o programa institucional de bolsas de iniciaÇÃo a … · pública, tanto no ensino fundamental...
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ISSN 2176-1396
O PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO A
DOCÊNCIA (PIBID) E AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS
PROFESSORES EM INÍCIO DE CARREIRA
Neide de Melo Aguiar Silva1 - FURB
Eixo – Representações Sociais e Educação
Agência Financiadora: não contou com financiamento
Resumo
Este estudo ocupa-se das representações sociais de egressos do Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) sobre sua iniciação na docência. Os participantes da
pesquisa estão em fase inicial na carreira e foram licenciados em uma universidade pública do
interior do Estado de Santa Catarina. O material empírico que funda esta discussão integra o
banco de dados de uma pesquisa mais ampla, desenvolvida em nível nacional, cujo foco é o
processo de formação do professor pelo viés de sua inserção na docência. Por este recorte, as
representações sociais dos professores são abordadas em duas fases: a primeira, que identifica,
contextualiza e discute estratégias formais e informais de ingresso do professor na carreira; a
segunda, que levanta aspectos objetivos e subjetivos destacados pelo grupo como componentes
de sua identidade profissional. A discussão das representações do grupo está pautada na vertente
orientada por Serge Moscovici. São nucleares na orientação das condutas dos professores
iniciantes a escola e suas estruturas e agentes, a sala de aula, a carreira, os mecanismos de
sustentação da prática e os meios de superação de problemáticas decorrentes. Há um olhar
atento sobre a atividade docente como um todo, acenando distanciamento e mudanças em
representações de precarização do trabalho docente, distanciamento na relação família escola,
massificação do trabalho pedagógico e desvalorização social da profissão. A escola é
representada pelo grupo como espaço aberto a inovações, o que estimula a inserção dos jovens
professores. É possível considerar as contribuições positivas do PIBID no desempenho do
professor iniciante, em especial pelas opções de docência como ação entre os pares e atenção
ao processo de construção das políticas de formação do professor.
Palavras-chave: Professor iniciante. PIBID. Representações de inserção na docência.
1 Doutora em Educação Matemática pela UNESP – campus de Rio Claro/SP. Professora da Universidade Regional
de Blumenau (FURB). Coeditora da Revista Atos de Pesquisa em Educação (PPGE/FURB). Pesquisadora
Associada da Fundação Carlos Chagas, participando do CIERS-Ed (Centro Internacional em Representações
Sociais e Subjetividade – Educação. E-mail: [email protected].
25343
Introdução
Este estudo ocupa-se da inserção na docência com egressos do Programa Institucional
de Bolsas de Iniciação à Docência, o PIBID, licenciados em uma instituição pública municipal
situada no interior do Estado de Santa Catarina, e doravante identificada como UniV.
O estudo é parte integrante de uma pesquisa mais ampla, desenvolvida como projeto de
Grupo de Pesquisa vinculado à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), com
fomento do CNPq, e cujo objetivo central é compreender o processo de inserção profissional
de egressos de programas de iniciação à docência. Várias instituições de ensino superior,
situadas em diversos estados brasileiros, participaram da referida pesquisa, aqui identificada
como Pesquisa P, dentre elas a UniV.
Em se tratando de um recorte, o foco epistemológico ora tomado reside na teoria das
representações sociais e suas interações com a educação. De modo geral, pesquisas com este
enfoque inferem sobre a necessidade de situar as práticas educativas numa totalidade concreta,
instigando para o encurtamento de distâncias entre pensamento social e acadêmico, comum e
clássico, cotidiano e institucionalizado, ético e legal. Do social é necessário compreender as
lógicas organizativas e o jeito de ser do mundo, construído na concretude de sujeitos comuns-
iguais-a-todo-mundo; do clássico acadêmico é imprescindível conhecer os meandros e
continuamente redimensionar as práticas.
Estudos em representações sociais tomam como imprescindíveis a contextualização do
espaço, a identificação dos sujeitos participantes, as práticas vivenciadas e as perspectivas
observadas. A construção dessa reflexão e seu consequente registro escrito segue, portanto, esta
lógica.
A UniV e suas trajetórias
Iniciada em 1964, como fundação educacional com o curso de Ciências Econômicas, a
UniV tem abrangência a 12 municípios circunvizinhos de seu campus, e oferece atualmente
cerca de 15 mil vagas para graduação, pós-graduação, cursos sequenciais e/ou de curta duração.
Incluindo a extensão e os serviços, a instituição divulga envolvimento anual direto de 90 mil
pessoas. Por sua história e localização estratégicas, como responsável pela expansão do ensino
superior fora da capital, a UniV representa para a região e para o Estado uma referência de
25344
desenvolvimento e organização, bem como espaço de oportunidades para avanços individuais
e socialmente construídos.
Transcorridos 53 anos de sua fundação, a UniV oferece 47 cursos de graduação, dentre
eles os cursos de licenciatura em Artes Visuais, Ciências Biológicas, Ciências da Religião,
Educação Física, História, Letras, Letras – Língua Alemã, Licenciatura em Computação,
Matemática, Música, Pedagogia, Química e Teatro. A UniV também integra o Plano Nacional
de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR), formando turmas especiais em
cursos de licenciatura, segunda licenciatura e formação pedagógica a professores em exercício
na rede pública de educação básica.
Os cursos de pós-graduação lato sensu tiveram início na UniV em 1976. O status de
Universidade foi alcançado em 1986. Em 1991 iniciaram-se as atividades da pós-
graduação stricto sensu com a criação do Mestrado em Educação. Atualmente a instituição
oferece 11 cursos de pós-graduação stricto sensu, sendo 3 deles (Ciências Contábeis,
Desenvolvimento Regional e Engenharia Ambiental) com programa de mestrado e doutorado.
No que se refere aos cursos de especialização lato sensu, 13 encontram-se em andamento, 21
estão com inscrições abertas e 17 são ofertados conforme demanda.
As atividades de extensão são desenvolvidas por grupos de docentes com base em seus
projetos aprovados nas unidades administrativas, com fomento interno e externo. Em sua
maioria visam reforçar a forte vocação institucional enquanto partícipe do desenvolvimento da
região. À extensão cabe também a frequente oferta de cursos sequenciais e de curta duração.
A UniV desenvolve 04 programas de bolsa de pesquisa e diversos programas de
extensão. As bolsas, sejam de pesquisa ou extensão, ficam associados a projetos específicos
elaborados conforme interesse, qualificação docente e demanda da comunidade acadêmica e
sociedade. Os diversos projetos de extensão, sempre aprovados em editais, têm alcance aos
acadêmicos nas clínicas e no ambulatório, no serviço judiciário, na televisão da UniV, nas redes
de ensino da região, como também às atividades dos acadêmicos atletas, instrumentistas,
cantores, bailarinos e artistas de grupos artístico-culturais.
Dentre os programas de bolsa desenvolvidos na UniV situa-se o Programa Institucional
de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID). Trata-se de um programa nacional, desenvolvido
pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) como incentivo
à formação de docentes em nível superior para a Educação Básica, concedendo bolsas de
iniciação à docência para alunos regularmente matriculados em cursos de licenciatura. A
25345
seleção do Pibid é regulamentada por editais específicos em cada instituição; o valor mensal da
bolsa é de R$ 400,00, pagos diretamente ao beneficiário pela CAPES.
O PIBID na UniV, os sujeitos e os marcos da investigação
O PIBID/UniV disponibilizou para a pesquisa duas planilhas com dados referentes aos
acadêmicos bolsistas. Uma das planilhas reuniu 205 acadêmicos contemplados com bolsa em
editais anteriores a 2013; a outra, referente aos editais de 2013, congregou 295 acadêmicos.
(Ver Quadro 01). Como é possível observar, o PIBID conta com larga demanda na instituição.
As informações permitiram o contato, via e-mail, com cada um dos acadêmicos, com o
convite à participação na pesquisa. O aceite incorria no acesso ao questionário, composto por
22 questões, entre abertas e fechadas, disponibilizado na plataforma do SurveyMonkey, e
consequente inclusão no banco de dados da pesquisa. Participaram 105 egressos do
PIBID/UniV.
O PIBID/UniV conta atualmente, (março de 2017), com 14 subprojetos; é contemplado
com um total de 286 bolsas, sendo 28 para coordenadores de área, 32 de supervisão e 216 bolsas
de iniciação à docência. Quanto às escolas parceiras, a UniV conta com a parceria de 30
escolas.
O Quadro 01, a seguir, apresenta um panorama do PIBID/UniV conforme a participação
dos acadêmicos nos subprojetos. São tomados como referência nesta análise três períodos, o de
iniciação do Programa na Instituição, o ano de 2013 e, por fim, dados atuais (mar/2017).
Quadro 01 – O PIBID/UniV: subprojetos e bolsas de iniciação à docência
Subprojeto: subárea
Bolsas de Iniciação à Docência
Editais
anteriores a
2013
Editais 2013 Quadro atual
-Março 2017
Artes 13 -- --
Ciências 25 23 24
Ciências Sociais 16 12 16
Educação Especial -- 11 5
Educação Física 21 34 20
Ensino Religioso -- 13 --
História 20 14 18
Intercultural Indígena 8 -- --
Interdisciplinar 19 -- --
Interdisciplinar: Direitos Humanos -- 13 12
Interdisciplinar Educação Ambiental -- 22 --
Interdisciplinar: Gestão escolar -- 21 17
25346
Interdisciplinar: Linguagens -- 10 15
Interdisciplinar: Tecnologias Digitais -- 12 6
Letras – Alemão 15 7 --
Letras – Português 15 11 17
Matemática 33 36 20
Música -- 24 17
Pedagogia 20 -- --
Pedagogia: Alfabetização -- 17 18
Pedagogia: Educação Infantil -- 15 11
Total 205 295 216
Fonte: A autora
Há demanda acentuada nos subprojetos Ciências, Matemática, Letras e Educação Física,
o que poderia sinalizar igual demanda pelos correspondentes cursos de licenciatura. No caso de
Matemática, em especial, a demanda pelo curso é relativamente pequena, se comparada à carga
horária da disciplina na educação básica, o que gera falta de professor nas redes de ensino ou
professores atuando sem a devida qualificação.
Em contrapartida, as lacunas geradas pela falta de professores podem impulsionar a
disponibilização de bolsas e ampliação do interesse dos acadêmicos. Neste caso, programas de
incentivo à iniciação na docência em áreas de vulnerabilidade cumprem a contento o seu papel.
Adentrar esse universo implicaria em levantar informações a respeito do interesse por
cada curso, ou as contingências que implicariam nas escolhas, o que não é especificamente
objeto deste estudo. No entanto, fica neste ponto um claro sinal da relevância de se discorrer
sobre representações sociais na formação profissional.
Segundo Jodelet (2001, p. 17-22), representar ou se representar corresponde a um ato
de pensamento pelo qual um sujeito se reporta a um objeto, compreendendo-o. A representação
tem com seu objeto uma relação de simbolização (substituindo-o) e de interpretação
(conferindo-lhe significações). Esta forma de conhecimento tem origem na vida cotidiana,
mostrando-se como forma de organizar o mundo para que a vida nele torne-se possível de ser
vivida.
A escolha por um curso, a trajetória de formação e o consequente exercício profissional
são permeados por representações; inseridas em um contexto de mútuas influências, elas
contribuem efetivamente para a formação das identidades.
25347
O tempo médio de permanência dos bolsistas no PIBID/UniV é de 6 meses. O Gráfico
01, a seguir, apresenta esta análise para os ingressantes de 2013.
Gráfico 01 - Tempo de permanência no PIBID/UniV (em meses). Ingressantes 2013
Fonte: Banco de Dados Pesquisa P
É possível observar a predominância de bolsas com tempo igual ou inferior a 6 meses;
no entanto, a participação também se estende até o limite de 18 meses. A permanência no
Programa por 11 meses foi efetivada por 35 acadêmicos, sinalizando envolvimento e
continuidade.
É relevante destacar que a maior parte dos respondentes (86%) estudou em escola
pública, tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio. Grande parte (58%) exerceu a
docência antes de concluir o curso de licenciatura e daqueles que atuam na área, que equivalem
a 60% do total, cerca de ¾ deles está atuando em sala de aula.
No grupo de egressos chama a atenção para o percentual de 38%, correspondente aos
que não estão atuando na área da educação. Em se tratando de uma região próspera, com nível
de emprego bastante amplo, pode ter havido opção de trabalho em outras áreas. Esta opção
pode ter prevalecido mesmo após a conclusão do curso de licenciatura.
Por outro lado, o número de vagas na área de educação é igualmente amplo na região,
com escolas em número suficiente para atender toda a população, desde a educação infantil ao
ensino médio. Neste caso, pode-se deparar com maior chance de ter vagas ociosas que
professores sem espaço de trabalho.
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
25348
Tomando por referência as justificativas, observa-se envolvimento do acadêmico das
licenciaturas com a formação e também com a construção da própria carreira. Embora 13
tenham respondido estar em outras atividades profissionais, maior parte deles especificaram
com funções ligadas à docência, sendo 08 na função de professor auxiliar na educação infantil
e/ou especial, 01 músico, 01 preparador físico, 01 orientador e 02 bolsistas na pós-graduação
stricto sensu.
A figura denominada Mapa de Cores, conforme apresentada a seguir, reforça uma visão
geral do perfil dos participantes da pesquisa e dos elementos agregados à formação profissional.
Gráfico 02 – O perfil dos participantes da pesquisa
Fonte: a Autora
É possível observar, conforme penúltima coluna do Gráfico 02, que há um número
elevado de professores egressos do PIBID que ainda não atuam na área. O Quadro 02, conforme
apresentado adiante, faz um apanhado em relação aos motivos para a não inserção na profissão.
Em conformidade ao argumento anterior que destaca o elevado número de vagas nas redes de
ensino da região ou mesmo a falta de professores em algumas áreas, 7 dos 40 respondentes
afirmam estar aguardando chamada para ingresso após terem sido aprovados em concurso
público. É possível reforçar conjecturas sobre um elevado investimento do professor na própria
Outros
39 a 49
NÃO EXERCEU DOCÊNC ENQTO ESTUD
NÃO ATUA
NA ÁREA
> Públ EJA
EFI 2013
Privado MAGIST HIST
30 a 39
Escola Pública
Ensino Médio
Regular
MAT
Escola Pública
25 a 29
LET
ATUA NA
ÁREA
GESTÃO
OUTR
EXERCEU DOCÊNC ENQTO ESTUD
ATE 2014
< 24 DOC
PED
BIO
Curso Ano de
conclusão Idade
Ensino
Fund.
Ensino
Médio Qual curso Trabalho
Atuação na
área
Tipo de
atuação
25349
carreira, uma vez que 35% daqueles que não estão atuando na área deram continuidade aos
estudos após a licenciatura.
Quadro 02 - Por que você não exerce a docência atualmente? [Questão 19]
Opções de resposta Percentual Respostas
Aguardo ingresso por concurso público 18 7
Trabalho em outra área. 25 10
Continuo os meus estudos. 35 14
Não tive oportunidade. 2 1
Não tenho interesse. 10 4
Outro (especifique) 10 4
Total 100 40
Fonte: A autora
Gráfico 03 – Respondentes que atuam na área de educação
Atuam na
Área
da
Educação
CLT
Outro
Gestão Iniciativa
privada
Outro
Outro
Mais de
40
Estado
MAIS DE
3
De 31 a 40
h
Docência
ATÉ 03
Servidor
Público
ATÉ 02
ACT
De 21 a 30
h
ATÉ 01
Município DE 11 a
20 h
Até 10 h
Fonte: A autora
25350
O Gráfico 03 ocupa-se em compreender o perfil dos respondentes que estão atuando na
área da educação, o que totaliza 62 respondentes. Destes, 77 % exercem a docência, atuando
em sala de aula, como titulares, na educação infantil ou ensino fundamental. Apenas 01 trabalha
como gestor escolar.
Ao que se apresentam nas justificativas, é de consenso que ser docente implica ser
responsável direto por uma turma de estudantes, com regência de classe definida e não
compartilhada. Inseridos em condições socioeconômicas, culturais e históricas específicas da
região, o grupo legitima uma representação de docência socialmente compartilhada, pautada na
figura do professor como responsável único e direto por uma ou mais turmas de estudantes.
Esta representação segue orientando a conduta dos professores iniciantes.
As representações sociais são construções teóricas que expressam conhecimentos do
senso comum; são elaboradas e partilhadas coletivamente, com a finalidade de construir e
interpretar o real. Enquanto sistemas autônomos de significações, as representações sociais
denotam normas, costumes, crenças e saberes característicos de grupos sociais em tempos e
espaços definidos. Construídas em espaços sociais funcionam como estatuto de conhecimento,
ratificando o pensamento de um grupo, um povo, uma cultura.
As representações sociais são saberes que norteiam o pensamento e a ação; estão
presentes e naturalizados no cotidiano. Ainda que complexas e com elevado potencial de
transformação, as representações sociais não entram, ou sequer cogitam, o mérito da
comprovação mormente estabelecido pela ciência para se constituir e circular. A autenticidade
e autonomia dos saberes promovem contínua (re)construção da identidade do grupo. (SILVA,
2009).
Por serem dinâmicas, as representações levam os professores iniciantes a produzir
comportamentos e interações com o meio reforçando a figura do professor como autônomo e
independente. Tais ações, sem dúvida, modificam, tanto a eles próprios, na condição de
profissionais em início de carreira, quanto ao grupo e espaços sociais em que estão inseridos.
O gráfico 04, a seguir, apresenta um panorama da atuação dos profissionais em relação
à modalidade de ensino.
25351
Gráfico 04 – Espaço de atuação profissional
Fonte: Banco de Dados Pesquisa P
Há destaque para o Ensino Fundamental de 6º a 9º ano. Este fato está associado à
formação acadêmica, haja visto o curso que frequentaram no período de participação no PIBIC
e os subprojetos aos quais se vincularam. Apenas 11% do total de acadêmicos participam dos
subprojetos relacionados à Pedagogia, justificando o menor número de egressos que atuam na
educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental.
O número de profissionais em exercício no ensino médio pode ser justificado pelo
menor número de escolas e consequente menor número de vagas nesta modalidade. Também
pode estar associado a uma prática comum entre professores iniciantes: adquirir experiência
com estudantes em fase inicial de escolarização. Nestes espaços os estudantes são crianças com
menor faixa etária e os conteúdos a serem trabalhados no ensino são de domínio amplo, o que
facilita ao professor iniciante sua fase de adaptação e inserção na carreira.
Dos 15 respondentes que especificaram outro nível e/ou modalidade de ensino, 02 estão
na educação superior, 03 no ensino profissionalizante, 01 na EJA e 09 ocupam-se do ensino
não formal, com aulas de reforço, instrumento musical, paradesporto e apoio pedagógico.
Em relação às condições e à jornada de trabalho (Gráfico 03), observa-se que embora
em menor número, há professores que trabalham em mais de uma escola. Iniciantes na
profissão, podem ver prejudicada a sua atuação mediante esse quadro de dificuldade. O
deslocamento, o reduzido tempo de permanência em cada escola, as diferenças institucionais
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%
45,0%
50,0%
Educação
Infantil.Ensino
Fundamental – 1º
ao 5º ano.
Ensino
Fundamental – 6º
ao 9º ano.
Ensino Médio. Outro
(especifique)
25352
ou a sobrecarga de atividades podem ser fatores de repercussão negativa para a inserção
profissional na docência.
Gráfico 05 – Em quantas escolas você trabalha?
Fonte: Banco de Dados da Pesquisa P
Em relação ao vínculo empregatício, 48% daqueles que atuam estão admitidos em
caráter temporário.
Gráfico 06 - Qual é a sua situação trabalhista atual? (Pode marcar mais de uma opção)
Fonte: Banco de Dados Pesquisa P
Apenas 1 escola.
Em 2 escolas.
Em 3 escolas.
Em 4 ou mais escolas.
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%
45,0%
50,0%
Servidor Público. CLT (Celetista). Contrato temporário. Outro (especifique)
25353
Admissões sucessivas em caráter temporário ou envolvendo um número elevado de
professores em cada escola podem repercutir em situações transitórias, emergenciais e, talvez
comprometimento no desempenho por parte dos profissionais. Essa transitoriedade pode ser
comum aos iniciantes em qualquer profissão, haja vista também a instabilidade ocasionada por
empregos, seja no setor público ou privado. Porém, em educação a inserção dos professores na
carreira e a consequente definição por uma modalidade de ensino não depende apenas da
habilitação. Vários fatores contribuem para a migração acentuada dos professores em seus
espaços de trabalho: os concursos públicos, nem sempre realizados com regularidade, a
identificação ou não do próprio professor em relação às modalidades de ensino; a eventualidade
das vagas de substituição, em geral de curta duração e ocupadas em sua maioria por professores
em início de carreira.
O professor em seu contexto de ação
As representações dos professores são responsáveis por seus comportamentos e atitudes
na coletividade, sofrendo mudanças a partir do convívio entre os pares, em situações
vivenciadas nos grupos de pertença. Essas representações são múltiplas, e tantas quantas forem
as opiniões de onde fluírem e desvelarem conceitos fundamentais e de coesão do grupo, como
percebidos por todos os agentes.
Moscovici (1978; 2001; 2004) preocupa-se em compreender a tríade grupos, ações,
ideias ou imagens que constitui e transforma a sociedade. Em sua essência, a interação entre
estes três referentes consiste em compreender o processo de operacionalização e as razões que
levam as pessoas a partilharem um dado conhecimento, produzirem uma realidade comum e
transformarem ideias em práticas.
As representações reconstroem de modo abstrato o real da vida cotidiana e atuam como
o principal meio para estabelecer associações com as quais os indivíduos ligam-se uns aos
outros. “Enquanto as representações, que são partilhadas por tantos, penetram e influenciam a
mente de cada um, elas não são pensadas por eles; melhor, para sermos mais precisos, elas são
re-pensadas, re-citadas e re-apresentadas”. (MOSCOVICI, 2004, p. 37).
Nesta perspectiva, foram levantadas com o grupo alguns focos de interesse que orientam
sua prática profissional. Os focos foram balizados por posicionamentos de concordância,
completa ou parcial, e discordância, também completa ou parcial, em um conjunto de 18
25354
assertivas. Os posicionamentos resultantes envolveram 54 participantes (aqueles que atuam na
docência) e foram sistematicamente enucleados.
Conforme a relevância atribuída pelo grupo às assertivas, resultaram como nucleares na
representação da própria prática aspectos ligados à instituição escolar, às pessoas, à sala de aula,
à carreira e aos mecanismos de apoio.
Em relação à instituição o grupo avalia como adequadas as condições de infraestrutura
vivenciadas nas escolas onde atuam; elas possuem recursos tecnológicos e materiais
pedagógicos em número e condições satisfatórias, que são utilizados em suas aulas. A avaliação
do número de alunos por turma foi destoante dos demais aspectos, dividindo o grupo entre
aqueles que concordam com a política atual (57%), os que discordam (30%) e aqueles que
optaram por não opinar (13%).
A relevância das relações entre pessoas ligadas ao contexto escolar destaca, em ordem
decrescente de apoio recebido, a equipe gestora, os colegas e a equipe pedagógica. Esta boa
relação do professor com demais sujeitos só fica estremecida quando se referem aos pais.
Dentre os respondentes 31% dos professores consideram insuficiente o apoio recebido dos pais.
E, entre os 63% que concordam com o apoio recebido dos pais, 19 professores o fazem apenas
parcialmente. É compreensível esta dissonância, haja vista a discussão atual e recorrente no
contexto das políticas educacionais para que se alarguem a relação família escola.
A escola desempenha sua função pedagógica aliada a um conjunto de fatores e
influências recebidas no meio familiar. E o peso das referências socialmente adquiridas, seja
no contexto familiar ou escolar, varia de acordo com o que a escola proporciona em termos de
reconhecimento ao ensino dispensado. Assim, a organização de imagens e linguagens que
reforçam a relação entre pais e professores realça e simboliza fatos e atos que se tornam comuns
no contexto de noções, regras e valores onde atuam os professores, determinando seus
comportamentos e atribuindo significados às respostas a serem dadas por eles no exercício de
sua profissão.
Quanto às atividades de ensino e às atividades em sala de aula os professores, ainda que
iniciantes, não apontam dificuldades. Suas experiências em sala de aula são positivas, assim
como são igualmente positivas as respostas dos estudantes. Porém, é de consenso que
encontram muita dificuldade para lidar com a indisciplina em sala de aula.
Ao enfatizarem a indisciplina como elemento de dificuldade, os professores iniciantes
explicitam uma representação comum de disciplina, que vem se constituindo historicamente
25355
como uma das maneiras mais eficazes de dar conta da conformação e normalização dos
estudantes nas escolas. Necessárias para o desenvolvimento realizado no convívio com o outro
e defendidas como forma de homogeneizar na cultura os valores supostamente úteis e
necessário a todos, as regras estão sempre presentes no contexto escolar e no discurso de seus
agentes.
Mediante a forte representação de recusa da indisciplina, podem ser conduzidas
discussões a respeito de problemáticas atuais e de grande relevância para a educação, como o
caráter educativo do trabalho pedagógico; a violência social e suas manifestações no contexto
escolar; o silenciamento escolar e suas decorrência; as relações de poder sempre presentes na
ação dos sujeitos; entre outros aspectos que explicitam a estreita relação entre a prática social,
o processo de escolarização e a formação do professor.
Em relação à carreira, 78% dos professores consideram adequada a sua carga de
trabalho. Embora possam ser identificados no perfil aspectos de dificuldade como o trabalho
em duas ou mais escolas e a transitoriedade dos contratos, o professor iniciante parece disposto
a superar. Afirmam discutir sobre a prática pedagógica com os colegas e também buscar apoio
fora da escola, com pessoas amigas ou da família, ex-professores, cursos, sites ou blogs
específicos.
O fator de discordância com atributos relacionados à carreira está na remuneração;
apenas 6 professores do grupo indicam satisfação e concordância plena com o salário que
recebem. Nesse aspecto, além das condições concretas que pautam as políticas educacionais, a
valorização do trabalho do professor apresenta-se relacionada à uma desvalorização social da
profissão, como representação antiga e contraditória.
Conforme Gatti (2013, p. 155), “a representação da não valorização da docência na
educação básica vem perdurando uma vez que a constituição sócio-histórica-política de
elementos para a superação e reconstrução dessas representações sociais não tem alcançado
efetividade real”. A mudança em representações sociais é um processo complexo e lento e
ocorrem mediante acontecimentos impactantes, reconstruções delimitadas por fatores de
necessidade e mudanças culturais. Ao que se apresenta nas justificativas, é sobre essa
desvalorização que o professor se ressente. Mas também é sobre a valorização que vêm
pautando a construção de seu perfil.
Por fim, é relevante ressaltar que a representação do grupo sobre a escola e sobre o modo
como são recebidos por ela contempla elementos de satisfação e integração. Para o grupo a
25356
escola está sempre aberta à realização de práticas inovadoras, recebe sem preconceito os
professores e não lhes arroga de início as tarefas ou espaços de maior dificuldade e tem, quase
sempre, um ambiente agradável de trabalho.
Em suma, cabe destacar que a representação do grupo sobre a prática docente congrega
elementos para bom desempenho profissional. Também se destaca, com 89% de concordância,
a contribuição positiva do PIBID para a sua inserção na atividade profissional.
Considerações Finais
Ao levantar o perfil de um grupo de egressos do PIBID na UniV e discutir as
representações deste grupo sobre o processo de inserção na docência, foi possível estabelecer
dois vínculos teóricos, que de algum modo podem ser tomados também como epistemológicos.
Por um lado, aspectos da formação do professor e o conjunto de conhecimentos já
produzidos sobre a profissionalização docente e políticas específicas estão permeados nas
respostas e valorações atribuídas pelos participantes da pesquisa. Por outro, podem ser
avaliados alguns desdobramentos da construção de conhecimentos específicos da formação
profissional nas relações sociais que os participantes afirmam entabular na escola e fora dela,
em uma via de mão dupla, por onde os sujeitos ampliam condições concretas de transformarem-
se e transformar o mundo velas vias de sua ação.
As representações do grupo destacam sobremaneira fortes vínculos entre os professores
iniciantes, a escola e demais agentes escolares. As lacunas e fragilidades neste vínculo situam-
se apenas na relação família escola, sendo destacadas pelos professores em consonância à falta
de apoio e reconhecimento dos pais sobre o seu trabalho.
Não obstante a discordância sobre as políticas salariais vigentes, que lhes imputa baixos
salários, poder aquisitivo menor e falta de reconhecimento social, prevalece o interesse pela
continuidade na profissão. Os investimentos na carreira se destacam pela busca de formação
continuada, capacidade de inferência sobre as políticas educacionais e demais práticas de
superação, como apoio de pessoas, cursos e meios fora da escola.
Há que se destacar, pelo perfil do grupo, sinalizadores de bom desempenho e,
essencialmente, atributos de formação bem delimitada. O fato de terem participado do PIBID,
que reforça com suas práticas os propósitos desencadeados no curso de licenciatura, pode ter
contribuído na construção deste cenário. As representações identificadas no grupo sobre a
docência e seus componentes atitudinais, conforme identificados nas assertivas, dinamizam e
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orientam as condutas, suscitando um conjunto de reações objetivas e subjetivas necessárias ao
exercício da profissão.
REFERÊNCIAS
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participativa em um contexto institucional. In: GATTI, B. A. (Org.). O trabalho docente:
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N.M.A. (Org.) Representações sociais em educação: determinantes teóricos e pesquisas.
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