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O PROCESSO HISTÓRICO DE INSTALAÇÃO DO COLÉGIO TÉCNICO

INDUSTRIAL DE SANTA MARIA – CTISM/UFSM

Drª Roselene Moreira Gomes PommerCTISM/UFSM

[email protected] Lima

Acadêmica do Curso de História/[email protected]

Resumo

Na década de 60, juntamente com a oferta do ensino superior, a Universidade Federal

de Santa Maria implantou escolas técnicas de nível médio. Essa ação esteve relacionada ao

incremento da industrialização do país na segunda metade do século XX, o que passou a

exigir a qualificação da mão-de-obra operária. As ações públicas, então, refletiram mais o

interesse dos grupos empresariais, do que dos próprios trabalhadores. Santa Maria, em função

de sua posição geográfica – área central do RS – e por possuir, na época, oficinas de reparo e

manutenção da Rede Ferroviária Federal, apresentava um contingente operário que, em um

contexto político de transformação dos movimentos sociais com a emergência dos governos

militares, interessava manter controlado. A criação de uma escola técnica industrial de nível

médio, vinculada a UFSM, na segunda metade da década de 1960 assumiu essa função.

Palavras-Chave

Educação – Trabalho – Universidade

Introdução

A História, ao refletir sobre as revisões teóricas e metodológicas a que são

constantemente submetidas as mais diversas áreas de conhecimento das Ciências Sociais, tem,

nos últimos anos, redimensionado seus objetos e métodos. A revisão dos paradigmas

tradicionais deu origem a chamada Nova História, a qual se preocupa prioritariamente com a

história vivida a fim de abordá-la de modo a estudar, nas inter-relações sociais, as ações dos

sujeitos do processo histórico, entrecruzando narrativas e explicações de eventos

dialeticamente postos em relação com as narrativas e explicações de longa duração. Com isso,

modificou-se também a concepção de documento, fazendo com que a sua relação com

pesquisador fosse revista. “O documento deixou de ser um material bruto, objetivo e inocente,

mas exprime o poder da sociedade do passado sobre a memória e o futuro: o documento é um

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monumento” (Le Goff, 2003, p. 10). Ou seja, o documento tem um significado mais

simbólico do que funcional cujas parcialidades representacionais solicitam investigação e

neste sentido implica a noção de monumento, pois deixou de ter a função de replicar o

passado, se constituindo em importante fonte de interpretação de eventos e/ou do passado

para a compreensão do presente. Nesta perspectiva, as narrativas mnemônicas também

assumiram a função de documentos históricos por serem portadoras de representações das

experiências vividas pelos grupos sociais nos seus mais diversos tempos.

O caráter explicativo que a narrativa histórica assumiu atingiu as diversas áreas de

atuação da ciência histórica. Este foi o caso da História da Educação que, ao trabalhar com a

educação tendo-a como objeto complexo, passou a abordar as práticas educativas

historicamente constituídas e registradas nos documentos oficiais das escolas, das agências de

planejamento, fomento e de fiscalização das redes de ensino, bem como aquelas práticas cujos

registros escapam ao oficial, ou seja, aquelas que são guardadas também pela memória

individual e social dos sujeitos envolvidos nas atividades educacionais como um todo.

A partir do exposto é possível escrever a História das Instituições Escolares como

espaços de produção de identidades multifacetadas, correspondentes aos tempos históricos

que lhes são próprios: “a noção de duração, de tempo vivido, de tempos múltiplos e relativos,

de tempos subjetivos ou simbólicos” (Le Goff, 2003, p. 13). Portanto, na análise das

identidades culturais educacionais das instituições, poderemos localizar a sua cultura

pedagógica e a relação que a escola estabelece com a totalidade do corpo social na perspectiva

destes tempos na dialética do tempo linear do calendário e das periodizações da História.

O objetivo primeiro desta pesquisa é o de apreender/compreender em cada momento

histórico nacional que correspondeu a diferentes políticas públicas para a educação, as

identificações pedagógicas produzidas pelo Colégio Técnico Industrial de Santa Maria. Essa

escola de formação técnica, vinculada a Universidade Federal de Santa Maria, desde a sua

implantação apresenta-se como um espaço de profissionalização de nível médio. Mesmo

mantendo essa forma de apresentação nos seus 43 anos de atuação, a cultura pedagógica do

CTISM produziu identificações diferentes, relativas a quatro fases: a primeira, a “fase de

implantação”, período que vai de 1963 até 1970; a segunda, a “fase de afirmação”, de 1971

até 1984; a terceira, “fase de revisão”, de 1985 até 2005; e a quarta, a “fase de renovação”,

que envolve os últimos cinco anos. A partir da análise dos contextos históricos que são

próprios de cada fase, pretendemos localizar as condicionantes para a produção de

identificações multifacetadas elaboradas pela cultura pedagógica do CTISM.

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Conforme Hall, compreender identidades como “pontos de apego temporário às

posições-de-sujeito que as práticas discursivas constroem para nós” (2005, p.112) é um

significativo suporte teórico. Os pontos de apego possuem a função de estabelecer a unidade

do grupo, diferenciando-o dos demais. Assim, os elementos de identificação se produzem

mais pela diferença em relação ao “outro”, do que pela homogeneidade de um “nós”. O

fechamento que a unidade pretensamente produz é resultado do poder e dos interesses do

grupo social que se encontra em condições de produzir os elementos simbólicos para a sua

identificação.

Neste primeiro momento da pesquisa, analisaremos aquilo que identificamos como a

primeira fase da História do CTISM, ou seja, a da instalação. Buscaremos na interpretação

desse processo histórico, os elementos para a compreensão da identificação que a escola

produziu e adotou para se apresentar à comunidade, na segunda metade da década de 1960,

tomando como co-implicantes desse passado tanto documentos oficiais da escola, da

universidade, correspondências, notícias veiculadas na imprensa, bem como narrativas de

pessoas que participaram de sua implantação. As nossas fontes serão, portanto, os documentos

oficiais, a rememoração oral, as notícias veiculadas pelos jornais e outras que forem

pertinentes.

1. O Ensino Profissionalizante no Brasil: situando o objeto

As políticas voltadas para a educação profissional no Brasil são recentes e expressam

as adequações ao capitalismo mundial experimentadas pelo país desde o século XIX. Nessa

época foram criados os primeiros Liceus de Artes e Ofícios (SAVIANI, 2007, p.125), os quais

significaram o embrião de uma nova divisão sócio-cultural que a educação ajudava a

legitimar: aos homens livres e de posses oferecia-se a educação que preparava para as

atividades intelectuais; para os serviçais, a educação deveria significar a preparação para o

processo de trabalho.

Nesse sentido, a escola era elevada a categoria de instrumento de viabilização do saber

que correspondesse aos interesses dos grupos burgueses e, no caso brasileiro do século XIX,

também da aristocracia agrária. Quando o país atingiu o estágio em que as tarefas de reparo,

manutenção e ajustes das novas tecnologias necessitaram de trabalhadores mais bem

preparados, surgiram os cursos profissionalizantes. Porém, com a concentração de

trabalhadores em parques industriais ou em áreas de habitação específicas, o movimento

operário poderia encontrar facilidades de organização e de reivindicações, essa modalidade de

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ensino assumia, também, a função de controlar os movimentos que pudessem colocar a ordem

aristocrático-burguesa em risco.

Na primeira fase do período republicano, apesar da incipiente industrialização, as

políticas públicas de educação estiveram voltadas para o ensino primário que deveria ser

democratizado a partir dos princípios laicos do positivismo. Frente aos problemas

educacionais da época – falta de professores e despreparo dos existentes, falta de estrutura e

de escolas – herdava-se o sistema de segregação social da época imperial, ou seja, a grande

maioria da população permaneceu analfabeta, sem participação política, vendendo sua mão de

obra desqualificada para as indústrias emergentes, enquanto os espaços escolares estiveram a

serviço do preparo político da aristocracia tradicional e da burguesia emergente.

Mas, a urbanização decorrente da incipiente industrialização do país exigiu algumas

ações para a preparação de jovens para o mercado, o que resultou em 1909, na criação de 19

Escolas de Aprendizes e Artífices. Essas unidades estiveram voltadas, fundamentalmente,

para o sentido moral do trabalho enquanto instrumento modelador da conduta dos jovens,

sacrificando sua preparação profissional. Mesmo que, naquele momento, as EAA não tenham

alcançando sucesso, elas representam, hoje, o início da Educação Técnica no Brasil.

A efetivação de uma real política de educação profissional surgiu após o golpe de

1930 que colocou Getúlio Vargas no poder. Destarte, o Estado surgia como o grande

promotor da alteração do modelo de desenvolvimento adotado: de agro-exportador, para

urbano-industrial. Configurava-se um projeto burguês de desenvolvimento industrial baseado

nos princípios taylorista-fordista. Saviani afirma que na época, “as políticas pertinentes a

educação objetivavam atender às demandas do processo de industrialização e do crescimento

ascensional da população urbana” (SAVIANI, 2007, p. 130), o que exigia mudanças nas

políticas de preparação dos jovens profissionais.

Em 1942, a Educação Profissional foi contemplada pelo Estado Novo com a Reforma

Capanema, que organizou o quadro educacional brasileiro em dois níveis: básico e superior; e

ajustou as propostas pedagógicas para a formação de trabalhadores de nível médio. No

aspecto da formação profissional, o Brasil continuava praticando a política educacional como

um fator legitimador das diferenças sociais, deixando evidente a educação do “aprender a

fazer” para os jovens oriundos das classes economicamente pobres.

No período do pós II Guerra houve a intensificação do processo de industrialização do

país, especialmente em decorrência da abertura do Brasil ao capital estrangeiro articulada e

permitida por Juscelino Kubitschek e seus grupos de apoio. A questão da qualificação da mão

de obra tornou-se premente e o Estado tentou resolvê-la através da criação de Escolas

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Técnicas de formação rápida. Em 1963, João Goulart propôs o PIPMO (Programa Intensivo

de Preparação de Mão de Obra), que acabou sendo executado, com adequações ideológicas,

pelos governos militares após 1964. Esse programa era formado por cursos profissionalizantes

de curta duração, distribuídos em todo o país, para operários de baixa escolaridade, seguidos

do encaminhamento para trabalhos pouco remunerados.

Após 1964, as políticas educacionais estiveram de acordo com as diretrizes de um

Estado organizado sob os auspícios do poder econômico, nacional e internacional. De modo

consciente e planejado os assim chamados tecno-empresários por René Dreyfuss, articularam

a destruição do modelo populista o que incluía a sua base ideológica, sendo que o ensino

profissionalizante também se tornou muito útil na formação da nova base ideológica

necessária ao novo modelo de administração pública.

Os tecno-empresários tiveram de reconhecer [no início da década de sessenta] que, para implementar uma forma particular de “planejamento nacional” eles precisavam assegurar a paz social e apoderar-se do comando político, ou seja, controlar o Estado. Os tecno-empresários participariam então da ação organizada da burguesia para quebrar o regime e o sistema populista e conquistar o poder do Estado em 1964 (DREIFUSS, 1981, p. 86).

Para que o país fosse preparado para essa apropriação, no sentido de uma

modernização conservadora, o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais teve contribuição

relevante. Criado em 1962, esse Instituto se configurou em uma frente de ação do

empresariado nacional e multinacional, de altos funcionários públicos, de profissionais

liberais e de militares integrantes da Escola Superior de Guerra, voltada mais para o combate

às reformas populistas propostas por João Goulart, do que para o estudo e apresentação de

soluções para os problemas do país. Para Dreifuss, os empresários que constituíam a força

maior do IPES, “(...) visavam uma liderança política compatível com sua supremacia

econômica e ascendência tecnoburocrática” (1981, p. 163).

Para atingir esse objetivo, o IPES fez uso, inclusive, da doutrinação de jovens de

Ensino Médio e de adultos trabalhadores. Na tentativa de manipulação da opinião pública, o

Instituto produziu e distribuiu material didático-pedagógico e influenciou a ideia de criação da

Universidade do Trabalho, em Campinas.

Assim, após março de 1964, mais que em outras épocas, a educação profissionalizante

foi usada como forma de adestramento do operariado, até por que, a ideia de que o estudante

deveria estudar e o trabalhador trabalhar se constituiu no lema da educação brasileira dos

governos militares. Para viabilizar a oferta de ensino profissionalizante, esses governos

estabeleceram acordos com instituições estrangeiras. Alguns deles foram feitos entre o

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Ministério da Educação e Cultura (MEC) e a United States Agency International for

Development (USAID).

Os 12 acordos assinados entre o MEC e a USAID ocorreram entre 1964/68 e tiveram

como objetivo a reformulação do ensino brasileiro em todos os seus níveis, do primário ao

superior, para adequação do país, a partir da educação, aos novos contextos político e

econômico. Ocorre, porém, que esses acordos feriam a autonomia da nação. Ao prefaciar o

livro Beabá dos MEC-USAID, Lauro de Oliveira Lima afirma que, com eles “(...) o centro de

gravidade das decisões sôbre o ensino do País deslocou-se do MEC, no Palácio da Educação,

para as sedes das comissões americano-brasileiras, cujos endereços não eram acessíveis a

qualquer um” (ALVES, 1968, p. 08). A perda da autonomia sobre as diretrizes educacionais

do país resultou em um sistema de ensino baseado em interesses norte-americanos. Esses

interesses, inseridos em um contexto político de polarização típico da Guerra Fria, voltavam-

se para a aceleração do desenvolvimento econômico a fim de ajustar o Brasil à política

capitalista. Para Pina, nessa época, “(...) ostensivamente, a política educacional brasileira

centrou-se na formação do operário e não do cidadão” (2009, p. 283).

Para tanto, os acordos MEC/USAID previam assessoria técnica estadunidense para o

planejamento da estrutura de ensino, capacitação e aperfeiçoamento de professores e ainda

para a cooperação em publicações técnicas e pedagógicas. As ações práticas iniciaram com o

ensino primário, em 1964. Em 1966 eram estendidas para o ensino médio e universitário,

efetivando a relação entre a política educacional dos governos da época, com a qualificação

de uma mão de obra “adestrada”. Para Lima, o resultado foi (...) a transformação do ensino em fábrica de gerentes, de técnicos bitolados, de autômatos que aceitem que se lhes determine completamente como devem usar suas vidas. Daí a ênfase dada nos últimos tempos à “tecnização” do ensino (...) os técnicos sonhados pelas classes dominantes (...) são meros executores de tarefas. Querem homens que vêem na máquina uma máquina, no operário um operário, na emprêsa um fim, no consumo uma realização última e feliz (1968, p. 106/107).

O ensino tecnicista atendia, assim, as necessidades dos contextos político e econômico

da época, ou seja, preparar os grupos populares para serem operários de nível médio, privados

da participação política e da consciência cidadã. Essa foi a ideia que a lei 5692/71 legitimou.

Editada em 1971, época do paradoxo entre aumento da repressão de um lado e do

desenvolvimento econômico “milagroso” de outro, a nova Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional entre outras medidas, legitimou o ensino tecnicista profissionalizante.

Müller observa que no período de crescimento econômico dos governos militares, as políticas

educacionais não estiveram ligadas a um o aumento expressivo da mão de obra operária, e

sim, “(...) a busca por adestramento e treinamento para formar trabalhadores necessários ao

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processo de ampliação do parque industrial”(2008, p. 06). Assim, as políticas públicas para a

educação profissional foram intensificadas, porém, estritamente a partir do interesse dos

grupos empresariais e em detrimento dos possíveis interesses dos próprios trabalhadores.

Em Santa Maria, o contexto da década de 1960 não foi muito diferente. Em função de

estar localizada no centro do Rio Grande do Sul e de possuir oficinas de reparo e manutenção

da Rede Ferroviária Federal para todo o Estado, a cidade apresentava-se como um pólo de

prestação de serviços especializados o que demandava desde a década de 1920 de um

contingente operário qualificado. Foi em função dessa demanda que a Cooperativa de

Consumo dos Empregados da Viação Férrea (fundada em 1913), em 1922 decidiu investir

também na educação, através da Escola de Artes e Ofícios. Essa escola, que a partir de 1934

passou a denominar-se Ginásio Industrial Hugo Taylor, oferecia, além da instrução primária e

ginasial, o ensino profissionalizante aos filhos de trabalhadores da RFFSA, com fins de

preparar mão de obra para suprir as necessidades da própria empresa. Além dessa escola e

com o mesmo propósito, a RFFSA de Santa Maria, oferecia cursos de formação e atualização

rápidos nas dependências de suas oficinas.

Outra alternativa para os jovens santa-marienses que prematuramente necessitassem

ingressar no mercado de trabalho era o Patronato Agrícola Antônio Alves Ramos. Criada em

abril de 1961, essa escola oferecia cursos de tipografia, marcenaria e mecânica com os

mesmos objetivos das escolas citadas anteriormente.

No entanto, nenhuma das instituições oferecia formação técnico-industrial de nível

médio. Tanto o Ginásio Hugo Taylor quanto a Escola Patronato ofereciam qualificações em

nível primário e ginasial. O ensino técnico industrial de nível médio passou a ser ofertado, na

cidade de Santa Maria, com a instalação da Universidade Federal. Essa oferta se deu através

das unidades a ela vinculadas: Escola Politécnica, instalada em 1963 e do Colégio Industrial,

instalado em 1967.

2 O Processo de Implantação do Colégio Industrial

Em dezembro de 2010 a Universidade Federal de Santa Maria, primeira universidade

federal criada no interior do Brasil, completará 50 anos de atuação na região central do Rio

Grande do Sul. Sua fundação está ligada e decorre das ações da Associação Santa-mariense

Pró-Ensino Superior (ASPES) que, em 1958, já apresentava o projeto de instalação de um

Centro Politécnico com diversos Institutos, como o de Mecânica, de Hidráulica e de

Eletrotécnica, o que resultaria na instalação da Universidade dois anos depois.

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Concomitante a oferta de ensino superior, era preocupação da ASPES a oferta de

cursos de qualificação de nível médio, em função da necessidade de instrução de jovens a

serem capacitados para atuar tanto no meio rural como no meio urbano. Segundo o Professor

Mariano da Rocha, presidente da ASPES na época, o Ensino Médio “(...) não preparava os

jovens para o mercado de trabalho, eis que o ensino é apenas teórico” (ISAIA, 2006, p. 341).

Em março de 1960 Mariano da Rocha recebia autorização do MEC para a criação da

Escola Agrotécnica de Santa Maria. Pela falta de área adequada, essa escola só começou a

funcionar em 1963, depois do surgimento da UFSM e foi a primeira desse nível instalada em

um campus universitário no interior do país. Neste mesmo ano, o senador Daniel Krieger

requereu junto ao MEC, uma verba para a instalação de um Colégio Técnico Industrial

vinculado a Universidade de Santa Maria. A justificativa dada para a solicitação estava na

concentração populacional que a cidade apresentava e no fato de ela sediar as oficinas de

manutenção e reparo da RFFSA (ISAIA, 2006, p. 213), o que aumentava a necessidade da

qualificação da mão de obra local e regional.

A alegada importância geopolítica que a cidade assumia no estado, também foi

utilizada pelo Reitor Mariano da Rocha em correspondência enviada ao presidente João

Goulart em abril de 1963. Nela, ao solicitar a instalação de um escritório da Agência

Nacional1, fez uso das seguintes justificativas:Santa Maria é um conglomerado essencialmente proletário (...) dá curso a todos os caminhos do quadrante estadual e fica ao pé de duas fronteiras internacionais (...) possui quatro estações de rádio, imprensa escrita diária e periódica e é o mais importante centro de rádio-amadorismo no Estado (...) tem intensa vida político-partidária (...) é sede de Congressos Classistas Regionais e Nacionais (...) é a cidade de mais intensa vida corporativa em todos os setores de atividades (...) possui os quatro maiores redutos humanos de militares, ferroviários, estudantes e comerciários do Estado (...) oferece a segurança do maior lastro de politização das massas [e] o panorama magnífico e inequívoco de comunidade isenta de impulsos bruscos na vida econômica e financeira (1963, fls. 01/02)

Considerando-se o momento político do país, com a retomada do presidencialismo

(janeiro de 1963), o lançamento das Reformas de Base (março de 1963) e o aumento da

organização dos movimentos sociais, lideranças de Santa Maria procuraram afirmar a cidade

como centro estudantil, industrial e de serviços, enfatizando o seu papel relevante no contexto

regional. A alegada importância constituía-se ao mesmo tempo, porém, na própria

justificativa para a instalação de cursos técnicos por parte da UFSM e numa referência

modelar para a identificação que a escola adotou após sua instalação, ou seja, a de um espaço

de formação técnico-industrial de nível médio.

1 Inferimos, pelo conteúdo da correspondência, que a o reitor referia-se a Agência Nacional de Notícias. In Arquivo Histórico da UFSM.

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Ainda relativamente a essa justificação, em abril de 1965, uma comissão da Faculdade

Politécnica elaborou um parecer, a pedido do Departamento de Educação e Cultura da UFSM,

sobre a carência de técnicos no país. Primeiramente o documento explicava que a estrutura

curricular do ensino secundário não preparava para o mercado de trabalho e sim, para o

ingresso no ensino superior. Logo, se fazia necessário(...) voltar as vistas para a questão do preparo de técnicos de grau médio, para apoiar o desenvolvimento industrial do nosso país, [pois] a atual tendência do ensino secundário é altamente prejudicial a economia e extremamente danosa para o desenvolvimento de setores da produção em tôdo o país (AITA, SANTOS e RAMOS, 1965, fls 01/02).

A comissão se posicionava favorável a oferta de cursos como de Mecânico, Eletricista

e Condutor de Obras, porém, sem vínculo com a Faculdade Politécnica, já que esta carecia de

docentes e de oficinas adequadas. Propunha, então, a criação de um Colégio Industrial,

vinculado a Universidade, no mesmo modelo da Escola Agrotécnica. Assim, ainda em 1965,

iniciava a construção do prédio que abrigaria o CTISM.

Em outubro de 1966, o jornal A Razão noticiava a visita de técnicos da USAID à

Universidade. Mr. Reynolds, diretor do ensino industrial da USAID para o Brasil,

acompanhado de Mr. Nostrat, assessor para o Rio Grande do Sul2, juntamente com o Reitor,

percorreram o campus, detendo-se(...) especialmente no Colégio Industrial, motivo principal [da presença] dos representantes da USAID em Santa Maria. Os visitantes vieram verificar as necessidades de equipamento, organização do Colégio e o plano de cursos, bem como foi aventada a possibilidade de aquisição do equipamento em condições excepcionais para o futuro colégio, que deverá funcionar no próximo ano (A RAZÃO, 1966, p. 06).

No final do ano de 1966 a obra se encontrava em fase de conclusão, sendo

mencionada, como uma daquelas para as quais o Reitor solicitava recursos em

correspondência enviada ao presidente Castelo Branco3. Vale lembrar que os últimos meses

de 1966 foram marcados, em Santa Maria, pelas discussões entre as lideranças políticas e

empresariais da cidade, sobre a implantação do Distrito Industrial. Esse fato aponta o desejo

de crescimento industrial e, por conseguinte, o aumento de um grupo operário que necessitava

de qualificação, o que reforçava a urgência para o início do funcionamento do Colégio

Industrial.

Quanto aos resultados da visita dos técnicos da USAID não foram encontrados

registros no arquivo histórico da Universidade, porém, em julho de 1967, o Reitor em

correspondência ao presidente Costa e Silva, solicita a inclusão dos projetos da UFSM nos

2 Jornal A Razão, de 29/10/1966.3 Conforme correspondência constante no Arquivo Histórico da UFSM.

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programas estabelecidos “(...) entre o Govêrno Brasileiro e a USAID ou o BID [para] o

financiamento necessário aos projetos elaborados com relação ao ensino em geral e que,

incluem, óbviamente, a construção das cidades universitárias e o equipamento de suas escolas

e hospitais” (ROCHA, 1967). Essa solicitação sugere que a visita não resultou em ações

positivas que promovessem o equipamento das oficinas do Colégio Industrial.

Em janeiro de 1967 a imprensa local divulgava a abertura das matrículas, de 11/01 e

10/02, para os cursos de edificações, eletrotécnica, máquinas e estradas, sendo ofertadas vinte

e cinco vagas para cada um. A documentação exigida, além da conclusão do ensino ginasial,

era: “(...) atestado de sanidade mental, (...) abreugrafia, prova de quitação militar, atestado de

conduta fornecido pela escola de origem (...)4. A exigência de “atestados de conduta”

relacionava-se ao regime político de exceção vigente desde 1964 e que a já partir 1967 parecia

se afirmar como hegemônico. Naquela época, manifestações de qualquer ordem eram

interpretadas como indisciplina e contestação ao governo, por isso a conduta individual

passou a ser controlada e documentada. Alguns desses atestados encontram-se arquivados,

juntamente com a documentação dos alunos, na secretaria do CTISM.

Estava previsto que, se o número de inscritos ultrapassasse o limite de vagas para cada

curso, seria feita seleção. Parece, no entanto, que as expectativas não se confirmaram, pois,

em 10 de fevereiro a imprensa noticiava a prorrogação das inscrições por mais dez dias5. As

atividades, inicialmente marcadas para 15/03, somente começaram no dia 29/03 com reunião

de professores, e no dia 04/04, com a primeira aula.

Alguns depoimentos de professores e alunos que integraram o grupo pioneiro do

CTISM testemunham as dificuldades enfrentadas no período de implantação. O professor

Osvaldo Dal Lago lembra que o Reitor da UFSM convidou o irmão marista e ex-diretor do

Colégio Santa Maria, Mario Guagliotto, para dirigir o Colégio. Este por sua vez o procurou e

o convidou para ajudá-lo na elaboração da grade curricular dos cursos e para lecionar Língua

Portuguesa. Dal Lago recorda que o irmão Mário visitou os colégios industriais de Curitiba e

de Pelotas, trazendo orientações, inclusive regimentais, para a instalação da escola. Havia

pressa, pois, o professor Mariano ordenara: “(...) a partir de março eu quero essa escola

funcionando”(Dal Lago, 2010, p. 01).

O modelo curricular tomado de outras instituições foi lembrado, também, por

Waldemar Fuentes, que fez parte do grupo dos primeiros docentes do CTISM. Formado pelo

4 A Razão, 10/01/1967, p. 05.5 A Razão, 10/02/1967, p. 03.

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Colégio Técnico de Pelotas, o professor Fuentes participou da elaboração do currículo do

curso de eletrotécnica, tomando como referência o projeto curricular do Colégio de Pelotas6.

Provavelmente a primeira dificuldade enfrentada pelo grupo tenha sido atingir um

número suficiente de matrículas para a formação da primeira turma. Dal Lago diz que foi

necessário visitar instituições, como o Seminário Marista, para conseguir um número relativo

de alunos, que foram distribuídos em dois cursos, eletrotécnica e mecânica7. Assim, dos

quatro cursos anunciados na abertura das matrículas, somente dois foram efetivados. O

professor Zeferino da Silva, aluno da primeira turma, e o professor Fuentes, fazem a mesma

referência do professor Dal Lago sobre os vários seminaristas que integraram esse primeiro

grupo. O segundo ingresso, o de 1968, já apresentou um número maior de matriculados, o que

possibilitou a formação de duas turmas8.

Vencida a primeira dificuldade, a de compor a primeira turma, outra se apresentava: a

carência de materiais e de professores “(...) Não havia nada, absolutamente nada, só havia o

colégio com uma secretaria, com três salas de aula (...) nós não tínhamos professor para quase

nada”(Dal Lago, 2010, p. 03). Por isso, alguns profissionais práticos foram contratados, como

o Sr Armando Périco, para a área de mecânica, que disponibilizou material próprio, como

motores, para suas aulas. O professor Zeferino também lembra o primeiro ano, como um ano

difícil, pois inclusive as ferramentas para as aulas práticas eram adquiridas pelos alunos.

Isso preocupou os alunos da primeira turma, ao ponto de levá-los a contatar a Escola

Técnica de Pelotas, para cogitar a possibilidade de transferência no início do ano de 1968.

Waldemar Fuentes lembra que no início daquele ano, quando já havia se transferido para a

Escola de Pelotas, foi procurado por alguns alunos que demonstraram intenção de requerer

transferência. O Professor Zeferino recorda que “(...) ao chegar o fim do ano [1967] nós, o

grupo de alunos, falamos que se não houvesse material suficiente e consistente para que a

escola pudesse iniciar o curso com alguma qualidade, os alunos daquela turma com certeza

estavam indo buscar em março, matrícula em outra escola”(2010, p. 09). A pressão por parte

dos alunos parece ter dado resultado positivo. Ao começar o ano letivo de a1968, a direção da

escola havia conseguido material que,(...) embora fosse antigo, usado pelo terceiro exército da época, era bastante e foi possível, dentro do esforço do grupo ir selecionando itens que pudessem ser úteis para o desenvolvimento de nosso trabalho de aula prática, principalmente na área de máquinas, de geração, de instalações e alguns instrumentos de medição (SILVA, 2010, p. 10).

6 Conforme depoimento oral concedido por Waldemar Fuentes em 02/06/2010.7 Conforme os cadernos de registros de aulas dos professores, o número total de alunos matriculados nos dois cursos foi de 30.8 Turma A com registro inicial de 27 alunos, e turma B com registro inicial de 21 alunos.

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A instabilidade vivida pelos alunos era similar a da situação diretiva da escola. O

primeiro diretor, Mário Guagliotto, assumiu no início de 1967 e pediu afastamento em julho

daquele ano. Para substituí-lo foi nomeado, interinamente, o também irmão marista Giácomo

Fontana, diretor do Ginásio Hugo Taylor. O professor Zeferino da Silva lembra que Fontana

procurou administrar o CTISM de dentro do Ginásio Hugo Taylor e “(...) parece que visitou

apenas uma vez a nossa escola, não lembro tê-lo visto na escola (...) contatava com os

professores daqui [CTISM], mas não participava da vida ativa da escola”(2010, p. 06). Em

dezembro, assumiu a direção o professor Enio Cureau, que permaneceu no cargo até 19789.

Possivelmente a pressão dos alunos tenha contribuído para a troca da direção da escola e, por

conseguinte, a sua mobilização para a solução dos problemas estruturais. Vale destacar que,

ainda em 1967, os alunos da primeira turma fundaram o Grêmio Literário Estudantil do

CTISM, o qual se constituiu num instrumento representativo no sentido de “(...) discutir, com

o terceiro diretor, os problemas e as soluções necessárias ao avanço da escola”(SILVA, 2010,

p. 12).

Paralelamente ocorreu outro problema no primeiro ano de funcionamento do CTISM:

a situação do vínculo dos docentes com a Universidade e do pagamento dos seus serviços. O

Colégio havia sido instalado em abril, mas a resolução de sua criação só foi editada em

outubro de 1967. Isso porque em reunião do Conselho Universitário e como último item na

pauta de discussões do dia 11/10, foi abordada a situação de que, estando o colégio em

funcionamento, com despesas constando do orçamento da Universidade e professores

contratados, quando foi necessário empenhar as importâncias a serem pagas, o setor de

contabilidade constatou uma dificuldade: não havia como justificar o pagamento perante o

tribunal de contas, pois não havia resolução que legalizasse a instalação da escola. Por isso, o

reitor solicitava autorização do Conselho para baixar a Resolução nº 01/67, que considerava

criado o Colégio Técnico Industrial, como unidade da Universidade, a partir de março daquele

ano. Talvez esta situação tenha contribuído para motivar alguns professores a, diante de outras

oportunidades, deixar a escola, aumentando o quadro de instabilidade.

Nos primeiros anos de funcionamento, o CTISM esteve vinculado, juntamente com a

Escola Agrotécnica, ao Centro de Ciências Rurais. Em 1972, pela Portaria nº5999, foi

vinculado ao Centro de Tecnologia, ao qual permaneceu ligado até 1983.

A primeira turma, iniciada com trinta alunos, formou 20 técnicos, 08 em

eletrotécnica e 12 em mecânica. Em função do número reduzido de docentes e de alunos e

9 Revista O Quero-Quero. Santa Maria, UFSM, ano IX, nº 33, p. 05/06.

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pelas dificuldades estruturais, no primeiro ano os alunos foram divididos por cursos somente

nas disciplinas específicas das áreas técnicas, sendo as disciplinas básicas do ensino médio,

ministradas coletivamente. Em 1968, com o ingresso de um número maior de alunos, foi

possível a constituição de turmas diferenciadas por cursos.

A organização curricular das primeiras turmas indica a identificação pedagógica que

a escola assumia nessa primeira fase, isto é, ensino tecnicista, voltado para a instrução do

aluno e sua adequação ao mundo do trabalho como operário. A distribuição dos conteúdos

entre as disciplinas básicas e técnicas não seguia um critério proporcional, pois para as

primeiras, era reservado um tempo maior à área das ciências exatas, em detrimento das

ciências humanas Essa área era representada pelas disciplinas de História (60 h/a ministradas

no 1º ano) e de Relações Humanas (60 h/a no 3º ano), não sendo ofertadas para as duas

primeiras turmas, Geografia, Filosofia e Sociologia. Para a 2º turma foram ministradas, no 3º

ano, as disciplinas de Educação Moral e Cívica (40 h/a) e Educação Física (90 h/a), além de

Ensino Religioso sob a forma de atividades. A disciplina de Prática Profissional, com maior

quantidade de horas-aula em relação às demais, era ministrada durante os três anos de curso.

O registro dos conteúdos trabalhados em História indica o estudo de um processo

histórico linear, que enfatizava o desenvolvimento industrial e tecnológico em nível mundial e

nacional, sem referências às questões sociais. As avaliações, de caráter quantitativo, eram

feitas mensalmente e, ao final do ano letivo o aluno, para ser considerado aprovado, deveria

alcançar nota 7, com freqüência de 75%.

A falta de algumas disciplinas de formação básica se explica tanto pela inclusão, na

base curricular, de disciplinas técnicas, quanto pela direção tecnicista exigida para a formação

operária. Isso acabou dificultando o ingresso dos alunos nos cursos superiores. O Professor

Vizzotto lembra que o objetivo primeiro da instalação do CTISM foi a formação rápida de

mão de obra:O Doutor Mariano na época viajava muito para a Alemanha e a Alemanha teve sempre uma concepção de empresa. Então, lá não existem grandes escolas técnicas, existem “fábricas escolas” (...) e ele queria que a escola [CTISM] funcionasse assim (...) para que os alunos não fizessem vestibular e fossem direto para o mercado de trabalho.(2010, p. 08).

Mesmo que parte significativa dos alunos das primeiras turmas tenha alcançado o

ensino superior, buscando sanar as deficiências deixadas pelas disciplinas não contempladas

pela base curricular, através de estudos paralelos, esse não era o objetivo da escola. As

atividades desenvolvidas com os primeiros alunos estiveram voltadas, prioritariamente, para a

formação profissional.

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Conclusão:

A criação de uma escola de instrução técnico-industrial vinculada a Universidade

Federal de Santa Maria assumia, assim, em uma área estrategicamente localizada no centro

Estado mais meridional do país, uma dupla função: instruir trabalhadores adequados às

necessidades do mercado e orientá-los a viverem privados da participação política.

Mesmo que determinados governos, em épocas diferentes, tenham priorizado ou não

o ensino profissionalizante, a distância entre as áreas propedêutica e técnica, que embasam os

currículos dos cursos técnicos, não deixou de existir. Isso decorre do fato de a escola não ser

uma categoria neutra inserida em um corpo social. Antes, ela reflete as diferenças de

concepções culturais, políticas e econômicas que o corpo ao qual corresponde, foi

determinado ao longo de seu processo histórico.

Em função desse reflexo, o CTISM produziu identificações relativas às experiências

vividas ao longo de seus 43 anos, as quais o levaram a apresentar-se à comunidade como um

espaço de profissionalização técnica de nível médio. Essa identificação teve início antes

mesmo da implantação da escola e orientou o trabalho do grupo pioneiro no sentido de

produzir elementos que norteassem as diferenças apresentadas na relação com os demais

profissionais formados pela Universidade.

Referências Bibliográficas:

ALVES, Márcio Moreira. O Beabá dos MEC/USAID. Rio de Janeiro: Gernasa, 1968.

DREIFUSS, René Armand. 1964: A Conquista do Estado. Petrópolis: Vozes, 1981.

HALL, Stuart Hall. Quem Precisa da Identidade? In: SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.).

Identidade e Diferença. Petrópolis: Vozes, 2005.

ISAIA, Luiz Gonzaga. UFSM Memórias. Santa Maria: Palotti, 2006.

LE GOFF, Jacques. História e Memória. Campinas: Ed Unicamp, 2003.

MÜLLER, Meire Terezinha. A Lousa e o Torno – o SENAI e a Educação

Profissionalizante. Disponível em www.histedbr.fae.unicamp.br, capturado em 20/01/10.

PINA, Fabiana. A Universidade e o Mundo do Trabalho. Disponível em

w ww.ifch.unicamp.br , capturado em 22/03/10.

SAVIANI, Dermeval. História das idéias pedagógicas no Brasil. Campinas: Autores

Associados, 2007.

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Referências Documentais:

AITA, SANTOS e RAMOS. Parecer da Comissão para Instalação do Colégio Industrial.

02/02/1965. Arquivo Histórico da UFSM.

ROCHA, Mariano da. Correspondências – Arquivo Histórico da UFSM

Jornal A Razão – exemplares de 10/1966 a 05/1967. Arquivo Público de Santa Maria.

Depoimento escrito concedido por Osvaldo Dal Lago em 21/07/2010.

Depoimento oral concedido por Waldemar Fuentes em 02/06/2010.

Depoimento oral concedido por Zeferino Gilberto da Silva, em 11/05/2010

Depoimento oral concedido por João Paulo Vizzoto, em 19/04/2010.

Revista O Quero-Quero. Santa Maria, UFSM, ano IX, nº 33, p. 05/06.

Diários de Classe. Secretaria do Colégio Técnico Industrial de Santa Maria.

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