o processo administrativo fiscal - josehable.adv.br · e no paf, faz mais sentido ainda entender...

21
1 O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL ASPECTOS POLÊMICOS E RELEVANTES José Hable 1 INTRODUÇÃO O processo administrativo nasceu com o estado de direito, onde as garantias individuais se constituem em direitos fundamentais. Tem ele como ponto de partida a Constituição Federal de 1988 (CF/88), que consagrou de forma explícita o princípio do devido processo legal, em seu art. 5º, LV, ao estabelecer que são assegurados o contraditório e ampla defesa aos litigantes e aos acusados em geral, em processo administrativo. Assim, o Processo Administrativo Fiscal (PAF) encontra o seu fundamento na CF/88 e legislações infraconstitucionais (CTN e legislação específica de cada ente). Relevante informar que está em discussão no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar PLP 381/2014 (Origem: PLS 222/2013), que estabelece normas gerais sobre o PAF no âmbito das administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Desse modo, todo contribuinte tem direito de defender-se, caso seja autuado pela fiscalização tributária, sem necessariamente ter que recorrer ao órgão judiciário, podendo fazê-lo de forma administrativa, ou seja, junto às próprias repartições fiscalizadoras. O PAF instaura-se no exato momento em que o lançamento tributário é impugnado pelo sujeito passivo, e nesse instante, altera-se a natureza jurídica da relação, passando de procedimento para processo, amparado em princípios processuais, que fixam regras e garantias. 2 Neste trabalho, serão discutidos alguns pontos de relevância no PAF, relacionados principalmente aos seus prazos, competências e procedimentos previstos nas legislações tributárias, que geram polêmica e controvérsia na doutrina e jurisprudência de nossos tribunais, como os prazos de decadência e prescrição, o controle de constitucionalidade pela Administração, a coisa julgada administrativa, a reversão de decisão administrativa desfavorável ao Fisco pela Justiça e o oferecimento de denúncia pelo Ministério público (MP) antes do término do PAF, entre outros. 1 JOSÉ HABLE, Auditor Fiscal da Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal. Conselheiro e Presidente do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais. Mestre em DIREITO INTERNACIONAL ECONÔMICO. Pós-graduado em DIREITO TRIBUTÁRIO. Graduado em DIREITO, ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS e AGRONOMIA. Professor de pós-graduação e graduação. Autor de livros. 2 MARINS, James. Processual tributário brasileiro, Dialética, 2003, p. 28.

Upload: buidien

Post on 10-Nov-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

1

O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL ASPECTOS POLÊMICOS E RELEVANTES

José Hable1

INTRODUÇÃO

O processo administrativo nasceu com o estado de direito, onde as garantias

individuais se constituem em direitos fundamentais. Tem ele como ponto de partida a

Constituição Federal de 1988 (CF/88), que consagrou de forma explícita o princípio do

devido processo legal, em seu art. 5º, LV, ao estabelecer que são assegurados o contraditório e

ampla defesa aos litigantes e aos acusados em geral, em processo administrativo.

Assim, o Processo Administrativo Fiscal (PAF) encontra o seu fundamento na

CF/88 e legislações infraconstitucionais (CTN e legislação específica de cada ente). Relevante

informar que está em discussão no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar PLP

381/2014 (Origem: PLS 222/2013), que estabelece normas gerais sobre o PAF no âmbito das

administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Desse modo, todo contribuinte tem direito de defender-se, caso seja autuado pela

fiscalização tributária, sem necessariamente ter que recorrer ao órgão judiciário, podendo

fazê-lo de forma administrativa, ou seja, junto às próprias repartições fiscalizadoras.

O PAF instaura-se no exato momento em que o lançamento tributário é impugnado

pelo sujeito passivo, e nesse instante, altera-se a natureza jurídica da relação, passando de

procedimento para processo, amparado em princípios processuais, que fixam regras e

garantias.2

Neste trabalho, serão discutidos alguns pontos de relevância no PAF, relacionados

principalmente aos seus prazos, competências e procedimentos previstos nas legislações

tributárias, que geram polêmica e controvérsia na doutrina e jurisprudência de nossos

tribunais, como os prazos de decadência e prescrição, o controle de constitucionalidade pela

Administração, a coisa julgada administrativa, a reversão de decisão administrativa

desfavorável ao Fisco pela Justiça e o oferecimento de denúncia pelo Ministério público (MP)

antes do término do PAF, entre outros.

1JOSÉ HABLE, Auditor Fiscal da Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal. Conselheiro e

Presidente do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais. Mestre em DIREITO INTERNACIONAL

ECONÔMICO. Pós-graduado em DIREITO TRIBUTÁRIO. Graduado em DIREITO, ADMINISTRAÇÃO

DE EMPRESAS e AGRONOMIA. Professor de pós-graduação e graduação. Autor de livros. 2 MARINS, James. Processual tributário brasileiro, Dialética, 2003, p. 28.

Page 2: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

2

Para isso, busca-se responder aos seguintes questionamentos:

1. É procedimento ou processo administrativo fiscal?

2. O duplo grau de jurisdição é uma garantia constitucional?

3. Qual o momento em que poderá ocorrer a decadência ou a prescrição tributária

no PAF?

4. Caso não ocorra o pagamento de tributo declarado, para sua exigência correrá

qual prazo extintivo?

5. Há causas impeditivas do prazo prescricional?

6. Com a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, pela interposição da

impugnação, ocorre também a suspensão da prescrição?

7. Há prescrição intercorrente no PAF?

8. Há prazos para a conclusão do PAF?

9. O que ocorre com o recurso interposto fora do prazo legal?

10. Há renúncia ou desistência ao direito de recorrer no PAF?

11. Há PAF nos impostos sujeitos ao lançamento por homologação?

12. Pode a autoridade julgadora, no PAF, apreciar matéria de constitucionalidade?

13. Há coisa julgada administrativa no PAF?

14. A Administração pode ingressar na Justiça para reverter decisão administrativa

desfavorável ao Fisco?

15. No PAF, em que momento o MP pode oferecer a denúncia criminal de exigência

fiscal?

2. O PR0CESSO ADMINISTRATIVO FISCAL

A primeira indagação que surge , quando se vai estudar o PAF, é sobre a própria

expressão: procedimento ou processo administrativo? Não obstante a divergência doutrinária,3

tem-se o entendimento que o procedimento administrativo fiscal se refere a todos os

procedimentos administrativos relativos à apuração dos tributos, antes da impugnação pelo

sujeito passivo. O processo administrativo fiscal, por sua vez, instaura-se no exato momento

3 JUSTEN Filho, Marçal. Considerações sobre o “Processo Administrativo Fiscal”, in Revista

Dialética de Direito Tributário nº 33/108 a 115.

Page 3: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

3

em que o lançamento tributário é impugnado pelo sujeito passivo e o processo judicial fiscal é

aquele que se desenvolve perante o Poder Judiciário.4

Assim, trata-se de Processo administrativo Fiscal, que é uma sucessão itinerária e

encadeada de atos administrativos que tendem, todos, a um resultado final e conclusivo.5 Seu

objeto é, por excelência, o lançamento tributário, vocábulo que apresenta duas acepções:

procedimento e ato administrativo, como definido no art. 142 do CTN.6

Relevante colocar inicialmente algumas peculiaridades e especificidades do PAF.

A doutrina7 apregoa que, não obstante inexista texto expresso na CF/88 sobre o

duplo grau de jurisdição, ele estaria ínsito no sistema constitucional brasileiro, sendo,

portanto, uma construção doutrinária, a fim de melhor garantir a essência do due process of

law. Contudo, apesar da ampla construção doutrinária sobre o duplo grau de jurisdição, veio o

Supremo Tribunal Federal (STF), em várias oportunidades, posicionar-se no sentido de que

não se insere, na Carta de 1988, a garantia do duplo grau de jurisdição administrativa.8

Assim, regra geral, pode-se afirmar que a CF/88 prestigia o duplo grau de jurisdição

como um princípio, pois a ele apenas se refere, e não como uma garantia.9

E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma

garantia constitucional, porquanto suas características e regras informadoras apenas podem

comportar como um princípio, e ainda quando assim a lei do ente tributante dispuser.

Isso porque, o sistema administrativo adotado pelo Brasil é o Sistema Inglês,

denominado também de sistema de jurisdição única, em que todos os litígios, administrativos

ou não, podem ser dirimidos pelo Poder Judiciário, e assim todo ato administrativo pode ser

revisto pela Justiça.10

4 CASSIONE, Vittorio, Maria Eugenia Teixeira Cassone. Processo tributário: teoria e pratica, 6ª ed.

– São Paulo: Atlas, 2005, p. 24. 5 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. Malheiros, São Paulo,

1998, 10 ed. pp. 315 a 318. 6 BRASIL. CTN, “Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito

tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do

fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido,

identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.” 7 MARQUES, José Frederico, Instituição de direito processual civil, v. IV, p. 210, 1958-1960. apud

Barbosa Moreira, Comentários ao código de processo civil, 2ª ed., v. V, nº 257, p. 458-9. 8 STF- RE 169077/MG, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI, Diário da Justiça, 27-03-98, PP-00018

EMENT VOL-01904-03 PP-00556; STF- RE 311023 / RJ, Rel. Min. MOREIRA ALVES, Diário da Justiça, 26-

10-01, PP-00063 EMENT VOL-02049-05 PP-00961. 9 DINAMARCO, Cândido Rangel. “Os efeitos dos Recursos”. Aspectos polêmicos e atuais dos recursos

cíveis, v. 5. Nelson Nery Jr. e Teresa arruda Alvim Wambier (coords.). São Paulo: RT, 2002. 10 Diferentemente do Sistema Francês, também chamado de contencioso administrativo, em que há uma

vedação de conhecimento pelo Poder Judiciário de atos da Administração Pública, que são dirimidos no seio da

própria Administração Pública.

Page 4: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

4

Somado a isso, no PAF têm-se vários princípios como da celeridade na solução das

demandas administrativas, juntamente com a garantia constitucional da razoável duração do

processo, bem como o da informalidade, que em contraposição ao judicial, autoriza que seus

atos e termos processuais, quando a lei não prescrever forma determinada, contenham

somente o indispensável à sua finalidade, não se atendo a rigorismos formais, e sim a “formas

simples, suficientes para propiciar maior grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos

administrados”.11

A obrigação tributária é uma obrigação ex lege, ou seja, o tributo somente é devido

se estiver em lei, com fulcro no princípio da legalidade (CF/88, art. 150, I). Dessa forma, a

Fazenda Pública, quando da análise de qualquer pleito tributário, deve utilizar-se de todos os

meios e provas disponíveis, verificando se a obrigação tributária realmente existiu, em busca

da verdade dos fatos, em homenagem ao princípio da verdade material, diferentemente do

processo judicial que presa pela verdade formal. Assim, a Administração não pode agir

baseada apenas em presunções e alegações, e se contentar com a verdade formal constante do

processo, mas perseguir a verdade substancial, sob pena de estar-se apropriando de algo que

não lhe pertence, em clarividente violação ao princípio da legalidade.12

E por fim, deve a própria Administração agir de ofício, para instaurar, impulsionar e

concluir o PAF, sem precisar da interferência do administrado, segundo o princípio da

oficialidade, sempre buscando respeitar os prazos regulamentares.

2.1 Os Prazos no Processo Administrativo Fiscal

Prazos são estipulados e uma de suas funções é facilitar à Administração o controle

e organização dos procedimentos administrativos, evitando-se abusos e arbitrariedades contra

o administrado, na busca de uma maior eficiência administrativa, assegurada na CF/88, em

seu art. 37, como princípio.

11 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 26ª ed. 2009, apud Soares

de Melo, 2012, p. 72. 12 HABLE, José. Pagamento indevido e restituição tributária. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1664,

21 jan. 2008. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/10868>. Acesso em: 22 maio 2014.

Page 5: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

5

O CTN determina que sejam lavrados termos que documentem o início do

procedimento fiscal e fixem prazo máximo para a conclusão das diligências.13 E assim, dá-se

o início do procedimento fiscal com qualquer procedimento administrativo ou medida de

fiscalização, relacionados com a infração,14 excluindo a partir de então a denúncia espontânea

do sujeito passivo.

2.1.1 Os prazos de decadência e de prescrição tributária

No CTN, o instituto da decadência vem disciplinado no seu art. 173 e o da

prescrição está regrado no seu art. 174, estando definidos, no art. 156, V, do mesmo diploma

legal, como modalidades de extinção do crédito tributário.

No Direito Tributário, há um evento marcante e significativo, denominado ato de

lançamento, que irá separar, de forma nítida, os prazos de decadência e de prescrição.

A decadência tributária somente ocorre antes do lançamento tributário, ou seja, se

não houver o lançamento no prazo determinado em lei. Realizado o lançamento tributário no

prazo legal, não há mais se falar em decadência. Já a prescrição tributária ocorre quando o

Estado deixa de promover a cobrança do crédito tributário, no prazo de cinco anos contados

da constituição definitiva do crédito tributário.15

Assim, entre o lançamento tributário efetuado e contestado (impugnado) e até que

ocorra a decisão final do contencioso administrativo, independentemente do período

transcorrido, não há qualquer modalidade de extinção de crédito tributário pelo decurso do

prazo, nem decadência, nem prescrição. Isso porque, com a constituição do crédito tributário,

pelo lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo, cessa a inércia do Fisco, não se

falando mais em decadência e o prazo de prescrição apenas tem seu início com a constituição

definitiva do crédito tributário, isto é, com o trânsito em julgado administrativo (decisão final

do contencioso administrativo).16

Enfatize-se então que: (i) o ato de lançamento, no Direito Tributário, é um marco,

onde, antes dele somente ocorre a decadência, e, depois dele, apenas a prescrição; e, (ii) em

ocorrendo o pagamento do crédito tributário, ou a decadência pelo não lançamento, que são

13 BRASIL. CTN. Art. 196. 14 BRASIL. CTN. “Art. 138. Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após

o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração.” 15 HABLE, José. O que você deve saber sobre os institutos da decadência e da prescrição tributária. Jus

Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1849, 24 jul. 2008. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/11523>. Acesso

em: 22 maio 2014. 16 HABLE, Jose. Extinção do Crédito Tributário por Decurso de Prazo. Decadência e Prescrição

Tributárias, São Paulo: Editora Método, 4ª ed., 2014, p. 74.

Page 6: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

6

modalidades de extinção do crédito tributário (CTN, art. 156, I e V, respectivamente), não faz

qualquer sentido falar-se em prazo de prescrição.

No modelo de lançamento por homologação, em que o contribuinte realiza todos os

procedimentos de lançamento descritos no art. 142, do CTN, tratando das atividades

realizadas pelo sujeito passivo, duas delas se sobressaem:

(a) a realização do pagamento antecipado, por meio do qual ocorre a extinção do

crédito tributário (CTN, art. 156, I); e,

(b) a entrega da declaração do tributo devido, que, quando não pago, constitui

confissão de dívida, tornando-o exigível, segundo rezam diversas legislações tributárias17 e a

jurisprudência de nossos tribunais.18

Assim, quando o sujeito passivo entrega a declaração de tributo sujeito ao

lançamento por homologação, o Fisco, ao recebê-la, física ou virtualmente por sistema

computadorizado, toma conhecimento das atividades exercidas pelo obrigado, nos termos do

caput do art. 150 do CTN. Nesse instante, então, homologando-as, está a se configurar o

lançamento tributário, momento em que ocorre a constituição definitiva do crédito

tributário.19

E, caso não ocorra o pagamento do tributo declarado, no prazo estabelecido na

legislação pertinente, inicia-se o prazo prescricional para a ação de cobrança, nos termos do

art. 174 do CTN. Em outras palavras, com a entrega da declaração não há necessidade de

constituição formal do débito pelo Fisco, e ainda, com a aceitação da declaração pelo Fisco,

há a constituição do crédito tributário, sendo instrumento hábil e suficiente para a exigência

do referido crédito, conforme determina o Decreto-Lei nº 2.124/1984, art. 5º, caput e § 1º.20

17 No mesmo sentido, SÃO PAULO. Lei nº 6.374, de 1º de março de 1989. Dispõe sobre a instituição

do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte

Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS. Ver arts. 57 e 62. Disponível em:

http://www.fazenda.sp.gov.br Acesso em: 12 abr. 2014, entre outras. 18 BRASIL. STJ. AgRg no Ag 748560/RS, Rel. Min. José Delgado, 1ª T, data da decisão: 01/06/2006,

DJ 26.06.2006, p. 121. No mesmo sentido, REsp 673585/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, 1ª Seção, data de

julgamento 26/04/2006, DJ 05.06.2006, p. 238; entre outros. Disponível em: http://www. stj.jus.br. Acesso em:

20 abr. 2014, entre outros. 19 BRASIL. STJ. Sumula 436. “A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal

constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco.”. 1ª Seção. Data do

Julgamento: 14/04/2010. Data da Publicação: DJe 13/05/2010. RSTJ vol. 218 p. 704. Disponível em:

http://www. stj.jus.br Acesso em: 20 abr. 2014. 20 UNIÃO. Decreto-lei nº 2.124, de 13 de junho de 1984. “Art. 5º (...) § 1º O documento que formalizar

o cumprimento de obrigação acessória, comunicando a existência de crédito tributário, constituirá confissão de

dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência do referido crédito.” Disponível em:

http://www6.senado.gov.br/sicon/ExecutaPesquisaBasica.action . Acesso em: 12 abr. 2014.

Page 7: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

7

O CTN tratou de forma expressa somente das causas de interrupção do prazo

prescricional (CTN, art. 174, parágrafo único). Porém, cabem também causas de impedimento

do prazo de prescrição. Para que se inicie o prazo prescricional tributário, além de estar o

crédito tributário constituído definitivamente e de haver a violação de um direito, o titular do

direito não pode estar impedido de atuar, porquanto a prescrição não corre contra quem não

pode agir (agere non valenti non currit praescriptio).

Isso vem a demonstrar, então, que em determinadas situações, mesmo já constituído

definitivamente o crédito tributário e tendo havido a violação do direito, pode não ocorrer o

início do prazo prescricional, simplesmente por estar o titular do direito impedido de agir.

É o que acontece, por exemplo, quando, a critério do órgão competente para instituir

o tributo, concede-se, por norma legal, um lapso de tempo de 30 (trinta) dias, ou mais, da

decisão administrativa definitiva desfavorável ao contribuinte, para que ele efetue o

pagamento do tributo.21

Desse modo, no âmbito tributário, para que se inicie o prazo prescricional é

imprescindível que, além de estar o crédito tributário constituído definitivamente, haja o

descumprimento do dever de satisfazer a obrigação, pois, antes dessa lesão, ainda não existe o

interesse processual de o Estado propor a ação de cobrança, e que não esteja o titular do

direito impedido de agir, descabendo assim uma interpretação literal do caput do art. 174 do

CTN, que disciplina iniciar o prazo a contar da constituição definitiva do crédito tributário. A

jurisprudência do STJ já se manifestou nesse sentido no Resp nº 717.934-SC.22

O CTN silencia também no que se refere às causas de suspensão do prazo

prescricional,23 tratando apenas das modalidades de suspensão da exigibilidade do crédito

tributário (CTN, art. 151), o que, para alguns doutrinadores e jurisprudência de nossos

tribunais,24 seriam também causas de suspensão do prazo de prescrição.

21 HABLE, Jose. Extinção do Crédito Tributário por Decurso de Prazo. Decadência e Prescrição

Tributárias, São Paulo: Editora Método, 4ª ed., 2014, p. 128. 22 BRASIL. STJ. REsp 717934-SC, Rel. Min. Denise Arruda, 1ª T, data da decisão: 10/06/2009 e REsp

1070644, Rel. Min. DENISE ARRUDA, 1ª T, data da decisão: 04/02/2010, entre outros. Disponível em:

http://www.stj.jus.br. Acesso em: 20 abr. 2014. 23 Exceção feita aos dizeres do art. 155, I e parágrafo único, do CTN: “Art. 155. A concessão da

moratória em caráter individual não gera direito adquirido e será revogado de ofício, (...), cobrando-se o crédito

acrescido de juros de mora: I - com imposição da penalidade cabível, nos casos de dolo ou simulação do

beneficiado, ou de terceiro em benefício daquele; (...) Parágrafo único. No caso do inciso I deste artigo, o tempo

decorrido entre a concessão da moratória e sua revogação não se computa para efeito da prescrição do

direito à cobrança do crédito; (...).” (grifamos) 24 Nesse sentido: FANUCCHI, Fábio. A decadência e a prescrição em direito tributário. 2 ed. São

Paulo: Resenha Tributária, 1971, pp. 133-134 e MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de direito

tributário. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2v., 1997, p. 476. No STJ, REsp 267437/MG, Rel. Min. Eliana

Calmon. 2ª T, DJ 17/6/2002, entre outros. Disponível em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 20 abr. 2014.

Page 8: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

8

Destaque-se que a suspensão disciplinada no art. 151 do CTN é da exigibilidade do

crédito tributário, e não do prazo de prescrição, pois, antes da constituição definitiva do

crédito tributário, não é ele ainda passível de ser cobrado, não podendo assim ser suspenso um

prazo que ainda não se iniciou.25

Desse modo, pode-se afirmar que decadência tributária só ocorre quando da

realização dos procedimentos administrativos fiscais, isto é, refere-se ao ato de constituir o

crédito tributário. No PAF não há prazo extintivo, nem decadencial nem prescricional, e a

prescrição tributária apenas inicia-se com o término do PAF, ou seja, com a constituição

definitiva do credito tributário.

2.1.2 A razoável duração do PAF e a prescrição intercorrente

A CF/88, em seu art. 5º, LXXVIII,26 introduziu, como garantia fundamental a

razoável duração dos processos, tanto na esfera judicial quanto na administrativa. É de se

notar que praticamente toda legislação tributária que trata de processo administrativo vem

definindo prazos para a realização e conclusão dos atos processuais.27

A demora na tramitação dos processos administrativos é uma realidade recorrente. E

assim, quando a Administração Fazendária deixa de atuar em um processo, por mais de cinco

anos de sua entrada no órgão incumbido de julgá-lo, há quem queira invocar a extinção do

crédito tributário pela demora na solução do contencioso fiscal, arguindo a prescrição

intercorrente,28 em analogia ao que dispõe o art. 267, II, do CPC.29

25 HABLE, Jose. Extinção do Crédito Tributário por Decurso de Prazo. Decadência e Prescrição

Tributárias, São Paulo: Editora Método, 4ª ed., 2014, p. 138. 26 BRASIL. CF/88. Art. 5º (...) LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são

assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (grifos

não do original) 27 Nesse sentido, na via administrativa tributária, podemos citar o Decreto nº 70.235, de 1972, que

determina, no seu art. 4º, por exemplo, que o servidor executará os atos processuais no prazo de oito dias. No

mesmo sentido, vem disciplinando a Lei nº 9.784, de 1999, ao tratar do dever de decidir, estabelecendo um

prazo máximo de 30 dias para assim proceder. 28 Prescrição intercorrente é a perda da pretensão de atuar ou agir no processo, em virtude da inércia de

seu titular, ao deixar de praticar os atos processuais necessários ao seu andamento, durante certo lapso de tempo. 29 BRASIL. CPC. “Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: (...) Il - quando ficar

parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das partes;”

Page 9: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

9

Contudo, a prescrição intercorrente no PAF ainda não é aceita na jurisprudência de

nossos tribunais, por ausência de previsão legal,30 onde o STJ31 já decidiu não acolher a

prescrição intercorrente no PAF pois “a demora na tramitação do processo-administrativo

fiscal não implica a ‘perempção’ do direito de constituir definitivamente o crédito tributário,

instituto não previsto no Código Tributário Nacional.”

A celeridade na tramitação e solução das demandas administrativas é almejada por

toda a sociedade, e em homenagem ao princípio da eficiência administrativa, previsto na

CF/88, foi publicada a Lei nº 11.457, de 2007,32 tornando obrigatório o julgamento dos

recursos administrativos no prazo máximo de 360 dias.

Tendo em vista que não há previsão de penalidades pelo descumprimento desse

prazo, esse dispositivo legal está apenas a oferecer fundamento jurídico para se buscar e obter

a intervenção judicial, na solução concreta de um caso específico, reconhecendo o direito

subjetivo do administrado, no sentido de estabelecer prazos para que a Administração aprecie

e decida os recursos administrativos do contribuinte dentro de um "prazo razoável".33

2.1.3. O recurso intempestivo no PAF

Quando o prazo se expira ocorre o que se denomina preclusão, no sentido de não

poder ser analisado o requerimento. Ora, quem perde prazo definido em lei deixa de ter o

direito de ver examinada a matéria substantiva, assim como ocorre a extinção do direito pela

caducidade, pelo não-cumprimento de um dos requisitos definidos na lei.

Não obstante a impugnação seja extemporânea, há doutrinadores34 que sustentam

caber à autoridade administrativa conhecê-la quando a reclamação aponte alguma ilegalidade

30 O acolhimento da prescrição intercorrente pelo Poder Judiciário está limitado à fase do processo

judicial de execução fiscal, e não no processo administrativo fiscal, conforme o REsp nº 74040/RS, Rel. Min

Humberto Gomes de Barros, 1ª T, Data do Julgamento 13/12/1995, DJ 11.03.1996 p. 6579. Disponível em:

http://www.stj.jus.br. Acesso em: 24 abr. 2014. 31 BRASIL. STJ. REsp nº 53467/SP, Rel. Min. Ari Pargendler, 2ª T, Data do Julgamento 05.09.1996,

DJ 30.09.1996 p. 36613. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 24 fev. 2014. 32 UNIÃO. Lei 11.457, de 16 de março de 2007. “Art. 24. É OBRIGATÓRIO que seja proferida

decisão administrativa no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo de petições,

defesas ou recursos administrativos do contribuinte.” (grifos não do original). Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br Acesso em: 20 maio 2014. 33 HABLE, José. A razoável duração do processo no âmbito judicial e administrativo. Jus Navigandi,

Teresina, ano 14, n. 2100, 1 abr. 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/12560>. Acesso em: 23 maio

2014. 34 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 16ª edição, São Paulo: Malheiros,

1991, p. 572, entre outros.

Page 10: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

10

ou erro na conduta administrativa, e desde que se convença da procedência da reclamação e

não haja ocorrido a prescrição da ação judicial cabível.35

Outro fato relevante, quando ocorre a intempestividade recursal, está na natureza da

obrigação tributária, pautada no princípio da legalidade. Nesse sentido, é de fundamental

importância que a Fazenda Pública analise se houve erro material na autuação, verificando se

a obrigação tributária verdadeiramente existiu, ou se houve algum vício de legalidade na sua

constituição.

Assim, em sendo impugnado intempestivamente o lançamento tributário pelo

contribuinte, ou apresentado após o trânsito em julgado administrativo, o presente pedido

deve ser recebido e analisado, não como um recurso, mas sim como uma revisão de ato

administrativo, a pedido, porquanto “o não conhecimento do recurso não impede a

Administração de rever de ofício o ato ilegal,” quando interposto fora do prazo, nos termos do

art. 63, § 2º da Lei nº 9.784/99. Relevante afirmar que a análise se restringirá a vícios de

legalidade não se adentrando ao mérito.36

2.2. O contencioso tributário no PAF

As exigências, contidas nos autos de infração (AI) ou documentos equivalentes,

podem ser impugnadas administrativamente pelos contribuintes ou responsáveis, segundo o

que prescrevem as legislações tributárias dos entes tributantes, que regulam o PAF.

Na União, por exemplo, é o Decreto nº 70.235/1972, que dispõe sobre o PAF

federal, podendo-se citar ainda a Lei nº 9.784/1999, que regula o processo administrativo no

âmbito da Administração Pública Federal. No Distrito Federal, por sua vez, o PAF,

contencioso e voluntário, é disciplinado pela Lei nº 4.567/2011. Já no Estado de São Paulo, é

a Lei nº 13.457/2009 que vem dispondo sobre o processo administrativo tributário decorrente

de lançamento de ofício, e no Município de São Paulo, é a Lei nº 14.107/2005 que dispõe

sobre o PAF e cria o Conselho Municipal de Tributos, entre outros.

Importante frisar que o processo administrativo existe justamente para facultar ao

administrado o exercício do contraditório e da ampla defesa, bem como para a própria

35 Tem-se ainda a Lei nº 9.784, de 1999, em seu art. 65, disciplinando que os processos administrativos

poderão ser revistos, a qualquer tempo, a pedido ou de ofício, quando surgirem fatos novos ou circunstâncias

relevantes (grifamos). 36 Ver artigo disponível em: HABLE, José. O recurso intempestivo no processo administrativo fiscal .

Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1626, 14 dez. 2007. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10758>. Acesso em: 28 abr. 2014.

Page 11: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

11

Administração sanar ou corrigir eventual ilegalidade ou irregularidade do ato por ela

praticado.37

A etapa contenciosa (processual) caracteriza-se pelo aparecimento formalizado do

conflito de interesses, isto é, transmuda-se a atividade administrativa de procedimento para o

processo no momento em que o contribuinte registra seu inconformismo com o ato praticado

pela Administração.38

Deve-se colocar, no entanto, que só há PAF de jurisdição contenciosa, ou seja,

somente existe contencioso administrativo fiscal se houver impugnação decorrente de

lançamento de ofício, momento em que se suspende a exigibilidade do crédito tributário

(CTN, art. 151, III).

Porém, se o contribuinte autuado efetuar pedido de parcelamento ou pagamento da

exigência fiscal constante do AI, ou ainda, propor ação judicial sobre o mesmo objeto do AI,

estará caracterizada a renúncia ao seu direito de recorrer ou sua desistência, caso já tenha

interposto o recurso na esfera administrativa.39

Por outro lado, não há PAF contencioso para os impostos sujeitos ao lançamento por

homologação, a exemplo do ICMS ou ISS, em que haja exigência de crédito tributário

decorrente de imposto declarado, em guias de informação ou por escrituração fiscal

eletrônica, e que deixe de ser recolhido no prazo regulamentar, ou recolhido a menor (Lei

4.567/2011, art. 53). Nesses casos, em não havendo o pagamento do imposto que foi

declarado, a autoridade competente providenciará, no prazo legal, a inscrição desse crédito

tributário em dívida ativa.40

Relevante registrar ainda que na análise do processo, a autoridade julgadora deve

formular seu julgamento plenamente vinculado à legislação tributária, e se restringir à matéria

impugnada, nos termos da lei distrital (Lei 4.567/11, art. 43, § 2º).

Essa restrição legal pode estar indo de encontro ao princípio da legalidade,

porquanto, em se verificando alguma ilegalidade ou irregularidade na exigência fiscal, é dever

do agente corrigir de ofício, mesmo que não seja objeto de impugnação, sob pena de estar o

Fisco se apropriando de algo que não lhe pertence.

37 MEIRELLES, Hely Lopes. Obra citada, p. 576. 38 MARINS, James. Obra citada, p. 166. 39 UNIÃO. Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, art. 38, parágrafo único. Dispõe sobre a cobrança

judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública. 40 UNIÃO. Decreto-Lei nº 2.124, de 13 de junho de 1984. “Art 5º (...) § 2º Não pago no prazo

estabelecido pela legislação o crédito, corrigido monetariamente e acrescido da multa de vinte por cento e dos

juros de mora devidos, poderá ser imediatamente inscrito em dívida ativa, para efeito de cobrança executiva,

observado o disposto no § 2º do artigo 7º do Decreto-lei nº 2.065, de 26 de outubro de 1983. (grifos não do

original).

Page 12: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

12

2.2.1 O controle de constitucionalidade no PAF pela Administração

Disciplina a legislação processual tributária que na competência de julgamento

exclui-se a apreciação quanto à constitucionalidade das normas.41 Nessa situação, coloca-se a

questão relacionada à recusa do agente em cumprir ou não lei que se considere

inconstitucional.

Alguns doutrinadores entendem que somente o Chefe do Poder Executivo poderia

exercer essa recusa, não podendo seus subordinados deixar de cumpri-la por julgá-la

inconstitucional. Outros, no entanto, por ser a Constituição uma lei, deve ser obedecida, e o

órgão subordinado não só pode, mas deve recusar-se a aplicar lei inconstitucional.42

Em realidade, o servidor deve cumprir norma vigente, pois enquanto está em

vigência está no mundo jurídico, não se podendo admitir que cada agente ou setor da

administração venha a se manifestar quanto à validade de uma norma, sob o evidente risco de

ingerência administrativa, entre outros. Cabe sim o agente justificar o seu entendimento, com

representação ao seu superior quanto ao vício de inconstitucionalidade como de ilegalidade. E

nesse sentido, compete ao chefe do Poder Executivo, nos termos da lei, julgar a conveniência

e oportunidade de revogar a alegada lei inconstitucional, ou questioná-la junto ao Poder

Judiciário.

O Projeto de Lei Complementar PLP 381/2014,43 versão aprovada no Senado

Federal e enviada à Câmara dos Deputados, assim vem dispondo:

Art. 4º No âmbito do processo administrativo fiscal, é vedado aos órgãos de julgamento

afastar a aplicação ou deixar de observar tratado, acordo internacional, lei ou decreto sob

fundamento de inconstitucionalidade, salvo quando amparados em decisão definitiva

plenária do Supremo Tribunal Federal ou em outras hipóteses previstas na legislação

específica do ente tributante.(grifos não do original)

2.2.2 A coisa julgada administrativa no PAF

41 As Delegacias de Julgamento e o CARF estão impedidos de reconhecer a inconstitucionalidade de

normas legais, nos termos da Lei no 11.941, de 27 de maio de 2009, art. 26-A. “Art. 26-A. No âmbito do

processo administrativo fiscal, fica vedado aos órgãos de julgamento afastar a aplicação ou deixar de observar

tratado, acordo internacional, lei ou decreto, sob fundamento de inconstitucionalidade.” No mesmo sentido, a

Lei distrital nº 4.567/11, art. 43, § 3º, I. No mesmo sentido, Lei 4.567/11, art. 43, § 3º, I. 42 CABRAL, Antonio da Silva. Processo Administrativo Fiscal, Saraiva, 1993, p. 542. 43 O Projeto de Lei Complementar PLP 381/2014 estabelece normas gerais sobre o processo

administrativo fiscal no âmbito das administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios.

Page 13: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

13

No DF,44 assim como em outros entes da federação, são definitivas as decisões de

primeira instância, quando esgotado o prazo para recurso voluntário e de segunda instância, se

não couber recurso ou, quando couber, não tiver sido interposto no prazo. Indaga-se: há assim

coisa julgada administrativa?

Há dois grandes sistemas administrativos no direito mundial: o Sistema Inglês e o

Sistema Francês. O Francês, também denominado contencioso administrativo, é aquele em

que há uma vedação de conhecimento pelo Poder Judiciário de atos da Administração

Pública, que são dirimidos no seio da própria Administração Pública. Já o sistema Inglês,

chamado também de sistema de jurisdição única, é aquele adotado no Brasil, em que todos os

litígios, administrativos ou não, podem ser dirimidos pelo Poder Judiciário.

O CPC, no seu art. 467, define coisa julgada material, como “a eficácia que torna

imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”.

Relevante ainda colocarmos uma das sutis diferenças que existe entre coisa julgada material e

formal: a coisa julgada formal opera dentro do processo em que a sentença foi proferida, sem

impedir que o objeto do julgamento seja novamente discutido em outro processo. Já a

material produz seus efeitos no mesmo ou em qualquer outro processo, vedando o seu

reexame, após o trânsito em julgado.

Como qualquer decisão administrativa poderá ser revista e modificada pelo Poder

Judiciário (CF/88, art. 5º, XXXV), ao garantir que a lei não excluirá da apreciação do Poder

Judiciário (princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional ou do acesso à justiça), no

máximo pode-se defender a decisão definitiva como coisa julgada formal administrativa.

Contudo, esse entendimento é aplicável apenas sob a ótica do administrado, ou a

Administração também pode ingressar perante o Poder Judiciário para rever uma decisão

administrativa?

2.2.3 A reversão de decisão administrativa pela Justiça

No DF, até a edição da Lei nº 3.427/2004, que revogou do art. 40 da lei nº 657/1994,

havia instância especial, em que se recorria ao Secretário de Fazenda de decisões do Tribunal

Administrativo de Recursos Fiscais (TARF). Na União, da mesma forma, pelo Dec. nº

83.304/1979, revogado o § 1º, art. 37, do Dec. nº 70.235/1972, dava competência aos

44 DISTRITO FEDERAL. Lei nº 4.567/11, art. 102.

Page 14: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

14

procuradores representantes da Fazenda para recorrer ao Ministro da Fazenda, de decisão não

unânime, quando a entendessem contrária à lei ou à evidência da prova.

Em 2004, por sua vez, foi editado o PARECER/PGFN/CRJ/Nº 1087/2004, da

Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), em que se defende a possibilidade de a

Fazenda Pública acionar o Poder Judiciário para reverter decisões administrativas que lhe

forem desfavoráveis.

A PGFN, em Parecer recente CRJ nº 2.044, de 22/10/2013, assim se manifestou:

44. Pelo exposto, conclui-se: a) as decisões proferidas pelo CARF têm nítida natureza de ato

administrativo vinculado; b) as decisões do CARF podem ser revistas judicialmente em

três hipóteses de nulidade: a) quando apresentarem defeito de formação (desrespeito aos

requisitos de validade do ato); b) quando exorbitarem das opções interpretativas possíveis,

com consequente afronta à legalidade, à razoabilidade e à proporcionalidade; e, c) evidente

erro de fato; (...) (grifou-se)

Grande parte da doutrina defende posição no sentido de que as decisões

administrativas em matéria tributária vinculam a Administração Pública quando contrárias à

Fazenda, por entender ter sido a própria Administração, por meio de seus mecanismos

institucionais, que decidiu contra seus próprios interesses. Nesse sentido, esta corrente admite

para tais casos a chamada coisa julgada administrativa em matéria fiscal.

Contudo, esta posição é questionada por aqueles que entendem que a CF/88 prevê o

cabimento da postulação ao Poder Judiciário contra todo e qualquer ato jurídico praticado por

autoridade administrativa. Nesse entender, é consequência natural e lógica da separação de

Poderes, cabendo à função jurisdicional controlar e revisar, terminativamente, os atos e

decisões da Administração, independentemente de esses terem sido favoráveis ou não à

Fazenda Pública.45

Relevante colocar, no entanto, que o princípio constitucional (CF/88, art. 5º,

XXXV), da inafastabilidade do controle jurisdicional contém uma garantia não absoluta, pois

embora o acesso ao Poder Judiciário seja amplamente garantido, deve-se obedecer certos

regramentos que visam assegurar a efetividade e a própria sobrevivência do sistema. Assim, é

que vem disciplinando o art. 3º do CPC, norma básica do processo, que para se aforar uma

ação perante o Poder Judiciário o litigante deverá possuir interesse e legitimidade, que no

caso em estudo não se vislumbram, por ser o objeto de impugnação judicial um ato emanado

do próprio órgão impugnador.

45 Na obra "Processo Administrativo Tributário" (Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1999), a

questão da possibilidade de a Fazenda ir a juízo para pleitear a anulação da decisão administrativa a ela contrária

foi colocada para vários doutrinadores nacionais, que expressaram a sua opinião.

Page 15: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

15

Desse modo, não se mostra razoável a Administração, irresignada com a decisão por

ela mesma prolatada, que lhe foi desfavorável, pleitear a anulação desse ato no Poder

Judiciário, implicando no mesmo órgão, figurado no pólo ativo e passivo do feito judicial, em

verdadeira confusão entre as partes, bem denotando a carência de interesse processual e a

ilegitimidade ativa.46 A jurisprudência do STF47 firma que tem força vinculatória a decisão

proferida pela Administração.

Com o ajuizamento das referidas ações judiciais, há forte probabilidade de prejuízo

ao erário na hipótese bastante provável da extinção precoce de ditas ações pelo Poder

Judiciário, impondo ao autor a condenação ao pagamento dos honorários de sucumbência, que

por cuidarem de autuações fiscais de grande monta, serão vultosos. Porém, para se evitar

suposto prejuízo ao erário, podem ser aforadas a ação popular, por qualquer cidadão, e a ação

civil pública, pelo Ministério público (MP) local.48

Portanto, quando o administrado sucumbe em um processo administrativo, em se

sentindo lesado em seu direito, pode provocar o Poder Judiciário, para que este confirme ou

não o teor de suas irresignações. O mesmo não é cabível à Administração Pública, que,

enquanto não extinto pelo tempo o seu direito, tem o poder de rever seus atos, reformando ou

anulando sua própria decisão, pelo princípio da autotutela.

O Projeto de Lei Complementar PLP 381/201449 prevê hipóteses de revisão judicial,

ao dispor:

Art. 3º São definitivas as decisões: (...)

§ 5º A decisão definitiva favorável ao sujeito passivo somente poderá ser revista

judicialmente quando houver, comprovadamente, dolo ou fraude. (grifou-se)

2.2.4 O oferecimento de denúncia pelo MP antes do término do PAF

É atribuição privativa do MP promover ação penal pública (CF/88, art. 129, inciso

I), podendo para tanto requisitar informações e documentos na forma da lei complementar

(LC) respectiva (CF/88, art. 129, VI). O art. 104, inciso I, letra b da LC nº 734/1993, por sua

vez, confere ao MP o poder de requisitar documentos, certidões e informações. Logo, do

46 GRECO, Marco Aurélio. Processo administrativo tributário, Caderno de Pesquisas Tributárias –

nova série, n. 5, Coord. de Ives Gandra. São Paulo: Centro de Extensão Universitária/Revista dos Tribunais,

1999, p. 702. 47BRASIL. STF. RE nº 68.253 – PR, Rel. Min. Rafhael de Barros Monteiro, DJ de 6.5.1970. 48 Trechos retirados do PARECER nº 8487/2004 – PROFIS/DF. 49 Projeto de Lei Complementar PLP 381/2014. Estabelece normas gerais sobre o processo

administrativo fiscal no âmbito das administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios.

Page 16: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

16

ponto de vista formal as requisições têm amparo constitucional. Contudo, essas requisições

devem obedecer às prescrições legais genéricas ou específicas para cada caso em concreto.

A Lei nº 9.430/1996, no seu art. 83,50 regulamenta a representação fiscal da natureza

penal, com relação aos crimes tributários definidos nos artigos 1º e 2º da Lei 8.137/1990,

dispondo que ela será encaminhada ao MP após proferida a decisão final, na esfera

administrativa.

Por sua vez, o art. 34 da Lei nº 9.249/199551 prescrevia a extinção de punibilidade

dos crimes contra a ordem tributária e de sonegação fiscal na hipótese de pagamento do

tributo antes do recebimento da denúncia pelo juiz. Porém, com a Lei n° 10.684/2003,52 art.

9º, ficou suspensa a pretensão punitiva do Estado, enquanto o denunciado estiver em regime

de parcelamento.

Assim, com a Lei nº 10.684/2003, desapareceu a condição prevista no art. 34 da Lei

n° 9.249/1995, de ter que fazer o pagamento antes do recebimento da denúncia, resolveu o

problema de extinção da punibilidade nos casos de pagamento parcelado e ficou igualmente

paralisado o curso da prescrição criminal.53

Em realidade, o art. 83 da Lei 9.430/1996 prescreve que a condição é para a

representação fiscal, não proibindo a deflagração pelo MP da ação baseada em prova obtida

por outra forma ou por ele requisitada à autoridade fiscal.

O mencionado art. 83 atacado por meio da ADIN nº 1.571,54 que restou declarado

constitucional. E no Hábeas Corpus nº 81611/DF, de 2003, o STF firmou sua jurisprudência

no sentido de ser inviável a ação penal por crimes contra a ordem tributária enquanto

pendente o PAF relativo ao crédito correspondente.

CONCLUSÃO

50 UNIÃO. Lei nº 9.430, de 1996. “Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes

contra a ordem tributária definidos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, será

encaminhada ao Ministério Público após proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a

exigência fiscal do crédito tributário." (grifamos) 51 UNIÃO. Lei nº 9.249 de 1995. “Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº

8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o

pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.” 52 UNIÃO. Lei n° 10.684 de 2003. “Art. 9º. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos

crimes previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do

Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica

relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.” 53 UNIÃO. Lei n° 10.684, de 2003. “Art. 9º. § 1o A prescrição criminal não corre durante o período de

suspensão da pretensão punitiva.” “§ 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a

pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e

contribuições sociais, inclusive acessórios.” 54 BRASIL STF. ADIN nº 1.571. Rel. Min. Néri da Silveira, DJ de 30/04/2004.

Page 17: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

17

Desse modo, apresentam-se as seguintes conclusões, quanto aos questionamentos

levantados:

1. É procedimento ou processo administrativo fiscal?

Trata-se de Processo administrativo fiscal se que instaura no exato momento em que

o lançamento tributário é impugnado pelo sujeito passivo, termo utilizado pela própria CF/88,

no seu art. 5º, LV.

2. O duplo grau de jurisdição é uma garantia constitucional?

Regra geral pode-se afirmar que a CF/88 prestigia o duplo grau de jurisdição como

um princípio, pois a ele apenas se refere, e não como uma garantia. E no PAF, faz mais

sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional,

porquanto suas características e regras informadoras apenas podem comportar como um

princípio, e ainda quando assim a lei do ente tributante dispuser.

3. Qual o momento em que poderá ocorrer a decadência ou a prescrição tributária

no PAF?

Tendo em vista que a decadência tributária somente ocorre antes do ato de

lançamento, resultando na extinção do direito de constituir o crédito tributário pelo seu não-

exercício durante determinado tempo (CTN, art. 173), só há se falar em decadência na

realização dos procedimentos administrativos fiscais, que se refere exclusivamente ao ato de

lançar o crédito tributário. E a prescrição tributária apenas inicia-se com o término do PAF, ou

seja, com a constituição definitiva do credito tributário.

Assim, entre o lançamento tributário efetuado e contestado (impugnado) e até que

ocorra a decisão final do contencioso administrativo, independentemente do período

transcorrido, não há qualquer modalidade de extinção de crédito tributário pelo decurso do

prazo, nem decadência, nem prescrição. Isso porque, com a constituição do crédito tributário,

pelo lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo, cessa a inércia do Fisco, não se

falando mais em decadência e o prazo de prescrição apenas tem seu início com a constituição

definitiva do crédito tributário, isto é, com o trânsito em julgado administrativo (decisão final

do contencioso administrativo).

4. Caso não ocorra o pagamento de tributo declarado, para sua exigência correrá

qual prazo extintivo?

Se não ocorrer o pagamento do tributo declarado, no prazo estabelecido na

legislação pertinente, inicia-se o prazo prescricional para a ação de cobrança (CTN, art. 174).

Ou seja, com a entrega da declaração não há necessidade de constituição formal do crédito

tributário pelo Fisco, e ainda, com a aceitação da declaração pela Fazenda Pública, há a

Page 18: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

18

constituição definitiva do crédito tributário, podendo-se inscrevê-lo de imediato em dívida

ativa, que é o título extrajudicial para sua cobrança judicial.

5. Há causas impeditivas do prazo prescricional?

O CTN tratou de forma expressa somente das causas de interrupção do prazo

prescricional (CTN, art. 174, parágrafo único). Porém, cabem também causas de impedimento

do prazo de prescrição, pois para que se inicie o prazo de prescrição, além de estar o crédito

tributário constituído definitivamente e de haver a violação de um direito, o titular do direito

não pode estar impedido de atuar, porquanto a prescrição não corre contra quem não pode

agir. Assim, em determinadas situações, mesmo já constituído definitivamente o crédito

tributário, pode não ocorrer o início do prazo prescricional, simplesmente por estar o titular do

direito impedido de agir.

6. Com a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, pela interposição da

impugnação, ocorre também a suspensão da prescrição?

Com a suspensão da exigibilidade do crédito tributário pela interposição de recurso

(CTN, art. 151, III) não ocorre a suspensão do prazo de prescrição, pois, antes da constituição

definitiva do crédito tributário, não é ele ainda passível de ser cobrado, não podendo assim ser

suspenso um prazo que ainda não se iniciou.

7. Há prescrição intercorrente no PAF?

A prescrição intercorrente no PAF ainda não é aceita na jurisprudência de nossos

tribunais, por ausência de previsão legal, porquanto a demora na tramitação do PAF não

implica a ‘perempção’ do direito de constituir definitivamente o crédito tributário, instituto

não previsto no CTN.

8. Há prazos para a conclusão do PAF?

A CF/88 introduziu, em seu art. 5º, LXXVIII, como garantia fundamental, a

razoável duração dos processos. Assim, além de a celeridade na tramitação e solução das

demandas administrativas ser um princípio administrativo, em homenagem ao princípio da

eficiência administrativa (CF/88, art. 37), foi publicada a Lei nº 11.457/2007, tornando

obrigatório o julgamento dos recursos administrativos no prazo máximo de 360 dias. Como

não há previsão de penalidades pelo seu descumprimento, esse dispositivo oferece

fundamento jurídico para se obter a intervenção judicial, na solução mais rápida dos recursos

administrativos.

9. O que ocorre com o recurso interposto fora do prazo legal?

E sendo impugnado intempestivamente o lançamento tributário, o pedido deve ser

recebido e analisado, não como um recurso, mas sim como uma revisão de ato administrativo,

Page 19: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

19

a pedido, porquanto o prazo não pode ser um impeditivo para a Administração rever de ofício

ilegalidades praticadas.

10. Há renúncia ou desistência ao direito de recorrer no PAF?

Se o contribuinte autuado efetuar pedido de parcelamento ou pagamento da

exigência fiscal constante do AI, ou ainda, propor ação judicial sobre o mesmo objeto do AI,

estará caracterizada a renúncia ao seu direito de recorrer ou sua desistência, caso já tenha

interposto o recurso na esfera administrativa.

11. Há PAF nos impostos sujeitos ao lançamento por homologação?

Para os impostos sujeitos ao lançamento por homologação, em que haja exigência de

imposto declarado, não há PAF contencioso, pois se não pago, constitui-se confissão de

dívida, tornando-o exigível.

12. Pode a autoridade julgadora, no PAF, apreciar matéria de constitucionalidade?

A autoridade julgadora não pode, no PAF, apreciar a constitucionalidade das

normas, conforme vedação expressa das legislações tributárias dos entes tributantes. O agente

deve cumprir norma que esteja vigendo, cabendo-lhe representar ao seu superior quanto ao

vício de inconstitucionalidade da norma, que, sendo competente, julgará a conveniência e

oportunidade de revogá-la ou questioná-la junto ao Poder Judiciário.

13. Há coisa julgada administrativa no PAF?

Como qualquer decisão administrativa poderá ser revista e modificada pelo Poder

Judiciário (CF/88, art. 5º, XXXV), no máximo pode-se defender a decisão definitiva como

coisa julgada formal administrativa, que se opera dentro do processo em que a sentença foi

proferida.

14. A Administração pode ingressar na Justiça para reverter decisão administrativa

desfavorável ao Fisco?

Não se mostra razoável a Administração, irresignada com a decisão por ela mesma

prolatada, que lhe foi desfavorável, pleitear no Poder Judiciário para anular o seu ato,

implicando em verdadeira confusão entre as partes (pólo ativo e passivo no mesmo agente),

bem como carência de interesse de agir e a ilegitimidade ativa.

15. No PAF, em que momento o MP pode oferecer a denúncia criminal de exigência

fiscal?

Pelo art. 83 da Lei nº 9.430/1996, a representação fiscal para fins penais relativa aos

crimes contra a ordem tributária será encaminhada ao MP somente após proferida a decisão

final, na esfera administrativa. Não há proibição da deflagração pelo MP da ação baseada em

prova obtida por outra forma ou por ele requisitada a autoridade fiscal. O STF firmou sua

Page 20: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

20

jurisprudência no sentido de ser inviável a ação penal por crimes contra a ordem tributária

enquanto pendente o PAF relativo ao crédito correspondente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIAS

CABRAL, Antonio da Silva. Processo Administrativo Fiscal, Saraiva, 1993.

CASSIONE, Vittorio, Maria Eugenia Teixeira Cassone. Processo tributário: teoria e

prática, 6ª ed. – São Paulo: Atlas, 2005.

FANUCCHI, Fábio. A decadência e a prescrição em direito tributário. 2 ed. São Paulo:

Resenha Tributária, 1971.

GRECO, Marco Aurélio. Processo administrativo tributário, Caderno de Pesquisas

Tributárias – nova série, n. 5, Coord. de Ives Gandra. São Paulo: Centro de Extensão

Universitária/Revista dos Tribunais, 1999.

HABLE, Jose. Extinção do Crédito Tributário por Decurso de Prazo. Decadência e

Prescrição Tributárias, 4ª ed., São Paulo: Editora Método, 2014.

MARINS, James. Processual tributário brasileiro, Dialética, 2003.

MARQUES, José Frederico, Instituição de direito processual civil, v. IV, p. 210, 1958-1960.

apud Barbosa Moreira, Comentários ao código de processo civil, 2ª ed., v. V, nº 257.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 16ª edição, São Paulo:

Malheiros, 1991.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. Malheiros, 10 ed.,

São Paulo, 1998.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 26ª ed. 2009, apud

Soares de Melo, 2012.

MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de direito tributário. 3 ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2v., 1997.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIAS ELETRÔNICAS E REVISTAS

DINAMARCO, Cândido Rangel. “Os efeitos dos Recursos”. Aspectos polêmicos e atuais dos

recursos cíveis, v. 5. Nelson Nery Jr. e Teresa arruda Alvim Wambier (coords.). São Paulo:

RT, 2002.

HABLE, José. Pagamento indevido e restituição tributária. Jus Navigandi, Teresina, ano 13,

n. 1664, 21 jan. 2008. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/10868>. Acesso em: 22 maio

2014.

Page 21: O PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - josehable.adv.br · E no PAF, faz mais sentido ainda entender que o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional, porquanto suas

21

HABLE, José. O que você deve saber sobre os institutos da decadência e da prescrição

tributária. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1849, 24 jul. 2008. Disponível em:

<http://jus.com.br/artigos/11523>. Acesso em: 22 maio 2014.

HABLE, José. A razoável duração do processo no âmbito judicial e administrativo. Jus

Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2100, 1 abr. 2009. Disponível em:

<http://jus.com.br/artigos/12560>. Acesso em: 23 maio 2014.

HABLE, José. O recurso intempestivo no processo administrativo fiscal . Jus Navigandi,

Teresina, ano 12, n. 1626, 14 dez. 2007. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10758>. Acesso em: 28 abr. 2014.

JUSTEN Filho, Marçal. Considerações sobre o “Processo Administrativo Fiscal”, in Revista

Dialética de Direito Tributário nº 33/108 a 115.

SÃO PAULO. Lei nº 6.374, de 1989. Disponível em: http://www.fazenda.sp.gov.br Acesso

em: 12 abr. 2014.

UNIÃO. Lei nº 6.830, de 1980. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br Acesso em: 20

maio 2014.

UNIÃO. Lei nº 9.430, de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br Acesso em: 20

maio 2014.

UNIÃO. Lei n° 10.684, de 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br Acesso em: 20

maio 2014.

UNIÃO. Lei nº 11.457, de 2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br Acesso em: 20

maio 2014.

UNIÃO. Decreto-lei nº 2.124, de 1984. Disponível em:

http://www6.senado.gov.br/sicon/ExecutaPesquisaBasica.action . Acesso em: 12 abr. 2014

UNIÃO. Decreto nº 70.235, de 1972. Disponível em: http://www.planalto.gov.br Acesso em:

20 maio 2013