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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O PODER DAS GRANDES MARCAS
POR: JULIANA ALVES MELO
ORIENTADOR: FRANCIS RAJZMAN
RIO DE JANEIRO
JANEIRO DE 2011
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
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O PODER DAS GRANDES MARCAS
Apresentação de monografia à Universidade Cândido Mendes, Instituto A Vez do Mestre, como requisito para obtenção do grau de especialista em Direito da Concorrência e Propriedade Intelectual. Orientador: Francis Rajzman
POR: JULIANA ALVES MELO
ORIENTADOR: FRANCIS RAJZMAN
RIO DE JANEIRO
JANEIRO DE 2011
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AGRADECIMENTOS
Agradeço, primeiramente, a Deus por me permitir não desistir facilmente dos obstáculos que ora me são impostos e a todos aqueles que contribuiram direta e indiretamente para a construção deste trabalho, em especial: minha mãe, advogada que, pra mim, é um exemplo de superação e sucesso e meu chefe, também advogado, militante na área de Propriedade Industrial, que me incentivou a entrar no curso de especialização em Direito da Concorrência e Propriedade Intelectual
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DEDICATORIA
Dedico esta monografia à minha mãe, que desde sempre colaborou com meus estudos e me incentiva a cada dia para que eu me aprimore intelectual e profissionalmente, bem como à grande amiga e colega de trabalho, Luciana Lima, que me tem como exemplo de persistência e obstinação, ambas tolerando, tacitamemente, meus rompantes de stress e crises de mau humor ao longo do curso
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“Necessitamos sempre de ambicionar alguma coisa que,
alcançada, não nos torna sem ambição”
Carlos Drummond de Andrade
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RESUMO
O presente trabalho visa expor a importância da construção e do gerenciamento de marcas fortes para as empresas como estratégia para o aumento da fidelidade do consumidor e geração de lucros e, ainda, abordar as consequências da influência das grandes marcas no mercado sobre o público consumidor.
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ABSTRACT
This paper aims to disclose the importance of creating and managing strong marks for the companies as a strategy for increasing customer loyalty and generate profits, and also approaching the consequences of the influence of strong marks on the market on consumers.
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METODOLOGIA
A construção do trabalho foi realizada através de pesquisa bibliográfica em bancos de dados, na
biblioteca do renomado escritório Dannemann Siemsen Bigler & Ipanema Moreira, artigos
publicados relacionados ao tema e sites especializados, além de pesquisa de campo por meio de
entrevistas com profissionais militantes na área de Propriedade Industrial.
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SUMÁRIO
Introdução.................................................................................................................................. 10
Capítulo I - Para que serviam as marcas? Para que servem hoje?............................ 11
Capítulo II - O valor de uma marca no mercado................................................................... 14
2.1 - Naturezas de marca
2.2 - Formas de marca
2.3 - O marketing da marca
Capítulo III - Grandes negócios por trás de grandes marcas.............................................. 18
3-1 - Existe segredo para o sucesso?
3.2 - O caminho a percorrer
3.3 - Os riscos de ser líder de mercado
3.4 - Na sintonia do mercado
3.5 - Hora de mostrar valor
Capítulo IV - A inserção das marcas no mercado mundial
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Capítulo V - Propriedade Intelectual e Poder Econômico 29
Conclusão................................................................................................................................... 31
Bibliografia................................................................................................................................ 32
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INTRODUÇÃO
Originalmente, a função das marcas era diferenciar, identificar o produtor ou fabricante de
seus concorrentes e, dessa forma, facilitar o processo de escolha do consumidor.
As marcas também protegem o fabricante de fraudes e imitações, estando essas vantagens
sempre presentes desde que o recurso de marcar produtos foi adotado.
Produtores, fornecedores, comerciantes, consumidores, todos precisam estabelecer relações
em que valores são construídos e compartilhados. Nesse sentido, as marcas atuam como elementos
que potencialmente agregam valor às coisas. São ferramentas poderosas e frequentemente podem
agir em favor de uma empresa – embora, quando não cuidadas, depreciem sua imagem.
Na maioria das vezes, constituem o ativo mais valioso das empresas, sendo inclusive alvo de
transações comerciais sem precedentes.
Marcas inspiram qualidade, evocam lembranças, atraem desejos. Portanto, merecem
investimento e proteção. E a maior proteção de uma marca é o seu registro junto ao INPI - Instituto
Nacional de Propriedade Intelectual.
No entanto, o conceito de marca vem evoluindo ao longo dos tempos. As marcas em
conjunto com o capital intelectual podem agregar diferencial competitivo para as empresas. Uma
marca forte é uma ferramenta valiosa para fidelização, podendo ser vista como uma ponte entre o
consumidor e o produto/serviço.
Com a globalização do mercado, as organizações tiveram que antecipar as mudanças e
estarem à frente dos concorrentes como uma forma de conquistar o público consumidor, uma vez
que os clientes estão cada vez mais exigentes. Em função disso, conhecer estratégias que garantem
a manutenção e a lealdade dos clientes se faz cada vez mais necessária.
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CAPÍTULO I - PARA QUE SERVIAM AS MARCAS? PARA QUE SERVEM HOJE?
A existência de marcas não é algo novo: as primeiras delas surgiram na pré-história, e
serviam para responder perguntas como: quem fabricou isto? O que é aquilo? De onde vem esse
produto/serviço? Qual sua principal característica? Quem é seu proprietário?
Caçadores na pré-história gravavam suas armas para indicar propriedade; na idade média
ceramistas da Grécia e Roma pressionavam seu polegar na argila ainda úmida na base dos potes
para indicar sua origem às corporações; as famílias usavam tradicionais símbolos heráldicos;
remédios e fumo eram marcados na jovem América, até chegarmos hoje às marcas mundiais. De
fato, uma marca sempre foi uma receita eficaz de condensar e comunicar uma realidade complexa
numa imagem que ultrapassa fronteiras.
Economicamente falando, a marca facilita as transações, haja vista que torna mais rápida a
interpretação e o processamento das informações pelo consumidor em relação a determinada
experiência com o produto ou o serviço, acionando ou não suas expectativas de satisfação,
confiança, conforto, identificação e auto-expressão, servindo até mesmo como critério de redução
de risco na decisão de compra.
Segundo Troiano1, a marca bem estruturada melhora a eficiência dos programas
mercadológicos, permitindo o desenvolvimento de programas de relacionamento e fidelidade,
fornecendo uma diferenciação protegida por lei (registro de marca), facilitando o processamento de
pedidos, deixando uma base para a comunicação da imagem corporativa, delimitando um valor de
ativo intangível no caso de venda e uma fonte de segmentação eficaz, possibilitando obter maiores
retornos e maiores alavancagens comerciais, gerando possibilidades para futuras expansões de
marca.
Pode-se dizer que a marca é ao mesmo tempo uma entidade física e espiritual; ela dá sentido
e define a identidade do produto ou serviço no tempo e espaço, extrapolando os atributos físicos
incorporando conteúdos psíquicos na mente do consumidor.
______________ 1 Jaime Troiano: engenheiro químico formado pela Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) e sociólogo formado pela Universidade
de São Paulo. Autor do Livro As marcas no divã: uma análise de consumidores e criação de valor, editado pela Editora Globo em
2009.
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Ainda segundo o referido autor, até alguns anos atrás, as preocupações com a marca da
própria empresa, sua marca corporativa, era apenas protocolar. Anúncios institucionais, por
exemplo, eram tratados como iniciativas quase cosméticas, vistas como fruto da vaidade dos
principais executivos das organizações. As marcas que mereciam apoio e recursos de marketing e
comunicação eram apenas as marcas de produto. A presença da marca da empresa era tímida,
muitas vezes apenas indicada nos materiais de comunicação, nas embalagens ou nos anúncios. Essa
realidade mudou.
As marcas corporativas deixaram de significar meras coadjuvantes. Aos poucos, passaram a
protagonizar as relações das organizações com o mercado e se tornaram a marca das marcas. De sua
antiga inibição em se expor, não sobrou nada. O que aconteceu? O que provocou essa
transformação tão ampla? Há pelo menos três fatores centrais que explicam essa mudança.
O primeiro fator foi uma aguda consciência de que unidades de negócio não foram criadas
para fragmentar a força de uma organização, mas para potencializar seus resultados. A exacerbação
da presença das unidades fez com que muitas se transformassem em verdadeiras “capitanias
hereditárias”, em feudos, na busca compulsiva por seus resultados individuais. Contra essa
pulverização organizacional, um poderoso antídoto foi o crescimento da presença da marca
corporativa.
A dinâmica do mercado de capitais foi o segundo fator que alterou a tímida presença da
marca corporativa nas manifestações das empresas. A disputa na Bovespa não se dá na arena
mercadológica de produtos, ou seja, na arena em que operam os consumidores. Na bolsa, Lojas
Americanas, por exemplo, compete com Petrobras, com Itaú e com a Gol, não apenas contra outra
companhia do mesmo setor.
O terceiro ponto que contribuiu para a transformação foi que as empresas que criaram
marcas poderosas no século XX sabem que podem multiplicar seus negócios com as mesmas
marcas neste século XXI, em novas áreas de produtos e serviços. Está mais do que comprovado que
o sucesso na extensão de negócios de uma determinada marca é muito estimulado pelo prestígio da
paternidade corporativa. Clientes, consumidores e stakeholders2 em geral pensam: “Se esse novo
produto ou serviço é de uma empresa que eu respeito, ele deve ser bom - por que não
experimentar?”.
___________________ 2 aquele que detém aplicações financeiras, aquele sob cuja custódia se encontram aplicações.
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A crise econômica recente mostrou que marcas corporativas bem administradas têm uma
grande vantagem. Elas criam em volta de si uma espécie de blindagem. As fortes e de prestígio não
evitam a crise, não tornam a empresa totalmente resistente a ameaças, mas atenuam e muito o
impacto que sofreriam sem essa blindagem. E, ainda mais importante, garantem uma retomada dos
negócios muito mais acelarada.
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CAPÍTULO II - O VALOR DE UMA MARCA NO MERCADO
Imaginemos uma cena do cotidiano: um determinado consumidor saiu de casa com imenso
desejo de comprar um perfume nacional ou importado em sua loja favorita de um Shopping Center.
Sendo assim, segue até a prateleira já conhecida. De repente, leva um susto: todos os perfumes
estão embalados de maneira igual, envoltos numa embalagem padrão e sem nenhuma marca, cor,
tamanho, forma, sinal, frase, disposição, estilização de letras, texturas ou ornamentos em geral, que
possam diferenciar o produto. Todos iguais, absolutamente sem aquilo que o faz guiar suas escolhas
no mercado: um sinal, um nome, uma figura, uma forma, uma identidade, enfim, uma marca.
As marcas não desapareceram. Esta cena hipotética serviu apenas para ilustrar como seria o
mundo caso os produtos ou serviços, postos à venda no mercado, não possuíssem uma marca.
Marcas funcionam como pontes entre as pessoas. Por isso, requerem investimento e proteção, isto é,
seu registro junto ao INPI - Instituto Nacional de Propriedade Intelectual.
Apesar de não ser obrigatório, o registro da marca no INPI garante ao titular direitos
específicos. Se a empresa possui determinado negócio, provavelmente seus produtos ou serviços
devem ter uma marca. Então, ao deixar de registrá-la pode acarretar imitação por parte de
concorrentes e, consequentemente, desvio da clientela e perda finaceira.
Com a marca registrada, seu titular tem garantias contra seu uso indevido, resguardando-se
contra a concorrência desleal e atos de má-fé praticados por terceiros. É um respaldo legal que
constrói valor para a marca, fornece mais segurança à sua atuação no mercado, além de viabilizar
transações comerciais nas quais a marca é o maior objeto de negociação.
Diante de um cenário cada vez mais competitivo, registrar uma marca é o principal passo
para garantir os direitos de uma empresa no mercado.
2.1. NATUREZAS DA MARCA
A natureza de uma marca diz respeito à sua origem e ao seu uso. No que tange à origem,
existem marcas brasileiras e marcas estrangeiras. Para todos os efeitos, marca brasileira é aquela
regularmente depositada no Brasil, por pessoa domiciliada no país.
Já a marca estrangeira é aquela regularmente depositada no Brasil, por pessoa não
domiciliada no país, ou aquela que, depositada regularmente em país vinculado a acordo ou tratado
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do qual o Brasil seja partícipe, ou em organização internacional da qual o país faça parte, é também
depositada no território nacional no prazo estipulado no respectivo acordo ou tratado, e cujo
depósito no País contenha reivindicação de prioridade em relação à data do primeiro pedido.
No que concerne ao seu uso, as marcas podem se distinguir de acordo com o quadro abaixo:
Natureza das marcas A que se aplica
Produto Distinguir produtos de outros idênticos, semelhantes ou afins
Serviço Distinguir serviços de outros idênticos, semelhantes ou afins
Coletiva Identificar produtos ou serviços provenientes de membros de um determinado grupo ou entidade
Certificação Atestar a conformidade de produtos ou serviços a determinadas normas ou especificações técnicas
2.2 - FORMAS DE APRESENTAÇÃO
As marcas possuem diversas formas de apresentação. Não são apenas nomes; nem apenas
figuras.
Entretanto, de acordo com a lei brasileira, não se pode proteger sinais que não sejam
visualmente perceptíveis. Assim, um som, ou ainda um aroma, não encontram amparo legal como
marca.
A seguir, um quadro apresentando as principais características de cada forma de
apresentação:
Apresentação A que se aplica Exemplos
Nominativa Sinal constituído apenas por palavras, ou combinação de letras e/ou algarismos, sem apresentação fantasiosa
TITAN
Mista Sinal que combina elementos nominativos e figurativos
Figurativa Sinal constituido por desenho, imagem, formas fantasiosas em geral
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Tridimensional Sinal constituído pela forma plástica distintiva e necessariamente incomum do produto
2.3 - O MARKETING DA MARCA
É interessante como líderes empresarias e/ou consultores mencionam na maioria das vezes a
relevância estratégica do marketing para obtenção de sucesso em seus negócios. O marketing é
colocado como uma das prioridades dentro de uma empresa.
Por outro lado, é impressionante quando as pessoas ligadas ao marketing falam sobre suas
estratégias, os CEOs3 não se interessam tanto pelo assunto. Claro que, conhecimento da marca pelo
consumidor, sua satisfação pelo produto ou serviço, market share4 são questões que podem ser
medidas e avaliadas e é importante ter conhecimento.
Não é impossível notar como os CEOs estão muito mais atrelados ao retorno financeiro do
empreendimento, bens tangíveis, fluxo de caixa, novos investimentos, concorrência, enfim o
aumento do lucro.
Todavia, a percepção acima vem mudando drasticamente nos últimos anos, e por um
simples motivo: a relevância da Propriedade Intelectual para a atividade empresarial. De fato, com
os elevados níveis de competição somado ao aumento da capacidade de produção, marcas fortes são
instrumentos indispensáveis para ajudar as empresas a se diferenciarem num mercado cada vez
mais globalizado.
_______________ 3 - CEO (Chief Executive Officer) - diretor-executivo, diretor-geral, presidente, executivo responsável pela direção de uma empresa ou grande organização. 4 - quota de mercado ou ainda fatia de mercado, participação no mercado, porção no mercado.
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A marca diferencia produtos e serviços aparentemente semelhantes, de forma que
capacidade competitiva não é só saber se o produto funcionalmente atende aos interesses do público
alvo, e sim, o que o produto significa para ele. Marcas que claramente diferenciam produtos e/ou
serviços se traduzem em benefício econômico mensurável para seus proprietários, porque trazem
retorno financeiro aos seus investimentos.
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CAPÍTULO III - GRANDES NEGÓCIOS POR TRÁS DE GRANDES MARCAS
O que faz um consumidor optar, e às vezes até pagar mais caro, por uma determinada marca
de creme dental? Ou entrar na loja de uma rede internacional de fast food e comer algo semelhante
ao que poderia consumir na lanchonete da esquina? Atração pela marca? Milhões de dólares são
investidos anualmente em marketing para construir e manter um dos maiores patrimônios que uma
empresa pode ter, a sua marca. Muitas vezes esquecida nas transações de aquisição, venda ou fusão
de empresas, a marca, se bem trabalhada, pode representar um valor maior do que o do próprio
negócio da organização.
Tesouro reverenciado pelo consumidor, a marca é um bem intangível, não-consignado em
balanços, para a maioria de seus proprietários. De outra parte, a exigência constante de padrões de
conduta que garantam a qualidade do produto (e de sua imagem), muitas vezes coincide com as
estratégias de valorização que a empresa aplica à sua marca. Nesse caso, afinar o marketing mix5 na
direção correta requer competência e talento em todas as disciplinas da Comunicação.
Qual será, por exemplo, o segredo mercadológico da Coca-Cola, a marca mais valiosa do
mundo? Rodolfo Jimenez, gerente de comunicação da companhia, prefere uma explicação que
mantém a aura de mistério que envolve a composição do refrigerante. "Temos uma formulação
química mágica, que não cansa o paladar do consumidor do mundo inteiro", afirma. "Outro
elemento está no próprio estilo Coca-Cola, que é mais do que um refrigerante: é um compromisso
com o alto astral, com a alegria e a confraternização". A preocupação com a renovação da marca se
revela nos slogans internacionais da companhia, que costumam ter duração de três a seis anos.
Segundo Jimenez, um dos temas - "Sempre Coca-Cola" - e a campanha publicitária que o
acompanha seguem o padrão da marca, que busca ser relevante, surpreendente e original aos olhos
do consumidor.
______________ 5 - Marketing mix ou Composto de marketing é formado por um conjunto de variáveis controláveis que influenciam a
maneira com que os consumidores respondem ao mercado. É dividido em 4 seções frequentemente chamadas dos
"quatro pês", quais sejam: Produto, Preço, Praça (ponto de venda/distribuição) e Promoção.
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Para manter status de sua marca, a Coca-Cola investe, no Brasil, US$ 300 milhões por ano
em marketing - verba que envolve propaganda, patrocínio, promoção, incentivo aos revendedores,
equipe de vendas, distribuição, equipamento de vendas, post-mix e o jornal Merchandising, dirigido
ao trade. "A intimidade com o consumidor é fundamental no nosso negócio", diz Jimenez. "Temos
de manter a marca viva e presente na cabeça e no coração das pessoas; para isso, precisamos utilizar
várias e simultâneas ações de comunicação."
Equilibrar essa equação é tarefa árdua. Mas exemplos como a própria Coca-Cola, Marlboro,
McDonald"s e outros permitem afirmar que, além da qualidade de seus produtos, essas marcas têm
valor monetário e podem cobrar a mais por isso.
3.1 - EXISTE SEGREDO PARA O SUCESSO ?
"Nenhum consumidor em potencial, com dinheiro para optar, aventura-se a escolher uma marca
qualquer em detrimento daquela que ele reconhece e com a qual se identifica", diz José Roberto
Martins, à época vice-presidente da GlobalBrands, primeira empresa latino-americana especializada
em trabalhar marcas sob o enfoque econômico-financeiro. Em parceria com o jornalista Nelson
Blecher, Martins lançou recentemente o livro "O império das marcas" (v. box à pág. XX). Nesse
trabalho, os autores constatam que as principais e melhores marcas do mundo são praticamente as
mesmas há mais de 50 anos, e companhias suas detentoras têm todas as condições para mantê-las
nesse patamar por mais meio século.
Geralmente, podem ser contadas nos dedos de duas mãos as principais características que essas
marcas têm em comum:
1. conseguem atrair e reter investidores e pessoal qualificado;
2. distribuem seus produtos com eficiência logística;
3. são detentoras de boas tecnologia e sistemas;
4. globalizam-se com facilidade;
5. investem adequadamente em pesquisa e desenvolvimento;
6. são administradas por profissionais, geralmente acionistas;
7. utilizam seus ativos com maior sabedoria;
8. conhecem perfeitamente seu ambiente estratégico;
9. catalisam simpatia e confiança e sabem lidar com seus consumidores e funcionários;
10. possuem eficiente estrutura de pós-venda.
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Um bom exemplo de articulação adequada de cada um desses pontos pode ser percebida
na tradicional Maizena. A primeira menção à marca faz recordar a infância e os mingaus preparados
pela mãe ou avó. Uma outra imagem, mais recente, conduz ao conceito de ingrediente útil no
preparo de receitas. É justamente este conceito, passado de mãe para filha há gerações, que vem
sendo retratado numa ação de mídia da Refinações de Milho Brasil (RMB).
Em parceria com sua agência, a S,A&S, a companhia leva ao ar, pelo Sistema Brasileiro
de Televisão (SBT), o programete "Nossa Vida com Maizena", protagonizado pelas atrizes Célia
Helena e Lígia Cortez. A produção foge aos padrões convencionais do comercial para televisão ou
da novela patrocinada. "Estamos fortalecendo a marca na memória das donas-de-casa,
principalmente junto às mais jovens", explica Solange Fontes, gerente de produto da RMB. "Mais
do que crescer em vendas, nossa idéia é aumentar a empatia que a marca tem com as mulheres,
explorando situações do seu cotidiano que envolvam emoção, bom-humor e cumplicidade."
Desde que chegou ao Brasil, em 1874, o apelo de Maizena é tão forte na mente da população
que, além de virar sinônimo da categoria de produtos farináceos, faz com que qualquer estudante
menos avisado escreva o nome do ingrediente com z e não s, como manda o dicionário. Por todo
esse tempo, inúmeras ações de marketing conjugadas à ampliação da linha de produtos contribuíram
para a boa performance da marca. Além das campanhas publicitárias, a marca Maizena combina a
tradição da caixa amarela com a preocupação do rejuvenescimento. Assim, em 1991, a companhia
incluiu fichas de receita em suas embalagens; dois anos depois, introduziu no mercado a bebida
quente infantil Combinada Maizena e, em 1995, foi o patrocinadora oficial da Seleção Brasileira de
Futebol Feminino, vencedora do Campeonato Sul-Americano. Esta última ação garantiu a presença
da marca na Copa do Mundo, realizada em 2010 na Suécia. Na esteira da credibilidade alcançada, a
Maizena está avalizando o lançamento da linha Betty Crocker de misturas para bolos, coberturas e
brownies, que chega ao Brasil por meio da International Dessert Partners (IDP), joint-venture6
estabelecida pela RMB com a General Mills.
_____________________
6 - Joint venture ou empreendimento conjunto é uma associação de empresas, que pode ser definitiva ou não,com fins lucrativos, para explorar determinado(s) negócio(s), sem que nenhuma delas perca sua personalidade jurídica.
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3.2 - O CAMINHO A PERCORRER
Quando a multinacional de cigarros Philip Morris adquiriu a totalidade das ações da
fabricante de chocolates Lacta (ou quando a Plus Vita, da Santista Alimentos, comprou a tradicional
fabricante de pães Pullman), mais que aumentar sua participação de mercado essas empresas
estavam investindo em marcas já firmemente introjetadas na mente dos consumidores. O tempo e o
capital necessários para consolidar marcas com tamanha identidade junto ao consumidor muito
provavelmente inviabilizariam a intenção de uma empresa em atuar em determinado segmento em
posição satisfatória.
Não há fórmulas exatas para estimar quanto vale uma marca secular e reconhecida, como
Maizena ou Coca-Cola. Mas, em seu livro, Martins e Blecher oferecem algumas pistas
interessantes. Segundo eles, primeiro deve-se fazer uma projeção de vendas faturadas ao longo de
certo período, também considerando os elementos de marketing que referendam os investimentos.
Dessa forma, os conceitos de situação de mercado (marketing share, área de atuação, distribuição,
concorrência), de imagem (história, comprometimento ecológico, top of mind7, extensões de linha,
consumidores, embalagem), de números de marca (vendas, rentabilidade, consumo per capita,
preço) e de estado de marca (pesquisa e desenvolvimento, proteção legal, suporte de marketing,
ambientes econômicos e societários) serão traduzidos numericamente para uma projeção que aponta
o valor monetário da marca. Martins acredita que a marca bem-trabalhada é soberana, sobrevivendo
até a eventual má administração de uma empresa. Em casos mais graves, porém, a marca pode
sucumbir principalmente num ambiente que alie má gestão à falta de ética nos negócios.
Se por um lado a tradição de marcas líderes como Maizena, Johnson"s, Lacta e Coca-Cola
facilita a vida das empresas que as detêm, por outro cabe aos concorrentes trilhar novos caminhos
para que suas marcas também ganhem vida própria. Num mercado estabelecido há 20 anos, com o
advento do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), a Ticket é líder inconteste e
transformou seu principal produto - o tíquete-refeição - em sinônimo de um sistema que beneficia 6
milhões de trabalhadores brasileiros e movimenta US$ 6 bilhões por ano. Para também conseguir
seu lugar ao sol, a concorrente TransCheck se aliou ao Banco Real e transformou os gerentes da
rede bancária em verdadeiros relações públicas da empresa. A TransCheck passou a utilizar não só
o database do banco como também a habilidade dos profissionais do Real para detectar possíveis
empresas junto às quais a empresa poderia conseguir novos negócios, agilizando a conquista de
importantes pontos de participação de mercado. O resultado mais visível dessa estratégia foi que,
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em três anos de mercado, a TransCheck conseguiu chegar ao quinto lugar entre as 57 empresas do
setor de tíquete-refeição e conquistou o Top de Marketing de 1996, concedido pela Associação dos
Dirigentes de Vendas do Brasil (ADVB).
Para a TransCheck chegar a esse patamar, a agência Itapeva criou uma campanha
publicitária que brincava com o mote dos estabelecimentos credenciados, e de clientes como
McDonald"s e C&A. Para complementar as atividades de comunicação, a TransCheck também
apostou em descontos em restaurantes, iniciando o processo que visava agregar mais valor à sua
marca. Paralelamente, na área editorial criou folders voltados ao trade, com informações
atualizadas sobre a empresa e com o objetivo de oferecer soluções criativas para o negócio dos
proprietários de bares, lanchonetes e restaurantes. Nessa mesma linha, as tabulações de pesquisas de
preços das refeições por regiões brasileiras passaram a servir de índice para matérias jornalísticas.
Todas essas ações fizeram com que a TransCheck chegasse a um índice de popularidade
representado por 2 mil clientes - empresas cadastradas que oferecem o tíquete para os seus
funcionários. A conquista desse número expressivo também está intimamente ligada aos programas
motivacionais, que estimulam o pessoal de vendas com viagens e prêmios, e à comunicação
integrada com o mercado.
Para Jefferson Ribeiro Martins, diretor comercial e de marketing da TransCheck, o segredo
do bom desempenho da marca está na busca da agilidade e na permanente renovação criativa com
vistas a agregar mais valor ao serviço. Em junho de 1996, entrou em fase piloto o smart card da
empresa, que veio para abolir os tíquetes de papel. Do valor de face até o controle dos
estabelecimentos, tudo passou a ser feito eletronicamente, reduzindo o custo dos procedimentos e
acoplando à marca o status de praticidade e modernidade.
______________________
7 - Top of Mind é um termo em inglês utilizado na área de marketing empresarial, como uma maneira de qualificar as marcas que são mais populares na mente (mind em inglês) dos consumidores.
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3.3 - OS RISCOS DE SER LÍDER DE MERCADO
Assim como o SBT se notabilizou na segunda posição no ranking brasileiro de audiência de
TV, ser o segundo, terceiro ou quinto num mercado pulverizado pode ser melhor que estar em
primeiro lugar - posição em que os riscos provocados por algum deslize são bem maiores. Às vezes,
liderar um segmento de um determinado setor econômico pode produzir frutos melhores que os
colhidos das árvores de uma floresta fechada como a da aviação comercial brasileira, por exemplo.
Entre as grandes Varig, Vasp e Transbrasil, a TAM despontou no segmento das companhias
regionais. Quando todos olhavam com reservas, e mesmo com certo desdém, para as gentilezas e
para o tapete vermelho que o comandante Rolim Amaro literalmente estendia aos seus passageiros
nos aeroportos, o consumidor não só se surpreendeu com o padrão de atendimento da empresa
como também passou a preferir embarcar nos vôos da companhia. Resultado: a TAM bateu o
recorde brasileiro com o seu programa de fidelização de clientes, atingindo a marca de 100 mil
viagens gratuitas até março de 1996.
"A TAM descobriu que o passageiro estava acostumado a ser maltratado e precisava não só
de conforto, bons horários de vôo, pontualidade e segurança como também de atenção e, se
possível, de paparicos", revela Marilu Torres Candelária, diretora de marketing da TAM. Seja para
reclamar ou elogiar, o consumidor conta com canais diretos de comunicação com a empresa e com
seu presidente, o comandante Rolim, por meio do "Fale com o presidente" - sistema que pode ser
acionado por carta, telefone, fax ou Internet, com resposta em 24 horas. A relação dos clientes com
a companhia é ainda mais estreitada com a "Carta do Presidente", exposta no recosto dos bancos
das aeronaves e nos encontros pessoais no aeroporto, onde Rolim freqüentemente pode ser visto por
volta das 6 da manhã no check in de Congonhas, em São Paulo, ou na pista, ao pé da escada de seus
aviões.
Engana-se o consumidor que pensa que a TAM conquistou a fama que tem apenas com
propaganda. Dos US$ 15 milhões de verba de marketing, a maior parte vai para serviços de bordo e
para marketing direto. A propaganda, a cargo da agência Salles/DMB&B, vem como conseqüência
disso. Para reforçar a imagem da marca, a TAM atua fortemente na área editorial com dois jornais -
um voltado para o endomarketing, o XereTAMdo, e outro quinzenal, o TAM Notícias, ambos
distribuídos nos aeroportos e para um mailing de 250 mil clientes. Como toda companhia aérea, a
TAM terceiriza a edição da revista de bordo Classe e distribui em suas salas exclusivas de
embarque um reparte da revista Carta Capital. Por trás do "jeito TAM de voar" está um intenso
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trabalho de treinamento de pessoal, onde prevalece a cortesia que distingue a marca. O esforço foi
devidamente recompensado com o "Oscar" de melhor companhia aérea regional do mundo fora do
eixo Estados Unidos-Europa, concedido pela revista Air Transport World.
3.4 - NA SINTONIA DO MERCADO
Diante de um mercado competitivo, fica fácil identificar cada jogador. "Num ambiente bom,
todos ganham dinheiro. Mas quem tem boa marca, vende mais", diz o consultor José Roberto
Martins. Prova disso é o crescimento da indústria de perfumaria, que após o Plano Real deixou de
ser considerado supérfluo para experimentar uma intensa disputa com os itens importados. Com
essa alavanvagem, O Boticário não só conseguiu bons resultados de vendas, graças à sua rede de
franquias, como também é um dos fabricantes que mais investem em imagem institucional. De
acordo com Rogério Gusso, gerente de comunicação de O Boticário, dos US$ 5 milhões investidos
em marketing, US$ 3 milhões são destinados à propaganda desenvolvida pela agência W/Brasil. O
restante é gasto em promoção, ponto-de-venda e merchandising. No entanto, são ações paralelas
que dão o tom da comunicação de marca.
A atuação na comunidade, por exemplo, recebe verba especial da empresa. Para conjugar a
imagem de fabricante de produtos naturais com a ecologia, já foram destinados US$ 1 milhão para
o patrocínio de 330 projetos de proteção à natureza - o que faz de O Boticário um dos maiores
financiadores de projetos ambientais no Brasil. Na área da educação, em 2009 foram distribuídos
240 mil cadernos escolares para a rede paranaense de ensino oficial. A preocupação ambiental
estimulou a empresa a desenvolver, em sua fábrica de São José dos Pinhais (PR), uma estação de
tratamento que devolve à rede pública de esgotos os efluentes industriais já purificados.
Internamente, O Boticário move suas peças no sentido de treinar os 400 lojistas, responsáveis por
80% das vendas da empresa. O objetivo é aumentar o grau de profissionalização dos sistemas de
vendas e ouvir o consumidor por intermédio de um serviço de atendimento ao cliente. Esses canais
são ampliados com a edição de catálogos, manuais de produtos e com o jornal Dicas do Dr. Botica.
3.5 - HORA DE MOSTRAR VALOR
O que fazer quando uma empresa está com o caixa comprometido e já não suporta fazer
mais empréstimos? A solução, bem menos traumática que uma venda de ativos, pode estar na
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penhora da marca. Essa alternativa vem sendo a solução mais palatável para muitas empresas norte-
americanas em dificuldades, que optaram por utilizar suas marcas como garantia de pagamento. Se
a empresa não honrar a dívida, o investidor ganha os direitos de aquisição da marca. Em geral, o
acerto envolve investidores internacionais com alguma dificuldade de penetração em certos setores
de produção e, portanto, com grande interesse na transação.
Foi analisando esse tipo de negócio, especialmente no setor de fusões e aquisições de
instituições bancárias, que o executivo José Roberto Martins iniciou seus estudos sobre brand
bonds (bônus de marca). Sua experiência na área de finanças, aliada à importância que descobriu no
valor que as marcas têm no mercado, levou-o à ideia de publicar um livro sobre o assunto. Para
ilustrar a teoria, Martins incluiu em sua obra contéudos jornalísticos que mostram, na prática, o que
aconteceu recentemente a empresas vencedoras e também a outras que se atrapalharam na
manutenção de suas marcas. Para lançar "O império das marcas", publicado pela Marcos Cobra
Editora, Martins se aliou ao jornalista Nelson Blecher, editor-executivo da revista Exame com
passagens pela Folha de S.Paulo e Meio & Mensagem - veículos de onde pôde acompanhar vários
casos de marcas.
Nesse livro, os autores relatam o valor que uma marca bem-administrada pode alcançar no
mercado, fato muitas vezes ignorado no momento de avaliação do patrimônio de uma empresa.
"Apesar dos esforços voltados para marketing e propaganda, as empresas ainda não perceberam que
todo esse investimento não só dá suporte a vendas como também auxilia na construção e
valorização da marca", explica Martins. Ele acredita que, em comparação com outros mercados, as
marcas brasileiras são vendidas a preço de banana. A tese se confirma quando se analisa a aquisição
da indústria brasileira de linha branca Prosdócimo pela multinacional Electrolux, por cerca de US$
130 milhões, quando seu faturamento atingiu US$ 430 milhões em 1995. Nos Estados Unidos,
quando se trata de uma marca bem-posicionada acrescenta-se uma porcentagem sobre a projeção de
faturamento. No segmento de chocolates, por exemplo, essa margem chega a cerca de 1,2% sobre o
faturamento estimado.
A seguir, as 20 marcas mais valiosas do mundo:
AS 20 MARCAS
MAIS VALIOSAS DO MUNDO*
Marca Valor em Valor em
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1995 1994
Coca-Cola 39,05 35,95
Marlboro 38,71 33,04
IBM 17,15 negativo
Motorola 15,28 9,29
Hewlett-Packard 13,17 6,99
Microsoft 11,74 9,84
Kodak 11,59 10,02
Budweiser 11,35 9,72
Kellogg’s 11,00 9,37
Nescafé 10,34 11,54
Intel 9,71 6,48
Gillete 9,67 8,21
Pepsi 7,81 4,93
GE 7,42 5,71
Frito-Lay 6,92 5,90
Levi"s 6,92 5,14
Compac 6,89 4,00
Bacardi 6,54 7,16
Campbell"s 5,96 4,63
Pampers 5,92 5,73
Total 253,14 193,65
Fonte: Financial World, 1 de agosto de 1995
(* valores expressos em bilhões de dólares)
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CAPÍTULO IV - A INSERÇÃO DAS MARCAS NO MERCADO MUNDIAL
Os empresários nacionais estão acordando para o fato de que uma marca forte possibilita o
estabelecimento de um consumidor fiel e o desenvolvimento de um fundo de comércio que pode
gerar enormes vantagens na conquista de mercado.
Uma marca famosa é um poderoso sinal capaz de transmitir ao consumidor uma série de
valores e desejos que o empresário quer associar ao produto, a fim de maximizar os lucros da
empresa. Após perceber a importância da marca para o seu negócio local, é importante dar o
segundo passo, reconhecendo que a força de uma marca conhecida ultrapassa fronteiras e requer
proteção adequada.
É líquido e certo que a ampliação de mercados não apenas no Brasil, assim como no
exterior, é atualmente um objetivo perseguido por empresas de pequeno, médio e grande porte.
No entanto, quando se pensa em ampliação de mercados e exportação, as primeiras preocupações
de um empresário estão relacionadas ao potencial de sucesso de seu produto ou serviço, quais
sejam: realizar pesquisas de mercado, verificar barreiras, normas para importação do produto nos
países de interesse, certificações internacionais e, talvez até mesmo, com o processo de exportação
propriamente dito, buscando compreender o funcionamento do SISCOMEX - sistema integrado de
comércio exterior.
Curiosamente, a última preocupação do empresário será com a proteção da marca de seu
produto ou serviço e, quando isso ocorre, geralmente é feita apenas no Brasil, mesmo porque muitas
vezes o produto ou o serviço no exterior aparece sob marca de terceiro que os importa.
Ingenuamente, ao deixar que o importador utilize uma marca diferente, o empresário
nacional está perdendo uma excelente oportunidade de conquistar seu público-alvo, no exterior,
através da expansão do valor de sua marca. Sem contar que se torna mais fácil para o importador
trocar de fornecedor se detiver o controle da marca.
De maneira pior acontece se o empresário nacional, por descaso ou desconhecimento,
permite o registro de marca idêntica pelo importador no país de destino dos produtos. Nesse caso,
poderá ter de enfrentar uma batalha judicial demorada e dispendiosa para ter o direito de utilizar a
marca, em caso de a relação com o importador local terminar.
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A ausência de proteção para marcas no exterior é o que comprova uma pesquisa realizada
recentemente pela Federação e o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP/CIESP), por
meio de questionário respondido por 1.193 empresas.
Dessas empresas, aproximadamente 80% nunca registraram marcas no exterior e 61%
tiveram problemas com piratas no Mercosul, para onde o Brasil exportou, somente em 2003, mais
de 5 bilhões de dólares FOB8. Em vista disso, o empresário brasileiro não pode conceber a ideia de
exportar seu produto, sem se preocupar com a proteção de sua marca no exterior.
O empresário deve ter em mente, em primeiro lugar, que o registro, cujo órgão competente,
no Brasil, é o INPI, permite que o seu titular adquira a propriedade sobre a marca e possa fazer uso
de uma série de medidas legais para impedir que concorrentes se utilizem de marcas idênticas ou
semelhantes para identificar produtos ou serviços relacionados.
Todavia, é importante estar ciente de que o registro da marca no INPI só garante a
propriedade da marca no Brasil. Por isso, a importância de se registrar a marca internacionalmente
mesmo que já disponha de registro no País.
Outra precaução relevante é a inclusão de um programa de registro de marcas no exterior
como um dos itens do planejamento de médio prazo das empresas, visto que é cada vez mais
comum os casos de registro no exterior de marcas nacionais de sucesso por terceiros atentos ao que
ocorre no Brasil, em especial os países de língua portuguesa e espanhola, este úlimo idioma devido
à proximidade fonética com a língua portuguesa. A demora nesses casos pode custar caro.
Um programa de registros de marcas no exterior deve ser feito por um profissional com
experiência na área, preferencialmente um agente da propriedade industrial, capaz de fazer uso
correto das diversas opções disponíveis por meio de acordos internacionais.
Existe, portanto, um leque de opções à espera dos empresários nacionais que souberem proteger e
estender a reputação de suas marcas para o exterior. Basta ser um dos desbravadores para colher os
frutos dessa iniciativa!
______________ 8 - designa uma modalidade de repartição de responsabilidades, direitos e custos entre comprador e vendedor, no comércio de mercadorias. O termo é incluído na listagem dos Incoterm (International Commercial Terms), estabelecidos pela Câmara de Comércio Internacional como fórmulas contratuais que fixam direitos e obrigações, tanto do exportador como do importador, estabelecendo com precisão o que está incluído no preço negociado entre ambas as partes.
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CAPÍTULO V - PROPRIEDADE INTELECTUAL E O PODER ECONÔMICO
A imprensa vem publicando várias matérias sobre o descompasso entre a produção científica
do nosso país e sua transformação em patentes suscetíveis de assegurar resultados econômicos.
Tornou-se antológica, nesse aspecto, a comparação com a Coréia, onde cerca de 75 mil
pesquisadores trabalham em inovação tecnológica nas empresas, contra apenas 9 mil no Brasil. É
inevitável citar a lentidão do processamento de pedidos de registro de marca e de requerimentos de
patente, atribuíveis à ausência de um programa consistente para permitir que o Instituto Nacional da
Propriedade Industrial (INPI), órgão responsável pelo setor, lute por condições adequadas para
execer sua função. Exemplo disso é o comentário de um empresário capixaba, publicado na Gazeta
Mercantil, que, por conta da morosidade, acabou desitindo de patentear um produto criado por sua
empresa.
O assunto se faz propício em um momento em que o Brasil, vai, novamente, para o divã,
sufocado por uma tríade de problemas: energia, ética, identidade. O país do sol, sem luz; da
solidariedade, em crise ética; do futebol, berço dos melhores jogadores do mundo, que nem chegou
à final no último campeonato mundial; da criatividade, com poucas patentes.
Entretanto, essa crise também atinge outros países do grupo considerado desenvolvido, até
mesmo nesses setores, mas um fator que lhes dá sustentação, evitando que se desorientem, é a
aposta na capacidade de geração de tecnologia e conquista de mercados, traduzida na
disponibilidade de crédito e na oferta de segurança jurídica, mediante concessão de patentes e
registros de marcas.
Infelizmente, o brasileiro tende a reagir de forma conformista diante dos problemas sócio-
econômicos do País. A verdade é que complexo de inferioridade e simples destilação de azedume
contra o poder nunca levaram a resultado algum. Isso porque o poder de países como os Estados
Undidos não emana de qualquer fórmula mágica, mas sim da soma de força de suas empresas,
resultando em uma postura histórica de crédito, à capacidade de criar e à disposição para correr
riscos.
Ademais, participam desse somatório inúmeros cientistas e empresários brasileiros que,
desencantados com a falta de condições de investir no Brasil, emigram e oferecem sua mão-de-obra
a outros países. É assim que inventos como o câmbio automático, de autoria de um brasileiro, são
atribuídos aos Estados Unidos. Da mesma forma, perdemos para outros países a primazia na
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obtenção de patente para produtos pioneiros, como o Captopril, produto para redução da pressão
arterial, patenteado naquele país a partir de uma substância descoberta por um professor brasileiro
que não encontrou apoio financeiro para a conclusão de suas pesquisas.
Assim sendo, a posição marginal do Brasil não é obra da 'moira-grega'9, mas da falta de
conscientização do valor de bens não corpóreos, que são, hoje mais do que nunca, as grandes
engrenagens do desenvolvimento. Esse pensamento tem como pano de fundo uma cultura que só
atribui valor patrimonial a objetos sensíveis e que, com fobia de perda, criou o curioso modelo de
capitalismo sem risco.
É fato que nossas crises seriam muito menos penosas se, na retaguarda, contássemos com
uma multiplicação de medidas de estímulo à inventiva e à criação de mercados mediante marcas
fortes. Nenhum país do clube dos desenvolvidos cresceu sem isso. A situação do Brasil, nessa
área, é dramática. São poucas as empresas que atentam para o problema. Ao mesmo tempo, não se
vê, por parte do Estado, um programa contínuo e consistente para capacitar o INPI a atender a
demanda de serviços, que cresce proporcionalmente à envergadura do País. Pelo contrário: se, de
um lado, aumenta o número de processos, encolhe o órgão que, de mãos atadas, impedido de
contratar, viu cair de 860 para 550 o número de seus servidores.
Uma das fontes desse problema crônico é a utopia de que propriedade industrial é matéria de
interesse apenas das grandes potências, quando é a causa e não o efeito da riqueza de um país.
Propriedade Industrial é uma 'catapulta' para o crescimento, útil, sobretudo a pequenas e médias
empresas. Ao tratá-la inadequadamente, o Brasil frustra seus pesquisadores e empresários, perde
capacidade inventiva e mercados, além de estimular o deslocamento de cientistas e pessoas com
capacidade empresarial para países onde seu trabalho será mais bem remunerado e reconhecido.
Na verdade, a Propriedade Industrial nada mais é do que uma ferramenta jurídica de
fundamental utilidade a todos os que fazem pesquisa e desenvolvimento de produtos e pretendem
criar mercados com marca própria. O engenho e a capacidade empresarial não têm pátria: florescem
onde forem regados por mecanismos que os estimulem.
É preciso que a Propriedade Industrial seja, cada vez mais, objeto de debate desapaixonado
para que se desfaçam diversos mitos que a cercam, sobretudo a fantasia de que só serve a interesses
estrangeiros, quando, na verdade, serve ao homem e ao país que a trate adequadamente.
_______________ 9 - Na mitologia grega, as Moiras eram as três irmãs que determinavam o destino, tanto dos deuses, quanto dos seres
humanos.
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CONCLUSÃO
Considerando-se o que foi exposto anterioremente, pode-se afirmar que a construção de uma
marca forte e valiosa é um longo processo, que vem se tornando cada vez mais estratégico. Uma
marca forte é um instrumento valioso para fidelização, podendo ser vista como a menor distância
entre o produto ou serviço e o consumidor.
A falta de identidade acaba por enfraquecer a identificação dos clientes com a empresa, o
que aumenta os esforços de marketing e vendas para conquistar novas oportunidades e clientes.
Sem uma identidade da marca forte, as empresas acabam não conseguindo transmitir um valor
agregado dos seus produtos de maneira fácil e os clientes acabam tendo uma visão limitada da
oferta.
Com uma identidade forte da marca, as empresas acabam por criar vantagens competitivas,
os clientes creditam mais confiança na empresa e em sua oferta. Os clientes enxergam mais valor
agregado da oferta.
O poder das marcas está nas mãos do cliente. É necessário perceber a identidade da empresa
e transparecê-la para fora, para os possíveis consumidores. Somente com isso, as empresas
prosperarão.
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BIBLIOGRAFIA
BARBOSA, Denis Borges. Uma introdução à propriedade industrial, vols. I e II, 2ª ed., Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1997. BLECHER, Nelson & MARTINS J. R. O império das marcas. Editora: Negócio, 1997.
CARNEIRO, Borges Rodrigo. A inserção das marcas no mercado mundial. Artigo publicado no
suplemento "Marcas de Quem Decide" do Jornal do Comércio - RS em 28 de março de 2005
CORREA, FARIA José Antonio. Propriedade Intelectual e Poder Econômico. Artigo publicado
na Gazeta Mercantil em 17 de julho de 2001.
DANNEMANN SIEMSEN BIGLER & IPANEMA MOREIRA. Comentários à Lei da Propriedade Industrial, Editora Renovar, 2000. DRUMMOND, de Andrade Carlos. Os dias mais lindos. 9ª Edição. 2003 FURTADO, Lucas Rocha. Sistema de propriedade industrial no direito brasileiro – comentários à nova legislação sobre marcas e patentes, Ed. Brasília Jurídica, 1996.
KLEIN, Naomi; Sem logo: a tirania das marcas em um planeta vendido; Rio de Janeiro; Record; 2004 (Versão em inglês: NO LOGO: taking aim at the brand bullies; edição de Vintage Canada e division of Random House of Canada Limited)
LOBO, Thomaz Thedim. Introdução à nova Lei de Propriedade Industrial: Lei 8279-96. São Paulo: Atlas, 1997.
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