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UNIVERSIDAD SAN LORENZO - UNISAL DIRECCION DE POSTGRADOS O IMPACTO DO ARQUÉTIPO DOCENTE NA CONSTITUIÇÃO IDENTITÁRIA DOS ALUNOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL FRANCISCA SEPÚLVEDA SALES DISSERTACIÓN MESTRADO EN CIENCIAS DE LA EDUCACION ASUNCIÓN - PARAGUAY 2012

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UNIVERSIDAD SAN LORENZO - UNISAL

DIRECCION DE POSTGRADOS

O IMPACTO DO ARQUÉTIPO DOCENTE NA

CONSTITUIÇÃO

IDENTITÁRIA DOS ALUNOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

FRANCISCA SEPÚLVEDA SALES

DISSERTACIÓN

MESTRADO EN CIENCIAS DE LA EDUCACION

ASUNCIÓN - PARAGUAY

2012

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UNIVERSIDAD SAN LORENZO - UNISAL

DIRECCION DE POSTGRADOS

O IMPACTO DO ARQUÉTIPO DOCENTE NA

CONSTITUIÇÃO

IDENTITÁRIA DOS ALUNOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

FRANCISCA SEPÚLVEDA SALES

Disssertación presentada como requisito para la obtención del Título de

Maestria en Ciencias de la Educación.

Asunción - Paraguay

2012

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OBSERVACION

“Ni la Universidad, ni la Mesa Examinadora serán

responsables de las ideas expuestas por el estudiante en

el presente trabajo”.

Reglamento de Trabajo de Post-grado, Universidad Evangélica del

Paraguay.

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AGRADECIMENTOS

Aos meus familiares que compreenderam e

apoiaram o meu desejo de crescer em

conhecimentos e permitiram que eu compartilhasse

com eles as dificuldades e sucessos surgidos

durante a realização desse estudo.

Aos professores, orientadores e colegas que

contribuíram para meu crescimento profissional e

pessoal.

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DEDICATÓRIA

(In memorian)

À minha professora “das primeiras letras”, Maria

de Nazaré Paiva Dias, cuja postura construiu em

mim o ideário do arquétipo docente que, não raro,

surge surpreendentemente na minha prática

educativa.

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RESUMO

Procurar explicar o que é personalidade e como ela é construída, tem sido uma tarefa

constante do homem e remonta aos primórdios da história da humanidade. Partindo-se dos

estudos de Hipócrates há mais de 300 anos antes de Cristo até as recentes pesquisas das

Neurociências e Engenharia Genética, muitas teorias foram entusiasticamente defendidas. De

maneira extremada surgiram teorias que descartam a possibilidade de influência do meio

sobre o desenvolvimento psicoemocional do ser humano, da mesma forma que outras

defendem o contrário, baseando-se na existência de diferentes personalidades apresentadas

pelas pessoas apesar de compartilharem 99,99% de seus genes. Hoje a personalidade é

concebida como uma combinação de elementos biopsicossociais. Isso valida a teoria

psicanalista sobre o tema, comprovando a influência do Outro no processo de individuação do

sujeito. Estas constatações deram corpo ao presente estudo que teve como objetivo investigar

como o arquétipo docente influencia na formação da personalidade da criança na Educação

infantil, período no qual aspectos relevantes da personalidade são invariavelmente definidos

conforme postula a Psicanálise. Empregou-se o método observacional e entrevistas semi-

estruturadas junto ao corpo docente composto por 5 professoras e 98 crianças de 3 a 5 anos de

uma escola privada durante o ano de 2010, concluindo-se que é considerável a influência do

professor na formação da personalidade das crianças, bem como a necessidade de mudanças

nos currículos dos cursos de formação de professores de modo a capacitá-los a construir um

espaço escolar onde docente e alunos sintam-se potencializados no processo ensino-

aprendizagem, gerando adultos psicologicamente sadios.

Palavras-chave: arquétipo docente - influência - personalidade

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RESUMEN

Buscar la explicación de lo que es personalidad y cómo ella es construida, ha sido una tarea

constante del hombre y remonta al principio de la historia de la humanidad. Partiéndose de los

estudios de Hipócrates hace más de 300 años antes de Cristo hasta las recientes pesquisas de

las Neurociencias y Ingeniaría Genética, muchas teorías fueron entusiásticamente defendidas.

De forma extremada surgieron teorías que descartan la posibilidad de influencia del medio

sobre el desarrollo psicoemocional del ser humano, de la misma forma que otras defienden lo

contrario, basándose en la existencia de diferentes personalidades presentadas por las

personas a pesar de compartir 99, 99% de sus genes. Hoy la personalidad es concebida como

una combinación de elementos biopsicosociales. Eso valida la teoría psicoanalista sobre el

tema, comprobando la influencia del Otro en el proceso de individuación del sujeto. Estas

constataciones dieron cuerpo al presente estudio que tuvo como objetivo investigar cómo o

arquetipo docente influencian en la formación de la personalidad del niño en la Educación

infantil, periodo en el cual aspectos relevantes de la personalidad son invariablemente

definidos conforme postula la Psicoanálisis. Para tanto, se empleó el método observacional y

encuestas semi-estructuradas junto al cuerpo docente compuesto por 5 profesoras y discente

compuesto por 98 niños de 3 a 5 años de una escuela privada durante el año de 2010,

concluyéndose que es considerable la influencia del profesor en la formación de la

personalidad de los niños, bien como la necesidad de cambios en los currículos de los cursos

de formación de profesores de modo a capacitarlos a construir un espacio escolar donde

docente y alumnos se sientan potencializados en el proceso enseñanza-aprendizaje, generando

adultos psicológicamente sanos.

Palabras-clave: arquetipo docente - influencia - personalidad

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SUMÁRIO

CAPÍTULO I. ............................................................................................................................. 9

INCONSCIENTE COLETIVO ................................................ Error! Bookmark not defined.

1.1. MITOS E SÍMBOLOS ........................................................................................................ 9

1.1 TEMA ................................................................................................................................. 13

1.2 TÍTULO .............................................................................................................................. 14

1.3 DELIMITAÇÃO ................................................................................................................ 14

1.4 PROBLEMA ...................................................................................................................... 14

1.5 HIPÓTESES ....................................................................................................................... 14

1.6 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................... 14

1.7 OBJETIVOS ....................................................................................................................... 20

1.7.1 GERAL ............................................................................................................................ 20

1.7.2 ESPECÍFICOS ................................................................................................................ 20

1.8 METODOLOGIA ............................................................................................................... 20

1.9 FORMULAÇÃO/CARACTERIZAÇÃO DO PROBLEMA ............................................. 22

1.10 HIPÓTESES ..................................................................................................................... 23

1.11 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................. 24

1.2.1. ARQUÉTIPOS: PLURALIDADE E INFLUÊNCIAS .................................................. 27

CAPÍTULO II ........................................................................................................................... 42

O PROCESSO DE INDIVIDUAÇÃO ..................................................................................... 42

2. 1. CONSTRUÇÃO DA PERSONALIDADE E IDENTIDADE ......................................... 42

2.2 DOCENTE COMO FATOR DETERMINANTE NA FORMAÇÃO DO ALUNO .......... 62

2. 3. RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO NA CONCEPÇÃO DA PSICANÁLISE ............... 63

CAPÍTULO III. ........................................................................................................................ 78

METODOLOGIA E VALIDAÇÃO DA PESQUISA ............................................................. 78

3. 1. METODOLOGIA ............................................................................................................. 78

3. 2. RESULTADOS E DISCUSSÃO ..................................................................................... 79

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................... 88

REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO ....................................................................................... 92

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CAPÍTULO I.

INCONSCIENTE COLETIVO

1.12 MITOS E SÍMBOLOS

Os mitos surgiram na antiguidade como uma tentativa de explicar a realidade. O

tempo passou e hoje eles permanecem vivos no nosso inconsciente, influenciando a vida

consciente através de símbolos imortais.

O mito é um ingrediente vital da civilização humana; longe de ser uma fabulação vã,

ele é, ao contrário, uma realidade viva, à qual se recorre incessantemente; não é,

absolutamente, uma teoria abstrata ou uma fantasia artística, mas uma verdadeira codificação

da religião primitiva e da sabedoria prática.

A figura feminina para o homem tem sido, ao longo dos séculos, a inspiradora nas

suas descobertas e feitos heróicos. Tomando a mitologia como ilustração, percebemos em

Ariadne a imagem da anima, cuja promessa de amor não apenas inspira a luta de Teseu contra

o Minotauro - o aspecto sombrio e monstruoso do herói - mas também fornece-lhe o fio

condutor para um retorno seguro para fora do labirinto. Ela é ao mesmo tempo a musa que

inspira a luta heróica e a luz que aponta a saída da escuridão do inconsciente. Deusas, divas,

pin-ups, modelos e artistas são o objeto dessa projeção arquetípica e inspiram desde sempre os

feitos heróicos, artísticos e científicos que dão sentido à busca da individualidade.

Enquanto a anima se associa à receptividade afetiva no homem, o animus representa

sistemas de avaliação e capacidade de julgamento. Assim, liga-se a convicções por vezes

indiferenciadas, com a mulher passando a ter certezas absolutas e valores extremamente

rígidos. Em seu aspecto criativo, o animus liga a mulher à capacidade de discriminação, às

atitudes e iniciativas construtivas de modo consciente. Por meio dele, ela aprende a aceitar a

reparação, a independência e a responsabilidade por suas reações emocionais. Geralmente o

animus é projetado em figuras de professores, líderes e figuras de autoridade que inspiram às

mulheres a realização de seu potencial no mundo externo e a saída dos recônditos do mundo

familiar. Entretanto, quando a união entre mãe e filha é tão intensa que a possibilidade de um

casamento é sentida quase como um ato de ruptura abrupta, figuras de homem-vilão podem

emergir.

E a história de Perséfone, a jovem inocente, filha da grande mãe Deméter, que um dia

é raptada por Hades, o rei do mundo inferior, quando passeava pelos campos floridos. Aqui,

Hades representa a imagem do animus que transporta Perséfone para outra dimensão,

retirando-a das limitações do mundo conhecido. A mesma temática pode ser percebida em

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novelas e filmes em que o homem-vilão desempenha o papel daquele que abre por vezes

dolorosamente os horizontes e dá, apesar do sofrimento, novas perspectivas para o

desenvolvimento do potencial da mulher.

Etimologicamente a palavra símbolo vem do grego sym = juntar, unir, - balein = em

direção a uma meta, um objetivo. Nesse sentido, symbalein significava, na antiga Grécia, o

ato de unir duas metades de uma mesma moeda que fora partida na separação de duas

pessoas. Quando uma delas desejava enviar uma mensagem importante à outra, o mensageiro

trazia consigo uma das metades da moeda. Desse modo, o destinatário da mensagem poderia

verificar sua autenticidade ao constatar a perfeita união das duas metades (uma conhecida,

outra incógnita) .

A palavra "símbolo" passou a ser empregada para designar a união de opostos - algo

conhecido, consciente, com algo desconhecido, inconsciente. Como aquilo que é

desconhecido tem um valor afetivo, o símbolo sempre desperta uma emoção. É esse o aspecto

numinoso do símbolo: ele aponta uma conexão entre aspectos conscientes e inconscientes de

um mesmo fenômeno. Por mais que saibamos o significado racional das cores e forma de uma

bandeira, é quase impossível não nos emocionarmos quando a vemos tremulando num evento

de importância internacional, por exemplo.

Assim, o símbolo sempre contém um aspecto irracional e tem um enorme poder de

mobilização. Ele pode provocar grandes transformações de caráter estruturante, mas também

conflitos étnicos e religiosos. Podemos perceber o símbolo em formas concretas, como

bandeiras, slogans e hinos, ou em eventos como a queda do muro de Berlim, a derrubada da

estátua de Stalin ou de Saddan Hussein. O símbolo representa a conexão com a energia

arquetípica necessária para a consecução de feitos que alteram o estado das coisas e podem

trazer novas soluções para conflitos aparentemente insolúveis.

Grandes invenções tiveram o símbolo como mediador do processo de conhecimento,

como conta a história da descoberta do anel de benzol. Kekulé, químico alemão do século

XIX, que tentava, com pouco sucesso, descobrir a estrutura química do benzeno, sonhou que

as moléculas se reuniam na forma de serpentes. Quando uma delas mordeu a própria cauda,

Kekulé entendeu subitamente que a estrutura era um anel, dando um grande passo no progres-

so da química.

Em outros momentos, o símbolo é o elemento que traz nova luz a uma situação

aparentemente sem saída. Um jovem executivo bem-sucedido de 42 anos, solteiro e muito

disputado pelas mulheres, achava-se bastante deprimido e desmotivado, pois, segundo sua

própria opinião, "já havia alcançado o topo de tudo que desejava, nada mais restando a fazer".

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Um sonho esclarece bem sua situação, revelando o perigo em que se encontrava. Sonhou que

estava numa nave espacial de última geração, brilhante e prateada, que de repente despencou,

caindo num charco na periferia da cidade. Imediatamente, mendigos sujos e maltrapilhos in-

vadem a nave e roubam tudo que é precioso. Percebemos dessa forma que o sonhador estava

vivendo com uma atitude de superioridade, inflada, cindido de seus aspectos mais simples e

humildes, correndo o risco de tudo perder. Esses aspectos menosprezados ou reprimidos pela

atitude consciente podem surgir nos sonhos em figuras de mendigos maltrapilhos, ladrões,

personagens estrangeiros ou de constituição física oposta. Podem aparecer também nos

preconceitos, atos falhos, os lapsos de língua, como o de uma jovem que, aterrorizada perante

seu professor de física, um homem muito severo e repressor, ao tentar entender uma

formulação complexa sobre o movimento parabólico, pergunta aos colegas: "O que é mo-

vimento paralítico?". A situação provavelmente provocou a emergência de um complexo

paterno autoritário projetado sobre a figura do professor, paralisando a jovem na sua

capacidade de pensar.

Assim, os complexos fazem parte do nosso inconsciente pessoal, isto é, da sombra, e

são responsáveis em grande parte por nossos comportamentos mais aberrantes e desadaptados

à realidade. Podem levar, por exemplo, um pai de família calmo e tranquilo a se tornar um

assassino em potencial, quando provocado no trânsito. Nesse momento, o complexo de

inferioridade assume o controle, subjuga o ego e uma enorme quantidade de energia é

despendida na tarefa de vencer um adversário "imaginário". Sob a ótica da psicologia

analítica, esse adversário intangível é projetado sobre um motorista desconhecido que

inadvertidamente deflagra a atitude defensiva, a qual por sua vez vinha protegendo o pacato

pai de família contra seu próprio sofrimento inconsciente, cerne do complexo. Esse

sofrimento pode ter origem em um conflito, recente ou primitivo, mas de todo modo

inacessível à consciência.

Os complexos também se manifestam no plano da identidade de uma sociedade e são

chamados de complexos culturais. No Brasil, o complexo cultural mais evidente é o senti-

mento de inferioridade, presente nas relações dos brasileiros com o mundo exterior. A

supervalorização do que é estrangeiro em detrimento do produto nacional, atitudes

autodepreciativas presentes em piadas e na falta de valorização de tudo que é nativo, têm

contribuído em grande parte para a tolerância com corrupção, quebra da lei, favoritismos e

outros comportamentos espúrios por parte, principalmente, de figuras de autoridade. Somente

a consciência desse complexo, cuja raiz remonta à época do Descobrimento e da escravidão,

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possibilitará a recuperação da auto-estima, dando a real dimensão do valor da identidade

brasileira.

Embora a incorporação dos elementos inconscientes na consciência seja um processo

lento e doloroso, cada passo nessa direção, mesmo que comece por um pequeno grupo,

certamente contribuirá para uma melhora na qualidade de vida de todos. O desenvolvimento

da consciência traz também um aumento no padrão ético. O comportamento moral e a saúde

mental sem dúvida são a base de uma sociedade saudável.

Jung, na sua última entrevista (l959) , aos 84 anos, disse para um repórter da BBC de

Londres que precisaríamos cada vez mais da psicologia, pois todo mal que haveria por vir

partiria do próprio homem. A história continua como testemunha dessa verdade, mas também

podemos dizer que todo bem que está por vir só depende do desenvolvimento de nossa

consciência.

O símbolo é a expressão de um conceito de equivalência. Assim, para se atingir o

mito, que se expressa por símbolos, é preciso fazer uma equivalência, uma "con-jugação",

uma "re-união", porque, se o signo é sempre menor do que o conceito que representa, o

símbolo representa sempre mais do que seu significado evidente e imediato.

Jung vê nos símbolos uma função de mediação, uma tentativa de mudar a atitude

consciente e levar ao caminho da individuação. A psicologia analítica fala de funções auto-

reguladoras na psique. Estas funções auto-reguladoras ou compensatórias funcionam como

uma ligação entre consciente e inconsciente. O símbolo faz esta ligação.

A compensação é a expressão do processo de individuação. Este vai se fazendo em

termos de discriminação e síntese de opostos. A síntese de opostos vai propiciando uma busca

de equilíbrio e auto-regulação. Jung define este processo como compensação, significando

uma retificação automática a partir do inconsciente de um desequilíbrio ou de uma atitude

unilateral na consciência. Esta retificação, em geral, vai ocorrer pelos símbolos do

inconsciente que aparecem nos sonhos, no relato verbal do paciente, ou nas técnicas de

mobilização de símbolos utilizados pelos analistas junguianos. Analisando uma série de

sonhos, podemos perceber o significado dos símbolos e, relacionando-os com a vida

consciente, modificar a atitude egóica. Desta forma, estaremos propiciando que a

compensação se faça, e retomamos o nosso caminho de individuação.

Como uma forma de buscar o equilíbrio psiquico, Jung defendia que era necessário

retomar símbolos contrários à atitude consciente e apresentar uma possibilidade diferente da

unilateralidade da vida consciente.

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Por exemplo: uma pessoa que sonha estar voando. Pode ser que este sonho esteja

apontando para uma necessidade de ficar com os pés mais presos no chão, isto é, encarar a

realidade mais de frente e parar de idealizar os fatos vividos.

Para a psicologia junguiana, o inconsciente, como matriz formadora dos sonhos (e dos

símbolos) , tem uma função independente. Isto é o que Jung chamou de "autonomia do

inconsciente".

Jung, definiu a compensação como um processo psíquico diferente da mera

complementação:

. . . O complemento é um conceito muito limitado e muito limitativo, e por isso não

é capaz de explicar, de maneira satisfatória, a função onírica. Com efeito, ele

designa uma relação em que duas ou mais coisas se complementam, por assim dizer,

forçosamente. A compensação, pelo contrário, é como o próprio termo está dizendo,

uma confrontação e uma comparação entre diferentes dados ou diferentes pontos de

vista, da qual resulta um equilíbrio ou uma retiticação. (BOECHAT, 2007, p. 56

apud JUNG, 1978)

Desta forma, se a atitude consciente estiver unilateral, o sonho mostrará o outro lado e,

se estiver adequada, o sonho vai reforçá-la.

Ainda falando de compensação, Jung diz:

Embora, na imensa maioria dos casos, a compensação tenha por fim estabelecer um

equilíbrio psíquico normal, e se comporte como uma espécie de auto-regulação do

sistema psíquico, contudo não podemos simplesmente nos contentar com esta

verificação, pois a compensação, em certas condições e em determinados casos

(como por exemplo nas psicoses latentes) , pode levar a um desenlace fatal

(predomínio das tendências destrutivas) . (BOECHAT, 2007, p. 57 apud JUNG,

1978)

Jung denominou a conexão de opostos que se expressam por meio de símbolos, de

função transcendente. Essa função seria a capacidade da psique formar um símbolo

unificador, ou seja, trazer à consciência uma imagem para solucionar um conflito psiquico.

De acordo com Samuels:

Jung considerava a função trancendente como o fator mais significante no processo

psicológico. Insistia que sua intervenção era devida ao conflito entre opostos, mas

não se interessava pela razão por que isso acontecia, concentrando-se, em vez disso,

n aquestão “para que”. (BOECHAT, 2007, p. 58 apud SAMUELS, 1985)

1.1. TEMA

A constituição identitária da criança no espaço escolar sob a óptica da psicanálise.

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1.2. TÍTULO

O impacto do arquétipo docente na constituição identitária dos alunos na educação infantil.

1.3. DELIMITAÇÃO

O impacto do arquétipo docente na constituição identitária dos alunos na educação infantil do

instituto de desenvolvimento educacional de altos-piauí

1.4. PROBLEMA

Em que medida / intensidade o arquétipo docente influencia na formação identitária do aluno

na educação infantil?

1.5. HIPÓTESES

1 – A desestruturação familiar, comum na sociedade atual, dificulta a ação do docente

gerando conflitos durante o processo de individuação da criança.

2 – A existência de problemas na formação da personalidade das crianças durante a educação

infantil é reforçada devido ao fato de o professor desconhecer a influência que exerce sobre

seus alunos.

1.6 JUSTIFICATIVA

Na visão da Psicanálise o ser humano não nasce com um Eu (sujeito psiquico) pronto,

mas irá construí-lo a partir de si e de suas interações familiares e sociais. Como as relações e

influências dos cinco primeiros anos de vida são de extrema importância na determinação da

personalidade humana e é justamente neste período que a criança ingressa na escola, onde

novas e diferentes relações ela manterá, faz-se necessário investigar a intensidade da

influência do arquétipo docente sobre a formação da personalidade da criança/aprendiz, isto

porque o professor é visto como um modelo. Acrescente-se a isso, o fato já comprovado, de

que a criança tende a imitar os adultos com os quais convive.

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1.7 OBJETIVOS

1.7.1 GERAL

# Investigar como valores marcantes da personalidade do docente influenciam na formação da

personalidade da criança na Educação infantil.

1.7.2 ESPECÍFICOS

# Comprovar a influência do arquétipo docente na formação da personalidade da criança

durante a Educação infantil.

# Constatar a intensidade da transferência e contra-transferência de valores na prática docente

durante a Educação infantil.

# Verificar a importância da Psicanálise na construção de um espaço escolar, onde docente e

aluno sintam-se potencializados no processo de ensino-aprendizagem com análise de dados e

resultados da Pesquisa.

1.8 METODOLOGIA

MÉTODO:

- Observacional

- Entrevista semi-estruturada

PESQUISA:

- Bibliográfica e de Campo

TÉCNICA DE PESQUISA:

- Bibliográfica

- Exploratória

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Para discorrer sobre o tema “A constituição identitária da criança no espaço escolar

sob a óptica da Psicanálise” é necessário retroceder no tempo fazendo uma análise das

principais posições e/ou teorias que buscam explicar o que é a personalidade humana, como

ela é construída e quais fatores prevalecem no seu processo de formação.

Hipócrates (460-377 aC) já classificava a personalidade em quatro tipos. John Lucke,

no início do século XVII, teorizava que a mente/personalidade nascia vazia como um papel

em branco. Jean Jacques Rosseau, por sua vez, criou o conceito de bom selvagem, atribuindo

à civilização a responsabilidade pelos males que o homem virá a adquirir, como a ganância e

a violência.

Na era Moderna, Francis Galton, surge como o primeiro cientista a estudar seriamente

os fatores que interferem na formação da personalidade humana. Galton, primo de Charles

Dawin pretendia mostrar que a inteligência e os talentos da elite intelectual inglesa eram

repassados de pai para filho.

O fato é que durante o Renascimento e a era moderna o debate sobre a personalidade

humana girou em torno do grau de participação que a natureza e o ambiente teriam na

formação da personalidade.

Na verdade, no decorrer da história da humanidade muitos estudiosos da área

apresentaram suas teorias, cada uma à sua maneira, denotando claramente o ponto de vista

pessoal dos interessados, mas todas limitadas pelos escassos recursos necessários ao estudo

presentes em sua época, de forma que a partir da descoberta da estrutura do DNA pelo

americano James Watson e pelo inglês Francis Crick, em 1953, até o mapeamento do genoma

humano, em 2003, as possibilidades de se entender as origens biológicas da personalidade

multiplicaram-se e hoje sabe-se que os comportamentos dos seres humanos dependem da

interação entre fatores genéticos e ambientais.

As descobertas mais recentes nesse campo mostram que a influência dos hábitos e do

estilo de vida atuam sobre os genes com intensidade maior do que se pensava de modo que

questões vivenciais põem em evidência certas predisposições geneticamente determinadas.

Sendo assim, é mais sensato admitir uma natureza biopsicossocial na origem na personalidade

e o peso com que cada um desses elementos participam é variável e próprio de cada pessoa.

Considerando o resultado dessas novas descobertas, pesquisar sobre as influências

recebidas pela criança no espaço escolar, em especial as influências emanadas pelo professor

que é visto como exemplo pela maioria dos alunos, apresenta-se como um campo fértil à

constatação de hipóteses e/ou de surpreendentes descobertas.

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1.9 FORMULAÇÃO/CARACTERIZAÇÃO DO PROBLEMA

Inicialmente a criança precisa do reconhecimento e do amor dos pais para

experimentar o prazer e o desejo de pensar. O seu eu se constitui no ambiente familiar e vai

sofrendo transformações mediante a ampliação das relações que manterá.

Segundo Kupfer (1997) , na escola a criança precisa do amor e do reconhecimento do

professor – substituto simbólico dos pais –; precisa encontrar nele o prazer de aprender.

Ainda segundo Kupfer (1989) , na relação professor-aluno o desejo de ensinar e o

modo como o professor aceita e reconhece o aluno como ser único e singular, tem grande

importância para o desenvolvimento e fortalecimento do eu do educando para que ele

desenvolva autoestima, confiança, respeito a si e ao outro.

Freud também mostrou sua preocupação quanto à formação da personalidade das

crianças. Em suas palavras: “É difícil decidir se o que teve mais influência sobre nós e teve

importância maior, foi nossa preocupação pelas ciências que nos eram ensinadas ou pela

personalidade de nossos mestres. . . para muitos os caminhos das ciências passavam apenas

através de nossos professores” (Freud 1996/1914. Volume XIII: 286) .

Meireles (2006) afirma que toda prática educativa supõe a presença de um professor e

um aluno interagindo afetivamente nas mais diversas situações afetando e sendo afetado um

pelo outro e que qualquer que seja o estilo do professor, ou seja, se ele é autoritário, sério,

irresponsável, mais ou menos afetuoso, mais ou menos burocrático, nenhum deles passa pelos

seus alunos sem deixar sua marca.

Ao ingressar na escola, a criança mesmo em tenra idade, traz consigo idéias a priori

sobre a figura do professor bem como modelos de comportamento próprios do bom professor

e inconscientemente espera que essas impressões sejam vivenciadas, de fato, em sala de aula.

Essa idéia é defendida por Meletínski (2002) ao se reportar ao conceito de arquétipo

de Jung. Segundo Jung (2005) , arquétipos são certos esquemas estruturais, pressupostos

estruturais de imagens que existem no âmbito do inconsciente coletivo e que possivelmente

são herdados biologicamente.

Sendo o professor não apenas um transmissor de conteúdos, mas aquele capaz de

educar pelo exemplo, Jung (1981) , afirma que sua tarefa não consiste apenas em meter na

cabeça das crianças certa quantidade de ensinamentos, mas também em influir sobre as

crianças em favor de sua personalidade total, surge então o problema a ser analisado: em que

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medida/intensidade o arquétipo docente influencia na formação identitária do aluno na

Educação Infantil.

1.10 HIPÓTESES

A efetivação da pesquisa gira em torno de duas hipóteses que, à primeira vista, se

completam.

Hipótese 1 – A desestruturação familiar, comum na sociedade atual, dificulta a ação

do docente, gerando conflitos durante o processo de individuação da criança.

Nos dias atuais presenciamos uma nova forma de relação dentro da família em

decorrência da participação mais ativa das mulheres no mercado de trabalho cada vez mais

competitivo, recessivo e exigente.

Com a saída das mulheres do lar, os filhos são encaminhados cada vez mais cedo para

as creches/escolas, quando na realidade ainda precisam muito do contato íntimo e único com a

mãe. Daí os pais são chamados a participar mais na educação dos filhos.

Provenientes de uma sociedade historicamente patriarcal, na qual tarefas como essa

foram sempre de responsabilidade da mulher, estes não estão preparados para desenvolvê-la a

contento, e na maioria das vezes acabam não sabendo a melhor forma de colocar limites.

Muitos não querem repetir com seus filhos o tipo de educação repressiva que receberam dos

seus pais e outros, por comodismo, pois educar crianças é deveras muito desgastante e

trabalhoso, acabam sendo permissivos em demasia e não conseguem passar uma idéia positiva

de moral e ética para seus filhos.

Considerando o constante em teorias psicodinâmicas da personalidade apresentadas

por teóricos como Freud, Jung, Adler e Horney que de modo geral enfatizam a importância de

motivos, emoções e forças internas na formação da personalidade humana, é fácil supor que

as crianças, cuja assistência foi negligenciada por seus pais, apresentem sérios problemas de

relacionamento com os colegas e em especial com o professor ao se considerar que na sala de

aula o aluno revive a relação original entre pais e filhos transferindo para o professor todo o

amor e/ou hostilidade.

Hipótese 2 – A existência de problemas na formação da personalidade da criança

durante a Educação Infantil é reforçada devido ao fato de o professor desconhecer a influência

que exerce sobre seus alunos.

A constatação de que o encaminhamento de professores recém formados para

ministrar aulas, ou como dizem “ganhar experiência” em turmas de Educação Infantil é uma

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prática muito comum em escolas brasileiras e de que os cursos de formação de professores

apresentarem lacunas consideráveis no tocante ao processo de formação da personalidade

humana, é razoável supor que a maioria dos professores desconhecem o quanto são

importantes no processo de formação da personalidade de seus alunos, conforme Jung, que de

forma resumida afirma: “é preciso que ele mesmo (professor) seja uma pessoa correta e sadia;

o bom exemplo é o melhor método de ensino. Por mais perfeito que seja o método de nada

adianta se a pessoa que o executa não estiver acima dele em virtude de sua personalidade”

(Jung, 1995, p. 98)

1.11 JUSTIFICATIVA

O convívio social é imprescindível para o homem tornar-se realmente humano. São as

interações que ele manterá com o Outro que lhe oferecerá os parâmetros necessários no

julgamento de suas ações e que definirá o conceito que ele fará de si mesmo.

No bojo de todo o processo educativo pelo qual o indivíduo passa durante sua

existência, as interações sociais que ele mantém aparecem como o elemento determinante da

sua condição de humano.

Nenhum ser humano fica à parte desse processo que tem início mesmo antes de seu

nascimento, seja de modo formal ou informal cujos autores principais são os pais e

professores. Essa afirmação é corrente entre os principais teóricos que se detiveram ao estudo

do comportamento humano.

A psicanalista Klein (1926) , aponta que “as crianças desenvolvem a transferência de

suas mais internas fantasias, ansiedades e defesas em casa, na creche, na escola, nos diferentes

momentos do dia, no convívio escolar e durante as aulas”. Segundo Chamat (1997) , um

bloqueio na afetividade impede um vínculo saudável ou afetivo entre o ser que ensina e o ser

que aprende, seja na família ou escola”

Almeida (1998) , por sua vez diz que a criança somente se constituirá como sujeito

através do Outro, que acolhe sua palavra e reconhece o seu desejo, e é por isso que o educador

precisa estar atento aos “ditos e não ditos” pela criança, para conhecer verdadeiramente seu

desejo.

Kupfer (1992) mostra que “a transferência é uma manifestação do inconsciente que

permite à criança a reedição de suas vivências primitivas com os primeiros objetos de desejo

de forma que, na escola, tal reedição e direcionada aos professores; Freud lembra que o

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professor também transfere conteúdos inconscientes aos seus alunos no processo por ele

denominado contratransferência, onde as influências dos alunos sobre os sentimentos

inconscientes do professor são frequentes e resultam nos mais variados tipos de

comportamentos e reações por parte de quem ensina; Byington (1996) afirma que um

professor, por mais que não queira, pode desenvolver maior afinidade com determinado

aluno, ouvir melhor suas posições, encará-lo com os olhos do sucesso, estimulá-lo a crescer

com maior afinco, ao passo que, com outro aluno, pode desenvolver uma relação de

distanciamento, de recusa, de não envolvimento; Jung (1995) afirma que o autoconhecimento

e o aprendizado contínuo devem ser para o educador uma “segunda natureza”, onde sua

cultura não poderia deixar de reciclar-se, já que em algumas situações, o professor corrigirá

nas crianças os “defeitos” que não corrigiu em si próprio e acrescenta que um bom exemplo é

o melhor método de ensino.

A análise da posição desses renomados teóricos nos dá a dimensão da importância do

professor e como, de modo geral, a Psicanálise defende que as relações e influências dos

cinco primeiros anos de vida são de extrema importância na determinação de personalidade

humana e é justamente nesse período que a criança ingressa na escola onde manterá uma

relação muito próxima com o professor, faz-se necessário investigar a intensidade da

influência do arquétipo docente na formação identitária da criança durante a Educação

Infantil.

1.2 MARCO TEÓRICO

Considerando que as interações sociais da criança nos cinco primeiros anos de vida

deixam marcas determinando seu comportamento futuro e que nesse momento crucial de sua

formação surge a figura do professor como detentor de grande influência sobre as mesmas, o

objetivo geral deste estudo é investigar como valores marcantes da personalidade do docente

influenciam na formação da personalidade da criança na Educação Infantil.

Usando os meios disponíveis e os instrumentos necessários à investigação, este estudo

pretende, de modo mais específico, comprovar a influência do arquétipo docente na formação

da personalidade da criança durante os anos de estudo na Educação Infantil; constatar a

transferência e contratransferência de valores na prática docente nesse período, bem como

verificar a importância da Psicanálise na construção de um espaço escolar onde docente e

aluno sintam-se potencializados no processo ensino-aprendizagem.

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Com estes objetivos o presente estudo encontra-se organizado em três capítulos

focalizando no primeiro o inconsciente coletivo. Nesse capítulo, fica claro que o homem vai

construindo sua história individual influenciado por mitos, símbolos e signos presentes no seu

inconsciente coletivo que a ele foram passados sutil e involuntariamente por seus

antecedentes próximos e remotos, formando-se assim no seu universo mental muitos e

diferentes arquétipos que estarão de modo bastante visíveis e determinantes no processo de

individuação do sujeito.

Maiores esclarecimentos são dados sobre o processo de individuação do sujeito no

segundo capítulo deste trabalho. A análise das diversas teorias que procuram explicar como a

personalidade humana é construída, ressaltando as influências mais importantes nesse

processo de construção, fecham o capítulo, dando ao leitor uma visão global desse processo

que todo e qualquer ser humano, de modo individual ou coletivamente, vive.

O terceiro capítulo dá destaque especial à Psicanálise. Nesse capítulo debate-se a

relação da Psicanálise com a Educação tendo seus primórdios com Freud que em suas análises

observou pontos de conexão e mesmo de discordância entre as especificidades desses campos

de conhecimento e são levantadas questões relacionadas ao desenvolvimento humano, à

relação de transferência e contratransferência professor-aluno e finaliza apresentando o ponto

de vista de diferentes teóricos do comportamento humano sobre as atitudes mais

recomendadas ao adulto envolvido no processo educativo de uma criança.

Tendo como objetivo geral investigar como valores marcantes da personalidade do

docente influenciam na formação da personalidade da criança na Educação Infantil, o método

observacional e entrevistas semiestruturadas serão as vias mais adequadas à realização desse

estudo que inclui pesquisa bibliográfica e de campo.

A pesquisa bibliográfica visa fornecer um embasamento conceitual para a análise do

problema que será investigado a partir do posicionamento dos vários autores que trataram do

tema em estudo.

A pesquisa de campo será realizada no Instituto de Desenvolvimento Educacional de

Altos – IDEAL, escola pertencente à rede privada de ensino, localizada na Rua Lucrécio

Avelino Nº 2180, no centro da cidade de Altos, estado do Piauí, durante o ano letivo de 2010,

isto porque a pesquisadora trabalha na escola, fato este que lhe proporcionará maior liberdade

de ação e acesso aos dados importantes ao estudo.

A população foco da pesquisa será o corpo docente, formado por 5 professoras e

discente no total de 98 crianças da Educação Infantil da escola.

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O desempenho demonstrado em teste previamente aplicado e a idade das crianças são

os critérios considerados para a efetivação da matrícula no nível de ensino correspondente.

Neste ano formaram-se duas turmas de Nível I, composta por crianças de três anos; duas

turmas de Nível II que reúne crianças de quatro anos e duas turmas de Nível III, com crianças

de cinco anos de idade.

Os dados serão coletados junto à população envolvida direta ou indiretamente,

podendo ser ocasional, circunstancial ou intencional, conforme a necessidade.

Em decorrência da natureza subjetiva do problema a ser investigado, o método

observacional será utilizado em diferentes momentos da pesquisa, inclusive conjugado à

entrevistas não estruturadas, pois buscar o significado do silêncio, da hesitação, das

entonações, dos ditos e não ditos, são elementos que ajudam a compreender o discurso não

verbalizado das crianças.

Embora o foco da pesquisa seja as professoras e alunos da Educação Infantil, todo o

espaço escolar será palco de observações nos diferentes momentos da rotina escolar. Da

chegada da criança à escola (como ela despede-se de quem a trouxe; como é recebida pela

professora e colegas etc; a interação que mantém com os colegas e professora nas diferentes

atividades da aula; nas brincadeiras no pátio; na hora do lanche até a despedida).

Além da observação das professoras no trato diário com seus alunos em sala de aula e

nos vários e diferentes momentos e espaços da escola, outros dados pessoais e profissionais

serão coletados junto à Direção e Coordenação Pedagógica da escola. Além disso, será feita a

análise de documentos como a Proposta Pedagógica da Escola, Regimento Escolar, os livros

didáticos e paradidáticos adotados e até materiais utilizados na efetivação das propostas. A

análise desses documentos visa identificar que tipo de homem a escola pretende formar, ou

pelo menos lançar bases de sua formação.

Também fará parte desta pesquisa, a aplicação de questionários junto ao corpo docente

da Educação Infantil, bem como a análise das atividades escritas que são propostas aos

alunos, pretendendo-se com isso, identificar valores, pontos de vista, bom gosto, estética etc

das professoras.

A coleta de dados também se fará por meio de entrevistas não estruturadas junto às

professoras.

1.2.1 ARQUÉTIPOS: PLURALIDADE E INFLUÊNCIAS

De acordo com Meletínski (2002) , o conceito de "arquétipos" foi introduzido na

ciência contemporânea pelo fundador da psicologia analítica K. G. Jung. Apoiando-se na

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utilização que deste termo fizeram Fílon de Alexandria, Dioniso Aeropagita e em algumas

representações semelhantes de Platão e Santo Agostinho, Jung mostrou também a analogia

entre esses arquétipos e as "representações coletivas" de Durkheim, as "ideias a priori" de

Kant e os "modelos de comportamento" dos behavioristas.

Meletínski (2002) lembra que Jung entendia por arquétipos basicamente, certos

esquemas estruturais, pressupostos estruturais de imagens que existem no âmbito do

inconsciente coletivo e que, possivelmente, são herdados biologicamente, enquanto expressão

concentrada de energia psíquica, atualizada em objeto.

O conceito de inconsciente coletivo foi tomado emprestado por Jung dos

representantes da escola francesa de sociologia - as "representações coletivas" de Durkheim e

Lévy-Bruhl.

Segundo Meletínski (2002) os arquétipos "coletivos", no entender de Jung, deviam

basicamente opor-se aos "complexos" individuais de Sigmund Freud, deslocados para o

subconsciente.

Ainda segundo Meletínski (2002) Jung e seus seguidores como J. Campbell, E.

Neumann e outros, analisaram a mitologia dos povos do mundo inteiro como produto da

realização direta dos arquétipos. É muito importante a opinião de Jung quanto ao caráter

metafórico dos arquétipos e não alegórico, como queria Freud: seriam grandes símbolos,

muitas vezes plurívocos, e não signos, embora em algumas interpretações Jung ainda

acompanhe Freud, até certo ponto.

Continuando sua análise, Meletínski (2002) lembra que para Freud o mito mais

importante era o de Édipo, no qual ele viu a expressão nítida do erotismo infantil dirigido para

a mãe e passível de suscitar o ciúme do pai, o assim chamado complexo de Ëdipo. O

freudiano O. Rank via nisso principalmente o trauma do nascimento e a tendência a voltar ao

útero materno. Jung também reconhece o ciúme infantil e a tendência para a regressão à

infância, mas considera secundária a erotização, que substitui a rivalidade pela comida.

Os arquétipos da "mãe", da "criança", da "sombra", do animus (da anima) são

considerados por Jung os mais importantes arquétipos mitológicos ou mitologemas

arquetípicos. A "mãe" expressa o elemento do inconsciente eterno e imortal. A "criança"

simboliza o princípio do despertar da consciência individual a partir das forças do

inconsciente coletivo. mas também a ligação com a indiferenciação inconsciente primitiva e a

"antecipação" da morte e do novo nascimento. A "sombra" está à soleira da consciência e é a

parte inconsciente da personalidade, podendo se apresentar como o duplo ou sósia demônico.

A anima do homem e o animus da mulher encarnam o princípio inconsciente da

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personalidade que se manifesta enquanto sexo oposto e o "velho sábio", ou "velha", são a

síntese espiritual mais alta, que harmoniza, na velhice, as esferas inconsciente e consciente da

alma.

Percebe-se claramente que os arquétipos junguianos, em primeiro lugar, são antes

imagens, personagens, papéis a serem desempenhados e, apenas em medida muito menor,

temas. Em segundo lugar, que basicamente todos esses arquétipos representam etapas do que

Jung chamou de processo da individuação, isto é, o destacar-se gradativo da consciência in-

dividual a partir do inconsciente coletivo, a mudança da correlação consciente/inconsciente na

personalidade humana, até sua harmonização final no término da existência. De acordo com

Jung, os arquétipos traduzem os acontecimentos anímicos inconscientes em imagens do

mundo exterior.

No entanto, na prática, verifica-se que a mitologia coincide completamente com a

psicologia e esta psicologia mitologizada é tão-somente a autodescrição da alma, pois a

"linguagem" e a "metalinguagem" como que coincidem.

Alma esta que desperta para a existência consciente individual apenas como história

da relação mútua dos princípios do consciente e do inconsciente na personalidade, como

processo de sua (deles) harmonização gradativa no desenrolar-se da existência humana, como

passagem da persona dirigida para o exterior "máscara", para a mais elevada "mesmidade",

especificidade, da personalidade.

Acredita-se que a mútua correlação entre o mundo interior do homem e seu ambiente

são tanto objeto da imaginação poética e mitológica quanto a correlação anímica dos

princípios do consciente e do inconsciente. Pensa-se igualmente que o mundo exterior não é

apenas material para a descrição de conflitos puramente interiores e que o caminho da vida

humana se reflete nos mitos e nos contos maravilhosos, principalmente no plano da correlação

entre personalidade e coletivo, mais do que no da confrontação ou da harmonização do

consciente e do inconsciente. Uma outra história é o fato de o momento inconsciente e as

profundezas do inconsciente coletivo se refletirem tanto no mecanismo quanto nos objetos da

imaginação.

Em sua análise, Meletínski (2002) faz referência ao livro do junguiano E. Newmann,

Origem e História da Consciência (1949) , no qual as raízes arquetípicas e a evolução da

consciência apresenta-se de forma mais sistemática. Newmann chama

de arquétipos as "dominantes transpessoais" e insiste no fato de que o conteúdo transpessoal

primordial se personaliza por hereditariedade, a "personalização secundária". Os mitos da

criação, de acordo com Neumann, são justamente a história do nascimento do "eu", a emanci-

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pação gradativa do indivíduo e o sofrimento a ela ligado. A criação, afirma Neumann

apoiando-se em E. Cassirer, é sempre criação de um mundo, mas Neumann refere-se a este

como ao mundo da consciência, que domina as forças do inconsciente.

A coesão primordial do inconsciente é simbolizada pelo círculo, pelo ovo, pelo

oceano, pela serpente divina, pela mandala, pela essência primeira, pelo conceito alquímico

de uroboros.

O útero fértil da Grande Mãe é expresso pelas imagens do dia, do mar, da fonte, da

terra, da caverna, da cidade. Neste estágio, correspondente à estada da criança no útero

materno, a morte e o nascimento têm lugar a cada noite, e a existência antes e depois da morte

é idêntica. A este estágio corresponde também a união incestuosa direta inocente com a mãe.

O uroboros materno é pré-sexual e hermafrodita. Neste estágio os atos da digestão e da

excreção existem como forma de manifestação da atividade, do nascimento.

O desenvolvimento individual dá-se como separação do uroboros, como entrada no

mundo e encontro com o princípio universal das contradições, das oposições, que

desenvolvem a unidade primordial - a plenitude -, na integralidade. O uroboros e sua so-

berania estão estritamente ligados com a imagem da Grande Mãe, o "matriarcado" enquanto

estádio psíquico, associada com a terra e com a natureza absolutamente inconsciente, em

contraposição à cultura.

A criança (o "eu" nascente) é apresentada ora como relativamente vulnerável, ora

como acompanhante divino da Grande Mãe, como seu amante (associado ao falo) , detentor

de uma existência não propriamente individual, mas ainda ritual.

Na etapa do "eu" desenvolvido, a figura da Grande Mãe passa a receber uma

conotação negativa: é a natureza selvagem, a encantação, o sangue, a morte. Inicia-se a

ruptura com a mãe e a oposição a ela. No começo em termos de autocastração ou suicídio

(Átis, Eshmun, Batu) depois, de uma revolta decisiva (Narciso, Penteus, Hipólito) , e recusa

de seu amor (Guilgamesh) . A madrasta - e Fedra está neste rol - é a transformação da Grande

Mãe: se a mãe é boa, ao lado dela pode surgir a contrapartida má. O simbolismo dos gêmeos

antagônicos como que exprime o mesmo simbolismo da mãe.

Ocorre em seguida o afastamento dos pais, no sentido de a criança desligar-se deles,

do pai e da mãe, depois do que surge propriamente o mundo, a consciência e a cultura e

aparecem outras oposições. O desprendimento do "eu" consciente a partir do inconsciente é

expresso pelo arquétipo da luta. O desprendimento dos pais, que ocorre no filho, é análogo à

luta com o dragão. O "eu" se torna o herói - "primeira personalidade"- que é, em princípio, o

precursor arquetípico da humanidade como um todo. Na etapa do heroísmo quem ganha é

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decididamente o princípio masculino. Ele não é nem ctônico nem sexual como o materno, e

tem um caráter espiritual. O totemismo de E. Neumann diferencia o masculino pelo espírito.

Graças à luta com o dragão ocorre a transformação do herói, cujo sentido deve ser encontrado

no surgimento de uma forma mais elevada de personalidade. O dragão traz a marca do

uroboros.

O equivalente disso é também o incesto com a mãe, que pode tornar-se agora uma

forma de vitória sobre ela. O próprio dragão - o símbolo do uroboros - pode ser visto como

bissexual, associado em parte também com o princípio masculino. O pai terrestre pertence ao

reino da matéria, da terra. Consequentemente, a luta com o dragão é a luta com os primeiros

genitores, em particular com o pai que representa a ordem e a lei contra quem pode insurgir-se

o filho.

Ao matar o dragão, o herói liberta a prisioneira e alcança o tesouro. Neumann vê isso

como a descoberta da alma verdadeira ou psique, como o domínio da própria anima, como a

união do consciente do herói com a parte criativa da alma. Na imagem da prisioneira é

vencida a imagem da mulher-Grande-Mãe ruim e dá-se o deslocamento da endogamia para a

exogamia.

O herói torna-se apto para o casamento, libertando-se da esfera dos pais graças à

iniciação. Deste ponto de vista Neumann analisa os mitos da luta com o dragão de Perseu,

Teseu, Héracles e do egípcio Osíris, em cuja história ele vê o rumo da transformação da

individualidade, do auto-aperfeiçoamento da alma até a sua "identicidade" mais elevada,

como uma das individuações da totalidade junguiana. Um grande espaço é dedicado por

Neumann à análise da formação da consciência individual "a partir de dentro", fora da ligação

com o mito e com a fábula.

Sobre o mito do herói, Meletínski (2002) apresenta a análise de C. Boudouin feita no

livro O Triunfo do Heroi (1952) , segundo o qual, o que importa é o “segundo nascimento” e

também o motivo das sósias-substitutas.

Na análise de Meletínski (2002) o referido livro trata basicamente das teorias de Jung

e de J. Campbell, o qual, apoiando-se em Schopenhauer e em Nietzsche, complementa suas

concepções com as de outros psicanalistas e ritualistas, que reduzem a inteira cultura ao ritual.

Campbell é autor da monografia O Herói de Mil Faces (1948) e do compêndio em quatro

volumes As Máscaras de Deus (1959-1970) . No primeiro livro ele analisa alguns

"monomitos heróicos" que contêm a história do herói a partir de sua saída de casa até o

retorno solene. A história contém as provações para atingir a graça e a obtenção da força

mágica. À biografia do herói são associados paralelos cosmológicos.

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A inclusão do papel da iniciação no mito do herói - depois de P. Saintyves em Pierrô e

Contos Paralelos (1932) e de V. I. Propp em Raízes Históricas dos Contos de Magia (1946) -

é plenamente justificável, mas a iniciação em si é analisada por Campbell exclusivamente a

partir do ponto de vista da psicologia analítica, ou seja, enquanto aprofundamento do

indivíduo em sua alma à procura de novos valores. Campbell observa, com razão, que a

recusa a iniciar-se coloca o indivíduo fora da sociedade. Em As Máscaras de Deus ele trata a

mitologia de forma biologizante, vendo nela a função de sistema nervoso, onde os símbolos

sígnicos liberariam e orientariam a energia.

A iniciação também é vista como a força que supera as tendências libidinosas infantis.

Outros momentos do mito do herói são ligados por Campbell ora ao trauma do nascimento, de

acordo com O. Rank, ora mesmo ao complexo de Édipo, não como o analisa Jung, mas, sim,

Freud. Vendo nos mitos uma motivação de diferentes fatores físico-psíquicos, Campbell

fornece um apanhado impressionante da mitologia dos povos do mundo. Nesse mesmo

sentido ele interpreta a "mitologia criativa" da literatura modernista do século XX.

Os representantes da mitologia analítica aplicaram também ao conto maravilhoso seus

princípios de análise dos mitos. Em decorrência disso, os modelos e os episódios da narrativa

maravilhosa são vistos como símbolo ou mesmo como alegorias das diferentes etapas

relacionadas ao consciente e ao inconsciente. A luta com o dragão pode ser tratada como luta

contra a própria "sombra" demônica de cada um, a bruxa pode ser vista como encarnação da

Grande Mãe, com quem coincide também a vovozinha de Chapeuzinho Vermelho e até

mesmo o lobo que a devora. O casamento com o príncipe ou com a princesa é entendido

como a reconciliação com seu próprio mundo interior e manifestação da individuação; o

encontro com o velhinho como a expressão superior da individuação. Sobre isso escrevem

Leiblin, Frank, Leckler e Delaché, Rumpf etc.

O junguismo e o ritualismo produziram, unindo-se, a crítica mitológico-ritual, um dos

ramos da assim chamada nova crítica. O ritualismo, que provém de Frazer e de seus

discípulos da "escola de Cambridge", considera os rituais não apenas a base dos mitos e dos

temas mitológicos, mas também o fundamento de toda a Antiguidade e da cultura posterior,

conforme os trabalhos de G. Marr, lord Reglan, S. Khaiman, P. Saintyves, R. Carpenter, E.

Miro e G. R. Levi.

Meletínski (2002) afirma que D. Weston abriu caminho para a interpretação

ritualística do romance de cavalaria. K. Veisinger, Kh. Watts, F. Ferguson, N. Frye fizeram do

drama o objeto favorito da abordagem ritualística e mitológico-ritualística, especialmente o

drama de Shakespeare.

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Ainda sobre ritualismo e junguismo em relação ao estudo dos arquétipos, Meletínski

refere-se a M. Bodkin, autor de Modelos Arquetípicos na Poesia (1934) e, especialmente N.

Frye, autor de Anatomia da Crítica (1957) .

Bodkin (1934) ao estudar as metáforas na poesia, viu nelas o nascimento da vida

emotiva suprapessoal: uma atenção particular é dada por ele ao arquétipo do novo nascimen-

to, aos símbolos da passagem da morte para a vida associados aos ritos da iniciação; aos

símbolos do crescimento de tudo o que é vivo, às imagens do divino, do demônico e do

heróico. Frye (1957) considera o Ramo Dourado de Prazer e os trabalhos de Jung sobre os

símbolos da libido a base da análise literária. Ele acompanha Jung em muitos aspectos, mas

não considera obrigatória a hipótese do inconsciente coletivo. Para ele o mito e o ritual, o

mito e o arquétipo são únicos e não são a fonte da arte verbal como o são para os ritualistas,

mas sua essência. O mito é a união do ritual e do sonho, em forma de comunicação verbal. Os

ritmos poéticos - afirma Frye - são estritamente ligados ao ciclo natural pela sincronização do

organismo como os ritmos naturais, por exemplo, com o ano solar: a aurora, a primavera e

nascimento estão na base dos mitos do nascimento do herói, sua ressurreição e a derrota das

trevas, este é o arquétipo da poesia ditirâmbica. O zénite, o verão, a união, o triunfo dão

origem aos mitos da apoteose, dos esponsais sagrados, do paraíso - o arquétipo da comédia,

do idílio e do romance. O pôr-do-sol, o outono, a morte levam aos mitos do dilúvio, do caos e

do fim do mundo - arquétipo da sátira. A primavera, o verão, o outono e o inverno originam

respectivamente a comédia, o romance de cavalaria, a tragédia e a ironia.

Assim, os ciclos naturais determinam não apenas as imagens e os temas, mas inteiros

géneros. Frye vale-se do simbolismo da Bíblia e da mitologia antiga para explicitar a

"gramática dos arquétipos literários". Na "fase" mítica o símbolo atua como unidade de

comunicação - como arquétipo. Porém esta fase é precedida por uma série de outras: a literal -

o símbolo como imagem, detentor potencial de um grande número de significados, visto não

como reflexo da realidade, mas antes como um "aposto" dela. A união dos símbolos numa

"mônada" universal constitui, segundo Frye, a fase analítica.

Na organização dos símbolos arquetípicos Frye (1957) distingue a identificação

metafórica e analógica das associações ou comparações mais distantes. Por exemplo, em lugar

do mito do deserto, que floresceu graças ao deus da colheita, surge a história do herói que

mata o dragão e salva a filha do velho rei. Este último, no mito, não se diferencia do dragão.

Se o herói não é o genro, mas, sim, o filho do czar e a mulher a ser salva é a mãe dele,

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estamos diante do mito de Édipo. Tal como Campbell, Frye desloca para o primeiro plano o

ciclo da existência do homem, daí o fato de o mito da "busca" ser para ele o mais importante.

G. Durand (1969) apoiando-se nas obras do filósofo francês G. Bachelard, apresenta

uma classificação alternativa das imagens arquetípicas para a classificação junguiana. Ele se

coloca contra o reducionismo junguiano e vê os arquétipos dentro das molduras de uma

psicologia poética.

Partindo da "complementaridade" entre ciência e poesia e da pluriestratificação

dialética do conhecimento, Bachelard se interessa pelos problemas da psicologia e da

fenomenologia e, em particular, começa pela análise da percepção direta dos quatro elementos

naturais - fogo, água, ar e terra - e em seguida das diferentes propriedades de fenômenos,

sonhos etc. , como geradores de determinados arquétipos imagéticos. Valendo-se de alguns

princípios da psicologia analítica, estabelece em relação a eles algumas complementações

importantes.

Durand acha que devido à influência das estruturas dos esquemas primordiais, os

símbolos se transformam em palavras e os arquétipos em ideias e que, dessa maneira, o mito

passa a ser um sistema dinâmico de símbolos, de arquétipos e de esquemas e se transforma em

narrativa. À organização dinâmica do mito corresponde a estática, sob o aspecto de uma

"constelação de imagens". Durand constata o conhecido dualismo na esfera dos arquétipos, a

oposição entre os "regimes" diurno e noturno nos esquemas primordiais, conforme o

imaginário "apocalíptico" e "demônico" em Frye. Como ponto de partida do "regime diurno"

Durand analisa o medo diante de um movimento no tempo, como também diante do destino

ou da morte que assume a forma de uma animação irrequieta, de um movimento caótico dos

insetos e dos répteis, da corrida ctônica do cavalo, dos carnívoros e devoradores de carne

humana, procurando a morte.

Na obra Estruturas Antropológicas do Imaginário (1969) , lembra que o silêncio é o

complemento do ruído, por isso surgem imagens de escuridão, treva, cegueira, água escura,

sangue menstrual, com os quais está ligada a noite, a assustadora mãe feiticeira, e igualmente

a queda, o abismo. A queda é simbolizada pela carne como material do sexo e da digestão

conforme o pecado original.

Como opostos atuam os esquemas da ascensão, da escada, o arquétipo do mundo

primaveril, da altura, o voo rápido, a asa e a seta, a sublimação purificadora da carne, a

imagem do anjo. O poder combativo é expresso por símbolos viris como a luta, a guerra, a

cabeça, o chifre fálico, o sacerdote. Paralelos a ele são os símbolos solares, luminosos,

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igualmente isomorfos da fala, do saber, da divina transcendência. A luz tem a tendência de

transformar-se em raio ou espada e a expansão, em exaltação diante de um inimigo derrotado.

Daqui ao arquétipo do herói combativo, vencedor do dragão, é um passo. A vitória é vista

como purificadora da alma.

O "regime diurno" é comparado por Durand (1969) às reações esquizofrênicas

negativas enquanto o "regime noturno", ao contrário, sente-se atraído pelo compromisso

devido à ambivalência da libido, pelos eufemismos, pela ênfase dada ao processo rítmico que

leva ao novo nascimento.

A periodicidade acalma a corrida do tempo; a imaginação, de modo correspondente,

regula e organiza. Produz tanto uma inversão de valores quanto um desprendimento da

estabilidade no tempo. Na própria noite ocorrem buscas de luz: a queda torna-se imersão na

condição pré-natal, a noite é percebida como um prenúncio do dia. Após cada "deglutição" há

a "devolução" do que é deglutido, a libertação do ventre do monstro. É utilizada a oposição

binária enganado/enganador , etc. e as imagens ternárias são de qualquer maneira

minimizadas.

Paralelamente a isto tudo, como que se discerne a linguagem da mística e sua mudança

de ativo a passivo, constituinte a constituído, inferior a superior, com a transformação

eufemística da treva em noite, do túmulo em berço, da genitora em mãe etc. Disso tudo

decorre uma totalidade de símbolos cíclicos, ou seja, de símbolos de uma repetição-reversão

bem-sucedida ou de salvação messiânica. Esses símbolos se opõem ao tempo, base da

repetitividade do calendário. A repetição do drama sagrado do tempo é a iniciação. Seu

análogo são as "estruturas sintéticas" do imaginário, que levam ao pensamento histórico.

Em outro livro, Figura Mitológica e Rostos da Criação (1979) , Durand desenvolve

suas ideias, apoiando-se em grande parte na já referida monografia de Baudouin, e criticando

as pretensões cientificistas dos estruturalistas, ligadas à semântica linguística. Numa série de

esboços concretos Durand liga as diferentes épocas da criação literária à hegemonia de uma

ou de outra personagem mitológica antiga - no começo Prometeu, depois Dioniso e final-

mente Hermes. Em alguns momentos, eles como que brigam entre si, por exemplo Dioniso e

Prometeu, no romantismo europeu. O próprio mito, como afirma Durand seguindo Jung e em

parte Lévi-Strauss, sempre se apresenta como a arena em que se confrontam algumas

oposições. Essa última tese merece uma atenção especial, uma vez que a narrativa em si cos-

tuma encerrar a oposição e a luta de certas forças.

Da análise feita, Meletínski afirma:

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Contudo, devido a seu reducionismo psicológico ou mitológico-ritualístico, que

pretende conduzir à modernização do mito arcaico e à arcaização da literatura

moderna, não se podem aceitar in toto nem as concepções de Jung ou de Frye, nem a

de Bachelard-Durand. (Meletínski, 2002 p. 37)

Indo além em suas colocações, Meletínski afirma que tanto Jung quanto os outros

teóricos acima lembrados, quando falam dos arquétipos, não têm em vista os temas, mas um

repertório de figuras-chave ou objetos-símbolos que dão origem a alguns motivos. Sem falar

do fato de que o paradigma de figuras-chave apresentado por Jung suscita sérias dúvidas - já

que essas figuras dizem respeito apenas às etapas da individuação - os próprios temas estão

longe de ser sempre secundários e recessivos: eles podem unir-se a diferentes imagens e dar

origem a outras tantas. Além disso, os psicólogos analíticos, tanto quanto os junguianos ou os

seguidores de Frye, partem de uma grande "abertura", e por isso mesmo do caráter arquetípico

dos mitos, aduzindo elementos subconscientes congênitos. Isso não é absolutamente exato,

uma vez que os motivos subconscientes estão igualmente ligados à ambiência social,

enquanto a matricialidade temática, que permite a liberação dos arquétipos, configura-se

gradativamente, a partir de uma narrativa mais amorfa.

Não se deve esquecer que, na mitologia, a própria descrição do mito é possível

somente em forma de narrativa da formação dos elementos desse mundo, e mesmo do mundo

como um todo. Isso é explicado pelo fato de que a mentalidade mítica identifica o começo e a

essência, por isso mesmo dinamizando e narrativizando o modelo estático do mundo. Sendo

assim, o pathos do mito começa bastante cedo a reduzir-se à cosmicização do caos primordial,

à luta e à vitória do cosmos sobre o caos, isto é, a formação do mundo redunda, ao mesmo

tempo, em seu ordenamento. Justamente este processo de criação do mundo é o principal

objeto da representação e o principal tema dos mitos mais antigos.

Mas como será que isso se liga à concepção junguiana que vê na mitologia e no

folclore a expressão do processo da assim chamada individuação, isto é, do despertar da

consciência individual e sua gradual harmonização com a situação inconsciente-coletiva

inicial e com o conteúdo da psique? Poder-se-ia realmente aproximar o inconsciente coletivo

do caos, e o consciente do cosmos, mas não há dados de nenhuma espécie que nos permitam

ver no relato da criação do mundo tão-somente a metáfora da individuação, mesmo que

entendida como cosmicização da consciência individual.

Pelo fato de existir uma influência recíproca entre a natureza e o meio social, a

personalidade humana durante muito tempo continuou ligada à esfera da natureza, por isso a

natureza é muitas vezes pensada em termos humanos e a humanidade em termos naturais e, o

que é mais importante, não se separou enquanto personalidade - do conjunto da sociedade

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(socium) . Se muitos deuses e demos pareceram ao homem primitivo "donos" de diferentes

forças da natureza ou partes separadas dela, então os primeiros ancestrais - os demiurgos -, os

heróis culturais, esses primeiros heróis da narrativa folclórica, encarnaram em si mesmos o

primeiro coletivo da tribo, ou seja, o socium como reunião das "pessoas verdadeiras" à

diferença das "não-pessoas" que ficavam além dos limites do coletivo da tribo nativa.

Mesmo imagens mais desenvolvidas dos heróis -"super-homens" da mitologia antiga

conservaram um caráter super, inter ou pré. Somente em virtude da identificação de um

membro da tribo primitiva com seu socium é que ocorre a conhecida provação do herói. E

durante muito tempo a personagem mítica de origem semidivina só ficou sonhando em ter

suficiente liberdade de ação para tornar-se "herói".

Tendo diante de si a tarefa prática de dominar o mundo, o homem o estrutura

teoricamente em forma de relato de suas origens, sendo que o constrói de tal forma que lhe

sejam asseguradas relações harmoniosas com ele, por conta do diálogo, da troca, da magia, da

religião. Não apenas a ordem do mundo, mas também sua importante harmonização com as

exigências humanas encontra-se no programa de cosmicização, exigindo o momento oportuno

da luta ativa dos heróis contra as forças demônicas do caos.

O mito da criação é o mito básico, fundamental. O mito escatológico é apenas o mito

da criação pelo avesso, narrando durante a maior parte do tempo a vitória do caos, pelo

dilúvio, incêndio etc. , no fim do mundo ou no fim de uma época cósmica. Algo intermediário

é representado pelos mitos das estações nos quais a morte temporária da natureza, muitas

vezes personificada por um deus que morre e ressuscita como herói, serve bem à sua

renovação cíclica.

Apenas no mito heróico mais tardio e, sobretudo, no conto maravilhoso, começa-se a

falar na "criação" ou "cosmicização" sui generis da personalidade, cuja biografia corresponde

à série de ritos de passagem, o primeiro dos quais é o da iniciação que transforma a criança -

graças a uma morte ritual temporária e a diversas provações - em membro plenamente válido

da tribo. Aqui fala-se basicamente não apenas do despertar da consciência individual, mas

também da socialização, da iniciação para ingresso no meio social "maduro" e para sua

integração nele.

No mito heróico, a biografia da personagem principal, que passa por provações

propiciatórias, é frequentemente associada à troca ritualística de gerações. Isso ocorre

principalmente sob o aspecto da troca de chefe, isto é, de um processo que está no limite entre

o biológico e o social. Os motivos eróticos e incestuosos que surgem nessa ocasião, conforme

o de Edipo, o mais conhecido, servem aqui antes como signos da decrepitude e do

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amadurecimento das diferentes gerações e não tanto como expressão dos conflitos psi-

cológicos intrafamiliares. Ainda mais adiante a personalização chega ao conto maravilhoso,

onde já se trata do destino individual e onde se abre caminho para um longo antagonismo no

plano da psicologia da realização do desejo, da realização do sonho, do medo e das fantasias

compensatórias. No conto, opositores e coadjuvantes são percebidos mais nitidamente que o

próprio herói, opositores geralmente dele mesmo - o herói - e coadjuvantes em quem ele con-

fia. Depois surgem os antagonistas, seus rivais particulares. A celebração do herói é sua

celebração pessoal, ligada a uma mudança do status social. Em função disso tudo, mesmo no

conto maravilhoso, o que está em primeiro plano são as relações sociais e não as cósmicas.

Do que foi dito, entre outras coisas, fica evidente a significação de alguns modelos

ritualísticos para a formação dos temas arquetípicos. Obviamente não se podem deduzir os

temas a partir dos rituais, tal como fazem os representantes da tendência ritualista, que retiram

dos rituais não apenas os temas, mas a própria cultura como um todo. Na verdade o ritual é o

aspecto "formal" e o mito, o aspecto "conteudístico" do mesmo fenômeno. Sendo assim, a

cada ritual correspondem um ou muitos mitos e, vice-versa, a um mito correspondem um ou

muitos ritos; além disso, os rituais se entretecem e se entrecruzam entre si.

Uma influência particular para a formação de temas é inerente a rituais como os da

iniciação, das festas periódicas da natureza que renasce, o ritual da morte dos chefes-xamãs da

tribo ligado à troca de gerações, os rituais dos casamentos e outros rituais habituais. Entre

eles, o mais importante é o da iniciação, ligado à representação da morte temporal e à

renovação, às provações e às mudanças do status social, e que também se encontra

incorporado em outros rituais.

Contrariando Jung, Meletínski (2002) diz que a psicologia inconsciente coletiva

dificilmente tem um caráter hereditário, mas apresenta um caráter social real.

Não se deve subestimar o que foi conseguido pela psicologia analítica e pela crítica

mitológico-ritualística em termos de descrição e explicação de certos arquétipos, isto é, de

esquemas primordiais de imagens e de temas, que constituem um certo fundo emissor da

linguagem literária, entendida no sentido mais amplo. Mas é preciso lembrar da falha básica

dessas orientações que redundam no reducionismo biopsicológico e ritualístico das fontes e da

própria essência das imagens e temas da literatura, à vida interior do espírito, no plano da

correlação de seus elementos conscientes e inconscientes, ou a ritos diretamente identificáveis

com a narrativa.

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Saindo dos exemplos excepcionais, a forma como cada um de nós lida com

dificuldades e desafios do cotidiano, revela em boa parte as qualidades de nosso si mesmo.

Isso nos remete ao conceito junguiano de inconsciente como fonte de criatividade e

potencialidade, e não apenas como o depositário de conteúdos reprimidos, imagens, vivências

dolorosas cercadas pelos mecanismos de defesa do ego. Do inconsciente surgem os impulsos

que tomam forma na matéria, de acordo com o espaço e o tempo de uma pessoa.

O conceito de arquétipo - como representação psicológica do instinto - explica o

aspecto universal dos padrões de comportamento humano, tal como o esqueleto que estrutura

e dá base ao corpo. Embora todos tenhamos a mesma anatomia e fisiologia, não há um ser

idêntico ao outro. A maneira como cada pessoa atualiza os arquétipos depende das vivências

pessoais, educacionais e socioculturais. Em cada época, os arquétipos mudam a roupagem

com que se apresentam, embora seu dinamismo básico permaneça o mesmo.

A exemplo do arquétipo da Grande Mãe, podemos observar que desde as épocas das

cavernas já havia cultos a imagens femininas de largos quadris e muitas mamas, apontada

como criadora do mundo e deusa da fertilidade. Essa imagem sofreu transformações ao longo

dos tempos e hoje aparece no Brasil, por exemplo, nas formas de lemanjá e de Nossa Senhora

Aparecida. A crescente expansão do culto a lemanjá observada em todo o litoral é uma

demonstração do poder que esse arquétipo exerce sobre a psique do povo brasileiro. Nesse ri-

tual, repete-se o culto que os antigos gregos faziam à deusa Afrodite com oferendas de flores,

perfumes e pedidos levados em pequenos barcos lançados ao mar. Para muitos brasileiros, a

esperança de renovação da vida por meio desse ritual independe da religião e tornou-se um

ritual pagão realizado por pessoas de diferentes níveis socioculturais.

Os arquétipos também são facilmente observáveis na literatura e nas artes em geral —

entre eles os contos de fadas, em que podemos identificar as tarefas que o ego infantil deve

superar durante seu crescimento. A história de João e Maria mostra que, quando as crianças

são fragilizadas pela falta de capacidade dos pais em alimentá-las (amorosamente) , elas são

levadas a uma jornada solitária pela floresta, onde são seduzidas com doces e guloseimas pela

bruxa malvada. A falta de um ambiente familiar acolhedor e amoroso faz com que os filhos

tenham de desenvolver por si mesmos a capacidade de superar o aspecto devorador da mãe

que vive da vida dos filhos, uma grande mãe devoradora.

O caráter atual do conto também pode ser observado na problemática alimentar da

anorexia e da bulimia, que se tornou bastante comum na cultura contemporânea. A ditadura

da moda de magreza extrema obriga, principalmente os jovens, a um padrão anatômico por

vezes incompatível com o bem-estar físico e revelador de uma base afetiva bastante frágil. Ou

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seja, ser benquisto hoje está profundamente associado a um corpo escultural, uma pele

impecável ou a uma roupa que esconde as formas femininas no seu aspecto maternal. Vemos

com isso dois aspectos do arquétipo da Grande Mãe. O positivo - quando sua imagem é

reverenciada nos rituais de renovação do ano novo - e o negativo - como na magreza

excessiva, na tentativa de vencê-la para passar para um novo arquétipo. No processo

evolutivo, observamos também os movimentos ecológicos como uma maior consciência da

mãe Natureza, antes menosprezada e vilipendiada.

A passagem do arquétipo da Grande Mãe para o do Pai Espiritual é ilustrada na

história dos Três Porquinhos e o Lobo Mau. Aqui vemos a necessidade de fortalecimento do

ego para enfrentar as adversidades do crescimento, deixando a casa da mãe para construir um

mundo independente. Ao depararem com o Lobo Mau, o aspecto negativo da figura paterna,

eles percebem que uma casa feita às pressas com material frágil é facilmente derrubada pelo

sopro da violência. A experiência vai ensinar que somente uma casa solidamente construída -

ego forte e em contato com a realidade - pode lhes oferecer um abrigo suficientemente seguro,

no qual podem sobreviver longe da proteção materna.

O arquétipo subjacente a essas histórias é o Mito do Herói, talvez o mais presente no

mundo literário e cinematográfico em todos os tempos. De Tarzan, o rei da selva, a Neo, o

herói de Matrix, a imagem arquetípica do jovem que é levado a desafiar os valores predomi-

nantes da cultura nos ensina a incorporar habilidades inovadoras e a vencer obstáculos

aparentemente intransponíveis. Sua função libertadora ajuda a humanidade a confiar no

aspecto transcendente e transitório da condição humana. Os símbolos presentes nessas

histórias são também elementos facilitadores na integração dos conteúdos inconscientes.

De acordo com Byington (2007) , o desenvolvimento extraordinário das neurociências

nos últimos anos tem questionado e aprofundado muito o conceito de arquétipo. Já sabíamos,

com a genética moderna, que as imagens aprendidas não são herdadas, mas nunca antes

havíamos pesquisado, como agora, o que o sistema nervoso tem para organizar o processo

neuro-fisiológico típico da espécie humana. Um dos mais destacados estudiosos das

neurociências na comunidade junguiana é o psiquiatra Mário Eugênio Saiz, líder da Escola

Junguiana Uruguaia. Sua posição, apresentada no Congresso Internacional de Psicologia

Analítica em Barcelona, em 2004, é a de que o arquétipo é uma forma genética muito arcaica

de organização neuropsíquica, característica do sistema nervoso humano, como Jung pensava,

mas muito mais indiferenciada do que ele imaginou.

Pessoalmente, acredito que a descoberta mais espetacular das neurociências, que

consagrará finalmente a genialidade de Jung na academia científica e nos templos

religiosos, será a localização do Arquétipo Central do Self no sistema neuropsíquico.

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Nesse dia, o esforço criativo de sua vida e de sua obra dará um fruto excepcional.

Que eu saiba, a busca da imagem de Deus no sistema nervoso humano ainda não

consta oficialmente de nenhum projeto de pesquisa das neurociências. Sua proposta

já seria certamente um escândalo para a mentalidade positivista que, infelizmente,

ainda domina a universidade e chocaria certamente também o dogmatismo das

instituições religiosas. (Byington, 2007 p. 15)

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CAPÍTULO II

O PROCESSO DE INDIVIDUAÇÃO

2. 1. CONSTRUÇÃO DA PERSONALIDADE E IDENTIDADE

Para entender o que é personalidade e como ela é construída, diferentes correntes

teóricas detiveram-se a esse estudo e genericamente foram denominadas Teorias da

Personalidade.

A análise dessas teorias deve ser feita levando-se em consideração as limitações e/ou

contribuições de outras áreas de conhecimentos presentes no contexto histórico da época no

qual os teóricos achavam-se inseridos, bem como a história pessoal dos mesmos.

Os psicólogos behavioristas visavam modificar as atitudes através de técnicas de

condicionamento externo. Acreditam que o comportamento humano poderia ser planejado,

modelado ou transformado por meio da utilização adequada dos vários tipos de recompensas

– reforço positivo ou feedback positivo - ou punições – reforço negativo ou feedback

negativo. Para eles, as recompensas externas seriam a melhor maneira de reconhecimento o

qual determinaria a motivação extrínseca ou condicionamento.

A teoria behaviorista baseou-se em estudos empíricos. Analisou o ser humano “in

vivo”, ou seja, vivendo e interagindo com o seu habitat natural, onde descartou qualquer

tentativa de previsão sobre o comportamento habitual de cada indivíduo. Este, para Milhollan

e Forisha (1972) , é um ser passivo, governado por estímulos fornecidos pelo ambiente

externo, podendo ser modelado de acordo com suas normas. Essa visão de motivação defende

o determinismo no estudo da conduta de cada pessoa, à qual nega-se a liberdade e cujo

comportamento representa simples respostas aos estímulos ambientais. Logo não há

automotivação.

Precursor da linha behaviorista, Pavlov (1904) , com base no seu experimento com

cães, divulgou a teoria do Reflexo Condicionado, cujo resultado modelou a metodologia do

condicionamento. Em 1911, Edward Lee Thorndike propôs sua Lei do Efeito. Após observar

as atitudes de gatos famintos dentro de uma caixa, conclui que a personalidade deve ser

entendida como consequência da aprendizagem que é o processo por meio do qual as

respostas comportamentais são incorporadas ao repertório psíquico. Esses dois experimentos

iniciais mostraram que precisa haver um fator extrínseco para haver a modelagem dos

comportamentos.

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Outras pesquisas sucederam e acarretaram no conceito de Estímulo-Resposta (S-R

Bond Theory) que define o comportamento humano dentro da escola behaviorista, cujo

principal representante é Watson. Segundo esse, o sujeito reage de uma determinada forma de

acordo com as variáveis extrínsecas impostas pelo meio ambiente. Estas condições externas

podem modificar seu comportamento de modo a fazê-lo buscar adaptar-se às variações

ocorridas fora dele. Devido ao fato de existir uma correspondência entre os fatores “S”

(estímilo) e “R” (resposta) , ao se analisar o tipo de reação do organismo será possível inferir

qual a variável extrínseca que desempenhou o papel de seu estimulador.

Já, em 1971, Skinner elaborou a teoria do Condicionamento Operante. Ao observar

ratos e pombos, trabalhou com dois elementos que estruturam ou extinguem certos tipos de

comportamento. Assim, surgiu um novo conceito de aprendizagem, o qual defende que o

sujeito armazena no seu repertorio psíquico os eventos condicionados a recompensas e que

estruturam o comportamento, chamados de Reforço Positivo. Igualmente, são guardados na

memória os resultados insatisfatórios de certas ações resultando na sua diminuição ou sua

extinção total, o qual foi denominado Reforço Negativo.

Depreende-se dessa teoria que a personalidade humana poderá ser modelada a partir

do controle dos reforçadores existentes no ambiente externo a fim de obter os

comportamentos desejados de forma previsível.

De acordo com Duque (2006) , os teóricos humanistas em vez de considerarem as

pessoas como controladas por forças não observáveis, inconsciente (abordagem

psicanalítica) , um conjunto de traços (abordagem dos traços) , por reforços ou punições

situacionais (teoria da aprendizagem) , ou por fatores herdados (abordagens biológica e

evolucionária) , as abordagens humanistas ou humanísticas sublinham a bondade básica das

pessoas e a sua tendência para crescer em direção a níveis mais elevados de funcionamento.

É esta capacidade automotivada para mudar e melhorar, a par dos impulsos criativos

específicos, que constitui o núcleo da personalidade.

Segundo Carl Rogers os indivíduos têm uma necessidade básica de valorização que

reflete uma necessidade universal de ser amado e respeitado. Quando outras pessoas

proporcionam essa valorização, o indivíduo torna-se dependente delas. Começa a ver e a

julgar-se a si mesmo, através dos olhos de outras pessoas, baseando-se nos seus valores.

Uma consequência do dar importância às opiniões dos outros é a possibilidade de

surgir conflito entre as experiências da pessoa e o seu auto-conceito ou ideia de si.

Se as discrepâncias são menores, as consequências são também secundárias.

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Porém se são grandes, podem conduzir a distúrbios psicológicos no funcionamento diário

com a experiência de ansiedade crônica.

Rogers propôs que uma forma de ultrapassar a discrepância entre experiência e

autoconceito é dada por intermédio do reconhecimento e da valorização incondicional

proporcionada por outra pessoa (ex, um amigo, cônjuge, terapeuta) . Aceitação incondicional

refere-se a uma atitude de aceitação e respeito por parte de um observador,

independentemente do que o indivíduo faz ou diz.

Segundo Rogers, a aceitação incondicional permite à pessoa a oportunidade de

evoluir e crescer quer cognitiva quer emocionalmente e desenvolver autoconceitos mais

realistas.

Para Rogers e outros teóricos da abordagem Humanista, por exemplo, Abraham

Maslow que propõe a teoria da motivação, a finalidade última da personalidade é a realização

pessoal.

A realização pessoal é um estado de plenitude pessoal em que as pessoas são capazes

de concretizar as suas potencialidades próprias. O que, segundo Rogers, só se verifica

quando a sua experiência diária e o seu autoconceito se adequam. Deste modo, as pessoas

auto-realizadas aceitam-se como são na realidade, o que lhes permite atingir a felicidade e a

plenitude das suas capacidades.

Abraham Maslow encara o desenvolvimento da personalidade baseado na motivação

que pode ser hierarquizada, segundo o grau de importância.

Necessidades fisiológicas: a sede é uma necessidade mais forte que a fome; mas menos do

que respirar; já o sexo é a necessidade menos forte das antes referidas.

Acham-se também incluídas as necessidades que se dirigem a manter-nos ativos, a

dormir, a descansar, a eliminar desperdícios (suor, urina e fezes) , a evitar a dor e a ter sexo.

Necessidades de segurança e tranquilização: quando as necessidades fisiológicas se mantêm

compensadas, entram em jogo estas necessidades. Começamos a preocupar-nos com questões

que providenciem segurança, proteção e estabilidade. No adulto médio, este grupo de

necessidades remete para a urgência de ir para casa, ou para um lugar seguro, estabilidade

ao nível do trabalho, um bom plano de férias, e um bom seguro de vida, entre outras.

Necessidades de amor e pertença: quando as outras necessidades fisiológicas e de segurança e

tranquilização, se completam, iniciam-se estas necessidades que remetem para a necessidade

de afeto (amizade, casal, crianças e relações afetivas em geral) , incluindo a sensação geral de

pertencer a uma comunidade.

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Pela negativa, tornamo-nos exageradamente susceptíveis à solidão e às ansiedades

sociais.

Na nossa vida quotidiana exibimos estas necessidades através do desejo de união

(matrimônio) , de ter uma família, de fazermos parte da comunidade, ser membros de uma

igreja, de uma irmandade, fazer parte de um grupo ou clube social. É igualmente o que

procuramos quando elegemos uma carreira.

Necessidades de estima: Uma vez satisfeitas as necessidades anteriores, começamos a

preocupar-nos com algo relacionado com a auto-estima.

Maslow descreveu duas versões de necessidades de estima: uma elevada, outra baixa.

A baixa necessidade de estima é em relação aos outros, a necessidade de estatuto,

fama, glória, reconhecimento, atenção, reputação, apreciação, dignidade e inclusive domínio.

A alta necessidade de estima relaciona-se com a necessidade de respeito por si

mesmo, incluindo sentimentos tais como confiança, competência, erros, mestria,

independência e liberdade.

Observe-se que esta é uma forma “elevada” porque diferencia o respeito que temos

para com os outros do respeito que temos para conosco. E este é mais difícil de se perder!

A versão negativa destas necessidades é uma baixa auto-estima, e complexos de

inferioridade. Maslow estava convicto que Adler tinha descoberto algo importante quando

propôs que esta estava na raiz de muitos dos nossos problemas psicológicos.

Maslow considera todas estas necessidades como essencialmente vitais. Inclusive, o

amor e a estima são necessárias para a manutenção da saúde. Afirma que todas estas

necessidades estão construídas geneticamente em todos nós, como os instintos. Assim,

chama-lhes necessidades “instintivoídes” (quase instintivas) .

Em termos de desenvolvimento geral, movemo-nos através destes níveis como se de

estágios se tratasse. Quando recém-nascidos o nosso foco (ou o nosso quase completo

complexo de necessidades) situa-se ao nível fisiológico. Imediatamente começamos a

reconhecer que necessitamos sentir-nos seguros. Pouco tempo depois, procuramos a atenção

e o afeto. Um pouco mais tarde, procuramos a auto-estima. Tudo isto ocorre logo nos

primeiros anos de vida.

Sob condições de stress ou quando a nossa sobrevivência se encontra ameaçada,

podemos “regressar” a um nível de necessidade menor. Quando o nosso grande esforço

falhou, pode-se procurar um pouco de atenção. Quando a nossa família nos abandona,

parece que a partir daí a única coisa de que necessitamos é amor.

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Se formos privados das nossas necessidades físicas básicas, se estamos a viver

abaixo das circunstâncias amenizantes, se estamos alheados dos demais ou, se não temos

confiança nas nossas capacidades, podemos continuar a sobreviver, no entanto, não

vivendo. Não estaremos a atualizar completamente as nossas potencialidades e inclusive

seremos muito bem capazes de perceber que existem pessoas que se atualizam apesar da

privação.

Se considerarmos as necessidades de défice separadas das de atualização e se

falamos de uma auto-atualização completa em vez de auto-atualização como uma categoria

separada de necessidades, a teoria de Maslow entrelaça-se com outras teorias e aquelas

pessoas excepcionais que conseguem alcançar o êxito no meio da adversidade podem então

ser consideradas como heróis em vez de exceções ou raridades.

A teoria biológica ou evolucionária propõe que os componentes importantes da

personalidade são herdados. Esta teoria baseia-se em trabalhos de especialistas de genética do

comportamento, e é proposto por estes autores que a personalidade é, pelo menos em parte,

determinada por uma combinação de genes particular, à semelhança do que sucede, por

exemplo, com a altura do indivíduo, a qual resulta, em larga medida das contribuições

genéticas dos nossos antepassados.

Segundo esta abordagem os fatores de personalidade seriam influenciados pelos

fatores genéticos. A seguir apresenta-se uma lista de fatores de personalidade e a porcentagem

em que estes são influenciados pela hereditariedade (adaptado de Feldman, R. S. , 2001, p.

487) :

Potência social (é dominador, um líder que gosta de estar no centro das atenções) -

61%

Tradicionalismo (segue as regras e a autoridade, subscreve padrões morais elevados

e disciplina estrita) - 60 %

Reação ao “stress” (sente-se vulnerável e sensível, preocupa-se e irrita-se

facilmente) - 55%

Alheamento (possui uma imaginação muito fértil facilmente posta a funcionar pelas

experiências mais ricas; abandona o sentido de realidade) - 55 %

Alienação (sente-se maltratado e usado, pensando que “a vida é ingrata) 55%

Bem-estar (possui uma disposição alegre, sente-se confiante e otimista) 54 %

Evitamento da dor (evita os riscos e perigos, prefere ir pelo caminho mais seguro

mesmo que seja monótono) - 5 1%

46

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Agressividade (é fisicamente agressivo e vingativo, gosta de violência e tenta

“conquistar o mundo”) - 48%

Realização (trabalha duramente, procura controlar o seu contexto, põe o trabalho e as

realizações à frente do resto) - 46 %

Controlo (é cauteloso, racional, sensível, gosta dos acontecimentos cuidadosamente

planeados) - 43 %

Proximidade emocional (prefere a intimidade emocional às relações próximas, busca

nos outros conforto e ajuda) - 33 %

Esta perspectiva biológica e evolucionária defende que as crianças nascem com um

temperamento particular, uma disposição básica e inata (que emerge precocemente na vida) e

que o temperamento integra diversas dimensões, incluindo o grau de atividade geral e a

disposição.

Ainda de acordo com Duque (2006) os autores da Teoria dos Traços de Personalidade

defendem que todos os indivíduos possuem diversos traços de personalidade, variando entre

elas quanto ao grau em que este está presente.

O maior desafio para esta abordagem consiste na identificação dos traços primários

necessários na descrição da personalidade. Os diferentes teóricos desta abordagem têm vindo

a desenvolver um esforço consistente para apresentar conjuntos de traços extraordinariamente

diferentes. Os traços podem ser definidos como características permanentes da personalidade

que diferem de pessoa para pessoa.

Gordon Allport examinou de modo sistemático um dicionário e encontrou 18000

termos que podiam ser usados para descrever a personalidade. Ele reduziu essa lista para

4500 termos, através da eliminação de termos sinônimos e no final confrontou-se com um

problema crucial: quais destes são os fundamentais?

Para responder a esta questão estabeleceu três tipos básicos de traços: cardinais,

centrais e secundários (Alpport, G. , 1961; 1966) .

Traço cardinal é uma característica única que orienta a maioria das atividades da

pessoa (ex: uma pessoa generosa por natureza pode dirigir a sua atividade para ações de

caráter humanitário; alguém que tenha uma inesgotável sede de poder pode orientar a sua

vida pela sua permanente necessidade de controle) ;

Geralmente as pessoas não desenvolvem este tipo de traços cardinais abrangentes,

em vez disso, possuem um conjunto de traços centrais que constituem a base da

personalidade.

47

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Traços centrais como honestidade, sociabilidade, são características fundamentais da

pessoa; Habitualmente são entre cinco e dez.

Traços secundários são características que influenciam o comportamento em menor

grau, em menos situações, sendo menos centrais que os traços cardinais. (ex. , gostar de

praticar desportos radicais, ou não gostar de arte moderna) .

Mais recentemente, a identificação dos traços primários centrou-se numa técnica

estatística designada de análise fatorial.

A análise fatorial é um método que consiste em sintetizar as relações entre um grande

número de variáveis num número menor e num padrão mais geral. Por exemplo pode-se

administrar um questionário a muitas pessoas solicitando-lhes que se identifiquem com uma

extensa lista de traços. Ao combinar estatisticamente as respostas e calcular quais os traços

que estão associados numa mesma pessoa, o investigador pode identificar um padrão

fundamental ou combinação de traços – chamados fatores – que estão subjacentes às respostas

dos participantes.

Raymond Catell propôs, em 1965, que as características que podem ser observadas

numa dada situação representam 46 traços superficiais, ou agrupamentos de comportamentos

relacionados (ex: pode-se encontrar um bibliotecário simpático, gregário, que nos auxilia na

pesquisa e, após um conjunto de interações com ele, chega-se à conclusão que também possui

uma característica: sociabilidade – nos termos do modelo de Catell, este é um traço de

superfície. Este traço de superfície está baseado nas percepções e representações que os

indivíduos têm sobre a personalidade, e que estão na base, na origem do comportamento.

Continuando a análise fatorial, Catell descobriu, outros 16 traços básicos, que

representam as dimensões básicas da personalidade.

Usando estes traços básicos, construiu o Questionário dos Dezesseis Fatores de

Personalidade, ou 16 PF, uma medida que proporciona valores para cada um destes traços de

personalidade.

Os perfis de personalidade são desenhados com base nas seguintes dicotomias de

traços de personalidade: reservado/expressivo, menos inteligente/mais inteligente,

influenciado por sentimentos/ emocionalmente estável, submisso/dominante,

sério/despreocupado, expedito/arriscado, tímido/aventureiro, duro/sensível,

confiante/desconfiado, prático/imaginativo, direto/evasivo, auto-confiante/apreensivo,

conservador/experimentador, dependente do grupo/auto-suficiente, descontrolado/

controlado, calmo/tenso.

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Heysenck utilizou também a análise fatorial para identificar os padrões de traços, no

entanto chegou a conclusões diferentes sobre a natureza da personalidade. Encontrou três

termos que correspondem a três dimensões fundamentais: extroversão, neuroticismo e

psicoticismo.

A extroversão relaciona-se com o grau de sociabilidade, enquanto que a dimensão

neurótica inclui a estabilidade emocional. Por fim o psicoticismo refere-se à forma como a

realidade é distorcida.

Ao avaliar as pessoas de acordo com estas três dimensões, Heysenck foi capaz de

prever rigorosamente o comportamento em diversos tipos de situações.

Os diferentes traços associados com cada uma das dimensões são:

Extroversão: sociável, vivo, ativo, assertivo, procurando sensações;

Neuroticismo: ansioso, deprimido, culpado, baixa auto-estima, tenso;

Psicoticismo: agressivo, frio, egocêntrico, impessoal, impulsivo.

Muitos dos atuais teóricos dos traços, propõem que cinco traços correspondem à

estrutura da personalidade. Esses cinco fatores a que se chamou os “Big Five” são:

extroversão, concordância, consciência, neuroticismo e abertura à experiência.

Teóricos como Freud, Jung, Adler e Horney apresentam teorias psicodinâmicas da

personalidade. De modo geral, essas teorias enfatizam a importância de motivos, emoções e

forças internas na formação da personalidade humana. Esta se desenvolve mediante a

resolução de conflitos psicológicos, que ocorreram geralmente na infância.

A psicanálise é uma das raras linhas da psicologia que se preocupa com a estrutura da

personalidade ou aparelho psíquico. Segundo a teoria psicanalista, a personalidade é

resultante do desenvolvimento das estruturas ego e superego, dos processos de pensamento e

da sexualidade.

Na visão da psicanálise, o ser humano não nasce com um eu (sujeito psíquico) pronto,

mas irá construí-lo a partir de si e de suas interações familiares e sociais.

Segundo Freud (1973) , fundador da psicanálise, a personalidade resulta dos impulsos

fixados nos cinco primeiros anos de vida, somados aos impulsos adquiridos por meio da

sublimação e os mecanismos de defesa do ego, destinados a substituir os impulsos libidianos

e agressivos por outros que são socialmente aceitos.

A teoria da personalidade apresentada por Freud fundamentou-se na observação

clínica de seus pacientes, não utilizando para tal método experimental. Freud utilizou uma

abordagem estruturalista fundamentada na lógica formal e cientificou o aparelho psíquico.

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Numa concepção topológica, Freud apresentou as áreas da consciência humana: o pré-

consciente, o consciente e o inconsciente.

O pré-consciente é um sistema situado entre o consciente e o inconsciente. É formado

por atos psíquicos que tiveram a passagem liberada do inconsciente, os traços mnêmicos.

Segundo Cloninger (1999) , caracteriza-se pelo pensamento racional lógico, a linguagem, o

controle motor, a noção de bem ou mal. Pelo princípio de realidade, o processo secundário, o

qual adia a satisfação do desejo conforme coordenadas espaço-temporais. O pré-consciente

constitui-se, a exemplo do inconsciente, em um sistema no qual podemos distinguir um

conteúdo e um processo que regem o seu funcionamento.

O consciente é formado por atos psíquicos focalizados momentaneamente.

Caracteriza-se pela atenção, repressão, pensamento racional e recepção das excitações

externas e internas. É a região do universo psíquico que recebe e registra informações internas

e externas. As demais funções são iguais às do pré-consciente excluindo o recalcamento. É

como se esse sistema se situasse na periferia do aparelho psíquico. Sua função principal

consiste na recepção de excitações externas ou internas. Entretanto, ao contrário do que ocorre

no pré-consciente, bem como no inconsciente, o consciente não marca nenhuma excitação. A

censura que separa o consciente do pré-consciente é simplesmente “funcional”, deixa passar

os elementos psíquicos pré-conscientes que interessam à consciência num dado momento.

O inconsciente não é uma negação do consciente, mas outra cena (escondida) da

personalidade. Esse território inconsciente é ativo, organizado por leis e princípios que lhe são

próprios. O conteúdo do inconsciente consiste, pois, em impulsos carregados de desejo. Outro

aspecto é um modo de funcionamento que o torna organizado. Segundo Freud (1973) , o

inconsciente apresenta características que não são encontradas em nenhum outro sistema,

como o desconhecimento da negação, é regulado pelo princípio do prazer, dispensa qualquer

referência à realidade, seus processos são atemporais, é estruturado por relações de

semelhança e contigüidade, através dos mecanismos de deslocamento e condensação. Ele é

constituído de eus psicológicos reprimidos, que não têm acesso aos sistemas pré-conscientes e

conscientes do universo psicológico, pela ação da censura interna do próprio ego que ali se

processa.

A descoberta do inconsciente por Freud foi através da clínica pioneira de Breuer e com

experiências de sugestão pós-hipnótica de Bernheim. A ordem dada ao paciente submetido à

hipnose faz parte de um processo que este não percebe, é subjacente à sua consciência e, no

caso específico, é dominante sobre a consciência.

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As observações de Freud a respeito de seus pacientes revelaram uma série

interminável de conflitos e acordos psíquicos. Um instinto opunha-se a outro; proibições

sociais bloqueavam pulsões biológicas e os modos de enfrentar situações frequentemente

chocavam-se uns com os outros. Ele tentou ordenar este caos aparente propondo três

componentes básicos estruturais da psique: o id, o ego e o superego.

O id é a fonte fundamental da personalidade e está intimamente relacionada com as

funções biológicas, como a respiração, exsudação, e a excreção. É a estrutura da

personalidade original, básica e mais central, exposta tanto às exigências somáticas do corpo

como aos efeitos do ego e do superego. As principais funções do id é manter o equilíbrio entre

forças externas, e as que impelem as pessoas a realizações insatisfatórias. O id é o reservatório

de energia de toda personalidade e funciona no plano instintivo buscando todo o principio do

prazer e de auto-conservação. Os conteúdos do id são quase todos inconscientes, eles incluem

configurações mentais que nunca se tornaram conscientes, assim como o material que foi

considerado inaceitável pela consciência. A principal força do impulso do id é a "libido" uma

forma de energia voltada à sexualidade e sensações prazerosas como: afeição, amizade etc.

O ego significa "eu" em latim e representa a parte do aparelho psíquico que está em

contato com a realidade externa. Segundo Fadiman & Frager (1986) , é uma derivação do id,

mas opera de forma independente. São estas as principais características do ego: em

consequência da conexão pré-estabelecida entre a percepção sensorial e a ação muscular, o

ego tem sob seu comando o movimento voluntário. Ele tem a tarefa de auto-preservação.

Sendo a sua principal função, regular os impulsos frenéticos e irracionais do id. Com

referência aos acontecimentos internos, em relação ao id, ele desempenha essa missão

obtendo controle sobre as exigências dos instintos, decidindo se elas devem ou não ser

satisfeitas. Na concepção de Fadiman & Frager (1986) , o ego mantêm o equilíbrio entre as

solicitações do id e as exigências do superego. Quando este equilíbrio não é satisfeito, gera a

ansiedade no indivíduo. O ego ainda pode desenvolver mecanismos de defesa, como a

negação como forma de reação. Como também gerar impulso, para anular a ansiedade. O ego

atua no campo real.

O superego desenvolve-se a partir do ego. Freud descreve três funções do superego:

consciência, auto-observação e formação de ideais. Enquanto consciência, o superego age

tanto para restringir, proibir ou julgar a atividade consciente; mas também age

inconscientemente. É a estrutura que representa os padrões éticos aprendidos no meio onde

vive o indivíduo especialmente com os pais, por meio do processo castigo-recompensa. O

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superego é o componente realista, que age com extrema perfeição, buscando estabelecer a

diferença entre o bem e o mal.

O superego de uma criança é, com efeito, construído segundo o modelo não de seus

pais, mas do superego de seus pais; os conteúdos que ele encerra são os mesmos e

torna-se veículo da tradição e de todos os duradouros julgamentos de valores que

dessa forma se transmitiram de geração em geração. (Freud 1933, livro 28, p. 87 na

ed. bras) .

A psique tem como meta, manter o equilíbrio dinâmico visando maximizar o prazer.

Grande parte do ego e do superego pode permanecer inconsciente e é normalmente

inconsciente. Isto é, a pessoa nada sabe dos conteúdos dos mesmos e é necessário

despender esforços para torná-los conscientes. (Freud 1933, livro 28. p. 89 na ed.

bras.)

A energia necessária à realização dessa contínua tarefa é proveniente do id que é de

natureza primitiva, instintiva.

O ego, emergindo do id, existe para lidar realisticamente com pulsões básicas do id e

também age como mediador entre as forças que operam no id e no superego e as exigências

da realidade externa. O superego, emergindo do ego, atua como um freio moral ou força

contrária aos interesses práticos do ego. Ele fixa uma série de normas que definem e limitam a

flexibilidade deste último.

O ego, na busca pelo prazer, responde com ansiedade a toda a situação esperada ou

prevista de desprazer. A criança pequena é praticamente dominada pelo princípio do prazer,

buscando a satisfação imediata de suas tensões. Quando esta satisfação cessa, a criança reage

emocionalmente, chorando ou dirigindo sua cólera para o obstáculo que a impede de obter o

que deseja. Às vezes, há o uso de processos primários para diminuir a tensão como: imagens

mentais, devaneios, sonhos, etc.

Freud acreditava que durante a infância os impulsos originários da libido se

concentram em determinadas regiões do corpo, chamadas de zonas erógenas.

O desenvolvimento é biologicamente determinado e tem como ponto de referência as

zonas erógenas. Segundo Davidoff (1983), citando Freud (1973), durante os cinco primeiros

anos de vida, a criança passa por três fases de desenvolvimento que Freud denominou pré-

genitais. Ele acreditava que as atividades características de cada fase são de natureza sexual e

exercem uma influência marcante na personalidade do adulto.

A primeira região que surge como erógena é a boca, a segunda é o ânus e a terceira,

os órgãos genitais. Na análise de Davidoff (1983), o desenvolvimento emocional da criança

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depende das interações sociais, das ansiedades e das gratificações que ocorrem para as

atividades ligadas a essas partes do corpo.

Para Freud (1969) , a sucção do polegar, a tendência da criança colocar tudo na boca,

vêm da necessidade que não está ligada somente à auto-conservação. Durante essa fase, com

o aparecimento dos dentes, começam a se manifestar também os impulsos sádicos ligados ao

instinto agressivo, mesmo que sua expressão não se dê com frequência.

Segundo Schultz & Schultz (2002) , a terceira fase – fase fálica – é a que antecede a

forma final da vida sexual. Desse momento em diante, os sexos se diferenciam. Freud (1973)

cita que os meninos entram na fase edipiana e as meninas sofrem sua primeira desilusão

quando tomam consciência das diferenças existentes entre o homem e a mulher.

O complexo de Édipo termina, segundo Schultz & Schultz (2002) no menino, por

causa da ansiedade de castração. Nas meninas, a problemática edipiana não é tão intensa

quanto nos meninos. É por causa disso que as mulheres desenvolvem um superego mais fraco

e menos severo, o que explica o fato delas serem mais bondosas e mais compreensíveis de que

os homens.

O processo de organização da vida sexual não se realiza sem dificuldades. Podem

ocorrer inibições no seu desenvolvimento. Segundo Fadiman (1980) , quando isso acontece,

encontra-se nas fixações da manifestação da libido características de qualquer uma das três

fases iniciais. Nesses casos, os impulsos da libido tornam-se independentes de seus objetivos

sexuais e transforma-se em perversões.

Entre a terceira e a quinta fases do desenvolvimento, há um período em que os

impulsos sexuais apresentam uma certa calmaria, não ocorrendo nenhum progresso. Essa fase

foi denominada de latência e não mereceu interesse por parte de Freud. Nesse período há o

desenvolvimento dos processos cognitivos e a maior parte da energia psíquica é gasta no

conhecimento do mundo.

Também apresentando uma teoria psicodinâmica para explicar como a personalidade

humana é construída, Jung afirma que individuar é tornar-se si mesmo. Talvez este seja o

mais importante conceito da obra dele.

A individuação é um processo espontâneo de amadurecimento por meio do qual o

indivíduo se torna o que está "destinado" a ser, desde o início. Enquanto imagem, a semente

de uma fruta somente poderá se desenvolver tornando-se ela mesma e não outra: semente de

laranja torna-se laranja e não abacate. Nascemos "sementes" de seres humanos, porém nós

mesmos desconhecemos que tipo de sementes somos, isto é, qual será nossa verdadeira

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identidade profunda. A grande tarefa de nossa existência é descobrirmos quem realmente

somos e será esse nosso processo de "individuação".

Jung define esse processo como característico do que ele chamou "a segunda metade

da vida", não propriamente um critério baseado na faixa etária, mas um processo que costuma

ser deflagrado espontaneamente no indivíduo adulto.

Isso fez com que Jung se interessasse tanto pela psicologia do adulto. Ele dizia que

todo o acontecer psicológico da primeira metade da vida é uma espécie de preparação, de

afinação dos instrumentos para a verdadeira tarefa psicológica de nossa existência, ou seja,

nosso processo de individuação, a descoberta de nossa identidade profunda, através da

realização de nossos potenciais.

Não há processo de individuação fora da interação com a vida, no isolamento, sem a

interação com o outro. É, em parte, através da interação com o outro - extro e/ou

introvertidamente - e com o meio que se torna possível a descoberta do "si mesmo", isto é,

que se torna possível o processo de individuação. É importante essa compreensão, pois às

vezes esse conceito é bastante mal interpretado, sendo tomado como "individualização" ou

algo como se isolar de tudo e de todos. Jung insistia na importância, por ele percebida, do

"outro" na individuação do "sujeito".

Para Jung, é na segunda metade da vida que o indivíduo vai entrar em contato com os

arquétipos, matrizes de comportamento herdadas enquanto espécie, do inconsciente coletivo.

Isso se dá exatamente pelo processo de individuação, no qual ele discrimina quatro fases: em

primeiro lugar a conscientização da persona (máscara através da qual o indivíduo se relaciona

com o Outro e com o mundo) , em segundo lugar o confronto com a sombra (formada por

conteúdos inconscientes que já deveriam estar na consciência) , em terceiro lugar o encontro

com a anima (para o homem) ou com animus (para a mulher) - arquétipos que trazem à

consciência sua contraparte - e, finalmente, o encontro com o Self (ou si-mesmo) ,

representado pelos arquétipos do velho sábio ou da velha sábia.

Neojunguianos importantes, como E. Neuman e, entre nós, Carlos Byington,

estenderam o conceito junguiano de individuação para a vida toda, fazendo com que ela se

torne igual a uma teoria do desenvolvimento. Assim, durante todo nosso desenvolvimento o

ego, ou centro da consciência, será estruturado por símbolos que vêm dos arquétipos, através

de um eixo formado pelo ego e pelo Self (eixo ego-Self de Neuman ou eixo ego-símbolo-

Arquétipo Central, de Byington) .

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Desse modo, desde que nascemos até morrermos, estará acontecendo nosso "processo

de individuação", isto é, nossa consciência, nosso ego estará lidando com os arquétipos, sendo

por eles estruturado através de seus símbolos.

É através da progressiva estruturação do nosso ego, durante o processo de

individuação, que vamos por exemplo, integrando ao ego as outras funções da consciência,

harmonizando nossa tipologia.

Boechat (2007) relata que o conceito de individuação, o principium. Individuatinis, é

encontrado em obras de autores anteriores a Jung, como Aristóteles, Plotino, São Tomás de

Aquino, Leibniz e Schopenhauer. Na filosofia de Schopenhauer, o mundo é um produto da

vontade. Vontade significando uma energia que vai se expressando de início com as forcas da

natureza, e evolui através das plantas e dos animais até chegar ao homem, que seria a

manifestação da vontade mais individualizada.

Schopenhauer nos diz:

...ninguém é feliz e todos os homens se esforçam durante toda a vida em busca de

uma suposta felicidade que raramente conseguem, e, quando isso chega a acontecer,

é apenas para se decepcionarem com ela . (BOECHAT, 2007, p. . 50, apud

SCHOPENHAUER, 1970)

Plotino, filósofo romano (c. 205-270 d. C. ) , traz a ideia de uma viagem de

transformação cósmica e humana.

Imaginava o mundo como empenhado em uma jornada cíclica, envolvendo uma

emanação a partir do Uno original, uma queda em divisão, a multiplicidade e a

individualidade e, finalmente, uma epístrofe, ou volta para a unidade original.

Nietzsche via como objetivo para a vida a afirmação da vontade e a superação do ser.

Para ele, cabe a nós, humanos, projetarmos significado no cosmo, sermos construtores de

mundos. Clarke diz:

Enquanto Schopenhauer via a individuação como o mais terrível fardo da

humanidade, um tipo de castigo pelo simples fato de existirmos, Jung, tal como

Nietzsche, considerava-a como a oportunidade dada ao homem para encontrar

significado na vida. Embora a individuação possa acarretar pesadas

responsabilidades e grandes perigos, era, ainda assim, para Jung, um caminho para a

cura e a completude. Não promete a perfeição final do Uno de Plotino, ou do

Absoluto de Hegel, e nem mesmo o super-homem de Nietzsche, que redime a

história, mas oferece uma meta realista de transformação e crescimento pessoal, de

integração e realização do Si-Mesmo. . (BOECHAT, 2007, p. . 50, apud CLARKE,

1993)

Analisando o processo de individuação, Denise Guimenez Ramos (2005) , afirma que

este processo motiva o ser humano do nascimento à velhice, guiando-o nas escolhas afetivas e

profissionais e que os padrões básicos de comportamento vão se transformando mediante a

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assimilação de novos conteúdos pela consciência coletiva. Além disso, lembra que dos nossos

ancestrais até o dia de hoje houve uma grande evolução no nível de consciência em termos de

conhecimento, ética e moral.

Ainda segundo Ramos a sensação de "ser", independentemente da educação ou da

cultura em que vivemos, é um conceito intuitivo, uma vez que dificilmente a encontraremos

em uma célula ou em algum lugar no cérebro. Basta observar bebês recém-nascidos para ver

características de personalidade que não podem ser reduzidas apenas à genética ou ao

ambiente familiar. Ê comum crianças entre 3 e 5 anos falarem de si mesmo ou de sua origem

não biológica com grande convicção. Uma menina de 5 anos, ao visitar com a mãe a casa dos

avós, pergunta: "Mamãe, onde eu estava quando você dormia nesse quarto?".

A convicção de ter uma existência anterior à vida neste planeta, embora não seja uma

prova científica de existência pré ou pós-morte, é uma convicção psicológica arquetípica,

comum a toda a humanidade. Portanto, é um fato psicológico, assim como a sensação da

existência de um ser transcendente, um deus. Aqui não se disputa a existência de Deus, mas

pode-se afirmar que a ideia de que um deus está presente na psique humana é instintiva e,

portanto, comum a toda a humanidade. Só mudam sua aparência, forma e características

dinâmicas.

O processo de individuação, portanto, é resultante da interação do indivíduo com o

coletivo. No plano individual, à medida que a criança se desenvolve, certas aptidões e gostos

ficam cada vez mais evidentes. De certo modo, o processo de individuar-se depende dessa

fina sintonia com o que podemos chamar de nossa essência e que, embora dependa da

genética, da educação e do ambiente familiar e cultural, certamente a todos transcende.

A bússola para sentirmos quando estamos no caminho da individução é a alegria, uma

convicção forte e espontânea que emerge quando nossas atividades atuais estão alinhadas com

nossa essência inata. Por isso se diz que o objetivo do processo de individuação é fazer o

indivíduo tornar-se a pessoa que realmente é.

Essa singularidade diferencia um ser de qualquer outro e o toma insubstituível, pois a

tarefa que cada um deve cumprir de acordo com seus talentos não pode ser reproduzida por

nenhuma outra pessoa, nem pode ser reprimida.

Denise Gimenez Ramos, diz:

Sistemas educativos e políticos rígidos, que tentam adequar o indivíduo a fins

lucrativos ou ao bem do Estado, levam a distorções desse processo gerando graves

neuroses. Depressões e suicídios de jovens são frequentes onde o sistema totalitário

obriga a servir uma causa que impede o desenvolvimento do "si mesmo". (RAMOS,

2005 p 28)

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Na antiga União Soviética, por exemplo, a psicologia junguiana foi por muito tempo

execrada visto que a educação estava a serviço do Estado e não do bem-estar individual. O

mesmo acontece com a criatividade. Indivíduos criativos são mais livres na sua auto-

expressão em todos os campos. Sua ligação com o inconsciente, isto é, com o material ainda

desconhecido pela consciência coletiva, traz à tona novas perspectivas e novas soluções

técnicas e instrumentais para problemas há anos insolúveis.

Exemplos notáveis são encontrados na literatura e na biografia de pessoas famosas

que, mesmo desprovidas de qualquer possibilidade educativa ou de recursos materiais,

desenvolveram grandes talentos. James Hillman dá como exemplo um dos maiores pianistas

de jazz americanos, que, por falta de recursos, desenhou um teclado sobre uma folha de papel

quando era criança. Durante muito tempo, esse desenho foi o único teclado a que teve acesso

e nele ensaiou e treinou suas capacidades durante muito tempo, até tornar-se um músico

famoso.

Na realidade, o processo de individuação para Jung, além de ser uma busca de

autoconhecimento que vai levando a uma unicidade maior da personalidade, é uma busca do

sentido maior de vida da pessoa, é a busca do nosso mito individual, mesmo que, para isso,

tenhamos de admitir uma derrota dos valores do ego.

Com isso, o que Jung quer nos dizer é que devemos ter uma disposição sempre

renovada de mudar a postura consciente em função de uma melhor adaptação não só ao

mundo externo mas também à realidade interna de cada um de nós. Esta mudança de atitude

consciente vai nos trazer uma noção de harmonia psíquica. Para tanto, o ego deve se deixar

liderar por uma estrutura de mais autoridade e sabedoria, que é o Si-Mesmo ou Self .

Jung (2005) afirma que o objetivo da individuação é nada menos que despir o Self dos

falsos invólucros da persona, por um lado, e do poder sugestivo de imagens primordiais pelo

outro. Isto porque na visão de Jung, a persona, a máscara de adaptação social que somos

obrigados a usar para nos sentirmos aceitos pelo social, pode ser um fator positivo ou

negativo. A persona é positiva quando, além de estar de acordo com as expectativas sociais,

não contraria a nossa maneira mais própria e única de ser. Ela é negativa quando nós nos

identificamos com ela e passamos a viver em função dela, ou seja, das expectativas do social,

mais do que em função das nossas necessidades individuais.

Jung diz:

A persona é responsável pela nossa adaptação ao mundo social e é expressa nos

nossos estilos de vida, nas imagens que temos sobre as categorias profissionais e até

mesmo na moda. (Jung 2005 p. 39)

Jung vai mais além e completa:

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Aquele que tem uma persona bem adaptada – que corresponde às expectativas da

moda – tem maiores chances de ser reconhecido como uma pessoa bem sucedida e

amada. (Jung 2005 p. 39)

Para explicar como a personalidade se forma, Alfred Adler alegou que a sexualidade

era super-estimada por Freud, ao nível do desenvolvimento da personalidade e propôs que a

motivação humana primária fosse a busca de melhoria pessoal e a perfeição.

Na sua opinião, o complexo de inferioridade verificado nas pessoas ocorre porque os

adultos não chegaram a resolver os seus sentimentos de inferioridade quando crianças,

quando possuíam uma visão menor e limitada sobre o mundo, visto que as relações sociais

iniciais têm um importante efeito na forma como as crianças são capazes de ultrapassar a

inferioridade.

Ele igualava saúde psicológica à consciência social construtiva. Ele desenvolveu um

sistema que chamou de psicologia individual, o qual está ainda em vigor em muitos países.

Sua principal contribuição social foi o estabelecimento de centros de orientação infantil em

Viena que serviram como modelo para o resto do mundo.

Em contraste com Freud e sua ênfase sobre conflito intrapsíquico inconsciente, Adler

via as pessoas como entidades biológicas unificadas e singulares, cujos processos

psicológicos encaixam-se e justificam um estilo de vida individual. Além deste princípio de

unidade, Adler postulou um princípio de dinamismo, ou seja, cada pessoa está direcionada ao

futuro e que se move em direção a uma meta. Uma vez que a meta é estabelecida, o aparelho

psíquico molda-se em direção à obtenção desta meta. As metas de vida são escolhidas e são,

portanto, sujeitas à mudança; tais mudanças requerem a modificação das memórias, sonhos e

percepções para encaixar-se à realização desta meta. Adler também enfatizou a relação entre a

pessoa e seu ambiente social e enfatizou ação no mundo real sobre fantasia. A tendência de se

viver em comunidades, aceitação da necessidade de adaptar-se a demandas legítimas da

sociedade, é um preceito importante, mas Adler também indicou que uma dialética ocorre

entre as pessoas e seu ambiente interpessoal, cada qual constantemente reagindo e moldando

o outro.

A pedra fundamental da teoria da personalidade de Adler é o conceito de passar de um

sentimento de inferioridade para um sentimento de domínio. Segundo o autor, cedo na vida,

todos têm um sentimento de inferioridade resultante da comparação realista com o tamanho e

as habilidades dos adultos. Passar deste sentimento de inferioridade para um sentimento de

adequação é o tema principal motivacional importante na vida. Deste modo, a pessoa ideal

empenha-se por superioridade e o faz através de alto interesse social e da atividade; a pessoa

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emocionalmente incapacitada continua a sentir-se inferior e reforça esta posição através de

falta de empenho e interesse social.

Muitos obstáculos podem bloquear o desenvolvimento da auto-estima e interesse

social. Proeminentes entre eles estão órgãos ou sistemas mal desenvolvidos ou inferiores,

doenças infantis, excesso de cuidados e negligência. Desvantagens físicas e doenças de

infância podem promover autocentralização e perda de interesse social. Um outro fator que

contribui para o desenvolvimento da personalidade é a ordem de nascimento. Crianças

primogênitas, após ter perdido sua posição de filho único, tendem a não partilhar. Elas se

tornam conservadoras. Filhos segundos favorecem mudança e tornam-se ativistas sociais e

filhos mais novos sentem-se seguros porque eles nunca foram substituídos.

Em sua teoria, Adler afirma que os transtornos emocionais resultam de estilos de vida

errôneos, que são sujeitos à mudança pela vontade e por auto-entendimento. Pessoas sujeitas a

transtornos emocionais têm falsas idéias sobre si mesmas e o mundo e metas inapropriadas

que as afastam de interesses sociais construtivos. Aquelas com um estilo de vida mimado, por

exemplo, esperam e exigem de outros, evitam responsabilidade e incriminam os outros por

seus fracassos, mas porque seu bem-estar depende de pressionar outros a servir. Sentem-se

incompetentes e inseguras. Se a vida não impõe nenhum desafio, um estilo de vida errôneo

pode não ter consequências. Quando um estilo de vida errôneo é ineficaz, sintomas se

desenvolvem. Estes sintomas protegem a auto-estima enquanto ajudam a pessoa a evitar lidar

de forma realista com o problema a ser confrontado. A diferença entre transtornos mentais

menores e maiores é que aqueles com transtornos menores mantêm interesse social, mas são

bloqueados das metas de vida pelos sintomas, porém os com transtornos mentais maiores

perdem interesse social e voltam-se para seus próprios mundos.

Horney também apresentou sua teoria sobre a personalidade. Sustentou que o

desenvolvimento da personalidade resulta da interação de forças biológicas e psicossociais

que são singulares para cada pessoa. A personalidade desenvolve-se em termos de relações

sociais e depende particularmente da relação entre os progenitores e crianças e da maneira

como as necessidades da criança são satisfeitas.

Na medida em que o cerne de cada personalidade é um self real duradouro equivalente

parcialmente ao ego freudiano e parcialmente ao estado de ego infantil de Eric Berne, o self

real combina escolha, vontade, responsabilidade, identidade, espontaneidade e vivacidade.

Um processo natural em desenvolvimento de auto-realização conduz ao desenvolvimento do

potencial humano em três direções básicas: em direção aos outros, a expressão de amor e

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confiança; contra os outros, para a expressão de oposição saudável; e para longe dos outros

em direção à auto-suficiência.

Embora as condições, durante a infância, possam bloquear o desenvolvimento

psicológico, o crescimento saudável é sempre possível se os bloqueios internos são

removidos. As crianças cujas situações familiares as levaram a sentir-se sob perigo,

concentram em sobrevivência psicológica e podem fazer isso desenvolvendo mecanismos de

enfrentamento esterotipados.

Horney pensou que os atributos de passividade e sofrimento não eram biologicamente

específicos às mulheres conforme ensinados pelos analistas da sua época e que personalidades

masculina e feminina são, em realidade, culturalmente determinadas.

Horney definiu neurose tanto em termos intrapsíquicos como interpessoais. Ela

observou que seus pacientes queixavam-se não das neuroses sintomáticas como fobias e

compulsões, mas de infelicidade, bloqueio e falta de preenchimento no trabalho e inabilidade

de estabelecer ou manter relacionamentos. Ela viu estes pacientes como apresentando

complexos sistemas de padrões defensivos autoperpetuantes contra a ansiedade básica que

iniciou na primeira infância - neuroses de caráter. Busca de segurança. As crianças movem-se

psicologicamente em três direções para aliviar sua ansiedade, para tornar a vida segura e

previsível e para obter satisfação. Elas buscam afeto e aprovação ou elas se tornam hostis ou

elas se retraem. As crianças por fim usam a estratégia de enfrentamento que melhor satisfaz

suas necessidades, mas se apenas uma estratégia básica é usada, as crianças tornam-se

limitadas em seu repertório de enfrentamento em sua experiência de si mesmas e do seu

mundo. Seu senso de segurança é tênue porque elas têm perigo vindo de dentro de

sentimentos e impulsos suprimidos ou reprimidos. Se as condições ambientais desfavoráveis

continuam, seus sentimentos conflitantes são dirigidos para o inconsciente e tais crianças são

deixadas com um senso de desconforto, ansiedade e apreensão e com um senso de self

inseguro. Nesta junção, seu ponto de referência é externalizado, padrões de comportamento

enrijecem e crescentes bloqueios ao crescimento se desenvolvem. Horney designou estas

atitudes complexas, relativamente fixas em direção ao eu e aos outros como tendências

neuróticas.

Horney apresenta três principais tipos de caráter que são embasados no modo

predominante de relacionar-se com outros. O tipo self-apagado, anuente resulta da operação

defensiva de agarrar-se a outros. Tais pessoas tentam obter o favor dos outros através de

lisonja, subordinam-se aos outros e são relutantes em discordar por medo de perder favor. O

tipo expansivo, agressivo resulta de manobrar contra outros e colocar forte confiança em

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poder e domínio como um meio de obter segurança. O tipo desapegado, resignado resulta de

afastar-se de outros para evitar tanto dependência como conflito. Eles são pessoas muito

privadas que, embora se recusando a competir abertamente, vêem-se como se elevando acima

dos outros.

O superdesenvolvimento de um dos três estilos interpessoais básicos suprime os outros

dois. De um modo análogo aos complexos de Jung, os impulsos reprimidos continuam ativos

e produzindo conflitos. Uma harmonia artificial é obtida pelo uso de mecanismos mentais

como pontos cegos, comportamentalização, racionalização e técnicas de enfrentamento como

autocontrole excessivo, arbitrariedade, elusividade, cinismo e externalização.

Durante seus anos de adolescência, os futuros pacientes neuróticos criam uma imagem

ideal fantasiada que, caso atingida, promete terminar com seus sentimentos dolorosos e supre

o autopreenchimento. A imagem idealizada contrabalança a alienação dos eus centrais pela

qual as pessoas neuróticas passam porque as técnicas de sobrevivência que elas adotaram

anteriormente as forçam a anular seus desejos, sentimentos e pensamentos genuínos. A

imagem idealizada cobre todas as contradições, oculta a natureza defensiva do seu

comportamento e restaura um senso de integridade. A energia anteriormente disponível para a

auto-realização é usada em esforços para tornar-se como a imagem idealizada. Por exemplo,

uma pessoa que adotou a estratégia de mover-se em direção aos outros e é consequentemente

dependente de outros para obter afeto e aprovação, experimenta o medo de auto-asserção

razoável como humildade imaculada e a consideração pelos outros.

Porque o eu ideal é imaginário, as pessoas neuróticas são prontamente machucadas

por confrontos com a realidade e elas trabalharam demasiado arduamente para provar que elas

são, de fato, os seus eus ideais. Fazer isso resulta em um tipo de perfeccionismo que insiste

em excelência imaculada na qual "eu deveria" substituir "eu quero" ou "eu preciso". Isso

também resulta na ambição neurótica de ser o primeiro e em um forte impulso de vingança

sobre os percebidos como tendo interferido em que eles se tornassem seus eus ideais.

Apesar da sua frequente autodepreciação, as pessoas neuróticas esperam ser tratadas

como se fossem seus eus ideais. Estas reivindicações a tratamento especial, quando frustradas,

produzem raiva, indignação e ressentimento os "Deveres", demandas auto-impostas de que

eles devem viver à altura dos seus eus idealizados são irracionais e não relacionados às

realidades da vida cotidiana. Os "Deveres" são projetados e experimentados como demandas

feitas por outros e são também exigidos dos outros. Fazer isso resulta em que a pessoa

neurótica seja crítica dos outros e sensível ao criticismo.

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O auto-ódio resulta quando surge a ameaça que as pessoas neuróticas podem ser

incapazes de atingir seus eus idealizados. Se o apoio não fosse necessário para o self

idealizado, as alegações, "os deveres" e o auto-ódio não seriam partes tão importantes do

aparelho psíquico.

A autora em sua teoria refere-se ao orgulho neurótico e o mecanismo do orgulho.

Segundo Horney, aspectos glorificantes do self idealizado, orgulho neurótico substitui

autoconfiança saudável. Deste modo, quando seu orgulho é ferido por outros, as pessoas

neuróticas tornam-se enfurecidas e buscam vingar sua mágoa e ocultar sua autodecepção

obtendo uma vitória vingativa sobre a pessoa ofensiva. Junto com apoiar alegações e deveres,

o orgulho neurótico e o auto-ódio formam uma rede defensiva ou mecanismo do orgulho que

protege o self idealizado. Qualquer tentativa de reduzir elementos do mecanismo do orgulho é

experimentada como um ataque sobre a pessoa. Apesar da couraça da sua rede defensiva, as

pessoas neuróticas não estão em paz porque elas estão em conflito interno com as forças que

as protegem. O conflito entre o mecanismo do orgulho e as forças impulsionando em direção

à auto-realização saudável é o conflito interno central.

De acordo com seus estudos, Horney afirma que o conflito também existe dentro do

próprio mecanismo do orgulho. O orgulho neurótico e as reivindicações estão associados à

imagem idealizada glorificada; auto-ódio e "deveres" estão associados aos aspectos

inaceitáveis do self. Quando tentativas são feitas para satisfazer ambas as forças

simultaneamente, o conflito surge. Tentativas de evitar estes conflitos envolvem alienação

adicional do self.

Sobre alienação, a autora diz que a alienação do self é uma das consequências mais

sérias do desenvolvimento neurótico. A alienação resulta da combinação entre negação

repetida da realidade externa e a repressão de pensamentos, sentimentos e impulsos genuínos.

À medida que o processo de alienação continua, as pessoas neuróticas perdem contato com o

cerne do seu ser e não mais podem determinar ou agir sobre o que é certo para elas. Seus

sentimentos podem variar de incerteza e confusão à morte e vazio internos.

2.2 DOCENTE COMO FATOR DETERMINANTE NA FORMAÇÃO DO ALUNO

O processo de desenvolvimento do ser humano não se restringe apenas a aspectos

cognitivos, mas principalmente aos afetivos. Desta forma as relações que ele mantém com o

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Outro tem grande importância na construção de sua auto-estima, visto que ele tem uma

natural e permanente necessidade de ser ouvido, acolhido e valorizado pelos que o cercam.

O contato com diferentes grupos sociais contribui de forma relevante na construção do

auto-conceito da pessoa. A família é o primeiro grupo social que ela faz parte e do qual recebe

influências que determinam em grande parte o seu futuro. O auto-conceito que a criança terá

de si, refletirá em suas ações e na forma como vê o outro e o mundo.

As famílias, hoje com uma composição bastante diferente das observadas num

passado, não mais conseguem participar de forma integral do processo educativo. Na ausência

do cumprimento dessa função histórica por pais e mães, atribulados com suas atividades

profissionais, cabe ao docente o exercício do papel de orientador tanto escolar, como de

formação para a vida.

Outro fato preocupante nos dias é que as crianças são inseridas cada vez mais cedo nas

creches ou escolas. Muitas delas permanecem em tempo integral na escola aumentando ainda

mais o contato direto com os educadores, o que leva as crianças a concebê-los como

integrantes de sua família.

No entanto há um descompasso entre a formação dos professores e as exigências da

sociedade de agora. A maioria dos cursos universitários que os capacitam dão ainda mais

ênfase aos conteúdos do que às relações humanas, negligenciado o fato de que o docente tem

que conhecer mais as pessoas e saber lidar com suas carências afetivas e que transmitir

conhecimentos é importante, mas saber lidar com as crianças e adolescentes, é imprescindível.

É o professor que estabelece os objetivos para seus alunos e essa tarefa é realizada

levando em conta as necessidades e objetivos dele, professor. Dessa forma suas referências

representam padrões da educação pessoal e da experiência profissional com os quais ele

avalia os seus atos e os atos dos alunos.

Tais avaliações levam à escolha de novos atos. A realimentação constitui o traço

essencial que permite ao professor auto-avaliar-se e avaliar os atos do aluno, existindo assim,

uma interdependência entre os atos do professor e do aluno.

Na escola, o professor tem o poder de tomar decisões e influenciar os alunos direta e

indiretamente. Como indivíduo ele é o agente emissor da informação, organizador de

atividades e realimentador por excelência do sistema educacional. Como grupo, compõe a

massa crítica da sociedade, sendo capaz de indicar direções, propor mudanças e influir na

tomada de decisões, de modo a ser ele, teoricamente, o estrategista da própria sociedade.

Quando a criança ingressa na escola e tem uma visão negativa de si, demonstra um

comportamento diferente dos demais colegas como, agressividade ou apatia e, na maioria das

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vezes é considerada preguiçosa, desatenta, irresponsável e seu desempenho escolar é

comprometido. Isto ocorre em decorrência de inúmeros fatores, inclusive, do auto-conceito

que ela faz de si, não acreditando na sua capacidade de resolver problemas que surgem no seu

cotidiano.

Por isso, a escola deve propiciar melhores condições de aprendizagem, selecionando

atividades e posturas necessárias, que promovam o resgate da auto-estima do aluno. O aspecto

afetivo tem uma profunda influência sobre o desenvolvimento intelectual. Ele pode acelerar

ou diminuir o ritmo de desenvolvimento, e determinar sobre que conteúdos a atividade

intelectual se concentrará e, na teoria de Piaget, o desenvolvimento intelectual é considerado

como tendo dois componentes um cognitivo e outro afetivo que desenvolvem-se

paralelamente.

O papel da escola, enquanto relação professor/aluno, é de suma importância para que a

formação da auto-estima seja pautada em segurança, autonomia de idéias, conceitos que o

próprio aluno tenha de si e que contribuem para seu desempenho escolar e de sua vida como

um todo.

A escola como parte integrante da sociedade não pode ficar alheia ao fato de ser muito

importante na formação do ser aprendente. Recorrendo-se ao pensamento de Wallon, Piaget e

Vygotski, vemos que a escola deve basear suas ações pedagógicas na melhoria da relação

professor/aluno proporcionando momentos mais ricos no processo ensino/aprendizagem ao

reconhecer que a afetividade é um elemento desencadeador de diferentes ações que

beneficiam todos os envolvidos no processo de crescimento pessoal.

Sobre isso Antunes afirma:

Se um professor assume aulas para uma classe e crê que ela não aprenderá, então

está certo e ela terá imensas dificuldades. Se ao invés disso, ele crê no desempenho

da classe, ele conseguirá uma mudança, porque o cérebro humano é muito sensível a

essa expectativa sobre o desempenho. (ANTUNES. 1996, p. 56)

O professor consciente e comprometido a colaborar para a construção da auto-estima

positiva de seus alunos procura criar um clima de confiança que leve a pessoa a sentir-se

genuinamente aceita, compreendida e respeitada, sentimentos estes que ajudam a trabalhar

núcleos emocionais que bloqueiam condutas inadequadas.

Os educadores sabem que as crianças aprendem melhor quando estão satisfeitas com

elas mesmas, no entanto, alguns professores desconhecem seu papel de espelho dentro da sala

de aula, esquecendo que seus alunos os admiram e estão preocupados em ser iguais a eles,

acabando por imitá-los em suas atitudes e até pensamentos. Se os professores percebessem

essa imitação, sem dúvida procurariam policiar suas palavras e posturas.

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Esperam-se mudanças na educação a partir de conscientização de novas metodologias

que insiram cada vez mais o aluno em uma vida escolar que retrate sua realidade e que busque

a contextualização, porém, olhando-se de outro prisma, a solução para a educação pode estar

no afeto. Afeto este que inclua, que proporcione crescimento e valorização do ser humano e

reconhecimento pessoal como sujeito ativo na construção da história.

Mais do que aula, muitas vezes o aluno vai para a sala de aula em busca de respostas

que esclareçam o seu verdadeiro papel na sociedade. Considera esta escola, como grupo social

que pode contribuir para sua formação como cidadão e, na maioria das vezes, o professor não

se preocupa com o tipo de aluno que está convivendo, muito menos, em estabelecer um

vínculo afetivo mais forte nesta relação favorecendo atitudes positivas que favoreçam na

formação da auto-estima do aluno.

A psicanálise muito tem a contribuir para a formação de educadores, já que estes,

preocupados com a construção do conhecimento do aluno, devem atentar-se para os aspectos

motivadores do despertar da curiosidade do aluno, processo no qual a representação que o

professor causa constitui peso considerável.

Quem não se recorda de alguém já ter dito o quanto determinado professor foi capaz

de influenciar consideravelmente na opinião, motivação e relação do aluno em relação a uma

disciplina específica? Este fato recorrente encontra na psicanálise fundamentações teóricas

para sua sustentação: as transferências, que seriam reedições dos impulsos e fantasias

despertadas que trazem como característica a substituição de uma pessoa anterior pela pessoa

do professor.

Os pais são os primeiros símbolos para a criança, os quais serão contestados somente

mais tarde. A escola possui papel fundamental na descontinuidade deste pensamento, quando

distingue o conhecimento que o aluno traz de casa com a forma pela qual ele é tratado pelo

professor. É muito comum encontrar alunos fazendo suas tarefas de casa e, frente às

intervenções sugeridas pelos pais, tenham se retraído veementemente, alegando que a forma

proposta por eles não é do jeito da professora. Tal fato é um exemplo de transferência: os pais,

em primeira instância tidos como mantenedores de todo o conhecimento, têm suas posições

deslocadas para os professores, que devem por isto estar cientes deste processo psicanalítico,

para que possam lidar da melhor forma possível e favorecer a construção do conhecimento.

De acordo com a psicanálise as pessoas com as quais a criança convive fora do seu

círculo familiar assumem papel de figuras substitutas desses primeiros objetos de seus

sentimentos, tornando-se imagens destes.

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A transferência que acontece durante as interações que a pessoa vive é uma

manifestação inconsciente e como tal, pode gerar atos falhos, pois através da transferência a

pessoa pode aproximar-se ou rejeitar outras pessoas sem mesmo saber o porquê disso.

Dessa forma, sentimentos de simpatia ou rejeição gratuitos que tanto o professor pode

sentir em relação a algum aluno, assim como algum aluno em relação ao professor; podem ter

origem nesta premissa, já que os relacionamentos posteriores são obrigados a arcar com uma

espécie de herança emocional. Todas as escolhas posteriores de amizade e de amor seguem a

base das lembranças deixadas por esses primeiros protótipos.

Com a intenção de criar uma identificação nas crianças, as classes que atendem o

público infantil geralmente são chamadas de maternal, levando a crê que se relaciona ao amor

materno na tentativa de aproximar os eventos desse novo ambiente às vivências com a

família.

Porém, após o primeiro segmento do ensino fundamental, percebe-se uma divergência

na relação professor-aluno que pode ser prejudicial para o desenvolvimento afeto-cognitivo

dos alunos, por sofrerem uma mudança tão brusca no aspecto relacional com esses objetos

transferenciais de suas expectativas, que são os professores.

As turmas, antes sob regência de apenas uma professora, passa a possuir tantos

professores quanto o número de disciplinas oferecidas e uma maior distância e frieza nos

aspectos afetivos são valorizadas, em detrimento do conhecimento a ser transmitido por si.

O professor deve assim, atentar-se para estimular situações de envolvimento com os

alunos, de aproximação, de contato, além de dedicar todo um cuidado à sua apresentação. Ele

não deve considerar-se como sujeito petrificado com a simples tarefa de transmitir

conhecimentos para alunos-objetos, podendo desprover-se de quaisquer responsabilidades

além do conteúdo. Os alunos que ali estão em suas aulas trazem mundos dentro de si, trazem

seus históricos inconscientes, impulsos e forças reguladoras, além de forças identificatórias

desejosas por encontrar referenciais a construir. São sujeitos e assim devem ser considerados,

respeitados e ouvidos, além de alimentados por imagens positivas.

Um professor pode ser ouvido quando está revestido por seu aluno de uma

importância especial. Este será ainda mais especial quanto mais acreditar ser o seu aluno

também especial. Graças a essa importância bilateral de identificações, o professor passa a ter

em mãos um poder de influência sobre o aluno e vice-versa.

O educador não pode perder de vista este embasamento que a psicanálise oferece, para

que possa estar cada vez mais capacitado e apto a agir da melhor maneira em nome do alcance

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de seus objetivos que deve ser o de favorecer a construção do conhecimento, da cidadania,

enfim da formação geral de seus alunos.

Existe um certo consenso sobre os comportamentos que se espera de uma aluno e o

mesmo acontece com relação ao professor, pois se pode dizer que não há dúvidas de que

existe entre alunos e professores um jogo de expectativas que estão relacionados ao

desempenho dos dois e que o desempenho de ambos vai depender muito da relação,

principalmente afetiva e de respeito entre eles.

Dessa forma percebe-se que os professores devem levar seus alunos a pensarem por si

mesmo e a cooperarem sem coerção, ajudando-o a construir suas próprias razões morais,

físicas, afetivas e, portanto sua autonomia. E para ser desenvolvida essa autonomia dos alunos

é preciso que o professor tenha regras claras, mas que essas regras não sejam impostas e sim

explicadas, discutidas entre professores e alunos, possibilitando desse modo uma relação de

respeito e confiança entre ambos, no qual a responsabilidade do que acontecer em sala de

aula, não deve ser unicamente do professor, como diz PESSOA (1998, p. 29) , “essa

responsabilidade tem que ser repartida e os alunos devem tornar-se co-responsáveis pelo seu

aprendizado”.

O professor precisa reconhecer que o desenvolvimento da autonomia dos alunos não

só é um desafio como também faz parte do relacionamento professor-aluno, no sentido de

criar condições para os educandos pensarem, argumentarem, exporem idéias próprias e não

apenas repetirem o que é dito pelo professor. Da mesma forma o professor deve reconhecer

que a ação do aluno não é isolada, mas está apoiada na ação dele e deve ser capaz de utilizar

os resultados obtidos pelos alunos a fim de avaliar o próprio trabalho. Em outras palavras, o

professor deve refletir sobre os seus atos procurando incluir mudanças significativas no seu

agir para ser capaz de ajudar, de fato, seus alunos.

A partir dessas reflexões é natural concluir-se que ter o ensino escolar como um objeto

de estudo passa a estar cada vez mais atrelado ao reconhecimento do papel da subjetividade

do professor no exercício de sua profissão. Nesta atividade marcadamente humana como a de

professor, não há possibilidade de dicotomizar a personalidade, vendo-a ora pelo ângulo da

razão, ora sob o ponto de vista das emoções e o grande desafio do educador é viver com o

Outro e sua obra começa pela reordenação de si mesmo, porque o educar implica antes o

educar-se.

O professor precisa ter em mente que a personalidade esconde mistérios indecifráveis.

Daí porque ele não pode esquecer que muitas vezes as pessoas são o que deixaram de ser e

que aquilo que é reprimido não é excluido da personalidade. Estando atento a estes fatos o

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professor terá maiores chances de compreender seus alunos e assim tomar atitudes que de fato

os ajudem a crescer psicologicamente sadios.

Por fim o professor deve sentir-se adequado e confortável descobrindo-se como

instrumento de crescimento para o Outro. Da mesma forma é esperado que a personalidade do

professor contenha um grau suficiente de compreensão da forma, do ritmo e da amplitude de

aprendizagem de seus alunos. Ao mínimo desejo de aprender do aluno, a disponibilidade do

professor deverá se fazer presente, reconhecendo que as indecisões e as “limitações” dos

alunos devem, em contrapartida, esbarrar na compreensão de que a imperfeição é o caminho

para o desenvolvimento e que ele, de fato, está imbuído de responsabilidades no processo de

geração de adultos mais saudáveis.

2. 3. RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO NA CONCEPÇÃO DA PSICANÁLISE

A relação da Psicanálise com a Educação tem seus primórdios com Sigmund Freud,

que observou pontos de conexão, ou mesmo de discordância, entre as especificidades dos

campos de conhecimento, passando a estudar as relações entre a psicanálise e a educação,

elaborando as possíveis ligações entre esses temas. Segundo (Fillox 1997) , Freud não

escreveu artigos sobre a Educação, contudo, mostrava franco interesse em ver a Psicanálise

expandida para outras disciplinas.

A partir de então, segundo Neves (1998) a Educação e a Psicanálise percorrem um

complexo caminho, entrelaçando seus saberes sobre o funcionamento do ser humano, mesmo

diante da resistência de alguns. Esse entrelaçar permitiu o levantamento de questões

relacionadas ao desenvolvimento humano, à relação de transferência aluno-professor, ao

prazer em aprender, à terapêutica da Educação, à linguagem etc.

Dessa forma, a Psicanálise, no âmbito da teoria e a Educação, como um discurso

social, refletiram em muitas mudanças nos diversos contextos. Segundo Kupfer (2000) , a

educação passa por modificações que ultrapassam as idéias iniciais de Freud. O corpo teórico

da Psicanálise, por sua vez, não permanece imune à sua saída do divã e à sua entrada no

mundo institucional.

Na visão da psicanálise, o ser humano não nasce com um eu (sujeito psíquico) pronto,

mas irá construí-lo a partir de si e de suas interações sociais e familiares.

A criança sentirar-se-a amada, buscará prazer em si própria, bem como

reconhecimento e afeto, pois essa criança foi desejada e investida pelo desejo materno e

paterno.

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A atividade psíquica terá início neste investimento libidinal pelos pais, e pelo prazer

que o bebê experimenta em seu próprio corpo. Segundo Kupfer (1997) , este eu que está

sendo constituído, busca compreender, ter acesso ao significado do que existe e do que ele

vivencia. O eu deseja então saber. Os pais proporcionam a ela uma auto-estima positiva, que a

levará à busca do prazer de ouvir e pensar, pois eles investem o seu afeto na criança, servindo

de ligação entre seu psiquismo e o meio psíquico que a rodeia.

Segundo Kupfer (1997) é na escola que o professor aceita a criança como ela é,

valorizando-a e investindo no seu crescimento. O eu se estrutura então, pelo discurso social,

pelo desejo e pelas falas dos pais para a criança e sobre a criança. Este eu, que se constitui no

ambiente psíquico familiar, irá sofrendo transformações nas relações sociais. Ele precisa,

inicialmente, do reconhecimento e do amor dos pais para experimentar o prazer e o desejo de

pensar.

Enfim, prazer, amor e reconhecimento são elementos indispensáveis para a construção

e identificação do eu, para investir em si e no Outro. Na escola, a criança precisa do amor e do

reconhecimento do professor - substituto simbólico dos pais -; precisa encontrar nele o prazer

de aprender.

Nesta relação professor - aluno, o desejo de ensinar, e o modo como o professor aceita

e reconhece o aluno como um ser único e singular, também serão importantes. Segundo

Kupfer (1989) , a criança que encontra um professor preconceituoso em relação a ela, que a

desvaloriza, que não reconhece suas qualidades, e que não investe nela como um ser único e

especial, estará concorrendo

para que esta crianca perca o prazer de pensar e o desejo de aprender. O aluno passa a investir

sua atenção em outros objetos.

Na situação escolar, o professor é fonte privilegiada ao proporcionar prazer ou

sofrimento ao aluno, mas o aluno também pode ser fonte de prazer ou sofrimento ao

professor. Sua fonte de prazer reside nas respostas que os alunos dão à sua tarefa de ensiná-

los; de ser reconhecido ou não pelos alunos.

O educador livre de idéias pré-concebidas sobre o aluno, pode respeitá-lo e investir

nele, bem como na sua ação educativa. Desta maneira haverá uma relação professor-aluno

genuína, fundamentada na afetividade, na confiança mútua e na sinceridade.

É preciso além do amor, que esta relação professor-aluno seja autêntica e afetiva, com

uma prática pedagógica estabelecida no respeito, na autoridade humana e no estabelecimento

de limites, de modo que o professor permita o desenvolvimento e o fortalecimento do eu do

educando para que ele desenvolva auto-estima, confiança, respeito a si e ao outro.

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Enfim, a criança só pode desenvolver seu eu, só investirá no desejo de aprender, se

também o adulto (pais e professores) investir nela, no seu desejo de aprender. Os adultos que

convivem com a criança, precisam lhe dar amor, reconhecer seu valor e fortalecer o seu eu.

Segundo Freud (1973) , a Psicanálise estuda a constituição do sujeito do inconsciente,

e se as funções cognitivas crescem, evoluem, o sujeito se constitui. Para a Psicanálise, a

constituição do sujeito é regida por leis diversas das que regem o desenvolvimento cognitivo.

Não há paralelismo entre eles. Dessa forma, o eu, ocupa um lugar central, pois são essas

funções que regulam a relação da pessoa com sua realidade.

O professor deve portanto, investir no seu aluno, no potencial que ele possui e não no

"aluno idealizado" , assegurar a ele um lugar de reconhecimento em seu meio social. Assim

esta criança, sentindo-se respeitada e amada, poderá investir em si própria, no desejo de

pensar e aprender.

Freud (1973) coloca que só pode ser pedagogo aquele que se encontra capacitado para

penetrar na alma infantil e que os adultos não compreendem nem a própria infância,

dificultando a compreensão e a educação das crianças. Os educadores precisam entender a

psicanálise, e entender a criança que há dentro deles, dessa forma, conduzi-la a uma caminho

menos conflituoso.

Quando os educadores se familiarizarem com as descobertas da psicanálise, será

mais fácil se reconciliarem com certas fases do desenvolvimento infantil e, entre

outras coisas, não correrão o risco de superestimar a importância dos impulsos

instintivos socialmente imprestáveis ou perversos que surgem nas crianças. Pelo

contrário, vão se abster de qualquer tentativa de suprimir esses impulsos pela força,

quando aprenderem que esforços desse tipo com frequência produzem resultados

não menos indesejáveis que a alternativa, tão temida pelos educadores, de dar livre

trânsito às travessuras das crianças (FREUD, 1913-1914) .

Na abordagem psicanalítica, o aprender envolve a relação professor-aluno, pois

aprender é aprender com alguém. Kupfer (1989), aponta que um professor pode ser ouvido

quando está revestido de uma importância especial, e por isso o mestre passa a ter em mãos

um poder de influência sobre o aluno, pois ele agora substitui os pais e herda os sentimentos

que a criança dirigia a eles, apontando dessa forma que a psicanálise enfatiza as relações

afetivas entre professor e aluno.

É árduo decidir se o que nos afetou rnais e foi de maior importância foi nosso

interesse pelas ciências que eram ensinadas ou pelas personalidades de nossos

professores. É verdade, pelo menos, que este segundo interesse, constituiu uma

perpétua corrente oculta em todos nós e, em muitos de nós, o caminho às ciências

passava apenas através de nossos professores. (Freud 1973)

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Segundo Kupfer (1989), Freud cita as emoções conflitantes que ele e seus colegas

experimentaram em relação aos professores: o intenso ódio a alternar-se com o amor, a

procura da fraqueza dos professores e, simultaneamente, seu orgulho em descobrir que eles

tinham boas qualidades e grande conhecimento.

Percebe-se que na relação professor-aluno, o aluno transfere para o professor o rela-

cionamento com os pais, e então o professor pode tornar-se a figura a que são endereçados os

sentimentos de amor ou ódio, traduzidos por admiração ou hostilidade ao professor. O

professor torna-se então o depositário de "algo" do aluno, e fica carregado de uma

importância especial. Segundo Kupfer (1997) , nessa relação, analisa-se o poder que ele

exerce sobre o aluno, e se explica o lugar que ele ocupa no inconsciente do aluno. Em muitos

casos pode-se entender porque tantos professores que parecem nada ter de especial, marcam

tanto seu aluno para sempre, na vida pessoal e profissional.

Segundo Kupfer (1989) , um professor que recebe uma orientação psicanalistica,

saberá trabalhar com os sentimentos dos alunos e saberá abdicar de sua figura de autoridade,

permitindo que seu aluno se desenvolva de forma autônoma, crítica e independente. Este

professor aprenderá a organizar o seu saber, mas renunciará ao poder, que o levaria a se impor

aos alunos, renunciando ao poder, permitindo ao aluno tornar-se o mestre de si mesmo.

Segundo Filloux (1997) , pode-se, acompanhar o desenvolvimento de Freud sobre as

relações da arte analítica com a arte de ensinar. Entre 1909 e 1912, Freud construiu uma

imagem da Educação como “fator de vocação virtual ou realmente patogênica”, uma vez que

se relaciona ao recalcamento social das pulsões, sendo este considerado um dos fatores da

neurose. Ciaccia (1997) , afirma que a educação é reconhecida em sua participação positiva

na ajuda ao controle do princípio do prazer por meio de uma adaptação à realidade e à

sublimação. Nessa época, ele também ressalta que o processo analítico possui um componente

educativo, uma vez que a cura poderia ser vista como uma educação tardia.

Um ano após esse período, a Educação e a análise passam a ser vistas como ciências

complementares, sendo defendido que a Educação deveria ter como fim último impedir a

formação da neurose, facilitando os canais para a movimentação das pulsões para um bom

caminho. A Psicanálise estaria, assim, no papel de reeducação, porém Freud revê seus

pensamentos, analisando que a Educação não pode ser concebida apenas pelo seu aspecto

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preventivo das neuroses e afirma que se deve evitar confundir o trabalho pedagógico com

uma intervenção psicanalítica.

Caberá ao professor, guiado por seu desejo, organizar, articular e tornar lógico o

conhecimento transmitido a seu aluno, que ingere, desarticula e toma para si o conhecimento

que tem sentido para ele e que será fundamentalmente útil na sua vida.

A Psicanálise valoriza o aluno como ser humano nos seus afetos, capaz e livre de

construir seu próprio conhecimento através do seu desejo inconsciente. Professores ensinam

não só um conteúdo, mas, uma forma de amor a si e ao conhecimento.

Toda aprendizagem em que professor e aluno se entregam ao prazer de aprender,

segundo Kupfer (1997) , respaldados pelo afeto, pela liberdade e pelo respeito, torna-se uma

lição de amor; um encontro verdadeiro entre duas pessoas, de dois desejos inconscientes.

O professor é um dos primeiros substitutos dos pais. É ele quem ensina desde a forma

de pintar e colar mais adequada, das primeiras letras, até a construção de frases para a

elaboração de um texto mais complexo, estimula a criação de histórias e a desenvolver seus

papéis sociais.

“. . . . É difícil dizer se o que teve mais influência sobre nós e teve importância

maior foi nossa preocupação pelas ciências que nos eram ensinadas, ou pela

personalidade de nossos mestres. . . . para muitos, os caminhos das ciências

passavam apenas através de nossos professores. ” (FREUD (1996/1914 Volume

XIII: 286) .

O professor é aquele que vai além de transmitir conhecimentos. Através da

afetividade, a identificação tende a ocorrer, tanto na concepção do professor como do aluno.

O professor é, tanto quanto os pais, um modelo de identificação dos alunos. Como uma mãe,

um professor precisa olhar todos os seus alunos (filhos) individualmente. Tentar compreendê-

los de tal modo que seja possível trilhar o melhor caminho sobre o que dizer a cada um deles e

por quê os conhece, isto é, porque os observa, cuida das suas crianças.

O educador possui portanto, a tarefa de transmitir limites a cada aluno, auxiliando-os

no convívio em sala de aula, sendo esse relacionamento atravessado por afetos de amor e

ódio, assim como ocorre nas demais interações humanas.

O relacionamento interpessoal existe desde a criação do primeiro par humano e vem

se repetindo e se perpetuando sempre que se instala entre duas pessoas, uma relação

de proximidade e intimidade; uma relação na qual as partes "transferem" entre si

"todo um mundo" de expectativas e de sentimentos já vivenciados anteriormente

com figuras que lhes foram significativas". (MAMEDE-NEVES, 2006, p. 1)

Para as crianças, os professores ocupam o papel de “pais substitutos”, herdando

sentimentos que inicialmente foram direcionados a estes. Relacionando-se a esse professor

como aquele que pode ou não propiciar a aprendizagem. É importante que o próprio professor

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entenda que o lugar que ocupa em relação aos seus alunos não é apenas o daquele que ensina,

mas também, no nível simbólico, aquele que permite relações tão profundas a ponto de

possibilitar ou não a aprendizagem.

A aprendizagem vincula-se às relações afetivas estabelecidas entre professores e

alunos, pessoas que conhecem e se desconhecem no processo educacional. A relação

pedagógica propicia condições de exercício da autoridade a partir das relações originais,

particularmente as tranferenciais que permitem renascer sentimentos hostis iguais ou

afetuosos, os quais podem impedir ou favorecer o reconhecimento da autoridade do professor

para ensinar. A transformação da autoridade formal em autoridade real depende de um campo

transferencial favorável à relação professor-aluno. A criança depende de seus professores

como depende de seus pais.

“Somente alguém que possa sondar as mentes da criança será capaz de educá-la e

nós, pessoas adultas, não podemos entender as crianças, porque não mais

entendemos a nossa própria infância. ” (FREUD, 1996/1913p. 124)

Na sala de aula, o aluno revive a relação original entre pais e filho transferindo para o

professor todo o amor e/ou hostilidade que teve de abrir mão. Dessa forma, o professor,

precisa considerar os sentimentos transferenciais, canalizando as energias para que de fato o

aprendizado ocorra. O professor efetiva sua autoridade pedagógica quando rompe a

dominação que a autoridade original exerce sobre o aluno, sendo que a única maneira de fazê-

lo é não atender à sedução de ocupar, contratransferencialmente, o seu lugar.

O professor, segundo Morgado (1995) , deve aceitar a ‘transferência', mas não reagir a

ela, pondo o conhecimento como legitimador da autoridade pedagógica. Entre os personagens

do ensino-aprendizagem, estabelece-se um campo de relações, o qual propicia as condições

para aprender denominada transferência.

O fenômeno da transferência é por Freud apontado como sendo um fenômeno psíquico

que se encontra presente em todos os âmbitos das relações com nossos semelhantes. De

acordo com Laplanche & Pontalis (1992, p. 514) , "[. . . ] a transferência é entendida como

uma repetição de protótipos infantis vividos com uma sensação de atualidade acentuada".

A psicanálise percebe o sujeito como manifestação única e singular, caracterizando-o

através de seu inconsciente. Para o aluno ser tomado como sujeito é necessário que o

educador também o seja, que envolva sua prática com aquilo que lhe é peculiar, o estilo.

Logo, a relação professor-aluno depende fundamentalmente do clima estabelecido pelo

professor, da relação empática com seus alunos, de sua capacidade de ouvir, refletir e discutir

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o nível de compreensão dos alunos e da criação das pontes entre o seu conhecimento e o

deles. De acordo com Becker (1997) , na relação professor-aluno, está implicada uma relação

de amor, que envolve afetividade. Através dessa afetividade as habilidades e potencialidades

dos alunos são reveladas e valorizadas. Com o afeto a criança se redescobre, se percebe, se

valoriza, aprende a se amar transferindo este afeto em suas vivências e consequentemente na

aprendizagem escolar.

A psicanalista Klein (1926), aponta que as crianças desenvolvem a transferência de

suas mais intensas fantasias, ansiedades e defesas em casa, na creche, na escola, nos

diferentes momentos do dia, no convívio escolar e durante as aulas. Dessa forma o educador

deve estar atento às manifestações da criança, envolvendo-se, percebendo-a e estimulando-a a

manifestar seus papéis sociais, elogiando suas primeiras tentativas. O educador sendo o

mediador fora de sua convivência familiar torna-se um grande interventor para o

desenvolvimento emocional e cognitivo dos alunos.

Chamat (1997), afirma que um bloqueio na afetividade impede um vínculo saudável

ou afetivo entre o ser que ensina e o ser que aprende, seja na família ou escola. Conforme

Klein (1926), só o contato direto da criança com a sua realidade psíquica – impulsos, dores,

fantasias inconscientes – poderia ajudá-la a encontrar melhores formas de aceitação da

realidade e a renunciar a determinadas defesas contra as angústias. Segundo Kupfer (1992) , a

idéia de transferência mostra que aquele professor em especial foi investido pelo desejo

daquele aluno.

No professor, são depositadas projeções alheias enquanto pessoa. O professor ignora

sobre esse lugar que lhe é outorgado pelo aluno, pois é o desejo inconsciente desse aluno que

está determinando o lugar a ele conferido. Em decorrência disso, ao professor é atribuído um

poder que caracteriza a sua autoridade, ou seja, a autoridade do professor não é imposta ao

aluno, mas outorgada ao professor pelo próprio aluno.

Como declara Almeida (1998) , a criança somente se constituirá como sujeito através

do Outro, que acolhe a sua palavra e reconhece o seu desejo, e é por isso que o educador

precisa estar atento aos “ditos e não ditos” pela criança, para conhecer verdadeiramente seu

desejo. O mesmo autor aponta que o papel do outro social, representado pelo educador, é de

fundamental importância no processo de transmissão (ensino) e aquisição (aprendizagem) do

conhecimento. O professor é o mediador desse processo que se dá na relação triangular.

Na relação professor-aluno, a transferência se produz quando o desejo de saber do

aluno se liga a um elemento particular, no caso, a pessoa do professor. Posto isto, o conteúdo

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a ser ensinado deixa de ser o centro do processo pedagógico e a figura do professor e sua

significação para o aluno é que passam a ser a chave para o aprendizado. Se um aluno por

alguma razão, consciente ou não, não se sente à vontade com determinado professor é

possível que sinta dificuldades em aprender conteúdos que emanem desse professor. Neste

caso, segundo Morgado (1995) , o aluno pode ter transferido algo negativo para a figura deste

professor, que passou a ocupar um lugar de recusa na psiquê desse aluno, um lugar que nunca

foi da pessoa real do professor, mas que por alguma razão, passa a ocupar devido à

transferência do aluno.

A autoridade não é algo consciente, que dependa do querer do professor. Quando se

tem uma desigualdade entre os elementos, principalmente em relação ao saber, tem-se uma

relação de elementos em que um está na posição de saber para o outro. Nesse sentido, lida-se

com o fenômeno da transferência.

Logo, se o professor se colocar na posição de que ‘tudo sabe’, não restará outra

alternativa ao aluno a não ser submeter-se à posição de objeto diante desse professor. Segundo

Morgado (1995) , no entanto, para que o aluno possa se constituir como um sujeito ‘desejante

do saber’, o professor deveria reconhecer-se um sujeito faltante, castrado. Na mesma medida,

o professor deveria sustentar a sua posição como representante do conhecimento.

Qualquer que seja o estilo do professor, ou seja, se ele é autoritário, sério,

irresponsável, mais ou menos afetuoso, mais ou menos burocrático nenhum deles passa pelos

seus alunos sem deixar a sua marca. Segundo Meireles (2006) , toda prática educativa supõe a

presença de um professor e um aluno interagindo afetivamente nas mais diversas situações,

afetando e sendo afetado um pelo outro.

Na relação professor-aluno, o conhecimento só pode ser suscitado, no processo

ensino-aprendizagem, através do desejo – desejo daquele a quem o conhecimento falta e

desejo do professor de ensinar, pois, conforme Lajonquière (1999) , "todo adulto educa uma

criança em nome do desejo que o anima". Assim, se tem no professor a figura que

supostamente sabe e no aluno a figura que deseja, ou não, aprender, decorrendo daí afirmar

que, o primeiro sujeito, em tese, possui aquilo que ao segundo falta e, por isso, tem um grande

poder nas mãos. Percebe-se, então, a interligação entre a noção de desejo e a noção de falta,

posto que se deseja aquilo que não se tem.

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Segundo Kupfer (1992), a transferência é uma manifestação do inconsciente que

permite à criança a reedição de suas vivências primitivas com os primeiros objetos de desejo

de forma que, na escola, tal reedição é direcionada aos professores.

O professor também transfere, por sua vez, conteúdos aos seus alunos. A esse conjunto

de reações inconscientes do professor/analista à pessoa do aluno/analisado, Freud deu o nome

de contratransferência. As influências dos alunos sobre os sentimentos inconscientes do

professor são frequentes e resultam nos mais variados tipos de comportamentos e reações por

parte de quem ensina. Um professor, segundo Byington (1996), por mais que não queira, pode

desenvolver maior afinidade com determinado aluno, ouvir melhor suas posições, encará-lo

com os olhos do sucesso, estimulá-lo a crescer com mais afinco, ao passo que, com outro

aluno, pode desenvolver uma relação de distanciamento, de recusa, de não envolvimento.

Compreende-se que investir na formação do professor é o passo que a escola deve dar

para lidar com a questão da transferência que vai além das teorias estabelecidas para o ensino.

Conhecer o aluno como alguém que deseja e transfere emoções inconscientes devia ser uma

exigência para a formação do professor, conhecer que no aluno existem emoções para serem

tratadas e resolvidas.

De acordo com Mazet e Stoleru, (2003), o objetivo do ensino e o papel do educador

será compreender o outro (filho-aluno) como se fosse alguém que já perdera (educador) e

como vive (u) essa relação com essa perda, transportando-a como igual (aluno-professor) .

Na visão de Jung (1981), o professor não é apenas um transmissor de conteúdos, mas

aquele capaz de educar pelo exemplo. Jung, aponta que “sua tarefa não consiste apenas em

meter na cabeça das crianças certa quantidade de ensinamentos, mas também em influir sobre

as crianças, em favor de sua personalidade total”. Exigindo do professor muito mais que uma

técnica ou método, mas um compromisso.

Desde que o relacionamento pessoal entre a criança e o professor seja bom, pouca

importância terá o método didático correspondente ou não às exigências mais modernas. O

êxito do ensino não depende do método, de acordo com a verdadeira finalidade da escola, o

mais importante não é abarrotar de conhecimentos, mas sim contribuir para que ela se torne

adulto de verdade.

O que importa não é o grau de saber com que a criança termina a escola, mas se a

escola conseguiu libertar ou não o jovem ser humano de sua identidade com a

família e torná-lo consciente de si próprio. Sem essa consciência de si próprio, a

pessoa jamais saberá o que deseja de verdade e continuará sempre na dependência

da família e apenas procurará imitar os outros, experimentando o sentimento de estar

sendo desconhecida e oprimida pelos outros. (JUNG, 1995, p. 60) .

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Jung (1995) afirma que o autoconhecimento e o aprendizado contínuo devem ser para

o educador uma segunda natureza, onde sua cultura não poderia deixar de reciclar-se, já que

em algumas ocasiões, o professor corrigirá nas crianças os defeitos que não corrigiu em si

próprio.

É preciso que ele mesmo seja uma pessoa correta e sadia; o bom exemplo é o melhor

método de ensino. Por mais perfeito que seja o método, de nada adianta se a pessoa

que o executa não estiver acima dele em virtude do valor de sua personalidade.

(JUNG, 1995, p. 98) .

A escola contribui para o processo de desligamento da criança com a família,

ampliando sua consciência. O professor e a escola ainda contribuem para a gradual

diferenciação do ego, com o objetivo de formar um indivíduo consciente. Assim, quando Jung

fala de desligar o aluno da família, está se referindo a algo comparável a um segundo

nascimento, a um rompimento de um cordão umbilical simbólico, sem o qual não seria

possível a produção de cultura.

Jung (1995) , postulou dois tipos psicológicos: a introversão e a extroversão; e quatro

funções da consciência: pensamento, sentimento, intuição e sensação.

A introversão se caracteriza por internalizações do mundo externo para o mundo

interno do indivíduo. A extroversão seria a exteriorização de aspectos do mundo interno de

um indivíduo para o mundo externo, no qual vive.

Jung enfatiza que todos possuem esses dois mecanismos, e só o predomínio de um

deles sobre o outro configuraria um tipo.

Para este teórico, o tipo extrovertido fornece melhores professores. Estaria então o

introvertido impedido de ser professor? A resposta é não. O que ocorre é que o professor

extrovertido encontra em uma sala de aula um ambiente que não lhe é estranho, enquanto que

o professor introvertido necessita de todo um trabalho interior para lidar com uma turma de

crianças. Por outro lado, um professor extrovertido tenha dificuldades em lidar com seus

alunos introvertidos, a quem talvez classifique como sonhadores, distraídos ou egocêntricos.

Pode também achar difícil assumir a solidão necessária para seu próprio estudo e para a

preparação de suas aulas.

Portanto, os dois tipos têm suas vantagens e desvantagens, mas, desses dois tipos

podem sair excelentes professores, mas para isso devem estar atentos a todos os aspectos que

esse trabalho implica.

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CAPÍTULO III.

METODOLOGIA E VALIDAÇÃO DA PESQUISA

3. 1. METODOLOGIA

Tendo como objetivo geral investigar como valores marcantes da personalidade do

docente influenciam na formação da personalidade da criança na Educação Infantil, o método

observacional e entrevistas semiestruturadas serão as vias mais adequadas à realização desse

estudo que inclui pesquisa bibliográfica e de campo.

A pesquisa bibliográfica visa fornecer um embasamento conceitual para a análise do

problema que será investigado a partir do posicionamento dos vários autores que trataram do

tema em estudo.

A pesquisa de campo será realizada no Instituto de Desenvolvimento Educacional de

Altos – IDEAL, escola pertencente à rede privada de ensino, localizada na Rua Lucrécio

Avelino Nº 2180, no centro da cidade de Altos, estado do Piauí, durante o ano letivo de 2010,

isto porque a pesquisadora trabalha na escola, fato este que lhe proporcionará maior liberdade

de ação e acesso aos dados importantes ao estudo.

A população foco da pesquisa será o corpo docente e discente da Educação Infantil da

escola.

O desempenho demonstrado em teste previamente aplicado e a idade das crianças são

os critérios considerados para a efetivação da matrícula no nível de ensino correspondente.

Neste ano formaram-se duas turmas de Nível I, composta por crianças de três anos; duas

turmas de Nível II que reúne crianças de quatro anos e duas turmas de Nível III, com crianças

de cinco anos de idade.

Os dados serão coletados junto à população envolvida direta ou indiretamente,

podendo ser ocasional, circunstancial ou intencional, conforme a necessidade.

Em decorrência da natureza subjetiva do problema a ser investigado, o método

observacional será utilizado em diferentes momentos da pesquisa, inclusive conjugado à

entrevistas não estruturadas, pois buscar o significado do silêncio, da hesitação, das

entonações, dos ditos e não ditos, são elementos que ajudam a compreender o discurso não

verbalizado das crianças.

Embora o foco da pesquisa seja as professoras e alunos da Educação Infantil, todo o espaço

escolar será palco de observações nos diferentes momentos da rotina escolar. Da chegada da

criança à escola (como ela despede-se de quem a trouxe; como é recebida pela

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professora e colegas etc; a interação que mantém com os colegas e professora nas diferentes

atividades da aula; nas brincadeiras no pátio; na hora do lanche até a despedida) .

Além da observação das professoras no trato diário com seus alunos em sala de aula e

nos vários e diferentes momentos e espaços da escola, outros dados pessoais e profissionais

serão coletados junto à Direção e Coordenação Pedagógica da escola. Além disso, será feita a

análise de documentos como a Proposta Pedagógica da Escola, Regimento Escolar, os livros

didáticos e paradidáticos adotados e até materiais utilizados na efetivação das propostas. A

análise desses documentos visa identificar que tipo de homem a escola pretende formar, ou

pelo menos lançar bases de sua formação.

Também fará parte desta pesquisa, a aplicação de questionários junto ao corpo docente

da Educação Infantil, bem como a análise das atividades escritas que são propostas aos

alunos, pretendendo-se com isso, identificar valores, pontos de vista, bom gosto, estética etc

das professoras.

A coleta de dados também se fará por meio de entrevistas semi-estruturadas junto às

professoras.

3. 2. RESULTADOS E DISCUSSÃO

As professoras participantes da pesquisa foram unânimes em afirmar que receberam

orientações na área da Psicanálise em seus cursos de formação pedagógica (Gráfico 1).

o Gráfico 1 - Recebeu orientações de Psicanálise em sua formação docente?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

100%

0%0%0%

Sim

79

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Dentre os conhecimentos proporcionados pelos estudos na área mencionada, a

importância das interações vividas pelas crianças aparece como principal aprendizagem em

60% das professoras entrevistadas(Gráfico 2).

o Gráfico 2 - Qual(is) conhecimento(s) da Psicanálise é(são) importante(s) na prática

docente?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

No entanto há uma incoerência nas respostas dadas pelas professoras, pois todas

entendem que somente ações conscientes e bem planejadas são passíveis de serem executadas

e de gerar aprendizagem(Gráfico 3). Isto mostra a superficialidade dos estudos nessa área,

proporcionados pela programação curricular dos cursos de formação docente.

o Gráfico 3 - Apenas ações planejadas geram conhecimento?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí – 2010

60%

40%

100%

0%0%0%

Interações vividas pela criança Outros

Sim

80

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Ao serem questionadas sobre a importância de problemas emocionais da criança

decorrentes da desestruturação familiar no processo de formação do Eu, 40% das

entrevistadas afirmaram que esses problemas são significantes e negativos enquanto que 60%

afirmaram serem significantes, mas possivelmente negativo(Gráfico 4).

o Gráfico 4 - Como você classifica o impacto de problemas emocionais decorrentes de

desestruturação familiar no processo de construção do Eu?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

Já no que diz respeito às atitudes que o professor deve tomar ao perceber a negligência

da família em relação à apresentação e desenvolvimento de aprendizagens positivas para a

criança, as professoras defenderam que uma maior aproximação da criança seria a atitude

recomendada(Gráfico 5).

60%

40%

Significante e negativo

Significante e possivelmente negativo

81

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o Gráfico 5 - Como escola pode preencher as lacunas deixadas pela família quanto à

propostas que levem ao desenvolvimento de aprendizagens positivas?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

O gráfico 6 mostra que as entrevistadas entendem que a prática educativa e a empatia

do professor com a turma, são significativamente influenciadas por motivos inconscientes.

o Gráfico 6 - Motivos inconscientes podem influenciar a prática educativa e a empatia

do professor pelos alunos?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí – 2010

100%

0%0%0%

100%

0%0%0%

Aproximando-se mais da criança e aperfeiçoando o processo de escuta.

Sim

82

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Ao serem questionadas sobre a atuação do professor na formação do ser humano

durante o período que a criança permanece nas salas de Educação Infantil, 100% das

professoras entrevistadas afirmaram que, embora pequenas, as crianças detém o poder de

decisão, selecionando para si o que é de seu interesse (Gráfico 7).

o Gráfico 7 - O que interfere na atuação do professor na formação do ser humano

durante a Educação Infantil?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí – 2010

Da mesma forma as entrevistadas foram unânimes em afirmar que a atuação do

professor sobre a personalidade da criança é mais importante do que as atividades curriculares

(Gráfico 8).

o Gráfico 8 - A atuação do professor sobre a personalidade da criança é mais importante

do que as propostas curriculares?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí – 2010

100%

0%0%0%

100%

0%0%0%

A criança selecionar para si somente o que é de seu interesse.

Sim

83

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Quanto à difícil tarefa do professor que consiste em exercer autoridade sem no entanto

subjugar as crianças conforme afirma Carl Jung, de modo geral, as entrevistadas defendem

que o professor deve adotar uma posição firme, decidida, baseada no respeito e no

estabelecimento de um clima de confiança, levando em consideração a faixa etária do

aprendiz(Gráfico 9).

o Gráfico 9 - O que é mais importante para que o professor exerça a sua autoridade em

sala de aula?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

Embora as professoras tenham esta concepção, contrariamente ao que defende a

Psicanálise, afirmam que compete apenas a ele – professor – a decisão e o poder de praticá-

la(Gráfico 10), negligenciam portanto, a participação ativa dos alunos que tem o poder de

outorgá-la, de aceitar ou não essa autoridade.

20%

20%

20%

20%

20%20%

Posição firme, baseada no diálogo

Posição firme, decidida.

Posição firme, baseada no respeito

e confiança

Posição baseada na faixa etária

Posição amigável, mas

estabelecendo limites

84

78

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o Gráfico 10 - Como acontece a autoridade do professor junto a seus alunos?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

Ao serem questionadas sobre o poder que a criança tem em transferir para seus

professores emoções inconscientes que as afetam, interferindo no seu desenvolvimento

profissional e até como pessoa, 80% do grupo deu “sim” como resposta argumentando, de

modo geral, que as crianças são espontâneas e que, de uma maneira ou de outra, acabam

afetando o comportamento do professor e consequentemente sua prática educativa. 20% das

entrevistadas deu “não” como resposta alegando que o professor deve ser uma pessoa bastante

organizada e preparada para ajudar seus alunos sem no entanto ser afetado pelos problemas

que os mesmos possam trazer para a sala de aula(Gráfico 11).

o Gráfico 11 - A criança transfere emoções inconscientes para seus professores?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

100%

0%0%0%

80%

20%

Cabe a ele a decisão e o poder de praticá-la

Sim Não

85

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Estar bem consigo mesmo

Diante do questionamento sobre o que é estar “psicologicamente sadio”(Gráfico 12),

80% das professoras afirmaram que é estar bem consigo mesmo e 20% defendeu que é ter

consciência de que suas atitudes afetam as outras pessoas e que é passível de erro.

o Gráfico 12 - O que significa estar “ psicologicamente sadio” ?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

Já quanto à contribuição do professor na produção de adultos saudáveis, 60% do grupo

entrevistado afirmou que a orientação sobre os valores éticos seria o caminho certo a seguir;

20% defende que é necessário oportunizar as crianças a adquiriren conhecimentos corretos e

úteis e 20% afirma que é valorizando o respeito e o afeto entre as crianças que teríamos uma

ração de adultos mais saudáveis(Gráfico 13).

o Gráfico 13 - Qual a sua contribuição na construção de adultos mais saudáveis?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

80%

20%

Ter consciência de que afeta outras pessoas

20%

20%

60%

Orientação sobre valores éticos

Oferecer conhecimentos técnicos, úteis

Valorizar o respeito e o afeto

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Questionado sobre quais estratégias pedagógicas e/ou medidas que os professores

devem utilizar na sua prática com a finalidade de resolver questões afetivas/emocionais de

seus alunos, 40% do grupo afirmou que seria proporcionar atividades que inspirem confiança

de modo a levar a criança a expressar seus sentimentos por meio da fala e/ou ações; 40%

defende que seriam as atividades lúdicas capazes de solucionar problemas dessa área e 20%

defende a realização de atividades onde o amor pelo próximo seja o centro desencadeador de

muitos e diferentes sentimentos e ações que teriam o poder de resolver questões

afetivas/emocionais das crianças(Gráfico 14).

o Gráfico 14 - Quais estratégias pedagógicas o professor deve adotar para resolver

questões afetiva-emocionais de seus alunos?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

Como trabalhar a relação professor-aluno de modo a contribuir efetivamente para a

formação de cidadãos mais críticos, conscientes e participativos? (Gráfico 15). A este

questionamento 60% das professoras entrevistadas defende que o professor deve valorizar o

diálogo e ser um bom exemplo para seus alunos; 20% defende a realização de propostas que

reforcem os valores humanos e 20% defende ser o diálogo e a liberdade de agir a estratégia de

conduzir bem a relação professor-aluno.

40%

40%

20%

Atividades lúdicas

Atividades geradoras de segurança

Atividades que gerem sentimento de amor ao próximo

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o Gráfico 15 - Como trabalhar a relação professor/aluno para a formação de cidadãos

mais críticos, conscientes e participativos?

Fonte: O impacto do arquétipo docente na formação identitária dos alunos na Educação Infantil - Instituto de

Desenvolvimento Educacional de Altos – Cidade de Altos-Piauí - 2010

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tema abordado nessa pesquisa, apesar de muito pertinente, não é fácil de ser

analisado, sobretudo sob a vertente da Psicanálise. Ao tentar analisar as peculiaridades do

relacionamento professor-aluno abrimos um grande leque de possibilidades, pois colocamos

em foco uma relação entre seres humanos originais, constituídos por conteúdos conscientes e

inconscientes.

O professor deve ter como matriz de sua ação uma pedagogia baseada na formação e

desenvolvimento da personalidade humana que inclua todas as dimensões da vida: o corpo, a

psique, a natureza, a sociedade.

O professor deve perceber que o lugar que ocupa em relação aos seus alunos não é

apenas, o daquele que ensina, pois no nível do simbólico ocorre a dinâmica transferencial,

permitindo relações não perceptíveis, porém tão profundas a ponto de possibilitar ou não a

aprendizagem das possíveis influências envolvidas no relacionamento com o professor.

Valorizar o diálogo, sendo exemplo positivo

Apresentar propostas que reforcem valores humanos

Valorizar o diálogo e a liberdade

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A Psicanálise enfatiza que, na relação professor-aluno, não são os conteúdos

cognitivos, mas as relações afetivas, que se estabelecem entre o aluno e o professor que

proporcionam as condições para aprender sejam quais forem os conteúdos. O educador

inspirado por idéias psicanalíticas renuncia a uma atividade excessivamente programada,

instituída, controlada com rigor obsessivo.

Quanto mais o professor buscar se reconhecer no processo pedagógico, mais

facilmente ele poderá lidar com as manifestações transferenciais e contratransferenciais na

sala de aula, possibilitando o crescimento dos alunos, bem como o seu próprio. É necessário

que o professor observe os seus alunos, para que possa entender as suas condutas e não fazer

julgamentos precipitados.

Com a noção da importância de uma relação dinâmica no ensino, o professor tem ao

seu lado mecanismos e instrumentos capazes de serem usados para a edificação e resolução de

problemas inerentes às dificuldades e insucessos escolares. Dessa forma a educação pode vir a

ser um processo estruturante, tendo o professor como facilitador para a criança numa travessia

na elaboração de si mesma, de representação do mundo e de um elo que possibilitaria a

ligação dos diversos fragmentos constituintes da vida, apenas para enfatizar a valiosa função

estruturante e constituinte que a educação pode adquirir.

O professor percebe que pode organizar seus conhecimentos, mas não tem controle

sobre os efeitos que produz sobre seus alunos, sobre as repercussões inconscientes de sua

presença e de seus ensinamentos. Pode-se dizer, por isso, que a Psicanálise pode transmitir ao

educador, uma ética, um modo de ver e entender sua prática educativa. É um saber que pode

gerar, dependendo, naturalmente, das possibilidades subjetivas de cada educador, uma

posição, uma filosofia de trabalho, uma maneira de formar seu pensamento.

No que diz respeito à transferência, é fundamental apontar que ela acontece com

professores, que ocupam o lugar de modelos, uma vez que herdam as antigas relações que os

alunos viveram com seus pais. Portanto, professores são herdeiros da relação dos pais com os

filhos. E é sobre a transferência que desenvolvem-se os trabalhos escolares.

Na análise dos dados, percebe-se que embora as professoras da Educação Infantil

reconheçam que tem papel importante na travessia que a criança realiza durante o processo de

elaboração de si mesma e de representação do mundo, não possuem habilidades suficientes

para, de fato ajudá-la nesse importante processo.

Diante do exposto, fica claro que os cursos de formação de professores carecem de

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orientações nesta área e que um olhar psicanalítico sobre o pensar e o fazer desses

profissionais proporcionaria a modificação de postura em relação às suas práticas,

preparando-os melhor para lidar com as manifestações transferenciais e contratransferenciais

na sala de aula, possibilitando o crescimento tanto dos alunos quanto de si mesmo. Sabendo-

se do movimento da identificação com as figuras parentais e o desenvolvimento do superego,

bem como a formação do seu Eu, analisa-se que a criança pode receber influências que

venham a ser positivas e/ou negativas para a formação de sua personalidade, e se não forem

observadas muitos impulsos serão recalcados e remetidos às profundezas da mente onde

permanecerão criando tensões e conflitos.

Dessa forma, percebe-se que os postulados de Freud, onde é apontado que a

psicanálise deve direcionar-se a auxiliar o educador na difícil tarefa de educar, foi analisada e

comprovada nas discussões dos resultados. Julga-se que a missão de educar plenamente é

quase impossível de ser realizada, pois o ser humano vive numa constante luta entre suas

forças internas, regidas pelo princípio do prazer (id) e as forças externas que impõem juízos

de valor (superego) sobre esses desejos. O educador precisa ajudar o educando a buscar esse

equilíbrio na construção do eu (ego) para que a aprendizagem possa ocorrer de forma eficaz.

O professor é também um sujeito marcado por seu próprio desejo inconsciente. Aliás,

é exatamente esse desejo que o impulsiona para a função que exerce. O desejo do professor

justifica que ele esteja ali, mas, estando ali, ele precisa renunciar a esse desejo, em função do

desejo do outro. Essas postulações precisam ser vivenciadas nas relações professor-aluno, em

especial quando esse professor fora aprendiz.

Assim, os cursos que promovem a formação de professores (licenciaturas, cursos de

magistério, etc.) devem incluir em seus programas atividades que os remetam a uma reflexão

acerca de suas experiências educacionais, aos sentidos que eles atribuem à profissão de

educador, bem como aos conhecimentos teóricos e práticos relativos à profissão.

Diante de tudo que foi exposto, enfatiza-se que os Objetivos Específicos foram

totalmente cumpridos e alcançados, fundamentando cada capítulo e dando suporte teórico e

conceitual ao trabalho e concomitantemente, à Análise de Dados e aos Resultados da

Pesquisa.

Um olhar psicanalítico sobre o pensar e o fazer dos professores proporciona muitas

mudanças, visto que a ele é dado espaço onde se pode refletir sobre o fazer, através da

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resignificação para ampliação do repertório e modificação de posturas em relação às suas

práticas, inclusive responsabilizando-o por suas idéias e pelo que diz.

Portanto, os educadores devem conhecer os processos que permeiam a formação

psíquica da criança, bem como as relações que se desenvolvem nos diversos ambientes em

que transitam, pois assim, melhor instrumentalizados, esses profissionais podem promover a

mediação nos processos de aprendizagem e contribuir na formação equilibrada desse ser

social.

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