o enfermeiro no sistema de saÚde a opiniÃo de jorge … · o “enfermeiro de família” é um...

1
N ão obstante, vivemos hoje tempos tremendamente difíceis, não ape- nas como resultado dos constran- gimentos económico-financeiros que o país e a Europa atravessam, mas também em consequência das alterações sociodemográ- ficas e das exigências políticas em matéria de gestão dos serviços de saúde e da qualidade desses serviços. Nesta matéria, temos que ter bem presente que este setor de atividade apresenta características socioeconómicas muito particulares, em que o cliente/utente é, ainda, o contribuinte e o cidadão, cada vez mais consciente e exigente dos seus direitos. Para enfrentar este desafio, estamos convictos de que a alternativa é melhorar continuamente os serviços prestados e apostar em experiências inovadoras de prestação de cuidados de proximidade. O programa do XVII Governo Constitucional defi- ne como meta a “instauração de políticas de saúde, integradas no Plano Nacional de Saúde, e de po- líticas de segurança social que permitam: desen- volver e implementar ações próximas das pessoas em situação de dependência, investir no desenvol- vimento de cuidados de longa duração (...)”. Assim, parece clara a importância da proximidade dos cuidados de saúde (através dos diversos interve- nientes no processo), junto da população, numa lógica de cooperação e articulação que permita um melhor levantamento das necessidades, mais concretamente, daqueles que apresentam maior necessidade dos mesmos e que sejam abrangidos por estes, não apenas em termos geográficos, mas num sentido mais humanizador e global. Em consonância com este posicionamento, a Or- ganização Mundial de Saúde (OMS) salienta a “im- portância das metodologias de trabalho direcio- nadas para a família e que assente na efetividade, integralidade e na proximidade”. Em função de toda esta realidade, e já que a go- vernação política e gestionária não tem encon- trado, ou não tem querido encontrar, as melhores soluções, cabe aos enfermeiros assumir um papel de liderança nesta problemática e, sobretudo, na conjuntura atual. Os enfermeiros têm hoje a opor- tunidade de aprofundar uma metodologia de tra- balho de proximidade – “enfermeiro de família”, inseridos em equipas de saúde junto dos cidadãos ou através do próprio exercício autónomo de en- fermagem, o qual, traduzir-se-á em ganhos de saú- de para as populações e, consequentemente, com redução dos custos associados. A figura do enfermeiro de família tem vindo a ser criada nos sistemas de saúde de vários países da região europeia da OMS, reforçando a importância dos contributos da enfermagem para a promoção da saúde e prevenção da doença. O “enfermeiro de família” é um profissional que, integrado na equipa multidisciplinar de saúde, assume a responsabilidade pela prestação de cuidados de enfermagem globais a um grupo de famílias, em todo o processo de vida, do nasci- mento à morte, incluindo a promoção e proteção da saúde, a prevenção da doença, a reabilitação e a prestação de cuidados; atua, também, como agen- te facilitador para que os indivíduos e famílias de- O exercício profissional da enfermagem centra-se, fundamentalmente, no relacionamento interpessoal entre um enfermeiro e uma pessoa ou um grupo de pessoas (família ou comunidades) que se desenvolve através de atitudes humanizantes. Cuidar é comprometer-se a manter a dignidade e integridade da pessoa que é cuidada. O “ENFERMEIRO DE FAMÍLIA” CRIA PROXIMIDADE NOS CUIDADOS DE SAÚDE senvolvam competências para um agir consciente, quer em situações de crise quer em questões de saúde. Por outro lado, é ainda o gestor e organi- zador de recursos, com vista ao máximo de auto- nomia daqueles a quem dirige a sua intervenção, sendo para cada família a referência e o suporte qualificado que, numa perspetiva de intervenção em rede e equipa multidisciplinar, responde às ne- cessidades da família. A Ordem dos Enfermeiros considera ser aceitável que o modelo orgânico-funcional dos cuidados de proximidade garanta a potencialização dos recur- sos existentes, onde o foco de atenção são as fa- mílias e onde o modelo de enfermeiro de família, como “modelo integrado” de cuidados de proximi- dade, tem um papel preponderante na resolução dos problemas dos utentes em diferentes contex- tos da prática. Estamos convictos de que é nas fases de maior dificuldade que devemos apelar à nossa criativi- dade, ao nosso valor intrínseco. Aos enfermeiros cabe, pois, a responsabilidade de reinventar novas formas do exercício profissional, de encontrar no- vos caminhos, novos métodos e novas estratégias. Face às condições adversas dos nossos dias, devem assumir essas adversidades como janelas de opor- tunidade para novas expressões (externas) do seu desempenho profissional; serem empreendedores em áreas do seu domínio, já que é apenas através da interioridade dos seus gestos e da expressão dos afetos que, verdadeiramente, acedem ao outro, con- cretizando o cuidado de enfermagem. JORGE CADETE - PRESIDENTE DA SEÇÃO REGIONAL DO NORTE DA ORDEM DOS ENFERMEIROS O ENFERMEIRO NO SISTEMA DE SAÚDE A OPINIÃO DE... “A figura do enfermeiro de família tem vindo a ser cria- da nos sistemas de saúde de vários países da região europeia da OMS, refor- çando a importância dos contributos da enfermagem para a promoção da saúde e prevenção da doença” 71

Upload: others

Post on 20-Sep-2020

7 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: O ENFERMEIRO NO SISTEMA DE SAÚDE A OPINIÃO DE JORGE … · O “enfermeiro de família” é um profissional que, ... cuidados de enfermagem globais a um grupo de famílias, em

Não obstante, vivemos hoje tempos tremendamente difíceis, não ape-nas como resultado dos constran-gimentos económico-financeiros que o país e a Europa atravessam, mas também em consequência das alterações sociodemográ-ficas e das exigências políticas

em matéria de gestão dos serviços de saúde e da qualidade desses serviços. Nesta matéria, temos que ter bem presente que este setor de atividade apresenta características socioeconómicas muito particulares, em que o cliente/utente é, ainda, o contribuinte e o cidadão, cada vez mais consciente e exigente dos seus direitos. Para enfrentar este desafio, estamos convictos de que a alternativa é melhorar continuamente os serviços prestados e apostar em experiências inovadoras de prestação de cuidados de proximidade.O programa do XVII Governo Constitucional defi-ne como meta a “instauração de políticas de saúde, integradas no Plano Nacional de Saúde, e de po-líticas de segurança social que permitam: desen-volver e implementar ações próximas das pessoas em situação de dependência, investir no desenvol-vimento de cuidados de longa duração (...)”. Assim, parece clara a importância da proximidade dos cuidados de saúde (através dos diversos interve-nientes no processo), junto da população, numa lógica de cooperação e articulação que permita um melhor levantamento das necessidades, mais concretamente, daqueles que apresentam maior necessidade dos mesmos e que sejam abrangidos por estes, não apenas em termos geográficos, mas num sentido mais humanizador e global.Em consonância com este posicionamento, a Or-ganização Mundial de Saúde (OMS) salienta a “im-portância das metodologias de trabalho direcio-nadas para a família e que assente na efetividade, integralidade e na proximidade”. Em função de toda esta realidade, e já que a go-vernação política e gestionária não tem encon-trado, ou não tem querido encontrar, as melhores soluções, cabe aos enfermeiros assumir um papel de liderança nesta problemática e, sobretudo, na

conjuntura atual. Os enfermeiros têm hoje a opor-tunidade de aprofundar uma metodologia de tra-balho de proximidade – “enfermeiro de família”, inseridos em equipas de saúde junto dos cidadãos ou através do próprio exercício autónomo de en-fermagem, o qual, traduzir-se-á em ganhos de saú-de para as populações e, consequentemente, com redução dos custos associados.A figura do enfermeiro de família tem vindo a ser criada nos sistemas de saúde de vários países da região europeia da OMS, reforçando a importância dos contributos da enfermagem para a promoção da saúde e prevenção da doença.O “enfermeiro de família” é um profissional que, integrado na equipa multidisciplinar de saúde, assume a responsabilidade pela prestação de cuidados de enfermagem globais a um grupo de famílias, em todo o processo de vida, do nasci-mento à morte, incluindo a promoção e proteção da saúde, a prevenção da doença, a reabilitação e a prestação de cuidados; atua, também, como agen-te facilitador para que os indivíduos e famílias de-

O exercício profissional da enfermagem centra-se, fundamentalmente, no relacionamento interpessoal entre um enfermeiro e uma pessoa ou um grupo de pessoas (família ou comunidades) que se desenvolve através de atitudes humanizantes. Cuidar é comprometer-se a manter a dignidade e integridade da pessoa que é cuidada.

O “eNfermeirO de família” criaprOximidade NOs cuidadOs de saúde

senvolvam competências para um agir consciente, quer em situações de crise quer em questões de saúde. Por outro lado, é ainda o gestor e organi-zador de recursos, com vista ao máximo de auto-nomia daqueles a quem dirige a sua intervenção, sendo para cada família a referência e o suporte qualificado que, numa perspetiva de intervenção em rede e equipa multidisciplinar, responde às ne-cessidades da família.A Ordem dos Enfermeiros considera ser aceitável que o modelo orgânico-funcional dos cuidados de proximidade garanta a potencialização dos recur-sos existentes, onde o foco de atenção são as fa-mílias e onde o modelo de enfermeiro de família, como “modelo integrado” de cuidados de proximi-dade, tem um papel preponderante na resolução dos problemas dos utentes em diferentes contex-tos da prática.Estamos convictos de que é nas fases de maior dificuldade que devemos apelar à nossa criativi-dade, ao nosso valor intrínseco. Aos enfermeiros cabe, pois, a responsabilidade de reinventar novas formas do exercício profissional, de encontrar no-vos caminhos, novos métodos e novas estratégias. Face às condições adversas dos nossos dias, devem assumir essas adversidades como janelas de opor-tunidade para novas expressões (externas) do seu desempenho profissional; serem empreendedores em áreas do seu domínio, já que é apenas através da interioridade dos seus gestos e da expressão dos afetos que, verdadeiramente, acedem ao outro, con-cretizando o cuidado de enfermagem.

JORGE CADETE - PRESIDENTE DA SEÇÃO REGIONAL DO NORTE DA ORDEM DOS ENFERMEIROS

O ENFERMEIRO NO SISTEMA DE SAÚDE A OPINIÃO DE...

“A figura do enfermeiro de família tem vindo a ser cria-

da nos sistemas de saúde de vários países da região

europeia da OMS, refor-çando a importância dos

contributos da enfermagem para a promoção da saúde e

prevenção da doença”

71