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A Governança da Internet: atores, aspectos institucionais e questões políticas em confronto” Diego Rafael Canabarro Doutorando do PPG Ciência Política / UFRGS e-Mail para contato: [email protected] Trabalho apresentado no 8 o ENCONTRO DA ABCP 01 a 04/08/2012, Gramado, RS Área Temática: Relações Internacionais Sessão: Aspectos estratégicos na Governança Global 1º dia (02/08)

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“A Governança da Internet: atores, aspectos institucionais e

questões políticas em confronto” Diego Rafael Canabarro

Doutorando do PPG Ciência Política / UFRGS e-Mail para contato: [email protected]

Trabalho apresentado no

8o ENCONTRO DA ABCP

01 a 04/08/2012, Gramado, RS Área Temática: Relações Internacionais

Sessão: Aspectos estratégicos na Governança Global 1º dia (02/08)

   

 

  2

A Governança da Internet: atores, aspectos institucionais e questões políticas em confronto  1

Diego Rafael Canabarro  Resumo: Durante os anos 1990, criou-se o mito de que a Internet levaria ao fim da sociedade internacional fundada na soberania estatal. Essa percepção, porém, vem sendo cada vez mais desafiada por eventos recorrentes no plano das relações internacionais. Atualmente, sob o rótulo de governança da Internet, essa controvérsia orienta as interações políticas de atores estatais e não estatais no que diz respeito ao controle dos recursos críticos de infraestrutura da Internet (dos quais depende a disponibilidade permanente e a estabilidade da Rede); ao controle do acesso à (e da atuação na) Internet; e ao controle do conteúdo on line. Este trabalho apresenta os diferentes formatos institucionais patrocinados por diferentes stakeholders da governança global da Internet como forma de identificar as principais disputas políticas relativas à Internet no plano internacional.      

1) Introdução

Em 1968, Marshall Macluhan – baseado no desenvolvimento da televisão via satélite -

teorizou a respeito da consolidação de uma “aldeia global”, em que os diferentes povos e

regiões do planeta seriam potencialmente integrados pelo emprego de tecnologias da

informação e da comunicação [TIC] (Macluhan, 1968).

Nos trinta anos seguintes, agregou-se a essa expectativa de redução de barreiras

geográficas e temporais para as interações comunicacionais, a potencial virtualização da vida

em sociedade pelo emprego da Internet, especialmente na literatura de ficção e em relatos

jornalísticos (Gibson, 1984; Dibbel, 1993; Barlow, 1996). Cresceu também, no mesmo

período, a produção acadêmica – em grande medida de caráter normativo – destinada a

explicar e projetar as implicações decorrentes da “sociedade da informação”, da “era das

redes” e da popularização da Internet para a vida em sociedade e para as organizações em

geral (Beniger, 1986; Clark, 1992; Lipnack & Stamps, 1994; Tapscott, 1996). De forma

bastante representativa, Castells (1996) delineou a emergência de uma nova economia

política e de uma nova geografia política pautadas pelo controle dos fluxos de informação

pelo planeta.

Apesar disso, aponta-se que, mesmo após a virada do século, a ênfase nos aspectos

econômicos, administrativos e sociais do avanço da digitalização careceu de tratamento

analítico apropriado a partir da lógica da Ciência Política (Garson, 2007), ainda que temas

como “Estado virtual” (Fountain, 2001), “governo digital” (Banco Mundial, 2009), “democracia

eletrônica” (Milakovich, 2011), “guerra cibernética” (Libicki, 2009), “governança da Internet”

(Kurbalija e Gelbstein, 2005), por si só, envolvam fenômenos de disputa de poder em

múltiplos níveis sociais e relacionem-se diretamente com a formulação e implementação de

políticas públicas, seja no plano doméstico dos Estados, seja no plano internacional.

                                                                                                               1 Este texto foi confeccionado a partir do texto entregue como atividade da avaliação para a disciplina “Tópico Especial I – Política na Era Digital: mudança estrutural e problemas Estratégicos”, do PPG Ciência Política/UFRGS, ministrada pelo Prof. Marco Cepik em 2011/02. Grande parte das informações consolidadas no trabalho resultam do trabalho de pesquisa empreendido durante a disciplina “Seminário de Tese”, ministrada em 2011/01, pelo Prof. Marcello Baquero no mesmo PPG.

 

  3

Diante disso, este trabalho dedica-se ao estudo das questões políticas que pautam as

diferentes propostas para a formatação de um regime internacional para a governança da

Internet (GI). Para tanto, o trabalho faz – na seção “2” – uma descrição sintética da criação e

da evolução da Internet até os dias atuais. Na seção “3”, define-se o alcance da expressão

“governança da Internet”, desde um ponto de vista restrito em termos técnicos, até um ponto

de vista abrangente, que indica a emergência de um regime internacional em evolução. A

seção “4” apresenta uma tipologia de formatos institucionais possíveis para a GI, extraídos da

literatura especializada. Ao fim, nas considerações finais, procura-se conectar as

características de cada um desses formatos às questões políticas subjacentes, com a

finalidade de contribuir para a reflexão a respeito dos rumos que pode tomar a agenda de

pesquisa e de formulação de políticas públicas no campo, especialmente pela ótica de

pesquisadores do mundo em desenvolvimento.

 2) A Internet: propriedades estruturais

A Internet é uma rede que permite a conexão de computadores, bancos de dados e

redes computacionais distintas (internetworks) por meio de especificações tecnológicas,

protocolos e padrões de comunicação. Isso permite aos diferentes nodos que se conectam à

Rede (como o computador ou o aparelho celular de usuário individual, como as estações de

trabalho que integram a rede local de uma empresa, etc.) intercambiar informações diversas.

De maneira simplificada, isso pode ser ilustrado da seguinte forma:

 

 Figura  2.1:  A  Internet  a  partir  da  visão  dos  usuários.  Fonte:  Clarke  (2004).  

 Essa rede foi desenvolvida com financiamento direto do Departamento de Defesa dos

Estados Unidos e conectou, inicialmente, computadores de pesquisadores do Massachussets

Institute of Technology (MIT), da Universidade da Califórnia (Los Angeles e Santa Bárbara),

do Stanford Research Institute e da Universidade de Utah, todas nos Estados Unidos. Dois

foram os interesses principais do governo norte-americano no projeto.

 

  4

Em primeiro lugar, a Advanced Research Projects Agency (atualmente Defense

Advanced Research Projects Agency) patrocinou a ideia de interconexão (através de uma

ARPANET) de instituições de pesquisa que desenvolviam projetos relativos às TIC em

benefício da Agência. Com isso, poderia ser criada sinergia e se evitar a adoção de medidas

não conciliáveis entre os diferentes nodos acadêmicos que davam suporte intelectual aos

trabalhos da ARPA (Licklider, 1963).

Além disso, o desenvolvimento da tecnologia de “comutação de pacotes” 2 que

organizava essa interconexão foi percebido como habilitador da criação de uma rede

descentralizada que pudesse conectar, ao mesmo tempo, inúmeros centros de comando e

controle do Departamento de Defesa, em substituição a um nodo central de comando de

ações militares, aumentado, com isso, sua resiliência em caso de ataques externos (Bing,

2009). Esse projeto teve como resultado a ampliação dos número de nodos conectados à

rede original; levou, em 1983, à criação de uma rede dedicada exclusivamente ao setor militar

(a MILNET), mantida em paralelo à ARPANET (que passou a ser mantida pela National

Science Foundation – transformando-se na NSFNET); e possibilitou, pelo crescente

incremento da tecnologia de transmissão de dados – com ênfase especial ao

desenvolvimento dos protocolos TCP/IP3, a conexão entre a porção civil remanescente da

ARPANET e uma série de outras redes semelhantes (Malcolm, 2008:6).

A partir dos anos noventa, a simplificação do complexo sistema de endereçamento dos

dispositivos ligados à rede pela adoção de um sistema de nomes de domínio (DNS4, do

acrônimo em inglês) e a evolução de protocolos específicos para diferentes aplicações (e-

mail, troca de arquivos, acesso a sítios virtuais), permitiram a exploração comercial da “rede

das redes” (Getschko, 2008). Como decorrência de tal exploração, segundo estatísticas de

junho de 2012, a Internet já é atualmente acessada por mais de dois bilhões de pessoas,

tendo crescido, de 2000 a 2012, mais de 500% [quinhentos por cento] (World Internet Users

and Population Stats, 2012).5

                                                                                                               2 A “comutação de pacotes” foi desenvolvida por Paul Baran na década de 1960. Seu funcionamento é relativamente simples de se explicar. Esse método possibilitou a divisão de informações digitais em pequenos blocos com endereços de partida e de chegada próprios. Cada um dos pedaços da informação pode ser enviado separadamente através de caminhos distintos em uma rede física. Ao fim do caminho a ser percorrido, no destinatário, ocorre a remontagem da informação tal e qual no momento de partida. A importância estratégica de tal tecnologia diz respeito ao aumento da segurança na troca de informações pela diminuição das chances de sua interceptação (Malcolm, 2008:6). 3 O protocolo TCP/IP (Transfer Control Protocol / Internet Protocol) foi desenvolvido por Vincent Cerf e Bob Kahn para viabilizar transmissão de dados tanto entre computadores quanto entre redes distintas de computadores, o que é apontado pela literatura especializada como o evento que permitiu a gênese da Internet como hoje se conhece (Hauben, 2001). 4 DNS significa, no inglês, “domain name system”, que é o sistema de nomes de fantasia (inteligíveis ao humano) criados em tradução dos números IP de endereçamento, atribuíveis aos computadores ou qualquer outro recurso conectado à Internet para sua localização. Maiores informações em: http://www.isoc.org/briefings/019/. Último acesso em: 14/12/2010. 5 Tais números devem ser compreendidos num contexto em que dois terços da população do planeta ainda estão excluídos dos benefícios das tecnologias digitais. O alargamento do número de usuários da Internet e a exclusão digital são duas faces da mesma moeda e não são, necessariamente, auto-excludentes, ou seja, o progressivo aumento do número de usuários da Internet não implica necessariamente a redução do número de pessoas privadas de acessá-la (Headrick, 2009:143).

 

  5

Nesse sentido, a Internet alcançou o status de serviço público global (Blumenthal e

Clark, 2009:207), passou a ser declarada como a “espinha dorsal” do mundo globalizado

(Zukang, 2007:6) e, em tempo muito diminuto, “revolucionou o comércio, a saúde, a educação

e, por isso, a própria estrutura da comunicação e dos intercâmbios humanos” (Kurbalija e

Gelbstein, 2005:7).

Em termos estruturais, a Internet é composta por, pelo menos, três porções distintas:

(1) uma camada de infraestrutura de telecomunicações; (2) uma camada lógica e (3) uma

camada de conteúdos (Benkler, 2006:392). A primeira – a camada inferior – tem relação com

os suportes físicos, materiais, que dão suporte às conexões e interações que através delas

ocorrem. São as linhas telefônicas, os cabos de conexão, as antenas de transmissão, os

satélites e etc. A terceira – a camada superior – é composta pelas informações partilhadas e

acessíveis pelos usuários da Internet, que são transmitidas através dos suportes que compõe

a faceta física. E a segunda camada – a camada intermediária – compõe-se de códigos,

padrões, softwares, serviços técnicos dos provedores de acesso, e etc., que permitem a

tradução da linguagem das máquinas à linguagem dos usuários e vice-versa. Além dessas

três camadas, Zimet e Skoudis (2009) apontam a existência de um quarto domínio, o

“domínio social”, ocupado pelos usuários da Internet, que a empregam como um instrumento

de forma de acesso a, divulgação e troca de informações; e como uma plataforma para a

realização de transações econômicas, sociais e políticas diversas (Chadwick e Howard,

2009).6

A organização de cada uma dessas camadas, a padronização tecnológica, a atribuição

de papeis e responsabilidades a atores estatais e não estatais na administração dos recursos

estruturantes da Internet, os direitos e deveres de cada um deles, bem como a ordenação da

ação dos diferentes atores sociais na (e através da) Internet são tarefas bastante complexas

que compõem o campo semântico a que se refere a expressão governança da Internet.

 3) A institucionalização da governança da Internet

Em um sentido estrito, o termo governança da Internet refere-se à gerência técnica da

Rede: o funcionamento do servidor-raiz7; a administração do sistema de endereçamento dos

dispositivos conectados à rede (IP) e dos fluxos de informação através da rede; e a gestão do

                                                                                                               6 O autor-referência empregado pela seção “3” deste trabalho, no entanto, as divide em seis camadas: (1) a camada do conteúdo (símbolos e imagens comunicados); (2) a camada das aplicações (programas que usam a Internet para operar); (3) a camada de transporte dos dados (quebra dos dados em pacotes pelo protocolo TCP); (4) a camada de controle dos fluxos transferidos pela rede (organização pelo protocolo IP); (5) a camada de conectividade (que funciona como interface entre os dispositivos que integram a rede e a camada física); e (6) a camada física (composta por cabos de fibra óptica, cabos de cobre, satélites, antenas de telecomunicação. (Solum, 2009:65-66). Essa maior especialização técnica justifica-se diante do fato de que um dos modelos de governança delineados por ele refere-se, justamente, ao papel que códigos de programação e a arquitetura da Internet têm na definição da operação, do funcionamento e do acesso à Rede. 7 Os treze servidores raiz existentes hoje no mundo têm a função de armazenar e listar as correspondências entre os números IP e os nomes de domínio atribuíveis a cada dispositivo conectado à Internet. Maiores informações em: http://www.isoc.org/briefings/019/.

 

  6

sistema de nomes de domínio (DNS). (Kleinwächter, 2009). Diante da especialização técnica

necessária para a realização dessas tarefas, até a década de 1990, a comunidade epistêmica

de cientistas e engenheiros da computação e de usuários da Internet foi quem reteve o

controle do desenvolvimento e da arquitetura da Rede, da adoção de padrões e protocolos

técnicos, e, com isso, do acesso à Internet.8

Até então, o papel do governo dos Estados Unidos foi o de financiar (através do

Departamento de Defesa e da National Science Foundation - NSF) projetos de pesquisa

relacionados ao setor, bem como contratar os serviços de tais especialistas para a

governança da Internet. Exemplo disso é o caso de Jonathan Postel. Ele trabalhou no Instituto

de Ciências da Informação da Universidade de Stanford (ISI/UCS), na Califórnia, através da

Internet Assigned Numbers Authority (IANA). Essa empresa regulada pelas leis californianas

– que substituiu a primeira autoridade numeradora sediada também em Stanford –, era

responsável pelo gerenciamento da correlação entre os nomes de domínio (DNS) e os

respectivos números IP, bem como pela coordenação dos Registros Regionais da Internet

(RIR), responsáveis por realizar o gerenciamento da mesma em nível regional9 (Kleinwächter,

2009).

Em 1989, Tim Berners-Lee – à procura de uma forma de organizar a gestão e o

acesso simplificado a grandes quantidades de informação - inventou a world wide web: o

padrão WWW, uma aplicação agregada à Internet que permite a publicação e o

compartilhamento de informações através de sítios virtuais. O princípio de funcionamento

dessa aplicação é simples: as informações armazenadas em servidores e computadores

distintos são ligadas se através de uma linguagem de formatação de documentos (hypertext

mark-up language - html) que permite a criação de links entre bancos de dados distintos.

Essa linguagem, quando traduzida para uma linguagem compreendida por seres humanos,

deixa mark-ups (marcas) no conteúdo publicado, que levam o leitor diretamente a outros

                                                                                                               8 Ao longo do tempo, institucionalizaram-se comunidades de formadas por técnicos, empresas, acadêmicos do ramo da informática, curiosos, e etc., que tomavam decisões relativas à regulamentação da Internet de forma cooperativa e consensual. Três exemplos dessa ‘governança sem governo’ são a Internet Engineering Task Force (IETF), de 1986; a Internet Research Task Force (IRTF), de 1989; e a Internet Society (ISOC), de 1992. A IETF é responsável por “fazer a Internet funcionar melhor a partir da produção de documentos técnicos de alta qualidade e relevância que possam influenciar as maneiras de se desenhar, usar e gerenciar a Internet” (IETF, 2010). A IRTF dedica-se a “promover pesquisas relevantes para o futuro da Internet, a partir da criação de grupos de pesquisa de longo prazo a respeito de tópicos relacionados a protocolos, aplicações, arquiteturas e tecnologias da Internet.” (IRTF, 2010). A Internet Society anuncia-se como uma “organização sem fins lucrativos, fundada em 1992, com a finalidade de gerar liderança em questões relacionadas aos padrões, à educação e às políticas públicas relativas à Internet.” (ISOC, 2010). Ela é formada por membros das duas instituições anteriores e, também, por empresas, universidades e representantes governamentais. O marco inicial desse processo de institucionalização é localizado por Kleinwächter (2009) na formação do Internet Configuration Control Board (ICCB), ou o Conselho de Controle da Configuração da Internet, em 1979, dentro da própria agência governamental que desenvolvia o projeto da Internet (a ARPA). O ICCB foi criado para funcionar como uma plataforma de cooperação entre os diversos grupos (divididos em forças-tarefa) dedicados ao desenvolvimento da Internet. Em 1983, o ICCB passou a se chamar Internet Activities Board (IAB) (Cerf, 1990). Em 1992, o IAB, cujas principais forças-tarefa são o IETF e o IRTF, foi renomeado para Internet Architecture Board e, atualmente, é um dos conselhos integrantes da Internet Society. 9 Atualmente, existem cinco RIRs no mundo: ARIN (América do Norte), LACNIC (América Latina e Caribe), RIPE NCC (Europa Oriental e Ocidental), APNIC (Ásia e Pacífico) e AFRINIC (África).

 

  7

sítios virtuais.10 Esse desenvolvimento – que habilitou a “navegação na Internet” é apontado

por especialistas como sendo o elemento responsável por sua popularização (Mathiason,

2009:37). E mais: com a popularização da Internet, cresceu o interesse de empresas de TI

dos Estados Unidos na (bem como a pressão exercida pelo lobby sobre o Congresso norte-

americano para a liberação da) exploração comercial do acesso à Internet (Lucero, 2010:64).

Coincide com o surgimento da world wide web, no plano das relações internacionais, o

fim da Guerra Fria. Por causa dela, mesmo a rede mantida pela National Science Foundation

(de caráter eminentemente civil) era mantida sob o controle (ainda que indireto) dos Estados

Unidos. Na conjuntura inaugurada a partir de 1991 caíram as restrições à exploração

comercial da Rede. “A partir de 1990, a Internet deixava de ser uma rede para uso exclusivo no ensino e na pesquisa. Fugia à competência institucional da NSF, agência de fomento à pesquisa, mantê-la sob seu controle operacional. Progressivamente, os pontos de acesso da NSFNET, sucessora da ARPANET, seriam migrados para provedores comerciais, até que, em abril de 1995, a NSFNET seria oficialmente encerrada. A gestão do DNS, por sua vez, seria também delegada à iniciativa privada, mediante a contratação da Network Solutions Inc., empresa de pequeno porte sediada em Chantilly, no estado norte-americano da Virgínia.” (Lucero, 2010:65)

Esse processo de “privatização” da governança técnica da Internet pode ser assim

explicado: na década de 1980, há uma separação da ARPANET em duas redes distintas: a

MILNET – exclusiva do Departamento de Defesa – e a porção restante, destinada à National

Science Foundation. Até 1991, o Departamento de Defesa foi o responsável por financiar as

atividades de governança desenvolvidas pelo ISI/UCS. Diante do fato, porém, de que a maior

parte do crescimento da Internet dava-se fora da esfera militar, em 1992, a NSF assumiu a

responsabilidade pelo controle de tudo aquilo que não dizia respeito ao nome de domínio

.MIL.

Com isso, a Fundação resolveu criar uma organização própria (a Inter-NIC) para

articular os trabalhos das empresas Network Solutions (serviços de registro de nomes de

domínio), AT&T (serviços de armazenamento e base de dados) e General Atomics (serviços

de processamento de dados). Enquanto esse consórcio de empresas realizava as operações

técnicas de organização e manutenção da Internet em Funcionamento, a IANA de Postel

continuava subcontratada para dar suporte e orientação técnica às atividades da primeira

(Bing, 2009:36). Não tardaram, nesse contexto, a surgir divergências entre a comunidade

técnico-científica e as corporações, como as integrantes do consórcio organizado pela NSF,

que enxergavam no mercado de DNS oportunidades negociais de grande vulto (Kurbalija e

Gelbstein, 2005:9). Essas divergências serão apresentadas de forma mais detida na seção

“4”, abaixo. Pode-se adiantar, porém, que elas giram em torno do tema da monopolização do

gerenciamento do DNS pelo setor privado.                                                                                                                10 O documento originalmente desenvolvido por Berners-Lee pode ser acessado através do sítio virtual da World Wide Web Consortium: http://www.w3.org/History/1989/proposal.html. Último acesso em: 06/12/2011.

 

  8

No ano de 1998, o governo norte-americano reconheceu que “a Internet se tornou um

meio internacional para o comércio, a educação e a comunicação que superou o sistema

legado de gerenciamento técnico.” (Magaziner apud Kleinwächter, 2009) e, através do

Departamento de Comércio, fundou uma corporação sem fins lucrativos e repassou a ela as

funções antes desempenhadas pela IANA11 e pelo consórcio administrado pela NSF (Estados

Unidos, 1998).

Dos diálogos travados entre Postel, em nome da IANA, e o Departamento de Comércio

dos Estados Unidos, nasceu a Internet Corporation for Assigned Names and Numbers

(ICANN), “uma organização única no mundo – uma organização não-governamental com

responsabilidades significantes para a administração do que está se tornando um recurso

global importante” (Postel, 1998). A corporação seria gerenciada pelo setor privado, a partir

de decisões adotadas pelo consenso dos diversos atores interessados na Internet.

Há, no organograma institucional da empresa, um Conselho de Diretores (9

representantes do setor privado e da comunidade técnico-científica e 9 representantes dos

usuários da Internet e da sociedade civil em geral). Os países membros da ONU reúnem-se

em um Comitê Governamental de Aconselhamento (GAC) à Diretoria, que manteve – até

2001 - a prerrogativa de acatar ou descartar os conselhos feitos pelo fórum governamental

(GAC, 2010). Uma série de problemas técnicos, institucionais e de legitimação da ação da

ICANN para além da jurisdição dos Estados Unidos (Feld, 2003) acabou por aumentar o peso

da decisão do Comitê governamental, como se verá adiante. Nos dias de hoje, a ICANN

coordena a identificação dos computadores ligados à Internet e tem como responsabilidade

principal a manutenção da operação estável e segura dos sistemas que fazem tal

identificação. A corporação coordena, assim, a alocação dos domínios da Internet (como, por

exemplo, .com, .gov, .org, .us, .br, .edu), dos endereços IP, e dos protocolos e parâmetros

numéricos associados a eles. Também, a ICANN é responsável por coordenar o

desenvolvimento de políticas relacionadas a essas tarefas técnicas. Como o sítio da

corporação deixa claro, não é sua responsabilidade “controlar o conteúdo disponível na

Internet. Ela não pode controlar SPAM12 e não lida com o acesso à Internet. Porém, através

                                                                                                               11 A IANA existe até os dias de hoje. Pelo que se lê no sítio virtual da agência, ela é “o órgão responsável pela coordenação de alguns elementos-chave para o funcionamento da Internet. Apesar de a Internet ser conhecida por ser uma rede mundial livre de coordenação central, existe uma necessidade técnica de que algumas de suas partes sejam globalmente coordenadas e esse papel de coordenação cabe à IANA. (…) A IANA não objetivo determinar as políticas através das quais opera. Ao invés disso, ela é responsável por implementar políticas e princípios [desenvolvidos nos fóruns coordenados pela ICANN] de uma forma responsável e neutra.” (IANA, 2010) 12 Como explica o sítio virtual mantido pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), “spam é o termo usado para referir-se aos e-mails não solicitados, que geralmente são enviados para um grande número de pessoas. Quando o conteúdo é exclusivamente comercial, esse tipo de mensagem é chamada de UCE (do inglês Unsolicited Commercial E-mail).” Disponível em: http://www.antispam.br. Acesso em: 30/10/2011. N.A.: A palavra SPAM é um acrônimo para Spiced Ham (ou seja, presunto picante). Ela foi popularizada a partir de um dos quadros do programa de humor inglês Monty Python’s Flying Circus. No quadro, SPAM é um ingrediente incorporado em quase todos os pratos servidos no restaurante em que se passa a cena retratada. Tal expressão passou a ser empregada pela comunidade epistêmica da Internet como sinônimo de mensagens indesejadas enviadas sem requisição aos nossos endereços eletrônicos. Esse quadro encontra-se - a partir dos 40’’ de exibição - no vídeo disponível em:

 

  9

de sua coordenação do sistema de nomes da Internet, ela tem, sim, um verdadeiro impacto

na expansão e na evolução da Internet.” (ICANN, 2010)

É aí que encontra-se a divisa entre a governança da Internet em sentido estrito e sua

versão abrangente. Com a apropriação da Internet como recurso comercializável no mercado

de consumo, e, por isso, com a consequente ampliação dos recursos de infraestrutura

necessários para dar suporte a esse avanço, os Estados – especialmente os europeus

durante a década de 1990, e o restante dos membros da ONU a partir da virada do século –

passaram a buscar espaço na organização e na regulamentação do mercado consumidor,

das práticas comerciais e do avanço da infraestrutura em seus territórios, e nas relações

internacionais (Feld, 2003:384). O crescente número de usuários e a progressiva

simplificação do uso da Internet, bem como as possibilidades que ela trouxe para a

organização da sociedade civil, implicaram no desenvolvimento de uma massa de usuários

capazes de contrapor seus interesses individuais e coletivos aos interesses dos demais

atores envolvidos no processo de organização, administração e desenvolvimento da Internet

(Padovani e Pavan, 2007:102-103).

A partir da virada do século XX para o século XXI, a “governança sem governo”

passou a dar espaço à governança multissetorial, em que Estados e uma série de atores não

estatais (como empresas, organizações internacionais, a sociedade civil organizada, a

academia, e etc.) estabelecem relações políticas de conflito e cooperação na tentativa de

regular, organizar e governar a Internet. “Governos que não o governo dos EUA progressivamente se deram conta do quão pouco podiam controlar o que acontece na e ao redor da Internet. A partir do momento em que a Internet cresceu como um motor poderoso para o crescimento econômico e para o discurso político, as questões relacionadas à Internet ganharam relevância que não tinham há alguns anos atrás. O que eram questões técnicas relegadas aos cientistas e engenheiros passou a ser matéria de políticas públicas de interesse de uma série de pessoas que alegam ter interesses nas decisões [referentes à governança]” (Kwalwasser, 2009:492)

Diante disso, a governança da Internet integrou a agenda de trabalhos das duas

Cúpulas Mundiais para a Sociedade da Informação (2003 e 2005) organizadas pela União

Internacional das Telecomunicações.

Na Cúpula de 2003, os participantes reconheceram a necessidade de se garantir, no

que diz respeito à Internet, “a distribuição equitativa de recursos, facilitar o acesso por todos e

garantir estabilidade e segurança no funcionamento da Internet, levando-se em consideração

o multilingualismo” (UIT, 2003, par. 48); e requisitaram ao Secretário-Geral da ONU que

juntasse um grupo de peritos de governos, do setor privado, da sociedade civil e das

organizações Internacionais para definir, com mais precisão o alcance da “governança da

Internet” (UIT, 2003, par. 50).                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                http://www.youtube.com/watch?v=cFrtpT1mKy8. Acesso em: 03/07/2012. Maiores informações podem ser encontradas na reportagem publicada pela revista Superinteressante em setembro de 2004: http://super.abril.com.br/tecnologia/ha-tras-desse-spam-444736.shtml. Acesso em: 10/06/2012.

 

  10

Esse Grupo de Trabalho trabalhou durante o ano de 2004 e redigiu um relatório

intitulado Report of the Working Group on Internet Governance (Nações Unidas, 2005), em

que define governança da Internet como o “desenvolvimento e a aplicação, por governos,

pelo setor privado e pela sociedade civil – em seus respectivos papéis – de princípios,

normas, regras e procedimentos de tomada de decisão, bem como de ações programáticas,

que devem determinar a evolução e o uso da Internet” (Nações Unidas, 2005:4). Foram aí

listados os papeis e responsabilidades a cada um dos stakeholders (governos, setor privado,

sociedade civil e organizações internacionais)13. O documento listou, ainda, os principais

temas de políticas públicas relacionadas à governança da Internet14. E, por fim, o relatório

sugeriu a criação de um fórum multistakeholder (em português, multissetorial) de discussões

relativas à governança da Internet (Nações Unidas, 2005:4-10).

Na Segunda Cúpula, em 2005, ano em que foi adotada uma “Agenda para a

Sociedade da Informação”, uma série de questões passou a integrar a agenda da governança

da Internet: a exclusão digital, o cibercrime e a cibersegurança, as liberdades na Rede, a

proteção de direitos humanos e a diversidade cultural, as diferentes capacidades existentes

entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento no que diz respeito ao acesso à

Rede, à participação no processo de governança global da Internet e etc. (UIT, 2005, par. 29-

66). Além disso, esse evento foi palco do início da polarização dos atores (estatais e não

estatais) presentes no evento em relação à continuidade ou não da governança centrada no

modelo da ICANN. Enquanto alguns países aliaram-se aos Estados Unidos na defesa do

status quo, uma parcela bastante representativa da comunidade internacional (dentre as

quais os stakeholders brasileiros) seguiu a União Europeia na defesa de um modelo de

governança cooperativo, multilateralizado e mais democrático. 15 Finalmente, a Cúpula

solicitou ao Secretário-Geral da ONU a organização do fórum sugerido Grupo de Trabalho,

conforme o descrito acima.

                                                                                                               13 “A autoridade para o desenvolvimento de políticas públicas conexas à Internet é direito soberano dos Estados. Eles têm direitos e responsabilidades pelas questões internacionais relacionadas às políticas públicas relativas à Rede. O setor privado tem – e deve continuar tendo – um importante papel no desenvolvimento da Internet, tanto em termos técnicos quanto em termos econômicos. A sociedade civil – que teve um importante papel em questões de Internet, especialmente no nível local, deve continuar a desempenhar tal papel. As organizações intergovernamentais facilitaram e devem continuar facilitando a coordenação da tomada de decisões relativas às políticas públicas conexas à Internet. E as organizações internacionais devem continuar a ter um papel importante no desenvolvimento de padrões e políticas técnicas e não técnicas relacionadas á Internet.” (UIT, 2003, par. 48 – com grifos artificiais) 14 O controle unilateral do governo estadunidense sobre a tarefa de coordenar a identificação dos computadores ligados à Internet; as diferenças nos custos de conexão à Internet entre países desenvolvidos e em desenvolvimento; a estabilidade e segurança da rede e o cibercrime; o SPAM; a predominância da língua inglesa na internet, com pouca difusão de conteúdo local e multilíngue; a insuficiente capacidade institucional e de recursos humanos em grande parte dos Estados para tratar de dessas questões; a baixa de participação de países em desenvolvimento e da sociedade civil na formulação global de políticas públicas relacionadas à Internet; liberdade de conhecimento e acesso ao conteúdo on line; liberdade de expressão e a censura; os direitos de propriedade intelectual; a proteção de dados pessoais e direito à privacidade; e a proteção global ao consumidor na Internet. 15 O repositório dos documentos adotados no evento, bem como as manifestações de cada um dos países e demais atores participantes, pode ser acessado via: http://www.itu.int/wsis/documents/listing-all.asp?lang=en&c_event=s|2&c_type=all|. Ultimo acesso em 13/12/2010.

 

  11

Formou-se, então, para o quinquênio 2006-2010 o Fórum de Governança da Internet

(IGF), sem poder decisório, com a missão de aproximar os stakeholders interessados no

assunto e de documentar os consensos e dissensos existentes entre eles para orientar as

decisões adotadas por organizações em múltiplos níveis. Exemplos de tais organizações são

a ICANN para os nomes de domínio, a IETF para padrões técnicos, a UIT para questões de

infraestrutura e a UNESCO para questões socioculturais, como o multilingualismo na Rede.”

(Kleinwächter, 2009) O IGF teve seu mandato renovado pela Assembleia Geral da ONU por

mais cinco anos (Nações Unidas, 2010a e 2010b).

Em linhas gerais, o IGF funciona presencialmente e de maneira remota (através da

Internet). O Fórum não segue regras rígidas de participação. Todos os atores atuam em pé de

igualdade. Não há adoção de documentos finais formais sujeitos à deliberação dos presentes.

Anualmente, um relator é responsável por registrar os debates e diálogos travados no Fórum

(Malcolm, 2008:353 e ss.). Além disso, o secretariado da ONU mantém, em tempo integral,

um espaço virtual aberto para servir de plataforma ao diálogo constante entre os atores

envolvidos na governança da Internet.16

A partir do produzido e consolidado desde 2006 no âmbito do IGF, afirma-se que a

iniciativa vem funcionando como um compromisso [de diálogo] entre aqueles que procuram instituições baseadas na autoridade intergovernamental para a vigilância, a fiscalização, da Internet e aqueles que não querem nenhum tipo de controle (...). Se tiver sucesso, pode fornecer um modelo para áreas substancialmente similares. Porém, se não tiver sucesso, pode fazer retroceder a ideia de que a governança pode transcender o estado-nação.” (Mathiason, 2009:122)

A descrição de Mathiason permite afirmar que há um espectro polarizado de formatos

institucionais desejados, pelos diferentes atores, para o regime de governança global da

Internet. A seguir, apresenta-se uma tipologia que tem como extremos, de um lado, a

ausência de controle e governança, e de outro, a preponderância da vontade soberana dos

Estados.

   

4) Formatos institucionais em disputa

Inúmeras organizações de natureza distinta lidam com os temas a que se refere o

termo “governança da Internet”. “Muito pouco das operações da Internet estão sujeitas às decisões governamentais e até mesmo de organizações intergovernamentais. Ao invés disso, muitos dos fóruns-chave para o setor – especialmente aqueles relacionados com os processos de padronização que são fundamentais para o funcionamento da Internet – são dominados por entidades privadas e os governos têm apenas um papel coadjuvante a desempenhar.” (Kwalwasser, 2009:491)

                                                                                                               16 Disponível em: http://www.intgovforum.org/cms/discussionspace. Último acesso em: 14/12/2010.

 

  12

Pode-se sintetizar relacionar essas organizações e seus respectivos escopos de

atuação de acordo com o exposto na tabela 4.1, abaixo.

 ORGANIZAÇÃO   ESCOPO  DE  ATUAÇÃO  

ICANN   (Internet   Corporation   for   Assigned   Numbers   and  Names)  

Supervisão  do  Sistema  de  Nomes  de  Domínio;  alocação  dos  espaços  de  endereços  IP;  supervisão  dos  servidores-­‐raiz  da  Internet.    

ISOC   (Internet   Society);   IETF   (Internet   Engineering   Task  Force);   IESG   (Internet   Engineering   Steering   Group);   IAB  (Internet  Architecture  Board)  

Desenvolvimento   dos   padrões   de   operação   da   Internet   e  sua  arquitetura  de  rede.  

W3C  (World  Wide  Web  Consortium)   Desenvolvimento   de   padrões   para   a   World   Wide   Web  (www).  

UIT  (União  Internacional  das  Telecomunicações)   Desenvolvimento  de  padrões  de  telecomunicação,  incluindo  a   interface   entre   a   Internet   e   demais   sistemas   de  telecomunicação.  

OMPI  (Organização  Mundial  da  Propriedade  Intelectual)   Supervisão   e   aplicação   das   normas   de   propriedade  intelectual,   marcas   e   patentes,   acordadas   pelos   Estados-­‐membros;  combate  à  pirataria.    

OMC  (Organização  Mundial  do  Comércio)   Supervisão   e   aplicação   das   normas   referentes   às   relações  econômico-­‐comerciais  com  especial  ênfase  ao  e-­‐comércio.  

Comissões  e  agências  da  ONU  (UNESCO,  UNODC,  UNCITRAL,  CEPAL)   e   organizações   regionais   (UE,   OSCD,   OEA,   ASEAN,  G8)  

Desenvolvimento  de  políticas  ad  hoc  sobre  questões  que  são  de  interesse  de  seus  membros.  Ex:  inclusão  digital,  combate  ao  cibercrime,  relações  comerciais,  etc.  

Governos  nacionais  (ação  individual  ou  coletiva)   Desenvolvimento   de   políticas   ad   hoc   sobre   questões  variadas,   com  ênfase   especial   em   regulação   comercial,   uso  da  Internet  e  combate  ao  cibercrime.  

 Tabela  4.1:  Lista  exemplificativa  de  organizações  envolvidas  na  governança  da  Internet.  Fonte:  autoria  própria  com  base  em  

Mathiason  (2009:21-­‐22)  e  (Kwalwasser,  2009:492).    

Como se pode notar pela leitura da coluna dos escopos de atuação, há bastante

redundância no que diz respeito tanto aos aspectos mais técnicos, quanto aos mais

relacionados com questões econômicas, sociais e jurídicas da governança da Internet. Desde

as Cúpulas para a Sociedade da Informação, institucionalizou-se o debate relativo à

manutenção desse status quo ou à sua transformação. Os diferentes stakeholders citados

acima, na defesa de seus interesses particulares, dividem-se sobre esse dilema.

Para complicar essa situação, Garson (2007:372) aponta que “enquanto há esforços

consideráveis para cobrir as questões técnicas associadas com a governança da Internet,

estudos da política que a movimenta foram deixados sob a responsabilidade de relatos de

cunho jornalístico.” E sugere que, para orientar os tomadores de decisões sobre governança

da Internet, é necessário que se retorne às “raízes lasswellianas da Ciência Política,

entendida como o estudo de quem ganha o quê, quando e como”.

Garson tem razão. Grande parte da literatura consultada ao longo de 2010 e 2011,

especialmente os pioneiros na investigação do assunto, buscam a sua divulgação sem

grande rigor científico (Kurbalija e Gelbstein, 2005; Kleinwächter, 2009). Porém, com o início

de um processo de conformação de um regime internacional para o setor, os diferentes

autores passaram procurar analogias entre o setor e outros setores das relações

internacionais (Drake e Wilson III, 2008; Malcolm, 2008); e a debater, no plano normativo, os

melhores rumos a serem adotados para a governança da Internet (Thierer e Crews Jr., 2003;

 

  13

Giacomello, 2005; Goldsmith e Wu, 2006; Bygrave e Bing, 2009; Mathiason, 2009; Mueller,

2010, Lucero, 2011).

Como já referido, a partir dessa literatura é possível aprender que, em linhas gerais, há

dois extremos ideais polarizados para a governança da Internet: um completamente alienado

ao poder soberano dos Estados e outro que atribui a esses a preponderância nas decisões

relativas à governança da Internet, por conta da importância e da relevância que o tema

adquiriu para a vida em sociedade, seja no plano doméstico, seja no plano internacional. Há,

em cada um desses extremos, variantes decorrentes, sobretudo, da capacidade dos agentes

nos quais recai a responsabilidade pela Internet.

No livro organizado por Bygrave e Bing (2009), há uma tipologia sintética desses

modelos rivais para a governança da Internet (Solum, 2009:48-94). Por ser a tipologia mais

robusta encontrada até aqui, optou-se por emprega-la como forma de avaliar quais categorias

configuram modelos plausíveis de serem alcançados nas relações internacionais

contemporâneas e podem orientar a agenda de pesquisa do campo.

A tipologia em questão leva em consideração tanto os aspectos técnicos, quanto as

questões de políticas públicas relativas à governança da Internet. A governança, no primeiro

caso, diz respeito “à regulamentação da infraestrutura da Internet, a sua operação e aos

processos pelos quais ela se desenvolve e muda ao longo do tempo”; e no segundo, “com a

habilidade dos governos para regular as aplicações, o conteúdo e as atividades humanas que

acontecem e são facilitadas com o emprego da Internet”. (Solum, 2009:50)

Deve-se considerar que muitas questões regulatórias relativas à Internet encontram

analogia com outros ramos das telecomunicações. Outras não. Kurbalija e Gelbstein (2005)

explicam que dois enfoques distintos pautam as discussões atuais sobre a governança da

Internet. O enfoque “velho e real”, segundo o qual não há quaisquer diferenças entre a

governança da Internet, da telefonia, da radiocomunicação e etc. O outro é o enfoque “novo e

cibernético”, a partir do qual se deveria constituir um novo modelo de governança, próprio da

Internet. Como os autores esclarecem, “[esse] enfoque foi particularmente popular nos

primeiros dias da Internet. Existia a esperança de que o método inovador inicialmente

utilizado para se governar a Internet [consenso básico entre os técnicos sobre os códigos a

serem empregados] poderia se converter em um modelo para a regulação de outras áreas da

atividade humana. A principal premissa do enfoque cibernético é a de que a Internet desliga

nossa realidade social e política do mundo dos estados soberanos. O ciberespaço é diferente

do espaço real e, portanto, requer uma forma diferente de governança.” (2005:17-18).

Nesse ponto é que a tipologia que se apresenta a seguir passa a ser relevante. Antes

de detalha-la, deve-se ressaltar as premissas que orientam o trabalho de Solum (2009:52):

“(a) a ideia de que a Internet é constituída por sua arquitetura, ou código; (b) a ideia de que os

problemas de regulação da Internet podem ser analisados a partir do emprego de ferramentas

 

  14

próprias da análise política, incluindo, entre outras: (i) teoria normativa; (ii) teoria econômica; e

(iii) teoria da escolha social; e (c) a ideia de que o espaço lógico para discussão da

governança da Internet pode ser capturado a partir de ‘modelos’ ou tipos ideais de regulação

da Internet”.

São cinco os modelos formulados por Solum, acompanhados de uma sexta

composição híbrida (2009:52-88).

O modelo centrado na ordenação espontânea do ciberespaço é o que Solum

associa a uma “concepção romântica do ciberespaço como um reino separado do espaço

físico e do alcance tanto de governos nacionais quanto das forças do mercado” (2009:57).

Como indicado na introdução deste trabalho, tanto textos de ficção quanto trabalhos técnicos

orientaram essa concepção. Ela foi alimentada a partir de declarações como a do cientista da

computação norte americano, David Clark, que anunciou que os integrantes do ciberespaço

rejeitam reis, presidentes e votações; e que acreditam em um consenso fluido e um código de

programação em funcionamento que reflita esse consenso (Clark, 1992). O (agricultor)

entusiasta da vida virtual, John Perry Barlow, postou na web uma declaração de

ciberindependência em que dizia: “Governos do Mundo Industrial, vocês gigantes aborrecidos de carne e aço, eu venho do espaço cibernético, o novo lar da Mente. Em nome do futuro, eu peço a vocês do passado que nos deixem em paz. Vocês não são benvindos entre nós. Vocês não têm a independência que nos une. Os governos derivam seu justo poder a partir do consenso dos governados. Vocês não solicitaram ou receberam os nossos. Não convidamos vocês. Vocês não vêm do espaço cibernético, o novo lar da Mente. Não temos governos eleitos, nem mesmo é provável que tenhamos um, então eu me dirijo a vocês sem autoridade maior do que aquela com a qual a liberdade por si só sempre se manifesta. (...)Estamos formando nosso próprio Contrato Social. Essa maneira de governar surgirá de acordo com as condições do nosso mundo, não do seu. Nosso mundo é diferente.” (Barlow, 1996)

Esse otimismo liberal da década de 1990, porém, não tardou ser combatido pela

progressiva ocupação “pervasiva” (sic) do ciberespaço por governos e grandes multinacionais

(Solum, 2009:58). Mesmo que as características de estruturação da Internet e do tráfego de

informações pela rede tornem praticamente impossível o monitoramento e o controle

completo por parte dos Estados, reconhece-se que a tecnologia permite que isso venha a

acontecer (e, de fato, esteja acontecendo como se verá abaixo). Disso Solum (2009:59) retira

a conclusão que “a Internet pode não ser uma utopia diferenciada, autogovernada e libertária,

mas é um ramo da vida em sociedade que dificulta a regulamentação governamental”.

Como desdobramento e tentativa de contornar a impotência do modelo anterior

diante das crescentes iniciativas de controle e regulamentação por parte de Estados

soberanos, Solum apresenta o modelo do código e da arquitetura da Internet, segundo o

qual “a natureza da Internet ou do ciberespaço é determinada pelo código – o software e o

hardware que implementam a Internet” (2009:61). Com isso, o código entendido como um

constrangimento institucional, como a lei que habilita os atores sociais a agir, ou os

 

  15

impossibilita de adotar determinadas ações, no ciberespaço (Lessig, 2006). Enquanto que o

primeiro modelo entende que a partir da entrada no ciberespaço há uma desconexão entre as

ações aí adotadas e o mundo real, o modelo do código discorda da desconexão com base

argumento de que código e a arquitetura da Internet, por si só, têm efeitos regulatórios do

comportamento humano (Solum, 2009:62), que seriam adicionais ao próprio efeito regulatório

de outras instituições que têm jurisdição sobre as pessoas que utilizam a Internet em suas

“pontas”. Para fundamentar essa assertiva, o autor revisa o princípio de comunicação end-to-

end que é a base fundamental da Internet: a inteligência restringe-se às pontas, às camadas

superiores (a camada social e a camada das aplicações). Segundo o autor, a Rede é simples

e estúpida (ou transparente, em termos politicamente corretos): ela apenas garante a

comutação de pacotes, sem poder identificar a natureza dos pacotes (conteúdo de sítio

virtual, conteúdo de e-mail, conteúdo de redes sociais, etc.) e o tamanho dos pacotes. Isso é

feito pelas aplicações que são desenvolvidas pelos usuários da rede. Em linhas gerais, isso

garante que haja uma estabilidade na organização, na estruturação e no funcionamento da

Rede, que faz com que não haja a necessidade de investimento em reformar a infraestrutura

da rede e a forma de se conectar a ela diante de aplicações inovadoras: afinal, são as

aplicações que se adaptam às características da Rede e não a Rede que se adapta às

características das aplicações desenvolvidas para funcionar através daquela (Solum,

2009:63). Nesse ponto, Solum esclarece a importância da arquitetura da Internet: “ela foi

criada como uma rede de redes para a interconexão de vários sistemas computacionais

existentes quando do momento de sua criação” (Solum, 2009:68). Assim, a característica

estrutural de “estupidez” da Rede - que é apontada como o motor principal para a

popularização e a crescente ubiquidade da Internet - a erige como um constrangimento

institucional mais difícil de ser transformado e que, se transformado, pode desnaturar a

Internet que conhecemos hoje.

O modelo de governança centrado no papel dos Estados e no direito deriva do

papel central que os Estados e os ordenamentos jurídicos nacionais têm não apenas no

âmbito dos demais ramos das telecomunicações (Krasner, 1991), mas, antes disso, diante da

preponderância que essa formas de organização social e de regulamentação das atividades

humanas alcançaram em relação às demais, dentro de um território específico, ao longo do

tempo (Tilly, 1996:46). Por premissa, pode-se dizer que as atividades humanas realizadas ou

não através da Internet podem estar sujeitas à jurisdição de determinado Estado, desde que

haja a consagração de direitos e/ou deveres no ordenamento jurídico em questão. Solum, de

partida, esclarece as controvérsias relativas a esse modelo de governança (2009:68-69): “as

questões mais difíceis referentes à regulação da Internet pela aplicação de legislação

nacional surgem em dois contextos paradigmáticos [sic]. O primeiro contexto é aquele em que

se tenta subordinar a arquitetura [o código] da Internet à regulação nacional. O segundo

 

  16

contexto é aquele em que se tenta censurar o conteúdo divulgado através da Internet [ou

seja, a ação dos usuários].” Em relação ao primeiro, o autor é direto: “nenhum governo nacional tentou qualquer tipo de medida séria para modificar a arquitetura fundamental da Internet. Pode-se dizer que qualquer tentativa nesse sentido seria fadada ao fracasso, afinal, nenhum país teria o poder de forçar uma mudança de alcance global na arquitetura da Internet e uma mudança fundamental no plano nacional acabaria por fragmentar a própria Internet. Entretanto, a China vem adotando políticas [próprias do segundo contexto, de controle do acesso e do conteúdo on line] que objetivam criar o equivalente funcional a mudanças na arquitetura da Rede. (...) As regulações no país designam o Ministério da Indústria da Informação como o gatekeeper da Internet no país, e o acesso à Internet ocorre através de provedores de acesso ocorre através de alguns poucos canais exclusivos que são fornecidos ou autorizados a funcionar sob o comando do Ministério”. (Solum, 2009:69)

Esse formato de governança conflita diretamente com o modelo do código e

arquitetura da Internet, que, por si só, não foram desenvolvidos de maneira a facilitar a

regulamentação por parte do Estado (Solum, 2009:70). A atuação chinesa seria, segundo o

modelo em questão muito custosa e ineficaz à medida que cresce a capacidade dos usuários

em contorná-la. Mas se há algum sucesso da China em contornar parcialmente a arquitetura

da Internet e é capaz de bloquear, pela filtragem e pela criação de barreiras jurídico-

institucionais, o acesso dos habitantes de seu território ao conteúdo veiculado na Internet,

Solum aponta que dificilmente a China conseguira censurar os provedores de conteúdo e

informações que não estejam subordinados à legislação chinesa, porque faltaria ao país

“poder de fato para exercer tal controle de conteúdo” (2009:71).

É difícil determinar quem teria esse poder de aplicar sua própria legislação para além

de sua jurisdição. Tanto Solum (na mesma obra de referencia usada nesta seção), quanto

Goldsmith e Wu (2009:3-10) apresentam como referencia para essa discussão o caso do

Yahoo na França. Numa seção de leilões de objetos pela Internet, portal Yahoo.com, os

francês podiam comprar lembranças nazistas da Segunda Guerra Mundial. A lei francesa,

porém, proíbe a comercializão de tais artigos na França. Uma associação de combate ao

racismo e ao antissemitismo na França procurou o judiciário do país para proibir a

continuidade da atividade na França. Acontece que o sítio virtual da Yahoo estava,

alegadamente, hospedado num computador nos Estados Unidos (onde a liberdade de

expressão estaria protegida pela primeira emenda da Constituição do país). Enquanto a

Yahoo alegou imunidade em relação à lei francesa, a associação levantou a tese de que,

mesmo a partir do território dos Estados Unidos, a Yahoo causava dano à sociedade da

França e, por isso, poderia ser sancionado. Outro argumento da Yahoo buscava fazer

preponderar a ideia de que se os franceses visitavam o site americano da empresa, o

problema não era seu. E que (1) a empresa não tinha a capacidade de identificar a

procedência dos visitantes a seu sítio e (2) nem tinha o controle sobre pra onde os seus

produtos e serviços digitais eram despachados. A empresa procurou defender a ideia de que,

se fosse compelida a retirar do ar os sítios em questão, ela privaria outros consumidores não

 

  17

sujeitos às leis francesas e aceitaria a extensão da jurisdição francesa para todo o resto do

mundo. Tais argumentos não vingaram: o judiciário francês entendeu que a atividade da

empresa violava a lei francesa e determinou que a Yahoo tomasse todas as medidas cabíveis

pra impossibilitar o acesso por “franceses” ao sítio de leilões da empresa. A Yahoo não

apenas restou inerte em relação à determinação judicial sob a alegação de que a decisão

judicial francesa era impraticável por conta da arquitetura e a lógica de funcionamento da

Internet.

Descobriu-se, porém, que o servidor dos Estados Unidos, em que o sítio da empresa

estava hospedado, estava replicado em Estocolmo como forma de dar aos usuários europeus

acesso mais rápido ao conteúdo on line. Essa situação indicava que a empresa tinha o poder

de controlar e alocar o tráfego entre os seus servidores, o que indicaria a possibilidade de a

empresa identificar os usuários a partir de sua localização geográfica. A corte francesa

nomeou um grupo de peritos para avaliar essa questão. Os peritos indicaram, em termos

percentuais, que a empresa poderia fazer tal discriminação com alto grau de precisão, mas

não de maneira completa.

Diante disso, em segundo lugar, a Yahoo buscou o judiciário dos Estados Unidos

para buscar a declaração de que uma corte não americana não teria o poder de impor

restrições a operação de uma empresa sediada e em operação nos Estados Unidos (e que,

na prática, era acessada remotamente e não operava diretamente na França). A empresa

recuou, porém, quando seus executivos fizeram o cálculo de custo-benefício em relação ao

significado que a ordem do tribunal francês teria em relação aos investimentos da empresa na

França e na Europa como um todo. Mais recentemente, tanto a Yahoo quanto outras

gigantes da Internet e da TI (como a Google, o Facebook, a Microsoft, a Apple, etc.) parecem

ter incorporado a seu planejamento estratégico o fato de que o argumento da inexorabilidade

da arquitetura da Rede e da lógica de funcionamento da Internet não se sustenta diante (1) do

avanço tecnológico capaz de precisar cada vez com mais certeza a vinculação geográfica dos

usuários da Internet e (2) da crescente ação dos Estados para construir capacidade de operar

no ciberespaço e buscar determinar, também aí, o alcance de sua jurisdição (Goldsmith e Wu,

2009:49-86). Ao invés de desafiar o Leviatã, portanto, seria “melhor para os negócios” dessas

empresas aliar-se a ele como forma de minimizar as perdas e evitar a imposição de entraves

operacionais (BBC, 2005; Wired, 2006; CNN, 2007; BBC, 2010; Anistia Internacional, 2011).

O modelo centrado em organizações transnacionais e organizações

internacionais é o que mais se aproxima da situação apresentada pela tabela 4.1,

apresentada acima, e, em termos normativos, parece ser uma solução que intermedia a

governança sem governo e a governança pelos governos, porque ao mesmo tempo em que

leva em consideração a impossibilidade de ações isoladas dentro das fronteiras soberanas

dos Estados, procura articular as ações desses últimos com as ações da “comunidade da

 

  18

Internet”. Há que se ressaltar que esse modelo é bipartido: enquanto que aquilo que o autor

chama de organizações transnacionais (como a ISOC e a ICANN, que não são criadas por

tratados nos termos do direito internacional público) dá papel coadjuvante aos Estados, as

organizações internacionais são as entidades intergovernamentais (ONU, OMPI, UIT,

UNESCO, etc.) por natureza, em que prepondera a vontade daqueles (Solum, 2009:59).

O modelo intergovernamental seria justificável da importância que os Estados têm,

em teoria, para a organização e manutenção da ordem no sistema internacional. Como

contra-argumento, são reiterados os mesmos tipos de controvérsias relacionadas ao

contencioso entre o primeiro modelo estudado acima e o modelo centrado nos Estados e na

abordagem legal. Ao mesmo tempo, o modelo transnacional, apesar de parecer mais apto a

dar lidar com tanto com o caráter transnacional da Internet, bem como com seus

constrangimentos técnico-institucionais, padece de dois problemas: em primeiro lugar, haveria

uma replicação de uma arena de disputa de poder por parte dos membros dessas

comunidades. E, em segundo lugar, haveria uma preocupação maior em atender os membros

da corporação em detrimento de dos demais stakeholders (Solum, 2009:60). É o caso da

ICANN, cujo modelo regido pelo direito privado gera críticas relativas a sua accountability e

legitimidade para tomar decisões que afetam os dois bilhões de usuários da Internet (Koppel,

2005), num contexto em que o lobby do setor industrial é marcante; e cuja subordinação à

jurisdição dos Estados Unidos, desperta críticas das mais variadas, especialmente no que diz

respeito ao emprego da corporação para atender interesses nacionais do país em detrimento

dos interesses dos demais (Lucero, 2011).

Finalmente, o modelo centrado no mercado e na Economia procura articular a

ideia de que a governança da Internet não deve ser tratada como uma questão de regulação,

porque essa percepção indicaria a insuficiência das regras de mercado (oferta x demanda)

para dar conta dos problemas abordados acima. No que diz respeito ao papel do mercado e

da economia, a tarefa principal é a de distinguir o que é, de fato, público e o que é, de fato,

privado na esfera da governança da Internet. Em termos econômicos, as grandes

corporações de TI e os stakeholders (estatais e não estatais) a elas vinculados procuram

patrocinar e fundamentar a ideia de que a as atividades de distribuição de endereços IP, o

registro de DNS, a oferta de acesso à Rede, o provimento de serviços on line alcançam

resultados ótimos quando pautados pela livre iniciativa e pela livre concorrência nos

diferentes mercados existentes para tanto. Apesar de o acesso à Internet ter alcançado o

status de “direito humano fundamental” em inúmeros países (Estônia, França, Grécia,

Espanha, Portugal, etc.) e a ONU ter declarado a Internet como um patrimônio da

humanidade (ONU, 2011), a capacidade de o mercado prover soluções que atendam o

público em geral (e não apenas os públicos restritos interessados no desempenho econômico

das empresas a que estão vinculados) é questionada especialmente pelos stakeholders

 

  19

engajados na defesa da ideia de que as tecnologias da informação e da comunicação devem

ser orientadas para o desenvolvimento econômico e social e para a redução das assimetrias

socioeconômicas existentes dentro dos Estados e no plano internacional. E Solum aponta que

a viabilidade desse modelo passa não apenas pela Economia, mas é uma questão

eminentemente de político-filosófica. “A obrigação de agir segundo o interesse público é abstrata e vaga. Isso é verdade tanto como uma questão de filosofia política, quanto de direito. Como uma questão de filosofia política, a natureza do interesse público é, no mínimo, contestada. Ou seja, qualquer que seja a resolução final dos debates filosóficos sobre o que conta como um interesse público em termos práticos, essa é uma questão que provavelmente não terá uma resposta unívoca em uma democracia pluralista moderna. A falta de consenso sobre a natureza do interesse público é ainda mais evidente no contexto internacional: a Internet afeta diversas culturas com diferentes sistemas axiológicos.” (Solum, 2009:85)

Ao fim do texto usado como referência nesta seção, pondera-se sobre a necessidade

de que todos esses modelos sejam articulados – por conta das insuficiências apontadas para

cada um deles, bem como pela necessidade de atender aos interesses mínimos de cada um

dos stakeholders envolvidos - na definição do formato institucional que deverá ganhar o

regime internacional de governança da Internet. Na perspectiva de contribuir para a

compreensão do que está em jogo nesse setor das relações internacionais, a seção a seguir

procura pontuar e esclarecer os aspectos políticos do controle da Internet.

 5) Considerações finais: o controle da Internet como questão política

Ainda em 1998, quando houve a chamada “privatização do DNS” (seção 3, acima),

Postel procurou articular, através da IANA, da ISOC e do IAB, uma aproximação com

Organização das Nações Unidas (nas figuras da UIT e da Organização Mundial da

Propriedade Intelectual - OMPI) e com o setor empresarial (através da International

Trademark Association), com a finalidade de organizar um comitê abrangente para o

gerenciamento do DNS. Tais entidades, organizadas sob a forma de um International Ad Hoc

Committee (IAHC), assinaram um Memorando de Entendimento depositado sob os cuidados

do Secretário-Geral da UIT (Arata, 2006). A ação de Postel buscava integrar, nos debates

referentes ao futuro da Internet, organizações cujas atividades vinham sendo diretamente

afetadas pelo alargamento da Internet para outros países que não os Estados Unidos. Por

isso, a OMPI e a ITA, pois violações a direitos autorais e a marcas registradas nos domínios

da Internet começaram a proliferar. O mesmo se justifica em relação à ONU: para Postel, era

importante trazer ao debate uma série de governos que reclamavam maior participação sobre

os seus papéis na organização e na regulamentação da Internet (Kleinwächter, 2009). A

interação entre tais organizações, entretanto, ficou no nível dos secretariados e não contou

com a participação direta de seus membros. A intenção de tal aproximação seria a de libertar

a Internet, pela ação das organizações transnacionais e internacionais, da influência direta do

governo dos Estados Unidos.

 

  20

Tal concertação, entretanto, encontrou forte oposição no governo do país. “A Secretária de Estado dos Estados Unidos da América, Madeleine Albright, escreveu uma carta crítica a Pekka Tarjanne, argumentando que o Secretário Geral da UIT havia ultrapassado os poderes de seu mandato, quando assinou o Memorando de Entendimento sem maiores consultas aos Estados Membros da UIT. A Network Solutions, que via na recomendação uma ameaça ao seu monopólio no negócio de registro de nomes gTLD, opôs-se fortemente ao MoU [memorando] e fez lobby no Congresso norte-americano para rejeitá-lo. Mais ainda, as entidades nacionais de registro de ccTLDs, que não foram incluídos no gTLD MoU, criticaram sua exclusão. O IAHC gTLD MoU havia fracassado.” (Arata, 2006:74)

Nesse período, a administração Clinton trabalhava com duas premissas em relação à

Internet: (1) por ter financiado o desenvolvimento da Rede, o governo americano entendia que

tinha preponderância sobre a mesma; e (2) essa “Internet dos Estados Unidos” era entendida

como um motor para o aumento das relações comerciais dentro e fora do país. Assim, a

ênfase da ação do governo norte-americano foi a de evitar entraves ao livre mercado. O

governo agiu para evitar o controle governamental (alheio) da Internet. “Isso soou como um

paradoxo: ação governamental para evitar ação governamental. Mas o envolvimento da UIT –

uma agência composta por outros Estados membros – levou os representantes do governo

dos Estados Unidos a temer que o processo de Genebra [organizado por Postel] levaria

outros países Europeus e demais membros da organização a empregar o eventual controle

sobre o os nomes de domínio e os endereços IP como forma de impor uma nova forma de

poder, mais invasiva, sobre a Internet.” (Goldsmith & Wu, 2009:42) Ao mesmo tempo, a ideia

de uma Internet governada inteiramente de forma privada não serviria aos interesses do país,

pois não haveria qualquer mecanismo accountability, especialmente no que diz respeito a

questões que pudessem afetar a segurança nacional.

Diante do aumento das pressões do governo norte-americano por sobre o grupo de

Genebra organizado por Postel, esse procurou demonstrar a força que a comunidade de

técnicos tinha na governança da Internet: com apenas um e-mail aos controladores regionais,

Postel – alegadamente realizando testes rotineiros – transferiu a maior parte do tráfego que

deveria passar pela servidor-raiz sob o comando da Network Solutions para os computadores

sediados na IANA. Ao mostrar a força das organizações técnicas, Postel e a USC foram

ameaçados com penalização criminal. Se, de um lado, ficou evidente que o poder carismático

de Postel e a capacidade operacional das comunidades de técnicos poderiam desarticular a

Internet – dando-lhes força política para participar dos debates referentes à governança nos

dias de hoje –, por outro, o governo Clinton lançou um Livro Verde sobre a governança na

Internet que atribuía ao Estado o papel de ditar as regras na Internet (Goldsmith e Wu,

2009:44-46).

Pouco tempo depois, entretanto, a sucessão presidencial dos Estados Unidos em

2000, com a eleição de Bush, tirou da Internet a alta prioridade dada no governo Clinton. Isso

se explica, em primeiro lugar, porque, enquanto Al Gore foi financiado por gigantes do Vale do

 

  21

Silício, a campanha de Bush foi financiada por gigantes industriais tradicionais, sobretudo do

ramo energético e do complexo militar-industrial. Não tardou até que a Internet voltasse ao

centro das atenções do país. O 11/09 trouxe de volta à Internet a lógica da segurança e da

defesa nacional, o que levou a Administração Bush a reorientar a ICANN para servir aos

imperativos de segurança do país (Kleinwächter, 2009).

Nesse contexto em que começaram a crescer no âmbito da ONU – no processo de

organização das Cúpulas para a Sociedade da Informação –, a ICANN iniciou um processo

de reestruturação institucional a partir de 2002 como forma de prestar contas, aos Estados

membros do GAC, das atividades adotadas pelo Conselho de Diretores da corporação. Pela

reforma, para rejeitar recomendações feitas pelo Comitê Governamental, o Conselho deve

justificar-se, submeter-se a consultas com os governos e, em caso de manutenção da

rejeição, justificar-se também perante toda a comunidade de usuários da Internet (ICANN,

2010).

Com as Cúpulas da Sociedade da Informação, a governança da Internet passou a ser

discutida nos termos postos na seção precedente: a disputa pelo controle da Rede iniciou-se

com a tentativa do governo dos Estados Unidos de ter a preponderância nesse setor para

garantir a dominação das empresas do país, bem como para que o Estado pudesse agir em

benefício de sua segurança. A primeira reação organizada contra tal movimentação veio por

atores não estatais e cresceu, progressivamente, até incorporar no plano das relações

internacionais, atores estatais tanto do mundo desenvolvido, quanto do mundo em

desenvolvimento, em eventos de cooperação e/ou conflito nas searas econômica, social,

cultural, securitária, etc.17 (Cogburn, 2009).

Cada um desses stakeholders é movido por interesses próprios que podem coincidir

e/ou conflitar. E, desde que a governança da Internet ganhou sua versão abrangente, a

Ciência Política passou a ter papel fundamental para o esclarecimento e a explicação das

disputas existentes em torno da Internet, seja no plano doméstico, seja no plano internacional,

e, também, na forma com a qual se relacionam esses dois planos. No que diz respeito ao

plano internacional, o escrutínio de algumas questões decorrentes dos formatos institucionais

propostos para organização e consolidação de um regime internacional para a governança da

Internet é crucial para determinar quem ganha o que, como e de que forma em cada um dos

cenários possíveis.                                                                                                                17 A manifestação mais recente de tal disposição encontra-se nas ações do Congresso dos Estados Unidos quando da criação de legislação polêmica (conhecidas como PIPA [Bill S.968] e SOPA [H.R. 3261]) no ano de 2011 destinada a combater, pelo controle e o monitoramento dos usuários da Rede, a pirataria e a violação de direitos autorais e propriedade intelectual através da Internet. O texto integral http://www.govtrack.us/. As ações e reações de Estados, empresas e da sociedade civil organizada em inúmeras organizações ao redor de todo o mundo foi classificada pela revista de cultura pop Rolling Stone como uma “guerra” pelo controle da Internet. Na reportagem, sintetiza-se a polêmica: http://www.rollingstone.com/culture/blogs/gear-up/the-sopa-and-pipa-war-an-analysis-20120120. Acesso em: 07/06/2012.

 

  22

Em primeiro lugar, deve-se esclarecer que o domínio do código, da arquitetura da

Internet, implica de forma direta controlar acesso e visibilidade na Rede (Elmer, 2009). O

sistema de endereçamento dos dispositivos conectados à Internet é o que permite o

reconhecimento mútuo dos usuários. Além disso, o sistema de nome de domínios, pela

transformação dos números dos endereços IP em nomes (inicialmente em alfabeto latino,

mas que vem sendo ampliado progressivamente até alcançar outros alfabetos), facilita a

localização, a identificação e a memorização pelo usuário humano de daqueles endereços na

Internet. Mais ainda: a comercialização dos nomes de domínio é recurso muito lucrativos,

especialmente daqueles domínios que representam grandes corporações econômicas que

procuram a inserção de suas marcas no ciberespaço. É natural que haja disputa pela

possibilidade de lucrar a partir desse modelo de negócio. Como essa comercialização tem

relação direta com a economia, com finanças, com direitos autorais e de propriedade

intelectual, os Estados e as organizações intergovernamentais relacionadas a esses temas

ganham argumentos para controlar essa porção da governança da Internet.

As comunidades de usuários e as organizações transnacionais, por outro lado,

apontam para o fato de que a prática do consenso, da liberdade e da privacidade na Internet

foi o que permitiu que a Rede hoje tivesse o status que tem e que uma reversão em prol de

um modelo weberiano de governança levaria à reversão da capacidade de inovação e de

investimento na Rede. As empresas, por sua vez, querem a liberdade de poder operar sem

constrangimento a suas transações econômico-comerciais, mas querem ao mesmo tempo a

possibilidade de recorrer a instâncias (estatais ou não) que resolvam conflitos e façam

prevalecer a propriedade privada.

Se a Internet acabou sendo moldada pela escolha voluntária de base consensual dos

desenvolvedores de aplicações e empreendedores de inovação no ciberespaço, deve-se

ressaltar o fato de que durante as décadas de 1980 e 1990, quando a moldagem foi, em

grande parte, consolidada, a Internet era um recurso que pouco penetrava no mundo em

desenvolvimento. Ainda hoje, apenas 30% da população do mundo em desenvolvimento tem

acesso à Internet, contra os quase 80% da população do mundo desenvolvido. Pode-se

ponderar que exista um desequilíbrio marcante entre aqueles que produzem e aqueles que

apenas consomem a Internet como ela é (Gandy e Farral, 2009). Como visto acima, se a

arquitetura da Internet é, por si só, um constrangimento institucional, pode-se dizer que, até

aqui, o mundo em desenvolvimento – ressalvada a margem de manobra inerente à própria

característica estrutural da Rede – teve ditadas as regras para o acesso e operação no

ciberespaço pelo mundo desenvolvido. Faz todo sentido, portanto, que os governantes dos

países do Sul – na busca pelo desenvolvimento econômico e pela redução das assimetrias

existentes na economia política global – tenham empreendido esforços (que passam,

 

  23

inclusive, pelo campo da cooperação regional18) para a ganhar mais espaço no âmbito da

governança da Internet (Lucero, 2011).

Naturalmente, entra em cena, nesse ponto, a relação entre as tecnologias da

informação e da comunicação e o binômio capacidade estatal (de fornecer bem-estar,

segurança e justiça) versus democracia nas poliarquias contemporâneas. As TIC,

especialmente a Internet, podem ser empregadas para otimizar, em conjunto ou

isoladamente, os resultados tanto no eixo da capacidade estatal quanto no eixo da

democracia. Se as TIC contribuem para o aumento de canais de informação e de

comunicação entre atores estatais e cidadãos; contribuem para ampliar a atuação

organizacional em rede; diminuem custos transacionais pela diminuição de barreiras

geográficas e temporais (Papacharissi, 2009); elas funcionam também como poderosas

ferramentas de controle, monitoramento e vigilância (Philips, 2009). Empresas procuram

exercer esse poder como forma de conhecer as necessidades dos consumidores em

potenciais de maneira a orientar a produção em direção à ampliação das possibilidades de

lucro. A ampliação da capacidade de conhecer do Estado, ao mesmo tempo em que permite

o atendimento mais célere e efetivo das necessidades dos cidadãos, pode acarretar violações

a direitos e liberdades fundamentais. E pode ser direcionada, ainda, para as disputas de

poder entre Estados no plano internacional.

Além disso, a disponibilidade e os baixos custos de acesso ao ciberespaço e à

dominação da técnica de operação nesse ambiente permite, ainda, que atores não estatais de

todo o tipo possam exercer o mesmo tipo de monitoramento da inserção cibernética dos

órgãos governamentais, seja com a finalidade de cobrar e perseguir a accountability

governamental, seja com a finalidade de atentar contra o poder estabelecido (Brundidge e

Rice, 2009). O mesmo acontece com a ação criminosa contra empresas e contra usuários

com finalidade de lucro. Esse cenário é tão complexo que é difícil determinar em abstrato de

que forma a interação entre capacidade estatal e democracia opera nos diferentes contextos

nacionais. O que abre espaço para a realização de pesquisa em perspectiva comparada com

desenhos de investigação dos mais variados.

Na prática, o multistakeholderism (em português tratado como multissetorialismo) da

atualidade engloba uma série de corporações distintas: Estados, o setor privado, a sociedade

civil e organizações transnacionais e internacionais de natureza distintas. Em termos teóricos,

os Estados são aqueles que tem o poder de agir em prol do bem comum das populações que

representam. As organizações integrantes do setor privado tendem a funcionar segundo a

lógica das externalidades positivas e negativas, e respondem, em primeiro lugar, ao interesse

                                                                                                               18 O IGF passou, progressivamente, a articular os atores em espaços regionais próprios para a concertação e a preparação dos mesmos para as reuniões anuais. No caso da América Latina, por exemplo, os stakeholders da região se reuniram em reuniões regionais preparatórias nos anos de 2008, 2009 e 2010. Maiores informações em: http://lacnic.net/en/eventos/igfprep2010/. Último acesso em: 14/12/2010.

 

  24

de seus sócios. A sociedade civil é tão plural e tão abrangente, que é impossível precisar

exatamente o alcance dessa expressão (apesar de nos termos postos pelo Relatório do

Grupo de Peritos em Governança da Internet, indicar claramente o Terceiro Setor). As

organizações internacionais (governamentais e não governamentais), por sua vez,

congregam cada um dos stakeholders anteriores segundo lógicas distintas (Dutton e Peltu,

2009).

É inegável, nesses termos, que a governança da Internet seja equacionada a partir do

balanço entre os diferentes interesses nacionais (dos Estados e de seus constituintes) em

jogo (Erikson e Giacomello, 2007). Quem persegue esses interesses – se apenas os Estados

com o mandato explícito de seus nacionais ou os diferentes atores internacionais –, como se

perseguem esses interesses – através de cooperação ou de conflito –, e quais os resultados

dessa do alcance ou não de tais interesses – como, por exemplo, a maior ou menor

autonomia para a formulação e implementação de políticas públicas – são perguntas

passíveis de serem enquadradas nos referenciais teóricos e metodológicos da Política

Internacional (Karatzogianni, 2009).

Se as respostas para tais questões passam necessariamente pela avaliação e da

distribuição de poder entre os Estados do sistema internacional, bem como da competição

para a transformação e modificação dessa distribuição, elas passam também pela

necessidade de se determinar de que maneira esse constrangimento sistêmico afeta as

relações entre atores estatais e não estatais e de que maneira essas relações de cooperação

e conflito afetam o sistema como um todo.

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