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1 8º ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CIÊNCIA POLÍTICA ABCP Gramado 2012 1 a 4 de agosto AT11 - Segurança Pública e Segurança Nacional 3º dia (04/08) 5ª Sessão: Polícia, Judiciários e Prisões A Gramática Política da Polícia: comparação das polícias do Brasil e do Chile nos regimes políticos Alexandre Pereira da Rocha 1 Resumo: O objetivo deste artigo é realizar estudo comparado entre as polícias do Brasil e do Chile nos regimes políticos autoritários e democráticos. Analisa especificamente o problema da violência policial, que a despeito das transições políticas do autoritarismo para democracia, ainda é marcante na América Latina. Essa violência faz questionar: o papel da instituição policial varia em decorrência do regime político, seja ele autoritário ou democrático; ou varia conforme questões mais profundas do sistema político ou de interesses da própria polícia? Palavras-chave: polícia; violência policial; regimes políticos; autoritarismo; democracia. 1 Mestre em Ciência Política IPOL/UNB. Doutorando em Ciências Sociais no Centro de Pesquisa e Pós-graduação sobre as Américas da Universidade de Brasília CEPPAC/UNB. Email: <[email protected]> <[email protected]>

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8º ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA

DE CIÊNCIA POLÍTICA – ABCP

Gramado 2012 – 1 a 4 de agosto

AT11 - Segurança Pública e Segurança Nacional

3º dia (04/08)

5ª Sessão: Polícia, Judiciários e Prisões

A Gramática Política da Polícia: comparação das polícias

do Brasil e do Chile nos regimes políticos

Alexandre Pereira da Rocha1

Resumo: O objetivo deste artigo é realizar estudo comparado entre as polícias do Brasil e do

Chile nos regimes políticos autoritários e democráticos. Analisa especificamente o problema da

violência policial, que a despeito das transições políticas do autoritarismo para democracia,

ainda é marcante na América Latina. Essa violência faz questionar: o papel da instituição

policial varia em decorrência do regime político, seja ele autoritário ou democrático; ou varia

conforme questões mais profundas do sistema político ou de interesses da própria polícia?

Palavras-chave: polícia; violência policial; regimes políticos; autoritarismo; democracia.

1 Mestre em Ciência Política – IPOL/UNB. Doutorando em Ciências Sociais no Centro de Pesquisa e Pós-graduação sobre as Américas da Universidade de Brasília – CEPPAC/UNB. Email: <[email protected]> <[email protected]>

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Polícias autoritárias são as marcas de governos não democráticos.

David Bayley, 2005

Introdução

O tema segurança pública, em especial o tópico das instituições policiais, tem despertado

o interesse de governos, acadêmicos e sociedade civil de diversos países da América Latina. Isso

devido à necessidade de consolidar valores democráticos e direitos humanos em meio ao

aumento dos índices de criminalidade e de insegurança2. As sociedades dos países que deixaram

os regimes autoritários, marcados pela violência política, vislumbraram na democracia a solução

para diversos problemas, inclusive os de afrontas aos direitos humanos. Contudo, transcorrido

algumas décadas de experiência democrática, as mesmas sociedades convivem com variadas

formas violência. Esse é o caso, por exemplo, da violência oficial praticada pelas polícias, a qual

é presente nos regimes democráticos.

Destarte, se nos países da América Latina – por exemplo, Argentina, Brasil e Chile –, os

regimes políticos transitaram do estágio autoritário para o democrático, o que justifica a

ocorrência da repressão policial abusiva nos dias de hoje? Dados estatísticos, pesquisas e

noticiários relatam casos de violência policial,3 sobretudo, contra os grupos sociais menos

favorecidos, favelados, minorias étnicas, afrodescendentes, jovens de periferia. Este traço de

violência é herança do passado autoritário? Será que as mudanças institucionais propostas pelo

regime político não são suficientes para alterarem as práticas das organizações policiais? Enfim:

o papel da instituição policial varia em decorrência do regime político, seja ele autoritário ou

democrático; ou varia conforme questões mais profundas do sistema político ou de interesses da

própria polícia?

Para responder a tais questionamentos, esse ensaio realiza estudo comparado sobre o

papel das polícias nos regimes autoritários e democráticos do Brasil e do Chile. O propósito não

é realizar uma abordagem revisionista dos períodos autoritário e democrático, mas uma análise

das polícias sob esses regimes. Para tanto, adota uma abordagem institucional, na qual a

2 Vide, por exemplo: “O Brasil precisa deixar claro que respeita o Estado de Direito”, diz ONG internacional. Disponível em:

<http://blogs.estadao.com.br/roldao-arruda/o-brasil-precisa-deixar-claro-que-respeita-o-estado-de-direito-diz-ong-internacional/> Acessado em: 23/04/2012. 3 Vide: Human Rights Watch (2009): Força Letal: Violência Policial e Segurança Pública no Rio de Janeiro e em São Paulo; Justiça Global e Núcleo de Estudos Negros (2003): “Relatório de Execuções Sumárias no Brasil -1997/2003”; Observatorio Ciudadano, Amnistía, Internacional e outros (2008): “ALTO AHÍ! – Basta de Violencia Policial”. Disponível em: <http://www.londres38.cl/1937/articles-82945_recurso_1.pdf> Acessado em 14/04/2012.

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violência policial encontra abrigo numa perspectiva de violência institucional que está impressa

no arranjo de certas instituições, como, por exemplo, as coercitivas (ADORNO, 2005;

PINHEIRO, 1997, 2000, LOUBET DEL BAYLE, 1992). Também, considera-se a relevância da

abordagem que analisa a violência policial no contexto das práticas policiais construídas na

relação polícia-sociedade (PORTO, 2007; BRETAS, 1997, MONJARDET, 2003). Essas

abordagens combinadas demonstram a coexistência de instrumentos institucionais criados nas

forças policiais a partir de orientações políticas e práticas culturais socialmente rotinizadas no

âmbito das ações policiais.

Desse modo, num primeiro momento, analisam-se algumas circunstâncias nas quais as

polícias participaram da repressão política no autoritarismo. Num segundo momento, observa os

dilemas das polícias no contexto democrático, onde, certas vezes, o uso legítimo da força para

manutenção da ordem se torna violência desnecessária. Para tal objetivo, destacam-se a Polícia

Militar de São Paulo, Brasil; e, Carabineros, no Chile.

Todavia, a atuação de outras polícias será considerada a título de exemplo. Isso porque

na comparação entre Brasil e Chile, as diferenças nas formas de Estado – respectivamente, um

sendo federativo e outro unitário – demonstra a existência de modelos diferentes na organização

do sistema policial. No Brasil, o sistema policial é pluralista, que conta com polícias nacionais

(Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal) e com polícias estaduais de caráter militar e civil.

Por outro lado, no Chile, o modelo é dualista, o qual conta com duas polícias de caráter nacional,

sendo uma militarizada, os Carabineros, e outra civil, a Policía de Investigaciones – PDI

(FRÜHLING, 2009).

Com este trabalho se faz reflexão para compreender o motivo das persistências da

violência policial na transição dos regimes políticos, em vez de uma descrição quantitativa delas.

A violência é a negação da política, logo estudar os instrumentos de violência e repressão de

uma sociedade é mergulhar no interior da cultura política desta sociedade (CANCELLI,

2001:12). Por isso, defende-se que existem conjecturas políticas na ideia de policiamento que

não podem ser omitidas, assim, a violência oficial jamais é desprovida de sentido. Ela tem o

consentimento, ou pelo menos a omissão, de Estados, de governos, da sociedade. Por causa

disso, as polícias são atores relevantes nas definições das políticas de segurança pública, visto

que lidam com várias formas de violência e repressão.

Este artigo está divido em três seções. A primeira, busca uma compreensão conceitual da

polícia no contexto político. O objetivo é operar uma gramática política da polícia, isto é,

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analisar a relação política e polícia e como isso influência o policiamento. A segunda, analisa a

polícias brasileira e chilena, respectivamente sob os períodos autoritários de 1964-1985 e de

1973-1990. Argumenta-se que a polícia não tinha uma concepção neutra de policiamento,

porque dentro do seu espectro de seletividade passou a funcionar, em certos casos, como polícia

do regime, isso a despeito das suas funções tradicionais de combate à criminalidade. A terceira,

observa as mesmas polícias nos regimes democráticos iniciados ao fim dos anos 1980.

Demonstra-se que os avanços na ordem democrática não implicaram necessariamente mudanças

nas polícias.

A Gramática Política da Polícia

A polícia é entendida como instituição encarregada de possuir e mobilizar os recursos de

forças decisivos, com objetivo de garantir ao poder o domínio (ou a regulação) do emprego da

força nas relações sociais internas (MONJARDET, 2003:27). Ademais, a polícia analisada aqui

é um órgão estatal e público autorizado pela coletividade para regular as relações sociais via a

utilização, se necessário, da força física (SAPORI, 2007:99). Portanto, é uma das representações

do legítimo monopólio do uso da força física buscado pelos Estados modernos, conforme

preceitua Weber (2011).

A polícia é, por natureza, uma instituição política. Na literatura de ciências sociais isso é

evidente em obras de autores, como, por exemplo, Bayley (1971, 1979, 2006); Huggins, (1998);

Loubet del Bayle (1998); Polizcer (1988); Kalmanowiecki (1995); Pinheiro (1982, 1997, 1982);

Reiner (2004); Soares (2000); Skolnick (1972); Zaverucha (2005). Desse modo, no geral,

entende-se que a polícia civil é uma organização social criada e apoiada pelos processos

políticos, para aplicar os conceitos dominantes de ordem pública (SKOLNICK, 1972).

Em decorrência da natureza política da polícia, mudanças na ordem sociopolítica afetam

os modos de policiamento. Inclusive na América Latina as forças policiais têm sido fortemente

politizadas, vulneráveis e ligadas aos regimes políticos (KALMANOWIECKI, 1995: 335).

Diante disso, os regimes políticos, sejam autoritários ou democráticos, impactam nas forças

policiais, mas como isso ocorre depende da intensidade do regime e das características das

instituições policiais.

Basicamente se entende por regime político um conjunto de normas, regras,

procedimentos de formação e funcionamento das instituições de certo Estado (PASQUINO,

2004:14). Ademais, o regime político é um sistema de mediações entre Estado e sociedade civil,

logo quando se fala em regimes autoritários, refere-se a uma determinada pauta de sistemas e

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mediações (GARRETÓN, 1983: 67). No que concerne ao regime, a polícia se configura como

um dos mecanismos de mediação, sendo que nos governos autoritários tem como uma de suas

funções a proteção do regime; nos democráticos, a defesa dos direitos dos cidadãos (BAYLEY,

2001).

A polícia é uma das instituições tradicionalmente responsáveis pelo controle social, pela

mantença da ordem e respeito às leis.4 Por conta disso, o papel dela nos regimes autoritários

seguem a legalidade existente.5 Com efeito, a polícia cumpre suas funções, mesmo nos

momentos e ações de repressão à sociedade civil e, inclusive, na realização de torturas e mortes

de perseguidos políticos.6 Em outras palavras, a polícia não foge às suas funções, ela a executa

cumprindo o que o ordenamento legal impõem, o que os governantes determinam, ou seja, o que

o sistema político em vigor considera como questões de segurança. Isso, por certo, levou à

participação das polícias nas ações cruéis de regimes autoritários.

Nesse sentido, as polícias, em graus e formas distintas, foram instituições importantes de

controle e vigilância dos regimes autoritários da América Latina. Isso porque elas estavam em

contato com os mais variados segmentos da sociedade e terem maior capacidade de identificar os

agitadores, os comunistas, os grevistas, os guerrilheiros. Assim, muitas vezes, as polícias foram

responsáveis por “enquadrar”, “rotular”, “classificar” muitos indivíduos no rol de suspeitos de

“inimigos do regime”. Tais indivíduos foram considerados não só inimigos do regime, mas

criminosos, pois muito do que a polícia toca se converte em crimes e criminosos, e

interpretações alternativas de atos e atores se desvanecem (CHRISTIE, 2011:23). Com efeito,

muitos indivíduos foram detidos, torturados e mortos em nome das políticas de segurança

nacional. Por certo, partes das polícias latino-americanas contribuíram para essa forma de

violência oficial legalizada7.

Com o esfacelamento dos governos autoritários nos anos 1980 e 1990 e com a transição

para os regimes democráticos, as doutrinas do controle social passam por ajustes na América

Latina. Valores de respeito aos direitos individuais e a integridade da pessoa humana foram

impressos nas novas cartas constitucionais. Por conta disso, as instituições de justiça criminal

4 Conforme Becker (2008) as polícias podem ser vistas como impositores de regras, são os agentes que verificam a aplicabilidade

de regras morais, sem questionar o seu conteúdo. 5 Para uma visão sobre a questão dos regimes militares avocarem a legalidade para se legitimar vide: Ditadura e Repressão: o autoritarismo e o Estado de direito no Brasil, Chile e Argentina (2010), de Anthony Pereira. 6 Para revisão sobre a atuação da polícia no regime militar brasileiro, vide: Operários da Violência: policiais torturadores e assassinos reconstroem as atrocidades brasileiras (2006), de Martha K. Huggins, Mika Haritos-Fatouros e Philipe G. Zimbardo. 7 Vide a obra: “Operários da Violência: policiais torturadores e assassinos reconstroem as atrocidades brasileiras”, de Martha K.

Huggins, Mika Haritos-Fatouros, Philip G. Zimbardo (2006), Ed. UnB. Nela os autores através de pesquisa e relatos de policiais envolvidos na estrutura de repressão do governo militar. É possível ver a dimensão em que as polícias brasileiras se envolveram no autoritarismo, seguindo valores da lei e da ordem.

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(polícias, Ministério Público, tribunais judiciais, sistemas penitenciários) devem se legitimar

segundo preceitos de um Estado de direito democrático. Para tanto, a lei deve ser balizada como

elemento universal de relacionamento entre Estado e sociedade civil, e isso deve perseguir os

valores democráticos, sobretudo os das decisões públicas serem amplamente submetidas ao crivo

popular. Do mesmo modo, a ordem pública não deve ser imposta pela exclusiva vontade de uma

minoria, mas construída numa relação que considere diversos atores e interesses. Nesse ponto,

até temas anteriormente excluídos do debate público passam por transformações, é caso, por

exemplo, da segurança.

No regime democrático o Estado de direito democrático se fortalece e legitima na

proporção em que reconhece as garantias individuais e os direitos humanos. Nesse contexto, as

polícias são instituições fundamentais, haja vista serem responsáveis pela manutenção da ordem

e respeitos às leis. Ressalta-se o que a polícia faz pode afetar profundamente a vida dos cidadãos,

sobretudo no que se refere ao poder de prender e ao uso da força física (BAYLEY, 2005:17-18).

Nesse quesito, sob a democracia, a relação da polícia não pode ser mais de exclusiva

representante de governos, mas ser uma instituição responsável pelas demandas de segurança da

sociedade. Assim, por exemplo, cabe às polícias democráticas proteger os direitos humanos,

especialmente aqueles que são necessários para o exercício pleno das atividades políticas, os

quais são a marca da democracia (BAYLEY, 2001:11).

No entanto, nos regimes democráticos do Brasil e do Chile, não raras vezes, as polícias

agem de forma violenta, prendem arbitrariamente, praticam torturas, arrancam confissões à força

de suspeitos, executam criminosos extrajudicialmente, enfim passam por cima de direitos

fundamentais da pessoa humana seguindo as doutrinas de “lei e ordem”. Tais ações operadas em

regimes autoritários são vistas como parte do “ofício policial”, mas num Estado de direito

democrático elas são excessos do poder da polícia.

A violência policial na democracia é um contrassenso, sobretudo quando é endereçada às

camadas sociais menos favorecidas e alijadas de direitos fundamentais. Porém, é isso o que

acontece em muitos casos nos quais o uso legítimo da força física para o enfrentamento da

criminalidade e, até mesmo, em situações cotidianas de contenção de manifestações civis nas

ruas, torna-se ações de violência. Isso é uma forma de violência oficial tolerada, embora as

autoridades públicas teimem em reconhecer. A violência, nesses casos, não é mais usada como

política de contenção de movimentos contra governos, como foi nos períodos autoritários. Ela

não chega a ser uma política de governo, mas é uma prática persistente nas corporações

policiais.

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Alguns eventos recentes na América Latina demonstram a violência policial funcionando

como mecanismo de segurança e policiamento, mesmo com a conquista do Estado de direito

democrático no Brasil e no Chile nos últimos anos.

O primeiro deles ocorreu em janeiro de 2012, envolvendo a Polícia Militar de São Paulo

numa operação de desocupação na área de Pinheirinho, em São José dos Campos, estado de São

Paulo. A ação policial que foi montada para cumprir a determinação judicial assumiu aspectos

bélicos e cenas de guerras tomaram as ruas da região. Cerca de 2 mil policiais, helicópteros e

carros blindados foram destacados para desocupação da área em litígio judicial.8 O confronto

entre policiais e civis foi inevitável, sendo que a ação truculenta e militarizada da polícia foi

usada para retirar idosos, mulheres, crianças, trabalhadores de suas casas.9 Mas essa ação de

violência não foi um fato isolado, pois a Polícia Militar de São Paulo é conhecida pelo uso

abusivo da força, tanto que ela foi responsável por um a cada cinco assassinatos na cidade de

São Paulo, em 2011.10

O segundo evento envolveu os Carabineros do Chile no controle das manifestações civis

que tomaram algumas cidades do Chile, principalmente a capital Santiago, em meados de 2011 e

início de 2012. Milhares de estudantes, professores e trabalhadores protestaram contra as

disparidades do sistema educacional. As manifestações foram pacíficas, mas a dimensão que

assumiram nas ruas levou ao confronto com a força policial Carabineros. O objetivo da ação

policial era manter a ordem, mas, na verdade serviu para sufocar os movimentos

reivindicatórios. Os protestos civis ficaram tão intensos que o governo chileno invocou a “Ley

de Seguridad del Estado” com a finalidade de penalizar lideranças promotoras das marchas e

manifestações contra governo. A referida lei foi criada no governo de Augusto Pinochet (1973-

1990) para garantir a ordem do regime autoritário, que pode ter deixado mais de 40 mil vítimas

entre torturados, desaparecidos e mortos. 11

Assim, nota-se que no contexto do regime político democrático, muitas vezes na prática

as polícias agem de forma contrária aos preceitos democráticos, de maneira aética, atécnica, o

que se configura em práticas policialescas (ZAVERUCHA, 2003:30). Como explicar a

ocorrência de tais práticas? São meros desvios? São práticas institucionalizadas? Afinal, porque

elas persistem?

8 PM e moradores voltam a entrar em conflito após reintegração. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/pais/pm-moradores-

voltam-entrar-em-conflito-apos-reintegracao-3733561> Acessado em 19/04/2012. 9 Resistir e lutar: somos todos Pinheirinhos. Disponível em: <http://www.vermelho.org.br/editorial.php?id_editorial=1028&id_secao=16> Acessado em 19/04/2012. 10 “Um em cada 5 mortos em São Paulo é vítima de PM”. Folha de São Paulo, 27/01/2012. 11 Chile deve elevar número de vítimas da ditadura. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/internacional/chile-deve-elevar-numero-de-vitimas-da-ditadura/> Acessado em: 15/04/2012.

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A herança autoritária e a experiência de governos opressores na América Latina, decerto,

ajudam a explicar o caso de países que passaram por períodos de repressão política, porém são

insubsistentes em países com amplo histórico de liberdade política. É intrigante, mas em 2001, o

condado de Los Angeles, nos Estados Unidos, foi obrigado pela Justiça a pagar

aproximadamente sete milhões de dólares em indenizações as pessoas que foram vítimas de

violência policial (LEMGRUBER).12

Portanto, explicações que se concentram na tese de um

espólio maldito deixado por regimes autoritários incorrem o risco de serem reducionistas.

A relação polícia e política é bem mais complexa do que as expressões isoladas de

regime político autoritário ou democrático podem apreender. Assim, é oportuno estudar essa

relação em regimes políticos, Estados, sistemas políticos, polícias e sociedades diversos13

. Isso,

por um lado, ajuda a observar como o processo político influencia a questão do policiamento. De

outro lado, contribui para desvendar que as polícias têm certa autonomia, isto é, que não são

totalmente instrumentalizadas por governos e elites políticas ou apenas apêndices de outras

instituições, como, por exemplo, das Forças Armadas (FFAA).

É preciso ampliar o horizonte de análise sobre o papel das polícias na política, para tanto

a reflexão sobre “como elas são organizadas, como são controladas, como se comportam” tem

mais a dizer do que as mudanças políticas (BAYLEY, 1971: 92). Ademais, qualquer conjunto de

hipóteses, qualquer teoria, que comece e termine dentro de um regime é necessariamente

incompleta e talvez não se aplique, ou tenha uma aplicação mais modesta, em regimes diferentes

ou em mudanças e transições. Trabalhar com dados limitados a um regime impede conhecer a

influência do próprio nome dentro do qual se trabalha (SOARES, 2005).14

Para entender o papel da polícia, destarte, é preciso analisar para além do regime político.

Isso implica dizer que regimes políticos democráticos podem ter hibridamente polícias

autoritárias, pois as instituições são afetadas por fatores diversos, bem como podem desenvolver

conceitos e valores próprios de atuação. No entanto, se os regimes políticos per se não explicam

a instituição policial, o contrário pode ser verdadeiro, porque a forma como a polícia age tem

muito a dizer sobre a validade de um regime político. Na verdade, a polícia pode ser um

excelente exemplo da profundidade de certo regime político (POLICZER,1998).

12 LEMGRUBER, Julita. Quando a polícia mata...em Los Angeles. Disponível em: <http://www.carceraria.org.br/fotos/fotos/admin/Sistema%20Penal/Seguranca_Publica/Violencia_Policial_Los_Angeles.pdf>.

Acessado em: 14/04/2012. 13 Este trabalho faz parte de pesquisas realizada no doutoramento em Ciências Sociais na CEPPAC/UNB. As pesquisas ainda

estão em andamento, logo os resultados discutidos são preliminares. 14

SOARES (2005). Nesse trabalho o autor faz correlação do regime político com a violência, na proporção que “transformar os

regimes em variáveis, o que permite visualizar o seu efeito sobre o crime, a violência e o homicídio”.

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Com essas considerações, tem-se que para se chegar ao papel da polícia na política é

preciso compreender qual é a sua função na comunidade, o seu lugar na organização do Estado e

a sua postura frente ao regime político. Assim, a violência policial significar mais do que uma

prática tradicional, pois se configura numa questão política. A função policial basicamente

consiste em assegurar a regulação interna de uma sociedade global e o respeito a certo número

de regras, as quais a regem por um recurso eventual de intervenções coercitivas que implicam o

emprego da força (LOUBET DEL BAYLE, 1998:10). Como essa função é modulada depende

de decisões políticas, as quais têm muito a dizer sobre as formas de policiamento e as políticas

de segurança.

As Polícias dos Regimes Autoritários

As pesquisas nas ciências sociais sobre o período autoritário na América Latina, em

grande parte, concentram-se no papel das instituições dos Militares. Trabalhos como “Os

Militares na Política (1975)” e “Os Militares: da Abertura à Nova República (1986)”, de Alfred

Stepan; “Los Militares en la Política Chilena”, de Liisa North (1975) desvendam a atuação das

Forças Armadas nos regimes autoritários, bem como as implicações disso na formação dos

regimes democráticos. A relevância dos estudos sobre os integrantes das FFAA decorre do fato

de eles terem tomado a frente dos regimes ditatoriais.

O militarismo irrompe com força na América Latina por meio de fórmulas que vão do

caudilhismo até os golpes autoritários e ditaduras dos anos 1960 e 1970 com a finalidade de

proteger interesses particulares ou de grupos (SAINT-PIERRE, 2007). Por conta disso, na

América Latina, historicamente, os Militares foram identificados como conversadores e aceitos

pelas elites, o que possibilitou que eles se tornassem proeminentes no cenário político. Com

efeito, nos golpes políticos dos anos 1960 e 1970, os Militares tiveram por intuito a preservação

da ordem, a supressão da via política, a “higienização” do sistema sociopolítico das ideias

comunistas e a vinculação dos Estados aos interesses capitalistas15

.

Nada obstante, nos regimes autoritários latino-americanos as polícias também tiveram

participação acentuada, a qual pode dizer muito a respeito delas próprias, não apenas dos

regimes políticos. No caso do Brasil, as polícias militares se constituíram em estruturas de

reserva das FFAA, e as polícias civis foram importantes no procedimento de investigação dos

supostos “inimigos do regime”. Particularmente, no tocante à Polícia Militar brasileira até o

15 Vide: ROUQUIÉ, Alain. O Estado Militar na América Latina. Tradução: Leda Rita Cintra Ferraz. São Paulo : Ed. Alfa-Omega, 1984.

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momento do regime ela se encarregava de uma reduzida série de operações relacionadas com a

repressão de distúrbios civis e manutenção da ordem. Depois do golpe de 1967, foi designado a

ela responsabilidade de “levar a cabo, vestindo o uniforme, atividades policiais ostensíveis, que

serão planejadas por autoridades policiais competentes com o fim de garantir o cumprimento da

lei, a manutenção da ordem pública e o Exército terá a faculdade de constituí-las”

(ZAVERUCHA, 2008:133).

No Chile, a principal força policial, os Carabineros, compunha a estrutura do governo

militar. Sob o regime militar, a partir de 1974 as polícias passaram a depender do Ministério da

Defesa, sendo que a instituição que melhor aproveitou o novo regime para aumentar suas

atribuições foram os Carabineros. Eles entraram na área investigativa e se fizeram presente no

regime político incrementando sua autonomia institucional (FRÜHLING, 2009).

Disso resulta que no período de repressão política acirrada do Brasil e do Chile as

polícias foram atores ativos na contenção dos movimentos anti-regime, no controle de motins, na

perseguição de suspeitos, enfim, elas contribuíram para sustentação aos regimes autoritários.

Ademais, as forças policiais locais poderiam ser transformadas em um “sistema de alerta

precoce” para a detecção – e subsequente eliminação – de movimentos políticos de esquerda,

antes que eles explodissem em rebelião armada (MAECHILING 1988 apud HUGGINS,

1998:123).

Os governos militares do Brasil e do Chile utilizaram a função policial para conter as

demandas por mudanças políticas. Em graus variados de atuação, as polícias tiveram

participação no desenho dos regimes autoritários. No Brasil, a participação das polícias foi

subsidiária, pois elas serviam como expansão das ações militares e não foi uma orientação para o

conjunto das polícias. Foram desenvolvidas dentro da estrutura policial divisões próprias para

defender os interesses do governo autoritário. No Chile, diferentemente das polícias brasileiras,

as polícias, sobretudo os Carabineros, estabeleceram intensos mecanismos de vigilância nas ruas

em prol dos interesses do regime autoritário. Isso foi possível porque a polícia Carabineros é

instituição historicamente militarizada (PRIETO, 1990). Dessa forma, as polícias são definidas

como estruturas do regime, isto é, um braço armado do governo para atuar na sociedade civil.

No Brasil, entre as divisões que foram criadas para lidar com a repressão, destacam-se os

Departamentos de Ordem Política e Social (DOPS), que contavam com delegados e policiais

treinados para identificar, incriminar e “fichar” supostos indivíduos contrários ao regime. Ainda,

existiam outras estruturas do regime militar com presença das polícias, como, por exemplo, o

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Destacamento de Operações e Informações (DOI), junta com Centro de Operações de Defesa

Interna (CODI), os quais eram organizações responsáveis pela inteligência e repressão política

do governo. Essas estruturas ficaram mais conhecidas com a sigla “DOI-CODI” e reuniam

militares das três Armas, policiais militares estaduais, polícia civil e federal, tudo sob um mesmo

comando (MAECHILING 1988 apud HUGGINS, 1998).

Por sua vez, no Chile, os Carabineros assumiram intensamente a função de polícia do

regime, sendo inclusive instituição com capacidade participativa nas decisões do governo

autoritário, como membro da Junta do Governo ou Junta Militar (os Comandantes Chefes do

Exército, da Força Aérea, da Armada, e Geral Diretor de Carabineros). Através da Direção de

Comunicações de Carabineros (DICOMCAR), por exemplo, atuou na identificação dos

oposicionistas do regime. Essa direção criada em 1981 e tinha a responsabilidade de liderar

ataques contra insurgentes durante o período marcado pelo crescimento da resistência aberta ao

regime (ANTUNES, 2008).

Por causa disso, argumenta-se que concomitante ao Estado Militar se formou no

cotidiano da repressão política um Estado policialesco – em razão dos graus elevados de

liberdade das agências de repressão – que com constante controle policial foi fundamental no

estabelecimento dos Estados burocrático-autoritários presentes no Brasil e no Chile.

Os regimes militares concederam maiores poderes e tarefas institucionais às polícias com

a finalidade de que elas pudessem atuar repressivamente. Isso comprova a tese de que o local da

organização militar no regime político é um parâmetro importante na forma de policiamento e

organização da polícia, especialmente na extensão do envolvimento da polícia na política

(KALMANOWIECKI, 1995:20).

O papel das polícias nos regimes autoritários do Brasil e do Chile foi se posicionar como

instrumento apolítico, cujo objetivo era manter a ordem pública, utilizando-se da força física

caso necessário. A finalidade precípua das polícias é o combate ao crime comum, trata-se,

portanto, de uma polícia dos tipos ostensiva e criminal. Essas são as funções básicas das polícias

modernas. Isso não foi alterado com os regimes autoritários, o que mudou significativamente foi

parte do conteúdo dos alvos das polícias. Com os governos autoritários, muitos indivíduos foram

considerados não apenas manifestantes contra regime, mas criminosos. Lidar com criminosos é

tarefa da polícia, não necessariamente das FFAA. A polícia, portanto, continuou a lidar com

criminosos, mas o adjetivo criminoso passou abarcar dissidentes políticos, comunistas,

estudantes, grevistas. A polícia concedia um “ar de profissionalismo” e “neutralidade”, assim as

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perseguições aos “criminosos políticos” podam não representavam ações do regime, porém parte

da rotineira ação policial de lidar com o crime.

Desse modo, o subproduto significativo dessas mudanças foi neutralizar as conexões

entre a polícia e o poder organizado, tornando esses vínculos menos visíveis (HUGGINS,

1998:13). Com efeito, muitos dissidentes políticos foram considerados criminosos comuns e as

manifestações contra os regimes autoritários foram representadas como ações criminosas.

Repreender e deter tais indivíduos se tornou mero trabalho de manutenção da ordem e contenção

do crime. Com isso, o criou-se a ilusão de que certas ações policiais não decorriam dos

interesses do regime autoritário.

Nota-se que “quando uma polícia independentemente... luta contra multidão, ... o

antagonismo volta-se para a polícia, não contra a estrutura de poder” (CAIN, 1979 apud

HUGGINS, 1998:14). Logo, entrelaçar as instituições policiais em uma burocracia civil

complicada – colocando a polícia civil entre o Estado e as FFAA de um lado, e o povo do outro

– torna muito menos óbvia a repressão estatal como instrumento de proteção de prerrogativas de

classe e do próprio Estado (HUGGINS, 1998:14). Decerto, a polícia repressiva é símbolo de

governo autoritário, contudo, devido a mimetizações de combate ao crime, as ações polícias

contra dissidentes políticos estavam justificadas pela necessidade da imposição da ordem e

respeito às leis. Elas eram, portanto, “coisas de polícia”.

Assim, a atuação das polícias no regime político autoritário não é de fácil constatação,

visto que ela se confunde com a própria função do trabalho policial. Talvez por isso as polícias

não tenham merecido tanta atenção quando se analisa os períodos autoritários na América

Latina. Todavia, no Brasil o Golpe de 1964 implantou uma polícia política bastante complexa no

país – que mesclava polícia civil, polícia militar, militares das três forças e até mesmo bombeiros

e polícia feminina – e foi responsável pelos principais episódios de tortura e extermínio.

Representou a vitória completa da antiga "força autônoma". As turmas de busca e interrogatório

faziam o trabalho sujo que a "utopia autoritária" pressupunha (FICO, 2008:123).

No Chile, junto aos Carabineros criou o “Servicio de Inteligencia de Carabineros”

(SICAR), em substituição à Comisión Civil de Carabineros. Já em 1974 esse serviço seria

substituído pela “Dirección de Inteligencia de Carabineros” (DICAR), mas várias de suas

funções desenvolvidas no interior do país permaneceriam funcionando sob a chancela do

SICAR, dificultando a delimitação temporal de atuação desse órgão (ANTUNES, 2008).

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O que observou na prática foi que regime militar empoderou as polícias brasileiras e

chilenas. Isso foi feito a partir de instrumentos legais que permitiam maior capacidade de

policiar e prender. Portanto, nota-se que durante os regimes autoritários da América Latina a

ubíqua presença dos militares na política afetou a forma e o estilo de policiamento adotado

(KALMANOWIECKI, 1995:21). Esse fato, como será visto no próximo tópico, ainda persiste.

Couberam às polícias no regime autoritário participar de um processo de “limpeza”, que

se espalhou pelas ruas, onde batidas policiais e militares eram feitas com frequência. Ocorreram

buscas, detenções e prisões em massa. No Brasil no final da primeira semana após o golpe

militar de 1964, mais de 7 mil pessoas haviam sido detidas (BACK, 1977 apud HUGGINS,

HARITOS-FATOUROS & ZIMBARDO, 2006:139). No Chile, durante o processo de

contestação civil contra o governo autoritário, entre 1983 e 1984, o número de detidos foi de

mais de 5 mil pessoas (HUNEEUS, 1986: 112). Essas foram vistas como ações rotineiras do

trabalho policial.

No regime autoritário a violência policial estava justificativa nos interesses das políticas

de defesa nacional. É o que se pode chamar de violência oficial legalizada. Era necessário usar a

força para deter os “inimigos internos”, o que muitas vezes levava a excessos. A tortura contra

os dissidentes políticos começou de forma restrita aos centros de inteligência militar, mas depois

praticamente se institucionalizou no âmbito dos órgãos de segurança, como, por exemplo, nas

polícias (HUGGINS, 1998).

No Brasil na década de 1970, não só houve um aumento notável da tortura e do

assassinato pelas forças de segurança, mas ainda essa violência tornou-se plenamente

institucionalizada como política de governo (HUGGINS, HARITOS-FATOUROS &

ZIMBARDO, 2006:1159-60). Por sua vez no Chile, os Carabineros se tornou a principal força

responsável pela vigilância dos locais de detenção e tortura sob responsabilidade da DINA, além

de realizar detenções, interrogatórios e torturas. Mesmo os policiais Carabineros que não

trabalhavam vinculados à DINA, a ela disponibilizavam todas as pessoas que haviam detido por

razões políticas. Essa comunicação seria realizada através da Central de Radiopatrullas de

Carabineros, que mantinha uma frequência de rádio secreta com a DINA. Dessa forma, não

havia nenhum registro formal de que a pessoa teria sido presa e muito menos que teria sido

transferida para as mãos da DINA (ANTUNES, 2008).

Com essas constatações sobre os períodos de autoritarismo do Brasil e do Chile, observa-

se que as polícias eram forças do regime. Elas atuavam ora como polícia de ordem ora como

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polícia criminal, segundo a tipologia de Monjardet (2003). Nesta mescla, o que era função de

polícia praticamente sumia nos interesses do governo autoritário. Ressaltava-se o critério de

ordem, o que significa uma polícia de soberania, cujo intuito é ser um braço armado do Estado

na ordem interna. Nessa função as polícias, sobremodo, as militares, eram, por exemplo,

encarregadas de dominar as manifestações nos espaços públicos. Foi justamente assim que as

polícias militares brasileiras e chilenas atuaram contra passeatas civis, manifestações estudantis

pró-democratização.

Por sua vez, quando as polícias exerciam o critério criminal, muitas vezes ele era

distorcido em benefício do regime autoritário. Por policial criminal entende-se aquela que

instrumentaliza a força e os meios de ação não contratuais para reprimir os segmentos da

sociedade que recusam a lei (MONJARDET, 2003:282). Conforme Monjardet (2003): essa

polícia reintegra a sociedade no sentido em que exprime o fato de que esta “designa” em seu seio

esta ou aquela categoria de atores ou de comportamentos como alvo, o que é objetivo dos

códigos penais. Com esse instrumento, os governos autoritários do Brasil e do Chile

conseguiram criminalizar os dissidentes políticos, segundo parâmetros técnicos e legais.

Diante disso, quando se aplica ao caso das polícias brasileiras e chilenas nos períodos

autoritários as dimensões – como são organizadas, como são controladas, como se comportam –

, observa-se que o regime político não necessariamente mudou as polícias, mas reforçou uma

tradição histórica. Vale refletir se as polícias brasileiras e chilenas tinham papéis diversos ou

atuavam diferentemente antes do regime autoritário-militar. Num questionamento simples: a

polícia, em algum momento da História, atuou em prol das populações mais carentes com o

objetivo de garantir-lhes o mínimo dos seus direitos de cidadania? (PEDROSO, 2005).

Ao analisar as contextualidades históricas, culturais, políticas e sociais da formação do

Estado brasileiro, nota-se que as polícias foram formatadas no conjunto de pensamentos e

práticas autoritárias das elites políticas. Tem-se que a mentalidade autoritária no Brasil teve

como pressupostos básicos o modelo jurídico, o poder centralizado e elitizado e a organização

das forças policiais que se incumbiram de perseguir as camadas sociais desprivilegiadas. Ordem

pública e segurança interna encontram-se na raiz da construção da ideologia de Estado

(PEDROSO, 2005:49).

No Chile o processo de formação das polícias não foi diferente. Os traços da cultura

autoritária formaram polícias semelhantes às forças militares. Com isso, no país se estruturou um

aparato policial centralizado e militarizado, a imagem e semelhança das FFAA, similar a países

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como Espanha e Itália, que possuem uma larga tradição latifundiária e de instituições políticas

tradicionais (PRIETO, 1990).

O comportamento das polícias sob os regimes autoritários, portanto, seguiu sua trajetória

de histórica de tipificar criminosos dentro de um espectro de preconceitos definidos por ordens

políticas. Afinal, governos autoritários têm consistentemente subvertido a polícia para propósitos

de contenção das profundas transformações social e política (HINTON, 2005:94).

A gramática política das polícias nos regimes militares do Brasil e do Chile reforçou

falas autoritárias praticadas desde a gênese de suas polícias. A violência policial nos regimes

autoritários foi mais outra faceta das inúmeras violências oficiais dos aparatos de coerção contra

segmentos sociais marginalizados. O problema é que muitos indivíduos rotulados de criminosos

nas Ditaduras Militares geralmente não pertenciam às classes subalternas, o que incomodou as

elites fora do poder. A partir daí as ações violentas das polícias passaram a ser relacionadas a

intenções políticas.

Em suma, ao pensar o papel das polícias brasileiras e chilenas nos regimes autoritários,

tem-se que o autoritarismo não criou novas polícias repressivas, não transformou polícias

comunitárias em braços armados do governo. O que ele fez foi intensificar o que já era feito: o

controle da ordem social pela força policial num contexto de assimetrias sociais, preconceitos e

discriminações.

As Polícias nos Regimes Democráticos

Nos regimes democráticos latino-americanos um dos principais paradoxos das transições,

decisivo na consolidação democrática, é a sobrevivência de práticas autoritárias. Em tese as

transições representam oportunidades para mudanças e rupturas que permitam a emergência (ou

retomada) de padrões de relacionamento e de controle, mas condizente com a democracia

(CARDIA, 1999: 10). Nesse paradoxo se destacam o papel das polícias, pois, em vez de se

amoldarem às demandas por novos direitos, como, por exemplo, os direitos humanos, elas

passaram rechaçá-los.

No Brasil, as polícias despontaram como objeto de pesquisa, em virtude do problema de

conciliar soluções para o aumento da violência criminosa em meio a instituições de segurança

sucateadas, pouco eficazes, corruptas e violentas.16

Por isso, dois temas têm recebido bastante

destaque: uma redução nos índices de criminalidade e a necessidade de reformas nas instituições

16 Para análise das polícias brasileira no regime democrático, vide o relatório do Núcleo de Estudos da Violência – USP,

“Continuidade Autoritária e Construção da Democracia” (1999).

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policiais, quem permitam uma maior adequação ao contexto sociopolítico dos regimes

democráticos (COSTA, 2004: 47).

No Chile, os estudos sobre criminalidade não focam as polícias, pois há um importante

grau de conformidade com a estrutura do sistema policial chileno. As polícias, portanto, são

vistas como capazes de controlar a delinquência, logo quando se fala sobre as polícias os temas

mencionam quase exclusivamente recursos e atribuições (FRÜHLING, 2009). Todavia, observa-

se a contradição, pois o Chile é um dos poucos países democráticos onde as denúncias por

violência policial se processam através de tribunais militares (ÁLVARES & FUENTES, 2005).

Nada obstante, as situações nacionais sejam distintas, existe consciência da necessidade

imperiosa de reestruturar as forças policiais (FRÜHLING, 2009: 84). Nota-se que as instituições

policiais entraram na cena democrática com as mesmas vestes de tempos passados. A elas não

foi permitido uma transição lenta, gradual e segura, pois caíram num contexto de criminalidade

crescente, acirrados problemas sociais, econômicos, políticos, e, ainda, uma sociedade mais

exigente. O ideal democrático não foi formalmente apresentado às polícias. Ele foi empurrado

sem se importar com ajustes necessários. O resultado disso são polícias carentes de identidade

no novo ordenamento democrático, as quais não conta mais com a segurança do militarismo,

tampouco têm condições de se transformar numa instituição cidadã.

Com efeito, a transição democrática não representou modificações significativas nas

instituições policiais no Brasil e do Chile, tanto que se pode afirmar, segundo Pinheiro (2000):

“O retorno ao constitucionalismo democrático pouco fez para erradicar as

práticas autoritárias presentes no Estado e na sociedade. Apesar do da proteção constitucional, a violência ilegal continua. Governos falharam em controlar o

abuso de poder e em lutar contra a impunidade. Como resultado do fracasso nas

democracias na América Latina em refrear a polícia como a imposição de maiores controles civis, um dos sinais mais visíveis é a ocorrência de práticas

abusivas frequentes contra suspeitos e prisioneiros”

Em consequência desse dilema se questiona: como sistemas policiais constituídos numa

longa tradição autoritária, a qual foi intensificada pelos regimes militares, inserem-se no

contexto democrático?

A referida pergunta lança dúvidas sobre a influência do regime político na formatação

das instituições, em especial as polícias. Já foi visto que o sistema policial tem relação umbilical

com o sistema político, embora não possa se desprezar a já citada autonomia das polícias, em

virtude de seus conhecimentos e saberes. Assim, mudanças de regime político afetam o sistema

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policial, porém em que medida, como e quando isso se dá também depende de transformações

profundas no Estado ou sistema político, bem como nas instituições policiais.

A violência policial, por exemplo, constitui-se num traço de polícias autoritárias

(BAYLEY, 2001). Nada obstante, observa-se que no Brasil esse tipo de violência é um

acontecimento relativamente raro no universo das interações entre policiais e não-policiais. Mas

é um tipo de violência que afeta um grande número de pessoas. Pesquisa de vitimização

realizada pelo CPDOCFGV/Iser mostra que entre agosto de 1995 e agosto de 1996, na Região

Metropolitana do Rio de Janeiro, 5,3% da população foram desrespeitados, 2,3% foram

ameaçados e 1,1% foi agredido fisicamente por policiais. Isso significa que num período de um

ano, pelo menos 835.454 pessoas sofreram algum tipo de violência policial (MESQUITA 1999).

No Chile a violência policial não pode ser dissociada de outras violências, isso porque a

violência neste país provém quase sempre do Estado e dos setores dominantes. Assim, a

violência policial está ligada a repressão política. Mesmo sob o regime democrático a polícia

tem usado excessiva violência para repremir manifestações, tomadas de locais públicos, greves e

outras ações consideradas ilegais (VERGARA-ESTÉVEZ, 1990). Além disso, entre 1990 e 2004

os Carabineros responderam por mais de 6 mil casos de violências desnecessárias e abusos

(ÁLVARES & FUENTES, 2005).

Dados da Human Rights Watch (2009)17

dão indícios da dimensão da violência letal de

algumas polícias brasileiras. Por exemplo, entre o período de 1 de abril de 2004 a 31 de março

de 2009, uma análise comparativa entre os dados estatísticos da violência policial na África do

Sul e nos Estados Unidos, revela o quão desproporcional são as mortes por policiais no Rio de

Janeiro e em São Paulo, mesmo quando comparados a outros lugares violentos. Durante os

últimos cinco anos, houve mais mortes em supostos episódios de “resistência seguida de morte”

no estado de São Paulo (2.176 mortes) do que mortes cometidas pela polícia em toda a África do

Sul (1.623), um país com taxa de homicídio muito superior a São Paulo.

Ainda segundo dados da Human Rights Watch (2012)18

para o Chile, desde 2002 a

polícia tem sido responsável pela morte de pelo menos três mapuches (maior grupo indígena do

Chile). A violência policial contra a população Mapuche é uma das mais graves e impunes, já

que se ampara numa discriminação histórica que tem sofrido essa população originária, além de

17 Human Rights Watch (2009). Police Violence and Public Security in Rio de Janeiro and São Paulo. Disponível em:

< http://www.hrw.org/sites/default/files/reports/brazil1209web.pdf> Acessado em: 14/04/2012. 18 Human Rights Watch (2012). Informe Mundial. Disponível em: < http://www.hrw.org/sites/default/files/related_material/wr2012spwebwcover-1.pdf> Acessado em: 14/04/2012.

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uma permissão política governamental, a qual ao mesmo tempo em que criminaliza as demandas

Mapuche, tolera e justifica a ação policial em torno dessas comunidades19

.

Quando se analisa a violência policial no contexto do regime democrático, ela pode

representar persistências de tradições autoritárias, cujas mudanças do sistema político não foram

capazes de suplantar. Este legado autoritário, por exemplo, encontra suporte nas legislações

sobre as polícias, visto que em termos político-institucionais, quase não ocorreram mudanças

substanciais. Mas esse legado convive com outros – e também se transforma através dos tempos.

Portanto, não há como só atribuir práticas do presente a não-superação do passado. Durante

várias décadas de história republicana, a violência, com destaque a violência oficial, afetou

sobretudo os grupos sociais mais desprovidos de recursos, como os pobres e afrodescendentes

(PINHEIRO, 2003:32).

Com efeito, a despeito das mudanças de regime, as polícias brasileiras ainda não

reformaram suas práticas violentas. Segundo Zaverucha (2005; 2008), Pinheiro (1991; 1998;

1999; 2003) as instituições de segurança pública brasileira ainda ostentam ainda fortes laços

legais herdados da estrutura do regime autoritário. Ou seja, apesar do controle civil sobre as

polícias militares, a concepção militarizada da segurança pública, formulada pelos governos

militares depois de 1967, foi confirmada na Constituição de 1988, que manteve intocada a

organização policial, por meio do TÍTULO V, CAPÍTULO III, Da Segurança Pública, artigo

144, um dos textos mais flagrantes da grande insensibilidade para a necessidade de

desmilitarizar o aparelho do Estado depois da ditadura com condição de plena formalidade da

democracia (PINHEIRO, 1999:56).

No Chile, o governo autoritário estabeleceu arranjos institucionais que limitaram a

transição política em diversos aspectos. Por isso, um constante esforço governamental desde o

começo da transição foi tentado para incrementar as atribuições das autoridades

democraticamente eleitas com respeito às polícias, em principal os Carabineros. A Lei Orgânica

Constitucional de Carabineros do Chile, publicada no Diário Oficial quatro dias antes de se

iniciar o regime democrático, concedia amplas atribuições ao Geral Diretor de Carabineros para

estabelecer os serviços policiais que julgara necessários (FRÜHLING, 2004). Em consequência

disso, atos de violência policial cometidos pelos Carabineros ainda se processam através de

tribunais militares, mesmo com as instituições policiais não integrando o Ministério da Defesa.

19 “ALTO AHÍ! – Basta de Violencia Policial, ibidem.

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Com o processo de democratização dos anos 1980 e 1990, esperava-se que as polícias

brasileiras e chilenas mudassem suas formas de atuação junto à sociedade. Todavia, o que se

observa é certos traços de repressão política persistem, sobretudo no aspecto institucional e

organizacional. Nota-se, por exemplo, uma falta de accountability, a qual se evidencia no

predomínio repressivo das políticas de segurança pública, na visão militarista de enfrentamento

do crime, ou ainda, nas limitados reconhecimentos de violência policial, detenções arbitrárias,

torturas, execuções extrajudiciais.

Assim, o projeto Barômetro das Américas, em 2009, realizou pesquisa para medir o

abuso policial. A pergunta utilizada foi: “nos últimos doze meses algum policial lhe maltratou

verbalmente ou fisicamente? Quantas vezes?” As respostas mostram a persistência da violência

policial em diversos países da América Latina, sendo que no Brasil, 6,3% afirmou ter sofrido

abuso policial, e no Chile, 3,7%. 20

No geral, as polícias brasileiras são identificadas por terem um déficit de eficiência e um

superávit em violências indevidas (OLIVEIRA, 2007)21

. Com isso, observa-se um misto de

baixa eficiência no trabalho policial e desconfiança por parte da população. Portanto, entre as

instituições brasileiras, a polícia é uma das que a sociedade menos confia. Dados coletados pelo

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em 2010, para compor o Sistema de

Indicadores de Percepção Social (Sips) sobre Segurança Pública, evidenciam que a polícia

brasileira não tem boa imagem junto aos cidadãos. É lamentável, mas em nenhuma região do

País mais que 6% da população diz confiar muito no trabalho policial. Além dessa desconfiança

por parte dos cidadãos, destaca-se outro agravante: a baixa eficiência do trabalho policial.

Analisando apenas o crime de homicídio – que tem maior repercussão e mobiliza maiores

esforços das polícias – o número de casos solucionados é irrisório. Em média, 5% a 10% dos

homicídios são esclarecidos pelas polícias brasileiras. Tais cifras ficam piores quando se cogita

outros tipos de crimes de menor impacto junto à opinião pública (ROCHA, 2012).

No Chile a situação é distinta, pois suas polícias são avaliadas positivamente em termos

de não serem corruptas e gozarem de respaldo público. A polícia uniformizada do Chile, os

Carabineros, é uma das menos corruptas da América Latina, a sociedade manifesta altos níveis

de confiança nela e através dos meios de comunicação são poucos os casos de abuso policial que

chegam a ser destacados. Ademais, polícia chilena é considerada como respeitosa nos quesitos

20 Cruz, José Miguel. Maltrato policial em América Latina. Barómetro de las Américas de LAPOP. AmericasBarometer

Insights: 2009 (No.11) 21 Prof. Luciano Oliveira na apresentação do livro Polícia, Democracia e Sociedade (2007).

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de direitos das pessoas. Mesmo não tendo quantidade de casos expressivos de violência policial,

a situação é preocupante porque as denúncias aos tribunais por “violência desnecessária” são

frequentes (FUENTES, 2004).

Por causa disso, acredita-se que novas alternativas para a questão policial no Brasil e no

Chile, principalmente, mudanças na forma como algumas polícias ainda agem contra os direitos

humanos, não decore isoladamente de ajustes procedimentais na área de segurança pública, mas

de empenho político. A violência policial se situa nos limites da política. Ela é a prova da

existência de formas distintas de policiamento, a depender de quem é o alvo e dos interesses das

elites políticas. Nota-se que a violência policial não atinge a todos da sociedade igualmente, ela

distribuída segundo padrões seletivos e discriminatórios. No Brasil e no Chile a violência

policial é seletiva, a despeito das diferencias institucionais entre as polícias.

Em virtude disso, a análise das polícias sob a democracia não está adstrita às

características desse regime político. Afinal, da mesma forma que os regimes autoritários do

Brasil e do Chile não criaram polícias autoritárias, os enclaves do processo democrático não

fomentam isoladamente polícias violentas. No entanto, é considerável que os regimes militares

na América Latina, particularmente no Brasil e no Chile, reforçaram o ideal militarista nas

polícias e isso apresenta traços até hoje, sobretudo na organização das polícias e no controle do

crime. A novidade é que, no contexto democrático, o militarismo ressurge como uma forma

efetiva de policiamento. Isso é conveniente em espaços onde o combate à criminalidade assume

a postura de guerra. É por isso que no Brasil, as atividades do Exército estão cada vez mais

entrelaçadas com as da polícia. Nisso o processo de militarização das Forças Armadas se dá

simultaneamente com a militarização da polícia (ZAVERUCHA, 2008:133). No Chile, por sua

vez, a longa trajetória militarizada da polícia Carabineros não foi colocada em cheque pela

democratização (PRIETO, 1990).

Assim, é oportuno voltar à questão: que fatores explicam as resistências à mudança?

Acredita-se que no Brasil a questão do espólio autoritário, ou seja, a manutenção das práticas

policiais herdadas dos regimes militares passados com forças de segurança autônoma explica,

em parte, a persistência da violência policial. Com isso, a violência policial se justifica pelas

características institucionais e culturais (CHEVIGNY, 2000; PINHEIRO, 1997, 2000;

MÉNDEZ, 2000; RATTON, 2007).

No Chile, essa visão é limitada, pois a despeito das atuações violentas da polícia na

democracia, ela é bem avaliada pela sociedade chilena. Nesse caso, acredita-se na existência de

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21

uma tradição de autoritarismo que influencia os valores dos atores políticos no uso da força

(FUENTES, 2004). Com efeito, no Chile, survey do Latinobarômetro de 2004 constatou que

45% dos chilenos preferem viver numa sociedade ordenada, apesar disso gerar restrições às

liberdades (FRÜHLING, 2008: 116).

De toda forma, a persistência da violência policial no regime democrático em graus

variados no Brasil e no Chile oscila conforme apoios políticos. As causas das persistências

podem decorrer de fontes diferentes, mas as continuidades são similares no jogo democrático.

Com isso, para explicar os persistentes padrões de violência policial nos regimes democráticos

requer analisar a estrutura de incentivos e posições de poder dos atores chaves no sistema. O

debate sobre a violência policial tem de ser visto como um debate mais amplo sobre a

manutenção da ordem pública frente à proteção dos direitos dos cidadãos (FUENTES, 2004).

A violência policial, portanto, trata-se de uma opção ou falta de opção política, na qual

classe política, corporações policiais e cidadãos enfrentam o dilema do controle da criminalidade

e proteção aos direitos humanos. Assim, como prescreve Fuentes (2004):

“Num cenário democrático, os funcionários enfrentam pressões simultâneas para reduzir o crime, manter a estabilidade do país e proteger o direito dos cidadãos.

Mas ainda, os governos desejam contribuir com o poder apoiando políticas que

sejam atrativas para seu eleitorado. Dessa forma, se a coalizão pró-ordem tem a força e capacidade para conceber a delinquência e o crime como principal

preocupação da sociedade, é provável que o status quo prevaleça. Ao contrário,

se a coalizão a favor dos direitos humanos tem força e capacidade para conceber

a proteção dos direitos individuais como principal preocupação da sociedade e a violência policial como parte do problema de violência social, então os governos

se comprometem em fazer reformas para transformar os corpos policiais.”

Na América Latina a insegurança se converteu na principal preocupação cidadã e em

objeto de debates políticos sobre mecanismos e iniciativas mais adequados para enfrentar seu

incremento (DAMMERT, 2007). Com efeito, as crescentes taxas de criminalidade

acompanhadas do aumento da sensação de insegurança por partes dos cidadãos preocupam

brasileiros e chilenos. Essas demandas ocupam mais pauta dos governos e das autoridades

policiais do que mudanças em prol de direitos humanos e adequação das polícias ao regime

democrático. Isso é a fonte principal para violência oficial tolerada. Assim sendo, o apoio

popular aos abusos das polícias sugere não a existência de uma simples disfunção institucional,

mas de um padrão cultural muito difundido e incontestado que identifica a ordem e autoridade

ao uso da violência (CALDEIRA, 2008).

Diante disso, observar o papel das polícias no Brasil e no Chile sob o regime democrático

a partir das dimensões – como são organizadas, como são controladas, como se comportam –

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evidencia certas persistências. No regime democrático a gramática da polícia oscila entre

sintaxes e semânticas. Aos governos, aos comandantes e chefes das polícias, aos grupos

conservadores da classe política e da sociedade cabem às sintaxes. Eles apontam as mudanças

formais no ordenamento jurídico como prova de que as polícias agem conforme as leis. Todavia,

numa análise aprofundada, como a expressa na literatura aqui abordada, nota-se que tais leis

pouco alteraram o caráter autoritário, violento, discriminatório, seletivo da ação policial. Os que

enxergam essas contradições semânticas estão em várias partes, estão no Estado, na sociedade, e

também nas polícias, contudo, eles não têm a força política necessária para propor mudanças

substanciais.

É inegável que o regime democrático modifica a temática policial. Mas no caso do Brasil

e do Chile elas estão mais no campo das possibilidades. A persistência da violência policial

comprova o quanto é complexo superar culturas e legados autoritários enraizados nas

corporações policiais, nos governos e nas sociedades. Há tentativa de reformas policiais

operadas no Brasil, por exemplo, nos estados de São Paulo com a questão policiamento

comunitário e controle das polícias (LOCHE & MESQUITA, 2003; NEME, 2007), de Minas

Gerais, com a integração das polícias e melhorias no aparato de gestão das polícias (SAPORI,

2007, 2008), contudo o difícil é saber a consistência delas frente à política. No Rio de Janeiro,

por exemplo, entre os anos 1998 e 2000, uma reforma significativa foi proposta pela equipe do

antropólogo Luiz Eduardo Soares, mas ela foi abortada precocemente por interesses políticos do

governador carioca da época22

. No Chile, só recentemente com atuação violenta dos Carabineros

no enfrentamento com manifestantes civis em busca de reformas no sistema educacional se

cogitaram mudanças nos procedimentos da polícia. No geral, existia certa conformidade com o

sistema policial chileno, logo o assunto das reformas trilhava no sentido da eficiência no

trabalho policial e mudanças na estrutura corporativa das polícias (FRÜHLING, 2001).

Com efeito, o que se vê em termos de reforma policial nos países latino-americanos são

ajustes para busca de eficiência, aparelhamento das organizações, capacitação profissional. Tais

reformas são importantes, mas, elas quase não tocam na equação controle, organização e

comportamento das polícias, logo não geram mudanças substanciais na estrutura de

policiamento. O problema é que qualquer reforma implica mudança de paradigma na

organização policial, ou seja, na cultura policial, de tal maneira que permita a instituição

adaptar-se aos princípios e regras do jogo democrático (POBLETE, 2011: 141).

22 Relato da delicada passagem de Luiz Eduardo Soares à frente da segurança pública do Rio Janeiro está na obra: Meu Casaco de General, 500 dias no front da segurança pública do Rio de Janeiro (2000).

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Nas democracias, mais do que nunca, as polícias estão sujeitas às decisões políticas. O

problema é que, nos casos do Brasil e do Chile, tais decisões geralmente não são discutidas

publicamente, tampouco trilham no sentido das essenciais demandas de segurança da população.

Na verdade, na maioria das vezes, elas são ofuscadas pelas campanhas sob o slogan “a lei e a

ordem”, as quais segundo Monjardet (2003) são a expressão privilegiada das alianças político-

policiais, que ora atendem às pretensões político-partidárias dos governantes, ora, aos interesses

corporativos das elites policiais.

Conclusão

A comparação do papel das polícias no Brasil e no Chile nos regimes políticos revelou

que, certos traços considerados legados do passado autoritário recente, não são justificáveis. A

reflexão sobre a violência policial mostrou que ela se assenta num histórico arraigado de outras

violências institucionais. Na verdade, ela está presente no arranjo da própria atividade policial, a

qual tem em si um cunho discriminatório que não pode ser ignorado, cujo problema não está na

existência de conduta movida pela suspeição; mas, no conteúdo de tais percepções

preconceituosas, compartilhadas pela cultura policial e por vários setores da sociedade

(REINER, 2004).

Neste sentido, por exemplo, a violência policial aqui discutida, de forma alguma,

significa uma tentativa estatal de reforçar o monopólio da violência. O que se observa no Brasil

e no Chile, com suas polícias ainda atuando com brutalidade e arbitrariamente no contexto

democrático, não é ação de resgate de valores e normatizações dos períodos autoritários. A

violência policial hoje tem características próprias, por que esse tipo de violência tende, cada vez

mais, a se autonomizar face ao sentido que seria originalmente orientador de sua conduta,

vinculado à manutenção da ordem, em benefício de interesses pessoais, ou seja, privados

(PORTO, 2010:225).

Por causa disso, observa-se que a violência policial está para além das características do

regime político. É preciso considerar ainda que, instituições de policiamento desempenham um

papel fundamental em qualquer tipo de regime; seja em contextos democráticos ou autoritários, a

polícia carrega o fardo de manter a ordem e a segurança interna sob controle (MARENIN,

1996). No controle da ordem e no alcance da segurança tão almejados pelas sociedades latino-

americanas acometidas pela criminalidade e diversos tipos de agressões, a violência é um

recurso legitimado nos discursos e nas práticas de políticos, governantes, cidadãos e policiais.

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Por isso, a discussão da violência policial – seja a legalizada praticada no autoritarismo,

seja a tolerada na democracia – é assunto que atravessa a política. Na análise dos regimes

autoritário e democrático é possível encontrar finalidades ou omissões políticas na violência

policial, sobretudo quando operados de maneira particularizada para benefício de grupos

específicos. Em termos de policiamento, o que o Estado faz ou deixa de fazer é parte da política.

Se ele promove ações policiais violentas ou caso se omita de fiscalizar os crimes de policiais,

existem intenções políticas. Afinal, como argumenta Giddnes (2008): o policiamento nos

Estados modernos nunca pode ser uma questão meramente “técnica” de administração.

A gramática política da polícia observada a partir dos regimes aduz que novos arranjos

político-institucionais não eliminam imediatamente velhas estruturas socioculturais, bem como

novos discursos não geram necessariamente novas práticas. Afinal, o estudo do papel das

polícias do Brasil e do Chile corrobora a hipótese de Bayley (1971), para quem as características

dos sistemas policiais contemporâneos, como, por exemplo, suas estruturas, formas de controle e

imagens mudam lentamente. Isso fica expresso ao se confrontar as polícias com as dimensões:

como elas são organizadas, como são controladas, como se comportam. A despeito da mudança

política, velhas rotinas autoritárias persistem nas instituições policiais brasileiras e chilenas. Há

um hibridismo institucional, no qual coexistem práticas autoritárias numa estrutura legalmente

democrática, o que confirma os limites do processo de democratização.23

Ao pensar as polícias no regime democrático, o questionamento que transpassa todas

essa discussão é se os enclaves autoritários, a perspectiva de uma polícia pouco democrática e

não accountable, o enfrentamento militarista do crime, a violência institucional do Estado, não

passam de simples constrangimentos ou incômodos que os democratas precisam erradicar de

alguma maneira. É oportuno notar que as instituições de mando, por exemplo, as polícias, têm

suas próprias histórias, dinâmicas e interesses, separadas de tal ou qual regime político. Assim, o

desafio não é tanto a erradicação de enc1aves autoritários remanescentes, mas a articulação de

uma estrutura institucional mais permanente que concorde com os princípios democráticos

(POLICZER,1998). Neste sentido, não existem mudanças expressivas nas polícias brasileiras e

chilenas, mas continuísmos.

De todo forma, apesar dos paradoxos das polícias brasileiras e chilenas, na democracia,

vale frisar que elas já não são instituições exclusivamente do regime. O papel da polícia é cada

vez mais complexo. Hoje não competem às polícias apenas as funções de uso legítimo da força

23 Vide os trabalhos de Zaverucha (2000, 2005, 2008), que desenvolve a ideia de hibridismo institucional.

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física em situações extremas, vigilância, investigação, realização de prisões. Embora repletas de

contradições, elas estão assumindo local privilegiado no desenho das políticas de segurança

pública. A polícia influencia a política de diferentes maneiras, mas é particularmente pela

prevenção do crime e violência que ela se destaca (KALMANOWIECKI, 1995). No caso do

Brasil e do Chile – onde a insegurança, segundo dados Barômetro das América de 2010,

preocupa respectivamente 38,2% e 40,76% da população24

– as polícias são instituições

ativamente políticas.

A democratização lança desafios às polícias brasileiras e chilenas, mas nem todas elas

veem uniformemente a urgência de redefinições de seu papel, isto é, de reformas em seus

aspectos institucionais, organizacionais, culturais. Nesse caso, é preciso ampliar os horizontes na

temática das reformas policiais, pois elas não são somente ajustes estruturais nas políticas de

segurança pública e nas organizações policiais, elas são questões políticas que interferem

inclusive na profundidade do regime político. Afinal, toda reforma policial é política no sentido

que afeta a posição de interesses de diferentes grupos no interior e exterior da polícia (BAYLEY,

2001).

Na nova ordem democrática do Brasil e Chile, portanto, é necessário à classe política e às

instâncias de comando das polícias refletirem sobre as políticas públicas para enfrentamento de

maneira eficaz da criminalidade, diminuição dos altos índices de violência e transformação das

polícias em instituições democráticas e cidadãs. Esta gramática, no entanto, ainda está por ser

escrita.

24 Dados do Barômetro das América por LAPOP disponível em: RENNÓ, Lúcio R. e outros. Legitimidade e Qualidade da Democracia no Brasil: uma visão da cidadania / Lúcio Rennó, Amy E. Smith, Mattheu L. Lloyd e Frederico Batista Pereira. – São Paulo: Intermeios; Nashville: LAPOP, 2011.

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