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1 8º Encontro da ABCP 01 a 04/08/2012, Gramado, RS Área Temática: AT 03 – Eleições e representação política - Título do Trabalho: Análise de redes sociais e financiamento de campanhas eleitorais no Brasil - Nome completo e instituição dos autores: Ivan Jairo Junckes (UFPR) Rodrigo Rossi Horochovski (UFPR) Joseli Maria Silva (UEPG) Edson Armando Silva (UEPG) Leandro Batista de Almeida (UTFPR) Alides Baptista Chimin Junior (UEPG)

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8º Encontro da ABCP

01 a 04/08/2012, Gramado, RS

Área Temática: AT 03 – Eleições e representação política

- Título do Trabalho:

Análise de redes sociais e financiamento de campanhas eleitorais no Brasil

- Nome completo e instituição dos autores:

Ivan Jairo Junckes (UFPR)

Rodrigo Rossi Horochovski (UFPR)

Joseli Maria Silva (UEPG)

Edson Armando Silva (UEPG)

Leandro Batista de Almeida (UTFPR)

Alides Baptista Chimin Junior (UEPG)

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ANÁLISE DE REDES SOCIAIS E FINANCIAMENTO DE CAMPANHAS

ELEITORAIS NO BRASIL

Ivan Jairo Junckes – [email protected]

Rodrigo Rossi Horochovski – [email protected]

Joseli Maria Silva – [email protected]

Edson Armando Silva – [email protected]

Leandro Batista de Almeida – [email protected]

Alides Baptista Chimin Jr. – [email protected]

RESUMO

A metodologia de Análise de Redes Sociais (ARS) vem sendo vastamente utilizada em diversos campos da pesquisa social, podendo-se mencionar investigações em sociologia política voltadas à identificação de redes de movimentos sociais e organizações da sociedade civil ou ainda das interrelações entre atores no âmbito do sistema financeiro. A proposta deste paper é expor os aspectos metodológicos da ARS e explorar as possibilidades de sua aplicação em investigações sobre financiamento legal de campanhas eleitorais no Brasil – como, por exemplo, na prospecção de perfis de doadores e candidaturas e do grau de aproximação entre ambos, considerando variáveis como renda, gênero, filiação partidária, localização geográfica, bancadas e seu comportamento, entre outras. Palavras-chave: Análise de Redes Sociais (ARS); Financiamento Político; Brasil

1. INTRODUÇÃO

Desde 2002, os dados referentes aos resultados e ao financiamento de campanha de

todos os candidatos em pleitos eletivos no Brasil, em todos os níveis e esferas de

governo, estão disponíveis na página eletrônica do Tribunal Superior Eleitoral – TSE. Esta

ampla disponibilidade de dados em um mesmo ambiente eletrônico representa um grande

avanço em relação à maioria dos países democráticos e favorece investigações

motivadas por questões relacionadas ao funcionamento das instituições democráticas no

Brasil, tais como: quem financia o processo eleitoral? Quais as relações estabelecidas

entre grupos pagantes e grupos recebedores? Quais os principais grupos de interesses

articulados nas eleições no Brasil? Qual a espacialidade destas relações?

Dado o mérito de tais questionamentos, muitos têm sido os estudos dedicados a essa

temática no âmbito da ciência política. Grande parte desses estudos tem sido realizada

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através de tratamentos estatísticos convencionais e análises comparativas diversas.

Todavia, a estrutura do financiamento político legal e das redes de financiadores e

candidaturas que se articulam em torno dele são apenas tangenciadas pelos recursos

metodológicos usados nas pesquisas até então realizadas.

Buscando suprir essa lacuna teórico-metodológica, o Grupo de Estudos do Território

(GETE), da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), desenvolve uma pesquisa

financiada pelo CNPQ e pela Fundação Araucária (Paraná) para integrar o conjunto de

dados disponíveis sobre a dinâmica eleitoral em uma modelagem que permita ampliar a

capacidade de análise revelando sua estrutura e sua espacialidade. As investigações em

curso no GETE alcançam todos os níveis de candidaturas desde o pleito de 2004 até

2010, tanto de candidatas(os) eleitas(os) quanto não eleitas(os), do legislativo e do

executivo em todo o território nacional. O presente paper traz uma exposição da

metodologia e alguns resultados preliminares.

2. A PROBLEMÁTICA DA PESQUISA

Em democracias representativas, especialmente naquelas com pleitos eleitorais

midiatizados, os recursos financeiros tornam-se centrais para o desempenho eleitoral. A

estrutura do financiamento das campanhas influencia fortemente o potencial dos

candidatos, seus partidos e coligações para a conquista de posições favoráveis nos

resultados eleitorais. Distintas condições de financiamento implicam assimetrias pouco

calculáveis na promoção ou cerceamento da representação democrática, produzindo-se

condições dispares de pressão e influência sobre o conjunto das políticas públicas.

A literatura, a dinâmica política e a indústria midiática, esta última notadamente movida

pelos escândalos envolvendo grupos de interesse e elites político-partidárias,

permanentemente suscitam dúvidas sobre os valores oficiais e oficiosos envolvidos nas

campanhas eleitorais e sobre o grau de influência de seus financiadores sobre as

campanhas. Igualmente importantes são os questionamentos acerca dos compromissos

assumidos ou cumpridos pelos mandatários no exercício das funções típicas para a

sustentação do sistema político, a ponto de ter-se generalizado o jargão “quem paga a

banda escolhe a música”. Tal qual aponta Bernard Manin (2006, p. 113), “os intercâmbios

de contribuições políticas por favores de políticos geram distorções através de seus

efeitos na distribuição de recursos. O custo social de tais distorções é provavelmente

muito maior do que aquele do roubo aberto”. No mesmo sentido manifesta-se Emerson

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Cervi (2009),

ganha relevância o debate sobre fontes de recursos, vantagens e desvantagens do uso de financiamento privado ou estatal de campanhas eleitorais. Esse debate tem girado em torno do fato de os eleitos terem que “retribuir” doações feitas por apoiadores de suas campanhas, através de concessões a interesses específicos de empresas ou segmentos privados (CERVI , 2009, p. 03).

Embora consideremos que “o financiamento eleitoral é pelo menos tão antigo quanto a

democracia” (BOURDOUKAN, 2009, p. 08), a temática ganha expressão de elevada

preocupação quando pesquisadores que tratam do tema observam que ao longo das

últimas décadas as práticas de sustentação militante têm sido residuais quando

comparadas com os recursos oriundos de grupos de interesses, especialmente grandes

grupos empresariais e financistas (CERVI , 2009).

Em extenso estudo comparado sobre a condição de 111 países democráticos, Adla

Bourdoukan (2009) afirma em tom categórico: “dada a relevância do tema do

financiamento político e o grande número de questões que suscita, causa espanto o

pequeno número de trabalhos de ciência política sobre esse tema.” (BOURDOUKAN,

2009, p.14). A autora descreve o campo como marcado pela dificuldade de acesso a

dados e por um grande número de estudos “pouco analíticos” e normativos produzidos

por ONGs e órgãos governamentais. Pode-se ainda acrescentar que muitos estudos

retroalimentam-se em um debate endógeno caracterizado pela intensa utilização de

modelos econométricos que circulam a positividade entre volume de recursos e número

de votos obtidos. Tal qual aponta Daniel Zovatto: “o tema do financiamento político se

converteu em uma questão estratégica de toda democracia, e ao mesmo tempo, dada sua

complexidade e os desafios que apresenta, também tornou-se um problema, uma

verdadeira dor de cabeça” (ZOVATTO, 2005, p. 289).

No Brasil, dispomos de trabalhos bastante profícuos, como, por exemplo, os da

organização Transparência Brasil, referentes ao tratamento estatístico/analítico dos dados

das eleições de 2002, 2004, 2006 e 2010, elaborados a partir dos dados sobre os

financiamentos de campanhas eleitorais divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

e disponibilizados nas páginas eletrônicas www.transparencia.org.br e

www.asclaras.org.br. Além disso, uma série de estudos tem sido realizada pelo Instituto

Ethos e pela Transparency International, intitulados A Responsabilidade Social das

Empresas no Processo Eleitoral – Edições 2002, 2004, 2006, 2008 e 2010. Estas análises

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têm abordado o montante e a participação dos partidos políticos, a distribuição por

estados da Federação, os setores financiadores e os financiadores específicos (pessoas

jurídicas) em relação aos partidos e estados.

No campo acadêmico dispomos de diversos estudos consistentes sobre a dinâmica geral

do processo e do comportamento eleitoral, podendo-se destacar Fleischer (2002), Araújo

(2004), Zovatto (2004 e 2005), Abramo (2005 e 2005a), Rubio (2004, 2005 e 2005a),

Baquero (2007), Álvares (2008), Bourdoukan (2009), Cervi (2009) e Peixoto (2009).

Nenhum dos trabalhos citados explora, contudo, a estrutura formada pela rede de

financiadores e candidaturas, certamente porque não fora o propósito de seus autores.

Todavia, mesmo que tivesse sido este o interesse, os dados estavam dispersos de

maneira tal que impossibilitava a sua integração e a sua utilização em uma metodologia

de análise de redes sociais.

Em diversos países a divulgação dos dados relativos ao financiamento político eleitoral

tem-se tornado legalmente obrigatória ou, onde já o era, esta divulgação tem sido

ampliada com novos critérios e mecanismos. No Brasil, em face dos avanços no processo

eletrônico de votação e dos investimentos nos recursos de processamento de dados,

dispomos de acesso a um repositório de dados eleitorais de 1994 até 2010. Tal

disponibilidade tanto amplia as oportunidades de trabalhos que integrem dados e análises

quando acentua o risco de pulverização de esforços em pesquisas específicas, recortes

estatísticos e estudos de caso, com limitada capacidade de generalização explicativa.

Verificada a disponibilidade de dados e a insuficiência na análise da estrutura do processo

eleitoral, o Grupo de Estudos do Território (GETE), da Universidade Estadual de Ponta

Grossa (UEPG), com apoio de pesquisadores de outras instituições, como Universidade

Federal do Paraná (UFPR) e Universidade Federal Tecnológica do Paraná (UTFPR), tem

desenvolvido esforços para integrar tratamentos estatísticos convencionais, o

geoprocessamento e a tecnologia de redes com o objetivo de demonstrar a dinâmica do

financiamento político e sua espacialidade. Este paper é especificamente voltado à

descrição desta última tecnologia, em especial da metodologia de Análise de Redes

Sociais e suas aplicações.

3. A OPERACIONALIZAÇÃO DA PESQUISA

Para possibilitar a operacionalização da pesquisa, o grupo de pesquisadores envolvidos

(vide Anexo) investiu na incorporação de um conjunto de tecnologias livres que

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possibilitasse o tratamento analítico que contemplasse os princípios teóricos esboçados

acima: análise de redes em sua distribuição espacial.

Esforços estão sendo conjugados para viabilizar a análise: primeiramente, organizar os

dados em uma modelagem suportada por um banco de dados robusto e livre. Neste caso

optamos pelo PostgreSQL por este possuir módulos de análise espacial integrados e

também por sua flexibilidade em integrar todos os softwares utilizados para as análises –

a Figuras 1 reproduz exemplos da interface gráfica deste programa.

Figura 1 – Exemplos de interface gráfica do software PostgreSQL

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A partir dessa organização, as consultas e relatórios podem ser exportados para outras

ferramentas de análise conforme as perguntas feitas pelos pesquisadores. Parte dessas

perguntas é de natureza estatística. Escolhemos para isso um software livre chamado

SOFA (Statiscs Open For All). Trata-se de uma ferramenta que se destaca pela facilidade

de uso e pela rapidez na tabulação e produção de gráficos. Para as análises espaciais

optamos pelo Quantum Gis pela sua flexibilidade, embora posteriormente possamos

publicar os dados através do I3Geo. Finalmente para a análise de redes sociais optamos

pelo PAJEK, cuja interface é trazida na Figura 2, pela sua robustez no tratamento de

grandes bases e riqueza de recursos de análise de redes. Esta última ferramenta foi a

única que não conseguimos em software livre. Embora seja uma ferramenta

disponibilizada gratuitamente ela ainda não teve seu código publicado.

Figura 2 – Interface gráfica do software PAJEK

É necessário destacar, entretanto, que nossa proposta metodológica está justamente no

uso integrado de todas essas tecnologias. Não se trata de um processo em etapas, mas

de uso e reuso das ferramentas na dimensão em que elas se propõem. Assim, a análise

estatística pode revelar tendências que seriam aprofundadas na produção de redes e

visualizadas em um mapa temático que pode simultaneamente suscitar outros

cruzamentos estatísticos. Em suma, cada ferramenta é um recurso tecnológico para tratar

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de uma dimensão do fenômeno que, entretanto, ganha maior visibilidade quando visto no

conjunto. A consecução das tarefas implicadas na realização deste trabalho demanda,

portanto, a constituição de uma equipe multidisciplinar, formada por profissionais dos mais

diferentes campos, como geografia, história, sociologia, ciência política e informática.

O escopo do projeto de pesquisa mais amplo, no qual se insere a presente investigação,

tem como alicerce a organização das informações eleitorais em banco de dados contendo

resultados eleitorais e financiamento privado legal das campanhas desde 1994 no Brasil.

No presente momento, estamos analisando dados referentes a 2008 e 2010, abrangendo

todos os níveis e esferas de governo (municipal, estadual, distrital e federal), que

acumularão, estimativamente, 4,5 milhões de registros estruturados, contendo

informações de 360 mil candidatos(as), eleitos(as) e não eleitos(as), e de mais de 510 mil

doadores, pessoas físicas e jurídicas, em ambas as eleições. Este texto traz alguns

exemplos ilustrativos dos resultados preliminares dessas análises, em especial aqueles

referentes ao pleito de 2010.

Tal conjunto de dados pode ser bastante bem explorado por métodos estatísticos

convencionais, todavia, conforme já apontado, a estrutura de financiamento político pouco

seria perquirida, ao mesmo tempo em que os gráficos e tabelas produzidos ocultariam a

dinâmica espacial do fenômeno. Para ir além, nos propomos a contribuir com a agenda de

pesquisas sobre financiamento político com a análise de redes sociais (ARS). Para esta a

primazia das relações sobre os atributos dos atores sociais é fundante de todo o trabalho

de tratamento e análise dos fenômenos, tal qual apontam Lemieux e Ouimet (2004, p. 33):

“em análise estrutural, o objetivo é analisar as relações entre actores e não tanto entre

atributos. Trata-se da principal diferença entre a análise correlacional e análise

estrutural.".

A Análise de Redes Sociais (ARS), ou Social Networks Analisys (SNA), tem sido

amplamente utilizada há três décadas em muitos estudos em institutos anglo-saxões,

ibéricos e norte-americanos, apresentando também expansão entre alguns pesquisadores

latino-americanos. A ARS tem sido especialmente utilizada para explorar as relações de

agentes em conjuntos de indivíduos e de coletivos sociais porque sua base conceitual,

métodos e técnicas respondem diretamente a questões elaboradas sobre as diversas

formas de relações sociais.

O estudo das relações de um ator social na metodologia ARS estabelece para cada ator

as medidas de seu posicionamento na rede, sendo que um dos seus recursos mais

interessantes é a medida de centralidade de intermediação. Para uma rede cujo exercício

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do poder de influência não esteja restrito a um centro específico, como são as redes

sociais em geral, as medidas de intermediação evidenciam aqueles atores cuja distância

para alcançar os demais atores é menor e que, portanto, necessitam de menos energia

para conectá-los com facilidade. Assim, quando se apura que determinados atores

apresentam maior grau de intermediação, pode-se afirmar que eles são, para o período

estudado, os nós da rede, cuja capacidade para obstruir ou agilizar relacionamentos é a

mais elevada.

Expressando o conjunto de vínculos relacionais entre nós formados por indivíduos,

pequenas organizações ou grandes corporações, a análise de redes sociais persegue a

identificação das determinantes estruturais dos movimentos em análise, assumindo o

sistema social como redes de relações entre agentes passíveis de serem expressas por

modelagens computacionais espaço-temporais (DEGENNE e FORSÉ, 2007). Os

principais referentes conceituais da ARS são: a teoria dos laços fortes (cliques) e laços

fracos; a teoria dos buracos estruturais de conectores políticos de capital social; e, a

teoria da coordenação das relações, definidas como posições vantajosas formadoras das

redes de apoio e mobilização de recursos (LEMIEUX e OUIMET, 2004, p. 88).

Um dos estudos clássicos mais relevantes sobre elites de poder tem sido o de Narciso

Pizarro, Solidaridad estructural y cohesión en las elites del poder en la transición

española: Estado y economia. O citado trabalho reúne em modelagem computacional,

viabilizada pela metodologia de análise de redes sociais, o histórico de 11.014 agentes

em torno da verificação do grau de coesão da elite espanhola no período de

democratização do país e, principalmente, das condições estruturais destas relações de

poder (PIZARRO, 2005, p. 04).

Artigos de caráter investigativo das relações sociais utilizando-se da ARS também são

frequentes, destacando-se outros textos de Pizarro (2004), além de León e Gil-Mendieta

(2004), Clark (2006), Molina (2001), e Molina et al (2006). Recentemente, desenvolvem-

se pesquisas sobre as distintas formas de associação adotadas pelos atores em clusters

identificados na análise de redes. Esta metodologia de trabalho tem sido reconhecida

como análise transassociativa e tem como expressão os trabalhos de Ary Minella no

Núcleo de Estudos do Sistema Financeiro – NESFI, da Universidade Federal de Santa

Catarina – UFSC (MINELLA, 2002, 2005 e 2006).

Dando consequência à escolha da metodologia ARS, o programa Pajek1 é utilizado pelo

Grupo de Estudos do Território (GETE) para gerar e desenhar as redes de financiamento

das campanhas eleitorais no Brasil no período e escalas abrangidas pela pesquisa

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(municipal, estadual, distrital e federal), assim como para estabelecer os indicadores

básicos (dados gerais, índices e censo triádico), para a análise de redes de financiamento

de todas as 609 redes constituídas.

O Pajek é utilizado para análises estatísticas e visualização de redes. Conforme De Nooy

(2005), o desenvolvimento inicial deste software visou responder a disponibilidade de

dados de grandes redes (tais quais redes de interação virtual, redes de citação,

genealogias, de difusão epidêmica, notícias, etc.) que não dispunham de um programa

capaz de realizar seu processamento. Atualmente o Pajek encontra-se em franca

expansão entre pesquisadores brasileiros, inclusive no estudo das redes de

pesquisadores (SILVA, 2009; MARTINS, 2010).

A visualização das redes é a forma mais simples para a exposição do trabalho de análise

de redes. Dois exemplos de grafos de redes podem ser observados a seguir em um de

nossos trabalhos:

Figura 3 – Exemplos de Grafos de Redes

Fonte: SILVA, 2009, p. 70 e 72.

Tais grafos, com algumas dezenas de componentes (vértices), encantam pela

simplicidade de leitura e interpretação. Todavia a visualização é um recurso inócuo

quando o número de vértices alcança a ordem de milhares, tal qual ocorre nesta pesquisa

de financiamento político. Nestes casos, torna-se elementar a aplicação de um programa

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de análise de redes, como o Pajek, para a determinação do grau de coesão das redes,

cálculo e identificação dos componentes fortes, cálculo e identificação dos núcleos (k-

core), determinação do grau de centralização (degree) dos atores (candidatos e

doadores), e determinação do grau de centralidade de intermediação (betweenness). Tais

indicadores evidenciam a estrutura da rede, ou sub-rede, investigada e ampliam a

capacidade de análise do fenômeno selecionado para pesquisa.

4. ALGUNS RESULTADOS PRELIMINARES – DOIS EXEMPLOS DE APLICAÇÃO DA

ARS NA ANÁLISE DO FINANCIAMENTO POLÍTICO

4.1 A REDE GERAL DE FINANCIAMENTO POLÍTICO E ALGUNS RECORTES DE

GÊNERO

A pronta disponibilidade dos dados relativos ao pleito de 2010 viabilizou a população do

banco de dados, possibilitando, por exemplo, a montagem de uma rede constituída de

22.539 candidatas e candidatos e 206.035 doadoras e doadores, tanto pessoas físicas

quanto jurídicas. O grafo resultante deste primeiro esforço pode ser observado a seguir

(Figura 4):

Figura 4: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010

no Brasil

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

A mancha formada pela rede geral não permite, evidentemente, qualquer inferência.

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Pautados pelo senso comum poderíamos imaginar que realizar alguns recortes ou

partições específicas da rede viabilizaria a sua análise. Para testarmos tal concepção são

apresentadas na sequência algumas redes contendo todos os candidatos, as candidatas

e os financiadores(as) em estados selecionados (Figuras 5 a 8):

Figura 5: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 no Estado do Ceará

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 6: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 no Distrito Federal

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 7: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 no Estado do Pará

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Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 8: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 no Estado do Paraná

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Podemos observar que os avanços são mínimos quando recortamos o universo por

unidade da federação. Insistindo no sentido de recortarmos nosso universo podemos

visualizar as redes formadas por candidatos(as) a deputado(a) federal e estadual em cada

uma das unidades da federação já visualizadas anteriormente. A seguir apresentamos o

produto visual desta tentativa (Figuras 9 a 16):

Figura 9: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 para o cargo de deputado(a) federal pelo Estado do CEARÁ

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Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 10: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 para o cargo de deputado(a) estadual pelo Estado do Ceará

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 11: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 para o cargo de deputado(a) distrital no Distrito Federal

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 12: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 para o cargo de deputado(a) federal pelo Estado do Pará

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Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 13: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 para o cargo de deputado(a) estadual pelo Estado do Pará

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 14: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 para o cargo de deputado(a) federal pelo Estado de São Paulo

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 15: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 para o cargo de deputado(a) federal pelo Estado do Paraná

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Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Figura 16: Grafo de rede contendo todos os doadores e candidatos e candidatas nas eleições de 2010 para o cargo de deputado(a) estadual pelo Estado do Paraná

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

E simples constatar que em ambos os caminhos (de visualização geral ou visualização

reduzida por partição de unidade da federação ou cargo), não se viabilizam quaisquer

análises sobre a rede formada por doadores e candidatos e candidatas. Uma analogia

interessante é a de um novelo de lã com os fios “embolados”. Por maior que seja a

habilidade para identificar e tratar os nós da trama formada, ainda assim, a probabilidade

de efetividade, e especialmente de tempestividade, do trabalho é bem reduzida. Disso

resulta a necessidade de utilizarmos sistemas de cálculo de cliques e núcleos, do grau

médio de distância na(s) rede(s), centralidade de grau e grau de centralização por

proximidade (closeness) e intermediação (betweenness), dentre tantos outros possíveis.

Apresentamos, a seguir (Tabelas 1 e 2), um exemplo constituído a partir de um dos

cálculos mais simples na ARS. A centralidade por proximidade é a medida da distância

média necessária para que um determinado candidato(a) alcance qualquer um dos

demais candidatos(as). Estima-se por esse índice o potencial do candidato(a) de

influenciar no jogo político em curso.

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Tabela 1 - Participação PERCENTUAL das CANDIDATAS nas eleições de 2010 segundo índice de centralidade por proximidade*

Candidatas / Estado CE DF PA SP PR

Rede todos os cargos

Centralidade igual a 0** 40 31 32 20 28

Centralidade maior que 0 18 20 20 17 20

Rede DEP FED

Centralidade igual a 0** 47 31 32 24 24

Centralidade maior que 0 5 17 13 18 17

*DEFINIÇÃO DE índice de centralidade por proximidade: Conforme NOOY, MRVAR e BATAGELJ (2011, p. 146) índice de centralidade por proximidade de um vértice, também denominado de closeness centrality, é calculado tomando-se “o número de outros vértices dividido pela soma de todas as distâncias entre o vértice e todos os outros”. Tem por princípio que a menor distância necessária para alcançar todos e qualquer um dos demais participantes da rede confere ao agente (vértice) a condição positiva para exercer pressão e obter vantagens ou ceder a pressões e fornecer vantagens. ** Índice de centralidade por proximidade igual a zero ocorre quando o candidato(a) não declarou receita ou declarou-se como seu único doador.

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Tabela 2 – Participação PERCENTUAL das CANDIDATAS entre os 10% de candidatos(as) com maior centralidade segundo índice de centralidade por proximidade

Candidatas / Estado CE DF PA SP PR

Rede todos os cargos 11 11 12 13 5

Rede DEP FED 0 14 0 11 0

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Podemos observar que no Ceará 40% das candidatas, considerando-se todos os cargos

em disputa, apresentam índice zero, ou seja, não declaram receita ou declaram-se como

sua única doadora, tendencialmente com reduzida, ou nula, capacidade de projeção

eleitoral. Quando considerados os candidatos(as) com índice positivo, ou seja aqueles

que mantêm relação com pelo menos um doador além de si, esse índice é de apenas

18%, acompanhando o índice verificado nos demais estados.

Notamos também que o potencial de influência das candidatas torna-se mais crítico

quando observadas aquelas candidatas a deputada federal. No caso do CE, até 47%

delas tem índice de centralidade igual a zero e apenas 5% alcança índices positivos,

sendo que destas que alcançam alguma centralidade nenhuma compõe o decil superior. A

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situação é compartilhada pelas candidatas a deputada federal no estado do PA. No caso

do PR a participação das candidatas é ainda mais modesta, pois quando considerados

todos os cargos, apenas 5% delas compõem o decil com os maiores índices de

centralidade por proximidade e nenhuma candidata integra tal grupo seleto quando

considerados os cargos de deputado(a) federal.

As mulheres são, com efeito, duplamente penalizadas quando se consideram as chances

de eleição para deputado(a) federal nos estados selecionados, principalmente na medida

em que, tal qual revela a literatura a que referenciamos no início deste texto, a

capacidade de atrair recursos financeiros é um praticamente um proxy da capacidade de

eleger-se. Além de, como visto acima, apresentarem modesta centralidade por

proximidade na rede de financiamento político, desenvolvem campanhas com gastos

muitas vezes inferiores que os homens (Figura 17).

4.2 ANÁLISE DE UMA SUB-REDE GERADA A PARTIR DE FILTROS ESPECÍFICOS:

BANCOS vs CANDIDATURAS A DEPUTADO(A) FEDERAL

O segundo exemplo de aplicação é uma sub-rede gerada com aplicação de filtros

específicos, uma funcionalidade importante do software PAJEK e que permite gerar uma

infinidade de redes derivadas de uma rede mais ampla. Aqui empregamos dois filtros: 1)

os doadores são empresas que possuem os termos banco e investimento em suas razões

sociais; 2) os receptores são candidatos a deputado federal, em todos os estados, nas

Figura 17: Receita média declarada por candidatos e candidatas a deputado federal nas eleições de 2010

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eleições de 2010 que receberam das referidas organizações. Como se trata somente de

um exemplo ilustrativo de aplicação da metodologia, consideramos apenas as doações

realizadas diretamente por essas empresas, sem qualquer tratamento ou análise

transassociativa delas em seus grupos operativos. Trata-se de uma rede relativamente

pequena, que permite uma visualização bastante nítida de sua dinâmica (Figura 18). Isso,

por si só, é um achado importante, na medida em que as empresas em exame escolhem

candidaturas em uma quantidade comparativamente pequena se se considera o número

total de candidaturas.

Figura 18: Grafo de rede contendo todos os doadores com os termos banco e investimento no nome e candidatos e

candidatas nas eleições de 2010 para o cargo de deputado(a) federal no Brasil

Fonte: Elaboração dos autores com dados do TSE.

Embora não seja o objetivo principal da ARS, ela possibilita algumas estatísticas

descritivas, a partir das quais apresentamos uma breve caracterização das candidaturas à

câmara dos deputados destinatárias do financiamento das empresas consideradas. Como

já dissemos, trata-se de uma rede pequena formada por apenas 186 atores – 48

empresas e 138 candidaturas entre as 5.841 que se lançaram no país em 2010. Pequena,

porém bastante eficiente: 98 elegeram-se e somente 40, não o fizeram, ou seja, pouco

mais de 70% dos candidatos a deputado federal da sub-rede analisada foram bem-

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sucedidos em 2010, contra um percentual inferior a nove por cento no conjunto de todos

os candidatos. Ou seja, receber apoio financeiro de bancos incrementa em muito as

possibilidades de eleger-se.

O setor financeiro (ao menos a parte dele que analisamos) não tem grandes preconceitos

partidários, sobretudo quando se trata das agremiações que vêm orbitando nas bases de

apoio aos grupos políticos com mais chances de conquistar o executivo federal (Tabela

3). Não por acaso, os partidos com maior número de candidaturas financiadas são

justamente o PSDB e o PT – independentemente dos valores despendidos. Se há algum

preconceito na escolha dos receptores das doações, este é endereçado a partidos mais à

esquerda do espectro político ou com pouca viabilidade eleitoral, que não são

aquinhoados.

Tabela 3 – Partidos dos candidatos a deputado federal receptores de doação financeira legal de organizações do Setor Financeiro – Eleições de 2010

Nomes Sigla Número eleitoral

Candidatos % Partido Soma %

Partido da Social Democracia Brasileira

PSDB 45 26 18% 18%

Partido dos Trabalhadores PT 13 23 16% 35% Partido Progressista PP 11 17 12% 47% Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PMDB 15 15 11% 57%

Democratas DEM 25 14 10% 67% Partido Verde PV 43 9 6% 74% Partido Democrático Trabalhista PDT 12 7 5% 79%

Partido Trabalhista Brasileiro PTB 14 7 5% 84%

Partido Popular Socialista PPS 23 6 4% 88% Partido da República PR 22 4 3% 91% Partido da Mobilização Nacional PMN 33 4 3% 94%

Partido Republicano Brasileiro PRB 10 2 1% 95%

Partido Trabalhista Cristão PTC 36 2 1% 96% Partido Socialista Brasileiro PSB 40 2 1% 98% Partido Comunista do Brasil PC do B 65 2 1% 99% Partido Social Cristão PSC 20 1 1% 100%

Fonte: elaboração dos autores, com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

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Não necessitaríamos da ARS para fazer tais “descobertas”. Os mais simples pacotes

estatísticos as propiciariam. O diferencial da metodologia são algumas medidas

específicas que ela proporciona. Um exemplo: olhando para o grafo acima, notamos

vértices que se destacam. São os atores centrais, sejam eles financiadores ou

candidatos.

Destacamos, no exemplo em questão, a centralidade por intermediação desses atores, ou

seja, a capacidade de um nó de ser um "entreposto de influências", no sentido de que,

quanto mais central, maior a possibilidade de ele influenciar (ou contaminar) um número

maior de outros nós. Trata-se de uma medida distinta da centralidade por proximidade,

que aplicamos no exemplo anterior. A intermediação inclui também a quantos outros

atores ou grupos cada um dos os atores da rede dá acesso. Se um ator é completamente

central, sua centralidade seria equivalente a 1,0000 - é o caso de um ator no centro e

todos ligados em torno dele e somente a ele, com nenhum se ligando a qualquer outro

que não o central; se fosse completamente marginal, seria algo como 0,000000000001,

formando-se uma rede-ciranda, onde cada um liga-se a dois outros, um à esquerda e

outro à direita. Assim, fecha-se a roda e, portanto, não há centralidade.

Como a sub-rede em apreço é pequena, a intermediação dentro dela é mais limitada, mas

já é possível perceber visualmente os atores mais centrais como tendo maior capacidade

de alcance. No entanto, considerando os 98 candidatos que a formam, o Pajek nos dá

uma centralidade por intermediação média de 0,44688980 na rede geral,

significativamente superior à média (0,12685576) desta última, composta por todos os

candidatos e doadores, com que se pode afirmar a alta capacidade dos bancos estudados

de identificar os candidatos mais articulados e com maior poder de abrir e fechar portas.

A título de curiosidade, fizemos um recorte, a partir do grupo dos 40 candidatos que

apresentam maior centralidade por intermediação. A partir disso inferimos que, assim

como ser financiado por organizações do setor financeiro incrementa as chances de

sucesso nas eleições, uma alta centralidade age na mesma direção: 29 candidatos dentro

deste grupo se elegeram, ou seja, praticamente três quartos, uma altíssima “taxa de

sucesso”, embora não muito superior à da sub-rede. Em geral, quem não se elegeu ficou

nas primeiras suplências de suas coligações. Disso depreendemos que a centralidade

denota um índice de sucesso dentro das eleições que se assemelha a ser financiado por

um grupo economicamente forte.

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Analisando o atributo gênero, apuramos 37 homens e apenas três mulheres. É

interessante observar que os percentuais que estes números exprimem praticamente

coincidem com a composição de gênero da Câmara dos Deputados, com 92% de

candidatos recebendo doações do setor financeiro, para apenas 8% de mulheres na

mesma situação. Aparentemente, elas estão muito menos conectadas aos atores que

formam esta rede de financiamento altamente bem-sucedida, sendo este mais um fator a

explicar a pequena representatividade feminina na câmara baixa do legislativo federal

brasileiro.

Tabela 4 – Partidos das 40 candidaturas a deputado federal com maior centralidade

por intermediação na Eleição Geral de 2010 - Brasil Partido Número

eleitoral Candidatos % Partido Soma % Eleitos Não Eleitos

PSDB 45 10 25% 25% 7 3

PT 13 8 20% 45% 7 1

PP 11 5 13% 58% 2 3

DEM 25 3 8% 65% 1 3

PR 22 3 8% 73% 3 0

PV 43 2 5% 78% 1 1

PDT 12 2 5% 83% 1 1

PTB 14 2 5% 88% 2 0

PPS 23 2 5% 93% 2 0

PMN 33 1 3% 95% 1 0

PTC 36 1 3% 98% 1 1

PC do B 65 1 3% 100% 1 0

PMDB 15 0 0% 100% 0 0

PRB 10 0 0% 100% 0 0

PSB 40 0 0% 100% 0 0

PSC 20 0 0% 100% 0 0

Fonte: elaboração dos autores, com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

Quando se considera o atributo partido, ainda que o setor financeiro distribua recursos

para mais de uma dezena de agremiações, há certa concentração, principalmente em

PSDB e PT (Tabela 4). Os cinco partidos com maior número de receptores concentram

praticamente três quartos dos candidatos. Tal como ocorre no conjunto da rede, neste

grupo específico de candidatos com maior centralidade por intermediação é possível

vislumbrar um processo de oligopolização da recepção de financiamento político pelos

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partidos que se alternaram à frente do executivo federal nas últimas décadas. Vale

ressaltar ainda a ausência de candidatos do PMDB deste grupo especídico. Considerando

que ele é o quarto partido com mais candidatos na sub-rede analisada, pode-se daí inferir

que seus candidatos ocupam várias posições, porém periféricas da rede, numa emulação

das táticas peemedebistas de campanha nas últimas eleições. Por outro lado, o

comportamento da sub-rede, em geral, e do grupo recortado, em particular, denota um

fenômeno popularmente conhecido como “o rico fica mais rico” (WATTS, 2003) o que

ajuda os nós mais conectados a capturar um número desproporcionalmente grande de

conexões a custa dos outros nós. Este fenômeno será explorado em trabalhos futuros, em

que várias eleições poderão ser comparadas.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este paper consiste num registro inicial de pesquisa que vem mapeando as redes de

financiamento das eleições no Brasil mediante a aplicação da metodologia de Análise de

Redes Sociais (ARS), investigação que dá seus primeiros passos, o que, neste momento,

implica estudar e testar os próprios procedimentos empregados.

Os exemplos trazidos nos parágrafos acima apontam os potenciais da pesquisa. Aqui

destacamos apenas duas medidas, os graus de centralidade por proximidade e por

intermediação dos atores. Com elas, pudemos visualizar alguns fatos que o senso comum

intui. O primeiro deles é que entre tantas assimetrias produzidas pelo desigual acesso a

recursos financeiros, uma das mais significativas é a profunda iniquidade entre homens e

mulheres na capacidade de estabelecer relações significativas. Elas, na quase totalidade,

estão alijadas dos canais de recursos importantes para uma campanha eleitoral bem-

sucedida. Outra constatação, a partir de pequena amostra de empresas, é a capacidade

que o setor financeiro tem de prospectar as candidaturas mais articuladas e, por isso

mesmo, com maior poder de abrir e fechar portas e, no limite, eleger-se.

No desenvolvimento futuro da pesquisa, pretendemos aprofundar as análises. São

inúmeras as possibilidades. Pode-se, por exemplo, averiguar como esta sub-rede formada

por bancos e candidatos conecta-se a outras redes, de outros setores econômicos. É

possível conjugar a ARS com outras metodologias para, por exemplo, avaliar o

comportamento dos candidatos financiados, sobretudo sua atuação como agentes

políticos – seja no executivo ou no legislativo. Há, ainda, potenciais combinações das

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redes com ferramentas de geoprocessamento visando à compreensão de como os atores

se articulam territorialmente, prospectando-se, por exemplo, redes interestaduais de

financiamento político.

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ANEXO 1 – EQUIPE RESPONSÁVEL PELA PESQUISA

Alides Baptista Chimin Junior, geógrafo especializado em geoprocessamento

Ary Cesar Minella, sociólogo especializado em análise transassociativa

Clemente Herrero Fabregat, geógrafo especializado de análise territorial

Edson Armando Silva, historiador especializado em metodologia de pesquisa

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informacional

Ivan Jairo Junckes, sociólogo especializado em análise de redes

Joseli Maria Silva, geógrafa especializada na temática de gênero

Juliana Przybysz, geógrafa

Karina Eugênia Fioravante, geógrafa

Janaina Trajano, cientista política

Leandro Batista de Almeida, analista de sistemas especializado em análise de redes

Luciane do Rocio Moura Martins, geógrafa

Márcio José Ornat, geógrafo especializado na temática de gênero

María Reyes Herrero López, cientista política especializado em análise de redes

Narciso Pizarro Ponce De La Torre, sociólogo com amplo domínio em análise de redes

Rodrigo Rossi Horochovski, cientista político especializado em teoria democrática e participação política

Patrícia Del Claro, cientista política

Rodrigo Rossi, geógrafo especializado na temática de gênero

Rogério Ranthum, analista de sistemas especializado em banco de dados

Taísa da Motta Oliveira, cientista política

Wilson Silva Júnior, geógrafo especializado em geoprocessamento

E os graduandos em geografia Heder Leandro Rocha, Mayã Polo de Campos, Vinícius Cabral.