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NOLIA CRISTINA RODRIGUES PIMENTA GOMES

O DOENTE CIRRGICO NO PERODO PR-OPERATRIO: DA INFORMAO RECEBIDA S NECESSIDADES EXPRESSAS

Dissertao de Candidatura ao Grau de Mestre em Cincias de Enfermagem, submetida ao Instituto de Cincias Biomdicas de Abel Salazar da Universidade do Porto.

Orientadora Professora Doutora DINORA MARIA GUEDES GIL DA COSTA CABRAL Categoria Professora Adjunta Afiliao Instituto de Cincias da Sade Universidade catlica Plo Asprela

REGIO AUTNOMA DA MADEIRA

REPBLICA PORTUGUESA

UNIO EUROPEIA FSE

Maro 2009

As informaes so arquivadas na memria as experincias so cravadas no corao Augusto Curry (2006)

Ao meu marido Duarte Aos meus filhos Tiago e Catarina

AGRADECIMENTOSExpressamos o nosso reconhecimento e gratido Senhora professora Doutora Maria Dinora Costa Cabral, que atravs da sua preciosa orientao cientfica, compreenso, empenhamento, palavras de incentivo tornou exequvel o desenvolvimento desta investigao. Irm Maria Berta Fonseca Soares Directora da Escola Superior de Enfermagem S. Jos de Cluny por todo o apoio e estimulo proporcionado ao longo desta caminhada. equipa docente do 2 ano do Curso de Enfermagem da Escola Superior de Enfermagem So Jos de Cluny, pelo incentivo e apoio que foi imprescindvel para a concluso deste estudo. Ao Professor Jos Manuel Marques pela colaborao dada no tratamento estatstico. s Professoras Clara Sales Correia, Luz Chaves, Mercia Bettencourt e Ressurreio Carvalho, que se disponibilizaram para validar o instrumento de colheita de dados. Professora Luz Chaves, pela colaborao fornecida durante a colheita de dados. Professora Tnia Loureno, pela ajuda cedida durante o desenvolvimento da fase metodolgica e opinies e discusses sempre oportunas. Professora Rita Figueiredo pela disponibilidade demonstrada durante a formatao do trabalho. Aos Enfermeiros das Unidades de Cirurgia Geral do Hospital Central do Funchal, pela forma calorosa como nos acolheram nos servios e pela sua ajuda. A minha irm, Antnia, ao meu amigo, Emanuel pelos seus preciosos contributos nas tradues e verificao do Portugus. Aos utentes que participaram nesta investigao, cuja disponibilidade tornou vivel a sua realizao.

Aos meus pais e sogros pelo carinho, compreenso e palavras encorajadoras que sempre manifestaram, durante o desenvolvimento deste estudo. Aos meus filhos, Tiago e Catarina, para quem no estive to disponvel e ao meu marido, Duarte, pela pacincia e compreenso que tornaram mais fcil a difcil tarefa de chegar ao fim desta etapa da minha vida.

A todos o meu sincero muito Obrigado

RESUMOA enfermagem como actividade humana muito complexa e desempenha um papel importante na satisfao das necessidades dos doentes, peculiarmente as necessidades de informao, quando estes so confrontados com a possibilidade de serem submetidos a uma interveno cirrgica. incontestvel, a mais-valia proporcionada pelo conhecimento da perspectiva do doente para a prestao de cuidados de excelncia. Assim, este estudo teve como objecto o tema: O Doente Cirrgico No Perodo Pr-operatrio: Da Informao Recebida s Necessidades Expressas e pretendeu especificamente: descrever qual a informao recebida, o conhecimento e as necessidades de informao expressas pelo doente cirrgico sobre a preparao properatria, durante o internamento, nas unidades de cirurgia geral do Hospital Central do Funchal. O percurso metodolgico utilizado foi a abordagem quantitativa, sendo o estudo de carcter exploratrio e descritivo. A tcnica utilizada para a colheita de dados foi o questionrio com entrevista. Os participantes da investigao foram 96 doentes, sendo a nossa amostra probabilstica acidental. Como principais concluses, de salientar que relativamente varivel Informao recebida pelo doente cirrgico sobre a preparao pr-operatria, os inquiridos revelaram possuir, na dimenso do procedimento cirrgico, uma informao razovel e na dimenso sensorial e comportamental, insuficiente. No que concerne varivel Conhecimento do doente cirrgico sobre a preparao pr-operatria, os doentes evidenciaram possuir um nvel suficiente de conhecimento sobre o procedimento cirrgico e sobre os aspectos de carcter sensorial, e reduzido ao nvel comportamental. Ao nvel da varivel Necessidades de informao expressas pelo doente cirrgico sobre a preparao pr-operatria, a necessidade de informao foi elevada nas trs dimenses: procedimento cirrgico, sensorial e comportamental. Em termos globais, constatmos que os doentes receberam pouca informao sobre a preparao pr-operatria, que evidenciaram pouco conhecimento sobre estes temas e que a maioria necessita de mais informao.

Tambm, aferimos que os doentes mais velhos tenderam a referir menor informao recebida; os doentes com nvel socioeconmico mais elevado tenderam a evidenciar mais conhecimentos; que a experincia anterior de interveno cirrgica no influenciou significativamente a informao recebida, o conhecimento ou a necessidade de informao; e os inquiridos que receberam visita pr-operatria tenderam a referir mais quantidade de informao recebida Apresentamos algumas sugestes/propostas para a prtica de enfermagem, ensino e investigao, entre os quais: que se realize formaes em servio e que se promova encontros de reflexo sobre esta temtica; a implementao de uma consulta de enfermagem pr-operatria, assim como um programa de informao estruturado; proporcionar, aos alunos de enfermagem, momentos de reflexo em sala de aula e nos ensinos clnicos sobre este assunto; realizar outros estudos, sobre o mesmo tema, mas de natureza qualitativa e ainda, o desenvolvimento de um trabalho semelhante aos doentes submetidos a cirurgia de urgncia. Palavras-chave: Preparao Pr-Operatria, Informao, Conhecimento,

Necessidades, Procedimento Cirrgico, Aspectos Sensoriais E Comportamentais.

ABSTRACTAs an human activity, the nursing is very complex and plays an important role in satisfying the patients needs, peculiarly the needs for information, when they are confronted with the possibility to be submitted to a surgical intervention. It is undisputed the gain provided by the patient knowledge for providing excellence cares. Thus, this study had as object the theme: The Surgical Patient in the PreOperative Period: From the Received Information the Expressed Needs and intended specifically: to describe which information received, the knowledge and the expressed needs of information expressed by the surgical patient about a pre-operative preparation, during the internment, in the general surgery units of Hospital Central do Funchal. The methodological procedure used was the quantitative approach, whereas the study had an exploratory and descriptive nature. The technique used for the harvest of data was the questionnaire with interview. The participants of the inquiry were 96 patients, being our sample an accidental probabilistic one. As main conclusions, it is to point out that relatively to the variable Information received by the surgical patient about the pre-operative preparation the inquiries revelled to possess reasonable information in the dimension of the surgical procedure, and, in insufficient one in the sensorial and behavioural dimension. As far as variable Surgical patient knowledge about the pre-operation preparation, patients have reveled to possess an enough level of knowledge about the surgical procedure and about the aspects of the sensorial domain, and a reduced one on the compartmental. As far as the variable Information needs expressed by the surgical patients for pre-operative preparation, the need for information was high in the three dimensions: surgical, sensorial and behavioural. In global terms, we evidenced that patients have received little information about pre- operative preparation, showed modest knowledge about these issues and that the majority needs more information. Furthermore, we evidenced that the older patients tended to refer little information received; the patients with a higher social-economical status tended to show more knowledge; that the previous surgical intervention experience did not significantly

influence the received information, the knowledge or the need for information; the inquiries that have received pre-operative visits tended to refer the higher quantity of received information. We present some suggestions/proposals to the nursery practice, learning and investigation, among which: carrying out learning while in duty and promoting meetings to meditate upon this theme; the implementation of a pre-operative nursing appointment, as well as a structured information programme; providing nursing students moments to reflect, in their classrooms and in clinical practice on this matter, accomplishing of other studies about the same theme, but of qualitative nature and also, the development of a resembling work undertaken to patients under emergency surgery. Key-words: Pre-Operative Preparation, Information, Knowledge, Necessities, Surgical Procedure, Sensorial and Behavioural Aspects.

NDICE

INTRODUO .............................................................................................................21 1 CONTEXTUALIZAO DO PROBLEMA .......................................................25 2- QUADRO DE REFERNCIAS ..............................................................................37 2.1 Cuidar em contexto cirrgico .............................................................................37 2.2 A Enfermagem no perodo pr-operatrio ........................................................41 2.2.1- A preparao pr-operatria do doente cirrgico .................................................45 2.3 - Necessidades humanas bsicas ............................................................................52 2.4 Necessidade/ direito informao do doente cirrgico ....................................60 2.4.1- A informao ........................................................................................................65 2.4.2 Consentimento informado numa perspectiva cirrgica.......................................66 2.5 Benefcios de um programa de informao pr-operatria .............................70 3 DESENHO DA INVESTIGAO ........................................................................77 3.1- Tipo de Estudo .......................................................................................................77 3.2- Variveis .................................................................................................................78 3.3- Operacionalizao das variveis ..........................................................................79 3.3.1- Variveis de atributo e sua categorizao.............................................................80 3.3.2- Varivel em estudo e a sua operacionalizao......................................................85 3.5- Amostra...................................................................................................................90 3.6- Instrumento de Colheita de Dados .......................................................................92 3.6.1- Validao do questionrio ....................................................................................94 3.6.2- Pr-teste ...............................................................................................................95 3.6.3 - Questionrio.........................................................................................................96 3.7- Procedimento de Colheita de dados ...................................................................108 3.8- Aspectos ticos.....................................................................................................110 3.9- Tratamento estatstico dos Dados.......................................................................111

4- ANLISE E APRESENTAO DOS DADOS/ RESULTADOS ..................... 115 4.1- Anlise e apresentao descritiva....................................................................... 115 4.2- Anlise e apresentao inferencial ..................................................................... 134 5 - DISCUSSO DOS RESULTADOS ..................................................................... 141 6- CONCLUSES....................................................................................................... 155 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...................................................................... 165 ANEXOS.. ........................................................................................................ 173 ANEXO I Questionrio................................................................................................ 175 ANEXO II - Pedido oficial ao Sr. Presidente do Conselho de Administrao do Hospital Central do Funchal ...................................................................................... 193 ANEXO III - Resposta do Conselho de Administrao do Hospital Central do Funchal, autorizando a realizao da colheita de dados ............................................ 197 ANEXO IV - Consentimento informado ...................................................................... 202

NDICE DE FIGURASFigura n 1 Proposta de Modelo de Preparao do Doente Cirrgico no Perodo PrOperatrio ..................................................................................................49 Figura n 2 Hierarquia das Necessidades .....................................................................56 Figura n 3 Informao e Envolvimento: needs iceberg...........................................70 Figura n4 Principais Resultados da Investigao .....................................................149

NDICE DE QUADROSQuadro n1 Escala de Graffar.......................................................................................82 Quadro n 2 Variveis, Dimenses e Indicadores ........................................................88 Quadro n 3 Resultados do teste de normalidade.......................................................112 Quadro n4 Doentes cirrgicos segundo as caractersticas scio-demogrficas........116 Quadro n 5 Doentes cirrgicos segundo os dados relativos cirurgia .....................117 Quadro n 6 Doentes segundo a informao recebida, conhecimento e necessidade de informao sobre procedimento cirrgico (consentimento informado e avaliao pr-operatria).......................................................................118 Quadro n8 Doentes segundo a informao recebida, conhecimento e necessidade de informao sobre procedimento cirrgico (visita pr-anestsica e acompanhamento para o bloco operatrio) ...........................................121 Quadro n 9 Doentes segundo a informao recebida, conhecimento e necessidade de informao sobre procedimento cirrgico (permanncia no bloco operatrio, antes da cirurgia e sala de cuidados ps-anestsicos).........123 Quadro n 10 Doentes segundo a informao recebida, conhecimento e necessidade de informao sobre procedimento cirrgico (visitas no ps-operatrio e dispositivos) ..........................................................................................125 Quadro n11 Doentes segundo a informao recebida, conhecimento e necessidade de informao sobre procedimento cirrgico (mtodos de controlo da dor e condies para alta)...............................................................................127 Quadro n 12 Doentes segundo a informao recebida, conhecimento e necessidade de informao de carcter sensorial (efeitos da medicao e ambiente da sala operatria) ......................................................................................129 Quadro n 13 Doentes segundo a informao recebida, conhecimento e necessidade de informao de carcter sensorial (sensaes no primeiro levante e sensaes associadas aos dispositivos) .................................................130 Quadro n14 Doentes segundo a informao recebida, conhecimento e necessidade de informao de carcter comportamental (principais exerccios para preveno das complicaes respiratrias no ps-operatrio)..............131

Quadro n15 Doentes segundo a informao recebida, conhecimento e necessidade de informao de carcter comportamental (principais exerccios para a preveno das complicaes circulatrias no ps-operatrio).............. 132 Quadro n 16 Doentes cirrgicos segundo as principais fontes de informao e de conhecimento ........................................................................................ 133 Quadro n17 Medidas descritivas referentes avaliao da informao recebida, conhecimento e necessidade de informao ......................................... 134 Quadro n18 Correlao da informao recebida, conhecimento e necessidade de informao com a idade ........................................................................ 135 Quadro n19 Comparao da informao recebida, conhecimento e necessidade de informao em funo do nvel socioeconmico.................................. 136 Quadro n20 Comparao da informao recebida, conhecimento e necessidade de informao em funo da experincia cirrgica anterior...................... 138 Quadro n 21 Comparao da informao recebida, conhecimento e necessidade de informao em funo da visita pr-operatria..................................... 139

CHAVE DE SIGLASCIPE Classificao Internacional da Prtica de Enfermagemx - Mdia aritmtica

x p - Mdia dos postos

% - Frequncia relativa2 - Valor do teste Kruskal-Wallis

E.V Endovenosa Mx Valor mximo Md Mediana Min Valor mnimo Mo Moda n Frequncia absoluta p Significncia rs Correlao de Spearman s - Desvio padro SPSS - Statistical Package for the Social Science z Valor dos testes: Kolmogorov-Smirnov e U de Mann-Whitney - Alpha de Cronbach

INTRODUO

Nos ltimos anos os enfermeiros tm dedicado muito do seu tempo e ateno investigao em enfermagem, historicamente remonta segunda metade do sculo XIX com os ideais de Florence Nightingale. A investigao essencial cincia de enfermagem, assim como a todas as reas profissionais, para o desenvolvimento de um suporte cientfico que sirva de orientao para a prtica e para a sua creditao. Fortin (2003) afirma que nenhuma profisso ter um desenvolvimento contnuo sem o contributo da investigao (p.18). Esta autora ressalta que parte integrante das funes dos enfermeiros, independentemente do seu nvel de formao, a sua actualizao permanente e participao no desenvolvimento das concepes da profisso. A cincia de enfermagem, ao longo dos tempos foi influenciada por diversos factores, desenvolvendo-se ao ritmo das grandes correntes do pensamento, que foram fundamentais para a evoluo dos conhecimentos. De acordo com Barros, Barreto, Braga e Veloso (1997), a forma particular como a enfermagem relaciona os conceitos, cuidado, pessoa, sade e meio ambiente circunscreve o domnio da responsabilidade dos enfermeiros e clarifica o seu campo de actuao (p.9). O enfermeiro no exerccio da sua actividade profissional, munido de um corpo de conhecimentos cientficos, tem o dever de desenvolver competncias que lhe permitem assistir e cuidar do doente de forma holstica e personalizada, quando este ameaado na sua integridade nomeadamente na experincia cirrgica. Este acontecimento, na vida do homem, traduz uma alterao do seu curso normal, sendo fundamental que o enfermeiro coloque em prtica os seus saberes com o objectivo de assegurar a satisfao das necessidades das pessoas. Segundo Barros et al (1997), com o aproximar do terceiro milnio o cuidar s pode ser entendido como um cuidar cientfico, onde no haja espao para a rotina irresponsvel, o fazer por fazer, a irreflexo, o domnio da tcnica sobre outras dimenses da pessoa doente (p.8). O cuidar de hoje, segundo o mesmo autor, implica inexoravelmente, a percepo da globalidade, h que reinventar os cuidados queNolia Pimenta Gomes

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INTRODUO

promovam a vida, () que restituam um sentido vida tanto daqueles que os recebem como daqueles que os prestam (p.8). A pessoa ao passar da condio de saudvel para a posio de doente, em que necessita de ser submetido a interveno cirrgica, desenvolve segundo Leito (1992) um processo carregado de forte componente emocional. Ao abandono do seu papel na sociedade e famlia junta-se a dificuldade de encarar o seu novo papel e a prpria situao (p.10). De acordo com este autor o medo do desconhecido, os sentimentos de insegurana, a dependncia, entre outros, so causa de ansiedade para o doente, sendo essencial o enfermeiro estabelecer uma relao de proximidade, tentando colmatar as necessidades de cuidados que o doente expresse, nomeadamente as de informao. elementar que a abordagem ao doente cirrgico no passe apenas pelo acto operatrio em si, mas por uma preparao mais abrangente, contemplando os aspectos fsicos, psicolgicos, espirituais e sociais, que so essenciais para o xito de todas as fases que compem o processo cirrgico. Alguns estudiosos tm-se debruado sobre a temtica do doente cirrgico durante o perodo perioperatrio. Durante a nossa pesquisa encontrmos alguns trabalhos desenvolvidos nesta rea nomeadamente sobre: a preparao do doente para a cirurgia, a admisso em centro cirrgico, humanizao da assistncia de enfermagem, vivncias do doente cirrgico da cirurgia programada, prticas cuidativas numa unidade de cirurgia, entre outros. Contudo, no tivemos acesso a nenhum trabalho que aprofundasse a problemtica das necessidades de informao do doente cirrgico no perodo properatrio. Consideramos, que ao identificarmos as informaes que so transmitidas ao doente sobre a preparao pr-operatria, o seu conhecimento e as suas necessidades de informao sobre este assunto, permitir reflectirmos sobre as nossas prticas dirias, contribuindo para compreendermos melhor os cuidados de enfermagem numa perspectiva holstica respeitando a individualidade de cada pessoa. Com base nestes pressupostos, da reviso bibliogrfica desenvolvida e da nossa experincia profissional de contacto com o doente cirrgico, emergiu um conjunto de inquietaes que se traduzem nas questes orientadoras da nossa pesquisa: Qual a informao recebida pelos doentes cirrgicos sobre a preparao pr-operatria? Qual o conhecimento dos doentes cirrgicos sobre a preparao pr-operatria? Quais as necessidades de informao expressas pelo doente cirrgico sobre a preparao properatria? 22Nolia Pimenta Gomes

INTRODUO

Assim, no mbito do Mestrado em Cincias de Enfermagem, desenvolvemos a nossa dissertao sobre O Doente Cirrgico No Perodo Pr-operatrio: Da Informao Recebida s Necessidades Expressas. Com este estudo pretendemos descrever qual a informao recebida pelos doentes cirrgicos sobre a preparao properatria; descrever o conhecimento dos doentes cirrgicos sobre a preparao properatria e descrever as necessidades de informao expressas pelo doente cirrgico sobre a preparao pr-operatria. Como finalidade esperamos, que o trabalho por ns desenvolvido, contribua para a implementao de um programa de informao estruturado que satisfaa as necessidades de informao do doente cirrgico, sobre os cuidados de enfermagem, inerentes a preparao pr-operatria e contribua para adequar o ensino de enfermagem s reais necessidades de informao do doente. Tendo em conta os objectivos do nosso trabalho, utilizaremos a metodologia quantitativa, sendo a nossa investigao descritiva e exploratria. A nossa populao contemplou os doentes internados nos servios de cirurgia geral do Hospital Central do Funchal, durante os meses de Abril e Maio de 2008 e que ostentavam os critrios pr estabelecidos. Atendendo, as concepes defendidas por vrios autores, particularmente Fortin (2003), apresentamos a nossa investigao organizada em trs fases: conceptual, metodolgica e emprica. Na fase conceptual, contextualizamos o nosso problema de investigao com a explorao do tema a investigar. Tambm, abordamos os conceitos pertinentes para este estudo, tendo por base a pesquisa efectuada e o parecer dos vrios autores consultados. Na fase metodolgica, apresentamos o percurso efectuado ao longo da investigao incluindo o tipo de estudo, as variveis, a populao, a amostra, o instrumento de colheita de dados, os procedimentos utilizados na colheita dos dados, os aspectos ticos e a forma como os dados foram tratados. No que concerne a ltima fase, efectuamos a anlise e apresentao dos dados assim como a interpretao dos mesmos luz da fundamentao terica apresentada nas fases precedentes. Ao concluirmos, a nossa investigao efectuamos uma reflexo dos contedos desenvolvidos e apresentamos as principais concluses, limitaes, sugestes entre outros aspectos do nosso estudo.

Nolia Pimenta Gomes

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1 CONTEXTUALIZAO DO PROBLEMA

A prtica de enfermagem baseia-se no conhecimento da enfermagem assim como de outras disciplinas, como a psicologia, a biologia, a filosofia e a sociologia. Dentro de cada uma das disciplinas, incluindo a enfermagem, h perspectivas muito diferentes que ajudam a prever e a explicar os fenmenos. Segundo Silva (1995), entre outros autores consultados, as concepes tericas iniciais na enfermagem foram desenvolvidas por Florence Nightingale no final do sculo XIX e revistas no incio do sculo XX. A natureza do conhecimento em enfermagem, desenvolvido por Nightingale, destaca-se pelas suas bases profundamente humansticas. Os estudiosos da cincia de Enfermagem, atravs do desenvolvimento de perspectivas tericas, tm tentado fornecer uma estrutura que oriente os cuidados de enfermagem numa perspectiva cientfica e consequentemente o desenvolvimento da disciplina. A maioria demonstra uma preocupao bsica pelo ser humano, pelo meio ambiente, pela enfermagem e pela sade. Silva (1995) salienta que Florence Nightingale no explicitou o termo ser humano no seu sistema conceptual, no entanto, est implcito a viso da individualidade, singularidade, originalidade e totalidade deste ser com atributos e potencialidades fsicas, intelectual, emocional, social e espiritual (p.46). O termo meio ambiente no aparece nos escritos de Florence Nightingale, no entanto, enfatizou os conceitos de ventilao, calor, luz, dieta, silncio, bem como, boas condies sanitrias, como principais componentes do ambiente (Silva, 1995,p.47). Florence Nightingale destacou a influncia do meio ambiente na vida e na sade dos seres humanos pois, o ser humano e o ambiente esto inter relacionados e, portanto, cada um afecta o outro. Em 1995, Silva tambm refere que Florence Nightingale no deu primazia sade/doena mas sim, ao ser humano sadio ou doente. Nas palavras da autora, a condio de ser saudvel requer equilbrio entre as influncias ambientais, o estilo deNolia Pimenta Gomes

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CONTEXTUALIZAO

vida e as vrias potencialidades da natureza humana (p.48). A enfermagem foi entendida por Florence Nightingale como uma arte e uma cincia que requer uma educao formal, organizada e cientfica. A arte da enfermagem Nightingaliana consiste no cuidar tanto dos seres humanos sadios como doentes (Silva, 1995, p.48). Desde que existimos, temos a necessidade de sermos cuidados e da que nasce a necessidade de cuidar dos outros. Collire (1989) refere que:Cuidar um acto individual que prestamos a ns prprios, desde que adquirimos autonomia mas , igualmente, um acto de reciprocidade que somos levados a prestar a toda a pessoa que, temporria ou definitivamente, tem necessidade de ajuda para assumir as suas necessidades vitais. (p.236)

Ao longo dos tempos, a enfermagem cirrgica tem, progressivamente, evoludo dando maior nfase ao atendimento holstico da pessoa para a satisfao das suas necessidades em substituio de uma interveno exclusivamente tcnica. Nesta linha de pensamento, Cabral (2004) refere que Virgnia Henderson (1966) considera o indivduo completo, inteiro e independente quando as suas necessidades fundamentais so satisfeitas. As necessidades so, por ela definidas como requisitos ou exigncias de que precisa e no a falta de algo; considerando assim as necessidades como algo positivo (Cabral, 2004, p.123) que tem em conta os aspectos fsicos, biolgicos, psicolgicos, sociolgicos e espirituais da pessoa. As necessidades variam de indivduo para indivduo, pois cada pessoa considerada um ser singular e nico, logo a forma de satisfazer cada uma das necessidades pessoal e individual. Tambm Watson (1985) no seu modelo terico, d ateno especial a satisfao das necessidades da pessoa. Esta autora identificou e props dez factores elucidativos dos cuidados, que constituem um fundamento, sobre o qual as enfermeiras podem estudar a cincia do human care, devendo utiliz-los na prestao de cuidados. De acordo com a autora, o seu modelo pode ser aplicado a todas as reas, nomeadamente na vertente dos cuidados de enfermagem ao doente cirrgico, no qual a satisfao das necessidades humanas bsicas constitui um dos factores importantes para a cincia do cuidar. A hierarquizao das necessidades preconizadas por Watson (1985) integrou algumas necessidades humanas bsicas, includas na classificao de Maslow, por t-las considerado fundamentais. A autora acrescenta que essencial que os enfermeiros 26Nolia Pimenta Gomes

CONTEXTUALIZAO

tenham um conhecimento profundo destas necessidades para melhor se conhecerem e se aceitarem a si prprios, condio necessria para cuidar do Outro. A temtica das necessidades humanas bsicas tem sido alvo de pesquisa e anlise de alguns estudiosos. Entre eles destacamos Virginia Henderson, Jean Watson no deixando de fazer referencia a teoria de Abraham Maslow, conhecida como uma das mais importantes teorias da motivao segundo a qual as:Necessidades humanas esto organizadas e dispostas em nveis, numa hierarquia de importncia e de influncia, numa pirmide, em cuja base esto as necessidades mais baixas (necessidades fisiolgicas) e no topo, as necessidades mais elevadas (as necessidades de auto realizao). (Serrano 2006, s.p)

A pessoa, quando se encontra numa situao de doena / dependncia, necessita de algum que tenha conhecimentos e que consiga dar resposta s suas necessidades, que naquele momento no podem ser satisfeitas. O profissional de enfermagem tem um papel fulcral nesta rea porque a doena geralmente interrompe a habilidade para atender s necessidades em diferentes nveis (Potter & Perry, 1999, p.442). Tambm, Lpez e Redondo de la Cruz (1998) partilham desta opinio, afirmando que o indivduo doente tende a sentir-se indefeso e a abandonar as suas obrigaes e responsabilidades (p.10). Temos conscincia que a hospitalizao e particularmente uma interveno cirrgica, constitui de vrias formas, uma ameaa pessoa na sua identidade. Quando um indivduo est hospitalizado, existe uma ruptura com o seu ambiente habitual, que modifica os seus costumes, os seus hbitos e, em geral, a sua capacidade de autorealizao e de cuidado pessoal (Lpez & Redondo de la Cruz, 1998, p.9). Comungando deste pensamento Fernandes e Venncio (2004) afirmam que a hospitalizao e nomeadamente a experincia cirrgica, surgem na vida do homem como um factor adverso (p.4). Leito (1992), Cruz e Varela (2002), Silva (2002) e Bellman (2003) partilham da opinio que o enfermeiro desempenha no perodo cirrgico um papel fundamental. Este surge da obrigatoriedade de oferecer ao doente um cuidado autntico com valorizao, particularizada, da sua situao assim como das suas preocupaes, medos e necessidades. O enfermeiro, integrado na equipa multidisciplinar da unidade de cirurgia, desempenha funes especficas e definidas, cujo objectivo comum cuidar com qualidade, atendendo o doente como um todo, com todas as suas necessidades fsicas, psicolgicas e espirituais (Pinheiro, 1993, p.6).Nolia Pimenta Gomes

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imperativo investir nos saberes relacionados com o ser humano, atendendo s suas realidades, vivncias, sentimentos, pensamentos e necessidades pois, como refere Fernandes et al (2004), a cirurgia afecta a homeostasia do indivduo, assim o enfermeiro na relao que estabelece com este tende desde o incio a promover o restabelecimento da independncia, indo de encontro as suas necessidades (p.7). Tambm Leito (1992) da opinio que a cirurgia, programada ou no, surge na vida do indivduo como um factor desfavorvel, provocando desequilbrios fisiolgicos, psicolgicos e mesmo scio-familiares. Daqui, podemos depreender que essencial a ateno e apoio proporcionado pelo enfermeiro nestas circunstncias em que o doente habitualmente se encontra em estado de alerta, tentando captar algo que esteja interferindo ou que possa interferir em todo o processo cirrgico. imprescindvel, no perodo pr-operatrio, informar o doente sobre os acontecimentos do perioperatrio de forma a apaziguar os seus medos, receios, angstias, atendendo s suas necessidades naquele momento. Neste sentido, Melo (2005) ressalta que necessrio distinguir entre as necessidades que so expressas pela pessoa que a pede e as normativas, ou seja, as consideradas desejveis por um indivduo, grupo ou sociedade (p.54). Assim sendo, a informao deve ser direccionada para o doente em questo, para que seja eficaz. Contudo, existem vrios aspectos que so essenciais focar: o que ir acontecer informao de procedimento; como se ir sentir informao sensorial; o que poder fazer para lidar com a situao estratgias () (Melo, 2005, p.61). Nesta linha de pensamento Miller e Mangan citado por Melo (2005), aludem que podemos encontrar dois tipos de indivduos os: monitors e os blunters. Do monitors espera-se () que ao aguardar uma cirurgia procure o mximo de conhecimento sobre a situao, do blunte, em contraste, que tente afastar esta ideia da sua cabea, procurando evitar qualquer informao relevante (p.66). Assim, a informao a transmitir deve ser congruente, convergindo com o que os indivduos desejam e de acordo com as suas caractersticas individuais. Consequentemente, estamos a contribuir para a excelncia dos cuidados, tornando-os personalizados e humanizados. Melo (2005) defende que a informao que os doentes obtm nem sempre a mais adequada e que, mant-los informados, de acordo com as suas caractersticas pessoais, ser talvez, a resposta mais ajustada (p.53). Neste contexto Woodward e Walson citados por Melo (2005) revelam que as pessoas idosas, regra geral e em contraste com os jovens, preferem que seja o tcnico de sade a tomar as decises por eles, pois depositam toda a confiana nestes profissionais. 28Nolia Pimenta Gomes

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Segundo a nossa experincia profissional, patente a necessidade de informao que o doente manifesta, quando internado para ser submetido a uma interveno cirrgica. O doente cirrgico no pr-operatrio, manifesta preocupao com o desenrolar de todo o processo cirrgico, principalmente com os cuidados de enfermagem que ir necessitar; com seu grau de dependncia aps a interveno cirrgica; com as sondas com que pode ficar; com as dores que poder sentir; com o tempo de repouso no leito; com o primeiro levante, e com o perodo que ir necessitar para retomar a sua vida diria. Por outro lado, encontramos doentes que, embora apreensivos, no revelam grande interesse em saber o que ir acontecer, constituindo estes uma minoria. De acordo com Santos e Caberlon citados por Paula e Carvalho (1997), a preocupao maior envolvendo o paciente cirrgico decorre da obscuridade das informaes, englobando aspectos inerentes ao procedimento cirrgico (p.35). Para Brunner e Suddarth (1993), os cuidados de enfermagem ao doente cirrgico iniciam-se desde que dada a informao ao doente que ir ser submetido a interveno cirrgica e estende-se durante todo o perodo pr-operatrio, fase operatria, recuperao da anestesia e durante a convalescena. A temtica das necessidades de informao do doente cirrgico, no pr-operatrio, constitui para ns uma inquietao que advm das constataes que efectuamos ao longo dos anos, durante a prestao de cuidados e mais recentemente, na docncia, quando orientamos alunos em ensino clnico. O nosso estudo ir incidir no perodo pr-operatrio, por o considerarmos primordial para o sucesso da interveno cirrgica e recuperao do doente. Pitrez e Pioner (1999) referem que o cumprimento das etapas que fazem parte do perodo properatrio (diagnstico da doena, avaliao do estado do doente e preparao para a cirurgia), proporciona ao doente e aos profissionais a segurana de uma resposta adequada ao trauma cirrgico, acompanhada de uma evoluo clnica ps-operatria normal (p.19). Sorensen e Luckmann (1998) definem o perodo pr-operatrio como tendo incio no momento em que a cirurgia planeada, terminando quando o doente transferido para o bloco operatrio. Normalmente, o perodo pr-operatrio constitudo por duas fases: pr-operatrio mediato, que corresponde a dias, meses ou anos e pr-operatrio imediato, que corresponde s vinte e quatro horas que antecedem o acto cirrgico.Nolia Pimenta Gomes

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Habitualmente, o doente submetido a cirurgia electiva hospitalizado na vspera da interveno, ou seja, no perodo pr-operatrio imediato. Nesta fase, o doente entra em contacto directo com a equipa que ir lhe prestar cuidados durante o perodo perioperatrio e -lhe transmitida informao sobre os cuidados que compreendem todo o processo cirrgico. Graham (2003) salienta que os doentes internados no properatrio imediato tm muito pouco tempo para receber orientaes e assimil-las. Seria correcto pensar que nesta fase o doente j apresentasse conhecimentos sobre os procedimentos a decorrer. No entanto, de referir que esta prtica no se sucede na nossa regio nem na maioria dos hospitais do Pas. O que se verifica que uma boa percentagem dos utentes chega ao hospital com nenhuma ou pouca informao quer sobre a sua situao concreta quer sobre os acontecimentos que o aguardam (Cerejo, 2000, p.29). Vrios estudos realizados sobre doentes submetidos a uma interveno cirrgica, relatam o impacto positivo da transmisso de informao no pr-operatrio. Johnston, citado por Melo (2005), apurou que a informao pode: influenciar a recuperao; reduzir o internamento, a ansiedade, os nveis de dor e, consequentemente, a ingesto de analgsicos (p.68). Tambm Young e Humphrey, referenciados por Melo (2005), verificaram uma reduo do sofrimento e do tempo de permanncia no hospital (p.68), quando os doentes receberam informao inerente ao seu internamento. Similarmente Garretson (2004) numa pesquisa que efectuou sobre Benefits of properative informacion programmes, apurou alguns benefcios de proporcionar informaes sobre a preparao pr-operatria, das quais inclui o decrscimo da durao da estadia, a menor necessidade de utilizao de analgsicos no ps-operatrio e o aumento da satisfao do paciente. Paralelamente ao que foi referido anteriormente, crucial que o enfermeiro avalie os conhecimentos do doente sobre a sua situao actual, de forma a adequar as informaes a transmitir e valide os conhecimentos do doente, aps a transmisso da informao, para assim garantir que a mensagem foi compreendida. De acordo com Potter e Perry (2006), avaliar os conhecimentos do doente permitenos determinar a capacidade de aprendizagem e compreenso do que lhe foi transmitido. Segundo estes autores, podemos avaliar os conhecimentos do doente perguntando-lhe o que sabe sobre a doena ou a causa do internamento, entre outros aspectos. Parafraseando Melo (2005), os doentes precisam de mais conhecimentos para tomar uma deciso do que aquela que lhe fornecida pelos servios de sade (p.65).

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Da reviso bibliogrfica que efectuamos, cruzmo-nos com vrios estudos desenvolvidos por enfermeiros e outros tcnicos de sade direccionados para o doente cirrgico constatando que uma das maiores necessidades do doente, durante o properatrio, a informao, sendo esta essencial e primordial para a recuperao e sucesso de todo o processo cirrgico. Neves (1998), realizou um estudo sobre Prticas cuidativas numa unidade de cirurgia/ significado contextual para os doentes no mbito da aquisio do grau de Mestre em Cincias de Enfermagem, cujo objectivo foi determinar o significado, em contexto natural, que os doentes atribuem s praticas cuidativas dos enfermeiros de que so utentes, numa unidade de cirurgia. De acordo com Neves (1998), os doentes cirrgicos que participaram neste estudo nem sempre receberam, dos enfermeiros, os cuidados que esperavam e que lhes era significativo. Na maioria dos casos, e em termos globais, os doentes foram alvo de bons cuidados de enfermagem. Contudo, acham que houve um dfice de informao associado a vrios procedimentos, dos quais podemos destacar a preparao properatria; o tipo de cirurgia a que iam ser submetidos; possveis efeitos da anestesia e precocidade do primeiro levante. A autora do trabalho menciona que da anlise dos dados emergiram dois temas culturais: fazem com simpatia e tratam mas no explicam (p.8). Cerejo (2000) tambm efectuou um trabalho na rea do doente cirrgico, intitulado: Impacto de um programa de informao estruturada na recuperao psoperatria para obteno do grau de Mestre, cujo principal objectivo foi verificar qual o impacto de um programa de informao estruturado, no restabelecimento do doente aps cirurgia. O programa foi aplicado a 28 doentes, grupo experimental, que iriam ser submetidos a cirurgia electiva, institudo no pr-operatrio imediato e avaliado no ps-operatrio imediato. Para o controlo do efeito do programa, a autora utilizou dois grupos de comparao; grupo experimental I, constitudo por 27 doentes, sendo ministrada uma interveno placebo; e grupo de controlo constitudo por 31 doentes ao qual no foi efectuada qualquer interveno na rea da comunicao. Das concluses que Cerejo (2000) obteve de realar que a recuperao ps-operatria foi melhor nos doentes do grupo experimental (media de 25.75) junto dos quais os enfermeiros desenvolveram um programa de ensino estruturado, com informaes relativas aos cuidados pr e ps operatrio; enquanto no grupo experimental I a media foi de 23.26 e no grupo deNolia Pimenta Gomes

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controlo 21.42. Com base nos resultados obtidos, a autora do estudo concluiu que a interveno estruturada surtiu efeito na recuperao do doente. Por seu lado Silva (2002) desenvolveu um estudo sobre Vivncias do Doente Cirrgico no Perioperatrio da Cirurgia Programada para aquisio do grau de Mestre em Cincias de Enfermagem, sendo o objectivo do trabalho compreender as vivncias do doente cirrgico no perioperatrio da cirurgia programada, partindo da questo Qual a Estrutura do Fenmeno do Perioperatrio da Cirurgia Programada? A metodologia utilizada foi qualitativa com abordagem fenomenolgica. Atravs dos resultados desta investigao verificou-se existir uma disparidade significativa relativamente ao tipo de emoes e sentimentos vividos pelo doente nas trs fases que compem o perioperatrio, ou seja, no pr e intra-operatrio sobressaram as vivncias relacionadas com a componente emocional, enquanto que no ps-operatrio foi mais evidente as vivncias relacionadas com a componente fisiolgica. Silva (2002) salienta que alguns participantes foram crticos relativamente a alguns aspectos que falharam e aos quais, os enfermeiros devem dar o mximo de ateno, nomeadamente informao, presena e apoio psicolgico no pr-operatrio (p.7). Atravs deste trabalho a investigadora constatou que o doente precisa de mais apoio, mais informao, mais disponibilidade para expor as suas dvidas e compreender as informaes transmitidas (p.7). Kiyohara et al (2004) efectuaram um trabalho intitulado Surgery information Reduces Anxiety In The Pre-operative Period. Este estudo teve como objectivo comparar o grau de ansiedade, no dia anterior cirurgia, entre pacientes que receberam informao sobre o seu diagnstico, cirurgia e anestesia. Para medir a ansiedade foi utilizado o inventrio de Spielberg, State-Trait Anxiety Inventory (STAI). Para uma melhor compreenso dos resultados, importa definir os termos ansiedade-estado e ansiedade-trao. Spielberg citado por Kiyohara et al (2004) alude que a ansiedade estado refere-se a uma reaco emocional transitria desencadeada por factores / episdios pontuais que desaparecem aps a resoluo da situao que a desencadeou; na ansiedade trao, as reaces que a pessoa apresenta esto relacionadas com a sua prpria personalidade / caractersticas intrnsecas, persistindo independentemente das situaes. Como principais resultados, os autores salientam que ansiedade-estado foi semelhante para homens e mulheres, enquanto que a ansiedade-trao foi maior entre mulheres. O nvel de educao no influenciou a ansiedade-estado mas mostrou-se inversamente relacionada ansiedade-trao. No que se refere ao diagnstico 91,7% dos 32Nolia Pimenta Gomes

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pacientes revelou conhecimento, enquanto que em relao

cirurgia e anestesia

apresentaram uma percentagem de 75% e 37,5% respectivamente. O conhecimento sobre o diagnstico e anestesia no influenciou a ansiedade-estado, no entanto, o desconhecimento da cirurgia elevou os nveis da ansiedade. Em termos de concluso, Kiyohara et al (2004) salientam que os pacientes que no possuam informao sobre a cirurgia apresentavam maior grau de ansiedade-estado, ou seja, quanto maior for o conhecimento sobre a cirurgia, menor sero os nveis de ansiedade-estado. Este estudo alerta para a necessidade de preparar adequadamente o doente no perodo properatrio, nomeadamente, fornecendo informaes sobre o seu diagnstico, cirurgia e anestesia com o intuito de reduzir a ansiedade, contribuindo desta forma para uma melhor recuperao no ps-operatrio. Nesta linha de pensamento, Melo (2005) reala que os doentes informados sobre a sua situao clnica tendem a aderir mais, ao tratamento com repercusses positivas, no s a nvel do doente, mas tambm a nvel do prprio funcionamento do servio (p.14). Neste mbito, a autora supracitada realizou um estudo em que investigou o Impacto da informao em doentes internados para serem submetidos a uma interveno cirrgica. Como objectivos, a autora delineou: examinar o contedo da informao (clnica, diagnstico e cirurgia) que transmitida aos doentes hospitalizados que foram sujeitos a uma interveno cirrgica; analisar o impacto psicolgico causado por esta informao; identificar disposies individuais, estilo de coping monitoring versus blunting e ainda, examinar o impacto da informao sobre estes indivduos a nvel da satisfao e da ansiedade. Os resultados deste estudo demonstraram que a maioria dos doentes possua um dfice de informao factual sobre a sua situao clnica (92 indivduos (56.1%) face ao diagnstico e 103 indivduos (62.8%) face cirurgia). No entanto, os que se encontravam informados manifestaram um maior nvel de satisfao e um menor nvel de ansiedade (82 indivduos (50%) face ao diagnstico e 70 indivduos (42.7%) em relao a cirurgia). Os resultados encontrados comprovam que os doentes com estilo de coping monitoring mais informados sobre a sua situao clnica, diagnstico e cirurgia manifestam um maior nvel de satisfao face informao fornecida e um menor nvel de ansiedade, durante o perodo de internamento hospitalar (Melo, 2005,p.140). Em relao aos doentes que apresentavam um estilo de coping blunting, atravs dos dados colhidos, no foi possvel comprovar que os mais informados sobre a suaNolia Pimenta Gomes

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situao clnica, diagnstico e cirurgia manifestam um menor nvel de satisfao face informao e um maior nvel de ansiedade () (p.148). Ainda, Melo (2005) salienta que o fornecimento de informao constitui uma premissa na rea da sade, que por um lado resulta na necessidade de informao por parte do doente e por outro lado, da obrigatoriedade dos profissionais de sade em transmitir a informao aos doentes de forma personalizada e adequada a cada situao. Atendendo aos resultados obtidos nos estudos por ns consultados e da experincia profissional, podemos depreender que essencial reflectirmos e repensarmos nas nossas prticas de cuidados dirios, s quais, por vezes, dada maior primazia vertente tcnica dos cuidados, com algum prejuzo da componente humana e relacional. Por vezes, esquecemo-nos que o doente tem o direito informao e que esta deve ser transmitida de forma clara e adequada, permitindo assim a sua compreenso e a aquisio de conhecimento sobre o processo cirrgico. Na actualidade, como j foi mencionado anteriormente, regra geral o internamento do doente para ser submetido a uma interveno cirrgica programada acontece vinte e quatro horas antes do acto cirrgico o que compromete a preparao adequada do mesmo. Phipps, Sands e Marek (2003) aludem que dantes o ensino pr-operatrio terminava um ou dois dias antes da cirurgia. Alteraes recentes nos cuidados de sade tm desafiado o enfermeiro perioperatrio a implementar programas de ensino properatrio, em perodos de tempo mais curtos e locais alternativos (p.538). Perante este cenrio, o ideal seria a existncia de um programa de informao estruturado que fosse de encontro as necessidades de informao do doente cirrgico no perodo pr-operatrio. Este, poderia ser colocado em prtica atravs da interveno do enfermeiro perioperatrio, no hospital, numa consulta de enfermagem pr-operatria ou numa visita domiciliria. Sugere-se, que estas deveriam acontecer durante o properatrio mediato, proporcionando ao doente tempo suficiente para assimilar as informaes. De acordo com Cerejo (2000) a informao dirigida ao doente de forma coordenada e atempada contribui para a sua compreenso e interiorizao, sendo uma pedra basilar para o sucesso do internamento. Seria tambm crucial propiciar pessoa o contacto e conhecimento da unidade e equipa que lhe prestar cuidados durante o perioperatrio. Neste contacto, os profissionais de sade poderiam aproveitar para transmitir algumas informaes sobre o processo cirrgico e, simultaneamente, proporcionar um ambiente que contribuisse para o doente expressar as suas dvidas, angstias, incertezas, entre outros aspectos.

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Atendendo s constataes efectuadas, podemos inferir que existe uma lacuna na satisfao das necessidades de informao dos doentes cirrgicos sobre a preparao pr-operatria. Perante estas reflexes, surgiu-nos trs questes de partida: Qual a informao recebida pelos doentes cirrgicos sobre a preparao pr-operatria? Qual o conhecimento dos doentes cirrgicos sobre a preparao properatria? Quais as necessidades de informao expressas pelo doente cirrgico sobre a preparao pr-operatria? Assim, realizmos um estudo intitulado O Doente Cirrgico No Perodo Properatrio: Da Informao Recebida s Necessidades Expressas. Tendo por base os pressupostos tericos, delineamos os seguintes objectivos: Descrever qual a informao recebida pelos doentes cirrgicos sobre a preparao pr-operatria; Descrever o conhecimento dos doentes cirrgicos sobre a preparao pr-operatria; Descrever as necessidades de informao expressas pelo doente cirrgico sobre a preparao pr-operatria. Como finalidade, pretende-se que este estudo contribua para a implementao de um programa de informao estruturado que satisfaa as necessidades de informao do doente cirrgico no perodo pr-operatrio e que contribua para adequar o ensino de enfermagem s reais necessidades de informao do doente. De acordo com Melo (2005) compreender a perspectiva do doente torna-se um pr requisito indispensvel para uma boa prtica profissional (p.29). Nesta linha de ideias Silva (2002) alude que o doente deve ter a oportunidade e o direito de ser esclarecido sobre vrios aspectos que o preocupam, de acordo com as suas necessidades e no apenas naqueles aspectos que o enfermeiro julga serem importantes (p.21). Parse citado por Silva (2002) refere que o doente e no o enfermeiro, a figura autoritria e o principal tomador de decises no relacionamento (p.21).Nolia Pimenta Gomes

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Ainda, Melo (2005) alerta para a importncia e vantagens em proporcionar uma informao adequada s necessidades de cada doente. Refere que h uma maior satisfao do doente; melhor cooperao com o tratamento; reduo da ansiedade e da perturbao; recuperao mais rpida da cirurgia e estadias mais curtas no hospital (p.67). Para a elaborao deste estudo, baseamo-nos, entre muitos outros, nos seguintes autores: Watson (1985), Cerejo (2000), Silva (2002), Fortin (2003), Phipps et al (2003), Cabral (2004), Garretson (2004), e Melo (2005). No captulo seguinte, aprofundaremos os conceitos que consideramos pertinentes para uma melhor compreenso dos fenmenos em estudo.

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De acordo com Fortin (2003), o quadro de referncias representa as bases tericas ou conceptuais da investigao, as quais permitem ordenar os conceitos entre si, de maneira a descrever, explicar, ou predizer as relaes entre eles (p.89). Por seu lado Burns & Grove, citado por Fortin (2003), referem que o objectivo do quadro de referncias consiste em estruturar os elementos de um estudo, e em fornecer um contexto para a interpretao dos resultados (p.93). Assim, tendo por base os pressupostos destes autores, desenvolvemos neste captulo, os conceitos expressos no nosso problema de investigao que se refere ao Doente Cirrgico No Perodo Pr-Operatrio: Da Informao Recebida s Necessidades Expressas procurando defini-los de forma lgica e racional de modo a facilitar a compreenso do tema em estudo.

2.1 Cuidar em contexto cirrgicoParece-nos, essencial reflectir no nosso dia-a-dia sobre o termo cuidar, porque achamos, que deve ser visto como uma prtica que revele o conhecimento e a competncia do enfermeiro que presta cuidados ao doente. Segundo Collire (1989) cuidar uma das mais velhas expresses da Histria do Homem. Desde que existe vida, existem cuidados, sendo necessrio tomar conta da vida para que ela possa permanecer com qualidade, o maior espao de tempo possvel. A mesma autora refere que:Cuidar, prestar cuidados, tomar conta, , primeiro que tudo, um acto de VIDA, no sentido de que representa uma variedade infinita e actividades que visam manter, sustentar a VIDA e permitir-lhe continuar e reproduzir-se. (p. 235)

O desenvolvimento das cincias humanas e sociais por volta dos anos 50-60 influenciou, entre outras disciplinas, a Enfermagem. O Homem comeou a ser

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compreendido como um ser global, como um todo e no apenas a soma das partes que o compem. Assim, surgem novas formas de abordagem dos cuidados de Enfermagem, baseados em modelos que percepcionam o Homem como um ser holstico, em equilbrio com o meio externo e que se encontra inserido numa famlia, grupo e sociedade. Melo (2005), citando Stoudemire, salienta que a maioria das doenas, independentemente de serem fsicas ou psiquitricas, so influenciadas e determinadas por variveis biolgicas, psicolgicas e sociais, variveis que, por sua vez, influenciam a predisposio, o aparecimento, o curso e o prognstico da maioria das doenas (p.40). O enfermeiro surge aqui como algum que possui competncias para ajudar a pessoa a desenvolver as suas aptides, de forma a conseguir enfrentar a doena e promover o restabelecimento do equilbrio. Santos (1995) considera que:Cuidar requer uma relao interpessoal, que engloba comportamentos e sentimentos, tais com o assistir, o ajudar, o estar ao servio de, desenvolvendo aces de enfermagem e mostrando capacidade de empatia em relao s experincias do utente. (p. 9)

Nesta ptica, Caseiro e Pinto (2001) referem que a partilha de sentimentos, medos e alegrias podem tornar cada pessoa nica para ns e nos tornam nicos na vida daquela pessoa, isto , cuidar do outro e tambm de ns! Segundo Batalha (2001), ao enfermeiro compete-lhe cuidar do ser humano, isto , ser uma pessoa que acompanha outra que dele necessita. O mesmo autor, refere que o cuidar e a prtica dos cuidados deve situar-se para alm do modelo biomdico e o Homem deve ser entendido como um ser global inserido num meio singular. Nesta perspectiva, Cerqueira (1999) salienta que a enfermagem tem a possibilidade de cuidar do Homem na sua individualidade. Se, por um lado o cuidar a caracterstica globalizante da humanidade por outro lado, a forma de o concretizar que nos distingue uns dos outros. Este autor refere ainda que o Homem cuida porque a sua natureza cuidar, a me cuida do seu filho. O cuidar que muitos autores consideram ser a essncia da enfermagem , como salienta Watson (1985), o foco central da enfermagem.A enfermagem est preocupada em promover a sade, prevenir a doena, cuidar o doente e restaurar a sade. A enfermagem tradicional tem integrado o conhecimento biofisiolgico, como conhecimento do comportamento humano, para promover o bem-estar e cuidar do doente. No presente (como no passado), a nfase est na promoo da sade, mais do que na especializao do tratamento da doena. (p.7)

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Em consequncia deste pressuposto, Watson (1985) refora que a enfermagem interessa-se pelo conhecimento e compreenso do cuidado, o que embora complementar, diferente do conhecimento e compreenso do curar, que pertence ao campo de aco da medicina. importante criar um ambiente e um clima que sejam facilitadores da prtica de cuidados. As prticas do cuidar so uma parte integrante da excelncia no exerccio da enfermagem, sendo fundamental tornarem-se visveis. Segundo Benner (2001):As prticas crescem atravs da aprendizagem experiencial e atravs da transmisso dessa aprendizagem nos contextos de cuidados. As prticas no podem ser completamente objectivadas ou formalizadas porque elas tm sempre de ser trabalhadas em novas formas, no mbito de interaces particulares que ocorrem em momentos reais. (p.14)

Assim, o enfermeiro da unidade de cirurgia deve ter em ateno que a hospitalizao, e particularmente a experincia cirrgica, constituem um desafio ao normal funcionamento do organismo para a pessoa em qualquer momento da sua vida, ou seja, uma interrupo do processo contnuo de sade. Henderson (1994) reala que desde o momento que o doente hospitalizado, cada Enfermeiro deve questionar-se sobre os seus procedimentos habituais e sobre os aspectos que limitam a aco do indivduo na satisfao das suas necessidades bsicas. Constitui uma prioridade, propiciar um ambiente hospitalar o mais semelhante ao seu domicilio, para facilitar a adaptao a nova condio. Pois se durante demasiado tempo privarmos uma pessoa daquilo que ela mais valoriza amor, aceitao, uma ocupao til estas podem ser piores que a doena que pretendemos curar (Henderson 1994, p.17). Nestas circunstancias o doente aceita o internamento, na esperana que lhe sejam prestados cuidados de qualidade, sendo premente a necessidade de humanizar os cuidados. Segundo Vilaa (2004) o cuidar s global e completo quando a execuo de qualquer tcnica se encontra intrinsecamente ligada dimenso relacional que a suporta e lhe d sentido (p.14). A componente tica indissocivel da conduta do enfermeiro no cumprimento das suas funes. Para Queirs (2001), cuidar o ncleo central da enfermagem e desenvolvida atravs do suporte e da proteco da dignidade do doente/utente (p.18). Logo, fundamental preservar e fomentar o direito dignidade humana, que se encontra contemplado no Cdigo Deontolgico do Enfermeiro (2003) no Artigo 78. ponto n.1 as intervenes de enfermagem, so realizadas com a preocupao da defesaNolia Pimenta Gomes

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e da dignidade da pessoa humana e do enfermeiro (p.21) e o Artigo 89. refere-se a humanizao dos cuidados. Significa que a nossa interveno deve visar a qualidade dos cuidados que prestamos, atendendo o doente de forma personalizada, no seu todo, promovendo o seu conforto e minimizando o seu sofrimento, pois s assim, possvel humanizar os cuidados que prestamos no respeito pela dignidade da pessoa. Nesta linha de pensamento Osswald (2000) reala a necessidade de humanizar, colocar o doente no centro do sistema e das atenes, acolher, informar, encaminhar a pessoa doente, que nunca um caso ou um rtulo. (p.44) indiscutvel que o papel de humanizar cabe a todos os profissionais de sade, nomeadamente ao enfermeiro que tem caractersticas prprias e singular no desempenho das suas funes, razo pela qual considerado como o agente da primeira linha da humanizao. (p.45) Bellman (2003), partilhando das ideias de Osswald (2000) refere que:o papel do enfermeiro de cirurgia dinmico, multifacetado e continua a evoluir em funo de alteraes que surgem do interior da enfermagem, de politicas de servio locais e nacionais e de tecnologias em progresso acelerado. O enfermeiro de cirurgia do sculo XXI tem que ser, um praticante profissional, confiante e flexvel capaz de articular valores de enfermagem e inovar efectivamente a prestao de cuidados, em benefcio dos doentes... (p.27)

Para a enfermagem o processo de cuidar tem um enfoque importante que, segundo Watson (2002) tem o objectivo de proteger, melhorar e preservar a dignidade humana (p.55). Isto requer, por parte do enfermeiro, um envolvimento do seu todo, tanto a nvel pessoal, como social, moral e espiritual. De acordo com esta autora, todo o cuidar est relacionado com respostas humanas intersubjectivas s condies de sadedoena; um conhecimento de sade-doena, interaces ambiente-pessoa; um conhecimento do processo de cuidar; um auto-conhecimento e conhecimento das nossas capacidades e limitaes para negociar. (p.55) Silva (2002) reala que cuidar de uma pessoa que ser submetida a uma interveno cirrgica exige, por parte do enfermeiro, um conhecimento de todo o processo cirrgico, essencialmente do modo como o doente conceptualiza a cirurgia e relembra as experincias anteriores. O papel que o enfermeiro desempenha numa unidade de cirurgia crucial para o sucesso de todas as fases que compem o perodo perioperatrio, como referem Cruz e Varela (2002):a enfermeira precisa de assumir a posio de me carinhosa, compreensiva e protectora; de psicloga, na identificao, compreenso e conforto em presena de alteraes comportamentais; de assistente social, na identificao e compreenso dos problemas relativos sua

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QUADRO DE REFERNCIAS cultura e necessidades pessoais, ajudando a resolv-los. Assume at mesmo, a posio de religiosa para dar apoio espiritual assim como advogada, para defender e apoiar a pessoa de possveis intercorrncias e do prprio procedimento cirrgico. Tambm coloca-se como mensageira, mantendo o elo de ligao com a famlia do doente (p.53).

O conceito de cuidar, como pudemos constatar das descries anteriores, amplo e varia consoante a interpretao que cada autor concebe do conceito, assim como as suas crenas, valores e ideais. No entanto, unnime considerar que o cuidar a essncia e o centro da enfermagem. Nesta ptica, espera-se que os enfermeiros desenvolvam capacidades de ordem tcnica, cientfica, prtica, e tambm de ordem relacional e tica, para conseguirem dar resposta ao desafio que CUIDAR. Em seguida, efectuamos uma abordagem sobre a enfermagem perioperatria, especificamente sobre o perodo pr-operatrio e os respectivos cuidados de enfermagem que o doente necessita nesta fase.

2.2 A Enfermagem no perodo pr-operatrioAo longo dos tempos e face as mudanas socioculturais, econmicas, polticas e tecnolgicas, que se tem verificado na nossa sociedade, a Enfermagem tal como outras profisses, tem vindo a evoluir e a desenvolver o seu leque de conhecimentos, tendo como pilar o mtodo cientfico de pesquisa e a prtica da Enfermagem. Os profissionais tm a incumbncia de alargar os seus saberes, aprofundando os domnios que guiam os seus actos. imperativo a existncia de um conjunto terico de conhecimentos que oriente a formao dos profissionais e assim melhore a prestao de cuidados. Para Watson (2002) a enfermagem, na generalidade, consiste em conhecimento, pensamento, valores, filosofia, compromisso e aco, com algum grau de paixo (p.96), da que conhecermos e reflectirmos sobre os paradigmas da Enfermagem fundamental para compreendermos a natureza dos cuidados e o estado da Enfermagem actual. Krouac, Pepin, Ducharme, Duquette e Major (1994) apresentaram vrias correntes de pensamento atribuindo a designao de paradigma da categorizao, paradigma da integrao e o paradigma da transformao. O paradigma da categorizao representa os fenmenos de um modo linear e isoladamente, orientando o pensamento para a pesquisa de um factor causal, responsvel pela doena, ocorrendo mudanas como resultado de condies anteriores. Assim, os fenmenos so divisveis em categorias, classes ou grupos definidos eNolia Pimenta Gomes

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considerados elementos isolveis ou manifestaes simplificveis (Krouac et al, 1994, p. 3). A pessoa vista como um ser fragmentado e o ambiente algo que est isolado da pessoa, ou seja, a pessoa e o ambiente so duas entidades independentes. Neste paradigma, subsistem duas orientaes distintas da Enfermagem: uma centrada na sade pblica, que se interessa pelas condies de sade em que vivem as pessoas; outra orientada para a doena, estando ligada prtica mdica. O paradigma da integrao o prolongamento do paradigma anterior, em que os elementos e as manifestaes de um fenmeno esto integrados num contexto especfico onde se encontra. Este paradigma influenciou a orientao da Enfermagem para a pessoa, salientando-se o reconhecimento desta disciplina, distinta da disciplina mdica. Nesta perspectiva, a pessoa entendida como um todo em interaco e os cuidados de Enfermagem so prestados com a finalidade de assistir a pessoa em todas as suas dimenses (Krouac et al, 1994). Por outro lado, o paradigma da transformao representa uma mudana de mentalidade, perspectivando os fenmenos como nicos, jamais iguais a um outro. Krouac et al, (1994) narram que:os fenmenos apresentam algumas similaridades, mas nenhum se assemelha completamente. No entanto cada fenmeno pode definir-se por um estrutura e um padro nico; uma unidade global em interaco recproca e simultnea com uma unidade global mais larga, o mundo que o rodeia. (p.12)

Neste contexto, a pessoa considerada indissocivel do seu universo, e os cuidados de Enfermagem tm como intuito o bem-estar da pessoa e a satisfao das suas necessidades individuais, sendo crucial a parceria de trabalho enfermeiro / utente. Segundo os autores supra mencionados, um dos objectivos da Enfermagem a existncia de um modelo conceptual que constitua um ponto de referncia para a prtica de Enfermagem e que contribua para a melhoria dos cuidados prestados pessoa, famlia e comunidade. Quanto Enfermagem perioperatria, de acordo com Ladden (1997), este termo usado tanto no crculo de enfermagem como mdico, sendo reconhecida e praticada em salas de cirurgia, centros ambulatrios entre outros. Historicamente o termo enfermagem perioperatria usado para descrever os cuidados ao doente nas fases pr, intra e ps-operatria, ideia partilha por Pitrez e Pioner (1999), entre outros autores. Ainda Ladden (1997) menciona que a enfermagem perioperatria um processo profissional e dinmico (p.4). Atravs da identificao e planeamento das intervenes e aces, os enfermeiros perioperatrios asseguram aos pacientes cirrgicos cuidados de 42Nolia Pimenta Gomes

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enfermagem, com base cientfica e tm um papel preponderante no propiciar de um ambiente seguro e eficiente para que o doente alcance resultados positivos durante todo o processo cirrgico. Ao longo dos tempos, a enfermagem perioperatria tem evoludo, vindo a dar, progressivamente, maior nfase ao atendimento holstico do individuo para a satisfao das suas necessidades em substituio de uma interveno exclusivamente tcnica. A Enfermagem perioperatria contempornea centrada no doente, em vez de orientada para as tarefas inerentes (Phipps et al, 2003, p.526). O perodo pr-operatrio descrito, por vrios autores, como tendo incio no momento em que o paciente e o cirurgio tomam a deciso da interveno cirrgica, e termina com a transferncia do primeiro para a mesa cirrgica concepo partilhada por diversos autores, entre eles, Brunner e Suddarth (1993); Pitrez e Pioner (1999); Sorensen e Luckmann (1998); Phipps,Sands e Marek (2003) e Santos, (2003). Por outras palavras podemos afirmar que o perodo pr-operatrio compreende o espao de tempo que antecede o procedimento cirrgico () sendo esse tempo muito varivel e est sujeito a circunstncias multifactoriais, dependentes no s da patologia como tambm do estado clnico do paciente (Pitrez & Pioner, 1999, p.18). Segundo estes autores, no podemos predizer a durao desta fase, uma vez que cada caso nico e individual. Sawada, citado por Arajo, Jorgetto e Noronha (2007), acrescenta que o properatrio um perodo de deteco das necessidades fsicas e psicolgicas do paciente que ser submetido a um procedimento cirrgico (p.2). Fazendo uma breve resenha histrica da enfermagem no perodo pr-operatrio notrio que o papel do enfermeiro e as intervenes de enfermagem sofreram vrias alteraes ao longo dos tempos. Ladden (1997) parafraseando Black recorda que entre 1900 a 1919 a preparao do doente cirrgico se realizava especialmente no domiclio, aps a marcao da cirurgia. O paciente fazia uma alimentao mais reforada, banhos com maior frequncia, exposio ao sol e fazia perodos de repouso como preparao do corpo. Algumas horas antes da cirurgia, o enfermeiro deslocava-se a casa com o intuito de preparar o doente e o ambiente para que a cirurgia se realizasse. Seleccionava o quarto mais apropriado, esvaziava-o e fervia os utenslios necessrios, conversava com o paciente acalmando-o e obtendo informaes da sua histria pessoal e familiar. Corroborando com Ladden (1997), Phipps et al (2003) aludem que no incio do sculo XX os actos cirrgicos eram praticados em casa do doente, em que o papel da enfermagem centrava-se na preparao do ambiente e no suporte ao doente (p.525).Nolia Pimenta Gomes

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Durante o perodo compreendido entre 1920 e 1939, comeou a surgir um modelo de preparao pr-operatria, como resultado da afiliao dos mdicos aos hospitais. Tanto a preparao fsica como mental do paciente eram stressantes, o conceito de consentimento do paciente para a cirurgia foi iniciado e a preparao da sala de operaes (SO) e dos instrumentos foi aplicada (Ladden, 1997 citando Black, p.4). Neste perodo, segundo Phipps et al (2003), a principal funo do enfermeiro consistia na assistncia tcnica ao cirurgio. Entre 1940 e 1959 foram assinalados pelas descobertas cientficas na rea da Medicina e da Enfermagem. Os cuidados ao doente cirrgico tornaram-se mais globais, mais completos, deu-se um maior nfase as necessidades individuais de cada paciente e foi reconhecida a importncia e utilidade da preparao psicolgica antes da operao. Segundo Ladden (1997) citando Black, nos anos compreendidos entre 1960 e 1979, a investigao nesta rea foi enfatizada e as necessidades emocionais do paciente foram reconhecidas medida que elas relacionavam-se cada paciente individualmente, e os conceitos de instruo pr-operatria estruturada foram introduzidos e validados pela pesquisa em Enfermagem (p.4). Actualmente, segundo Santos (2003), o perodo pr-operatrio divide-se em mediato e imediato. O primeiro corresponde ao perodo de tempo que decorre desde o momento que tomada a deciso de interveno cirrgica at s 24 horas que antecedem a cirurgia. Este intervalo de tempo pode corresponder a dias, meses e at anos, sendo o mais frequente ocorrer com o doente no domiclio tendo como objectivo principal disponibilizar factores positivos para o acto cirrgico e estabilizar condies que possam interferir na recuperao (p.24). Durante o pr-operatrio mediato, o doente ir-se- consciencializando da necessidade e importncia da cirurgia, sendo normal que surjam muitas dvidas, medos incertezas e interrogaes, desempenhando o enfermeiro um papel muito importante na explanao, de forma precisa e objectiva dos aspectos que preocupam o doente, no sentido de prepar-lo adequadamente para o acto cirrgico. Ladden (1997) e Phipps et al (2003) aludem que nesta fase frequente a pessoa dirigir-se unidade hospitalar para a realizao de exames complementares de diagnstico, para a consulta de anestesia, entre outros procedimentos, proporcionando ao enfermeiro a possibilidade de estabelecer um contacto mais prximo com o doente. Logo, este momento poderia ser aproveitado para esclarecer o doente sobre os aspectos que o preocupam e transmitir algumas informaes sobre os aspectos que envolvem o perioperatrio. 44Nolia Pimenta Gomes

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Seguindo o pensamento dos autores anteriores Dawson (2003) menciona que o ideal seria o doente frequentar consultas de pr-admisso, onde conheceria o seu enfermeiro () esta abordagem serve para estabelecer uma relao teraputica muito antes da realizao da cirurgia (p.399). Relativamente ao perodo pr-operatrio imediato, este descrito como correspondendo apenas s 24 horas que antecedem a cirurgia, correspondendo, na maioria das vezes, ao internamento do doente. , normalmente, nesta fase que o doente entra em contacto directo com a equipa de sade que ir prestar-lhe os cuidados, sendo efectuada a preparao para o acto cirrgico e, simultaneamente, quando toma conhecimento das prticas da unidade. Em sntese, fazendo aluso a Phipps et al (2003), a avaliao inicial do doente, assim como a preparao pr-operatria, deveria ser iniciada antes do internamento na unidade hospitalar, ou seja, no perodo pr-operatrio mediato e continuada durante o internamento e alta hospitalar. No entanto, ao nvel do hospital onde trabalhamos, Hospital Central do Funchal, assim como noutros hospitais, esta prtica no comum.

2.2.1- A preparao pr-operatria do doente cirrgicoA adequada preparao pr-operatria do doente cirrgico, primordial para o sucesso de todas as fases que compem o processo cirrgico. No perodo pr-operatrio, so planeados cuidados de enfermagem que tero um grau de significncia elevado na recuperao e xito da cirurgia. Hesbeen (2000) define Cuidados de Enfermagem como sendo a ateno particular prestada por uma enfermeira ou por um enfermeiro a uma pessoa ou aos seus familiares com vista a ajud-los (). Englobam tudo o que os profissionais fazem, dentro das suas competncias, para prestar cuidados as pessoas (p.69). Assim, prestar cuidados de enfermagem complexo e tem como finalidade ajudar a pessoa a promover a sua sade, contribuindo para o seu bem-estar e proporcionando uma ateno particular quando esta se encontra numa situao adversa. Segundo o autor supracitado, os Cuidados de Enfermagem so compostos de mltiplas aces que so sobretudo, () uma imensido de pequenas coisasque do possibilidade de manifestar uma grande ateno ao beneficirio de cuidados e aos seus familiares ao longo das vinte e quatro horas (p.47).

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Corroborando com as citaes anteriores a Ordem dos Enfermeiros (2003) define os Cuidados de Enfermagem como as intervenes autnomas ou interdependentes a realizar pelo o enfermeiro no mbito das suas qualificaes profissionais (p.1669). De acordo com alguns autores consultados, nomeadamente Brunner e Suddarth (1993), Sorensen e Luckmann, (1998) e Phipps et al (2003), no perodo pr-operatrio a assistncia ao doente deve ser efectuada a vrios nveis, sendo primordial o primeiro contacto. crucial estabelecer um dilogo que permita ao doente sentir confiana e segurana nos enfermeiros que iro prestar-lhe cuidados, propiciando o desenvolvimento de uma relao teraputica. Assim, o utente sentir-se- mais confiante para transmitir alguns dados pessoais, manifestar as suas necessidades, as suas dvidas, os seus medos, entre outros, que sero muito teis para o planeamento de cuidados personalizados e para preveno de complicaes no ps-operatrio. A avaliao inicial deve ser holstica e reflectir as necessidades fisiolgicas, psicolgicas, espirituais e sociais, do doente e de sua famlia ou pessoas significativas (Phipps et al, 2003, p.530). Estes pressupostos so partilhados por Melo (2005) que alude ser elementar, para a prestao de cuidados, obter informaes sobre o doente para posteriormente conceder instrues distintas de acordo com as necessidades individuais. Utilizando os princpios da entrevista, o enfermeiro pode adquirir informaes valiosas. Um enfermeiro tranquilo, compreensivo e cordial desperta a confiana do paciente (Brunner & Suddarth, 1993, p.345). Atravs do dilogo / entrevista, o enfermeiro adquire dados sobre as preferncias alimentares do utente; hbitos de higiene; medicao que faz no domicilio; funcionamento vesical e intestinal; histria de sade; experincias cirrgicas anteriores; hbitos de sono; existncia ou no de alergias; hbitos tabgicos; ingesto de bebidas alcolicas; passado cultural, aspectos psicossociais; entre outros aspectos. De acordo com Phipps et al (2003), a histria de sade essencial para avaliar os sistemas orgnicos e verificar se o doente tem condies para ser submetido a cirurgia. No que se refere ao uso de frmacos e substncias, assim como presena de alergias, so dados muito importantes devido aos potenciais efeitos adversos dessas substncias, com alguns anestsicos, e o risco acrescido de complicaes (p.530). Os autores anteriormente citados referem que o passado cultural pode influenciar as reaces a sade, doena, cirurgia e morte (p.531). Ainda, Phipps et al (2003), alertam para a importncia das experincias cirrgicas vividas anteriormente como uma situao que pode afectar positivamente ou negativamente o nvel de ansiedade e, consequentemente a forma como o doente enfrenta este novo momento. 46Nolia Pimenta Gomes

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Brunner e Suddarth, (1993); Sorensen e Luckmann, (1998); Gonalves, (2003); Dawson, (2003); referem que no perodo pr-operatrio , crucial analisar os aspectos psicossociais, sendo necessrio preparar psicologicamente o doente para a interveno cirrgica, com o objectivo de reduzir a ansiedade que est sempre presente nestas circunstncias. Tambm Cruz e Varela (2002) mencionam que a admisso do doente num servio para ser submetido a interveno cirrgica sempre precedida da sensao de medo (p.51). O doente manifesta, entre outros, medo do desconhecido, do ambiente estranho, da cirurgia, do seu resultado, medo da anestesia, das alteraes que possam surgir na sua imagem corporal, medo da dor e medo da morte. Quanto aos aspectos psicossociais, no podemos esquecer a avaliao da situao familiar, nomeadamente a condio financeira que pode ter implicaes considerveis, tanto na interveno cirrgica imediata como nos cuidados de acompanhamento (Phipps et al, 2003, p.532). imprescindvel que o enfermeiro, ao cuidar do doente no pr-operatrio, tenha conhecimento e conscincia que sua funo suavizar, seno eliminar o processo ansioso que o doente vivncia () uma boa relao enfermeiro / doente / famlia permitir um esclarecimento atempado de todos os seus medos e dvidas, encarando a experincia vivida como mais uma etapa do seu ciclo vital (Gonalves, 2003, p.18). Dawson (2003) defende que o principal objectivo dos cuidados de enfermagem no perodo pr-operatrio facultar ao doente e familiares a compreenso e preparao da experincia cirrgica (p.395). Assim, torna-se fundamental informar o doente sobre os aspectos inerentes ao processo cirrgico. Esta advertncia pertinente, no s pelo facto de reduzir a ansiedade do doente, por contribuir para uma maior participao do mesmo, em todos os procedimentos, como tambm para uma adequada recuperao de todas as fases que constituem o perodo perioperatrio. Segundo Dawson (2003) quando o doente conhece e compreende a operao, a cura mais rpida. Quando () informado sobre os frmacos, adere com mais facilidade e usa-os adequadamente (p.396). De acordo com Phipps et al (2003) e Melo (2005), a preparao pr-operatria deve centrar-se em trs dimenses elementares. Na dimenso do Procedimento Cirrgico, na dimenso Sensorial e Comportamental. A dimenso do procedimento cirrgico contempla as orientaes sobre a experincia cirrgica como sendo: o consentimento informado; alimentao que deve fazer na vspera da cirurgia e no ps-operatrio; a forma de preparao da pele; a preparao intestinal; a roupa que deve usar no dia da cirurgia; os cuidados a ter com osNolia Pimenta Gomes

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cabelos e as prteses dentarias; a visita pr-operatria de enfermagem; a visita pranestsica; os cuidados que lhe sero prestados no bloco operatrio; o acompanhamento para o bloco operatrio; a sala de cuidados ps-anestsicos; as visitas no ps-operatrio, os mtodos de controlo da dor; os dispositivos que poder trazer e as condies para alta (Phipps et al, 2003; Melo, 2005). A dimenso sensorial inclui as sensaes que o doente pode experimentar durante o perioperatrio, como seja, os efeitos da medicao; o ambiente da sala operatria; as sensaes ao primeiro levante e as sensaes associadas aos dispositivos (Phipps et al, 2003, Melo 2005). No que concerne dimenso comportamental, compreende as aces relativas aos comportamentos a adoptar pelo doente para a preveno de complicaes no psoperatrio, como sejam: a respirao profunda; exerccio da tosse; o uso do inspirometro; exerccios com os membros inferiores; mobilizao no leito; o primeiro levante; entre outros (Phipps et al, 2003, Melo, 2005). Dawson (2003) aponta que as complicaes que despontam com maior frequncia no ps-operatrio so as respiratrias, circulatrias e as infeces. Tambm Phipps et al (2003) comunga da opinio do autor supra mencionado referindo que estas complicaes so as que sobrevm com maior frequncia aps o acto cirrgico. Dawson (2003) e Phipps et al (2003) partilham da convico que o risco de ocorrncia destas complicaes pode ser reduzido ou mesmo eliminado, se houver uma preparao adequada do doente no perodo pr-operatrio. De acordo com Melo (2005), a informao sensorial pode ser particularmente importante, porque ajuda a normalizar as sensaes do doente durante o procedimento. Similarmente, a informao sobre o que o doente pode fazer permite, tambm, ajudar a reduzir o stress (p.62). Por outro lado, Phipps et al (2003) salientam que as informaes sobre a preparao pr-operatria mais relevantes para a maioria dos doentes referem-se a exames e actividades, situaes relacionadas com a cirurgia, e expectativas sobre o que vai acontecer no ps-operatrio (p.538). Nesta linha de pensamento, Cerejo (2000) alude que o doente cirrgico na fase pr-operatria requer informaes, fundamentalmente sobre a sua situao aps o acto cirrgico, ou seja, sobre o psoperatrio. Esta autora ressalta que as principais preocupaes do doente prendem-se com o despertar da anestesia, saber se conseguir respirar normalmente e que dores poder sentir.

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As informaes transmitidas, assim como toda a preparao efectuada no properatrio, tm demonstrado ser benficas e influenciar a resposta do doente no psoperatrio. Potter e Perry (1999) reforam que melhora a capacidade fsica, permite o retorno precoce s actividades dirias e diminui o tempo de internamento. Reduz ainda a ansiedade, proporcionando uma sensao de bem-estar, evidenciando-se na diminuio das quantidades de analgsicos e contribui para uma actividade ventilatria mais eficaz. Tendo por base os pressupostos de Phipps et al (2003) e Melo (2005), apresentamos uma proposta de modelo de preparao do doente cirrgico no perodo pr-operatrio (figura n 1).

Figura n 1 Proposta de modelo de preparao do doente cirrgico no perodo properatrio

MODELO DE PREPARAO DO DOENTE NO PERODO PR-OPERATRIO

Aspectos do Procedimento Cirrgico

Aspectos de Carcter Sensorial

Aspectos de Carcter Comportamental

Satisfao das Necessidade de Informao e Melhor Recuperao do Doente

Fonte: Criao da autora, tendo como referencia Phipps et al (2003) e Melo (2005) Contudo, apesar de sermos da opinio que fundamental a existncia de um modelo de preparao do doente, que ajude a orientar os enfermeiros nas suas prticas, importante ter em ateno que cada pessoa deve ser esclarecida de forma personalizada, uma vez que os conhecimentos, as necessidades e as dvidas podem ser diferentes. Pois, como afirma Fox (1997) nem todas as necessidades dos pacientes so as mesmas, nem todos os pacientes precisam de saber tudo (p.200). Na mesma linha de pensamento, Nolia Pimenta Gomes 49

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Phipps et al (2003) mencionam que as orientaes pr-operatrias devem fornecer informaes que vo ao encontro das necessidades de aprendizagem do indivduo, promovam a segurana, promovam o conforto psicolgico, promovam o envolvimento do doente e sua famlia () (p.538). Outro aspecto a ter em ateno o planeamento do momento ideal de conceder as orientaes e a forma de transmitir as informaes ao doente e famlia. Relativamente a este facto, existem algumas controvrsias. Segundo Brunner e Suddarth (1993), se o doente instrudo com muita antecedncia, possvel que parte da informao seja esquecida, por outro lado, se orientado muito prximo da cirurgia (vspera), devido componente ansiedade, provvel que no retenha todas as informaes. Portanto, as orientaes devem ser dadas quando o paciente est mais receptivo e pode participar do processo de aprendizagem () devem ser espaadas ao longo do tempo, para permitir que assimile as informaes e faa perguntas, medida que as dvidas surjam (Brunner & Suddarth, 1993, p.350). Por outro lado, Dawson (2003), citando Cupples refere que o melhor momento para comunicar ao doente dados sobre a interveno cirrgica so os dez a catorze dias que antecedem a cirurgia, o que permite tempo suficiente para digerir a informao dada e a oportunidade para colocar questes durante perodo pr-operatrio do internamento (p.398). Tambm Nelson, citado por Dawson (2003), alude que a informao fornecida no dia anterior cirurgia no retida da mesma forma que a informao fornecida duas semanas antes da cirurgia (p.398). Na mesma linha de pensamento dos autores anteriores, Potter e Perry (1999) mencionam que a altura ideal para fornecer informaes antes da admisso do doente no hospital, por exemplo, numa consulta pr-operatria. Aps o seu internamento, devemos apenas reforar as indicaes j proporcionadas. Na realidade, o que acontece na maioria dos hospitais que a preparao do doente e a transmisso das informaes ocorrem aps o doente dar entrada no hospital, ou seja, na maior parte das vezes 24 horas antes da cirurgia. Neste contexto, no s difcil preparar convenientemente o doente, como tambm dificilmente este assimilar todas as informaes fornecidas, como j foi anteriormente referido por diversos autores. Logicamente, compete equipa multidisciplinar, nomeadamente o enfermeiro que exerce funes no servio de cirurgia em parceria com o enfermeiro do bloco operatrio, o mdico assistente e o mdico anestesista, preparar adequadamente o doente fsica e psicologicamente para o acto cirrgico. Nesta perspectiva, Loureno 50Nolia Pimenta Gomes

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(2004) refere que crucial a realizao da visita pr-operatria, pois indiscutivelmente a visita pr-operatria fundamental para que se possa cuidar no bloco operatrio (p.26). Embora o trabalho de equipa seja fulcral para atingirmos os objectivos que pretendemos, o enfermeiro da unidade de cirurgia , sem dvida, a pedra basilar. Afinal ele quem est em contacto mais directo e contnuo com o doente ao longo das 24 horas. A visita pr-operatria de enfermagem, segundo Loureno (2004), visa globalmente tranquilizar o utente na procura de uma melhoria do seu bem-estar, num ambiente novo e hostil () e tem uma eficcia objectiva sobre o excesso de stress do futuro operado (p.26). Esta opinio partilhada por Baldwin e Webb citados por Dawson (2003) quando afirmam que a visita pr-operatria de um enfermeiro de bloco operatrio pode reduzir a ansiedade do doente (p.398). Estes autores acrescentam ainda que o contacto do doente com o enfermeiro do bloco operatrio pode ser muito til, uma vez que se adquire informaes adicionais que so fundamentais para a equipa do bloco estabelecer / planear um plano de cuidados intra-operatrio personalizado e adequado a pessoa em questo. Tambm Silva (2002) comunga das concepes dos autores supracitados relativamente visita pr-operatria, ressaltando que o objectivo preparar o doente para a interveno cirrgica para que consiga ultrapassar os seus medos, receios e apreenses. O enfermeiro tem de ter a capacidade de detectar as necessidades manifestadas pelo o doente e dar resposta s mesmas de forma personalizada e individualizada. Enfim, pretende-se que o doente esteja informado e consciente da situao, pois assim poder ultrapassar mais facilmente esta nova etapa da sua vida. De acordo com Paula e Carvalho (1997), as principais finalidades da visita properatria de enfermagem so: informar o doente sobre os aspectos inerentes ao perioperatrio; diminuir a ansiedade que geralmente est presente; prestar cuidados de qualidade e contribuir para a recuperao da sade. Para que a visita pr-operatria tenha a eficcia que se deseja necessrio criar um meio propcio para esta actividade, logo deve ser realizada num ambiente calmo e silencioso, sem factores que possam provocar distraces ou impossibilitar a relao, () os membros da famlia podem e devem estar presentes (Pinheiro, 1999, p.42). Sempre que possvel, a visita deve ser realizada na vspera da operao e pelo enfermeiro que ir receber o doente ou acompanh-lo durante o acto cirrgico, no entanto, existem vrios aspectos que limitam esta condio, tais como: a falta de

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recursos humanos; o excesso de trabalho; a falta de tempo e ausncia de formao nesta rea (Loureno, 2004). Nesta linha de pensamento, Dawson (2003) menciona que alguns doentes consideram elementar encontrar o mesmo enfermeiro que realizou a visita properatria, no bloco de cirurgia, pois sentem-se mais protegidos e acolhidos. Esta ideia partilhada por Silva (2002) quando narra que os doentes, em geral, perguntam pelo o enfermeiro com quem conversaram no dia anterior pois de alguma forma se sentem mais seguros por verem uma cara conhecida (p.22). Tambm Cabr