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O DIREITO À EDUCAÇÃO E A DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO O presente painel discute o conjunto de três pesquisas desenvolvidas em três distintos programas de pós-graduação stricto sensu à luz da recorrência das políticas educacionais e o direito à educação no Brasil contemporâneo, os encaminhamentos para a sua efetividade e a fragilização de estratégias e ações que marginalizam as solicitações da realidade social. A primeira pesquisa, por meio de análise bibliográfica problematiza a relação entre direito e educação como eixos recorrentes e interdependentes do grau de mobilização da sociedade civil e da sociedade política e a qualidade da educação básica como vinculada a duas questões: a quantificação, ou seja, à universalização e a sua democratização, o que exige a participação dos sujeitos na sua organização/ planejamento. A segunda pesquisa discute o direito da criança à aprendizagem anunciado no Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Para este estudo a metodologia centrou-se na pesquisa bibliográfica, documental e de campo. Entre propósitos e devolutivas, problematiza-se as lacunas e recorrências da educação nacional no âmbito do direito à educação de qualidade. E, por sua vez, a terceira pesquisa analisa o processo de expansão e democratização do acesso à educação superior no Brasil ocupou em larga escala a agenda de governo de Luís Inácio Lula da Silva, entre planos e programas, por meio de análise bibliográfica e explicita que o aporte encaminhador da problematização em questão prima pela recorrência da recuperação do sentido entre o direito, a democracia, a universalização e humanização. Em seu conjunto o painel estrutura-se e articula-se na discussão sobre pontos de vistas distintos, mas aproximativos em três eixos: a) políticas educacionais e a busca pela qualidade no tempo presente, b) democratização do acesso e c) o direito à educação; temáticas atuais e recorrentes frente aos desafios por uma educação democrática e de qualidade para todos. Palavras-Chave: Políticas Educacionais, Democratização do Acesso, Direito à Educação XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 7963 ISSN 2177-336X

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O DIREITO À EDUCAÇÃO E A DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO NO

BRASIL CONTEMPORÂNEO

O presente painel discute o conjunto de três pesquisas desenvolvidas em três distintos

programas de pós-graduação stricto sensu à luz da recorrência das políticas

educacionais e o direito à educação no Brasil contemporâneo, os encaminhamentos para

a sua efetividade e a fragilização de estratégias e ações que marginalizam as solicitações

da realidade social. A primeira pesquisa, por meio de análise bibliográfica problematiza

a relação entre direito e educação como eixos recorrentes e interdependentes do grau de

mobilização da sociedade civil e da sociedade política e a qualidade da educação básica

como vinculada a duas questões: a quantificação, ou seja, à universalização e a sua

democratização, o que exige a participação dos sujeitos na sua organização/

planejamento. A segunda pesquisa discute o direito da criança à aprendizagem

anunciado no Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Para este

estudo a metodologia centrou-se na pesquisa bibliográfica, documental e de campo.

Entre propósitos e devolutivas, problematiza-se as lacunas e recorrências da educação

nacional no âmbito do direito à educação de qualidade. E, por sua vez, a terceira

pesquisa analisa o processo de expansão e democratização do acesso à educação

superior no Brasil ocupou em larga escala a agenda de governo de Luís Inácio Lula da

Silva, entre planos e programas, por meio de análise bibliográfica e explicita que o

aporte encaminhador da problematização em questão prima pela recorrência da

recuperação do sentido entre o direito, a democracia, a universalização e humanização.

Em seu conjunto o painel estrutura-se e articula-se na discussão sobre pontos de vistas

distintos, mas aproximativos em três eixos: a) políticas educacionais e a busca pela

qualidade no tempo presente, b) democratização do acesso e c) o direito à educação;

temáticas atuais e recorrentes frente aos desafios por uma educação democrática e de

qualidade para todos.

Palavras-Chave: Políticas Educacionais, Democratização do Acesso, Direito à

Educação

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

Paulo Gomes Lima (Coordenador)

Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)

[email protected]

Resumo: O processo de expansão e democratização do acesso à educação superior no

Brasil ocupou em larga escala a agenda de governo de Luís Inácio Lula da Silva, entre

planos e programas. O PDE [Plano de Desenvolvimento da Educação] reunindo metas

para a educação básica (Decreto N° 6094 de 24/04/2007), as Diretrizes para o processo

de integração de instituições federais de educação tecnológica para fins de constituição

dos IFETS (Decreto N° 6095 de 24/04/2007) e o Decreto N° 6096 de 24/04/2007 que

instituiu o programa de apoio a planos de Reestruturação e Expansão das Universidades

Federais são exemplos significativos dessa ênfase, objeto de discussão nesse artigo.

Esse trabalho discutiu até que ponto tais ações contribuíram efetivamente para a

finalidade a que estavam destinadas, considerando as contradições estruturais do

sistema capitalista. Concluiu que, embora o processo de “inclusão social” tendo

numericamente acrescido novos atores de distintas camadas sociais e grupos

historicamente marginalizados no seio da educação superior; mediante a leitura da

realidade, das demandas marcadas pelas desigualdades sociais e de uma sociedade e

universidade dualista, embora explicitamente divulgada como promotora de processos

democratizadores e universalizantes, ainda há muito porque lutar, no espaço intersticial

de resistência aos arranjos do sistema capitalista, pois dimensão da imobilidade de uma

universidade para todos como direito está longe de se tornar uma questão resolvida no

Brasil.

Palavras-chave: Universidade brasileira. Democratização. Universalização.

Introdução

Como observado em apontamentos anteriores (LIMA, 2009, 2012), a década de

1990 forneceu elementos contextuais imprescindíveis à compreensão das discussões

sobre as condições de acesso, permanência, democratização e universalização à

educação superior pública no Brasil. O cerne da discussão nesses eventos,

principalmente da Conferência Mundial sobre Ensino Superior realizada no período de

5 a 9 de outubro de 1998, em Paris, era a denunciada “inadequabilidade da estrutura e

funcionamento” da universidade frente ao mundo globalizado e em processo de

reestruturação econômica, daí a proposição da nova missão e função da universidade

para o século XXI: 1) A universidade tem a missão de educar, formar e realizar

pesquisas; 2) Função ética, autonomia, responsabilidade e prospectiva.

No âmbito da criação de uma nova visão de ensino superior a CMES, destacava:

3) Igualdade de acesso; 4) Fortalecimento da participação e promoção do acesso das

mulheres; 5) Promoção do saber mediante a pesquisa nos âmbitos da ciência, da arte e

das humanidades e da difusão de seus resultados; 6) Orientação a longo prazo fundada

nas atribuições; 7) Reforçar a cooperação com o mundo do trabalho e a análise e

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previsão das necessidades da sociedade; 8) A diversificação como meio de reforçar a

igualdade de oportunidades; 9) Métodos educativos inovadores: pensamento crítico e

criatividade; 10) Os professores e estudantes são os principais protagonistas da

educação superior.

Sobre a passagem da visão para a ação foram destacados os seguintes pontos: 11)

Avaliação da qualidade; 12) O potencial e os desafios da tecnologia; 13) Reforçar a gestão e

o financiamento da educação superior; 14) O financiamento da educação superior como

serviço público; 15) Ter em comum os conhecimentos teóricos e práticos entre os países e

continentes; 16) Do “êxodo de competências” ao seu retorno (Programas de cooperação

internacional e 17) as associações a alianças (DECLARACIÓN MUNDIAL SOBRE LA

EDUCACIÓN SUPERIOR, 1998).

No governo de Luís Inácio Lula da Silva tais pontuações não passariam à margem,

mesmo porque desde o final da década de 1990, muitas discussões convocadas por

organismos multilaterais delineavam a “missão e função da educação superior” para o

século XXI, seguidas de outras manifestações que à luz dessa primeira apontavam

modificações estruturais e de funcionamento tanto para o caso dos países latino-americanos

conforme rezavam os acordos internacionais, como também para o caso da comunidade

europeia, via Processo de Bolonha de 1999.

Esse pano de fundo é necessário para se entender as pontuações sobre os

condicionantes e abrangência das políticas educacionais e ações governamentais na gestão

de Luís Inácio Lula da Silva quanto a expansão, a democratização do acesso e

encaminhamentos da educação superior no Brasil e que certamente delimitou parte da

estruturação do PDE [Plano de Desenvolvimento da Educação] por meio do Decreto N°

6094 de 24/04/2007 “Todos pela Educação”, as Diretrizes para o processo de integração de

instituições federais de educação tecnológica para fins de constituição dos IFETS [Decreto

N° 6095 de 24/04/2007] e do Decreto N° 6096 de 24/04/2007 que instituiu o programa de

apoio a planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais. À luz dessas três

iniciativas governamentais, discutir-se-á o alcance da expansão e democratização do acesso

à educação superior para a realidade brasileira, considerando as contradições estruturais

entre proposições e necessidades reais da sociedade.

O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e a democratização do acesso à

educação no Brasil

O Programa de Aceleração do Crescimento [PAC] apresentado pelo governo

Lula à sociedade brasileira, passou a vigorar a partir de 28 de janeiro de 2007. O PDE

como uma fração do PAC fora caracterizado pelo próprio presidente Lula como "Uma

revolução na educação brasileira" e que a seu ver, deveria responder a lacunas históricas

até então não contempladas de forma parcial ou em sua totalidade. Esse primeiro

delineamento previa a articulação da sociedade civil e os entes federados para,

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estrategicamente, promover a oferta de educação para todos e de qualidade. Isso se faria

mediante parcerias e controle dos índices registrados quanto ao aproveitamento discente

(IDEB) e a verificação sazonal por avaliações externas, como exemplo, SAEB, Prova

Brasil, ENEM. Quanto à educação superior, as palavras expansão e democratização

seriam os norteadores no contexto das razões do PDE, considerando os seguintes

princípios: a) expansão da oferta de vagas, b) garantia de qualidade; c) promoção de

inclusão social pela educação; d) ordenação territorial e e) desenvolvimento econômico

e social (BRASIL, 2012).

Sem dúvida alguma o estabelecimento de políticas para o desenvolvimento da

democratização na educação superior no Brasil é urgente e decisivo para romper com a

educação de elite historicamente enraizada, no entanto, o PDE, como uma interface das

políticas educacionais, segundo Saviani (2009) pode ser caracterizado muito mais como

um “programa de metas” do que um plano propriamente dito, dadas as tentativas

pontualizadas para se alcançar algumas metas em determinado tempo (2017), visando a

duplicação de vagas no ensino superior, ficando aquém da proposta do PNE (2001-

2010) que, pelo menos previa um número total de vagas para 30% dos jovens entre 18 e

24 anos (e mesmo assim não alcançou o alvo para a década), portanto, um alvo tangível.

Para atingir as metas do PDE três instrumentos foram considerados como

determinantes:

a) Reestruturação e expansão das universidades: REUNI [Programa de Apoio a

Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais] e PNAES

[Plano Nacional de Assistência Estudantil];

b) Democratização do acesso: PROUNI [Programa Universidade para Todos],

reformulação do FIES [Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino

Superior];

c) Avaliação e regulação: SINAES [Sistema Nacional de Avaliação da Educação

Superior] via ENADE (Exame Nacional do Desempenho dos Estudantes].

Embora o desenvolvimento do Plano Nacional de Educação (2001-2010)

estivesse em desenvolvimento, como se explicaria a elaboração do PDE e seu

estabelecimento de ações via decretos governamentais, considerando a observação de

Saviani, quanto a ser este antes um “programa de metas” do que um plano de educação?

Por que ocorreu a proposição naquele momento histórico e não quando da conclusão do

PNE que estava em curso, quando aí sim, se justificaria a construção do próximo PNE

(2011-2020)?

Ramos (2007) observa que na elaboração e processo de implementação do PDE

não houve uma participação direta com muitos movimentos representativos, dentre os

quais, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), a União

Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (UNCME), a União Nacional dos

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Estudantes (UNE), a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) e a

Associação Nacional Pela Formação de Professores (ANFOPE). O âmbito que poderia

ser compreendido como avanço no conjunto do PDE quanto à educação básica foi a

instituição do IDEB, o “Provinha Brasil” e o Piso Salarial do Magistério. Os dois

primeiros por considerarem a relação do rendimento do aluno com os fluxos de evasão,

repetência e esforços para os aspectos qualitativos e o terceiro, como meta que prometia

“melhorar” o investimento na dignidade do professor pelo reconhecimento de seu papel

social.

Ora, se há a defesa de democratização da educação e sua proporcional expansão em

todos os níveis, haveria que se buscar a instituição de fóruns representativos em que todas

as vozes pudessem expressar a sua contribuição social e inferências que orientariam as

conquistas sociais, entretanto, o PDE se constituiria como instrumento fragmentário e

fragmentado das correções que se desejava e o pior, não havia precisão e previsão de

investimentos específicos do PIB em educação frente aos desafios que se faziam naquele

momento. Havia o reconhecimento de que se pensar num percentual para a educação via

PIB era necessário, mas nada que ultrapassasse a casa dos 5% naquele momento. Não,

somente a boa vontade, como aponta Saviani (2009), seria suficiente para se alcançar a

educação de qualidade que a sociedade brasileira necessitava, uma vez que os recursos

financeiros significativos para dar condução ao PDE, distintos dos 3,5% do PIB que até

aquele momento era aplicado não dariam conta de cobertura da educação como um todo. Se

falava sobre a projeção de 5% em 2007, o que Saviani destacava era que desde 1997 ele

chamara a atenção para o percentual de 8% como necessário.

E quanto à educação superior? O cenário de oportunizações dir-se-á, não é o mesmo

que em épocas passadas, uma vez que as políticas públicas para educação tem se

preocupado na diminuição das desigualdades sociais e econômicas, inclusive para a

educação superior, como por exemplo, com a instituição do REUNI, aumentando-se o

número de vagas nas instituições federais e promovendo-se a inclusão social para pobres e

grupos étnicos, a democratização do acesso ao ensino superior via iniciativa privada com

recursos do PROUNI e FIES, a ampliação de vagas nos IFETs e o acompanhamento da

qualidade da educação via SINAES? Esse quadro não é uma mostra de que a educação no

Brasil está de fato universalizada? De que todos têm a mesma possibilidade de conquistar

por seu mérito a projeção profissional que quiser, bastando somente escolher o canal

adequado para isso? A educação inclusiva não está se dando por distintos instrumentos,

como por exemplo a recente adoção de políticas de cotas para ingresso ao ensino superior?

Não pretendendo esgotar a discussão que far-se-á na próxima seção, vale

destacar algumas contribuições de Dias Sobrinho (2012) quando observa que uma

educação democrática e universalizada requer muito mais do que reconhecimento do

direito ao direito, ou seja, reúne quantidade e qualidade como extensão material para

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todos. A ideia de povo como unidade, requererá também a modificação das orientações

dos discursos políticos para educação, ao ponto de ao invés de se falar em educação

inclusiva, se vivencie a educação não excludente, ao invés de se destacar a porcentagem

de vagas para determinada fração social, haja a oferta como direito e conquista para

todos.

Se de fato o PDE, que tem previsão de alcance de suas metas até 2022, pretende

articulado ao PNE (2011-2020) promover o sentido e a concretização de uma educação

de qualidade para todos os brasileiros, não pode deixar à margem tais questões, pois são

definidoras do direito à construção da cidadania e definidoras também do crescimento

econômico. Nas palavras de Dias Sobrinho (2012): “Uma sociedade que não consegue,

ou não quer, estender os benefícios da escolarização de boa qualidade para todos, além

de estar condenada ao empobrecimento crescente no sistema mundial de alta

competitividade, é também uma sociedade perversa”.

O processo de integração de instituições federais de educação tecnológica e a

redução das desigualdades inter-regionais

No PPA (2004-2007) é de se notar que a ênfase central da agenda do governo se

assenta sobre a relação do aumento na produtividade e distribuição de renda. A

princípio o leitor do documento poderia pensar que a dimensão democrática alcançaria

enfim a melhor oportunidade para a sua consolidação, entretanto, no prosseguimento da

leitura se expressa o comprometimento de se garantir o pano de fundo necessário para a

tipologia de sociedade a que o Brasil fora historicamente signatário e não diferia em

finalidade do governo anterior, o que sim se diferirá será o alcance de algumas políticas

públicas, entretanto, sem romper com a estrutura social de oferta educacional de classes.

É interessante destacar que até então predominavam as instituições particulares no

atendimento à qualificação profissional ou oferta de cursos técnicos ou de graduação,

considerando a população de 10 anos a mais. A tabela 1 evidencia a descrição efetuada.

Tabela 1 – Distribuição percentual das pessoas com 10 anos ou mais de idade que frequentavam ou

frequentaram anteriormente curso de educação profissional, por natureza da instituição de realização

do curso, segundo as Grande Regiões – 2007

Grandes Regiões

Distribuição percentual das pessoas de 10 anos ou mais que

frequentavam ou frequentaram anteriormente curso de educação

profissional (%)

Total Natureza da instituição de realização do curso

Instituição de

ensino

vinculada ao

sistema “S”

Instituição

de ensino

publico

Instituição

de ensino

particular

Outra

Brasil 100,0 20,6 22,4 53,1 3,9

Norte 100,0 22,5 22,8 21,1 3,6

Nordeste 100,0 18,2 27,9 49,7 4,2

Sudeste 100,0 19,6 20,2 56,8 3,5

Sul 100,0 24,0 21,7 49,2 5,2

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Centro-Oeste 100,0 24,3 22,9 50,4 2,5

Fonte: IBGE. Diretoria de Pesquisas. Coordenação de Trabalho e rendimento. Pesquisa Nacional por

Amostra de Domicílios, 2007.

Deve-se observar que no âmbito da educação profissional e tecnológica são

considerados três diferentes cursos: a) de formação inicial e continuada ou qualificação

profissional; b) de educação profissional técnica de nível médio e c) de educação

profissional tecnológica de graduação e pós-graduação; conforme a LDBEN 9394/96.

Neste caso (Tabela 1) houve um percentual (em milhões) predominante da iniciativa

privada sobre a oferta das instituições de ensino superior, principalmente no que se

refere à cursos de qualificação profissional – com a exigência mínima do ensino

fundamental e em nível técnico e tecnológico havia um descompasso na oferta em nível

de instituições públicas, ou seja, a expansão e a democratização do acesso deveriam ser

revistas, inclusive com a desconcentração das instituições em regiões tradicionalmente

já desenvolvidas com vistas à redução das desigualdades inter-regionais.

No Plano de Desenvolvimento da Educação, por meio do Decreto 6095 de

24/04/2007 foram estabelecidas diretrizes para o processo de integração de instituições

federais de educação tecnológica, para fins de constituição dos Institutos Federais de

Educação, Ciência e Tecnologia - IFETs, no âmbito da Rede Federal de Educação

Tecnológica. Nesse decreto estava expresso o reconhecimento da insuficiência da oferta

de educação profissional e tecnológica, daí o destaque no artigo 1, para a reorganização

e a convocação para a atuação integrada nas distintas regiões da federação, que

deveriam reunir esforços (artigo 3) para a agregação voluntária de Centros Federais de

Educação Tecnológica - CEFETs, Escolas Técnicas Federais - ETF, Escolas Agrotécnicas

Federais - EAF e Escolas Técnicas vinculadas às Universidades Federais, localizados em

um mesmo Estado. A planificação do PDE ganharia robustez com a Lei 11892 de

29/12/2008 com a instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e

Tecnológica e criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Isso

significava que como autarquias, os institutos poderiam expandir a sua oferta, bem

como o número de unidades conforme as demandas regionais identificadas.

Sabermos a necessidade de se pensar a educação como um todo quer num

percurso formativo via universidade e cursos de educação superior tradicionais, quer em

nível técnico e tecnológico não é algo novo, se sabe e se faz muito bem essa discussão

em âmbito nacional, o que não se deve num país democrático é condicionar a oferta de

cursos à indução de uma amostragem da classe trabalhadora com o discurso de

atendimento em suficiência às solicitações sociais, a isto Frigotto (2007) chamou de

políticas focais. Com isso se mantem a desigualdade como produto e condição do

projeto dominante da sociedade brasileira e as mudanças estruturais necessárias são

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colocadas à margem de quaisquer discussões e a culpabilidade da não inserção no

quadro das oportunidades sociais recai sobre a responsabilização do jovem que não

buscou o seu lugar ao sol. Até que ponto tal justificativa pode ter sustentação se, por

exemplo, os dados de 2007, mostravam que apenas 46% dos jovens tinham acesso ao

ensino médio? Se mesmo com o aumento do número de unidades dos institutos federais

pós-PDE (que chegou à evolução de 214 unidades no governo Lula), existe uma

filtragem para o ingresso de tais oportunidades? A esse respeito ver evolução de

matrículas no Gráfico 1.

Gráfico 1

No Brasil quanto à sua natureza as políticas públicas podem ser caracterizadas

como conjunturais ou emergenciais (objetivam amainar uma situação temporária,

imediata), quanto a abrangência dos possíveis benefícios são segmentais (voltadas para

um segmento da população, caracterizado por um fator determinado (idade, condição

física, gênero etc.) e fragmentadas (destinadas a grupos sociais dentro de cada

segmento), quanto aos impactos que podem causar aos beneficiários, ou ao seu papel

nas relações sociais são mais distributivas (visam distribuir benefícios individuais;

costumam ser instrumentalizadas pelo clientelismo do que redistributivas (visam

redistribuir recursos entre os grupos sociais: buscando certa equidade, retiram recursos

de um grupo para beneficiar outros, o que provoca conflitos) e ainda são regulatórias,

isto é, visam definir regras e procedimentos que regulem comportamento dos atores

para atender interesses gerais da sociedade; não visariam benefícios imediatos para

qualquer grupo (TEIXEIRA, 2011).

Para que as políticas públicas de educação pudessem de fato corresponder as

solicitações por universalização e democratização deveriam ser, quanto a sua natureza

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ou grau de intervenção, estruturais, possibilitando condições igualitárias das

oportunidades sociais disponíveis para todos os estudantes, ao mesmo tempo que

universais e regulatórias, garantindo-se a educação como prioridade, portanto, não

excludente em sua finalidade. Ora, na organização social que tem o capital como

sustentação isso dificilmente ocorrerá, daí ser o mais comum manter-se a estrutura

sistêmica e favorecer a inclusão como plataforma de atendimento à percentuais

representativos.

O REUNI/ PROUNI/ FIES e as solicitações da realidade brasileira: por uma

educação superior universalizada

A expansão e frequência ao ensino superior na última década, conforme o

PNAD deveu-se a três iniciativas: a) o REUNI com o aumento das vagas em

universidades federais, b) ao aprimoramento e ampliação do Programa de

Financiamento Estudantil (Fies) e c) a criação do Programa Universidade para Todos

(PROUNI) para fazer frente ao não alcance da meta estipulada pelo PNE (2001-2010)

de que pelo menos 30% de jovens entre 18 e 24 estariam cursando o ensino superior no

Brasil. De acordo com os dados do IBGE (2010), considerando o universo de 23,03

milhões de jovens nesta faixa etária, somente 3,36 milhões estavam matriculados na

educação superior, portanto, muito aquém da taxa líquida e bruta pretendidas.

O REUNI, como uma das manifestações do PDE, foi estabelecido por meio do

Decreto nº. 6096, de 24 de abril de 2007, tendo como finalidade a de criar condições

para a ampliação do acesso e permanência na educação superior em nível de graduação,

aproveitando a estrutura física e os recursos humanos existentes nas universidades

federais (BRASIL, 2007). Às universidades que fizessem a adesão ao REUNI, seriam

oferecidos recursos para a ampliação de estruturas físicas e tecnológicas e contratação

de docentes e técnicos. Como contrapartida as universidades deveriam apresentar um

percentual de 90% de conclusões nos cursos de graduação e a relação de 18 alunos por

professor. Com isso todas as universidades federais brasileiras aderiram ao REUNI.

Como um dos resultados dessa iniciativa houve um crescimento de 20,4% de

matrículas nos cursos de graduação presencial, entretanto, observando-se que ao custo

de salas superlotadas e alocação de recursos insuficientes para a continuidade de

expansão, além do que, a contenção ao acesso à educação superior, principalmente a

pública, ainda permanece no Brasil, como processo que tem início muito antes do

vestibular.

Conforme Corbucci apud Garschagen (2007), isso se dá, "[...] a começar pelo

fato de que quase metade dos estudantes que iniciam o ensino fundamental não

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consegue concluí-lo". Além do que, enormes percentagens daqueles que concluem o

ensino médio [...] não dispõem de condições mínimas para disputar, com os que

estudaram em condições mais vantajosas, uma das vagas ofertadas pelas instituições de

ensino públicas e tampouco dispõem de recursos para arcar com os custos do ensino

privado.” Mesmo que, por outras vias, mediante políticas de ações afirmativas, os dados

não se alteram e não dão conta de atendimento às demandas de jovens que necessitariam

de educação de qualidade em instituições públicas.

Como alternativa ao atendimento das demandas, o PROUNI, criado em 2004 e

institucionalizado em 2005, tem a finalidade de conceder bolsas parciais ou integrais à

estudantes de baixa renda para o ingresso à cursos presenciais de educação superior em

instituições privadas, em contrapartidas essas instituições recebem isenções fiscais do

governo federal, dito de outra forma, seria uma maneira de destinação de dinheiro

público ao ensino privado, o que segundo Sguissardi (2006) isso pode ser caracterizado

como um desvio de propósito da oferta de ensino de qualidade para todos, pois as

instituições privadas, embora priorizem as atividades de ensino são avaliadas como de

baixa qualidade, enquanto que as públicas em tese seriam de melhor qualidade.

Uma outra forma ou maneira alternativa para o “atendimento” a um percentual

representativo de pessoas de baixa renda quanto ao acesso à educação superior é o

FIES, cujo objetivo é a disponibilização de financiamento para estudantes de baixa

renda matriculados em instituições privadas. Instituído em 1999 e orientado pelo FNDE

(Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), o FIES, por meio da Lei nº. 11.552

de 19/11/2007 alterou os limites de financiamento, bem como o período de carência e

diminuição de juros para os estudantes. Assim, PROUNI e FIES tem sido instrumentos

que tem contribuído para a expansão da educação superior privada, que representa hoje

no Brasil o atendimento de quase 75% das vagas.

Todo esse quadro de desenvolvimento em relação à educação superior poderia

apresentar o quanto já avançamos, entretanto, recente pesquisa coordenada por Andrade

e colaboradores (2012) da Unicamp, a partir de dados do PNAD e IBGE, afirmam que

mais de 80% de jovens entre 18 e 24 anos ainda não tem acesso ao ensino superior,

obstáculo que precisa ser trabalhado e vencido em meio às demandas de cidadãos com

cor autodeclarada e pobres dentre outros. A tabela 2 propicia uma visão mais precisa da

informação apresentada.

Tabela 2. Taxa da população com idade entre 18 e 24 anos, segundo o nível de escolaridade

Brasil – 2009 Situação escolar %

Não concluiu o ensino fundamental 21%

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Concluiu apenas o ensino fundamental 27%

Concluiu o ensino médio 33%

Tiveram acesso ao superior 19%

TOTAL 100%

Fonte: Elaboração a partir de dados das PNADs/IBGE, 2009.

Outro ponto de destaque, considerando o universo de 19% de ingressantes no

ensino superior, é o de que, embora esteja desenhado que a regulação da qualidade da

educação superior no Brasil se faria mediante o Sistema Nacional de Avaliação da

Educação Superior (SINAES)1, cuidando para que os cursos de baixa qualidade não

fossem oferecidos, dados recentes revelam que 38% dos matriculados em educação

superior não dominam habilidades básicas de leitura e escrita, conforme o Indicador de

Alfabetismo Funcional (INAF), divulgado pelo Instituto Paulo Montenegro (IPM) e

pela ONG Ação Educativa. Para Azevedo (2012) este indicador reflete o expressivo

crescimento de universidades de baixa qualidade e como um todo urge a necessidade de

se pensar e estruturar uma educação superior com qualidade propriamente dita.

Isso não se fará somente com sistemas ou programas de aferição de resultados,

nem com políticas focais co-resolutoras da problemática sobre educação superior no

Brasil, mas na organização, estrutura e funcionamento da oferta apesar da estrutura

social do capital, para que se ao menos tente alguma democratização do acesso,

permanência e conclusão de cursos superiores pela maior parte da população e isso é um

trabalho de base, pois como visto na pesquisa de Andrade e colaboradores (2012), são

80% de jovens entre 18 e 24 anos que estão à margem do processo da educação superior

por defasagens ao longo de sua formação escolar. A correção de tal fluxo tem que

passar ao menos por uma equiparação entre os investimentos do que se aplica para

formar um aluno em educação superior em relação ao aluno da educação básica, pois é

esse que depois buscará o acesso ao ensino superior.

Considerações finais

A universidade tem sido objeto de distintas discussões, apresentando

posicionamentos diversos, incluindo aqueles que insistem que o processo de expropriação

histórica é mais cultural do que socioeconômico, sem se ater na totalidade da relação

capital-trabalho que efetivamente promove a manutenção da não-universalização, mesmo

em face de um discurso que afirme o contrário. Qual o caminho? Recuperar o sentido entre

direito, democracia, universalização e humanização como objetos inalienáveis da história e

1O SINAES foi instituído pela Lei nº 10.861 de 14/04/2004, cuja finalidade centrava-se, dentre outros

pontos na “[...] melhoria da qualidade da educação superior [...] (BRASIL, 2004).

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manifestações humanas que não se dará de forma gratuita ou naturalmente, mas por meio

da manifestação do homem na história e com a história.

A trajetória de uma universidade no âmbito da justiça social rompe com tal lógica,

conferindo aos homens indistintamente, tornarem-se homens, pela superação das práticas

dissimuladoras na centralidade capital-trabalho; pela ação comunicacional entre direito e

democracia sem particularismos; pela leitura e encaminhamentos das problemáticas da

educação e sociedade por meio da dialética do concreto e pelo esclarecimento que

emancipa sem distorção de seu campo real e conceitual. Não pode haver silenciamento em

detrimento de qualquer mudança substancial que transforme o acesso à universidade em

seu sentido mais profundo de libertação, humanização e universalização, articulando a

mobilização pela superação da divisão social do trabalho e de classes.

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O ANÚNCIO DO DIREITO DA CRIANÇA A UMA EDUCAÇÃO DE

QUALIDADE PELO DO PACTO NACIONAL PELA ALFABETIZAÇÃO NA

IDADE CERTA

Maria Alice de Miranda Aranda

Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)

[email protected]

Resumo: O objetivo é discutir o direito da criança à aprendizagem anunciado no Pacto

Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). O PNAIC é tratado nesse estudo

na perspectiva da política e da gestão educacional. O mesmo chegou às escolas públicas

de educação básica no ano de 2012 por meio do Governo Federal com o intento de

materializar uma grande meta: alfabetizar as crianças até, no máximo, os oito anos de

idade, ao final do 3º ano do Ensino Fundamental. Recentemente, o PNAIC foi objeto de

investigação em pesquisa concluída por ocasião de realização de estágio pós-doutoral

via Programa Nacional de Pós-Doutorados oportunizado pela Coordenação de

Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (PNPD/CAPES). Assim, para este

estudo fez-se um recorte da investigação maior, pautada na pesquisa bibliográfica,

documental e de campo. Considera-se, portanto, que o PNAIC incita muitas

expectativas positivas em relação a um processo alfabetizador que venha a fortalecer o

direito da criança a uma educação de qualidade, entretanto dificuldades apresentadas

pelos sujeitos do PNAIC indicam a necessidade de superação de desafios de várias

ordens: tempo para estudo, melhorias na carreira docente, condições de trabalho,

definição de uma concepção de criança, de alfabetização e de avaliação que sustente tal

direito. Se o PNAIC, dos espaços mais amplos até o escolar, oportunizar reflexão sobre

os desafios mencionados, vislumbra-se uma direção para superar contradições presentes

na condução da gestão democrática da educação e na luta por uma política de Estado

para a alfabetização da criança que de fato fortaleça o direito a uma educação de

qualidade socialmente referenciada.

Palavras-chave: Alfabetização da Criança. Política Educacional. Direito.

Introdução

O objetivo é discutir o direito da criança à aprendizagem conforme anunciado no Pacto

Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). O PNAIC é objeto de análise de extrema

necessidade no campo da pesquisa educacional e é tratado nesse estudo na perspectiva da

política e da gestão educacional. O mesmo chegou às escolas públicas de educação básica no

ano de 2012 por meio do Governo Federal com o intento de materializar uma grande meta:

alfabetizar as crianças até, no máximo, os oito anos de idade, ao final do 3º ano do Ensino

Fundamental.

Recentemente, o PNAIC foi objeto de investigação em pesquisa concluída por ocasião

de realização de estágio pós-doutoral via Programa Nacional de Pós-Doutorado oportunizado

pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (PNPD/CAPES) em dois

Municípios brasileiros, tendo como sujeitos investigados professores alfabetizadores,

orientadores de estudo e coordenadores institucionais. Assim, para este estudo fez-se um recorte

da pesquisa maior que se desenvolveu pautada na pesquisa bibliográfica, documental e de

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campo e o destaque se dá em relação aos direitos de aprendizagem no PNAIC, estes necessários

a um processo exitoso de alfabetização da criança, com qualidade socialmente referenciada.

O Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa – PNAIC

O PNAIC foi instituído sob a Portaria nº. 867, de 4 de julho de 2012, decorre do

compromisso previsto no Decreto nº. 6.094 de 24 de abril de 2007, de alfabetizar as

crianças até, no máximo, os oito anos de idade, ao final do 3º ano do Ensino

Fundamental. Portanto, é um acordo formal assumido pelo Governo Federal, estados,

municípios e entidades para firmar o compromisso de alfabetizar crianças “[...] ao final

de um denominado ciclo de alfabetização” (BRASIL, 2012a). Registro destacado do

Documento que apresenta o Programa assim anuncia:

O Brasil está pronto para concretizar o Pacto Nacional pela Alfabetização na

Idade Certa. Uma ação inédita que conta com a participação articulada do

governo federal e dos governos estaduais e municipais, dispostos a mobilizar

o melhor dos seus esforços e recursos, valorizando e apoiando professores e

escolas, proporcionando materiais didáticos de alta qualidade para todas as

crianças e implementando sistemas adequados de avaliação, gestão e

monitoramento (BRASIL, 2012b, p. 13).

O PNAIC está sistematizado em cadernos explicativos que apresentam toda sua

organização e funcionamento. É um programa sustentado por 4 eixos: 1. Formação

continuada presencial para os professores alfabetizadores e seus orientadores de estudo;

2. Materiais didáticos, obras literárias, obras de apoio pedagógico, logos e tecnologias

educacionais; 3. Avaliações sistemáticas; e 4. Gestão, controle social e mobilização

(BRASIL, 2012b). O propósito maior do PNAIC é a alfabetização em Língua

Portuguesa e Matemática, até o 3º ano do Ensino Fundamental em todas as escolas

públicas municipais e estaduais, urbanas e rurais, brasileiras. Caracteriza-se, sobretudo

pelo eixo da Formação Continuada de Professores Alfabetizadores, de diversas ações,

materiais e referências curriculares e pedagógicas encaminhados pelo MEC, pelo

compartilhamento da gestão do programa entre Governo Federal, estados e municípios;

pela orientação de garantir os direitos de aprendizagem e desenvolvimento, a serem

aferidos pelas avaliações anuais.

A formação continuada de professores alfabetizadores é o eixo principal. Os

cadernos de formação totalizam oito unidades de Linguagem e oito cadernos de

Matemática. Os professores alfabetizadores participam de cursos presenciais com

estudos e atividades práticas. São divididas de acordo com o ano que lecionam, (1° ano,

2° ano, 3° ano) e turmas de professores que trabalham com a organização

“multisseriada” (vários anos do ensino fundamental em uma mesma turma e com um

único professor), ainda forte nas zonas rurais brasileiras. O curso para formar esses

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professores alfabetizadores segue a estrutura de outro curso já efetivado em anos

anteriores e nível nacional, o Pró-Letramento, programa de formação continuada de

professores para a melhoria da qualidade de aprendizagem da leitura/escrita e

matemática nos anos iniciais do ensino fundamental. A formação continuada, planejada

com base nos conteúdos e encaminhamentos designado pelo PNAIC é realizada em

parceria com universidades federais que integram a Rede Nacional de Formação

Continuada que ficam com a responsabilidade de promover a capacitação aos

orientadores de estudos que por sua vez realizam encontros com os professores

alfabetizadores de seus municípios.

Os professores alfabetizadores recebem um incentivo financeiro mensal,

traduzido em Bolsas no valor R$200,00 (duzentos reais), previsto na Portaria Nº. 1.458,

de 14 de dezembro de 2012 e na Medida Provisória Nº. 586, de 8 de novembro, que

dispõe sobre o apoio técnico e financeiro da União aos entes federados no âmbito do

PNAIC. Os orientadores de estudos são selecionados pelos municípios, cujos critérios

utilizados para a seleção foi, primeiro, ter experiência como tutor do Pró-Letramento e

nos casos dos municípios que não tem professores suficientes com essa experiência, são

selecionados de acordo com as exigências do PNAIC: a) ser professor efetivo da rede;

b) ter formação em pedagogia ou em outra licenciatura; c) atuar no mínimo há três anos

nos anos iniciais do ensino fundamental.

Para garantir que o Pacto pela alfabetização seja efetivado, o MEC disponibiliza

materiais didáticos (Eixo 2) que auxiliam no processo de alfabetização. A quantidade de

materiais didáticos é entregue às escolas de acordo com o número de turmas de

alfabetização “possibilitando aos docentes e alunos explorar melhor os conteúdos”

(BRASIL, 2012b, p.13).

O Eixo 3 do Pacto trata das avaliações. Para a verificação do cumprimento da

meta estabelecida no PNAIC, o compromisso de alfabetizar todas as crianças na

chamada “idade certa”, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

Anísio Teixeira (INEP) realizará avaliações ao final do terceiro ano do ensino

fundamental. A partir do ano de 2014 todas as crianças brasileiras passarão por essa

avaliação.

O Eixo 4, que trata da Gestão, controle social e mobilização, é composto por

quatro instâncias: um Comitê Gestor Nacional; uma coordenação institucional em cada

estado, composta por diversas entidades, com atribuições estratégicas e de mobilização

em torno dos objetivos do Pacto; Coordenação Estadual, responsável pela

implementação e monitoramento das ações em sua rede e pelo apoio à implementação

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17

nos municípios; e Coordenação Municipal, responsável pela implementação e

monitoramento das ações na sua rede de ensino (BRASIL, 2012b, p.14).

Para monitorar os cursos de formação continuada dos professores

alfabetizadores o MEC desenvolveu um sistema especifico via Sistema Integrado de

Monitoramento Execução e Controle (SISMEC), articulado ao Programa de Ações

Articuladas (PAR), onde todos os envolvidos podem registrar e acessar informações

sobre os cursos, esse sistema é “[...] destinado a apoiar as redes e a assegurar a

implementação de diferentes etapas do Pacto” (BRASIL, 2012a, p. 14). São instâncias

de gestão do PNAIC: o MEC, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. São

atribuições do MEC: promover, em parceria com as instituições públicas de ensino

superior (IPES), a formação dos professores alfabetizadores e dos orientadores de

estudo; conceder bolsas de apoio para os orientadores de estudo e os professores

alfabetizadores, durante o curso de formação; fornecer os materiais didáticos, literários,

jogos e tecnologias; aplicar as avaliações externas do nível de alfabetização em língua

portuguesa e em matemática, para alunos concluintes do 3º ano do ensino fundamental;

distribuir a Provinha Brasil para aplicação pelas próprias redes; e disponibilizar para as

redes de ensino o sistema informatizado para coleta e tratamento dos resultados da

Provinha Brasil.

E as atribuições dos Estados, Distrito Federal e Municípios: aderir ao Pacto

Nacional pela Alfabetização na Idade Certa; gerenciar e monitorar a implementação das

Ações do Pacto em sua rede; fomentar e garantir a participação dos professores

alfabetizadores de sua rede de ensino nas atividades de formação, sem prejuízo da carga

horária em sala de aula, custeando o deslocamento e a hospedagem, sempre que

necessário; indicar os orientadores de estudo de sua rede de ensino, custear o seu

deslocamento e a sua hospedagem para os eventos de formação; promover a

participação das escolas da sua rede de ensino nas avaliações externas realizadas pelo

INEP junto aos alunos concluintes do 3º ano do ensino fundamental; aplicar a Provinha

Brasil em sua rede de ensino, no início e no final do 2º ano do ensino fundamental, e

informar os resultados por meio de sistema informatizado específico, a ser

disponibilizado pelo INEP; designar coordenadores para se dedicarem ao programa e

alocar equipe necessária para a sua gestão, inclusive em suas unidades regionais, se

houver; monitorar, em colaboração com o Ministério da Educação, a aplicação da

Provinha Brasil e da avaliação externa, a entrega e o uso dos materiais de apoio à

alfabetização; disponibilizar assistência técnica às escolas com maiores dificuldades na

implementação das ações e na obtenção de resultados positivos de alfabetização;

promover a articulação do programa com o programa Mais Educação, onde houver,

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priorizando o atendimento das crianças do 1º, 2º e 3º ano do ensino fundamental como

garantia de educação integral e complementação e apoio pedagógico àquelas com

maiores dificuldades.

Importante registrar que O PNAIC teve como inspirador o Programa de

Alfabetização na Idade Certa do estado do Ceará (PAIC), implantado no estado em

2007. Dados demonstravam que o estado do Ceará apresentava sérios problemas com

alfabetização em 2007 com apenas 30% dos alunos da rede pública com até sete anos

em um nível de alfabetização considerado desejável. Após cinco anos de implantação

do PAIC, 90% dos estudantes alcançaram nível desejável, segundo o Sistema

Permanente de Avaliação da Alfabetização da Educação Básica (Spaece Alfa). Desde

então, o IDEB do estado do Ceará, para o 4º e 5º ano, passou de 3,2 em 2005 para 4,9

em 2011 (o esperado era 4,0). Se em 2007 apenas 15 municípios, de um universo de

184, tinham nível considerado desejável de alfabetização (um deles era Sobral), em

2011 praticamente todos os municípios alcançaram o mesmo patamar (com exceção de

cinco, que ficaram no nível "suficiente", segundo mais alto), indo de acordo com que o

país estava buscando que era um programa que trouxesse um rápido resultado.

No tocante aos números da alfabetização no Brasil, segundo o INEP (2012), 7.980.786

alunos do 1º, 2º e 3º anos do ensino fundamental, distribuídos em 400.069 turmas/salas de aula

são atendidos em 108.733 escolas públicas.

Segundo dados do IBGE, ainda no ano de 2010, 15% das crianças no Brasil não

estavam alfabetizadas. Na Região Nordeste 25,4%. Na Região Norte 27,3 %. Na

Região Centro-Oeste 9,0 %, na Região Sudeste 7,8, na Região Sul 5,6%. Os dados

evidenciam que o número de crianças não alfabetizadas com 8 (oito) anos de idade varia

de região para região demonstrando diferenças e diversidades presentes nas escolas

brasileiras como decorrência de recursos econômicos como o nordeste que apresenta um

rendimento escolar menor, “o Brasil apresenta estrutura educacional descentralizada e

fortemente marcada por disparidades entre as cinco regiões [...]” (DOURADO, 2005, p.

11) ou seja, isso influencia diretamente no processo de aprendizagem da criança, “[...]

grande maioria das crianças e jovens com baixo rendimento escolar é pobre, mora em

estados desfavorecidos economicamente e frequenta as escolas menos equipadas e com

professores menos preparados” (BRASIL/MEC/SEB, 2005). Como fica o direito a uma

educação de qualidade? Ou como garantir o direito à aprendizagem?

Direito de aprendizagem no PNAIC

Registros em Cadernos que sistematiza o PNAIC tratam dos direitos da criança a

uma educação de qualidade tendo o direito a aprendizagem em relevo. Em relação aos

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imperativos legais que asseguram os direitos, ainda são muitos os desafios vivenciados

pela escola e seus sujeitos, nos últimos anos, na busca da garantia de uma escola

democrática de direito, em que todos os alunos tenham acesso a uma educação de

qualidade.

Aprender a ler e a escrever é um direito de todos, que precisa ser garantido

por meio de uma prática educativa baseada em princípios relacionados a uma

escola inclusiva. [...] para garantir que todas as crianças aprendam a ler e

escrever faz-se necessário traçar direitos de aprendizagem que possam

nortear a organização do trabalho pedagógico nas escolas (BRASIL, 2012c,

p. 5).

Em termos mais amplos, o direito à Educação Básica é garantido legalmente a todos

os brasileiros. Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB

9.394/1996, a finalidade maior está em “desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação

comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no

trabalho e em estudos posteriores” (Artigo 22). Tem-se aí um direito fundamental e a este

segue muitos outros, como exemplo, o direito a ser alfabetizado, ou seja, de aprender a ler e

a escrever, conforme normatiza também o Artigo 32:

O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na

escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a

formação básica do cidadão, mediante:

I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos

o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;

II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da

tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;

III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a

aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores;

IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade

humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social (BRASIL,

1996).

Em decorrência, a título de exemplo, faz-se destaque para o que está delineado

no PNAIC, em específico na alfabetização em Língua Portuguesa, em relação aos

direitos gerais de aprendizagem:

Compreender e produzir textos orais e escritos de diferentes gêneros,

veiculados em suportes textuais diversos, e para atender a diferentes

propósitos comunicativos, considerando as condições em que os

discursos são criados e recebidos.

Apreciar e compreender textos do universo literário (contos, fábulas,

crônicas, poemas, dentre outros), levando-se em conta os fenômenos de

fruição estética, de imaginação de lirismo, assim como os múltiplos

sentidos que o leitor pode produzir durante a leitura.

Apreciar e usar em situações significativas os gêneros literários do

patrimônio cultural da infância, como parlendas, cantigas, trava línguas.

Compreender e produzir textos destinados à organização e socialização

do saber escolar/científico (textos didáticos, notas de enciclopédia,

verbetes, resumos, resenhas, dentre outros) e à organização do cotidiano

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escolar e não escolar (agendas, cronogramas, calendários, cadernos de

notas...).

Participar de situações de leitura/escuta e produção oral e escrita de

textos destinados à reflexão e discussão acerca de temas sociais

relevantes (notícias, reportagens, artigos de opinião, cartas de leitores,

debates, documentários...).

Produzir e compreender textos orais e escritos com finalidades voltadas

para a reflexão sobre valores e comportamentos sociais, planejando e

participando de situações de combate aos preconceitos e atitudes

discriminatórias (preconceito racial, de gênero, preconceito a grupos

sexuais, preconceito linguístico, dentre outros) (BRASIL, 2012c, p. 32).

Os direitos gerais em relação à leitura e a escrita retratam o grande compromisso

que os sistemas de ensino devem ter em relação aos alunos, no sentido de assegurar a

concretização de políticas curriculares fundamentadas teoricamente em perspectivas

críticas de educação, de sociedade e de sujeitos. Nesses termos, está a necessidade de

um trabalho pedagógico na escola que possibilite fortalecer o direito à educação e o

alcance da qualidade almejada, para tanto, “requer intervenções públicas

multidimensionais entre as quais políticas voltadas para o processo alfabetizador nas

instituições de educação e ensino” (FREITAS, POTT e GUSMÃO, 2013, p.124).

Complementam as autoras que o “tema alfabetização tem recebido destaque na agenda

educacional nacional e, por conseguinte, requerimentos para as políticas das instâncias

subnacionais (municípios, estados e Distrito Federal)” (IBID). Depreende-se daí que o

Brasil ainda não deu conta do princípio do direito à alfabetização de todos. Mortatti

(2010, p. 331) analisa que:

[...] no Brasil, passou-se a questionar, sistemática e oficialmente, o ensino e a

aprendizagem iniciais da leitura e escrita, já que nessa etapa de escolarização

se concentra (va) a maioria da população brasileira pobre, que fracassa (va)

na escola pública e em relação à qual se deveriam focalizar ações públicas

(grifo da autora).

Como uma ação pública está hoje o PNAIC, compreendido nesse estudo como uma

política educacional presente nas relações sociais, por isso, um alvo em movimento, um

processo ou uma série histórica de intenções, ações e comportamentos de muitos

participantes. Portanto, pode ser caracterizado como ação complexa, alusiva, dinâmica,

normativa, contraditória e conflitual por manifestar-se nas estratégias utilizadas pelos

governantes, cujo conteúdo referencia princípios e diretrizes constitucionais, prioridades,

objetivos e metas, meios, organização administrativa e operacional, população alvo e seu

papel. Política educacional que tem como suportes declarações, leis, regulamentos, planos,

projetos, programas (PALUMBO, 1998) e pacto. O termo “Pacto” é utilizado neste estudo

como uma expressão que objetiva a dimensão da intenção que a ação pretende alcançar e

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quais sujeitos envolver neste desafio de alfabetizar toda criança brasileira até os oito anos

de idade, como consta na Portaria nº. 867, de 4 de julho de 2012, Artigo II:

Parágrafo único - A pactuação com cada ente federado será formalizada em

instrumento próprio a ser disponibilizado pelo MEC. Art. 2º. - Ficam

instituídas as ações do Pacto, por meio do qual o MEC, em parceria com

instituições de ensino superior, apoiará os sistemas públicos de ensino dos

Estados, Distrito Federal e Municípios na alfabetização e no letramento dos

estudantes até o final do 3º ano do ensino fundamental, em escolas rurais e

urbanas (BRASIL, 2012a).

Assim, “pacto” vem representar a articulação entre atores representantes do

nacional e do local, unidos num mesmo propósito que é suprimir uma demanda de baixo

nível de alfabetização que vem sendo discutido há algumas décadas no País e que a

escola por si só, considerando questões mais amplas, não tem como resolver

considerando apenas o local. Daí a necessidade da intervenção do Estado, por meio do

governo, de implantar política pública, que, segundo Azevedo (2003, p. 38) “é tudo o

que um governo faz e deixa de fazer, com todos os impactos de suas ações e de suas

omissões”. Segundo Mortatti (2010, p. 329) a alfabetização da criança é um:

[...] processo de ensino e aprendizagem da leitura e escrita em língua

materna, na fase inicial de escolarização de crianças – é um processo

complexo e multifacetado que envolve ações especificamente humanas e,

portanto, políticas, caracterizando-se como dever do Estado e direito

constitucional do cidadão. Em sociedades letradas contemporâneas, essa

relação tanto impõe a necessidade de inserção/inclusão dos não alfabetizados

no mundo público da cultura escrita e nas instâncias públicas de uso da

linguagem, quanto demanda a formulação de meios e modos mais eficientes e

eficazes para implementar ações, visando concretizar essa inserção/inclusão,

a serviço de determinadas urgências políticas, sociais e educacionais.

Nessa direção, faz-se uma breve menção a algumas falas feitas pelos sujeitos

investigados na pesquisa maior, em relação a qualidade almejada e que pode vir a fortalecer

ou não o direito à educação da criança. Destaque de uma Formadora: “Penso que o PNAIC

não é uma política isolada, pois se sedimenta a partir de pesquisas de desempenho do

estudante (Provinha Brasil, Prova Brasil, por ex.), tem relação com outros programas [...] no

contexto do Programa de Desenvolvimento da Educação (PDE)”. Depreende-se dessa

afirmação que as avaliações externas são definidoras de uma concepção de qualidade, mas

que podem não garantir o direito, vez que a relação do PNAIC com as avaliações externas

indica que as expectativas dos docentes podem ser direcionadas para melhores resultados

educacionais como mera prestação de contas ou como competitividade (AFONSO, 2012),

sem considerar fatores como condições sociais e econômicas, e, ainda, a concepção de

alfabetização e de avaliação num sentido democrático do direito.

Quanto aos desafios, foram destaques dois pontos abordados na pesquisa que

estão presentes no título do PNAIC: a meta explícita de “alfabetizar todas as crianças

até os 8 anos de idade” e afirmação de que esta é a “idade certa”. Faz-se destaque a

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seguinte explicação: “Não existe idade certa, mas considero que um ciclo de 3 anos seja

suficiente para alfabetização em condições normais, com um processo bem conduzido”.

Por outro lado: “Foi estipulado um tempo de escolarização para que a crianças possam

ser capazes de ler, escrever e utilizarem a escrita numérica com eficiência. Para

adquirirem essas habilidades os três anos são necessários, desde que sejam utilizadas

metodologias adequadas às necessidades de aprendizagem das crianças”. Foi fortemente

mencionado o necessário tempo para estudo das questões colocadas pelo PNAIC.

Outro desafio de suma importância foi apontado: “necessidade de melhorias na

carreira docente e condições de trabalho com salários dignos”. Segue uma explicação:

“Em relação a estrutura física das escolas muita coisa melhorou depois do PDE Escola

(Plano de Desenvolvimento Escolar). Então, “muito é gasto em educação, mas pouco

com os professores e demais profissionais”. Como se vê, são muitos os desafios a serem

superados para que o direito a educação de qualidade venha a ser efetivado. Nesse

sentido, falar em direito à educação remete sempre ao tema da qualidade e “é por isto

que pensar sobre ele, a partir das nossas experiências de pesquisa, ganha relevância e

importância, no âmbito do debate sobre as políticas públicas para a educação”

(AZEVEDO, 2011, p. 411). Analisam Aranda e Lima (2014, p. 309-310) que a

qualidade almejada é de difícil alcance, pois:

[...] a educação no geral é perpassada pelos limites e possibilidades da

dinâmica pedagógica, econômica, social, cultural, política de uma dada

sociedade, portanto, é elemento partícipe das relações sociais mais amplas.

Entretanto, pode vir a contribuir, contraditoriamente, para a transformação

social provendo meios para a possibilidade de construção de um projeto de

nação não delineado pelas malhas capitalistas, cujo centro de tudo é o

„econômico‟, mas que seja voltado para a promoção humana.

Considerações Finais

O presente estudo objetivou discutir o direito da criança à aprendizagem

conforme anunciado no Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Foi

possível perceber que a questão do direito da criança a uma aprendizagem que venha a

concretizar uma educação de qualidade social, tornando-a sujeito da história, tem que

levar em conta as diretrizes e bases legais da educação nacional como pauta das lutas

dos educadores comprometidos com uma política educacional de caráter estatal. Assim,

espera-se que o PNAIC não entre no rol de outras políticas para a alfabetização

historicamente marcadas pela “continuidade descontínua”, ou seja, apenas uma política

de governo em oposição a uma política de Estado.Dourado (2007) analisa a constituição

e a trajetória histórica das políticas educacionais no Brasil, bem como e os processos de

organização e gestão da educação básica nacional e adverte que esses processos são

marcados “hegemonicamente pela lógica da descontinuidade, por carência de

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planejamento de longo prazo que evidenciasse políticas de Estado em detrimento de

políticas conjunturais de governo” (p. 925).

Em suma, em relação ao tema do direito da criança a uma educação de

qualidade, o PNAIC mostra caminhos, entretanto dificuldades recorrentes indicam ainda

a necessidade de superação de desafios de várias ordens: tempo para estudo para os

professores alfabetizadores, melhorias na carreira docente, condições de trabalho,

compreensão de uma concepção de criança, de alfabetização e de avaliação que sustente

tal direito. Se o PNAIC, dos espaços mais amplos até o escolar, oportunizar reflexão

sobre os desafios mencionados, vislumbra-se uma direção para superar contradições

presentes na condução da gestão democrática da educação e na luta por uma política de

Estado para a alfabetização da criança que de fato fortaleça o direito a uma educação de

qualidade socialmente referenciada.

Referências

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qualidade socialmente referenciada. Revista Educação e Políticas em Debate – v. 3,

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http://www.seer.ufu.br/index.php/revistaeducaopoliticas/index. Acesso em 20/01/2016.

AZEVEDO, J. L. de. Notas sobre a análise da gestão democrática da educação e da

qualidade de ensino no contexto das políticas educativas. RBPAE. v. 27, n. 3, p. 365-

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MEC, SEB, 2012bc.

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alfabetização. 1ª. Ed.- São Paulo: Expressão e Arte Editora, 2013. p. 157-167

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DIREITO À EDUCAÇÃO: QUAL DIREITO, QUAL EDUCAÇÃO?

Antônio Bosco de Lima

Universidade Federal de Uberlândia (UFU) - FAPEMIG

[email protected]

Resumo: O trabalho problematiza a relação entre direito e educação, considerando que

o direito se constrói na correlação de forças e disputas de projetos entre sociedade civil

e sociedade política, ou seja, dependendo da instituição Estado, o seu perfil e papel em

determinados momentos históricos. Trata a educação em sua complexidade, qual seja,

um modo de educar geral, sem o controle estatal e outro modo, o formal, que seria a

educação estatal (escolar), ambas apresentam características díspares. Assim, considera

que Direito e Educação são obras humanas e dependem do grau de mobilização da

sociedade civil e da sociedade política. Trata-se de um texto desenvolvido a partir de

pesquisa bibliográfica utilizando-se como referenciais autores clássicos e documentos

secundários que abordam o movimento atual sobre direito à educação. Foi desenvolvido

tendo como base os seguintes objetivos: a) problematizar Direito à Educação a partir de

necessidades e demandas sociais; b) questionar as implicâncias da obrigatoriedade da

educação, focando os modelos de quantificação e de qualificação e, c) considerar a

possibilidade de ação “qualitativa do Ministério Público - MP”. Indica-se como

aspectos relativos às conclusões das teses problematizadas no trabalho a necessidade de

fortalecimento dos movimentos sociais e da apresentação de exigências ao Ministério

Público de elementos que digam respeito à qualidade da educação, visto que, embora

seja considerado que o Ensino Fundamental tenha atingido a sua universalização, é

preciso que a Educação Básica tenha acesso e permanência garantidos, o que se

constitui em universalização, mas também que sua organização seja

participativa/democratizada. Estes dois institutos, universalização e democratização

congregam os princípios da qualidade social referenciada.

Palavras-chave: Direito. Educação. Estado.

Introdução:

Direito e educação são instituições forjadas no/pelo Estado moderno, a partir das

revoluções industriais, domínio e concepção burguesa sobre a sociedade e, é claro, das

lutas daqueles que vivem do trabalho por condições sociais dignas de sobrevivência.

Podemos afirmar, portanto, que direito e educação são obras humanas e dependem do

grau de mobilização da sociedade civil e da sociedade política. Dependem,

sobremaneira, de como o Estado está sendo conduzido e construído, ou seja, qual o seu

papel e sua função. Subordinam-se às lutas sociais, portanto. O Estado irá se constituir

em instrumento de regulação, ora com controlador das forças sociais, ora como juiz, ora

como defensor de uma classe social.

Podemos afirmar, assim, que o Estado está em constante disputa. A concepção

de Estado é permanente contenda, pois a sua teorização leva a uma consequente opção

de prática, o que define a sua função. Existem, desta forma, diversas concepções, que

podemos sintetizar, grosso modo, em concepções liberais e marxistas. Para os liberais a

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finalidade do Estado é agir como mediador dos conflitos entre os grupos sociais,

preservando, assim, os interesses comuns, o bem comum, entretanto existe uma

reinterpretação liberal daqueles que não admitem a interferência do Estado. Trata-se dos

liberais ortodoxos, radicais ou neoliberais: Smith, Hayek, Friedman, dentre tantos. Por

outro lado, teremos liberais que admitem um Estado interventor, é o caso de Keynes.

Neste caso o Estado é conciliador, equalizador. Para os Marxistas, o Estado não é um

simples mediador. Ele interfere nas lutas de classes a favor da classe hegemônica no

poder. Para Marx e Engels o Estado é o comitê executivo da classe dominante (1998).

O Estado é, portanto, um Estado de classe. Entretanto, também existe uma

reinterpretação de marxistas, aqueles que adotam outra postura, é o caso de Poulantzas

(1985), para quem o Estado não é de uma única classe, ele está em constante disputa,

concepção que adotamos neste trabalho. Conforme induzimos anteriormente, o Estado é

um produto da sociedade. Quando a “[...] sociedade se enredou numa irremediável

contradição com ela própria e está dividida por antagonismos irreconciliáveis que não

consegue conjurar” (ENGELS, 2002, p. 190). Assim, para que os entes sociais não se

devorem, não se consumam, “[...] faz-se necessário um poder colocado aparentemente

por cima da sociedade”, tal poder é o Estado (ENGELS, 2002, p. 191).

Advêm de tais teses as configurações sobre os fins do Estado. “Como o Estado

nasceu da necessidade de conter o antagonismo das classes, e como, ao mesmo tempo,

nasceu em meio ao conflito delas, é, por regra geral, o Estado da classe mais poderosa,

da classe economicamente dominante” (ENGELS, 2002, p. l93). Fica claro, então, que

problematizar Direito e Educação deve considerar as necessidades e demandas postas

pela sociedade, mas também sua correlação de forças entre a sociedade civil e a política,

o que irá influir no modelo de Estado historicamente vivenciado.

Direito e Estado democrático

No sistema capitalista o que é direito? E como se constitui a função da

educação? Trata-se de duas questões fundamentais e extremamente polêmicas. Para o

jurista Lyra Filho existe uma conexão entre lei e direito.

A lei emana do Estado e permanece, em última análise, ligada à classe

dominante, pois o Estado, como sistema de órgãos que regem a sociedade

politicamente organizada, fica sob o controle daqueles que comandam o

processo econômico, na qualidade de proprietários dos meios de produção

(LYRA FILHO, 2005, p. 8).

As leis se configuram, nesta concepção, em formas de organização e controle

social, a partir daqueles que tem o instituto da dominação, o que leva Lyra Filho a

registrar que “[...] não se pode afirmar, ingênua ou manhosamente, que toda legislação

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seja Direito autêntico, legítimo e indiscutível” (LYRA FILHO, 2005, p. 8). Com esta

tese inicial o autor nos informa a respeito de um engessamento, ou de uma forma de

determinação legal e de poder, entretanto problematiza tal teor com uma antítese, ao

dimensionar que “[...] o Direito resulta aprisionado em conjunto de normas estatais, isto

é, de padrões e condutas impostos pelo Estado, com a ameaça de sanções organizadas

[...]. No entanto, como notava o líder marxista italiano Gramsci, a visão dialética precisa

alargar o foco do direito, abrangendo as pressões coletivas [...] que emergem da

sociedade civil [...]” (LYRA FILHO, 2005, p. 9).

Tais problematizações nos levam a entender que o Direito não tem característica

unívoca, tampouco status universal, pois se constitui de um processo, resultante de

fatores históricos e sociais, atributos constituídos nas/das lutas sociais. Existem

máximas como educação para todos, mas o que é educação para todos se ela é seletiva,

objetiva e criteriosa, configurando-se como uma política educacional, que no caso é

mantida e controlada pelo Estado? Trata-se então de uma educação Estatal com algumas

características privativas, e não de uma educação pública, que deveria ter, para sê-lo,

necessariamente, suas várias dimensões influenciadas pelo público, ou por aqueles que

fazem parte da educação, a vulgarmente intitulada comunidade educacional (pais,

responsáveis por alunos, alunos, professores, especialistas, dentre outros).

Vejamos o que diz Anísio Teixeira em se livro Educação é um Direito (1967, p.

80): “As relações [...] entre o Estado Democrático e a Educação são relações intrínsecas,

no sentido de que a educação é a condição sine qua non da existência do Estado

Democrático”. Trata-se de uma ideia muito cara para os defensores da escola

democrática, entretanto é a educação que prescinde de processos democráticos que

ocorrem no interior da sociedade civil, visto que a sociedade política pode ser

influenciada pelas demandas relativas à democratização. Os clássicos têm muito a nos

dizer. São clássicos justamente porque suas obras, seus pensamentos, suas teses

continuam a vigorar. Nesse sentido, educação tem a ver com direitos e direitos

prescindem de democracia. Democracia é um processo, é um valor, é uma possibilidade

mutante, o que requer conflitos, contradições, lutas sociais, equilíbrio de forças, do

campo da esquerda, do campo da direita, da classe dominante e da classe dominada.

Hollanda, em Raízes do Brasil (1981, p. 119), assim trata:

A democracia no Brasil foi sempre um lamentável mal-entendido. Uma

aristocracia rural e semifeudal importou-a e tratou de acomodá-la, onde fosse

possível, aos seus direitos ou privilégios, os mesmos privilégios, os mesmos

privilégios que tinham sido, no Velho Mundo, o alvo da luta da burguesia

contra a aristocracia.

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Mas, será que se trata de um mal-entendido, ou em bom entendido pelas elites.

Um arranjo “por cima” como os historiadores tem argumentado, enquanto os “de baixo”

aguardam a tutela recompensada por uma cota, uma bolsa, um vale? É longa a História

social. A geração de direitos da pessoa surge no século XVII. Coincide com o advento

da urbanização, da industrialização, do capitalismo industrial. Este período é marcado

por lutas pela independência de países colonizados e pelo fim de regimes escravocratas.

Os países saem de modelos monárquicos ou imperiais e tornam-se repúblicas

democráticas – temos aí os direitos de primeira geração: políticos e civis.

Com o processo crescente de urbanização e industrialização no século XVIII e

XIX são constituídos os direitos de segunda geração: econômicos, sociais e culturais,

resultantes, também, é claro, de lutas, manifestações, rebeliões. O século XX é marcado

logo em seu início por uma crise política (Revolução Russa, 1917) e por uma crise

econômica aguda dos países capitalistas (quebra da bolsa de New York, 1929). Século

das grandes guerras, a Segunda (1940-1945) impõe uma nova ordem mundial no que

diz respeito às lutas pela democratização dos países. A declaração de 1948 (sobre os

direitos humanos) incorpora a perspectiva de um mundo tolerante e harmonioso, para

tanto conclama direitos universais, dentre eles a liberdade, tomando um cunho

liberalista.

De fato, os países ganham ares democráticos, o Brasil, por exemplo, sai de uma

ditadura – o Estado Novo – e passa a ser governado por voto popular. O fato reside em

que a declaração de 1948 não colocou fim às atrocidades do capitalismo – não garantiu

regimes democráticos, tampouco assegurou igualdade para todos. Os países ficaram

subordinados às duas grandes potências mundiais (EUA e URSS). O capitalismo

universalizou-se, globalizou-se e se tornou monopolista e o mundo dividiu-se em países

desenvolvidos e subdesenvolvidos, ou periféricos.

O Cenário histórico (político, econômico e social) demonstra que, apesar da

importância da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), ela, por sua

natureza liberal, tem limites, vejamos seu Artigo 1º, quando se refere à Educação

Superior: “[...] a instrução superior está baseada no mérito”. O direito à educação está

resguardado por convenções de caráter internacional que estabelecem entre os Estados-

partes responsabilidades sobre os Direitos Humanos. O principal deles é a Declaração

Universal, a partir dela vários documentos correlatos (Convenções, pactos, planos...)

foram sendo construídos, temos cerca de uma dezena. Pela filosofia de tais documentos

depreende-se que:

1. Direitos não são fatiados, estão em complementação;

2. Os países signatários podem adequar as convenções ao seu local;

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3. Os Direitos tendem a se internacionalizar para que se evitem guerras, genocídios

(Paz, convivência e tolerância); endemias, epidemias e pandemias (Saúde);

processo migratório (acesso ao mundo do trabalho); governos totalitários

(Educação);

4. Materializa-se um modelo de democracia liberal, que prima mais por

convenções ligadas aos direitos políticos e civis e menos afeto aos direitos

econômicos, sociais e culturais.

Educação e escolarização

O conceito de educação implica em uma perspectiva ampla, portanto, a princípio

todos tem o direito à educação, visto que ela ocorre na sociedade, nas relações sociais e

culturais entre os indivíduos, nas variadas instituições. Já a obrigatoriedade da educação

escolar se restringe à educação formal, não é assim, uma educação global, ela é limitada

e particularista. Por outro lado, a intitulada “Educação da vida” situa-se como

entendimento de relações amplas, perpassando por vivências/experiências na família, na

comunidade, no trabalho, na igreja, nos variados grupos sociais, nas escolas.

O avanço do direito à educação como subjetivo é bastante relevante, entretanto,

para acioná-lo o sujeito necessita ser educado. Eis o paradoxo. Horta, citando

Comparato (1989) indica que “A desigualdade econômica e a desarticulação social

atingiram tal nível, neste país, que a própria comunicação jurídica se torna impossível

entre os dois brasis: o que vive acima e o que vegeta abaixo da linha de pobreza

absoluta” (1998, p. 8). Bens sociais e culturais estão vinculados a bens educacionais, o

que implica ter acesso aos bens políticos e civis. Entende-se, assim, que existe um

Brasil dos direitos, da bonança, da concentração de rendas e existe um Brasil da miséria,

da marginalidade, da exclusão, das dádivas e assistencialismos. Dois brasis, dois

direitos, dois povos. Duas escolas, dois estudantes.

[...] a garantia de direito e o planejamento de políticas públicas na área social

em uma perspectiva civil democrática exigem, necessariamente, a

participação organizada da sociedade civil, para reivindicar o seu

atendimento efetivo (HORTA, 1998, p. 9).

A concretização do direito à educação somente se realiza com o incremento

destes dois elementos apontados anteriormente: o reconhecimento jurídico

implementado pelo poder público e consoante, movimentos populares e sociais em

defesa da educação. O direito à educação não é um fim em si, pois ele necessita da

obrigatoriedade escolar, que por sua vez prescinde da gratuidade da educação. Sem a

articulação destes três elementos a lei é letra morta. Os estudiosos da historiografia da

educação sabem como demorou se constituírem escolas/grupos escolares no Brasil, no

caso do estado de Minas Gerais, por exemplo, datam do início do século XX (1906).

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Esta herança marca, nas várias regiões do Brasil, a desigualdade de acesso e de

permanência.

Praticar a justiciabilidade

A justiciabilidade que pode garantir o direito à educação é processual. Segundo

Muñoz (2006) concatenada com quatro ações dependentes, articuladas:

a) divulgação dos conteúdos de direito e sua forma de realização;

b) capacitação de grupos comunitários para manifestações sobre demandas;

c) capacitação de operadores do direito;

d) avaliação e ampliação das políticas públicas (tipo mais conquistas).

Outros elementos podem congregar para um frágil modelo de direito à educação,

são termos que se constituem nos modelos de estados:

a) o mais atual congrega ações que combatem o direito à educação, configurando-

se como negociável, como mercadoria;

b) outro, mais complexo devido interpretações e interpelações, diz respeito à

natureza pública ou estatal da educação;

c) conclui-se a trilogia, com uma política superficial, que se congrega em

programas e ações, ziguezague, descontínuas, renunciadas, negadas,

ressignificadas, dadivosas.

Como podemos perceber, direito à educação não é uma garantia, não se constituem

em sínteses absolutas, ou seja, o conquistado é eterno, tampouco se traduzem de uma

única forma. A expressão máxima dos direitos, que deveria ser universal, em países de

pouca densidade reivindicativa e de lutas sociais se faz sempre a partir do mínimo, do

localizado, do focalizado, do emergencial e do categorial. Assim os processos de

inclusão sempre trazem alguma exclusão. Como não se aumenta a oferta de políticas,

mas se divide aquilo que já é ofertado, novos grupos sociais, oriundos das chamadas

minorias são incluídos e outros segmentos sociais são excluídos. No atual momento

grupos “sem direitos” tem lutado por inclusão social.

E os sem direitos?

O leque dos sem direitos é bem amplo, entretanto, situaremos quatro margens: o

contingente de analfabetos, a desigualdade de gênero, de raça e de LGBTs.

Tabela 1 – Analfabetismo no Brasil entre pessoas de 15 anos ou mais: tendência 1920/2013

Anos/Censos Total Analfabetos %

1920

1960

1980

17.557.282

40.278.602

73.541.943

11.401.715

15.964.852

18.716.847

64,90

39,60

25,50

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7992ISSN 2177-336X

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2000

2010

119.533.048

190.755.799

16.294.889

14.612.183

13,63

9,02

Fonte: IBGE, 1920 a 2010.

Temos aí uma massa de sem direitos, o que significa que as políticas

educacionais estão voltadas para outras modalidades, e que, programas como o da

Educação de Jovens e Adultos - EJA, por vários motivos (desarticulações, metodologias

pedagógicas, descontinuidades, etc.) não tem dado conta de resolver tal situação. Tanto

os grupos de pretos (14,4%) quanto os de pardos (13,0%) mostram um percentual de

analfabetos quase três vezes maior do que o dos brancos (5,9%). (IBGE, Censo

Demográfico, 2010). Com certeza é possível estabelecer relações com as remunerações

salariais destes segmentos.

Os rendimentos médios mensais dos brancos (R$ 1.538) e amarelos (R$ 1.574)

se aproximam do dobro do valor relativo aos grupos de pretos (R$ 834), pardos (R$

845) ou indígenas (R$ 735). (IBGE, Censo Demográfico 2010). A cidadania no mundo

contemporâneo tornou-se sinônimo de “direitos e deveres”, ou seja, reduzida a direitos

políticos e civis, mas não se ampliou para os direitos econômicos, sociais e culturais.

Temos como princípios da cidadania a liberdade e não a igualdade.

Observem que no caso do Brasil os grupos ditos minoritários (mulheres, negros,

LGBT) tem liberdade, mas não igualdade plena, o processo de igualdade de acesso e de

permanência destes grupos tem sido uma luta constante. Não basta, portanto, a

implantação de Leis (Lei 10.639/03, ou Lei 10.436/2002, ou ainda do PLC 122/2006

[arquivado em 2013]) é necessária a atuação destes grupos “minoritários” para sua

incorporação nos processos de cidadania ampla.

Considerações Finais

A questão central que tem sido colocada no debate sobre Direito à Educação diz

respeito à qualidade, entretanto, não atingimos plenamente a universalização de acesso à

Educação Básica, o que irá demorar para se concretizar em algumas décadas. A

qualidade da educação está vinculada a duas questões: a quantificação, ou seja, à

universalização e a sua democratização, o que exige a participação dos sujeitos na sua

organização/planejamento. Uma segunda questão que tem implicações diretas no

acesso, permanência e qualidade é a atuação do Ministério Público. O Ministério

Público (MP) exerce uma função de defensor do pobre e do oprimido, destacando-se,

portanto, como uma instituição democrática. Mas o que isto significa? Que ao defender

os pobres e oprimidos está oprimindo a força dos pobres, ou seja, a “educação da vida”

dos pobres, que somente a teriam, caso experimentassem as lutas sociais, o processo

participativo.

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7993ISSN 2177-336X

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Convenhamos encontrar aí um mal-estar, prescinde-se do MP como instituição

de defensoria, no entanto, o paradoxo: os sujeitos passam a dele depender, e não mais

dos Movimentos Sociais (MS). O MP está preocupado com a coerção – a

obrigatoriedade, forçando todas as crianças, independente de classe social, a irem à

escola, entretanto a qualidade política e social deve fazer parte das lutas da sociedade e

dos MS. Por que incluímos a questão da política na qualidade? Por ser essência da

educação e por ser instrumento de possíveis transformações, e se contrapor ao

movimento técnico/apolítico na educação.

Enfim, a luta por direito a educação prescinde de fortes articulações da

sociedade civil organizada, o que implica por um lado fortalecer os movimentos sociais

e por outro atuar influenciando os gestores de programas sociais. Concluímos este

trabalho apresentando uma questão que precisa ser problematizada: fazer valer a

qualidade não seria um novo campo de atuação para a pauta do MP?

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