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. estudos semióticos http://www.revistas.usp.br/esse issn 1980-4016 semestral julho de 2016 vol. 12, n. 1 p. 55-67 Enunciados de estímulo à cultura participativa na TV Globo e a formação de um acontecimento discursivo Diego Gouveia Moreira (UFPE) * Resumo: A televisão vem passando por diversas mudanças, provocadas, entre outros fatores, pela cultura participativa. No Brasil, a TV Globo também se reposicionou para continuar atraindo a atenção de sua audiência. Este artigo problematiza como os discursos de estímulo à cultura participativa constituem um acontecimento discursivo, nos termos de Michel Foucault (2007), diante da ordem do discurso da TV Globo. Para mostrar isso, são apontadas como condições de existência desses novos enunciados: a cultura da convergência e a ascensão de uma nova classe consumidora no país. Esses vetores são os dois que julgamos mais importantes para compreender o reposicionamento da TV Globo. Um deles diretamente ligado às transformações do ecossistema midiático e outro mais associado às mudanças no campo social e cultural. O objetivo é mostrar que o reposicionamento da Globo e a instauração de discursos de estímulo à participação se deram a partir do surgimento de uma nova classe social e também da própria cultura da convergência, sendo esta ligada ao ecossistema midiático, e aquela a mudanças no campo social e cultural. Ao longo do trabalho, são discutidas teorias sobre televisão, cultura da convergência, cultura participativa, estudos sobre a nova classe consumidora e postulações sobre acontecimento discursivo. Diante disso, é traçado um panorama das transformações empreendidas pela emissora para se aproximar dessa nova classe e também para atender as demandas da cultura da convergência. Ao final, constata-se que a principal resposta dada pela emissora foi o investimento em estratégias transmídias, diversos programas de engajamento propostos pelos produtores (destinador corporativo/institucional) aos consumidores (destinatários), explorando suas competências para buscar e articular conteúdos nas diversas mídias e plataformas. Palavras-chave: Nova classe trabalhadora; Acontecimento discursivo; Cultura participativa; TV Globo. 1. Introdução A cultura da convergência, marcada pelo movimento migratório dos consumidores por múltiplos suportes e mercados midiáticos em busca de novas experiências (Jenkins, 2008), alterou a forma como a TV lida com o público. Atenta, a TV, para sobreviver e atrair audiência, precisou adotar um modelo de produção transmídia, ou seja, [...] orientado pela distribuição em distintas mídias e plataformas tecnológicas de conteúdos associados entre si e cuja articulação está ancorada em estratégias e práticas interacionais propiciadas pela cultura participativa estimulada pela digitalização e convergência dos meios (Fechini et al., 2013, p. 26). Na TV Globo, a transmidiação se deu com o lançamento de conteúdos na internet, seja a partir de páginas criadas pela emissora ou de perfis em redes sociais e aplicativos. Os conteúdos transmídias, aqueles cuja produção de sentido está ancorada na articulação sinérgica entre diferentes mídias/plataformas e no engajamento proposto ao consumidor, coincidem com os discursos de estímulo à cultura participativa, entendida como o cenário e o conjunto variado de possibilidades abertas aos consumidores de maior acesso, produção e colocação em circulação de conteúdos midiáticos, a partir da digitalização e convergência dos meios (Fechini et al., 2013). Este artigo problematiza como os discursos de estímulo à cultura participativa constituem um acontecimento discursivo (Foucault, 2007) diante da ordem do discurso da TV Globo. Para isso, são apontadas como condições de existência desses novos enunciados: a cultura da convergência e a ascensão de uma nova classe consumidora no país. Esses vetores são os dois que julgamos mais importantes para compreender o reposicionamento da TV Globo. Um deles diretamente ligado às transformações do ecossistema midiático e outro mais associado às mudanças no campo social e cultural. Diante disso, é traçado um panorama das transformações empreendidas pela emissora para se aproximar da audiência. O objetivo é mostrar que o reposicionamento da Globo e a instauração de discursos de estímulo à participação se deram a partir do surgimento de uma nova classe social e também da própria cultura da convergência, sendo esta ligada ao ecossistema midiático, e aquela a mudanças no campo social e cultural. DOI: 10.11606/issn.1980-4016.esse.2016.120537 * Jornalista e professor do Núcleo de Design do Centro Acadêmico do Agreste da Universidade Federal de Pernambuco nos cursos de Comunicação Social (com ênfase em mídias sociais e produção cultural) e Design.. Endereço de e-mail: [email protected]

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Page 1: O corpo e a enunciação - Dialnet · aparição de novas práticas, mas de analisar sua formação. A arqueologia é apontada como uma maneira de descrever acontecimentos discursivos,

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estudos semióticoshttp://www.revistas.usp.br/esse

issn 1980-4016semestral

julho de 2016vol. 12, n. 1

p. 55-67

Enunciados de estímulo à cultura participativa na TV Globoe a formação de um acontecimento discursivo•

Diego Gouveia Moreira (UFPE)*

Resumo: A televisão vem passando por diversas mudanças, provocadas, entre outros fatores, pela cultura participativa. NoBrasil, a TV Globo também se reposicionou para continuar atraindo a atenção de sua audiência. Este artigo problematizacomo os discursos de estímulo à cultura participativa constituem um acontecimento discursivo, nos termos de MichelFoucault (2007), diante da ordem do discurso da TV Globo. Para mostrar isso, são apontadas como condições de existênciadesses novos enunciados: a cultura da convergência e a ascensão de uma nova classe consumidora no país. Esses vetoressão os dois que julgamos mais importantes para compreender o reposicionamento da TV Globo. Um deles diretamenteligado às transformações do ecossistema midiático e outro mais associado às mudanças no campo social e cultural. Oobjetivo é mostrar que o reposicionamento da Globo e a instauração de discursos de estímulo à participação se deram apartir do surgimento de uma nova classe social e também da própria cultura da convergência, sendo esta ligada aoecossistema midiático, e aquela a mudanças no campo social e cultural. Ao longo do trabalho, são discutidas teorias sobretelevisão, cultura da convergência, cultura participativa, estudos sobre a nova classe consumidora e postulações sobreacontecimento discursivo. Diante disso, é traçado um panorama das transformações empreendidas pela emissora para seaproximar dessa nova classe e também para atender as demandas da cultura da convergência. Ao final, constata-se que aprincipal resposta dada pela emissora foi o investimento em estratégias transmídias, diversos programas de engajamentopropostos pelos produtores (destinador corporativo/institucional) aos consumidores (destinatários), explorando suascompetências para buscar e articular conteúdos nas diversas mídias e plataformas.

Palavras-chave: Nova classe trabalhadora; Acontecimento discursivo; Cultura participativa; TV Globo.

1. IntroduçãoA cultura da convergência, marcada pelo

movimento migratório dos consumidores pormúltiplos suportes e mercados midiáticos em buscade novas experiências (Jenkins, 2008), alterou aforma como a TV lida com o público. Atenta, a TV,para sobreviver e atrair audiência, precisou adotarum modelo de produção transmídia, ou seja,

[...] orientado pela distribuição em distintasmídias e plataformas tecnológicas deconteúdos associados entre si e cujaarticulação está ancorada em estratégias epráticas interacionais propiciadas pelacultura participativa estimulada peladigitalização e convergência dos meios(Fechini et al., 2013, p. 26).

Na TV Globo, a transmidiação se deu com olançamento de conteúdos na internet, seja a partirde páginas criadas pela emissora ou de perfis emredes sociais e aplicativos. Os conteúdostransmídias, aqueles cuja produção de sentido estáancorada na articulação sinérgica entre diferentesmídias/plataformas e no engajamento proposto aoconsumidor, coincidem com os discursos deestímulo à cultura participativa, entendida como ocenário e o conjunto variado de possibilidades

abertas aos consumidores de maior acesso,produção e colocação em circulação de conteúdosmidiáticos, a partir da digitalização e convergênciados meios (Fechini et al., 2013).

Este artigo problematiza como os discursos deestímulo à cultura participativa constituem umacontecimento discursivo (Foucault, 2007) diante daordem do discurso da TV Globo. Para isso, sãoapontadas como condições de existência dessesnovos enunciados: a cultura da convergência e aascensão de uma nova classe consumidora no país.Esses vetores são os dois que julgamos maisimportantes para compreender o reposicionamentoda TV Globo. Um deles diretamente ligado àstransformações do ecossistema midiático e outromais associado às mudanças no campo social ecultural. Diante disso, é traçado um panorama dastransformações empreendidas pela emissora para seaproximar da audiência. O objetivo é mostrar que oreposicionamento da Globo e a instauração dediscursos de estímulo à participação se deram apartir do surgimento de uma nova classe social etambém da própria cultura da convergência, sendoesta ligada ao ecossistema midiático, e aquela amudanças no campo social e cultural.

• DOI: 10.11606/issn.1980-4016.esse.2016.120537 * Jornalista e professor do Núcleo de Design do Centro Acadêmico do Agreste da Universidade Federal de Pernambuco nos cursos de Comunicação Social (com ênfase em mídias sociais e produção cultural) e Design.. Endereço de e-mail: [email protected]

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Depois de desenvolver uma breve caracterizaçãodas transformações trazidas pela cultura daconvergência para TV, a pesquisa mostrará asadaptações promovidas pela TV Globo para atenderàs demandas desse novo cenário. A escolha pela TVGlobo se deu por ser, reconhecidamente, um ricoobjeto de estudo, a principal indústria audiovisualdo país, a mais assistida rede de televisão (Borelli;Priolli (2000), e a primeira que estruturou um núcleocentrado na produção de conteúdos convergentes(Fechini et al., 2013). A observação das mudançasempreendidas pela emissora teve como base ométodo arqueológico foucaultiano, uma modalidadeda análise do discurso. É importante, no entanto,destacar que o artigo apenas se baseia nosprincípios dessa metodologia, não se propondo defato a realizar uma arqueologia do tema proposto.

A arqueologia é, mais precisamente, uma análisedas condições históricas de possibilidade quefizeram com que em um determinado momentosomente certos discursos e não outros tivessem setornado possíveis. Não se trata tanto de analisar aaparição de novas práticas, mas de analisar suaformação. A arqueologia é apontada como umamaneira de descrever acontecimentos discursivos,pois, na descrição conceitual de acontecimento, leva-se em consideração as condições de existência quedeterminam a materialidade própria dos discursos.Em um primeiro momento, podem-se distinguir doissentidos do termo: o acontecimento como novidadeou diferença (acontecimento arqueológico) e oacontecimento como prática histórica(acontecimento discursivo). O primeiro dá conta danovidade histórica e o segundo da regularidadehistórica das práticas. Chama atenção, no entanto, ofato de que há uma relação entre os dois sentidos:as novidades instauram novas formas deregularidade. Dessa forma, a partir do método, foipossível identificar a regularidade dos discursos depromoção à cultura participativa e a descrição dosfenômenos que possibilitaram tais procedimentos.Assim, serão apresentadas as condições deemergência para o desenvolvimento de discursos deestímulo à cultura participativa. Também, serápossível compreender as principais estratégiasutilizadas pela emissora para atingir as expectativasda configuração atual do ecossistema midiático ecomo elas constituem um acontecimento discursivona emissora.

2. A noção de acontecimento discursivo

Para chegar à ideia de acontecimento discursivona TV Globo a partir dos discursos de incentivo àcultura participativa, é importante conceituar algunstermos que aparecerão ao longo deste trabalho:formação discursiva e acontecimento discursivo. Em

Foucault (2007), compreende-se discurso como umarede de enunciados e de relações que tornampossível o sentido. O autor define discurso comoconjunto de enunciados que provém de um mesmosistema de formação. É por isso que, para ele, pode-se falar em discurso econômico, discursopsiquiátrico, por exemplo. O discurso é constituídopor enunciados para os quais se pode definir umconjunto de condições de existência. No entanto,como foi dito anteriormente, na arqueologia, nãobasta mostrar as novas práticas discursivas, masidentificar os fatores que permitiram o seusurgimento. A noção de formação discursiva se tornaessencial para alcançar os objetivos deste trabalhojustamente quando se interessa por entender o quedeterminou o aparecimento de novos discursos. É apartir desse conceito que será conhecido o conjuntode regras que definiram uma determinada época,pois a formação discursiva é um conjunto de regrasanônimas, históricas, sempre determinadas notempo e no espaço, que define uma época dada(Foucault, 2007).

O filósofo francês diz que os discursos pertencema uma mesma formação discursiva quando:

[...] se puder descrever, entre um certonúmero de enunciados, semelhantes sistemade dispersão, e no caso em que entre osobjetos, os tipos de enunciação, osconceitos, as escolhas temáticas, se puderdefinir uma regularidade (uma ordem,correlações, posições e funcionamentos,transformações), diremos, por convenção,que se trata de uma formação discursiva –evitando assim, palavras demasiadocarregadas de condições e conseqüências,inadequadas, aliás, para designarsemelhante dispersão, tais como “ciência” ou“ideologia”, ou “teoria”, ou “domínio deobjetividade”. Chamaremos de regras deformação as condições a que estãosubmetidos os elementos dessa repartição(objetos, modalidades de enunciação,conceitos, escolhas temáticas). As regras deformação são condições de existência (mastambém de coexistência, de manutenção, demodificação e de desaparecimento) em umadada repartição discursiva (Foucault, 2007,p. 43).

Uma formação discursiva se define caso sejapossível estabelecer um conjunto semelhante; se sepuder mostrar como qualquer objeto do discurso emquestão aí encontra seu lugar, sua lei deaparecimento. A regularidade surge a partir doaparecimento sucessivo com correlaçõessimultâneas. Descrever a regularidade discursiva deuma determinada formação é identificar o queFoucault (2007) chama de positividade, que seriamas condições que caracterizam a unidade de umdiscurso ao longo do tempo. Analisar positividades émostrar segundo que regras uma prática discursivapode formar grupos de objetos, conjuntos de

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enunciações, jogos de conceitos, séries de escolhasteóricas (Foucault, 2007, p. 203).

Essa forma de positividade define um campo emque podem ser desenvolvidas identidades formais,continuidades temáticas, translações de conceitos,jogos polêmicos. Assim, a positividade desempenha opapel do que se poderia chamar um a priorihistórico, que seriam as condições de realidade paraenunciados. O a priori se define como o conjunto deregras que caracterizam uma prática discursiva.Temos, na densidade das práticas discursivas,sistemas que instauram os discursos comoacontecimentos arqueológicos e discursivos. Oacontecimento discursivo é da ordem da rupturacom outros discursos. Ele instaura sempre umfenômeno discursivo inédito, que depende das regrasde formação.

O regime de existência de discursos de estímulo àcultura participativa na TV Globo não surgiu derepente. A decisão de estimular a culturaparticipativa surge a partir de regras de formação,que serão detalhadas neste trabalho. Vamosentender as condições de possibilidade queviabilizaram o acontecimento discursivo na TV Globocom foco na cultura participativa. O objetivo éexplicar qual foi o regime que garantiu a existênciados discursos de estímulo à cultura participativaenquanto discursos possíveis.

A existência de determinado objeto discursivo éestudada por Michel Foucault (2007) a partir dasdiversas regras de formação de um discurso. Para oautor, as condições de aparecimento dependem docontexto histórico e das relações de semelhança,vizinhança, afastamento, diferença e transformaçãoque esse objeto tem com outros. Essas relações sãoestabelecidas entre instituições, sistemas denormas, processos econômicos e sociais. Elas nãodefinem a constituição interna de um objeto, massão responsáveis pelas condições que permitiram oseu aparecimento. Com isso, não se quer dizer queas relações discursivas são exteriores ao discurso,que o limitariam ou obrigariam a enunciar certascoisas. “Elas estão, de alguma maneira, no limite dodiscurso” (Foucault, 2007, p. 51).

As relações apontam os objetos que podem serfalados, limitando ou impondo formas, ou forçando odiscurso, em algumas circunstâncias, a enunciarcertas coisas. Elas determinam o feixe de relaçõesque o discurso deve efetuar para poder falar de taisou tais objetos, para poder abordá-los.

Possivelmente, outros fatores podem indicar ascondições de possibilidade para emergência, na TVGlobo, do discurso de estímulo à culturaparticipativa. Neste trabalho, serão apresentadasduas dessas condições associadas ao surgimentodesses novos discursos. A primeira delas se refere aocontexto da cultura da convergência no Brasil e asegunda está ligada à ascensão de uma nova classeconsumidora no País, que antes não tinha

possibilidade de comprar e hoje é apontada comoprincipal audiência da emissora. Adiante dados deinstitutos de pesquisa vão corroborar para essa ideia(cf. Figura 1).

Notam-se dois eixos de articulação quepossibilitaram a constituição dos novos discursos deestímulo à cultura participativa na TV Globo: umparte das reconfigurações no campo midiático em si,enquanto o outro das transformações sociaissofridas pelo campo social brasileiro nos últimosanos.

3. Globo e a emergência de nova classe consumidora

De acordo com o Comunicado do Instituto dePesquisa Econômica Aplicada (IPEA) nº 158, dedezembro de 2012, as rendas que mais crescem noBrasil são as dos mais pobres e as de grupostradicionalmente excluídos como mulheres, negros eanalfabetos (IPEA, 2012, informação eletrônica). Arenda individual média de pessoas entre 15 e 60anos subiu 4,89% de 2011 para 2012. Os dados sãobem otimistas, o IPEA chega a falar emdesenvolvimento inclusivo e sustentável, mas atéchegar a esses números, um longo caminho precisouser percorrido. É essa trajetória que será analisada aseguir para que possamos entender como osurgimento de uma nova classe consumidora estáimplicando também o reposicionamento da TVGlobo.

André Singer (2012), no livro Os sentidos dolulismo, afirma que a melhoria das condições de vidano Brasil nos últimos anos se deu a partir de quatroeixos: ampliação da transferência de renda,expansão do crédito popular, valorização do saláriomínimo e geração de emprego. No livro, Singerconsidera o lulismo uma condição para essamudança. Em uma definição breve, o lulismo seriaum realinhamento do eleitorado, uma versãonacional do que os Estados Unidos viveram em 1930com o presidente Roosevelt, que causou asubstituição de lideranças.

O lulismo, estabelecido pela relação do presidenteLula com os mais pobres que, beneficiados porvárias políticas com foco na melhoria da qualidadede vida, retribuíram com apoio para eleição de 2006.O cientista político Singer (2012) defende que areeleição em 2006 foi “a sensação de que eleitores derenda baixa e média de que seu poder de consumoaumentara, seja em produtos tradicionais(alimentos, material de construção), seja em novos(celulares, DVDs, passagens aéreas)” (Edição Kobo,p. 34).

Esse foi o cenário — que tornou possível aentrada de mais de 30 milhões de brasileiros nomercado de consumo — e, assim, a formação de umanova classe emergente. Nunca se falou tanto sobre oaumento do poder aquisitivo e o surgimento de uma

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nova classe média. Importantes jornais, revistas,portais e até mesmo institutos de pesquisa têmnomeado dessa maneira os emergentes. No entanto,o sociólogo Jessé Souza (2012, p. 45) explica que otermo não é adequado.

Chamar de nova classe média trata-se deuma visão triunfalista que pretendeesconder contradições e ambivalênciasimportantes da vida desses batalhadoresbrasileiros e veicular a noção de umcapitalismo financeiro apenas “bom” e semdefeitos.

O autor defende a ideia de que os emergentes quedinamizaram o capitalismo brasileiros na últimadécada integram “aquilo que gostaríamos dedenominar ‘nova classe trabalhadora brasileira’”(Souza, 2012, p. 26). Souza (2012) justifica o uso dotermo “nova” com o argumento de que essa formaçãosocial é fruto das mudanças que acompanharam ainstauração de uma nova forma de capitalismo noBrasil e no mundo: o novo capitalismo financeiro.Diferentemente do fordismo (que ainda existe),baseado no rígido controle e disciplina, trabalhodisciplinado, hierárquico e repetitivo das fábricas,comprado com salários, tempo para lazer e direito debens duráveis e conforto, no novo capitalismofinanceiro.

Concordamos com a nomenclatura adotada porSouza e, por isso, empregamos o mesmo termo paranos referir à classe social que interessa para estapesquisa. Somados à classe média, a nova classetrabalhadora brasileira representa 104 milhões debrasileiros, que movimentaram um trilhão de reaisem 2012, correspondente a 25% do PIB brasileiro(Jimenez; Bacoccina, 2012, informação eletrônica).

Essa dinheirama nas mãos de umapopulação, que até pouco tempo estavapraticamente alijada do mercado, traz umdesafio formidável para as empresas,acostumadas a atender a metade mais ricada pirâmide (Jimenez; Bacoccina, 2012,informação eletrônica).

De acordo com a cartilha Vozes da Classe Média,pesquisa desenvolvida pela Secretaria de AssuntosEstratégicos do Governo Federal, em 2012, entre2003 e 2010, foram criados 14 milhões de empregosformais e o salário médio do trabalhador expandiuem quase 20%. Isso levou o Brasil a ocupar a oitavaposição no mercado consumidor do mundo e aclasse média, entendida no estudo como famíliascom renda per capita entre R$291 e R$1.019 pormês, responde por 38% do consumo das famíliasbrasileiras (Secretaria de Assuntos Estratégicos,2012, informação eletrônica).

A porta de entrada para mudança do olhar dasemissoras sobre essa população foi a publicidade. Oaumento do poder aquisitivo da população e aformação de uma nova classe emergente levou a

publicidade a entender e montar estratégias paraesse público. Uma reportagem da Folha de SãoPaulo atesta:

[...] a propaganda no Brasil vai mudando ecomeça a não espelhar apenas brancos ericos; grupos que só atendiam a classe AAAlançam produtos mais populares(Marinheiro, 2012, informação eletrônica).

Na mesma matéria, o professor da Faculdade deEconomia, Administração e Contabilidade da USP,Celso Grisi, avalia que “os empresários perceberamque é essa classe média crescente que dará aosnegócios escala econômica” (Marinheiro, 2012,informação eletrônica).

Ao despertar esse interesse no campopublicitário, a nova classe trabalhadora brasileiratambém ocupou destaque na programação televisivacomo resposta a esse reposicionamento nasociedade. O aumento da renda e o parcelamento decompras deu à nova classe social possibilidade deconsumir produtos que antes não tinham comocomprar.

Dados divulgados, em 2014, pela AssociaçãoBrasileira de Televisão por Assinatura (ABTA)mostram que, de 2011 a 2013, o percentual departicipação da classe C no mercado de TVs pagasaumentou dez pontos percentuais, passando de 24%para 34%. A participação das classes A e B é de 87%e 65%, respectivamente. Embora estejam migrandopara os canais pagos, não significa que deixem deconsumir TV aberta. Muito pelo contrário, são oprincipal público dos canais abertos atualmente. Deacordo com dados do Instituto IpsusMarplan, apartir de hábitos de consumo1, 91% dosentrevistados (universo de 47.676 pessoas) têm ohábito de assistir à TV Globo (esse dado representa apenetração que a TV Globo tem) e a classeeconômica2 C figura como a que mais tem o hábitode consumir os produtos da emissora, totalizando48%.

As discussões sobre a audiência da televisãoforam balizadas em 2010 pelo fenômeno da“nova classe C”. No mercado das tecnologiasde comunicação, observou-se crescimentomuito significativo da compra deeletroeletrônicos. Esses dados tiveramconsequências importantes tanto para aformatação da grade de programação quantopara os conteúdos em TVs abertas e porassinatura, principalmente porque a classeC dedica mais tempo à TV que as classes ABe prefere telenovelas, programas humorísticoe de auditório. A entrada dessesconsumidores provocou mudanças visíveis

1 Por hábito de consumo, o instituto quer mostrar quem são aspessoas que têm o hábito no caso de ver TV como uma práticacorrente, costume, tradição ou probabilidade de maior frequência.2 A classificação usada para as Classes Socioeconômicas é o CritérioBrasil, que é definido por um modelo matemático desenvolvido noano de 2008, que trata da posse de bens não voláteis, ou seja, bensque já estão com seu consumo estabilizado.

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na programação, que se traduziram emestratégias para a sua fidelização, como, porexemplo, canais que passaram a exibirprogramas e filmes dublados e a inclusão deconteúdo nacional em canais internacionais(Lopes et al., 2011, p. 138).

As alterações com o avançar dos anos foramintensificadas. Além das estratégias iniciais defilmes, outras passaram a ser estabelecidas como arepresentação na programação das pessoas dessaclasse social e o olhar sobre o consumo dessa classeem relação às novas tecnologias e às transformaçõesculturais associadas. Durante muito tempo ainternet e a alta tecnologia eram regalias ligadas àsclasses altas. Mas a tecnologia mudou a relação dosbrasileiros com a sociedade e ressaltou o grandepoder de consumo da nova classe média. Pesquisado instituto Data Popular, de 2011, mostrava queera prioridade para pessoas na faixa de renda daclasse que estudamos neste trabalho a compra desmartphones. Em segundo lugar, estão os laptops(Nova Classe, 2011, informação eletrônica). Ainda deacordo com pesquisas do Instituto de PesquisasData Popular, a nova configuração da sociedadebrasileira mudou do tradicional triângulo para olosango e trouxe muitos impactos no setor deconsumo e e-commerce. Dados divulgados, em 2014,também pelo Data Popular, mostram que, emcomunidades mais carentes, 85% das pessoaspossuem um celular e 22%, smartphones. O mesmoinstituto de pesquisa afirma que seis entre dezpessoas que acessam à Internet são dessa novaclasse social. Levantamento divulgado em 2014 pelaempresa de pesquisas de mercado ComTech daKantarWorldpanel mostra que a maior parte dosconsumidores de smartphones são da classe C. Elessomam 36% dos donos dos aparelhos eletrônicos(Revista Exame, 2014, endereço eletrônico).

A partir desses dados, percebe-se que essa classesocial é também consumidora de tecnologiasnecessárias para colocar em operação a dimensãodas múltiplas telas, condição essencial da cultura daconvergência. Pesquisa do Ibope de 2013 revelouque 46 milhões de brasileiros estão nas redes sociaisonline. É, de acordo com dados do IpsosMarplan, aclasse social que mais tem o hábito de assistir à TVGlobo pelo celular e pela internet. As informaçõesmostram que 50% da classe C têm, diante douniverso de entrevistados (114 pessoas), o hábito deassistir à TV Globo pela internet contra 6,14% daclasse A. De acordo com os dados 50% das pessoasque têm o hábito de assistir à TV Globo pela internetsão da classe C. Quando se fala em assistir a partirdo celular, os números são exatamente os mesmos.

De acordo com o Ibope, em pesquisa de 2013, apenetração da internet, no Brasil, já chega a 56% dapopulação, o que representa um crescimento de115% desde 2003. Esses dados fazem parte doestudo Conectmedia, desenvolvido pela área de

learning & insights, do IBOPE Media. Olevantamento aponta que a internet e as novasplataformas estão contribuindo para o consumo dosdemais meios. “Simultaneidade e convergência sãopalavras-chave no novo contexto midiático, no qualos meios são consumidos nas mais variadascombinações e formas” (IBOPE, 2013, informaçãoeletrônica).

O acesso dessa nova classe social aosequipamentos eletrônicos (smartphones, tablets ecomputadores) e à internet (pelo celular ou porprogramas populares de banda larga) levaram essaclasse a despertar interesse dos meios decomunicação também no consumo de conteúdos emoutras plataformas midiáticas utilizadas pelaempresa.

Os reposicionamentos da TV Globo diante dessesnovos consumidores pertencem a duas ordens:acentuação das representações da periferia epreocupação em ensinar a consumir os produtos daemissora em outras plataformas, que Fechine (2012)chama de “pedagogia” de consumo dos meios3.

4. Representação da nova classe social brasileira

Dados da pesquisa Classe C urbana doBrasil: Somos iguais, somos diferentes, realizadapelo Ibope (2010), afirmam que a TV é a maior fontede entretenimento dessa população. De todaaudiência dos canais abertos, em 2011, 52% era deespectadores da classe C. Em matéria para o jornalO Globo, as repórteres Natalia Castro e Thaís Britto(2012, informação eletrônica) afirmam que:“entender quem é esse público e o que ele desejavirou obrigação”. Em entrevista às jornalistas, odiretor-geral da Rede Globo Octavio Florisbalesclarece que a nova classe C é tema de estudos daemissora e explica:

São mudanças importantes que precisamosacompanhar na nossa dramaturgia, comnosso humor, na prestação de serviço com ojornalismo. As próximas novelas terãorealmente uma abordagem mais popular”,disse, na entrevista coletiva (Castro, Britto,2012, informação eletrônica).

Essas palavras foram ditas no lançamento daprogramação da emissora para 2012. Ao longo doano, foi constatado que a emissora, de fato, investiuem conteúdos com foco na representatividadepositiva da nova classe trabalhadora do Brasil. “Vivao subúrbio. É lá que tá o futuro”, alertava Cadinho,personagem do ator Alexandre Borges, em AvenidaBrasil. A telenovela levou para o horário nobre da

3 Termo utilizado pela professora Yvana Fechine durante aula dadisciplina TV Digital, em 2012. A disciplina foi oferecida pelosProgramas de Pós-graduação em Comunicação e Ciências daComputação em uma parceria dos professores Carlos Ferraz eYvana Fechine.

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emissora estilos de vida dessa classe social. Ascenas da mansão de Tufão, personagem vivido porMurilo Benício, no bairro suburbano do Divino,contavam com um áudio em que todos ospersonagens falavam alto e ao mesmo tempo. Naépoca, a produção disse que era para representarcom mais veracidade os hábitos dessa população.Exagero ou não, a fórmula deu certo.

A ambientação no Divino, bairro fictício do Rio deJaneiro, de acordo com Brisolla (2012, informaçãoeletrônica), contribuiu para inverter a lógicaprioritária da dramaturgia da emissora.Normalmente, ambientadas em espaços habitadospelas classes A e B carioca e paulista, a trama deJoão Emanuel Carneiro optou por concentrar asações em lugares populares. Como resultado, foieleita pela revista Forbes, especializada em negócios,a mais bem sucedida da história da TV Globo(Antunes, 2012, informação eletrônica).

Durante os sete meses de exibição, dados darevista Forbes mostraram que a Globo faturou umbilhão de reais em publicidade, tornando a novela amais bem sucedida da história da América Latina. Apublicação afirma, ainda, que o sucesso bilionáriopode ser atribuído à escolha por representar o queeles chamam de classe C, adiante teremos umadiscussão mais apropriada sobre o uso desse termo.Para dar conta desse povo que quer se ver na TV, aemissora realizou pesquisa de hábitos paracomposição dos personagens (Brisola, 2012,informação eletrônica). Renato Meirelles, sócio-diretor do instituto de pesquisa Data Popular, ementrevista para a BBC Brasil, disse que a novela fazparte de um movimento da Rede Globo de entender ese aproximar mais da classe média, que não éapenas a maioria da audiência, mas também amaioria do mercado consumidor, que é para quemos anunciantes querem vender (Carneiro, 2012,informação eletrônica).

A novela Cheias de Charme também investiu emrepresentar uma classe que não aparecia comoprotagonista de telenovelas. O economista-chefe doCentro de Políticas Sociais da Fundação GetúlioVargas Marcelo Néri, em matéria do O Globo, afirmaque os exemplos das novelas, por muito tempo, eramde pessoas muito sofisticadas. “As domésticasassistiam àquilo como quem olha de baixo. Agora,essa nova classe média quer ver um espelho do queela se tornou” (Castro; Britto, 2012, informaçãoeletrônica). No mesmo texto, o autor da trama FelipeMiguez considerou ótimo ter empregadas domésticascomo protagonistas. “Mostramos personagens queainda não tinham sido vistos, ao menos não daquelaforma” (Castro; Britto, 2012, informação eletrônica).

A série Suburbia4 formou atores de comunidadese levou, com uma linguagem quase documental,para a madrugada da TV Globo histórias sobremoradores de favelas. O público prioritário dessaprodução não são os novos trabalhadoresbrasileiros, que precisam acordar cedo todos os dias,mas um telespectador mais escolarizado, aberto aexperimentações e narrativas mais complexas.

A pesquisa do Ibope (2010) mostrou também queestão na ordem de preferência da classe as novelas,seguidas pelos humorísticos e programas deauditório. Zorra Total5 continua há anos cumprindoa missão de representar, mesmo quegrosseiramente, tipos do subúrbio. Ainda no campodo humor, chama atenção também a repercussão dasérie Tapas & Beijos6, protagonizadas por FernandaTorres e Andréa Beltrão, que interpretam Fátima eSueli, respectivamente. As duas moram no Méier,subúrbio carioca, e são vendedoras em uma loja devestidos de noivas. No enredo, muitos retratos dotrabalho e da vida sentimental da nova classetrabalhadora brasileira. As atrações com auditórioEsquenta!7 e Caldeirão do Huck8 investem emmostrar mais sobre a realidade dessa população. Acarreira de Regina Casé como apresentadoracomeçou nos 90. De lá para cá, ela virou umaespécie de voz autorizada da Globo para falar sobrea periferia. Em entrevista ao portal Terra, sobre asegunda temporada do Esquenta!, disse:

Hoje a periferia está na moda, mas estoufalando dela há tempos. Sou rotulada comouma apresentadora que só fala de preto,pobre e favelado. No entanto, tenho apenasliberdade e vontade de falar sobre o povo

4“Minissérie brasileira, produzida e exibida pela Rede Globo entre 1ºde novembro de 2012 a 20 de dezembro de 2012, em 8 episódios.Escrita por Luiz Fernando Carvalho e Paulo Lins, com direção-geralde Luiz Fernando. Ambientada na década de 1990, a minissérieconta a história de Conceição (Débora Fidelix Nascimento /ÉricaJanuza), uma jovem de Minas Gerais que é acolhida por umafamília do Rio de Janeiro. Grande parte do elenco são jovens decomunidades principalmente integrantes do grupo "Nós do Morro",e vários deles passaram por testes até formar o elenco. Tudo isso sedeve porque o diretor e criador da minissérie queria que ela tivessemais próxima da realidade” (Wikipedia, 2014, informaçãoeletrônica).5Programa de televisão humorístico brasileiro produzido e exibidopela Rede Globo desde 25 de março de 1999.6Série de televisão brasileira produzida e exibida pela Rede Globosemanalmente desde 5 de abril de 2011. De autoria de CláudioPaiva, dirigida por Maurício Farias e protagonizada pelas atrizesFernanda Torres e Andréa Beltrão como as amigas Fátima e Sueli,respectivamente.7“Programa dominical da Rede Globo, apresentado por Regina Caséexibido atualmente no início das tardes de domingo e gravado cercade um mês antes da transmissão original (com a exceção doprograma em homenagem ao dançarino Douglas Silva, gravado trêsdias antes da sua exibição). O programa tem a proposta de trazeruma atração voltada aos públicos C, D e E à grade da Globo, comouma atração que lembra bastante uma festa na periferia carioca,em função da ascensão econômica dessa parte da população”(Wikipedia, 2014 informação eletrônica).8Programa de televisão brasileiro vespertino, produzido e exibidopela Rede Globo que vai ao ar aos sábados. Estreou em 8 de abrilde 2000, sempre sob o comando de Luciano Huck.

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brasileiro (Bessa, 2012, informaçãoeletrônica).

Na outra ponta, Luciano Huck visitacomunidades carentes para conhecer histórias,reformar casas no quadro "Lar Doce Lar",transformar carros no "Lata Velha", e eleger a maisbela mulher moradora de subúrbios, no "Top CufaBrasil 2012".

Novelas acabam, outras começam e a nova classetrabalhadora está sempre lá, ocupando espaço. Atrama de Salve Jorge se passa em uma favelaficcional. Na área da informação, os telejornais daTV Globo também fazem questão de se aproximar daclasse emergente, seja nos programas locais ounacionais, exemplo disso são as matérias sobre osproblemas e/ou culturas dos subúrbios brasileiros,ainda que seja numa chave bastante dicotômicamiséria/favelado legal. Adequados ou não, osretratos da nova classe trabalhadora brasileiraocupam as mais variadas faixas horárias da TVGlobo.

5. “Pedagogia” de Consumo dos Meios

Se a nova classe passou a ser prioridade nosprogramas televisivos, ela também se tornou alvoimportante nas estratégias de interação com outrosequipamentos eletrônicos conectados à internet. Oestímulo à cultura participativa também foiincentivado com o surgimento dessa nova classe.Não foram poucos os momentos em que,especialmente as telenovelas, mas tambémprogramas de auditório e telejornais, mostraram asnovas tecnologias, incluindo smartphones e tablets,sendo utilizados. É um processo que funciona comouma pedagogia dos meios, uma estratégia de educara população a utilizar determinados equipamentoseletrônicos. O site Gshow da emissora chegou amostrar o passo a passo de como o público deveriaacessar os conteúdos da telenovela no portal. Claroque a estratégia funciona para diferentes perfis depúblico, mas infere-se também uma preocupação emmostrar aos novos consumidores como eles podemfazer para acessar os conteúdos (cf. Figura 2).

No texto, o Gshow esclarece que os sites danovela foram reformulados e mostram um passo apasso de como os consumidores podem navegarpelas páginas e quais caminhos devem fazer paraencontrar determinados tipos de conteúdo. Nasfiguras seguintes (cf. Figuras 3 e 4), fica claro comoeles tiveram a preocupação de mostrar até os locaisem que as pessoas deviam clicar para acompanharmais conteúdos, mais informações sobre as novelas.Na figura 5, eles mostram como os consumidorespodem usar o menu para localizar conteúdos.

Sempre que surgem novas ferramentas, aemissora desenvolve uma espécie de tutorial

mostrando o passo a passo do que as pessoasprecisam fazer para acessar àqueles conteúdos. Ostutoriais servem logicamente para qualquer pessoaque queira aprender a navegar pelos produtos da TVGlobo, mas nota-se também um esforço em ensinaraos consumidores das classes sociais que passarama ter acesso a esses novos bens de consumo ainteragirem adequadamente com os conteúdosproduzidos para outras plataformas midiáticas.

Nas próprias novelas, os personagens aparecemutilizando os novos meios de comunicação,estimulando os espectadores a usarem taisferramentas. É interessante observar que constituitambém uma forma de preparar o público para oque vem em um movimento semelhante aos que aspublicidades mais antigas faziam quando ensinavamas pessoas a utilizarem os produtos. A TV Globoprepara o consumidor para responder aos apelos dacultura participativa no cenário da cultura daconvergência.

6. Globo na cultura da convergênciaDe acordo com pesquisa do instituto Millward

Brown, realizada no Brasil, divulgada em 2014, 66%dos brasileiros usam apenas um aparelhotecnológico por vez, mas 34% fazem uso simultâneodas tecnologias. Dos que usam simultaneamente,36% estão em busca de conteúdos relacionados aoque consumiam naquele momento. Os outros 64%estão acessando conteúdos dissociados. Osconsumidores acessam outras telas para buscarmais informações sobre o produto (27%), discutir oque está consumindo com outras pessoas (22%),interagir com o conteúdo televisivo (25%) e seguirum aplicativo de TV (11%). O consumo atrelado à TVé feito especialmente a partir do computador oulaptop, smartphones e tablets. De acordo com apesquisa, as pessoas usam diariamente a TV, emmédia, por 113 minutos, enquanto o celular é usadopor 149 minutos, o tablet por 66 minutos e o laptoppor 146 minutos.

Foi justamente de olho nesse consumo associadoe nesse interesse por estender a experiência da TVpara outros plataformas que a TV Globo investiu nainternet como uma plataforma parceira queaproximaria ainda mais a audiência da emissora.

Durante o seminário “Desafios da Integração daTV Conectada no ambiente da TV Digital brasileira”,evento realizado pelo Globo Universidade, Programade Pós-graduação em Comunicação e Centro deInformática da Universidade Federal dePernambuco, em 2012, o diretor geral de engenhariada TV Globo, Carlos de Brito Nogueira, apontoualgumas perspectivas da emissora diante da culturada convergência.

Ele destacou que a TV Conectada, aparelhos quepermitem a navegação e o download de aplicativos,também chamada de Smart TV, é um dos cinco

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pontos estratégicos da emissora e que isso foiinstituído à medida que a Globo percebeu que a telada TV passou a ser compartilhada por vários outrosdispositivos. “A TV nos traiu. Arrumou outroscasos”, revelou o engenheiro. Ao apresentar astendências da emissora, Carlos de Brito explicou quenão é possível falar de TV no Brasil sem pensar naideia de fluxo, sobretudo ao se pensar no modelo denegócio há muito tempo consolidado pela emissora.

A Globo busca trabalhar, portanto, comperspectivas de lançamento de conteúdosem outras mídias, sempre a partir da gradede programação (do fluxo). Para não haverconcorrência de conteúdos com a tela de TV,incluindo aqui as “parcerias publicitárias”, aGlobo está desenvolvendo, experimentando eestruturando projetos de segunda tela comconteúdos sincronizados e complementares(Nogueira, 2012, informação verbal).

A observação da materialidade dos discursos deapelo à cultura participativa nos levou a identificarque eles coincidem com os conteúdos oferecidos aopúblico a partir das estratégias transmídias criadaspela emissora. Neste trabalho, a análise foi feita, naTV Globo, a partir da telenovela, que é, como vimosno depoimento do gerente de Formatos da área deDesenvolvimento Artístico e Portfólio da TV Globo,Alex Medeiros, e o autor e roteirista, GustavoContijo, o espaço privilegiado de investimentos daemissora na interação com o público. “[...] atelenovela é nosso formato característico e nossogrande desafio. Procuramos experimentar formatos elinguagens ao máximo” (Medeiros; Contijo, 2013, p.349). Eles ainda informam que só existemprofissionais atuando na interação com a audiênciaem outras plataformas nas telenovelas, emboraafirmem que há profissionais em outras produçõespreocupados com essas questões.

Certamente, a escolha da emissora por investirna telenovela não se deu por acaso. A novela, desdesua veiculação diária, a partir de 1963, aparececomo produto prioritário no contexto de produçãodas diferentes emissoras. A telenovela pode serconsiderada um dos suportes fundamentais do tripéque constitui a base de funcionamento da televisãobrasileira: telejornalismo, variedades eteledramaturgia. A telenovela ajuda a pensar ocontexto das manifestações populares de massa noBrasil e sobre a consolidação de um modelo detelevisão no Brasil. “Um período bastante fértil deproduções de telenovelas [...] foi entre 1963 e 1969,quando foram produzidas 169 telenovelas” (Borelli;Priolli, 2000, p. 21). É importante lembrar que ocusto de produção de uma telenovela pode serconsiderado baixo quando relacionado ao retornoobtido com vendas publicitárias e merchandising.Com baixo custo e alta rentabilidade, ela se tornouuma das produções por excelência da TV Globo. AGlobo é a emissora que sabe fazer novela, que

propicia ao telespectador usufruir produtos comacabamento técnico modernos (Borelli; Priolli, 2000,p. 30). Quanto às mediações da telenovela com avida cotidiana, vale a pena enfatizar que, além deinterferir nos hábitos familiares e nas dimensões dasubjetividade, ela restitui elementos presentes emtraços culturais que integram o universo tradicionalda cultura popular. A telenovela responde ainda poroutros requisitos que colaboram para a reflexãosobre o contexto das manifestações culturaispopulares de massa emergentes, no Brasil, a partirdos anos 1960, no momento da efetiva expansão deum mercado de bens simbólicos (Borelli, 2005, p.193). Por esse motivo, este trabalho debruça seuolhar sobre esses produtos.

Os movimentos de aproximação entre a TV Globoe sua audiência sempre existiram. Das cartas etelefonemas, do Você Decide9 ou Intercine10, aemissora estimulava a participação, mas não setratava de um estímulo à cultura participativa nostermos que já conceituamos anteriormente. Graçasàs facilidades de comunicação proporcionadas pelacultura da convergência, foram ampliados os canaisde participação. Hoje, os telespectadores ajudam aconstruir roteiros de programas11, enviam vídeospara telejornais, participam de enquetes, acessamconteúdos online, "postam" materiais audiovisuaisdiante de concursos, além de outras oportunidadesque têm sido criadas para atender às novasdemandas.

Como foi visto anteriormente, a cultura daconvergência alterou profundamente a televisão.Com a TV Globo e sua busca pela manutenção doPadrão Globo de Qualidade e fidelização daaudiência não foi diferente. No livro A deusa ferida,Borelli e Priolli (2000) apontaram na virada de umadécada os motivos pelos quais a TV Globo vinha

9Programa exibido pela Rede Globo entre 1992 e 2000. Em cadaepisódio, eram encenados casos especiais, com um final diferente aser escolhido pelos telespectadores através de votações por telefone.10Sessão de filmes que ocupou a grade de programação da emissorade 1996 a 2011. Por telefone, os telespectadores escolhiam o filmeque seria exibido no dia seguinte.11Em Norma (2009), por exemplo, o público acessava o blog doprograma e contribuía com histórias. A promessa era um roteiroescrito a mil mãos. A série contava a história de uma psicólogaDurou apenas três edições e foi tirado do ar. A proposta era clara:"Público fará roteiro a mil mãos na série Norma". Antes da estreiado programa, matérias jornalísticas, chamadas na programação eparticipações em outras produções da Rede Globo anunciavam aproposta de interação do novo produto, que estreou no dia 4 deoutubro de 2009, em um domingo, depois do Fantástico, e contoucom apenas três edições. Não há nada de inovador no enredo deNorma. É, por sinal, uma história bastante convencional. Umapsicóloga, com 40 anos, recém-separada que vive na mesma casaque o marido (interpretado pelo ator Cássio Gabus Mendes), temuma filha adolescente e está à procura de um novo amor.Interpretada pela atriz Denise Fraga, a personagem trabalha em uminstituto de pesquisas comportamentais e é justamente o motedessas pesquisas que dão o tom de cada edição do programa. Odiferencial da série está centrado no investimento em múltiplasplataformas, visto que, além do programa na TV, os telespectadorespodiam participar, seja opinando, seja escrevendo o roteiro, pormeio do site e do blog de Denise.

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perdendo audiência. No livro, os pesquisadoresmostram que, a partir dos anos 90, houveacirramento da concorrência direta com outrasemissoras, incluindo a penetração popular dealgumas empresas como Record e SBT e realocaçãode verbas publicitárias, crescimento da TV paga coma migração de um público com maior poderaquisitivo, e, por fim, a entrada de novas tecnologiase acesso à internet. Se no final do século passado, arede mundial de computadores já era vista comouma importante via de mudança na TV Globo, doinício do século XXI aos dias de hoje, essastransformações foram intensificadas. Segundo ogerente de Desenvolvimento de Produtos da TVGlobo, Alex Medeiros, com a colaboração do autor eroteirista e coordenador de Desenvolvimento deNovos Formatos da TV Globo, Gustavo Contijo,

A Globo estuda há anos a expansão dainternet, entendendo que esta traria desafiose oportunidades para o processo criativo.Em 2007, diversos grupos foram montadospara estudar essas transformações e propornovos modelos de atuação (Medeiros;Contijo, 2013).

Nos últimos 49 anos, a TV Globo esteve presentediariamente em muitos lares brasileiros,responsabilizando-se, muitas vezes, pela forma comoos telespectadores compreendem a realidade. Aarticulação das imagens da TV com o imagináriosocial leva os espectadores a compartilharem com atelevisão modos de ver, saber e falar.

A queda nos índices de audiência e aconcorrência frente a novos meios de comunicaçãolevaram a Rede Globo a reconfigurar suaprogramação e, dessa forma, atrair audiência einvestidores. Nota-se, um esforço da Globo emlançar suas produções para outros meios decomunicação dentro deste conceito da novatelevisão.

Com a emergência e popularização das redessociais online, os padrões de produção e consumo debens culturais vivem um processo contínuo detransformação, produzido pelas tensões entre omodelo tradicional e consolidado e o padrãoemergente de cultura das mídias e das imagensdigitalizadas.

Essa nova forma deconsumir/receber/apropriar-se de bensculturais apresenta-se como um desafiopara o campo televisivo. [...] o que se podeverificar é que a Globo busca, no momentoatual, consolidar estratégias para atingiresse novo público, ao mesmo tempotelespectador e internauta, que parece nãomedir esforços para acessar bens culturais,por meio da mídia que oferecer a trilha maiseficiente (Borelli, 2011, p. 67).

A observação das transformações nateledramaturgia nos últimos anos revela um

empenho por parte da emissora em divulgarconteúdos em outras plataformas e convidar otelespectador a interagir com autores e personagens.

A incorporação crescente dos usuários naRede propicia a configuração de um entornomidiático onde as fronteiras entre produçãoe recepção são cada vez mais difusas, queestá transformando a rede no principalaliado da ficção televisiva (Lacalle, 2010, p.79).

O primeiro passo realizado pelo Grupo Globo,responsável pela TV Globo, foi a criação, em 2001,do Globo.com, portal e provedor de internet. Osconteúdos giravam em torno do jornalismo, esporte eentretenimento, incluindo notícias sobre ateledramaturgia. Os sites das novelas só foramcriados anos depois. Em buscas pela internet nodomínio da Globo, foi encontrado site para novelas apartir de Mulheres Apaixonadas (2003).

A partir de pesquisa desenvolvida por Borelli(2011), que buscou nos arquivos do Globo.com ossites das novelas que foram ao ar nos anos de 2008a 2010, foi possível verificar uma significativatransformação nos formatos de web. De acordo coma pesquisadora, nas telenovelas anteriores a 17 demaio de 2010 — estreia da telenovela Passione —, ossites estão centrados, predominantemente, emtextos e fotografias: embora o vídeo seja utilizado,sua presença é ainda periférica. “Desde então, ossites se transformam e a produção audiovisualpassa a ocupar um lugar expressivo, em detrimentodo espaço reservado aos textos escritos e às imagensfotográficas” (Borelli, 2011, p. 80-1).

Nessa época, pesquisada por Borelli, já havia naemissora um núcleo dedicado ao planejamento,produção e divulgação desses conteúdos. A TV Globofoi uma das primeiras emissoras a estruturar, apartir de 2008, um núcleo de produção transmídia.Iniciado em 2007, com a constituição de gruposinternos de estudo, o processo culminou na criaçãoda função do produtor de conteúdo transmídia, umnovo perfil profissional incorporado hoje às equipesdas telenovelas, principal formato dateledramaturgia brasileira. De acordo com Medeirose Contijo (2013), em entrevista para a rede Obitel depesquisadores, o produtor de conteúdo transmídia éresponsável pelas ações virtuais que envolvamaspectos referentes à trama e aos personagens, eminterface permanente com os autores e diretores decada produto.

Passione marca o início de um novo formato dewebsite para as telenovelas da Globo, em que o vídeopassa a ganhar mais destaque com a possibilidadede recuperação de capítulos bem como incrementodas interações com os consumidores a partir dejogos eletrônicos e brincadeiras.

Antes disso, a emissora já havia criado o seuprimeiro perfil em redes sociais. Em dezembro de

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2008, a Globo criou uma conta no Twitter paradivulgar sua programação e interagir comconsumidores. Ela chegou a criar perfis oficiais parapersonagens de novela como os de Jacques Leclair eVictor Valentim, estilistas da novela Ti-ti-ti. Depois,a emissora não criou mais perfis para personagense, atualmente, mantém apenas o perfil da RedeGlobo e de alguns programas específicos12.

As primeiras experiências com blogs, hospedadosdentro do site das novelas, surgiram com Caminhodas Índias. O personagem Indra, vivido pelo atorAndré Arteche, tinha um blog, mas não haviaenvolvimento direto com a história. Com o blogSonhos de Luciana, diário eletrônico da personagemLuciana da novela Viver a Vida, exibida na TV Globono horário nobre, Luciana, que ficou tetraplégicadepois de um acidente de carro, contavaexperiências de sua “nova vida”. Os leitoresinteragiam enviando mensagens de incentivo àpersonagem. Aos poucos, o blog ganhou mais espaçotambém na trama e passou a falar ainda mais sobreos direitos de pessoas com necessidades especiais.

Dados do Observatório Ibero-americano da FicçãoTelevisiva (Obitel/2010) mostram que, em 2009, aTV Globo foi a principal emissora a investir em umconceito de programação multimídia. A soap operaMalhação, na temporada de 2009, além de criarblogs dos personagens, desenvolveu conteúdosexclusivos para a internet em capítulos curtos de atédois minutos, que apresentam desdobramentos quenão foram mostrados na televisão. Segundo análisede Lopes et al. (2010), a primeira temporada da sé[email protected] foi lançada em DVD. A minissérie Som& Fúria14, exibida pela Globo, em 2009, foiinicialmente produzida para a televisão e, emseguida, sua versão reduzida ganhou as telas docinema; pouco depois, foi lançado o box de DVDscom a minissérie completa. O programa Norma foitambém mais uma demonstração desse esforço. Aprodução investia na interatividade à medida que apersonagem principal (Norma) contava com a ajudada plateia presente no palco e de internautas para aconstrução do enredo. Um blog colocou emdiscussão assuntos tratados pelo programa,possibilitando aos roteiristas da série contato com asexpectativas e opiniões do público.

De fato, a extensão das narrativas televisivasàs novas tecnologias é considerada um dosprincipais motores da renovação da ficçãotelevisiva [...] O casamento entre a televisãoe as novas tecnologias, sobre o qual se firma

12É o caso de Malhação e The Voice Brasil, programas que serãomelhor caracterizados mais adiante.13Voltada para o público jovem, a série contou a história de cincoadolescentes integrantes de uma banda de rock emocore.14Minissérie brasileira, parceria da Rede Globo com a produtora O2Filmes. Adaptada da série canadense SlingsandArrows, foi exibidade terça à sexta-feira, estreou no dia 7 de julho de 2009 e terminouno dia 24 de julho de 2009.

a crescente construção e o impulso dasnarrativas transmediáticas, é, sem dúvida,por amor (por parte dos destinatários), mastambém por conveniência (por parte dosemissores), e está rejuvenescendo um meiocuja rentabilidade em curto prazo passaprecisamente pela parceria com novastecnologias (Lacalle, 2010, p. 82).

Em Cheias de Charme, três empregadasdomésticas que protagonizam a história gravam umvideoclipe na casa da patroa de uma delas (Chayene)com uma música em que fazem gozação com as“madames”. A novela repercutiu bastante por contado universo criado em torno da internet e dolançamento de conteúdos em outras plataformas. Nanovela, o vídeo acaba sendo "postado" na internetpor Socorro (Titina Medeiros), que queria tomar oemprego de Rosário na casa de Chayene (CláudiaAbreu), uma cantora brega muito famosa que sonhaem se casar com o também cantor Fabian (RicardoTozzi), o “príncipe das empregadas”. Rapidamente, ovídeo começou a ser compartilhado entre ospersonagens da novela que apareciam assistindo aovídeo sem que ele tivesse sido mostrado para oespectador. Ao final desse capítulo, que foi ao arpropositalmente em um sábado (19/05/2012), aGlobo exibiu o endereço online em que o vídeopoderia ser visto. Apenas no capítulo seguinte, nasegunda-feira seguinte (21/05/2012), o vídeo foiexibido na íntegra dentro da própria telenovela,dando tempo para que se tornasse um viral, como,de fato, ocorreu15.

A partir de 2 de janeiro de 2012, foi criada apágina no Facebook da Rede Globo. A emissorachegou a criar, em 2011, uma página exclusiva paradramaturgia (o Novelas - TVG), mas tirou do ar,ficando apenas com o da Rede Globo e de algunsprogramas específicos.

No Instagram, a emissora anunciou sua entradana rede social de compartilhamento de fotografiasem 12 de março de 2013. Há o perfil da Rede Globoe de alguns programas específicos.

Em janeiro de 2014, a emissora criou o portalGshow16. Anunciado como o canal de entretenimentoda empresa, nele, é possível encontrar informaçõessobre os programas favoritos dos telespectadores.Com a criação do Gshow, todos os sites deteledramaturgia migraram para o portal. Com ele,pode-se dizer que houve mais uma mudança, comoa que houve em 2010 com Passione. Dessa vez,foram intensificados os espaços de interação com opúblico a partir do acionamento de redes sociais,como Facebook e Twitter, no próprio site daemissora. Também, há um investimento maciço nadivulgação de vídeos, sejam eles antecipandoconteúdos, possibilitando assistir aos capítulos na

15O vídeo até junho de 2013 já havia sido visto mais de 11 milhõesde vezes.16Disponível em: <gshow.globo.com>. Acesso em 6 de fevereiro de2014.

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íntegra, ou recuperando cenas exibidas na TV. Apromessa é clara:

Interatividade, diversão, participação dotelespectador, bastidores, entrevistasexclusivas, vídeos, tudo sobre o que vaiacontecer nas novelas, e muito conteúdo quevai além da TV, como Estilo, Decoração,Receitas, Tutoriais etc (Conheça o Gshow,2014, informação eletrônica).

Na segunda edição do programa The VoiceBrasil17, a Globo lançou um aplicativo parafuncionar como uma segunda tela18. Com ele, osconsumidores podiam dar palpites sobre quem seriaescolhido entre os técnicos e também qualparticipante deixaria o programa nas fasesseguintes. Ele funcionava enquanto o programaestava no ar. Quanto mais respostas corretas,melhor a posição do consumidor no ranking. Haviaconteúdos extras e jogos de perguntas e respostaslançados para a tela do celular ou do tablet.Também foi criado o aplicativo globo.tv no qual osconsumidores podem assistir aos programas da TVGlobo, SporTV, Globo News, Multishow, GNT, entreoutros, bem como acompanhar vídeos deentretenimento, esportes e jornalismo.

Como outros exemplos, temos os sites dasnovelas que são hospedados no Gshow. Os menuscontemplam, em sua maioria, os capítulos,personagens, vídeos, próximas cenas, trilha sonora,bastidores, e opções de interagir com a produção apartir de seções como “Você em” seguido do nome danovela. Nesse espaço, o público pode participar deatividades propostas pela instância produtora. Comodefende Lacalle (2010), a rede rica em conteúdosaudiovisuais cumpre uma importante função deacompanhamento e de aprofundamento dosconteúdos televisivo.

7. Considerações FinaisAnteriormente, este trabalho se ocupou em

mostrar como a cultura da convergência promoveureposicionamentos da TV Globo diante de seupúblico. Ficou claro que a principal via detransformações se deu com o desenvolvimento deestratégias transmídias e, como foi visto, atransmidiação demanda estímulo à culturaparticipativa.

E são justamente os discursos presentes nasestratégias transmídias que constituem umacontecimento discursivo, visto que rompem comenunciados propostos em outros momentos. Quando

17Show de talentos brasileiro exibido pela Globo. É a versãobrasileira do formato original holandês The Voice of Holland, criadopor John de Mol. A primeira temporada teve estreia em 23 desetembro de 2012. A segunda temporada começou no dia 3 deoutubro de 2013 e acabou dia 26 de dezembro do mesmo ano.18Numa breve definição, seria uma proposta de complemento emtempo real aos conteúdos exibidos na tela principal.

a TV Globo investe em uma aproximação com opúblico a partir dos conteúdos lançados emmúltiplas plataformas (com uso de internet eaparelhos da informática), temos uma ruptura comformas de interação anteriores, nas quais não haviaa possibilidade de uso de meios de comunicaçãoinfoeletrônicos.

A cultura participativa constitui umacontecimento discursivo na TV Globo porque,diante das alterações no ecossistema midiáticobrasileiro e nos estratos sociais do País, há rupturacom discursos vigentes anteriormente, centrados naemissora como instância produtora por excelência,para novas discursividades em que a audiência setorna potencial produtor de conteúdos para a TV.

As estratégias transmídias geram interações como público consumidor. Esse olhar sobre audiência ea definição de estratégias e conteúdos, por parte dainstância produtora, para alcançar o público,engendra uma perspectiva que promove ao mesmotempo a possibilidade de liberdade da audiênciafrente às possibilidades de interação, mas também anecessidade, por parte da instância produtora e dospróprios consumidores, de regular essa participação.Sobre essas questões, cabe aprofundamentoadequado para próximas pesquisas.

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Dados para indexação em língua estrangeira

Moreira, Diego Gouveia.Statements of stimulus to participatory culture on TV Globo

and the formation of an event discursive.Estudos Semióticos, vol. 12, n. 1 (2016)

issn 1980-4016

Abstract: Television has undergone several changes, caused, among other factors, the participatory culture.In Brazil, TV Globo also repositioned itself to continue to attract the attention of its audience. This articlediscusses how participatory culture stimulus speeches are a discursive event, according to Michel Foucault(2007), in front of the TV Globo discourse order. To show this, they are seen as the living conditions of thesenew statements: the culture of convergence and the rise of a new consumer class in the country. These vectorsare the two that we consider most important to understand the repositioning of TV Globo. One of them directlylinked to changes in the media ecosystem and other more associated with changes in the social and culturalfield. The goal is to show that there positioning of the globe and the establishment of stimulus speeches toparticipate if given from the emergence of a new social class and also the very culture of convergence, which isconnected to the media ecosystem, and that the changes in the field social and cultural. Throughout the work,theories on television are discussed, convergence culture, participatory culture, studies on the new consumerclass and postulations about discursive event. Therefore, it is traced a panorama of change undertaken by theissuer to approach this new class and also to meet the demands of the convergence culture. In the end, itappears that the main response by the station was the investment in transmedias strategies, manyengagement programs proposed by producers (corporate sender/institutional) to consumers (recipients),exploring their skills to seek and articulate content on various media and platforms.

Keywords: New working class; Event discursive; Participatory culture; TV Globo.

Como citar este artigoMoreira, Diego Gouveia. Enunciados de estímulo à cultura participativa na TV Globo

e a formação de um acontecimento discursivoEstudos semióticos [on-line]. Disponível em: ( http://www.revistas.usp.br/esse ).

Editores responsáveis: Ivã Carlos Lopes e José Américo Bezerra Saraiva.Volume 12, Número 1, São Paulo, Julho de 2016, p. 55-67.

DOI: 10.11606/issn.1980-4016.esse.2016.120537.Acesso em “dia/mês/ano”.

Data de recebimento: 22/01/2016Data de aprovação: 27/05/2016

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Anexos

Figura 1: Condições de emergência para o surgimento dos enunciados de estímulo à cultura participativa na TV Globo. Fonte:o autor.

Figura 2: Gshow explica como acessar os sites das novelas da TV Globo. Fonte: GshowDisponível em: <http://gshow.globo.com/novelas/cheias-de-charme/Fique-por-dentro/noticia/2012/05/o-site-de-cheias-de-charme-esta-

de-cara-nova-saiba-o-que-muda.html>. Acesso em: 31 de maio de 2012.

Figura 3: Imagem mostrando as mudanças nos sites das novelas. Fonte: GshowDisponível em: <http://gshow.globo.com/novelas/cheias-de-charme/Fique-por-dentro/noticia/2012/05/o-site-de-cheias-de-charme-esta-

de-cara-nova-saiba-o-que-muda.html>. Acesso em: 31 mai. 2012.

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Figura 4: Imagens da seção Últimas da Novela. Fonte: GshowDisponível em: <http://gshow.globo.com/novelas/cheias-de-charme/Fique-por-dentro/noticia/2012/05/o-site-de-cheias-de-charme-esta-

de-cara-nova-saiba-o-que-muda.html>. Acesso em: 31 de maio de 2012.

Figura 5: Imagem mostrando como acessar matérias. Fonte: GshowDisponível em: <http://gshow.globo.com/novelas/cheias-de-charme/Fique-por-dentro/noticia/2012/05/o-site-de-cheias-de-charme-esta-

de-cara-nova-saiba-o-que-muda.html>. Acesso em: 31 de maio de 2012.