o budismo em hegel e schopenhauer

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O budismo na filosofia de Hegel e Schopenhauer

O budismo na filosofia deHegel eSchopenhauer

Prof. Dr. Deyve Redyson(PPG-CR UFPB)

Hegel e o BudismoEncontramos o budismo nas lies de Hegel que vo de 1820 e 1830. Inicialmente em suas Lies sobre Filosofia da Histria (Vorlesungen ber die Philosophie der Geschichte) e em seguida nas Lies sobre Filosofia da Religio (Vorlesungen ber die Philosophie der Religion) e por fim nas Lies sobre Histria da Filosofia (Vorlesungen ber die Geschichte der Philosophie).Religies da Natureza Religies da conscincia dividida em si mesma (religies da substncia)Religio do ser em si

A principal fonte utilizada por Hegel para os seus desenvolvimentos, em toda a sua obra, sobre o budismo foi o artigo de Francis Buchanan On the religion and literature of the Burmas publicado no volume 6 do Asiatic Researches que expe a natureza do budismo em sua genealogia histrica, atravs das histrias do nascimento do Buda Shakyamuni, passando pelos principais conceitos sobre o sofrimento e termina por entronizar que existem escolas budistas diferentes que desenvolvem estruturas diferentes, como o Tibete, por exemplo. O texto de Buchanan levanta questes fulcrais para a compreenso do budismo, at por que, como veremos, Schopenhauer deve acesso as mesmas leituras e teve uma interpretao bastante diferente. Hegel, em muitas passagens acaba por depreciar diversos conceitos do budismo e extrair deles pr-conceitos no to verdadeiros como observaremos.Hegel, ainda nas Lies sobre a Filosofia da Histria identifica Fo como a representao do Buda na China e nos d traos de sua expanso. Na tentativa de expressar sua doutrina, Hegel insere o budismo entre as religies da interioridade e demonstra sua no substancialidade: Nessa religio, que na verdade deve ser caracterizada como a religio da interioridade, a elevao da falta de espiritualidade para a subjetividade acontece de duplo modo, sendo um do tipo negativo e o outro do tipo afirmativo. Para Hegel, o budismo prega uma interioridade contemplativa sem espiritualidade e na relao de sua subjetividade transporta-se para uma efetiva inter-subjetividade. HEGEL, Filosofia da Histria. Braslia, Editora da UNB, 2008, p. 145-146.HEGEL E O TIBETEA leve diferena entre a religio de Fo e do lamasmo somente artificial. Na religio do Lama a figura e o aspecto da realidade esta autoconscincia, um homem efetivo e vivo, mas existem vrios desses lamas supremos. Aqui Hegel comete um erro, pois sua leitura est baseada em Die Wichtigsten Reise de Wilhelm Harnisch que apresenta o lamasmo como uma religio independente do budismo. Harnisch apenas afirma na pgina 355 de seu trabalho que tanto o lamasmo como o budismo so muito parecidos. O detalhe que o lamasmo uma criao ocidental e tal expresso no existe, pois no Tibete o budismo tem caractersticas prprias, mas estas caractersticas prprias no fazem, do budismo praticado no Tibete, uma outra religio. Nas lies sobre Filosofia da Histria Hegel j afirmava isso, outra vez baseado nas informaes de Harnisch: No Tibete e entre os mongis essa religio manteve a matriz do lamasmo.HEGEL, G. W. F. Lecciones sobre filosofia de la religin, 2, Madrid. Alianza. 1985, p. 189.HEGEL, G. W. F. Filosofia da Histria. Braslia, Editora da UNB, 2008, p. 145Ainda sobre o budismo continua Hegel: Sua essncia consiste em existir sem atividade ou vontade, pois o nada idntico em si mesmo numa forma abstrata... No Ceilo e no imprio birmans, onde essa f no budismo tem razes, domina a crena de que o homem poderia obter, pela meditao, a sua independncia em relao doena, velhice e morte. Percebe-se a falta de informao sobre a teoria interdependente dos mundos e sobre os agregados da existncia. Hegel fala filosoficamente na abstrao e no nada, tema cara a sua filosofia, como o sentido do ocidente em clarear a intuio mesma e sua efetividade do real, para Hegel, ainda, podemos perceber o abstrato atravs de uma subjetividade de si e do outro, o outro est em si como conscincia do mesmo, eis o fundamento de sua Fenomenologia do Esprito e sua caracterizao idealista HEGEL, Filosofia da Histria, p. 146.Schopenhauer e o Budismo O Orientalismo Com poucas referncias e poucos materiais a disposio, Schopenhauer teve um verdadeiro insight oriental para que no cometesse desvios ou incongruncias, como tantos fizeram. Schopenhauer se aproxima do budismo, mantendo um dilogo de proximidade e semelhana entre a sua tica e a sua metafsica.No decorrer da obra de Schopenhauer encontramos diversas passagens que nos trazem o budismo como uma religio de predileo do filsofo alemo, em diversas passagens so tratados conceitos e expresses usuais no budismo primitivo e at mesmo no budismo mais moderno. Schopenhauer no conviveu e nem teve diante de si nenhum integrante de alguma tradio budista diretamente, dessa forma como chegou a conhecer o budismo e anunci-lo como uma religio de excelncia e verdadeEncontramos em toda a obra de nosso filsofo mais de duzentas referncias ao budismo, somente em sua obra capital existem mais de sessenta. Sua obra mxima, O Mundo como vontade e como representao demostra claramente isto, e evoca um homem que conhece at certo ponto o budismo e suas tradies.Schopenhauer lamenta no ter em mos o doutrina do BudaAtravs do AM descobre que existem vrios budismosComea a reunir livros sobre budismo em lngua modernas: alemo, ingls, italiano, francs e espanhol:R. Spence Hardy. Manual of Buddhism (Prabodh Chandro Daya. Edio de J. Taylor, Londres, 1812; Jean Baptiste F. Obry. Du Nirvana Indien, Ou, De Laffranchissement De Lme Aprs La Mort, Selon Les Brhmanes et les Bouddhistes de Paris. Imprimerie de Duval et Herment, 1856; K. Kppen. Die Religion des Buddha. 2 vols. (I, 1857; II, 1859); Vincenzo Sangermano. The Burmese Empire a Hundred Years Ago de 1838; Eugene Burnouf. Introduccion histoire du Buddhisme e uma edio do Dhammapada, Dhammapadam. Trad. Victor Fausbll de 1855.

Com esta importante passagem, Schopenhauer nos informa da precariedade de estudos sobre o budismo em sua poca na Europa e de quanto foi importante suas poucas e no claras aproximaes com esta religio: Pois quando em 1818 veio a luz minha obra, as notcias na Europa que poderiam ser encontradas sobre o budismo eram muito escassas, sumariamente incompletas e pobres, limitando-se quase todas a alguns artigos nos primeiros volumes do Asiatic researches que se referiam principalmente ao budismo dos birmanos. Somente depois fomos obtendo, pouco a pouco, maior notcia dessa religio, principalmente atravs dos profundos e ilustrativos tratados do acadmico de So Petersburgo J. J. Schmidt em seus ensaios de sua academia, logo depois atravs de diversos eruditos ingleses e franceses, de modo que pude oferecer um ndice bastante numeroso dos melhores escritos sobre essa crena em minha obra Sobre a vontade na natureza no captulo sinologia. Infelizmente Csoma Krsi, esse grande hngaro que passou muitos anos no Tibete e sobre tudo nos mosteiros budistas com o fim de estudar a linguagem e os escritos sagrados do budismo, foi arrebatado para a morte justamente quando comeava a elaborar o resultado de suas investigaes. SCHOPENHAUER, O Mundo II... , trad esp, p. 207-208.O objetivo do Buda para Schopenhauer seria o objetivo do Buda Shakyamuni, libertar o caroo da casca, era limpar a grande doutrina de todas as figuras e divindades, tornando seu contedo puro acessvel e compreensvel at mesmo pelo povo. Nisto foi maravilhosamente bem sucedido, e por isto sua religio a mais adequada e representada pelo maior nmero de adeptos na Terra (Glubigen vertretene auf Erden).SCHOPENHAUER, Sobre a tica in Parerga e Paralipomena II. Col. Os Pensadores. So Paulo. Abril Cultural, 1980, p. 205.O elemento que poder, previamente, responder-nos, o fato de que na terceira edio de O Mundo como Vontade e como Representao, Schopenhauer em 1859 acrescenta a tal citao uma nota de rodap onde remete a leitura do prajn pramit. A nota diz: Isso tambm o Pradschna-paramita dos budistas, o alm de todo o conhecimento, ou seja, o ponto onde sujeito e objeto j no existem (vide Isaac Jacob Schmidt), Sobre Mahayna e o pradschna-paramita). Atravs deste trecho, podemos verificar que Schopenhauer conheceu o prajn pramit atravs do livro de Schimdt e que seu conhecimento deste texto o levou a entender que o sutra de linhagem mahayana trata da vacuidade e a este termo relacionou a sua noo de vazio que est delimitada pelo conceito de vontade. Segundo App e Abelson, Schopenhauer conheceu o prajn pramit tambm por outros dois textos, o de Robert Spencer Hardy Eastern Monachism de 1850 e Carl Friedrich Koeppen Die Religion des Buddha und ihre Entstehung de 1857, este ltimo nos fala de uma hierarquia de lamasmo no Tibete.SCHOPENHAUER, O Mundo I, 71, p. 574.Tambm por razes histricas Schopenhauer depositar confiana na prtica tibetana no prajna paramita: Disso se pode concluir que para alm do fenmeno, no ser em si de todas as coisas que h de ser no tempo e no espao... isso designado pelo budismo como prajna paramita, quer dizer, para alm de todo conhecimento (veja-se sobre isto J. J. Schmidt, Sobre o Maha-Jana e o Prajna Paramita).SCHOPENHAUER, O Mundo II... , trad esp, p. 316.Para Schopenhauer a verdade encontra-se est no budismo: O valor de uma religio depender, pois, do maior ou menor contedo de verdade que traga consigo... Se quisesse tomar os resultados de minha filosofia como medida da verdade, teria que admitir a preeminncia do budismo sobre as demais. Nosso filsofo cr definivamente que se colocar numa balana qual religio efetiva mais o que prega, ele acredita que ser o budismo onde encontraremos o seu maior nmero. SCHOPENHAUER, O Mundo II... , trad esp, p. 207.

BibliografiaABELSEN, Peter. Schopenhauer and Buddhism. In Philosophy East and West, 43, 1993.APP, Urs. Schopenhauers Begegnung mit dem Buddhismus. In Schopenhauer Jahrbuch, 79.HEGEL, G. W. F. Lecciones sobre la historia de la filosofia. Mxico. Fondo de Cultura Econmica. 1995. 3 vols.REDYSON, Deyve. Schopenhauer e o Budismo. Joo Pessoa. Ed. UFPB. 2012.SCHOPENHAUER, Arthur. Smtliche Werke. herausgegeben von Wolfgang Frhr. von Lhneysen. Stuttgart/Frankfurt am Main. Suhrkamp Taschenbuch Wissenschaft 1986. 5 vols._______________, Arthur. Der Handschriftliche Nachla - Herausgegeben von Arthur Hbscher. Frankfurt am Main Waldemar Kramer 1966-1975 5 Bnden.________________, Arthur. O Mundo como vontade e como representao. Trad. Jair Barboza. So Paulo. Unesp. 2005. Tomo I.VIYAGAPPA, Ignatius. G. W. F. Hegels concept of Indian Philosophy. Roma. Gregoriam University Press. 1980.