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Doubhglas Allecsandr S N Cernichiaro NOUMENON A Noite do Universo Primeira Edição Londrina - Paraná 2012

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Doubhglas Allecsandr S N Cernichiaro

NOUMENON A Noite do Universo

Primeira Edição

Londrina - Paraná

2012

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© 2012, por Doubhglas Allecsandr S Nevsk Cernichiaro Todos os direitos reservados. Noumenon, personagens e nomes apresentados, salvo quando de domínio histórico, é propriedade registrada, protegidos pela Lei Nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que em seu Art. 1º - regula os direitos autorais, entendendo-se sob esta denominação os direitos de autor e os que lhes são conexos. (Registro n.º 566.701 do Livro 1.081 às Folhas 265 de 23 de julho de 2012. no EDA). Diagramação e arte da capa pelo Autor.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil).

Ficha catalográfica Elaborada por Perse Editora, SP, Brasil.

Cernichiaro, Doubhglas Allecsandr S. N. Noumenon : a noite do universo. -- 1. ed. --

São Paulo : PerSe, 2013.

ISBN 978-85-8196-223-8

1. Crônicas brasileiras 2. Ficção brasileira I. Título.

13-02524 CDD-869.93

Índices para catálogo sistemático: 1. Ficção : Literatura brasileira 869.93

Esta é uma obra de ficção; qualquer semelhança com fatos e nomes reais terá sido mera conhecidência.

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Em memória de meus pais Miguel e Maura

e meu irmão, Rubens.

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Índice

Créditos.................................................................................................... Pág. 004 Dedicatória........................................................................... Pág. 005 Prefácio à Noumenon......................................................................... Pág. 009 Prólogo....................................................................................................... Pág. 011 Parte 1ª – Como o Golem................................................................... Pág. 015 Parte 2ª – Muito Além da Noite Silenciosa................................... Pág. 027 Parte 3ª – Vestinik............................................................................... Pág. 055 Parte 4ª – O Encontro........................................................................ Pág. 087 Parte 5ª – A Noite do Universo...................................................... Pág. 105 Parte 6ª – O Inimigo Final................................................................ Pág. 135 Epílogo........................................................................................................ Pág. 155 Glossário.................................................................................................... Pág. 157 Noumenon................................................................................................ Pág. 158

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Prefácio à Noumenon

No princípio não havia nada, apenas o manto vasto e negro do gélido infinito.

Nada existia então, e tudo o que havia era a luz fraca e débil do átomo primitivo.

E toda a matéria do universo estava concentrada nesse átomo primitivo; uma pesada massa material, cuja coesão sofria pressão constante para formar núcleos.

E aquela força primitiva, onienvolvente, existente an-tes de tudo quanto chegou à ser feito, era um Neutro.

E aquele Neutro existia antes do big-bang. Aquele Neutro, força primitiva, incorpórea, coman-

do decisivo, tornar-se-ia matéria, e de antemão, conhecia o resultado da grande explosão.

As forças gigantescas aumentaram e multiplicaram-se à ponto de não mais poderem se conter.

No princípio...

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Prólogo...

Os primeiros ventos de inverno chegaram com a noite. O brilho prateado da lua parecia gélido e fugidio como

pequenas gotas de gelo. Parecia que navalhas afiadas flutuavam ao sabor do

vento. Uma sensação de medo e solidão impregnava o ar tor-

nando-o pesado, trazendo um inquietante mistério a ser desvendado. Mas talvez... Talvez jamais o fosse.

Ele veio com os ventos de inverno, e talvez não hou-vesse retorno.

Chegou com uma neblina fina e estacou o passo. Parado na paisagem fria lançou um olhar sobre a pai-

sagem que atravessou, e ela lhe parecia totalmente vazia. O vento frio soprava sobre ela, e de algum modo, ele

havia perdido tudo aquilo que lhe importava, e tudo o que mais queria, desaparecera.

O ar pesava ao seu redor com o peso de mil mundos, tornando lento o tempo e deformando o espaço.

A cintilância de milhões de partículas cristalinas era suavizada pela neblina fosca, parecendo lanternas perdidas na distância.

Pouco a pouco ele retomou o passo firme, confundin-do-se com passadas soltas, próprias daqueles que se deixam levar com os ventos.

Sombras furtivas tomavam quase todo o seu rosto, pois ele não queria - ou talvez não ousasse - erguer a face e contemplar o firmamento. Mas ainda assim os traços som-

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brios eram suavizados sempre que algum raio de luar teima-va em percorrer sua face. E nesses momentos as sombras pareciam lutar arduamente e se defender contra a intrusão da luz prateada em seu território.

O corpo esguio possuía uma compleição forte e robus-ta, exalando algo de atraente - uma invocação clara de uma beleza profana - mas, sobretudo, cheia de uma jovialidade e uma inocência. Talvez perdida...

As mãos firmes acompanhavam o conjunto dos braços e ombros com uma suave tez morena, em contraste com o rosa pálido da face. Os cabelos emolduravam a face aquilina, com lábios finos quase sem cor. Vez por outra jogava a cabe-ça para trás, livrando a face dos cabelos que lhe caiam sobre os olhos.

Nesses instantes os raios da lua incidiam sobre sua fa-ce, revelando toda a jovialidade daquele olhar inquisidor, próprio de quem busca por alguma coisa, incansavelmente.

As sobrancelhas eram finas, levemente arqueadas na fronte, contrastando com um nariz fino e sensível.

E os olhos... Olhos que haviam olhado para muitos mundos cheios de esperança... Agora pareciam terrivelmen-te vazios.

Eram como enormes pérolas negras, brilhando vivi-damente, e parecendo ser grandes demais para aquele rosto sereno e contraditório.

A pupila dilatava-se e à medida que pulsava deixava claro que a cor negra era apenas uma ilusão, pois naqueles olhos predominava um azul escuro, tão escuro quanto o cre-púsculo.

E aqueles olhos pareciam varrer a face da Terra, sendo capazes de olhar através de uma barreira e ver o interior de qualquer ser, sem que nada houvesse para impedi-los.

Eram olhos grandes e profundos. Num instante se fixavam nas estrelas, no seguinte pa-

reciam querer desvendar todos os segredos do universo, como grandes reveladores do destino.

As trevas que emergiam dali pareciam envolver e sufo-car, despertando um medo terrível e primitivo.

Eram como as trevas que existiam desde a aurora dos tempos - sombras agigantando-se... Pairando nas fronteiras

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da consciência, na periferia do coração humano. As trevas que havia além das fogueiras primitivas...

Espreitando... Quando almas conturbadas se encontram nas encruzi-

lhadas, as trevas estão lá... Sussurrando... Clamando pelo seu amor indiferente, e o conforto do

negro desespero. Os pássaros da tristeza voavam naqueles olhos... Som-

bras esguias de arremedos de humanidade. Apenas ondulações entre vagas de outras experiências

no oceano de mistérios de vidas perdidas. Um Zagadka (1) na verdade. No ritmo em que este oceano se movimentava - o fluxo

e refluxo de sua estranha maré - estavam todas as respostas do negro entendimento.

Quem pudesse sondar suas profundezas ou escalar as alturas de seu espaço, ouviriam somente uma melodia... A-penas um som.

Mas aqueles olhos também pareciam encher o espírito de medo, dúvida, ansiedade, remorso e ódio.

Eram olhos gelados. E a ansiedade era o pior dos sentimentos despertados.

Era quase fatal. Um apelo ao desgosto e ao remorso. E não há espaço para recordações alegres onde essas feras habi-tam.

Eram olhos que contemplaram a solidão de muitos mundos.

Então o rosto tornava a baixar, como que em resigna-ção, sendo novamente tomado pelos traços sombrios, tor-nando-se obscuro demais.

Ele veio com os ventos de inverno, e parecia ser sem-pre levado com eles.

E talvez... Talvez fosse! “Lembro, lembro! O Inimigo sempre esteve lá... No ruído do trovão... No reflexo do relâmpago. Sempre além das fogueiras primitivas nas noites soli-

tárias... Como trevas existentes desde a aurora da criação.

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Sombras agigantando-se nas fronteiras do coração humano... Sussurrando.

Clamando pelo conforto do negro desespero. Enchendo o coração de medo. Lembro, lembro! Foi a muito... Muito tempo! Mas vocês também não esqueceram. Esperem...! Esperem por nós... Voltaremos!"

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Parte Primeira

Como o Golem (2)

Do Relatório De Egger Moghol

O planeta era um mundo monótono, bem visível e muito frio. Era o único daquele sistema de sol azul, cuja luz era débil e fria. Não possuía satélites naturais. O contorna-mos duas vezes com a nave. Em seguida liberamos a sonda aérea. Com sua aparência de abutre, ela circulou o planeta, registrando cada pormenor de sua superfície, como uma verdadeira ave de rapina caçando. Mas não encontrou ne-nhuma "presa".

Com isso adquirimos vasto conhecimento de todos os detalhes interessantes sobre a configuração de sua superfí-cie, a temperatura ali reinante, a velocidade de rotação, a pressão atmosférica e a gravidade. Mas, principalmente, determinamos que naquele mundo não houvesse o menor sinal de inteligência. Ao menos na superfície.

Quando Opal recebeu os dados sentiu-se decepciona-do. Esperava que o planeta lhe desse alguma pista... Trou-xesse respostas. No entanto...

Não havia oceanos. A temperatura era de cerca de oito graus negativos. A pressão atmosférica era de 84 e nenhuma montanha tinha mais que algumas centenas de metros de altura. Pelo menos três quartos da superfície era formado por desertos vermelhos de óxido de ferro e a força gravita-cional não ultrapassava 0,53 gravos. Apesar de tudo, o solo era firme. Todas as colinas tinham a mesma altura, a mesma base e o mesmo formato. Se não se tratasse de formações arenosas, como acontecia com todas as elevações existentes no planeta, poder-se-ia supor que haviam sido criadas artifi-cialmente. Era um mundo solitário. Um vento frio e cortante soprava sobre ele com certa violência, remoendo partículas de poeira, açoitando suas elevações arenosas.

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Era, sobretudo um mundo triste, cheio de uma pe-numbra, que o sol enfraquecido não conseguia desfazer. Mi-nha equipe estava analisando as informações com certa dose de ceticismo, e mesmo eu - devo admitir - estava cético quanto a algum sucesso. Mais soturna e fria, a equipe com-posta por Galey Stronk, Armory Sharrat e Oshan Nerhel transmitia mecanicamente os dados recolhidos, armazenan-do-os nos circuitos positrônicos dos computadores de bordo. Na verdade nossa equipe era um grupo bastante homogê-neo, e como o restante da tripulação da Explorer, tentáva-mos esconder nossa decepção. Pousamos no deserto verme-lho com a Ex - III e passamos aos cálculos de medição. O ecorrastreamento informou da presença de vastas cavernas sob a superfície, mas os sistemas não confirmaram a menor presença de vida. Deixamos a nave meia hora depois, enver-gando os trajes espaciais devidamente ajustados. A baixa gravidade dava-nos maior flexibilidade de movimentos, e percorremos rapidamente uma faixa de três quilômetros no deserto vermelho, até a base de uma colina. O primeiro e-xame da área adjacente às colinas produziu resultado nega-tivo. Sabíamos que havia entradas para as cavernas entre as colinas - que cobriam uma área de cerca de duzentos quilô-metros quadrados - mas levaríamos dias numa busca minu-ciosa.

Várias vezes perguntamo-nos se valeria à pena, e por algum motivo que desconhecíamos, achávamos que sim. A área das colinas se estendia pelo hemisfério norte, e seriam necessárias muitas horas para se explorar apenas alguns quilômetros dessa área; e o planeta tinha um dia de apenas dezenove horas. Pela posição do eixo do planeta, devia estar chegando o fim do verão. Oshan comentou qualquer coisa sobre não querer estar ali quando o inverno chegasse. Avan-çamos lentamente, prestando atenção aos mínimos detalhes.

Estranhas plantas cresciam naquele deserto, não ul-trapassando meio metro de altura, com uma coloração mar-rom-avermelhada. O céu sobre nossas cabeças era de um violeta monótono, alterando sutilmente as cores de nossos uniformes. A Ex - III não refletia seu característico brilho cinza metálico, mas antes uma cor verde fosforescente. O desvio do espectro luminoso produzia ainda variações um

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tanto desagradáveis aos nossos olhos. Mas aquele céu, to-talmente sem nuvens, era ainda mais desconcertante.

O ecorressonador portátil ressoou, guiando-nos à a-bertura de uma caverna, e entramos por sua garganta afuni-lada. Percorremos vastas extensões delas, e por vezes fomos dar à superfície, em pontos diferentes. Mas nada encontra-mos de excepcional. Mesmo o robô de sondagem terrestre falhou. Penetrou por galerias intermináveis, analisando e enviando dados a cada instante, e nada. Tudo parecia aban-donado, com um inquietante aspecto de cidade fantasma. Não havia ruídos, excetuando-se o rugido do vento.

Eventualmente transmitíamos dados ao comando cen-tral da Explorer, e por dois dias - tempo padrão - percorre-mos aquele mundo sem nome - mas a busca mostrou-se in-frutífera.

Voltamos à nave e contatamos o comandante Opal, pedindo novas instruções, no que nos foi ordenado retornar a Explorer. Desde já começamos a sentir-nos desiludidos e fracassados.

Mas será que temos esse direito? Nossa missão mal começou...

*** *** *** *** ***

Os dedos corriam rápidos pelo teclado do computador,

emitindo um ruído seco e contínuo. Fora isso, o silêncio da sala era completo. Parou por um instante e virou-se para o livro aberto na

escrivaninha. Riscou alguma coisa na borda da foto e fez algumas

anotações rápidas. A página finíssima de plastimetal absorveu a tinta es-

pecial com facilidade. A foto - com um grande sol central - pareceu brilhar

com os reflexos do monitor. Voltou-se para o monitor, e novamente encarou a pá-

gina aberta.

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Recostou-se na cadeira giratória, e fixou a visão no monitor.

"- A disposição do nível subquântico produzia as par-tículas atômicas perpassadas pela anti-matéria; os movi-mentos de grande envergadura impulsionavam as nebulo-sas em formação, como matrizes de futuras galáxias, estre-las e planetas." - parou a leitura e contemplou, pensativo, as próprias mãos, continuou a leitura algumas linhas mais a-baixo "- O espaço axioma absoluto era então o subespaço - ambiente adjacente aos gravitrons que, de certa maneira, flutuavam nele. Era vazio, povoado por uma grande con-densação de partículas elementares praticamente imateri-ais, de dimensões incluídas entre 10(60) e 10(80) centímetros, que correspondia ao "ambiente ou nível profundo e oculto, ou nível subquântico"... Pôs a mão na fronte e fechou os o-lhos. Ficou assim, imóvel, por alguns segundos, depois tor-nou a abrir os olhos.

Levantou-se e se dirigiu ao balcão automático. Pres-sionou o botão de "café" e aguardou. Dentro de instantes um copo descartável saiu por um compartimento retangular, cheio do revigorante estimulante.

Sorveu aos poucos o líquido, constatando que estava bem quente.

Olhou de soslaio para o computador, enquanto a me-mória se ativava.

Quantas vezes, na infância não havia sonhado com a imensidão gelada do espaço cósmico? Queria alcançar as estrelas e descobrir seus segredos, e depois...

O sonho se tornara realidade. O pequeno, sardento e magricela Kris cresceu, for-

mou-se em astrofísica e recebeu o treinamento para integrar a tripulação da maior criação tecnológica da história. Já não era tão magricela, mas o cabelo ruivo e as sardas ainda eram sua marca registrada. Foi quando se deparou com seu desti-no e a Explorer Nautic lhe acenou com sonhos de uma in-fância esquecida. Embrenhava-se agora em um oceano de estrelas em busca dos sonhos. E nada.

Assim, Kris Stenghel encaminhva-se para um labirinto de perguntas, sem imaginar que as respostas surpreenderi-am não só a si mesmo, mas toda a raça humana.

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E não só isso. Poderia mudar vidas para sempre... Ou acabar com elas.

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* Diário de O'Flahertie Piotr Alexenovitch Leonov. Nossa equipe expedicionária já está no espaço a mais

de um ano. A maioria dos planetas visitados não possuía sequer atmosfera, e nem sequer foi identificado o menor vestígio de uma civilização galáctica. Infelizmente esses con-tratempos nos levam a raciocinar de uma maneira estranha, substituindo a euforia e entusiasmo por dúvidas e ceticismo. Uma dessas linhas de raciocínio me conduziu a uma questão bastante curiosa: o que acontecerá se encontrarmos uma raça bélica? Defenderemo-nos simplesmente, deflagrando uma guerra de proporções galácticas? E será que poderemos nos defender? E aí nossa fuga das guerras e busca pela paz nos conduzirá a mais guerras? Não é guerra que buscamos, mas contato com nossos irmãos no universo... Se é que eles realmente existem. Já nem sei em que acreditar.

Karl Krauss disse uma vez, que a guerra é, a princípio, a esperança de que vamos nos dar bem; em seguida é a ex-pectativa de que o outro vai se ferrar; depois a satisfação de que o outro não se deu bem. E finalmente, é a surpresa de que todo mundo se ferrou. Mesmo assim, o homem nunca se convenceu da inutilidade da guerra. Por quanto tempo, no entanto, tentamos nos convencer de que não somos uma raça guerreira? E o pior é que, admitamos ou não, falhamos.

Se não somos uma raça bélica, por que então nossa história está tão recheada de guerras?

Quantas já não arrasaram nosso mundo? As guerras do Peloponeso, na Grécia Antiga, duraram trinta anos; as Cruzadas prolongaram-se por mais de dois séculos; Alexan-dre, príncipe da Macedônia, empenhou sua vida em campa-

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nhas de guerra, e a guerra dos cem anos marcou a Europa. Se não somos uma raça guerreira, porque então esta nave exploratória que comando, está tão bem equipada para a guerra?

O princípio do século vinte foi marcado por revolu-ções, e houve a primeira Grande Guerra. Depois veio a Se-gunda. A verdade é que, graças a uma série de interpretações erradas e certos incidentes - que resultariam divertidos se as conseqüências não tivessem se revelado sinistras - a Europa mergulhou numa guerra multinacional em 1914. As maiores potências eram a Alemanha, por um lado, e a Inglaterra e França, por outro. Os Estados Unidos entraram no conflito ao lado destes últimos em 1917, e a Alemanha capitulou em 1918. No entanto, as condições que os Aliados lhe impuse-ram eram insustentáveis por demais e sua economia desmo-ronou. O governo deixou de poder funcionar e registraram-se outras numerosas situações simultâneas, que contribuí-ram para a formação de um clima propício para que um alu-cinado chamado Adolf Hitler - um simples cabo na Primeira Guerra Mundial - assumisse o poder em princípios da déca-da de 30. Antes disso, a 1 e 2 de maio de 1919 as tropas regu-lares invadiram Munique e exerceram pressão implacável. Uma sociedade secreta, a Thulé, tomou orientação nova e prosperou. Nesta época os futuros dirigentes do Terceiro Reich eram neopaganistas.

Este neopaganismo era engrandecido por numerosos escritores. Segundo Osvald Dutch, os deuses germânicos Thor, Odin e Wotan ressuscitam depois da debandada de novembro de 1918. A sua vez, “eles vencem o Galileu”. (3)

Em Westphalie, cidades inteiras voltaram-se ao paga-nismo. Cruzes foram deitadas em cemitérios e realizaram-se rituais mágicos à volta de fogueiras. Quando da declaração da guerra em Agosto de 1914, Rudolf Steiner tinha a seu lado a Condessa Von Moltke. Havia no momento deste Putsch de Munique, ligações entre a Sociedade Teosófica e os neo-idólatras do hitlerismo. Os nazis votavam um ódio feroz aos seguidores de Rudolf Steiner. Para desacreditar Steiner, a-tribuíram-lhe a derrota de La Maine. Finalmente desfeito o Putsch de Munique a nove de novembro de 1923, Adolf Hi-tler e outros dirigentes da NSDAP (4) foram presos e encar-

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cerados na prisão de Landsberg. Detido na cela número se-te, Hitler aproveitou os seus tempos livres para escrever "Mein Kampf " (5). Juntamente com Kriebel e Weber, Hitler fora condenado a cinco anos de prisão; Rudolf Hesse há de-zoito meses e o general Ludendorf foi absolvido. Durante sua prisão Hitler recebia a visita do general de artilharia Karl Haushofer. Muito dele há no livro "Mein Kampf " . Haushofer era membro da Thulé. Depois de várias experiên-cias decepcionantes, os dirigentes da Thulé haviam fixado sua escolha no antigo combatente, autodidata, agitador e detentor de um extraordinário magnetismo, dominando pobres coitados a quem dava conferências intermináveis. Esse, é óbvio, era Hitler.

Entrementes os mestres de Thulé não se lembraram da lenda judaica contada na idade média pelos cabalistas de Praga. A lenda do Golem - Um homem artificial que um má-gico animava traçando um pentágono na fronte. Mas o Go-lem consegue apagar o sinal mágico que o enfeitiça, revolta-se, estrangula o mágico, rouba-lhe a alma e torna-se um ser demoníaco de força invencível, espalhando o Mal e a Morte.

Que Adolf Hitler foi um Golem, afirmam-no todos os que dele se aproximaram. Denis de Rugemnot, Rausching, e o embaixador François Poncet o declararam peremptoria-mente. Alguns creem ter sentido, na sua presença, uma es-pécie de arrepio interior, como que uma grande força domi-nadora, como um espírito. Sentiam que sua energia não per-tencia a ele, e se manifestava independente dele. Tinha Hi-tler um comportamento normal a maior parte do tempo. De repente parecia cair-lhe do céu, poderes especiais que o ele-vavam acima da média humana. É óbvio que existiam forças estranhas das qual Hitler era o veículo. Frequentemente entrava numa espécie de transe. Seu rosto transformava-se, possuído de um arrebatamento estático. Faria o Golem Hi-tler, o Pentágono mágico na fronte algumas vezes?

A 29 de julho de 1921, Adolf Hitler foi eleito chefe do NSDAP, com plenos poderes. Foi proclamado Führer, e não presidente, por indicação de Rudolf Hesse. O seu serviço de ordem, Stosstrup, tornou-se um corpo de assalto que tomou o nome de Sturn Abteilung, cuja sigla foi SA. Esta formação tornou-se, bem depressa, fiel depositário do espírito nacio-

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nalista; propôs ser a educadora cívica do povo alemão. Bem depressa se sentiu frustrada e começou a reclamar pela ver-dadeira revolução. Hitler havia sido eleito o Führer prome-tendo restituir à Alemanha esmagada e acabrunhada, o or-gulho do passado. Começou por entregar um bode expiató-rio aos alemães: os judeus. Precisava deste bode expiatório onde seus dissidentes pudessem expandir os temores e a cólera. Tratava-se de uma simples questão de psicologia: dá-se-lhes um Inimigo comum para odiar, para que não se a-percebam do modo horrível como governava o país. A eco-nomia achava-se no caos quando Hitler assumiu o poder, pelo que atribuiu a culpa aos judeus, muitos dos quais ocu-pavam posições chaves na bancada e nas finanças. Por outro lado a Alemanha havia emergido da primeira guerra mundi-al em condições tão deprimentes que o povo havia perdido o respeito por si próprio como nação. Ao convencê-los de que os judeus constituíam uma raça inferior, fez com que sua autoestima se elevasse automaticamente. Depois, quando o atual conflito principiou a correr mal, considerou o movi-mento de resistência judaica, o responsável. Thulé ocupava-se do patrimônio espiritual dos arianos nórdicos, os quais seriam portadores da luz para o mundo inteiro. Judeus não se enquadravam no quadro político religioso de um povo perfeito. Quando Hitler subiu ao poder, havia cerca de doze milhões de Judeus no mundo. Mais tarde, no momento em que o último tiro da segunda guerra mundial foi disparado, restava menos da metade. Ele despachara-os, na sua maiori-a, para campos de concentração onde foram aniquilados em câmaras de gás e sepultados em valas maciças. Algumas cen-tenas foram convertidas em sabão e as peles aproveitadas em quebra-luzes. Um ato hediondo dos nazistas. E, ao mes-mo tempo em que fazia seus seguidores sentirem-se seres à parte - a raça ariana superior - construía uma vasta e pode-rosa máquina de guerra, que levou a economia do país a re-compor-se. A SA, entretanto, estava descontente a tal ponto, que Hitler começou a recear uma revolta desta sua guarda pretoriana na pessoa de Roehm. Assim, na Noite de Cristal, a 30 de Julho de 1934, Roehm foi executado, a SA desman-telada e os seus poderes transferidos para a Schultz Staffel, a SS, e finalmente para a Gestapo em 1936.

Page 21: Noumenon - perse.com.br · (Registro n.º 566.701 do Livro 1.081 às Folhas 265 de 23 de julho de 2012. no EDA). Diagramação e arte da capa pelo Autor. Dados Internacionais de Catalogação

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Já não há um ideal - contestável, sem dúvida - mas sim uma espécie de feira de horror e roubo, onde os apetites mais cínicos e vorazes se revelam. O conflito mundial, entre-tanto principiou de maneira banal. Hitler fez marchar suas tropas ao país vizinho, com o pretexto de que necessitava de mais espaço para seu povo, e proclamando que se tratava de uma simples disputa fronteiriça. O mais desconcertante é que quase todos acreditaram nele, apesar dele ter exposto os seus projetos de conquista do mundo no livro intitulado Me-in Kampf. Os franceses então afirmaram que só houve uma segunda guerra mundial para decidir quem ganhou à pri-meira. Hitler queria trazer essa decisão em favor da Alema-nha. Mas a história foi mais séria. A Alemanha começou a conquistar as nações europeias, uma a uma. Algumas resisti-ram um ou dois dias, antes de se entregarem. A França pos-suía a Linha Maginot, um cinturão defensivo com quilôme-tros de extensão que considerava invulnerável. Hitler se li-mitou a contorná-lo, e os franceses capitularam ao cabo de uma semana. Todavia, quando se voltou para a Inglaterra e Rússia, as operações ficaram num impasse. Em 1942 os Es-tados Unidos declararam guerra à Alemanha, Itália e Japão - se bem que o caso dos japoneses fosse separado e se alias-sem aos alemães apenas porque ambos lutassem contra os Estados Unidos. Em 1943 os Aliados enviaram tropas contra a África e Itália.

Vitórias brasileiras marcaram a reconquista do solo i-taliano das mãos nazis. Em 1944 o resultado do conflito já não oferecia dúvidas e no mês de maio do ano seguinte, a Alemanha rendeu-se, finalmente, sendo dividida pelas qua-tro grandes potências: Rússia, Estados Unidos, Inglaterra, e França; - muito embora nunca se tenha compreendido, his-toricamente, porque a França foi considerada uma das grandes potências. Mesmo porque a Pátria das Luzes e dos Direitos Humanos, Terra da Acolhida e do Asilo, França, que um dia realizou o irreparável, e faltando à sua palavra, en-tregou seus "protegidos".

Dos 350 mil judeus que viviam na França em 1939, 76 mil foram deportados aos campos de concentração nazi; somente 2.500 sobreviveram. No dia da "Vergonha", 16 de julho de 1942, a polícia francesa detinha 13.000 judeus -