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1 NO PEDAÇO DO ARMANDO: ABSTRAÇÕES E CONCRETICIDADES DA PAISAGEM GEOGRÁFICA João Henrique José Vieira Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNESP de Presidente Prudente Resumo: este texto caracteriza-se por uma sistematização de conhecimentos e inquietações adquiridos ao longo dos três últimos anos no curso de Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNESP de Presidente Prudente. Contempla-se aqui a memória do geógrafo Armando Correa da Silva, que tratou em suas obras, direta ou indiretamente, da questão do método em Geografia. O fio condutor para o desenvolvimento teórico do trabalho é a produção de categorias inseridas numa possível relação entre Geografia e ontologia. Argumenta-se, a partir da polissemia do conceito de paisagem, também muito discutido por Armando, empregado em diferentes contextos, sobre a necessidade das categorias como mediadoras no processo de transição do pensamento do nível abstrato para o nível concreto. O recorte empírico é o espaço urbano porque as formas e funcionalidades aí inscritas contribuem para a percepção da dimensão da abordagem que se intenta quando estão unidos no mesmo texto concepções sobre o método e a paisagem geográfica. Palavras-chaves: método; paisagem; espaço urbano; imagem.

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NO PEDAÇO DO ARMANDO: ABSTRAÇÕES E CONCRETICIDADES DA PAISAGEM GEOGRÁFICA

João Henrique José Vieira

Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNESP de Presidente Prudente

Resumo: este texto caracteriza-se por uma sistematização de conhecimentos e inquietações

adquiridos ao longo dos três últimos anos no curso de Geografia da Faculdade de Ciências e

Tecnologia da UNESP de Presidente Prudente. Contempla-se aqui a memória do geógrafo Armando

Correa da Silva, que tratou em suas obras, direta ou indiretamente, da questão do método em

Geografia. O fio condutor para o desenvolvimento teórico do trabalho é a produção de categorias

inseridas numa possível relação entre Geografia e ontologia. Argumenta-se, a partir da polissemia do

conceito de paisagem, também muito discutido por Armando, empregado em diferentes contextos,

sobre a necessidade das categorias como mediadoras no processo de transição do pensamento do

nível abstrato para o nível concreto. O recorte empírico é o espaço urbano porque as formas e

funcionalidades aí inscritas contribuem para a percepção da dimensão da abordagem que se intenta

quando estão unidos no mesmo texto concepções sobre o método e a paisagem geográfica.

Palavras-chaves: método; paisagem; espaço urbano; imagem.

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I PEQUENA INTRODUÇÃO

Sobre o professor e geógrafo Armando Corrêa da Silva:

Preocupado em estabelecer o rompimento com as velhas formas de produção geográfica, Armando dedicou parte de seu trabalho na busca de seu próprio ritmo e da utilização do fio condutor do seu texto para o refinamento profundo da musicalidade das palavras (...). Ao aproximar-se da linguagem em prosa e da poesia, renovando o sentido do discurso formal, Armando provocou intencionalmente uma relação entre a linguagem conceitual e a linguagem simbólica, gerando não raras vezes uma sensação de mal-estar (GUIMARÃES, 2006, p.4).

II NO PEDAÇO ARMANDO

As palavras são de Armando:

Quando alguém tem uma vertigem, perde as noções de espaço e tempo. Durante a ocorrência fará esforços para reter essas referências. Ao voltar a si pergunta: onde estou? Que horas (dia) são? É como se a referência espacial precedesse o tempo. Daí a sensação, na vertigem, de estar girando no espaço. A positividade do ser recusa o momento mágico. (1986, p.144).

Persiste-se com Armando:

Uma experiência curiosa é a de fechar os olhos, estando-se em pé, e sem apoio. Produz-se momentaneamente (num breve espaço de tempo) o equivalente à sensação de vertigem. As referências de espaço e tempo não as perdem, mas põem-se como no mundo dos cegos. Para este, o recuperar a visão inverte o real: a objetividade de ver é, então, mágica, A subjetividade é o “nada” anterior, formado das experiências táteis e das sensações de frio e calor etc. (Idem).

Ver poderia ser uma opção?

Sim, porque “a positividade pode vir, então, à recusa do momento mágico, por não querer ver”

(Silva, 1986, p.144).

Primeira situação: olha-se a silhueta vítrea dos arranha-céus da marginal do Rio Pinheiros na

altura da Avenida Engenheiro Luiz Carlos Berrini; segunda situação: vê-se o mesmo ponto a partir da

perspectiva da ciência geográfica. O que muda? Retiramos o véu da primeira ou colocamos um filtro

na segunda?

“Enquanto método, a Geografia define-se como uma abordagem ontológica, fenomenológica,

estrutural. No sentido do senso comum e do cotidiano, explicita-se com a aparência, ser e forma”

(Silva, 1998). A resposta poderia ser a seguinte: da perspectiva geográfica não mais se olha,

extrapola-se o imediatismo da aparência do dado imediato para efetivamente se ver que aquele

ponto é um território que concentra as sedes dos principais bancos internacionais e grandes

empresas nacionais e multinacionais na cidade de São Paulo.

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Imagem 1: a silhueta vítrea na edificação da nova cidade global.

A partir de 1977, nas margens do Rio Pinheiro, o mercado financeiro e imobiliário promoveu

quatro ciclos de expansão e especulação imobiliária que configuraram as estruturas e

funcionalidades atuais daquela área (Fix, 2007): deslocamento do eixo de negócios da Avenida

Paulista para a Marginal Pinheiros (1977 a 1985); participação dos principais fundos de pensão do

pais no financiamento de obras imobiliárias (1986 a 1993); abertura da Nova Faria Lima e entrada de

incorporadoras e investimentos estrangeiros (1994 a 2000); e diminuição do financiamento dos

fundos de pensão e crise de vacância nos prédios da região (a partir do ano 2000).

A recusa do momento mágico está nas palavras do filósofo Denis Lerrer Rosenfield, professor

na UFRGS, quando rechaça o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no embate

com a empresa Aracruz Celulose:

Palavras perdem o seu significado num processo de formação da opinião pública, estágio preparatório de invasões ainda mais violentas. Passa-se a utilizar a expressão “deserto verde” para justificar esse tipo de ação, cometendo-se uma impropriedade vernacular. Imaginem explicar a um habitante do Saara que "deserto" veio a significar uma verdejante floresta de eucaliptos! (2006, p.2).

O que a positividade de Rosenfield não quer ver é a floresta de eucalipto como uma realidade

socialmente produzida pelos atores sociais que a compõe. Não caberia discutir aqui as relações

entre esses atores, mas, sim, destacar que a:

simples materialidade física imediata [da floresta de eucalipto] não é suficiente para se afirmar que se trata de uma realidade. Sua concretude ou realidade está em sua materialidade física invisível assim como em sua materialidade social igualmente invisível. A realidade está além de sua visibilidade imediata ou, como dizem os geógrafos, além de sua paisagem. (MELO, 2004, p.12).

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A possibilidade de filtrar o dado imediato existe porque este filtro é o aporte teórico e

metodológico da Geografia, ou seja, das categorias e conceitos que conduzem o pensamento do

nível abstrato (forma aparente) ao nível concreto (forma real). O movimento categorial media a

relação da abstração (retirada de parte do todo) com o concreto pensado. Entre outras palavras:

deixa-se o subjetivismo do olhar para, efetivamente exercitar o ato de ver.

O ver geográfico, então, sobrepõe-se ao simples olhar, desprezando, algumas vezes, a

subjetividade da aparência na “hipótese idealizada” (Silva, 2000). O esquema, elaborado a partir de

Martins (2007), com apoio do Professor Raul Borges Guimarães, esboça a produção das categorias

e suas funções na fundamentação do conhecimento geográfico.

Este esboço é a tentativa de situar as categorias como partes de uma ampla questão

ontológica. O fazer geográfico, a práxis na perspectiva marxista, produz as categorias que, de

universais abstratos, transformam-se em universais concretos, condensando a movimentação

do real em formas, compondo a existência do ente e engendrando no conceito o seu

conteúdo.

III ANÁLISE DA PAISAGEM URBANA COMO EXERCÍCIO LÓGICO DE ABSTRAÇÃO

Em uma possível relação entre ontologia e Geografia, a paisagem então se transforma no

ente, na categoria e no conceito. Como entidade, a paisagem enuncia o ser da objetividade de Milton

Santos, Ruy Moreira, Armando Corrêa da Silva, Roberto Lobato Corrêa. Enquanto categoria

“respondem não o que os entes são, e sim indicam o estar e o ter enquanto condição do existir dos

entes em geral” (Martins, p.34, 2007). A existência do ente paisagem fará ela ser o que é – o

conceito. O conceito é a representação do objeto pelo pensamento, ou seja, uma idéia sobre o

objeto.

Categoria da Geografia, a paisagem se apresenta, conforme o interesse dos geógrafos, sob

diferentes conceitos e sob diferentes interesses em conceituá-la; a seguir, alguns deles.

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Para o recorte empírico deste trabalho, a paisagem urbana se apresenta como um conceito

condutor da discussão que se segue. Primeiro porque possibilita “múltiplas leituras de diversos

contextos histórico-culturais, envolvendo diferenças sociais, poder, crenças e valores” (Corrêa, p.179,

2003) e segundo porque:

é um produto do trabalho social, profundamente impregnada de relações sociais e conflito, e não o produto de um indeterminado agente denominado cultura, a paisagem urbana desempenha, por intermédio daqueles que a controlam e definem novos significados, a tarefa de apagar ou minimizar aquelas relações de conflitos e, ao mesmo tempo, promover aquilo que seus controladores desejam, isto é, transformá-la em produto espontâneo, natural, e fruto de uma tradição da qual a harmonia social e o desejo de progresso são partes integrantes (Idem, p.181).

Rugosidades, como a residência de Joaquim Franco de Mello, antigo barão do café,

construída ano de 1905, coexistem na Avenida Paulista, cidade de São Paulo com o Conjunto

Nacional, inaugurado 1958, e o edifício Comendador Yerchanik Kissajikian, inaugurado em 2003.

Para cada ano um paradigma arquitetônico diferente que inscreveu, na extensa avenida, registros de

épocas diferentes. Indica-se, portanto, aquele espaço como a somatória de tempos desiguais, cuja

paisagem atual permitiria a leitura do processo de transformação do uso e funcionalidade da Paulista

ao longo do tempo. Nesta relação entre paisagem e memória, Milton Santos destaca que:

A paisagem é o conjunto de formas que num dado momento, exprimem as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre homens e natureza espaço são essas formas mais a vida que as anima (1997, p.81-85).

Figura 2 – Da esquerda para a direita: o casarão Franco de Mello, o Conjunto Nacional e o edifício Yerchanik Kissajikian.

Na silhueta vítrea da Marginal Pinheiros (Imagem 1), altura da Berrini, há uma

intencionalidade nos prédios construídos predominantemente em concreto, aço e vidro. “Por trás das

fachadas simples ou monumentais da paisagem urbana nos espreita a ideologia que os construtores

da ordem nos querem incutir” (Moreira, p.51, 1994). Para Ribeiro (2002) uma paisagem estética,

neste caso, urbana, conformar-se-ia em um:

tecido urbano que contém valores culturais transpassados pela afirmação do mesmo, que oprimem o singular, sintetizados, por exemplo, em formas urbanas reproduzidas a partir de modelos de arquitetura oriundos de países hegemônicos, uma das críticas às cidades contemporâneas....

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Nas cidades contemporâneas a força dos recursos imagéticos é explorada pela mídia, que

“faz a paisagem tornar-se uma fábrica cuja função é produzir em série, em massa e

padronizadamente o nosso dia-a-dia” (Moreira, p.51, 1994). A cidade é constituída por um sem-

número de símbolos que fundamentam sua paisagem estética para além da materialidade

arquitetônica, fundido imaginário e paisagem como na imagem publicitária do condomínio Sítio

Anhanguera.

Figura 3 – O urbano e o rural fundidos no espaço metropolitano da cidade de São Paulo.

A intenção do condomínio é proporcionar o urbano-rural àqueles quem não querem deixar a

cidade de São Paulo para desfrutar de paz e silêncio. O condomínio está dentro é fora da cidade,

segundo a propaganda. Dentro porque está situado na Grande São Paulo e próximo às principais

vias de interligação com a capital; e fora porque se pode andar correr descalço e se divertir no ar

puro como seria no campo. Aproveitando-se necessidades produzidas por esse imaginário urbano,

as empreiteiras e empresas imobiliárias encontraram um público-alvo cativo e ávido pelo consumo do

verde.

Mas a questão é saber para privilégio de quem este mercado, onde se ‘vende o verde’, é fomentado. As contradições entre centro e periferia podem ser visualizadas de diversas formas, uma delas é através da espacialização das propostas de melhoria da vida urbana sob o foco da atenção ambiental condicionada às diferentes classes sociais. Por exemplo, indaga-se em que medida os mais ricos habitam em lugares mais arborizados, e geralmente distantes do centro para evitar o contato com a poluição (SANTANA, p.184, 2001).

Os elementos de paisagens tidas como naturais são mimetizados na tentativa de se construir

espaços que atendam aos anseios do imaginário urbano. A cidade, então, torna-se a antítese da

natureza. Daí a necessidade de fuga para as idílicas paisagens naturais do campo – uma recriação

da “fugere urbem, sequi natura” (fugir da cidade, seguir a natureza) dos poetas árcades do século

XVIII para os dias atuais. Recriação porque não se pretende abandonar a cidade, muito menos o

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modo de vida moderno-industrial, mas conciliá-lo àquele que o imaginário urbano concebe como

natural: campo, montanha e praia.

Figura 3 – Propaganda do Fiat Adventure, a praia, o campo e a montanha (elementos naturais) se fundem numa mesma paisagem a ser desbravada pelo automóvel (elemento artificial?).

Mas Armando Corrêa da Silva (1994), ao indagar sobre o que vem a ser, atualmente, o

natural, alerta que:

não se trata de procurar o natural nos lugares ainda intocados pela humanidade. O natural está presente na informática, na cibernética, na robótica, na telematica [...]. Ora, isso quer dizer que o natural é a cidade informacional. Aí, em suas várias manifestações, como tecnopolo etc., a natureza então criada em laboratório revela uma parte de seus segredos (p.42).

Por serem simulacros, a materialidade das paisagens, na figuras acima, “en el nivel de la

realidad practicable es imposible. Es concebible y verosímil únicamente en el espacio-tiempo virtual

de la mente, es decir en los sueños” (Alvarez, 2003).

Se o “natural e o humano encontram-se na dimensão onírica” (Silva, 1994, p.44),

rememorando o quadro “Sueño causado por el vuelo de una abeja alrededor de una granada, un

segundo antes de despertar”, de Salvador Dali, surge a pergunta: qual seria o sonho do geógrafo a

um segundo de acordar? Para o cartógrafo seria produzir um mapa que representasse fielmente a

realidade; para o geógrafo, talvez fosse produzir uma análise integradora que superasse a dicotomia

entre a Geografia Física e Humana. No caso especifico do geógrafo, a obsessiva busca pela

integração da análise sociedade-natureza poderia reforçar a positividade do que foi outrora, por

exemplo, a busca pelo objeto da ciência geográfica, sem que, até hoje, exista consenso na sua

definição.

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Figura 4 – Sueño causado por el vuelo de una abeja alrededor de una granada, un segundo antes de despertar.

IV POR FIM, OS MÉTODOS EM QUESTÃO

Por que se buscar uma definição? Uma análise não se faz geográfica antes do pôr-se a fazer.

A Geografia Urbana ou Rural, por exemplo, são possibilidades de recortes empíricos no transcorrer

do projeto. Sendo assim, este texto buscou evidenciar o jogo categorial e conceitual na produção do

conhecimento científico, especialmente o geográfico, tendo por base a revisão do pensamento do

geógrafo Armando Corrêa da Silva a respeito do método em geografia. Para Armando, os

procedimentos científicos em Geografia deveriam contemplar quatro princípios:

o da extensão (os fenômenos ocorrem num espaço); o da repartição (eles possuem uma certa freqüência); o da correlação (estão correlacionados); e o da atividade (possuem um dinamismo que não poder ser expresso sem a consideração de sua historicidade) (1972, p.9, grifos nossos).

Para a exposição da relação entre ontologia e Geografia, a análise de dois territórios dentro

do espaço urbano paulistano serviu de recorte empírico num pretenso exercício metodológico –

seguindo as etapas clássicas do trabalho científico – em que o conceito e categoria ‘paisagem’

mediam a produção de conhecimento.

O exercício seguiu da intuição à dedução da hipótese: a silhueta vítrea dos arranha-céus da

paisagem na Marginal Pinheiros, erguida rapidamente a partir da década de 1990, é semelhante ao

de outras cidades globais; deduziu-se, então, a hipótese de existirem intencionalidades naquela

paisagem construída que a torna parte de um processo mais amplo, presente também em outros

espaços do mundo.

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Da hipótese à experiência: para a análise, estabeleceu-se como recorte empírico o espaço

urbano da cidade de São Paulo e, verificada as características de sua paisagem, procedeu-se com

um encaminhamento indutivo relacionando o pensar de diversos autores sobre o tema com o intuito

de se confirmar a hipótese.

Da experiência ao resultado e do resultado a concretização: a hipótese suscitada foi

confirmada pelo raciocínio indutivo, concluindo-se (generalização) que existem intencionalidades na

produção da paisagem que se ergue tanto na Avenida Paulista ao longo de um século quanto nos

arranha-céus modernos – os edifícios inteligentes – da Marginal Pinheiros, complementado agora

com a construção da moderníssima Ponte Estaiada, um símbolo imagético para a nova cidade que

se ergue. A concretização é este trabalho que se encerra, como não poderia deixar de ser, com as

palavras inusitadas de Armando: “Por falar nisso, enquanto viajava espacialmente esqueci onde

coloquei o meu carro. O que fazer? Aterrissar” (Silva, 1997, p.5).

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