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150 www.backstage.com.br REPORTAGEM Karyne Lins [email protected] P Encontro O Encontro Nacional de Organistas é um evento que ocorre anualmente e agrega organistas profissionais (concertistas e professores) e aficionados pelo órgão de tubos. O assunto principal desta 16ª edição do evento foi a tecnologia digital. Nacional de Organistas ela primeira vez a cidade do Rio de Janeiro sediou um dos mais im- portantes encontros de organistas do Brasil, realizado de 26 a 29 de julho. A data coincidiu com o X Encontro Latino Americano de Organistas e Organeiros, onde profissionais debateram o tema O Órgão no Século XXI. A 16ª edição do evento foi realizado pela Associação Brasileira dos Organistas (com sede em São Paulo e organizadora das edi- ções anteriores) e organizado pela co- missão da Associação Carioca dos Or- ganistas (ACO), presidida por Benedito Rosa, auxiliado por Eugênio Gall, Lys Gazanego e Irmão Renato Koch (RS). “Considero de suma importância o en- contro, porque este é um instrumento que não pode desaparecer das nossas igrejas e penso que o futuro do órgão e dos organis- tas está na dedicação de trabalhar com música popular”, disse Dorival Ristof, pas- tor da igreja Luterana Martin Luther. O objetivo do encontro é divulgar a música de órgão no Brasil e tratar dos problemas comuns. “Os organistas, no pas- sado, tinham certo prestígio, recebiam ho- norários regularmente; hoje a situação se inverteu muito. A grande maioria das igrejas não remunera os organistas, que não podem ter uma dedicação integral ao órgão. Poucas igrejas no Rio têm um bom órgão, há instrumentos sem manutenção, falta incentivo, etc.”, disse Eugênio Gall, organista e secretário da ACO. Palestras e atrações Após a abertura do encontro, Dorotea Kerr (organista, pesquisadora, professora e regente de coral) iniciou o círculo de pa- lestras abordando A Situação do Órgão em São Paulo. “O campo profissional do orga- nista foi deixando de existir e hoje outras habilidades são exigidas dentro da músi- ca. São várias situações adversas e o desa- fio da categoria é não deixar o segmento ser esquecido de vez no Brasil. No entan- to, nos últimos cinco anos, registramos cerca de 24 concertos anuais e isso com- prova que vale a pena o trabalho para a divulgação e valorização do instrumento e dos organistas”, comentou Dorotea. A Evolução do Órgão e as Novas Tecno- logias foi tema do segundo dia de encontro, ministrado por Daniel Birouste (França) na Catedral Metropolitana do Rio de Janei- ro. Ele falou desde o uso da eletricidade até os novos caminhos no ciclo da informa- tização e da era digital, quando adotaram Participantes do 16º Encontro Nacional dos Organistas Fotos: Karyne Lins / Divulgação

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Page 1: no palco com 141 - Revista Backstage · “O campo profissional do orga-nista foi deixando de existir e hoje outras ... duzida digitalmente pelas caixas de som ... panhando os projetos

150 www.backstage.com.br

REPORTAGEM

Karyne Lins

[email protected]

P

EncontroO Encontro Nacional de Organistas é um evento que ocorre anualmente eagrega organistas profissionais (concertistas e professores) eaficionados pelo órgão de tubos. O assunto principal desta 16ª edição doevento foi a tecnologia digital.

Nacional de Organistas

ela primeira vez a cidade do Riode Janeiro sediou um dos mais im-portantes encontros de organistas

do Brasil, realizado de 26 a 29 de julho. Adata coincidiu com o X Encontro LatinoAmericano de Organistas e Organeiros,onde profissionais debateram o tema OÓrgão no Século XXI.

A 16ª edição do evento foi realizado pelaAssociação Brasileira dos Organistas (comsede em São Paulo e organizadora das edi-ções anteriores) e organizado pela co-missão da Associação Carioca dos Or-

ganistas (ACO), presidida por BeneditoRosa, auxiliado por Eugênio Gall, LysGazanego e Irmão Renato Koch (RS).

“Considero de suma importância o en-contro, porque este é um instrumento quenão pode desaparecer das nossas igrejas epenso que o futuro do órgão e dos organis-tas está na dedicação de trabalhar commúsica popular”, disse Dorival Ristof, pas-tor da igreja Luterana Martin Luther.

O objetivo do encontro é divulgar amúsica de órgão no Brasil e tratar dosproblemas comuns. “Os organistas, no pas-

sado, tinham certo prestígio, recebiam ho-norários regularmente; hoje a situação seinverteu muito. A grande maioria dasigrejas não remunera os organistas, quenão podem ter uma dedicação integral aoórgão. Poucas igrejas no Rio têm um bomórgão, há instrumentos sem manutenção,falta incentivo, etc.”, disse Eugênio Gall,organista e secretário da ACO.

Palestras e atraçõesApós a abertura do encontro, Dorotea

Kerr (organista, pesquisadora, professora eregente de coral) iniciou o círculo de pa-lestras abordando A Situação do Órgão emSão Paulo. “O campo profissional do orga-nista foi deixando de existir e hoje outrashabilidades são exigidas dentro da músi-ca. São várias situações adversas e o desa-fio da categoria é não deixar o segmentoser esquecido de vez no Brasil. No entan-to, nos últimos cinco anos, registramoscerca de 24 concertos anuais e isso com-prova que vale a pena o trabalho para adivulgação e valorização do instrumentoe dos organistas”, comentou Dorotea.

A Evolução do Órgão e as Novas Tecno-logias foi tema do segundo dia de encontro,ministrado por Daniel Birouste (França)na Catedral Metropolitana do Rio de Janei-ro. Ele falou desde o uso da eletricidade atéos novos caminhos no ciclo da informa-tização e da era digital, quando adotaramParticipantes do 16º Encontro Nacional dos Organistas

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REPORTAGEM

para estes órgãos a norma MIDI, e as vanta-gens da informática musical, um padrãoaceito mundialmente.

Any Raquel (Porto Alegre) falou so-bre ‘Arthur Napoleão e a Introdução doÓrgão Mustel no Brasil, e, fechando oprograma de palestras, Os Organistas noBrasil: Rumos e Ações Para o Futuro, porFelipe Radicetti, e o Ressurgimento doÓrgão nas Liturgias das Igrejas Tradicio-nais, por Renato Koch (Canoas/RS).

Durante todo o encontro os participantesassistiram aos recitais de Domitila Balles-teros, Gisele Sant’Ana, Myriam Nogueira,Renato Koch, Gertrud Mersiovsky e umconcerto coletivo no órgão digital da Cate-dral Metropolitana com Eugênio Gall (RJ),Miriam Carpinetti (SP), Bailinda Heckert(MG), Lys Gazanego (RJ), Jeanine Mund-stock (RS) e Benedito Rosa (RJ). Uma dasatrações internacionais foi o alemão DetlefSteffenhagen. Residindo em Curitiba há

cinco anos, mostrou a influência do ritmobrasileiro em forma de samba numa obra deBach, além de tocar a obra As Quatro Esta-ções, de Vivaldi, completa.

“É a primeira vez que estou participan-do do encontro. Os eventos anterioressempre coincidiram com datas de concer-tos na Alemanha e foi muito prazeroso es-tar aqui, conhecendo outros organistas eseus trabalhos, suas idéias e o que eles es-tão fazendo pelo órgão no Brasil”, disse o

Márcio Rigatto fala de manutenção de órgãos Cerimônia de abertura do Encontro Visita ao órgão da igreja de Santa Teresinha

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REPORTAGEM

organista alemão. Nos qua-tro dias foram agendadasvisitas para os organistas co-nhecerem órgãos de váriasigrejas do Rio de Janeiro,como o Órgão Lowndes, daPrimeira Igreja Batista doRio de Janeiro, Wlacker, daIgreja Martin Luther, G.Berner, do Convento deSanto Antônio e o ÓrgãoMonumental Tamburini,da Basílica Nossa SenhoraAuxiliadora, em Niterói.

Uma das igrejas que ogrupo visitou foi a Igreja Batista em Itacu-ruçá, na Tijuca (RJ), que adquiriu um ór-gão digital Rodgers modelo Trillium Mas-terpiece 908. Ele foi instalado em janeiro de2006 por Pakito, coordenador da área CK(contemporary keyboards) da Roland Bra-sil. A avaliação técnica e calibragem doinstrumento foram feitas por John Green,da Rodgers USA, que também é managerinternacional de vendas.

A Rodgers foi fundada na década de50, sendo que foi pioneira em fabricar ór-gãos digitais, simulando órgãos de tubos,exatamente no ano de 1980. Em 1988, aempresa foi incorporada ao grupo Roland.Na palestra sobre a introdução dos órgãosdigitais nas igrejas, Pakito explicou que osórgãos Rodgers são digitais mas simulamcom maestria os sons de órgãos de tubos.

A intenção não é utilizar um digitalcomo substituto absoluto do órgão de tu-bos. A idéia é que as igrejas e consumido-res finais (ou entidades) que não tenhamdinheiro para comprar um órgão de tubostenham no digital uma solução muitosatisfatória, com preço módico. Pakito co-mentou sobre as diversas tecnologias quesão empregadas nestes órgãos digitais,tanto para fazer com que o som se modifi-que dinamicamente enquanto o músicotoca, quanto em termos de qualidade dascaixas de som e acabamento de gabinetes.

Os órgãos Rodgers podem tambémoperar conectados a tubos reais e podemser customizados, ou seja, fabricados sobespecificação dirigida pelo cliente, perso-nalizando o instrumento de acordo coma necessidade de cada cliente.

O tradicionalismoe o digitalUm som digital é uma amostra compu-

tadorizada do som real de um órgão de tu-bos. A amostragem digital dos sons é feitanota a nota, tubo por tubo, sempre emestéreo, com resolução digital em 24 bits etaxa de amostragem de 48 kHz. Com estaresolução e taxa de amostragem, há condi-ções de captar as mais detalhadas nuancessonoras, desde um som mais grave até omais sutil harmônico num som agudo.

Com a introdução datecnologia digital nestesegmento musical, a preo-cupação maior por partedos organistas é com a qua-lidade de som, ou seja, seele realmente consegue seaproximar do som de órgãosde tubos. “Sabemos que,apesar disso, muita gente sepreocupa em adquirir uminstrumento que seja de fá-cil manuseio. No caso dosórgãos Rodgers, pode-sememorizar ´registrações´

em cartões de memória, conectá-los viaMIDI com computadores ou módulos desom externos ou até mesmo conectar umcomputador via link de rede, para quepossamos editar parâmetros de configu-ração interna do órgão através da tela docomputador com gráficos amigáveis”,disse Pakito.

A questão de preço se tornou um pro-blema maior, por isso os órgãos digitaistêm sido a escolha de igrejas e escolasque não possuem recursos para comprarum órgão de tubos. Mas ainda existe umpouco de resistência pelos tradicionalis-tas. Alguns organistas não aceitam a so-noridade do órgão digital por acharemque este ainda deve muito para os órgãosde tubos. Entretanto, a grande maioriade organistas que esteve presente naigreja em Itacuruçá, aprovou a qualida-de de som do Trillium Masterpiece 908.

“Acreditamos, sim, que com o passardo tempo mais e mais entidades estarãooptando por combinar órgãos de tuboscom órgãos digitais aproveitando o me-lhor de dois mundos. Porém, acho que re-sidências, escolas e igrejas pequenas quenão têm condições de comprar ou cuidarde maneira adequada da manutenção deum órgão de tubos real, o caminho estámais do que aberto para instrumentos di-gitais”, opinou Pakito.

“Com o passar dotempo mais e mais

entidades optarão porcombinar órgãos detubos com órgãos

digitais aproveitandoo melhor de doismundos” (Pakito)

Órgão Lowndes da Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro

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REPORTAGEM

SonoridadeEm relação à sonoridade, alguns orga-

nistas presentes no encontro já tocaramem órgãos digitais e receberam bem essanovidade. A proposta do órgão digital nãoé substituir o órgão de tubos. O som de umRodgers, por exemplo, se aproxima muitodo som de um órgão de tubos graças atecnologia PDI, que faz pequenas altera-ções de timbre, afinação e volume en-quanto o músico está tocando. Há o equi-valente a seis computadores operando emconjunto dentro de um órgão Trillium, fa-zendo cálculos matemáticos complexosque permitem esta perfeição sonora.

“Quando estes órgãos são combinadoscom tubos reais, desligamos o som digitalnas caixas de som. Os únicos sons que saemnos alto-falantes são aqueles que o órgãode tubos não possui. Por exemplo, se numacombinação de console digital com tubosreais a igreja não possui, digamos, uma filei-ra de tubos equivalente a Gemshorn 8, en-tão, neste caso, esta sonoridade seria pro-duzida digitalmente pelas caixas de somconectadas ao nosso console digital. Emcombinações deste tipo, podemos instalarum sensor de temperatura preso a uma fi-leira de tubos que irá indicar, sempre que oconsole digital for ligado, se houve altera-

ção natural de afinação dos tubos fazendocom que os sons digitais ajustem sua afina-ção, casando com a afinação atual dos tu-bos”, explicou Pakito.

Uma curiosidade sobre os órgãos de tu-bos no Brasil, é que nas regiões Nordeste eCentro-Oeste não existem muitas referênci-as de igrejas que possuam este tipo de órgão.Isso se deve um pouco a cultura musical, pormotivos econômicos ou de doutrina dasigrejas. Por razões históricas, existe uma mai-or quantidade de órgãos de tubos concen-trada em São Paulo, Rio de Janeiro e RioGrande do Sul. Em outras regiões, há diver-sos órgãos de tubos que estão fora de uso.

PerspectivasUma das expectativas é que com o

advento dos órgãos digitais mais pessoaspoderão ter acesso ao instrumento. Mes-mo que uma igreja já possua um bom ór-gão de tubos, um órgão digital é semprebem-vindo para sessões de ensaio, atéporque demanda baixos valores de ma-nutenção, nunca desafina, permite usode fones de ouvido e pode ser utilizadoem qualquer situação. “Estamos acom-panhando os projetos desenvolvidospela ABO (Associação Brasileira de Or-ganistas) e esperamos poder participartambém dos próximos eventos. Para nósé uma honra participar como co-patro-cinadores, pois entendemos a importân-cia deste encontro no sentido de perpe-tuar o instrumento e também de au-mentar a popularidade do órgão, sejaele de tubos ou eletrônico, popular ouerudito” disse Pakito.

O presidente da ACO, Benedito Ro-sa, disse que gostou do resultado do tra-balho da comissão organizadora e pensaque em breve o Rio possa ser novamentesede do Encontro.

Roland Brasil, Família Artesã Rigatto

& Filhos, Igreja Luterana Martin Luther,

Catedral Metropolitana do Rio de Ja-

neiro, Igreja Nossa Senhora do Carmo

da Lapa e Hotel Inglês.

Apoio

Para saber mais

www.roland.com.br/DOWNLOAD/

Arquivos/pdf/rodgers.pdf

Órgão Tamburini da Escola de Música UFRJ