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16/03/2020 Desafios ambientais dos frigoríficos ainda são grandes no Norte | Agronegócios | Valor Econômico https://valor.globo.com/agronegocios/noticia/2020/03/16/desafios-ambientais-dos-frigorificos-ainda-sao-grandes-no-norte.ghtml 1/6 Desafios ambientais dos frigoríficos ainda são grandes no Norte O monitoramento dos fornecedores diretos de animais evoluiu, mas indiretos continuam a ser gargalo Por Marina Salles e Luiz Henrique Mendes — De São Paulo 16/03/2020 05h01 Atualizado O diretor de sustentabilidade da Marfrig, Paulo Pianez: em busca de avanços no controle dos fornecedores indiretos — Foto: Claudio Belli/Valor Dez anos após a “Farra do Boi”, o barulhento relatório do Greenpeace que despertou a comunidade internacional para a responsabilidade dos frigoríficos no desmatamento da Amazônia, os principais exportadores de carne bovina do país evoluíram no monitoramento dos fornecedores diretos de gado, barrando milhares de pecuaristas em situação irregular. Mas o problema está longe do fim, o que torna a situação cada vez mais urgente dada a severidade das mudanças climáticas. há 4 horas

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Desafios ambientais dos frigoríficos ainda são grandesno NorteO monitoramento dos fornecedores diretos de animais evoluiu, mas indiretos continuam a sergargalo

Por Marina Salles e Luiz Henrique Mendes — De São Paulo

16/03/2020 05h01 Atualizado

O diretor de sustentabilidade da Marfrig, Paulo Pianez: em busca de avanços no controle dos fornecedores indiretos — Foto: ClaudioBelli/Valor

Dez anos após a “Farra do Boi”, o barulhento relatório do Greenpeace que despertou acomunidade internacional para a responsabilidade dos frigoríficos no desmatamento daAmazônia, os principais exportadores de carne bovina do país evoluíram no monitoramentodos fornecedores diretos de gado, barrando milhares de pecuaristas em situação irregular. Maso problema está longe do fim, o que torna a situação cada vez mais urgente dada a severidadedas mudanças climáticas.

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Atualmente, o principal gargalo está no fornecimento indireto. Os sistemas de monitoramentoexistentes não são capazes de certificar a regularidade do criador de bezerro ou boi magro quevende o animal ao produtor para engorda.

Noúltimo

ano, o aumento do desmatamento, aliado à retórica antiambiental de autoridades do governo,intensificou a pressão sobre as indústrias, sobretudo as maiores - JBS, Marfrig e Minerva -, quecompram ao menos 38% do gado no bioma amazônico. Conforme dados do IBGE compiladospela associação civil Imaflora, o rebanho bovino amazônico cresceu mais de 20 vezes desde1974 e superou 64 milhões de cabeças em 2018, enquanto o efetivo do país todo “apenas”dobrou, para 213,5 milhões de cabeças.

Para responder ao problema ambiental, os principais frigoríficos buscam mecanismos paramitigar o risco de serem acusados de “lavagem de gado”, mas a solução do problema tambémdepende do engajamento do governo federal, que parece ausente do debate. Um grupo detrabalho que estudava formas de monitorar o fornecimento indireto de gado foi encerrado peloMinistério do Meio Ambiente em 2019.

Procurada pelo Valor, a Pasta redirecionou o assunto ao Ministério da Agricultura - que, porsua vez, atribuiu a responsabilidade ao setor privado e passou a bola para a ConfederaçãoNacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). “O que se debate no momento é a adoçãode protocolos privados por parte das empresas que operam no setor de carnes, com contratosde longo prazo com produtores em áreas de maior risco ambiental”, informou o Ministério daAgricultura, em nota.

Do ponto de vista regulatório, os frigoríficos sugerem mudanças para viabilizar um controlemais efetivo dos indiretos. Atualmente, os documentos que regulam a movimentação de gadoentre pecuaristas não são de acesso público.

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Além disso, não basta garantir que o grande frigorífico preserve a Amazônia. Dezenas deindústrias de médio e pequeno porte não têm qualquer mecanismo de controle, alegamexecutivos da indústria. O argumento é contestado por Mauro Armelin, diretor-executivo daONG Amigos da Terra - Amazônia. “Se os três maiores fizerem, 50% do problema vai estarresolvido, e cria-se um ciclo virtuoso de melhora da cadeia”, defendeu.

Outra necessidade é uma política de regularização ambiental para pequenos produtores, sema qual a exclusão social se torna um problema de grandes proporções, de acordo comexecutivos das indústrias, membros do Ministério Público Federal (MPF) e organizações não-governamentais (ONGs). “Ter um banco de dados e montar uma lista suja sem a aderência doprodutor nunca foi a solução. É preciso batalhar pela reinserção dele na cadeia”, afirmou ocoordenador de pecuária sustentável da The Nature Conservancy Brasil (TNC), FranciscoFonseca.

Enquanto uma solução nacional para os fornecedores indiretos não é engendrada, iniciativasestaduais e privadas ganham espaço. No Pará, onde o MPF fez os primeiros Termos de Ajustede Conduta (TACs) da Carne, em 2009, está se formando uma força-tarefa entre os setorespúblico, privado e da sociedade civil a fim de resolver o fantasma dos indiretos.

Para atacar o problema e suas arestas, o governo do Pará vai alocar R$ 92 milhões, recebidosda Operação Lava-Jato, em ações de fomento, fiscalização e regularização. Segundo MauroO'de Almeida, secretário de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado, o caráterdo programa é desenvolvimentista e não puramente conservacionista. “Trazer o pessoal para alegalidade e incentivar a eficiência são nossas metas”, disse. Segundo ele, no Estado a lotaçãomédia nas fazendas, que é de 1 cabeça de gado por hectare, pode ser facilmente triplicadacom ações de assistência técnica.

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“O desafio dos indiretos está atrelado aos pequenos produtores, que fazem a cria emassentamentos, sobre áreas desmatadas e com pouquíssima tecnologia”, destacou FranciscoFonseca, da TNC. Ao longo dos últimos anos, a organização constatou dificuldade de rastrearo gado individualmente. “Chegamos, inclusive, a tentar rastrear os animais usando brincos ebólus [equipamentos eletrônicos colocados no rúmen do boi], mas sem sucesso por conta docusto-benefício e das extensas áreas na Amazônia”, disse.

Agora, com o auxílio da iniciativa governamental britânica Partnerships for Forests (P4F), maisuma frente de trabalho se abre. Por meio de um consórcio envolvendo TNC, Amigos da Terra ea startup mineira Safe Trace, e com apoio do governo do Pará, a P4F lançará uma plataformade rastreabilidade. Tendo a tecnologia blockchain como aliada - para preservar o sigilo de cadaelo da cadeia, seja o frigorífico parceiro, produtor ou governo -, a ideia é criar um sistema quecruze dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e da Guia de Trânsito Animal (GTA) depecuaristas dispostos a fornecer suas informações voluntariamente, em troca de assistênciapara resolver os seus passivos.

A meta é incluir, até maio, 300 imóveis rurais na plataforma. Estima-se que cada imóvel leve aquatro produtores indiretos, somando 1,4 mil cadastrados, que movimentam, em média, 1milhão de cabeças de gado por ano. “Provado o piloto em São Félix do Xingu e sudeste doPará, espera-se que o modelo seja replicável para todo o Estado e outras regiões”, afirmouLuiz de Almeida, da P4F.

Do outro lado do balcão, os frigoríficos tentam encontrar soluções, enquanto são observadospelos consumidores europeus e por investidores. A JBS, que tem no bioma amazônico metadede seus 90 mil fornecedores, fará novas sugestões ao governo. Com uma lista de 8 milprodutores bloqueados na Amazônia, Márcio Nappo, diretor de sustentabilidade da companhia,

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argumenta que o controle dos fornecedores diretos avançou muito em dez anos, mas admitiuque a batalha dos indiretos está no começo.

Em busca de uma solução, a JBS trabalha em alguns projetos, ainda embrionários. Um deles éa atualização da proposta, feita anos atrás, para a criação de uma Guia de Trânsito Animalpara fins ambientais - a “GTA Verde”. A ideia é atrelar a GTA, documento de política sanitáriausado para verificar o cumprimento de vacinações obrigatórias e conter eventuais surtos dedoenças, às informações ambientais do produtor.

Anos atrás, a proposta de GTA Verde previa vetar a emissão do documento para o pecuaristaque estivesse na lista de áreas embargadas do Instituto de Meio-Ambiente e dos RecursosNaturais Renováveis (Ibama). Mas o plano continha uma fragilidade: se o produtor nãopudesse emitir a GTA para movimentar o gado, colocaria em risco o controle sanitário, namedida em que o transporte de animais poderia se tornar clandestino, admitiu Nappo, da JBS.

Por isso, a ideia agora é que a GTA Verde informe sobre a situação ambiental do produtor, masnão vete a emissão das guias. Assim, as indústrias que quisessem determinariam aospecuaristas diretos que não fornecessem lotes de animais oriundos dos indiretos comirregularidades ambientais.

Na Marfrig, segunda maior indústria de carne bovina do mundo, está em curso a criação de ummapa de mitigação de risco de fornecedores indiretos, segundo o diretor de sustentabilidadePaulo Pianez. Com testes a partir de setembro e entrada em funcionamento em 2021, a Marfrigvai sobrepor mapas com as regiões típicas de produção de bezerros com áreas de vegetaçãonativa.

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Se não resolve o problema definitivamente, o serviço ao menos ajudará a Marfrig a nortear ascompras dos fornecedores diretos. Atualmente, quase 40% do gado abatido nos frigoríficos dacompanhia é oriundo do bioma amazônico. A companhia tem 13,1 mil fazendas fornecedoras e3 mil bloqueadas.

Terceira maior indústria de carne bovina do país, a Minerva também tenta minimizar o risco deindiretos. De acordo com Taciano Custódio, responsável pela área de sustentabilidade, aempresa faz um mapeamento interno de seus fornecedores para identificar aqueles que atuamno ciclo completo - produzindo os próprios bezerros. Segundo ele, esses produtores sãomenos suscetíveis a problemas. Entre 45% e 50% dos bovinos comprados pela empresa vêmdo bioma.