saúde do trabalhador de frigoríficos unioeste

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CARTILHA SOBRE SAÚDE DO TRABALHADOR FIQUE DE OLHO PARA NÃO ENTRAR NUMA FRIA! CARTILHA PARA TRABALHADORES DE FRIGORÍFICOS Pró-Reitoria de Extensão da Unioeste Programa de Pós-Graduação em Educação – Mestrado em Educação Campus de Cascavel Curso de Enfermagem Associação de Portadores de Lesões por Esforços Repetitivos – AP-LER Apoio e financiamento: Programa de Apoio à Extensão Universitária PROEXT 2007 – MEC/SESu/DEPEM

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cartilha saúde do trabalhados

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CARTILHASOBRE

SAÚDE DO TRABALHADOR

FIQUE DE OLHO PARA NÃOENTRAR NUMA FRIA!

CARTILHA PARA TRABALHADORES DE FRIGORÍFICOS

Pró-Reitoria de Extensão da UnioestePrograma de Pós-Graduação em Educação – Mestrado em Educação

Campus de CascavelCurso de Enfermagem

Associação de Portadores de Lesões por Esforços Repetitivos – AP-LER

Apoio e financiamento:

Programa de Apoio à Extensão UniversitáriaPROEXT 2007 – MEC/SESu/DEPEM

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Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Programa de Pós-Graduação emEducação. Mestrado de Educação

Cartilha sobre a saúde do trabalhador : fique de olho para não entrar numa fria :cartilha para trabalhadores de frigoríficos / Universidade Estadual do Oeste doParaná. Mestrado de Educação, Curso de Enfermagem, Associação de Portadoresde Lesões por Esforços Repetitivos; organização de Neide Tiemi Murofuse [et al.];ilustração de Arivonil Policarpo Pereira. – Cascavel : Gráfica Universitária - Unioeste,2008.

44 p. ISBN: 978-85-7644-134-2 1. Doenças profissionais - Fatores de risco 2. Acidentes de trabalho 3. Higiene

do trabalho 4. Segurança do trabalho 5. Trabalhadores - Saúde e higiene I. Cursode Enfermagem II. Associação de Portadores de Lesões por Esforços RepetitivosIII. Murofuse, Neide Tiemi IV. Pereira, Arivonil Policarpo V. T.

CDD 20. ed. 613.62

Produzido pela Unioeste (Programa de Pós-Graduação em Educação – Mestradoem Educação; Curso de Enfermagem), Campus de Cascavel e Associação dePortadores de Lesões por Esforços Repetitivos – AP-LER

Organização:Neide Tiemi Murofuse (Unioeste / Enfermagem)Georgia Sobreira dos Santos Cêa (Unioeste / Mestrado em Educação)Manoela de Carvalho (Unioeste / Enfermagem)Laerson Vidal Matias (AP-LER)Rejane Rodrigues da Silva (Unioeste / Técnica-Administrativa)Danieli Cristina Scalco (PIBIC/CNPq/Unioeste)Luciana Aparecida Soares (PIBIC/CNPq/Unioeste)Kelly Ribeiro (Unioeste / Acadêmica de Enfermagem)Ilustração: Arivonil Policarpo PereiraApoio e financiamento: Programa de Apoio à Extensão Universitária

PROEXT 2007 – MEC/SESu/DEPEMDiagramação: Antonio da Silva JuniorTiragem: 20 mil exemplaresJulho / 2008

U58c

Ficha Catalográfica elaborada por: Marilene de Fátima Donadel CRB 9/924

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Índice

Apresentação ................................................................................. 05

Para quem é esta cartilha? ............................................................ 07

O que é saúde do trabalhador? ..................................................... 07

O trabalho e a saúde do trabalhador ............................................. 09

Características da organização do trabalho em frigoríficos ......... 12

Efeitos negativos do trabalho em frigoríficos sobre a saúdedo trabalhador ................................................................................ 21

Acidente de trabalho ................................................................. 24Tipos de acidente de trabalho ................................................. 25As Lesões por Esforços Repetitivos - LER ............................... 27Como reagir nos casos de LER? ............................................. 28O que se passa com um trabalhador que ficadoente por causa do trabalho? ................................................ 31Assédio moral ........................................................................... 32

Os direitos dos trabalhadores à saúde no trabalho ...................... 35

Palavras finais ................................................................................ 39

Referências bibliográficas ............................................................. 41

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Apresentação

A idéia desta cartilha nasceu de um encontro de gruposdiferentes: de pesquisadores da Universidade Estadual do Oeste doParaná (Unioeste) que estudam processos de trabalho, educação esaúde e de militantes de movimentos sociais que lidam diariamentecom trabalhadores que ficam doentes por causa de processos detrabalho organizados em função da lucratividade, e não da dignidadedas pessoas que produzem e dedicam horas, dias, anos de sua vida aotrabalho.

Esse encontro foi possível por causa do projeto de extensão“Trabalho, educação e saúde: formação permanente de profissionaise usuários da saúde pública”, coordenado pelo Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Educação da Unioeste e que envolveuprofessores e alunos do Mestrado em Educação, do curso deEnfermagem, e membros da Associação de Portadores de Lesões porEsforços Repetitivos (AP-LER de Cascavel). O desenvolvimento desteprojeto, incluindo a publicação desta cartilha, só foi possível graças asua aprovação pelo Programa de Apoio à Extensão Universitária doMinistério da Educação (MEC), em 2007.

Um dos objetivos do Projeto foi contribuir com a qualificaçãodos usuários da saúde, especialmente aqueles que ficam doentes porcausa das condições de trabalho. Assim, esta cartilha espera contribuircom os trabalhadores e com a Rede Nacional de Atenção Integral àSaúde do Trabalhador (RENAST), integrada ao Sistema Único deSaúde.

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Para quem é esta cartilha?

Esta cartilha é voltada para os trabalhadores, em especialaqueles que atuam em frigoríficos.

No oeste do Paraná, crescem rapidamente os casos detrabalhadores de frigoríficos que ficam doentes por causa do processode trabalho que envolve a criação, o abate e o processamento deanimais.

Pode-se dizer que os animais recebem mais cuidado e atençãonos frigoríficos do que os próprios trabalhadores. Os animais abatidossão mais bem tratados do que os homens vivos que produzem alimentospara milhões de pessoas.

Em muitos ambientes nosfrigoríficos a temperatura é muitofria. Mas ninguém precisa “entrarnuma fria” para toda vida, ficandodoente por causa do processo detrabalho nesse setor da economia.Por isso, espera-se que esta cartilhapossa alertar os trabalhadores defrigoríficos sobre os riscos eameaças à sua saúde e sobre seusdireitos de trabalhador.

Boa leitura!

O que é saúde do trabalhador?

Saúde do Trabalhador é um campo do conhecimento queestuda as relações entre o trabalho e o processo de saúde/doença.

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Trabalhador é toda pessoa que exerce uma atividade detrabalho, estando empregado numa empresa ou trabalhando por contaprópria para manter seu sustento.

A maior preocupação daqueles que estudam a Saúde doTrabalhador é contribuir para que o trabalho deixe de ser um espaçode sofrimento dos trabalhadores. Para isso, é preciso ter muita atençãocom as condições de trabalho que podem adoecer os trabalhadores ecom as melhores formas de prevenir doenças.

Mas quando não há prevenção e o trabalhador começa a ficardoente, por causa das condições de seu trabalho, aqueles que sepreocupam com a Saúde do Trabalhador visam orientar ostrabalhadores sobre como buscar e garantir os seus direitos e continuarsobrevivendo, sem prejuízo salarial.

Os estudiosos sobre Saúde do Trabalhador e os militantes queparticiparam da elaboração desta Cartilha também entendem que épreciso mudar as condições de trabalho para que o trabalhador tenhasua saúde preservada. E os principais agentes dessas mudançasdevem ser os próprios trabalhadores, pois, antes de serem vítimas doprocesso de trabalho, os trabalhadores são sujeitos que podem e deveminterferir na realidade. Mas é preciso que eles saibam como fazer isso.Afinal, ninguém precisa ficar doente por causa do trabalho, mas quemficar doente não pode perder o direito de continuar vivendo.

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O trabalho e a saúde do trabalhador

Na sociedade em que vivemos, alguns poucos conseguem vivermuito bem, especialmente quando ganham muito dinheiro com a riquezaproduzida por outros. É o caso da grande maioria dos empregadores.Os trabalhadores contratados produzem valores muito maiores do queas quantias que recebem como salário. Boa parte dessa diferença vaiconstituir a riqueza dos proprietários das empresas, indústrias e outrosestabelecimentos empresariais.

Para que os empregadores possam acumular cada vez mais dariqueza produzida pelos trabalhadores, muitas mudanças são feitas noprocesso de trabalho: novas formas de organização, aumento da jornada,aceleração do ritmo da produção, introdução de máquinas maismodernas, etc.

Todas essas alterações têm por objetivo aumentar aprodutividade e diminuir os custos de produção. Assim, mais riqueza éproduzida, e nem sempre os trabalhadores são beneficiados com isso.

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Os salários não aumentam na mesma medida que os lucrosdas empresas e, em muitos casos, as mudanças no processo detrabalho acabam trazendo danos à saúde dos trabalhadores.

Há muito tempo trabalhadores ficam doentes por causa da formacomo o trabalho é organizado.

Quando começa a industrialização, lá por volta do século XVIII,os casos de trabalhadores doentes passaram a aumentar.

Muitos trabalhadores morreram, ficaram mutilados ou incapazespara o resto da vida por causa de acidentes que sofreram no exercíciodo trabalho.

Por exemplo: nos séculos XVIII e XIX, muitos trabalhadoresperderam dedos, mãos ou braços, ficaram doentes e até morreram porcausa das ferramentas, máquinas e do tipo de serviço que realizavam.

A partir do século XX, principalmente com a informatização, aautomação e o aumento do ritmo e da intensidade do trabalho, ostrabalhadores passaram a ter doenças mais difíceis de seremrelacionadas com o trabalho. Começam a aparecer “doençasinvisíveis”, em que o “machucado” não aparece, mas o trabalhador ficadoente do mesmo jeito. Antes, a violência que o processo de trabalhoindustrial causava era mais explícita, mais visível, e atualmente, essaviolência é oculta, menos visível (RIBEIRO, 1999).

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No Brasil, a partir desse período, muitos trabalhadores passarama ser vitimados por doenças e por constrangimentos no local de trabalho.

O Ministério da Saúde doBrasil (BRASIL, 2000, p. 6-7) informaque o grande número e a gravidadedas doenças resultantes doprocesso de trabalho fazem comque as Lesões por EsforçosRepetitivos (LER) sejam tratadascomo uma epidemia. No Brasil, asLER “respondem por 70% dasdoenças relacionadas ao trabalho”.Os quatro setores em que maisocorrem doenças, segundo oMinistério da Saúde, são: frigoríficos,supermercados, indústria decalçados e telemarketing (OGLOBO1 , apud Unb Clipping, 2007).

Um desses setores – o frigorífico – é destaque no estado doParaná, que aparece como o maior produtor de carnes do Brasil. Osudoeste e o oeste do Paraná, junto com o oeste de Santa Catarina, porexemplo, formam juntos o maior pólo de produção e abate de aves domundo (DONDA Jr., 2002, p. 61-62).

Em 2006, o Paraná foirecordista nas exportações eprodução de frango de corte noBrasil: foram vendidas 751.248toneladas de carne de frango sópara países estrangeiros(SINDIAVIPAR, 2007). Em 2007 osucesso do setor frigorífico serepetiu (IBGE, 2007).

1 Jornal O Globo, edição de 07 abr. 2005.

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No oeste do Paraná, que tem 50 municípios, em 12 deles hácooperativas, frigoríficos e abatedouros de suínos, bovinos e aves,totalizando 35 empresas. Entre estas, o destaque é para a indústriaprocessadora de carne de aves, organizada na forma de frigoríficos,com oito unidades de processamento. Segundo o IPARDES (2003, p.63-64), “o segmento de abate de aves é o maior empregador da região,com 13,84% da mão-de-obra industrial”. Essa importância nodesenvolvimento regional demonstra o grande potencial das indústriasfrigoríficas para a geração de emprego e renda (DONDA Jr., 2002, p.54).

Mas toda essa importância econômica do setor frigorífico naregião oeste do Paraná tem um custo humano muito alto: milhares detrabalhadores estão ficando doentes, perdendo sua saúde e adquirindolesões que afetam toda a sua vida, dentro e fora do ambiente de trabalho.

Por que?

Características da organizaçãodo trabalho em frigoríficos

Há muitos tipos de frigoríficose o principal objetivo do trabalho alirealizado é receber o animal vivo,inteiro, e processar cada uma dassuas partes até ficarem prontas paraa comercialização e o consumo. Osfrigoríficos geralmente abatem eprocessam carnes de aves, suínos ebovinos.

As grandes empresasfrigoríficas costumam funcionar 24horas por dia, cinco dias porsemana, em diferentes turnos. Em

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geral, o processo de trabalho em frigoríficos se divide em quatro grandesetapas:

1) Preparação do animal para o processamento: os animais,tratados em granjas e incubatórios, são recebidos vivos edepois são abatidos e encaminhados para as outrasetapas da produção.

2) Evisceração dos animais: são retiradas as vísceras dosanimais e eles são preparados para serem cortados emdiferentes partes. Cada parte dos animais abatidos échamada de peça.

3) Espostejamento e embalagem: os animais são cortadosem peças, em vários setores. As peças dos animais saemdo espostejamento já embaladas e pesadas e depoissão encaminhadas para a estocagem.

4) Estocagem e expedição: as peças dos animais sãoestocadas e despachadas para as empresas quecomercializam alimentos industrializados.

Cada uma dessas etapas é dividida em vários setores,envolvendo milhares de trabalhadores na produção. Dentro dosfrigoríficos há outros setores, como a lavanderia e a higienização. Enão é só isso! Muitos trabalhadores atuam em locais fora dos frigoríficos,como incubatórios e granjas, onde os animais são criados e tratadosaté a hora de estarem prontos para o abate.

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O ritmo, a velocidade e a quantidade de coisas para seremfeitas podem levar ao acúmulo de trabalho: aí acontece o “vareio”. Paradar conta das peças paradas na esteira, o trabalhador faz tudo bemmais rápido ou diminui o tempo da pausa e o intervalo das refeições.

Em grandes frigoríficos de aves são abatidos cerca de 8 milfrangos por hora, envolvendo 18 etapasque duram cerca de 50 minutos,tempo total em que as aves sãoabatidas e processadas. Em um dosmaiores frigoríficos de bovinos doBrasil são abatidas 3 mil cabeças debois por dia. Outro, de suínos, abate 7mil porcos por dia2 . É muito trabalhomesmo!

Em estudo realizado por Finkler(2007), vários depoimentos de trabalhadores de empresas frigoríficasinformam sobre algumas características da organização do trabalhonos frigoríficos e que atingem a saúde dos trabalhadores.

Trabalho intenso e rápido. Nosetor de evisceração, por exemplo,cada trabalhador tem que dar contade retirar as vísceras de 10 frangospor minuto. Num incubatório, otrabalhador tem que encher quase32 carrinhos com 30 bandejascheias de ovos (mais de 2 mil, emcada carrinho!), todos os dias.

Trabalho estático. Na maioria dos setores, o trabalhador permaneceem pé durante todo o processo e por muito tempo, movimentandoapenas partes do corpo (braço direito ou esquerdo, coluna, porexemplo).

2 Jornal Valor Econômico, set. / 2007.

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Exigência de grande esforçofísico. Em muitos setores, otrabalhador tem que manusear,segurar, cortar, levantar, puxar, jogare carregar animais ou parte deles.Algumas peças são muito pesadas,e quando colocadas em caixas paraserem transportadas, o trabalhadortem que “agüentar o tranco”!

Necessidade deatenção. Para nãocomprometer aqualidade da peça,o trabalhador temque estar o tempotodo atento. Naevisceração deanimais, é precisomuito cuidado para não perder peças com fraturas de ossos oucontaminar com bílis ou restos de fezes. O pessoal que trabalha comfacas deve ter mais atenção ainda. Se bobear...

Repetitividade de movimentos. Em muitos setores as atividadesenvolvem movimentos que devem se repetir intensamente como, porexemplo, abaixar e levantar o tempo todo, separar, cortar e carimbarpeças, erguer e abaixar os braços, vacinar animais, catar ovos, montarcaixas, etc... No refile de suínos, o trabalhador deve dar conta de tratarcada peça em um minuto e meio! E vem mais na esteira!

Sobrecarga de trabalho. Nem sempre o trabalhador consegueacompanhar o ritmo das esteiras. E aí, vem o vareio e ele tem que

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“dançar” rapidinho! Caso falte algum trabalhador, os demais devemacelerar o ritmo e cumprir as metas de produção.

Velocidade de trabalho controladapor esteiras. O ritmo de trabalhodepende da velocidade das esteirasque levam as peças até ostrabalhadores. Isso exige rapidez, forçae agilidade para não acumular peçase não atrasar a produção. A esteirasempre corre bastante, menos quandotem visitas e inspeção nas empresas.Aí os frangos desfilam na esteira mais devagarinho...

Ritmo de trabalho ditado pela máquina. Todo o maquinário funcionanum ritmo que é ditado pelas metas de produção. Na caixaria, porexemplo, um trabalhador abastece as máquinas com folhas de papelãoque pesam quase 40 quilos e tem que fazer umas 15 mil caixas por diaou 14 caixas de peças por minuto.

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Extensão da jornada de trabalho. Em muitas ocasiões, o ritmo e aintensidade da produção não dão tempo nem para as pausas: idas aobanheiro e tempo livre de almoço, nem pensar! Quando tem vareio,então, nem se fala!

Falta de tempo para a satisfação das necessidades fisiológicas.Muitas vezes, por causa do ritmo da produção, o trabalhador nãoconsegue nem utilizar as pausas destinadas para idas ao banheiro:uma pausa de 5 minutos a cada quatro horas.

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Trabalho pesado. Muitasatividades exigem força para seremrealizadas. Na lavanderia, porexemplo, o trabalhador devecarregar montes de quase 100 Kgde roupas sujas e colocar dentro damáquina. Na embalagem, depoisde classificar e passar plástico nasbistecas, o trabalhador deve colocá-las em caixas que são empurradaspara a esteira. Cada caixa pesaquase 15 quilos e a meta é de 45toneladas por dia! Na higienização,o trabalhador tem que segurarmangueira, rodo e balde de até 20litros. Um peito de frango parecebem leve... Mas, vai colocar peito defrango o dia inteiro na balança...

Exposição a variação de temperaturas. Num frigorífico, a temperaturado ambiente de trabalho pode variar bastante. Há lugares muito frios,como, também, há outros lugares muito quentes. Quem trabalha nacâmara fria, quando sai para o almoço sente aquele “baque”! Temambiente de trabalho em que otermômetro marca 7º; mas o termômetrofica no teto e a peça congelada que estána mão do trabalhador tem menos de 0º!Nos galpões, por causa do teto de zinco,a temperatura pode chegar a 45 º noverão, porém, no inverno o frio é intenso.

Exposição a ambientes insalubres.Além da variação da temperatura, temoutras coisas que incomodam bastante

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o trabalhador: mexer com cloro e amônia; ficar o dia inteiro com abarriga encostada na calha gelada; permanecer em locais úmidos;sentir cheiros desagradáveis; respirar pó que vem do contato com osanimais nas granjas e incubatórios; ficar em posições incômodas... Étanta coisa...

Peso e desconforto dos equipamentos de proteção individual (EPIs).Embora existam equipamentos de proteção, eles geralmente sãopesados, incômodos e, às vezes, não cabem direito nos corpos dostrabalhadores, dificultando a movimentação e aumentando ainda maisa sobrecarga do trabalho. Tem trabalhador que usa luva de lã, luva deplástico, luva de aço e braçadeira. Tudo isso junto dá quase 3 kg. Semfalar no peso da peça que tem que ser segurada. As botas e luvas sóficam no tamanho certinho do trabalhador em dias de inspeção.Engraçado isso...

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Instrumentos de trabalho. Em sua maioria, os instrumentos de trabalhosão muito perigosos. Tem grampeadora, vacinadora, carimbos,máquina de fita durex, chaira para afiar as facas... Estas, então, são asmais perigosas. Tem faca tão afiada que parece gilete! O que tem degente que se corta...

Supervisão e controle do ritmo de produção. Nos frigoríficos, hámuita pressão e cobrança para aumentar a produção. O trabalho ésempre fiscalizado e quem fiscaliza exige rapidez de quem está nalinha de produção para que as metas sejam atendidas e superadas.Chega-se a utilizar a cronometragem do tempo, que também serve deestímulo para a competitividade entre funcionários, por meio dacomparação entre o tempo gasto por cada trabalhador nas atividades.

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Trabalho desgastante. Abate de milhares de animais por dia; trabalhointenso, rápido, repetitivo, estático, pesado, desconfortável, perigoso,que exige esforço e atenção; elevado ritmo de trabalho; pressão porprodutividade... Ufa! Pelo tipo de trabalho desgastante que se realizanos frigoríficos, é comum a ocorrência de faltas ao trabalho, o chamadoabsenteísmo. As faltas se devem, principalmente, a problemas de saúdee esgotamento físico e mental.

Se o seu trabalho tem essas características e você está ficandodoente por causa delas, fique atento e continue lendo esta cartilha comatenção!!!!!!!

Efeitos negativos do trabalho em frigoríficossobre a saúde do trabalhador

Em Mato Grosso, as denúncias sobre as condições de trabalhoeram tantas que um juiz mandou fechar um frigorífico porque, segundoele, o que ali se produzia era um “exército de trabalhadores acidentadose doentes”3 .

A situação está tão grave que, no Brasil, a Justiça tem obrigadoalguns grandes frigoríficos a criarem pausas para descanso e

3 Repórter Brasil, 2007.

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diminuírem a jornada de trabalho, sem redução dos salários, comoforma de prevenção de doenças. A melhor forma de cuidar da saúde dotrabalhador é mudar a organização e o processo de trabalho. Se issonão acontece, não adianta fazer ginástica laboral e freqüentar os centrosde fisioterapia.

No Rio Grande do Sul, foi realizada uma pesquisa integradasobre saúde do trabalhador avícola que estudou os tipos de dores dessestrabalhadores e as partes do corpo que mais estão sujeitas às doençasresultantes do trabalho. Veja:

Frente Costas

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No estudo de Finkler (2007), trabalhadores de frigoríficosrelataram sobre as atividades que realizam e lesões e doenças que osatingem. Entre as mais freqüentes estão as seguintes:

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Quando se comprova que essas doenças são resultados do tipode atividade realizada, elas são chamadas de doenças do trabalho.Para fins legais, os efeitos negativos do trabalho sobre a saúde dostrabalhadores são tratados como se fossem acidentes de trabalho.

ACIDENTE DE TRABALHO:

Acidente de trabalho é aquele que acontece quando você estáindo ou voltando do local de trabalho ou durante o tempo em que vocêrealiza seu serviço.

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Existem muitas formas de acidentes de trabalho: dores, doenças,cortes, amputações, explosões, alergias, queimaduras, intoxicação pelouso de produtos muito fortes...

É preciso ficar atento!!!!!!!Um acidente de trabalho pode causar lesão corporal, prejudicar

o funcionamento do corpo e da mente, ou mesmo causar a morte dotrabalhador. A perda ou diminuição da capacidade de trabalho podeser por um curto tempo (temporária) ou pelo resto da vida (permanente).

Qualquer trabalhador pode sofrer um acidente de trabalho:trabalhador com carteira assinada, sem carteira assinada, trabalhadorautônomo... Mas só o trabalhador que contribui com a PrevidênciaSocial pode continuar recebendo seu salário, em forma de auxíliodoença, caso tenha que ficar afastado do trabalho por causa do acidenteque sofreu.

TIPOS DE ACIDENTE DE TRABALHO:

- Acidente típico:

É quando acontece um acidente no momento em que você estátrabalhando. Se você se machucar ou se ferir, levar um tombo no localde trabalho, sofrer queimaduras, cortes ou mutilações, por exemplo,terá sofrido um acidente típico.

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- Acidente de trajeto:

É quando acontece um acidente no caminho de casa para otrabalho ou do trabalho para a casa. Por exemplo: se você for atropelado,cair de bicicleta, sofrer algum acidente com o veículo (pode ser umônibus, seu carro ou da empresa), terá sofrido um acidente de trajeto.

- Doença do trabalho:

A doença de trabalho é aquela adquirida ou desencadeada porcausa das condições especiais em que o trabalho é realizado e quetenha relação direta com ele. Se você sentir dores constantes por causado tipo de trabalho que executa (repetição de movimentos, carregarpeso, por exemplo) ou se apresentar sofrimento psíquico (estresse,depressão, síndrome do pânico, etc) terá uma doença do trabalho.

Nos frigoríficos, as Lesões por Esforços Repetitivos (LER) sãoos principais motivos de adoecimento dos trabalhadores.

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AS LESÕES POR ESFORÇOS REPETITIVOS:

As LER formam um conjunto de doenças que podem atingirmúsculos, tendões, vasos e nervos dos membros superiores (dedos,mãos, punhos, antebraços, braços), pescoço, coluna e membrosinferiores (quadril, pernas, joelhos, tornozelos, pés). Essas doençassão causadas pelas exigências das tarefas, dos ambientes e daorganização do trabalho, que acabam obrigando o trabalhador aexecutar movimentos repetitivos, continuados, rápidos e intensos,durante um longo período de tempo.

Alguns sintomas das LER são: dor, formigamento, sensação depeso, perda de força, fisgadas, choques, inchaços, calor localizado,etc. No início, os sintomas geralmente melhoram com o repouso. Como passar do tempo, os sintomas continuam por várias horas após otérmino da jornada de trabalho, e podem perturbar o sono e dificultar arealização de tarefas comuns (carregar objetos, abotoar roupas, pentearcabelos, descascar alimentos, escovar os dentes, etc.).

Assim que esses sintomas aparecem, é importante diagnosticarse o trabalhador tem ou não LER. Eliminar a causa das doenças é omais importante para o tratamento da LER. Assim, o trabalhador deveficar afastado do trabalho para tentar se recuperar e evitar que as lesõesse agravem.

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COMO REAGIR NOS CASOS DE LER?

1) Aos primeiros sintomas (dor, formigamento, sensação depeso, perda de força, fisgadas, choques, inchaços, calor localizado,etc.), você deve procurar imediatamente um médico. Um bom médicodeve perguntar o que você sente, quando e como os sintomascomeçaram, como você trabalha... Pergunte o que quiser ao médico etire todas as suas dúvidas. É dever de todo médico respondê-las, segundoo Código de Ética Médica. É comum que os médicos peçam muitosexames. Desconfie... Um bom médico examina muito bem o pacienteantes de pedir exames complementares. Peça esclarecimentos sobrea consulta e o resultado dos exames. É seu direito!

2) Pergunte ao médico sobre o diagnóstico. Se o médico disserque se trata de LER, volte à empresa e peça para que seja preenchidaa Comunicação de Acidente deTrabalho (CAT). Se a empresa senegar a fazer isso, procure omédico, o sindicato, a AP-LER oupreencha a CAT você mesmo! Ébom que a CAT seja preenchidapor pessoas que conhecem oproblema e lhe orientemcorretamente! Esse é o primeiropasso para a garantia dos seusdireitos.

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3) Se você precisar de tratamento, veja se ele é de boa qualidadee está dando resultado. O que importa é que você sinta que está sendotratado como pessoa. Você não é só uma mão, um braço, uma coluna.É um ser humano inteiro, que sente no corpo e na mente. O tratamentopode incluir medicações, fisioterapia, imobilização de membros... Presteatenção se você está se sentindo melhor com o tratamento. Nem sempreo diagnóstico é feito corretamente. Médicos de empresas e de convêniosdificilmente dão diagnóstico de LER: acabam recomendando um curtoafastamento do trabalho e não pedem ao trabalhador que procure aempresa para fazer a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT).

4) É muito importante que durante otratamento você se afaste de sua função oua realize de outra forma. Não adianta nadafazer o tratamento numa parte do dia etrabalhar do mesmo jeito na outra. Seráperda de tempo e você não vai melhorar;pode até piorar!

5) Tudo o que for anotado nasconsultas e todos os exames vão fazer partedo seu prontuário. Essas coisas ficam com omédico, mas pertencem a você e você podeter acesso a esses documentos. Se o médiconegar isso, estará ferindo o Código de ÉticaMédica.

6) Só seu médico e você podemconhecer o seu diagnóstico. Mas só você

pode dizer para outras pessoas o que está acontecendo com você,inclusive para o departamento pessoal de sua empresa. O médico nãopode fazer isso!

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7) Se você precisar ficar afastado do trabalho, no final dessetempo você deverá voltar ao INSS para passar pela perícia médica.Não tenha medo de dizer honestamente se ainda sente dores ou semelhorou. O mais importante é a sua saúde. Os médicos da empresa(que consultam ou fazem seus exames) não podem agir como peritosdo INSS. Isso é ilegal.

8) Se você precisar se afastar do trabalho por até 15 dias seguidos,o seu médico deve lhe dar um atestado. Sua empresa deve aceitaresse documento. Ele é a primeira prova de que você não está bem desaúde. No atestado deve estar escrito o número do código da doença.Sem esse código, que se chama CID (Classificação Internacional deDoenças), não tem como o INSS reconhecer sua doença como umacidente de trabalho.

9) Se você precisar ficar afastado do trabalho por mais de 15dias seguidos, o seu médico deve fazer um relatório e enviar para aperícia do INSS explicando o motivo de você precisar ficar afastado pormais tempo.

10) A partir do 16º dia seguido do seu afastamento, a perícia doINSS irá lhe autorizar a receber o auxílio-doença acidentário, caso sejacomprovada sua incapacidade para o trabalho.

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11) Você não pode ser demitido enquanto estiver afastado dotrabalho para tratamento. Se a perícia do INSS afastar você por acidenteou doença do trabalho, você terá estabilidade no emprego por um ano.E esse tempo só começa a contar depois que você tiver alta e voltar atrabalhar!

12) Se em algum momento você se sentir ameaçado, sempreque sua saúde correr riscos, sempre que tiver dúvidas ou problemaspara continuar saudável ou se tratar, peça esclarecimentos e ajuda aquem conhece seu problema. A AP-LER é um bom local! Lá, todo mundojá passou por isso; o pessoal sabe das dificuldades e está sempredisposto a ajudar outros trabalhadores.

O QUE SE PASSA NA VIDA DE UM TRABALHADOR QUE FICADOENTE POR CAUSA DO TRABALHO?

É muito difícil para um trabalhador ter que admitir que o seutrabalho está retirando sua saúde. Sofrer um acidente de trabalho ouficar doente por causa do trabalho é uma situação muito desgastante.As dificuldades são grandes. Aempresa não aceita, a famílianem sempre entende, os amigosduvidam das dores, a rotina davida muda...

Em muitas situações, ostrabalhadores que têm LER,quando começam a se tratar ouretornam do afastamento médico,passam por situações novas edesagradáveis no ambiente detrabalho que pioram seu estadode saúde e afetam as condiçõesemocionais do trabalhador. Às

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vezes, o trabalhador que tem LER passa por situações humilhantes econstrangedoras durante a jornada de trabalho.

Os amigos passam a olhar para o trabalhador de uma maneiradiferente, os chefes querem testar sua capacidade; os olhares, os risos,os comentários e as conversas nem sempre são de boas-vindas. Aocontrário, o trabalhador é recebido com mais frieza do que um animalnum frigorífico!

Quando as situações humilhantes e constrangedoras passama ocorrer repetidamente, por inúmeras vezes, é porque está ocorrendoo que se chama de “assédio moral”.

ASSÉDIO MORAL4 :

A humilhação resultante do assédio moral faz com que otrabalhador se sinta ofendido, menosprezado, rebaixado, inferiorizado,constrangido pelo outro. O assédio moral faz o trabalhador sentir-seum ninguém, sem valor, inútil, ficando magoado, revoltado, perturbado,sentindo-se traído,envergonhado, indignado ecom raiva. A humilhaçãocausa dor e sofrimento.

As situaçõeshumilhantes podem incluir:comportamentos; palavras;atos; gestos, e mesmo coisasescritas que afetememocionalmente otrabalhador.

Essas experiênciastrazem prejuízos práticos(perder o emprego, perder

4 Sobre assédio moral foram consultados Home Assédio Moral e Cartilha ANDES.

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amigos, por exemplo) e emocionais para o trabalhador, fazendo comque ele se sinta isolado do grupo, sem explicações, e passe a se sentirindesejado pelos colegas, inferiorizado, ridicularizado, além de fazê-loperder sua auto-estima. Geralmente as situações de humilhação partemde pessoas que exercem funções de vigilância, supervisão e chefia.Mas também acontece de colegas de trabalho, que fazem as mesmasfunções, imitarem as ações e atos do agressor no ambiente de trabalho.Por medo ou vergonha de também serem humilhados, esses colegasrompem os laços de amizade com a vítima e viram também agressores.

Preste atenção a algumas situações que podem significarassédio moral, caso elas aconteçammuitas vezes:

• Receber instruçõesconfusas que podematrapalhar o desen-volvimento do trabalho.

• Ser encaminhado paranovas tarefas semreceber instruções outreinamento.

• Ser obrigado a realizartarefas que podemprejudicar ainda mais asaúde do trabalhador.

• Ser acusado de erros no trabalho que não foramcometidos.

• Ficar na “geladeira”, sem receber nenhuma tarefa pararealizar, como se o trabalhador fosse um inútil.

• Receber ordens impossíveis de serem cumpridas.• Ter os horários e os turnos de trabalho mudados, sem ser

avisado com antecedência.

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• Ser ignorado pelas outraspessoas, como se otrabalhador não estivesse nolocal de trabalho.

• Receber críticas na frente detodo mundo e ser motivo debrincadeiras de mau gosto.

• Ser assunto de boatosmaldosos e de calúnias.

• Ser agredido e humilhadopor alguém apenas quandoo trabalhador e a pessoaagressora estão a sós.

• Receber advertências e punições por causa de atestadosmédicos e reclamação de direitos.

• Ficar proibido ou ser vigiado enquanto está no banheiro.• Receber ameaças de violência.• Ser vigiado por outros colegas que não exercem função

de supervisão na empresa.• Sentir-se forçado a pedir demissão ou ser transferido de

setor só para ficar isolado.Quando o assédio moral acontece, o trabalhador pode passar a

viver situações como depressão, eestressee, síndrome do pânico, doresno estômago, tremores, angústia, insônia, etc. Além de ter que convivercom a dor física, o trabalhador ainda sofre com o clima afetivo negativodo ambiente de trabalho.

Como o trabalhador deve reagir no caso de assédio moral?• Resista: anote numa folha as humilhações, com detalhes,

e procure a ajuda dos colegas.• Evite conversar com a pessoa que o humilhou e exija, por

escrito, explicações das atitudes dele. Fique com cópiada carta enviada ao setor de recursos humanos daempresa e da eventual resposta do assediador.

• Busque apoio na família, amigos e colegas. O afeto e a

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solidariedade ajudam a recuperar a auto-estima e a dignidade.

O constrangimento ilegalestá no artigo 146 do Código PenalBrasileiro com pena de detençãode 3 meses a 1 ano ou multa.Assédio moral é crime! Por isso...

Denuncie o caso aosindicato ou à Associação dosPortadores de LER (AP-LER). Adenúncia é a melhor forma de seproteger do assédio moral.

Nem todos os trabalhadoresapresentam doenças em função dotrabalho que realizam nos frigoríficos ou passam por situaçõeshumilhantes. É impossível saber quem pode ou não ficar doente porcausa do processo de trabalho. E é difícil identificar quando o assédiomoral está ocorrendo. Mas a incidência de trabalhadores doentes (nocorpo e na mente) tem sido cada vez maior. É preciso saber que direitosesses trabalhadores podem ter.

Os direitos dos trabalhadoresà saúde no trabalho

Com o aumento detrabalhadores doentes por causa dotipo e do ambiente de trabalho,muitas mudanças nas leis ocorrem,principalmente quando ostrabalhadores se organizam e lutamcoletivamente pelos seus direitos.Conheça alguns dos direitos dos

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trabalhadores que têm LER ou sofrem algum outro tipo de acidente detrabalho:

Fazer a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT):Todo acidente de trabalho é registrado pela primeira vez numa

CAT. Se isso não for feito, fica difícil comprovar que as condições detrabalho estão fazendo o trabalhador ficar doente. Se a empresa senegar a preencher a CAT, lembre-se: procure o médico, o sindicato, aAP-LER ou preencha a CAT vocêmesmo! Depois disso, a CAT deveser entregue no INSS.

Estabilidade no emprego:Se o trabalhador sofrer um

acidente de trabalho, ele temgarantia de continuar no empregopor mais um ano (12 meses). Essetempo passa a ser contado quandoterminar sua licença médica (maiordo que 15 dias) ou parar de recebero auxílio-doença acidentário.

Auxílio-doença acidentário:Se o trabalhador tiver que ficar afastado do

trabalho para tratamento de doença por maisde 15 dias, ele tem direito a receber seu saláriopelo INSS. A empresa paga os 15 primeiros diasda licença médica; o INSS paga o restante (92%do salário de contribuição do empregado). Otrabalhador afastado para tratamento médicopor causa de acidente ou doença do trabalhonão pode receber menos do que o saláriomínimo.

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Reabilitação profissional:Se após o tratamento o trabalhador não puder mais realizar as

mesmas atividades de antes do acidente ou doença do trabalho, eletem direito à reabilitação profissional para aprender a realizar outrafunção, na mesma empresa, que não prejudique sua saúde. Oatendimento ao trabalhador é feito nos Centros de ReabilitaçãoProfissional – CRP’s do INSS.

Auxílio-acidente:Quando o trabalhador não puder mais realizar as mesmas tarefas

que desempenhava antes do seu adoecimento e, por causa disso,precisar mudar de função, ele tem direito ao auxílio-acidente. O auxílio-acidente é pago a partir da alta médica, que é dada quando termina oprocesso de reabilitação profissional. Todo mês o trabalhador temdireito a receber 50% do salário de contribuição (o INSS é que faz ocálculo), até a sua aposentadoria.

Aposentadoria por invalidez acidentária:Às vezes, o acidente ou doença do trabalho é tão sério que o

trabalhador fica incapaz para o trabalho pelo resto da vida. Quandoisso acontece, ele tem direito a receber 100% do salário de contribuição.

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Direito à indenização5 :Todo trabalhador que é vítima de acidente ou doença do trabalho

pode buscar seus direitos na Justiça e ser indenizado. A indenização éum tipo de pagamento em dinheiro que visa compensar, em algumamedida, os prejuízos materiais e morais do trabalhador que sofrer umacidente ou ficar doente por causa do trabalho. Em várias situações otrabalhador pode receber uma indenização, desde que sejacomprovada a culpa do empregador:

- Se o trabalhador morrer num acidente de trabalho, sua famíliaterá direito a receber um valor correspondente ao salário que elereceberia em vida.

- Se o trabalhador ficar inválido e tiver que se aposentar, terádireito a receber um valor correspondente ao seu salário pelo resto davida.

- No caso de invalidez parcial, o valor da indenização dotrabalhador será proporcional à sua limitação para o trabalho.

5 Panazzolo, 1998.

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Palavras finais

O Ministério da Saúde está cada vez mais preocupadocom os casos de trabalhadores que estão ficando doentes porcausa da forma como os processos e os ambientes de trabalhoestão organizados.

A maioria dos trabalhadores utiliza o serviço público desaúde, e não é justo que os gastos com a saúde públicaaumentem pelo fato de que vários trabalhadores estejam ficandodoentes por causa de situações que poderiam ser evitadas. Maso prejuízo maior é causado na vida do trabalhador e da sua família.É preciso identificar os setores e as empresas que têm produzidotrabalhadores doentes e mudar as condições de trabalho. Masisso só pode acontecer se os próprios trabalhadoresconhecerem o que lhes causa mal no ambiente de trabalho ecomo exigir tratamento adequado e garantia de seus direitos.Assim, em 2002 foi criada a Rede Nacional de Atenção Integral àSaúde do Trabalhador (RENAST), integrada ao Sistema Único deSaúde (SUS). O sucesso da RENAST depende muito do “graude informação dos cidadãos responsáveis por exercer o controlesocial e que têm o compromisso de zelar para que essas açõessejam executadas na direção de preservar o direito dosbrasileiros e brasileiras garantidos na Constituição Cidadã de 1988”(BRASIL, 2007, p. 7).

Esta cartilha espera contribuir com os trabalhadores,especialmente aqueles que trabalham em empresas do setorfrigorífico. Estes trabalhadores têm sido vítimas de acidentes edoenças do trabalho e precisam se dar conta dos riscos à suasaúde e de saber como agir nos casos em que ela estiverameaçada.

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Nenhum direito é conquistado sem luta e sem organização.É por isso que a Unioeste e a AP-LER são parceiras na elaboraçãoe divulgação deste material. Espera-se que a cartilha possa ajudarvocê:

FIQUE DE OLHO PARA NÃO ENTRAR NUMA FRIA!E NÃO ESQUEÇA: É PRECISO MUITA LUTA E ORGANIZAÇÃO

PARA TER UMA VIDA SADIA NO TRABALHO!

Se precisar, busque orientações na AP-LER / Cascavel:Rua Souza Naves, 3983; sala 407 –Edificio Lince – 4º andar - Centro – Cascavel – PRTelefone: (45)3035-2083

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Referências

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BRASIL. SUS. RENAST. Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde doTrabalhador. Manual de Gestão e Gerenciamento. São Paulo, 2006. Disponívelem: < http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ManualRenast06.pdf>. Acesso em:30 abr. 2007.

BARRETO, Margarida; GERVAISEAU, Maria Benigna Arraes de Alencar. AssédioMoral no trabalho. Disponível em: <http://www.assediomoral.org/site/assedio/AMconceito.php>. Acesso em 13 abr. 2008.

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DONDA JÚNIOR, Alberto. Fatores influentes no processo de escolha dalocalização agroindustrial no Paraná: estudo de caso de uma agroindústria deaves. 2002. 141 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção). Programade Pós-Graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de SantaCatarina, Florianópolis, 2002.

FINKLER, Anna Luisa. A relação entre os problemas de saúde dos trabalhadores eo processo de trabalho em frigoríficos. 2007. Trabalho de Conclusão de Curso.(Graduação em Enfermagem) - Universidade Estadual do Oeste do Paraná.Orientador: Neide Tiemi Murofuse.

FTIA. FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES DAS INDÚSTRIAS DAALIMENTAÇÃO; UFPel. UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS; UFRGS.UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL. Pesquisa integradasaúde do trabalhador avícola: saúde do trabalhador, condição de dignidade ede direitos. 2006. Slides.

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Produzido pela Unioeste (Programa de Pós-Graduação em Educação – Mestradoem Educação; Curso de Enfermagem), Campus de Cascavel e Associação dePortadores de Lesões por Esforços Repetitivos – AP-LER

Organização:Neide Tiemi Murofuse (Unioeste / Enfermagem)Georgia Sobreira dos Santos Cêa (Unioeste / Mestrado em Educação)Manoela de Carvalho (Unioeste / Enfermagem)Laerson Vidal Matias (AP-LER)Rejane Rodrigues da Silva (Unioeste / Técnica-Administrativa)Danieli Cristina Scalco (PIBIC/CNPq/Unioeste)Luciana Aparecida Soares (PIBIC/CNPq/Unioeste)Kelly Ribeiro (Unioeste / Acadêmica de Enfermagem)Ilustração: Arivonil Policarpo PereiraApoio e financiamento:

Programa de Apoio à Extensão UniversitáriaPROEXT 2007 – MEC/SESu/DEPEM

Diagramação: Antonio da Silva JuniorTiragem: 20 mil exemplaresJulho / 2008ISBN 978-85-7644-134-2