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Conselho EditorialAnabela Lemos, Daniel Ribeiro, Janice Lemos, Ruben Manna, Samuel Mondlane e Vanessa Cabanelas

Boletim informativo com a autorização Nr. 17/GABINFO-DEC/2007

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Caros Leitores,

Este é o nosso último boletim de 2015.O escritório da Justiça Ambiental estará fechado para férias colectivas durante 12 dias.Aproveitamos esta oportunidade para desejar Festas Felizes a todos os que nos acompanharam ao longo deste ano, e para agradecer-vos pelo apoio, pelas críticas construtivas e pelos elogios também.

Retomaremos o Boletim em Fevereiro de 2016, até lá poderão ter noticias nossas através do nosso facebook e do nosso website:

www.ja.org.mz

A Luta Continua

Justiça Ambiental

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Um estudo recente da Friends of the Earth International conceptualizou o que seria necessário para alcançar uma revolução energética que não só resolvesse o problema das emissões que estão a causar as mudanças climáticas, mas também a pobreza energética dos países em desenvolvimento. Foi surpreendente perceber quão simples a solução é e quão financeiramente viável poderia ser. O estudo menciona que a riqueza de 0.000015% dos mais ricos do planeta “poderia suprir África, a América Latina e quase toda a Ásia com energia 100% renovável em 2030.” Afirma também que “a riqueza das 53 pessoas mais ricas do mundo poderia dar a toda a África energia 100% renovável [igualmente] em 2030”.Interessante!Bem, a metodologia do estudo e os seus valores são discutíveis, até mesmo os números em torno do custo das soluções são discutíveis, mas tendo em conta que estamos a falar de 0.000015% da população, podemos aumentar, mudar e multiplicar valores, até mesmo deslocar um ponto decimal para cima ou para baixo que, ainda assim, teríamos a mesma dinâmica em que uma muito, muito pequena parte da humanidade detém riqueza suficiente para corrigir uma das principais ameaças que a sociedade de hoje enfrenta: as mudanças climáticas.No entanto, o que mais me surpreende é a reacção que esta estatística provoca nas pessoas. Na maioria das vezes dizem “WOW”, mas “não podemos

levar o seu dinheiro assim sem mais nem menos”, ou “mas é injusto usar o dinheiro arduamente ganho por outras pessoas”, etc, etc. O interessante é que antes sequer de se debater a opção, já a maioria tirou essa conclusão precipitada e descartou a possibilidade. Surpreendentemente, essas mesmas pessoas parecem bem mais comedidas a tirar conclusões quando falamos das implicações que uma acção tardia para combater as alterações climáticas poderão ter na vida e subsistência de tantos.Quanto mais eu falo com as pessoas que estão dentro do mainstream do movimento climático, especialmente governos e sector privado, mais eu noto a sua desconexão com as implicações dos debates e negociações em que estão envolvidos. Quando “empurram” a margem de aumento médio de temperatura de 1,5ºC para 2ºC, essas pessoas julgam ter encontrado um bom compromisso entre os lucros do sector privado e as exigências da sociedade civil. Quando “empurram” a concentração de CO2 de 350 ppm para 400 ppm, parece-lhes apenas uma pequena mudança que dará ao sistema financeiro alguma margem de manobra para se adaptar e tornar esse alvo acessível. Quando mudam a data para começar a agir, de 2011 para 2020, acreditam estar a dar tempo para que o sector privado e os governos se preparem para fazer as mudanças necessárias, sem grandes choques para o seu status quo. Todas estas

A Riqueza de poucos ouo Bem-estar de muitos?Caso não haja uma mudança de sistema, em breve teremos de tomar esta importante decisão

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alterações e cedências face ao que a ciência mostra ser necessário e ao que os povos estão a exigir, parece carecer do fundamental.O fundamental de que falamos é a vida das pessoas. Na verdade, quando aumentamos a margem limite de temperatura de 1,5°C para 2°C, estamos a aceitar que milhões de pessoas mais morram devido às mudanças climáticas. Quando adiamos as acções de 2011 para 2020, estamos a aceitar que ainda mais milhões de pessoas morram. Pode parecer dramático, mas é a verdade. Eu nunca ouvi um negociador do governo chamar a atenção ao sector privado porque está a atrasar ou a enfraquecer as metas dizendo: “Mas isso não é justo, matará milhões de pessoas mais”. A economia dos seus argumentos encaixa-se tão bem no sistema de valores de hoje que isso faz sentido, e as implicações humanas são facilmente escondidas por trás desses convincentes números e notas de dólar. Dessas mudanças e atrasos nós não tiramos as conclusões óbvias... O que estamos realmente a negociar é quantas mais pessoas, nós como sociedade, consideramos aceitável deixar morrer devido às alterações climáticas, e nós nem sequer pensamos nisso. De mencionar apenas que a riqueza dos 1% mais ricos poderia dar-nos a revolução energética de que tanto precisamos, talvez diminuindo os biliões que entram nas suas contas, é inaceitável. É lucros de um lado e vidas do outro, e toda a gente parece pensar que a balança está equilibrada, que o nível de importância é o mesmo. É triste que a humanidade tenha chegado a este ponto, onde as coisas sem sinal de dólar não têm valor algum. Em que

precisamos de vendê-las para salvá-las e em que a riqueza de alguém parece ser mais sagrada que o bem-estar de milhões de pessoas.Isto levou-me a investigar a divisão da riqueza, onde se encontra e qual a sua história. Olhando para as listas de pessoas mais ricas como a da Forbes ou a da Bloomberg, se analisarmos o padrão, é interessante constatar como este espelha a nossa dinâmica global de poder e a nossa história e privilégios. Das 50 pessoas mais ricas, 26 são Norte-Americanas e 14 são Europeias, o que perfaz 80%. Se você expandir a amostra para as 100 mais ricas, continuará a ter mais de 70% sendo da América do Norte ou da Europa, e se você continuar a subir na lista a tendência mantém-se. A divisão de género também é chocante com apenas 6 mulheres no top 50 e apenas 10 no top 100, com a tendência também a manter-se lista abaixo. Dessas 10 mulheres que estão entre as 100 pessoas mais ricas do mundo, todas elas obtiveram a sua riqueza por herança. Sim, muitas delas enriqueceram ainda mais, mas nenhuma pode reivindicar ter vindo do nada. Ao que parece, o sistema não o permite.Na verdade, a herança é uma tendência forte em toda a lista, com 23 indivíduos no top 50 a obterem a sua riqueza ou parte dela por seu intermédio. No caso de alguém se estar a perguntar como se comporta a tendência lista abaixo, a resposta é: como todas as outras tendências. A herança significativa de riqueza mantém-se forte lista abaixo, sendo de 46% no top 50 e de 45% no top 100. É importante notar que estas listas não incluem a realeza e a riqueza das famílias reais, o que se traduziria

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numa influência da herança ainda mais forte.Agora, se incluirmos os indivíduos que vêm de um meio privilegiado ou da alta sociedade, podemos adicionar outros 11 entre os 50 mais ricos. Ainda assim, o restante 1/3 do top 50 não pode dizer que veio do nada, porque muitos deles vieram de elites políticas (os ditadores não são incluídos na lista) ou gozaram de privilégios políticos significativos, nomeadamente os bilionários da China, Rússia e da América do Sul.No entanto, convém mencionar quão poucos Sul-Americanos constam nestas listas. No top 50 não há nenhum e no top 100 há apenas 4. Na verdade, todo o hemisfério sul tem apenas 6. África tem apenas uma pessoa no top 100, e sim, ele é nigeriano. Agora, é preciso não esquecer que estas listas não incluem a riqueza de ditaduras, do crime e de riqueza cuja aquisição não pode ser rastreada. Julga-se que uma grande porção dos ricos de África não constam desta lista porque adquiriram a sua riqueza através de corrupção, de forma criminosa ou, na melhor das hipóteses, de forma desconhecida. Imagino que essa seja a razão pela qual o Presidente de Angola não consta nas listas mas a sua filha sim. Seja como for, deveria haver mais Africanos dada a abundância de recursos no nosso continente. No top 100, não só há apenas um Africano, como ele é o único negro da lista. Sem surpresa, 2/3 dessa lista é composta por brancos.A divisão da riqueza e a desigualdade é chocante e está a ficar cada vez pior. Um estudo recente mostrou que os 1% mais ricos têm riqueza semelhante aos 99% restantes (ou seja, possuem quase 50% de toda a riqueza disponível), e

em 2016 esses 1% mais ricos serão mais ricos do que o resto da população mundial. É também mencionado que 80% da população do planeta tem apenas 5,5% da sua riqueza e que os 80 bilionários mais ricos têm mais riqueza do que 50% da população do planeta. Em 2010, eram precisos os 388 bilionários mais ricos para igualar a riqueza de 50% da população do planeta, ou seja, as coisas estão a acontecer a um ritmo assustador. Só para dar um exemplo de quão rápido as coisas estão a acontecer, em 2000, a soma da riqueza de todos os bilionários estava abaixo de $1 trilião de dólares e, em 2015, passou os $7 triliões. Até entre bilionários a desigualdade é aguda, com o 1/4 dos bilionários no topo a controlar 2/3 da riqueza de todos os bilionários.Eu sei que tudo isto é um monte de números, e que pequenas mudanças nas definições e metodologias podem mudar muita coisa que está na lista de bilionários, e, claro, as mudanças nos mercados também podem causar grandes mudanças. No entanto, as tendências sobrepostas são tão fortes e as desigualdades são tão graves que as conclusões são claras independentemente da maneira que você as analise. O facto é que a lista dos bilionários mais ricos é um reflexo da nossa história global e um indicador da sociedade de hoje e do seu sistema de valores. Homens brancos e velhos do norte ainda detêm o poder, e com esse poder definem as regras do nossos mundos.Estas regras favorecem os homens sobre as mulheres, pois mesmo os novos bilionários são na sua maioria homens. As mulheres, quando dada a oportunidade – o que geralmente

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acontece por meio de herança – são tão boas se não melhores a fazer crescer a sua riqueza. O problema é que, fora o caso de herança, o sistema não lhes garante campo para competirem em pé de igualdade, e na maioria dos lugares nem lhes permite que entrem no recinto de jogo.As regras são racistas. As injustiças históricas do colonialismo definiram a divisão de riqueza e, em seguida, o capitalismo e os mercados livres

mantiveram-na, chegando até a exacerbá-la. No top 100 de bilionários há apenas uma pessoa negra. Entre os 40 bilionários dos EUA no top 100, nem sequer um é Afro-Americano. Aliás, Oprah Winfrey e Michael Jordan são os únicos Afro-Americanos em 1826 bilionários listados. Desses 1826 apenas 11 são negros, 5 deles são Nigerianos (predominantemente ligados ao petróleo) e 3 outros estão ligados à indústria extractiva em África – que está

– --- 1% mais ricos – --- 99% abaixo

Dados do relatório de 2014 da OXFAM Wealth: Having it all and wanting more

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repleta de corrupção, opressão militar, conflitos e muito mais. Parece que as regras do jogo estão de tal maneira montadas contra as pessoas negras que estas só conseguem ganhar se fizerem batota. O triste é que, mesmo entre os que beneficiam das regras há também quem faça batota, então as probabilidades estão sempre contra nós. Para alguns dos que figuram nestas listas, qualificá-los de batoteiros é ser bastante gentil. Ao percorrê-las, deparamo-nos muitas vezes com indivíduos cuja riqueza (ou cuja riqueza da família) está associada a alguns dos momentos mais moralmente desprezíveis da história mundial, desde o genocídio dos povos indígenas Americanos, ao nazismo na Segunda Guerra Mundial, entre outros. Além disso, muitos na lista são accionistas de empresas que estiveram envolvidas em algumas das maiores crises de ecossistemas e desastres ambientais, tais como a tragédia de gás químico da Bhopal que desde 1984 matou 15.000 pessoas na Índia.A realidade é que o mundo se encontra nesta situação como resultado directo da geração de riqueza destes bilionários. Então, isso traz-nos de volta ao início da nossa discussão, a actual crise climática global e o custo da solução para resolvê-la. Conforme mencionado no estudo da FOEI “An Energy Revolution is Possible” (Uma Revolução Energética é Possível), a riqueza das 782 pessoas mais ricas do planeta (entre as quais muitos CEO’s de grandes corporações responsáveis pela situação actual das mudanças climáticas) “poderia suprir África, a América Latina e quase toda a Ásia com energia 100% renovável em 2030.”

Quando começamos a explorar este conceito, a ideia de tomar a riqueza de outra pessoa era inconcebível, mas conforme nos vamos inteirando melhor do assunto, mais clara se vai tornando a noção de que a sua riqueza é o motivo pelo qual estamos onde estamos, e que a sua re-apropriação é realmente um pensamento justo e correcto.No entanto, ainda que o conceito seja justo, o processo iria certamente causar tumulto. O que podemos então fazer para resolver a crescente desigualdade e colocar mais riqueza onde esta é realmente necessária? Bem, na verdade existem muitas opções, como reconhecer e garantir direitos básicos (e.g. água) e serviços públicos (e.g. saúde e educação); passar de salários mínimos para salários condignos para todos os trabalhadores, e criar mecanismos de segurança fortes para os mais pobres com garantias de rendimentos mínimas. Outra área importante que necessita de ser abordada é a tributação. Há que mudar a tributação do trabalho para o capital e para a riqueza. Por exemplo, uma das principais maneiras de alguém se tornar bilionário é por herança. Tradicionalmente, quando alguém herda algo, há impostos envolvidos, mas com os mercados livres, e com a tendência de interferência mínima do capitalismo, esses impostos são cada vez menores, beneficiam de excepções e lacunas que surgem de todo o lado, permitindo que se evitem ainda mais os impostos. Nos EUA, os primeiros $5,2 milhões de dólares herdados de cada pessoa são isentos de impostos. Assim, um indivíduo pode receber mais de $10 milhões de dólares de herança dos seus pais sem ter de pagar quaisquer

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impostos, e mesmo acima desse valor os impostos são extremamente baixos e não aumentam muito. E isso apenas nos raros casos classificados como tributáveis. Devido ao aumento de excepções, às inúmeras lacunas e ao enfraquecimento das leis fiscais, mais de 99% das propriedades herdadas não pagam impostos. Esta tendência de se enfraquecer a tributação sobre os mais ricos é verdade para todas as formas de impostos. Em 1978, o imposto de renda para os mais ricos era de 70% e o imposto sobre os rendimentos capitais era de 40%, hoje esses números são 35% e 15% respectivamente. Sim, os EUA estão entre os piores, mas muitos outros países apresentam tendências similares. Em Moçambique as leis e regulamentos não são tão claros e fáceis de interpretar, mas a nossa regulação parece não perceber que existem entre nós pessoas extremamente ricas, embora todos nós saibamos que eles existem. Por exemplo, a fasquia mais alta do nosso imposto de renda é $3.000 plus. Isto significa que alguém que ganha $3.000 dólares paga os mesmos impostos que alguém que ganha $30.000 dólares, o que é ridículo. Quanto ao resto, a tributação sobre o capital e sobre a riqueza é fraca. O imposto sobre a herança tem relativamente pouca variação entre a transferência média de riqueza e a alta transferência de riqueza. O que é pior, é que aos maiores investimentos são geralmente dadas tantas excepções fiscais e um tratamento tão preferencial, que a riqueza distribuída aos pobres torna-se relativamente pequena.

Então é comum a riqueza ser transferida de ricos para ricos com retornos

mínimos que beneficiem a sociedade em geral. E não nos esqueçamos que os impactos, crimes e injustiças cometidos no processo de geração de riqueza não são transferidos, e assim sendo recebem-se todos os benefícios da riqueza livres de responsabilidade. Não temos tempo para desenvolver este assunto agora, mas é um bom tema para discussões futuras.

Quanto à questão da desigualdade, temos muitas opções para começar a reverter a tendência e espalhar a riqueza de forma mais justa, mas algo me diz que isso não vai acontecer, a menos que os 99% unam forças no terreno e exijam algumas mudanças. O activismo online não será suficiente, precisamos de sair de trás dos nossos computadores, facebooks, twitters, etc, e agir. Se não o fizermos e esta ridícula desigualdade continuar a aumentar, vamos chegar a um ponto em que teremos de decidir se queremos ter bilionários felizes à custa do nosso clima e dos meios de subsistência de milhões e milhões, ou se queremos forçosamente transformar multi-bilionários em multi-milionários. A bem da verdade, ficar multi-milionário não parece ser uma consequência assim tão má... pelo menos não para 99% de nós.Para fechar, deixo-vos o seguinte trabalho de casa: Mesmo depois de subtrairmos os fundos necessários para resolvermos as mudanças climáticas, sobraria ainda muita riqueza para corrigir outros grandes problemas globais. Pense no que de bom poderíamos fazer se pudéssemos utilizar a riqueza dos 1% mais ricos. Vai surpreender-se com o incrível mundo que poderíamos desenvolver.

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Dia 19 de Outubro, a propósito de actividades de monitoria que temos vindo a levar a cabo junto a comunidades que praticam agricultura de subsistência na área do Baixo Limpopo, encontrávamo-nos em Baixa Fome, no Distrito de Xai-Xai, Província de Gaza, reunidos com mais de 90 camponeses das zonas de Baixa Fome e Kana Kana, que então nos solicitavam apoio e nos relatavam os mais recentes incidentes da sua luta pelas suas terras, quando subitamente os seus relatos se materializaram bem diante dos nossos olhos. No exacto momento em que os camponeses terminavam a sua narração, chegou ao local uma camioneta carregada com blocos, que um grupo acompanhado por homens armados (que nos pareceram ser guardas prisionais) se pôs prontamente a descarregar. Indignados e exaltados, e empunhando as suas enxadas e catanas, os camponeses dirigiram-se prontamente aos recém-chegados e a coisa ficou tensa. A Justiça Ambiental teve mesmo que intervir para que o pior não acontecesse. Serenados os ânimos,

Camponeses de Xai-Xai são novamente retirados das suas terras de cultivo pelo Governo Provincial de Gaza em Moçambique

aconselhámos os camponeses presentes a retirarem-se da área e a procurarem respostas junto ao Regadio do Baixo Limpopo, apontado pelos “invasores” como a entidade responsável.Era precisamente disto que nos falavam os camponeses, literalmente segundos antes de acontecer. Contavam-nos como recentemente, depois de lavrarem as suas terras e enquanto esperavam que chovesse para semearem, encontraram tractores a lavrar novamente a área. Disseram-nos que exortaram os homens a parar uma vez que as terras lhes pertenciam mas que foram taxativamente ignorados.

De acordo com o Líder Comunitário e com o Chefe do Comité dos Camponeses, a área em questão – cedida à população há mais de 24 anos pelo Governo Provincial e que era de 320 hectares antes de mais de metade ter sido cedida à Wambao – é neste momento cultivada por cerca de 52 famílias da comunidade de Ximbonhanine. Estas famílias contaram-nos que, quando a empresa governamental

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Regadio do Baixo Limpopo os abordou solicitando que cedessem a área à Penitenciaria da Província de Gaza para os reclusos praticarem agricultura, propôs que os camponeses fossem compensados com outras terras. Mas a área sugerida como compensação pertencia e estava a ser cultivada por outra comunidade e, como tal, não houve acordo. Posto isto, foi com surpresa que eles encontraram os tractores e homens da Penitenciaria a lavrarem as suas terras.

Por seu turno, os representantes do Regadio do Baixo Limpopo afirmam ter olhado para as zonas não exploradas, (o que não constitui verdade face às declarações feitas pelos líderes e camponeses) e ter contactado a Casa Agrária de Inhamissa (que não tem nada a ver com a área em conflito nem com a comunidade afectada), entidade com quem identificaram os cerca de 70 hectares supostamente então atribuídos à penitenciaria. Após a intervenção da população, o Regadio do Baixo Limpopo mandou a penitenciaria paralisar o trabalho e só então decidiu procurar o Líder Comunitário e o Chefe do Comité dos Camponeses de modo a juntos solucionarem um conflito causado pelo facto de não terem consultado os camponeses logo à partida.

Por sua vez, Lider Comunitário e Chefe do Comité dos Camponeses incumbiram o Secretário do Comité

de gerir o conflito. O dito Secretário e o Regadio do Baixo Limpopo rapidamente identificaram 48 hectares disponíveis que, desta feita, uma vez reunido consenso com os camponeses, foi lavrada e entregue a aqueles que tinham perdido as suas áreas de cultivo.

Conforme nos relataram também o Líder Comunitário e o Chefe do Comité dos Camponeses de Baixa Fome, os técnicos do Regadio do Baixo Limpopo com quem lidaram no processo apresentaram as suas desculpas em nome da empresa e assumiram ter conduzido o processo fora do estabelecido pela Lei e passando por cima dos Direitos Humanos dos camponeses.

A Justiça Ambiental, a Liga dos Direitos Humanos de Gaza e o Fórum das Organizações de Gaza recomendaram ao Regadio do Baixo Limpopo que passe a fazer o seu trabalho envolvendo sempre representantes dos camponeses e as lideranças locais, para evitar futuros conflitos. Recomendaram ainda que a empresa escrevesse uma carta à Penitenciaria explicando o ocorrido e ordenando a paralisação de quaisquer actividades enquanto se resolve o conflito.

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O Tubarão Assassino de Inhambane(Ou os Assassinos de Tubarões em Inhambane?)

É sem dúvida um assunto sério, pelas vitimas que já fez, e pela forma como tem vindo a ser tratado, sobretudo pela nossa comunicação social que claramente deixa cada vez mais a desejar! Não basta ver e ouvir meia dúzia de acontecimentos, inventar um título sensacionalista e pronto está feita a notícia! Qual é o objectivo de uma notícias dessas? É mesmo só informar? Ou será que na verdade o que se pretende é criar pânico? Que acaba por levar exactamente ao que se vê agora: uma caça desenfreada aos tubarões! Meus senhores, onde está a responsabilidade? Onde está o jornalismo sério?

Houve recentemente 3 ataques de tubarão, pelas contas feitas com base na informação passada nos meios de comunicação, o dito tubarão assassino feriu três pessoas, 1 delas uma senhora que infelizmente acabou por falecer. É triste

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e revoltante, concordo! Mas antes de autorizar o abate destes animais, é preciso entender as circunstâncias em que se deram os ataques, caso contrário o mesmo poderá acontecer vezes sem conta e vamos continuar a recorrer a este tipo de solução.O alvo já não é apenas o tal tubarão assassino mas todos, como se pôde ver em notícias e fotografias que circulam nas redes sociais mostrando os tubarões abatidos na Baia dos Cocos em Inhambane, no passado dia 10 de Novembro. Até em Nampula foram mortos tubarões... Os assassinos somos nós! Se as fotos e notícias a circular são correctas, nesse dia foram mortos 9 tubarões! Então qual deles era o tão procurado assassino? Ou eram todos igualmente assassinos? E quem é que decide sobre que tubarão é ou não para abater? Como podem afirmar que é 1 tubarão problemático e não dois ou mais tubarões? Esta é uma forma bastante ignorante e insensata de agir.Numa das notícias sobre a mesma questão, menciona que um dos barcos de pescadores que também estava a fazer a tal caça ao tubarão, naufragou e morreram 4 pessoas e outras 5 estão desaparecidas. Ou seja, o tubarão feriu 2 e matou 1, e num naufrágio para o caçar morreram 4 e 5 desapareceram... e isto é culpa de quem? Foi o tubarão também?

O nosso governo ao promover e autorizar a caça indiscriminada aos tubarões só demonstra uma vez mais a sua imensa insensibilidade às questões ambientais. Demonstra que desconhece e desrespeita por completo as consequências de um acto impensado e ignorante como este no equilíbrio ecológico e até mesmo na educação cívica do seu povo. Porque na verdade esta é a solução mais fácil, pois assim basta incitar aos pescadores e estes mesmo farão os possíveis para acabar com os tubarões, e assim o governo pouco terá de fazer, por esta forma de pensar saem todos felizes, as comunidades de pescadores conseguiram saciar a sua sede de vingança dos tubarões e o governo mostrou-se sensível aos problemas do povo. E assim vamos entretendo os problemas! E no processo vão se criando outros. Mas quem autorizou? As notícias que vi mencionavam que o governo autorizou. Será possível isso? Mas só vi a Administração Marítima a falar e onde está o nosso Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural? Está a assistir apenas? Antes de avançar com soluções estúpidas, como colocar “longlines”, uma arte de pesca bastante contestada e proibida em vários países, porque é bastante nociva a várias espécies como golfinhos, raias e até tartarugas marinhas (protegidas por lei)! É importante tentar perceber em que circunstâncias se deram os ataques? E este papel moderado de tentar entender primeiro cabe ao governo, não podemos esperar que os pescadores, que são as principais vitimas, tenham neste momento discernimento para tal, mas em vez de tentar acalmar os ânimos e entender o que se passa, o nosso governo é o primeiro a pôr mais lenha na fogueira. Chamam biólogos e ambientalistas para comentar a questão e depois os mesmos são insultados e ameaçados porque supostamente estão a defender os animais e não as pessoas. Meus senhores sejamos sensatos!!! Quem pede opinião a um biólogo está à espera de que opinião? Nem precisa ser um biólogo, basta que seja sensato e não vai com

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certeza ser essa a sua primeira opção. Abater indiscriminadamente os tubarões, que são predadores de topo com inúmeras e importantes funções ecológicas, terá com certeza consequências!!! A quem vão se lamentar depois? A legislação relativamente à pesca de tubarão é pobre, o Regulamento da Pesca Recreativa e desportiva (Decreto 51/99 de 31 de Agosto) é o único que regulamenta a pesca do tubarão, neste documento o tubarão branco é protegido e a sua captura é proibida (Anexo II. Lista de espécies protegidas). Todas as restantes espécies de tubarão são apenas sujeitas a restrições, onde o limite de captura são 2 peças por pescador por dia (Anexo I. Lista de espécies sujeitas a restrições).Porquê que a matança indiscriminada é inaceitável? Porque não exterminar todos os tubarões ficando assim com os oceanos livres de assassinos? Parece absurdo colocar estas questões, não faz qualquer sentido exterminar toda uma espécie, até porque convém recordar aos mais esquecidos que estes animais até têm um importante papel a desempenhar nos ecossistemas.

Os tubarões são predadores de topo da cadeia alimentar e contribuem para o controle e saúde das populações das espécies que são suas presas, nomeadamente o peixe. Acredita-se que os tubarões sejam vitais na manutenção da biodiversidade, da estrutura dos ecossistemas marinhos e que a redução da sua população e até o seu possível desaparecimento irá afectar os ecossistemas e diversas espécies de peixe de modo imprevisível. É igualmente importante perceber em que circunstâncias se dão os ataques por tubarões, pelo que pude verificar nas notícias todos os ataques foram a pescadores a exercer a actividade, é sabido que o tubarão tem um extraordinário sentido de olfacto e consegue detectar uma gota de sangue em 2 milhões de litros de água, ou a cerca de 300 metros, daí que é fundamental ter determinados cuidados quando se pesca em águas onde se sabe haver tubarões. O homem não faz parte da dieta do tubarão, a grande maioria dos ataques de tubarão são um infeliz engano, estes confundem-nos com as suas presas preferenciais e algumas espécies de tubarão são territoriais e atacam por sentir o seu território invadido, como é o caso do tubarão touro. A sensibilização e educação dos pescadores, que são o grupo mais exposto, é fundamental para evitar acidentes futuros.

Para além dos impactos negativos que o abate indiscriminado de tubarões poderá ter, a prática abre as portas a um aumento exponencial do negócio de captura e abate de tubarões para extrair as suas barbatanas, e alimentar um negócio cruel da venda de barbatanas de tubarão na sua maioria para o mercado chinês. A província de Inhambane tem sido o palco principal desta prática ilegal, e tudo tem sido feito no maior segredo, agora com esta autorização de abate por causa do tubarão assassino teremos então a liberalização de um novo negócio. A pesca de tubarão para retirada das suas barbatanas é responsável pela morte de milhões de tubarões anualmente, há inúmeras campanhas a nível global a trabalhar para que não sejam dizimados os tubarões nesta prática ilegal, cruel e insustentável. Enquanto por cá nós vamos aplaudindo a sua matança indiscriminada.

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“Ninguém come eucalipto”. Essa afirmação bem direta foi a forma como camponeses expressaram, anos atrás, sua indignação quando a empresa Aracruz Celulose expandiu o monocultivo de eucalipto sobre terras agricultáveis do estado do Espírito Santo, no Brasil, para poder produzir e exportar mais celulose. Mesmo assim, essa e outras empresas sempre adotaram um discurso público de que suas práticas eram “inteligentes”: por exemplo, eucalipto só era plantado em terras “degradadas” ou “abandonadas”. Agora, com a crise climática, a FAO

A farsa de uma “silvicultura inteligente”Os casos de Green Resources em Moçambique e Suzano no Brasil

Artigo e Fotografia da World Rainforest Movement

está sugerindo adotar uma “silvicultura inteligente para o clima”. Nossa pergunta: será que já podemos dizer que as empresas praticam hoje algo que se parece com uma “silvicultura inteligente”?

A FAO é a organização da ONU para promover a agricultura e a alimentação, mas trata também dos temas de florestas e plantações de árvores – esta última categoria é erroneamente definida por ela como “florestas plantadas”. No seu livro de referência sobre “agricultura inteligente para o clima” (CSA, na sigla

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em inglês), a FAO aborda o papel de florestas e árvores, dizendo, dentre outras coisas, que “o esforço para fazer a transição à silvicultura inteligente para o clima precisa acontecer em todos os níveis (...) e escalas” (1).

Mas podemos chamar a silvicultura como ela é praticada hoje de inteligente? Uma silvicultura praticada por poucas empresas, que ocupam milhões de hectares de monoculturas de eucalipto, pínus, acácia, seringueira e algumas outras espécies, visando a maior produtividade possível e causando muitos impactos negativos?

Em contradição com o objetivo da FAO de fortalecer a produção de alimentos e o discurso das empresas de recuperar terras “degradadas”, a prática tem sido as empresas de monoculturas de árvores sempre disputarem terras agricultáveis. Isso por uma razão muito óbvia: se não ocupassem terras férteis, suas plantações não teriam a produtividade desejada. Por isso, onde as plantações se expandem – geralmente em grandes áreas de milhares de hectares –, a produção de alimentos costuma ser reduzida. Trata-se de um verdadeiro desastre para as comunidades camponesas, com profundo impacto sobre a soberania alimentar das comunidades e da população local. Portanto, um processo pouco inteligente. Por isso, a lógica empresarial que visa o máximo de produção e lucro tem sido uma das principais críticas que essas empresas receberam, muito bem resumida na frase “ninguém come eucalipto”.

Em resposta, várias empresas começaram a desenvolver projetos-

piloto que pudessem integrar, de alguma forma, o plantio de monocultivo de árvores com a produção de alimentos. Um dos programas mais propagados e implementados é o chamado “fomento florestal”. Significa que agricultores plantam eucalipto nas suas próprias terras, geralmente assinando um contrato com a empresa para que cuidem das árvores e posteriormente as vendam apenas para essa mesma empresa, além de assumir os riscos caso as plantações não se desenvolvam bem. As empresas apresentam essa ideia como um “programa social”, uma forma de “ajudar” os camponeses, também sugerindo que, com o “fomento”, seria possível integrar de forma harmoniosa o plantio de eucalipto com a produção de alimentos.

Green Resources em Moçambique

Em Moçambique, o principal país africano em termos de expansão de plantações de árvores para madeira, a empresa norueguesa Green Resources (GR) está promovendo o monocultivo de eucalipto na província de Nampula, sob o nome de Lúrio GR,. Durante uma recente visita de campo ao distrito de Mecubiri, ouvimos moradores de uma comunidade diretamente afetada pelas plantações de eucalipto da empresa.

Na sua página na internet, a Green Resources afirma que planta eucalipto apenas em “pastagens de baixo valor ou áreas de floresta degradada”. Mas, ouvindo a comunidade sobre essa afirmação, a mesma é categórica ao dizer que a empresa ocupa terras agricultáveis. São terras onde famílias já faziam, fazem e/ou farão futuramente sua roça de alimentos, por eles chamada

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de “machamba”. As pessoas afirmam que, nos últimos anos, paralelamente à entrada na comunidade do plantio de eucalipto, a produção de alimentos foi reduzida.

Os moradores também contam que parte desse eucalipto é plantada nas terras de camponeses/as como “fomento florestal”, um programa que conta até com apoio da União Europeia. Conversando com um grupo de pessoas que participa dele, elas dizem que entraram no programa em função das promessas da empresa de que ficariam ricas, que poderiam continuar plantando alimentos no meio dos eucaliptos e que, se 80% das mudas de eucalipto sobrevivessem, ganhariam um painel solar – para poder ter acesso a energia elétrica. No entanto, a sensação atual entre essas pessoas é de frustração. Mesmo que a maioria dos eucaliptos tenha crescido e muitos tenham recebido um painel solar, eles afirmam que vários desses painéis já não funcionam mais. Sobre o cultivo de alimentos no meio do eucalipto, uma camponesa conta que tentou plantar mandioca, mas que, depois de algum tempo, a mandioca já não se desenvolveu, enquanto o eucalipto continuava crescendo. Ela constatou que o eucalipto fez com que o solo secasse, comprometendo o crescimento da mandioca. Ela se pergunta como vai produzir comida suficiente para alimentar seus filhos.

Outro morador conta que participou de outro programa da empresa que promovia o plantio de uma cultura alimentar, a soja. Nesse programa, a Lúrio GR distribuía sementes que cobrava depois, em quantidade 20%

maior. O morador que plantou soja comenta que ninguém na comunidade come soja porque ela não faz parte do cardápio tradicional das pessoas. Por isso, a soja é produzida para ser vendida à indústria de avicultura. Como ocorre com os fomentados do eucalipto, também o sojicultor está desanimado. Ele diz que sua renda foi reduzida porque o preço da soja baixou significativamente nos últimos três anos, e que a empresa GR não está dando apoio na parte da comercialização. (2).

Suzano no Brasil

Outro exemplo de uma empresa que promove o chamado “fomento florestal” é a Suzano Papel e Celulose. A empresa afirma ter 1.000 produtores rurais, dos quais 80% são pequenos produtores que praticam o “fomento florestal”. A Suzano é uma das maiores empresas em expansão no Brasil, que promove o plantio da monocultura de eucalipto para celulose e papel. Futuramente, pretende exportar “pellets de madeira” para geração de energia e eletricidade na Europa. Também é a primeira empresa no Brasil e na América Latina que conseguiu, este ano, a aprovação do plantio comercial de um eucalipto transgênico, supostamente 20% mais produtivo que as árvores “convencionais”.

A expansão da Suzano nos últimos anos tem gerado conflitos com comunidades tradicionais na região do Baixo Parnaíba. Elas têm defendido seus territórios, onde praticam o extrativismo de bacuri e de outros produtos (3). Mesmo assim, a Suzano afirma que “a maioria das terras onde plantações são implementadas é terra agrícola

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degradada”. E sobre a introdução das árvores transgênicas, a empresa afirma que os agricultores que praticam o “fomento florestal” seriam os que mais se beneficiariam dessa nova tecnologia. A empresa argumenta que o aumento da produtividade pode fazer com que os pequenos produtores necessitem de menos terras para produzir a mesma quantidade de madeira; portanto, sobrariam mais áreas para a produção de alimentos e/ou proteção de florestas, segunda afirma a Suzano. (4)

No entanto, décadas de “sucesso”, com aumentos constantes de produtividade das árvores de eucalipto no Brasil, seguindo métodos “convencionais” de melhoramento da produção, resultaram em milhões de hectares de plantações a mais, e não a menos. Com isso, a Suzano e outras empresas contribuíram para gerar muitos conflitos e a expulsão de comunidades locais das suas terras, bem como redução das áreas disponíveis para a produção de alimentos. Conforme diz o advogado brasileiro da ONG Terra de Direitos, André Dallagnol: “O próprio eucalipto, que é uma espécie exótica no Brasil, tem se apresentado como um grande inimigo dos Camponeses e dos Povos e Comunidades Tradicionais no Brasil. Isso acontece justamente pelos impactos que já são causados pelas variedades não modificadas geneticamente e que são potencializados na variedade transgênica, especialmente as

relacionadas ao consumo de água. Há relatos de esgotamento dos recursos hídricos para comunidades inteiras onde há intensos monocultivos de eucaliptos, lugares que passam a ser chamados de desertos verdes. Além disso, há necessidade de uso intenso da pulverização aérea de agrotóxicos que se espalham por longas distâncias, atingindo, novamente, as comunidades vizinhas”. (5)

Por fim

Esses dois exemplos de empresas, ambas certificadas pelo FSC, reforçam aquilo que o WRM vem argumentado ao longo dos anos: é pouco inteligente promover sem limites um modelo de silvicultura ou agricultura com base em monocultura em larga escala. Isso também vale para o clima: se consideramos ainda que esse modelo de produção das empresas de silvicultura é baseado em mecanização, em um uso intenso de fertilizantes e agrotóxicos, e em transporte da produção em longas distâncias, etc., estamos falando de uma atividade que depende profundamente do petróleo. Insistir nesse modelo apenas tende a piorar a crise climática. Portanto, a opção realmente inteligente seria não mais praticá-lo. Até lá, é fundamental apoiar e fortalecer as comunidades nas suas lutas contra as plantações de árvores em larga escala.

(1) http://www.fao.org/3/a-i3325e.pdf(2) Visita a campo do WRM junto com Justiça Ambiental, de 15 a 23 de setembro de 2015.(3) http://wrm.org.uy/pt/livros-e-relatorios/plantacoes-de-eucalipto-para-energia-o-caso-da-suzano-no-baixo-parnaiba-maranhao-brasil/(4) http://theforestsdialogue.org/publication/company-responses-questionnaire-development-genetically-modified-trees(5) http://wrm.org.uy/pt/artigos-do-boletim-do-wrm/secao1/os-transgenicos-nao-sao-bem-vindos-entrevista-com-andre-hl-dallagnol-de-a-organizacao-brasileira-terra-de-direitos/

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Eu sou da Suécia, e estou em Moçambique há dois meses a fazer um estágio.

Tenho orgulho da história de prestação de segurança social da Suécia. Impostos altos e um Estado que funciona bem permitiu uma distribuição de renda daqueles que têm mais, para aqueles que têm menos, e isso por sua vez permitiu

uma acumulação de bens comuns, tais como uma educação gratuita, uma assistência médica gratuita, bons cuidados aos idosos, boas infra-estruturas, etc . Dito isto, ao longo dos últimos anos ficou demonstrado como uma mudança política aparentemente pode desmantelar estas políticas sem dúvida bem fundamentadas. Na Suécia, o desenvolvimento segue

ASegurançaSocialdaMachambaPor: Daniel Burgos-Nyström

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agora uma lógica mais capitalista, mais individualista, onde os pobres da sociedade ao invés de serem ajudados por meio de incentivos na forma de diferentes tipos de tão necessário apoio, estão a ser castigados com menos apoio.

Pelo que tenho visto e vivenciado aqui em Moçambique, a machamba é a base de subsistência de uma grande parcela da população moçambicana. Importância que é reiterada se considerarmos que cerca de 70% de toda a terra cultivada do país consiste de machambas. Para a população, a machamba supre necessidades alimentares e providência ainda alguma renda para pagar outras despesas.

Durante uma viagem de campo ao Xai-Xai, um homem contou-me como o governo local o havia informado que ele e a sua família deveriam desistir da sua machamba e começar a levar uma outra vida, uma vez que o governo agora tinha outros planos para a terra. O homem de 60 e poucos anos de idade explicou que vivia daquela machamba desde que nascera, que fora criado lá, que ele e sua mulher a seu lado lá tinham tido 10 filhos, todos eles criados com a renda daquela machamba. A machamba não só os tinha alimentado a todos, como também tinha dado à família uma renda extra obtida pela venda dos seus produtos no mercado local. Essa renda tinha sido suficiente para comprar roupas para toda a família, pagar as suas despesas médicas, bem como para pôr as crianças a estudar. Além disso, os bens produzidos também forneceram a outras pessoas da região alimentos acessíveis no mercado local.Dói ouvir estes casos de pessoas sendo

despojadas do próprio fundamento da sua segurança social - a machamba. Este homem e sua família no Xai-Xai não estão sozinhos, casos semelhantes acontecem em todo o país, e em grandes comunidades, afectando um grande número de pessoas.Como se sabe, de acordo com a lei moçambicana toda a terra é propriedade do Estado, razão pela qual apenas direitos de uso são atribuídos. Assim, não há propriedade privada da terra, uma herança socialista ainda pertinente. Eu acho que isso é bom na medida em que impede que actores economicamente poderosos comprem as machambas das pessoas. No entanto, com demasiada frequência o governo de Moçambique, seja sozinho ou em cooperação com actores privados, remove pessoas de suas machambas retirando-lhes o seu meio de subsistência em troca de uma compensação económica insultuosamente baixa ou em troca por um pedaço de terra (muitas vezes pior, menos fértil) noutro lugar qualquer para onde as pessoas são forçadas a relocar-se.

Como para a Suécia, eu desejo para Moçambique que as políticas sejam moldadas e operacionalizadas de forma a proteger o sistema de segurança social para a população. Em Moçambique, entre representantes do governo, creio que, em larga medida, a machamba precisa ser reconhecida como uma parte fulcral do sistema de segurança social. Em vez de desmantelar ou enfraquecer tão importante sistema de segurança social, o esforço deveria ser feito no sentido de protegê-lo, bem como aos benefícios que ela traz para os seus usuários.

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Julgamento de Activistas Angolanos

O julgamento de 17 activistas angolanos, 15 destes em prisão preventiva desde 20 de Junho, teve início a 16 de Novembro. Este caso tem levado a manifestações de repúdio e protesto pelos seus contornos políticos e pelo facto da prisão preventiva dos activistas ter há muito ultrapassado o tempo máximo previsto pela lei. Os 17 activistas são acusados de actos preparatórios para uma rebelião e de atentado contra o auto proclamado presidente vitalício, num país onde a liberdade de expressão é coisa do passado e já nem vergonha na cara existe. A ditadura está muito bem instalada, os abusos de poder são flagrantes e a sua denúncia em nada resulta e a violação dos direitos humanos é igualmente preocupante.Em Angola, Portugal e Brasil tem havido inúmeras manifestações públicas de solidariedade para com os activistas presos e de repúdio pelas inúmeras e gritantes irregularidades em todo o processo, bem como pela postura intransigente assumida pelo arrogante governo angolano.O julgamento está a decorrer à porta fechada, nem jornalistas e observadores podem assistir ao mesmo. A probabilidade de condenação é grande, e se forem condenados, as penas de prisão podem ir até 3 anos de prisão. Os advogados de defesa só tiveram acesso ao processo no dia em que iniciou o julgamento, e provas? Provas são os encontros dos activistas para discutir um livro e os problemas sociais de angola. Que são activistas e lutam por justiça social não há dúvida alguma e nenhum dos acusados nega isso, mas que há provas para levar o caso a tribunal ou para prisão preventiva sequer, é bastante questionável.Estamos a torcer por justiça! Estamos a torcer para que não prevaleça a ditadura e a opressão da liberdade de expressão, a opressão do direito à cidadania! Somos contra todas e quaisquer formas de opressão! Estamos solidários com os 17 activistas! Estamos juntos!!!

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A Barragem ruiu...De quem é a responsabilidade pelas vidas que destruiu?No passado dia 5 de Novembro, às 15:30, a barragem do Fundão ruiu, seguida pela barragem de Santarém. As barragens do Fundão e de Santarém, localizam-se no subdistrito de Bento Rodrigues, a cerca de 35 km do centro do Município de Mariana, uma cidade histórica de Minas Gerais no Brasil. Ambas pertenciam à mineradora Samarco, fundada em 1977 e controlada pela Vale e pela BHP Billiton. Restou ainda uma terceira barragem, a barragem de Germano, que, constituída por 3 diques, se encontra agora instável e em risco de romper face à imensa quantidade de lama libertada pela barragem do Fundão. A barragem do Fundão armazenava lama resultante dos resíduos da produção de minério de ferro, e ao romper libertou cerca de 50 milhões de metros cúbicos desta lama, o que equivale à quantidade de água de cerca de 21 mil piscinas olímpicas. A avalanche de lama devastou o subdistrito de Bento Rodrigues. O número exacto de vítimas é ainda desconhecido, mas fala-se em 11 mortos, 12 desaparecidos, e mais de 600 pessoas sem abrigo. A grande maioria dos imóveis foi destruída, para além de praticamente tudo quanto o mar de lama encontrou no caminho, desde árvores a animais. Para além de Bento Rodrigues, mais 6 localidades foram atingidas, e vários municípios de Espírito Santo ficaram sem água potável por terem os seus rios carregados de lama. A lama já percorreu mais de 850 km e já chegou ao mar, ainda não há informação sobre a extensão dos danos ambientais e materiais deste desastre, que já é considerado o maior desastre ambiental do Brasil. A Samarco justifica o acidente com base em dois tremores de terra de pequena dimensão ocorridos no início da tarde do mesmo dia 5, os mesmos foram confirmados, no entanto, ainda não sabem se os incidentes estão relacionados nem o que levou aos tremores de terra. As causas da ruptura das barragens ainda não são conhecidas. O Ministério Público de Minas Gerais abriu um inquérito para apurar as causas e responsabilidades do incidente. Entretanto, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) já multou a Samarco no valor de 250 milhões de reais, sem contudo eliminar a possibilidade de aplicar multas adicionais. Os presidentes da Samarco, da Vale e da BHP Billiton afirmaram que será criado um fundo de assistência financeira para ajudar os atingidos pelo desastre. É Irónica a linguagem escolhida pelas empresas, afirmando que pretendem ajudar os afectados pelo desastre, ao invés de assumir responsabilidade e compensar e indemnizar da melhor forma possível. Apesar das causas ainda não serem conhecidas, está claro que os sistemas de aviso falharam por completo. Não há como compensar vidas humanas nem como indemnizar aqueles que perderam tudo o que tinham na vida. A Organização das Nações Unidas pronunciou-se pedindo a aplicação de medidas imediatas para proteger o ambiente e os moradores das áreas afectadas, e declarou ainda que as medidas tomadas pelo governo, Samarco, Vale e BHP Billiton para evitar danos foram claramente insuficientes.

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Aquando da visita do Presidente Nyusi à África do Sul em Outubro deste ano, deparamo-nos com um artigo muito interessante do Professor Andre Thomashausen. O que nos chamou a atenção foi o seu título: “Cahora Bassa: 40 biliões de dólares desperdiçados - ou como Moçambique subsidia a África do Sul”. O artigo denuncia a tarifa absurda que a Eskom paga pela energia de Cahora Bassa, e como, mesmo com o novo acordo de 2007, esta continua muito aquém do seu real valor. De acordo com o autor, o preço actual de energia a nível mundial varia entre os 14 e os 32 cêntimos de dólar por kWh, no entanto, a Eskom compra energia a Moçambique por menos de 1 cêntimo por kWh.Em 1982, quando o acordo foi assinado, o preço irrisório acordado tinha uma justificação política: o governo Sul Africano visava destabilizar Moçambique. Curiosamente, o ainda que desfasado preço por kWh imposto pelo governo do Apartheid na altura, era (face ao valor do Rand na época) 3 vezes maior que o pago hoje pelo governo do ANC sem justificação alguma.Mas porquê que da renegociação de 2007 não surtiu o devido reajustamento? Como é possível que o nosso governo tenha acatado novamente um acordo tão injusto?Como o Professor Thomashausen escreveu e bem no seu artigo, “o governo do ANC triplicou a injustiça praticada pelo governo do Apartheid“! Moçambique, um país muito mais pobre que a África do Sul, continua assim a subsidiar a economia do seu vizinho rico e desenvolvido. Não faz sentido algum.De acordo com as contas do catedrático, este desastroso acordo custa a Moçambique cerca de 1300 milhões de dólares por ano! Uma loucura! Em 33 anos, pense em tudo o que poderíamos ter feito com esse dinheiro! Pense no acesso à educação, à saúde... De certeza que os níveis de pobreza teriam diminuído. Infelizmente, esta história é somente mais um exemplo flagrante da incompetência dos nossos governantes em garantir para o país um desenvolvimento justo, sadio e inclusivo.Este artigo só veio fortalecer as nossas preocupações em relação à proposta Hidroeléctrica de Mphanda Nkuwa. Porquê? Porque tememos que a historia se repita. Primeiro, porque a procura de financiamento não tem sido fácil; segundo, porque as recentes acusações de corrupção que a Camargo Correa (um dos proponentes do

África do Sul, Moçambique e a questão da Energia

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projecto) enfrenta no Brasil é elucidativa quanto à postura e carácter dos envolvidos; terceiro, porque não acreditamos que os nossos dirigentes sejam capazes de colocar os interesses do povo à frente dos seus; e quarto, porque as intenções dos 3 shareholders (Camargo Correa, INSITEC e EDM) ficaram claras no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do projecto, um documento, em nossa opinião, lamentavelmente cheio de lacunas, que não responde compreensivamente às preocupações dos visados, e que deixou em aberto questões técnicas fundamentais.Nas negociações de Mphanda Nkuwa, ao que tudo indica e conforme noticiado em 2014 a propósito da dificuldade das partes chegarem a acordo, a Eskom pretende repetir a injustiça. Desta feita, a instabilidade em Moçambique não é o objectivo mas sim a desculpa.E nós? Vamos continuar a sorrir enquanto somos roubados declaradamente? Há com certeza algo errado neste cenário surreal. Afinal, com que finalidade é que vamos construir uma barragem que terá tantos impactos, tanto sobre o ambiente como sobre as comunidades cuja subsistência depende do rio? Será Mphanda Nkuwa realmente uma necessidade para Moçambique? Ou estaremos novamente a ferir o Rio Zambeze e o bem estar de milhares de pessoas para encher os bolsos de meia dúzia?

Recapitulando, eis algumas das preocupações que durante mais de 10 anos de debates, pedidos e reuniões fomos colocando ao nosso executivo, mas que, ainda assim, o EIA apresentado em Agosto de 2011 negligencia:• Análise de sedimentos elaborada com dados insuficientes, que não permitem uma análise cientifica válida;• Análise sismológica fraca, sem dados concretos e com resultados e conclusões que contrariam outros estudos de especialistas de renome;• Não estar ainda definido o regime de fluxo em que a barragem irá operar (base-load ou mid-merit);• Não estar ainda definido o local para o reassentamento das comunidades;• Não ter havido uma análise aos potenciais impactos das alterações climáticas e mudanças na demanda de água a montante da barragem, tendo em conta os vários estudos que projectam reduções no fluxo de água no Delta do Rio Zambeze;• As directrizes da Comissão Mundial de Barragens para questões de base de direitos e justiça social e ambiental, tais como: 1. Conquista de aceitação pública2. Avaliação abrangente das opções3. Aproveitamento das barragens existentes4. Preservação de Rios e Meios de Subsistência5. Reconhecimento dos Direitos Adquiridos e Partilha de Beneficios6. Garantia de Cumprimento7. Partilha de Rios para a Paz, Desenvolvimento e SegurançaMesmo com tantas falhas, o EIA foi aprovado.A realizar-se, este será sem sombra de dúvidas mais um projecto que só vai trazer mais desgraça para as comunidades da Província de Tete. Uma província já atolada em problemas fruto dos seus controversos projectos de exploração de carvão.Uma coisa é certa, com a dívida externa do país a subir de forma alarmante, temos de ser mais cuidadosos e criteriosos nas nossas escolhas de investimento. Que nos sirva de lição a Ematum.

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No dia 04 de Dezembro de 2015, na sequência do COP 21 em Paris, o governo moçambicano, através do Ministro da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural (MITADER), Celso Correia, apresentou o Programa Nacional Integrado de Desenvolvimento Rural Sustentável para Moçambique – “Estrela”.

Segundo a intervenção do MITADER, o programa “Estrela” pretende promover a cadeia de valores baseada na agricultura e florestas nas zonas rurais, abordando as várias barreiras do sector que limitam o acesso aos mercados, tecnologia, água, energia, finanças e conhecimentos de modo a catalizar a produção sustentável nas zonas rurais. Neste contexto, o governo assinou uma Carta de Intenções para o Programa de Gestão Integrada da Paisagem da Zambézia, com o Forest Carbon Partnership Fund, marcando assim o inicio da implementação oficial do REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal).

O REDD e sua estratégia foram tratados de forma leviana e apesar da contestação pela sociedade civil a nível nacional, africano e global o governo insiste em avançar com este mecanismo ao assinar a Carta de Intenções.

Ao ser questionado pela assinatura do acordo, o governo admite que o REDD poderá não resolver o problema das mudanças climáticas, reiterando no entanto, que a sociedade civil deve mesmo assim apoiar esta decisão, uma vez que se pretende criar alternativas para as comunidades locais.

Segundo Nnimmo Bassey, activista renomado e director da Fundação Health of Mother Earth, Moçambique de forma voluntária promove a implementação do REDD no país, mesmo reconhecendo que este poderá não contribuir para a resolução do problema das mudanças climáticas, e irá ainda facilitar mais uma forma de recolonização do continente.

O REDD representa uma solução falsa por se tratar de um mecanismo de compensação que utiliza as florestas e ecossistemas como esponja para a poluição industrial causada pelo ocidente, adiando constantemente a necessidade e urgência de um compromisso sério de redução de emissões. É também nesta vertente que o REDD tem sido uma das principais matérias de discussão e controvérsia no âmbito do eminente acordo de Paris nesta Conferência das Nações Unidas.

Comunicado de Imprensa

Governo Moçambicano assina um acordo que irá agravar os impactos das mudanças climáticas

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Anabela Lemos, Directora da Justiça Ambiental, defende que o “REDD é uma ilusão, é uma licença para que as corporações multinacionais continuem a poluir e a destruir o continente Africano e o Planeta. O REDD é a nova forma de colonização¨.

Importa notar que actualmente não existem acções e mecanismos vinculativos que obriguem à redução das emissões e, a agravar a situação, o REDD cria condições perfeitas para que os poluidores continuem a poluir, enquanto se orgulham de ser os campeões de acções climáticas.

A oportunidade para alcançar um acordo com compromissos concretos para solucionar a crise climática na COP 21 está sendo desperdiçada a favor de acordos e intenções pouco claros e que poderão ter graves consequências sociais e ambientais, à semelhança da Carta de Intenções assinada por Moçambique.

Ainda por ocasião da COP, foi lançado no dia 6 de Dezembro, um livro sobre o REDD - “Parando a Usurpação do Continente e a REDD-ficação de África” pela Rede Africana contra o REDD (NRAN – sigla em inglês). O objectivo desta publicação é desmistificar o REDD e projectos similares em todas as suas formas. Este evento representou um contra peso à pressão para adopção do REDD e demais mecanismos similares.

Ademais, no passado dia 8, à entrada da sala de negociações foi levada a cabo uma acção conjunta de protesto ao REDD, da qual fizeram parte vários grupos, tais como NRAN, Rede Ambiental dos Indígenas, Grupo da America Latina e Organizações dos Estados Unidos da America e Europa, para numa só voz manifestarem a sua oposição ao REDD, que tem sido a base das discussões do eminente acordo que poderá sair de Paris.

Portanto, não restam dúvidas que o REDD representa uma ameaça à salvaguarda de vários recursos naturais e humanos pelo que, Moçambique jamais devia assinar acordos que sustentam o mesmo.

“O REDD é o mesmo que uma pessoa ter a cabeça dentro do forno e depois colocar os pés no congelador acreditando que não irá se queimar” Firoze Manji, grande pensador Africano, historiador e editor da Pambazuka Press e ex-director the Ammesty Internacional.

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