neila de jesus ribeiro almeida saberes e prÁticas...
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NEILA DE JESUS RIBEIRO ALMEIDA
SABERES E PRTICAS TRADICIONAIS: POPULAO PESQUEIRA
EXTRATIVISTA DA VILA SORRISO-SO CAETANO DE ODIVELASPA.
Belm
2012
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAR
NCLEO DE MEIO AMBIENTE - NUMA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GESTO DOS RECURSOS NATURAIS E DESENVOLVIMENTO LOCAL - PPGEDAM
1
NEILA DE JESUS RIBEIRO ALMEIDA
SABERES E PRTICAS TRADICIONAIS: POPULAO PESQUEIRA
EXTRATIVISTA DA VILA SORRISO-SO CAETANO DE ODIVELASPA.
Dissertao apresentada como requisito parcial para obteno de grau de mestre em Gesto de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amaznia. Ncleo de Meio Ambiente, Universidade Federal do Par. rea de concentrao: Gesto Ambiental Orientador: Prof. Dr. Srgio Cardoso de Moraes
Belm
2012
2
Dados internacionais de catalogao-na-publicao (CIP),
Biblioteca do Ncleo de Meio Ambiente/UFPA, Belm PA.
____________________________________________________
Almeida, Neila de Jesus Ribeiro
Saberes e prticas tradicionais: populao pesqueira extrativista da vila Sorriso-So Caetano de OdivelasPA / Neila de Jesus Ribeiro Almeida; orientador: Srgio Cardoso de Moraes. __ 2012. 108 p.
Dissertao (Mestrado em Gesto dos Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amaznia) Ncleo de Meio Ambiente, Universidade Federal do Par, Belm, 2012.
1.Manguezais So Caetano de Odivelas (PA). 2. Pescadores So Caetano de Odivelas (PA). 3. Sustentabilidade. I. Moraes, Srgio Cardoso de. III. Ttulo.
CDD 22. ed. 577.69809811
____________________________________________________
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NEILA DE JESUS RIBEIRO ALMEIDA
SABERES E PRTICAS TRADICIONAIS: POPULAO PESQUEIRA
EXTRATIVISTA DA VILA SORRISO-SO CAETANO DE ODIVELASPA.
Dissertao apresentada para obteno de grau de mestre em Gesto de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amaznia. Ncleo de Meio Ambiente, Universidade Federal do Par. rea de concentrao: Gesto Ambiental
Defendido e aprovado em: 02/ 03/ 2012 Conceito: _____________________ Banca examinadora: _________________________________________ Prof. Srgio Cardoso de Moraes - Orientador Doutor em Educao Universidade Federal do Par __________________________________________ Prof. Maria Cristina Alves Maneschy - Membro Doutora em Sociologia Universidade Federal do Par ___________________________________________ Prof. Gutemberg Armando Diniz Guerra - Membro Doutor em Scio Economia do Desenvolvimento Universidade Federal do Par
4
Aos meus pais, Ney e Graa pelo amor e entusiasmo. Ao Daniel, pela pacincia, carinho e incentivos sempre constantes.
5
AGRADECIMENTOS
A Deus, pelo dom da vida.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Srgio Cardoso de Moraes, pelos ensinamentos recebidos, pelo apoio e dedicao oferecidos durante a realizao deste trabalho.
A coordenao do PPGEDAM.
Ao Prof. Dr. Daniel dos Santos Fernandes, pela avaliao e sugestes dadas ao trabalho.
A banca de qualificao, Prof. Dr. Maria Cristina Maneschy e Prof. Dr. Gutemberg Armando Guerra, por todas as correes e sugestes para a finalizao deste trabalho. E a todos os professores que direta ou indiretamente contriburam para este trabalho.
Ao quadro tcnico do NUMAUFPA, sempre prontos para ajudar.
Aos meus pais pelos preceitos de idoneidade e solidariedade e acima de tudo, respeito pelo ser humano.
Aos meus irmos que indiretamente contriburam para a concretizao deste.
A D. Carmen por disponibilizar sua residncia durante o perodo da pesquisa.
A todos os Pescadores Extrativistas do Manguezal da Vila Sorriso, que muito contriburam com seus conhecimentos para a realizao dessa pesquisa. Muito obrigada pelo apoio, acolhimento e sempre dispostos a contribuir.
E a todos os outros que direta ou indiretamente foram indispensveis na realizao deste trabalho.
6
Tudo quanto a cincia descobre, a natureza j ensinou h muito tempo.
(Francisco Lucas da Silva)
7
RESUMO
A pesquisa trata da relao entre ser humano e natureza, tendo como foco a
comunidade Vila Sorriso, situada a 7,5 km da sede do municpio de So Caetano de
Odivelas no Estado do Par. Objetiva identificar dentre os pescadores extrativistas
do manguezal, os modos de vida como subsistncia, seus saberes e prticas em
relao ao uso do manguezal e propor aes que possam reduzir os impactos
negativos no ecossistema local. O procedimento metodolgico obedece trs etapas,
sendo a primeira o levantamento bibliogrfico, a segunda uma abordagem da
pesquisa de campo com entrevistas, observaes dos modos de vida, a utilizao
do ecossistema de manguezal a partir dos conhecimentos locais e a terceira etapa a
sistematizao de todo conhecimento adquirido pelos pescadores extrativistas,
levando em considerao os modos de vida e os saberes e prticas da comunidade
pesqueira extrativista. Foi identificado que na referida comunidade so utilizadas trs
tcnicas de captura do Ucides cordatus L.1763: a do lao, a tcnica da tapagem e a
tcnica do soco, brao ou muque. Essas tcnicas de captura foram analisadas e
trabalhadas junto comunidade com base na legislao ambiental nacional e
estadual, visando a insero da legislao com os extrativistas, fomentando o
desenvolvimento local e a conservao do ecossistema de manguezal. A partir das
observaes, anlises, interpretaes e sistematizaes, a pesquisa discorre sobre
a sustentabilidade local e junto com os pescadores extrativistas, prope algumas
aes para a conservao do ecossistema local, como: estudar as galerias do
Ucides cordatus L., 1763, para disseminao do conhecimento do sexo e do
tamanho do animal antes da captura; capacitar os pescadores extrativistas, atravs
de reunies, cursos e oficinas, para sensibilizao na tcnica do lao, para liberao
do crustceo que no pode ser comercializado, e estimular a participao dos
extrativistas na colnia de pescadores local na qual so filiados, para serem
beneficiados com o seguro defeso.
Palavras-Chave: Conservao. Manguezal. Sustentabilidade. Desenvolvimento
local. Subsistncia.
8
ABSTRACT
The research treats of the relationship between human being and nature, tends
in focus the community of Vila Smile, located to 7,5 km of the headquarters of the
municipal district of So Caetano of Odivelas, State of Par. Lens to identify among
the extraction fishermen in the mangroves, the life manners as subsistence, yours
know and practices in relation to the uses of the mangroves and to propose actions
that can reduce the negative impacts in the local ecosystem. The methodological
procedures obey in three stages, being the first the bibliographical rising, Second
stage approach of the field research with interviews, observations of the life manners,
the use of the mangroves ecosystem starting from the local knowledge and the third
stage the systematisation of every acquired knowledge for the extraction fishermen,
taking in consideration the life manners and you know them and the extraction fishing
community's practices. It was identified that in the referred community three
techniques of capture of the Ucides cordatus are used L.1763: the one of the bow,
the technique of the tapagem and the technique of the punch, arm or muscles. Those
capture techniques were analyzed and worked the community close to with base in
the legislation, seeking the insert of the legislation with the extrativists, fomenting the
local development and the conservation of the mangrove ecosystem. It starting from
the observations, analyses, interpretations and systematizations, the research
discourses on the local sustainability and with the extrativists fishermen, it proposes
some actions for the conservation of the local ecosystem, as: to study the galleries of
the Ucides cordatus L., 1763, for dissemination of the knowledge of the sex and of
the size of the animal before the capture; to qualify the extrativists fishermen, through
meetings, courses and workshops, for awareness in the technique of the lace, for
liberation of the crustacean that cannot be marketed and to stimulate the participation
of the extrativists in the local colony of fishermen in the which they are enrolled, in
manner they be benefitted with the defeso insurance.
Keywords: Conservation. Mangrove. Sustainability. Local development.
Subsistence.
9
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Fotografia de Satlite da regio de So Caetano de Odivelas....... 21
Figura 2: Rodovia PA 140 no municpio de So Caetano de Odivelas.......... 22
Figura 3: Fotografia de Satlite da regio da Vila Sorriso.............................. 24
Figura 4: Ramal: Vila Sorriso......................................................................... 25
Figura 5: Ecossistema Manguezal em So Caetano de Odivelas................. 29
Figura 6: Parte adaxial e abaxial da folha de Rhyzophora mangle L............. 31
Figura 7: Fruto de Rhyzophora mangle L....................................................... 31
Figura 8: Raiz de Rhyzophora mangle L........................................................ 32
Figura 9: Partes da folha de Avicennia schaueriana S. & Lechman ex Mold. 32
Figura 10: Fruto de Avicennia schaueriana Stapft & Lechman ex Mold.......... 33
Figura 11: Razes de Avicennia schaueriana Stapft & Lechman ex Mold....... 33
Figura 12: Incndio no manguezal da PA 140 em So Caetano de Odivelas. 35
Figura 13: Situao atual do manguezal da rodovia PA-140........................... 36
Figura 14: Ucides cordatus L., 1763 macho..................................................... 39
Figura 15: Ucides cordatus L., 1763 fmea..................................................... 40
Figura 16: Confeco dos cofos....................................................................... 49
Figura 17: Os primeiro passos no manguezal.................................................. 50
Figura 18: Conhecimento passado de me para filha...................................... 51
Figura 19: Casa do atravessador da Vila Sorriso............................................. 55
Figura 20: Moradia construda com palmeira do aaizeiro e telhas de barro.. 56
Figura 21: Moradia de pescador extrativista na Vila Sorriso............................ 56
10
Figura 22: Pote: armazena gua nas moradias dos pescadores extrativistas. 57
Figura 23: Fogo de barro na casa de pescador extrativista........................... 58
Figura 24: Rancho: casa onde esperam o momento exato para a pesca........ 58
Figura 25: Colnia de Pescadores Z-04........................................................... 59
Figura 26: Fio de nilon para confeco de lao............................................. 62
Figura 27: Confeco do lao com fio de nilon e madeira medindo aproximadamente 30 cm.......................................................................
63
Figura 28: Montando um lao........................................................................... 63
Figura 29: Laos armazenados........................................................................ 64
Figura 30: Colocao do lao no manguezal................................................... 65
Figura 31: Identificao especfica da regio do lao...................................... 66
Figura 32: Despesca do Ucides cordatus L.,1763........................................... 67
Figura 33: Procurando galerias do Ucides cordatus L.,1763........................... 68
Figura 34: Galeria do Ucides cordatus L.,1763................................................ 68
Figura 35: Sapato utilizado na tcnica da tapagem......................................... 69
Figura 36: Preparao para a tcnica da tapagem.......................................... 69
Figura 37: Tcnica da tapagem........................................................................ 70
Figura 38: Tapagem da galeria do Ucides cordatus L.,1763........................... 71
Figura 39: Ucides cordatus L.,1763 capturado na tcnica da tapagem........... 71
Figura 40: Braceira confeccionada com tecido de algodo............................. 72
Figura 41: Apetrechos de proteo para a tcnica do brao .......................... 73
Figura 42: Introduzindo o brao na galeria....................................................... 74
Figura 43: Tcnica do brao, soco ou muque.................................................. 75
11
Figura 44: Captura do caranguejo-u na tcnica do brao............................ 75
LISTA DE ILUSTRAES
Grfico 1: Moradores da Vila Sorriso........................................................... 26
Grfico 2: Domiclios da Vila Sorriso........................................................... 27
Grfico 3: Pescadores extrativistas do manguezal da Vila Sorriso............. 41
Grfico 4: Gnero dos Pescadores extrativistas da Vila Sorriso................. 45
Desenho 1: Ecossistemas aquticos da regio da regio da Vila Sorriso..... 53
Desenho 2: Manguezais da regio da Vila Sorriso......................................... 54
Quadro 1: Funes do capataz da Colnia de Pescadores Z-04................ 43
Quadro 2: Diagrama das funes do capataz da Colnia de Pescadores
Z-04.............................................................................................
60
Quadro 3: Tcnicas de captura do Ucides cordatus L.,1763, utilizadas com mais freqncia anualmente................................................
76
Quadro 4: Tcnicas de captura utilizadas com mais freqncia em cada
fase da lua...................................................................................
78
12
SUMRIO
1 INTRODUO.......................................................................................... 13
1.1 INTERESSE PELO ESTUDO.................................................................... 13
1.2 O PROBLEMA E HIPTESES.................................................................. 14
1.3 OBJETIVOS............................................................................................... 15
1.3.1 Geral........................................................................................................ 15
1.3.2 Especficos............................................................................................... 15
1.4 PROCEDIMENTOS METODOLGICOS.................................................. 16
2 APRESENTAO DA REGIO E CAMPO DE ESTUDO....................... 20
2.1 O MUNICPIO DE SO CAETANO DE ODIVELAS.................................. 20
2.2 A VILA SORRISO...................................................................................... 22
3 O ECOSSISTEMA MANGUEZAL E A POPULAO PESQUEIRA
EXTRATIVISTA.........................................................................................
28
3.1 O MANGUEZAL......................................................................................... 28
3.1.1 Conceitos e Definies........................................................................... 28
3.1.2 Morfologia Botnica................................................................................ 30
3.1.3 A Importncia do Manguezal.................................................................. 34
3.1.4 Impactos Negativos nos Manguezais.................................................... 34
3.2 Ucides cordatus L., 1763........................................................................... 37
3.3 PANORAMA SOCIAL................................................................................ 41
3.3.1 Os pescadores extrativistas do manguezal da Vila Sorriso................ 41
3.3.2 Modos de vida dos pescadores extrativistas do manguezal.............. 45
13
3.3.3 A tradio passada de gerao a gerao: o extrativismo e o cofo... 47
3.3.4 O conhecimento quanto o espao......................................................... 51
3.3.5 As casas................................................................................................... 55
3.3.6 Relao com a Colnia de Pescadores Z-04......................................... 59
4 MODOS DE EXTRATIVISMO: SABERES E PRTICAS DA
COMUNIDADE PESQUEIRA LOCAL......................................................
62
4.1 TCNICAS DA CAPTURA DO Ucides cordatus
L.,1763.......................................................................................................
62
4.1.1 Armao do lao...................................................................................... 62
4.1.2 A tapagem................................................................................................ 68
4.1.3 O soco, brao ou muque......................................................................... 72
4.2 O PERODO DE EXTRAO DO Ucides cordatus L.,1763..................... 76
5 SUSTENTABILIDADE DO ECOSSISTEMA DE MANGUEZAL............... 79
5.1 PRESERVAO, CONSERVAO OU UMA POSSVEL
SUSTENTABILIDADE...............................................................................
79
5.2 A LEGISLAO VIGENTE E A ATUAL CAPTURA.................................. 82
5.3 PROPOSTAS QUE PODEM REDUZIR OS IMPACTOS NEGATIVOS
NO MANGUEZAL......................................................................................
87
6 CONSIDERAES FINAIS...................................................................... 88
REFERNCIAS.................................................................................................... 90
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA............................................................................ 94
APNDICES......................................................................................................... 97
ANEXOS............................................................................................................... 102
14
1 INTRODUO
1.1 INTERESSE PELO ESTUDO
A necessidade de repensar constantemente prticas que viabilizem a melhoria
da qualidade de vida, com menor impacto possvel no meio ambiente, buscando
fixar o homem a seu espao vivencial, o pensamento mais coerente para a
soluo de problemas ambientais.
Tendo a zona costeira como um dos biomas mais importantes, procura-se
trabalhar seus ecossistemas que so fundamentais para a vida marinha e estuarina,
sendo que nesta pesquisa d-se enfoque populao que vive diretamente dos
recursos naturais extrados do manguezal e suas relaes com este ecossistema.
Neste sentido o municpio de So Caetano de Odivelas pertencente ao estado
do Par foi escolhido, por estar situado em sua maior parte em rea de manguezal.
Segundo a legislao brasileira esta rea considerada rea de Preservao
Permanente (APP), em que possui vrios meios de proteo atravs de leis federais,
estaduais e municipais. Alm do acervo do ecossistema de manguezal o municpio
tambm conhecido como a Terra do caranguejo-U.
Desta forma foi selecionada a comunidade Vila Sorriso por ser considerada na
regio uma das comunidades que depende diretamente da coleta de crustceo,
especificamente do Ucides cordatus L., 1763 conhecido como caranguejo-u. A
populao que trabalha na coleta do caranguejo, vinculada Colnia de Pescadores
Z-04 situada na sede do municpio, chamada de Pescador (a) Extrativista do
Manguezal.
Identificar a populao que trabalha diretamente no ecossistema manguezal,
conhecer os saberes, as prticas e os modos de uso deste ecossistema fazendo
relao com as questes de conservao e sensibilizao ecolgica, propondo
aes que reduzam os impactos negativos nos recursos naturais da rea de
manguezal local, visando sua utilizao sustentvel so os objetivos desta pesquisa.
15
1.2 O PROBLEMA E A HIPTESE
Neste trabalho, procura-se abarcar a relao entre ser humano e natureza a
partir dos saberes e prticas locais para a conservao dos ecossistemas, pois o
mundo est sendo questionado sobre os problemas ambientais, levando a
movimentar todos os segmentos das sociedades em direo a conservao da
biodiversidade.
Neste sentido, quais poderiam ser seus desdobramentos no destino dos seres
vivos? A partir desta problemtica global, muitos caminhos esto sendo analisados
partindo das necessidades de repensar constantemente prticas que viabilizem a
melhoria da qualidade de vida, com menor impacto possvel no meio ambiente,
buscando fixar o homem em seu espao vivencial, o pensamento mais coerente
para a soluo de alguns problemas ambientais.
Levando em considerao estes desdobramentos mundiais necessrio que
se faa anlises locais, focalizando no problema desta pesquisa, em que o grande
questionamento : De que maneira os saberes e prticas das populaes
pesqueiras extrativistas da regio do municpio de So Caetano de OdivelasPA,
podem influenciar na conservao do ecossistema do manguezal local?
A partir desta pergunta foram construdas suposies, admitindo a hiptese
bsica e as hipteses secundrias, baseadas em bibliografia que mostra as
necessidades de proteger os ecossistemas do litoral do Brasil, onde um dos mais
importantes e mais frgeis o ecossistema de manguezal. Segundo Mann (1970, p.
45) as dedues propostas nas hipteses no so comprovadas, por isso no se
sabe se essas dedues esto certas e quando se apresenta as idias oriundas de
bases tericas que a hiptese exerce a sua funo.
O fundamental nas hipteses que elas procuram selecionar as teorias, de
maneira que trazem as consideraes mais refinadas de pesquisas que s tenham
sidas exploradas de maneira geral.
A hiptese bsica deste trabalho : admitindo que a superexplorao do
ecossistema de manguezal, advm dos modos de utilizao destes espaos, alguns
saberes e prticas tradicionais podem fomentar a proteo dos recursos naturais
deste ecossistema.
16
A partir das dedues da hiptese bsica, foi necessrio criar duas hipteses
secundrias, a primeira que supondo que o ecossistema de manguezal da zona
costeira brasileira necessita com urgncia de um elo entre a gesto governamental e
os conhecimentos daqueles que sobrevivem deste ecossistema, objetiva-se a
contribuio para a conservao da biodiversidade e a estabilidade do espao
utilizado pelas populaes pesqueiras extrativistas.
A segunda hiptese secundria leva em considerao, a busca por resultados
diferenciados para o problema da pesquisa. Assim tem-se como hiptese secundria
que na percepo global sobre o aumento da degradao dos ecossistemas
costeiros do Brasil para diversos fins, busca-se o incentivo para o desenvolvimento
sustentvel a partir dos modos de ocupao e utilizao deste bioma.
As hipteses propostas neste trabalho se constituem em respostas supostas e
provisrias ao problema desta pesquisa, e serviro de indicadores para a viabilidade
da pesquisa.
1.3 OBJETIVOS
1.3.1 Objetivo Geral
Analisar os saberes e prticas da populao pesqueira extrativista da Vila
Sorriso, e sua relao com a conservao dos ecossistemas de manguezais.
1.3.2 Objetivos Especficos
Identificar os pescadores extrativistas do manguezal e os modos de
extrativismo no ecossistema;
Verificar e conhecer as prticas e saberes da comunidade pesqueira para
fomentar o uso sustentvel no manguezal local;
Propor aes que reduzam os impactos negativos nos recursos naturais da
rea de manguezal local;
17
1.4 PROCEDIMENTOS METODOLGICOS
Determinar como desenvolver as atividades para chegar aos resultados
fundamental para a execuo das pesquisas, ou seja, qual o caminho a percorrer
para um determinado fim. Seguindo este enfoque nos procedimentos metodolgicos
desta pesquisa foi necessrio dividi-los em 3 (trs) etapas, denominadas: 1.
Fundamentao terica, 2. Observao dos modos de extrativismo dos recursos
naturais e 3. Sistematizao dos conhecimentos locais para o fomento do uso
sustentvel em rea de manguezal.
A primeira etapa iniciou com levantamento bibliogrfico a partir de material j
publicado sobre a essncia deste trabalho levando em considerao os objetivos
geral e especficos baseados nas prticas de conservao, preservao, impactos
ambientais na zona costeira, problemtica socioambiental e modos de vida das
populaes locais.
Esta etapa da fundamentao terica foi utilizada at o final da pesquisa, pois a
base terica fundamental para a sistematizao de uma problemtica e
conseqentemente uma possvel proposta para a melhoria da qualidade de vida e
proteo do ecossistema em estudo.
A partir da primeira etapa, tornou-se necessrio o trabalho de campo, estudo de
campo, pesquisa de campo, termos estes utilizados por antroplogos, para se
contrapor aos trabalhos com tcnicas comparativas de gabinete (BROW, 1980
apud HAGUETTE, 2005).
Assim como afirma Haguette (2005) para deixarem de lado as tcnicas
semelhantes na abordagem do real e especialmente no valor que alocarem
participao do pesquisador no local pesquisado, e a necessidade de ver o mundo
atravs dos olhos do pesquisador.
A partir deste enfoque, fez-se necessrio a segunda etapa denominada
observao dos modos de extrativismo dos recursos naturais. Baseada nos
objetivos especficos, esta etapa teve como foco principal a observao dos modos
de vida, dos saberes e das prticas tradicionais utilizadas por estes pescadores
extrativistas do manguezal, atravs de visitas comunidade.
18
As visitas na Vila Sorriso foram feitas nos meses de Outubro, Novembro e
Dezembro de 2010 e Junho, Agosto e Novembro de 2011, acompanhando os
pescadores extrativistas at o manguezal, observando os horrios de atividade,
todas as maneiras de utilizao do ecossistema e os modos de vida da populao
em questo, coletando de diversas maneiras toda informao possvel para
posteriormente analis-las.
Nesta fase da pesquisa foram feitas entrevistas que segundo Haguette (2005)
o processo de interao social entre duas pessoas na qual uma delas, o
entrevistador, tem por objetivo a obteno de informaes por parte do outro, o
entrevistado. Assim como as aplicaes de questionrios na comunidade.
Desta forma, para Haguette (2005) esta tcnica utilizada nesta fase chamada
de observao participante, pois
A observao participante no supe nenhum instrumento especfico para direcionar a observao, tal como um questionrio ou um roteiro de entrevista, e, por esta razo, a responsabilidade e seu sucesso pesa quase que inteiramente sobre os ombros do observador salvo, obviamente, naqueles aspectos que so fontes de vieses e que emanam do exterior, ou seja, da prpria situao da observao.
Segundo Mann (1970) observao participante geralmente refere-se a uma
situao onde o observador fica to prximo quanto um membro do grupo que ele
est estudando e participa das atividades normais deles. Por isto nesta etapa foi
utilizada a tcnica da observao participante, onde h pouca interferncia do
pesquisador.
Foi observada a relao dinmica entre a populao pesqueira extrativista e os
recursos naturais, dando-se enfoque para a metodologia qualitativa e quantitativa
nas entrevistas e nos formulrios (APNDICE A).
Foi levado em considerao o nmero de moradores total da comunidade e
priorizados os pescadores extrativistas do manguezal nas questes de gnero,
tcnicas de captura, modos de vida, tipos de moradias, renda familiar e per capita,
quantidade coletada diariamente e mensal do caranguejo-u e o preo unitrio do
crustceo para anlises e aplicaes estatsticas voltadas para a conservao do
ecossistema manguezal local.
19
Esta etapa foi de extrema necessidade para que a terceira etapa pudesse ser
viabilizada, pois acreditava-se que primeiramente fosse necessrio conhecer a
populao local a ser pesquisada, buscando certo grau de confiana para chegar
sistematizao da pesquisa, que o objetivo da 3 etapa.
Partindo do pressuposto que a metodologia o estudo do caminho para se
chegar natureza do problema e a averiguao das hipteses da pesquisa, faz-se
necessrio uma terceira etapa, para chegar ao princpio da sistematizao:
observao, classificao e interpretao, para uma possvel concluso da
pesquisa. Nesta ltima etapa se fez uso do mtodo da pesquisa-ao, pois esta fase
tem como objetivo de acordo com Haguette (2005 apud OLIVEIRA; OLIVEIRA,
1983)
Uma proposta poltico-pedaggica que busca realizar uma sntese entre o estudo dos processos de mudana social e o envolvimento do pesquisador na dinmica mesma destes processos. Adotando uma dupla postura de observador crtico e de participante ativo, o objetivo do pesquisador ser colocar as ferramentas cientficas de que dispe a servio do movimento social com que est comprometido.
A 3 etapa denominada Sistematizao dos conhecimentos locais para o
fomento do uso sustentvel em rea de manguezal. Partindo do bioma zona
costeira onde o manguezal em estudo est localizado, busca-se propor alternativas
para a comunidade.
Em busca da gesto participativa, para o fomento do desenvolvimento local
fixando a idia de sustentabilidade a partir do que Barqueiro (1999) identifica-se pelo
menos trs dimenses para alcanar o desenvolvimento sustentvel: uma
econmica, a partir do sistema especfico de produo, que permite aos empresrios
locais utilizar eficazmente os fatores produtivos; outra dimenso sociocultural, em
que os atores econmicos e sociais se integram com as instituies locais, neste
caso a colnia de pescadores Z-04, formando uma rede de relaes que incorporam
os valores da sociedade; e outra a dimenso poltica, que direcionada pelas
iniciativas locais e que permite criar um entorno local que estimule o
desenvolvimento local.
20
Nesta etapa atravs das entrevistas e dos resultados dos dados, busca-se um
dilogo com a comunidade, em que os pescadores da Vila Sorriso participaro
ativamente no processo de formao das aes, nas avaliaes dos resultados e na
formao de propostas visando a melhoria da qualidade de vida, fomentando a
proteo, a conservao, o manejo dos recursos naturais do ecossistema de
manguezal, minimizando os impactos socioambientais atravs de atitudes que
solidifiquem uma gesto ambiental junto colnia de pescadores Z-04, qual os
pescadores (as) extrativistas da Vila Sorriso pertencem.
21
2 APRESENTAO DA REGIO E CAMPO DE ESTUDO
2.1 O MUNICPIO DE SO CAETANO DE ODIVELAS
Os fundamentos histricos deste municpio foram lanados na era colonial,
pelos jesutas quando desbravaram a regio, atravs do rio Mojuim. No local onde
se encontra a atual sede municipal, fundaram uma fazenda denominada So
Caetano, a qual mais tarde, ficara sob a administrao de prepostos do Governo
(IBGE, 2007).
Texto da Biblioteca do IBGE (2010) afirma que em 1755 a localidade foi
elevada Freguesia com o nome de So Caetano de Odivelas e, em 1757 foi criado
como distrito, sendo que em 1833, passou a fazer parte do territrio de Vigia. Em
1872, a sede da ento freguesia recebeu predicado de Vila.
Nessa ocasio, foi criado o municpio, que se instalou em 1874. Entretanto com
a extino sofrida em 1930, o seu territrio fora anexado ao dos municpios de
Curu e de Vigia, dos quais trs anos depois se desmembrou, onde em 1935 se
emancipou poltico administrativamente.
O Municpio de So Caetano de Odivelas se localiza na Costa Atlntica do
Estado do Par, na Mesorregio do Nordeste Paraense, Microrregio do salgado,
distante da capital do Estado 93 km em linha reta e 120 km pela rodovia, possuindo
uma rea de 743km com 16.891habitantes (IBGE 2010).
Situa-se entre as sedes dos municpios de Santo Antnio do Tau e Vigia de
Nazar. A figura 1 mostra a localizao, no estado do Par, da regio do municpio
de So Caetano de Odivelas, a partir da captura da imagem de satlite
geoestacionrio. Nesta imagem, pode-se observar a situao geogrfica da cidade e
perceber a proximidade do Oceano Atlntico o que reflete nas guas do rio Mojuim.
Este rio banha o municpio e constitui um ecossistema rico, composto por
diversificadas espcies de fauna e flora.
22
Figura 1- Foto de Satlite da regio de So Caetano de Odivelas.
Disponvel em: http://www.google.com/gadgets/directory?pid=earth&synd=earth&cat=featured&hl=pt-BR&gl=br Acesso: 14 de Maio de 2011.
http://www.google.com/gadgets/directory?pid=earth&synd=earth&cat=featured&hl=pt-BR&gl=brhttp://www.google.com/gadgets/directory?pid=earth&synd=earth&cat=featured&hl=pt-BR&gl=br
23
Figura 2- Rodovia PA 140, portal que d acesso ao municpio de So Caetano de
Odivelas.
Foto: Neila Almeida, 2011.
2.2 A VILA SORRISO
Durante as pesquisas de campo foi feito um levantamento a partir de
entrevistas com os moradores da Vila Sorriso sobre a origem da comunidade, que
se deu a partir da chegada da energia eltrica na comunidade, que em contato via e-
mail com a rede CELPA aconteceu em 09 de Janeiro de 2007(ANEXO A).
Para estes levantamentos sobre a origem da comunidade foram entrevistados
moradores com mais de 30 anos e que j residem no local h mais de 10 anos.
Nesta poca a Vila Sorriso pertencia Vila de Boa Vista do Camap. Foi averiguado
que no perodo que a energia eltrica chegou regio, somente os moradores
residentes na sede de Boa Vista do Camap foram beneficiados, os outros
moradores no contemplados procuraram o rgo competente para reclamar da
falta de energia, mas constava no sistema que a Villa de Boa Vista do Camap j
tinha sido beneficiada com a energia eltrica, porm a regio da atual Vila Sorriso
continuava na escurido.
24
Segundo os entrevistados um senhor chamado Jacob Guedes Valentin, que
residia na Vila do Alto Perer localizada prxima a VilaSorriso, tinha vrias aes
sociais desde a dcada de 80 nas comunidades, uma dessas aes era a Creche
MARANATA, que acolhia crianas de 3 a 6 anos de idade, onde ficavam das 8:00
horas de segunda-feira at as 18:00 horas de sexta-feira em uma espcie de
internato. Na creche as crianas tinham acesso a Educao Infantil por professores
contratados e pagos pelos fundos que a creche recebia, j que Jacob Valentim tinha
uma rede de contatos com polticos.
Desta forma, como Jacob Valentim tinha interesse na candidatura para prefeito
nas eleies de 2005, em 2003 se mobilizou para resolver o problema da energia
eltrica com ajuda do ento Governador do estado do Par Almir Gabriel. Procurou
os meios legais, porm com uma condio, a regio que no tinha sido contemplada
com a energia eltrica tinha que ser dada como uma Vila, e no apenas como uma
parte da Vila de Boa Vista, pois esta comunidade j havia sido beneficiada
legalmente. Desta forma foi necessrio renomear parte da Vila Boa Vista do
Camap, que recebeu o nome de Vila Sorriso. Jacob Valentim foi eleito a prefeito do
municpio de So Caetano de Odivelas em 2005, assumiu em 2006 e faleceu em
2007, sendo substitudo pelo vice-prefeito Rubens Barbalho.
A Vila Sorriso est localizada aproximadamente 7,5 Km da sede do municpio,
a Vila Sorriso caracteriza-se pelo ecossistema de manguezal em seu entorno, por
sua fauna e flora nativa da regio da costa Amaznica e pela populao pesqueira
extrativista.
Situa-se s margens da estrada que liga sede do municpio a Vila de Boa
Vista do Camap, distribuindo-se em 1350 m da estrada (Figura 3), com
diversificados tipos de moradias.
Na regio onde est localizada a Vila Sorriso, pode ser observada uma grande
extenso de rea verde, composta por diversificados ecossistema com
predominncia do manguezal.
nesta rea que a comunidade sorriense extrai os recursos naturais, em
abundncia o caranguejo-U. Nesta regio tambm so encontradas as palmeiras
25
de onde retiradas as folhas para a confeco dos cofos para condicionamento do
caranguejo.
Figura 3- Foto de Satlite da regio da Vila Sorriso
Disponvel em: http://www.google.com/gadgets/directory?pid=earth&synd=earth&cat=featured&hl=pt-BR&gl=br Acesso: 14 de Maio de 2011.
_________________________
Cesto feito com folhas de palmeiras tpicas da regio, utilizado para armazenar caranguejo.
http://www.google.com/gadgets/directory?pid=earth&synd=earth&cat=featured&hl=pt-BR&gl=brhttp://www.google.com/gadgets/directory?pid=earth&synd=earth&cat=featured&hl=pt-BR&gl=br
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Atualmente a comunidade composta por setenta e sete residncias
distribuda s margens do ramal (Figura 4) que liga a Vila de Perer Vila de Boa
Vista do Camap. Desse total de residncias, cinco no esto ocupadas, pois
pertencem a pessoas que nasceram na comunidade, mas residem na sede do
municpio e na capital do estado.
Este trecho no possui pavimentao, e segundo os moradores no perodo
chuvoso alaga e no perodo que no chove a poeira toma conta do ramal. Na figura
4 pode ser observado, que neste permetro o mato toma conta das laterais do ramal.
Figura 4- Ramal: Vila Sorriso
Foto: Neila Almeida, 2011.
Para obter informaes sobre o nmero de habitantes e atividades
desenvolvidas na comunidade, foram aplicados formulrios em setenta e duas
residncias, em que apenas o chefe da famlia, pai ou me, eram entrevistados.
A partir da aplicao dos formulrios, foi identificado que a Vila Sorriso possui
uma populao de trezentos e quarenta e dois habitantes entre crianas, jovens e
adultos com nvel de escolaridade entre ensino fundamental completo, incompleto e
analfabetismo. Foi identificado que todos os jovens e adultos que residem na
comunidade tm alguma relao com o sistema pesqueiro.
A comunidade possui uma populao de cento e oitenta e uma pessoas do
sexo masculino e cento e sessenta e uma do sexo feminino (Grfico 1). Neste
grfico pode-se observar que a diferena do nmero de habitantes do sexo
27
masculino para o sexo feminino de apenas vinte habitantes, por esse motivo pode-
se explicar a presena de mulheres na maioria das atividades.
Apesar desses dados no fugirem do senso demogrfico brasileiro, vale
ressaltar que na comunidade comum encontrar mulheres nas atividades de
capinao de ruas, limpezas de quintal e principalmente atividades ligadas com a
pesca; o que no acontece em outros espaos, pois em muitos lugares essas
atividades so consideradas servios de homens, bem diferente da realidade dos
moradores da Vila Sorriso.
Grfico 1- Moradores da Vila Sorriso
FonteDados: Microsoft ExcelPesquisa de Campo
Esses moradores distribuem-se em setenta e duas residncias, onde houve a
aplicao dos questionrios (Grfico 2), os 6% dos domiclio no entrevistados
correspondem aos domiclios de moradores que por alguma razo no residem na
comunidade e que atualmente vivem sede do municpio e na capital do Par, porm
freqentam a Vila Sorriso no perodo das frias escolares, mas tem alguma relao
de parentesco com a populao local.
Os 94% so os moradores considerados habitantes regulares da comunidade,
pois residem durante o ano todo naquele local.
28
Grfico 2- Domiclios entrevistados na Vila Sorriso
FonteDados: Microsoft ExcelPesquisa de Campo
29
3 O ECOSSISTEMA MANGUEZAL E A POPULAO PESQUEIRA EXTRATIVISTA
3.1 O MANGUEZAL
3.1.1 Conceitos e Definies
O litoral brasileiro apresenta a mais extensa rea de ecossistema de
manguezal do mundo, possuindo cerca de 25.000 km que se estende desde o
Amap at Santa Catarina de Norte a Sul do Brasil, sendo que a maior concentrao
est nos estados do Amap, Par e Maranho. (UICN, 1983).
Segundo Vannucci (2002) o primeiro uso da palavra mangue que a autora pde
encontrar foi em uma carta de Lopo-Homem-Reineis, datada de 1519, na qual a o
termo mamguez ( que era uma ortografia antiga do plural da palavra mangue)
indicava uma rea do golfo dos Reyes, hoje conhecido como Angra dos Reis,
localizada a oeste e ao sul da cidade do Rio de Janeiro.
A palavra mangle, tambm foi usada neste mesmo ano pelos espanhis. J
Segundo Oxford (1613 apud VANUCCI, 2002), a palavra inglesa mangrove
derivado da palavra portuguesa mangue e do espanhol mangle. Analisar esses
conceitos tericos de referncia e agregar conceitos como mangue, que em
portugus, serve para designar as rvores, sendo a palavra manguezal utilizada
para designar o conjunto de rvores, ou seja, a comunidade em si, o ecossistema de
mangues, tendo a origem da palavra mangue (ou manguezal) e sobre a origem da
palavra mangrove em ingls.
O ecossistema de manguezal (Figura 5) designa um ecossistema formado por
uma associao muito especial de animais e plantas que vivem na faixa entremars
das costas tropicais baixas, ao longo de esturios, deltas, guas salobras interiores,
lagoas e lagunas. Na figura referida, pode ser observado um ecossistema de
manguezal, inundada pela mar cheia, pertencente ao municpio de So Caetano de
Odivelas, o que influencia na construo de um ecossistema com diversificadas
espcies faunsticas, constituindo uma estabilidade entre os fatores biticos e
abiticos.
30
Figura 5- Ecossistema Manguezal em So Caetano de Odivelas
Foto: Neila Almeida, 2010.
Existe o conceito de manguezal como uma floresta de mangue, entendido como
um ecossistema de transio entre a gua e a terra firme, sendo irrigada por uma
infinidade de pequenos canais diariamente inundados pelas guas costeiras
(ALVES, 2004).
Reforando o conceito de manguezal como floresta, Isaac et al. (2003)
apontam o ecossistema de manguezal correspondente a um ambiente de floresta,
composto por poucas espcies de flora, que so resistentes a muitos perodos de
inundao e altos teores salinos, possuem uma fauna associada de grande
biodiversidade e conseqentemente inmeros grupos taxonmicos.
Nesta rea de terra costeira, sujeita a mars, inundada perenemente por uma
mistura de gua doce e gua salgada, ou seja, na regio estuarina, proliferam fauna
e flora caractersticas dos habitats palustres (SOARES, 2005).
Estes conceitos vem sendo estudados por muitos pesquisadores, onde
Vannucci (2002), resume em poucas palavras:
Colocando-se tudo junto a floresta, as guas e o solo -, no se constri o ecossistema manguezal; necessrio muito mais para constituir um ecossistema. O ar, com sua carga de poeira e umidade, insetos, pssaros e morcegos, plncton areo, odores, aromas e feromnios, tambm um constituinte importante do ecossistema e sobre o qual pouco se sabe.
31
3.1.2 Morfologia Botnica
Nas Amricas as florestas de mangue so geralmente formadas por vrias
espcies, na Amaznia brasileira podem ser encontradas vrias espcies como:
Rhizophora mangle L. (espcie dominante), Rhizophora racemosa G.F.W. Mayer,
Rhizophora barrisonii Leechman, Avicennia germinans L. Stearn, , Laguncularia
racemosa (L.) Gaertn, Avicennia schaueriana Stapft & Leechman ex Mold. e
Conocarpus erectus L., alm de vrias espcies associadas (SENNA; MELO, 1994).
Os recursos hdricos pertencente ao municpio de So Caetano de Odivelas
encontram-se no sentido sul-norte, desaguando no Atlntico. O rio Mojuim que
banha a sede odivelense, o mais importante, porque forma toda a bacia
hidrogrfica do Municpio; aps entrar em territrio de So Caetano, a sudeste,
segue em direo norte e desgua no Atlntico, banhando a vila Perseverana e o
povoado do Porto Guarajuba, que hoje, pertence ao municpio de So Joo da
Ponta, mas antes fazia parte do territrio do municpio odivelense.
Destaca-se, tambm, o rio Mocajuba, que banha alm do municpio de So
Joo da Ponta, a vila de Boa Vista do Camap, prximo Vila Sorriso, localizada no
municpio de So Caetano de Odivelas e serve de limite natural, a leste, com o
municpio de Curu; e o rio Barreta, a noroeste, que verte para o Atlntico e serve
de limite natural com o municpio de Vigia de Nazar (SEPOF, 2008 apud MACIEL,
2009).
Segundo Almeida (2009) esses recursos hdricos esto diretamente associados
do desenvolvimento da floresta de manguezal no municpio de So Caetano de
Odivelas, onde desenvolvem-se inmeras espcies arbreas, sendo as mais
comuns a Rhizophora mangle L. e a Avicennia schaueriana Stapft & Lechman ex
Mold.
Leva-se em considerao estudos anteriores de (Almeida, 2009) a partir de
algumas consideraes morfolgicas das folhas, frutos e raiz dessas espcies
predominantes na regio do municpio de So Caetano de Odivelas.
Rhizophora mangle L.
Folha: simples, rijas e coriceas, inteiras, levemente mais claras na face
inferior, pice obtuso, mas encontra-se do tipo retuso, sua forma obovada, mede
de 8 a 10 cm de comprimento (FERRI, 1978).
32
Figura 6- Parte adaxial e abaxial da folha de Rhyzophora mangle L.
Foto: Neila Almeida, 2010.
Fruto: so do tipo baga alongada, coricea, de cerca de 2,2 cm de
comprimento, pndulas e de cor acinzentada, contendo uma nica semente (VIDAL,
2000).
Figura 7- Fruto de Rhyzophora mangle L. conhecida popularmente como
caneta.
Foto: Neila Almeida, 2010
Raiz: Segundo Gonalves e Lorenzi (2007) a raiz originada de rizforo, que
uma estrutura de natureza caulinar na forma de um eixo lateral com geotropismo
positivo, que produz razes adventcias regularmente ao longo de seu crescimento.
33
Essas pseudoraizes ampliam a base da planta e com isso aumenta seu sistema
de fixao, o que lhe muito conveniente no solo movedio do mangue (FERRI,
1978).
Figura 8- Raiz de Rhyzophora mangle L.
Foto: Neila Almeida, 2011.
Avicennia schaueriana Stapft & Lechman ex Mold
Folhas: apresentam nervuras principal e secundrias, so coriceas por
apresentarem o limbo espesso e consistente, so esbranquiadas na parte abaxial
devido a presena de minsculas escamas, so opostas cruzadas simtricas,
obovadas, inteira, unilobada, possuem base cuneada, pice retuso com ngulo
obtuso e isero de pecolo marginal. Observa-se abaixo as duas faces adaxial e
abaxial respectivamente (VIDAL, 2000).
Figura 9- Parte adaxial e abaxial da folha de Avicennia schaueriana S. & Lechman ex Mold
Foto: Neila Almeida, 2009.
34
Fruto: apresentam geometria assimtrica.
Figura 10- Fruto de Avicennia schaueriana Stapft & Lechman ex Mold
Foto: Neila Almeida, 2009.
Raiz: De acordo com Gonalves (2007), as razes so horizontais e radiais a
poucos centmetros abaixo da superfcie, de onde surgem os pneumatforos.
Apresentam geotropismo negativo, crescendo para fora do solo encharcado. Seu
revestimento relativamente esponjoso, permitindo a difuso de oxignio,
constituem uns dos tipos de razes respiratrias.
Figura 11- Razes pneumatrficas de Avicennia schaueriana Stapft & Lechman ex Mold com geotropismo negativo.
Foto: Neila Almeida, 2010.
Com base nas pesquisas bibliogrficas e de campo, observou-se que a grande
maioria das rvores tpicas do manguezal apresentam reproduo por viviparidade,
35
ou seja, consiste na permanncia das sementes na rvore-me at que se
transformem em embries, chamando-se estas estruturas de propgulos que
acumulam reservas nutrientes para que sobrevivam por perodos longos at que
encontrem o local apropriado para fixao (FERRI, 1978).
3.1.3 A Importncia do Manguezal
Trabalhar conceitos, definies e morfologia so to importantes quanto relatar
a importnca desse ecossistema, como o de exercerem funes fundamentais como
berrio, meio nutritivo, centro de multiplicaes de numerosas espcies faunsticas,
fonte de recursos naturais e economia para as populaes costeiras (PROST;
LOUBRY, 2000 apud MENDES, 2003).
De acordo com Alves (2004) os manguezais eram tidos como reas insalubres e
sem valor desde a chegada dos colonizadores. Desde ento grande parte da
populao que migrava do campo para a cidade foi morar sobre as florestas de
mangue.
A pesca e a coleta dos recursos do manguezal constituram e constituem uma
fonte de subsistncia e econmica, muitas vezes nica para milhares de famlias ao
longo dos manguezais. Sabe-se que grupos indgenas coletavam moluscos e
crustceos e pescavam nos manguezais desde pelo menos 2 mil anos antes de
Cristo.
Os manguezais desempenham importante papel como exportador de matria
orgnica para o esturio, contribuindo para a produtividade primria na zona
costeira. no mangue que peixes, moluscos e crustceos encontram as condies
ideais para reproduo, berrio, criadouro e abrigo para vrias espcies de fauna
aqutica e terrestre, de valor ecolgico e econmico. inquestionavelmente
considerado um dos ecossistemas mais produtivos do planeta.
3.1.4 Impactos Negativos nos Manguezais
De acordo com (Jornal Dirio do Par, 2010), estudos realizados pelo
Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e pelo The Nature
36
Conservancy, apontam que a ao humana j destruiu 20% dos manguezais no
mundo em 30 anos.
Esses estudos podem ser confirmados a partir de um incndio que durou
aproximadamente 5 dias em um manguezal (Figura 12) s margens da rodovia PA
140 pertencente geograficamente ao municpio de So Caetano de OdivelasPA em
Dezembro de 2009.
O fogo comeou em uma rea particular nas proximidades do manguezal,
sendo que esta rea utilizada para pasto. O fogo se alastrou no manguezal,
destruindo aproximadamente uma rea de 400 m do ecossistema causando
prejuzos incalculveis ao ecossistema e populao que sobrevive da estabilidade
desta rea de Preservao Permanente.
Figura 12- Incndio no manguezal da PA 140 em So Caetano de Odivelas
Foto: Neila Almeida, 2009.
Este ecossistema possui dois tipos de estabilidade: a estabilidade de
resistncia e a estabilidade de elasticidade, onde a primeira est direcionada para a
capacidade que o ecossistema tem de se manter estvel diante do estresse e a
segunda est ligada com a capacidade do ecossistema se recuperar rapidamente
(ODUM, 1913).
Porm, dois anos se passaram e at hoje o que se v uma rea devastada
(Figura 13) sem estabilidade de resistncia e de elasticidade, pois a estabilidade
alcanada pelos ecossistemas vai depender da sua evoluo e de seus controles
37
internos, portanto quanto menor a explorao dos ecossistemas de manguezal,
maior ser sua estabilidade.
muito fcil perceber grandes exploraes dos recursos naturais em torno
dessa rea, com fazendas de gado. O que se sabe que ningum foi multado por
esse grande desastre ecolgico, os incndios em manguezais apenas um dos
inmeros fatores que prejudicam este ecossistema. Ainda no municpio de So
Caetano de Odivelas, existe a questo de ocupaes na frente, onde era para existir
manguezais, h construes de postos de gasolina, hotis, residncias e junto com
essas infra-estruturas, a poluio total do ecossistema.
No Brasil existem leis na esfera nacional, estadual e municipal que protegem os
manguezais, considerados rea de Preservao Permanente (APP) conforme o
Cdigo Florestal, a Lei 771 em seu artigo 2 de 17 de Setembro de 1965; tambm no
artigo 18 da Lei 6.938 de 31 de Agosto de 1981, pelo Decreto 89.336 de 31 de Abril
de 1984 e pela Resoluo n 04 do Conselho Nacional de Meio Ambiente
(CONAMA) de 18 de Setembro de 1985. Como so protegidos por Lei os
manguezais no podem sofrer nenhum tipo de destruio ou degradao por parte
do homem. Apesar da legislao, a realidade tem mostrado, a incapacidade de
conter grandes impactos negativos nessa regio.
Figura 13- Situao do manguezal da rodovia PA-140 em So Caetano de Odivelas 2 anos aps o incndio
Fonto: Neila Almeida, 2011.
38
3.2 Ucides cordatus L., 1763 (CARANGUEJO-U):
O Ucides cordatus L., 1763 conhecido popularmente como caranguejo-U,
representa um dos mais importantes componentes da fauna dos manguezais
brasileiros. Vive unicamente nos manguezais e pode ser encontrado ao longo da
costa brasileira, de Santa Catarina ao estado do Amap.
Constitui a fauna semi-terrestre, pois passa parte da vida (fase larval dentro
dgua). Vivem em longas galerias, sempre retas e relativamente rasas construdas
entre razes das rvores de mangue e s vezes ocupando galerias de outras
espcies. Segundo Castro (1986) alimentam-se principalmente de folhas da flora do
manguezal que caem no substrato. Ao serem armazenadas nas galerias, as folhas
so atacadas por fungos, entrando em processo de decomposio e transformam-se
em uma pasta recoberta de fungos.
Isto leva concluso de que os caranguejos-u se alimentam no das folhas e
sim dos fungos ou das protenas produzidas pelos fungos. considerado organismo
abundante no ecossistema de manguezal. Dependendo da idade da fmea a
postura de ovos podem variar entre 10.000 e 250.000, porm as perdas tambm so
muito grandes, ocasionadas por diversos fatores como: predaes, aes antrpicas
como pisoteio, movimentao de embarcaes, poluio e alteraes climticas e
de ciclos hidrolgicos, alterando assim os ciclos naturais de reproduo (ALVES,
2004).
Com base nessas variveis, estima-se que da totalidade de ovos em cada
postura apenas entre 300 a 500 desses ovos se transformam em caranguejos em
idade adulta que pode levar de 4 a 4,5 anos (PINHEIRO, 2001).
De acordo com a Portaria 34/03 do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renovveis(2007), o perodo reprodutivo, poca em que os
caranguejos machos e fmeas saem de suas galerias e andam pelo manguezal para
acasalamento de larvas, de Dezembro a Maio de cada ano e neste perodo de
acordo com o calendrio lunar, trs dias antes e trs dias depois da lua cheia e nova
fica proibida a captura do Ucides cordatus L., 1763 de qualquer tamanho e sexo.
De Junho a Novembro liberada a captura do macho com o tamanho mnimo
de 6,0 centmetros de carapaa (Cefalotrax).
39
Levando em considerao o tamanho liberado pela legislao, o macho
(FIGURA 14) normalmente maior, possui 10 patas, sendo 5 da esquerda e 5 da
direita.
Suas patas dianteiras ou principais so isentas de plos, sendo que a da
esquerda possui circunferncia de 9 centmetros e comprimentos de 14 centmetros
e pata dianteira da direita possui circunferncia de 5 centmetros e comprimento de
9 centmetros e as demais ou secundrias so cobertas com plos por completo,
suas patas secundrias apresentam comprimento que varia de 14 a 7,5 centmetros.
O abdmen em forma de tringulo.
A fmea (FIGURA 15), assim como o macho possui 5 patas da esquerda e 5 da
direita, porm todas as 10 patas so praticamente isentas de plos, apresentam
algumas granulaes nas patas dianteiras, sendo que a esquerda mede 4,5 de
dimetro e 9 centmetros de comprimento.
A pata direita mede 7,5 centmetros de circunferncia e 11,5 centmetros de
comprimento. As patas secundrias tem comprimento que varia de 11 a 6
centmetros. A fmea apresenta a regio ventral mais larga e coberta de plos pelas
extremidades para facilitar o carregamento dos ovos no perodo de reproduo. A
regio ventral de aproximadamente 15 centmetros de dimetro e mais
arredondada.
A localizao das patas dianteiras do macho e da fmea est ligada a
reproduo da espcie. A pata dianteira maior do macho est para a direita, assim
como a da fmea, para que no momento do acasalamento a pata maior do macho
sustenta as patas menores da fmea, bem com a pata menor da fmea sustenta a
menor do macho para se equilibrar.
Ambos possuem 4 juntas em cada pata, tendo variao de tamanho para cada
sexo, onde as patas secundrias prximas as patas principais ou dianteiras so
maiores, sendo que para o macho a pata secundria mais prxima da pata dianteira
mede aproximadamente 14 centmetros e mais distante 7,5 centmetros de
comprimento. E para a fmea a mais prxima de 11 centmetros e a mais distante
de 6 centmetros de comprimento.
Os pescadores extrativistas da Vila Sorriso, tambm diferenciam o macho e a
fmea apenas pelas caractersticas deixadas no manguezal pelo crustceo. Essa
diferena feita geralmente prximo galeria, quando o extrativista se aproxima da
40
galeria para fazer a captura, logo procura observar as proximidades da galeria se h
rastro ou fezes.
Figura 14- Ucides cordatus L., 1763 macho.
Foto: Neila Almeida, 2011.
Para os extrativistas da Vila Sorriso, o rastro do macho mais profundo, mais
espesso e pode observar alguns sinais de plos prximos galeria; A fmea possui
um rastro mais delicado, mais curto e sem sinais de plos.
Segundo o conhecimento do pescador as fezes do macho mede
aproximadamente 1 cm de comprimento e 1cm de dimetro e tem cor preta. J a da
fmea menor e de cor marrom.
41
Porm, apenas aqueles pescadores mais experientes, conseguem distinguir o
macho da fmea por essas caractersticas no manguezal. Pois essa identificao
requer bastante ateno do pescador extrativista.
Figura 15- Ucides cordatus L., 1763 fmea
Foto: Neila Almeida, 2011.
42
3.3 PANORAMA SOCIAL
3.3.1 Os pescadores extrativistas do manguezal da Vila Sorriso
A partir do levantamento de campo, pode-se dizer que a Vila Sorriso tem um
nmero significativo de pescadores extrativistas do manguezal, baseado em sua
populao total (Grfico 3). Esta comunidade se insere em um nvel de populao
costeira (populao que vive prxima ou na zona costeira que depende diretamente
do mar e de suas influncias. Na Vila Sorriso estes pescadores extrativistas
dependem diretamente do ecossistema de manguezal.
Esta comunidade conta com uma populao pesqueira extrativista do
manguezal diversificada em relao faixa etria. No total so 93 pescadores
extrativistas representados em porcentagem (Grfico 3) com idade que varia entre
15 a 55 anos, sendo 52 do sexo masculino e 41 do sexo feminino, tendo a presena
da mulher prxima a dos homens como observado graficamente (Grfico 4).
Grfico 3 - Pescadores extrativistas do manguezal da Vila Sorriso
FonteDados: Microsoft ExcelPesquisa de Campo
Estudos realizados na regio do Salgado, pelas pesquisadoras Motta-Maus
(1999), Cardoso (2000) e Maneschy (2003) ressaltam a invisibilidade do trabalho
das mulheres na pesca. Apesar de no ser objetivo especfico desta pesquisa,
43
importante ressaltar que o grfico 4, apresenta um nmero significativo e a
visibilidade das mulheres na captura do carangujo-U na Vila Sorriso.
Enquanto Cardoso (2000) ressalta que em Guarajubal as mulheres trabalham
na coleta de moluscos e crustceos, e que esta atividade pouco valorizada pelos
pescadores locais que pescam em alto mar, por acreditarem que trabalho que vale
aquele feito em alto mar, na Vila Sorriso as mulheres que trabalham na coleta do
crustceo (caranguejo-u), so consideradas mulheres do sexo forte, pois
participam com uma parcela considervel para a economia familiar.
Na Vila Sorriso existe domicilio em que a mulher responsvel pela nica fonte
de renda do lar. Como relata a pescadora extrativista L. S. de 36 anos: Eu sou me,
pai e tudo para os meus filhos depois de Deus, se eu no pegar o caranguejo, no
tem como dar comida para meus filhos, e capaz da gente morrer de fome porque
eu no tenho de onde tirar, o mangal tudo pra mim
Segundo Maneschy (2005), em pesquisa de campo no municpio de So
Caetano de Odivelas em 1990, verificou centenas de catadores de caranguejo
moradores da sede do municpio, atuando nesta atividade extrativista. J os das
comunidades prximas, mesclavam a captura do caranguejo com agricultura e
pesca em rios prximos.
Atualmente (2011), h comunidades que exercem inmeras atividades, na Vila
Sorriso, por exemplo, os pescadores extrativistas do manguezal, no perodo de
defeso em que fica proibida a comercializao do caranguejo-U, procuram outros
meios de sobrevivncia, ou seja, trabalham com outros recursos naturais, pois como
essa categoria no contemplada com o seguro defeso, precisam de algum dinheiro
para pagar gua encanada, energia eltrica e a colnia de pescadores.
No perodo do defeso do caranguejo-u, os pescadores extrativistas
diversificarem as atividades para sobreviver, j que neste perodo so proibidos pela
legislao de exercerem a atividade extrativista.
Neste perodo, considerado pelos extrativistas um perodo de muito sufoco para
sobreviver, uns exercem a atividade da caa, outros da pesca em rios prximos as
suas residncias, j que no dispe de transporte fluvial, outros atuam na coleta do
camaro, utilizando o pu, e outros continuam no extrativismo de pequena
44
quantidade de caranguejo (Quadro 1) . Vale ressaltar que todas as atividades
exercidas no perodo de defeso pelos pescadores extrativistas da Vila Sorriso, so
para a subsistncia das famlias. Um meio de comercializao nesse perodo ocorre
nas mercearias da comunidade, pela troca da caa, do peixe, do camaro, do turu e
do caranguejo por acar, caf e feijo
Quadro 1: Atividades freqentes desenvolvidas pelos extrativistas da Vila Sorriso, no perodo de defeso e fora do perodo de defeso.
PERODO DO DEFESO
FORA DO PERODO DO
DEFESO
MESES
Jan., Fev., Mar. e Abr.
Mai., Jun., Jul., Agost.,
Set., Out., Nov. e Dez.
ATIVIDADES
FREQUNTES
Pesca de peixes nos rios
prximos s residncias,
pequena quantidade de
caranguejo-u, coleta de
camaro e turu (Teredo) e
nas florestas da regio
atividade da caa como:
(cotia-Dasyprocta s.p., paca -
Agouti paca), tatu- Dasypus
novemcinctus, e mucura-
Didelphis marsupialis).
Atividade de subsistncia.
Extrativismo do
caranguejo-u (Ucides
cordatus L., 1763).
Atividade para fim
comercial.
Fonte: Pesquisa de campo, 2011.
Nas residncias em que a mulher a nica responsvel pelo sustento da
famlia, no perodo de defeso, com a mar de morta ela trabalha na captura do
caranguejo e vende por um valor muito baixo na prpria comunidade e na mar de
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lance ela trabalha na pesca do camaro para comercializar, o preo do quilograma
do camaro pode chegar R$ 20,00. Na Vila Sorriso, na categoria dos pescadores
extrativistas do manguezal, no foi identificada mulheres que trabalham com peixes,
apenas com camaro e caranguejo-u.
Motta-Maus (1999) pesquisando na comunidade de Itapu, no municpio de
Vigia tambm discorre neste foco da diviso hierrquica onde ressalta que o
trabalho no mar-exclusivamente de homens e na terra preferencialmente das
mulheres, porm esta autora trs inquietaes no prprio ttulo com um ponto de
interrogao Pesca de homem Peixe de mulher (?). Ser que estas questes de
hierarquia no esto ligadas diretamente as culturas e a fora fsica?
Quando Cardoso (2000) fala que o trabalho das mulheres pescadoras em
Guarajubal no valorizado pelos pescadores de alto mar, pode ser porque as
mulheres no conseguem lanar uma rede de grande porte ou porque as mulheres
culturalmente no pescam em alto mar.
O fato que na Vila Sorriso as mulheres pescadoras utilizam o mesmo
ecossistema que os homens e muitas delas capturam a mesma quantidade de
caranguejo-u. Este fato leva as mulheres sorrienses a uma singularidade, pois de
acordo com estudos realizados na sede do municpio, as mulheres esto inseridas
nas atividades domsticas ou na pesca extrativista no perodo menos chuvoso, pois
nesse perodo a tcnica do lao a mais utilizada na regio e esta maneira de
captura do caranguejo-U no exige tanto esforo fsico como a tcnica do brao e
a da tapagem tambm utilizada na regio.
Isto leva a algumas reflexes em relao a essas particularidades de gnero na
pesca amaznica, que como ressaltei no foi o foco de minha pesquisa, seja em
pequenas atividades ou em larga escala da pesca. O que vale ressaltar que a
mulher cada vez mais busca seus direitos e seu lugar, sem se importar se o homem
mais forte ou mais fraco, se o homem j pesca h milhares de anos ou se o seu
companheiro da pesca e ela do peixe.
A mulher, em algumas comunidades, a nica responsvel pelas finanas do
domiclio, em que na Vila Sorriso, a particularidade dessa mulher, faz com que o seu
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nvel econmico seja muito baixo, passando por muitas dificuldades financeiras,
diferente daquelas que tem um companheiro que divide as atividades.
Grfico 4 - Gnero dos pescadores extrativistas do manguezal da Vila
Sorriso
FonteDados: Microsoft ExcelPesquisa de Campo
3.3.2 Modos de vida dos pescadores extrativistas do manguezal
Esses pescadores trabalham diretamente no ecossistema de manguezal na
coleta do Ucides cordatus L., 1763, conhecido popularmente como caranguejo-u.
A extrao do Ucides cordatus L.,1763 considerada a base econmica da
comunidade Vila Sorriso, pois dessa atividade que os pescadores extrativistas do
manguezal compram outros alimentos, produtos de necessidade bsica, pagam a
colnia de pescadores e at tarifas de energia eltrica e gua.
Os pescadores extrativistas sorrienses contam com iluminao eltrica e
sistema de abastecimento de gua, porm a gua consumida para beber a mesma
utilizada para outros fins.
No existe sistema de esgotamento sanitrio, coleta de lixo nem posto de
sade e h escola apenas nas vilas vizinhas para a alfabetizao. Quando alunos
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necessitam de estudos mais avanados quando passam para as primeiras sries do
Ensino Fundamental, necessitam se deslocar para as escolas situadas na cidade de
So Caetano de Odivelas. O transporte feito em um nibus, doado pela prefeitura
do municpio.
A pescadora extrativista V. S., me de oito filhos, resume a importncia do
crustceo para a sobrevivncia da famlia ... se no fosse o caranguejo no sei
como ia sustentar meus filhos e se o caranguejo acabar no sei o que fazer, eu j
sinto o caranguejo muito escasso pelo tamanho e pela quantidade.
A extrativista relata que h alguns anos, seu companheiro saa pela manh e
voltava no fim do dia com vrios cofos cheios de caranguejo-U. Atualmente ele
tem que se deslocar para outras regies e passar dias, para conseguir o suficiente
para manter a famlia. Por este motivo, a pescadora tambm tem que ir para o
manguezal em busca da alimentao do dia a dia, pois o que seu companheiro trs
de longe para pagar as contas da energia eltrica e da gua encanada que hoje a
comunidade possui.
No perodo do defeso (reproduo) do caranguejo-u em que a
comercializao est proibida, a comunidade extrativista busca algumas alternativas
para sobreviver como: pesca, coleta do camaro, do turu , da caa (Quadro 1), j
que os pescadores da regio nunca receberam o seguro defeso.
O pescador extrativista J. G. diz que muito difcil depender s de uma
atividade de extrativismo, pois no perodo do defeso ele pratica o extrativismo de
outros animais do manguezal e tambm pratica a caa de animais silvestres e afirma
que ainda h muito que caar na regio.
Como a comercializao de animais silvestres proibida, o pescador
extrativista ainda ver no caranguejo-U uma das melhores alternativas para pagar
as contas, como ressalta o extrativista J. G.
Quando o caranguejo est fechado, eu tenho que descer para o rio e igaraps e pegar camaro, algum peixinho e siri ou eu vou caar e quando eu tenho sorte pego um tatu. Mas isso s pra comer naquele dia e no d pra vender nada, o nico que d um dinheirinho o caranguejo, este bicho que nos faz viver.
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Desta forma percebe-se a importncia do caranguejo-u para a sobrevivncia
dos pescadores extrativistas da Vila Sorriso.
O caranguejo-u vendido ao atravessador na Vila Sorriso, pois a
comunidade no tem como transportar sua produo para centro da
comercializao, vendendo assim o produto a um preo extremamente baixo.
As principais transaes comerciais estabelecidas pelos moradores da Vila
Sorriso so realizadas na comunidade, todo recurso natural extrado vendido na
comunidade, em que a principal comercializao do Ucides cordatus L., 1763,
onde a unidade do caranguejo-U varia entre R$0,25 R$0,80 dependendo da
poca do ano, porm comum encontrar em restaurantes, na sede do municpio a
apenas 7,5Km da Vila Sorriso a unidade R$3,50 e o quilograma da massa e da
pata R$30,00 em locais de beneficiamento.
3.3.3 A tradio de gerao a gerao: o extrativismo e o cofo
A comunidade no tem tradio de beneficiamento ou extrao da massa do
caranguejo como na sede do municpio. A populao da Vila Sorriso retira o
caranguejo-u vivo do manguezal armazenando-o nas cofos ou cestas (Figura 16),
tipo de cesto feito com as folhas das palmeiras do maraj (Pyrenoglyphis maruja
(Mart.) Burr.) e do inajazeiro (Maximiliana Maripa Aublet Drude) tpicas da regio.
A confeco dos cofos feita tanto por homens quanto pelas mulheres que
vem aprendendo com seus pais e avs e atualmente passando a filhos, netos e
bisnetos em um vis de tradio familiar. Almeida (2010) ressalta que a tradio
percebida apenas na funo de conservar aquilo que j se tem, constituindo-se por
elementos a serem guardados na memria.
Para os extrativistas da Vila Sorriso a confeco de cofos, vai alm da
necessidade de armazenagem do caranguejo-U. Tudo comea pela denominao
dada pelo tamanho do cofo. Segundo os extrativistas para armazenar at 70
caranguejos eles chamam de pra e quando tem capacidade de armazenar mais
de 70 chama-se cofo. Porm de acordo com os pescadores isto no muito levado
em considerao, pois o que determina realmente a armazenagem o tamanho do
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palmito, grelo, palha verde, ou seja, o tamanho da palmeira de onde se retira a
matria-prima para fazer o cofo. Por este motivo, neste trabalho utilizada apenas a
denominao cofo para todos os tamanhos de recipiente.
O tempo estimado para se fazer um cofo de aproximadamente de 30 a 40
minutos, dependendo da habilidade de quem faz. Os extrativistas fazem um
percurso de 15 minutos a p para encontrar uma palmeira e tirar duas palhas verdes
que varia de 10 a 20 palmos de comprimento equivalente a aproximadamente 1 a 2
metros de comprimento, em seguida fazem o percurso de volta para sua residncia,
momento em que comeam a confeccionar o cofo.
Esta confeco feita em seis etapas, sendo que a primeira o ato de
engrazar que se d na separao das folhas da palmeira. O extrativista pega as
duas palhas e separa as folhas em trs e quatro. Em seguida feito um forma de
tranado entre elas, comeando a segunda etapa chamada de abano em que a
tecelagem tem uma forma circular. Na terceira etapa feito o fechamento fazendo
uma forma cilndrica, logo em seguida comea a quarta fase chamada de enfiar que
se d no fechamento do cilindro. Na quinta etapa acontece o ato de puxar que
resume-se no reforo do fundo para apertar o cofo e na sexta e ultima etapa
tranado o fundo onde feita a finalizao.
Segundo dona F. R. de 70 anos, pescadora extrativista do manguezal desde
seus 12 anos at os 65 anos, a palha retirada da palmeira no prejudica o vegetal,
pois depois de dois meses a palmeira est com novas palhas para ser retirada e
fazer novos cofos.
Os extrativistas sorrienses, relatam que preferem utilizar o cofo para armazenar
o Ucides cordatus L., 1763 porque cofo conserva por mais tempo o crustceo, como
relata a pescadora do manguezal A.C. de 28 anos.
Eu s coloco os meus caranguejos no cofo, porque quando eu no consigo vender no mesmo dia, eu posso vender no outro dia quando aparece o comprador e eles no morrem, j na saca esquenta muito e se eu no vender no mesmo dia eu perco muito, porque morre mais da metade.
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Os crustceos so vendidos nos cofos, sendo que os pescadores do
manguezal cobram R$ 1,00 por cada cofo, mas muitos compradores j levam um
recipiente para armazenar o caranguejo e o cofo utilizado na prxima pescaria.
A tradio funciona como mantenedor da mltipla contribuio das civilizaes
submersas: elas sobrevivem na memria de alguns sbios que transmitem
oralmente seu conhecimento (BALANDIER, 1997).
Figura 16- Confeco dos cofos para armazenagem do Ucides cordatus
L.,1763
Foto: Neila Almeida, 2011.
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Os pescadores do manguezal da Vila Sorriso levam seus filhos para o
manguezal desde seus primeiro anos de idade. Na figura 17, pode ser observado os
primeiros passos de um filho de pescador no manguezal. muito comum ver
crianas e adolescentes (figura 18) no manguezal com seus familiares nos fins de
semana e no vero. Nos fins de semana por no terem que ir para a escola, j que
todas as crianas e adolescentes filhos de extrativistas sorrienses estudam, e no
vero pelo fato do substrato est bem resistente e facilitar as caminhadas pelo
manguezal.
H uma relao do saber e do saber fazer passado de gerao a gerao
familiar, como retrata Diegues (2001), em que o saber fazer e o saber se d a partir
do mundo natural e sobrenatural, transmitidos oralmente de gerao a gerao, uma
frase de Fletcher (1904) apud Lvi-Strauss (1976) se encaixa muito bem, nessa
nova gerao sorriense do manguezal. Fomos ensinados a prestar ateno a tudo o
que vemos.
O conhecimento que os pescadores extrativistas sorrienses possuem acerca da
pesca no manguezal, adquirido atravs das atividades do dia a dia neste
ecossistema que vai desde o momento da confeco dos laos, dos cofos, dos
objetos para proteo como: luvas, braceiras, munhequeira, dedeiras, sapatilhas,
perneiras, at a comercializao do crustceo.
Figura 17- Os primeiro passos no manguezal
Foto: Neila Almeida, 2011
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Figura 18 Conhecimento passado de me para filha
Foto: Neila Almeida, 2011.
3.3.4 O conhecimento quanto ao espao
Para os pescadores extrativistas muito importante conhecer a rea em que
eles trabalham e a influncia da mar nos rios, igaraps e furos que influenciam
cada rea de manguezal, isto fundamental para o sucesso de um dia de trabalho
do pescador. O conhecimento quanto a esse espao de trabalho, se d no dia a dia
na comunidade. Os filhos crescem ouvindo seus familiares, repetindo os nomes dos
rios, igaraps, furos, caminhos e manguezais da regio em que trabalham.
Neste contexto, pode ser observado nos desenhos (1 e 2) de J.G., o
conhecimento que este pescador extrativista possui em relao ao territrio.
Conhecendo as particularidades da regio a partir da interpretao no dia a dia,
antes, durante e depois de cada jornada de trabalho. Como relata Almeida (2010)
Os homens, mais afeitos s longas caminhadas para o trabalho, sabem ler a natureza, compreender a linguagem dos animais e das plantas, os segredos da mata. Desenvolvem um rico conjunto de tcnicas agrcolas, extrativistas, de pesca e de conhecimento sobre ecossistema, mesmo que no registrem essa sabedoria por meio de palavras escritas em livros. Essa enciclopdia de saberes milenares corre o risco de se perder pelo ar, a menos que os registros da oralidade se propaguem por geraes seguidas ou que algum
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apreciador dessas cosmologias de idias as eternize por meio de palavras escritas.
Neste sentido, tem-se J. G., com seus saberes e suas prticas a partir de sua
atividade de pesca extrativista passado de seu av por oralidade e pelo seu esforo
do empirismo, assim como Silva (2007) em A natureza me disse afirma que
conhecimento manipulao cognitiva, trabalho artesanal do pensamento.
Existindo uma vontade de conhecer pelo prazer de conhecer.
Os pescadores do manguezal possuem um conhecimento singular da rea em
que trabalham. comum na Vila Sorriso, ouvir dilogos entre extrativistas como o
descrito abaixo:
- tu vai no Pavo? Vai pegar a canoa no Pratiquara? Ou vai p pro Agiruzeiro?
- olha eu no sei ainda, mas como estou sem canoa, acho que vou pela campina
at o sapateiro.
- bem, minha canoa est no Pratiquara pertinho do Genipapo, e hoje eu acho que
vou s eu.
Neste fragmento de um dilogo entre extrativistas sorrienses, possvel
perceber a intimidade que a comunidade possui em relao ao espao percorrido no
dia a dia, para aqueles com poucos anos de idade no to ntimos na prtica, porm
j gravado na memria. Para aqueles com mais idade, massificado na teoria e
prtica. Como ressalta Silva (2007) em uma de suas frases guia: A gente s
conhece o campo, andando ele todo. No com um dia s que a gente arruma a
bagagem do tempo inteiro.
O que ratificado pelo pescador do manguezal J. G.:
Dona eu ando nesses matos por a desde criancinha, eu ia com meu pai para o mangue, para a caa e tambm pescar. Assim eu fiquei conhecendo cada lugar daqui, nesse mato eu no me perco, sei todos os nomes, escutava meu pai falar que ia pegar caranguejo em tal lugar, eu ia com ele e assim aprendi todos os nomes.
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Desenho 1 - Ecossistemas aquticos da regio da regio da Vila Sorriso
Desenho elaborado por Jeovnio Guimares(2011), pescador extrativista do manguezal.
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Desenho 2 - Manguezais da regio da Vila Sorriso
Desenho elaborado por Jeovnio Guimares(2011), pescador extrativista do manguezal.
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3.3.5 As casas
Na comunidade Vila Sorriso existem diferentes tipos de casas. Existem as
moradias que abrigam normalmente uma famlia de pais e filhos. Podem ser grandes
ou pequenas e de diversificados materiais dependendo do poder aquisitivo da
famlia.
Existem casas de alvenaria (Figura 19), geralmente de comerciantes, de
aposentados e a do nico atravessador residente na Vila Sorriso.
Figura 19- Casa do atravessador da Vila Sorriso
Foto: Neila Almeida, 2011.
As moradias dos pescadores extrativistas da Vila Sorriso so mais simples,
geralmente construdas com palmeiras da regio, como o inajazeiro, maraj e
aaizeiro, tem formato triangular na parte superior (Figura 20). Tambm existem
moradias construdas com madeiras do mangue como a siriubeira, cobertas de
palha e o cho de barro (Figura 21).
Geralmente residem aproximadamente de seis a dez pessoas em cada
residncia e geralmente o pai, a me e os filhos. Essas residncias dos
extrativistas so geralmente de um cmodo. Raras so as moradias formadas de
trs partes: sala, quarto e cozinha.
__________________________
Compra o caranguejo-u dos pescadores extrativistas e vende na sede do municpio ou nas feiras
livres, pois possui meios para transportar o crustceo.
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Figura 20 Moradia construda com palmeira do aaizeiro e telhas de barro.
Foto: Neila Almeida, 2011. Figura 21- Moradia de pescador extrativista na Vila Sorriso
Foto: Neila Almeida, 2011.
A rea com paredes destinada para o sono da famlia em redes. Esta parte
utilizada geralmente noite; durante o dia uma parte da famlia fica na parte externa
da casa cuidando de alguns animais como patos e galinhas e outros entre os
manguezais da regio. comum encontrar a filha mais velha cuidando da casa e
dos irmos enquanto os pais esto no manguezal.
Os modos de vida das famlias pescadoras extrativistas do manguezal no
mudaram muito com a chegada de novas tecnologias e energia eltrica.
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Muitas casas tm geladeira, mas muitos ainda preferem tomar a gua do pote
(Figura 22), pois acreditam que mais saborosa. Tem fogo a gs, mas preferem
cozinhar em fogo de barro usando o carvo vegetal ou madeira seca do
manguezal, por dois motivos um pelo preo alto do gs de cozinha e outro por
acharem os alimentos mais saborosos feitos no fogo de barro (Figura 23). Isto
retrata um modo de vida tradicional na comunidade Vila Sorriso. De acordo com
Balandier (1997, p. 94)
A tradio no dissocia daquilo que contrrio. Governa os indivduos e a coletividade, mas s alguns a conhecem inteiramente. Na superfcie do conhecimento banal - aquele que as prticas utilizam - encontra-se escondido o conhecimento profundo, que s um pequeno grupo detm e que se transmite por meio de um lento procedimento inicitico.
O que se observa nos pescadores sorrienses so esses modos de vida que
no dissocia dos antepassados. H uma conservao e uma memria neste povo
que lhes permite ser o que de alguma forma j foram antes. O conhecimento que as
prticas utilizam do uso do fogo lenha e da figura do pote em lugar estratgico
nas casas para purificar a gua h valores que so guardados pelo segredo que as
tradies tm de proteger os saberes e as prticas primitivas, sempre mantendo o
passado no presente, onde o passado se prolonga no presente, onde o presente
chama o passado.(BALANDIER, 1997,p.93).
Figura 22- Pote: armazena gua para beber nas moradias dos pescadores extrativistas
Foto: Neila Almeida, 2011.
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Figura 23- Fogo de barro para cozinhar os alimentos dos pescadores extrativistas
Fotoe: Neila Almeida, 2011.
Tambm existem os ranchos (Figura 24), casas construdas em lugares
estratgicos, s margens dos rios e prximas aos manguezais, pela populao de
diversos segmentos da pesca para o momento exato da atividade. Muitos esperam a
pramar, outros a baixa-mar, outros passam a noite. Cada grupo habita no rancho
de acordo com seus interesses da pesca. Essas casas so construdas com rvores
do manguezal como o mangueiro (Rhizophora mangle L.), a siriubeira (Avicennia
schaueriana Stapft & Lechman ex Mold.), tambm so utilizadas palmeiras tpicas da
regio como o maraj (Pyrenoglyphis maruja (Mart.) Burr.) e o inajazeiro
(Maximiliana Maripa Aublet Drude).
Figura 24- Rancho: onde pescadores extrativistas esperam o momento exato para o extrativismo.
Foto: Neila Almeida, 2010.
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3.3.6 Relao com a Colnia de Pescadores Z-04
Os 93 pescadores extrativistas da Vila Sorriso so filiados colnia de
pescadores Z-04 situada na sede do municp