necessidades em saúde cecílio

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As Necessidades de Saúde Estruturante na Luta pela como Conceito Integralidade e Eqüidade na Atenção em Saúde LUIZ CARLOS DE OLIVEIRA CECILIO trntrodução Universalidade, inte-eralidade e eqürdade da atenção constituem um con- ceito tríplice, entrelaçado. quase um signo, conr fbrte poder de expressar ou traduzir de fbrma muito vir a o ideário da Reforma Sanitária brasileira. A crdadania, a saúde como direito de todos e a superação das injustiças resul- tantes da nossa estruìtura social estão implícitas no tríplice conceito-signo. Neste texto, destaco e trabalho mais especificarnente os temas det integralidade e da eqüidade. sem desconsiderar que não integralidade e eqüidade possíveis sem a unirersalidade do acesso garantida. Dou ênfase a esses dois conceitos porqLÌe creio que a integralidade e a eqiiidade, enqrìanto objetivos da atenção em saúde, r'ão além do simples "consumo" orÌ acesso a determinados serviços e nos remetem ao campo da(s) rnicropolítica(s) de saúde e suas articulações, fluxos e circuitos. Estes, afinal, confìguram un'ìa "macro" política de saúrde que, por convenção (e inércia) temos charnado de "sistema de saúde". E ainda, acho que perÌsar a eqliidade e a integralidade da ittenção nos obriga a enxergar como o "rnicro" está no "macro" e o "macro" no "micro", e que essa recursividade, mais do que uma Íormulação teórica, tern itnpor'- tantes implicações na organização de nossas práticas. A luta pela eqtiidade e pela integralidade implica. necessariamente, repensarmos aspectos impor- tantes da organização do processo de trabalho, gestão, planejamento e cons- trução de novos saberes e priiticas em saúrde. Para orientar estas reÍlexões. \'oLÌ tomar corno "analisador" as necessi- dades de saú<le, em particular a potencialidade que têm de ajudar os traba- lhadores/equipes/serviços/rede de serviços a Íazer uma melhor escuto das pessoas que buscam "cuidados em saúde", tomando suas necessidades como

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Page 1: Necessidades em saúde cecílio

As Necessidades de SaúdeEstruturante na Luta pela

como ConceitoIntegralidade e

Eqüidade na Atenção em Saúde

LUIZ CARLOS DE OLIVEIRA CECILIO

trntrodução

Universalidade, inte-eralidade e eqürdade da atenção constituem um con-ceito tríplice, entrelaçado. quase um signo, conr fbrte poder de expressar outraduzir de fbrma muito vir a o ideário da Reforma Sanitária brasileira. Acrdadania, a saúde como direito de todos e a superação das injustiças resul-tantes da nossa estruìtura social estão implícitas no tríplice conceito-signo.

Neste texto, destaco e trabalho mais especificarnente os temas det

integralidade e da eqüidade. sem desconsiderar que não há integralidade e

eqüidade possíveis sem a unirersalidade do acesso garantida. Dou ênfase a

esses dois conceitos porqLÌe creio que a integralidade e a eqiiidade, enqrìantoobjetivos da atenção em saúde, r'ão além do simples "consumo" orÌ acessoa determinados serviços e nos remetem ao campo da(s) rnicropolítica(s) desaúde e suas articulações, fluxos e circuitos. Estes, afinal, confìguram un'ìa"macro" política de saúrde que, por convenção (e inércia) temos charnado de"sistema de saúde".

E ainda, acho que perÌsar a eqliidade e a integralidade da ittenção nosobriga a enxergar como o "rnicro" está no "macro" e o "macro" no "micro",e que essa recursividade, mais do que uma Íormulação teórica, tern itnpor'-tantes implicações na organização de nossas práticas. A luta pela eqtiidadee pela integralidade implica. necessariamente, repensarmos aspectos impor-tantes da organização do processo de trabalho, gestão, planejamento e cons-trução de novos saberes e priiticas em saúrde.

Para orientar estas reÍlexões. \'oLÌ tomar corno "analisador" as necessi-

dades de saú<le, em particular a potencialidade que têm de ajudar os traba-lhadores/equipes/serviços/rede de serviços a Íazer uma melhor escuto daspessoas que buscam "cuidados em saúde", tomando suas necessidades como

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Luis Carlos de Oliveila Cecilio

centro de suas intervenções e práticas. o desafio, então, seria conseguirmosfazer uma conceituação de necessidades de saúde que pudesse ser apropri-ada e implementada pelos trabalhadores de saúcle nos seus cotidianos. Algoque nos permitisse fazer uma mediação entre a incontornável complexidadedo conceito (necessidades de saúde) e sua compreensão e apropriação pelostrabalhadores, visando a urna atenção mais human jzaçJa e qualifrcada.

As conclusões e indicações de Stotz (1991) têm desempenhado papelmuito importante na discussão qLre aqui apresento, e em várias investigaçõesacadêmicas e intervenções institr,rcionais que tenho acompanhado. Entre tantascontnbuições do autor, destaco duas. A primeira é aqueÌa que reconhece que,se as necessidades de saúde são social e historicamente determinadas/construídas, elas só podem ser captadas e trabalhadas em sua dimensãoindividual. A outra indicação de Stotz que tenho adotado e desenvolvido é queseria quase inevitável a adoção de alguma taxonomia de necessidades desaúde, "ou seja, de que se deva r-rtilizar um conceito normativo (de necessicladede saúde) que seja traduzível em descritivo e operacional [...1. por outro lado,o conceito descritivo e operacional precisa ser reconceitualizado para poderexprimir a dialética do individual e do social" (STOTZ, 1991, p. 136).

A taxonomia que tenho adotado (CECILIO, 1999; MATSUMOTO, 1999)trabalha com a idéia de que as necessidades de saúde poderiam ser apre-endidas, de Íbrma bastante completa, numa taxonomia organi zada em quatrograndes conjuntos. o primeiro diz respeito a se ter "boas condições de vida".A reconceitualização necessária aqui, tal como apontado por Stoz, seria nosentido de reconhecer que "boas condições de vida" poderiam ser entendi-das tanto no sentido mais funcionalista, que enfatiza os fatores do .,ambien-

te", "externos", que determinam o processo saúrde-doença (Leavell e clarksão paradigmáticos com sua Hisrória natural clu cloença), como nas Íbr-mulações de autores de extração marxista (Berlinguer, castellanos, Laurelle Breilh, por exemplo), que enÍatizam os diÍèrentes Ìugares ocupados porhomens e mulheres no processo prodLrtrvo nas sociedades capitalistas comoas explicações mais importantes para os modos de adoecer e morrer (inser-ção na Íãbrica, no escritório, mas também acesso a água tratada, condiçõesde moradia e hábitos pessoais). Ecletismo nos pontos de partida conceituais,ffìas um consenso: a maneira corno se vive se "traduz" em difèrentes ne_cessidades de saúde.

o outro conjunto de necessidades de saúde que constitui a taxonomiafala da necessidade de se ter acesso e se pocler consumir toda tecnologiade saúde capaz de melhorar e prolongar a vida. A reconceitualização

os sENTtDos DA INTEcRAT_TDADE NA ATDNÇÂo E No cutDADo a saúpn

Page 3: Necessidades em saúde cecílio

consegLurmos;e ser apropri-ridranos. Algocontplexidaderpriação pelosrÌrlicada.enhado papelinr estigaçõesl. Entre tarìtas:.'onhece que,lererminadas/;ul dimensãor olr ido é que:essidades dee necessidadelr outro lado,o para poder,. l-j6).ÍoTo, 1999)lnì ser apre-J: em quatroier de vida".Ìoz. seria noser entendi-

do "ambien-

r rll e Clarkrno nas fbr-nos. Laurell:upados poriìistas comooner (inser-r. condiçõesconceituais,ierentes ne-

Ìaronomiatecnologia

itualização

As Necessidades de Saúr.le como ConccitÕ Estruturante

necessária aqui é, partindo-se dos conceitos de tecnologias reve, Ìeve_clurae dura (MERHY, 1997), abandonar quarquer pretensão de hierarquizar essastecnologias. Questiona-se, assim, a idéia prevalente de que as tecnoÌogiasduras, baseadas na produção de procedimentos dependenies de equipamen-tos, seriam mais "comprexas", e aqueras mais relacionais, do tipo leve, se-riam menos "comprexas". Trabalho com a idéia de que o valor de uso(cAMPos, 1992) que assume cacla recnologia de sardË e sempre defìnidoa partir da necessidade de cada pessoa, em cada singular momento que vive.o diagnóstico precoce de uma hipertensão arterial, fara determinada pessoa,em determinado momento de sua vida, é tão cruciar qllanto o acesso a umexame de cineangiocoronario-erafia para outro, que vive outro momento.A "hierarquia" de importância do consumo das tecnorogias, não a estabere_ceÌnos unicamente nós, técnicos, mas tambénr o, p-rroãr, com sras neces-sidades reais.

. um terceiro conjunto cle necessidades diz respeito à insubstituível criaçãode vínculos (a)ef'etivos entre cada usuário e Llma equipe e/ou um profìssional- vínculo enquanto reÍèrência e reração cle confiança, argo como o rosto dosistema de saúde para o usuário. A reconceitu alizaçào uqii e reconhecer queo vínculo, mais do que a simples adscrição a um serviço olr a inscriçãoformal a Lrm programa, signifìca o estaberecimento de umá reração contínuano tempo, pessoal e intransferível, calorosa: encontro de subjetividades.

um quarto e último conjunto de necessiclades diz ,"rp"ito'à necessidadede.cada pessoa ter graus crescentes de autonomia no seu modo de revar avida. A reconceituarização dessa necessidade é que informuçao

" educaçãoem saúde são apenas parte do processo de construção da autonomia decada pessoa. A autonomia implicaria a possibiridade ie reconstrução, peÌos

sujeitos, dos sentidos de sua vida e essaìessignificação teria peso eÍ.etivo noseu modo de viver, incrLrindo aí a lr.rta pela satisfaçáo ae sua, necessìdades,da fbrma mais ampla possír,el.

uma definição ampriada de integraridade da atenção a partir dasnecessidades de saúde

É possível adotar a idéia de que a integraridacre da atenção precisa sertrabalhada em várias dimensões para que seja arcançada àa forma maiscompleta possíver. Numa primeira crimensão, a integraiidade deve ser fiutodo esforço e confluência dos vários saberes de uma Jqurpe muliiprorissionar,no espaço concreto e singular dos serviços de saúde, sejam ele.s um cerìtro

os sEN'Ì'rDos DA .N-TEGRALTD,\DE NA ATENçÃO u No curDADo a srúoc

Page 4: Necessidades em saúde cecílio

Luis Carlos de Oliveira Cccilio

de saúde, uma equipe de Programa de Saúde da Família (PSF) ou um

hospital. Poderíamos denominá-la "integralidade Íocalizada", na medida em

que seria trabalhacla no espaço bern delimitado (focalizado) de ttm serviço

de saúde.

Nesse encontro do usuário com a equipe haveriam de prevalecer' sem-

pre, o compromisso e a preocLlpação de se fazer a melhor escuta possível

àas necessidacles cle saúde trazidas por aquela pessoa que busca o serviço,

apresentadas ou "travestidas" em algr.rma(s) demanda(s) específica(s). Po-

deríamos trabalherr com a seguinte imagem: quando alguém procLìra um

serviço cle saútde, está trazendo tlma "cesta de necessidades de saúde" e

cabeiia à equipe ter sensibilidade e preparo para decodificar e saber atender

da melhor forma possível. Toda a ênfase da gestão, organização da atenção

e capacitação dos trabalhadores deveria ser no sentido de uma ntaior capa-

cidacle de escutar e atender às necessidades de saútde, mais do que a adesão

pura e simples a qualquer modelo de atenção dado aprioristicatnente.

A demanda é o pedido explícito, a "tradução" de necessidades mais

complexas do usuário. Na verdade, demanda, em boa medida, são as neces-

sidaães modeladas pela otèrta que os serviços t-azem. A demanda pode ser

por consulta médica, consumo de medicamentos, realização de exames

(as ofertas mais tradicionalmente percebidas pelos usuários'..); as necessi-

dades podem ser bem outras.

As necessiclades cle saúde, como vimos, podem ser a busca de algum tipo

de resposta pareì as rnás condicões de vida que a pessoa viveu ott está

vivendo (c1o desemprego à violência no Iar), a procura de ttm vínculo (a)efètivo

com algum profissional, a necessidade de ter maior autonomia no modo de

andar a vicla ou, lÌìesmo, de ter acesso a alguma tecnologia de saúde dis-

ponível, capaz de melhorar e prolongar stta vida. Está tudo ali. na "cestinhil

tle necessidacles", precisando ser, de alguma forma, escutado e traduzido,

pela equipe. Assim, a integralidade da atenção. no espaço singular de cada

serviço cle siiúcle, pocleria ser definida como o esforço da equipe de saúde

de traduzir e atender, cla melhor forma possívcl, tais necessidades' sempre

complexas mas, principalmente, tendo que ser captadas em sua expressão

individr-ral.

O resr-rltado dessa "integralidacle Íocalizada" há de ser o resultado do

esÍorço de cada um dos trabalhadores e da equipe como tÌm todo. Cada

atendimento, de cada profissional, deve estar compromissado com a maior

integralidacle possível, sempre, mas também ser realizado na perspectiva de

que a integralidade pretendida só será alcançada como fruto do trabalho

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os sENTIDos DA INTEcRALII)ADE NA ATENÇÃo E No culDADo a s'qÚoe

Page 5: Necessidades em saúde cecílio

IPSF) ou umna medida emde um serviço

:r alecer, sem-scLrta possívelsca o serviço,:cífica(s). Po-1 procura um; de saúde" e

s:rLrer atenderão da atençãoa nraior capa-que a adesão

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1

As Necessidades tle Saúde como Conccito Estruturante

solidário da eq,ipe de saúde, conl seLrs múltiplos saberes e práticas. Maiorintegralidade possível na aborda-eem cle cada profissional, maiãr integralidadepossível como fruto de um trabalho mLrltiprofissional. Duplo desafio que háde ser tratado no processo de -sestão clos serviços, ern particular noi pro-cessos de conversaçâo e comunicacão - entendimento para ação - que seestabelecem entre os difèrentes trabalhadores cle saúde. A (máiima)integralidade (possível) cla atenção, pautada pelo (melhor) atendirnento (pos-sível) às necessidades de saúcle portacras pelas pessoas: Lìma síntese daspretensões da integralidade no espaço da micropolítica de saúrde.

Por outro lado, é necessário ter em conta que a integralidade nunca seráplena em qnalquer servico cle saúrcre singular, por melhãr que seja a equipe,por melhores que sejarn os trabalhadores, por melhor que seja a comunica-ção entre eles e a coordenacão de suas práticas. Em particular, a batalhapela melhoria das condicões cle 'ida e pelo acesso a iodas as tecnologiaspara melhorar e prolonrar a

'ida. por mais competente e comprometida que

se.ia a equipe, jamais poderá ser plenamente bem-s'cedida no espaço sin_qu-lar dos serviços.

Tal constatação nos rerÌlete. então, a rma segunda dimensão daintegralidade da atenção. qual se3a. a integralidade da aìenção como frr,rto deruma articulação de cada servico cle saúde, seja ele ,,. ."ntro de saúde, umaeqripe de PSF, um ambulatório de especialidacles o'um hospital, a uma redemuito mais complexa coÌnposta por outros serviços de saúide e otrtras ins-tituições não necessariamente clo "setor" saúde. A integralidade pensacla no"macro". A (máxima) integralrcìacie cla atenção no esp-aço singular do ser-viço - rntegralidade focalizacla - pensada como parte de uma integralidadenrais ampliada que se realiza nurna rede de serviços de saúrcle ou não. Aintegralidade da atenção pensacra em rede, como objeto de reflexão e de(novas) práticas da equipe de saúcie e sua gerência, em particr-rlar a com-preensão de que ela não se dá. nunca, num rugar só, seja porque as váriastecnologias em saúde para melhorar e prolongar a vida estão- distribuídasnuma ermpla gama de ser'icos. seJa porque a melhoria das condições de viclaé tarefa parÍì um esfbrço intersetorial.

Depende'do do momento que 'ive o usuário, a tecnologia de saúde de

que necessita pode estar en-ì uma uniclade básica de saúde ou em algumserviço produtor de procedimentos sofisticados. pode haver rÌm momentoem qlle a garantia do consumo de cleterminaclas tecnologias mais ,,dnras',(MERHY, 1991), mais baseaclas em proceclimentos e consideradas mais"complexas", produzidas em lu-eares específicos, que fìncionam como refè-

os sENTU)os DA IN'TEGRALIT)ADc NA ATDNçÂo E NO curDADo À saúon

Page 6: Necessidades em saúde cecílio

Luis Carlos de Oliveira Cecilio

rência para determinado número de serviços, seja essencial para se garantira integralidade da atenção. sem esse acesso, não haveria integraridade pos-sível: finalização do cuidado, resorutividade máxima, a"niro Jã, conhecimen_tos atuais disponíveis, para o problema de saúde que a pessoa está vivendo.A garantia dessa integraliclade do cuidado tem que ser uma responsabilidadedo sistema de saúrde e não fruto da batarha indìvicruar, muitas vezes deses_perada, de cada usuário individual.

Em outro momento, a simples participação num grupo de hipertensos oude diabéticos pode ser a tecnologia que merhor reiponae a determinadasnecessidades, tendo_ alto grau de impacto na qualiclade de vida daquelaspessoas. são necessários novos fluxos e novas possibiridades de captação declientes na várias portas de entrada do ,,sistema,, de saúde e, mais do queisso, uma reconceituarização do que seja "serviço de referência,, (cECÌLIo,1997). Assim, muitas vezes, a "reÍ'erência" de que o paciente necessita é umatendimento amburatoriar regurar e vinculante,-qu" àc conta de suas neces_sidades atuais. por isso é necessário pensar o ,.sistema', de saúcle menoscomo "pirâmide" de serviços raciànalmente organizados de formahierarquizada e mais como uma rede com múltiplas entradas, múrtiplos flu_xos' para cuja construção as representações e necessidades individuais sãomuito importantes.

Por outra parte, é necessário considerar, ainda, que essa imagem de umsistema de saúde organizado como uma pirâmide, po.ìíueis de .,compÌexidadecrescente"' "hierarquizado", dá conïa, apenas em parte, da discussão sobreintegralidade que se está fazendo aqui, porque os serviços mais ,.comprexos,,.de referência, têm sido entendidoi como l,-,gu.., de finarização, da últimapalavra, de atendimento de.demandas pontuais, superespecializaclas e espe-cíficas e' por isso mesmo, descompromissados .o* u inieg.alidade. No má_ximo' a integralidade entendida como uma boa contra-rerüência para o ser_viço que encaminhorl' o que não é pouco, no contexto atuar, mas não basta.Defèndo que a rógica da integraridade, tar como desenvolvida no q.echamei de primeira dimensão da integralidade, a ,,integralidade

focalizacla,,.como preocupação de cada profissional e da equipe ãe cada serviço, deveestar presente em bdos os serviços, mesmo nos superespeciarizados, sejaele um serviço de emergência ou uma enfermaria de hospital, por exempro.Precisamos deslocar .nosso

f'oco de atenção da .,atençãì p.imá.iu,, con,olugar privilegiaclo da integraricrade. Aliás, ìntegralidade não se realizanuncaem um serviço: integraridade é objetivo de rede. Temos desconsiderado quehá espaço para (e necessidade dó; escuta das necessidades singulares cle

r20 os sENTrDos DA TNTE.RALIDADE NA ATENÇÃ' E No curDADo À s,qúon

Page 7: Necessidades em saúde cecílio

ncraÌ para se garantirna integralidade pos-

ntro dos conhecimen-p.ssoa está vivendo.

uma responsabilidade. rnuitas vezes deses-

Jfiì de hipertensos ou

',:nde a determinadasrJl de vida daquelasrd.rdes de captação de

s.rúde e, mais do que

:ferência" (CECILIO,rciente necessita é um

: -,'rÌìrr de suas neces-

ml" de saúde menos

r;nrzados de formantrrdas. múltiplos Í1u-

idides individuais são

e essa imagem de um

ír ers de "complexidade

;;. da discussão sobre

çrìs mais "complexos",tìnalização, da última

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rntegralidade. No má-

r-reierência para o ser-

o :itual, mas não basta.

r desenvolvida no que

egraÌidade focalizada",de cada serviço, deve

perespecializados. seja

hospital, por exemplo.

en:ão primária" como

de não se realiza nunca

ìo: desconsiderado que

'ssidades singulares de

\] ì ,\ SAÚDE

As Nccessidades de Saútle como Conccito Estruturante

saúdedaspessoaseacriaçãodenovasestratégiasdequalïficaçãoedefesada vida dos usuários, mesmo naqueles serviços pelos quais.estão apenas de

"passagem", para consumo de um atendimento bem especializado'

Poder-se-ia argllmentar que é exigir demais que os serviços

superespecializados se dediquem a Íazet uma escuta mais cuidadosa' bas-

tandoaelescumprirsuapa,tedeofereceroatendimentoespecia|izadonecessário naquele momento. A integralidade, por esta visão, seria conseguida

fo, u*u boa àrticulação entre os sJrviços, cacla um "cumprindo sua parte".

Pode ser. Ou, pelo *Lno', os paradigmas de atenção que temos trabalhado'

entre olÌtras coisas' pela formação que a academia continua produzindo, não

nos permitem pensar de outra forma'

Mas creio que temos que nos ocupar de pensar novas maneiras de

realizar o trabalho em saúrdà. por exemplo, um episódio de internação hos-

pitalarpodeserumasituaçãoprìvilegiadaparaseestabelecervínculos,mesmoquetemporários,esetrabalharaconstruçãodaautonomiado..paciente''.oatendimentonumserviçodeernergênciapodeSerummomentocrucialparaa escuta da necessidaaÉ ae consllmo de certas tecnologias para tnelhorar e

prolongaravida"qu""'taodisponíveisemoutrost"tu-t:o,t*"nãonaquelepron,olro.orro. lJm paciente hipertenso' que esteja sem seguimento contínuo

ouvíncuÌocomum.seruiçoanbulatorial'nãopodedeixaropronto-Socorrosem essa orientação e, de preferência' sem sair com uma consulta marcada'

Umaconsultamédica,po'n.'"i'especializaclaqueseja'nãopodedeixardefazerttmacertaescutadeotttrasnecessidadesdopacientequevãoalérndademanda "referenciada" que o Í'Íaz ao consultório'

Aintervençãodoespecialistanãopodealcançarsuaeficáciaplenasenão tiver uma boa noçao do nlodo de andar a vicla do paclente, inclusive seu

vínculo com outra "qìip" ou profissional, seu grau de autonomia e a inter-

pretacão que faz O" ,u" doença' Simples como idéia' muito difícil de

imptementur na prática. Seguimás trabalhando de forma muito Íiagmentada'

respondendo a demandas pontuais com o que temos em mãos' ou seja' não

temos nos ocupaclo com a qtÌestão da integralidade de forma mais "comple-

ta", pelo ,o"noi do ponto de vista da pessoa concreta que' naquele momento'

busca alguma forma de assistência'

Chamemos,pois,de..integralidadeampliada''estaarticulaçãoemrede,institucional, intencional, p.oJ"sruul, das múltiplas "integralidades focaliza-

das" que, tendo como "pit"n"o cada serviço de saúde' se articulam em

Íluxos e circuitos, apartir das necessidades reais das pessoas - a integralidade

no ,.micro,, reÍletida no ..macro''; pensar a organização do ..macro'' que

oSSENTIDoSDAINTEGRALIDADENAATI]NÇÃoENoCUIDADO,qs.rÚol

Page 8: Necessidades em saúde cecílio

Luis Carlos do Oliveira Cecilio

resulte em maior possibilidade de integraliclade no "micro". Radicalizar aidéia de que cada pessoa, com sLlas múltiplas e singulares necessidades, sejasempre o Íoco, o objeto, a razão de ser de cada serviço de saúcle e do"sistema" de saúrde. A integralidade ampliada seria esta relação articulada,complementar e dialética, entre a máxima integralidade no cuidado de cadaprofissional, de cada equipe e da rede de serviços cle saúcle e outros. umanão é possível sern a orÌtra. o cuidado inclividLral, em qualquer serviço desaúde, não importa sua "complexidade", está sempre atento à possibilidade eà potencialidade de agregação de ourros saberes disponíveis na equipe e deoutros saberes e práticas disponír.eis em olìtros serviços, de saúcle ou não.

A eqüidade na atenção à saúde trabalhada nos espaços singularesdos serviços de saúde

Adoto, para as reflexões deste rexto. uma definição de eqiiidade quepode ser considerada consensual entre os qlle pensam e militam na constru-ção SUS, tal qual apresenrada por \lalta (2001, p. 135-13ó):

"A eqtiidade ó entcndida como r supcracão de clesigualdades que, em dcter-minado contcxto hist(rrico c soci.rl. são cvitávcis c consiticraclas injustas,implicando que nccessidacles drÈrenciadas cÌa populaçiro scjam atendidas pormeio de ações govcrnamentais tlnrbénr clii'c.enciadas [...]. Subjaccnte a cstcconccito cstii o entendimento de cluc as desigualcÌacles sociais cntrc as pessorìsniro são dadas 'natr-rraln.Ìentc'. nras sim criacìas pelo proccsso histórico e pelomodo dc proclução c organizacão da socieclacle,'.

Também para essa autora, as duas formas de af'erir a (não-)eqiiidacleseriam a avaliação dos ditèrentes padrões de saride de difèrentes grupospopulacionais, através da utilizaçao de instrumental proveniente do.uÃpo aoepidemiologia e o reconhecimento do acesso desigual de segmentos clapopulação aos recllrsos tecnolóeicos de cura e prevenção das doenças.

Na tradição do pensamento crítico sanitário brasiieiro e latino-americano,a discussão e os encaminhamentos sobre a (não-)eqiiidade têm sido tratadosno campo de conhecirnento onde planejamento e epidemiologia se encontrame, até mesmo, se sobrepõerl. Para fazer esta reÍ'rexão, vou ousar clizer queo debate em torno do planejaniento - enqllanto teoria e método - se Íaz emtorno de dois -qrandes paradigrnas: o planejamento/programação e o plane-jamento/política. o exemplo acabado do prirneiro paradigma L o GENDES/

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Page 9: Necessidades em saúde cecílio

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c:rlrnação c o plane-;digma é o CENDES/

: ,, S,IÚDE

As Nccessidades cle Saúde conio Conceito Estruturante

oPS; o segundo, inaugurado pelo Formulación (de Políticas de salud), em

1975, abarca uma un-ìpto gama de documentos, t'ormuladores e autores' do

próprio Formnlacióil, passando pelas elaboraclas ret'lexões e proposituras de^l,l"ilo

Robirosa, na déiada de 1970, do Planejamento Estratégico Situacional

(PES), de carlos Matus, e a visão estratégica clesenvolvida por Mario Testa.

No planejamento/programação, o instrun.Ìental proprciado pela epidemiologia

é a base para a const;tlção de sua teoria e método' Que coisa mais se

destaca no cnxoES/OPS, para além da sua evidente adesão a uma lógica

eficientista, de forte inspiração economicista, clo que o tema da eqüidade?

uma eqüidacle que se pocie configurar muito perversa para nós, hoje, porque

não toma a universalidade do atendimento como um contraponto para a

quase exclusão que criaria. se levada às últimas conseqüências. De qualquer

Íbrma, a idéia de que a epidemiolo,sia é capaz de nos fornecer indicações,

tal como dito acima, para diagnosticarmos a iniqtiidade, tem suas raízes na

utilização da informãção e Lrso de inclicaclores tal qual apregoado pelo

prográmación en Soltrcl e permanece, ainda, com muita atualidade para

orientar políticas de saúde.

oparadigmaplanejanlento/política,Comoonomebemoindica'incorporaa politica, u iAeiu de atores ern disputa e del'esa de interesses e projetos

diitintos, o conÍlito e o poder na constrtìção de sua teoria e na formulação

cle rnétodos concretos de interVencão. Assim, a explicação da iniqüidade e

a luta pela eqüiclacle passal.n. necessariamente, pelo reconhecimento de ato-

res com maior o1-, ,r-ránot- capaciclacle cle reconhecer, Íormular e batalhar na

deÍ'esa cle seus interesses. Creio que o planejamento/programação, ou pelo

menos boa parte do seu instrumental analítico, poderia ser e tem sido, de

Íato, per{eitamente subsumido pelo planejamento/política, como parte da caixa

de feruamentas que atores reais. em disputa no jogo social, podem utilizar

para aumentar seu poder cle lr.rta, barganha e conquista de seus objetivos.

O Programa Nacional <le Controle da Aids, em particular a política de

distribuiçáo dos rnedicamentos que compõem o coqlìetel de anti-retrovirais,

poderia ser lembrado como ltm bom exemplo para ilustrar esta discussão,

mostrando como é possír,el, na prática, uma aproximação dos dois paradigmas'

As reconhecidas extensão e senerosidade do progran.ìa poderiam ser credi-

tacias tanto à pressão cle inútmeros grllpos organizados muito combativos e

com Íorte poder de lobbt', atores na batalha em defesa de grupos da poptt-

lação que têm necessidade de ser amparaclos por políticas governamentais

diferenciadas, como a cabal clemonstração, através de indicadores

epidemiológicos, da existência de grupos de risco e mais vulneráveis'

oS SEN'TIDOS DA ÌNIEGRALIDADE NA ATENçÃO E NO CUIDADO A SAÚDE

Page 10: Necessidades em saúde cecílio

Lr.ris Carlos dc Oliveira Cecilio

Mas, principalmente, a comprovação da dramática economia de recursosfinanceiros (e impactos) quando se compara a utirização de ,.instrumentos,,(tal como definido no programación...) com composições tecnológicas di-fèrentes, quais sejam, o reito-dia para o pacienie pártador de Aids e aconsulta ambulatorial com coqueteÌ incluído, para os mesmos pacientes.

creio que a iniqüidade pode ser trabarhada em vários espaços, tar comoconceituado por Matus (s/d), tanto para se compreender suas determina-ções, como para se pensar estratégias de sua superação: o geral, o particulare o singular. Podemos considerar como espaço geral aquele no quar sãoformuladas as macropolíticas econômicas que, afinal, ,"rrilto* no varor dossalários, nos níveis de emprego, na distribLrição da riqueza - em síntese, nosmaiores acesso/exclusão dos brasileiros às/das .iqueras produzidas no nossopaís. Podemos dizer que a eqiiidade/iniqüidade que existem em um clado paíssão o resultado final do que se crefine nesse espaço geral. Espaço de fortedeterminação.

Situo o Ministério da Saúde nesse espaço geral, por seu enorme poderde definir diretrizes da política de saúde, em particular através da utilizaçãode mecanismos de Íìnanciamento como orientador de práticas e formas deorganização da prestação da assistência nos níveis m'nicipar e rocal. o graude constrangimento imposto pela NOAS/2001 (Norma operacional de As-sistência à Saúde) na organização dos serviços de média e arta comprexida-de, nas regiões de saúde, é u' bom exemplo disso. o espaço particularpoderia ser situado. na atLrar conficLlracão doSUS. nos municípios. em par_ticular nas Secretarias Municipais de Saúde, os gestores locais oo sistema.O espaço singular seria aquele dos serviços de saúde.

A iniqüidade pode ser entientada. com difèrentes graus de governabilidade,nesses diferentes espaços. Adoto a idéia de que, .r" po, uL ludo há umaforte relação de determinação cro espaço geral para o particular e deste parao singr-rlar, por outro é importante reconhecer que o espaço singular, aqueledos serviços, pode trabalhar e trabarha, com alto g.au de ou,onoÀio, podendogerar contravetores com capacidade de determinação clas políticas definidasnos espaços "superiores", em particular se for capaz de escutar e fazerressoar as necessidades trazidas pelos usuários. Mais do que isto, entencloque tanto eqiiidade como integralidacre só poderão ser irabalhadas como necessário radicalismo se forem tomadas como temas dos processosde.gestão dos espaços singurares, Ìugares de encontro dos usuários e dostrabalhadores de saúde.

Desta fbrma, a não-integraridade e a não-eqüidade podem ser captadas

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124 OS SENTIDOS DA INTDGRALIDADE NA ATENçÃO E NO CUIDADO À SITÚOI:

Page 11: Necessidades em saúde cecílio

ìmia de recursose "instrumentos"

tecnológicas di-lor de Aids e a

nos pacientes.spaços, tal como:.Llas determina-eral. o particularrele no qual sãorc,nl no valor dos- em síntese, nosiuzidas no nosso3m um dado paísEspaco de Íorte

u enorme poderies da r-rtilizaçãocas e fbrmas deielocal.Ograu:racional de As-rlta complexida-;paço pafticularri.-ípios, em par-cris do sistema.

sor ernabilidade,m lado há umatlar e deste parasinrulaq aquelenornia, podendolíticas definidasescrÌtar e fazerre isto, entendo'abalhadas comdos processostusuários e dos

m ser captadas

'. -i Il

As Necessidades dc Saúde como Conceito Estruturante

e/ou reconhecidas em duas dimensões. Numa dimensão mais coletiva, pri-vilegiadamente nos espaços geral e particular, estudos epidemiológicos ou asdemandas e disputas de atores sociais nas várias arenas políticas nos reve-lariam grupos excluídos, com mais dificuldade de acesso oLÌ que precisam decuidados especiais. No entanto, a não-integralidade e a não-eqüidade sópoderão ser escutadas ou apreendidas, mas também enfrentadas, superadasou reduzidas, com radicalismo, se conseguirmos captá-las na sua dimensãoindividual, subjetiva, singular, ali no espaço cle cada serviço, no encontro decada usuário corn suas necessidades de saÍrde únicas e os profissionais e/ou a equipe de saúde.

3. Conclusões

Indaga Stotz (1991, p.159): "como é possível pensar a adeq.ação. acorrespondência entre necessidades (de saúde) e sistema institr-rcional-admi-nistrativo voltado para satisÍazê-las'J". creio que, para respondermos a essaindagação, temos que lançar mão tanto de todo o instrumental disponibilizadopela epidemiologia para o reconhecimento de grandes grupos mais excluídosdo acesso às riquezas produzidas pela sociedade e dos serviços de saúde,como pensar Íbrmas de gestão e reorganização da micropolítica de saúde.

o leitor há de ter notado que passei, nas últimas linhas, a tratar simul-taneamente os temas da (não-)integralidade e da (não-)eqüidade. uma qua-se imposição decorrente da lógica e dos conceitos que adotei para organizarminha reflexão. Estas duas dimensões da atenção, junto com a universalida-de, compõem o que denominei de tríplice signo da refbrma sanitária. e sópoderão ser implementadas de forma plena se trabalhaclas a partir da apro-priação e reconceitualização das necessidades de saúde peloi trabalhadoresem suas práticas, nos mais variados serviços, e pelos gestores, na constru-ção da lógica mais "macro" da atenção. Trabalhadores de saúrde, gestoreslocais, distritais, municipais e regionais solidários na construção da integialidadee da eqüidade no "macro" e no "micro", de torma recursiva e dralética. otempo todo. Novas fbrmas de coordenação, implementação e avaliação dotrabalho em saúde.

Há várias possibilidades de se trabalhar na prática e com as equipes desaúde os temas da rntegralidade e da eqiiidade. creio que a adoção cle umataxonomia de saúde é o prirneiro passo para isso, mesmo que "enquadrar"um tema tão complexo em alguma forma de classificação acabe tendo,sempre, um risco de reducionismo on simplificação excessiva. De novo Stotz

os sEN'trDos DA INTEGRAT_tDADE. NA ATENÇÃo E No curDADo e se.úpu

Page 12: Necessidades em saúde cecílio

Luis Catlos tlc OÌiveira CeciÌio

(1991, p. 135-136):

"Decorre dessls diferenças qlle não se possa recLrsar, conceitualmente, a

taxonomia de necessidades de saútde. Ou seja, de quc se cleva utilizar un'r

conceito nornÌativo que seja traduzír'el em descritivo c operacional. Istoporque necessidadcs de saúdc são necessidacies individuais e humanas. mas

concretamentc consideradas. são tambórr necessidades distorcidas e oculta-dus. não recorìhccidus. justl: c injrr'lls. porque o sio nssirn cm umu soci-

edadc historicamente dada".

A construção, uma qllase "pactLlação" mesmo, com boa participação dostrabalhadores, de um conceito mais operacional de necessidades de saúde jáé, em si, um bom dispositivo para qualificar e hrìmanizar os serviços desaúde (CECILIO, 2000). Instrumento de conversação, de comunicação, decoordenação de prátrcas e de -uestão: momento de se revelarem "necessi-dades distorcidas e ocultadas".

Os indicadores tradiciollais de cobertllra de determinados grupos, de otèrta(ou não) de determinadas acões para crllpos mais vulneráveis, são apropriadosde torma mais viva e apaixonada pelas equipes e pelos vários níveis degerência, quando refèrenciados à discussão das necessidades de saúde. Háolltros dispositivos que podem facilitar a discussão e a compreensão, pelostrabalhadores, sobre o quanto as necessidades de saúcle estão sendo contem-pladas. A análise de prontuírrios de um centro de saúde, por exemplo, nosperrrrite inlerÍogar quanto a equipe tem considerado o grau de autonomia. ascondições de vida e mesmo a -caríìntia de acesso a todas as tecnologias parauma determinada pessoa. Mil possibilidades de escuta se abrem quando oconceito de necessidade de saúrde é incorporado pela equipe.

Por fim, e radicalizando minhas reflexões, creio que o tema da integralidade,se tomaclo em toda a sua expressio, na perspectiva aqui trabalhada, seriacapaz de subsumir a eqiiidade. Explico melhor: se Íbssem possíveis fbrmasde se organizar a atenção, no "nticro" e no "macro", que, no hmite, conse-guissem escutar e atender, da maneira mais completa possível, as necessi-d,acles das pessoas, no sentido de buscar ii máxima integralidade (possível)da atenção (integralidade ampliada), a iniqiiidade haveria de ser reconhecidanaturalmente. expressa em sin-gulares necessidades de saúrde não atendidas.Podemos trabalhar com a idéia de que há necessidades dif'erentes cle vín-culos para diÍ'erentes pessoas em difèrentes morÌìentos, assim corno cliÍèren-

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t26 os s[NTrDos DA ÌN'Ì'EGRALÌDAD[] NA ATENÇ^O E No cutDADo a seúop

Page 13: Necessidades em saúde cecílio

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: :ìLÌmaniìS, mas

:.-:;:Jas e ocuÌta-

:: em uma soci-

b,-.r participação dos

':.idades de saúrde jániz.lr os serviços de

de comunicação, derevelarem "necessi-

rcitì: gIUpoS, de otèrtair eis. são apropriados'i.rs r'ários níveis de

idades de saúde. Hár ctrÌrìPr€eflSão, pelos

e.tlio sendo conten.Ì-le. por exemplo, nosr:lr de autonomia, as

-. "s tecnologias para

si abrem quando o

auipe.tenra da integralidade,qui trabalhada, seria;enr possíveis formasu3. no limite, conse-possír,el, as necessi-

e lrralidade (possível)ir de ser reconhecidas:úde não atendidas.es diÍèrentes de vín-ar:im corno drferen-

As Necessitl:rdes de Saúcìe cono Conccito EstÍtÌturante

tes necessidades de constuno cle determinadas tecnologias de saúrde, dif'eren-

tes necessidades ligadas às condìções de vida e difèrentes necessidades de

construção da autonomia no modo de andar a vida. A busca da integralidade,

se levada às últimas conseqi.iências, revelaria as difèrentes iniqüidades vivi-das por cada um que bttsca os serviços de saúrde. Da mesma Íorma, a

integralidade seria impensável sel-Ìl a garantia de univcrsalidade do acesso.

Recompõe-se assim o signo: universalidade, eqi.iidade e integralidade.

Signo produzido pela Reforma Sartrtária brasileira que fala de uma utopia. no

limite "projeto irrealizável; quitnera; tantasia" (AURELIO, 2000) por tudo

que está em jogo: a inJittitct t'ariahilidade das necessitlades hwnanas e

as finitas possibilitlades qtte Íetnos, até mesnto, tle cctmpreendê-las.

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MATSUMOTO. N. F. A tn'rtlirtção do ímpacÍo do IAS act nível dt rurt cetrtro de

, 5.\UDE OS SEN'I'IDOS DA INTF.GRAI-ID;\D[ NA ÂI'ENÇAO I NO CL]lDAI)O A SAUDtj