mulheres e prÁticas sociais por meio de … · assim nosso trabalho consistiu na análise de...
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MULHERES E PRÁTICAS SOCIAIS POR MEIO DE REGISTROS FOTOGRÁFICOS: UBIRATÃ (DÉCADA DE 1970)
Andrea Marcia de Souza Claudia Priori
(Unespar – Campo Mourão)
Resumo: Esta comunicação tem como objetivo abordar as práticas e representações sociais, os papéis, espaços e práticas sociais desempenhados por mulheres no município de Ubitarã-Pr, no decorrer da década de 1970. Para isso, utilizamos como metodologia a análise de imagens, especialmente fotografias de mulheres, buscando perceber como a imagem feminina foi construída pela mídia fotográfica durante o processo de consolidação do município, bem como os aspectos culturais, práticas e relações sociais que essas mulheres vivenciaram e que podem ser identificados nas imagens. Nesse sentido, compreende-se que a imagem fotográfica se constitui um recurso importante para a história, pois permite o armazenamento de traços e eventos de um determinado período. Além disso, é importante considerar que as imagens não demonstram uma visão geral de uma determinada sociedade, mas sim, uma visão particular (a de quem fotografou), por isso exprime uma dimensão do real, uma visão de mundo que se altera no movimento do foco e depende também da representação que a pessoa fotografada quis deixar registrada. Diante disso, nosso objetivo é proceder à análise imagética percebendo as formas de atuação das mulheres, no que tange principalmente às práticas sociais, bem como evidenciar as representações sociais e estereótipos do feminino retratados nas fotografias, fonte de nossa pesquisa para o recorte temporal proposto. Palavras-chave: Fotografia; Mulheres; História.
Financiamento: Fundação Araucária
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Introdução
Compreender o papel das mulheres no contexto de consolidação do
município de Ubiratã, na década de 1970, foi o que impulsionou nossa pesquisa, que
tem como fonte, as fotografias nas quais elas são retratadas. Nosso objeto de
estudo se insere na temática da história das mulheres e dos estudos de gênero,
assim nosso trabalho consistiu na análise de imagens que representam práticas
femininas, e as mesmas nos propiciaram perceber a participação efetivas das
mulheres naquele processo.
Constatamos nas fotografias selecionadas, traços que se atrelam a
sentimentos e subjetividades, pois as mesmas são carregadas de impressões e
representações sobre a forma de vida adotada pelas pessoas fotografadas em
Ubiratã-PR, em meados da década de 1970. Assim essas fotografias obedeciam a
uma objetividade para o fotógrafo, para o fotografado e ao mesmo tempo carrega
vestígios culturais de um tempo.
A década de 1970 foi de grande importância para a fotografia, pois a mesma é marcada pelas abordagens de história de vida e da valorização das fotografias como fontes históricas, sendo utilizadas como metodologia para acessar a realidade e também memórias construídas, o que segundo Leite, é conhecido como “realismo fotográfico”, assim, a “a fotografia pode ser uma reprodução de um recorte de alguma coisa existente, mas frequentemente é mais a reprodução do que o retratado em si, é a construção do que o fotógrafo deseja” (LEITE, 2006 p.143-144).
Nessa perspectiva diversos autores tais como, Leite (2006), Gralha (2010) e
Kossoy (2002), discorrem a respeito do real construído pelo fotógrafo e suas
especificidades quanto à construção da História. Quanto a isso, Gralha afirma:
Nos interessa aqui chamar a atenção para o fato de que a ação de reproduzir frações do real não é um processo asséptico, passivo, pois o fotógrafo, seja ele amador ou profissional, atua sobre o real impregnado e sabedor dos códigos sociais, políticos, ideológicos, comerciais e estéticos. De outra forma, a “composição” da imagem produzida seria passível de não ser compreendida por sua clientela, ou seja, estaria fora do seu circuito social, de sua clientela (GRALHA, 2010 p.13).
Esta atenção dada às imagens para se contar a atuação das mulheres na
história, deve-se ao silenciamento de memórias femininas nos arquivos oficiais
produzidos majoritariamente pela ótica e interesses masculinos. Assim, nosso
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objetivo foi compreender e constatar as formas de participação feminina no período
de colonização e consolidação do município, e ainda, quais usos foram feitos de
suas imagens, em uma sociedade que estava vivenciando um processo de
formação. Nesta perspectiva, a análise das fotografias de mulheres tem se revelado
muito pertinente para abordar o referido contexto.
No que tange à história das mulheres e aos estudos de gênero na década de
1970, algumas autoras como Joan Scott, Margareth Rago, Cristina Bruschini, têm
sido referências de grande importância para compreensão da temática, e também
para a história das mulheres e do gênero.
Joan Scott (1992), retrata a história das mulheres e do gênero como
decorrente de uma série de mudanças no decorrer do tempo, o que tem propiciado
avanços significativos na perspectiva historiográfica, especialmente a partir do fim da
década de 1970 e 1980 com a adoção do gênero como uma categoria de análise
histórica.
No Brasil, os estudos relacionados à história das mulheres ganharam especial
relevância nas últimas décadas, e isso se justifica pelo fato de que por grande
período da história, as mulheres foram esquecidas do discurso e da produção
historiográfica. Para Margareth Rago,
[...] as transformações na historiografia, articuladas à explosão do feminismo, a partir de fins da década de 1960, tiveram papel decisivo no processo em que as mulheres são alçadas à condição de objeto e sujeito da História, marcando a emergência da História das Mulheres (RAGO, 2007, p.90).
Cristina Bruschini discorre a respeito da mulher que se insere no mercado de
trabalho, em meados da década de 1970 até o século XXI:
A necessidade econômica, que se intensificou com a deterioração dos salários reais dos trabalhadores e que as obrigou a buscar uma complementação para a renda familiar é uma delas. Os dados referentes à década de 70 mostraram, porém, que não só as mulheres pobres entraram no mercado, mas também as mais instruídas e das camadas médias.
Nesse sentido compreendemos que a década de 1970, foi de grande
relevância para a história das mulheres, simbolizando o início do reconhecimento de
seu trabalho, o que anteriormente era novidade, nesse momento começa a virar
rotina. Sair de casa, conquistar espaço no mercado de trabalho e lutar por seu
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espaço, mostrando que elas são ativas, eficientes e conscientes da importância de
seu papel.
A década de 1970 marcou Ubiratã por três acontecimentos: a concretização
do projeto de colonização da SINOP, a conquista da BR-369, e a criação da
Cooperativa Agropecuária União Ltda (COAGRU).
Na conjuntura da solidificação do município de Ubiratã na década de 1980,
percebemos um destaque para o projeto pós-Sinop e a confirmação do agronegócio,
que causaram o aumento da mecanização agrícola, e na substituição do cultivo de
algodão para o de soja, na década posterior, que resultou em uma produção mais
sólida economicamente
Fica claro na história de Ubiratã e demais municípios do mesmo porte, a
intenção política de seus governantes de desenvolverem a região, incentivando a
agricultura, o agronegócio, a ampliação das rodovias para o escoamento da
produção, e também o estímulo ao processo de urbanização e crescimento das
atividades do comércio. Constata-se que a história deste município se confunde com
as ações e ideais dos primeiros habitantes, homens e mulheres, e também do
projeto de expansão da SINOP.
Ao abordarmos a presença e atuação das mulheres no processo de
colonização de Ubiratã, via análise imagética, partimos da perspectiva dos estudos
de gênero, pois entendemos que as práticas femininas e representações sociais
acerca das mulheres são construções culturais e que diferem de um contexto
histórico para outro.
Roger Chartier, ao abordar temas que remetem a compreensão das
representações sociais, demonstra que as ações dos indivíduos são direcionadas
segundo os modelos sociais impostos, levando em consideração que as
representações indicam de que modo uma realidade é construída em seu meio
social (CHARTIER, 1990). Nesse mesmo sentido, David (2012), em trabalho
intitulado “Práticas e Representações sobre os Comportamentos Femininos”, afirma:
No caso específico do estudo das mulheres por meio dos processos-crime, as representações sociais observadas nesta fonte indicam como parte da sociedade compreende os comportamentos femininos, segundo as representações dominantes de diferença entre os sexos e a proibição de determinadas atividades voltadas às questões sexuais para as mulheres. (DAVID, 2012, p.2)
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Segundo a historiadora Joan Scott (1992), nas duas últimas décadas do
século XX, principalmente nos Estados Unidos, a história das mulheres alcançou
uma maior visibilidade através de documentos publicados e conferências
internacionais.
A autora salienta que, as historiadoras das mulheres almejavam o
reconhecimento como intelectuais, pois estavam em busca do seu lugar no campo
da história. Portanto, inúmeras dificuldades cercavam a história das mulheres, pois
para que elas mesmas relatassem no meio acadêmico estadunidense suas
vivências e atuações no processo histórico foi necessário encontrar “estratégias”
para essa inserção.
Ao defender novos cursos sobre as mulheres, diante um comitê curricular universitário em 1975, argumentei como exemplo que a história das mulheres era uma área recente de pesquisa, assim como os estudos da região ou das relações internacionais. Em parte, esse foi um artifício tático (uma jogada política) que tentava, em um contexto específico, separar os estudos das mulheres daqueles intimamente associados ao movimento feminista. Em parte, resultou da crença de que o acúmulo de bastante informação sobre as mulheres no passado, inevitavelmente atingiria sua integração na história padrão. (SCOTT, 1992, p.81).
Nesse período, a história das mulheres deu um grande passo, e reafirmou a
“mulher” como sujeito ativo, participante e portadora de uma história.
A apropriação do conceito gênero para teorizar a questão da diferença sexual,
possibilitou pensar as relações sociais na perspectiva de gênero e também refletir
sobre as diferenças. Desse modo, o gênero pode ser visto de duas formas: como
algo meramente descritivo, como um conceito associado ao estudo das coisas
relativas às mulheres, e pode também ser estudado como uma categoria analítica ao
abordar as relações existentes entre os gêneros. A categoria gênero trouxe uma
noção relacional para os estudos históricos, preocupada em analisar a complexidade
das relações de gênero, suas construções e reproduções sociais que envolvem
poder, política, cultura, diferenças socioculturais e também com as articulações de
gênero com outras categorias como raça, classe ou etnia.
Segundo Margareth Rago, os estudos relacionados à história das mulheres
ganharam especial relevância nas últimas décadas, e isso se justifica pelo fato de
que por grande período da história, as mulheres terem sido esquecidas do discurso
e da produção historiográfica. Para a autora,
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[...] as transformações na historiografia, articuladas à explosão do feminismo, a partir de fins da década de 1960, tiveram papel decisivo no processo em que as mulheres são alçadas à condição de objeto e sujeito da História, marcando a emergência da História das Mulheres. (RAGO, 2007, p.91)
Atualmente, com as mulheres se destacando em várias esferas da sociedade
em âmbito mundial, aguçou o interesse para os estudos de gênero.
As mulheres ubiratanenses na década de 1970
Os procedimentos metodológicos adotados nessa investigação compreendem
algumas etapas. Primeiro, realizamos uma coleta de fotografias do município de
Ubiratã-Pr, desde o início da década de 1970 até o ano de 1979. Um arsenal de
fontes foi conseguido por meio do arquivo digital da Biblioteca Municipal Cecília
Meireles, fotografias de moradores em seus próprios álbuns pessoais e jornais da
referida década e também fotografias que foram coletadas pela Professora
Terezinha Ficher que realizou durante o ano de 2012 e 2103 seu trabalho no
Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE).
De acordo com a análise de fotografias realizada no decorrer desta pesquisa
constatamos que a década de 1970 apresentou importantes mudanças tanto em
nível nacional, quanto em nível estadual. Cada acontecimento traz consigo diversos
registros (fotografias) e no que se refere às fotografias de mulheres, percebemos
mais uma vez, uma escassez numérica, mas que não desabona nossa análise, já
que as imagens de mulheres retratadas nos permitiram recompor traços de sua
atuação social no processo de colonização do município de Ubiratã PR, como pode
ser averiguado na análise das imagens seguintes.
Analisando as fontes, constatamos uma participação da mulher ubiratanense
na imprensa local, e assim como no restante do país, a mulher era retratada de
forma discreta, mas participante. Dessa forma, ficou evidente que naquela
sociedade, a realidade se assemelhava a nacional, a luta pelo espaço feminino era
constante. A imprensa local, salvo algumas exceções, visava a promoção da mulher
no âmbito social, as mesmas eram sujeitos da história, daquele município que
consolidava sua emancipação política.
A imprensa feminina brasileira assistiu ao nascimento das reivindicações da mulher, criou veículos próprios, mas nunca chegou ao grau da
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movimentação francesa, que propiciou até o aparecimento de um jornal diário feito por mulheres: La Fronde (BUITONI, 2009, p. 193).
Durante o levantamento de fotografias nos deparamos com uma pequena
quantidade de exemplares do Jornal “Vale do Piquiri”, referentes aos anos de 1978 e
1979, pois os demais impressos da década de 1970 foram molhados em um
incidente e acabou mofando e sendo descartados. Nos exemplares que restaram,
observamos que as mulheres estavam sempre presentes, tanto nas matérias,
quanto nas fotografias do período, sendo citadas e retratadas como participantes
dos fatos ocorridos. Os poucos exemplares de jornais encontrados para o período,
como já citado, podemos destacar algumas colunas em que as mulheres apareciam:
Foto 1: Coluna de Aniversariantes
Fonte: Arquivo da biblioteca Municipal Cecília Meireles
Essas imagens fazem parte da coluna de aniversariantes, referentes ao
domingo, trinta de dezembro de 1979. A primeira fotografia faz referência ao
aniversário de 16 anos de Luzia de Fatima Domene, de família bem conhecida na
cidade, que segundo relatos de moradores, a família Domene fora proprietária de
muitas terras e exerciam uma boa posição social. Pelo anúncio podemos
subentender que Luzia era uma jovem muito conhecida e bastante popular entre os
amigos. Uma jovem que nos remete a ideia de que a juventude ubiratanense, da
década de 1970, assim como no restante do pais, foram jovens alegres que se
reuniam para festas e bailes comemorativos, onde as mulheres e sua beleza
estavam sempre presentes.
A segunda fotografia (à direita) também fora da mesma data da anterior, e
está parabenizando Lais Calcinone, interessante que não apresenta que idade Lais
completava, mas usa o adjetivo “garotinha”. Fica evidente que ambas as fotos
trazem imagens de belas mulheres sendo homenageadas, e além disso, eram
mulheres oriundas de famílias que ocupavam uma posição social de destaque no
município.
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Quanto ao enquadramento das duas fotografias, foram registradas de close,
preto e branco e em estilo porta retrato, que evidencia os traços das belas jovens.
Foto 2: Entrega e Inauguração da Escola Pé de Galinha
Fonte: Arquivo da biblioteca Municipal Cecília Meireles
A fotografia é parte do Jornal Vale do Piquiri, do dia quatro de novembro de
1979, a mesma está retratando o ato de inauguração da escola rural Pé de Galinha,
sendo a escola na comunidade que leva o mesmo nome.
A imagem traz um grande número de autoridades municipais, pais,
professoras e alunos. Todos posando para uma fotografia que serviria de registro
daquele momento. Segundo relatos de pessoas que viveram na comunidade e
estudaram na escola, a mesma atenderia as crianças da comunidade, a principio
apenas uma turma multiseriada.
Meninos e meninas estão sem uniforme, e não conseguimos identificar a
professora, pois há um grande número de mulheres na fotografia, mas isso nos faz
perceber que elas não mais ficam apenas ao lado dos seus esposos, para posar
para fotografias, mas se agrupam entre si. Seria o momento de perceber uma certa
independência, quanto ao domínio dos maridos?
Foto 3: Entrega de certificados de alfabetização: final de curso do MOBRAL
Fonte: Arquivo da biblioteca Municipal Cecilia Meireles
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A imagem é datada de quatro de novembro de 1979, e nos reporta à entrega
dos certificados de alfabetização para as mulheres que participaram das aulas
naquele ano. As mulheres estão com expressão de felicidade, exibindo seus
certificados com orgulho, pois talvez significassem muito para elas, já que a partir da
alfabetização, elas poderiam exercer outras funções, ingressar no mercado de
trabalho formal, não mais serem apenas donas de casa e trabalhar no campo.
Segundo relatos de algumas senhoras alfabetizadas pelo Mobral da época,
ser alfabetizada era ter novos horizontes, ver o mundo com outros olhos, ser
independentes e não mais pedir para que lessem para elas. Algumas falavam que
poderiam ler a bíblia, as embalagens de produtos e principalmente ajudar e
incentivar seus filhos no processo de alfabetização.
Quanto ao enquadramento da imagem, trata se de um ângulo aberto e a
iluminação é abundante, para que possamos perceber todas as pessoas presentes
na fotografia.
Foto 4: Primeiro curso de aperfeiçoamento de professoras da zona rural
Fonte: Arquivo da biblioteca Municipal Cecília Meireles
A imagem é datada de 04/11/1979, e está noticiando o primeiro curso de
aperfeiçoamento para professoras da zona rural, grande maioria de professores do
município, já que segundo registros mais de 60% da população residia no campo.
A importância desse curso de aperfeiçoamento está fortemente ligado a duas
realidades, a primeira relacionada à necessidade de novas práticas de ensino,
levando em consideração que em praticamente um mês estariam na década de
1980, e na mesma ocorreriam diversas mudanças no sistema de ensino brasileiro. A
segunda nos remete ao papel da mulher, perante a sociedade ubiratanense, a
importância de um curso de capacitação para mulheres, ou seja, que elas estavam
presentes no mercado de trabalho, já não era uma novidade, mas agora estavam
investindo na sua capacitação como professoras. Na fotografia é perceptível que
havia muitas professoras, pois as vestimentas revelam que se trata de vários grupos
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sociais, todas com extrema atenção no que estava ocorrendo. A imagem em si
registrava o momento do curso e nenhuma das mulheres olhava para o fotógrafo.
Era um registro oficial do evento.
Além das fotografias de jornais, também analisamos algumas fotografias de
acervos pessoais, com as quais pudemos ter um contato direto com algumas
pessoas retratadas ou com familiares das mesmas. Isso enriqueceu nossa pesquisa,
já que pudemos ver além daquilo que a fotografia fala por si só, o que propiciou uma
soma na análise, ao ter acesso aos relatos dos proprietários das mesmas.
Foto 5: Registros de Fotografias Escolares
Fonte: Acervo Digital de Elizabeti Saran
A foto acima (5) é datada de 1970 e nos apresenta alunos e professora da
Escola Santo Antonio. As crianças estão uniformizadas e alinhadas, segundo relatos
da proprietária da fotografia, refere-se a fotografia anual de turma. E quanto à
presença da professora, segue o padrão de uma mulher que está presente no
mercado de trabalho, exercendo principalmente a função do magistério. A
professora aparece no alto, à direita, e é a primeira fotografia em que aparece uma
professora da escola Santo Antonio sem as vestimentas de freira, pois na década
anterior a escola tinha apenas irmãs católicas.
Constatamos também nesta imagem, a mulher numa postura mais imponente
perante aos alunos, está numa posição superior na foto, olhando fixamente para o
fotógrafo, com um leve sorriso. Enquanto os alunos desviam o olhar para os lados, e
suas expressões mostram timidez, pois tirar fotografias não era uma situação
comum na época. Quanto ao enquadramento dessa fotografia tem um plano amplo,
em que não há apenas um foco de evidência, mas sim um foco geral.
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Foto 6: Fotografia anual do Colégio Santo Antonio
Fonte: Acervo Digital da Biblioteca Municipal Cecília Meireles
A fotografia acima foi tirada no ano de 1976. Nos detalhes da fotografia
percebemos que o enquadramento tem seu foco amplo, sendo um registro de uma
classe multiseriada, pois as crianças têm tamanhos diferentes, com meninos e
meninas, algumas ajoelhadas e outras em pé (visualização), todas olham fixamente
para a câmera.
Nota-se que a professora não está posando para a fotografia, mas sim
organizando as crianças, impondo autoridade, e assim mostrando ser autoridade
entre as crianças, deixando evidente que estava a serviço da ordem. A profissão de
professora foi uma das primeiras ocupações estabelecidas no município de Ubiratã,
e ainda que a função do magistério fosse visto como obrigação e não como
profissional atuante em uma sociedade que precisava de educação, a mulher
iniciava de forma tímida a ganhar espaço na região e na história.
Consideraçoes finais
A pesquisa realizada no decorrer desta experiência de Iniciação Científica tem
nos admitido perceber práticas e representações sociais, intrínsecas nas imagens
analisadas, entendemos o papel desempenhado pela mulher da década de 1970
estava diretamente atrelado ao modo em que as imagens foram construídas, assim
a intencionalidade dessa construção deixa traços claros de uma sociedade em
constante transformação social.
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Nossa pesquisa proporcionou uma maior compreensão quanto às
representações sociais acerca das mulheres no processo de colonização e
consolidação do município de Ubiratã, na década de 1970. Através da análise
imagética, nesse caso as fotografias de mulheres, constatamos a presença feminina
tanto na esfera privada quanto na esfera pública, atuando na vida política, religiosa,
educacional e também no mercado de trabalho formal ou informal.
Pesquisar a história das mulheres possibilitou uma melhor compreensão do
universo feminino e suas lutas, sua trajetória no decorrer do processo de
colonização de Ubiratã. Constatamos que as mulheres foram pouco registradas,
sendo pouco o uso de imagens relativas às mulheres, todavia, nas poucas
fotografias em que elas aparecem conseguimos recompor sua presença e
participação social. A fotografia é muito mais que uma imagem capturada pela
câmera fotográfica, é um registro construído pelo fotógrafo, e não pode ser,
simplesmente, denominada como uma “ representação” do real.
Enfim, esperamos que nossa pesquisa tenha contribuído para uma visão mais
ampliada das práticas e representações femininas registrada em fotografias de
determinada época.
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