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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ciências da comunicação, realizada sob a orientação científica de Dr. Helder Bastos 1

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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à

obtenção do grau de Mestre em Ciências da comunicação, realizada sob a

orientação científica de Dr. Helder Bastos

1

A todos os que me apoiaram na realização e investigação desta dissertação.

2

Índice

Introdução …………...………………………………………………………………….6

Capítulo I : Revisão da Literatura

1. Origem da crítica.……………..…………………………………………81.2. Origem da crítica de cinema .....

………………………………………...91.3. Função da crítica de cinema ..……...

………………………………….181.4. Caracterização da crítica de cinema ....

………………………………..211.5. Formato da crítica de cinema

………………………………………….231.6. A subjetividade vs. Objetividade das críticas de cinema ..

…………….261.7. Estudos publicados

…………………………………………………....27

Capítulo II: Metodologia

2.1. A análise de conteúdo …………………………………………………29

2.2. A análise de discurso ………………………………………………….30

Capítulo III: Resultados e discussão

3.1. Suplemento Atual (Jornal Expresso) ……………...……….………….…………..32

3.2. Suplemento Ípsilon (Jornal Público) …………………….….…………………….36

3.3. Diário de Notícias …………………………………………….…………………..39

3.4. Metropolis……………………………………………..…………………………..43

3.5. Jornal de Notícias ………………………………………………………………....47

3.6. Síntese……………………………………………………………………..……….49

3.7. Dados explicativos …………………………….…………………………………..50

3.8. Formação dos críticos de cinema .............................................................................52

3.9. Conclusões ...............................................................................................................54

3

Bibliografia .....................................................................................................................57

Apêndices .......................................................................................................................60

RESUMO

Com a presente dissertação de Mestrado pretende-se estudar a crítica de cinema  em

Portugal, tendo como exemplo diferentes publicações.  Desta forma, o trabalho foi

dividido em duas partes: a primeira parte teórica, e a segunda parte, com uma

abordagem prática, baseada em estudos de caso. A primeira parte, introduz a origem e

evolução da crítica de cinema até aos dias de hoje. Esta perspectiva histórica permite

reconhecer os cânones e características das críticas, e a forma como se foram adaptando

desde os seus primórdios. Na segunda parte, recolheu-se críticas de cinema dos

suplementos Público e Expresso, os jornais Diário de Notícias, Jornal de Notícias, e da

revista especializada em cinema Metropolis, durante o mês de Outubro e primeira

quinzena de Novembro de 2012. Durante o seguinte período de tempo analisou-se o

conteúdo e discurso das críticas de cinema publicadas em cada suporte. A selecção dos

suportes mencionados anteriormente apoiou-se na procura de diversidade das

publicações estudadas, com intuito de obter diferentes resultados acerca de cada um dos

suportes. Verificou-se divergências no espaço que cada suporte concede às críticas de

cinema e na regularidade de publicação. Os suplementos Atual e Ípsilon dão um grande

espaço ao cinema, e por isso as críticas tendem a ser extensas, e são publicadas várias

críticas por publicação (semanal). Estes suplementos são inteiramente dedicados à arte,

pelo que se justifica as secções dedicadas ao cinema. O jornal Diário de Notícias foi a

maior surpresa, sendo um jornal híbrido de carácter generalista, tem uma publicação

mais frequente que o habitual neste tipo de jornais. Em contrapartida, o Jornal de

Notícias, é o suplemento com menos publicações na amostra. Como seria de esperar, a

revista especializada em cinema, Metropolis, apresenta críticas sólidas e mais extensas.

A conclusão retirada no final aponta para críticas com formato e conteúdo diferente nos

cinco suplementos analisados. Por fim,  distribuiram-se inquéritos online pelos críticos

de cinema que redigiram críticas no período de tempo da amostra. Estes inquéritos

revelam o perfil dos críticos de cinema, a sua formação, e a experiência na área cinema,

assim como a sua forma de avaliar os filmes e o que consideram importante referir nas

4

críticas de cinema. Atente-se que apenas foram consideradas críticas de cinema

referentes a filmes estreados nas salas de cinema portuguesas.

PALAVRAS-CHAVE: Críticas de cinema, géneros jornalísticos, Cinema, géneros de

opinião, imprensa

ABSTRACT

The present Master Degree’s thesis intends to study film criticism in Portugal, taking as

example different media publications from Portugal. Thus, the work was divided into

two parts: the first, a theoretical part, and the second, with a practical approach, based

on case studies. The first part introduces the origins and evolution of film criticism up to

the present day. This historical perspective allows us to recognize the canons and

structures of film criticism, and how they have been adjusted since their origin. In the

second part were collected film reviews from the supplements Atual (Expresso) and

Ípsilon (Público), from the daily newspapers Diário de Notícias and Jornal de Notícias,

and from specialized cinema magazine Metropolis, during October and the first half of

November 2012. During that period of time the content and discourse of film reviews

published in each support were analyzed. The selection of the previously mentioned

supports relied in the seeking for diversity of the studied publications, in order to get

different results on each newspaper and magazine. As expected, there were differences

between supports, especially in the regularity of publications and the importance given

to reviews. The supplements Atual and Ípsilon are publications focus on arts and

culture, so, they give a large space to film reviews in their editions. The texts tend to be

extensive and several reviews are published by each edition, in this case, weekly. The

daily newspaper Diário de Notícias, a generalist newspaper, and considered a hybrid in

its contents, has surprisingly, more film reviews than the other supports. In contrast, the

daily newspaper Jornal de Notícias was the support with fewest publications in the

whole sample. As expected, the magazine specialized in cinema, Metropolis, has solid

and extent film reviews. In conclusion, the five supports show reviews with different

formats and content. In the end, there were distributed online inquiries to the film critics

who wrote the studied reviews in this investigation. The inquiries turn out to be about

the profile of film critics, their studies, experience in cinema, as well the way they

evaluate the films, and what they consider important. Only the film reviews about

premieres were considered into this investigation.

5

Keywords: Film criticism, Jornalistic genres, cinema, opinion texts, press

Introdução

As críticas de cinema estão de momento presentes num grande número de

jornais não especializados, o que indica que o cinema já não é um tema que se restringe

a um público específico, mas agrada as massas. Nos jornais e revistas não

especializados, a maioria dos artigos sobre filmes são críticas aos filmes que estreiam

nas salas de cinema. Todos os outros artigos, como entrevistas aos atores e equipa

técnica, notícias sobre lançamento de filmes em DVD e Bluray, são mais frequentes nas

revistas de cinema. Por esta razão, as críticas de cinema na imprensa portuguesa, em

suportes com diferentes características, são o ponto de partida desta investigação

académica.

A escassez de estudos relevantes nesta área em Portugal fez com que se

decidisse investir na investigação das críticas de cinema publicadas no País.  Assim,

através da análise comparativa entre quatro jornais e uma revista com características

distintas, compara-se o discurso e conteúdo das críticas de cinema que publicaram

durante o mês de Outubro e primeiros quinze dias de Novembro de 2012. Escolheu-se

dois suplementos direccionados para assuntos artísticos e contemporâneos, Atual

(Expresso) e Ípsilon (Público); um jornal de carácter híbrido, Diário de Notícias; um

jornal popular, Jornal de Notícias, e uma revista especializada em cinema, Metropolis,

antiga revista Premiere . Efetivamente, muitos outros suportes em Portugal publicam

críticas de cinema, no entanto não puderam ser todos analisados, pois a amostra seria

demasiado extensa para a investigação que propomos. De fato, existem outros casos que

podem ser estudados, e esta dissertação pretende abrir portas a futuros estudos do

tema. A dissertação divide-se por cinco capítulos: "Críticas de cinema" - estudo teórico

e estudo de caso; " Metodologia", "Resultados" e "Conclusões".

Inicialmente, colocaram-se as seguintes perguntas de investigação e hipóteses:

Perguntas de investigação:

1. Quais são as características dos textos de crítica cinematográfica em Portugal?

6

2. Quais as diferenças principais entre as críticas dos jornais de referência, dos

populares e das publicações especializadas?

3. Qual é o perfil dos críticos?

Hipóteses:

h1: O texto é predominantemente hermético e elaborado

h2: verificam-se diferenças entre as críticas dos jornais de referência, populares

e especializados

h3: A maior parte dos críticos é jovem e não tem formação ou experiência em

cinema

O primeiro capítulo, "Críticas de cinema", inicia-se com a trajectória histórico-

social da crítica desde os primórdios da imprensa. A "Função da crítica de cinema" é

assunto para o segundo capítulo, onde explora o impacto que a crítica tem junto dos

leitores. Do mesmo modo, estudou-se nos capítulos seguintes as "Características da

crítica " e o "Formato das críticas", que se prevê ser dependentes do tipo de suporte em

que são publicadas. Em seguida, apresentam-se diferentes argumentos e contra-

argumentos de teóricos e críticos em relação à questão da subjectividade das críticas de

cinema. Por fim, foram entregues inquéritos aos autores das críticas de cinema

analisadas, dos suportes Atual, Ípsilon, Diário de Notícias, Jornal de Notícias e

Metropolis.

O segundo capítulo referente a "Metodologia", expõe as técnicas usadas na

investigação teórica e nos estudos de caso. Por fim, explica o que levou a utilizar esses

métodos, inclusive a opção de distribuir inquéritos pelos críticos de cinema.

Com efeito, no capítulo III, referente aos “Resultados e discussão” podem ser

consultados as conclusões sobre as críticas de cinema recolhidas durante período de

estudo (Outubro e Novembro de 2012) nos suportes Atual, Ípsilon, Diário de Notícias,

Jornal de Notícias e a revista Metropolis. Como critério comparativo entre as

publicações, utilizou-se a análise de discurso e análise de conteúdo das críticas. Como

acontece com qualquer método, estas técnicas apresentam insuficiências. Neste estudo

devido a uma necessidade de gestão de espaço e organização da informação, teve de se

criar opções abrangentes para classificar todas as críticas, tendo por vezes de se abdicar

de certos aspectos relevantes e mais específicos, que identificavam cada crítica.

7

O capítulo "Conclusões" sintetiza todas as questões colocadas ao longo da

investigação. É neste ponto que se expõem também os principais obstáculos, e os dados

explicativos que ajudam a explicitar dados da metodologia utilizada.

Capítulo I: Revisão da literatura

1. A Origem da crítica

A origem da crítica de arte em geral remonta aos primeiros anos do Teatro grego,

que apesar de ser discutível a sua datação precisa, aponta-se para 550 a.C. a 220 a.C. A

palavra crítica provêm do verbo grego “krinein” que significa “yo decido, separo,

juzgo”1. Mas só séculos mais tarde, nomeadamente no séc. XVII, é que a crítica viria a

ganhar uma maior importância. Os séculos XVII e XVIII foram marcados pelos avanços

na arte e cultura, pois investiu-se em museus e exposições para exibir obras. Neste

período, vivia-se na Europa o movimento do Romantismo, e os espaços culturais e

artísticos começavam a ser cada vez mais frequentados. Com efeito, formaram-se

“artistas, público e, por consequência, críticos” que aconselhavam quais as obras que

mereciam ser vistas e os motivos que os levavam a tal constatação (Gomes, 2006, pág.

1). Assim, podia falar-se num novo tipo de jornalismo, o jornalismo cultural, que

inicialmente consistia em distribuir “folhetins, críticas nos jornais, plaquetes e brochuras

onde os críticos materializavam o gosto e selecionavam os artistas quase num formato

de competição” (Paixão,2001). Um dos primeiros jornais a publicar notícias sobre

cultura e arte foi o jornal diário inglês The Spectator. Os grupos de “intelectuais”, como

eram frequentemente apelidados, reuniam-se em cafés e locais para comentar os textos

sobre as obras do momento. A função da crítica de arte ganhou destaque neste séculos

pela função mediadora da arte, a crítica era uma forma de “suprir as dificuldades quanto

à comunicabilidade das obras de arte” entre os artistas e o público (Barroso, 2008). De

fato, o objetivo principal nesta altura era dar a conhecer as obras e exposições na

vanguarda, indicando ao leitor onde as poderiam ver e quais as datas. “A crítica cumpre

diversas funções, sendo a orientação do consumo dos leitores a que costuma ganhar

1 COROMINES, JOAN, op.cit, p. 174

8

mais importância na era da produção em massa de bens artísticos.” (Pereira, Costa: sd).

O papel do crítico era de “orientador periódico do anónimo e inseguro público burguês”

que tinha curiosidade e interesse pela arte e queria aumentar a sua cultura (Gomes,2006,

pág. 1). Assim, a crítica tornou-se uma ponte entre artistas e público, permitindo ao

público conhecer os lançamentos das obras dos artístas, assim como, se tornou uma

forma de os artísticas mostrarem o seu trabalho às massas. Os Estados Unidos da

América receberam mais tarde esta influência, nomeadamente na segunda metade do

século XIX, coincidente com a revoução económica e industrial do País.

No século XX, a noção de crítica foi sendo alterada, nesta altura procurava-se um

tipo de texto mais objetivo, regido por críterios próprios, e “menos moralista e

meditativo que os textos escritos pelos críticos europeus do século XIX” (Barreto, 2005,

pág.13). Os críticos optaram por “ desqualificar a avaliação e os juízos sobre as obras,

uma vez que era importante privilegiar a análise e a interpretação”. Desta forma, as

críticas começaram a ser avaliadas com base em normas e critérios, em vez de serem

suportadas apenas por opinião ou gosto pessoal dos críticos.

Pode dizer-se que a crítica foi ganhando terreno por todo o mundo, e hoje

generalizou-se a todo o tipo de público, muito devido à sua dispersão nos meios de

comunicação. Se inicialmente as críticas eram dirigidas a públicos específicos,

sobretudo eruditos, atualmente as críticas estão ao acesso de todos os leitores, desde

jornais, revistas, a internet.

1.1. Origem da crítica de Cinema

No séc. XIX a crítica começava a ter um papel importante nos circuítos de arte,

inclusive pintura, escultura e literatura. Os artistas expunham as suas obras ao público, e

os críticos depois de avaliarem uma série de critérios, comunicavam a sua opinião

através de publicações periódicas, que já tinham formato de crítica. Por sua vez, o

cinema ainda não era visto como forma de entretenimento, davam-se apenas os

primeiros passos, muito elementares, com dispositivos que faziam sequências de

imagens animadas, mas ainda limitadas. Tinha de se esperar até 1895, para se ter a

verdadeira ideia de cinema: filme projetado. Os irmãos Lumière estrearam em França

“La Sortie de l'usine Lumière à Lyon”, um vídeo com cerca de 46 segundos. O cinema,

9

tornou-se assim, anos depois, uma indústria de arte e cultura, e começou a produzir

filmes como forma de entretenimento.

Foi no final do século XIX e início do século XX, que o cinema começou a ser

avaliado por críticos como Louis Delluc, Riccioto Canudo, Siegfried Kracauer, Jean

Epstein, Otis Ferguson ou Grahan Green. Entre este período, as críticas centravam-se

essencialmente na motivação financeira, isto é, se o filme compensava o preço do

bilhete, que na época era elevado. Curiosamente, actualmente encontram-se algumas

semelhanças com esta época, especialmente em filmes que são antecedidas por grande

expectativa. As críticas parecem preocupar-se em confirmar aos leitores se o filme vale

a pena ser visto. Os bilhetes de cinema continuam a ter preços considerados elevados

para a maioria, e as críticas de cinema nunca deixaram de considerar a questão

financeira, e se o filme merece o preço despendido no bilhete.

No entanto, as críticas de cinema tinham aparência diferente das que conhecemos

hoje “Eram escritas como crônicas, pequenos ensaios poéticos, geralmente escritas, com

pseudónimos, por escritores, poetas e jornalistas” (Barreto,2005, pág. 17). De fato, no

ínício do século XX, os artistas eram versáteis e dividiam-se por vários tipos de arte, por

isso, é natural que as críticas de cinema fossem muitas vezes escritas por autores que

também estudavam literatura, filosofia, jornalismo ou outras vertentes. As críticas

tinham influência nas “abordagens psicanalíticas, marxistas estruturalistas”

(Gomes,2006, pág.1), correntes utilizadas nesta altura.

Ainda durante os primeiros anos do século XX, França, Itália e os Estados Unidos

eram os maiores produtores de cinema, com número de obras elevado por ano, e

importados um pouco por todo o mundo. No final da primeira guerra mundial, em 1918,

o cinema americano teve a sua grande expansão, altura em que fazia e exportava cada

vez mais filmes para outros países. A Europa ficou atrás desta poderosa indústria

americana, e apesar de possuir um currículo imprescindível na história do cinema, ainda

não conseguiu recuperar o sucesso comercial e financeiro que gozava antes da primeira

guerra mundial.

Com o fim da 2ª Guerra Mundial, houve uma consequente vantagem económica

para Países como Estados Unidos, França, e Inglaterra, que investiram na cultura e nas

artes, ficando até hoje com uma posição avançada no cinema. O cinema estava, por isso,

a ter um papel cada vez mais importante nestes países, e por conseguinte, surgiram nesta

altura algumas das revistas mais importantes de cinema, como Cahiers du Cinéma,

Screen, e Film Culture.

10

Na primeira metade do século XX, era usual a “crítica impressionista” (Barreto,

2005, pág.16), focada na opinião do crítico em relação ao filme, sem recorrer a critérios

específicos de análise. Trata-se de um texto subjectivo e não científico, com ausência de

parâmetros comparativos entre os filmes. Diversos teóricos de cinema e críticos

contemporâneos não consideram este texto uma crítica de cinema no seu sentido actual,

pela falta de critérios e por ser apenas baseado na impressão subjectiva que o filme

deixava ao crítico. A crítica de cinema como hoje conhecemos, começou a desenvolver-

se especialmente em França, país onde o cinema tinha uma importância no campo das

artes. A crítica de cinema, surgiu posteriormente à crítica de arte em geral, que como

vimos atravessou a história, por isso “a crítica cinematográfica pediu emprestados

conceitos e métodos de análise e de escritura (Figuerôa,2004, pág. 58).” Ainda nos

primeiros anos do século XX o cinema teve uma fase de mudança, e consequentemente

a crítica também acompanhou esta evolução. A seguir à primeira guerra mundial, surgiu

a “Hollywood” e vivia-se um período áureo no cinema norte-americano, com o

surgimento de realizadores conceituados e grandes êxitos no cinema. O filmes

americanos eram importados um pouco por todo o mundo, e por isso a crítica de cinema

passou a centrar-se mais em filmes americanos, especialmente filmes comerciais Os

filmes de autor, europeus como também americanos, nem sempre chegavam ao grande

público. Os filmes franceses e italianos, maiores indústrias até então, estavam agora

mais discretas do que nunca.

Surge, assim, um novo modelo do texto crítico, mais realista e menos subjectivo

que o que tinha sido utilizado até à data, o modelo norte-americano. Apesar de ser de

origem francesa, a revista Cahiers du Cinéma foi das primeira a utilizar este tipo de

texto. Esta nova crítica era mais objetiva e propôs-se a “superar o impressionismo que

dominava a crítica”, e passou focar-se no conteúdo da própria obra (Bareto,2005, pág.

18):

«O jornalismo opinativo, de influência francesa, que dominou a primeira metade doséculo, “foi gradualmente substituído pelo modelo norte-americano: a um jornalismo que privilegia

a informação e a notícia e que separa o comentário pessoal da transmissão objetiva e impessoalda informação”» (Barreto,2006, pág. 19)

Assim, a crítica de cinema dos anos 50 rompeu com os padrões anteriores,

centrados na opinião do crítico, e evoluiu para uma crítica regida por critérios que

comparavam os filmes do ponto de vista técnico e artístico.

11

Paralelamente a esta mudança dos valores da crítica de cinema, continuava a

dar-se o apogeu do cinema americano que estava a ultrapassar o êxito dos filmes

franceses, até então considerados obras primas. Também outro aspecto incomodava os

realizadores independentes, a publicidade dos filmes e promoção comercial era

“exclusivamente baseada no nome dos atores” (Geada, 1987) e o público ia ao cinema

para ver os actores da moda a representarem, e não pelo próprio filme. Holywood fazia

as suas primeiras estrelas de cinema, e um filme tinha tanto mais sucesso quanto mais

publicidade fazia aos seus actores. No seguimento desta fase do cinema industrial

norte-americano, surgiu no final desta mesma década de 50, em França, a Política dos

Autores, termo criado pela revista de cinema francesa Cahiers do Cinéma, e que

influenciou toda a crítica de cinema mundial. Sylvie Pierre, que já escreveu críticas de

cinema para Cahiers du Cinéma, e é atualmente fundadora e membro do conselho

editorial da revista de cinema Traffic, explicou melhor esta viragem na crítica de cinema

em todo o mundo, numa entrevista gravada no dia 18 de maio de 2013 em Portugal.

Durante a Nouvelle Vague, movimento que influenciou o campo artístico em França, os

críticos de cinema tinham ambição de se tonar cineastas, em especial dos críticos da

conceituada revista Cahiers du Cinéma. Assim, na sequência deste movimento em

França, surge nos anos 50 a Política dos Autores, definada pelo crítico de cinema Andre

Bazin e impulsionada pelos Cahies du Cinéma, revista onde o mesmo escreve. Esta

iniciativa permitia aproveitar o caráter reinvidicativo da Nouvelle Vague para fazer

algumas reformas no cinema. Um dos primeiros objetivos, era como vimos, permitir a

rápida passagem dos críticos de cinema, para realizadores de filmes. Jean-Luc Godard,

também ele um crítico tornado realizador nesta fase, exprimiu: "Nos Cahiers todos nós

nos consideramos futuros realizadores. Frequentar cineclubes e a cinemateca já era

pensar cinema e pensar no cinema". (Cit. por Godard, Jean-Luc – Nouvelle Vague).

O segundo ponto que esta ideologia apoiava era que o realizador deve ser

considerado o autor do filme. Em França, nos anos 40, o autor do filme era o

argumentista, que como escrevia a história do filme, tinha os direitos sobre ele, e ficava

com os prémios que o filme recebia. No entanto, a Política dos Autores, pretendia

instituir um novo ponto de vista: quem deveria ser o autor do filme era o realizador, e o

filme já não deveria depender do nome de grandes estrelas de cinema. Na verdade, o

cinema da Nouvelle Vague contrastava com o cinema de Hollywood, não só

tecnicamente mas também em termos de orçamento. Se Hollywood privilegiava nomes

12

de actores famosos nos posters dos filmes, por sua vez, a Nouvelle Vague filmava com

orçamentos baixos e muitas vezes atores amadores.

“Com a Nouvelle Vague, com a pressão dos Cahiers du Cinéma, da equipa...eles afirmaram que o verdadeiro autor era o diretor e orientaram os gostos deles para o cinema americano nessa direção” 2

(Sylvie Pierre)

De fato, os realizadores que surgiram durante a Política dos Autores

contrariavam a indústria norte-americana que racionalizava o cinema, e criava fórmulas

de sucesso. Apesar de ainda hoje Hollywood ser a maior e mais poderosa indústria

cinematográfica, também foi influenciada pela Política dos Autores, pois criou a ideia

do realizador como o autor do filme. Este movimento tornou-se uma mudança para o

cinema e crítica mundial “porque também nos Estados Unidos, os realizadores Alfred

Hitchcock, Howard Hawks foram considerados os autores dos filmes “até pelos próprios

intelectuais americanos3”. Na “indústria cinematográfica do divertimento, o director

[realizador] era apenas aquele que dirigia os atores na filmagem”, e não tinha o direito

de intervenção no argumento, montagem, era apenas “pago para dirigir os atores”.4

Com a Nauvelle Vague, os apoiantes deste movimento francês diziam que alguns

realizadores tinham “tanta personalidade criadora e tanta autoridade” , que eram eles os

verdadeiros autores dos filmes. Atente-se que Sylvie Pierre diz esta frase enquanto

chama a atenção para o jogo de palavras autoridade-autor da obra. De fato, tornou-se

uma novidade na indústria do cinema, que aos poucos virou uma banalidade, de tal

forma que em qualquer trailer, teaser ou publicidade ao filme vemos : Filme de (nome

do realizador).

Antes da Nouvelle Vague, havia uma hierarquia nas funções na produção

cinematográfica, pelo que era difícil um jovem cineasta começar a sua carreira como

realizador. Tinha de passar por várias funções desde o “apanha cabos” a assistente, de

forma a ganhar experiência e curriculum, mais tarde, teria então possibilidade de

ascender ao topo da carreira, realizador. Com a Nouvelle Vague esta tendência alterou-

se, pois os defensores do movimento diziam que qualquer pessoa podia fazer cinema

com uma câmera. Este ponto de vista influenciou vários cineastas de vários Países, e

deu uma maior liberdade aos cineastas independentes e amadores. Para explicar melhor

2 Gravação 2 no dia 18-5-2013 com Sylvie Pierre3 Gravação 2 no dia 18-5-2013 com Sylvie Pierre4 Gravação 2 no dia 18-5-2013 com Sylvie Pierre

13

este pensamento, citamos Glauber Rocha, referido como pai do cinema brasileiro, e

seguidor deste movimento Francês que revelou a certa altura “cinema é uma câmera na

mão e a ideia na cabeça”.

Esta noção de autor tinha uma razão de ser, os críticos de cinema queriam

tornar-se realizadores, e os realizadores queriam ter poder sobre os seus filmes, no

entanto, acabou por apresentar também as suas desvantagens. Em primeiro, caiu-se na

banalidade de fazer cinema, isto é, com apenas uma câmara de filmar qualquer pessoa

se sentia capaz de ser realizador. Em segundo, como refere Sylvie Pierre, os outros

membros da equipa podem passar para segundo plano, devido ao protagonismo que é

dado ao realizador.

Historicamente a noção de autor da obra também se modificou ao longo dos

anos. Sylvie relembra que no século XVII e XVIII o artista era anónimo e recebia uma

proposta para compor uma música, ou para pintar um quadro, sem que o seu papel de

autor fosse o mais importante, o que realmente era importante era o resultado final da

obra. Já no século XIX surge uma nova fase que realça o trabalho do autor da obra, e

surge a noção de autor. Este novo pensamento permitia, assim, dar a conhecer o nome

do autor e tornar o seu percurso artístico público, e acessível a todos de acompanhar as

seus trabalhos anteriores e posteriores. Por isso, pode considerar-se que a Política de

Autores tornou-se um “fato cultural” no cinema, pois a maioria dos filmes

contemporâneos refere o nome realizador, o que permite aos espectadores

acompanharem a obra do autor, e por sua vez facilita o trabalho do crítico de cinema

que vai conhecendo melhor o tipo de linguagem e estética do realizador nos seus filmes.

(Sylvie Pierre).

Desta forma, a revista Cahiers du cinéma atravessou fronteiras e mudou a noção

de crítica de cinema em todo o mundo, na verdade “A relação dos Cahiers com o meio

cinematográfico são talvez mais profundas que podeis imaginar”. (Cit. por Rocha –

Delahaye, Kast e Narboni, 1969, p. 23-40) No entanto, outros meios de comunicação se

opuseram às ideias da “nova vaga francesa”, como a revista francesa Positif que não

concordava com a posição da revista Cahiers du Cinéma ao defender a Nouvelle Vague

e aceitar este movimento como uma realidade. Ao invés, a revista Positif tinham uma

preocupação maior com os temas políticos e sociais.

Nos anos 60, ainda sobre a influência da Nouvelle Vague surgiram importantes

revistas francesas especializadas em cinema que foram importantes para continuar a

14

divulgar o trabalho do cinema, e a afastaram a ideia que se tinha criado de que o cinema

era apenas dirigido a grupos pequenos. Assim, o cinema começava a dirigir-se a um

público mais alargado de pessoas. Os interessados em cinema podiam ler artigos e

críticas de cinema mais extensas e em maior quantidade que nas revistas generalizadas,

que não dedicavam tanto espaço ao cinema. Nas revistas especializadas “as críticas

ocupavam um lugar central e quase sempre eram confiadas a escritores de talento que

haviam compreendido o que era o cinema” (Figuerôa, 2004, pág. 52).

Desta modo, deu-se uma nova era para o cinema francês, que foi um marco

importante para a crítica de cinema francesa, e consequentemente influenciou a crítica

de todo o mundo, “O mérito da Política dos Autores, numa época histórica em que a

crítica de cinema não ultrapassava o impressionismo mais anedótico”, deu uma nova

credibilidade à crítica de cinema e formou novos especialistas na matéria” (Geada,

1987).

Em Portugal, a situação era um pouco diferente, o cinema não tinha o impacto

no País que tinham os filmes franceses, italianos e norte-americanos. Entre os anos 10 a

60 do século XX, faziam-se “reflexões estéticas sobre cinema”, que tinham o mesmo

formato das críticas de cinema que hoje conhecemos (Barroso, 2008). A construção de

salas de cinema ou adaptação de antigas salas de espectáculo em salas de cinema em

muito contribuiu para a imposição do cinema como uma arte de entretenimento. Nos

anos 40, faziam-se pequenas discussões depois da exibição dos filmes em salas de

cinema, como forma de apreciar o filme e debater sobre a mensagem e o impacto que

deixou nos espectadores. Estas sessões começavam já a aproximar-se da noção de

crítica cinematográfica, uma forma de dar a conhecer o filme e de o criticar - no

verdadeiro sentido da palavra. Nesta altura começaram a aparecer revistas

especializadas em cinema em Portugal, e o cinema começou também a marcar presença

em revistas literárias e jornais, o que permitiu uma especialização nas críticas de

cinema. Nos anos 50 e 60 a crítica de cinema teve uma fase francamente positiva, muito

devido ao investimento em cineclubes e festivais de cinema. Estas duas novidades

trouxeram consigo exibições de filmes novos, como também críticas de cinema, que iam

despertando cada vez mais a atenção dos leitores. Assim, a década de 60 tornou-se a

época de mudança para a crítica de cinema em Portugal, que estava a sentir a influência

das revistas francesas Cahiers du Cinéma e Positif, e por isso começou a ganhar

destaque nas publicações especializadas e não especializadas.

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No entanto, apesar da fase favorável que a crítica de cinema estava a passar, os

críticos de cinema tinham de enfrentar o problema que marcou e ainda marca o cinema

português, a pouca produção cinematográfica e o desinteresse dos espectadores

portugueses. De fato, comparativamente aos filmes que estreavam todos os anos nos

outros países, Portugal tinham uma produção assustadoramente baixa e a qualidade das

obras continuava a não cativar as massas. Por outro lado, as revistas francesas e

espanholas da altura como Cahiers du Cinéma e Nuestro Cine, respectivamente, já

começavam a dar espaço nas suas páginas ao cinema português, que tinha relativamente

boa imagem no estrangeiro, mas no País continuava a ser ignorado pelos espectadores

que acusavam os filmes, entre outras características, de aborrecidos e lentos.

Até aos anos 70 o cinema continuou a ganhar reputação, especialmente o cinema

norte-americano, enquanto a Europa respondia com movimentos como o

Impressionismo Francês, o Expressionismo Alemão, Construtivismo Russo. Nesta fase

favorável do cinema, as críticas de cinema ganharam lugar de destaque nos jornais e

revistas e da época. A crítica de cinema foi sendo cada vez mais frequente não só em

revistas especializadas em cinema, como também em jornais generalistas. Os jornais

passaram a criar secções específicas para assuntos de cinema, que podia ter vários

nomes desde “secção das artes”, “cultura”, “cinema”, tal como actualmente, e a crítica

de cinema tornou-se um artigo assíduo em várias publicações.

Na década de 80, o cinema americano continuava a criar obras de

entretenimento, que cativavam cada vez mais o público, e o fazia progressivamente

desinteressar pelo cinema de autor. Por sua vez, os jornais apostavam cada vez mais na

crítica ligeira, e nos textos informativos, de forma a tornarem a própria actividade de ir

ao cinema, também um entretenimento. Nesta altura, começou-se a questionar os

critérios de avaliação usados pelos críticos, devido ao fato das críticas serem sintéticas e

com pouco conteúdo. Por outro lado, surgia também a questão da subjectividade da

opinião dos críticos, e perguntava-se até que ponto a sua avaliação do filme era

fidedigna, em relação a outras críticas escritas por outros críticos de cinema. Começou a

sentir-se a necessidade de perguntar quais os parâmetros usados pelos críticos de

cinema, pois o fato de vários jornais darem avaliações distintas ao mesmo filme,

levantou estas discussões. De fato, esta situação mantém-se na crítica da actualidade,

pois na maioria das vezes são desconhecidos os parâmetros de avaliação dos críticos, o

que continua a gerar comentários sobre a sua validade:

16

«Ao invés de tentar estabelecer um diálogo com o criador das obras, os jornais

passaram a se dirigir apenas à massa indistinta de leitores, com a qual mantém uma relação de

orientação, diferente daquela de instrução encontrada em décadas anteriores. » (Barreto,2005,pág. 32)

Depois de algumas evoluções no campo da crítica de cinema, eis que surge em

1990 uma situação que viria a fazer repensar o formato da crítica de cinema. Na década

de 90 do século passado, a Internet começou a dar os primeiros passos, e hoje está

acessível a grande parte da população. A Internet tornou-se uma grande ameaça para os

suportes impressos, pela oferta de espaço e imagens de forma gratuita para os leitores.

Os leitores foram migrando para a Internet, o que obrigou os meios de comunicação a

se readaptar. Os suportes pensaram em formas de garantir retorno financeiro, seja por

publicidade ou por artigos pagos. Mas os próprios artigos que foram transpostos para os

sites não puderam simplesmente ser transcritos, tiveram também de ser repensados. Se

por um lado a Internet permite publicar textos mais extensos e mais imagens a custo

zero, por outro lado, há vários estudos que indicam a dificuldade de concentração dos

leitores num artigo online, que rapidamente perdem o interesse em textos grandes. Esta

foi uma decisão que todos os suportes tiveram de tomar, optar pela versão impressa ou

online, ou ambas. Um dos suportes analisados nesta dissertação, a revista Metropolis,

foi anteriormente uma revista de cinema impressa, e actualmente está disponível

gratuitamente através do site http://www.cinemametropolis.com. No caso da

Metropolis, sendo uma revista especializada em cinema, manteve o formato extenso das

críticas e o conteúdo aprofundado, para leitores interessados na área do cinema.

Em síntese, os primeiros anos do século XX foram marcados por um crescimento de

obras de cinema e pelo aparecimento de realizadores conceituados, principalmente

europeus e norte-americanos. Até aos anos 50 do século XX, as críticas eram mais

eclécticas, com "tendência ao impressionismo e a recusa de um sistema de valores

preciso e rigoroso para a apreciação dos filmes" (Barreto,2005, pág. 29). Por outras

palavras, as críticas eram mais elitistas e menos rigorosas, baseadas na opinião dos

críticos, que eram geralmente, pessoas pertencentes ao meio cultural da época, que

davam a sua aprovação ou desaprovação em relação ao filme.

Na segunda metade do século XX, com o cinema americano em grande expansão,

sentiu-se uma alteração na estrutura das críticas de cinema, pois os críticos perceberam

que tinham de adaptar o seu discurso às novas circunstâncias. Como os filmes

17

americanos preocupavam-se em agradar as massas, e produzir filmes rentáveis, os

críticos de cinema começaram a focar-se no fator entretenimento, isto é, se os

espectadores iriam usufruir do filme. As críticas de cinema estava subordinadas “a

sucessos mediáticos, a comportamentos de audiências, a várias confusões entre êxito e

valor estético e entre espectáculo e criatividade” (Barroso, 2008). As críticas de cinema

tornaram-se, portanto, mais informativas e permitiam dissecar a história e a estrutura do

filme de forma mais sintética. Desta forma, a crítica começava geralmente com um

resumo da história, e em seguida, uma análise que referia o que o espectador podia

esperar do filme, é por isso, uma crítica mais focada na qualidade do filme e se vale a

pena o espectador despender o seu tempo e dinheiro no filme. Seguindo esta abordagem

mais prática e sintética, nos anos 70, as críticas tornam-se mais completas, com

linguagem técnica e com delimitação de critérios de avaliação.

Nos anos 90 surge a Internet, meio de comunicação que inicialmente se afirmou de

forma tímida, e hoje liga todo o mundo de forma instantânea, gratuita e acessível. As

características da Web obrigaram os suportes impressos a repensar a sua estratégia, o

conteúdo e aparência das críticas de cinema. Em suma, o papel da crítica tem evoluído

desde a sua origem e “não se reduz à mera informação, mas a uma atitude

intencionalmente pedagógica, à formação dos leitores”. (Paixão:2001).

1.3. Função da crítica de cinema

A crítica de cinema não tem como único propósito dizer se um filme é bom ou

mau, e se compensa ser visto. Para o espectador é algo intuitivo, depois de ver um filme,

fica com uma impressão acerca do filme, seja positiva ou negativa. Por vezes um filme

deixa os espectadores desapontados, por questões técnicas que não estão ao alcance do

espectador comum: o argumento é mal estruturado, a banda sonora é exagerada ou

inexistente, a realização não foi bem conseguida; ou por outro lado, o filme torna-se

uma agradável surpresa por boa utilização destes factores técnicos. É aqui que o crítico

tem a sua função de intérprete ou analista do filme, que traduz de uma forma simples os

detalhes técnicos que não familiares ao espectador comum, e explica quais os motivos

que o levam a considerar um filme de qualidade ou, por outro lado, dispensável. No

entanto, o critico de cinema Andre Bazin, relembrou que o papel do crítico não se

restringe aos aspectos técnicos, ele deve conseguir apreciar o filme, e considerá-lo à luz

18

de aspectos económicos, sociais, e históricos. Com efeito, cabe ao crítico salientar os

aspectos menos perceptíveis para o espectador, que depois de ler a crítica, recorda-se de

determinadas cenas do filme, e reflecte sobre o assunto. O crítico é também um didacta,

que vai contribuir para a cultura cinematográfica dos seus leitores, e despertar-lhes

interesse pelo cinema. No momento em que está a escrever a crítica de cinema, o crítico

deve “reflectir com profundidade a análise do estilo, do género, da história que é

contada, focar a figura do realizador e o impacto social da obra”. (Barroso, 2008).

A crítica tem, deste modo, como principais funções informar, interpretar e

avaliar a obra segundo determinados cânones e critérios. Deste modo, este processo

começa pela escolha de um filme a ser criticado, dentro de vários que todas as semanas

estreiam nas salas de cinema. A escolha depende geralmente do público alvo do jornal

ou revista no qual o crítico escreve. Por exemplo, se o crítico de cinema escrever para

um jornal generalista, provavelmente terá fazer uma crítica sobre um filme mais

comercial, susceptível de agradar uma maioria dos espectadores. Por outro lado, no caso

das revistas especializadas em cinema, os críticos tem mais liberdade para escrever

sobre filmes menos conhecidos, uma vez que os próprios leitores procuram críticas

sobre filmes fora do circuito comercial. Por isso antes de mais é necessário escolher o

filme que poderá estar de acordo com o registo do jornal/revista e com os leitores. Para

o crítico literário Jean Starobinski «sólo se interpreta aquello que suscita interés y

parece “prometedor”» (Starobinski,1974, pág. 170), neste caso o que se pensa que vai

ser do interesse dos leitores da publicação.

Depois de escolhida a obra a analisar, o crítico tem como função informar os

leitores, partindo do princípio que está a dar-lhes a conhecer o filme. Caso o leitor já

tenha conhecimento do filme, a função do crítico não deixa de ser menos relevante,

deve informar o leitor sobre o que pode esperar de filme. Deste modo, a crítica é antes

de mais um género informativo, uma notícia sobre o filme que "se transmite

objetivamente" (Dallal:2003).

Assim, a crítica de cinema não só informa sobre as estreias de cinema, como

também aconselha sobre os filmes que estão nas salas de cinema, que muitas vezes são

desconhecidos para o leitor. Por outro lado, há também críticas de cinema que não se

referem a estreias, no entanto, neste caso deve haver uma justificação para se referir

filmes que não são recentes, senão corre o risco de soar despropositado. Geralmente

vemos este tipo de críticas quando há lançamento de um filme em Dvd ou Bluray, e

19

segue-se a crítica depois da notícia principal. De realçar que a presente dissertação,

apenas se debruçou sobre as estreias em salas de cinema.

“El acto crítico selectivo tropieza no obstante con la función de informar”

(Gomis:2008, pág. 170). Segundo o autor Lorenzo Gomis no livro “Teoria dos géneros

periodísticos” os jornais são os meios de comunicação que publicam mais informação

sobre cultura e estreias de cinema, no entanto, é essencialmente através das críticas de

cultura que o fazem. Atente-se que a maior parte das notícias de cinema são dadas

através de críticas, pois não é frequente serem publicadas notícias de filmes sem ser em

formato de crítica ou crónica.

As críticas de cinema geralmente saem no dia seguinte à anteestreia dos filmes,

logo a maioria dos leitores ainda não viu o filme. No entanto, principalmente nas

revistas semanais ou mensais como é o caso da Metropolis, os leitores podem já ter

visto o filme na altura em que lêem a crítica. Depois de verem o filme, os espectadores

terão naturalmente a sua opinião formada, e por isso vão querer comparar com a opinião

de um especialista em cinema. Os espectadores tornam-se leitores atentos e exigentes e

querem um texto mais pormenorizado e referente a determinadas cenas de filme, no

entanto, o crítico nunca deve relevar demais, especialmente as reviravoltas do filme,

tendo em conta que há leitores que ainda não viram o filme e pode estragar-lhes a

surpresa. De fato, é possível fazer uma crítica que agrade os dois tipos de leitores: o

texto pode ter uma espécie de sinopse que introduz o filme ao leitor que ainda não o viu,

e pode ainda ter uma descrição mais pormenorizada sobre certos aspectos do filme, que

apenas o espectador que viu o filme compreende.

“ a crítica tem a intencionalidade pragmática de orientar o consumidor/leitor na selecção de opções culturais que este deve experimentar, como também fazê-lo compreender o produto cultural sob um

determinado ponto de vista” ( Paixão:2001)

Para Eduardo Paz Barroso, jornalista e investigador de assuntos artísticos e culturais, o mais importante na crítica de cinema é:

O carácter jornalístico, a dimensão argumentativa e persuasiva, o conceito de Autor, a classificação por géneros e subgéneros, bem como a hierarquização e valorização, a personalidade e estatuto do crítico (por exemplo, o jornal onde escreve, a credibilidade demonstrada (Barroso, 2008)

20

1.4. Caracterização da crítica de cinema

A crítica é um género opinativo, contudo não significa, que seja destituído de

técnicas jornalísticas. Os textos críticos dão espaço à opinião, contudo, isto não significa

que sejam totalmente subjectivos, pois devem ser tidos em conta parâmetros de

avaliação de forma a dar credibilidade à opinião do crítico. A crítica de cinema surgiu

mais tarde, em meados do século XIX, e destaca-se por ser um texto especializado, que

exige uma linguagem técnica e conhecimentos do tema por parte do crítico, “la crítica

busca informar de las características del film, evaluar sus resultados de acuerdo com un

cierto criterio de valoración” e concluir dizendo o que pensou do filme, incentivando ou

não a vê-lo. (Carmona,1993)

“un texto que se escribe después de que el redactor haya presenciado el acontecimiento y puede dar

su opinión profesional…es decir, com los conocimientos que tiene acerca del evento o del tema”

(Martín, 2009, pág. 42)

Como vimos anteriormente, a palavra “crítica” provém de “krinein”, verbo de origem

grega que significa separar, distinguir e julgar. Apesar da palavra “crítica” ser associada

a uma avaliação negativa, na verdade, trata-se de um erro comum. A palavra abrange

uma análise à obra, tendo em conta aspectos positivos e negativos.

“A palavra crítica guarda a dupla significação de negatividade e positividade. Dela, no entanto, tem-se ressaltado, ao longo dos anos, o sentido negativo, com o qual a empregamos comumente. Criticar passou

a ser um ato de depreciação, que se limita a julgar negativamente, apontando erros ou lacunas. Essa atitude embora persistente não corresponde nem à etimologia, nem à origem histórica da palavra,

tampouco ao desempenho da crítica.” (SAMUEL, 1985, p. 91).

Resumindo é “equivocado assumir el término crítica con ese acto que conduce a

entresacar los defectos del objecto que se analiza. Algo muy equivocado.” (Garcia;

21

Guitiérrez:2011). Com efeito, também a crítica de cinema não consiste apenas em julgar

uma obra, mas interpretá-la e analisá-la, tendo em conta diversos fatores como a estética

e qualidade do filme, os valores sociais e políticos que são transmitidos no filme, assim

como o impacto num determinado país que o filme estreia. A crítica de cinema assume

o papel de estudo e de análise do filme, desta forma, é natural que surja por vezes a

comparação com análise de filmes, disciplina também dedicada à interpretação de

filmes. A análise de filmes interpreta a linguagem e os elementos simbólicos do filme,

deixando a parte técnica para segundo plano (apesar de por vezes a mencionar). Apesar

das críticas de cinema também referirem em alguns casos a simbologia do filme,

destaca-se da análise de filmes por permitir ao crítico expressar a sua opinião. A análise

de filmes “...pode construir também, por si mesma, uma actividade autónoma, paralela à

crítica mas sem carácter avaliativo desta” (Aumont;Marie:2008, pág.13). Assim, tal

como o teórico de cinema que escreve análise de filmes, o crítico de cinema deve ser

capaz de analisar o filme e compreendê-lo, tendo ainda a responsabilidade de dar a sua

opinião. “A crítica tem portanto uma dupla função de informação e avaliação. É o que

em princípio a distingue da análise, cujo objectivo é esclarecer o funcionamento e

propor uma interpretação da obra artística” (Aumont; Marie:2008). Em suma, a

distinção entre os dois é essencialmente o fato de o crítico poder avaliar o filme, e o

analista não o faz, "o crítico pode ser um analista, mas o analista não pode ser um

crítico." (Regina Gomes,2006, pág. 4)

O crítico tem uma grande responsabilidade no que toca ao sucesso do filme. O

fato de escrever num meio de comunicação que o leitor já por si escolhe, faz com que

esteja num posição privilegiada, e que a sua opinião esteja a ser lida por alguém. Tendo

em conta que há vários fatores que levam o leitor a ler a crítica - seja porque quer ver o

filme, ou porque lhe chamou a atenção o título, ou até porque aprecia os textos do

crítico - depois do crítico captar a atenção do leitor, tem um poder de persuasão sobre

ele. Pauline Kael, crítica de cinema americana, salienta a responsabilidade informativa

das críticas de cinema “In the arts, the critic is the only independent source of

information. The rest is advertising” (Cit. por Kael, Pauline – The Reel Deal: Writing

about Movies, p. 3). Com efeito, o crítico pode ser a causa do sucesso ou fracasso de um

filme. Se por um lado, a crítica positiva convencer os leitores, o número de espetadores

do filme pode aumentar, no entanto, um filme que tenha revisão negativa, pode sair

afetado no box office.

22

"O que um jornalista brasileiro escreve sobre um filme americano, por exemplo, não faz a menor diferença para os responsáveis por esse filme. Em primeiro lugar, porque estes não o lerão nunca. E

depois porque, mesmo que tal crítica prejudique a carreira comercial do filme no Brasil, seu sucesso em nosso mercado é uma preocupação de vigésima importância para a indústria de Hollywood. Mas o que o

crítico escreve sobre um filme brasileiro não só importa para a carreira comercial do mesmo, como também mexe com a cabeça de seus realizadores, podendo influenciar o que vamos fazer a seguir. (Cit.

por Diégues –O papel da crítica cultural e cinematográfica, p. 7.).

Com efeito, muitos são os casos de realizadores que viram os filmes a serem

reconhecidos, devido a críticas positivas. O autor Juan A. Hernández reconhece o papel

importante do crítico de cinema e acrescenta, no sentido figurativo, que "sem os quais

muitos realizadores nem existiriam”. No entanto, apesar do poder que o crítico exerce

sobre o leitor, a crítica nunca deixa de ser um artigo de opinião, como vamos ver de

seguida.

1.5. Formato da crítica de cinema

A crítica pode apresentar vários formatos, dependendo do jornal ou revista, e do

espaço que este investe na categoria de cinema. Os texto podem ter vários tamanhos

podendo ir de um parágrafo a 3 páginas. Podem ainda ser acompanhadas de imagens

promocionais do filme, sinopse, e curiosidades acerca do filme.

Por norma, as críticas têm antes do texto, um resumo da ficha técnica do filme como

os atores principais e o realizador, e informações do filme como o seu género e duração.

No entanto tem-se notado um maior número de críticas ligeiras, especialmente em

jornais generalistas. Este fenómeno pode ser explicado pelo pouco espaço cedido ás

categorias das artes, em particular, o cinema. Como vimos anteriormente, os jornais

generalistas procuram abordar vários temas da actualidade, sem dar destaque a nenhum

em particular, o que faz com que os artigos de cinema sejam pouco frequentes e breves.

"A extensão, profundidade e qualidade destes textosvaria de acordo com o jornal e o colunista, mas são quase sempre textos curtos, com o objetivo

de apresentar o filme ao leitor, informando-lhe alguns detalhes sobre o enredo, produção, elenco" (André Ramos França,2002, p. 60)

23

Tendo em conta as diferentes características de cada suporte, a autora Rachel C.

Barreto considera que actualmente existem dois tipos de críticas de cinema, a crítica

elevada e a crítica ligeira.

As críticas elevadas são publicadas em revistas ou jornais especializados em

cinema. Utilizam linguagem técnica, e são mais extensas que as críticas dos jornais

generalistas. O público alvo deste tipo de crítica é exigente, interessado em cinema, e

com conhecimentos na área. No entanto, o trabalho do crítico torna-se mais facilitado

que nos jornais generalistas, pois “não depende das restrições, do formato, das

determinações e do público alvo das publicações de grande

circulação”(Barreto,2005,p.155).

Por outras palavras, o crítico tem mais espaço para escrever e mais liberdade

criativa, porque os seus leitores são mais específicos, e à partida interessam-se pelo

cinema, o que permite ao crítico utilizar uma linguagem mais técnica e especializada,

sem estar constantemente preocupado em cativar a atenção dos leitores.

Por outro lado, a crítica ligeira caracteriza-se pelo texto curto, breve, e tem como

principal objectivo informar os leitores sobre os filmes nas salas de cinema. Vários

críticos não consideram este texto como uma crítica, por ser demasiado sintética, e por

abdicar de carácter avaliativo e reflexivo da crítica de cinema habitual. É por isso "um

texto mais informativo do que analítico" (França,2002, p. 60). A crítica ligeira é mais

utilizada em jornais generalistas, por isso parte-se do princípio que este público é mais

heterogéneo, podendo ter desde leitores com conhecimentos em cinema, a leitores que

não tem interesse na área. Cabe ao crítico incentivar os leitores a irem ao cinema, e

aconselhar sobre os filmes em exibição nas salas. Por vezes, como vimos anteriormente,

o crítico acaba por ter uma abordagem baseada na motivação financeira, isto é, opina

sobre a qualidade do filme, e confirma se o espectador vai sentir que o seu dinheiro do

bilhete foi bem gasto no filme.

Desta forma, conquistar os leitores dos jornais não especializados não é menos

exigente do que escrever para uma revista especializada em cinema, com leitores

conhecedores do tema. De fato, nos jornais generalistas, o texto deve ser “marcado por

um tom didático” que tem intenção de “iniciar os espectadores nos segredos da sétima

arte, inclusive apontando quais filmes deveriam ver e como deveriam interpretá-los.”

(Barreto,2005, p.24) É necessário, portanto, que o crítico seja capaz de incentivar os

leitores a se interessarem por cinema, e formá-lo na matéria, tendo um papel didáctico.

24

Assim, a grande diferença entre críticas de cinema de jornais generalistas e

críticas de revistas especializadas é a profundidade e espaço que é dado a estes artigos.

O crítico de cinema de revistas especializadas tem, efectivamente, maior oportunidade

de comentar filmes menos conhecidos do grande público do que os críticos de cinema

de meios generalistas.

O crítico de cinema da revista francesa Positif, Robert Benayoun, referiu durante

uma entrevista à revista Cahiers du Cinéma5 que reservava as teorias e polémica para as

revistas especializadas em cinema. Citando Benayoun “reservo a análise ‘profunda’

para os leitores mensais”, uma vez que não estava limitado ao número de caracteres, e

podia expressar a sua opinião com mais pormenor. Benayoun considerava que os

críticos de cinema destas publicações eram privilegiados (Cit. Por Robert Benayoun–

Cinema Novo: a onda do jovem cinema e sua recepção na França, p. 62). O fato de os

críticos de cinema dos jornais generalistas estarem limitados ao número de caracteres,

faz com que os textos sejam mais informativos, como guias de cinema, e prescindam de

uma análise mais exaustiva. Os críticos contemporâneos em Portugal tem-se deparado

também com a publicação periódica e pouco frequente das suas críticas de cinema,

muitas vezes em dias aleatórios. Maria do Carmo Piçarra, crítica da revista de cinema

Metropolis, explica este fato pela pressão económica que os meios de comunicação são

sujeitos pelo “modelo de apresentação dos novos media, mais imediatos e com menos

espaço dedicado a cada tema”. Maria do Carmo Piçarra realça ainda que quando iniciou

a sua carreira em 1995, tinha mais espaço para escrever artigos sobre os filmes e

desenvolver as críticas de cinema, contudo, mesmo os suportes especializados em

cinema optaram por reduzir o espaço da crítica, tornando-se, no seu ponto de vista, uma

“tendência internacional”:

“Quando comecei a escrever sobre cinema tinha mais espaço para escrever sobre os filmes edesenvolver a crítica. Progressivamente os jornais e revistas - mesmo da especialidade - passaram a

reduzir o espaço para a crítica” (Ver entrevista em apêndices)

De fato, os próprios jornais e revistas decidem o espaço e formato que as críticas

devem ter, condicionando a escrita e assuntos tratados pelos críticos. Note-se também,

que os critérios de avaliação utilizado em cada suporte nem sempre é do conhecimento

dos leitores, o que leva à questão do próximo ponto : o que é objectivo e o que é

subjectivo nas críticas de cinema.

5 Número 3 do mês de Dezembro de 1961,

25

1.6. A Subjetividade vs. Objetividade das críticas de cinema

A credibilidade e rigor das críticas de cinema têm sido discutidas ao longo dos

anos, devido ao carácter subjectivo dos textos. De fato, é inevitável que o crítico tenha a

sua opinião pessoal, que surge de uma primeira impressão depois de ver o filme,

contudo, devem ser definidos critérios para avaliar as críticas. Por isso fala-se da

dicotomia das críticas de cinema, pois o trabalho do crítico requer objectividade, mas a

subjectividade tem de ser sempre considerada em qualquer texto de opinião ,"the role of

the critic and his/her responsibility as well as objectivity/subjectivity, film knowledge

and ethical concerns related to film criticism" (Tucker,2007, p.6).

Os critérios podem ser definidos pelo jornal ou pelo crítico, e recaem sobre

aspectos técnicos do filme como argumento e história, por exemplo se tem “uma trama

coerente ou um bom roteiro, possui uma mensagem construtiva, usa a linguagem do

cinema de modo pouco convencional, tem personagens interessantes, etc.”; ou ainda a

realização do filme, edição, fotografia ou banda sonora. O crítico deve, por isso, ser

capaz de avaliar os pormenores técnicos e transmiti-los de forma acessível aos leitores.

De fato, a utilização de termos demasiado técnicos podem ser muito selectivos e causar

desinteresse em leitores que não dominem a cultura cinematográfica.

Para o crítico de cinema do Jornal de Notícias, João Antunes, o principal

parâmetro de avaliação de um filme é o “impacto emocional que o filme tem em mim”.

Esta vertente subjectiva não deixa de ser suportada por critérios como o argumento, a

história e a realização. João Antunes revela que a crítica de cinema é antes de mais, uma

vontade de partilhar a sua opinião e conhecimento com o leitor ou espectador.

Por outro lado, Tatiana Henriques, crítica de cinema da revista Metropolis

destaca “a qualidade do argumento e o desenvolvimento da narrativa, uma realização

criativa, direcção de fotografia, a integração da banda sonora na obra e também o

26

desempenho dos atores” como peças fundamentais para avaliar um filme. Por sua vez,

Maria do Carmo Piçarra, também crítica da revista Metropolis, revela que o seu método

passa por avaliar o filme no seu todo e procura “integrá-lo no que conheço sobre a

história do cinema.” Para o efeito, Maria do Carmo coloca questões como a linguagem

que o filme tem, relacionando-o com movimento histórico a que pertence. Assim, apoia-

se numa perspectiva histórica ao invés de uma “abordagem tecnicista”. Maria do Carmo

considera os parâmetros técnicos como a direção de fotografia, a realização e

argumento, como competentes mas que não oferecem “margem para grande reflexão ou

distinção”, especificando no caso da crítica ao cinema industrial.

A par dos conhecimentos e cultura cinematográfica, o crítico deve fazer trabalho

de casa e manter-se sempre actualizado, por isso a autora Betty Tucker aconselha no seu

livro The reel deal: Writing about movies , "you must continue to build your knowledge

of film by seeing and reading about as many movies as you can".

Em suma, apesar das críticas de cinema serem escritas por especialistas ou

escritores com conhecimentos na área, são sempre opinativos, «O discurso da crítica é

um discurso retórico interpretativo e, portanto, fora do campo da “verdade”. Mais que

tentar impor uma visão única da realidade, o crítico propõe-se a convencer o público

amparado pela ambiguidade da linguagem.» (Regina Gomes:2006)

1.7. Estudos publicados

Os estudos empíricos sobre a crítica cinematográfica na imprensa não são

abundantes. No entanto, podemos salientar o trabalho de Rachel C. Barreto que fez uma

retrospectiva da crítica de cinema do ponto de vista histórico, e traçou a evolução até

aos dias de hoje. Na mesma investigação, publicou o estudo de caso que fez às críticas

de cinema no Brasil, e concluiu que as críticas se adaptam ao tipo de suporte em que são

publicadas. Cada suporte tem determinadas características que define os seus leitores,

desde a linguagem, o discurso ou o conteúdo dos artigos. Desta forma, o crítico de

cinema deve adequar o seu texto ao público-alvo do suporte que escreve. Com efeito,

foi possível concluir que, no caso dos jornais generalistas, os leitores tem diferentes

níveis de conhecimento e interesse sobre o cinema. Assim, o crítico tem a difícil tarefa

de tornar o texto apelativo para um maior número de leitores possível e cativá-los a ver

mais filmes.

27

A autora analisou críticas de cinema de alguns suportes brasileiros e verificou

uma nova tendência nas publicações: os textos são cada vez mais curtos e breves, como

se "os críticos estivessem abrindo mão da reflexão e da análise críticas em nome da

orientação de um consumo passageiro, em textos também passageiros" (Barreto, 2005,

p. 162). Por outro lado, o fato de as críticas de cinema abdicarem de uma maior reflexão

e análise, proporciona um contacto maior com os leitores, pois torna os textos mais

acessíveis, e ao não usar linguagem técnica e especializada, há maior probabilidade de

conquistar leitores que não se consideram cinéfilos, isto é, espectadores que não são

assíduos de cinema. Pode concluir-se que esta nova tendência, também visível em

Portugal, traz a desvantagem de serem textos sem profundidade e que, em alguns casos,

a avaliação do crítico não é perceptível. No entanto, este tipo de texto cumpre a função

informativa da crítica, e pode resultar em jornais que invistam pouco espaço na

categoria de cinema.

O docente e investigador, Eduardo Paz Barroso, escreveu o livro Locomotiva

dos sonhos(2008), onde dedica especialmente no primeiro capítulo um estudo à crítica

de cinema. Faz um paralelismo entre a evolução da crítica mundial e em Portugal,

utilizando estudos de caso.

O autor André Ramos França refere, na sua dissertação Das teorias do cinema à

análise filmica (2002), que tem verificado uma perda de qualidade nas críticas de

cinema. Com efeito, aponta como principal causa a tentativa dos jornais de adequarem

os textos à vida dos leitores. Dada a vida atarefada das pessoas, e o reduzido tempo e

pouca concentração para lerem textos extensos, tem-se optado por críticas mais

sintéticas. Os crítico adaptaram, por isso, as críticas ao novo estilo de vida dos leitores,

e optam actualmente por textos mais informativos, substituindo alguns parágrafos de

texto por "gráficos e outras ilustrações que pretendem informar ainda mais rapidamente

o leitor, tornando o texto um coadjuvante." Desta forma, André Ramos França considera

que as críticas de cinema são cada vez mais um guia informativo para os leitores, e tem

como principal objectivo dar a conhecer o filme ao leitor. No entanto, o autor esclarece

que, na sua opinião, o limite de caracteres não é impeditivo da qualidade do texto, e que

uma crítica de cinema pode ser pequena, mas sólida e bem estruturada, depende,

efectivamente do conteúdo e da forma como o crítico avalia o filme e o transmite por

escrito.

28

Capítulo II: Metodologia

Na presente investigação recolheram-se, durante o mês de Outubro e primeira

quinzena de Novembro de 2012, críticas de cinema de cinco media portugueses com

características diferentes. Desta forma, escolheram-se os suportes Atual, Ípsilon, Diário

de Notícias, Jornal de Notícias e a revista Metropolis. Os suplementos Atual(Expresso)

e Ípsilon (Público) são publicações semanais, que referem-se a tema sobre arte e

cultura. O Diário de Notícias, é um jornal híbrido, o Jornal de Notícias um jornal

popular, e a revista Metropolis, especializada em cinema.

2.1. A análise de conteúdo

Depois de recolhida a amostra de críticas de cinema dos vários suportes, decidiu

fazer-se uma análise ao conteúdo dos textos. Este ponto centra-se no filme avaliado, e

para esse efeito, recolheu-se informações como o género de cada filme, o ano de

produção, e o País de origem.

Assim, recolheu-se o género de cada filme com o intuito de saber qual o tipo de

mercado cinematográfico em Portugal, e que filmes são mais comercializados nas salas

de cinema (são os filmes de acção? Dramáticos?).

A origem do filme permite concordar ou não com a impressão geral dos

espectadores, de que os filmes norte americanos dominam as estreias de cinema.

Por outro lado, interessou recolher o ano de produção de cada filme, de forma a

esclarecer a ideia que se criou ao longo dos anos, de que os filmes chegavam a Portugal

com muito tempo atraso em relação aos Estados Unidos.

Em suma, nesta análise espera-se concluir se há atrasos nas estreias de filmes em

Portugal (e se há, com que intervalo de tempo) pois a data de estreia em Portugal de

todos os filmes da amostra foi o ano de 2012, como também concluir se os filmes norte-

americanos continuam a representar a maioria das estreias nas salas de cinema; e por

fim, quais os géneros de filmes mais frequentes nas salas de cinema.

Expôs-se os resultados de cada jornal e revista em tabelas individuais, e aplicou-

se os mesmos critérios a todas as críticas de cinema dos diferentes suportes, pelo que,

no futuro, pode dar continuidade a estudos relacionados com a investigação.

Ainda no âmbito do estudo, fez-se um inquérito (Apêndices) pelos críticos de

cinema dos suportes estudados, na tentativa de ter uma opinião de críticos portugueses

29

no activo. O questionário foi elaborado como forma de dar a conhecer um pouco da

realidade das publicações portuguesas, a formação dos profissionais da crítica de

cinema, e quais os parâmetros de avaliação que utilizam.

2.2. A análise de Discurso

Depois de uma análise ao conteúdo das críticas de cinema, decidiu

complementar-se com uma análise ao discurso das mesmas. Assim, analisou-se o

discurso dos críticos, o tom que utilizaram para expressar a sua opinião e, por fim,

comparou-se esses aspectos com a avaliação que deram aos filmes, isto é, se avaliaram

o filme positiva ou negativamente.

Esta análise permite tirar conclusões sobre o tipo de linguagem mais utilizada

nas críticas de cinema de cada um dos suportes. De fato, existe uma espécie de

estereótipo em volta das críticas publicadas nos jornais portugueses, que levam alguns

leitores a associarem crítica de cinema a um texto elitista e complexo. Por essa mesma

razão, pretende esclarecer-se qual o tipo de linguagem predominantemente utilizada nas

críticas, relacionando com a estrutura do próprio suporte, os seus conteúdos e leitores a

quem se dirige. Atente-se que a amostra era composta por um jornal popular, um jornal

de carácter híbrido, dois suplementos sobre arte e uma revista de cinema. Se

compararmos o discurso de todos os textos destes jornais, encontramos naturalmente,

diferenças no discurso e na linguagem utilizada, pois o tipo de artigos que publicam e o

público-alvo são diferentes. Assim, com esta análise pretende-se comparar o discurso

das críticas de cinema de cada periódico, assim como o tom utilizado pelos críticos para

expressar a sua opinião. Com o parâmetro "avaliação" pretende-se contabilizar as

críticas positivas e negativas de cada suporte, e elucidar sobre outro preconceito criado

pelos leitores de que a maioria das críticas são pejorativas, em especial sobre filmes

norte americanos.

Ainda no âmbito da investigação, distribui-se um inquérito pelos críticos de

cinema dos suplementos estudados.

30

Capítulo III: Resultados e discussão

O presente capítulo apresenta os resultados obtidos na análise de críticas

cinematográficas durante o mês de Outubro e primeira quinzena de Novembro de 2012,

em 4 jornais e uma revista de cinema portugueses. Ao longo de um mês e quinze dias

fez-se uma análise ao discurso e ao conteúdo das críticas dos jornais Diário de Notícias

e Jornal de Notícias, dos suplementos semanais dos jornais Expresso (Atual) e Público

(Ipsílon) e da revista especializada em cinema, Metropolis.

Assim, numa primeira parte, fez-se uma análise de conteúdo, centrada no filme

analisado em cada crítica. Os parâmetros estudados são o género do filme, o ano de

produção e o País de produção. Com o estudo pretende-se concluir quais foram os

géneros cinematográficos mais e menos frequentes nas críticas de cada jornal ou revista.

Atente-se que, a cada filme podem pertencer vários géneros. Por outro lado, o ano de

produção permite detectar atrasos nas estreias de filmes nas salas de cinema em

Portugal, comparando o ano corrente (2012) ao ano de produção no país de origem. Por

fim, ao recolher os País de origem de cada filme permite concluir se os filmes norte

americanos continuam a representar a maioria das estreias nos cinemas. No entanto, por

vezes um filme pode ter mais que um País na sua produção, nestes casos atribuímos o

nome de co-producões.

Numa segunda parte, refere-se ao discurso das críticas, e por isso, estuda a

linguagem e o tom que o crítico utilizou no texto. Nesta secção é também considerada a

avaliação final que o crítico atribuiu ao filme, positiva, negativa ou ambigua. Em suma,

o presente capítulo estuda o conteúdo das críticas e os filmes que aborda, assim como o

discurso utilizado nas críticas.

31

3.1. Suplemento Atual (Jornal Expresso)

Periodicidade: Semanário

Dias: Sábados

No período em análise, mês de Outubro e primeira quinzena de Novembro de 2012, o

suplemento Atual publicou 33 críticas cinematográficas. O suplemento Atual é um

semanário que pertencente ao jornal Expresso.

A maioria dos textos do suplemento Atual incidiu sobre filmes incluídos na categoria

Drama, seguido dos filmes de comédia e os de acção (ver Tabela1). Os géneros menos

representados são os filmes de guerra, animação e westerns. Assim, em 34 géneros

mencionados nas críticas do Atual, o género Drama, representa 29% da amostra.

Tabela 1- Géneros dos filmes mencionados nas críticas

Género de filme Número Percentagem

Guerra 1 3%

Comédia 6 18%

Acção 5 15%

Drama 10 29%

32

Documentário 3 9%

Histórico 3 9%

Animação 1 3%

Terror 2 6%

Western 1 3%

Biografia 2 6%

A maioria dos filmes que foram objecto de crítica estreou no ano 2012, com 25 filmes

em 33 analisados, ou seja 76% do total da amostra. Em 2012 estreou um filme com ano

de produção de 2010 o que corresponde a um atraso de dois anos nas salas portuguesas.

Estreou também um filme com ano de produção de 2009, o que corresponde a 3 anos de

atraso em Portugal (ver tabela 2).

Tabela 2- Ano de produção dos filmes

Ano de produção Número Percentagem

2012 25 76%

2011 6 18%

2010 1 3%

2009 1 3%

Na amostra recolhida do suplemento Atual, existem 10 origens possíveis de filmes.

Cada filme pode ter mais de que um País envolvido na sua produção, o que significa

que podem existir co-produções. Desta forma, co-produção acontece quando mais que

um País se une na produção do filme. Segundo a tabela 3, os filmes dos Estados Unidos

são os mais frequentes nas críticas do suplemento Atual, com 28% dos resultados. De

seguida surgem os filmes franceses e portugueses. Os filmes polacos, chineses e

húngaros surgem no fundo da tabela.

33

Tabela 3- Origem dos filmes

Origem do filme Número Percentagem

Portugal 7 13%

França 10 19%

EUA 15 28%

Bélgica 4 7%

Alemanha 3 5%

Canada 2 4%

Itália 4 7%

Espanha 6 11%

Polónia 1 2%

China 1 2%

Hungria 1 2%

Na análise ao discurso das críticas, constatou-se que 70% das críticas tem uma leitura

facilmente legível, com predominância de vocabulário simples e frases acessíveis. Com

efeito, as restantes criticas têm um discurso heterogéneo, isto é, alternam entre frases

rebuscadas, e passagens informais.

O tom sóbrio foi o mais utilizado pelos críticos, com 30% dos resultados.  O tom sóbrio

indica que não foi perceptível no texto elogios ao filme ou comentários pejorativos, e

que o crítico optou por uma abordagem neutra.

De seguida, com apenas menos uma crítica que o anterior, surge o tom negativo e

crítico, caracterizado por comentários que mostram desagrado como “A estrutura

34

narrativa é inútil”6 ou “No gesto, o filme perde mais do que ganha”7. Com 21% dos

resultados surge o tom de admiração, onde o crítico utiliza adjectivos para mostrar o

fascínio pelo filme, como por exemplo “…são uma tour de force com sentido de

economia impressionante, levando a palavra de Brandão à sua essência alucinatória – e

é com este efeito puramente cinematográfico…”8. Por fim, também com 21% dos

resultados, o tom humorístico e descontraído, onde prevalecem expressões cómicas e

um discurso informal «…o nosso herói recolhe a encomenda que o título português

“armadilhou…”».

Por fim, como indica a tabela 4, a maior parte das críticas de cinema do suplemento

Atual foram de conotação negativa (57%), onde se utilizaram frases como

“Infelizmente, a matéria humorística esgota-se a meio caminho”9. As restantes 42% das

críticas reflectem a boa impressão dos críticos sobre os filmes.

Tabela 4 - Avaliação dada pelo crítico

Avaliação do crítico Número Percentagem

Positiva 14 42%

Negativa 19 57%

6 Atual, dia 10 de Novembro de 2012. A moral conjugal por Vasco Batista Marques 7 Atual, dia 13 de Outubro de 2012 . Adeus, minha rainha por Vasco Batista Marques 8 Atual, dia 13 de Outubro de 2012. O gebo e a sombra por Francisco Ferreira9 Atual, dia 13 de Outubro de 2012. [Rec] 3 Génesis por Vasco Batista Marques

35

3.2. Suplemento Ípsilon (Jornal Público) Periodicidade: Semanário

Dias: sextas-feiras

O suplemento Ípsilon publicou 22 críticas cinematográficas durante o período de

análise. Os filmes de género Drama lideram com  35% dos resultados, seguido pelo

género documentário com 16%.  No fundo da lista estão a Ficção científica e animação

(Tabela 1).

Tabela 1- Géneros dos filmes mencionados nas críticas

Género de filme Número Percentagem

Acção 3 10%

Ficção cientifica 1 3%

Drama 11 35%

Comédia 1 3%

Guerra 1 3%

Documentário 5 16%

Crime 2 6%

Animação 1 3%

Western 2 6%

36

Histórico 2 6%

Biografia 2 6%

Como indica a tabela 2, a maioria dos filmes foram produzidos em 2012, com 16

críticas em 22, ou seja  73% da amostra. Por outro lado, 13% dos filmes referidos nas

críticas estrearam cerca de 1 ano depois do seu ano de produção  (2011) , e os outros

13% estrearam 3 anos depois nas salas de cinema portuguesas (2009).

       Tabela 2- Ano de produção dos filmes

Ano do filme Número Percentagem

2012     16 73%

2011       3 13%

2009       3 13%

Os filmes com origem norte americana representam a maioria das críticas, com 29% dos

resultados, seguido de França com 19% e Portugal com 16%. A China e Polónia

encontram-se no fim da lista com apenas um elemento na amostra.

Tabela 3- Origem dos filmes

Origem do filme Número Percentagem

EUA 9 29%

China 1 3%

França 6 19%

Bélgica 3 10%

Polónia 1 3%

Portugal 5 16%

Itália 2 6%

Reino Unido 2 6%

37

Espanha 2 6%

Verificou-se que mais de metade das críticas, isto é 52% são facilmente legíveis, com

predominância de vocabulário e frases simples. De seguida, 43 % das críticas tem um

discurso heterogéneo, e alternam entre palavras elaboradas e passagens mais acessíveis.

Por fim, apenas um texto da amostra utiliza gíria popular, calões ou expressões

idiomáticas.

Com 41% dos resultados, o tom de admiração foi o mais utilizado nas críticas. Neste

tom os críticos  recorrem a elogios, adjectivos, hipérboles e comparações para mostrar o

seu agrado pelo filme. A título de exemplo podemos referir a crítica publicada no dia 12

de Outubro de 2012 a Looper(2012)10:

«Daqui sai um filme de género com volta na ponta, que passa a vida a tirar o tapete de baixo dos pés do

espetador mas sem nunca fazer pouco, e que cumpre ao risco o caderno de encargos pronunciado por Jeff

Daniels :”Tenta apenas ser novo”»

Seguem-se críticas escritas com tom sóbrio, que representam 32% da amostra. O tom

negativo e crítico, representam 23% dos casos. No entanto, com uma diferença

relevante, o tom humorístico e descontraído, caracterizado pela utilização de piadas e

expressões cómicas, tem apenas um elemento na amostra.

       

Por conseguinte, as críticas do suplemento Ípsilon revelam uma maioria de críticas

positivas, com 55% da amostra. As críticas negativas representam 41% da amostra, e

pela primeira vez surge a crítica de conotação ambígua, na qual é difícil  identificar a

opinião do crítico.

Tabela 4 - Avaliação dada pelo crítico

Avaliação do crítico Números Percentagem

Positiva 12 55%

Negativo 9 41%

10 Ípsilon, dia 12 de Outubro de 2012. Looper por Jorge Mourinha

38

Ambígua 1 5%

3.3. Diário de Notícias

Periodicidade: Diário

O Diário de notícias foi o segundo suporte com mais críticas publicadas, sendo apenas

superado pelo suplemento do Expresso ( Atual) que publicou 33 críticas. O Diário de

notícias reuniu 26 críticas durante o período analisado.

Segundo a tabela 1 verifica-se uma predominância dos filmes de género Drama, que

correspondem a 46% das críticas da amostra. Com uma diferença significativa, seguem-

se os géneros Ação e Documentário com 11%. No fundo da lista surgem os géneros

Histórico, Romance, Animação, Crime, Biografia, Terror, Thriller, Fantasia, Aventura.

39

Tabela 1- Géneros dos filmes mencionados nas críticas

Género de filme Número Percentagem

Histórico 1 3%

Drama 12 32%

Romance 1 3%

Ficção ciêntifica 3 8%

Guerra 1 3%

Acção 4 11%

Documentário 4 11%

Animação 1 3%

Comédia 3 8%

Crime 1 3%

Histórico 2 5%

Biografia 1 3%

Terror 1 3%

Thriller 1 3%

Fantasia 1 3%

Aventura 1 3%

Os filmes com ano de produção de 2012 estiveram em maioria nas críticas do  Diário de

Notícias, com 69% dos resultados. Segundo a tabela 2, 15% dos filmes referidos nas

críticas estrearam um ano depois do seu ano de produção (2011),  8% estrearam dois

anos depois do ano de produção (2010), e 8%  tiveram três anos de atraso (2009) nas

salas de cinema.

Tabela 2- Ano de produção dos filmes

Ano de produção Número Percentagem

40

2012     18 69%

2011       4 15%

2010       2 8%

2009       2 8%

O Diário de Notícias contraria a tendência dos restantes jornais e revistas da amostra,

verificando-se uma maioria de filmes de origem Francesa. Contrariamente às outras

publicações que tiveram maior número de críticas sobre filmes americanos, no Diário

de Notícias verificou-se uma vantagem dos filmes francófonos com 20% dos resultados.

Em seguida, surgem os filmes americanos, com 18%. No final da lista surgem os filmes

de países da Europa de leste - Bósnia e Herzegovina, Liubliana, Servia - e ainda

Singapura, Malásia, Indonésia, Canadá, China e Hungria.

. Tabela 3- Origem dos filmes

Origem do filme Número Percentagem

Espanha 3 6%

França 10 20%

Bélgica 5 10%

Reino Unido 2 4%

Alemanha 3 6%

Bósnia e Herzegovina 1 2%

Liubliana 1 2%

Servia 1 2%

EUA 9 18%

Singapura 1 2%

Malásia 1 2%

Indónésia 1 2%

Portugal 6 12%

Canadá 1 2%

China 1 2%

Itália 3 6%

41

Hungria 1 2%

Na amostra verificou-se que 18 em 26 críticas, isto é, 69% tem um discurso legível, com

frases e linguagem simples. Por sua vez, 31% da amostra refere-se a críticas com

discurso heterogéneo, que alternam entre palavras rebuscadas, e passagens mais

informais.

O tom mais utilizado nas críticas foi de admiração, com 46% dos casos. Neste tipo de

texto, o crítico recorre a elogios, adjectivos, hipérboles e comparações para reforçar o

seu agrado pelo filme, é exemplo deste discurso a passagem “…consegue um admirável

equilíbrio entre o fresco histórico e a montagem dos destinos individuais”11 ou «O

“Monstro” é irresistível, chama-se Sparky e é…um cão!”12. De seguida, com 38% da

amostra, surge o tom sóbrio que é caracterizado pela avaliação do crítico, sem recorrer a

elogios ou elementos pejorativos para demonstrar o ponto de vista. Com apenas um

elemento da amostra, surge o tom humorístico, onde o crítico apresenta uma postura

descontraída na análise do filme, e utiliza piadas e expressões cómicas.

Por fim, 62% das críticas cinematográficas do Diário de notícias são de conotação

positiva. Expressões como “Apesar dos três anos de atraso com que chega ao mercado

português, este é um grande acontecimento”, ajudam a reforçar o agrado do crítico. Por

outro lado, 23% das críticas tiveram avaliação negativa, e 15% foram consideradas

ambíguas pela opinião pouco clara do crítico.

Tabela 4 - Avaliação dada pelo crítico

Avaliação do crítico Números Percentagem

Ambígua 4 15%

Positiva 16 62%

Negativa 6 23%

11 Diário de Notícias, 2 de Outubro de 2012. Cirkus Colombia por João Lopes12 Diário de Notícias, 18 de Outubro de 2012. Frankenweenie por João Lopes

42

3.4. Metropolis

Periodicidade: mensal

A presente dissertação recolheu críticas cinematográficas durante o mês de Outubro e a

primeira quinzena de Novembro, no entanto, dada a periodicidade mensal da revista

Metropolis, que é disponibilizada online no primeiro dia de cada mês, serão

consideradas as críticas publicadas durante os dois meses na revista.

Nas publicações de Outubro e Novembro de 2012, a revista Metropolis apresentou 17

críticas cinematográficas, na secção “Críticas”. O género Drama voltou a ser o mais

frequente, com 38% dos resultados. Segue-se o género comédia, com 24%. Os géneros

biografia, animação e documentário ocupam os últimos lugares da lista. (Tabela 1)

Tabela 1- Géneros dos filmes mencionados nas críticas

Género de filme Número Percentagem

Drama 8 38%

Comédia 5 24%

Acção 3 14%

Thriller 2 10%

Biografia 1 5%

43

Animação 1 5%

Documentário 1 5%

Dos filmes analisados pelos críticos da revista, 12 em 17, isto é 71% da amostra, foram

filmes produzidos em 2012. No entanto, 29% dos filmes foram produzidos em 2011, e

estrearam um ano depois nos cinemas Portugueses.

Tabela 2- Ano de produção dos filmes

Ano do filme Número Percentagem

2012     12 71%

2011       5 29%

Mais uma vez os filmes dos Estados Unidos voltam a liderar o número de estreias

nacionais. Como se pode constatar pela tabela 3, 7 em 17 críticas referem-se a filmes

americanos, o que corresponde a 27%. Seguem-se os filmes franceses com 23% da

amostra. No fim da lista surgem Alemanha, Polónia, Reino Unido, Suécia, Espanha e

Hungria com um filme na amostra.

Tabela 3- Origem dos filmes

Origem do filme Números Percentagem

França 5 19%

Bélgica 3 12%

Alemanha 1 4%

Polónia 1 4%

EUA 7 27%

Itália 3 12%

Reino Unido 1 4%

Portugal 2 7%

44

Suécia 1 4%

Espanha 1 4%

Hungria 1 4%

Depois de uma análise ao discurso é possível concluir que metade das críticas da revista

Metropolis são legíveis, com discurso claro e simples. Contrariamente, 13% da amostra

corresponde a um discurso predominantemente hermético, com palavras e frases

complexas.

Por outro lado, 33% das críticas correspondem a um discurso misto, onde intercala

frases acessíveis com passagens mais rebuscadas.  Por fim, apenas uma crítica da

amostra tem um discurso que utiliza gíria popular e calões.

Cerca de 6 críticas num total de 17, o que representa 35 % da amostra, e por

conseguente a maioria, mostram admiração do crítico pelo filme. Para o efeito, o crítico

recorre a elogios, adjectivos, hipérboles e comparações para provar o seu ponto de vista,

como por exemplo a publicação em Novembro de Manuela Costa sobre o filme

Palme:” É uma história notável, que já merecia o olhar que a distância do passar do

tempo começa a permitir.”13

De seguida, surge o tom sóbrio com 29% da amostra, nestes textos o crítico não tece

elogios nem críticas demasiado óbvias, opta por um discurso mais imparcial.

O terceiro discurso mais utilizado é o discurso humorístico e descontraído com 24% da

amostra. Este género pontua-se por utilização de piadas, expressões cómicas como

“Mas, quanto mais não seja, revela que Woody já tem idade para saber que Roma não se

faz num dia.”14

Por fim, com apenas 12% da amostra, pode concluir-se que os discursos negativos e

críticos estão em minoria nas publicações da Metropolis.

Como refere a tabela 4, as críticas da revista Metropolis são na sua grande maioria de

conotação positiva, com 82% da amostra.

13 Metropolis, mês de novembro de 2012. Palme por Manuela Costa14 Metropolis, mês de Outubro de 2012. Para roma com amor por Vasco Batista Marques

45

Tabela 4 - Avaliação dada pelo crítico

Avaliação do crítico Número Percentagem

Positivo 14 82%

Negativa 3 18%

46

3.5. Jornal de Notícias

Periodicidade: Diário

Durante o período de estudo, o Jornal de Notícias teve o menor número de críticas de

cinema, com 4 publicações. Dada a amostra reduzida, nenhum género é predominante, e

os géneros Comédia, Acção, Animação, Fantasia, Drama tem apenas um elemento no

total da amostra.

Tabela 1- Géneros dos filmes mencionados nas críticas

Género de filme Percentagem

Comédia 1 20%

Acção 1 20%

Animação 1 20%

Fantasia 1 20%

Drama 1 20%

Os quatro filmes analisados pelos críticos têm ano de produção de 2012. Assim, 100%

da amostra refere filmes sem atraso, ou com atraso de menos de um ano nas salas de

cinema.Tabela 2- Ano de produção dos filmes

Ano do filme Número Percentagem

47

2012       4 100%

Os filmes dos Estados Unidos representam a maioria, com 3 críticas na amostra, o que

representa 43% da amostra. Por sua vez, França, Espanha, Itália e Hungria tem apenas

um elemento na amostra.

Tabela 3- Origem dos filmes

Origem do filme Números Percentagem

França 1 14%

Espanha 1 14%

Itália 1 14%

Hungria 1 14%

EUA 3 43%

A análise ao discurso permitiu concluir que as quatro críticas têm um texto legível, com

uso de frases e vocabulário simples.

O tom do texto mais utilizado foi de admiração, onde o crítico utiliza figuras de estilo

como a comparação, elogio, hipérbole para enfatizar o agrado pelo filme. Na publicação

do crítico João Antunes no dia 25 de Outubro pode verificar-se este tom de admiração:

“…o filme destaca-se pela excelência da direcção de um realizador de ascendência

portuguesa…”15. O tom humorístico e o tom sóbrio ocupam os últimos lugares com

apenas um elemento na amostra.

       Avaliação do crítico Número Percentagem

Ambígua 2 50%

Positiva 2 50%

Em suma, a avaliação dos críticos do Jornal de Notícias dividiu-se equitativamente entre

15 Jornal de Notícias, dia 25 de Outubro de 2012. Skyfall por João Antunes

48

críticas positivas e negativas. Assim, 50 % das críticas foram positivas, e os restantes 50%

referem-se a críticas negativas.

3.6. Síntese

Durante o mês de Outubro e primeira quinzena de Novembro de 2012 foram recolhidas

as críticas de cinema publicadas nos suplementos Atual (Expresso) e Ípsilon (Público) ,

nos jornais Diário de Notícias e Jornal de Notícias, e na revista Metropolis.

O suplemento Atual (Expresso) foi o periódico que mais críticas de cinema publicou

durante o período de análise, com um total de 33 críticas. O Diário de Notícias foi o

segundo suporte a publicar mais críticas de cinema, com 26 no total. Seguiram-se o

suplemento Ípsilon (Público) com 22; a revista especializada em cinema Metropolis,

com 17. Com uma diferença significativa dos restantes, o Jornal de Notícias, foi o

suporte que menos espaço dedicou a críticas de cinema, com 4 críticas publicadas no

período de estudo.

Com excepção do Jornal de Notícias, os filmes de género "Drama" estiveram em maior

número nos suportes. No Jornal de Notícias não houve género maioritário, uma vez

que, publicou apenas quatro críticas de cinema, e todas se referiam a filmes com

géneros diferentes.

Em todos os suportes, as críticas abordaram, maioritariamente, filmes com ano de

produção de 2012. Isto quer dizer que a maioria dos filmes analisados nas críticas não

tiveram atraso - ou o atraso teve menos de um ano - na estreia nas salas portuguesas. O

suplemento Atual e o Diário de Noticias foram os que apresentaram maior espectro de

datas de produção. De fato, nas críticas do Diário de Notícias e o suplemento Atual

foram analisados filmes com data de produção de 2012, 2011, 2010, e 2009. Assim,

estes dados indicam que houve atrasos nas salas de cinema portuguesas de 1 a 3 anos,

em relação à data de produção do filme. É comum comentar-se que os filmes costumam

chegar tarde a Portugal, por esse motivo, este estudo prova que apesar de a maioria dos

filmes terem pouco tempo de atraso nas salas de cinema, há uma percentagem de filmes

com atrasos significativos de 1 a 3 anos.

49

Os filmes norte americanos foram os mais referidos nas críticas de cinema, com

excepção do Diário de Notícias que publicou mais críticas sobre filmes franceses.

Também no suplemento Atual, no suplemento Ípsilon, e na revista Metropolis os filmes

franceses apresentaram percentagens altas nas críticas, ocupando o segundo lugar. Este

fato deveu-se ao festival de cinema "Festa do Cinema Francês", que teve lugar em

várias cidades do país e exibiu vários filmes franceses durante o mês de Outubro e

Novembro de 2012.

Em todos os suportes a maioria das críticas tinham discurso legível, com linguagem

predominantemente simples. Em menor número, foram também recolhidos textos com

linguagem hermética e formal; e ainda discursos heterogéneos ,isto é, críticas de cinema

com predominância de linguagem simples e simultaneamente passagens mais

rebuscadas. Por fim, com menores percentagens, o texto humorístico; e o texto com uso

de calões e gíria popular.

O tom mais utilizado pelos críticos no suplemento Ípsilon, no Diário de Notícias, no

Jornal de Notícias e na revista Metropolis foi de "admiração". Este tom caracteriza-se

por um discurso positivo, que recorre a elogios, hipérboles e comparações para enfatizar

o agrado do crítico pelo filme. Estes dados permitem concluir que nestes suportes a

maioria das críticas foram avaliadas de forma positiva pelos críticos. No entanto, no

suplemento Atual a maioria das críticas tem um tom sóbrio, que se caracteriza por um

discurso neutro, no qual o crítico avalia o filme, sem utilizar elogios ou comentários

pejorativos.

O suplemento Atual foi o único suporte da amostra a publicar, maioritariamente, críticas

negativas, isto é, foram dadas mais avaliações negativas aos filmes. Por outro lado, os

críticos do suplemento Ípsilon, do Diário de Notícias e da revista Metropolis,

publicaram maior número de críticas positivas. O Jornal de Noticias foi a excepção,

com metade de críticas positivas e metade das críticas negativas.

3.7. Dados explicativos

A escolha da amostra, entre os diversos jornais e revistas portugueses, teve como

base dois critérios: a diversidade de fontes e o discurso utilizado em cada uma destas.

Naturalmente, o discurso e os temas abordados definem o tipo de público que lê cada

50

uma destas publicações. Assim, jornais de referência diários como Público, ou

Expresso, tem uma linguagem predominantemente hermética e informam de assuntos

mais restritos como economia ou política. Por sua vez, o Jornal de Notícias, de carácter

popular, publica notícias diárias mais generalistas. Em seguida optou-se Diário de

notícias, jornal diário de carácter híbrido. Por fim, escolheu-se a revista especializada

em cinema, Metropolis, antiga revista impressa Premiere, agora apenas disponível

online.

Durante as primeiras semanas do mês de Outubro, verificou-se um elevado

número de críticas sobre filmes Portugueses e Franceses, contrariamente às expectativas

iniciais, que esperavam uma maior atenção aos filmes americanos, devido à maior

produção de obras deste país. No entanto, este caso pode ser explicado pelo evento que

estreou em Portugal no dia 4 de Outubro, a 13ª Festa do Cinema Francês. Durante

algumas semanas foram exibidos filmes franceses em várias cidades portuguesas.

Destaque para, o filme estreado neste evento, “Galinha com ameixas” que não poderia

passar despercebido, pois não só é uma produção francesa, como conta com a

internacional atriz portuguesa, Maria de Medeiros. Também a estreia de “Astérix e

Obélix, ao serviço de sua Majestade”, já fora da competição deste evento, aumentou o

número de críticas a filmes franceses. Por outro lado, Portugal esteve também

representado neste mês em vários jornais devido à estreia de duas grandes produções

portuguesas : “Linhas de Wellington” e “O gebo e a sombra”. O primeiro, conta com

uma equipa técnica e artística inglesa e francesa, enquanto “Gebo e a sombra” é o mais

recente filme de Manoel de Oliveira, conceituado realizador português.

No caso dos filmes europeus, eram frequentes as cooperações e co-produções

com outros países, isto é, o filme pode estar associado a um determinado país (por

exemplo França) , mas ter apoios/ patrocínios, e ser filmado noutros países (Espanha,

Alemanhã, por exemplo). A esta colaboração dá-se o nome de co-produção. No entanto,

no caso dos filmes americanos, as afiliações com outros países, não foram tão

frequentes, isto deve-se ao fato de os EUA serem a maior indústria cinematográfica,

com as maiores produtoras, logo mais financiamento. Na Europa os apoios financeiros

são menores, e em grandes produções, difíceis de serem sustentados por um único País,

por isso unem-se a outros países que contribuem com atores nativos, cenários, despesas

ou mesmo patrocínios.

Como foi referido, nesta dissertação apenas se considerou críticas sobre filmes a

estrear nas salas de cinema. Assim sendo, o ano de estreia em Portugal de todos os

51

filmes da amostra é 2012, ano que estava a decorrer durante o período de recolha da

amostra. Não se considerou críticas de cinema sobre lançamentos de filmes em DVD,

Bluray, ou mesmo críticas sobre filmes que não são recentes.

3.8. Formação dos críticos de cinema

Uma das questões que surge quando se fala de críticas de cinema é “Qual a

formação do crítico de cinema?”. Esta resposta é essencial, pois quando se trata de uma

área especializada como o cinema, é necessária cultura e /ou formação para se avaliar

um filme, e para posteriormente, se transmitir uma avaliação séria e credível aos

leitores.

O jornalista cultural, Iván Tubau, considera que em Espanha, País onde se

formou e trabalha, há uma carência de críticos especializados, e considera dois tipos de

críticos com lacunas no exercício da sua profissão: os primeiros, que não tem formação

e cultura suficiente na área, e os segundos que não dominam a técnica informativa e a

escrita.

Desta forma, o crítico deve ter formação ou experiência na área de cinema, de

forma a conseguir avaliar parâmetros técnicos do filme como, o argumento, realização,

direcção de fotografia, que são imperceptíveis ao espectador comum. Por outro lado, se

possível, deve ter conhecimentos na escrita de textos de opinião, de forma a conseguir

transmitir a sua ideia com facilidade. De fato, para escrever uma crítica de cinema, o

crítico deve ter noções da especialização em causa, neste caso em cinema, e deve

articular com um discurso acessível para todos os leitores, tanto para os cinéfilos como

para os leigos na matéria. Os autores Víctor Manuel García e Liliana María Gutiérrez no

seu livro Manual de géneros periodísticos sugerem os críticos a condensar em poucas

palavras as variantes de uma obra, e a evitar “la terminologia rebuscada, para

impresionar y presumir de erudición”(García; Gutiérrez, 2011, p. 207).

Note-se, mais uma vez, a importância de os críticos serem pessoas

especializadas na área, que dominem a linguagem da obra, e saibam avaliá-la do ponto

de vista técnico e não apenas baseado na primeira impressão. O fato de compreenderem

os filmes e dominarem a linguagem cinematográfica e técnica vai permitir-lhes fazer

uma crítica mais coesa e com referência a pormenores que facilmente escapam à

52

maioria dos espectadores. A título de exemplo, o crítico pode revelar que a cena de

acção do filme estava demasiado longa, e o som estava demasiado baixo; estes aspetos,

mesmo não sendo imediatamente perceptíveis pelo espectador, fazem-no reflectir e

associar à sua memória visual do filme, compreendendo assim, porque não gostou

daquela parte do filme em específico. A autora Ana Atorresi sintetiza a importância de

críticos que dominem a linguagem da obra:

“Por crítica especializada entendemos la formulación de juicios de valor por parte de un especialista en la

materia, no desde un ángulo subjetivo sino como resultado de un análises aparentemente objetivo,

metódico y fundamentado del acontecimento”(Atorresi,s.d,p.36).

Há algumas décadas, a pouca oferta de cursos relacionados com cinema em

Portugal, e a ausência de formação sobre a arte de escrever a crítica de cinema, levou

muitos dos atuais críticos das publicações a começarem a escrever críticas de cinema de

forma académica. João Antunes, crítico do Jornal de Notícias, começou a escrever de

forma amadora ainda durante o tempo de faculdade, numa revista de cinema que o

próprio criou no final dos anos 70. Apesar da sua licenciatura ser em Economia, a

verdade é que o crítico desde cedo se apercebeu pelo seu gosto pelo cinema e durante os

seus estudos, criou um cine-clube no Instituto Superior de Economia, e assim fez a sua

fomação, vendo filmes “compulsivamente”, como o próprio refere, em circuitos

comerciais e mais restritos como Cinemateca ou Fundação Gulbenkian.

Tatiana Henriques, crítica de cinema da revista de cinema Metropolis,

acompanhou a evolução da mesma, desde a altura em que era a versão impressa

Premiere. Inicialmente fazia reportagens e entrevistas para as quais a licenciatura de

Ciências da Comunicação -Variante Jornalismo- a preparou, e mais tarde, foi convidada

pelo director da revista a fazer críticas de cinema.

Contudo, como vimos anteriormente, os críticos de cinema foram surpreendidos

pela recente redução do espaço para críticas de cinema nos jornais e revistas, o que

levou a uma alteração das redacções. Nos jornais generalistas, a crítica de cinema é cada

vez mais reduzida, e em alguns suportes surge apenas periodicamente, sem dia certo de

publicação. Reduziram-se os artigos de cinema, assim como se abdicou da contratação

de teóricos de cinema para escrever apenas críticas. Os editores contrataram jornalistas

para escrever críticas de cinema, que muitas vezes não tinham conhecimentos,

formação ou gosto na área, e foram obrigados a desdobrar-se por múltiplas categorias

53

das “Artes”, sem no entanto ter uma especialidade. Por outro lado, o aumento

significativo de sites e blogs de cinema -mais ou menos amadores- também levou a um

aumento de críticos de cinema que na maioria dos casos não tem especialização na área.

Tem-se visto um número cada vez maior de cinéfilos que escrevem sobre cinema sem

qualquer remuneração, mesmo em meios de comunicação com maior potencial. Por esta

razão, a crítica de cinema da revista Metropolis, Maria Carmo Piçarra, pensa que a

profissão de crítico de cinema regrediu. Considera que há poucos críticos de cinema em

Portugal “com a necessária formação, capacidade de reflexão e argumentação além de

cultura cinematográfica”, que estejam a par dos media internacionais da especialidade.

Maria Carmo Piçarra concluiu dizendo que falta na crítica de cinema portuguesa, a

lógica da crítica francesa, inglesa ou norte-americana; já Tatiana Henriques, crítica na

mesma revista, considera que a crítica portuguesa se equipara à crítica internacional,

mas que esta tem apenas mais visibilidade e meios que as nacionais.

Atente-se que, mesmo que o crítico de cinema seja um cinéfilo com grandes

conhecimentos técnicos, nunca podemos esquecer que a crítica de cinema é um texto

opinativo, logo nunca há total objectividade. "O crítico é, antes de tudo e sempre, um

espectador que experiencia sozinho cada filme”, e formula a sua opinião dependente da

primeira impressão que reteu do filme (Barreto,2005, p.67). No entanto, torna-se

indispensável que o crítico nunca se abstraia da sua função e que desde o início veja o

filme com uma visão tecnicista. O crítico não "assiste um filme sem compromisso, mas

em função da escrita posterior de um texto crítico sobre aquele

filme"( Barreto,2005,p.67).

A crítica de cinema tem tido algumas alterações ao longo da história, no entanto,

estes últimos anos marcaram um ponto de viragem para todos os suportes impressos,

que sentiram-se ameaçados pelos conteúdos gratuitos e acessíveis que a internet oferece.

Ainda assim, cabe às próprias publicações e aos críticos de cinema adaptarem-se aos

novos media, e continuarem a sua função de didatas de cinema, como também continuar

a informar sobre as estreias de cinema.

3.9. Conclusões

54

Um dos principais obstáculos da investigação foi a necessidade de agrupar os critérios

da amostra, de forma a abranger todos os dados. Inicialmente recolhidas as críticas dos

jornais e revistas impressos e online, os textos apresentavam-se, naturalmente, de forma

diferente, por terem sido escritos por diferentes autores. Assim, durante uma pré-estudo

anterior à recolha tentou criar-se conceitos que permitissem avaliar todas as críticas da

mesma forma. No entanto, estes pontos eram por vezes demasiado redutores, e não

permitiam justificar casos específicos.

Um dos casos em que se verificou esta síntese foi na categorização de crítica positiva e

negativa. Assim, como “crítica negativa” considerou-se de 1 a 2 estrelas, e a pontuação

média, de 3 estrelas , entra na categoria “crítica positiva” onde figuram obras com

pontuação até 5 estrelas, o máximo. Nos casos em que a pontuação vai até 10, divide-se

da seguinte forma: “crítica negativa” de 1 a 5 estrelas, a segunda metade é uma “crítica

positiva”. Desta forma, não se considerou a crítica “medíocre” ou “satisfatória”, porque

essa categoria indicaria que o crítico salientou aspectos positivos e negativos no filme,

mas no fim considerou-o razoável. No entanto, poderia originar conflitos na amostra,

pois grande parte dos críticos salienta as melhores e piores partes de um filme nas suas

críticas, mas acaba por ter sempre uma posição mais dominante.

As críticas de cinema mostraram-se presentes na imprensa portuguesa, mesmo em

suportes não especializados. Depois de recolher diariamente as críticas dos jornais

Diário de Notícias, Jornal de Notícias, suplementos Atual e Ípsilon, e revista de cinema

Metropolis, foi possível constatar as conclusões deste estudo, que tem como objectivo

compreender o espaço dedicado às críticas de cinema nas publicações portuguesas. As

divergências entre publicações verificaram-se, essencialmente, na regularidade que

publicavam críticas, na extensão das críticas, e na quantidade de críticas por publicação.

Assim, tendo em conta as hipóteses que foram colocadas inicialmente, conseguiu-se

provar que (H2) verificam-se diferenças entre as críticas dos jornais de referência,

populares e especializados. Verificou-se que os dois jornais de referência Público e

Expresso, têm suplementos dedicados à arte, Ípsilon e Atual, respectivamente, que

publicam maior quantidade de críticas - cerca de duas a três páginas de crítica. Em

ambos, a primeira crítica é geralmente a mais extensa, e as seguintes são mais curtas.

55

No caso do jornal popular Jornal de Notícias, é dado pouco espaço às críticas, com uma

regularidade pouco certa das publicações e textos muito curtos, com um parágrafo por

norma.

Por outro lado, inicialmente, colocou-se a hipótese (H1) que pretendia provar se a

linguagem dos textos era hermética e elaborada. Esta hipótese surgiu pela noção

preconcebida que se foi criando acerca das críticas de cinema, como textos pouco

acessíveis e utilização de linguagem complexa. Contudo, a maioria dos suportes

apresentou linguagem acessível, com excepção de casos pontuais.

Em relação à formação dos críticos (H3), não foi possível traçar um perfil tão

objectivo como gostaríamos, uma vez que apenas recebemos resposta de três críticos

dos suportes estudados : João Antunes do Jornal de Notícias, Maria Carmo Piçarra e

Tatiana Henriques da revista Metropolis. Dos três críticos pudemos concluir que apesar

de não terem formação específica em cinema, partilham desde jovens o gosto pelo

cinema, e têm experiência na escrita de críticas de cinema em outros jornais ou revistas.

Os três críticos mostraram também a óbvia ligação à crítica de cinema, e não referiram

experiência na realização de cinema ou cargos técnicos. Por outro lado, as três respostas

não nos permitem concluir a idade maioritária dos críticos, mas dos três, apenas Tatiana

Henriques tem menos de 25 anos, o que nos permite excluir a ideia que a grande

maioria dos críticos é jovem. Apesar nos três casos não referirem formação num curso

de cinema e experiência no cinema, demonstram por outro lado, experiência na escrita

de críticas de cinema e cultura cinematográfica.

Um dos inconvenientes deste tipo de estudo prende-se com o fato de qualquer amostra

recolhida se referir a um determinado período de tempo, o que impossibilita retirar

qualquer conclusão definitiva sobre as críticas de cinema publicadas em qualquer um

destes suportes.

Por outro lado, considera-se que a presente dissertação pode abrir portas para o estudo

de críticas de cinema em Portugal, e serve como manual teórico para estudos de outros

Países. Por fim, espera-se que o mesmo, seja um guia para os cinéfilos e interessados

em cinema perceberem qual é o periódico que mais se identifica com o tipo de crítica

que procuram.

56

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Artigos impressos

Gomes, Regina - Crítica de cinema : História e influência sobre o leitor. Crítica Cultural. ISSN 1980-6493. Volume 1: Número 2 (2006)

58

Artigos electrónicos

Pereira, Reinaldo Maximiano e Costa, Tatiana Alves de Carvalho - Papel da crítica cultural e cinematográfica. s.d., s.d., s.d. [Consulta em 27 De Fevereiro de 2013]. Disponível em https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&cad=rja&ved=0CCkQFjAA&url=http%3A%2F%2Fwww.unilestemg.br%2Frevistacomplexus%2F01edicao%2Ftextos_revista02%2F10artigo2_reinaldo02.doc&ei=L9-oUcewA-mp7AbSuYCABA&usg=AFQjCNHFHkpQ6zIf38eMFTRECeK3MoykNg&sig2=g7GHAw-LVyBNF52uGN17NA.

Teses / Investigações

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Barreto, Rachel C. – A crítica de cinema na Imprensa Brasileira. Belo Horizonte: Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG, 2005.

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Apêndices

Modelo do inquérito cedido aos críticos de cinema

1. Há quanto tempo é crítico de cinema?

2. Como começou a sua carreira como crítico(a) de cinema?

3. Tem alguma formação específica em cinema (exemplo: curso de cinema)?

4. Lê criticas de cinema de outros jornais?

5. Na sua opinião, qual a diferença entre a crítica de cinema que se faz em Portugal e a de outros países? (que tenha conhecimento)

6. Quais são os parâmetros que privilegia quando faz a crítica a um filme? (Argumento, Realização, Direcção de fotografia...)

7. Tem preferência por algum destes tipos de cinema? (Pode escrever até 4 pontos na resposta)

Resposta

____________________________________________________________________________

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a) Cinema Indiano

b) Cinema Francês

c) Cinema Espanhol

d) Cinema Português

e) Cinema Africano

f) Cinema Australiano

g) Cinema Asiático

h) Cinema Norte americano

i) Cinema Sul americano

j) Outro. Qual?

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