modelaÇÃo do processo de digestÃo anaerÓbia da

82
MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA FORSU À ESCALA INDUSTRIAL Celso Duarte Correia Gonçalves Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia do Ambiente Júri Presidente do Júri: José Manuel de Saldanha Gonçalves Matos, DECivil, IST-UTL Orientador: Professora Doutora Susete Martins Dias, DEQB, IST-UTL Co-Orientador: Professor Doutor Filipe José Gama Freire, DEQB, IST-UTL Vogal: Doutor Tiago Faria, EFACEC, SA Vogal: Doutor Santino Di Berardino, LNEG Outubro de 2012

Upload: trinhkien

Post on 09-Jan-2017

224 views

Category:

Documents


5 download

TRANSCRIPT

Page 1: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO

ANAERÓBIA DA FORSU À ESCALA INDUSTRIAL

Celso Duarte Correia Gonçalves

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

Engenharia do Ambiente

Júri

Presidente do Júri: José Manuel de Saldanha Gonçalves Matos, DECivil, IST-UTL

Orientador: Professora Doutora Susete Martins Dias, DEQB, IST-UTL

Co-Orientador: Professor Doutor Filipe José Gama Freire, DEQB, IST-UTL

Vogal: Doutor Tiago Faria, EFACEC, SA

Vogal: Doutor Santino Di Berardino, LNEG

Outubro de 2012

Page 2: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

1

Page 3: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

2

Agradecimentos

Quero deixar os meus agradecimentos à Professora Dra.Susete Martins-Dias e ao Professor Dr.

Filipe G. Freire por todo o conhecimento e orientação que possibilitaram a realização deste trabalho;

ao Doutor Tiago Faria, director da Divisão de Residuos Sólidos da EFACEC Ambiente, pela simpatia,

auxílio e meios disponibilizados; às engenheiras Inês Moura e Catarina Rodrigues, pelo constante

apoio, troca de experiências e informações indispensáveis para a calibração do modelo. Agradeço

também a toda a equipa EFACEC Ambiente, Valorlis e Suldouro pela disponibilidade de realizarem

visitas técnicas às Instalações de Valorização Orgânica, que foi uma mais valia para o meu trabalho.

Ao Dr.Santino Di-Berardino do LNEG, por me ter aberto novos horizontes no conhecimento cientifico

sobre o processo de digestão anaeróbia, que se revelou ser de grande utilidade.

Aos estagiários Angelo Crocamo e Rafaelle di-Geovani, pela amizade e experiências trocadas

durante o seu estágio nas Instalações do LNEG.

À minha familia e amigos pelo apoio e motivação e à Inês Rodrigues, pelo carinho e amizade.

A todos os que me ajudaram, me motivaram e tornaram este trabalho possível.

Um muitíssimo obrigado.

Page 4: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

3

Page 5: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

4

“I think and think for months and years. Ninety-nine times, the conclusion is false. The hundredth time I am right."

Albert Einstein

Page 6: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

5

Page 7: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

6

Resumo

A complexidade do processo industrial de produção de biogás constitui um obstáculo à sua

optimização. A formulação de modelos cinéticos possibilita a compreensão dos fenómenos que

ocorrem em reactores, abrindo portas à automação e controlo.

Neste trabalho, para melhor compreender o processo de digestão anaeróbio (DA), foi realizada uma

revisão bibliográfica do conhecimento científico e tecnológico e foram apresentados os mais recentes

métodos de monitorização e controlo, incluindo métodos de cálculo do desempenho da digestão

anaeróbia.

Seguidamente desenvolveu-se um modelo matemático, que descreve a degradação anaeróbia da

fracção orgânica de resíduos sólidos urbanos, em reactores à escala industrial. O estudo tem como

base, modelos desenvolvidos por diferentes autores, onde foram incluídos três grupos de

microrganismos genéricos, com diferentes parâmetros cinéticos, obtidos da bibliografia. Os fluxos

degradativos foram agrupados em três etapas: hidrólise, acidogénese/acetogénese e metanogénese.

O modelo simula as principais cinéticas biológicas, como a decomposição de matéria de baixa

degradabilidade, formação de ácidos orgânicos voláteis e produção de biogás. O pH e as espécies

ionizadas/desionizadas são também calculados num total de 9 balanços de massa e 6 equações de

equilíbrio químico. Como principais simplificações, considerou-se um reactor bifásico, gás-líquido,

isotérmico a 35ºC, com transferência de massa entre fases homogéneas e perfeitamente agitadas,

com 5% de sólidos totais e 50% de sólidos voláteis.

Os digestores anaeróbios da Valorlis, caso de estudo, foram modelados, optimizando os objectivos e

alterando os parâmetros operatórios. O modelo simula um arranque, com cinéticas coerentes com a

bibliografia, atingindo o estado estacionário após 6 meses, tendendo para os valores experimentais

observados.

Palavras-chave: Digestão Anaeróbia, Escala Industrial, FORSU, Modelação, Monitorização

Page 8: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

7

Abstract

The industrial complexity of the process of biogas production is often a drawback to the optimization.

Kinetic models allowed the understanding of current phenomenon’s in reactors making possible the

automation and control.

To deepen the knowledge of the process, a bibliographic research of the scientific, technological and

monitoring state-of-art of the anaerobic digestion process was made, including performance

calculations to find the parameters that best suited for optimization.

A mathematical model that describes the general degradation of organic fraction of municipal solid

waste in full scale reactors was then developed. The current study is based on models developed by

several authors, where it was included the microbial growth kinetics, each one with their own

parameters, found in the bibliography. The kinetic flux was divided into three processes: hydrolysis,

acidogenic/acetogenic and methanogenic. The model simulates the decomposition of low

biodegradable matter in high biodegradable matter, acid formation and production of biogas. It also

includes pH calculation and physical-chemical equilibrium relationships among ionized/unionized

species. As main simplification, it was considered a biphasic, liquid/gas reactor, isothermal at 35ºC

with mass transfer between phases, homogenized and stirred perfectly with 5% of total solids of which

50% are volatile solids.

The full scale model was applied to Valorlis reactors, optimizing it by objectives and by changing the

operational parameters. The model correctly simulates a start-up in an industrial. The steady state is

achieved after 6 months at which time the variable values are in accordance with the experimental

values observed.

Key-words: Anaerobic Digestion, Modeling, Monitoring, OFMSW, Scale-up

Page 9: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

8

Índice

1 INTRODUÇÃO............................................................................................................................ 14

1.1 Digestão anaeróbia da FORSU ............................................................................................ 16

1.1.1 FORSU como substrato da digestão anaeróbia ............................................................. 17

1.1.2 Pré-tratamentos............................................................................................................. 18

1.1.3 Principais tecnologias aplicadas .................................................................................... 18

1.1.4 Descrição do processo da CVO da Valorlis e da CVO da Suldouro ................................ 19

1.1.5 Etapas de processo microbiológico e bioquímico ........................................................... 20

1.1.6 Condições operatórias ................................................................................................... 26

1.2 Variáveis de monitorização .................................................................................................. 30

1.2.1 Indicadores de controlo ................................................................................................. 30

1.2.2 Indicadores de estabilidade ........................................................................................... 32

1.2.3 Modelos matemáticos de digestão anaeróbia ................................................................ 36

1.3 Objectivos do estudo ............................................................................................................ 39

2 MATERIAIS E MÉTODOS .......................................................................................................... 41

2.1 Monitorização....................................................................................................................... 41

2.1.1 Parâmetros experimentais de controlo do processo ....................................................... 41

2.2 Modelo cinético não-linear .................................................................................................... 43

2.2.1 Considerações gerais .................................................................................................... 43

2.2.2 Metodologia de calibração e validação .......................................................................... 44

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................................................... 45

3.1 Análise e discussão dos parâmetros operatórios .................................................................. 45

3.2 Análise da performance dos digestores ................................................................................ 46

3.3 Descrição do formalismo do modelo ..................................................................................... 46

3.3.1 Estrutura do modelo ...................................................................................................... 48

3.3.2 Equações da fase líquida .............................................................................................. 49

3.3.3 Equações da fase gasosa.............................................................................................. 50

3.3.4 Determinação do pH e Alcalinidade ............................................................................... 51

3.4 Implementação do formalismo proposto ............................................................................... 52

4 CONCLUSÕES........................................................................................................................... 57

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................ 59

Page 10: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

9

Anexos ............................................................................................................................................. 65

Anexo A.I – Determinação das características do substrato ........................................................... 67

Anexo A.II – Equações dos parâmetros operatórios e cálculo de performance .............................. 69

Anexo A.III – Equações do Modelo ................................................................................................ 71

Anexo A.IV – Medições dos parâmetros operatórios ...................................................................... 75

Anexo V – Simulações do Modelo ................................................................................................. 81

Page 11: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

10

Índice de Figuras

1 INTRODUÇÃO

Figura 1. Biogás Produzido na Europa, em ktep, no ano de 2009 (EUROBSERV’ER, 2010), a partir de

biomassa e da fracção orgânica do Resíduo Sólido Urbano (Biomass &FOMSW ) de Lamas de ETAR

(Sewage) e em aterro sanitário (Landfill). .......................................................................................... 15

Figura 2. Ranking de produção de Biogás na Europa, em tep/1000 hab, no ano de 2009

(EUROBSERV’ER, 2010) .................................................................................................................. 15

Figura 3. Evolução temporal das tecnologias de DA em termos de teor de sólidos, à esquerda, e

gamas de temperatura, à direita (Fonte: De Baere, 2006). ................................................................ 17

Figura 4. Esquemas de processos por via seca e semi-seca comercializados pela Dranco (à

esquerda), Kompogas (centro) e Valorga (à direita). (Fonte: Vandevivere et al, 2002). ...................... 19

Figura 5. Esquema típico do processo por via húmida e fase única (Vandevivere et al, 2002). .......... 19

Figura 6. Esquema do processo de produção de biogás da CVO da Valorlis ..................................... 20

Figura 7. Esquema do processo de digestão anaeróbia .................................................................... 21

Figura 8. Influência da pressão parcial de hidrogénio na energia livre de Gibbs, durante a

acetogénese e formação de metano. Zona viável de produção de metano na área a verde. Ácido

acético, 25mM; Propiónico, Butírico, láctico e etanol,10mM; Sulfito, 5mM; Bicarbonato, 20mM;

Metano, 0,7atm (Adaptado de Di-Berardino, 2006) ............................................................ 22

Figura 9. Inibição do ácido acético em função do pH. (Fonte: Deublein e Steinhauser, 2008) ............ 25

Figura 10. Relação entre a carga orgânica e a produção de biogás em m3/ t SV, (MT-metric tonne)

(Hartmann e Ahring, 2006), para diferentes gamas de temperatura, concentração de sólidos e pré-

tratamentos, relativo à FORSU (OFMSW) ......................................................................................... 27

Figura 11. Relação inversa entre o teor em lenhina e celulose e a biodegradabilidade (%), da matéria

orgânica (Buffiere et al., (2006)) ........................................................................................................ 28

Figura 12. Taxa de crescimento relativa dos microrganismos psicrófilos, mesofílicos e termofílicos

(adaptado de Schӧn (2009)).............................................................................................................. 29

Figura 13. Produção de biogás, em unidades de volume de gás por SV vs. TRS, onde a relação entre

C.Org e rendimento em biogás é Y=0,84-0,072xC.Org, para regimes termófilos por via húmida e teor

de SVinput de 5%=50kg/m3 Hartmann H., Ahring B.K. (2006). ............................................................. 31

Figura 14. Fracções dissociadas e protonadas da amónia, ácido sulfídrico, dióxido de carbono e ácido

acético em função do valor de pH. As constantes de equilíbrio e equações químicas usadas para a

realização deste gráfico, encontram-se no anexo A.III. ...................................................................... 33

Figura 15. Variação do pH e da Alcalinidade em função dos AGV (adaptado de Cecchi, 2005).

Representação da zona de baixo risco, a vermelho, com base no indicador de AGV/ALC e a gama de

pH para o qual o processo é estável, representado a azul, no eixo do pH. ........................................ 34

Figura 16. Interdependência entre o pH, o teor em CO2 no gás e a Alcalinidade, a 35ºC (EPA, 1979).

......................................................................................................................................................... 34

Page 12: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

11

Figura 17. Taxas relativas de formação de ácidos: acético, propiónico e butírico, em função da

concentração de hidrogénio (Gerber e Span, 2008) .......................................................................... 35

Figura 18. Fases do crescimento microbiano: (1) fase de latência, adaptação a substrato; (2) fase de

aceleração do crescimento; (3) fase de crescimento exponencial ou fase de crescimento de primeira

ordem; (4) fase de abrandamento (5) fase de estacionária e (6) fase de decaimento (Gerber e Span,

2008). ............................................................................................................................................... 37

2 MATERIAIS E MÉTODOS

Figura 19. Variação do TRH, em dias, e da concentração de ST no digestor 1 da Valorlis, em g/l,

durante o ano de 2011. (As medições do digestor 2 encontram-se no Anexo A.IV)............................ 42

Figura 20. Produção de biogás e sua qualidade no digestor 1 da Valorlis, durante o ano de 2011. .... 42

Figura 21. Variação do pH e teor de CO2 no digestor 1 da Valorlis, durante o ano de 2011. .............. 43

Figura 22. Variação da alcalinidade e ácidos orgânicos totais no digestor 1 da Valorlis, durante o ano

de 2011. ........................................................................................................................................... 43

Figura 23. Esquema de Calibração e Validação do modelo ............................................................... 44

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Figura 24. Esquema do reactor bifásico perfeitamente agitado com trocas de massa entre fases,

usado no modelo proposto. ............................................................................................................... 47

Figura 25. Diagrama do modelo proposto. ......................................................................................... 48

Figura 26. Cálculo iterativo do pH e das espécies iónicas em equilíbrio ............................................. 52

Figura 27. Simulação do modelo para diferentes caudais no tempo...... Error! Bookmark not defined.

Figura 28. Simulação da produção de biogás e teor em CH4 (à esquerda) e do pH e AGVt (à direita).

......................................................................................................................................................... 55

Figura 29. Simulação do arranque do digestor, onde é visível à esquerda, a evolução dos SV de

entrada e de saída, SVin e SVout. Este último constituído pela soma entre o substrato de baixa e alta

biodegradabilidade, Sp e Sh, respectivamente, e biomassa total, em termos de sólidos suspensos

totais (SSV). À direita em pormenor, é apresentado o crescimento da biomassa hidrolítica,

acidogénica/acetogénica e metanogénica, Xh, Xa e Xm, respectivamente, no tempo. ....................... 55

Page 13: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

12

Índice de tabelas

1 INTRODUÇÃO

Tabela 1. Comparação entre diferentes poderes caloríficos de vários combustíveis (Abbasi et al.,

2012). ............................................................................................................................................... 14

Tabela 2. Exemplos de produtos de fermentação de glucose e amina (adaptado de Boe (2000)). ..... 22

Tabela 3. Energia livre de algumas reacções da acetogénese (Adaptado de Berardino (2006)) ......... 23

Tabela 4. Reacções de associações sintróficas de bactérias (adaptado de Ferreira (2010)). ............. 23

Tabela 5. Energia livre de algumas reacções da metanogénese (Adaptado de Berardino (2006)) ..... 24

Tabela 6. Condições ambientais óptimas para digestão anaeróbia. (adaptado de Deublein e

Steinhauser (2008)). ......................................................................................................................... 26

Tabela 7. pH óptimo em diversos grupos de bactérias (adaptado de Berardino (2006)) ..................... 32

Tabela 8. Potencial de oxidação redução e respiração (adaptado de Gerardi, 2003) ......................... 35

Tabela 9. Alguns dos modelos cinéticos de digestão anaeróbia para a produção de biogás e principais

parâmetros incluídos, em reactores homogéneos e perfeitamente agitados (SVB – sólidos voláteis

biodegradáveis, XL- fracção de lípidos, XP- fracção de proteínas, HAc- acetato, HPr- propionáto, HBt-

butiráto) (adaptado de Gerber e Span (2008)) ................................................................................... 38

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Tabela 10. Condições iniciais e de arranque. .................................................................................... 53

Tabela 11. Parâmetros cinéticos, no modelo proposto (adaptado de Liu et al. (2007)) e constantes

cinéticas alteradas, através da optimização por objectivos. ............................................................... 54

Tabela 12. Comparação entre os valores obtidos, pelo modelo e os valores experimentais industriais,

em estado estacionário. .................................................................................................................... 55

Page 14: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

13

Lista de abreviaturas

ALC Alcalinidade

AGV Ácido orgânico volátil

APOH Bactérias produtoras obrigatórias de hidrogénio

Cj Molécula com j carbonos

GNC Gás natural comprimido

C:N Razão de carbono e azoto

CO2e Dióxido de carbono equivalente

CQO Carência química de oxigénio

CQOs Carência química de oxigénio em solução

DA Digestão anaeróbia

Eh Potencial de redução e oxidação

FORSU Fracção orgânica de resíduo sólido urbano

PC Poder calorífico

PCI Poder calorífico inferior

RSU Resíduo sólido urbano

ST Sólidos totais

SST Sólidos suspensos totais

SV Sólidos voláteis

SSV Sólidos suspensos voláteis

Tep Tonelada equivalente de petróleo

TRH Tempo de retenção hidráulico

TRS Tempo de retenção de sólidos

Page 15: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

14

1 INTRODUÇÃO

O uso do biogás pela humanidade remonta ao séc. X a.C. a povos como os Assírios e Antiga China,

cujo domínio da técnica permitia o seu uso para aquecimento de banhos e outros usos domésticos,

tal como o aproveitamento do digerido estabilizado anaerobiamente para a agricultura (He, 2010).

Desde a 1ª grande crise energética na segunda metade do século XX, com o aumento do preço dos

combustíveis fósseis e com o aumento das preocupações ambientais, a União Europeia tem vindo a

realizar grandes apostas com a utilização de combustíveis renováveis de baixo custo, estando entre

eles o biogás.

O biogás, mais especificamente, o biometano é um gás produzido naturalmente quando a matéria

orgânica é decomposta em meio húmido e na ausência de oxigénio por microrganismos

metabolicamente activos. Na natureza, o metano é formado em corpos de água estagnada como

lagos, pântanos e sistemas digestivos de ruminantes.

As vantagens da produção de biogás sobre outro tipo de energias renováveis existentes no mercado

(Tabela 1), relaciona-se com o facto de conter um poder calorifico da mesma ordem de grandeza da

do gás natural, a um menor custo, sendo produzido através de matéria biodegradável considerada

como resíduo, contribuindo para a redução de emissão de gases de efeito de estufa para a atmosfera

(cerca de 23 vezes menos que o gás natural). Por outro lado, a energia final do biogás pode ser

aplicada em diferentes áreas de intervenção, tais como a combustão directa e produção de calor,

geração de electricidade e integração na rede de gás natural, utilização como combustíveis para

veículos e, em ultima análise, a aplicação em pilhas de combustíveis.

O facto de ser produzido localmente, com pouca ou nenhuma dependência de combustíveis fósseis,

pode conduzir a menores volumes depositados de orgânicos biodegradáveis em aterros sanitários,

com consequente redução da produção de lixiviados, que propiciam a degradação da qualidade da

água e do ar (Abbasi et al., 2012).

Tabela 1. Poder calorífico de vários combustíveis e respectivas emissões em CO2 equivalente (Abbasi et al., 2012).

Combustível Poder calorífico

inferior (PC)

Factor de emissões indirectas

(kg CO2e/GJ, base PCI)

Petróleo 10800 kcal kg-1

12,51

Gás Natural 8600 kcal m-3 5,55

Gás Natural liquefeito 13140 kcal kg-1 20,00

Querosene 10300 kcal kg-1 13,34

Diesel 10700 kcal kg-1 14,13

GNC 8600 kcal m-3 8,36

Biogás 5000 kcal m-3 0,246

Page 16: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

15

Figura 1. Biogás Produzido na Europa, em ktep, no ano de 2009 (EUROBSERV’ER, 2010), a partir de biomassa e da fracção orgânica do Resíduo Sólido Urbano (Biomass &FOMSW ) de Lamas de ETAR (Sewage) e em aterro sanitário (Landfill).

Figura 2. Ranking de produção de Biogás na Europa, em tep/1000 hab, no ano de 2009 (EUROBSERV’ER, 2010)

Page 17: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

16

O processo de digestão anaeróbia é, hoje em dia, competitivo no mercado das energias renováveis

(Raposo et al, 2011) e encontra-se em expansão por toda a Europa (Figura 1 e Figura 2). A produção

média de biogás na Europa atingiu os 16,7 tep/1000 hab em 2009, destacando-se a Alemanha, o

maior produtor, com 51,5 tep/1000 hab de energia primária obtida a partir de biogás de resíduos

agrícolas, como por exemplo do milho, e da fracção orgânica de resíduos sólidos urbanos (FORSU).

Em 2010, Portugal ainda não ultrapassava os 2,2 tep/1000 hab, estando numa fase de crescimento.

1.1 Digestão anaeróbia da FORSU

As tecnologias aplicadas à digestão anaeróbia da FORSU diferenciam-se pelo regime hidráulico

(contínuo, descontínuo ou semi-contínuo) pelo teor em sólidos no digestor (via húmida e seca) e

também pela gama de temperaturas em que ocorre a digestão (mesofílicos e termofílicos).A escolha

do tipo de tecnologia depende essencialmente do investimento a realizar e características do resíduo,

pois sistemas por via húmida, ou de baixa carga, obrigam ao uso de grandes volumes de reactor para

processar grandes quantidades de matéria orgânica, com consequentes custos elevados de

tratamento de efluentes. Mas, por outro lado, possibilitam uma maior estabilidade, devido à grande

difusão de possíveis inibidores. Tecnologias de alto teor de sólidos, proporciona baixos volumes de

reactor, altas cargas orgânicas e menores custos de investimento inicial, mas, em contrapartida

requerem equipamentos mais caros (Vandevivere et al, 2002).

Até ao início dos anos 90, as tecnologias dominantes eram por via húmida, em regime mesofílico,

descritas nos subcapítulos 1.1.6.4 e 1.1.6.6, devido principalmente à sua estabilidade (Figura 3). Com

o avanço do conhecimento científico, houve um despoletar destas tecnologias em substituição de

sistemas por via seca em regime termofílico. Até 2006, verifica-se que quer em termos de via húmida

ou seca quer em termos de regime mesofilo ou termófilo, existe uma estabilização tendencial dos

processos.

Outro tipo de processos prende-se à utilização de tecnologias de estágios múltiplos, devido ao facto

das etapas da degradação anaeróbia serem maioritariamente sequenciais e independentes da etapa

seguinte, possibilitando uma maior flexibilidade optimização e controlo cada uma das etapas. Para

este tipo de tecnologia, tipicamente são utilizados dois reactores: o primeiro para hidrólise/liquefação

e acetogénese e o segundo para a metanogénese.

No primeiro reactor, o tempo de retenção é limitado pela taxa de hidrólise da celulose e no segundo

pela taxa de crescimento das bactérias metanogénicas (Reichert, 2004). Devido ao facto de a

separação de fases ser pouco conhecida, segundo De Baere (2006), mais de 92% da capacidade

instalada é realizada em processos de estágio único, em que a metanogénese e a

hidrólise/acidogénese ocorrem no mesmo reactor.

Page 18: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

17

Figura 3. Evolução temporal das tecnologias de DA em termos de teor de sólidos, à esquerda, e gamas de temperatura, à direita (Fonte: De Baere, 2006).

1.1.1 FORSU como substrato da digestão anaeróbia

De forma a tirar partido do máximo de rentabilidade da reutilização e valorização do potencial

energético endógeno de resíduos, com o menor risco sanitário e de saúde pública, as instalações de

tratamento de resíduos sólidos urbanos (RSU) necessitam de responder aos diferentes estímulos de

mercado, quer através de incentivos comunitários, quer por restrições impostas para a deposição de

resíduos em aterro (PERSU II, 2007).

Na perspectiva da gestão de RSU, quer sejam originados pelas grandes concentrações urbanas ou

pela produção agrícola e industrial intensiva, o aproveitamento energético a partir da digestão

anaeróbia (ou biogasificação), da FORSU em metano e dióxido de carbono apresenta-se como uma

solução adequada sendo uma tecnologia sustentável actualmente e em rápido crescimento (De

Baere, 2006), devido essencialmente à dupla produção de energia renovável (biogás) e recuperação

de matéria orgânica estabilizada em forma de composto. Por outro lado, os resíduos domésticos

putrescíveis, por serem muito húmidos e não terem uma estrutura definida, são preferencialmente

mais facilmente degradados anaerobiamente que por compostagem (Kubler et al, 2000). Quer do

lado económico, quer do lado ecológico, comparativamente com tecnologias de compostagem “pura”,

o processo de digestão anaeróbia pode ter menor consumo de combustíveis fósseis e menor impacte

ambiental, consequente da relativa redução de gases de efeito de estufa, comparativamente com

tecnologias de tratamento aeróbio (Edelmann et al, 2000).

Os RSU são muito variáveis quanto à sua composição, sendo uma mistura heterogénea de

macromoléculas biodegradáveis (carbohidratos, proteínas e gorduras), não biodegradáveis,

inorgânicos e inertes. A sua composição depende de vários factores tais como o estilo de vida das

populações, padrões de consumo ou nível de desenvolvimento económico e tecnológico do país

(Cheremisinoff, 2003).

A FORSU é descrita como mistura heterogénea de resíduos putrescíveis, capazes de serem

degradados por microrganismos, com um teor típico de 40% de humidade (Ferreira, 2010). A

variabilidade da sua constituição depende maioritariamente do sistema de recolha utilizado, da sua

proveniência ou efeitos de sazonalidade ao longo do ano. O teor em contaminantes, como plásticos,

Page 19: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

18

vidros, metais pesados e algumas substâncias químicas, geralmente, estão presentes em menores

quantidades em sistemas de recolhas selectivas “porta-à-porta”, apresentando uma maior qualidade

em FORSU, com baixos teores em matéria não-biodegradável (Hartmann e Ahring, 2006), tendo

influência directa na produção específica de biogás por sólidos alimentados ao digestor e na sua

qualidade em metano, devido a menores concentrações de substâncias tóxicas aos microrganismos,

não dependendo unicamente da configuração do processo utilizado para maximização da eficiência

de produção.

1.1.2 Pré-tratamentos

A aplicação de um pré-tratamento, com o intuito de remover potenciais contaminantes, e outros

agentes desestabilizadores do processo, ou de dilacerar e hidrolisar termicamente partículas de

grande dimensão, como é o caso da FORSU, pode aumentar as condições de solubilização,

melhorando as condições de biodegradação ao nível do substrato, contribuindo para que, num

determinado tempo de retenção hidráulico, a produção específica de biogás seja optimizada

(Carlsson et al, 2012). Embora se considere que com um pré-tratamento se perdem 15 a 25% de

sólidos voláteis (SV), o facto de actuar na redução da dimensão das partículas, no aumento da

superfície de contacto da matéria orgânica insolúvel biodegradável ou na remoção de partículas que

possam vir a afectar o sistema, poderá ser positivo porque potencia condições de solubilização,

acelerando a fase hidrolítica e favorecendo as condições biológicas do processo, podendo, em última

analise, permitir passar de produções típicas de 220 L CH4/kg SV para produções de 400 L CH4/kg

SV (Hartmann et al., 1999. Citado por Ferreira, 2010).

1.1.3 Principais tecnologias aplicadas

Para processos cujo design é realizado por via seca e semi-seca, existem no mercado pelo menos

três que se mostraram eficazes na produção de biogás (Figura 4).

O reactor da tecnologia Dranco (“Dry anaerobic Composting”) é tubular com um escoamento em

pistão vertical e pode ser aplicado em regime mesófilo e termófilo, sendo que a mistura dentro do

reactor é promovida pela recirculação do digerido, extraído do fundo do reactor e misturado com

resíduo fresco, sendo bombeado para o topo. Este simples design é eficiente para tratamentos de

resíduos com um teor de ST de 20 a 50% com tempos de retenção de 12 a 18 dias. O reactor da

tecnologia da Kompogas é semelhante à da Dranco mas com escoamento em pistão horizontal,

aplicado em regime termófilo, descontinuo e com recirculação de inóculo.

No reactor da tecnologia Valorga, de design diferente dos anteriores sistemas em escoamento pistão

linear, os resíduos alimentados são transportados de forma circular num reactor cilíndrico cuja mistura

ocorre por injecção de biogás em alta pressão no fundo do reactor a cada 15 min (Vandevivere et al,

2002; Ferreira, 2010)

Page 20: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

19

Figura 4. Esquemas de processos por via seca e semi-seca comercializados pela Dranco (à esquerda), Kompogas (centro) e Valorga (à direita). (Fonte: Vandevivere et al, 2002).

Figura 5. Esquema típico do processo por via húmida e fase única (Vandevivere et al, 2002).

O processo de digestão anaeróbia por via húmida (Figura 5) é precedido por um pré-tratamento

designado pulping, onde é adicionada água para facilitar a hidrólise e transporte do resíduo para o

digestor, de uma ou duas fases, por forma a se proceder à biometanização e a mistura da suspensão

dentro do digestor, é promovida por sistemas mecânicos ou de bolhas de biogás tornando o processo

essencialmente automático. Neste tipo de tecnologia estão incluidos os processos comercializados

pela BTA e Linde-KCA (R.W.Beck, 2004).

1.1.4 Descrição do processo da CVO da Valorlis e da CVO da Suldouro

O processo industrial de produção de biogás nas Centrais de Valorização Orgânica (CVO) da Valorlis

e Suldouro, esquematizado na Figura 6, é realizado em regime mesófilo e por via húmida (5 %ST).

Esta tecnologia, é dividida em três etapas. Numa primeira fase, o resíduo putrescível é separado a

seco num crivo rotativo de 80mm e armazenado num contentor denominado “bunker”. Ambas as

Page 21: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

20

fracções sofrem uma valorização de metais sendo a fracção de maior diâmetro encaminhada para um

sistema de triagem para recuperação de plásticos. A fracção de menor diâmetro segue para a

segunda etapa, patenteada pela BTA®

Technology, onde ocorre uma remoção, por via húmida, de

leves (plásticos e gorduras) e pesados (materiais grosseiros e areias) num sistema sequencial de

Pulpers restando uma suspensão aquosa que é posteriormente transferida para um sistema de

remoção de areias que se encontrem em suspensão (GRS-Grit Removal System) formando uma

suspensão de resíduo putrescível, desintegrado maioritariamente de forma mecânica e com um teor

de sólidos na ordem dos 5%. Antes de ser alimentado, em paralelo, aos dois digestores com um

volume de 2000 m3

cada, a suspensão é espessada até cerca de 10%ST e armazenada num tanque

arejado com um volume de 500m3.

Figura 6. Esquema do processo de produção de biogás da CVO da Valorlis

1.1.5 Etapas de processo microbiológico e bioquímico

O processo de degradação anaeróbio (Figura 7) é complexo e depende do substrato utilizado, dada

as diversas cinéticas de formação e consumo de intermediários de reacção. Os compostos são

bioconvertidos por um consórcio de bactérias quimioheterotróficas sensíveis ou até mesmo inibido

pela presença de oxigénio. (Botheju e Bakke, 2011).

De forma genérica, na primeira etapa degradativa, a matéria orgânica pode ser dividida, de modo

grosseiro, em dois grandes grupos, de baixa e alta biodegradabilidade. A de baixa biodegradabilidade

é constituída essencialmente por macromoléculas aminadas, lípidos e polímeros de carbohidratos

(celulose, hemicelulose e lenhina) e hidrolisados a compostos mais simples e de maior

biodegradabilidade como aminoácidos, ácidos gordos de cadeia longa e açúcares, numa primeira

etapa do processo de digestão anaeróbia. Na etapa degradativa seguinte, na acidogénese, estes

compostos são fermentados por bactérias produtoras de ácidos orgânicos a ácidos de cadeia curta

Page 22: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

21

sendo posteriormente consumidos, durante a etapa denominada acetogénese, tendo como produtos

acetatos, dióxido de carbono e hidrogénio os quais são transformados, durante a metanogénese, em

metano e dióxido de carbono (Berardino, 2006).

Figura 7. Esquema do processo de digestão anaeróbia

Todavia verifica-se que os diversos grupos de microrganismos especializados que interferem no

processo manifestam-se de forma ecológica formando um ecossistema simbiótico heterogéneo e com

forte interdependência em que todos os produtos de uma fase metabólica anterior são convertidos

para a fase seguinte (Ferreira, 2010). Por outro lado, a diversidade de produtos metabólicos,

consequentes de diferentes caminhos degradativos da matéria orgânica, dependem do tipo de

microrganismos activos, das condições operatórias e da termodinâmica das reacções de fermentação

anaeróbia (Gerardi, 2003).

1.1.5.1 Hidrólise e acidogénese/fermentativa

A hidrólise corresponde à primeira fase da degradação anaeróbia da matéria orgânica. Nesta fase

substâncias poliméricas, como carbohidratos, proteínas e lípidos, insolúveis e de elevado peso

molecular, são fragmentadas das suas ligações covalentes nos seus monómeros correspondentes

(açúcares, aminoácidos e ácidos gordos de cadeia longa, respectivamente) por exoenzimas (lipases,

celulases, proteases, peptidases, etc) excretadas por bactérias hidrolíticas ou anaeróbias facultativas

de forma a poderem atravessar a membrana celular. Por outro lado, o consumo do oxigénio existente

do meio possibilita baixar o potencial redox (Eh), necessário para o metabolismo das bactérias

anaeróbias obrigatórias.

Após a “liquefacção” da matéria orgânica complexa, os monómeros formados são consumidos por

diferentes bactérias anaeróbias facultativas e obrigatórias durante a fase de acidogénese

transformando-se em ácidos gordos de cadeia curta (C1-C5), como ácido butírico, propiónico e

acético, álcoois, hidrogénio e dióxido de carbono (Tabela 2).

Page 23: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

22

Tabela 2. Exemplos de produtos de fermentação de glucose e amina (adaptado de Boe (2000)).

Acidogénese Equações Simplificadas

Acetato

Acetato*

Propionato + acetato

Butirato

Lactate

Etanol

*- degradação de aminoácidos (Gerardi, 2003)

1.1.5.2 Acetogénese

Os produtos metabólicos da fase acidogénica servem como substratos a outro grupo de bactérias que

os transformam em moléculas de menor peso molecular, mais propriamente em acetato, hidrogénio e

dióxido de carbono, por acção de bactérias homoacetogénicas e de bactérias produtoras obrigatórias

de hidrogénio (APOH). Do ponto de vista termodinâmico, as transformações acetogénicas realizadas

pelas APOH são desfavoráveis em condições normais (Tabela 3), tornando-se exergónicas para

concentrações de hidrogénio na ordem inferior de 10-4

atm (Alves e Mota, 2007; Gerardi, 2003), como

é visível na Figura 8, permitindo o consumo de ácidos de peso molecular elevado, como propiónico e

butírico, não degradados por bactérias produtoras de metano.

Figura 8. Influência da pressão parcial de hidrogénio na energia livre de Gibbs, durante a acetogénese e

formação de metano. Zona viável de produção de metano na área a verde. Ácido acético, 25mM; Propiónico, Butírico, láctico e etanol,10mM; Sulfito, 5mM; Bicarbonato, 20mM; Metano, 0,7atm

(Adaptado de Di-Berardino, 2006)

1- Oxidação do ácido propiónico a acético

2- Oxidação do ácido butírico a acético

3- Etanol a ácido acético

4- Ácido láctico a acético

5- Respiração acetogénica do bicarbonato

(CO2)

6- Respiração metanogénica do bicarbonato

(CO2)

7- Respiração do sulfato a sulfídrico

8- Respiração do sulfito a sulfídrico

9- Conversão do ácido acético pelas

metanogénica

10- Conversão do ácido acético regulado

pelas sulfato-redutoras

Page 24: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

23

Tabela 3. Energia livre de algumas reacções da acetogénese (Adaptado de Berardino (2006))

Acetogénese Equações Simplificadas ΔGº(kJ/mole)

Etanol + 9,6

Propionato + 76,1

Butirato ( ) + 48

O processo de regulação da pressão parcial de hidrogénio é feito através da associação sintrófica

das bactérias metanogénicas utilizadoras de hidrogénio, designadas hidrogenofílicas, com as APOH

(Tabela 4) de forma a manter os valores de hidrogénio baixos (Coombs, 1990; Berardino, 2006;

Ferreira, 2010). Aproximadamente 30% do metano produzido é atribuído à redução do CO2 pelo H2,

mas apena 5-6% deve-se ao H2 dissolvido.

O fenómeno da eliminação de hidrogénio do meio reaccional pode ser explicado pela associação

sintrófica de transferência de hidrogénio entre os grupos de microrganismos sem que haja dissolução

no meio (Deublein e Steinhauser, 2008).

Tabela 4. Reacções de associações sintróficas de bactérias (adaptado de Ferreira (2010)).

APOH +

Metanogénica

Equações Simplificadas ΔGº(kJ/mole)

Etanol

-116.2

Lactate

-143.4

Butirato

-39.3

Proprionato

-102.4

1.1.5.3 Metanogénese

A metanogénese corresponde à quarta e última etapa da digestão anaeróbia onde maioritariamente

acetato, hidrogénio e dióxido de carbono são transformados em metano e dióxido de carbono por

bactérias anaeróbias obrigatórias (Tabela 5). Por outro lado, ao captarem estes compostos previnem

a acumulação de ácidos e consequente “consumo” de alcalinidade, que poderiam conduzir a uma

diminuição do pH e aumento da pressão parcial de hidrogénio.

As bactérias produtoras de metano levam a cabo a etapa final do processo de decomposição da

matéria orgânica e estabelecem a cadeia final de transferência de electrões entre dadores e

Page 25: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

24

receptores (Gerardi, 2003), influenciando fortemente todo o processo de digestão anaeróbia,

condicionando a termodinâmica das reacções bioquímicas das etapas anteriores (Berardino, 2006).

Devido à grande sensibilidade ao oxigénio, capaz de originar a morte destas bactérias, de forma a

manter o normal funcionamento metabólico e condições favoráveis à formação de acetato, o potencia

redox necessita de ser menor que -300 mV.

Tabela 5. Energia livre de algumas reacções da metanogénese (Adaptado de Berardino (2006))

Metanogénese Equações Simplificadas ΔGº(kJ/mole)

Acetoclástica -31

Hidrogénofilica -135,6 (33,9)

Metanol

-102,5

Metilamina -101,6

Devido ao facto de bactérias produtoras de metano se reproduzirem muito lentamente (Ahring, 2003),

na ordem dos 3 a 30 dias e produzirem reduzidas quantidade de lamas, estas necessitam de poucos

nutrientes para o seu crescimento, mas em termos de micronutrientes como cobalto, ferro, níquel e

enxofre necessitam de duas a cinco vezes mais que a maioria dos microrganismos (Garardi, 2006).

As bactérias metanogénicas são mais sensíveis que as bactérias hidrolíticas e acidogénicas a

elevadas concentrações de ácidos gordos voláteis (AGV) com consequente redução do pH. Caso

ocorram efeitos desestabilizadores, como a súbita alteração do pH ou temperatura, o custo de

recuperação dos níveis estacionários pode ser elevado dado que as alterações ambientais diminuem

a actividade das espécies de microrganismos aclimatizados e aumentam a competição inter-espécies

podendo alterar os caminhos fermentativos existentes e consequente quantidade e qualidade do

biogás final.

1.1.5.4 Inibições e efeitos Tóxicos

A inibição é a consequência da diminuição de actividade ou até mesmo morte de um microrganismo

devida à presença de compostos tóxicos no ambiente. O caso mais comum de inibição do processo

de digestão anaeróbia é a acumulação de ácidos gordos voláteis e amónia dentro do reactor. Outros

inibidores menos comuns, como ácido sulfídrico, metais alcalino e alcalino-terrosos e outros metais

pesados como, crómio, níquel, zinco e cobre, são apontados na bibliografia como possíveis

causadores de instabilidade e falhas de sistemas de tratamento anaeróbio.

1.1.5.4.1 Inibições de ácidos Gordos Voláteis

Os ácidos orgânicos, produzidos durante a digestão anaeróbia e imprescindíveis para a produção de

metano, variam nas suas características químicas, principalmente no comprimento da cadeia de

carbonos. As cadeias curtas volatilizam com relativa facilidade à pressão atmosférica, sendo

denominados ácidos orgânicos voláteis. Aproximadamente 85% da totalidade dos ácidos existentes

Page 26: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

25

no caldo físico-químico é composta por ácido acético (C2) sendo os restantes maioritariamente

constituídos por ácido propiónico (C3), butírico (C4), valérico (C5) e capriónico (C6). Estes últimos,

devido ao seu peso molecular, não são degradados pelas bactérias metanogénicas acumulando-se

caso não sejam degradados a cadeias mais simples (Gerardi, 2003).

A acumulação de ácidos no digestor, consequente muitas vezes de desequilíbrios metabólicos, tem

um grande impacte na alcalinidade, pH e na sua forma desionizada. Estes ácidos podem penetrar

facilmente pela membrana celular e induzir a redução do pH interno, provocando um decréscimo da

velocidade metabólica ou a morte celular (Berardino, 2006; Deublein e Steinhauser, 2008).

A inibição dos ácidos orgânicos voláteis é intensificada pelo pH e quanto maior a concentração maior

é o efeito de inibição potencial na biomassa (Figura 9). De forma a minimizar a inibição, é importante

manter a concentração de ácido voláteis baixas, menores que 2g/l de acetato (McCarty e McKinney,

1961) e em valores de pH na ordem de 7,5, no máximo até 6 g/l.

Figura 9. Inibição do ácido acético em função do pH. (Fonte: Deublein e Steinhauser, 2008)

1.1.5.4.2 Inibições por amónia

A amónia livre encontra-se em equilíbrio com o ião amónio e ambos inibem a digestão anaeróbia,

sendo que a primeira exerce um efeito tóxico em concentrações muito mais baixas. Este equilíbrio

depende fortemente do pH (Figura 14). A fracção de amónia a pH=7 é de 1% da concentração total e

10% a pH=8, sendo termodinamicamente favorável para pH básico.

De entre os 4 grupos de biomassa existente no processo de digestão anaeróbia, é globalmente aceite

que as metanogénicas são as mais sensíveis a valores elevados de amónia livre (Gerardi, 2003;

Deublein e Steinhauser, 2008). Concentrações totais de amónia de 1,5 a 3 g/l podem ser toleradas,

Page 27: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

26

como descrito por McCarty (1964), mas na bibliografia é apontada uma gama considerável de valores

onde a produção de metano foi reduzida em 50%, para valores na ordem de 1,7 a 14 g/L, indicando

uma dependência externa como tipo de substrato, inóculo, condições ambientais (temperatura, pH) e

tempos de aclimatização (Chen et al., 2008).

1.1.6 Condições operatórias

A produção de metano depende de vários factores como a composição do substrato, tamanho das

partículas, proporção de compostos existentes, degradabilidade da matéria e relação entre os

nutrientes essenciais. Para além das características intrínsecas do substrato, existem outras variáveis

não menos importantes a ter em conta de forma a manter o processo estável, como as descritas na

Tabela 6 e outras como a velocidade das etapas de processo, tempo de retenção hidráulico e de

sólidos, carga orgânica e grau de mistura (Deublein e Steinhauser, 2008).

Tabela 6. Condições ambientais óptimas para digestão anaeróbia. (adaptado de Deublein e Steinhauser (2008)).

Parâmetros Hidrólise/Acidogénese Formação de Metano

Temperatura 25-35 ºC Mesofílo:32-42ºC/ Termofílo:50-58ºC

pH 5,2-6,3 6,7-7,5

Rácio C:N 10:1 – 45:1 20:1 – 30:1

%ST <40 <30

Eh +400 a -300mV <-300 mV

1.1.6.1 Carga orgânica

A carga orgânica (C.Org) máxima mede a capacidade do consórcio microbiano em converter os

substratos nos correspondentes produtos e é definida como o quociente entre o caudal mássico de

sólidos biodegradáveis alimentados e o volume de reactor. Este caudal mássico é determinado pelo

caudal volumétrico da alimentação e pela sua concentração em sólidos biodegradáveis, sendo

expressa em unidade de CQO/m3 ou SV/m

3, tal como expresso na equação A.II.3 (vide Anexo A.II).

Comparativamente com tecnologias de degradação aeróbia, a C.Org na entrada do reactor é baixa e

raramente ultrapassa valores na gama de 1-4 KgSV/dia em sistemas por via húmida (Figura 10). Esta

limitação deve-se principalmente ao efeito de inibição resultante da acumulação de AGV’s,

consequente da baixa velocidade de crescimento das bactérias metanogénicas. Apesar de em

sistemas por via semi-seca e seca serem exequíveis C.Org na gama de 7-15 KgSV/dia, sem

acidificação excessiva, as eficiências de produção de metano e de remoção de SV apresentam

valores menores na ordem de 140- 314 mL/gSV e 31-48%, respectivamente (Nagao et al., 2012).

Page 28: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

27

Figura 10. Relação entre a carga orgânica e a produção de biogás em m3/ t SV, (MT-metric tonne) (Hartmann e

Ahring, 2006), para diferentes gamas de temperatura, concentração de sólidos e pré-tratamentos, relativo à FORSU (OFMSW)

1.1.6.2 Biodegradabilidade

A digestão anaeróbia pode ser usada para degradar uma vasta gama de resíduos biologicamente

degradáveis cuja maioria pode ser dividida em cinco categorias; FORSU, resíduos orgânicos

provenientes da indústria alimentar, resíduos agrícolas, chorume e estrumes e lamas provenientes de

estações de tratamento de águas residuais (Carlsson M. et al, 2012).

As velocidades de degradação dos diferentes compostos orgânicos complexos podem ser muito

distintas. Por exemplo, a taxa de degradação da celulose pode demorar semanas sendo que a da

hemicelulose e proteínas é mais rápida, podendo demorar alguns dias, e a degradação de pequenas

moléculas como açúcares, ácidos orgânicos voláteis e álcoois é ainda mais rápida, podendo demorar

algumas horas (Coombs, 1990). Compostos presentes em resíduos vegetais, como a lenhina, não

são degradados pela maioria dos sistemas de digestão anaeróbia necessitando de tempo de

retenção na ordem dos 250 dias (Benner, 1984).

Vários estudos têm sido realizados sobre a influência da composição dos substratos, como a relação

inversa entre o teor em lenhina e celulose e a biodegradabilidade do substrato (Figura 11)

determinada por Buffiere et al. (2006), tendo sido modelada por Chandler et al. (1980).

Page 29: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

28

Figura 11. Relação inversa entre o teor em lenhina e celulose e a biodegradabilidade (%), da matéria orgânica (Buffiere et al., (2006))

Substratos como jornais, dejectos de animais, palha, folhas e outros resíduos agrícolas foram

utilizados para o estabelecimento da equação (1), com um coeficiente de correlação de 0,94:

( ) (1)

Em que

BD, é a fracção biodegradável dos SV (0 <BD <1);

, o teor inicial em lenhina, em %SV, (0 < <20%).

Por outro lado devido à grande variabilidade no tempo dos substratos, a produção e qualidade do

biogás raramente se mantém constante pois, como referido por Chandra et al. (2012), os rendimentos

de produção de biogás específica de carbohidratos, lípidos e proteínas apresentam valores na ordem

de 886L/ SVremov (com 50% de CH4), 1535l SVremov (com 70% de CH4) e 587 L/SVremov (com 84% de

CH4), respectivamente.

1.1.6.3 Razão C:N

É globalmente aceite que a relação entre a quantidade de carbono e azoto presente na matéria

orgânica é óptima entre 20 e 30, com base no carbono biodegradável. Altos valores de C:N indicam

uma deficiência em azoto, diminuindo a formação de nova biomassa, normalmente em concentrações

de amónia abaixo de 200 mg/L (McCarty, 1964; Che et al., 2008). Caso ocorra valores baixos de C:N

verifica-se que a degradação da matéria orgânica leva à produção excessiva de amónia, inibindo a

biomassa metanogénica, com consequente diminuição de produção de metano e possível

acumulação de AGV (Che et al., 2008).

1.1.6.4 Teor em sólidos e Tamanho das Partículas

O teor de sólidos é considerado um dos parâmetros fundamentais no dimensionamento de um

digestor pois permitem optimizar custos por redução do volume do reactor e de consumos de água

fresca. No mercado existem três tipos de gamas dominantes para o processamento de FORSU sendo

estas caracterizadas por via: húmida (6 a 10%ST); semi-seca (10 a 20%ST); e seca (>20%ST). Para

Page 30: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

29

tecnologias por via húmida, os factores de diluição extremos exercem importantes problemas

operatórios dado que suspensões muito diluídas promovem o assentamento de partículas sólidas no

fundo do digestor. Por outro lado, acima de 10% ST, a eficiência de transferência de massa

líquido/gás é comprometida nas zonas mais baixas do reactor (Carlsson et al., 2012). Mas, ao

contrário dos métodos de tratamento por via seca, em sistemas por via húmida podem ser atingidas

maiores taxas de metanogénese devido ao elevado fluxo de transferência de ácidos produzidos

durante a acidogénese e acetogénese conduzindo simultaneamente a elevadas eficiências de

remoção de sólidos e altas produções específicas de metano (Nagao et al., 2012).

1.1.6.5 Mistura

A mistura permite o aumento da homogeneidade dos constituintes do meio, como a biomassa,

substrato e outros nutrientes, e equalização da temperatura no volume do reactor através do aumento

mecânico dos fluxos convectivos e difusivos. Desta forma o contacto biomassa/substrato é maior

tornando os processos degradativos mais rápidos permitindo tempos de retenção mais baixos e

diluição dos efeitos de inibição locais. Por outro lado, impede que, no caso de um reactor de fase

líquida, materiais inertes e aglomerados de biomassa precipitem no fundo do reactor causando uma

menor eficiência de transferência de massa.

1.1.6.6 Temperatura

A temperatura, tal como o pH, exerce uma influência enorme na eficiência do processo de digestão

anaeróbia dado que a variação de apenas alguns graus num curto espaço de tempo afecta de forma

global a actividade biológica (Figura 12).

Figura 12. Taxa de crescimento relativa dos microrganismos psicrófilos, mesofílicos e termofílicos (adaptado de Schӧn (2009))

Por outro lado, dada a grande diversidade de estirpes microbianas, existem diversas gamas de

temperatura óptimas sendo que, para os processos anaeróbios, normalmente são consideradas três

gamas de temperatura: psicrófila (<20ºC); mesófila (20 e 45ºC); e termófila (>45ºC). As bactérias

metanogénicas apresentam um crescimento máximo na gama mesófila, para temperaturas entre 30 e

38ºC, e na gama termófila, entre 49 e 47ºC (Alves e Mota, 2007), com uma variação máxima diária de

2-3ºC e 1ºC, respectivamente (Garardi, 2003).

Page 31: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

30

Assim, de forma a manter uma produção estacionária de metano, é necessário que o reactor opere a

uma dada temperatura uniforme de forma a prevenir instabilidades prejudiciais a longo prazo.

1.2 Variáveis de monitorização

As variáveis usadas na monitorização do processo de digestão anaeróbia são usadas na maioria dos

processos biotecnológicos ou químicos sendo as mais relevantes a alcalinidade, caudal de gás, pH,

Eh, concentração de hidrogénio, ácido sulfídrico e metano e ácidos orgânicos voláteis (Spanjers e

Lier, 2006). Outras variáveis não menos importantes, como a carência química (CQO) e carbono

iónico total (TOC), sólidos suspensos totais (SST) e voláteis (SSV) e caudais volumétricos,

possibilitam construir um conjunto de indicadores, como eficiências de remoção de sólidos e

produção específica do produto de interesse, como é o caso do metano.

1.2.1 Indicadores de controlo

A optimização do desempenho da digestão anaeróbia passa pela avaliação da carga orgânica

máxima a alimentar aos digestores, ou seja, a massa de sólidos biodegradáveis que entra no reactor

por unidade de tempo e por unidade de volume de reactor, a taxa de produção de biogás, o

rendimento de produção de metano, ou volume de gás por unidade de massa de sólidos degradados

e pela eficiência de remoção de sólidos do digestor, como descritas nas equações AII.3, AII.4, AII.5 e

AII.6, respectivamente (vide Anexo A.II).

1.2.1.1 Caudal, rendimento de produção e composição de biogás

O caudal de biogás, mais especificamente o metano produzido, constitui um bom indicador do estado

metabólico da digestão anaeróbia permitindo avaliar de forma global o desempenho do processo

como, por exemplo, caso a produção de metano baixe aquando da ocorrência de inibição por

acumulação de AGV na fase líquida. Todavia, o uso isolado deste indicador mostra-se insuficiente na

determinação de ocorrências de falha (Moletta, 1998) pois não indica de forma eficaz a origem da

perturbação.

Em sistemas por via húmida (<5%ST) foram atingidos, segundo a bibliografia, rendimentos de

produção de metano na ordem de 364–489 L/kgSV e eficiências de remoção na ordem dos 83-91%

para resíduos de alta biodegradabilidade (Cho et al., 1995; Heo et al., 2004; Raposo et al.,2011) e

taxas de produção entre 1-5 m3/ m

3react/dia (Coombs, 1990).

1.2.1.2 Tempo de retenção hidráulico e de biomassa microbiana

O tempo de retenção hidráulico (TRH) é também um dos factores que interfere no processo biológico

e que mais directamente condiciona o funcionamento dos reactores anaeróbios. Por outro lado,

condiciona igualmente aspectos construtivos, nomeadamente a concepção tridimensional do reactor.

O TRH é o tempo médio em que o fluxo líquido afluente fica retido no sistema, sendo a razão entre o

volume útil do reactor e o caudal afluente, sendo equacionada unicamente para sistemas líquidos

(Ferreira, 2010). Por outro lado, o tempo de retenção de biomassa (TRS) decorre da capacidade do

Page 32: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

31

reactor, através de meios mecânicos e físicos, de reter a biomassa microbiana e substrato por

períodos maiores que o TRH sem provocar zonas mortas ou caminhos preferenciais dentro do reactor

sendo uma variável da extensão das reacções que ocorrem no digestor (Figura 13).

Figura 13. Produção de biogás, em unidades de volume de gás por SV vs. TRS, onde a relação entre C.Org e rendimento em biogás é Y=0,84-0,072xC.Org, para regimes termófilos por via húmida e teor de SVinput de

5%=50kg/m3 Hartmann H., Ahring B.K. (2006).

No caso da digestão anaeróbia por via seca, dado que os substratos contêm elevados teores de

sólidos (30%), verifica-se praticamente sempre a relação TRH=TRS uma vez que a quantidade de

afluxo de H2O é muito baixa.

O tempo de retenção necessário para que ocorra a decomposição anaeróbia nos reactores varia com

as diferentes tecnologias, temperaturas do processo e composição dos resíduos. O tempo de

retenção para o tratamento de resíduos em processos mesofílicos e termofílicos varia de 10 a 40 dias

e nas zonas termofílicas são requeridos menores TRH. Reactores com alta taxa de sólidos operando

em condições termófilas têm normalmente um TRH de 14 dias.

1.2.1.3 Características da matéria orgânica

A matéria orgânica ou o teor de SV, em resíduos sólidos, é quantificado pelo resultado da subtracção

das cinzas obtidas após combustão completa dos resíduos aos ST secos a 105ºC (vide Anexo A.I).

Os SV podem ser subdivididos em sólidos voláteis biodegradáveis (SVB) e sólidos voláteis

refractários (SVR). O conhecimento da fracção de SVB ajuda na melhor definição da

biodegradabilidade do resíduo em estudo, da produção de biogás, da carga orgânica a fornecer ao

sistema e da relação C/N (Reichert, 2004).

Apesar do aumento do teor em sólidos indicar uma maior disponibilidade de matéria orgânica residual

disponível para a valorização energética, a diminuição de água no processo biológico pode, no limite,

conduzir à instabilidade e até inibição (Ferreira, 2010). Por outro lado, o crescimento específico da

biomassa metanogénica aumenta linearmente com um factor de 3,5, para valores de humidade entre

65 a 82%, correspondente 35 a 18 %ST (Guendouz et al., 2012).

Page 33: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

32

1.2.2 Indicadores de estabilidade

A metodologia da monitorização tem como base a criação de indicadores de fácil medição que melhor

reflictam o estado comportamental do reactor e cujas unidades funcionais sejam de fácil

compreensão e universais de forma a serem comparados com valores da bibliografia.

Tal como descrito por McCary (1964), devido à grande variabilidade de fenómenos que ocorrem no

digestor, os indicadores de estabilidade e controlo não podem ser avaliados de forma independente

mas sim de forma uníssona de modo a compreender a tendência da complexa dinâmica do processo.

1.2.2.1 pH

A concentração de protões de uma solução, ou seja, o seu pH, afecta os processos de conversão

microbiana directamente afectando a actividade enzimática, por alterar a estrutura das proteínas e

indirectamente, a toxicidade dos ácidos voláteis, azoto amoniacal, sulfureto de hidrogénio ou a

disponibilidade de nutrientes, que se torna muito baixo para pH superiores a 8,3 (Figura 14).

A actividade dos grupos de microrganismos intervenientes apresentam sensibilidades diferentes ao

pH podendo classificar-se de acordo com a Tabela 7.

Tabela 7. pH óptimo em diversos grupos de bactérias intervenientes no processo de digestão anaeróbia (adaptado de Berardino (2006))

Grupo Bacteriano pH

óptimo

Hidrolíticas 7,2-7,4

Acidogénicas ±6

Acetogénicas 7,0-7,2

Metanogénicas 6,5-7,5

Redutoras de Sulfatos 7,3-7,6

Em tecnologias onde o processo é realizado num único reactor a digestão anaeróbia dá-se numa

gama óptima de pH de 6,8 a 7,2. No caso de reactores de duas fases, na fase de hidrólise e

fermentação o pH óptimo ronda o intervalo entre 5 e 6,5 e na fase acetogénica e metanogénica 6,8 e

7,4.

A utilização isolada do pH como indicador de estabilidade pode revelar-se pouco sensível a

variações de acumulações de ácidos caso a capacidade tampão seja suficiente para neutralizar os

ácidos produzidos produzindo variações de pH muito lentas e tardias (Boe et al., 2010) sendo útil

muitas vezes a monitorização cruzada entre o pH, teor de CO2 no gás e a alcalinidade, dada a sua

forte interdependência, de forma a maximizar a performance dos digestores.

Page 34: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

33

Figura 14. Fracções dissociadas e protonadas da amónia, ácido sulfídrico, dióxido de carbono e ácido acético em função do valor de pH. As constantes de equilíbrio e equações químicas usadas para a realização deste

gráfico, encontram-se no anexo A.III.

1.2.2.2 Indicador de acidez e alcalinidade

Em termos de estabilidade, o rácio de ácidos gordos voláteis e alcalinidade (AGV/ALC) é considerado

um satisfatório indicador pois permite avaliar a tamponização do sistema e indica a proporção relativa

dos componentes que interferem no pH. A alcalinidade representa a capacidade do reactor

neutralizar ácidos formados durante a digestão ou presente no substrato que entra no reactor. A

acumulação de AGV reflecte a cinética da produção e consumo destes intermediários por parte da

biomassa acidogénica/acetogénica e metanogénica. A acumulação de ácidos tem como

consequência problemas como a diminuição da capacidade tampão com consequente diminuição do

pH.

O AGV/ALC é expresso em equivalentes de ácido acético/equivalentes de carbonado de cálcio,

medido com base em técnicas titulométricas (Weichgrebe, 2007). Este indicador expressa o nível de

risco do digestor em acidificar tendo uma gama de baixo risco de igual a 0,1 a 0,4. Valores acima do

limite máximo indicam que o processo é instável devido ao elevado consumo de alcalinidade por

parte dos ácidos e risco de inibição de produção de metano. Contudo, não permite prever o período

haverá falha do processo, sendo uma análise tardia, sendo apenas aplicável quando a concentração

de ácidos se encontra abaixo da gama de inibição.

Por outro lado, foi possível verificar que a gama de baixo risco coincide com a gama de pH para o

qual o processo é considerado estável, entre 6.8 e 7.2, como anteriormente referido, para os

reactores de fase única, como ilustrado na Figura 15.

Page 35: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

34

Figura 15. Variação do pH e da Alcalinidade em função dos AGV (adaptado de Cecchi, 2005). Representação da zona de baixo risco, a vermelho, com base no indicador de AGV/ALC e a gama de pH para o qual o processo é

estável, representado a azul, no eixo do pH.

1.2.2.3 Relação pH, CO2 na fase gasosa e Alcalinidade

Uma forma alternativa de análise da estabilidade de um reactor é a relação entre o teor em CO2 na

fase gasosa, o pH e a alcalinidade. O teor em CO2 no biogás e o pH do meio estão inter-relacionados

(Hansson et al., 2002), como ilustrado na Figura 16, pois as fases líquida e gasosa do CO2 estão em

equilíbrio sendo que quando se verifica um aumento do teor em ácidos o ião bicarbonato reage com

os ácidos provocando a formação e passagem de CO2 para a fase gasosa de modo a restabelecer o

equilíbrio (Di Berardino, 2006).

Figura 16. Interdependência entre o pH, o teor em CO2 no gás e a Alcalinidade, a 35ºC (EPA, 1979).

Page 36: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

35

1.2.2.4 Pressão parcial de hidrogénio

A pressão parcial de hidrogénio dissolvido é considerada um indicador muito sensível à instabilidade

entre os diferentes grupos de microrganismos pois tem uma relação linear com a acumulação de AGV

em condições de cargas orgânicas bruscas.

Figura 17. Taxas relativas de formação de ácidos: acético, propiónico e butírico, em função da concentração de hidrogénio (Gerber e Span, 2008)

Switzenbaum et al., 1990, verificou que o indicador de pressão parcial de hidrogénio é limitado

quando avaliado de forma isolada pois, apesar de a concentração de hidrogénio indicar com

antecedência uma possível acidificação do processo, não permite avaliar a causa da destabilização

do processo.

1.2.2.5 Potencial Redox

O Eh constitui um indicador muito importante do estado da digestão anaeróbia e da termodinâmica

das reacções que ocorrem no meio pois exprime a capacidade de uma molécula receber ou doar

electrões (Gerardi, 2003) possibilitando identificar rapidamente qual o tipo de reacções dominantes

(Tabela 8).

Tabela 8. Potencial de oxidação redução e respiração (adaptado de Gerardi, 2003)

Tipo de respiração Molécula final da cadeia de electrões Eh (mV)

Aeróbia ou oxida >50

Anaeróbia ou anóxica +50 a -50

Anaeróbia ou redução-sulfato <-400

Anaeróbia ou fementação de ácido e alcoóis <-100

Anaeróbia ou produção de metano ( ) <-300

Page 37: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

36

A sua alteração antecipa a acumulação de ácidos e a variação do pH constituindo o indicador com a

resposta mais rápida para o controlo do comportamento do processo (Berardino, 2006).

1.2.3 Modelos matemáticos de digestão anaeróbia

Na bibliografia os modelos existentes variam muito respectivamente ao seu objectivo e complexidade

desde de modelos simples, como os de Buswell e Mueller (1952), Boyle (1976) (vide equação 2)

desenvolvidos exclusivamente para o cálculo da produção máxima de biogás com base nas

características teóricas do substrato orgânico, ou modelos, como o de Keymer e Schilcher (2003) e

Amon et al. (2007), comparativamente simples de cálculo da produção de biogás incluindo taxas de

degradabilidade de diferentes componentes do substrato, pois nem todas têm as mesma taxas de

conversão, como é o caso da lignina que tem uma taxa de conversão considerada nula para os

tempos de retenção usuais. Este tipo de modelos não permite um controlo dinâmico existindo assim

modelos complexos que incluem cinéticas de crescimento microbiano e sua interacção com

condições externas.

SeHdNHCOedcba

CHedcba

OHedcb

aSNOHC edcba

2324

2

48

3

48248

3

482

24

3

24

(2)

Com a inclusão de cinéticas de crescimento, a actividade microbiana proporciona uma maior

variabilidade tendencial do modelo para uma previsão mais aproximada aos valores reais de

produção quer dos diferentes intermediários da reacção quer de biogás e qualidade em metano tendo

importantes implicações nas decisões estratégicas, como alterações de condições operatórias devido

a perturbações ou tentativas de optimização de produção.

De forma a compreender o crescimento dos microrganismos, Monod (1949) determinou e dividiu o

ciclo de vida do microganismo em 6 fases distintas como mostra a Figura 18 e definiu o crescimento

microbiano na fase de estacionária, com base na seguinte equação:

(3)

em que:

⁄ - taxa de crescimento da biomassa X limitado a um substrato, S (kg.kg-1

.d-1

)

- taxa de crescimento máximo específico da biomassa X (d-1

)

- constante de saturação para o substrato limitante S (kg. m-3

)

Page 38: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

37

Figura 18. Fases do crescimento microbiano: (1) fase de latência, adaptação a substrato; (2) fase de aceleração do crescimento; (3) fase de crescimento exponencial ou fase de crescimento de primeira ordem; (4) fase de

abrandamento (5) fase de estacionária e (6) fase de decaimento (Gerber e Span, 2008).

Nos últimos 40 anos, com o aumento do conhecimento científico, a modelação dos processos de

digestão anaeróbio tem vindo a ganhar novos adeptos sendo que metade dos modelos desenvolvidos

referem-se aos últimos 10 anos, contando até 2006 com 750 publicações (Batstone et al., 2006) dos

quais se destacam alguns mais citados na bibliografia, principalmente para estado estacionário

(Tabela 9), como o Anaerobic Digestion Model 1 (ADM1).

O ADM1 da International Water Association (IWA) Anaerobic Digestion Modelling Task Group

(Batstone et al, 2002) inclui 8 grupos de bactérias e 11 reacções. Taxas de morte, desintegração e

hidrólise são considerados como função do pH, equilíbrio iónico e equilíbrio líquido/gás. Apenas a

influência da temperatura e energia para a manutenção da célula são desprezáveis. O modelo

desenvolvido é um dos mais complexos e dos mais usados contando com 32 variáveis de estado

dinâmicas aumentando significativamente o efeito da validação. O manuseamento de equações

diferenciais ordinárias é de grande complexidade mas permite a sua aplicação em escala industrial e

metodologias de optimização de estudos científicos e controlo e operação assim como a previsão de

falhas de processo (Gerber e Span, 2008).

Page 39: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

38

Tabela 9. Alguns dos modelos cinéticos de digestão anaeróbia para a produção de biogás e principais parâmetros incluídos, em reactores homogéneos e perfeitamente agitados (SVB – sólidos voláteis biodegradáveis, XL- fracção de lípidos, XP- fracção de proteínas, HAc- acetato, HPr- propionáto, HBt- butiráto) (adaptado de Gerber e Span (2008))

Cinética Substrato Tipo de

processo Input Output Inib

Ren

dim

en

to d

e

su

bstr

ato

a p

rod

uto

Ren

dim

en

to d

e

su

bstr

ato

a

bio

massa

Ren

dim

en

to d

e

su

bstr

ato

a e

nerg

ia

Taxa d

e m

ort

e

Desin

teg

ração

Hid

róli

se

Eq

uaçõ

es

este

qu

iom

étr

icas

Gru

po

s d

e b

acté

rias

Tem

pera

tura

pH

e e

qu

ilíb

rio

ión

ico

E

qu

ilíb

rio

liq

uid

o/g

ás

Andrews & Graef,

1971

Andrews Lamas de ETAR

Estado estacionário, seco

HAc, HPr

ou HBt

CH4, CO2

HAc, HPr

ou HBt

x x - - - - 1 1 - x x

Batstone et al, 2002

Primeira ordem, Monod

n.s. Estado estacionário, seco

CQO CH4, CO2, H2, H2O

H2, NH3

x x - x x x 11 8 - x x

Bryers, 1985

Primeira ordem, Monod

Vários Batch, estado estacionário, seco

SVB CH4, CO2, H2

- x x - x - x 6 3 - x x

Chen & Hashimoto,

1978

Chen & Hashimo

Vários Estado estacionário

CQO ou SV

CH4 - x x - - - - 1 1 - - -

Hill, 1982 Andrews Resíduos animais

Estado estacionário, seco

Orgânico solúvel

CH4, CO2

AGV x x - x - x 7 5 x - -

Moletta et al, 1986

Andrews Vários Batch Glucose

eq.

CH4 AGV x x x x - - 2 2 - x -

Knobel & Lewis,

2002

Primeira ordem, Monod

Lamas Batch, estado estacionário, seco

CH, XL, XP

CH4, CO2, H2, H2S

H2,

AGV, H2S

x x - x - x 17 12 - x x

Kiely et al., 1996

Andrews FORSU, lamas

Batch Glucose

eq.

CH4, CO2, NH3

AGV,

NH3

x x x x - x 2 3 - x x

1.2.3.1 Factores de rendimento

O crescimento celular implica consumo de substratos que fornecem matéria-prima e energia para a

formação de células novas. Nas culturas de organismos anaeróbios, um determinado nutriente, S,

serve, em geral, simultaneamente de fonte de carbono e de energia. Assim, para formar uma

quantidade de biomassa, X, é consumida uma quantidade de substrato. Esta relação pode ser

expressa em termos de rendimento de consumo de substrato de acordo com a seguinte equação:

Page 40: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

39

(4)

em que:

⁄ - Coeficiente de rendimento, em g(X)/ g(S)

- taxa de crescimento da biomassa X (d-1

)

- taxa de consumo do substrato

De forma análoga, o rendimento de formação de produtos metabólicos é considerado neste modelo

associado ao crescimento da biomassa.

1.3 Objectivos do estudo

A partir de modelos e conhecimento científico existentes na bibliografia, o objectivo final deste

trabalho foi o de desenvolver um modelo matemático, com base em modelos numéricos não- lineares,

e simular com um grau de elevado pormenor os principais fenómenos físico-químicos.

O estudo realizado divide-se assim em três fases:

1. Compreensão dos fundamentos teóricos e técnicos de análise de dados;

2. Enquadramento no processo industrial de produção de biogás na Valorlis e Suldouro,

métodos laboratoriais, interpretação dos parâmetros de monitorização e controlo e estudo da

performance dos digestores;

3. Identificação, formulação e calibração de um modelo aplicado às condições operatórias à

escala industrial com simulação de um start-up.

Page 41: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

40

Page 42: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

41

2 MATERIAIS E MÉTODOS

No presente capítulo são apresentados e descritos os materiais e métodos utilizados para o

desenvolvimento do modelo matemático com base na análise e tratamento dos dados cordialmente

fornecidos pela EFACEC cujas amostras foram recolhidas e analisadas in situ durante o ano de 2011

pelos respectivos colaboradores.

2.1 Monitorização

A monitorização e controlo representam uma estratégia fulcral para a optimização da estabilidade,

máximo de rentabilidade e da eficiência do processo de digestão anaeróbia. O controlo da

degradação anaeróbia da matéria orgânica passa por assegurar o delicado balanço existente entre os

fluxos de hidrólise e metanogénese. Se as cinéticas de hidrólise e acidogénese aumentarem

consideravelmente, devido por exemplo ao aumento brusco da carga orgânica, criar-se-á um efeito de

acumulação de AGV dentro do reactor, podendo provocar uma acidificação irreversível do sistema

(Garardi, 2003; Berardino, 2006). Se, pelo contrário, a carga orgânica for baixa, não existe inibição

por excesso de substrato mas sim por falta conduzindo a produções de metano abaixo da produção

nominal (Moletta, 1998). Assim, a manutenção da produtividade estacionária depende fortemente do

constante controlo de processo através do controlo da carga orgânica e tempo de retenção de forma

a maximizar a produção dentro da gama de valores de estabilidade aconselhados na bibliografia.

2.1.1 Parâmetros experimentais de controlo do processo

De forma a optimizar o modelo para o processo de digestão anaeróbio em análise, foi necessário

proceder à monitorização dos valores experimentais tendo sido criados os indicadores estipulados no

anexo A.II e feita a identificação do período de aplicabilidade do modelo.

A monitorização do processo das centrais de valorização orgânica da Valorlis e Suldouro seguem a

metodologia usual (e.g. Spangers e Lier, 2006) em que as principais medições são o volume e a

qualidade do biogás, pH e temperatura, alcalinidade e os AGV, ST e SV de entrada e saída do

reactor e N-NH4+. Deste modo foi possível compreender os fenómenos físico-químicos ocorridos

durante o ano de 2011 através de uma análise da interdependência de todos os parâmetros.

Os valores das medições realizadas à saída dos reactores, como os ST, SV, AGV e N-NH4+, foram

usados para a calibração do modelo que, em termos teóricos, quantificam a massa dos diferentes

componentes existentes no volume útil de fase líquida e são o resultado do balanço de massa entre a

formação, consumo, entradas e saídas do reactor.

Os dados experimentais apresentados foram agrupados em intervalos de uma semana havendo em

cada grupo 3 a 5 medições, excepto para as medições de CQOs, NH4+ (vide Anexo A.IV) onde estão

compreendidas entre 1 a 3 medições. Seguidamente, os dados foram ordenados e, para cada grupo,

calculou-se o mínimo, 1ºquartil, mediana, 3º quartil e máximo e criou-se uma whisker box onde a área

a vermelho representa os valores compreendidos entre o 1ºquartil e a mediana e a verde os valores

Page 43: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

42

compreendidos entre a mediana e o 3ºquartil. As barras de erro representam os valores

compreendidos entre os quadrantes e os valores extremos.

Na Figura 19 é ilustrado o TRH, correspondente ao caudal alimentado aos dois digestores da Valorlis

calculado segundo a equação A.II.1, e à concentração de ST no Digestor 1, calculada assumindo que

1kg de suspensão é aproximadamente igual a 1 litro. Os parâmetros do Digestor 2 (vide Anexo A.IV)

não foram ilustrados dada a sua semelhança com os parâmetros do Digestor 1.

Figura 19. Variação do TRH, em dias, e da concentração de ST no digestor 1 da Valorlis, em g/l, durante o ano de 2011. (As medições do digestor 2 encontram-se no Anexo A.IV)

Figura 20. Produção de biogás e sua qualidade no digestor 1 da Valorlis, durante o ano de 2011.

0

60

120

180

240

300

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

TRH

[d

ias]

Ano 2011 - Semanas

20

28

36

44

52

60

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

ST [

g/L]

Ano 2011 - Semanas

0

0.5

1

1.5

2

2.5

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Bio

gás

[m3/d

ia]

Ano 2011 - Semanas

40

48

56

64

72

80

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Me

tan

o[%

]

Ano 2011 - Semanas

Page 44: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

43

Figura 21. Variação do pH e teor de CO2 no digestor 1 da Valorlis, durante o ano de 2011.

Figura 22. Variação da alcalinidade e ácidos orgânicos totais no digestor 1 da Valorlis, durante o ano de 2011.

2.2 Modelo cinético não-linear

A função do Engenheiro como interveniente na análise e optimização de processo requere uma dupla

capacidade de utilizar as ferramentas versáteis aprendidas durante a sua formação académica e

profissional, quer em engenharia propriamente dita quer nas ferramentas matemáticas.

2.2.1 Considerações gerais

Como mencionado anteriormente, a digestão anaeróbia é um processo bioquímico multifásico cujas

velocidades cinéticas dependem grandemente do meio reaccional, como o pH, temperatura,

condições de alimentação (substratos e intermediários de reacção) e entrada de possíveis inibidores.

Em condições dinâmicas, esta complexidade, muitas vezes, impede que o operador compreenda

efectivamente as cinéticas reaccionais que ocorrem dentro do digestor. Sem as ferramentas

conceptuais necessárias o reactor é muitas vezes considerado um sistema de “caixa negra”. O uso de

modelos matemáticos, revela-se uma ferramenta de apoio muito importante pois para além de

possibilitarem menores quantidades de dados experimentais para caracterizar, com um rigor

aceitável, os fenómenos não-lineares que ocorrem dentro do volume, permitem de igual forma avaliar

10

18

26

34

42

50

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

CO

2[%

]

Ano 2011 - Semanas

6.5

6.9

7.3

7.7

8.1

8.5

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

pH

Ano 2011 - Semanas

0

3.2

6.4

9.6

12.8

16

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

ALC

[gC

aCO

3/L

]

Ano 2011 - Semanas

0

0.6

1.2

1.8

2.4

3

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

AG

V [

gCH

3C

OO

H/L

]

Ano 2011 - Semanas

Page 45: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

44

as consequências de alterações das condições operatórias no tempo sem pôr em causa o processo

de produção de biogás contribuindo para um melhor controlo e, indirectamente, a um balanço

económico optimizado.

A análise do processo utilizando os métodos científicos, como a modelação, teve como primeira

abordagem a identificação e formulação do problema e desenvolvimento de procedimentos e critérios

para a sua solução. Para isso, procedeu-se a uma simplificação conceptual do processo onde foram

isoladas as variáveis de interesse possibilitando uma análise mais cuidada sem colocar em risco a

veracidade dos fenómenos decorrentes da produção do biogás e que garantam uma total

compreensão da problemática em questão.

Quando o processo é composto por uma sequência de reacções, a velocidade global é determinada

pela reacção mais lenta. O passo limitante na digestão anaeróbia com suspensão de matéria

orgânica é normalmente a liquefacção da matéria particulada, ou hidrólise (Vavilin et al., 2007), mas

dada a complexidade do resíduo urbano, substratos de alta degradabilidade podem tornar a

metanogenese a fase limitante do processo.

2.2.2 Metodologia de calibração e validação

Para que o modelo seja aplicado correctamente às condições operatórias do processo em estudo, é

necessário realizar um conjunto de procedimentos de calibração, com posterior validação, de forma a

obter um modelo com um rigor previsional aceitável.

O procedimento para a calibração de um modelo numérico segue um esquema básico como o

ilustrado na Figura 23. Após a construção do modelo são realizadas simulações consecutivas, com a

alteração das condições iniciais e outros parâmetros, que são constantemente comparadas com as

medições experimentais in situ obtidas na instalação. Caso os valores simulados não se aproximem

com um erro aceitável (dependendo do critério especificado pelo utilizador) dos valores

experimentais, os parâmetros necessitam de ser ajustados de forma sistemática e iterativa até que

sejam satisfeitos os critérios de aceitabilidade.

Figura 23. Esquema de Calibração e Validação do modelo

Page 46: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

45

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Análise e discussão dos parâmetros operatórios

Para melhor compreender o estado dos digestores e o seu funcionamento operacional, para posterior

modelação analisou-se qualitativa e quantitativamente os dados operacionais e construiu-se um

conjunto de indicadores indicados no anexo II.

Da análise dos parâmetros operatórios, verificou-se que a concentração de ST e de SV no reactor

dependem essencialmente do caudal de alimentação. Esta notória relação pode ser observada na

Figura 19, onde é ilustrado o tempo de permanência da suspensão no Digestor 1, calculado à custa

da equação A.II.1 durante o ano de 2011 e a correspondente concentração de ST, onde se verifica

que entre as semanas 20 e 41 o tempo de retenção mediano aumentou progressivamente até um

máximo local de aproximadamente igual a 120 dias, correspondendo a uma diminuição de

aproximadamente 20% em sólidos, devido essencialmente à baixa reposição de substrato e

conversão deste em biogás.

Consequentemente, tal variação tem grandes implicações na produção de biogás, pois menores

concentrações de substratos conduzem a uma produção menor de metano. De igual forma, grandes

oscilações na alimentação, até um terço do ano, tiveram grandes implicações na produção de biogás

em igual período, sendo esta claramente instável.

Em relação ao pH, verifica-se novamente uma influência da alimentação, até um terço do ano. O valor

de pH passa de 7,5 para um valor médio de 7,7 após esse período. Este fenómeno está relacionado

com a progressiva diminuição da carga orgânica fornecida aos digestores, com o consequente

aumento da alcalinidade e diminuição do teor de CO2 no biogás tal como descrito na bibliografia e

ilustrado na Figura 16. Na mesma figura, é possível verificar que para um teor de 35% em CO2, uma

alcalinidade de 10 g/l e um pH de 7,7, o digestor opera fora das condições normais de funcionamento.

Com este facto poderá estar relacionada, perda média quase de 5% da qualidade em metano desde

o início do ano.

Outra causa para a diminuição da qualidade em metano poderá estar relacionada com o aumento

progressivo dos AGV durante o ano que resulta na inibição por excesso de ácidos, como ilustrado na

Figura 22. Mas, ao comparar a evolução dos AGV com a alcalinidade, verifica-se que existe uma

tendência crescente dos dois parâmetros, verificando-se uma contradição em relação ao descrito na

bibliografia, ou seja, teoricamente, tal como ilustrado na Figura 15, a alcalinidade tem uma correlação

negativa com os AGV pois sendo o ião bicarbonato o termo dominante na alcalinidade, um aumento

do teor de ácidos promove a desprotonação do ião ao reagir com o ácido provocando a formação e

passagem de CO2 para a fase gasosa de modo a restabelecer o equilíbrio.

Page 47: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

46

3.2 Análise da performance dos digestores

A análise da performance permite ao operador identificar o estado dos digestores em relação aos

parâmetros de dimensionamento e compara-los com valores da bibliografia de modo a maximizar ao

máximo a produção.

Os digestores da Valorlis de volume útil médio total igual a 4000 m3react,foram alimentados durante o

ano de 2011, com um caudal médio de 45 m3/dia e uma concentração média de SV 50 Kg/m

3

( 5%SV). Segundo a equação A.II.3, a carga orgânica correspondente foi de 0,6 Kg SV/ m3react/dia

sendo um valor baixo quando comparado ao valor inicialmente esperado, cerca de 4,6 Kg SV/

m3react/dia. Consequentemente a %ST atingido revelou-se baixo, aproximadamente igual a 4,4% após

o estado estacionário, quando comparado ao valor de 6,2% ST espectável inicialmente.

Em termos de rendimento de produção de metano, verifica-se que o valor de biogás diário mediano

oscila em torno de 4000 m3/dia tendo uma queda abrupta no 4ºtrimestre do ano de 2011. Segundo a

equação A.II.4, durante o ano, a taxa de produção de biogás média diária é de 1 m3/ m

3react /dia e com

uma qualidade em metano de 60% e, segundo a equação A.II.5, o rendimento de produção de biogás

foi de 0,8m3 biogás/KgSVinput.

Por outro lado, em estado estacionário, o teor de SV médio foi de 20g/l. Deste modo verifica-se que,

segundo a equação AI.6, a eficiência de remoção de SV é de aproximadamente 52%. Desta forma

verificou-se que a produção se encontrava aproximadamente a metade e que o rendimento em

biogás foi superior, possivelmente devido ao elevado tempo de retenção de 90 dias, ao comparar

com os valores de dimensionamento iguais a 2,2 m3/ m

3react /dia, 0,49m

3 CH4/KgSVinput e TRH de 17

dias.

3.3 Descrição do formalismo do modelo

Pequenas desregulações imprevisíveis como acção activa da concentração de inibidores, oscilações

da concentração de nutrientes e de substratos intermédios ou e diferentes TRH, tornam o balanço

entre o crescimento e morte de biomassa viável muito variável. Consequentemente, um perfeito

estado estacionário raramente é atingido e sua simulação muito difícil devido ao facto de ser

necessário vastas quantidades de informação no tempo, para poder obter um erro previsional

relativamente aceitável. Assim, por forma a poder dar resposta ao problema de falta de informação,

como as características elementares do substrato, quantidade de diferentes subprodutos, como

diferentes ácidos orgânicos e populações microbianas existentes no reactor, é necessário proceder a

um conjunto de simplificações que tornem o exercício de modelação viável em termos de

caracterização dos fenómenos globais ocorrentes.

O entendimento do exercício de optimização por objectivos, ou seja, a calibração do modelo por

métodos minimização da diferença entre os valores experimentais e os valores simulados para

condições de estado estacionário, numa primeira fase, obrigou à identificação dos períodos onde o

processo industrial se mantinha em estado estacionário de forma a minimizar o número de variáveis,

Page 48: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

47

como o caudal e a temperatura do reactor. Verificou-se que os valores operatórios do caudal de

alimentação e temperatura e volume útil dos reactores correspondentes às semanas 20 - 37 do ano

de 2011 assumiam um valor constante e aproximadamente igual a 50m3d

-1, 35ºC e 4000m

3,

respectivamente.

O processo de desenvolvimento do modelo matemático presente neste trabalho agrega modelos

desenvolvidos por diversos autores (Moletta et al., 1986; Kiely et al., 1996; (Markel e Krauth,1999;

Keshkar et al., 2001; Liu et al., 2007). A descrição dos processos de digestão anaeróbia num reactor

contínuo em regime transiente é complexa e por isso, como é frequente (Markel e Krauth,1999),

dividimo-lo em três subsistemas interdependentes que envolvem a degradação biológica (1), os

equilíbrios físico-químicos (2) e a transferência de massa entre fase líquida e gasosa (3).

Consideraram-se ainda as seguintes simplificações: o digestor é um reactor bifásico, gás/líquido,

isotérmico a 35ºC, sem acumulação de sólidos precipitados no fundo; as fases, líquida e gasosa,

estão perfeitamente agitadas e a operação é isotérmica dada a presença de elevados fluxos de

recirculação quer da fase líquida como da fase gasosa e devido ao baixo teor em ST. Contudo foram

consideradas as trocas de massa entre as duas fases, como ilustrado no esquema da Figura 24.

Figura 24. Esquema do reactor bifásico perfeitamente agitado com trocas de massa entre fases, usado no modelo proposto.

Quanto aos processos de conversão admite-se que ocorrem unicamente em fase líquida pois o

metano não reage nem é consumido na fase gasosa. A fase líquida contém essencialmente uma

mistura de matéria particulada complexa em suspensão, matéria hidrolisada, ácidos orgânicos e

biomassa. Inertes e outros materiais orgânicos não biodegradáveis não foram considerados neste

modelo pois não interferem directamente nos balanços de massa assumidos.

De modo a descrever de forma global as cinéticas existentes no volume de fase líquida,

consideraram-se três grupos de microrganismos genéricos com diferentes parâmetros cinéticos

usados para calcular os fluxos degradatativos dos diferentes substratos correspondentes às etapas

sequenciais degradativas consideradas: (1) hidrólise, (2) acidogénese/acetogénese e (3)

metanogénese. Por outro lado, os parâmetros cinéticos considerados descrevem o crescimento da

Page 49: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

48

biomassa em descontínuo não podem ser transcritos para processos em contínuo sem que seja

realizado um controlo e ajustamento.

A influência do hidrogénio no controlo das vias degradativas dos ácidos não foi considerada pois

admitiu-se que a produção e consumo de hidrogénio ocorrem instantaneamente (Kiely et al., 1996) e

a concentração deste não varia substancialmente durante as fases estacionárias do processo

anaeróbio, tal como descrito por Di-Berardino (2006).

Os diferentes ácidos formados no digestor foram agrupados e avaliados em termos de ácido acético

pois em processo reais 80% dos AGV é ácido acético, em situações onde não existe inibição.

No total foram implementados 7 balanços de massa na fase líquida, 2 em fase gasosa e 6 equações

de equilíbrio químico, incluindo o pH e fracções dissociadas/não dissociadas das diferentes espécies

consideradas.

3.3.1 Estrutura do modelo

Os substratos e intermediários foram agrupados em variáveis globais dado que o tipo de dados

industriais recolhidos ao longo do tempo, da acumulação dos vários constituintes da matéria orgânica

biodegradável e diferentes ácidos gordos voláteis que entram e saem do reactor, apenas dão uma

indicação global em termos de SV, Alcalinidade e AGVt.

Figura 25. Diagrama do modelo proposto.

A matéria orgânica de baixa degradabilidade, como carbohidratos, proteínas e lípidos, foram

agrupados numa variável denominada sólidos particulados (Sp). Matéria orgânica hidrolisada, como

açúcares, aminoácidos e ácidos de cadeia longa, são representados numa variável como sólidos

Page 50: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

49

hidrolisados (Sh). Os ácidos produzidos, essencialmente ácido propiónico e butírico e ácido acético,

são englobados em termos de AGVt, tal como esquematizado na Figura 25.

Apesar de se considerar que as três componentes da matéria orgânica têm cinéticas de hidrólise

diferentes, a globalização destas numa variável causa uma diminuição da sensibilidade do modelo à

alteração das fracções biodegradáveis (Feng et al., 2006).

Aproximações semelhantes têm sido realizadas em modelos mais complexos como o ADM1 dado

que a fracção particulada da FORSU é muitas vezes composta por estruturas celulósicas (Bollon,

2011).

3.3.2 Equações da fase líquida

Tradicionalmente, a hidrólise é considerada como uma reacção de primeira ordem (Eastman e

Ferguson, 1981), como por exemplo no modelo ADM1 (Batstone, 2002). Mas esta simplificação

aparenta não abranger todos os processos que ocorrem durante a hidrólise verificando-se uma

possível dependência, pela biomassa ou uma outra actividade enzimática, da reacção de degradação

da matéria particulada (Vavilin et al., 2008), tendo sido considerada uma cinética de Monod, (equação

1), desenvolvida em 1940 (Gerber e Span, 2008), com afinidade a um dado substrato limitante.

A morte celular foi modelada segundo um decaimento de primeira ordem (equação 5).

(5)

“em que:

- taxa de morte da biomassa (kg.kg-1

.d-1

)

- constante de morte da biomassa (d-1

)

- concentração da biomassa (kg. m-3

)

Os balanços de massa considerados neste modelo têm como forma geral a equação 6.

(

)

(6)

“em que:

- caudal volumétrico da fase líquida (m3 d

-1)

- volume da fase líquida (m3)

- rendimento, definido como a razão entre a velocidade de crescimento da biomassa e a

velocidade de conversão do substrato [kg(Xi)/ kg(Si)]”

De forma a contabilizar efeitos de inibição, Andrews (1968) propôs a adição de um termo de inibição

não competitiva equação de Monod, correspondente ao somatório dos efeitos tóxicos infligidos no

microrganismos (equação 7).

Page 51: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

50

(7)

“em que:

Ki - concentração de substrato ao qual o crescimento do microrganismo é reduzido em 50%

(kg m-3

).

No modelo, foram incorporados efeitos de inibição por ácidos nas equações de biomassa acidogénica

e metanogénica, sendo apenas incorporada nesta última inibição por amónia (Kiely et al.,1996).

No balanço à amónia considerou-se que a sua produção ocorre durante a hidrólise (Berardino, 2006)

com um rendimento igual a 0,183 g(NH3)/g(Xh) (Keshtkar et al., 2001) e que, apesar de ser consumida

pela biomassa para criação de novas células, por simplificação considerou-se desprezável face ao

que era produzido e ao que era arrastado da fase líquida para fora do reactor.

Dado que a quantidade de sólidos suspensos voláteis (SSV) constituem na prática uma primeira

aproximação da biomassa em suspensão (Spanjers e Lier., 2006), as massas dos três grupos de

microrganismos modelados foram somadas para simular a quantidade total de biomassa no reactor.

3.3.3 Equações da fase gasosa

As espécies consideradas na fase gasosa foram unicamente metano e CO2 produzidos na fase

líquida. Com uma solubilidade relativamente baixa à temperatura de 35ºC, considerou-se que o

metano produzido no volume líquido não é solúvel nas condições operatórias existentes e seria

rapidamente transportado para a fase gasosa sendo que as equações de transferência de massa

entre fases coincidem. Tendo o CO2 uma solubilidade 1000 vezes superior, este encontra-se em

equilíbrio com a fase líquida não podendo ser desprezada a resistência da transferência de massa de

CO2 entre fases. O fluxo de CO2 para fase gasosa pode ser calculado através da dinâmica da

transferência de massa gás-líquido (equação 8).

( ( )

) (8)

“em que:

- fluxo molar da transferência de líquido-gás (kmol m-3

d-1

)

, - coeficiente de transferência de massa volumétrico (d-1)

( ) - concentração do gás dissolvido (kmol m-3

)

, - pressão parcial do gás i (bar)

- constante de Henry (bar kmol-1m

-3)”

Devido à variação dos fluxos de transferência de massa para a fase gasosa, a pressão parcial dos

gases, no volume de gás, variam no tempo de acordo com a equação 9. Esta equação representa a

variação da pressão parcial de CO2 e CH4 dada pela diferença entre o que é transferido para o gás e

Page 52: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

51

o volume de gás que sai do reactor (Kiely et al., 1996) respeitando igualmente a lei dos gases

perfeitos.

(

)

(9)

“em que:

- volume de gás no reactor,(m3)

R - constante dos gases perfeitos, (bar K-1 kmol

-1)

T, - temperatura no reactor (K)

- caudal volumétrico total de gases (m3 d

-1)”

Para o cálculo da transferência de CO2 considerou-se um de 100 d-1

(Graef e Andrews, 1973) e

uma constante de Henry igual a 28,43 bar/(mol/ l) (Markel e Krauth,1999) estando este em equilíbrio

com o CO2 dissolvido. Por fim, o caudal de biogás resulta do somatório dos volumes de gás

transferidos da fase líquida, no tempo, mais especificamente o metano e CO2, como descrito na

equação 10:

(∑

) (10)

3.3.4 Determinação do pH e Alcalinidade

Devida à produção de dióxido de carbono no meio reaccional, de ácidos e amónia, e de estes

estarem em equilíbrio com as suas espécies ionizadas, considerou-se importante o cálculo do pH

(equação 11). Este é calculado com base no balanço de cargas das espécies intervenientes

simultaneamente com o balanço de massa tendo em consideração que a cinética do balanço de

cargas é muito mais rápida que a cinética dos processos bioquímicos (Batstone, 2002). Em termos de

cálculo, a concentração das espécies iónicas foram definidas em termos das concentrações molares

totais (vide Anexo A.III), para o mesmo volume, mais especificamente, em termos de amónia, ácidos

orgânicos e carbono iónico (CI) totais (Smith e Chen, 2006).

(11)

Apenas os sistemas tampão da amónia ( ), ácidos orgânicos totais ( ), fracções do

carbónico iónico total (

) e dissociação da água ( ) foram considerados

(Markel e Krauth, 1999) pois admite-se que o somatório de cargas de outras espécies catiónicas e

aniónicas (

), como , , ou

, é nula.

Sendo o sistema considerado bifásico, o carbono iónico total não se mantém constante no tempo,

dentro do volume, estando o dióxido de carbono em solução em equilíbrio com a sua fase gasosa

tornando o cálculo do pH muito difícil devido à constante alteração do equilíbrio.

Page 53: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

52

Figura 26. Cálculo iterativo do pH e das espécies iónicas em equilíbrio

A resolução deste problema baseou-se no facto de se considerar que durante o espaço temporal, Δt,

a concentração das espécies iónicas mantem-se constante, ou seja, por cada intervalo de tempo o

sistema é fechado e as espécies encontram-se em equilíbrio.

A alcalinidade foi igualmente calculada para cada intervalo de tempo, devido ao facto de este

indicador representar a sensibilidade do pH à acumulação de ácidos voláteis sendo representada

pela equação 11 em CaCO3.

(12)

O consequente efeito tampão, para valores entre 6 e 7,7, é quase exclusivamente dado pela

dissociação do ácido carbónico (Figura 14) sendo desprezável o efeito do amoníaco e dos ácidos

gordos voláteis (Di Berardino, 2006).

3.4 Implementação do formalismo proposto

Com base nas equações de velocidade, foi construído um mecanismo reaccional global de todo o

processo bioquímico em que se estabeleceram as influências do pH, dos produtos intermédios da

reacção denominados por sólidos hidrolisados e ácidos gordos totais com base em parâmetros

cinéticos referidos na bibliografia.

A integração do sistema de equações diferenciais foi realizada por métodos numéricos de Runge-

Kutta de 4ª ordem usando o MatLab como plataforma de cálculo. Estendeu-se a resolução até um

tempo suficientemente longo, próximo de uma situação estacionária.

As condições iniciais utilizadas correspondem a uma situação de arranque industrial em que

a concentração de sólidos no reactor é aproximadamente nula e com uma quantidade não nula de

biomassa, como indicados na Tabela 10.

Page 54: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

53

Tabela 10. Condições iniciais e de arranque.

Por simplificação, considera-se que SVinput

corresponde à soma de Spinput

e Shinput

, tendo sido

considerado igual a 49g/l e 1g/l, respectivamente, para o mesmo volume dado que o valor mediano

de entrada de SV é aproximadamente igual a 50 g/l. Para o cálculo do parâmetro de SVoutput

,

assumiu-se de forma grosseira, dado o nível de rigor existente, que este correspondia à soma entre a

matéria biodegradável disponível e o total de biomassa formada dentro do reactor, desprezando a

biomassa inactiva ou morta.

Na fase gasosa, considerou-se que os dois digestores, com características semelhantes e com um

volume de gás igual a 100 m3, produziram iguais quantidades de biogás aproximadamente igual a

0,81 m3/ m

3react/d e com uma qualidade, em CH4, de 60%.

Por fim, resolveram-se, em simultâneo, os balanços de massa de cada uma das espécies e

procedeu-se ao cálculo iterativo do pH, em estado transiente, tendo em conta as trocas de massa

entre as fases, líquida e gasosa, de forma caracterizar, o mais possível, os digestores industriais

recorrendo a uma optimização por objectivos através da comparação do modelo em estado

estacionário com os dados industriais de biogás produzido e respectivos teores em metano, CO2,

amónia, AGVt, pH e alcalinidade dentro do reactor.

Os resultados da primeira simulação não foram satisfatórios dado que os valores dos parâmetros

cinéticos recolhidos conduziram a valores incoerentes quando comparados com os parâmetros

operatórios industriais. De forma a obter uma performance optimizada do sistema foi necessário

alterar diferentes parâmetros (Tabela 11) com base no esquema de calibração da Figura 23 sem

causar perda de rigor em relação à modelação dos fenómenos, tal como descrito na bibliografia. Por

outro lado comparou-se alguns parâmetros obtidos com valores de referência da bibliografia.

Dado que o modelo reproduzia concentrações de biomassa hidrolítica nulos, foi necessário alterar o

parâmetro de crescimento específico pois este assumia um valor inferior à correspondente taxa de

morte. Em relação aos parâmetros da biomassa produtora de ácidos, foi realizada uma alteração na

constante Ks, pois a concentração de AGVt assumia valores baixos quando comparados com os

valores experimentais. Devido à incapacidade dos parâmetros da biomassa metanogénica,

inicialmente admitidos, simularem correctamente a produção de metano, correspondente aos valores

observados nos digestores industriais, procedeu-se a uma alteração quase generalizada dos

parâmetros de forma a melhor caracterizar os fenómenos observados.

Page 55: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

54

Tabela 11. Parâmetros cinéticos, no modelo proposto (adaptado de Liu et al. (2007)) e constantes cinéticas

alteradas, através da optimização por objectivos.

Constantes

cinéticas

Hidrólise Acidogénese/

Acetogénese

Metanogénese Produção

de CO2

Produção

de Metano

max [d-1

] 0,03 (0,18) 0,4 0,6 - -

Kd [d-1] 0,06 0,04 0,016 (0,003) - -

Ks [g(Si)/l] 10 0,26 (0,66) 0,003 (1,1) - 0,0208

Ycons

[g(Xi)/ g(Si)]

0,2 0,188 0,08 (0,7)

- -

Yprod

[g(Xi)/ g(Si)]

0,22 2,65 - 0,08 32 (0,013)

Ki [g(Si)/l] - 0,02*

(0,5)*

0,04*/0,12

**

(0,4)*/ 0,12

**

- 0,059*

()-valores alterados; *-inibição por ácidos;**- inibição por amónia

De forma a avaliar a coerência do modelo em termos de estabilidade, realizou-se um conjunto vasto

de testes dos quais se destaca apenas neste trabalho a alteração do caudal de alimentação

mantendo todas as outras condições iniciais inalteradas. Para isso, criaram-se duas equações de

caudal variáveis no tempo, com característica sinusoidal e hiperbólica, como descritas e ilustradas na

Figura 27. Os outputs resultantes das simulações podem ser consultados no Anexo A.V.

As alterações realizadas e optimizadas por objectivos possibilitaram a simulação do processo, como

mostram as Figura 27 e Figura 28, verificando-se uma tendência do modelo para os valores dos

parâmetros operatórios (Tabela 12) correspondentes ao período avaliado, 180 dias (6 meses) após o

início da simulação, indicado a tracejado na vertical, assumindo um erro inferior a 10%.

Page 56: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

55

Tabela 12. Comparação entre os valores obtidos, pelo modelo e os valores experimentais industriais, em estado

estacionário.

Modelo (est. estacionário) CVO da Valorlis

SVout

(g/L) 17 18±2

ALC (g CaCO3/L) 13 10±2

VFAt (g CH3COOH/L) 0,06 1,1±0,4

pH 7,6 7,69±0,12

(g/L) 1,5 1,4±0,6

Biogás (m3/m

3/dia) 0,85 0,81±0,14

%Metano 60 58±6

Figura 27. Simulação da produção de biogás e teor em CH4 (à esquerda) e do pH e AGVt (à direita).

Figura 28. Simulação do arranque do digestor, onde é visível à esquerda, a evolução dos SV de entrada e de saída, SVin e SVout. Este último constituído pela soma entre o substrato de baixa e alta biodegradabilidade, Sp e Sh, respectivamente, e biomassa total, em termos de sólidos suspensos totais (SSV). À direita em pormenor, é apresentado o crescimento da biomassa hidrolítica, acidogénica/acetogénica e metanogénica, Xh, Xa e Xm, respectivamente, no tempo.

Page 57: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

56

Na Figura 27 é apresentada uma simulação da produção de biogás e sua qualidade, em teor de

metano e dióxido de carbono, para uma carga orgânica constante e igual a 1.25 kg/m3react/dia. O

modelo indica uma ligeira diminuição da produção nos primeiros dias, após o arranque, devido à

condição inicial de CI considerada poder ser elevada. De igual forma, é interessante verificar na

Figura 27, uma acidificação do meio líquido, no arranque, devido ao baixo poder tampão existente e

devido à limitada quantidade de biomassa metanogénica havendo um claro efeito desfavorável na

estabilização do pH, tal como descrito na bibliografia.

Após restabelecido o balanço de carbono iónico a produção de biogás aumentou exponencialmente

durante a fase de arranque, primeiramente com teor em CO2 dominante devido ao elevado

crescimento da biomassa hidrolítica e acidogénica, com a consequente produção excessiva de ácidos

(Figura 27) devido ao baixo crescimento das metanogénicas, tal como referido na bibliografia.

Este aumento brusco de ácidos provocou um efeito estimulador sobre a biomassa metanogénica

tendo consequências na produção de CH4, como se pode observar no pico de produção no dia 130,

estabilizando, após algum tempo, num valor de 0,85 m3/ m

3react/dia e com uma qualidade em metano

de 60% (Figura 28).

Em termos de tendência, é interessante notar uma enorme semelhança entre o modelo aqui descrito

e modelos complexos como o de Keshtkar (2003), mostrando que o modelo interpreta correctamente

os processos físicos e bioquímicos simulados por outros modelos.

Page 58: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

57

4 CONCLUSÕES

O modelo proposto considera-se válido para a análise de tendências dos fenómenos bioquímicos e

físico-químicos que ocorrem no processo de digestão anaeróbia nas condições operatórias admitidas

inicialmente, com um ajustamento aceitável das cinéticas existentes no reactor industrial e tendendo

para os valores experimentais em condições de estado estacionário com um erro inferior a 10%.

Apesar do bom ajustamento realizado, a necessidade de alteração das constantes cinéticas

intrínsecas ao comportamento dos diferentes grupos de microrganismos pode não responder de

forma eficaz a alterações que ocorram no processo industrial, como por exemplo grandes flutuações

na alimentação, que podem produzir ou excesso ou défice de substrato, interferindo na cadeia de

degradação anaeróbia e levar a um estado estacionário diferente do previsto dado que o sistema não

é linear e tal como as características da biomassa podem variar no tempo alterando as cinéticas reais

ocorridas no reactor.

Relativamente ao desempenho do digestor durante o ano de 2011, a análise aos parâmetros de

monitorização e operação dos reactores mostrou que estes se encontram fora dos limites normais de

funcionamento devido ao facto do pH se encontrar acima dos valores aconselhados na bibliografia,

consequência da elevada alcalinidade. Este aumento, por outro lado, é devido ao aumento

progressivo do tempo de retenção.

Com base na bibliografia conclui-se ainda que existe uma contradição na correlação positiva entre os

valores medidos dos ácidos orgânicos voláteis e a alcalinidade pois, teoricamente, esta deveria ser

negativa não sendo possível tirar qualquer ilação dos valores medidos de AGV.

O presente trabalho leva a admitir que é importante estudar outras cinéticas existentes na bibliografia,

aprofundar a avaliação do formalismo proposto, como a criação de cenários de excesso de carga

orgânica, alterações dos tempos de retenção, ou até incorporação de cinéticas de degradação de

ácidos de cadeias maiores que C2, por forma a validar a robustez do modelo a diferentes

perturbações. Será igualmente importante validar o modelo em diferentes reactores industriais, em

contínuo, com semelhanças no substrato e tipo de processo, como é o caso da estação de

valorização orgânica da Suldouro.

Em suma, apesar de o modelo mecanístico interpretar correctamente os processos de digestão

anaeróbia para condições de estado estacionário, este pode se tornar um pouco rígido em cenários

onde as simplificações consideradas não podem ser desprezadas. Mas a sua formulação apresenta

uma oportunidade de optimizar os métodos de monitorização utilizados, eficiência do processo

operacional e pode constituir uma ferramenta de apoio importante na análise estratégica do processo.

Page 59: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

58

Page 60: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

59

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Abbasi T., Tauseef S.M., Abbasi S.A. (2012). Anaerobic digestion for global warming control and

energy generation - an overview. Renewable and Sustainable Energy Reviews, 16, 3228 – 3242.

Ahring B.K. (2003). Perspectives for Anaerobic Digestion. In Scheper T. (Eds), Advances in

Biochemical Engineering/ Biotechnology, 81(4). Springer-Verlag, Berlin.

Alves M., Mota M. (2007). Reactores para tratamento anaeróbio. In Fonseca M.M., Teixeira J.A.

(Eds), Reactores Biológicos. Lidel -Edições Técnicas Lda, Lisboa.

Andrews, J.F. (1968). A Mathematical Model for the Continuous Culture of Microorganisms Utilizing

Inhibitory Substrates. Biotechnology and Bioengineering, 10, 707 – 723.

Andrews J.F., Graef S.P. (1971). Dynamic Modeling and Simulation of the Anaerobic Digestion

Process. Anaerobic Biological Treatment Processes, Advances in Chemistry Series, American

Chemical Society, Washington, D.C.

Amon, T., Amon, B., Kryvoruchko, V., Machmüller, A., Hopfner-Sixt, K., Bodiroza, V., Hrbek R.,

Friedel, J., Pötsch, E., Wagentristl, H., Schreiner, M., Zollitsch, W., Pötsch, E. (2007): Methane

Production trough Anaerobic Digestion of Various Energy Crops Grown in Sustainable Crop Rotations.

Bioresource Technology, 98 (17), 3204 - 3212

Appels, L., Baeyens, J., Degrève, J., Dewil, R. (2008). Principles and potential of the anaerobic

digestion of waste-activated sludge. Progress in Energy and Combustion Science, 34, 755–781.

Batstone D.J., Keller J., Newell R.B., Newland M. (2000). Modelling anaerobic degradation of complex

wastewater.I: model development. Bioresource Technology, 75, 67-74.

Batstone D.J., Keller J., Angelidaki I., Kalyuzhnyi S.V., Pavlostathis S.G., Rozzi A., Sanders W.T.M.,

Siegrist H., Vavilin V.A., (2002) Anaerobic Digestion Model No. 1 (ADM1), IWA Task Group for

Mathematical Modelling of Anaerobic Digestion Processes. IWA Publishing, London.

Batstone D.J., Keller J., Steyer J.P. (2006). A review of ADM1 extensions, applications, and analysis:

2002-2005. Water Science and Technology, 54(4), 1–10.

Benner R., Maccubbin A. E., Hodson R. E. (1984). Anaerobic Biodegradation of the Lignin and

Polysaccharide Components of Lignocellulose and Synthetic Lignin by Sediment Microflora. Applied

and environmental Microbiology, 47 (5), 998-1004.

Boe K. (2000) Online monitoring and control of the biogas process. Ph.D. dissertation, Institute of

Environment & Resources, Technical University of Denmark, Denmark.

Boe K., Batstone D.J., Steyer J-P., Angelidaki I. (2010). State indicators for monitoring the anaerobic

digestion. Water Research, 44, 5973 – 5980.

Page 61: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

60

Bollon J., Le-hyaric R., Benbelkacem H., Buffiere P. (2011). Development of a kinetic model for

anaerobic dry digestion processes: Focus on acetate degradation and moisture content. Biochemical

Engineering Journal, 56, 212– 218.

Botheju D., Bakke R. (2011). Oxygen Effects in Anaerobic Digestion – A Review. The Open Waste

Management Journal, 4, 1-19.

Boyle, W. C. (1977): Energy Recovery from Sanitary Landfills. In: Microbial Energy Conversion. Edited

by: H. G. Schlegel & J. Barnea, 119 – 138.

Buffiere P., Loisel D., Bernet N., Delgenes J.P. (2006) Towards new indicators for the prediction of

solid waste anaerobic digestion properties. Water Science and Technology,53, 233–241.

Buswell A. M., Mueller, H. F. (1952). Mechanism of Methane Fermentation. Industrial and Engineering

Chemistry, 44 (3), 550 – 552.

Bryers J.D. (1985). Structured Modeling of the Anaerobic Digestion of Biomass Particulates.

Biotechnology and Bioengineering, 27, 638 – 649.

Carlsson M., Lagerkvist A., Morgan-Sagastume F. (2012). The effects of substrate pre-treatment on

anaerobic digestion systems: A review. Waste Management, 32(9), 1634-1650.

Cecchi F., Battistoni P., Pavan P., Bolzonella D., Innocenti L. 2005. Digestione anaerobica della

frazione organica dei rifiuti solidi. APAT Agenzia per la Protezione dell’Ambiente e per i Servizi

Tecnici, Roma.

Chandler J.A., Jewell W.J., Gossett J.M., Vansoest P.J., Robertson J.B. (1980). Predicting methane

fermentation biodegradability. Biotechnology and Bioengineering, 22, 93–107.

Chandra R., Takeuchi H., Hasegawa T. (2012). Methane production from lignocellulosic agricultural

crop wastes: A review in context to second generation of biofuel production. Renewable and

Sustainable Energy Reviews, 16, 1462-1476.

Chen Y., Cheng J.J., Creamer K. S. (2008). Inhibition of anaerobic digestion process: A review.

Bioresource Technology, 99, 4044-4064.

Chen Y.R., Hashimoto A.G. (1978). Kinetics of Methane Fermentation. Biotechnology and

Bioengineering Symposium, 8, 269 – 282.

Cheremisinoff, N P. (2003). Handbook of solid waste management and waste minimization

technologies. Elsevier Science, USA.

Cho, J.K., Park, S.C., Chang, H.N., (1995). Biochemical methane potential and solid state anaerobic

digestion of Korean food wastes. Bioresour. Technol. 52, 245–253.

Page 62: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

61

Coombs J. (1990). The present and future of anaerobic digestion. In Wheatley A. (Eds) Anaerobic

digestion: a waste tratament technology. Elsevier science publishiers Lds, London.

De Baere L. (2006). Will anaerobic digestion of solid waste survive in the future? Water Science and

Technology, 53(8), 187-194.

Deublein D., Steinhauser A. (2008). Biogas from Waste and Renewable Resources: An Introduction,

WILEY-VCH Verlag GmbH & Co. KGaA, Weinheim.

Di-Berardino S., (2006). Desenvolvimento de um processo tecnológico inovador para o tratamento

dos efluentes do processamento de sementes de alfarroba. Dissertação par obtenção do grau de

Doutor em Engenharia Sanitária, Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de

Lisboa, Lisboa.

EUROBSERV’ER (2010). Biogas Barometer. Le journal des énergies renouvelables, 200, 112-113.

Eastman, J.A., Ferguson, J.F., (1981). Solubilization of particulate organic carbon during the acid

phase of anaerobic digestion. J. WPCF 53, 352–366.

Edelmann W., Schleiss K., Joss A. (2000). Ecological, energetic and economic comparasion of

anaerobic digestion with different competing technologies to treat biogenic wastes. Water Science and

Technology, 41(3), 263-273.

EPA. (1979). Process Design Manual for Sludge Treatment and Disposal. Center for Environmental

Research Information Technology Transfer. U.S

Feng Y., Behrendt j., Wendland C., Otterpohi R. (2006). Parameter analysis of the IWA Anaerobic

Digestion Model No.1 for the anaerobic digestion of blackwater with kitchen refuse. Water Science and

Technology, 54(4), 139-147.

Ferreira, V. (2010). Contribuição para o estudo da modelação da digestão anaeróbia de resíduos

sólidos. Estudo da influência da geometria do reactor na cinética do processo. Lisboa: Edições

Colibri/Instituto Politécnico de Lisboa.

Garardi M.H. (2003). The Microbiology of Anaerobic Digesters. John Wiley & Sons, New Jersey.

Garardi M.H. (2006). Wastewater Bacteria. John Wiley & Sons, New Jersey.

Gerber M., Span R. (2008). An Analysis of Available Mathematical Models for Anaerobic Digestion of

Organic Substances for Production of Biogas. IGRC, Paris.

Guendouz A. A., Brockmann D., Trably E., Dumas C, Delgenès J.P., Steyer J.P., Escudié R. (2012).

Total solids content drives high solid anaerobic digestion via mass transfer limitation. Bioresource

Technology, 111, 55–61.

Page 63: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

62

Graef S. P., Andrews J. F. (1973). Mathematical modelling and control of anaerobic digestion. AIChE

Symp. Ser, 70, 101-131.

Hartmann H., Angelidaki I., Ahring B.K. (1999). Increase of anaerobic degradation of particulate

organic matter in full-scale biogas plants by mechanical maceration. In Mata-Alvarez J., Tilche A.,

Cecchi F.(Eds). II International Symposium on Anaerobic Digestion of Solid Waste, vol.I. Gràfiques

92,S.A.,Barcelona, 129-136.

Hartmann H., Ahring B.K. (2006). Strategies for the anaerobic digestion of the organic fraction of

municipal solid waste: an overview. Water Science and Technology, 53(8), 7-22.

Hansson, M., Nordberg, Å., Sundh, I. and Mathisen, B. (2002) Early warning of disturbances in a

laboratory-scale MSW biogas process. Water Science and Technology, 45, (10), 255-260.

He P. J., 2010. Anaerobic digestion: An intriguing long history in China. Waste Management, 30, 549–

550.

Heo, N.H., Park, S.C., Kang, H., (2004). Effects of mixture ratio and hydraulic retention time on single-

stage anaerobic co-digestion of food waste and waste activated sludge. Journal. Environmental.

Science and Health, Part A, 39, 1739–1756.

Hill D.T. (1982). A Comprehensive Dynamic Model for Animal Waste Methanogenesis. Transactions of

the ASAE, 1374 – 1380.

Keshtkar, A., Ghaforian, H., Abolhand, G., (2001). Dynamic simulation of cyclic batch anaerobic

digestion of cattle manure. Bioresource Technology, 80, 9–17.

Keshtkar A., Meyssami B., Abolhamd G., Ghaforian H., Khalagi Asadi M. (2003). Mathematical

modeling of non-ideal mixing continuous flow reactors for anaerobic digestion of cattle manure.

Bioresource Technology 87,113–124

Keymer, U.; Schilcher, A. (2003): Biogasanlagen: Berechnung der Gasausbeute von Kosubstraten.

Bayrische Landesanstalt für Landwirtschaft.

Kiely, G., Tayfur, G., Dolan, C., (1996). Physical and mathematical modeling of anaerobic digestion of

organic wastes. Water Research, 31,534–540.

Knobel A., Lewis A. (2002). A Mathematical Model of a High Sulphate Wastewater Anaerobic

Treatment System. Water Research, 36, 257 – 265.

Kruble K., Hoppenheidt K., Hirsch P., Kottmair A., Nimmrichter R., Nordsieck H., Mucke W., e Swerev

M. (2000). Full scale co-digestion of organic waste. Water Science and Technology, 41(3), 195-202.

Lesteur M., Bellon-Maurel V., Gonzalez C., Latrille E., Roger J.M., Junqua G., Steyer J.P. (2010).

Alternative methods for determining anaerobic biodegradability: A review. Process Biochemistry, 45,

431–440.

Page 64: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

63

Liu C.-f., Yuan X.-z., Zeng G.-m., Li W.-w., Li J. (2007). Prediction of methane yield at optimum pH for

anaerobic digestion of organic fraction of municipal solid waste. Bioresource Technology, 99, 882–

888.

Markel W., Krauth K. (1999). Mass transfer of carbon dioxide in anaerobic reactors under dynamic

substrate loading conditions. Water Research, 33(9), 2011-2020.

McCarty P.L., McKinney R.E. (1961). Volatile acids toxicity in anaerobic digestion. Water Pollution

Control Federation, 33(3), 223-232.

McCarty P.L. (1964). Anaerobic Waste Treatment Fundamentals, Part I, Chimistry and Microbiology.

Public Works,

Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional. 2007. Plano

Estratégico para os Resíduos Sólidos Urbanos 2007-2016 (PERSU II).

Moletta, R., Verrier, D., Albagnac, G., (1986). Dynamic modeling of anaerobic digestion.

Water Research, 20, 427–734.

Moletta R. (1998). Quantitative analysis of anaerobic oxidation of methane (AOM) in marine

sediments: A modeling perspective. Laboratoire de Biotechnologie de l’Environnement, INRA, France.

Monod, J. (1949): The Growth of Bacterial Cultures. Annual Reviews of Microbiology, 3, 371 – 394.

Mosey F.E., (1983). Mathematical modeling of the anaerobic digestion process: regulatory mechanism

for the formation of short-chainvolatile acids from glucose. Water Science. Technology, 15, 209–232.

Nagao N., Tajima N., Kawai M., Niwa C., Kurosawa N., Matsuyama T., Yusoff F.M., Toda T. (2012).

Maximum organic loading rate for the single-stage wet anaerobic digestion of food waste. Bioresource

Technology, 118, 210–218.

Raposo F., De la Rubia M.A., Fernández-Cegrí R., Borja R. (2011). Anaerobic digestion of solid

organic substrates in batch mode: An overview relating to methane yield and experimental

procedures. Renewable and Sustainable Energy Reviews, 16, 861-877.

Reichert G.A. (2004). Aplicação da digestão anaeróbia de resíduos sólidos urbanos: uma revisão. 23º

Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental, Brasil.

R. W. Beck, Inc. (2004). Anaerobic Digestion Feasibility Study. Bluestem Solid Waste Agency and

Iowa Department of Natural Resources.

Schӧn M. (2009). Numerical modelling of anaerobic digestion processes in agricultural biogas plants.

Ph.D. dissertation. Innsbruck University, Austria.

Smith S.A., Chen S. (2006). Activity correction for ionization constants in defined media. Water

Science Technology, 54(4), 21-29.

Page 65: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

64

Spanjers H., Lier, J. V. (2006). Instrumentation in anaerobic treatment – research and practice. IWA

Publishing, 53(4), 63–76.

Switzenbaum M.S., Giraldo-Gomez E., Hickey R.F. (1990). Monitoring of the anaerobic methane

fermentation process. Enzyme Microb. Technol., 12, 722-730.

Vavilin V.A., Fernandez B., Palatsi J., Flotats X. (2007). Hydrolysis kinetics in anaerobic degradation

of particulate organic material: An overview. Waste Management, 28, 939–951.

Vandevivere P., De Baere L., Verstraete W. (2002). Types of anaerobic digesters for solid wastes. In:

Biomethanization of the organic fraction of municipal solid waste. IWA, 336-367.

Weichgrebe, D. (2007). FOS/TAC, Herkunft, Methode und Anwendbarkeit,

Vortrag: Wasserwirtschaftliches Kolloquium Leibniz Universität Hannover

Page 66: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

65

Anexos

Page 67: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

66

Page 68: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

67

Anexo A.I – Determinação das características do substrato

As características globais do substrato que é alimentado aos digestores são definidas em termos dos

sólidos totais (ST), a matéria degradável, também denominado sólidos voláteis (SV), carência química

de oxigénio (CQO) e carência bioquímica de oxigénio, em cinco dias (CBO5).

Determinação dos ST (matéria orgânica e inertes)

O teor de sólidos totais resulta da evaporação da água livre e da evaporação, total ou parcial, da

água oclusa e da água de cristalização dos sais.

Resumo do método

Uma quantidade conhecida de resíduo orgânico é sujeita a secagem em estufa, à temperatura de

105ºC. O resíduo da secagem é pesado, calculando-se o teor de sólidos totais.

Determinação dos SV (ou matéria orgânica)

O teor de sólidos voláteis não permite distinguir com precisão os compostos orgânicos dos compostos

inorgânicos porque a volatilização total dos compostos orgânicos é acompanhada da decomposição e

da volatilização de certos sais minerais. Permite, no entanto, na maior parte dos casos, uma

avaliação grosseira do teor de matéria orgânica da amostra.

Resumo do método

A determinar o teor de sólidos voláteis, é seguida da determinação dos ST, e leva-se os sólidos

resultantes da secagem, à mufla uma temperatura de 550ºC, durante meia hora. Calcula-se o teor de

sólidos voláteis após pesagem.

Determinação de CQO

A carência química de oxigénio (CQO) é a quantidade de oxigénio, expressa em miligrama, que é

consumida pela matéria, oxidável nas condições do ensaio, contida num litro de amostra.

Resumo do método

A matéria orgânica e a inorgânica oxidável presentes na amostra são oxidadas por um excesso de

dicromato de potássio (K2Cr2O7) em meio ácido, à temperatura de ebulição, na presença de sulfato de

prata (catalizador da oxidação) e de sulfato de mercúrio (agente complexante dos cloretos). O

excesso de dicromato é determinado por titulação com uma solução de sulfato de ferro (II) e de

amónio de título conhecido.

Page 69: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

68

Page 70: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

69

Anexo A.II – Equações dos parâmetros operatórios e cálculo de performance

a) Tempo de retenção hidráulico médio

(A.II.1)

em que

, tempo de retenção hidráulico médio, no período de n dias, [dia];

, volume útil do reactor, [m3];

, caudal afluente diário, [m3/dia];

n, número de dias

b) Tempo de retenção de sólidos (ou idade das lamas)

(A.II.2)

em que

, tempo de retenção hidráulico médio, no período de n dias, [dia];

, caudal efluente diário, [m3/dia];

, concentração média de biomassa dentro do reactor (kgSV/m3)

, concentração média de biomassa na corrente de saída (kgSV/m3)

Caso o sistema for perfeitamente agitado e com um volume útil constante, e

. Fica

então que TRH=TRS.

c) Carga orgânica volumétrica

(A.II.3)

em que

, carga orgânica volumétrica média, no período de n dias, [kgSV/dia/m3react];

, concentração média de substrato na corrente de entrada (kgSV/m3)

Page 71: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

70

d) Taxa de produção de Biogás

(A.II.4)

em que

, taxa de produção de biogás por unidade de volume de reactor, em condições

normais [Nm3/dia/m

3react];

, caudal volumétrico de biogás, em condições normais [Nm3/dia].

e) Rendimento de produção de metano (ou produção específica de metano)

( ) (A.II.5)

em que

, produção específica de metano por unidade de matéria orgânica alimentada ao

digestor [Nm3/ kgSV].;

e) Rendimento de produção de metano (ou produção específica de metano)

f) Eficiência de remoção de Sólidos

(A.II.6)

em que

, eficiência de remoção da matéria orgânica S;

, massa de ST, SV ou CQO na corrente de entrada;

, massa de ST, SV ou CQO na corrente de saída;

Page 72: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

71

Anexo A.III – Equações do Modelo

No corrente anexo são demonstradas as equações de equilíbrio químico do CO2, H2S, AGV e NH3.

São igualmente apresentadas as equações usadas no formalismo proposto para o Modelo de

Digestão Anaeróbia.

Equações de equilíbrio químico

Dinâmica do dióxido de carbono dissolvido

2

3332221 COHCOCOHCO DCDCDC

LÍQUIDO

KKK

LÍQUIDO

CO

COHK DC

2

32

32

3

1

COH

HHCOK DC

3

2

3

2

HCO

HCOK DC

2

332 COHCOCOCILÍQUIDO

Resolvendo o anterior sistema de equações, determinou-se as fracções dissociadas do CO2:

2211

2

1

H

KK

H

K

CICO

DCDCDCLÍQUIDO

,

2211

1

3

1

H

KK

H

K

CI

H

KHCO

DCDCDC

DC

2211

2

212

3

1

H

KK

H

K

CI

H

KKCO

DCDCDC

DCDC

Dinâmica do ácido sulfídrico dissolvido

2

221 SHSSH DSDS KK

SH

HHSK DS

2

1

HS

HSK DS

2

2

2

2 SHSSHSI

Resolvendo o anterior sistema de equações, determinou-se as fracções dissociadas do H2S:

2211

2

1

H

KK

H

K

SISH

DSDSDS

,

2211

1

1

H

KK

H

K

SI

H

KHS

DSDSDS

DS ,

2

2112

212

1

H

KK

H

K

SI

H

KKS

DSDSDS

DSDS

Page 73: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

72

Dinâmica dos ácidos orgânicos voláteis totais

HAOVAOV dissociado

K

odesionizada

odesionizaddissociadoT AOVAOVAOV

HAOV

AOVK

dissociado

odesionizad

a

T

a

a

odesionizad AOVHMM

KAOV

1

1

Dinâmica da amónia

HNHNH NK

34

344 NHNHNH T

4

3

NH

HNHK N

T

NN

NHKMM

HNH

4

1

3 1

Tabela A.III.1. Constantes de equilíbrio das espécies dióxido de carbono, ácido sulfídrico, amónia e ácido acético (Bibliografia)

Constante de Equilíbrio Valor

Page 74: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

73

Equações da fase líquida

Hidrólise

Hcons

HHpp

L

Vp

Y

XSS

V

QS

dt

d 0 ,

psH

pMaxH

HSK

S

HdHHHHH

L

VH XkXXX

V

QX

dt

d 0

3

4044

NH

HHTT

L

VT

Y

XNHNH

V

QNH

dt

d

Acidogénese/acetogénese

AH cons

AA

prod

HHhh

L

Vh

Y

X

Y

XSS

V

QS

dt

d 0 ,

iaAOV

odesionizad

h

sA

MaxA

A

K

AOV

S

K

1

AdAAAAA

L

VA XkXXX

V

QX

dt

d 0

Metanogénese

MA cons

MM

prod

AATT

L

VT

Y

X

Y

XAOVAOV

V

QAOV

dt

d 0

MdMMMMM

L

VM XkXXX

V

QX

dt

d 0

3

31imNHimAOV

odesionizad

odesionizad

sM

MaxM

M

K

NH

K

AOV

AOV

K

Page 75: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

74

Carbono Iónico total

2

22

0 COR

YMM

X

YMM

XCICI

V

QCI

dt

d

CObac

A

A

CObac

M

M

L

V

Equações da Fase Gasosa

2

2

2

2

CO

laCO

He

pCOCOKR GÁS

LÍQUIDO

odesionizadimet

imet

odesionizadm

odesionizad

oMe

M

CH

AOVK

K

AOVK

AOV

Y

XR

tan

4

G

L

GCH

G

Lmol

V

VQpCHR

V

VVpCH

dt

d

44 4

G

L

GCO

G

Lmol

V

VQpCOR

V

VVpCO

dt

d

22 2

L

mol

L

CH

L

CO

G

V

VV

He

pCHV

He

pCOQ

42

42

Tabela A.III.2. Constantes assumidas na formulação do modelo (excepto constantes cinéticas)

Constantes do Modelo Valor Unidade

( )

( )

*- =massa molar da fórmula geral da bactéria (C5H7O2N)

Page 76: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

75

Anexo A.IV – Medições dos parâmetros operatórios

No seguinte anexo são apresentadas medições de parâmetros realizados à saída do suspension

buffer, dos quais resumem-se a ST, SV. São apresentados posteriormente os parâmetros do caudal

volumétrico de entrada nos digestores e de biogás total produzido, seguindo-se as medições

realizadas na recirculação de cada digestor como ST, SV, temperatura, pH, qualidade em metano e

dióxido de carbono, ALC, AGV, CQOs, NH4+ e H2S.

Suspension Buffer

20

44

68

92

116

140

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

SB -

ST

[g/L

]

Ano 2011 - Semanas

0

24

48

72

96

120

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

SB -

SV

[g/

L]

Ano 2011 - Semanas

6

6.6

7.2

7.8

8.4

9

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

SB -

CO

2 [%

]

Ano 2011 - Semanas

-100

0

100

200

300

400

500

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Acu

mu

laçã

o d

e su

spen

são

[m

3/d

ia]

Ano 2011 - Semanas

Page 77: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

76

Digestor 1

0

50

100

150

200

250

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Cau

dal

en

trad

a To

tal [

m3/d

ia]

Ano 2011 - Semanas

0

0.5

1

1.5

2

2.5

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Bio

gás

Tota

l [m

3/d

ia]

Ano 2011 - Semanas

20

28

36

44

52

60

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

ST [

g/L]

Ano 2011 - Semanas

0

8

16

24

32

40

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

SV [

g/L]

Ano 2011 - Semanas

27

31

35

39

43

47

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Tem

per

atu

ra [o

C]

Ano 2011 - Semanas

6.5

6.9

7.3

7.7

8.1

8.5

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

pH

Ano 2011 - Semanas

Page 78: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

77

40

48

56

64

72

80

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Me

tan

o[%

]

Ano 2011 - Semanas

10

18

26

34

42

50

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

CO

2[%

]

Ano 2011 - Semanas

0

3.2

6.4

9.6

12.8

16

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

ALC

[gC

aCO

3/L

]

Ano 2011 - Semanas

0

0.6

1.2

1.8

2.4

3

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

AG

V [

gCH

3CO

OH

/L]

Ano 2011 - Semanas

0

1.6

3.2

4.8

6.4

8

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

CQ

Os [g

O2/L

]

Ano 2011 - Semanas

0

0.6

1.2

1.8

2.4

3

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

NH

4+ [

g/L]

Ano 2011 - Semanas

Page 79: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

78

Digestor 2

20

28

36

44

52

60

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

ST [

g/L]

Ano 2011 - Semanas

0

8

16

24

32

40

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

SV [

g/L]

Ano 2011 - Semanas

25

29

33

37

41

45

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Tem

per

atu

ra [o

C]

Ano 2011 - Semanas

6.5

6.9

7.3

7.7

8.1

8.5

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

pH

Ano 2011 - Semanas

40

48

56

64

72

80

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Met

ano

[%

]

Ano 2011 - Semanas

10

18

26

34

42

50

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

CO

2[%

]

Ano 2011 - Semanas

Page 80: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

79

Valores de H2S nos dois Digestores em 2011

0

3.2

6.4

9.6

12.8

16

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

ALC

[gC

aCO

3/L

]

Ano 2011 - Semanas

0

0.6

1.2

1.8

2.4

3

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

AG

V [

gCH

3C

OO

H/L

]

Ano 2011 - Semanas

0

1.6

3.2

4.8

6.4

8

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

CQ

Os [g

O2/L

]

Ano 2011 - Semanas

0

0.6

1.2

1.8

2.4

3

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

NH

4+ [

g/L]

Ano 2011 - Semanas

0

400

800

1200

1600

2000

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Did

esto

r 1

- H

2S

[p

pm

]

Ano 2011 - Semanas

0

400

800

1200

1600

2000

Sem1

Sem11

Sem21

Sem31

Sem41

Sem51

Dig

esto

r 2

- H

2S

[p

pm

]

Ano 2011 - Semanas

Page 81: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

80

Page 82: MODELAÇÃO DO PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DA

81

Anexo V – Simulações do Modelo

Simulação com um caudal com tendência sinusoidal

Simulação com um caudal com tendência hiperbólica