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Marcos Luppi — Engº Ambiental
Os tipos de meio biológico interferem direta-
mente no projeto, na eficiência e no funciona-
mento dos sistemas de tratamento de efluen-
tes. É no meio biológico que a Matéria Orgâni-
ca será “digerida” e, consequentemente, o e-
fluente será tratado, ficando pronto para ser
destinado. A digestão do lodo pode se dar em
meio aeróbio, onde há presença de ar ou ana-
eróbio, sem a presença de ar. Esta característi-
ca difere completamente os meios entre si, a-
presentando peculiaridades e tornando seus
desempenhos bem diferentes e específicos pa-
ra cada tipo de sistema ou tratamento.
Digestão Anaeróbia
Sistemas Anaeróbios
mo de energia. Um aspecto que deve ser leva-
do em conta ao se projetar um sistema de tra-
tamento anaeróbio é a formação de gases áci-
dos que pode ocorrer. O processo bioquímico
do meio anaeróbio tende a ser insuficiente pa-
ra decompor alguns elementos químicos como
o Enxofre por exemplo, resultando na geração
de Gás Sulfídrico (H2S) que além de tóxico é o
responsável pelo mau cheiro característico
destes sistemas.
Uma das principais características dos sistemas
anaeróbios é a baixa geração de lodo, que in-
clusive ajuda a viabilizar a redução de área de
projetos que empregam este meio. A geração
de lodo pode ser da ordem de 5 a 15% (DQO)
enquanto sistemas aeróbios tendem a gerar de
50 a 60% (DQO). Por não necessitarem de sis-
temas de aeração, os sistemas anaeróbios nor-
malmente apresentam menor custo de im-
plantação e operação, além de menor consu-
Tanque de digestão aeróbia (esquerda) pode ser aberto por não emitir mau cheiro, já o de digestão anaeróbia (direita) normalmente é fechado para evitar a
emissão direta de odores ao ambiente.
1
A Metanogênese
Outro gás resultante do processo anaeróbio é
o Metano (CH4), também conhecido como Bio-
gás, e pode ser aproveitado como combustível.
O Metano é gerado por bactérias presentes no
próprio meio, chamadas de bactérias metano-
gênicas, em um processo denominado meta-
nogênese. Neste processo ácidos voláteis são
formados durante a degradação anaeróbia de
carboidratos, proteínas e gorduras. Este pro-
cesso de biodegradabilidade da matéria orgâ-
nica presente no esgoto, desde as macromolé-
culas orgânicas complexas até o bio-
gás, requer a mediação de vários gru-
pos diferentes de microrganismos. A
Figura 1 mostra uma representação
sugerida por Gujer e Zehnder (1983)
para digestão anaeróbia de proteí-
nas, carboidratos e lipídios (a maior
parte do material orgânico pertence
a esses grupos). Pode-se distinguir quatro par-
tes diferentes no processo global da conver-
são, descritas a seguir:
Hidrólise
Neste processo o material orgânico particula-
do é convertido em compostos dissolvidos de
menor peso molecular. O processo requer a
interferência das chamadas exo-enzimas que
são excretadas pelas bactérias fermentativas.
As proteínas degradam-se através de (poli)
peptidas para formarem aminoácidos; os car-
boidratos transformam-se em açúcares solú-
veis (mono e dissacarídeos) e lipídios são con-
vertidos em ácidos graxos de cadeia longa de
Carbono (C15 a C17) e Glicerina. Em particular, a
taxa de conversão de lipídios abaixo de 20o C
torna-se muito baixa (O’Rourke, 1968).
Acidogênese
Os compostos dissolvidos, gerados no proces-
so de hidrólise ou liquefação, são absorvidos
nas células das bactérias fermentati-
vas e, após a acidogênese, excretadas
como substâncias orgânicas simples
como ácidos graxos voláteis (AGV),
álcoois, ácido lático e compostos mi-
nerais (CO2, H2, NH3, H2S, etc.). A fer-
mentação acidogênica é realizada
por um grupo diversificado de bacté-
rias, das quais a maioria sendo facul-
tativas, torna-se importante nos sistemas de
tratamento anaeróbio de esgoto, porque o oxi-
gênio dissolvido eventualmente presente po-
deria se tornar uma substância tóxica.
Acetogênese
A acetogênese é a conversão dos produtos da
acidogênese em compostos que formam os
substratos para a produção de metano: aceta-
to, hidrogênio e dióxido de carbono. Uma fra-
Representação da mo-
lécula de Metano
2
ção de aproximadamente 70% da DQO origi-
nalmente presente converte-se em ácido acé-
tico, enquanto o restante da capacidade de
doação de elétrons é concentrado no hidrogê-
nio formado. Dependendo do estado de oxida-
ção do material orgânico a ser digerido, a for-
mação de ácido acético pode ser acompanha-
da pelo surgimento de dióxido de carbono ou
hidrogênio.
Metanogênese
A metanogênese, em geral, é o passo que limi-
ta a velocidade do processo de digestão como
um todo, embora a temperaturas abaixo dos
20oC a hidrólise possa se tornar também limi-
tante (Gujer e Zehnder, 1983). Metano é pro-
duzido pelas bactéria acetotróficas a partir da
redução de ácido acético ou pelas bactérias
hidrogenotróficas a partir da redução de dióxi-
do de carbono. Tem-se as seguintes reações
catabólicas:
(A) metanogênese acetotrófica: CH3COOH ->
CH4 + CO2
(b) metanogênese hidrogenotrófica: 4H2 + CO2
-> CH4 + 2H2O
As bactérias que produzem metano a partir de
hidrogênio crescem mais rapidamente que a-
quelas que usam ácido acético, de modo que
as metanogênicas acetotróficas geralmente
limitam a taxa de transformação de material
orgânico complexo presente no esgoto para
biogás.
Os diferentes grupos de bactérias que trans-
formam o material orgânico afluente têm to-
dos atividade catabólica e anabólica. Desse
modo, paralelo à liberação de diferentes pro-
dutos de fermentação, há a formação de novas
células, dando origem a quatro populações
bacterianas no digestor anaeróbio. Por conve-
niência, muitas vezes os três primeiros proces-
sos juntos são chamados de fermentação áci-
da, que deve ser completada com a fermenta-
ção metanogênica.
É importante também, ressaltar a capacidade
energética do Metano e o aproveitamento que
deve ser feito desta fonte de energia, segundo
Vanzin (2009) a geração de metano em depósi-
tos de resíduos sólidos no Brasil é da ordem de
Figura 1—-Resumo da sequência de processos na digestão anaeróbia
de macromoléculas complexas (os números referem-se a porcenta-
gens expressas como DQO)
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945 milhões de metros cúbicos por ano que,
consideradas as perdas energéticas dos moto-
res à combustão, seriam capazes de disponibi-
lizar 2,1 TWh ou seja 2100 GWh, o suficiente
para alimentar uma cidade de 3,5 milhões de
habitantes.
Drenagem de Metano em aterro sanitário
Fontes: http://www.fae.edu/publicacoes/pdf/IIseminario/pdf_praticas/praticas_01.pdf // Van Haandel e Lettinga, 1994
Um sistema anaeróbio bastante utilizado é o
UASB (Upflow Anaerobic Sludge Blanket ou Re-
ator Anaeróbio de Fluxo Ascendente). Esse tipo
de reator de manta de lodo no qual o efluente,
em seu movimento ascendente no reator,
atravessa uma camada de lodo biológico
biodegradador, é frequentemente empregado
para tratamento anaeróbio de águas
residuárias com baixos teores de sólidos
sedimentáveis. O emprego do meio anaeróbio
permite que o sistema UASB apresente as
vantagens já abordadas dos sistemas
anaeróbios com relação à custos e espaços,
porém sistemas anaeróbios normalmente
necessitam de pós-tratamento, pois
apresentam eficiência de 65 a 75% de remoção
de DBO e DQO. Sistemas UASB acompanhados
de pós-tratamento costumam ser altamente
eficientes em remoção de matéria orgânica e
espaço físico requerido.
Sistema UASB
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Representação do funciona-
mento de um sistema UASB. É
possível observar o fluxo as-
cendente do efluente e as en-
tradas e saídas do sistema.
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