mobilidade espacial e acessibilidade À cidade

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estruturação urbana nas cidades capitalistas interfere no cotidiano dos citadinosà medida que estes necessitam locomover-se constantemente para realizarem asmais diversas funções e atividades, e para adquirir bens e serviços, os quais seencontram dispersos nesse espaço e são necessários à reprodução da vida. Dessaforma, a situação espacial de cada um pode facilitar ou dificultar essesdeslocamentos intra-urbanos. Associado a ela está o poder aquisitivo que definiráos meios de locomoção a serem utilizados para que ocorram o uso e aapropriação do espaço urbano.

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  • Revista OKARA: Geografia em debate, v.1, n.1, p. 1-152, 2007Joo Pessoa, PB, DGEOC/CCEN/UFPB http://www.okara.ufpb.br

    OKARA: Geografia em debate, v.1, n.1, p. 43-76, 2007

    MOBILIDADE ESPACIAL E ACESSIBILIDADE CIDADE1

    Slvia Regina PereiraDepartamento de Geografia da UNIOESTE-PR

    Resumo

    A estruturao urbana nas cidades capitalistas interfere no cotidiano dos citadinos medida que estes necessitam locomover-se constantemente para realizarem asmais diversas funes e atividades, e para adquirir bens e servios, os quais seencontram dispersos nesse espao e so necessrios reproduo da vida. Dessaforma, a situao espacial de cada um pode facilitar ou dificultar essesdeslocamentos intra-urbanos. Associado a ela est o poder aquisitivo que definiros meios de locomoo a serem utilizados para que ocorram o uso e aapropriao do espao urbano. As cidades mdias, em sua maioria, como o casode Presidente Prudente-SP, tm apresentado caractersticas que eram, at poucotempo, comuns apenas nos espaos metropolitanos. Isso tem ocorrido em funodas diferenas socioespaciais estarem mais presentes, e do espao urbano tornar-se cada vez mais compartimentado, expressando os processos de segregao eauto-segregao, os enclaves e as novas periferias, os novos espaos voltadospara o consumo de mercadorias e a possibilidade da ocorrncia da fragmentaourbana. Nesse sentido, nosso objetivo foi entender como essas manifestaes seapresentam nesta cidade e interferem na vida dos citadinos, no que diz respeitoao exerccio do direito cidade. Para a compreenso do fato, analisamos ocotidiano de diferentes tipos sociais (mulher trabalhadora, dona-de-casa,estudante, desempregado, idoso, portador de deficincia fsica e residente emcidade vizinha a Presidente Prudente), por meio de entrevistas eacompanhamentos de percursos intra-urbanos, no intuito de avaliar a mobilidadee o grau de acessibilidade para a reproduo da vida. Definimos trs perfis paracada tipo social, considerando para isso a faixa salarial, a faixa etria, o lugar deresidncia e os meios de deslocamentos. A partir desse estudo foi possvelentender os entrevistados como segregados, diferenciados ou auto-segregadossocioespacialmente, de acordo com a relao entre situao espacial e a condiosocioeconmica, que define o meio de deslocamento e interfere no acessodiferenciado cidade. Essas configuraes refletem a lgica de produo,apropriao e consumo do espao urbano, que favorece a diferenciaosocioespacial no interior da cidade e interfere na vida dos citadinos.

    Palavras-chave: percursos urbanos, mobilidade, acessibilidade, diferenciaosocioespacial, segregao socioespacial, fragmentao urbana, direito cidade.

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    Resumen

    A estruturao urbana nas cidades capitalistas interfere no cotidiano dos citadinos medida que estes necessitam locomover-se constantemente para realizarem asmais diversas funes e atividades, e para adquirir bens e servios, os quais seencontram dispersos nesse espao e so necessrios reproduo da vida. Dessaforma, a situao espacial de cada um pode facilitar ou dificultar essesdeslocamentos intra-urbanos. Associado a ela est o poder aquisitivo que definiros meios de locomoo a serem utilizados para que ocorram o uso e aapropriao do espao urbano. As cidades mdias, em sua maioria, como o casode Presidente Prudente-SP, tm apresentado caractersticas que eram, at poucotempo, comuns apenas nos espaos metropolitanos. Isso tem ocorrido em funodas diferenas socioespaciais estarem mais presentes, e do espao urbano tornar-se cada vez mais compartimentado, expressando os processos de segregao eauto-segregao, os enclaves e as novas periferias, os novos espaos voltadospara o consumo de mercadorias e a possibilidade da ocorrncia da fragmentaourbana. Nesse sentido, nosso objetivo foi entender como essas manifestaes seapresentam nesta cidade e interferem na vida dos citadinos, no que diz respeitoao exerccio do direito cidade. Para a compreenso do fato, analisamos ocotidiano de diferentes tipos sociais (mulher trabalhadora, dona-de-casa,estudante, desempregado, idoso, portador de deficincia fsica e residente emcidade vizinha a Presidente Prudente), por meio de entrevistas eacompanhamentos de percursos intra-urbanos, no intuito de avaliar a mobilidadee o grau de acessibilidade para a reproduo da vida. Definimos trs perfis paracada tipo social, considerando para isso a faixa salarial, a faixa etria, o lugar deresidncia e os meios de deslocamentos. A partir desse estudo foi possvelentender os entrevistados como segregados, diferenciados ou auto-segregadossocioespacialmente, de acordo com a relao entre situao espacial e a condiosocioeconmica, que definem o meio de deslocamento e interferem no acessodiferenciado cidade. Essas configuraes refletem a lgica de produo,apropriao e consumo do espao urbano, que favorece a diferenciaosocioespacial no interior da cidade e interfere na vida dos citadinos.

    Palabras-clave: trayectos urbanos, movilidad, segregacin socio-espacial,fragmentacin urbana, derecho a la ciudad.

    Introduo

    A partir do enfoque da mobilidade espacial, buscamos, neste captulo, analisar aacessibilidade cidade. As pessoas entrevistadas residem em diversas reas dePresidente Prudente e utilizam diferentes meios de deslocamento para realizaremsuas atividades cotidianas.

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    Tomamos a perspectiva de que:

    La forma urbana es el marco sobre el que las personas, lasmercancas y la informacin se mueven, de ah su importanciacuando queremos realizar un estudio sobre movilidad urbana(GUERRERO, 2003, p. 18).

    A forma urbana uma dimenso especfica e restrita da cidade. Partimos dela,mas estamos analisando a estruturao urbana que mais abrangente porquecompreende a forma e os fluxos que se estabelecem em um dado espao urbano.

    Nosso estudo busca compreender o espao urbano de uma cidade mdia,diferenciado socioespacialmente2 por apresentar os problemas que,anteriormente, eram apenas visveis e sentidos nas grandes cidades. Partimos dahiptese de que as condies socioespaciais definem e reafirmam o tipo deinsero que os citadinos estabelecem com relao cidade onde vivem,podendo estar segregados ou no.

    Consideramos para essa anlise: a) a situao espacial, ou seja, o local demoradia, em relao ao centro; b) os meios de deslocamento utilizados,avaliando-se o tempo e a freqncia dos mesmos; c) o poder aquisitivo destes; ed) as formas de utilizao e consumo de diferentes reas da cidade. A partirdessas consideraes, foi possvel verificar a mobilidade dos entrevistados,procurando saber se so segregados, os graus de acessibilidade e se conseguemse apropriar do conjunto da cidade.

    Partimos do entendimento da estruturao que se estabelece no espao urbano,por meio dos percursos realizados pelo transporte pblico, visando a entendercomo ocorre o acesso dos diferentes segmentos a esse meio de transporte, bemcomo o atendimento, ou no, s suas demandas e, por conseguinte, como issoimplica na definio do grau de acessibilidade dos citadinos cidade.

    Posteriormente, analisamos o espao urbano como lcus do automvel particular,em contraposio aos espaos dos pedestres e do transporte coletivo, e asinterferncias e problemas que se apresentam para o trfego urbano. Analisamos,tambm, os deslocamentos e os meios de transporte utilizados pelosentrevistados, para entender como se d a acessibilidade destes ao espaourbano, segundo suas condies socioespaciais.

    Para finalizar o captulo, avaliamos a mobilidade dos entrevistados, no intuito deverificar as dificuldades e facilidades de deslocamento de cada um deles,concluindo, ento, se h ou no acessibilidade para todos.

    Transporte pblico e espao urbano

    Com o intuito de relacionar a questo do transporte pblico com o espaourbano, apresentamos alguns aportes de estudos de casos que tratam desse

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    assunto, mesmo que estejam relacionados com outras realidades e outrosperodos histricos, para que seja possvel entender como o tema abordado, demodo geral e a partir de ento, saber se plausvel o estabelecimento decorrelaes.

    Pelo fato de termos tido a oportunidade de realizar um estgio em Barcelona,vivenciando, assim, um pouco daquela realidade, e tambm pela leitura de obrassobre a temtica aqui abordada, inclumos na discusso algumas referncias questo da mobilidade nessa cidade, com base em dois trabalhos. Em seguida,destacamos as idias de um estudo que aborda esse assunto na metrpole de SoPaulo. A partir de ento, consideramos a cidade em estudo, buscando estabeleceranalogias entre esses nveis escalares, suas diferenas, bem como os contextoshistricos que a ensejam.

    Em relao aos trabalhos indicados, o de Oyn (1992) discute o transportetranvirio3 em Barcelona no perodo de 1872 a 1914, destacando que as redes detransportes tiveram um papel decisivo no crescimento das cidades europiasdesde o sculo XIX. Para ele, a relao transporte-crescimento urbano bastantecomplexa e, no caso dessa cidade, foi operada simultaneamente ao crescimentourbano em forma de ensanche4 e de suburbanizao, sendo que nem todas asreas e nem todas as classes sociais participaram da democratizao dotransporte, por ter sido este um processo bastante lento e seletivo, fortalecendoas diferenciaes existentes. Segundo o autor, faz-se necessrio questionar adiviso social do espao provocada pelo trfego urbano em Barcelona e todas asconseqncias sobre o crescimento urbano.

    Es necesario preguntarnos primero sobre quin usaba eltransporte y a qu costes para poder examinar despus endetalle posibles efectos fsicos en la expansin de la ciudad. Elespacio historico que se abarca es el de la era de transportecaro, caracterizada por un no intervencionismo municipal y lagestin de las redes tcnicas urbanas a travs del sistema deconcesiones a compaias privadas. El control municipal deltransporte fue voluntariamente tibio, pero esa mismareluctancia a intervenir y los particulares sistemas deregulacin liberal impuestos facilitaram un sistema de gestinempresarial, unas polticas tarifarias, de trazado y extensinde lneas de consecuencias profundas en la estructura urbana(OYN, 1992, p. 108).

    Para compreender as interferncias do transporte pblico na estruturao urbanade Barcelonano referido perodo, Oyn faz uma recuperao da implantao deinfra-estruturas de transporte e dos tipos que foram instalados a partir de 1848,como os ferrocarriles5 para grandes distncias, os chamados mnibuses6 e os

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    tranvias (de trao animal, a partir de 1872, com o vapor, em 1889, e o eltrico,em 1903).

    Com o tranvia houve uma valorizao de reas como do ensanche e dos bairrosaltos, em termos de longitude de vias e de superfcie urbana atendida, pois ascompanhias visavam ao atendimento das reas que poderiam oferecer maiorrentabilidade, j que o transporte era considerado caro para a poca. Entre 1892e 1896 houve um grande impulso do transporte pblico, diante das redues detarifas em vrias linhas e, no perodo de 1898-99 a 1906, com a eletrificao. Apartir de 1909 ocorreu um decrscimo na utilizao do tranvia, aumentandonovamente a partir de 1914-1919. O uso do transporte pblico, a partir de 1922,em relao poca do tranvia de trao animal aumentou, mas, mesmo assim,ainda era inferior ao seu uso nas cidades britnicas, alems e em outras cidadeseuropias de tamanho similar ao de Barcelona, que se destacava em relao freqncia no uso dirio. Essas variaes do trfego tranvirio refletem os altos ebaixos da economia da poca, caracterizando uma elementar democratizao dotransporte barcelons entre 1883 e 1914, marcado por oscilaes, principalmentepara aqueles que no podiam custear o uso desse meio de transporte, j que noera acessvel a todos os segmentos (OYN, 1992).

    Em Barcelona, para o perodo destacado pelo autor, os tranvias e os ferrocarrilesforam os meios de transporte utilizados apenas por alguns segmentos sociais, porserem extremamente seletivos, e desse modo, no acessveis a todos, em especialpelo custo, trazendo implicaes para a mobilidade dos citadinos, o que nopossibilitava efetiva acessibilidade. Segundo o autor, o caminho para umademocratizao do transporte pblico foi traado a partir de 1914, quando doaumento nos salrios, permitindo a alguns trabalhadores o pagamento pelotransporte. O fato, no entanto, no significou acessibilidade a todos. Nesseperodo de democratizao do tranvia, com o uso em diferentes reas sociais,aparece um outro meio de transporte, privado, o automvel, que teve grandeinfluncia no fortalecimento da diviso e da diferenciao do espao urbano e dossegmentos.

    Um outro trabalho mais recente sobre Barcelona o de Guerrero (2003), no qualo autor retrata a questo da estrutura urbana e da mobilidade entre residncia etrabalho. Aborda os deslocamentos e a oferta de transportes no sculo XIX, com autilizao da trao animal, das caminhadas e, posteriormente, com a utilizaodo mnibus, como meio de transporte urbano.

    La demanda de movilidad se hallava directamentecondicionada por la reducida oferta y por la estructuraespacial de las ciudades. A grandes rasgos la forma espacial dela ciudad preindustrial se configuraba como unidad orgnica,compacta, muy bien delimitada, con alta densidad depoblacin, cuyo interior encontraba una alta integracin entreamplia variedad de funciones (tanto residenciales, comocomerciales y de produccin); adems compreenda distintos

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    estratos sociales, presentando, en cuanto a su desarrollo en elespacio, una forma orgnica, con un entramado urbanogeneralmente complejo formado por calles angostas(GUERRERO, 2003).

    A introduo das inovaes tecnolgicas nos sistemas de transporte permitiuampliar a mobilidade urbana por meio da implementao do transporte pblico(que era caro) e pela generalizao do seu uso. O custo elevado nos transportesdeu-se, em especial, no perodo entre 1830 e 1900, com os tranvias, trens emnibus que, alm das tarifas elevadas, possuam inadequao de horrios,tornando-se acessveis somente para a burguesia, enquanto os trabalhadoresdeslocavam-se quase sempre a p ou de bicicleta. Com a eletrificao, amunicipalizao dos transportes e a incluso de trolebus7, houve uma reduonos custos, possibilitando um aumento na utilizao desse meio por volta dasegunda metade dos anos 30 do sculo XX, o que permitiu a ampliao dos limitesespaciais das cidades industriais (GUERRERO, 2003).

    O modo de produo fordista incitou a necessidade de maior espao para odesenvolvimento de funes produtivas, fazendo com que a localizao daproduo industrial urbana passasse do centro para as periferias. Concomitante aisso, a funo residencial tambm foi deslocada para a periferia, devido aoaumento do uso do automvel.

    No ps-fordismo (com as mudanas no processo de produo, nas prticaslaborais e no processo de consumo), a introduo de novas tecnologias resultouem elemento chave no processo de flexibilizao e nos transportes. Houve umcrescimento forado da mobilidade, diante da complexidade dos fluxosintrametropolitanos, com a descentralizao dos centros de produo e deconsumo e com o crescimento da interao territorial. A oferta de servios detransporte necessitava ser adequada realidade da policentralidade e dadiversificao de atividades, com os novos fluxos entre subcentros, para entomelhorar a mobilidade (GUERRERO, 2003).

    Assim, no que diz respeito Barcelona, pelos estudos apresentados, a formaurbana atual reflete as decises que foram sendo tomadas ao longo dos anos,definindo e redefinindo a sua organizao espacial que, segundo o ltimo autor,pode sintetizar o confronto de duas estratgias de planejamento.

    La traduccin urbanstica de este conflito se concetrabsicamente en la confrontacin de dos modelos alternativosde crecimiento urbano: un modelo de crecimiento radial, quebusca mediante la generao de centralidad revalorizar elsuelo del centro historico de la ciudad (defendido por lospropietarios del suelo); y otro, representado por el PlanCerd, que busca la extensin mediante el ensanche sobre elllano de Barcelona, con la intencin ltima de aumentar laoferta de suelo sin incrementar el precio del mismo(GUERRERO, 2003, p. 20).

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    O plano de Ensanche de Ildefons Cerd foi aprovado em 1859 e, no princpio dosculo XX, a cidade consolidava sua expanso, anexando ncleos de populaes jexistentes como Sants, Grcia, Sant Andreu, Srria etc. Em 1905, o Plan Jausselypropunha uma cidade como unidade funcional de produo e consumo,rechaando o Plan Cerd, mas no chegou a ser posto em prtica, embora o PlanGeneral de Urbanizacin de 1917 tenha levado em conta algumas de suaspropostas como limitao do crescimento, grandes artrias radiocntricas queorientam o crescimento de acordo com os anis concntricos com base no preodo solo e zoneamento de atividades. Outros planos tambm foram propostos,como o Regional Planning, de 1932, para a regio metropolitana, e o Plan Macia,de 1934, para Barcelona, com a colaborao de Le Corbusier e com vistas aplicao do conceito de cidade funcional. O ordenamento territorial foiretomado nos anos cinqenta por meio da metropolizao da cidade e doaumento do transporte privado. O Plan Comarcal, de 1953, visava ordenar essametropolizao, primando o uso do transporte privado medida que organizava oespao para esse meio, criando uma extensa rede viria e deixando de lado outrosmeios e os pedestres. Em 1976, com o governo democrtico, foi aprovado o PlanGeneral Metropolitano que procurou corrigir as aes urbansticas anteriores evalorizar o interesse coletivo, de acordo com Guerrero (2003).

    Essas aes ao longo do tempo so protagonizadas por agentes urbanos queinfluenciam e direcionam o ordenamento, o planejamento e a estruturaoespacial que se estabelece nas cidades.

    Resumidamente, a estruturao atual, nessa cidade europia, em termos deoferecimento de transporte pblico, composta por metrs, nibus, tranvias etrens, entre os quais h uma integrao no intervalo de uma hora e quinzeminutos. As tarifas para os percursos na rea urbana e metropolitana sediferenciam de acordo com a diviso por zonas. A demanda por transporte bastante grande, sendo ainda acentuada pelos turistas, em funo da falta dereas para estacionamentos de automveis individuais e de seu custo elevado. Hum grande nmero de automveis particulares e de txis gerando um trfegobastante tumultuado.

    possvel apreender que as afirmaes anteriores dizem respeito a um outrocontexto histrico, mas tambm podem ser perfeitamente relacionadas realidades capitalistas atuais. O fato de haver uma estruturao dos transportesque privilegia algumas reas em detrimento de outras, de no atender a demandados usurios que mais necessitam, de ser um servio de alto custo para a grandemaioria da populao, de no haver um planejamento desse sistema de modoque seja eficiente e que se torne uma opo mais atrativa em relao ao uso doautomvel privado, so caractersticas que se aplicam a diferentes contextossocioespaciais. Nossa preocupao, portanto, a de destacar a necessidade deuma reestruturao do sistema de transporte pblico considerando os seususurios, as diferenas socioespaciais, o aumento do uso do transporte privado e,

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    com isso, a concorrncia pelas vias de circulao, bem como a grande importnciade se efetivar a acessibilidade cidade.

    Aps essas consideraes sobre a realidade de Barcelona, apresentamosVasconcelos (2001) que analisa, para a cidade de So Paulo dos anos 1960 a 1990,as relaes entre transporte urbano, espao e equidade em pases emdesenvolvimento, numa perspectiva poltica e social, buscando entender osdeslocamentos humanos no espao urbano e seus condicionantes. Segundo oautor, as condies de transporte so insatisfatrias para grande parte dapopulao, principalmente para aquelas que no tm acesso ao transporteprivado. As polticas e investimentos em polticas pblicas poderiam propiciaruma melhora nas condies de vida dos segmentos de menor renda.Concomitante a isso a poltica de transporte urbano poderia gerenciar ocrescimento urbano que no fosse to excludente em termos ambientais esociais. Prope ainda que haja uma abordagem sociolgica da circulao paraanalisar a oferta, a operao e o uso das estruturas e meios de circulao emfuno das necessidades de produo e reproduo.

    Primeiramente, o autor faz uma distino entre os enfoques da poltica detransporte e trnsito, sendo que o enfoque tcnico limita-se a clculos geraissobre quantidades e custos, o social, por outro lado, diz respeito contabilidadedos impactos sociais, enquanto o sociolgico complementa a anlise numrica,considerando os padres de viagem em funo de condies sociais, polticas,econmicas e institucionais que condicionam as decises de pessoas e entidades.

    O autor faz um aporte geral de como foi sendo redefinido o planejamento detransporte nos pases industrializados. Neles, aps a Segunda Guerra Mundial,com o aumento no uso do automvel e o considervel crescimento territorialurbano, eram utilizadas tcnicas sofisticadas de planejamento, predominando afuno do engenheiro de trfego, que procurava a acomodao para oautomvel, por meio de planos e propostas tcnicas sem a adoo de enfoquessociais e polticos. J nos anos de 1960, a Sociologia e a Cincia Poltica passarama estudar a rea dos transportes, considerando-se, a partir da, os impactos sociaise ambientais, mesmo que esse planejamento ainda continuasse sendounidirecional e com uma viso estreita definida pela relao custo-benefcio. Apsos anos de 1970, houve uma reavaliao do planejamento do transporte com umamelhor utilizao da Sociologia para a anlise da estrutura e das mudanas sociais(VASCONCELOS, 2001). Essas metodologias eram, geralmente, transpostas paraoutros pases, como ocorreu com o Brasil, em funo da acelerao daurbanizao aps a Segunda Guerra Mundial quando as maiores cidadescomearam a vivenciar problemas de transporte e trnsito. O perodo militar, coma centralizao poltica e a falta de recursos locais para investimentos em sistemasde transporte pblico, fez com que o planejamento nessa rea fosse desenvolvidojunto ao Governo Federal, no Ministrio dos Transportes ( exceo de So Paulo,que contava com agncias prprias). A metodologia utilizada era tradicional, ouseja, um enfoque tcnico com incurses na rea social. Como as condies de

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    transporte no se alteraram significativamente, houve uma forte crtica a essetipo de planejamento tradicional no final da dcada de 1960.

    O tema transporte no era abundantemente abordado, enquanto aquelesrelacionados habitao e educao recebiam maior ateno. Aos poucos, nadcada de 1980, foi se privilegiando a incorporao do tema e dos atores sociais,bem como a sua participao na construo do espao urbano, significando umatransio em relao ao uso da metodologia da sociologia urbana francesa dosanos de 1970 (VASCONCELOS, 2001).

    Este autor considera, em sua anlise, a estrutura de produo, que se refere aoambiente construdo onde grande parte da produo e da gesto ocorre com aindstria, o comrcio e servios e as empresas pblicas; a estrutura dereproduo, onde ocorre a produo biolgica, social e cultural das pessoas,destacando-se a residncia, a escola, locais de lazer e de realizao de outrasatividades sociais e polticas, bem como dos servios mdicos; e a estrutura decirculao, que so as vias pblicas, caladas, terminais, ou seja, onde ocorre acirculao.

    A circulao extremamente essencial para que haja o deslocamento das pessoasat seus locais de trabalho j que, normalmente, h uma separao entre este e olocal de moradia, bem como das demais atividades necessrias sua reproduo,o que implica em custos que, muitas vezes, no podem ser pagos, fazendo comque as pessoas busquem outras alternativas, como ir a p ou de bicicleta.

    Historicamente, a proviso dos meios de transporte foi sendopaulatinamente transferida do empregador para o Estado medida que no mais interessou ao capital. Condiesespecficas do modo capitalista de produo luta em tornodo valor da fora de trabalho, das necessidades sociais dereproduo e dos salrios determinados pelo mercado levam a uma incapacidade permanente do sistema paraprover todas as necessidades da fora de trabalho [...]. Nocaso de So Paulo, por exemplo, a construo de moradiasjunto s fbricas pelos empregadores garantia a residncia e otransporte (a p) dos trabalhadores no incio daindustrializao (VASCONCELLOS, 2001, p. 35).

    Essa situao foi sendo alterada com o aumento do nmero de trabalhadores edos custos para a habitao, e com o fato dos empregadores passarem, aospoucos, os encargos de transporte para o Estado e para os prprios trabalhadores(VASCONCELOS, 2001).

    No que diz respeito a esses encargos, as pessoas com menor renda sempre teroque resolver questes bsicas relativas sua reproduo, ou seja, precisamconseguir habitao e emprego, alm do deslocamento para realizar essas eoutras atividades, geralmente por meio de transporte coletivo. Muitas vezesmoram distante do trabalho e no tm como custear os seus deslocamentos,

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    tendo que sair mais cedo de sua residncia e ir a p ou de bicicleta, e, em muitoscasos, precisam percorrer longas distncias. Uma acessibilidade adequada no fazparte da vida desses segmentos sociais.

    Essas questes correspondem ao fato do espao urbano ser produzido,reproduzido e apropriado de acordo com os ditames da lgica capitalista e seencontrar cada vez mais dividido e segmentado socioespacialmente. Nessesentido, a circulao e a mobilidade de pessoas, bens e mercadorias, nesseespao, do-se diferentemente, de acordo com os fatores econmicos, polticos esociais.

    As pessoas, enquanto seres polticos, apropriam-se do espaode formas variadas, algumas condizentes com as formasprevistas e outras no, interferindo nos pressupostos formaisdas polticas de transporte e trnsito. O exemplo mais claroest no trnsito, em que a ocupao violenta do espao pelosmotoristas reflete um aspecto da luta de classes. Se no campodo trabalho o conflito principal se d entre os detentores dosmeios de produo e os trabalhadores, no trnsito o conflitobsico se d entre a classe mdia e os trabalhadores, na formaautomvel versus nibus/pedestres (VASCONCELLOS, 2001, p.205).

    No caso especfico de So Paulo, Vasconcellos (2001) faz uma anlise de algunsaspectos e dimenses da poltica de transporte em dois grandes perodosdistintos: um entre 1960 e 1980, caracterizado pelo regime militar e pelocrescimento econmico com grandes transformaes no espao dessa cidade e,ps 1980, quando ocorre a redemocratizao da poltica, estagnao econmica,inflao e desemprego.

    Com os processos de urbanizao e industrializao, a cidade se reestrutura e alocalizao das diferentes atividades tambm se reorganiza de acordo com o usodo solo, com o direcionamento da expanso urbana e com as infra-estruturas.Para essa estruturao espacial se constituir so necessrios os meios detransporte, que podero ser pblicos ou privados, de acordo com o poderaquisitivo dos usurios. Tanto a estruturao espacial quanto a ordenao dosmeios de transportes pblicos no so to simples e espontneas, estandopermeadas por interesses diferenciados dos agentes urbanos. Com isso no h,portanto, uma situao favorvel que permita fluir a circulao de maneiraadequada, j que h inmeros problemas nos sistemas de transporte pblico euma grande presena do automvel particular, implicando na mobilidade eacessibilidade de muitas pessoas, principalmente das que possuem uma rendamenor.

    Voltando-nos para Presidente Prudente8 destacamos, a seguir, as informaesreunidas por Sperandio (1992), que fez uma anlise da legislao relativa aotransporte coletivo, a partir do incio de 1950, onde se encontram as premissas

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    que nortearam a prestao desse servio, por meio da concesso e da permissodo mesmo empresas particulares.

    A autora analisa a prestao de servios de transporte coletivo nas diferentesadministraes da cidade, demonstrando como o oferecimento desse servio populao foi se estruturando. No governo de Luiz Ferraz de Sampaio (de 1961 a1964) foi criada a Empresa de Transportes Braslia S/A (1961), que prestouservios ilegalmente at 1963, ano em que foi outorgada a primeira permissopara que a empresa operasse na legalidade. De 1965 a 1968, com o prefeito WatalIshibashi, essa permisso foi renovada, no considerando o prazo de cinco anosprevistos para a renovao. No perodo posterior, com Antonio Sandoval Neto(1969 a 1972), essa mesma empresa continuou sendo beneficiada, j que o editalpara a prestao desse servio estipulava o mnimo de dez anos de experincia noramo de transportes coletivos para participar da concorrncia. Ela possua essesrequisitos, alm de no existir naquele momento outra empresa que pudesseconcorrer (SPERANDIO, 1992).

    A situao no se diferenciou nos dois mandatos posteriores, de 1973 a 1980,com os governos de Valter Soares e Paulo Constantino. No houve nem mesmo aprorrogao da permisso prevista para 1977 e 1978. A empresa criava eampliava linhas de acordo com seus interesses. Nos anos de 1981 e 1982, nogoverno de Benedito Pereira do Lago, houve a renovao da permisso, mas semuma concorrncia pblica e, conseqentemente, a regularizao de linhas criadasanteriormente.

    No mandato de Virglio Tiezzi Jnior (1985 a 1988), a prorrogao da permisso foirealizada mais uma vez sem grandes alteraes. O prefeito Paulo Constantinoteve um segundo mandato, de 1989 a 1992, constituindo-se o ltimo perodoanalisado pela autora citada, o qual foi marcado por conflitos entre a PrefeituraMunicipal e a empresa que atuava no ramo dos transportes coletivos, j que esseempresrio, Virglio Tiezzi, demonstrou interesse em concorrer no setor, uma vezque j atuava no ramo de transporte coletivo. Ele tinha empresas de transporteintermunicipal e interestadual e tambm de transporte urbano nas cidades deAraatuba, Franca, no Estado de So Paulo, e Campo Grande, no Estado de MatoGrosso do Sul (SPERANDIO, 1992).

    Os empresrios proprietrios da Empresa de Transportes Braslia sempre atuaramvisando o lucro. Criaram e suprimiram linhas quando julgaram necessrio, as quaisforam legalizadas no momento da renovao da permisso, sem que houvesse ainterferncia do poder pblico, legtimo representante dos interesses dosusurios. Essa realidade comeou a ser alterada a partir de 1993, quando odecreto de 1991 entrou em vigor determinando a concorrncia pblica emigualdade de condies e a proibio da prorrogao da permisso dos servios.Ficou expresso, tambm, que poderia/deveria operar mais de uma empresa naprestao desse servio por meio da setorizao da cidade, dividindo entre elas asreas a serem servidas (SPERANDIO, 1992).

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    Por meio das consideraes feitas, possvel compreender que houve ummonoplio com relao prestao de transporte coletivo em PresidentePrudente, o que foi, de certa forma, apoiado pelo poder pblico durante a maiorparte do tempo de atuao da empresa citada, legitimando as suas aes. Ficaevidente que os usurios eram os mais prejudicados com essa omisso do poderpblico em propiciar melhores condies de deslocamento populaoprudentina, ao permitir que a empresa administrasse o transporte coletivo deacordo com os seus interesses.

    O transporte coletivo, na cidade de Presidente Prudente, foi gerenciado por essaempresa at o ano de 1993 e, a partir de 1994, passou a ser operado por duasempresas, a Transporte Coletivo Presidente Prudente (TCPP) e a Pruden Express,que permanecem at o momento como prestadoras do servio. Segundo constaextra-oficialmente, as duas empresas so de propriedade do ex-prefeito PauloConstantino. Esse fato, se confirmado, evidencia que no houve mudanas comrelao manuteno do monoplio. As linhas de transporte coletivo somam, nasduas empresas, um total de 47, sendo que a TCPP opera em 27 linhas (dentreestas, quatro so com veculos adaptados a portadores de deficincia fsica) e aPruden Express opera um total de 20 (destas, trs so com veculos adaptados).

    A freqncia de nibus (em termos de maior nmero de veculos e menorintervalo de tempo) maior nas linhas que servem o centro e as suas imediaes,enquanto h um maior intervalo de tempo entre os que circulam numa mesmalinha comparativamente quelas que compreendem trajetos mais longos entrereas perifricas e centro da cidade, chegando at a 40 ou 50 minutos. Noshorrios de pico, com maior demanda, os veculos esto sempre lotados,influenciando na qualidade do servio prestado. O preo do transporte considerado alto para essa cidade de porte mdio, sem contar que no hterminal de integrao. Muitas pessoas no podem pagar R$ 1,80 (um real eoitenta centavos), principalmente as de renda mais baixa, portanto, no acessvel a todos.

    Com relao estruturao do transporte pblico e do espao urbano dePresidente Prudente, lembramos que a expanso cafeeira a que esteve associadaa fundao da cidade, interferiu na implantao de suas vias de circulao, j queos veculos eram, em sua maior parte, individuais, como carros e charretes, sendoausente uma viso urbanstica que orientasse um plano urbano com vias maislargas que, mais tarde, pudessem ser mais apropriadas para o trfego, emespecial ao de nibus (SPERANDIO, 1992).

    Compem a estrutura urbana9 atual de Presidente Prudente uma rea central epericentral com ruas estreitas que dificultam o trfego e, em contraposio, umgrande nmero de loteamentos em reas distantes, com a permanncia de vaziosurbanos intermedirios resultantes da especulao imobiliria, implicando namobilidade e acessibilidade da populao.

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    No que se refere ao uso das vias na cidade, h uma concorrncia entre os nibusque realizam o transporte coletivo e os veculos privados e individuais que,associados a uma estruturao viria no adequada, geram congestionamentos euma menor fluidez nos horrios de pico. Alm disso, o alto custo desse meio detransporte faz com que diversas pessoas se desloquem a p ou de bicicleta porgrandes distncias, o que se torna ainda mais dificultoso pela declividade do stiourbano.

    Alm das caractersticas do sistema virio, no h tambm na cidade um sistemade transporte coletivo integrado que facilite a acessibilidade da populao. Nestesentido, o poder pblico tem que atuar com o intuito de possibilitar uma melhorintegrao entre as diversas reas da cidade, por meio do transporte pblico eoferecer melhores condies para a populao de menor renda, que geralmentese encontra distante das reas melhores servidas com equipamentos de usocoletivo, de comrcio e servios etc. No caso de Presidente Prudente, os setoresnorte e leste abrigam um grande contingente populacional de baixa renda e, nosetor sul, esse fato pouco ocorre, porque a ocupao feita pelo segmento demaior poder aquisitivo.

    Apesar das diferenas de escala, de pases, de contexto histrico, das camadassociais, do nmero de habitantes etc, as cidades capitalistas esto cada vez maisse estruturando para o uso do automvel em contraposio ao transportecoletivo, que tem seu custo cada vez mais alto, e, com isso, a diferenciaosocioespacial amplia-se em funo das dificuldades de acessibilidade, como jdito, principalmente para os segmentos de menor poder aquisitivo. Assim,entendemos que a anlise da mobilidade fator primordial para a compreensode como ocorre o direito cidade.

    A princpio, mister e necessria uma inter-relao entre planejamento urbano,ordenao dos meios de transportes pblicos e circulao dos transportesprivados, de modo que as pessoas que residem em reas mais afastadas nosejam to prejudicadas em seus direitos de ir e vir nas cidades, que esto cada vezmais caracterizadas pela diferenciao socioespacial. Faz-se necessria a aoconjunta dos agentes envolvidos nessas questes: o poder pblico, o poderprivado e a populao.

    A seguir, a anlise se dar entendendo a cidade como lcus do automvel privadoe individual que cada vez mais se beneficia dos espaos urbanos em contraposioao transporte pblico e coletivo.

    A Cidade do automvel

    A predominncia do automvel no espao urbano destacada a seguir por sereste considerado um meio de deslocamento flexvel e mais veloz em comparaos condies de transporte coletivo. O fato traz graves implicaes, j que h umadisputa pelos espaos de circulao por esse meio de transporte, gerando

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    congestionamentos, aumento da poluio, necessidades de novas reas paraestacionamento e o uso bastante diferenciado, j que muitos o utilizamindividualmente, enquanto o transporte coletivo pode atender a um nmero maissignificativo de pessoas.

    A maioria das idias que se seguem esto baseadas em referncias bibliogrficaseuropias, mas elas retratam o que acontece em outras realidades sobre ainfluncia do automvel no espao urbano. Barcelona ser novamente citada,mas no realizamos uma anlise sobre a realidade brasileira ou prudentina, pois oobjetivo aqui fazer a apresentao das idias que justificam o item, ou seja, acidade como lcus do automvel para, posteriormente, abordamos osdeslocamentos e os meios de transporte utilizados por nossos entrevistados.

    Tras la II Guerra Mundial el paradigma de ciudad industrialest completamente afianzado en los pases desarrollados,potenciado desde diversos terrenos: en el econmico, por laevolucin del modo de produccin industrial hacia procesosfordistas; en el transporte, por la consolidacin del transporteprivado como medio de transporte hegemnico, y en elterreno del pensamiento urbano, con la puesta en prctica delas ideas del pensamiento funcionalista en la planificacinurbanstica de las ciudades (GUERRERO, 2003, p. 14).

    Na Espanha, o automvel foi sendo cada vez mais utilizado e, nos anos de 1960,teve seu uso ainda mais elevado em funo da diminuio dos custos defabricao e pelo fato de propiciar flexibilidade, privacidade e velocidade. Emoutras palavras, pde-se verificar que ocorreu, de fato, um aumento namobilidade, multiplicando a intensidade e o nmero de fluxos obrigatrios dosindivduos nos espaos urbanos (GUERREIRO, 2003).

    Como j citado, a renda determinante para a escolha do tipo de transporte a serutilizado, sendo que os segmentos de menor poder aquisitivo levaro sempre emconta esses custos no seu oramento mensal, enquanto os de maior poderaquisitivo podem optar pela comodidade e flexibilidade dos meios de circulaoprivados e individuais.

    Nesse sentido, a cidade vai sendo cada vez mais lcus da circulao realizada pormeios de transporte privados e individuais que competem nas vias com os meiosde transporte coletivo, sendo progressivamente adaptada para o uso daqueles emdetrimento destes. necessrio propiciar o uso coletivo dos espaos urbanos e,com isso, possibilitar uma circulao mais fluida, melhorando o trfego, oscongestionamentos e a qualidade do ar (por meio da diminuio da quantidadede monxido de carbono emitido), privilegiando-se, inclusive, os pedestres.

    Para isso importante que haja a implementao de medidas que regulem o usodo solo urbano e promovam a acessibilidade dos citadinos cidade enquantoconjunto. Alm disso, preciso atrair os usurios para a utilizao do transporte

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    coletivo. Para Guerrero a [...] medida ms efectiva para cambiar la tendncia deincremento de uso del automvil el ahorro en los tiempos de viaje de lostransportes pblicos (2003, p. 38).

    Em funo dos problemas no oferecimento de transporte pblico, precisoconsiderar a oferta e a demanda, de modo que haja uma eficcia, uma melhoria,para que de fato os usurios sejam contemplados com um meio de deslocamentoeficiente.

    Dado que la demanda no es constante a lo largo del tiempo,sino que tiene puntas, si se quiere evitar la congestin, lacapacidad del sistema tiene que adecuarse al mximo de lademanda. Este es el panorama que tenemos que contemplar:los mnimos de capacidad tienen que ser suficientes paraabsorber el mximo de demanda. El problema seria trivial silas diferencias entre mximos y mnimos de capacidad deoferta y entre las de demanda fueran insignificantes; elproblema es grave porque ocurre todo lo contrario. Laconsecuencia es una infraestructura infrautilizada durante 16horas al da, acompaada de una deficiencia de capacidaddurante 8 horas diarias que representan los mximos dedemanda. Es decir, congestin acompaada de una utilizacinantieconmica de la infraestructura (LORCA, 1971, p. 28).

    Essa situao observada em muitas cidades com veculos de transporte coletivosuper lotados nos horrios de maior utilizao, quando deveria haver uma maioroferta que atendesse essa demanda. Por outro lado, nestes mesmos perodos dodia observa-se o maior nmero de carros nas vias, sendo que a maior parte delestem apenas um passageiro. Assim, h o transporte individual e privado ocupandoa maior parte das reas das vias, mas, com uma densidade baixa quando severifica a relao veculos x nmero de passageiros transportados porautomveis, ocorrendo o contrrio no que concerne ao transporte coletivo.

    As longas distncias percorridas em transporte pblico podem tornar-se aindamais extensas diante do tempo de espera, do tempo de viagem, da qualidade doservio oferecido, influenciando, muitas vezes, na escolha pelo automvelindividual.

    Os segmentos que possuem veculo prprio utilizam constantemente esse meiopara os deslocamentos em funes das suas atividades, mesmo que elas seencontrem a curtas distncias de sua residncia. Esses segmentos podem residirem reas mais centrais, como tambm nas reas de expanso urbana maisrecentes, caracterizadas pelos loteamentos fechados, que se encontramgeralmente afastados da malha compacta sendo que, nesse caso, a escolha darea de residncia leva em considerao a facilidade de deslocamentos por meiodo transporte prprio.

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    A escolha do automvel, por parte de quem tem possibilidadede escolher, decorre de uma avaliao racional de suasnecessidades de deslocamento, frente aos condicionanteseconmicos e de tempo, e frente ao desempenho relativo dastecnologias de transporte disponveis. Neste sentido, a visodo automvel como smbolo de status superficial: a suaescolha no decorre de um desejo natural das pessoas, masda percepo de que ele constitui um meio essencial para areproduo das classes mdias criadas pela modernizaocapitalista [...] (VASCONCELLOS, 2001, p. 38).

    Para o caso de Barcelona, Guerrero (2003) ressalta que esse fato provoca umaelevada externalidade, com a sada de setores da populao de rendas altas darea central para reas mais afastadas, e com menos densidade, dependendo doautomvel para esses deslocamentos. Segundo ele, isto gera custos para o meioambiente medida que se prioriza o transporte privado e o poder pblico temque investir constantemente no sistema virio, que, muitas vezes, no utilizadode forma coletiva mas apropriado seletivamente por segmentos da sociedade.

    El automovilista urbano slo paga una parte del coste de lainfraestructura con los impuestos. Sin embargo, hasta ahorano se ha resuelto el problema de establecer un sistemadiscriminatorio por la utilizacin de la infraestructura urbanaen horas de punta (LORCA, 1971, p. 23).

    Como soluo para os problemas de trnsito e circulao, Lorca (1971) sugere quehaja uma segregao de trfegos, separando os diferentes tipos, evitando ainterao entre eles e o congestionamento. O trfego pode ser segregado deacordo com a distncia da viagem, por meio de rondas ou cintures, se o destinofor mais exterior ao ncleo central, segregar o trfego dos pedestres por meio devias elevadas, segregao de corredores virios para transporte pblico e asegregao dos horrios de abastecimento de mercadorias nos estabelecimentoscentrais. Essas sugestes poderiam ser implementadas para as diferentesrealidades urbanas, tendo em vista a melhor mobilidade e acessibilidade dapopulao.

    Lorca (1971) ainda ressalta que, do ponto de vista individual, o automvel omeio de transporte mais caro e, se forem agregados os custos sociais, esse meiotorna-se ainda mais oneroso. Ele afirma que no quer defender com isso, que oautomvel deva desaparecer, mas que para evitar males maiores necessrio:

    [] robustecer el sistema de transportes colectivos en laciudad y racionalizar el sistema de precios para que tenganstos algo que ver con los costes de los diferentes servicios yas construir las bases que hagan posible una eleccin lgicapor parte del individuo del medio de transporte utilizado ( p.23-24).

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    A cidade cada vez mais est sendo reestruturada, levando-se em conta acirculao que tem aumentado bastante. Parte desses fluxos constituda portransporte privado, ocorrendo a apropriao desigual dos espaos da cidade poralguns segmentos que se beneficiam desse meio. Em funo do automvel, acidade sempre modificada, como destaca Fbregas (1971):

    Desde el trazado de sus calles hasta las seales reguladorasdel trfico. Desde la mentalidad de sus ciudadanos hasta lossloganspublicitarios. Desde la mano de obra empleada en laindustria automovilstica hasta los agentes de la autoridad,pasando por los programas de actuacin pblica, estnimpregnados, condicionados y colocados a servicio delautomvil (p. 37).

    Que a cidade est estruturada em funo do automvel, isso fato, mas devemosampliar nossas consideraes levando em conta o papel de agentes quepromovem esse espao para a utilizao desse meio, em contraposio ao usopelo transporte coletivo pblico. Quin crea los automviles?, quin utiliza losautomviles? y quin construye la infraestructura del tranporte?? (FBREGAS,1971, p. 38).

    Essas questes precisam permear as discusses sobre a influncia do automvelno espao urbano, j que no simplesmente um mero aumento do nmero deveculos privados, mas toda uma lgica que permeia a estruturao ereestruturao desse espao que serve ao automvel, que segrega os segmentosda populao, que propicia a concentrao de uso das infra-estruturas eequipamentos coletivos, ou seja, h que se demonstrar o papel dos agentesenvolvidos na produo e apropriao dos espaos da cidade capitalista.

    Fbregas (1971) salienta, considerando indicativos que para ele so fortesargumentos para se defender o uso do meio de transporte coletivo, que umapessoa que viaja neste tipo de transporte ocupa uma stima parte do espao queocupa a pessoa que viaja em automvel e uma pessoa que viaja em motocicletaocupa a quinta parte do espao que ocupa a pessoa que se desloca porautomvel.

    Circulando en autobuses se reducria el espacio necesario auna sptima parte. Circulando en autobuses se reducria elproblema de los aparcamientos, de los embotellamientos, dela contaminacin, etc. Circulando en motocicletas se reduce elespacio necesario destinado a trafico en una quinta parte.

    [...] los responsables de la gestin pblica en Barcelona seempean en la construccin de aparcamientos subterrneosque aplazan, pero no solucionan el problema, en las tentativasde disear un conjunto de vas rpidas a base de cambiarconstantemente las direcciones y los sentidos de marcha yatravesar la ciudad longitudinamlmente por autovas que

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    adems de romper y dividir el barrio, constituyen un peligro ymolestia para los transentes (p. 47).

    Ainda de acordo com o autor, no que diz respeito realidade europia,especificamente a espanhola, os investimentos em infra-estrutura pblica para ouso do automvel beneficiam somente 15% das famlias. No caso de Barcelona, oque se obtinha com a cobrana para a circulao no cobria os custos commanuteno e conservao das infra-estruturas. Nuevamente aparece ladesproporcin entre los que contribuyen y los poseedores de automvil privado alMunicipio y el enorme gasto pblico que se realiza ste para aqullos (p. 49-50).

    A soluo proposta por Fbregas (1971) para a realidade europia, assim como asoluo apontada por outros autores para outras realidades a mesma, ou seja,la colectivizacin de los transportes. Sin embargo, esto es imposible mientras laclase dirigente se mueva sobre cuatro ruedas (p. 51).

    preciso uma conciliao e efetividade de polticas de transporte urbano parapromover a mobilidade e a acessibilidade para/na cidade, de modo que sepriorize a circulao do transporte pblico e coletivo, possibilitando a oferta deacordo com a demanda, em contraposio presena massiva dos automveis,principalmente nas reas de concentrao de equipamentos coletivos.

    fundamental permitir-se o acesso dos segmentos de menor poder aquisitivo,que em sua maioria necessitam do transporte coletivo para se deslocar cidade.Estes se encontram cada mais segregados, no conseguindo realizar todos osdeslocamentos que gostariam, enquanto os segmentos de maior poder aquisitivoe possuidores do veculo prprio no tm sua mobilidade prejudicada.

    Os segmentos de menor poder aquisitivo j se encontram, em grande parte,distantes das reas abastecidas e melhores equipadas das cidades e precisam,pelo menos, chegar at elas sem maiores prejuzos e dificuldades.

    Lorca (1971) aponta que as moradias para esses segmentos esto:

    [...] ms alejadas de los centros de trabajo y son utilizadas porla parte de poblacin con rentas econmicas ms bajas ymatrimonios ms jvenes. Esta circunstancia hace que lamayor carga de costes de los transportes urbanos tenga queser soportada por este sector de la poblacin. Otro hecho queexpresa la situacin de esta poblacin es que es el sector queva a tener que utilizar con ms frequencia el transportepblico por carecer del privado, y si la calidad de ste sedeteriora, sus oportunidades de acceso a las distintas partes de laciudad disminuirn y, consiguientemente, lo harn susoportunidades de trabajo, entretenimiento y de compras. Laciudad est quitando la movilidad a quien ms la necesita (p. 32).

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    Portanto, os que mais necessitam dos deslocamentos no so atendidos comodeveriam, restringindo a acessibilidade desses segmentos cidade e aos bens eequipamentos de uso coletivo nela concentrados. Muitas vezes as estruturasproduzidas socialmente no so utilizadas pelo simples fato de se encontraremdistantes do local de moradia de grande parte dos citadinos e pelo fato de se terque pagar caro para se chegar at elas, restringindo os deslocamentos para arealizao de atividades como o trabalho e ensino. O possuidor do transporteprivado pode encurtar as distncias, aumentar o tempo disponvel, enquanto osusurios do transporte coletivo tm um dispndio maior de tempo em funo dasdistncias e da seletividade resultante do fato de que os espaos da cidade cadavez mais so os espaos para a circulao do automvel.

    Apresentamos, a seguir, os deslocamentos e os meios de transporte utilizadospelas pessoas entrevistadas, procurando entender a mobilidade destas no espaourbano de Presidente Prudente.

    Os deslocamentos e os meios de transporte utilizados

    Necessitamos, constantemente, nos deslocarmos para a reproduo. Tanto asatividades a se desenvolverem, como os deslocamentos, dependero de fatores,especialmente econmicos e espaciais, que podem restringir ou possibilitar adiversidade e a intensidade dos mesmos.

    Dessa forma, consideramos as reflexes que alguns autores estabelecem a partirda realidade europia, mas que se aplicam a outras realidades, para enfocar emseguida, o deslocamento dos nossos entrevistados, bem como os meios utilizadospor na realizao de diferentes atividades no espao urbano.

    Os segmentos de menor renda, muitas vezes por falta de mobilidade que gerabaixo grau de acessibilidade, no se movem pela cidade, desconhecendo muitasparcelas de seu territrio e no tendo oportunidade de apreend-la comototalidade.

    Los desplazamientos cotidianos, en relacin con el trabajo y elocio, constituyen un rasgo indiscutido de la vida actual, y elhombre moderno se desplaza ms que ninguno de suspredecesores, no slo en mbitos comerciales, sino tambinen intercambio de ideas. La evidencia ms patente de estehecho la encontramos en nuestras grandes ciudades que sonpuntos clave de industria, comercio y administracin. Y esobjetivo primordial de las autoridades municipales asegurarque las ruedas continen girando: cualquier obstruccinaporta cierto grado de desorganizacin y su subsiguienteprdida de eficacia (MACGREGOR, 1974, p. 437).

    O mesmo autor ressalta ainda, que as cidades, lcus de diversos deslocamentos,exercem influncias para alm de seus limites espaciais, e esse fato est

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    relacionado com as facilidades de transporte para os deslocamentos que serealizam.

    Macgregor (1974) retrata, por meio de um estudo de caso, os deslocamentoscotidianos em Edimburgo. Ele inicia seu estudo ressaltando que, na Gr-Bretanha,ocorreu um despovoamento dessa comarca e a cidade se tornou inspita com asrestries dos muros, o trfego e os acidentes nas rodovias, havendo com isso,perda do sentido comunitrio. Em razo desses resultados, ele apresenta algunsquestionamentos sobre a possibilidade de reorganizar a expanso suburbana parafrear os deslocamentos locais e diminuir o congestionamento no trfego dacidade, por meio da criao de assentamentos de identidades prprias, exteriores cidade. Nesse caso, as autoridades de administrao e planejamento urbanoteriam que melhorar a acessibilidade mesma.

    Guerrero (2003) salienta que a organizao territorial regida por cinco grandesprincpios, o da interao espacial, o da aglomerao, o da acessibilidade, o dahierarquia e o da competitividade. Dentre esses, o da interao espacial estariadiretamente associado aos deslocamentos e mobilidade no interior das cidades.No que se refere questo da especializao funcional de algumas delas nas reasmetropolitanas, tendo em vista os custos com moradia, seria preciso implementaras polticas de transporte para favorecer esses deslocamentos, bsicos para oexerccio da funo trabalho. Sobre Barcelona, ele ressalta que:

    En la aglomeracin central encontramos grandes variacionesentre municpios, as tenemos municpios especializados enresidencia como Badalona, Hospitalet y especialmente SantaColoma de Gramenet, frente la creciente especializacin entrabajo de Barcelona (GUERRERO, 2003, p. 57).

    H, portanto, os deslocamentos cotidianos desses municpios da reametropolitana para a cidade de Barcelona onde muitas pessoas trabalham,necessitando, por isso, de condies favorveis mobilidade, ampliando o graude acessibilidade para essas reas. O autor adverte que h uma relao entre oaumento no consumo de energia e a mobilidade por meio de transportes diantedo tipo de urbanizao das cidades, sendo que as mais compactas possibilitam areduo desse consumo. Considera tambm que os aspectos sociais, econmicos,as polticas urbansticas e as caractersticas fsicas da cidade so fundamentaispara a maior ou menor mobilidade.

    [...] podemos indicar que las variables que afectan al costecolectivo de commuting son susceptibles de actuacin poltica:tanto poltica sobre usos del suelo, como em poltica deformacin educativa, o como en potenciacin de desarrollolocal; y que, por tanto, la tendencia al aumento de laexternalidad generada por la movilidad puede ser controladatanto de manera directa ofreciendo una red efectiva e

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    integrada de transportes como de manera indirecta incidiendoen las polticas [...] (GUERRERO, 2003, p. 63-64).

    Essas variveis destacadas pelo autor com relao realidade espanhola, podeme so consideradas pelos agentes urbanos, como o poder pblico (que elabora alegislao e as polticas de planejamentos) e os atores econmicos (queinfluenciam as decises de acordo com os seus interesses, no prevalecendo osinteresses coletivos, pelos quais o poder pblico deveria zelar). Podemosentender que essa situao tambm se estabelece em outras realidades como,por exemplo, em Presidente Prudente, que possui um tecido urbano bastantediferenciado, com um grande nmero de vazios, que provoca uma expansourbana para alm da rea compacta, aumentando a especulao imobiliria einfluenciando na estruturao da periferia pobre, que carente de infra-estruturas adequadas que permitam melhores condies de vida e acessibilidade.Aqui, no h o entrelaamento entre a poltica urbana e a de transportes pblicos,fato que pode propiciar melhores condies de deslocamento e mobilidade para apopulao, predominando a estruturao viria para os automveis particulares eindividuais, o que dificulta o acesso cidade, agravado pelo aumento dos custoscom os meios de locomoo pblicos.

    preciso considerar que os deslocamentos:

    [...] so determinados por fatores sociais, polticos eeconmicos que variam no tempo e no espao, de acordo comas classes sociais, regies e pases. Por exemplo, o nvel e adiversidade do consumo de um habitante de classe mdiaeuropeu so muito diferentes do que eram no incio do sculoe so diferentes tambm dos atuais padres de consumo deum habitante da frica rural ou Brasil urbano.Conseqentemente, as suas necessidades de transporte tambmso muito diferentes e esto diretamente ligadas s condiesespecficas de cada local (VASCONCELLOS, 2001, p. 37).

    Para Vasconcellos (2001), os deslocamentos so condicionados pela ao dosindivduos, mas tambm so influenciados por caractersticas familiares, comorenda, escolaridade, idade e relaes de gnero. Nesse sentido, o autor ressaltaque, em um domiclio mononuclear, as pessoas mais jovens ou idosas estosempre dependentes das necessidades dos adultos que trabalham (questo daidade), as inativas de acordo com as necessidades dos ativos (questo econmica)e as do sexo feminino conformam-se s necessidades das pessoas do sexomasculino (questo de gnero).

    Observamos, com relao aos deslocamentos realizados pelos entrevistados emPresidente Prudente, que os moradores das reas distantes (Mapa 1), da periferiamais empobrecida, como as do Jardim Morada do Sol, do Jardim HumbertoSalvador, do Conjunto Habitacional Brasil Novo, com menor renda, deveriam ter a

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    possibilidade de se deslocarem, por meio de transporte coletivo, para a realizaodas suas atividades, fato este que no ocorre.

    Dentre eles, a trabalhadora Rosa, residente no Conjunto Habitacional Brasil Novo,utiliza o transporte coletivo diariamente para ir trabalhar e, esporadicamente,para ir casa de um familiar ou a alguma rea de lazer pblica, no realizandoestes ltimos percursos freqentemente em virtude dos custos.

    No Jardim Morada do Sol reside a dona-de-casa Irailda que, em funo da baixarenda e pequeno grau de mobilidade, no tem acesso ao conjunto da cidade dePresidente Prudente. A jovem estudante Ieide, que tambm reside nessa mesmarea, usa esse meio de deslocamento diariamente para trabalhar, tendo queservir-se de duas linhas para ir ao local de trabalho e duas para voltar suaresidncia, o que aumenta seus gastos e no permite que ela utilize essetransporte para outras atividades, dificultando, por exemplo, o seu acesso educao formal, j que no h a oferta de escolas na rea de sua residncia. OSenhor Olegrio, desempregado, residente nesse bairro, utiliza a sua bicicletapara se deslocar para as diferentes partes da cidade por no possuir recursossuficientes para o pagamento do transporte coletivo, fator que restringe odesenvolvimento de outras atividades e de freqncia reas de lazer pblicas,como por exemplo, o Parque do Povo.

    Os outros dois entrevistados da periferia pobre, apresentados a seguir, noutilizam freqentemente o transporte coletivo.

    O idoso10, Senhor Francisco, residente no Parque Jos Rota, quase no utiliza otransporte pblico11, realizando os trajetos a p ou por meio de caronas deamigos.

    A portadora de deficincia fsica Zil, residente no Jardim Humberto Salvador, nousa esse tipo de transporte principalmente pelo fato de no existir uma linha, comnibus adaptado12 para os portadores dessa deficincia, que realize o trajetoentre o local de sua moradia e o de seu trabalho. Ela tambm no pode usufruirdo servio em funo dos nibus, que fazem o percurso entre a sua residncia eoutras reas da cidade s quais ela deseje ir, no possurem este tipo deadaptao. servida somente pelo nibus convencional, o que dificulta o seuacesso cidade por meio do transporte pblico. Dessa forma, alm de ser ummeio considerado caro por ela, no h condies estruturais, nos nibus quecirculam por essa rea que permitam seu deslocamento. Fica ainda mais restrito oseu direito de ir e vir pois, na maioria das vezes, ela tem que ser conduzida em suaprpria cadeira, enfrentando os declives e aclives do stio urbano.

    Para o conjunto de entrevistados que compe a periferia pobre e distante,podemos afirmar que a renda baixa e o alto custo do transporte coletivo nopossibilitam a acessibilidade cidade, mantendo-os segregadossocioespacialmente13.

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    Ao retratarmos as reas mais prximas ao centro da cidade, no entanto,percebemos a diferena no padro de acessibilidade de alguns entrevistados queresidem nessas reas.

    A mulher trabalhadora Dona Antnia utiliza diariamente o transporte coletivopara trabalhar, no sendo prejudicada pelo fato da oferta desse servio ser maisfreqente nessa rea e tambm por realizar percursos a p em funo daproximidade em que se encontra.

    Um fato interessante, que destoa dos observados em relao aos demaisentrevistados residentes na rea central e pericentral, refere-se dona-de-casaVilma que, como a dona-de-casa residente na periferia pobre Irailda, possui umbaixo grau de mobilidade, mesmo residindo em rea de fcil deslocamento paraoutras partes da cidade. Essa quase imobilidade deve-se ao fato de que seu poderaquisitivo no propicia o desenvolvimento de atividades que estejam alm dasimediaes de sua residncia, como o contato com a vizinhana, familiares,deslocamento para levar os filhos escola e creche nas proximidades, que tambm o local onde realiza o consumo de bens e servios necessrios suasubsistncia. Para Vilma, a mobilidade est relacionada com esse tipo de consumoe, segundo ela, sua renda no permite o deslocamento em direo a outras reasda cidade. J Irailda ressalta que, se residisse mais prximo das reas centrais,teria uma mobilidade maior, mesmo que fosse somente para olhar e noconsumir bens.

    O estudante Mrcio desloca-se diariamente para trabalhar e estudar por meio detransporte coletivo, no tendo grandes dificuldades, como a estudante daperiferia pobre, pois reside mais prximo da rea central onde a freqncia dessemeio de transporte maior, alm de poder realizar percursos a p para asatividades de lazer.

    A desempregada Maria de Ftima, por residir em uma rea de fcil acessibilidade,realiza os percursos a p, no necessitando pagar o transporte coletivo, j que asua situao socioeconmica no possibilita custear esse meio de deslocamento.

    O idoso Senhor Afonso desloca-se muito a p em razo da atividade quedesenvolve para complementar sua renda. Vende bilhetes de loteria e, para ele,se no fosse a possibilidade de ir e vir a p propiciada pela rea em que reside,no poderia trabalhar com essa atividade, pois, assim como o Senhor Francisco,ele no utiliza o transporte coletivo, mesmo que para ele este seja gratuito emrazo das mesmas justificativas que esse outro senhor tambm apresentou.

    O portador de deficincia fsica Paulo tem uma mobilidade reduzida pelo fato deno conseguir deslocar-se sozinho, o que o faz dependente de um familiar. tambm o que ocorre com a portadora dessa deficincia Zil, j citadaanteriormente. A diferena entre eles est no meio de deslocamento utilizado. Elesempre conduzido por amigos em veculos particulares ou por meio detransporte pblico, como ambulncias ou peruas da Prefeitura Municipal, para a

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    realizao das atividades esportivas e atendimento mdico. Assim, tem maisacessibilidade que ela, podendo realizar atividades esportivas e de lazer,enquanto ela realiza os seus deslocamentos prioritariamente para trabalhar. Naverdade, entendemos que o que os diferencia no a situao socioecmica, masa situao espacial em que se encontram, bem como o fato dele ser contempladopor uma poltica pblica que oferece transporte coletivo para os portadores dedeficincia realizarem alguns deslocamentos e atividades, como, por exemplo, aprtica de esportes. Paulo autnomo e realiza sua funo profissional na suacasa, enquanto Zil tem que cumprir horrios em um local de trabalho pblico,fato que no permite a ela uma flexibilidade para realizao de outras atividades.O deslocamento principal para trabalhar e, para isso, no contemplada poruma poltica pblica.

    Quando o deslocamento feito por meio de veculos privados, a mobilidade maior e a acessibilidade se efetiva. Os entrevistados motorizados, com renda maiselevada e residentes em rea central ou prxima a ela, ou ainda, em loteamentosfechados, permitiram-nos verificar que a condio socioeconmica aliada ao fcildeslocamento por meio de veculo prprio possibilita a realizao de um nmeromaior de atividades e uma maior acessibilidade cidade.

    No caso da mulher trabalhadora Eliane, a mobilidade e a realizao de diferentesatividades bem semelhante da dona-de-casa Vera, justamente pelo maiorpoder aquisitivo e pela utilizao de veculo prprio. Ambas residem emloteamentos fechados.

    Essa dona-de-casa, ao contrrio das duas outras donas de casa (Irailda, daperiferia pobre, e Vilma, da rea prxima ao centro), tm uma grande mobilidadepara a realizao de diversas atividades do seu dia-a-dia, propiciada pelotransporte privado e por sua condio socioeconmica.

    A estudante Zumira que compe esse grupo, apesar de ter um dia-a-dia bastantepreenchido com atividades da sua profisso e com o seu estudo, desloca-sefacilmente, no tendo grandes dificuldades para ir e vir. Na fase de realizao deestgios exigidos pelo curso que est fazendo, tem uma agenda bastante cheia e,para poder realizar todas as suas atividades, tem sido fundamental o fato depossuir um meio de deslocamento prprio, o que facilita seu ir e vir comagilidade.

    Entrevistamos um desempregado, Eduardo, que reside em um condomniofechado, possui veculo prprio e que tambm desloca-se facilmente,basicamente para estudar e consumir bens e servios, j que outras atividadesno so realizadas em razo de sua situao econmica no momento.

    O idoso Senhor Lourival possui uma boa condio socioeconmica e um veculoprprio para realizar algumas atividades, que, segundo ele, so suficientes. Norealiza uma grande mobilidade freqentemente, mas tambm no pode sercaracterizado por uma simples imobilidade. Assim, essa menor mobilidade

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    decorrncia de sua idade e das demandas e interesses que ele julga seremnecessrios satisfazer nessa fase da vida.

    Uma outra diferena notvel entre o portador de deficincia fsica desse grupoManoel, pois, mesmo com poder aquisitivo, no o to mais elevado que o dosoutros dois portadores de deficincia fsica (Zil, da periferia pobre, e Paulo, darea prxima ao centro). Por possuir um veculo prprio adaptado, possuitambm maior mobilidade, no dependendo de algum para conduzir suacadeira. Essa condio possibilita que ele trabalhe e desfrute de atividadesesportivas e de lazer, tendo uma boa acessibilidade.

    No que diz respeito s entrevistadas que residem em cidades vizinhas Presidente Prudente, destacamos que a entrevistada Rose, residente emPirapozinho, que se desloca diariamente pra trabalhar por meio de transportepblico para Presidente Prudente, tambm tem um fcil acesso a essa cidadequando precisa de bens e servios que no encontra na sua. No h problema emresidir l pois o tempo necessrio para o deslocamento entre essas cidades tambm menor que entre alguns dos bairros de Presidente Prudente. Alm disso,essa entrevistada possui uma grande mobilidade em Presidente Prudente,freqentando-a constantemente para a realizao de atividades de lazer e visitasfamiliares, utilizando o transporte coletivo e o servio de moto-txi.

    A estudante Celina, residente em lvares Machado, desloca-se diariamente praestudar por meio de transporte coletivo para estudar, realizando basicamenteapenas esse trajeto e algumas vezes um percurso at o centro ou ao shopping dacidade para consumir algum bem. Ela no possui uma mobilidade no interior dacidade, mas possui uma mobilidade interurbana, j que o deslocamento querealiza entre a cidade de sua residncia e o local de estudos mais rpido que noespao interno de Presidente Prudente. Segundo ela h boas condies pararesidir em uma cidade pequena e, quando necessita, desloca-se facilmente para acidade maior.

    J a entrevistada Dona Marta, residente em Regente Feij, que se deslocaalgumas vezes para Presidente Prudente por meio de veculo prprio, poderia teruma mobilidade maior, mas no tem, j que vem cidade para ir a pontosespecficos, sendo que seus deslocamentos so maiores e mais freqentes nacidade de origem, onde ela, tambm como as demais, realiza a maioria doconsumo de bens e servios.

    Para esse grupo constitudo por residentes em cidades vizinhas a mobilidade e aacessibilidade que se estabelecem realizam-se na escala interurbana, salientandoque as distncias entre essas cidades e Presidente Prudente relativamentepequena14, sendo os deslocamentos realizados em tempo menorcomparativamente ao necessrio entre algumas reas da cidade.

    Os deslocamentos cotidianos da maioria da populao so para o exerccio dotrabalho e, dependendo do tamanho da cidade e da diferenciao socioespacial

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    existente, seus citadinos tm suas mobilidades afetadas j que, para as grandesdistncias, necessria a utilizao de transporte pblico que, na maioria doscasos, insuficiente e caro, restringindo o uso.

    Os segmentos de menor poder aquisitivo e que residem nas reas mais distantesprocuram outras alternativas, como o uso da bicicleta, a caminhada, ou atmesmo o pedido de carona aos que possuem veculo prprio, para que possamdeslocar-se para o trabalho e para pagamento de contas e algum consumoespordico em reas centrais, quando isso possvel. Em outros casos, aimobilidade pode predominar se no houver uma atividade obrigatria a cumprir,como o trabalho. Nestas condies, outras atividades podem at mesmodeixarem de ser realizadas, como, por exemplo, estudar, freqentar parques epraas pblicas ou simplesmente circular pelos espaos da cidade. Para muitos,utilizar-se do espao urbano e por ele circular est relacionado com o consumo debens e servios, ainda que sejam tambm importantes os tipos de circulaorelativos vida urbana, em seu sentido mais amplo, ou seja, aqueles quepropiciam a apropriao do espao urbano para a vida social e poltica.

    Diante das consideraes realizadas, apresentamos, a seguir, uma anlise sobre amobilidade dos entrevistados, com intuito de avaliar se ela facilitada oudificultada.

    Mobilidade e acessibilidade: para todos?

    Abordamos, em nossa anlise, a importncia de uma mobilidade que seja eficaz epermita a ocorrncia da acessibilidade. Essa acessibilidade deve estar associada estruturao urbana que se estabelece em diferentes contextos para que assim,haja de fato a possibilidade de exerccio do direito cidade.

    Ser que todos os citadinos possuem uma mobilidade que lhes permita aacessibilidade?

    [] Cules son los benefcios que podra ofrecer la movilidadal ser urbano? Veamos algunos de los ms importantes:

    a)La movilidad aumenta las posibilidades de trabajo; la granciudad, con sus economas de aglomeracin, ofrece alindividuo una amplia gama de trabajos, la movilidad delindividuo dentro de la ciudad ofrece la posibilidad de elegiarentre stas la ms adecuada a sus deseos y aptitudes.

    b)La movilidad va a dar ms oportunidades de acceso a loslugares de entretenimiento.

    c)Uno de los beneficios ms importantes de la movilidad es elaumento del tiempo disponible: tiempo-trabajo y tiempo-ocio.

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    Las ventajas del aumento del tiempo son claras, disminuicinde costes, aumento de produccin, etc.

    d)Aumento del espacio disponible es otra de las ventajas,espacio-trabajo, espacio-entretenimiento, espacio-escuela,etc. La movilidad da la oportunidad de poder utilizar toda esaserie de espacios (LORCA, 1971, p. 18).

    De acordo com os apontamentos destacados, podemos avaliar a importncia damobilidade para o funcionamento do sistema urbano, bem como para areproduo social, uma vez que os indivduos necessitam realizar constantesdeslocamentos para satisfazer necessidades referentes a essa reproduo.Sabemos, porm, que a efetivao dessa mobilidade nem sempre acontece deforma simples e adequada, estando relacionada com inmeras determinaespolticas, sociais e econmicas.

    No lado prtico, o processo de reproduo requer mobilidadefsica para realizar as atividades. Ele tambm implica adisponibilidade de meios de transporte, seja os meios no-motorizados e pessoais (a p, de bicicleta), seja os meiosmotorizados, pblicos ou privados. Finalmente, implica aligao fsica e temporal adequada entre os meios detransporte e os destinos desejados. Portanto, o processo dereproduo uma combinao entre meios pessoais, osistema de circulao e os destinos desejados. Isso requeruma melhor compreenso das diferenas entre uma visosimplista da mobilidade pessoal e uma viso mais abrangenteda acessibilidade (VASCONCELLOS, 2001, p. 40).

    A mobilidade, como um fim a ser obtido por um meio de transporte, varia deacordo com o meio em que ela realizada. Em alguns casos e situaes podemosnos movimentar, movermo-nos pelo espao urbano a p, para realizar algumasatividades. medida que a extenso territorial desse espao se amplia e parte dosequipamentos coletivos ainda permanece centralizada, faz-se necessrio odeslocamento por meio de transporte motorizado. Esses meios podem serpblicos e coletivos ou privados e individuais de acordo com a renda dos usurios,sendo que, a oferta, qualidade, eficincia e o tempo de deslocamento entre elessero bastante diferenciados, implicando em menor grau de acessibilidade dosque dependem do transporte coletivo.

    Nesse sentido, nem sempre a mobilidade possibilita a acessibilidade. Para que aequiparao entre mobilidade e acessibilidade ocorra necessria uma adequadapoltica de transportes atrelada ao planejamento e s polticas urbanas, de modoa favorecer a melhoria e a eficcia dos deslocamentos por meio de transportepblico coletivo, contribuindo para que o acesso aos equipamentos de usocoletivo e aos espaos para as realizaes das diferentes funes e atividades sejaadequado, o que garante essa condio principalmente para os segmentos que seutilizam desse meio e que se encontram cada vez mais afastados da rea central.

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    Vasconcellos (2001) salienta que a mobilidade, na viso tradicional, refere-semeramente ao ato de movimentar-se de acordo com condies fsicas eeconmicas. Esta viso deixa a idia incorreta de que a poltica de transportedeveria aumentar o nmero de meios de transporte, atendendo aos preceitos damodernizao capitalista, segundo os quais o tempo, como valor econmico, cada vez mais presente. J a acessibilidade entendida como a mobilidade para arealizao das necessidades para a reproduo, ou seja, no simplesmentemovimentar-se, mas chegar aos destinos desejados. Nesse sentido, com umenfoque mais amplo que o da mobilidade, ao se tratar de acessibilidade,considera-se que h uma conexo entre a oferta do sistema de circulao e aestrutura urbana, e ela refere-se ao modo como o indivduo pode usar o espaoda cidade.

    De acordo com a estruturao que se estabelece em cada espao urbano, poderhaver aumento ou reduo nos deslocamentos para a realizao de determinadasfunes segundo a localizao das atividades no interior da cidade, conforme suasreas centrais e as mais perifricas.

    La dispersin de la localizacin de trabajos y viviendas puedetericamente llevar a minimizar el tiempo (o distancia) mediode viaje pero tambin puede llegar a maximizarlodependiendo de cules sean los orgenes y destinos de losdesplazamientos. El policentrismo, a pesar de desconcentrarlos empleos y residencias a lo largo del territorio ofreceventajas de proximidad local que reducen tanto el tiempocomo la distancia de los viajes. Sin embargo, esta ventaja sediluye si la densidad de los subcentros es reducida [...](GUERRERO, 2003, p. 33-34).

    A constituio de subcentros considerada, no caso do policentrismo, como umtipo de estruturao que se faz presente em muitas cidades, tanto europiasquanto latino-americanas, e que, a nosso ver, poderia contribuir para facilitar aacessibilidade aos meios de consumo coletivo, medida que eles fossem sendodescentralizados nesses vrios ncleos urbanos, e para ampliar e melhorar aeficcia da circulao, j que os fluxos no precisariam ser todos para a reacentral. Isso no quer dizer que a mobilidade tenha que ser propiciada somentenas imediaes desses ncleos, mas a utilizao desses subcentros estariaatrelada a uma acessibilidade para a cidade como um todo, por meio de umsistema de transporte pblico eficaz e mais descentralizado, comparativamente constituio de sistemas de transporte coletivo exclusivamente radiais, cujosfluxos convergem somente para a rea central principal.

    Associado a isso poder-se-ia [...] incrementar los niveles de densidad residencial;y la adopcin de polticas de transporte que proporcionen un sistema de serviciospblicos alternativo al transporte privado [...] as como desincentivar el uso delautomvil (GUERRERO, 2003, p. 31).

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    Outra medida importante para propiciar a acessibilidade ampliar asoportunidades de uso do transporte pblico pelos segmentos carentes e que seencontram distanciados das reas melhor servidas de meios de consumo coletivo.Para Lorca (1971), seria interessante se houvesse redues das tarifas detransporte nos horrios de pico para beneficiar a classe trabalhadora que se utilizabasicamente desse meio para se deslocar. A reduo das tarifas, um maiorconforto, maior velocidade e flexibilidade fariam com que o transporte coletivofosse mais atrativo, podendo contribuir para uma menor utilizao do transporteindividual e privado, o que implicaria na melhoria do trfego, na diminuio dostempos mdios de deslocamento e na qualidade do ar.

    Sousa (2003) analisou a mobilidade e a acessibilidade dos moradores de um bairrode baixa renda que se utilizam do transporte coletivo na rea suburbana deGuarulhos, indicando que a mobilidade est vinculada a aspectossocioeconmicos e a acessibilidade est relacionada ao uso do solo e formaurbana, que se referem ao processo de funcionamento da cidade. Ele ressalta queos entrevistados utilizam o transporte coletivo para trabalhar na rea central deGuarulhos ou em So Paulo. Na cidade de So Paulo, uma pessoa que se deslocapor meio de transporte privado ocupa oito vezes o espao fsico de uma pessoaque utiliza o transporte coletivo no horrio de pico, ocorrendo uma apropriaodesigual do territrio da cidade, gerando um desequilbrio na circulao e no usodo espao urbano. Nessa cidade, houve tambm uma diminuio no uso dotransporte coletivo e um aumento no transporte individual a partir dos anos de1990, resultado da insero do transporte alternativo. O ndice de mobilidade temcado, mesmo com o aumento do transporte privado, devido ao baixoinvestimento em transporte coletivo, aumento no preo das tarifas, aumento dodesemprego e m ocupao do solo (SOUSA, 2003).

    Segundo esse autor, a mobilidade faz parte das pr-condies dodesenvolvimento poltico e cultural de um povo, pois as pessoas necessitam estarem constante movimento para realizar diferentes funes como trabalho, lazer,educao, prticas religiosas, consumo de bens e servios. A mobilidade estvinculada renda que define o tipo de transporte a ser utilizado e as diferentesacessibilidades.

    Merlin, apud Sousa (2003), fez uma distino entre as mobilidades realizadas noespao urbano, classificando-a em quatro grupos, que so:

    - mobilidade residencial: a circulao entre o local demoradia em direo a qualquer outro ponto em meio a ummesmo espao urbano. o desejo de adaptar ascaractersticas do local s necessidades familiares;

    - mobilidade ocasional: no obedece um perododeterminado. Os motivos so: profissional, lazer, visita aparentes, etc.;

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    - mobilidade semanal: est relacionada aos trabalhadores eestudantes que exercem atividades longe de suasresidncias, repetindo-se as viagens semanalmente;

    - mobilidade quotidiana: quase obrigatria. o circuito deligao dirio entre o local de moradia e os locais detrabalho e escola (SOUSA, 2003, p. 32-33).

    Sousa (2003) tambm retrata o movimento pendular como forma de mobilidadeentre moradores de reas distantes e desprovidos de condies adequadas para avida urbana, em direo s centrais, em busca de bens e equipamentos de usocoletivo.

    A acessibilidade o acesso fcil, qualidade do que acessvel. A falta deacessibilidade no transporte coletivo est associada s grandes distncias e longasviagens. O tempo o momento ou a ocasio apropriada para que um fato serealize. A pouca acessibilidade no transporte est associada ao tempo excessivode execuo de uma viagem. Trata-se da relao tempo-espao (SOUSA, 2003, p.40).

    A acessibilidade aos equipamentos de uso coletivo pode ser prejudicada se amobilidade para essas reas no for eficaz o que depender do meio detransporte utilizado.

    A mobilidade e a acessibilidade esto atreladas ao uso de meios de transporte,considerando a relao espao-tempo, e se encontram vinculadas estruturaourbana, que deve ser resultado de polticas e planejamento que direcionam o usodo solo, mas, na maior parte dos casos, como o de Presidente Prudente, resultamsobretudo das iniciativas e interesses dos agentes privados. O planejamentourbano deve priorizar os interesses coletivos e deve estar associado estruturao do sistema de transporte pblico, que proporcione a acessibilidade cidade, considerando as diferentes reas onde se localizam as atividades detrabalho, educao, sade, lazer, comrcio e servios. Quando a acessibilidadeno favorecida fortalece-se ainda mais a diferenciao socioespacial.

    Vasconcellos (2001) avalia a acessibilidade a partir da oferta de linhas detransportes pblicos para os usurios freqentes e da densidade de vias para osusurios de automveis privados, o que determina o tempo de espera e deviagem.

    Por meio dessas consideraes sobre mobilidade e acessibilidade e avaliando osdeslocamentos realizados pelos entrevistados em nosso trabalho, j descritos noitem 3, podemos inferir que:

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    A) De maneira geral, os residentes na periferia pobre (Jardim Morada do Sol,Conjunto Habitacional Brasil Novo, Parque Jos Rota e Jardim Humberto Salvador)possuem uma mobilidade reduzida, que est diretamente relacionada ao:

    - cumprimento da funo trabalho por meio de transporte pblico, como ocaso da mulher trabalhadora Rosa, da estudante Leide e da portadora dedeficincia fsica Zil; e

    - deslocamento para a realizao de algumas atividades no to freqentescomo pagamentos de contas e visitas familiares, no caso do desempregadoSenhor Olegrio, que se desloca por meio da sua bicicleta, e do idoso SenhorFrancisco, que se desloca a p para a realizao do consumo de bens eservios.

    J a dona-de-casa Irailda, possui uma quase imobilidade, em funo da norealizao de qualquer funo fora de sua residncia, da distncia em que seencontra e dos custos para se deslocar.

    Assim, para esse grupo, alm da mobilidade reduzida no h uma acessibilidade cidade.

    B) Os residentes das reas mais prximas ao centro (Jardim Paulista, Vila SantaTereza, Vila Iolanda, Jardim Itapura, Parque Furquim e Vila Malaman) possuemuma mobilidade maior, que est relacionada :

    - ida ao trabalho, por meio do transporte coletivo, para a mulher trabalhadoraDona Antnia, e para o estudante Mrcio, que tambm o utiliza paraestudar;

    - realizao de diferentes atividades e funes, pela desempregada Maria deFtima, que se desloca sempre a p; e

    - complementao da renda, pelo idoso Senhor Afonso, que tambm sedesloca a p.

    O portador de deficincia fsica Paulo tm uma mobilidade mais reduzida,deslocando-se sempre com ajuda de um familiar ou amigo para a realizao deatividades de lazer, esportivas e de outros servios. A dona-de-casa Vilma, mesmoresidindo em rea relativamente prxima central, desloca-se muito pouco.

    Nesse grupo podemos dizer que a mulher trabalhadora Dona Antnia, oestudante Mrcio e a desempregada Maria de Ftima possuem uma maiormobilidade, como tambm uma acessibilidade cidade, diante das condiessocioespaciais dos mesmos. Em contraposio a eles, o idoso Senhor Afonso,apesar de seu potencial grau de mobilidade, no tm acessibilidade em funo dasituao socioeconmica que, segundo ele, restringe seu acesso a alguns meios deconsumo coletivo. O portador de deficincia fsica Paulo tm mobilidade eacessibilidade reduzidas diante das suas condies fsicas e socioeconmicas. Uma

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    quase imobilidade a caracterstica marcante para a dona-de-casa Vilma,resultado da sua condio socioeconmica.

    C) No que diz respeito ao grupo constitudo pelos entrevistados de maior poderaquisitivo, que possuem tambm veculo prprio, podemos ressaltar que, demaneira geral, todos eles possuem mobilidade e acessibilidade cidade, sendobeneficiados pela condio socioeconmica que possuem. Destacamos que oidoso Senhor Lourival tm menor mobilidade nesse grupo em funo de circularmenos, o que ele prprio considera uma opo para a fase de vida em que seencontra, realizando os mnimos deslocamentos para as atividades que julganecessrias, como lazer, compras e outros servios. Nesse caso no a renda nema dificuldade de mobilidade que influenciam. O portador de deficincia fsica,Manoel, tm uma mobilidade e acessibilidade maior que os outros doisportadores (Zil, da periferia pobre, e Paulo da rea prxima ao centro), em razode sua condio socioeconmica que possibilita que o mesmo tenha um meio detransporte prprio e adaptado para realizar seus deslocamentos.

    D) As pessoas residentes em cidades vizinhas tm mobilidade e acessibilidadepara a cidade de Presidente Prudente sem grandes dificuldades de deslocamento.A mobilidade no interior desta maior para a entrevistada Rose, que se deslocatodos os dias para trabalhar. As trs entrevistadas se utilizam mais do espaourbano da cidade de origem, que so cidades pequenas, para o consumo de bense servios, em comparao freqncia com que realizam este tipo de atividadeem Presidente Prudente, que uma cidade mdia. A cidade de destino utilizadapor Rose para a realizao da sua atividade profissional, alm do consumo dealguns bens e de algumas reas de lazer. A estudante Celina tm como objetivoprincipal cursar a Universidade, no realizando um consumo considervel demercadorias e das reas de lazer. Marta, apesar da fcil acessibilidade por meiode transporte prprio, no consome prioritariamente em Presidente Prudente.

    Consideramos que necessria e urgente a efetivao de polticas pblicas detransporte urbano que permitam a acessibilidade dos citadinos cidade para arealizao das suas mais diferentes atividades que se encontram dispersas peloespao urbano. Sabemos que a maior determinante a diferena de renda,portanto, uma das medidas que poderia viabilizar a acessibilidade adiferenciao de tarifas de acordo com o poder aquisitivo da populao. Os demenor renda precisam receber subsdios para utilizar o meio de transportepblico, que deve ser eficiente e atender demanda existente de modo a tornar-se mais atrativo que os meios de deslocamento privados. Assim, ocorrer areduo dos inmeros problemas que so gerados com a presena massiva doautomvel.