minha vida com dragões · fosse o apoio dos meus pais, andré e viviane, quanto a minha...
TRANSCRIPT
(2)
Minha Vida com Dragões
ILUSTRAÇÃO DA CAPA: Selene H. Stern
DIAGRAMAÇÃO: Stephanie de Oliveira Santos
AUTOR(A): Stephanie de Oliveira Santos
CÓDIGO: N1400949602982
CATEGORIA(S): Literatura Nacional
IDIOMA: Português
EDIÇÃO/ANO: 2014
NÚMERO DE PAGINAS: 326
PESO: 419
TIPO DE CAPA: Capa cartão
ACABAMENTO: Brochura sem orelha
PAPEL: Offset 75g
FORMATO: 14 x 21 cm
MIOLO: Preto e branco
WWW.PERSE.COM.BR
(3)
Agradecimentos
Quando comecei a escrever, nunca pensei que esse livro teria
um final de verdade. Nunca pensei que tantas palavras sairiam em
uma folha de papel e nunca pensei que escrever fosse um
passatempo tão divertido. Criar essa história foi a maior façanha
que eu já realizei na vida e ela jamais teria se concretizado se não
fosse o apoio dos meus pais, André e Viviane, quanto a minha
criatividade infinita. Se não fossem as noites em que eu tinha que
ir cedo para cama mesmo completamente sem sono eu nunca teria
sonhado por tanto tempo acordada.
Quem me ajudou a desenvolver esse livro foram algumas
colegas da escola, Victória, Luana e Mariana. A elas sou e serei
eternamente grata, por todas as vezes que me incomodaram, ou
que me apressaram para terminar cada capítulo. Devo um
agradecimento especial a Mariana que acompanhou meu livro do
primeiro ao último capítulo, que me induziu a prosseguir, sempre
faminta por minhas histórias e importunou-me, impedindo-me de
me perder em um mar de fantasias.
Um agradecimento especial a Selene, uma pequena amiga que
atendeu minhas preces e fez a maravilhosa capa desse livro, de um
modo tão encantador que atraiu a atenção de todos aqui em casa
logo a primeira vista.
E claro, um agradecimento a minha maior inspiração. Eu não
poderia deixá-lo de fora. Sendo sempre bastante tímida, tive uns
trocentos amigos imaginários durante toda a minha vida (não tão
longa quanto faço parecer), mas se eu escrevi uma linha sequer, ele
foi minha total inspiração. Então obrigada, Garel.
(5)
Sumário Dragões ........................................................................................... 9
Perdidos Na Excursão Da Escola ................................................. 19
Faço Um Amigo Inesperado.......................................................... 25
Castigos Simples ............................................................................ 34
Uma Confusão E Tanto ................................................................. 41
Encrencas De Fim De Ano ............................................................ 55
Dragão Na Cidade ......................................................................... 70
Meu Cavalo Sabe Falar .................................................................. 79
Falando De Dragões ...................................................................... 86
Daniel ............................................................................................ 98
Uma Visita Especial .................................................................... 108
Fim Das Férias ............................................................................ 119
Piquenique ................................................................................... 128
Inimizade E Amizade .................................................................. 140
Dragão Conhecido ....................................................................... 148
Desastre ....................................................................................... 162
Guerra Declarada ......................................................................... 209
Fim De Semana ........................................................................... 231
Adeus Escola ............................................................................... 252
Eu Vou Matar Aquele Dragão ..................................................... 272
A Última Luta .............................................................................. 296
Continua ...................................................................................... 324
(7)
Este livro é dedicado ao meu pai, sem o qual nunca teria saído da tela do meu computador. Obrigada pela paciência para descobrir onde eu queria chegar e por ser o primeiro a ler meu primeiro exemplar. Sei que não foi fácil, mas nunca deixou de me apoiar por isso. Te amo muito.
(9)
Dragões
Um mundo inigualável. Lindo! Majestoso! Ou talvez apenas
diferente.
Depois de anos ouvindo-se falar que o mundo acabaria com
desastres naturais e que o ser humano estava condenado devido
ao montante de desperdício concentrado em todo o planeta, este
deu a volta por cima, contrariando nossa “ciência moderna” e...
Qualquer outra lógica existente.
A questão básica é: o mundo não está apodrecendo. Ele está
renascendo. Os Pampas sul-americanos subjugados preenchem
agora quilômetros de terras secas com sua grama verdejante e seus
morros de árvores esparsas. A Amazônia está mais viva do que
nunca, como se ninguém nunca tivesse entrado em seus rios ou
cortado suas árvores. Mais ao norte, as Tundras e os desertos
norte-americanos também parecem intocáveis, com espécies
majestosas e mais fortes, prontas para nos enfrentar novamente.
Outros continentes sofreram transformações semelhantes,
como se tivessem jogado algo na atmosfera que restaurasse tudo o
que resolvemos destruir.
Eu atribuo isso aos dragões.
É isso aí, vocês me ouviram direito. O mundo está infestado
de dragões, e tipo, infestado mesmo, como um rio é de peixes ou
uma casa de formigas. A coisa é complicada. A mitologia
responsável por cria-los atribuem-lhes poderes mágicos, mas acho
que a única mágica neles está em fazer a natureza se adaptar aos
seus estilos de vida – afinal, floresta que não conseguem guardar
seus próprios cervos e ursos não conseguiria esconder um réptil
alado maior que um tanque de guerra, conseguiria?
Ah, sim, claro. Não posso esquecer de relatar que eles são um
pouquinho “folgados”. Acho que toda a expansão natural da
biodiversidade não acompanha os seus ritmos, então eles tem que
destruir algumas cidadezinhas só pra garantir, sabem como é.
SÓ QUE NÃO DÁ PARA VIVER ASSIM, CARAMBA!
(10)
Eles parecem demônios encarnados. Não deixam nem a gente
da cidade grande em paz, isso já tá virando código vermelho em
todos os países do mundo. Será que não percebem a bagunça que
estão fazendo? Creio que se percebem, não estão muito
preocupados.
O que, é claro, me preocupa.
Eu passo por um probleminha um pouco mais complexo do
que o “povo” de cidade grande. Acontece que vivo num haras.
Não há gado para eles devorarem – e não acho que eles iam me
devorar, sabe, aquela questão de só “pele e osso” –, mas eu tenho
meus cavalos para me preocupar.
Começando do início, meu nome é Carter Rodrigues, tenho
quatorze anos e moro em Belo Horizonte, Minas Gerais. É um
lugarzinho bacana, com gente legal por todos os lados, muita
correria e blá-blá-blá. Eu não entendo de tudo isso porque acabo
passando a maior parte do meu dia na minha casa, a cinco
quilômetros de um bairro qualquer da cidade – literalmente eu
moro na estrada.
O haras, CAVALGADAS RODRIGUES é um lugar imenso
para quatro pessoas: eu, meu pai, John, minha mãe, Carla e minha
irmã mais velha, Helen. Mas ainda somos felizes lá.
É um lugar simples e confortável, um pouco difícil de localizar.
Uma cerca de madeira – que nunca ficava pintada – delimitava o
perímetro da área. Entrando pelo portão tinha uma estradinha
asfaltada com uma calçada no canto, que era rodeada de belas
bromélias que eram responsabilidades de minha mãe.
Depois de dois quilômetros essa estradinha se dividia em duas:
uma levava ao estacionamento e a outra mais para o fundo do
haras, onde a primeira coisa que se avistava era a área de lazer,
composta por um playground, duas piscinas, uma cama elástica,
diversas mesas e cadeiras de pedra e altas mangueiras.
Cercando a área de lazer tinha uma série de quartos colados
uns aos outros em forma de quadrado sem um lado e cercando
esses quartos tinha uma estradinha que levava a casa grande.
(11)
Era como uma mansão, mas não tinha tantos quartos e sim
cômodos maiores. A sala era duas ou três vezes maior que uma
sala normal de uma casa grande. Era equipada de uma televisão
enorme e dois sofás em forma de L, de cinco lugares, e diversas
poltronas, uma mesa de centro e um vaso de flores.
A cozinha era equipada com diversos eletrodomésticos, uma
bancada de mármore e armários enormes. Tinha uma mesa grande
cheia de cadeiras ao redor, para um café da manhã em conjunto.
Nos fundos da casa tinha uma sala de jogos e no segundo andar,
uma sala de vídeo.
Fora de casa, mais para o fundo tinha o estábulo, com
quatorze baias e treze cavalos da raça pampa e um árabe. E o resto
eram quilômetros de belezas naturais e mata tentando invadir
nossa casa.
Sabe aqueles dias que mudam tudo na sua vida? Bem, teve um
dia que mudou, não só a minha vida, como a de muita gente.
Lembro-me de como tomei conhecimento das abominações do
meu mundinho. Era uma manhã clara e ensolarada, depois do café
da manhã eu saí para a escola.
Como morava longe e papai geralmente estava ocupado, eu fui
pra escola a pé e sozinha. Era uma caminhada longa, mas
felizmente tinha árvores de sobra com sombra fresca. Cheguei
faltando poucos minutos para as sete e encontrei na sala de aula a
minha melhor amiga, Victória, devorando um pão de queijo.
- Oi.
- Oi. Aceita? – Ela ofereceu o pão de queijo.
- Não, valeu. Fez o para casa?
- Que para casa? – Por que era sempre assim?
- Por que você nunca faz para casa?
- Porque eu sou uma garota ocupada, tá? Agora, me passa o
dever, vai.
Sorri e entreguei os cadernos para ela, que não parecia com
muita pressa de largar sua comidinha.
- Se eu fosse você se apressava. – Lembrei e escorei na porta,
tomando um ar na cara. – É logo no primeiro horário.
(12)
Ela deu de ombros.
- Você já leu o jornal de hoje? – Ouvi-a perguntar com a boca
cheia.
- Não. – Respondi sem prestar atenção.
Meus olhos se fixaram num ponto brilhante no céu,
rodopiando no ar como uma águia procurando sua presa – não
que eu já tenha visto uma. O sol me incomodava e eu perdi uma
pergunta de Victória. Abanei uma das mãos, pedindo-a para
esperar. Havia algo de errado com aquilo. A tal sombra estava
crescendo, enquanto iniciava uma longa e lenta descida.
“Aquilo não é um pássaro.” Definitivamente não podia ser um
pássaro.
- Carter? – Minha amiga apareceu ao meu lado e olhou na
mesma direção que eu, recuando surpresa. – Não pode ser.
“Não pode ser o quê?”
Um potente rugido nos fez encolher, tapando os ouvidos. Para
quem não consegue imaginar o som, é parecido com o rugido de
um dinossauro, só que menos agudo e mais rouco. Creio que teria
admirado, se não estivesse tão aterrorizada.
Dentro da escola, os muitos alunos despreocupados em entrar
para as suas salas de aulas saíram vazados, num “salve-se quem
puder”, atropelando qualquer um na frente.
E era óbvio que eu não podia tolerar isso. Não havia muitos
pequenos ali, mas um garotinho, de uns quatro ou cinco anos
talvez estava vagando no monte daqueles covardes – só Deus sabe
fazendo o quê. Victória agarrou o meu braço, provavelmente
querendo que saíssemos da porta antes de sermos forçadas para
dentro, mas o garotinho que eu estava de olho se perdeu na
multidão e eu não o vi mais.
“Raios.”
Desci para o pátio, abrindo caminho entre os desesperados –
tarefa nada fácil – e encontrei o moleque caído com o tornozelo
torcido, perto do fim do pátio. Obviamente tinha sido atropelado,
chorava muito e segurava o pé com dor, mas ninguém se
importou – afinal, tinha um lagarto descendo dos céus.
(13)
Segurei-o nos braços o mais rápido que pude e recuei para a
área coberta, que, infelizmente não tinha proteção alguma.
Abaixei-me com o baixinho, tentando parecer o menor e mais
invisível possível, quando, a um metro do pátio, o animal pousou,
estremecendo o solo. A área ficou completamente desolada,
enquanto eu o observava com os olhos arregalados.
Ele era incomparavelmente gigante, com a cabeça com chifres
curtos e um focinho pequeno – se é que se podia chamar aquilo
de pequeno. Fumaça saía de suas narinas, como o vapor de um
trem, deixando o ar com um cheiro estranho de ozônio e areia.
Seus olhos pequenos sondavam, com bastante curiosidade, o
lugar, deixando-me aflita e com o corpo tenso.
Seu corpo era forte, coberto por uma armadura de brilhantes
escamas azuis safiras. Um par de asas longas foram dobradas
cuidadosamente sobre o seu dorso, mas ainda destacavam-se
reluzido ao sol da manhã.
Por fim vinha sua cauda poderosa, arrastando-se no chão de
um lado para o outro, como se ele estivesse ansioso. Suas garras
perfuraram o solo quando suas asas voltaram a se erguer,
arqueando o seu corpo para novamente subir aos céus... E o
garoto gritou apavorado.
Tapei sua boca, assustada, xingando-o em silêncio, mas ele já
tinha nos visto. Seu longo pescoço desceu e o animal olhou-me
cara a cara. O garotinho quase enlouqueceu em meus braços, por
isso eu o apertei contra o peito, forçando minha mão em sua
boca.
“Um dragão.” Eu estava quase tendo um ataque histérico
também.
“Não se mova.” Ordenei a mim mesma e até meu coração
parou por um momento. Esperando.
O animal abriu levemente a boca, revelando-nos sua dentadura
potente e branca, que parecia cortar só de olhar. Minha respiração
cessou e eu desvendei um sorriso em seu focinho – sim, ele sorriu
para mim –, antes de levantar a cabeça e voltar voando aos céus,
devastando o cimento do pátio.
(14)
Vários minutos se passaram até que meus batimentos e minha
respiração se regulassem, ajustando meus pensamentos que
acordaram o cérebro.
“Agora pode se mover, idiota.”
Quando o fiz, notei que meus músculos doíam devido a tensão
e que eu ainda esmagava o garoto trêmulo e assustado. Respirei
fundo, forçando-me a soltá-lo e olhei em volta. O ambiente estava
num silêncio sepulcral, ninguém tinha saído ainda, então levantei-
me e me perguntei se conseguiria andar.
- Vamos?
Como ele não se moveu, tive que carregar o moleque,
sentindo-me estranhamente vulnerável, sozinha naquele pátio.
Apressando-me, voltei para a sala, onde encontrei todos na janela,
observando a tudo. Seus olhares voltaram-se para mim,
acusadores.
Não reparei, apenas pus o garoto na cadeira e apoiei-me na
mesa, tendo a impressão de que poderia desmaiar.
- Carter? – Victória deu um passo a frente, tocando minhas
costas preocupada. Será que todos evidenciaram o quão perto eu
cheguei daquele animal?
- Me diga que aquilo não é o que penso que é?
Céus, um dragão?! Eu queria pensar que fui a única que viu o
que vi, mas isso estava longe da verdade. Esse meu primeiro
encontro com um dragão deixou-me tão abismada, que agora eu
me perguntava o que era fantasia e o que era real.
- Muito bem... Sentem-se. – A voz da professora estremeceu,
enquanto ela se direcionava a sua mesa.
Os outros fizeram o mesmo, exceto eu, que fui para o lugar de
Victória e ela para o de trás.
- Ninguém aqui sabia disso, não é? – Ela perguntou.
Todos ficaram em silêncio por muito tempo, até que dois ou
três alunos levantaram timidamente as mãos. Apenas Victória
falou:
(15)
- Eles também apareceram no Norte e na Europa. – A maioria
voltou-se para ela, mas eu ainda encarava a mesa, como se fosse
mais interessante. – Só a Oceania não teve contato com eles.
- Ainda. – A professora completou. – Um... Desses apareceu
na Avenida Amazonas ontem, derrubando um prédio. Sabe-se
também de alguns desaparecimentos na região Nordeste. – Um
minuto de silêncio se fez presente. – Ainda não se sabe contra o
quê estamos lidando.
- Dragões. – Minha voz ecoou pela sala silenciosa.
- Dragões não existem. – Um dos garotos falou, apertando
uma folha de jornal. – Essa foi a resposta dos Estados Unidos.
Neguei com a cabeça.
- Aquilo era um dragão, não importa se querem ou não
admitir.
- Dragões são mitos, Carter. – A professora reforçou, sem
muita segurança.
Mordi o lábio inferior. É claro que era um mito. Mas esse mito
acabou de quebrar o cimento do pátio da escola.
- E... E se não forem?
Dragões eram meus monstros preferidos, tudo que divulgavam
sobre eles – fossem filmes ou livros – eu procurava me informar.
Infelizmente dragões não eram muito bem vistos pela sociedade.
Na Europa Medieval eles eram famosos por devorar gado e
pessoas e destruir reinos. Não achava que tinham mudado seus
hábitos.
Deitei a cabeça na mesa, com informações correndo na minha
mente. Uma mulher apareceu na sala, colocando a cabeça para
dentro e entrou sem permissão, abraçando o pequeno que ainda
chorava em minha mesa.
- Juca! Ah, meu Deus, você está bem!
Fomos liberados mais cedo, já que estavam todos inquietos
demais para estudar. A mãe do moleque – que estava ali para
renovar a matrícula de um atrasado – agradeceu-me tantas vezes
que eu quase me senti mal por não ter prestado atenção em
nenhuma delas.