microcrÉdito e combate À pobreza sob a …©dito-e... · autores acima citados quanto ao momento...

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MICROCRDITO E COMBATE POBREZA SOB A PERSPECTIVA

DE ORGANISMOS INTERNACIONAIS

Antonia Celene Miguel*

RESUMO

Organismos internacionais, como o Banco Mundial e a Organizao Internacional do Trabalho OIT tm defendido a expanso do microcrdito, como alternativa de combate pobreza atravs da oferta diferenciada de crdito a partir da elaborao de programas especficos. Visto que nas atividades financeiras definidas como microfinanas, o microcrdito se destaca por significar a possibilidade de acesso ao crdito por pessoas de baixa renda que no possuem garantias para a obteno de emprstimos no sistema financeiro tradicional. Partindo do caso Brasileiro, apontamos que a forma como o microcrdito tem sido conduzido em diferentes realidades, tem relao no apenas com as diretrizes de organismos internacionais, mas com o tipo de arranjo institucional e de aes polticas voltadas para a fomentao desse setor, conforme o programa de cada governo.

PALAVRAS CHAVE: Microcrdito; Combate pobreza; Banco Mundial; OIT;

Brasil.

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*Universidade Federal de So Carlos, [email protected], Mestre em Cincias Sociais e

Doutoranda em Cincia Poltica - PPGPol.

1. INTRODUO

O microcrdito est inserido dentro das atividades que ocorrem no espao das

microfinanas. Conforme Forte (2006), as microfinanas diz respeito atividade econmica

voltada a prestao de servios financeiros (crdito, poupana, seguros, servios bancrios)

que atendem o perfil da populao de baixa renda, geralmente excludas do sistema

financeiro tradicional por no ter condies de oferecer garantia e tambm de arcar com os

custos das taxas de juros de emprstimos convencionais.

Dentro dessa proposta, o microcrdito se constitui como um tipo de crdito

direcionado ao financiamento de pequenos e micro empreendimentos formais e

informais, se diferenciando dos outros tipos de emprstimos principalmente pela

metodologia aplicada, bem diferente daquela utilizada nas operaes de crdito

tradicionais. Como afirma Ledgerwood citado por Lima:

As instituies de microfinanas - IMFs, de uma maneira geral, e, em especial as que realizam microcrdito, possuem como objetivos: (a) a reduo da pobreza; (b) o fortalecimento de grupos minoritrios, como o de mulheres pobres; (c) a criao de empregos; (d) a ajuda aos pequenos empreendedores a fortalecer seu negcio ou mesmo diversificar suas atividades; e (e) o estmulo ao desenvolvimento de novos pequenos negcios. (LEDGERWOOD, 1999, apud LIMA, 2004, p. 33).

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Dessa maneira, o microcrdito diferencia-se do crdito tradicional quanto ao

pblico alvo, a finalidade, o montante e o valor dos juros. Sua finalidade de aplicao

pode ser destinada ao capital de giro ou capital fixo dos pequenos empreendedores, o

montante do crdito ser sempre pequeno e com juros no apenas baixos, mas

adequados s condies dos tomadores desse tipo de emprstimo.

Nas ltimas dcadas o microcrdito passou a ser visto como estratgia

importante de combate pobreza, visto que a impossibilidade das camadas mais

pobres em adquirir emprstimos passou a ser considerado um importante implicador

da excluso econmica em todo mundo. Adquirindo assim, um papel social num

cenrio pela busca de alternativas para o combate da pobreza a partir do acesso ao

crdito, ganhando destaque nas diretrizes do Banco Mundial, Organizao

Internacional do Trabalho - OIT e nas aes dos governos de diversos pases.

2. MICROCRDITO: ORIGENS E CENTRALIDADE COMO ALTERNATIVA DE

COMBATE A POBREZA

Diversas experincias espalhadas pelo mundo so citadas como as origens

do microcrdito, as primeiras prticas datam do sculo XVIII e XIX. Uma dessas

experincias da Associao do Po criada pelo pastor Raiffeinsen em 1845 na

Alemanha, cuja finalidade era assistir os agricultores que se encontravam endividados

aps passarem por dificuldades devido a um inverno intenso. A associao acabou se

transformando numa cooperativa de crdito. (SINGER, 2002 apud COSTA, 2006). Em

1900, na cidade de Quebec no Canad, Alphonse Desjardins criou uma caixa de

poupana popular em que os participantes depositavam suas economias e utilizavam

o microcrdito para fomentar os seus negcios, surgindo assim, o Caisse Populaire

de Lvis. (BIJOS, 2004). Em Chicago nos EUA em 1953, foram criados os fundos de

ajuda por Walter Krump, presidente de uma metalrgica, com o objetivo de auxiliar os

associados da entidade de metalrgicos. Os fundos evoluram e se transformaram em

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Ligas de Crdito que se tornaram depois Federao das Ligas de Crdito, operando

hoje em diversos pases do mundo. (MICK, 2003).

Mas entre as inmeras experincias de microcrdito que foram surgindo,

uma determinada iniciativa contribuiu para consolidar e difundir mundialmente esse

tipo de crdito, o Grameen Bank criado em 1976 em Bangladesch por iniciativa de

Muhammad Yunus. Inspiradas no modelo de Bangladesh sugiram diversas

experincias em mais de 60 pases, dando origem ao movimento de microfinanas, o

qual culminou com a realizao da primeira Conferncia Global de Microcrdito

(Microcredit Summit) em 1997. O evento contou a participao de representantes de

organizaes governamentais, agncias de desenvolvimento, ONGS e instituies

financeiras oriundas de 137 pases do mundo. Nesse evento definiu-se como meta a

ser atingida at o ano de 2005, a concesso de crdito para um nmero estimado em

100 milhes de famlias pobres, principalmente s mulheres. (OIT, 2002 apud

FARRANHA, 2005, p.63).

Com base nessa expanso de prticas de microcrdito, essa Conferncia

considerou que a importncia do papel desse tipo de crdito no combate pobreza

consiste principalmente nos seguintes fatores:

a) os mais pobres so um bom risco; b) possvel implementar programas sustentveis nos pases em desenvolvimento; c) os modelos de microcrdito podem ser facilmente replicados em outros pases; d) os programas se ampliam para atender s necessidades de um nmero elevado de pessoas muito pobres; e) programas de microcrdito ajudam os pobres a sair da misria; f) programas de microcrdito estimulam a poupana e a acumulao de ativos; g) programas de microcrdito estimulam um amplo leque de progressos sociais. (OIT, 2002 apud FARRANHA, 2005, p. 63).

Conclui-se assim que os programas de microfinanas podem ser uma

ferramenta poderosa contra a pobreza, como j foi demonstrado em vrias situaes.

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Estima-se que neste momento eles atinjam aproximadamente 8 milhes de pessoas

muito pobres nos pases em desenvolvimento (OIT, 2005, p. 40).

Assim no mbito das microfinanas, o microcrdito tem explicitado numa

dimenso global, a questo do acesso aos recursos econmicos como forma de

reduzir os efeitos da pobreza. O microcrdito tornou-se atualmente uma tendncia

em nvel mundial, sendo visto no apenas como uma forma de crdito mais acessvel,

mas uma forma possvel de incluso econmica e social atravs das finanas.

Como argumenta Costa (2006, p. 172):

O microcrdito constitui-se hoje em uma nova tendncia mundial. (...) esse movimento de tal magnitude que chega a configurar, na opinio de alguns tericos, uma poltica de desenvolvimento, abrangendo questes de natureza social, econmica, legal, financeira e institucional, possibilitando o acesso ao crdito trabalhadores de baixa renda, sem as exigncias e burocracias do sistema financeiro convencional, que terminam excluindo-os do processo. Apesar de ser um crdito pequeno, em virtude das caractersticas dos tomadores, a idia do microcrdito bem mais abrangente, e pode vir a ser uma ferramenta para a transformao da pessoa, das suas relaes e de sua comunidade.

De forma geral, boa parte da populao atendida hoje pelo microcrdito no

se encontra apenas sem uma alternativa de renda, mas excluda dos servios do

sistema bancrio tradicional, principalmente sem acesso a emprstimos para

fomentao de atividades econmicas, visto que as grandes instituies financeiras

no teriam necessariamente interesse em emprstimos pra uma populao que no

teria como comprovar garantias de pagamento e nem condies de arcar os custos

de um emprstimo. Dessa forma, a ausncia de servios financeiros voltados para

atender parte da populao mundial passou a ser considerada como um problema

tambm de excluso social.

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A ONU declarou o ano de 2005 como o Ano Internacional do Microcrdito,

enfatizando essa forma de crdito como essencial para colocar em prtica um dos

objetivos definidos por esta organizao como metas a serem perseguidas no sculo

XXI - Metas de Desenvolvimento do Milnio, documento elaborado em 2000 como

Declarao do Milnio - o combate pobreza. Como aponta Kraychete (2006), o

microcrdito adquiriu assim uma centralidade na agenda internacional, no que diz

respeito s iniciativas que tentam alcanar, metas consideradas ambiciosas como a

reduo da pobreza.

Seguindo nessa linha, os organismos internacionais como a OIT e o Banco

Mundial passaram a conceber o microcrdito como alternativa para favorecer a

incluso das pessoas atravs da sua insero no sistema financeiro.

2.1. MICROCRDITO E COMBATE POBREZA SOB A PERSPECTIVA DO

BANCO MUNDIAL E DA OIT

Existe uma diversidade de estudos sobre a pobreza enquanto fenmeno

que apresenta a complexidade conceitual sobre o que pode ser considerado

pobreza. Segundo Di Fiori (2008), o debate da pobreza enquanto problema traz a

tona opinies divergentes e crticas, principalmente acerca das metodologias que

se prope a mensurar a pobreza e sobre os modelos criados para combat-la.

notria a centralidade que o conceito pobreza passou a assumir desde incio dos anos 1990, sobretudo em funo de sua ampla utilizao, tanto em relatrios de organismos internacionais quanto em documentos de formulao e avaliao de polticas pblicas, principalmente de pases seguidores das recomendaes dessas agncias. (UG, 2005, p. 55).

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Todavia, mesmo no havendo assim um consenso universal, o ponto em

comum nos debates sobre a pobreza diz respeito ao carter pluridimensional do

fenmeno.

Das Necessidades Bsicas a Sen (capacidades de acesso), passando por Rowntree (abordagem privativa) e Townsend (privao relativa), o conceito iniciou com uma abordagem mais centrada na subsistncia, passando para a privao relativa e chegando s capacidades in-troduzindo a questo qualitativa. (LOPES, 2011, p. 107).

Assim, a variedade de abordagens e enfoques sobre a pobreza evoluiu de

anlises das variveis essencialmente quantitativas para valorizao das variveis

qualitativas nos estudos sobre a questo. A pobreza que os organismos

internacionais consideram que deve ser combatida, atravs de medidas como

promover o acesso ao crdito, resulta de uma viso sobre o que esses organismos e

os prprios Estados passaram a considerar como pobreza, perpassando polticas e

programas que visam tal objetivo.

No caso do Banco Mundial, segundo Kraychete:

A noo da pobreza que emerge das Organizaes da Cooperao Internacional, o Banco Mundial frente, no entanto, no presidida pelo instrumental estatstico. Suas razes esto fincadas na filosofia poltica liberal, que emerge a partir dos anos 70 no mundo anglo-americano, da qual John Rawls um formulador importante e Amartya Sen pontua como destacado articulador de proposies que orientam as polticas dessas organizaes. A linha analtica da filosofia poltica liberal tem como seu principal fundamento a defesa da inviolabilidade da liberdade dos indivduos baseada na justia. A pequena divergncia entre os autores acima citados quanto ao momento em que a liberdade deve ser assegurada, no fere o principio da inviolabilidade da liberdade. (KRAYCHETE, 2005, p. 208).

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Em termos de elaborao das polticas que visam reduzir a pobreza, ocorre

demarcao de uma linha de pobreza - numa definio de uma pobreza absoluta e

pobreza relativa - que distribui o conjunto subdividido entre os que so classificados

como extremamente pobres e os pobres. Esta ordenao nortear a definio das

polticas para cada um destes segmentos sociais levando em conta essa

demarcao, o Banco Mundial considera que:

A noo de pobreza absoluta comporta a demarcao de linha de indigncia e linha de pobreza. A pobreza absoluta tem por base um nvel de renda necessrio para a estrita reproduo do indivduo ou grupo familiar. Os indivduos ou grupos familiares abaixo desta linha so classificados entre os que vivem em situao de pobreza extrema. Definida a linha de indigncia, ao nvel da renda mnima necessria reproduo calrica, aplica-se um multiplicador para agregar as despesas necessrias a suprir os gastos com vesturio, aluguel e transporte para se obter a linha de pobreza. (BANCO MUNDIAL apud KRAYCHETE, 2005, p. 124).

Cabe salientar de acordo com Rodrigues e outros (1999) que a pobreza

absoluta baseia-se na noo de necessidades bsicas, estando em causa, vrias

dimenses inerentes noo de recursos (rendimentos, bens de capital, benefcios

em espcie associados ao trabalho, etc.) enquanto que a pobreza relativa remete

para a anlise da pobreza face aos padres sociais em geral. Segundo os autores,

mesmo havendo dicotomia, haveria uma relao de complementaridade e no de

antagonismo.

Logo, esperado que as aes polticas elaborem estratgias diferenciadas

de combate pobreza.

Para os indivduos que vivem em estado de pobreza absoluta, so prescritos programas especiais distribuio de alimentos, programas de bolsas para fins diversos, entre outros - que os ajudem a ultrapassar

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esta fronteira. J para os pobres que conseguiram vencer a linha de indigncia, as recomendaes recaem sobre a distribuio de ativos aliada ao funcionamento do mercado. Para atender a estes, cabe aos governos nacionais traar polticas que visem ao ingresso dos pobres nos mercados de terras e de crdito, ativos estes capazes de capitalizar os indivduos, levando-os a romper as fronteiras da pobreza. (KRAYCHETE, 2005, p. 137).

Ainda sobre a diferenciao entre os pobres e os mais pobres na

recomendao e elaborao de propostas do Banco Mundial voltadas para o combate

pobreza, Ug (2004) argumenta que na concepo desse organismo, o Estado deve

assistir o pobre incapaz de competir na busca pela sua sobrevivncia, vtima do seu

prprio fracasso individual. No sendo preocupao estatal, os indivduos que

conseguem competir em busca do seu sustento, as polticas sociais devem ser

direcionadas para os pobres.

Kraychete (2005) aponta que o intuito de formar um mercado de

microfinanas voltado para atender aos pobres que no tm acesso ao sistema

tradicional de servios financeiros das grandes instituies bancrias, elemento

importante na estratgia de reduo da pobreza atravs do mercado, e conforme a

terminologia utilizada pelas instituies da cooperao internacional, focada nos

pobres que se encontram acima da linha de indigncia.

Dessa maneira, as polticas direcionadas a partir dessa estratgia,

delimitam um pblico alvo, ou seja, entre os considerados pobres, existem aqueles,

que devem ser prioritariamente atendidos pelos programas que visam incluso

econmica atravs do acesso ao mercado de microfinanas.

Segundo Mick (2003), o apoio do Banco Mundial expanso do microcrdito

se ampara numa mudana de percepo quanto s estratgias de combate

pobreza.

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O apoio do Banco Mundial expanso do microcrdito amparou-se numa mudana de percepo quanto s estratgias de combate pobreza. O Relatrio sobre o Desenvolvimento Mundial de 1995 era reticente quanto efetividade do microcrdito, posio oposta expressa no Relatrio 2000/2001, que teve por tema Luta contra a Pobreza. Este ltimo relatrio props uma estratgia para atacar a misria em trs frentes: promover oportunidades, aumentar a autonomia e reduzir a vulnerabilidade das populaes mais pobres. O novo enfoque contrariou a lgica das propostas anteriores do Banco Mundial, concentradas na necessidade de crescimento econmico para a gerao de emprego e renda. O banco alertou para a importncia de aes governamentais no sentido de estimular a participao poltica dos pobres, eliminar barreiras discriminatrias (por sexo, raa, religio ou condio social), fortalecer as instituies sociais e coloc-las a servio dos pobres. (MICK, 2003, p. 50).

Sobre a forma com tratada o tema da pobreza no relatrio 2000 - 2001 do

Banco Mundial, Ug (2004) aponta que houve realmente uma diferena ao tratamento

dado ao tema em comparao ao relatrio apresentado em 1990. A mudana de

enfoque presente no relatrio de 2000-2001 sofreu influencia direta das ideias de

Amartya Sen (2001) sobre a pobreza. Na sua perspectiva, a pobreza trata-se da

privao de capacidades bsicas que impede a realizao do indivduo na busca por

seus objetivos. Para Amartya Sen, (2000) existe uma relao estreita entre pobreza

de rendimentos e pobreza de potencialidades.

A relao entre a pobreza como insuficincia de potencialidades e modicidade de rendimento ntima, e existe nos dois sentidos. O rendimento , sem dvida, um meio importante para as potencialidades. Estas, por sua vez, alargam a capacidade da pessoa ser mais produtiva e obter mais rendimento. Esta ligao no sentido oposto crucial para ultrapassar a pobreza. A educao bsica e os cuidados de sade, alm de melhorarem a qualidade de vida, aumentam tambm a capacidade da pessoa obter rendimentos. A mera reduo da pobreza de rendimento no pode ser a motivao ltima de uma poltica antipobreza. As questes fundacionais de base obrigam-nos a compreender a pobreza e a carncia em termos da vida que as pessoas podem levar realmente e das liberdades que realmente exercem. (SEN, 2000, p.05).

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Desta maneira, a mudana de enfoque por parte do Banco Mundial em

relao s possveis dimenses da pobreza e as estratgias para combat-la, se deve

a estratgia proposta pelo relatrio de 2000-2001, que tem como foco a expanso

das capacidades humanas das pessoas pobres. (UG, 2004, p. 59). Assim, os

pressupostos definidos pelo Banco Mundial em relao ao combate a pobreza e

outros organismos internacionais passam a considerar o chamado componente

humano juntamente com a perspectiva de desenvolvimento como liberdade, ambos

defendidos por Amartya Sen (2000).

Para Colodeti (2011) essas so duas concepes presentes na teoria do

microcrdito visto que Amartya Sen (2000) argumenta que a pobreza deve ser

concebida como resultado da ausncia de capacidades dos indivduos. Nessa

perspectiva, o microcrdito pode contribuir para promover possibilidades

econmicas como parte das liberdades instrumentais apresentadas por Sen (2000,

p.5) como: liberdades polticas; servios sociais; garantias de transparncia e

segurana protetora.

Nesse sentido, Sen argumenta que,

As liberdades polticas (sob a forma de livre expresso e eleies) ajudam a promover a segurana econmica. As oportunidades sociais (sob a forma de servios de educao e de sade) facilitam a participao econmica. Os dispositivos econmicos (sob a forma de oportunidade de participar no comrcio e na produo) podem ajudar a gerar tanto a riqueza pessoal como os recursos pblicos destinados a servios sociais. As liberdades de diferentes espcies podem reforar-se umas s outras. (SEN, 2000, p. 5).

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As possibilidades econmicas podem ser criadas atravs de polticas

pblicas distributivas, como programas de microcrdito. (MAURIEL, 2008 apud

COLODETI, 2011).

Os dispositivos econmicos respeitam as oportunidades de que os indivduos dispem para utilizar os recursos econmicos para consumo, produo ou troca. Na relao entre rendimento e riqueza, por um lado, e capacidades econmicas dos indivduos, por outro, as preocupaes distributivas tambm so importantes. (SEN, 2000, p. 12).

Assim, entende-se que, segundo tal tica, o objetivo maior fornecer

ferramentas que possibilitem a atuao das pessoas pobres no mbito do mercado.

(COLODETI, 2011, p. 143).

Esse o ponto crucial do enfoque de Sen sobre a pobreza, que traz consigo outro tipo de funo para as polticas pblicas. Estas no precisam ser redistributivas (no sentido social-democrata clssico de redistribuir propriedade/renda), mas conseguir aumentar as capacidades [dos pobres], pois o aumento de renda seria alcanado pelos esforos dos prprios indivduos no mercado. (MAURIEL, 2008 apud COLODETI, 2011, p. 144).

Sendo assim, partindo da perspectiva de que a pobreza est relacionada

dificuldade de insero no mercado, o microcrdito atravs de programas sociais

pode servir como uma ferramenta eficiente para a diminuio da pobreza. (MAURIEL,

2008 apud COLODETI, 2011). Nesse caso, para Colodeti (2011), o microcrdito pode

ser conciliado a uma perspectiva de emancipao individual, por meio da gerao de

capacidades, conforme a proposta de Amartya Sen (2001).

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Kraychete (2005, p. 204) afirma tal perspectiva ao mostrar que a constituio

do setor de microfinanas assiste a diretriz do Banco Mundial de reduzir a pobreza

atravs do mercado. Nesse contexto, o acesso ao crdito concebido como um

direito facultado ao indivduo, na condio de sujeito de crdito. Seguindo o princpio

liberal que atribui ao mercado maior eficincia na alocao de recursos, os servios

no mbito das microfinanas devem ser realizados a partir da construo de um

mercado especfico e orientados para os pobres..

Portanto, no seu aspecto institucional, a expanso do microcrdito como

alternativa vivel de incluso social atravs da insero econmica daqueles que se

encontram a margem da pobreza, est relacionada mais especificamente com as

aes do Banco Mundial como resultado de duas dcadas de articulao em conjunto

com outras organizaes, incluindo as que formam cooperao internacional a partir

dos Estados e as de carter privado, na promoo de incentivos a constituio de um

mercado de microfinanas, como parte das polticas de combate pobreza.

(KRAYCHETE, 2005).

Entretanto, embora haja convergncias em torno da idia do microcrdito

como alternativa de combate a pobreza, os organismos internacionais tentam

direcionar tal idia a aes que sejam mais condizentes com suas diretrizes. Nesse

sentido, enquanto o Banco Mundial concebe o microcrdito em relao as suas

diretrizes sobre combate a pobreza e polticas de desenvolvimento, a OIT (2005)

passou a debater o acesso ao crdito como parte da sua pauta sobre trabalho

decente, tendo em vista que as condies de trabalho, bem como a dificuldades de

insero no mercado de trabalho so problemas que no esto desassociados das

aes de combate pobreza.

A busca de solues para a superao da pobreza tem feito parte das agendas de organizaes governamentais, no-governamentais e de organismos internacionais. O conhecimento e a experincia acumulados nessa trajetria tm demonstrado que a pobreza um fenmeno que se encontra diretamente relacionado aos nveis e padres de emprego e s desigualdades existentes na sociedade. (OIT, 2005, p.03).

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Na concepo da OIT (2005) o trabalho o meio essencial para superao

da pobreza e da excluso social. Tendo em vista tal objetivo, no qualquer trabalho

que pode atender tal agenda de mudana, mas o trabalho decente, que segundo a

prpria OIT (2005, p.3), trata-se de uma ocupao produtiva adequadamente

remunerada, exercida em condies de liberdade, eqidade, segurana e que seja

capaz de garantir uma vida digna.

Efetivamente, excluso e pobreza no so equivalentes. possvel ser pobre e no excludo e, o contrrio, nem todos os excludos so pobres, embora todas as investigaes e trabalhos mostrem que existe um vasto crculo onde coincidem os pobres e excludos. (OIT, 2003, p. 20)

Segundo a OIT (2003), considerando o peso do debate internacional sobre a

excluso social, a organizao no pode ficar ausente a estre debate, bem como das

suas consequncias. Pois para OIT preocupao histrica pela justia social, pelos

direitos humanos, pela melhoria das condies de trabalho e pela extenso da

proteo social, junta-se um conjunto de esforos que se articulam em redor da ideia

do trabalho decente. (2003, p.5).

Para a OIT (2005), a excluso social se desdobra em diversas formas de

discriminao que produzem e reproduzem a pobreza. So responsveis pela

superposio de diversos tipos de vulnerabilidades e pela criao de poderosas

barreiras adicionais para que pessoas e grupos discriminados possam superar a

pobreza. (OIT, 2005, p.3).

Portanto, na perspectiva da OIT (2005, p.31), uma vez o microcrdito, visto

como recurso de integrao de empreendimentos populares ao processo de

desenvolvimento dentro de uma tica no-excludente pode desempenhar papel

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estratgico no campo das polticas de emprego e renda e de combate pobreza.

Nesse sentido, para a OIT, a oferta de crdito destinada populao em condio de

pobreza, deve contar com programas especficos e adequados a cada realidade.

Existem formas alternativas para fornecer servios de crdito aos pobres? At agora foram desenvolvidas vrias experincias, em nvel nacional e internacional, com o objetivo de tentar superar as limitaes das pessoas em situao de pobreza para obter crdito em instituies formais e para adaptar os servios financeiros s suas necessidades. Isso foi feito por meio de planos e programas de crdito. Os objetivos gerais desses programas so heterogneos, assim como suas estratgias e seus contextos institucionais. (OIT, 2005, p. 23).

Segundo a OIT (2005), nas ultimas dcadas, vrias experincias

demonstraram que o acesso ao crdito essencial para a produtividade do trabalho

em pequenas unidades de produo, que requer pouco capital. Colaborando assim,

para reduzir a pobreza e amenizando desigualdades de gnero e raa. Dessa forma,

pra OIT a falta de acesso aos recursos financeiros prejudica diversos trabalhadores

formais e informais que trabalham por conta prpria.

A falta de acesso aos recursos financeiros limita a capacidade dos pequenos agricultores, pescadores, artesos e trabalhadores autnomos da economia informal urbana para aumentar sua produtividade e sua renda. Ainda que o desenvolvimento dos recursos humanos, mediante a educao e a formao, seja crucial para a superao da pobreza, isso por si s no resulta em maior produtividade, mais renda e mais empregos para os pobres. Estes geralmente necessitam tambm de apoio financeiro para realizar suas atividades econmicas. Por outro lado, os servios de crdito para os pobres tambm podem fortalecer seu poder de negociao frente a outros grupos sociais. (OIT, 2005, p.15)

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A OIT (2005) aponta que estudos mostram como o sistema financeiro

tradicional excluem os pobres por considerar um grande risco trabalhar com tal perfil,

assim como administrar pequenos emprstimos com custos elevados. Nesse sentido,

a OIT reconhece que a maioria das pessoas de baixa renda est excluda do acesso

ao crdito porque no tem como oferecer as garantias exigidas pelas instituies

financeiras tradicionais, visto que os seus servios visam de preferencia as grandes

empresas e mdias, incluindo tambm trabalhadores assalariados formais e famlias

de classe mdia das reas urbanas.

. Alm desse cenrio institucionalmente no favorvel ao acesso dos pobres aos

servios financeiros, a OIT (2005) ainda sugere, problemas como: a enorme

burocracia desses servios, a falta de informaes adequadas sobre eles e o custo

fora da realidade da maioria da populao.

Por outro lado, os pobres consideram muito complexos, difceis e praticamente interminveis os procedimentos para uma solicitao de crdito, o que os leva auto-excluso. Outro fator que tambm incide na marginalizao desses grupos a falta de informao adequada sobre os benefcios e requisitos dos servios de crdito. Alm disso, as transaes so caras, e muitos dos servios de crdito no so adequados natureza nem s necessidades de capital das atividades microeconmicas. (OIT, 2005, p.16)

Por conseguinte, o acesso a servios bancrios vem sendo assimilado como

um direito que deve ser estendido a todos, ou seja, a insero na economia como

uma forma de poder exercer sua cidadania.

O importante garantir o acesso do pobre ao crdito, promover a sua incluso no mercado. A constituio de um mercado especfico de microfinanas resultado de um proceder a partir dos princpios da justia como eqidade. O crdito justo o crdito oportuno, que vem a tempo de potencializar as oportunidades dos pobres no mundo dos pequenos negcios. Nessa perspectiva, o crdito tomado como um dos instrumentos a ser mobilizado em favor do indivduo tomado a partir das

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ideologias que valorizam a concorrncia e o empreendedorismo. (KRAYCHETE, 2005, p. 204).

Podemos entender assim, que se trata da promoo de uma justia social na

tentativa de solucionar o que pode ser considerada uma contradio do sistema

capitalista, pois numa sociedade cuja economia essencialmente de mercado, em

que o crdito necessrio, boa parte da sua populao ao se encontrar excluda do

seu sistema financeiro est impedida no apenas do consumo, mas limitadas do

desenvolvimento de atividades consideradas produtivas na procura pela

sobrevivncia atravs do prprio mercado e da sua lgica de concorrncia e de

empreendedorismo.

2.2. MICROCRDITO, VIRTUDES E LIMITES: ENTRE O LIBERAL E O

EMANCIPATRIO

Embora, as proposies do Banco Mundial sobre o microcrdito como

alternativa de combate da pobreza siga um paradigma liberal, existe outro paradigma,

o emancipatrio, que contribui pra tencionar o debate sobre a promoo de incluso

social atravs da insero no mercado no que diz respeito ao microcrdito. No

obstante, tais paradigmas, inicialmente partem do mesmo princpio, o de que o

acesso ao crdito um direito e um caminho vivel para combater a pobreza. (MICK,

2003; KRAYCHETE, 2005).

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Conforme apontado, a perspectiva de que o microcrdito pode produzir

impacto social com efetivas possibilidades de combate pobreza, gerando trabalho e

renda para as famlias pobres, fortemente defendida por diferentes atores, sejam

por aqueles ligados a uma concepo dita mais liberal, ou aqueles que consideram o

microcrdito como um instrumento emancipatrio.

Grosso modo, a diferena entre esses dois paradigmas estar na forma como

o microcrdito deve ser conduzido. O liberal defende uma incluso social atravs do

mercado de microfinanas com foco no desenvolvimento da capacidade dos

indivduos, enquanto que o emancipatrio defende essa incluso atravs do acesso

ao microcrdito, no apenas focado nos indivduos, mas tambm no desenvolvimento

local com a fomentao de redes de solidariedade como uma alternativa ao mercado

convencional.

Considerando a presena desses dois paradigmas nas aes voltadas para a

promoo do microcrdito, a OIT (2005) avalia que mesmo as experincias dos

programas mnimos (que se limitam aos servios financeiros) produzem efeitos na

renda das pessoas atendidas, tanto quanto, nos programas que ofereceriam crdito e

algo a mais. Para a OIT (2005) o debate em torno das possibilidades de microcrdito

seja com condies de oferecer algo a mais que o prprio crdito, como alguma forma

de suporte tcnico, capacitao, ou apenas o crdito, ainda est em curso.

O debate em torno das possveis potencialidades e limitaes do microcrdito,

mostra que sua capacidade de atender uma agenda de desenvolvimento, depende da

forma como ele for utilizado. Dessa forma, podemos apontar que o microcrdito

visto em certa medida tanto na perspectiva liberal quanto na emancipatria como um

programa capaz de produzir mudanas, fornecendo aos mais pobres ferramentas que

lhes do oportunidades de desenvolverem habilidades em prol de atividades

econmicas que possam lhe garantir a sobrevivncia.

Autores de diferentes tendncias, da esquerda direita, so unnimes em reconhecer os impactos positivos desses programas, com destaque aos

19

seguintes aspectos: fortalecimento das mulheres; melhoria da renda dos menos privilegiados; real alvio da pobreza mediante a criao de emprego e renda; participao e liderana das ONG na intermediao dos recursos; uso de mecanismos regidos pelas foras do mercado. (MONZONI NETO, 2006, p.28)

Sendo assim, mesmo existindo uma diferena de concepo sobre qual o

alcance do microcrdito na diminuio da pobreza, e de como ele deve ser

empregado, seja como programa visto como compensatrios ou aqueles que

atendem uma proposta de emancipao, o microcrdito tem alcanado um consenso

como um instrumento necessrio para o combate pobreza, sobre o qual tem se

construdo uma literatura considervel em sua defesa, seja discutindo suas virtudes e

limites, seja apontando os resultados de experincias locais de acesso ao

microcrdito.

Entretanto, a forma como o microcrdito ser desenvolvido, embora possa

seguir de alguma forma, um ou outro paradigma, bem como as diretrizes de

organismos internacionais, pode ocorrer de forma diferenciada, no apenas devido as

diferentes realidades sociais e culturais, mas tambm de escolhas polticas que iro

influenciar ou definir incentivos, recursos e regulaes que podem favorecer ou no a

expanso do mercado de microcrdito/microfinanas. Conforme podemos observar no

caso brasileiro, em que este setor passou a contar com um programa governamental

especifico, uma poltica nacional de microcrdito (delimitao de marco regulatrio,

destinao de recursos financeiros e tecnolgicos, subsdios, isenes fiscais,

estmulos oferta e a demanda) como resultado das aes de dois governos, que

pensaram de acordo com as suas plataformas polticas, arranjos diferentes com o

objetivo de expandir a oferta de microcrdito no Brasil.

3. MICROCRDITO NO BRASIL: A CONSTRUO DO MERCADO DE

MICROFINANAS VIA POLTICA PBLICA

20

No Brasil o microcrdito comea com incentivos financeiros e metodologia de

redes internacionais, como a experincia desenvolvida no incio dos anos 70 pela

UNO Unio Nordestina de Assistncia a Pequenas Organizaes, que implantou a

primeira iniciativa em termos de organizao de microcrdito no Brasil. No final dos

anos 80 surgiu o Centro de Apoio aos Pequenos Empreendimentos Ana Terra

(Ceape) em Porto Alegre, ONG que contou com o apoio do BID Banco

Interamericano de Desenvolvimento e da Inter American Foundation (IAF). Em 1989 -

foi criado na Bahia, o Banco da Mulher atravs do fundo das Naes Unidas para a

infncia/UNICEF e do BID, com filiao ao Womens World Banking.

As iniciativas voltadas para este setor por parte do governo federal comeam

especificamente nos anos 90, quando o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-

2002) criou em 1995 a Comunidade Solidria. A criao da Comunidade Solidria

expressava que esse governo Cardoso pretendia conduzir a questo social atravs da

tnica de que o desenvolvimento social no seria responsabilidade exclusiva do

Estado, incentivando assim, parcerias com a sociedade civil e o setor privado como

estratgia para dinamizar as aes do Estado em diferentes segmentos. (ZOUAIN;

BARONE, 2007)

Seguindo a proposta para o qual foi criada, de incentivar novas parcerias

entre o Estado e a sociedade civil no combate a pobreza e a excluso social, a

Comunidade Solidria atravs do seu Conselho realizou em 1997 uma Rodada de

Interlocuo Poltica sobre Alternativas de Ocupao e Renda, promovendo debates e

seminrios, que resultaram na promulgao da lei 9.790 de 1999, possibilitando o

reconhecimento das organizaes sem fins lucrativos por parte do Ministrio da

Justia como Organizaes da Sociedade Civil de Interesse Pblico OSCIP, que at

ento tinham suas atividades de financiamentos aos pequenos negcios regulados

pela Leia da Usura (que limitava os juros a 12% ao ano).

21

Em seguida, em 2001 o Conselho promoveu uma nova rodada de discusso

sobre o incentivo e a expanso do microcrdito no Brasil, que resultou na edio da

Lei 10.194, que permitiu ao Conselho Monetrio Nacional criar a Sociedade de

Crdito ao Microempreendedor SCM para regulamentar a atuao do setor privado

no mbito da microfinanas.

Segundo Zouain e Barone (2007), as Rodadas de Interlocuo Poltica

promovidas pelo Conselho da Comunidade Solidria, influenciaram crucialmente as

polticas pblicas de favorecimento de acesso ao crdito. Para Monzoni Neto (2006),

o Conselho da Comunidade Solidria contribuiu no processo de institucionalizao

das atividades de microfinanas no Brasil, mediante articulaes e promoo de

debates e seminrios que resultaram em importantes medidas legislativas no setor de

microfinanas.

A Lei 9.790/99 contribui com a regulao do setor de microfinanas no pas,

favorecendo inciativas como a criao em 2001 do Programa de Apoio ao Segmento

de Microcrdito pelo SEBRAE, voltado para a criao e o fortalecimento de

organizaes de microcrdito que adotem princpios de independncia e

autosustentabilidade.

Embora, no governo Cardoso a poltica voltada para o setor de microfinanas,

tivesse como pauta o desenvolvimento do microcrdito atravs de entidades privadas

- se aproximando mais do paradigma liberal na forma de conduzir o desenvolvimento

desse setor - em certa medida recebiam incentivos do governo atravs de dois

programas coordenados pelo BNDES, o Programa de Crdito Produtivo Popular

PCPP e o PDI Programa de Desenvolvimento Institucional. (MIGUEL, 2010).

O BNDES passa a atuar neste setor atravs desses dois programas com o

objetivo de compor uma indstria de microfinanas no Brasil, atravs da oferta de

funding para os agentes responsveis pelo repasse de microcrdito. Azeredo citado

por Farranha (2011) afirma que nesse perodo h o (res) surgimento da rea social do

banco, articulando as suas estratgias para a microfinanas em consonncia com as

22

aes do Conselho da Comunidade Solidria.

Na busca pelo fortalecimento do segmento do microcrdito no mbito

nacional, o BNDES em 1997 fecha Convnio de Cooperao Tcnica no

Reembolsvel com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). No perodo do

governo Lus Incio Lula da Silva (2003-2010), o BNDES passa a ter um papel ainda

mais relevante. Em 2003, o PCPP deu lugar, ao Programa de Microcrdito (PM), que

aps dois anos de articulao intragovernamental, foi substitudo pelo Programa de

Microcrdito do BNDES (PMC), que buscou se ajustar s diretrizes estabelecidas no

Programa Nacional de Microcrdito Produtivo Orientado (PNMPO), criado no governo

Lula.

3.1 PNMPO: MICROCRDITO COMO POLTICA PBLICA DE GERAO DE

TRABALHO E RENDA

O PNMPO foi elaborado com um desenho institucional capaz de oferecer

crdito ao empreendedor considerado popular atravs de um modelo inovador de

poltica pblica, que tem sua estrutura em forma de uma rede composta por

organizaes autnomas que ingressam no programa por iniciativa prpria. O

programa coordenando diretamente pelo MTE - Ministrio do Trabalho e Emprego,

responsvel pela habilitao das organizaes de microcrdito e a difuso de

informaes sobre o microcrdito. O fornecimento de crdito voltado para a

fomentao de atividades consideradas produtivas, tendo assim, como objetivo a

gerao de trabalho e renda, utilizando uma metodologia de relacionamento direto

entre o agente de crdito e os microempreendedores populares. Tendo em foco tal

objetivo, a medida provisria n. 226 de 2004, que foi responsvel pelo inicio do

PNMPO, antes da sua institucionalizao pela lei n. 11.110 de 2005, diferenciou o

microcrdito de uso livre, geralmente voltado para o consumo e o microcrdito

produtivo orientado, direcionado necessariamente para o desenvolvimento de

atividades econmicas de microempreendedores populares.

23

De acordo com Da Costa (2010), antes da implantao do PNMPO, o total de

recursos do microcrdito de uso livre era bem maior do que o concedido como

microcrdito produtivo, tanto que em 2005, a perda de competitividade desse tipo de

microcrdito em relao ao primeiro, colaborou com a criao do respectivo programa

com o intuito tambm de estreitar a relao entre as instituies financeiras de

atuao comercial e as instituies que forneciam o microcrdito produtivo, atravs da

aquisio de carteiras e ligando outros servios financeiros concesso do

microcrdito produtivo.

O PNMPO fez parte do conjunto de medidas do governo Lula para uma

poltica de incluso financeira, que almejou atuar nas seguintes frentes: ampliao do

microcrdito produtivo urbano e rural; incluso bancria e ampliao do acesso ao

crdito pela populao de baixa renda; fortalecimento do cooperativismo de crdito.

Nesse sentido, conforme Da Costa (2010), mediante o acesso ao crdito

atravs da microfinanas e aos servios bancrios bsicos oferecidos pelo sistema

bancrio tradicional, o governo Lula, almejava viabilizar o acesso aos servios

financeiros (conta corrente, poupana, seguros, crditos) as pessoas de baixa renda,

tendo em vista a garantia de uma maior cidadania, combinada com a reduo das

taxas de juros nos financiamentos.

De acordo com Jardim (2009), o microcrdito no governo Lula fez parte de

um conjunto de projetos desenvolvidos neste perodo que mostram a aproximao

deste governo com o mercado financeiro, visando uma incluso social atravs deste

setor, levando assim as classes populares at o mercado, promovendo uma espcie

de capitalismo popular.

Com o objetivo de favorecer a incluso bancria de pessoas de baixa

renda, em 2003 foi aprovada a Lei 10.735, processo que ficou conhecido como

24

bancarizao dos pobres, tendo em vista que a bancarizao no se limita apenas a

propriedade de uma conta corrente, mas de ter acesso aos diversos servios

financeiros e ao uso desses servios (FEBRABAN, 2011). Segundo informao da

rea de desenvolvimento social do BNDES, divulgada em 2002, 70% da populao

brasileira estava excluda do sistema financeiro. Um levantamento publicado em 2011

pelo Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA) mostrou que 39,5% dos

brasileiros ainda no possuem conta bancria, o que corresponde a 53 milhes de

brasileiros sem acesso a servios bancrios bsicos. (DESAFIOS DO

DESENVOLVIMENTO, 2011).

Segundo o Ministrio da Fazenda (BRASIL, 2011), no perodo de 2003 a 2010

foram realizadas um total de 12,2 milhes de operaes de microcrdito produtivo

urbano, emprstimos num volume de R$ 13,7bilhes, resultados que segundo esse

Ministrio se mostraram satisfatrios. No que diz respeito ao PNMPO, de acordo com

os dados do Ministrio do Trabalho, desde a criao do programa em 2005 at o final

de 2010 - o ultimo ano do governo Lula - foram realizadas mais de 7,3 milhes de

operaes, que representam a concesso de um volume total de crdito acima de R$

9,5 bilhes em termos nominais. (BRASIL, 2010). Com o intuito de facilitar ainda

mais o acesso a linhas de microcrdito e garantir baixas taxas de inadimplncia, o

PNMPO permite tambm o uso da opo de garantia de aval solidrio. Esse tipo de

aval pode ser utilizado quando na reunio de um grupo (geralmente 3 a 5 pessoas)

com pequenos negcios e necessidade de crdito e que, ao mesmo tempo, as

pessoas sejam prximas e tenham confiana umas nas outras, o suficiente para cada

participante possa ao mesmo tempo receber o crdito, do qual necessita, bem como

ser o avalista dos demais. (BARONE et al. 2002). Dessa forma, o PNMPO tenta

alcanar pequenos empreendedores populares, que at ento no tinham acesso a

qualquer tipo de crdito, devido alta burocracia, exigncia de garantias do

pagamento dos emprstimos e juros inacessveis a sua condio econmica.

25

Outra medida pra facilitar a oferta de microcrdito produtivo atravs do

PNMPO a no incidncia de IOF - Imposto sobre Operaes Financeiras nas

concesses de microcrdito produtivo orientado, realizadas especificamente no

campo de ao desse programa. (PNMPO - MTE, 2009).

O governo Lula tambm articulou aes pblicas com aes de carter privado

na oferta de crdito, mas ao contrrio do governo Cardoso, nesse perodo a expanso

e o dinamismo do setor de microcrdito/microfinanas foram marcados pela entrada

dos bancos pblicos (Caixa Econmica e Banco do Brasil), assumindo assim, uma

caracterstica mais pblica, em que o Estado, se tornou o principal responsvel e

indutor desse arranjo, garantido, principalmente taxa mais acessveis de juros nos

emprstimos feitos atravs das linhas de microcrdito. (FARRANHA, 2005)

No governo Lula as aes em relao ao microcrdito no Brasil, ganharam

maior fora quando este foi atrelado tanto a idia de empreendedorismo quanto a

idia de economia solidria, ou seja, a de que o acesso ao microcrdito essencial

para incentivar e apoiar no apenas pequenos e micronegcios, mas a formao de

cooperativas de trabalho ou outras formas de associativismo, desenvolvendo assim,

atividades consideradas empreendedoras como forma de estimular o espirito

empreendedor do pblico atendido pelo setor de microfinanas. Assim, segundo

Farranha (2011), a vinculao do PNMPO com a Economia Solidria buscava

contribuir atravs das microfinanas para o desenvolvimento de uma economia

popular e desenvolvimento local. Visto que a economia solidria se constitui como

uma forma de economia popular, uma alternativa vivel de prticas econmicas aos

efeitos negativos da economia capitalista. Como afirma Singer citado por Queiroga

(2006), a expanso mundial do microcrdito em conjunto com o crescimento da

economia solidria, se tornaram alternativas consideradas mais viveis aos efeitos

perversos do sistema econmico capitalista.

Dessa forma, tais arranjos fizeram com que a poltica de microcrdito do

governo Lula, assumisse um carter hibrido. Se aproximando por um lado de uma

perspectiva considerada mais liberal em relao s polticas de incluso social e

26

combate a pobreza atravs da oferta crdito direcionada aos pobres considerados

empreendedores. E por outro, se apresentou tambm como uma proposta de carter

emancipatrio, que considera o microcrdito como capaz de construir redes

alternativas a lgica puramente de uma economia de mercado, atravs da articulao

entre as instituies de microfinanas e os projetos que visam crescimento econmico

com incluso social.

Silva (2006) considera que a entrada do poder pblico no mbito da

microfinanas tem favorecido o desenvolvimento desse setor, principalmente a partir

de aes de carter regulatrio, aes voltadas para as operaes mais diretas de

oferta de crdito e as aes que visam garantir suporte tcnico e financeiro as

operaes realizadas, assegurando assim, certa sustentabilidade ao setor. Ainda,

segundo Silva (2006), a criao do PNMPO expressa o reconhecimento do

microcrdito como poltica pblica voltada para o desenvolvimento socioeconmico,

bem como marca o papel do poder pblico como o principal fomentador do setor de

microfinanas no pas.

O PNMPO no contribuiu apenas com um marco regulatrio do setor de

microfinanas no Brasil, mas com a destinao de recursos para garantir a oferta de

microcrdito, mecanismos para manter a sustentabilidade das entidades que

oferecem esse tipo crdito e a delimitao do pblico alvo. Provocando desse modo,

tanto uma oferta de crdito dessa natureza quanto uma demanda pelos servios de

microfinanas.

Bourdieu (1997) argumenta que mesmo em graus diferentes, os mercados

so resultados de uma dupla construo, no qual o Estado contribui de forma

determinante, sendo responsvel pela constituio da demanda, mediante a produo

de disposies individuais e principalmente dos sistemas de preferncias individuais.

27

Mesmo numa economia capitalista, o mercado apenas um dos meios que a

sociedade usa para tomar decises, determinar merecimentos, alocar recursos,

manter o tecido social e conduzir as relaes humanas. (KUTTNER, 1998, p. 26).

A participao estatal teve papel decisivo no avano do setor de microfinanas no Brasil, tendo em vista que os principais programas de voltados para o microcrdito ou microfinanas no pas contam com a participao direta ou indireta do Estado. (COSTANZI, 2002, p.23).

Como sugere Carruthers (2009), as instituies tm o poder de constranger

ou estimular as atividades econmicas, possuindo a capacidade de criar um ambiente

de estabilidade e confiana para as transaes econmicas, como os investimentos

num determinado setor.

Hoje o Brasil conta com trs segmentos na oferta de microcrdito: pblico,

sociedade civil e iniciativa privada. As quais se desdobram empiricamente em

inmeras modalidades de atuao no setor de microcrdito/microfinanas.

4. CONSIDERAES FINAIS

Conforme apontamos, organismos internacionais como o Banco Mundial e a

OIT veem colaborando com a expanso do microcrdito no mundo com o proposito

de combater os efeitos da pobreza. Contudo, as diversas experincias de microcrdito

desenvolvidas em diferentes pases e regies, podem apresentar desenhos

diferenciados. No caso do Brasil, mostramos que o microcrdito vem se expandido

28

atravs de medidas governamentais, sendo atualmente estimulado atravs de um

programa de mbito nacional. Alm disso, considerando que o microcrdito tem se

expandido mundialmente, principalmente atravs de aes no governamentais e

entidades que prestam servios de microfinanas com ou sem fins lucrativos, a

experincia brasileira ganha destaque, pois o Brasil um dos poucos pases que

possuem uma poltica pblica de alcance nacional voltada para o setor de

microcrdito/microfinanas como parte dos seus programas de gerao de trabalho e

renda.

5. REFERNCIAS

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