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·1 MÉTODOS "PERT"E "CPM/~: PROBLEMAS E APLlCAÇOES GRAClANO SA "A escolha racional depende da construção de alter- nativas, das quais uma sàrnetite chega a realizar-se." - BERTRAND RUSSELL. • i.' Circunstâncias excecionais decorrentes do desenvolvimen- to tecnológico à taxa exponencial dos dias de hoje têm sido causa de embaraços novos também em áreas admi- nistrativas, sobretudo as ligadas ao planejamento e con- trôle da produção. Nesse particular faltam recursos às so- luções rotineiras de outrora, seja para atribuir às variáveis sua verdadeira natureza aleatória, seja para atacar o pro- blema de forma rigorosamente matemática, embora deter- minística. De alguns anos para cá, os métodos PERT e CPM têm sido largamente difundidos como soluções novas dos problemas contemporâneos de planejamento e contrôle da produção. O artigo em pauta focaliza a natureza específica das situa- ções às quais se aplicam PERT e CPM, indicando as severas limitações daqueles modelos na solução dos problemas que tentam aproximadamente resolver. De oito anos para cá, no glossário próprio das técnicas de planejamento e contrôle da produção duas palavras - PERT e CPM - têm aparecido em relêvo de certa forma GRACIANOSÁ - Instrutor de Ensino na Escola de Engenharia da Universidade do Rio Grande do Sul, atualmente servindo no Escritório de Pesquisa Ecortô- mica. Aplicada do Minbtério e Extraordinário para o Planejamento e Coor- denação Econômica.

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MÉTODOS "PERT"E "CPM/~:PROBLEMAS E APLlCAÇOES

GRAClANO SA

"A escolha racional depende da construção de alter-nativas, das quais uma sàrnetite chega a realizar-se."- BERTRAND RUSSELL.

• i.'

Circunstâncias excecionais decorrentes do desenvolvimen-to tecnológico à taxa exponencial dos dias de hoje têmsido causa de embaraços novos também em áreas admi-nistrativas, sobretudo as ligadas ao planejamento e con-trôle da produção. Nesse particular faltam recursos às so-luções rotineiras de outrora, seja para atribuir às variáveissua verdadeira natureza aleatória, seja para atacar o pro-blema de forma rigorosamente matemática, embora deter-minística.

De alguns anos para cá, os métodos PERT e CPM têm sidolargamente difundidos como soluções novas dos problemascontemporâneos de planejamento e contrôle da produção.O artigo em pauta focaliza a natureza específica das situa-ções às quais se aplicam PERT e CPM, indicando as severaslimitações daqueles modelos na solução dos problemas quetentam aproximadamente resolver.

De oito anos para cá, no glossário próprio das técnicas deplanejamento e contrôle da produção duas palavras -PERT e CPM - têm aparecido em relêvo de certa forma

GRACIANOSÁ - Instrutor de Ensino na Escola de Engenharia da Universidadedo Rio Grande do Sul, atualmente servindo no Escritório de Pesquisa Ecortô-mica. Aplicada do Minbtério e Extraordinário para o Planejamento e Coor-denação Econômica.

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merecido. Tenho observado, e não sem curiosidade, a pre-sença, sobretudo de PERT, mesmo em periódicos brasileiros,onde, ao que parece, perdeu encanto a divulgação pura esimples do mistério que envolve siglas tão curtas, paraceder lugar a ambiciosas modificações nos modelos corres-pondentes. Mais recentemente, e de forma inequívoca,PERT e CPM têm sido citados em textos publicitários, comoque para atestar a excelência técnica do anunciante.

Proponho-me neste artigo a conversar com o leitor sôbrePERT e CPM, avançando a idéia, sem querer polemizar, deque talvez seja melhor observar PERT como instrumentopróprio de contrôle da produção, e CPM como instrumentoespecífico de planejamento.

Por planejamento entende-se uma rotina antecipada deação. Contrôle, por sua vez, é o confronto periódico e siste-mático, do planejado com o realizado e a adoção de me-didas corretivas correspondentes. Dados fundamentaispara o planejamento da produção, portanto, são o roteirode execução, ou seja, a lista exaustiva e ordenada dasoperações necessárias à execução, os tempos de execuçãoe o montante dos recursos disponíveis à produção.' Ele-mentos pertinentes ao contrôle da produção, por sua vez,são os associados à organização burocrática do processoprodutivo ou, mais precisamente, ao sistema de informa-ções de que a gerência disponha para atuar antes - e nun-ca depois - de o fato estar consumado.

Isso pôsto, o leitor está a vê-lo, são triviais os problemasde planejamento em processos de produção altamente re-petitivos, sobretudo porque nesses casos a experiênciaacumulada favorece a reunião dos dados relevantes ne-cessários. Essa acumulação de experiências permite a esti-rr.ativa dos tempos de produção com tão pequena margemde êrro, em relação a um valor esperado, que as estimativasdeixam de ser aleatórias para assumir configuração prá-

1) Talvez fôsse desejável, também, o conhecimento específico dos lotes deprodução, mas para os fins a que S8 propõe êste contexto O" lotes 603

produção não sâc relevantes.

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tica determinística. Quer dizer, torna-se lícito afirmar "atarefa realiza-se em 5 minutos", em lugar de afirmar, comoé correto, "a tarefa realiza-se em aproximadamente 5 mi-nutos". Tempos deterrninisticamente prevalentes e proces-sos sólida porque tradicionalmente operantes concedemao planejador um estado de informação perfeita sôbre ovalor das variáveis que afetam a solução do seu problema.Daí a trivialidade dessa solução: o que se pede do plane-jador é, por erros e tentativas, ajustar recursos a tarefas,operação que êle executa normalmente, em face do grandenúmero de soluções lógicas que o problema comporta, emfunção de uma análise subjetiva do problema alimentadaprimacialmente por sua própria experiência.Se são triviais os problemas de planejamento num pro-cesso repetitivo de produção, são literalmente inexistentesos de contrôle. É evidente que parto, nesse particular, dapressuposição sadia de que a emprêsa possui adequado sis-tema de informações. Logo, uma vez resolvidos os proble-mas do que, do como, do quando e do quanto produzir, atarefa de controlar decorre de um fluxo de documentaçãoque, em princípio, nada tem que ver com o planejamentopropriamente dito, mas que só poderá funcionar bem seo planejamento tiver sido bem realizado.Problemas de planejamento e contrôle realmente apare-cem quando se procura planejar e controlar o desconhe-cido, isto é, quando um esquema de recursos deve ser apli-cado a um esquema de ação para produzir uma coisa quenão se sabe ao certo cemo será, não se tendo notícia, tam-pouco, de quanto tempo será necessário para produzi-la,nem ainda de quantos recursos deverão ser-lhe destinados.Sob essas condições, o estado que cerca o planejador é,para não dizer de ignorância, de, no mínimo. informaçãoimperfeita.

Três estimativas logo despertam atenção:• A primeira refere-se ao custo total do projeto, vinculadoque está à destinação de recursos às macrotarefas em pers-pectiva (pois, é de supor, o pormenor só pode ser macros-cópico sob condições de informação imperfeita).

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• A segunda diz respeito ao tempo total de execução doprojeto, êste dependente não só dos recursos aplicados acada macrotarefa, como também da complexidade técnicaque esteja ligada a essa macrotarefa.

• Finalmente, a terceira refere-se à excelência técnicado projeto, vinculada ao tempo e ao custo, num sem número de interdependências.

"Soluções" para o nôvo quebra-cabeça só podem ser apro-ximadas ao nível da aplicação prática, pois êsse é o estadoatual da investigação acadêmica. O primeiro ditame daprática e a primeira e violenta simplificação consistem emisolar custo, tempo e excelência técnica como variáveisindependentes, à procura, portanto, de soluções indepen-dentes. Ao nível de contrôle, as aproximações de maiorrepercussão que dizem respeito a custo e tempo são PERT/custo e PERT/tempo. Fala-se, também, de PERT/perfor-mance para atender, especificamente, aos problemas deengenharia do projeto; mas, embora conclusões de invul-gar interêsse tenham sido obtidas acadêmicamente, nadade prático foi ainda concretizado. Ao nível de planeja-mento, dizendo respeito exclusivamente à variável custo,CPM constitui solução de extraordinário valor, tanto sobo aspecto acadêmico quanto sob o prático, hipoteticamenterestringindo o muito de ignorância que cerca o projeto.

PERTe CPM são criaturas do estágio atual de notável pro-gresso tecnológico norte-americano. As inversões públicasnorte-americanas em projetos especiais de defesa e nos pro-jetos oriundos da corrida espacial são de volume assombro-so. Essas inversões têm sido canalizadas ao setor privadoda economia na forma de contratos de prestação de serviçoscom produtores que, afora razões de ordem política e so-cial, têm suficiente capacidade produtiva (ou reputaçãotécnica) para disputá-los na categoria de contratantesprincipais. Os contratantes principais, por sua vez, nagrande maioria dos casos vêem-se inabilitados para realizartodo o empreendimento e passam a subcontratar empreen-dedores menores. O leitor poderá fàcilmente verificar que,dependendo do volume do empreendimento ou de sua

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complexidade tecnológica, há uma verdadeira avalanchade subcontratos nas mais desencontradas regiões do País,sendo às dezenas e até às centenas as companhias que co-laboram na consecução de um mesmo projeto.

O único problema daí resultante é que, como os fundossão públicos, ao Govêrno resta a responsabilidade de con-trolar o emaranhamento de realizações. Sem falar no pro-blema decorrente da qualidade técnica do projeto, fazercom que as estimativas de custo e tempo inicialmente ela-boradas se coadunem com dispêndios realmente verifica-dos e com as demoras inevitáveis do processo de produçãoé tarefa realmente gigantesca. Estudo realizado em 1962sôbre contratos vinculados ao programa de defesa norte--americana 2 mostra, em média, para 12 projetos analisa-dos, dispêndios 3,2 vêzes maiores que os estimados e tem-pos 1,36 vêzes superiores aos previstos. Antes disso, emfins de 1959, um relatório da Rand Corporetioti 3 referen-te à aquisição de material para a Fôrça Aérea norte-ame-ricana indicou que de 22 projetos estudados dois apenasapresentavam dispêndios médios compatíveis com as esti-mativas. Nos 20 projetos restantes os custos haviam sidosubestimados em montantes que variavam de 20 a 5,760por cento. Somente seis projetos referentes a mísseis, porexemplo, responderam por erros de previsão de 1.760 porcento, em média. Outro estudo, também realizado em1962,4 demonstrou que desvios dessa ordem eram previs-tos para projetos em realização naquela época. Em 26 pro-jetos estudados, estimativas então correntes de dispêndiosvariavam para mais, chegando até 502 por cento das esti-mativas iniciais, com a média de desvio de 80 por cento.

2) FREDERIC SCHERER e MERTA PECK, "The Weapons Acquisition Process,Cantabrigia, Mass.: Research Graduate SchooI 01 Business Administra-tion, Urriversidade de Harvard, 1962.

3) A. W. MARSHALL e W. H. MECKLlNG, "PredicabiJity oi the Cost, andSuccess oi Development", RAND Corporation Report P 1821, dezembrode 1959, pág. 22.

4) THOMAS FINCH, "Fectors that Influence Changes in Coet and TimeSchedules oi Rerearch and Development Contrects", M. S. Thesis, MITSchooI 01 Industrial Management, junho de 1962.

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A tentativa que vem sendo feita nas principais agênciascontratantes do Govêrno dos Estados Unidos (dentre asquais as três Secretarias das Fôrças Armadas, a Comissãode Energia Atômica e a NASA)no sentido de manter maiorvigilância em relação a tempos e dispêndios contratual-mente estimados é a do emprêgo sistemático de PERT.5

PERT (Project Evaluation and Review Technique) foi ort-ginalmente concebido por D. G. MALCOMe outros numprograma de pesquisas financiado pelo Escritório de Pro-jetos Especiais da Marinha Americana por volta de 1958.';Supostamente, a técnica foi a causa fundamental do êxitodo programa Polaris, e desde então os benefícios de suaaplicação em trabalhos de pesquisa e desenvolvimento têmtido desmedida publicidade.

CPM (CriticaI Path Method), por outro lado, é resultadode estudos numa área da pesquisa operacional a que sevem dando o nome de "fluxos em gráficos", e que temrecebido divulgação, por afinidade matemática, como tó-pico aliado à programação linear. Estudos em CPM tive-ram início por volta de 1956 por J. E. KELLEY para aDu Pont ; e foram concluídos com o modêlo desenvolvidopor FORDe FULKERsoN para a Rand Corporetion.

O fato de CPMmanifestar-se como instrumento de plane-jamento e PERTcomo de contrôle parece ficar patente naspróprias designações que lhes são correspondentes. Poraliar-se a trabalhos de planejamento, CPMencontra menorcampo de aplicação que PERT,em decorrência das premis-sas que devem ser adotadas para que o mcdêlo tenha va-lidez. Em princípio, o mundo em que CPM atua é deter-minístico, e o de PERT, probabilístico. Dados para aaplicação de CPM são o roteiro de fabricação e a relaçãofuncional - para cada uma das tarefas do projeto -

5) "FERT Guide for lvlanageme·tlt Use", Pert Ccorâineting Group, U.SPrinting Oflice, 0-698-452, junho de 1963.

6) D. G. MALCOM, J. H. ROSEBOOM, C. E. CLARK e W. FAZAR, "Applioetionof a T'echnique for Reseerch and Dev eiopinent Eveluetion", OperationsResearch, .etembro.'outubro de 1959.

7) J. KELLEY e M. WALKER, "Criticel Path Plenning and Schedü'ing",Proceedings of the Eestern Joint Computer Conlerence, Bóston ; 1959.

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entre tempos e custos de execução. Em conseqüência, aaplicação de CPM parte da premissa de que se sabe comoproduzir, sendo o tempo de fabricação decorrência diretados recursos aplicados a cada tarefa. Como resultado, CPMindica, em função de um tempo de execução total para oprojeto, em face do qual o orçamento deva ser minimizado,quais os recursos (e, portanto, quais os custos) correspon-dentes a cada tarefa do empreendimento. A suposição domodêlo - como, aliás, de todos os modelos de aplicaçãoda programação linear - é que as variáveis em [ôgo severificam na prática deterministicamente, devendo, pois,tempos e custos ocorrerem tal como tiverem sido calcula-dos. O leitor percebe, portanto, que CPM se restringe naprática a projetos de pequeno porte, onde as premissasdo modêlo não tornem falaciosas as conclusões. Explicaçãomais pormenorizada de CPM torna-se incompatível, peloavanço do tratamento matemático que comporta, com otipo de exposição que venho fazendo. O leitor interessadopoderá valer-se da literatura especializada a que faço re-ferência nas notas bibliográficas citadas nas margens infe-riores destas fôlhas, sobretudo nas de números 8 e D logoabaixo.

PERT, CPM e outras técnicas correlatas têm sido vincula-das, mesmo em periódicos brasileiros, a uma representaçãodesenhada do roteiro de ação do projeto, que, por fôrça deexpressão, tem recebido no contexto dos problemas deplanejamento e contrôle a designação de "gráfico PERT".

Trata-se de uma figuração constituída de setas e círculoscu pontos, tal como a que aparece na Figura 1. Cada setarepresenta uma ~specífica tarefa ou atividade referente aoprojeto. Cada círculo representa, por sua vez, um evento,ou seja, o término de uma ou mais tarefas. Na Figura 1deixamos explícita a natureza das tarefas e até mesmo osignificado de alguns eventos; mas, por via de regra, ba-tizam-se os eventos por números e as tarefas pelos pares

8) L. R. FORD e D. R. FULKERSON, "Flows in Netwcrks", Princetoti Uni-versity Press, 1952.

9) D. R. FULKERSON, "A Network Flow Ccmputation for Project CostCurves", ME"!1agement Science, janeiro de 1961.

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ordenados de números correspondentes aos eventos iniciale final.

É interessante e de certo modo curioso que tanto PERTcomo CPMlancem mão dêsse gráfico de características pe-culiares como veículo comum de informação, pois, comofiz ver, duas equipes distintas trabalharam na concepçãodaqueles modelos, visando a objetivos fundamentalmentediferentes (planejamento versus contrôle) e partindo de.premissas igualmente diferentes (determinísticas num,probabilísticas noutro). A presença dêsse tipo de gráficonos meios que deram origem a CPM parece-me de certaforma natural, pois o modêlo gráfico corresponde exata-mente ao que se tinha em mente, há muito, para a repre-sentação de problemas de distribuição na área da progra-mação linear. Acredito que MALCOMe seus companheirostenham reconhecido pelo bom senso a excelência dêsse tipode representação para efeitos de arrolamento, exaustivo esistemático, dos eventos que supostamente terão lugar noprojeto, assim como de suas interdependências.

Reluto em aceitar que PERT consista na aplicação e utili-zação dêsse gráfico de setas e círculos. Talvez êsse con-ceito seja válido para CPM,onde o gráfico que se tem emmãos é lei, só faltando especificar quem ou quantos rea-lizarão esta e aquela tarefa. Mas, identificar PERT como gráfico implica na aceitação da tese, aliás sustentadapor inúmeros autores de respeito, de que PERT seria ins-trumento também de planejamento, isto é, de que suaaplicação exigiria a elaboração de um roteiro de ação quelhe fôsse, de certa forma, peculiar. Isso, todavia, não meparece verdadeiro. O que torna PERT sui generis no con-junto das técnicas aplicadas à administração da produçãoé o repetido emprêgo de inúmeras variáveis cuja finalida-de precípua é o contrôle da produção e que atraem a aten-ção da gerência do projeto para os focos de exceção, ondecustos ou tempos tendam a contrariar as estimativas ini-ciais. Quando em trabalhos de pesquisa e desenvolvimentonão se sabe bem o que deva ser feito, nem muito menosse conhecem os tempos e custos que realmente hajam de

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prevalecer no empreendimento, a maneira mais própria detornar o contrôle consentâneo com a fluidez de afirmaçõesiniciais é aumentar a freqüência com que a gerênciaobserva o processo de produção. A mim me sabe a préviaaceitação de derrota o tratamento que prevê o contrôlemaciço como solução ao problema da ignorância que acom-panha certos empreendimentos. FÍC'aimplícita no proce-dimento a impossibilidade física de a administração ante-cipar-se ao fato consumado. Administra-se a posteriori(after the fact) e o máximo que se consegue, por judiciosaincorporação da experiência adquirida ao longo do projeto,é diminuir as inevitáveis discrepâncias entre novas esti-mativas e futuras realizações.

A verdadeira essência de PERT está, precisamente, nesseaspecto. O ataque que PERT propõe à incerteza das esti-mativas presume, primeiro, a concepção de instrumentosvaliosos de equiparação e, segundo, a possibilidade físicaem empreendimentos que, ao nível microscópico de rea-lização, atingem comumente dezenas de milhares de ta-refas e eventos da realimentação e revisão das afirma-ções iniciais com a freqüência que seria de desejar. Osinstrumentos de equiparação são as variáveis que PERTintroduziu. A habilidade física para controlar freqüente-mente e a baixo custo só se tornou possível com o compu-tador eletrônico. O que PERT trouxe, portanto, ao cenarioamericano da pesquisa e do desenvolvimento foi, sobre-tudo, um fluxo nôvo de documentos originais entre con-tratantes principais, subcontratantes e agências governa-mentais de interêsse. Êsses documentos - chamados "rela-tórios PERT para custos" (ou "para tempos") - permitemque a administração de projetos muito complexos sejafeita em estrita obediência ao princípio da exceção. Mas,- e isto convém salientar - definidas as variáveis e pro-jetados os documentos (isto é, definido o sistema de in-formações relevantes no qual se estribará a gerência paraadministrar), PERT - como, aliás, qualquer sistema decontrôle - prescinde de representação gráfica específicado plano de ação. Aí está porque considero impróprio as-sociar PERT a um gráfico específico, ao invés de associar-

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-lhe, como seria certo, uma filosofia de ação da gerênciaem face da incerteza.

PERT /TEMPO

A esta altura, pretendo fazer um apanhado das principaisvariáveis que PERT introduziu para o contrôle da produção.Iniciá-Ic-ei pelas variáveis referentes a PERT /tempo. Paranão enfadar o leitor com abstrações omitirei as restriçõesque devem ser impostas na representação gráfica do pro-jeto para que cada definição adquira consistência. Queiraagora o leitor acompanhar-me numa análise do projetoproposto na Figura 1:• Êsse hipotético projeto refere-se à instalação de umcomputador eletrônico para prestação de serviços prima-cialmente a terceiros. A figura é resultado mais de intros-pecção do que de experiência desfrutada na realização deprojetos semelhantes. Como tal, carateriza com nitidez asituação para a qual PERT foi essencialmente concebido.A situação é de informação imperfeita, e o plano de açãotraçado a priori, que inclui um esbôço de cronograma,reflete as tendências e pressuposições do projetista emface do empreendimento, máxime ao partir do princípiode que o bureau ou "departamento de serviços" deve tercondições de faturamento tão logo o equipamento tenhasido instalado.• Igualmente - note o leitor - certo grau de conheci-mento sôbre o futuro mercado de trabalho do departa-mento aparece explicitamente na figura. Na realidade, afigura admite a hipótese, viável ou não, de que o departa~mento conta com quatro clientes potenciais, um dos quaisé a própria emprêsa adquirente. Se alguém perguntar deque forma terá sido obtida essa informação, a respostaserá: "depois do início do projeto". E se o projeto já tivercomeçado, convirá conceber o atual momento de intros-pecção como pertinente à primeira tarefa do empreendi-mento - "estudos e estimativas preliminares".

• O restante da figura, torna-se claro, não passa deexaustivo arrolamento de tudo o que, segundo as previsões

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atuais, deverá ocorrer no futuro, com indicação das inte-rações previstas entre as diversas tarefas. Os números so-brescritos a cada uma das tarefas indicadas na figuracorrespondem a estimativas dos tempos de duração nocaso de aquelas tarefas serem de fato empreendidas. Paranão complicar a argumentação mantenho, por ora, estima-tivas singulares. De que forma são obtidas na prática?Por inquisição direta do pessoal técnico sôbre o qual re-cairá a responsabilidade de executá-las. Note-se que otempo de realização de algumas tarefas do projeto foi con-siderado igual a zero. Essas pseudotarefas devem constardo projeto para indicar interdependências de natureza tec-nológica.• Estabelecidas essas premissas e dispondo-se de um es-bôço de plano e cronograma, recolhem-se os dados preli-minares para a aplicação de PERT: são as variáveis dePERT específicas para o controle que agora pedem atenção.Chame-se (x, y) uma tarefa qualquer do projeto; t(x,y)será o tempo estimado de realização, que aparece sôbreas setas da Figura 1; x será o evento "início de (x,y)" e yo evento "fim de (x,y)". Chamando-se t» o mais curtotempo possível de ocorrência de x, o mais curto tempopossível para a ocorrência de y será:

(Expressão A).

• Quando uma única tarefa (x,y) contribui para aocorrência de y a Expressão A é suficiente; o mesmo nãoacontece quando diversas tarefas convergem para y, poisnesse.caso a Expressão A deixa algo a desejar. Senão, ve-jamos: se diversas tarefas contribuem para a ocorrênciade y, é axiomático que o mais curto tempo possível paray só pode ser o mais longo dos tempos mais curtos calcula-dos independentemente para cada uma das tarefas do gru-po que converge em y. Note-se, por exemplo, o tempo maiscurto possível para o "início da instalação" (Fig. 1). Seránecessário escolher o local e, eventualmente, empreenderalgum trabalho de construção. Mas os tempos correspon-

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dentes a essas tarefas, tal como estão estimados, não pre-valecem sôbre o intervalo de tempo necessário para otransporte do equipamento, isto é, o período contratual-mente estimado para o despacho dêsse equipamento dopôrto de origem até seu recebimento no ponto final dedestino. Dessa forma, o que comanda o início da insta-lação são os problemas vinculados ao transporte do equi-pamento, e isso impede que a instalação se inicie antesde 95.a semana, caso tudo suceda como foi estimado.A partir dêsse raciocínio e da sucessiva aplicação da Ex-pressão A, podem-se calcular os mais curtos tempos pararealização de cada evento do projeto, especialmente doúltimo evento - o fim do empreendimento. Ora, como asestimativas da Figura 1 levaram em conta o número dedias úteis do calendário durante aquêle período e previramcompatível aplicação de recursos, salvo erros e omissões(que certamente serão observados, mas a posteriori), tudoindica que o departamento não operará antes de 124 se-manas.• Admitindo que o projeto, tal como tenha sido delinea-do, agrade à gerência, convenhamos que a gerência tenhamesmo fixado em 124 semanas o tempo total para a reali-zação do empreendimento. Nesse caso 124 semanas é nãosó o mais curto tempo possível para a consecução do últi-mo evento, como também a última oportunidade possívelpara a ocorrência dêsse evento. Designemos por Ty aúltima oportunidade de ocorrência de y. Êsse conceitopassa a assumir relevância, uma vez que - retroativa-mente - é possível calcular T', por esta expressão:

T, = T. - t(x,y) (Expressão B),

com a ressalva de que, se diversas tarefas divergirem de x,T x corresponderá ao menor dos tempos calculados segundoa Expressão B para cada uma das tarefas do grupo diver-gente. Particularmente com relação ao projeto da Figura 1,note-se que a última oportunidade para a assinatura do'Contrato com a companhia fornecedora do equipamento

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ocorre no fim da 63.a semana, ainda aqui em decorrênciado prazo estimado para a entrega do equipamento. Casofôssem predominantes as "providências preliminares deinstalação", a assinatura do contrato poderia esperar pelofim da 76.a semana, sem perigo para a realização do pro-jeto no prazo estipulado.

• Uma terceira variável de contrôle resulta das Expres-sões A e B: torna-se evidente que o máximo tempo dis-ponível para a realização de (x,y), vale dizer, M(x,y), é:

I M(x,y) =Ty - tx.1 (Expressão C).

Quer dizer, a instalação propriamente dita do equipamen-to pode levar, no máximo, 14 semanas - mais, portanto,que as 6 estimadas. Em contrapartida, os "testes finais"têm o tempo máximo de realização de 15 semanas, exata-mente igual ao prazo estimado para aquela tarefa. Tarefasque devam ser realizadas estritamente no prazo estimado- isto é, tarefas para as quais a variável M(x,y) sejaigual à variável t(x,y) - são consideradas críticas parao projeto.

• A avaliação quantitativa de quão crítica seja uma ta-refa para um projeto é obtida através do conceito de folga.Por folga - f(x,y) - entende-se a variável de contrôle

I f(x,y) = M(x,y) - t(x,y) I (Expressão D),

variável que, como se vê, mede a sobra estimada do tempoque se tem para realização da tarefa. Se a tarefa fôr crítica,a folga será nula. Chamemos F o último evento do projeto.Pode-se provar que, estabelecido por definição serT» = tF, como o fizemos no exemplo em pauta (ondeTF = tF = 124), então certamente existirá no projetopelo menos uma cadeia de tarefas que ligará o comêço ao

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fim do projeto e para a qual a folga em cada tarefa seránula. Essa cadeia (ou êsse conjunto de cadeias) recebea designação de caminho crítico do projeto."

Grande fonte de confusão entre PERT e CPM é precisa-mente a utilização do conceito de caminho crítico porambos os métodos, embora em contextos e com finalidadesbàsicamente diferentes. Em PERT caminho crítico é umgargalo de produção, um conjunto de tarefas que requeremcontrôle especificamente apurado. Em CPM é um instru-mento de cálculo, não de contrôle: é, por definição, a maislonga cadeia do gráfico para um específico tempo total derealização do projeto e de um orçamento específico. Emconseqüência, definida a pressa que se tenha de realizaro empreendimento, o caminho crítico de CPMtorna explí-citas as tarefas que requerem recursos adicionais para aexecução do trabalho, sendo, daí, um passo para a obten-ção do orçamento total do projeto, compatível com a pressaque se tenha estabelecido. Isso torna ainda mais nítida adistinção de que CPMplaneja e PERTcontrola. Aliás, certosentido de complementação entre PERT e CPM pode daíresultar. Já existem trabalhos nesse sentido. Veja-se, porexemplo, o que dizem BmSONe GILLESPIEna obra citadada nota",

Finalmente, a derradeira variável de importância para ocontrôle, que PERTjtempo prevê é a folga livre de umatarefa, a qual se define pela igualdade

i fi (x,y) = ty - tx - t(x,y) : (Expressão E).

10) Se T F fôr estabelecido diferente de tF, poder-se-á entender como cami-nho crítico a cadeia de tarefas para a qual a folga constante seja amenor possível (se TF > tF) ou a maior possível (se T F < tF)· Comessa precaução o caminho crítico (em PERT) será sempre o mesmo,indE'pendentemente de T F"

11) R. A. Bmsox e J. R. GILLESPIE, "Criticel Path PlanrunA-PERT InteAra-tion", Opemtions Research, vol. 10 (1962), págs. 909 a 912.

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Particularmente para a tarefa de construção e instalaçãode material elétrico e de refrigeração no projeto que esta-mos estudando, da folga calculada em 21 semanas existemapenas 13 semanas "livres". Para a maioria das tarefas doprojeto a folga livre é nula.

Essas as principais variáveis que tornam PERT/tempo pe-culiar. Outras mais existem, mas sem a importância dasque definimos. A gerência do empreendimento centralizasua atenção no fato de serem ou não confirmados os va-lôres estimados para essas variáveis, e através dessa cons-tante equiparação reajusta os recursos para o atendimentodos interêsses que tem em vista.

PERT/CUSTO

O muito da singularidade que carateriza PERT/tempocomo nôvo instrumento para contrôle de tempos não apa-rece em PERT/ custo para o contrôle de custos. Reluto emaceitar que PERT/ custo seja uma técnica original para ocontrôle de custos e que mereça, dessa forma, rótulo espe-cial, Tôda a peculiaridade de PERT/ custo em projetos cer-cados de incerteza reside no modo de definir agrupamen-tos de tarefas que mereçam contrôles orçamentários inde-pendentes. PERT/ custo propõe um exame da representa-ção gráfica do projeto ao nível de desmembramento maismicroscópico possível. Desde logo, por exemplo, a pers-pectiva macroscópica da Figura 1 julgo-a incompatívelcom a utilização de PERT/ custo.

Uma vez que se tenha em mãos o gráfico suficientementepormenorizado do projeto, PERT/ custo fraciona-o numnúmero variável de partes, cada parte contendo uma co-leção coerente de tarefas. Por seu turno, cada coleção -que se designa coleção de trabalho - recebe contrôle or-çamentário específico e, portanto, confronto periódico en-tre dispêndios reais e previstos, em decorrência da natu-reza da discrepância. O critério de fracionamento do pro-jeto em coleções parece ser bastante flexível.

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Algumas agências norte-americanas 12 propõem que o nú-mero de atividades numa coleção seja regido por um orça-mento não superior a US$ 100.000 e por um tempo detrabalho total para a coleção não superior a três meses. Isso,entretanto, não desmente que o nível de minuciosidadepara o qual PERT / custo se aplica é fundamentalmente fru-to de julgamento, variando de projeto a projeto, de partea parte do mesmo projeto ou, ainda, de um estágio paraoutro de preparação ou execução em que o projeto se en-contra. Para controlar custos dentro dêsse esquema deoperações as variáveis fundamentais são as discrepâncias,positivas e negativas, de dispêndios e estimativas para cadacoleção do projeto. Do relatório periódico que arrola asdiscrepâncias por coleções deve constar, ainda, a discrepân-cia estimada para o total do empreendimento.

o MODÊLO ORIG:i:NALDE PERT/TEMPO E SUA MODIFICAÇÃONA PRÁTICA

Insisti, desde o início, em que a natureza matemática dePERT, pelo menos no modêlo original, é probabilística.Dessa forma foi possível salientar uma diferença básicafundamental entre PERT e CPM, pois em CPM prevaleceum ambiente de constantes, isto é, de valôres destituídosde incerteza. Como tudo neste mundo é incerto, o leitortenderá a negar validez ao que CPM tenta implantar. Mas,em assim fazendo, terá igualmente de negar validez àmaioria quase absoluta dos modelos de valor prático deque certamente faz uso. Veja-se, por exemplo, o que acon-teceu com PERT, mesmo nesta descrição: embora tivesseenfatizado a caraterística da inc-erteza, apliquei sôbre astarefas da Figura 1 valôres que nada aparentam ter deincertos, os quais ambiguamente tratados como "estima-tivas singulares dos tempos de duração", impregnaram comseu determinismo tôdas as variáveis de contrôle posterior-mente calculadas.

12) "DOD anel NASA Guide PERT/Cost", Ofiic.e of the Secretery of Defetl-se, Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço dos EUA, junhode 1962.

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o exemplo, como aliás quase tôda a aplicação de PERTna prática, constitui corruptela do ambicioso modêlo queMALcoM e seu grupo conceberam inicialmente e que opróprio grupo foi levado a simplificar dràsticamente paraadaptá-lo ao nível de conhecimento dos usuários e a outrascircunstâncias de natureza pragmática.

Em linguagem probabilística, diz-se de uma variável queassuma valôres incertos que é aleatória. Em média, elacertamente assume determinado valor, que é seu valor es~perado. Mas, o valor esperado da variável é u'a médiados valôres que assume experimentalmente. Quando sediz de uma pessoa que "costuma chegar sempre com meiahora de atraso" a implicação matemática é que o valoresperado do tempo de chegada é de 30 minutos além doprazo estabelecido, e com isso se entende que algumasvêzes o atraso será superior e, outras vêzes, inferior a 30minutos. A margem de êrro em tôrno da estimativa na-tural que a média concede designa-se, probabilisticamente,variância. Quando a variância é pequena, pequena é tam-bém, em média, a discrepância verificada, ocorrendo o con-trário quando a variância seja grande. Modelos determi-nísticos - para os quais tudo no mundo é constante _partem da premissa de que a variância é tão pequena quea adoção do valor esperado da variável como valor certode ocorrência não torna falaciosas as conclusões.

Em trabalhos de pesquisa e desenvolvimento - para osquais PERT foi concebido - a hipótese da pequena va-riância para os tempos de duração das tarefas é obvia-mente precária. Quando se pede de um engenheiro queestime o prazo de conclusão do projeto de uma engrena-gem cujas especificações requeiram uma liga metálicaainda desconhecida, o prazo estimado, digamos, de 2O se-manas, reflete apenas o grau de complexidade com queo engenheiro avalia subjetivamente a tarefa. Concluir daíque o número 20 tenha algo de fatal é êrro grosseiro.

MALcOMe seu grupo levaram em consideração, inicial-mente, a aleatoriedade das estimativas, sugerindo que aoprojetiltafQsse d'da a prerrogativa de estimar não o tem-

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po médio de realização da tarefa, mas a inteira distribuiçãode probabilidades dos tempos correspondentes.

Para haver coerência nas estimativas colhidas em diversasfontes o projetista deveria limitar-se a sugerir uma dasfunções de u'a mesma família de funções matemáticaschamadas funções beta. Como essa família é inexaurível,o projetista teria infinitas oportunidades de aliviar o espí-rito, sugerindo (tal como na Figura 2) proposições dotipo "qualquer tempo de duração dentre os do prazo éigualmente possível" ou, ainda, "pressinto que a probabi-lidade de que a tarefa termine mais perto do fim do prazoé maior do que a correspondente ao comêço".

Estimativas assim versáteis tornam o modêlo interessante,mas dificilmente prático em projetos complexos. Determi-nar a média e a variância de distribuições beta não cons-titui problema matemático, mas a repetição do cálculo para

f (.)

(b-a)

FIGURA 2: Funções Beta

(1) Carateriza a situação "todosostemp.os são igua1rnE'Ilteprováveis dentre os do prazo".

(2) Caracteriza a situação inversa de (3).

(3) Carateriza a situação "os tempos. ao fim do prazosão mais prováveis que os do comêço".

(2)

(1)

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diversos milhares de tarefas é certamente onerosa. Ade-mais, convencer o projetista, geralmente leigo em proba-bilidades, da informação que dêle se pretende colhêr é pa-radoxalmente mais difícil para estimativas versáteis doque para estimativas singelas. Essas dificuldades devemter conduzido o grupo de MALCOM a sugerir do projetista,em lugar de uma completa distribuição de probabilidadesque incluísse tôda a informação subjetiva que êle tivessesôbre a tarefa, tão somente três estimativas pontuais, àsquais se deram os nomes de estimativa otimista (a), pessi-mista (b), e mais provável (m). O pensamento deMALCOM era acomodar uma distribuição beta àqueles pa-râmetros. Dificuldades matemáticas apareceram nesseponto, exigindo novas premissas e simplificações. Aos pou-cos, o modêlo originalmente concebido como probabilís-tico foi perdendo sua flexibilidade, e a hipótese da distri-buição beta de tempos, virtualmente destruída. Duasfórmulas mágicas apareceram em seu lugar, cuja deduçãoseria irrelevante introduzir nesta descrição, A primeira dizrespeito ao tempo médio estimado para duração de umatarefa,

1 E(t) = (a+4m+b)/6\ (Expressão F),

e a segunda, à margem de êrro dessa estimativa, ou seja,à variância do tempo de duração,

(Expressão G).

Utilizando-se as Expressões F e G em conjunção com aExpressão A, pode-se determinar o tempo mais curto deocorrência estimado para um evento e a variância corres-pondente. Isso permite que se estime, por exemplo, a pro-babilidade com que qualquer evento do projeto haja deocorrer no prazo estabelecido. É fácil entender que essasestimativas são tão arbitrárias como o são as ExpressõesF e G, e, porisso, só têm valor num contexto onde o con-trôle seja muito freqüente e apurado.

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Com o decorrer do tempo a Expressão G perdeu quaseinteiramente seu valor. Quanto à Expressão F, - indago- porque passar pelo dissabor de seu cálculo, se uma esti-mativa única pode ser obtida mais fàcilmente com idên-tica arbitrariedade? Em 1963 travei contato com três usuá-rios de PERT na área de Bóston, EUA: a Procter &Gamble, a Reytbeon (companhia de pesquisas) e algunstécnicos envolvidos no Projeto Apollo no MIT. As variân-cias não eram calculadas, e a Reytheon era a única queainda usava três estimativas de tempo para cada tarefa,embora não de forma sistemática. Êsse fato fêz-nos crerque a incerteza das estimativas que PERT utiliza deter-ministicamente na prática para o cálculo das variáveis decontrôle que introduzimos anteriormente é apenas man-tida como pano-de-fundo no cenário do projeto.

Os métodos de cálculo que a prática de PERT introduziunão o tornam mais probabilístico do que CPM. Sucede,apenas, que o sistema que emprega PERT mantém viva aconsciência de que tudo é incerto e fluido, e de que a únicaforma de atacar a ignorância do que venha a ocorrer aolongo do projeto é o maciço contrôle de suas etapas.

O emprêgo de PERT /tempo também sofreu substancialalteração na prática. Inicialmente concebido apenas comoinstrumento de contrôle do absolutamente' nôvo - pro-dutos de pesquisa e desenvolvimento -, aos poucos PERTdespertou a atenção de outras áreas de atividade, sobretu-do das que requerem processos de produção infreqüente-mente repetidos. A construção civil, principalmente emobras de arte de médio e grande porte, procurou, desdelogo, tirar proveito das variáveis de PERT. Hoje o reper-tório de aplicações de PERT /tempo é virtualmente ine-xaurível, seja em trabalhos de produção corrente, seja emtrabalhos de produção intermitente. A mercadização deprodutos novos, a administração orçamentária, a instala-ção e programação de sistemas eletrônicos de processa-mento de dados, a construção de abrigos em programas de<lefesa urbana, o lançamento de peças teatrais, os proble-

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mas de manutenção etc. são alguns dos campos de aplica-ção que no passado não se pensava PERT pudesse ter.

Finalmente, conviria pedir a atenção do leitor para certosproblemas que a aplicação de PERT envolve e que adqui-rem, na prática, pouca ou nenhuma relevância em virtudedo fascínio despertado, normalmente, pela simples mani-pulação numérica e pelos demais mecanismos da técnica.A primeira observação é de natureza matemática. A se-gunda, muito mais importante, diz respeito ao âmago doproblema que PERT tenta resolver.

• Matemàticamente, comete-se êrro flagrante quando seescolhe o maior valor da Expressão A como o mais curtotempo possível para a ocorrência de um evento sôbre oqual convirjam duas ou mais tarefas. É fácil entender por-que. Proponho ao leitor que conceba o encontro de duaspessoas, digamos, entre 3 e 4 horas da tarde de certo dia.Suponhamos que nenhuma dessas pessoas tenha motivospara evitar o encontro com a outra e, ainda, que nenhumadelas telefone ou procure certificar-se. de alguma forma,sôbre se a outra está ou não a caminho do local do en-contro. Imaginemos, por fim, que ambas as peSS08Snãotenham o que fazer naquele período, estando, dessa forma,absolutamente indiferentes quanto ao momento de chegarao local.

A implicação dessas hipóteses é dupla: primeiro, as che-p"adassão ditas independentes; segundo, qualquer minutono intervalo entre 3 e 4 horas é igualmente provável paraa chegada de qualquer dos dois indivíduos. O prob1emacorresoonde, num gráfico PERT, a duas setas ("transportede cada indivíduo ao local do encontro") que convergemnara um círculo (representando o evento "encontro").O que PERT prognostica é que o encontro se dará às3: 30 h, pois essa é a média do tempo de chegada não sódo primeiro indivíduo, como também do segundo. Ocorreque a solução é simplista. Em verdade, o encontro terálugar quando a pessoa mais atrasada chegar; portanto, otempo da ocorrência do evento "encontro" depende exclu-

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sivamente do tempo de chegada da pessoa mais atrasada.É possível provar que o horário médio de chegada da pes-soa mais atrasada será o das 3: 40 h e que somente a essahora, em média, se dará o encontro. A tendência para oatraso, evidentemente, é fato da natureza e independe, nocaso, da vontade de ambas as partes. PERT omite-se diantedessa realidade matemática e, por isso, estima tempos"mais curtos de duração" menores do que aquêles que, emmédia, certamente prevalecerão. Os resultados de PERT /tempo são, por isso mesmo, considerados "otimistas" e,convém alertar, a margem de otimismo em PERT podeatingir cifras de quase 40%, altamente significativas, por-tanto. O cálculo exato do tempo médio de ocorrência dedeterminado evento sôbre o qual convirjam diversas tare-fas não será difícil se as tarefas forem, como as chegadasdo exemplo, efetivamente independentes. Se não o forem(como certamente será o caso), a determinação exata dostempos de ocorrência será tarefa muito complexa. Talvezconvenha adicionar que, quanto mais fortes as dependên-cias - isto é, quanto mais hiperestático o gráfico -, tantomenor será a margem de êrro de PERT.

Dir-se-á que, afinal de contas, um contrôle maciço, comoo prognosticado, logo revelará a tendência otimista indevi-damente incorporada na forma de aplicar a Expressão A,daí resultando revisões mais conservadoras de estimativasoriginais, à medida que o projeto se aproximar do fim.Acompanho o raciocínio. Afinal de contas, uma arbitra-riedade a mais não faz diferença, desde que seja fonte deêrro de natureza sistemática e previsível. O problema, en-tretanto, reside em outros elementos de êrro, de naturezaassistemática e imprevisível, que fazem parte integranteda própria estrutura do problema que PERT tenta resolver.E isso sugere a segunda observação no tópico.

• A forma de PERT atacar o problema do contrôle daprodução daquilo que chamei "absolutamente nôvo" ou"infreqiientemente repetido" é, sob todos os aspectos, su-perficial, ir.gênua, simplista. Alguns pensadores americanos

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- dentre êles, EDWARDROBERTS/3 que é quem melhortem estudado os problemas de pesquisa e desenvolvimentonos EUA - acusam PERT de enfatizar tecnicismos, emvez de compreender a verdadeira natureza do problema;acusam PERTde salientar o valor de resultados numéricos,arbitrários e falaciosos, que resultam em medidas igual-mente falaciosas e arbitrárias porque deixam encoberto overdadeiro mecanismo de causação circular que comandao sistema.

ROBERTSchega ao ponto de considerar desperdício detalento humano a existência de PERT e técnicas similares,porque por causa dêles ficam drenados alguns recursos ne-cessários ao estudo e à compreensão das causas da insegu-rança administrativa de tais empreendimentos. A superfi-cialidade de PERT como solução fica a descoberto quandose examina, com um pouco mais de cuidado, o mecanismode causação circular (feed-back), segundo o qual a discre-pância entre o prazo desejado para o término de uma ta-refa e aquêle que PERT sugere como viável origina umatomada de decisões que redispõe os recursos; êstes, por suavez, atuam no projeto dando origem a novas estimativasde progresso, as quais, por sua vez, em face do desejado,provocam nova redisposição dos recursos, fechando o cír-culo. E isso não é tudo, pois inexistem fontes tangíveis eseguras para a medida do progresso em empreendimentosnovos ou infreqüentemente repetidos, o que implica em adiscrepância entre o real e o desejado deixar de ser a causade decisões. Essas passam a ser tomadas em face do pro-gresso aparente do projeto, e o progresso aparente decorredo fluxo de informações em múltiplos canais, onde incidemdemoras, ruídos e tendências.

Por ingenuidade, PERT aceita que o projetista não é "ra-cional" ou, como se tem dito, "econômico". Mas êle o é.

13) E. ROBERTS, "Towerâ a New T'heory for Research and Developrnent":Industrial Management Review, MIT School oi Industrial Management,VoI. 4, n.? 1, outono de 1962.

Idem, The Dynemics oi Research and Development, MIT PhD Thesis,junho de 1962.

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Êle estima, alega ou insinua em face de seu esquema devalôres e, sobretudo, em face do esquema de valôres daemprêsa, principalmente no que diz respeito à política prê-mio-penalidade por essa emprêsa adotada. O esquema devalôres do projetista reflete-se nas tendências da gerênciaao administrar o projeto, e novos círculos de feed-back seinsinuam na verdadeira estrutura do problema. Na ma-cro-escala do projeto ROBERTS observou que fatôres comoa propensão de risco da emprêsa, as demoras de financia-mento do projeto, a habilidade da emprêsa para expandir-se sem perda de eficiência e a própria integridade da em-prêsa são fatôres mais marcantes para o sucesso do empre-endimento que o contrôle apurado dos tempos de produ-ção. Análises com a profundidade da que ROBERTS fêz doproblema de pesquisa e desenvolvimento decorrem de umapoderosa simulação em computadores eletrônicos, aindalargamente desconhecida no Brasil, a que se dá o nome de"Dinâmica -Ind ustrial". 14

CONCLUSÃO

Minai, joguemos PERT à cesta, como talvez o pretendaROBERTS? Não foi o que fizeram as agências governamen-tais norte-americanas no contrôle de seus projetos. Não éo que têm feito os milhares de usuários que desfrutamda técnica sobretudo como instrumento disciplinador dobom senso. Nem ROBERTS iria tão longe. Os resultados deuma análise mais profunda mostram apenas que PERTnão resolve o problema integralmente. Diria que deve serempregado com cuidado, que constitui verniz a encobrirsuperficialmente um problema de natureza virtualmente

14) Estudos de Dinâmica Industrial começaram, há cêrca de dto anos atrás,com o Prof. ]AY W. FORRESTER na Escola de Administração do InstitutoTecnológico de Massachusetts (MIT). O trabalho fundamental da dis-ciplina é o livro de FORRESTER, Industrial Dynemics, The MIT Press,1961. A Dinâmica Industrial enfatiza as caraterísticas dE' causação cir-cular de tôdas as atividades econômicas e administrativas, e estuda osmeios p,.los quaís "a estrutura da organização, a amplificação das polí-ticas de decísâo e as demoras em ações e decisões interagem para influen-ciar o ilxito lia 111memprwndimento".

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desconhecida porque nêle incide, sobretudo, a complexida-de do elemento humano.

Penso que a verdadeira importância tecnológica de PERTe métodos similares está em que são técnicas que "arru-mam a casa", organizam o raciocínio." Não resolvem tudomas forçam a solução de uma parte inicial do problema,que é muito importante para o sucesso do empreendimen-to: a que exige minuciosa introspecção do trabalho quejaz à frente, seja no que concerne à sua complexidade eaos dispêndios que eventualmente venham a ser enfren-tados, seja no que se refere aos tempos de execução.

Êstes, a despeito da arbitrariedade e falácia que carreiamem boa dose, permitem à gerência sentir os pés no chãoe dar início ao empreendimento com o que melhor se asse-melha aos fatos sôbre os quais carece de informações.

15) GRACIANO SÁ, "A Study on the Solutions to PERT Networke", M. S.Thesis, MIT School of Industrial Management, junho de 1964.