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  GUIA DE VIAS DE ADMINISTRAÇÃO, MEDICAMENTOS E EUTANÁSIA PARA ANIMAIS EM EXPERIMENTAÇÃO PROF. CARLA APARECIDA DE BARROS RESP. TÉCNICO BIOTÉRIOS-UNIFIL 2014

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  • GUIA DE VIAS DE ADMINISTRAO,

    MEDICAMENTOS E EUTANSIA PARA

    ANIMAIS EM EXPERIMENTAO

    PROF. CARLA APARECIDA DE BARROS

    RESP. TCNICO BIOTRIOS-UNIFIL

    2014

  • 1) Vias e locais de administrao de drogas

    Todos os animais devem ser corretamente imobilizados para que a administrao das injees seja conduzida sem risco para o pesquisador ou animal. Considerando que qualquer fator externo pode alterar a homeostase, e ainda ser apontado como um fator estressante, fundamental que se aguarde tempo suficiente para que o animal se adapte a manipulao e torne-se familiarizado com o pesquisador. A manipulao incorreta ou brusca pode implicar estresse e, conseqentemente, desequilbrio de funes orgnicas, que determina a ocorrncia de alteraes fisiolgicas. Os procedimentos recomendados para a administrao de substncias aos animais so descritos a seguir:

    a) Via oral (VO) e gavage

    A substncia introduzida na cavidade oral ou no aparelho digestrio por meio de um tubo esofgico ou estomacal. Para a maioria das espcies, um tubo flexvel (ou agulha) com a ponta arredondada introduzido na boca do animal e gentilmente empurrado pelo esfago at o estmago.

    necessrio ser cauteloso para assegurar que o tubo no tenha penetrado inadvertidamente a traquia. Os tubos utilizados para camundongos (4 cm) so menores do que para os ratos (8 cm de comprimento). O volume mximo para roedores de 1mL de soluo para cada 100g de peso corporal, no entanto, se a administrao for de soluo aquosa, o volume pode ser de at 2mL para cada 100g de peso corporal. Deve-se lembrar que os roedores ingerem alimento e gua muitas vezes ao dia, e por isso dificilmente esto com o estmago vazio. A distenso mxima do estmago se d no final do perodo escuro, em contrapartida quantidade mnima no final do perodo claro. Nesse sentido, pequenos volumes devem ser administrados no incio do perodo claro (fase de repouso).

    b) Subcutnea (SC)

    a injeo de soluo sob a pele do animal, a qual deve ser levantada antes da aplicao. realizada com agulha hipodrmica curta (normalmente 25x5 mm ou mais fina), passando apenas pela derme, o mais prximo da superfcie, formando uma ppula aps a administrao da substncia. As reas dorsolaterais do pescoo, ombro e flancos so as regies de escolha. uma via que raramente induz dor e realizada em animais

  • conscientes. Antes de injetar a substncia, deve-se aspirar exercendo uma leve presso no mbolo da seringa para assegurar que a agulha no esteja penetrando em um vaso sangneo.

    c) Intramuscular (IM)

    A substncia injetada no msculo esqueltico na forma de solues oleosas ou suspenses. Os msculos de grande superfcie so as regies mais utilizadas. Devem ser usadas agulhas de tamanho similar s empregadas nas injees subcutneas e a profundidade no tecido deve ser de aproximadamente 5mm. Estruturas sseas, nervos e vasos sanguneos devem ser evitados. Antes de injetar deve-se assegurar que a agulha no est em um vaso sanguneo, exercendo uma leve presso de retirada no mbolo da seringa. O tamanho da agulha geralmente 25x5 ou 25x7mm ou mais fina, e o volume mximo, de 0,5mL por stio de administrao em ratos e hamster e de 0,3 em camundongos.

    d) Endovenosa

    A administrao feita diretamente na corrente sangnea, por meio de vasos superficiais. As solues a serem aplicadas no devem ser irritantes e o veculo deve ser do tipo aquoso. A veia da cauda o vaso sanguneo de escolha em camundongos no anestesiados. Entretanto, sua perfurao requer habilidade e prtica. O movimento do animal tambm pode ser contido dentro de um pequeno recipiente para facilitar a administrao. A visualizao da veia facilitada por procedimentos como a imerso da cauda em gua quente a 40-50 C por alguns segundos ou proximidade de uma lmpada quente.

    Observaes: - nunca se deve aplicar medicamentos diludos em veculo oleoso, sob pena de causar mbolos no animal com a conseqente morte do mesmo. - vrios dispositivos foram desenvolvidos para facilitar injees endovenosas junto veia lateral da cauda, alguns dos quais so obtidos comercialmente. Basicamente, estes dispositivos consistem de um cilindro transparente, de dimetro apropriado, com divisor de comprimento ajustvel, com uma fenda para exteriorizao da cauda.

  • e) Intraperitoneal

    A via intraperitoneal normalmente a mais utilizada na experimentao com roedores. A substncia injetada na cavidade peritoneal entre os rgos abdominais. Normalmente, injeta-se na metade posterior do abdome com o animal contido pelo dorso. O tamanho das agulhas normalmente utilizado de 25x5 ou 25x7 mm. A imobilizao adequada pr-requisito bsico para o sucesso deste tipo de aplicao.

    2) Tcnicas anestsicas em animais de laboratrio

    O animal de laboratrio, freqentemente utilizado como material de pesquisa que envolve procedimentos cirrgicos diversos, necessita por questes de melhor manejo e acima de tudo humanitrias, ser submetido anestesia. A anestesia deve ser realizada sempre que o procedimento implique em dor ou desconforto dos animais. No sero necessrios anestsicos, analgsicos ou tranqilizantes quando isto no ocorre, como em procedimentos que incluem administrao de fluidos, imunizao, medicao oral, coleta de sangue (exceto intracardaca e periorbital). Para minimizar a dor e o desconforto devem ser utilizadas drogas anestsicas, analgsicas, tranqilizantes e ainda a eutansia. Alguns procedimentos que envolvem dor e requerem anestesia incluem: cirurgias, agentes que envolvem inflamao excessiva e necrose e coleta de sangue pelas vias intracardaca e periorbital. Alteraes substanciais no estado de alerta, padro respiratrio do animal, presena de secrees nasais ou oculares e diarria podem sinalizar a ocorrncia de anormalidades.

  • Uma vez detectada a alterao, o procedimento experimental deve ser adiado e a causa identificada.

  • a) Monitoramento da anestesia

  • A profundidade anestsica deve ser avaliada por meio da presena ou ausncia de determinados sinais como reflexo da cauda, replexo palpebral e corneal e das alteraes das freqncias cardaca (FC) e respiratria (FR), que sofrem modificaes de acordo com os planos atingidos (profundidade da anestesia).

    b) Cuidados com os animais no ps-cirrgico

    Uma vez concludo o procedimento cirrgico, os animais devem ser colocados isoladamente em suas gaiolas para a recuperao anestsica. Este local deve ser silencioso e com pouca luz, evitando-se estressar os animais, com um mnimo de manipulao. A temperatura do ambiente deve variar de 27 a 30 C para adultos e 35 a 37C para os neonatos. Uma vez restabelecidos os parmetros normais, a temperatura pode ser reduzida para 25 C para adultos e 35 C para neonatos. Os camundongos so mais sensveis a hiportermia que as demais espcies. A cama de proteo do fundo da gaiola no deve permitir o contato do paciente com resduos tais como poeira e quaisquer detritos que possam se aderir aos olhos, nariz ou boca do animal e a recuperao de coelhos e cobaias no deve ser realizada em gaiolas gradeadas, sob risco de ocorrncia de fraturas. O consumo de gua no perodo ps-operatrio est diminudo, devendo-se monitorar atentamente a ingesto de lquidos. Se o grau de desidratao for importante, a administrao de fluidos deve ser iniciada pela via oral, subcutnea ou intraperitoneal, utilizando-se soluo fisiolgica ou glicofisiolgica. A administrao de analgsicos no perodo ps-operatrio deve ser considerada, ficando a escolha do medicamento a critrio do pesquisador.

    3) Estresse

    O estresse foi definido como o efeito de fatores fsicos, fisiolgicos ou emocionais que induzem a uma alterao na homeostase do animal.

    A homeostase o equilbrio fisiolgico normal do corpo. O estresse e suas consequncias podem ser divididos em trs tipos: - eustresse o estresse bom, benfico para o animal. Ocorre quando o animal sofre um estmulo no doloroso e a partir da tem incio uma resposta adaptativa a esse estmulo;

  • - estresse neutro aquele em que ocorre um estmulo causador de estresse que no nem prejudicial nem benfico para o animal; - distresse ocorre quando o animal sofre um estmulo que prejudica seu bem-estar. Para a avaliao do estresse, devem-se utilizar de preferncia mtodos no invasivos. Os parmetros utilizados na avaliao do estresse incluem alteraes comportamentais, sintomas clnicos, aspectos fisiolgicos, indicadores bioqumicos, achados patolgicos e indicadores imunolgicos. Vale destacar que, ao se avaliar o estresse, prefervel utilizar sempre mais de um desses parmetros.

    4) Analgesia

    Para garantir o bem-estar animal aps a realizao do procedimento cirrgico, o pesquisador deve avaliar em seu protocolo a possibilidade de utilizao de um agente analgsico. O uso de analgsicos sempre deve ser considerado quando so realizados procedimentos cirrgicos invasivos, para aliviar a dor ps-operatria imediata e em longo prazo.

    Para realizar adequado manejo da dor e estresse do animal, preciso conhecer o comportamento normal da espcie e o comportamento relacionado dor. O reconhecimento da dor em animais difcil e, por isso, na dvida, deve-se considerar que, se o procedimento passvel de causar dor no humano, tambm passvel de causar dor no animal. Dessa forma, preciso pensar em maneiras para o alvio potencial da dor.

    No mbito da pesquisa, vantajoso promover o alvio da dor, pois o animal com dor sofre alteraes patofisiolgicas que podem influenciar os resultados dos experimentos. Alm disso, ao promover o alvio da dor trabalha-se de acordo com a legislao e com princpios ticos e humanitrios.

    H muitos agentes analgsicos disponveis para realizar o devido cuidado ps-operatrio com o animal, considerando-se que existem procedimentos experimentais mais invasivos que outros, causando diferentes graus de dor no animal. O Quadro abaixo classifica a dor ps-procedimento como leve, moderada ou severa, de acordo com o tipo de procedimento realizado. J o Conselho Nacional de Controle de

  • Experimentao Animal (CONCEA) classifica os experimentos em grau de invasividade 1 a 4.

  • 5) Eutansia

    O termo eutansia derivado do grego (eu = bom, thanatos = morte) e significa boa morte, ou seja, uma morte sem sofrimento. Uma boa morte aquela em que o animal no sente dor nem angstia. Na realizao de experimentos cientficos com animais, a eutansia faz-se necessria no final do experimento ou nas seguintes ocorrncias:

    - ameaa ao bem-estar animal;

    - impossibilidade de utilizao de medicamentos para aliviar o distresse

    ou o sofrimento; quando o animal constituir ameaa sade pblica ou

    animal;

    - quando for objeto de ensino.

    Na maioria das vezes, a coleta de material biolgico dos animais para anlise ocorre antes ou aps a eutansia. Como os pesquisadores so os responsveis pela eutansia do animal em experimentao, seu dever assegurar que estes sejam tratados em todos os momentos com o mximo de respeito, evitando que tenham uma morte dolorosa e que sejam tomados por angstia em momentos anteriores morte, antes da perda de conscincia. As tcnicas de eutansia devem resultar em rpida perda de conscincia, seguida por parada cardaca ou respiratria e pela perda definitiva da funo cerebral. Alm dos cuidados com o bem-estar do animal, devem-se levar em considerao os efeitos emocionais causados ao operador. As reaes envolvem a dor pela perda de uma vida, mal-estar, distresse e desconforto. Devem ser buscadas solues para amenizar esse problema, como rodzio de pessoal, treinamento dos pesquisadores e da equipe tcnica quanto aos mtodos humanitrios de manejo e eutansia e aos efeitos esperados do mtodo utilizado, bem como quanto ao motivo pelo qual est sendo realizada a eutansia.

    Se necessrio, deve-se fazer acompanhamento psicolgico dos envolvidos, pois a eutansia de um animal pode fazer a pessoa entrar em conflito com seus princpios ticos e morais. Independentemente das circunstncias, o mtodo de eutansia sempre deve ser selecionado com base em princpios ticos e valores sociais e morais. Esse tema deve

  • ser sempre revisto e estudado, a fim de buscar as melhores tcnicas e equipamentos para realizar esse procedimento de forma eficiente e humanitria. A regulamentao dos procedimentos de eutansia animal no Brasil se d por meio da Resoluo do CFMV n1.000, de 11 de maio de 2012. Essa resoluo determina como obrigatria a superviso por mdico veterinrio dos procedimentos de eutansia em todas as pesquisas que envolvam animais.

    a) Mecanismos para causar a morte

    Os mtodos de eutansia produzem a morte por meio de trs mecanismos:

    1. hipxia direta ou indireta;

    2. depresso direta de neurnios relacionados s funes vitais;

    3. ruptura fsica da atividade cerebral.

    b) Seleo do mtodo de eutansia

    Para que ocorra a morte humanitria, sem dor e distresse, o animal dever perder a conscincia antes de ocorrer a perda da atividade motora (muscular) . Antes de realizar a eutansia, deve-se procurar diminuir o distresse, o medo, a apreenso e a ansiedade do animal. Sempre manipul-lo de forma gentil e calma e fora de seu alojamento.

    c) Classificao dos mtodos de eutansia

    Recomendados: so aqueles que, quando utilizados isoladamente, produzem no

    animal uma morte humanitria.

    Aceitos sob restrio: so mtodos que trazem o risco de no produzir a morte

    humanitria, pois apresentam probabilidade de erros cometidos pelo operador ou so tcnicas de risco ocupacional.

    Inaceitveis: so os mtodos que no produzem a morte humanitria sob nenhuma

    circunstncia. Entre eles esto tambm os mtodos que envolvem um grande risco ocupacional para o operador.

    Mtodos adjuvantes: produzem a morte humanitria quando em combinao com

    outras tcnicas. Se utilizados isoladamente, so considerados inaceitveis.