mal invisÍvel a difícil tarefa de combater o cyberbullying · 2013-09-27 · chamar de...

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FOLHA DIRIGIDA 4 a 10 de abril de 2013 2 CADERNO DE EDUCAÇÃO Sinais podem identificar vítimas Escritor João Pedro Roriz promove palestras sobre bullying em escolas Educadora recomenda que pais estejam atentos ao que os filhos acessam na rede A difícil tarefa de combater o cyberbullying MAL INVISÍVEL | Anonimato e alcance maior das agressões morais tornam o bullying na internet mais preocupante Ser vítima de ofensas via internet pode causar danos psicológicos graves “O bullying é uma violência invisível” Ana Maria Albuquerque: bullying faz cair rendimento escolar ARQUIVO Há muito conhecido pelos educadores, o bullying tem assu- mido uma face ainda mais cruel e difícil de ser combatida nas escolas. A popularização do aces- so à internet por uso das mais diferentes formas de comunica- ção móvel e o hábito cada vez mais frequente, entre jovens e adolescentes, de acessar redes sociais, geraram o ambiente per- feito para o que se convencionou chamar de cyberbullying, ou seja, a realização de práticas de cons- trangimento e agressão moral pela rede. Dois aspectos tornam, para muitos, o cyberbullying ainda mais grave que o bullying tradi- cional. Na prática, o anonimato se transforma em um incentivo a mais para o agressor. Além disso, a possibilidade de o conteúdo ser acessado por qualquer computa- dor ou dispositivo móvel pode aumentar em uma escala incalcu- lável o tormento das vítimas. Para a educadora e pós-gradu- ada em Educação Infantil, em Educação e Saúde, professora Bi- anca Acampora, o acesso mais fre- quente dos jovens à tecnologia de comunicação móvel amplia, e muito, os riscos do cyberbullying. “Os meios tecnológicos que, a priori, seriam para melhorar e fa- cilitar a vida das pessoas em to- das as áreas estão sendo utiliza- dos para menosprezar e insultar”, comentou a especialista. Autora do livro Psicopedagogia clínica: o despertar das potencialida- des (Editora WAK), Bianca Acam- pora ressalta que a prática cyber- bullying, geralmente, é feita por adolescentes sem limites, insen- síveis e inconsequentes. “Em re- lação a colegas de escola e pro- fessores, as difamações são inten- cionadas e visam mexer com o psicológico da pessoa, deixando- a abatida e desmoralizada peran- te os demais.” A possibilidade de utilizar a internet de qualquer lugar torna mais difícil, para as escolas, fis- calizar e restringir o cyberbullying. Por isso, o primeiro passo acon- selhado por especialistas é a ins- tituição verificar o uso de seus próprios laboratórios de Infor- mática. Afinal, alunos podem utilizar os equipamentos para postar mensagens contra algum colega ou mesmo para acessar emails do tipo e, com isso, dar pistas sobre se alguém está sen- do constrangido. “O cyberbullying pode ser visto em comunidades criadas com o objetivo de ofen- der e xingar pessoas, na manipu- lação de fotos e nos emails ofen- sivos que invadem o espaço ín- timo da vítima”, exemplifica Bi- anca Acampora. Em casa, os pais podem adotar cuidados semelhantes. Mesmo aqueles que não são muito famili- arizados com a Informática podem e devem buscar formas de saber como os filhos usam a internet. É o que defende a professora Ana Maria Albuquerque, psicóloga for- mada pela Universidade de Brasí- lia e autora do livro Cyberbullying e outros riscos na internet: despertado a atenção de pais e professores (Editora WAK). “No que se refere à ética na internet e o que deve ser exposto publicamente na web e o que deve ficar no privado, os pais possuem um melhor discernimento do que as crianças e os adolescentes”, sali- enta a educadora, que recomenda que os pais busquem sempre ter uma postura de diálogo, e não de punição, com os filhos. “É muito comum o filho não expressar os problemas ou dra- mas existenciais que esteja viven- do referentes às práticas de cyber- bullying por medo de os pais terem reações como, por exem- plo, deixar o filho de castigo, sem usar o computador ou até de to- marem uma atitude mais intem- pestiva na escola”, destaca a pro- fessora Ana Maria Albuquerque. Uma das dificuldades para identificar e ajudar alguém que sofre com cyberbullying é o fato de que, muitas vezes, a própria vítima prefere esconder o pesa- delo que está enfrentando. No entanto, alguns sinais e compor- tamentos pode ajudar os pais e professores a saber quando al- guém é alvo de críticas, ofensas e agressões morais. Segundo a professora Ana Maria Albuquerque, existem al- guns sintomas físicos, psicosso- máticos e emocionais que podem ser indicativos de bullying tanto físico quanto pela internet. Quei- xas constantes de dor de cabeça, excesso de sono ou insônia, pe- sadelos, obesidade, bulimia, ansiedade, pensamentos persecu- tórios e síndrome do pânico são alguns exemplos de comporta- mentos que podem indicar a ocorrência do bullying, que pode, inclusive, afetar rendimento nos estudos por parte da vítima e até de outros alunos do colégio. “Cabe ressaltar que tanto as prá- ticas de bullying virtual como a do bullying presencial podem gerar queda do desempenho escolar entre as vítimas, entre os agresso- res e também entre a plateia que assiste a agressão. Quando o cli- ma escolar fica inóspito e violen- to, isso diminui a capacidade de aprendizagem dos alunos em de- corrência deste tipo de estresse entre os alunos e também entre alunos e educadores”, ressalta. Ana Maria Albuquerque tam- bém trabalha com prevenção ao bullying e ao cyberbullying no Portal do Professor. Mantido pelo Ministério da Educação (MEC), o site possui um blog destinado especificamente para a prevenção ao bullying e cyberbullying, com dicas a educadores e pais sobre como enfrentar o problema. Há outros serviços públicos que podem ajudar vítimas, pais e es- colas a lidar problemas relacio- nados com o cyberbullying. Na Safernet, a central brasileira de cibersegurança, existe um canal chamado Help Online, que possui psicólogos especializados para receber denúncias e auxiliar os jovens e suas famílias. Outra opção é a Polícia de Crimes Di- gitais da Polícia Federal, que cuida de casos relacionados a ocorrên- cias pela internet, e o Disque 100, um número gratuito para denún- cia de quaisquer casos de viola- ção dos direitos humanos. Uma estratégia que pode au- xiliar os pais a saberem se seus filhos são vítimas de cyber- bullying é o uso de softwares de controles, ou de parental con- trol, como são chamados. Segun- do a professora Ana Maria Al- buquerque, neste caso, é impor- tante que o programa esteja ins- talado em todas as máquinas da casa e que elas estejam em lo- cais de comum acesso, como a sala, o hall ou a cozinha. Ela, no entanto, alerta que a solução não pode se limitar a isto. “O uso de software parental control não substitui o diálogo em casa so- bre vida digital.” Indícios de ocorrência de bullying •Sintomas físicos: queixas constantes de dor de cabeça, tonturas, náuseas, diarreia, enurese (incontinência de urina), excesso de sono ou insônia, perda de apetite, dores generalizadas no corpo, apresentar arranhões ou machucados. •Sintomas psicossomáticos: gastrite, úlcera, bulimia, anorexia, rinite, obesidade. •Problemas de saúde mental: ansiedade, pesadelos, pensamentos persecutórios, oscilação de humor, síndrome do pânico, psicoses, depressão, pensamentos suicidas e suicídio. •Comportamentos que podem indicar cyberbullying: apresentar ansiedade após o uso da internet, aparentando perturbação; diminuir o tamanho da tela sempre que um adulto passa por perto; apagar sempre o histórico dos sites navegados; isolar-se da família e dos amigos; SERVIÇO Safarnet: [email protected] Polícia de Crimes Digitais da PF: www.crimespelainternet.com.br/ delegacias-de-crimes-digitais Disque Direitos Humanos: 100 Blog sobre cyberbullying: e- proinfo.mec.gov.br/eproinfo/blog/ bullying DALIANE CASTANHO Errata - Na reportagem “Bullying: um mal que atormenta as escolas”, publicada pela FOLHA DIRIGIDA na última terça-feira, dia 1º, foi divulgado, de forma equivocada, que o livro Almanaque da Cidadania era da editora WAK. A publicação, na verdade, é da Editora Paulus. GABRIEL NASCIMENTO [email protected] Autor do livro Almanaque da Cidadania (Editora Paulus), o escritor João Pedro Roriz tem re- alizado palestras em escolas para falar, entre outros temas, sobre o bullying. Segundo ele, a preocu- pação maior em torno da ques- tão é o fato de que as agressões sofridas, principalmente na infân- cia, ter consequências para toda a vida. “Uma situação que acon- tece dentro da escola contamina a vida de uma criança, porque a escola é a vida dessa criança”, destacou o especialista. FOLHA DIRIGIDA - COMO PODEMOS DIFERENCIAR O BULLYING DE UMA AGRESSÃO COMUM? João Pedro Roriz - O bullying é aquela violência que acontece todos os dias. Existe a crise indi- vidual, ou entre dois indivíduos, que não pode ser considerada bullying. O bullying, quando acontece, ele não é tão facilmente diagnosticado, por isso é muito difícil você perceber o que está acontecendo na escola. O profes- sor precisa ter muito “jogo de cin- tura” porque o bullying é uma violência invisível, e quando você vê, já contaminou todo o ambi- ente. Normalmente a vítima tem medo de dizer que está sofren- do esse tipo de violência. POR QUE ESTE PROBLEMA TEM PRE- OCUPADO TANTO AS ESCOLAS? Porque sabemos que desde a cri- ação da primeira escola, existe bullying, desde o momento em que se criou a primeira comuni- dade. Bullying não é um fenôme- no que acontece apenas nas es- colas, em todo lugar em que há uma comunidade, existe o bullying. O que a gente pode fa- zer é um trabalho de prevenção para que isso não venha a ocor- rer. Qual é o porquê da preocu- pação? Nós sabemos que a cur- to, médio e longo prazo, as víti- mas do bullying sofrem traumas que podem se estender até a vida adulta, e uma situação que acon- tece dentro da escola contamina a vida de uma criança, porque a escola é a vida dessa criança. É ali que ele tem seus melhores ami- gos, ali ele tem os primeiros con- tatos sociais, ali ele entra em contato com o ideal de autorida- de, etc. Quando uma situação de violência acontece e ele vê cair por terra a ideia de autoridade, o poder do Estado, ele começa a duvidar desse estado, duvida da autoridade, duvida de si, ele passa a querer fazer justiça com as pró- prias mãos. Daí até partir para vingança é um pulo. Então nós não vemos o bullying como um problema de escola. O bullying é um problema socioeducativo, que quanto mais for inibido, melhor, porque nós vamos criar uma sociedade mais justa. O SENHOR DISSE QUE ISSO COMEÇA NA INFÂNCIA, MAS NÓS REPARAMOS QUE O BULLYING TEM UM PESO MUI- TO GRANDE NA ADOLESCÊNCIA. O SENHOR ACHA QUE ISSO ACONTECE DEVIDO AO PERÍODO DELICADO DE TRANSIÇÃO EM QUE O JOVEM SE ENCONTRA? Existe o bullying desde a primeira infância, mas é o chamado bullying indireto. Acontece quando o bully isola a vítima, cria fofocas e etc., quando a criança chega ao sexto ou sétimo ano, que são os anos mais complicados, essas crianças estão vivendo seus primeiros momentos de liberda- de, e com um detalhe: deixa de ter aquele único professor, que o acompanhou durante toda sua trajetória no primário, que conhe- ce os pais, e passa a ter professo- res que são indiferentes ao que se passa no lar dessas crianças, e esse vácuo de poder, para algu- mas crianças, pode ser avassala- dor, então eu proponho aos pais que não se usem muito como exemplo na hora de dar essa li- berdade aos filhos, que busquem fazer isso de acordo com a neces- sidade da própria criança, do pró- prio adolescente, porque depen- dendo de como for, ele pode sen- tir a falta dessa autoridade, e a criança e o adolescente tem ten- dência a testar o limite do adul- to o tempo inteiro, para saber até onde ele pode agir, e ele vai fa- zer isso como o colega que está na escola. Ele irá testar o limite do outro. Se você tem uma reli- gião e eu tenho outra, eu vou testar o seu limite para saber se você realmente tem certeza do que você está falando. E daí para partir para agressões ou preconceito, para uma situação de estresse, é um pulo. E se eu começar a fazer isso todo dia com você, ou se por acaso já fizeram isso comigo al- guma vez e eu acho que assim eu cresci e eu acho que você deve crescer assim e passo a aplicar esse método com você, a gente vê es- tabelecida uma situação de bullying na escola. O SENHOR ACREDITA, ENTÃO, QUE A LIBERDADE DEMASIADA É UM DOS FATORES QUE PROPICIAM O DESEN- VOLVIMENTO DISSO? Eu não diria que a liberdade de- masiada, eu diria que esse é um momento propício para que as crianças e os adolescentes come- cem a tomar suas primeiras de- cisões e é evidente que ali have- rá erros. Mas os pais têm que es- tar atentos para continuar dando os limites necessários, e de acor- do com a necessidade daquela criança. Todo pai tem que ser um pouco pedagogo, essa história de criar os filhos a sua própria ma- neira não funciona bem. Eu di- ria, inclusive, que os pais deve- riam buscar base em livros de pedagogia e cidadania, pois eles estão cuidando de uma vida muito importante, porque essa criança vai se tornar um adulto e precisará de certos elementos pra se sentir seguro. O SENHOR DEVE TER FALADO IN- CLUSIVE PARA PAIS. O SENHOR, APÓS AS PALESTRAS, NOTA ALGUM RETOR- NO POSITIVO? Sim. Eu acompanho os efeitos após as minhas palestras, porque o que fazemos aqui é suscitar ideias para que os professores entrem no cenário e discutam com os alunos. Nós não temos a pre- tensão de resolver o problema e nem impedir que a violência aconteça na escola, mas a gente planta uma semente. Lembro de uma escola, em Presidente Pru- dente, interior de São Paulo, que um aluno se identificou como bully (o agressor) e falou que praticava sem saber, porque, na verdade, antigamente ele tam- bém sofria bullying, então ele achava que era uma conduta na- tural. Depois de assistir à pales- tra, ele sentiu o que estava fazen- do e pediu desculpas à vítima. Foi uma cena muito bonita, e todos ficaram muito emocionados. Te- nho muitas histórias para contar sobre resoluções de problemas. Há pessoas que ainda adultas lembram daquele garoto ou ga- rota que as perseguiram, isso é muito ruim. ALÉM DE PROMOVER PALESTRAS E EVENTOS COMO ESSES, QUE OUTRAS MEDIDAS O SENHOR ACHA QUE A ESCOLA PODE TOMAR PARA CONSCI- ENTIZAR AS CRIANÇAS? Adoção de livros; é importante, também, identificar aquela pes- soa que tem uma propensão maior a ser a agressora e aquela pessoa que tem a propensão maior a ser a vítima, porque exis- tem vários tipos de vítimas. Nós temos, na literatura de hoje da medicina comportamental, o assunto bullying sendo tratado com muita clareza. Antigamen- te não era. Ou seja, nós temos um apoio que torna mais fácil a identificação desses persona- gens. E depois se identificar isso, é importante ter paciência, por- que o agressor também é uma espécie de vítima das circunstân- cias. Você não sabe o que essa pessoa sofre em casa, o que a levou a agir dessa forma, etc. Lembro de uma escola em Bra- sília que tinha 300 alunos mui- to bem comportados, e apenas um que não se comportava de acordo com as diretrizes da es- cola. A freira, que era professo- ra da escola, disse que no ano seguinte teria que convidá-lo a se retirar. Eu falei: “Você tem 300 alunos bons e uma missão, resto está resolvido. Você tem uma missão que é com esse me- nino e você vai tirá-lo da esco- la?” Ela me ouviu, depois me disse que não iria expulsá-lo. Eu fiquei feliz com isso, porque nós temos, também, que carregar nossa cruz. Há pessoas na vida da gente que nós temos que li- dar com elas, temos que apren- der a ter neuroplasticidade para lidar com essas pessoas. Por mais que você não goste de certa pessoa, você deve aprender a conviver com ela.

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FOLHA DIRIGIDA4 a 10 de abril de 20132 CADERNO DE EDUCAÇÃO

Sinais podem identificar vítimas

Escritor João Pedro Roriz promove palestras sobre bullying em escolas

Educadora recomendaque pais estejamatentos ao que osfilhos acessam na rede

A difícil tarefa de combater o cyberbullyingMAL INVISÍVEL | Anonimato e alcance maior das agressões morais tornam o bullying na internet mais preocupante

Ser vítima de ofensas via internet pode causar danos psicológicos graves

“O bullying é uma violência invisível”

Ana Maria Albuquerque: bullyingfaz cair rendimento escolar

ARQUIVO

Há muito conhecido peloseducadores, o bullying tem assu-mido uma face ainda mais cruele difícil de ser combatida nasescolas. A popularização do aces-so à internet por uso das maisdiferentes formas de comunica-ção móvel e o hábito cada vezmais frequente, entre jovens eadolescentes, de acessar redessociais, geraram o ambiente per-feito para o que se convencionouchamar de cyberbullying, ou seja,a realização de práticas de cons-trangimento e agressão moralpela rede.

Dois aspectos tornam, paramuitos, o cyberbullying aindamais grave que o bullying tradi-cional. Na prática, o anonimato setransforma em um incentivo amais para o agressor. Além disso,a possibilidade de o conteúdo seracessado por qualquer computa-dor ou dispositivo móvel podeaumentar em uma escala incalcu-lável o tormento das vítimas.

Para a educadora e pós-gradu-ada em Educação Infantil, emEducação e Saúde, professora Bi-anca Acampora, o acesso mais fre-quente dos jovens à tecnologia decomunicação móvel amplia, emuito, os riscos do cyberbullying.“Os meios tecnológicos que, apriori, seriam para melhorar e fa-cilitar a vida das pessoas em to-das as áreas estão sendo utiliza-dos para menosprezar e insultar”,comentou a especialista.

Autora do livro Psicopedagogiaclínica: o despertar das potencialida-des (Editora WAK), Bianca Acam-pora ressalta que a prática cyber-bullying, geralmente, é feita poradolescentes sem limites, insen-síveis e inconsequentes. “Em re-lação a colegas de escola e pro-

fessores, as difamações são inten-cionadas e visam mexer com opsicológico da pessoa, deixando-a abatida e desmoralizada peran-te os demais.”

A possibilidade de utilizar ainternet de qualquer lugar tornamais difícil, para as escolas, fis-calizar e restringir o cyberbullying.Por isso, o primeiro passo acon-selhado por especialistas é a ins-tituição verificar o uso de seuspróprios laboratórios de Infor-mática. Afinal, alunos podemutilizar os equipamentos parapostar mensagens contra algumcolega ou mesmo para acessaremails do tipo e, com isso, darpistas sobre se alguém está sen-do constrangido. “O cyberbullyingpode ser visto em comunidadescriadas com o objetivo de ofen-der e xingar pessoas, na manipu-lação de fotos e nos emails ofen-sivos que invadem o espaço ín-timo da vítima”, exemplifica Bi-anca Acampora.

Em casa, os pais podem adotarcuidados semelhantes. Mesmoaqueles que não são muito famili-

arizados com a Informática podeme devem buscar formas de sabercomo os filhos usam a internet. Éo que defende a professora AnaMaria Albuquerque, psicóloga for-mada pela Universidade de Brasí-lia e autora do livro Cyberbullying eoutros riscos na internet: despertado aatenção de pais e professores (EditoraWAK). “No que se refere à ética nainternet e o que deve ser expostopublicamente na web e o que deveficar no privado, os pais possuemum melhor discernimento do queas crianças e os adolescentes”, sali-enta a educadora, que recomendaque os pais busquem sempre teruma postura de diálogo, e não depunição, com os filhos.

“É muito comum o filho nãoexpressar os problemas ou dra-mas existenciais que esteja viven-do referentes às práticas de cyber-bullying por medo de os paisterem reações como, por exem-plo, deixar o filho de castigo, semusar o computador ou até de to-marem uma atitude mais intem-pestiva na escola”, destaca a pro-fessora Ana Maria Albuquerque.

Uma das dificuldades paraidentificar e ajudar alguém quesofre com cyberbullying é o fatode que, muitas vezes, a própriavítima prefere esconder o pesa-delo que está enfrentando. Noentanto, alguns sinais e compor-tamentos pode ajudar os pais eprofessores a saber quando al-guém é alvo de críticas, ofensase agressões morais.

Segundo a professora AnaMaria Albuquerque, existem al-guns sintomas físicos, psicosso-máticos e emocionais que podemser indicativos de bullying tantofísico quanto pela internet. Quei-xas constantes de dor de cabeça,excesso de sono ou insônia, pe-sadelos, obesidade, bulimia,ansiedade, pensamentos persecu-tórios e síndrome do pânico sãoalguns exemplos de comporta-mentos que podem indicar aocorrência do bullying, que pode,inclusive, afetar rendimento nosestudos por parte da vítima e atéde outros alunos do colégio.

“Cabe ressaltar que tanto as prá-ticas de bullying virtual como a dobullying presencial podem gerarqueda do desempenho escolarentre as vítimas, entre os agresso-res e também entre a plateia queassiste a agressão. Quando o cli-ma escolar fica inóspito e violen-to, isso diminui a capacidade deaprendizagem dos alunos em de-corrência deste tipo de estresse entreos alunos e também entre alunose educadores”, ressalta.

Ana Maria Albuquerque tam-bém trabalha com prevenção aobullying e ao cyberbullying noPortal do Professor. Mantido peloMinistério da Educação (MEC),o site possui um blog destinadoespecificamente para a prevençãoao bullying e cyberbullying, comdicas a educadores e pais sobre

como enfrentar o problema.Há outros serviços públicos que

podem ajudar vítimas, pais e es-colas a lidar problemas relacio-nados com o cyberbullying. NaSafernet, a central brasileira decibersegurança, existe um canalchamado Help Online, que possuipsicólogos especializados parareceber denúncias e auxiliar osjovens e suas famílias. Outraopção é a Polícia de Crimes Di-gitais da Polícia Federal, que cuida

de casos relacionados a ocorrên-cias pela internet, e o Disque 100,um número gratuito para denún-cia de quaisquer casos de viola-ção dos direitos humanos.

Uma estratégia que pode au-xiliar os pais a saberem se seusfilhos são vítimas de cyber-bullying é o uso de softwares decontroles, ou de parental con-trol, como são chamados. Segun-do a professora Ana Maria Al-buquerque, neste caso, é impor-tante que o programa esteja ins-talado em todas as máquinas dacasa e que elas estejam em lo-cais de comum acesso, como asala, o hall ou a cozinha. Ela, noentanto, alerta que a solução nãopode se limitar a isto. “O usode software parental control nãosubstitui o diálogo em casa so-bre vida digital.”

Indícios de ocorrência de bullying•Sintomas físicos: queixas constantes de dor de cabeça, tonturas,náuseas, diarreia, enurese (incontinência de urina), excesso de sono ouinsônia, perda de apetite, dores generalizadas no corpo, apresentararranhões ou machucados.

•Sintomas psicossomáticos: gastrite, úlcera, bulimia, anorexia, rinite,obesidade.

•Problemas de saúde mental: ansiedade, pesadelos, pensamentospersecutórios, oscilação de humor, síndrome do pânico, psicoses,depressão, pensamentos suicidas e suicídio.

•Comportamentos que podem indicar cyberbullying: apresentaransiedade após o uso da internet, aparentando perturbação; diminuir otamanho da tela sempre que um adulto passa por perto; apagar sempre ohistórico dos sites navegados; isolar-se da família e dos amigos;

SERVIÇOSafarnet: [email protected]ícia de Crimes Digitais da PF:www.crimespelainternet.com.br/delegacias-de-crimes-digitaisDisque Direitos Humanos: 100Blog sobre cyberbullying: e-proinfo.mec.gov.br/eproinfo/blog/bullying

DALIAN

E CASTANH

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Errata - Na reportagem “Bullying: um mal que atormenta as escolas”, publicada pela FOLHA DIRIGIDA na última terça-feira, dia 1º, foi divulgado, de formaequivocada, que o livro Almanaque da Cidadania era da editora WAK. A publicação, na verdade, é da Editora Paulus.

GABRIEL [email protected]

Autor do livro Almanaque daCidadania (Editora Paulus), oescritor João Pedro Roriz tem re-alizado palestras em escolas parafalar, entre outros temas, sobre obullying. Segundo ele, a preocu-pação maior em torno da ques-tão é o fato de que as agressõessofridas, principalmente na infân-cia, ter consequências para todaa vida. “Uma situação que acon-tece dentro da escola contaminaa vida de uma criança, porque aescola é a vida dessa criança”,destacou o especialista.

FOLHA DIRIGIDA - COMO PODEMOSDIFERENCIAR O BULLYING DE UMAAGRESSÃO COMUM?João Pedro Roriz - O bullying éaquela violência que acontecetodos os dias. Existe a crise indi-vidual, ou entre dois indivíduos,que não pode ser consideradabullying. O bullying, quandoacontece, ele não é tão facilmentediagnosticado, por isso é muitodifícil você perceber o que estáacontecendo na escola. O profes-sor precisa ter muito “jogo de cin-tura” porque o bullying é umaviolência invisível, e quando vocêvê, já contaminou todo o ambi-ente. Normalmente a vítima temmedo de dizer que está sofren-do esse tipo de violência.

POR QUE ESTE PROBLEMA TEM PRE-OCUPADO TANTO AS ESCOLAS?Porque sabemos que desde a cri-ação da primeira escola, existebullying, desde o momento emque se criou a primeira comuni-dade. Bullying não é um fenôme-no que acontece apenas nas es-colas, em todo lugar em que háuma comunidade, existe obullying. O que a gente pode fa-zer é um trabalho de prevençãopara que isso não venha a ocor-rer. Qual é o porquê da preocu-pação? Nós sabemos que a cur-to, médio e longo prazo, as víti-mas do bullying sofrem traumasque podem se estender até a vidaadulta, e uma situação que acon-tece dentro da escola contaminaa vida de uma criança, porque aescola é a vida dessa criança. É alique ele tem seus melhores ami-gos, ali ele tem os primeiros con-tatos sociais, ali ele entra emcontato com o ideal de autorida-de, etc. Quando uma situação deviolência acontece e ele vê cair porterra a ideia de autoridade, opoder do Estado, ele começa aduvidar desse estado, duvida daautoridade, duvida de si, ele passaa querer fazer justiça com as pró-prias mãos. Daí até partir paravingança é um pulo. Então nós

não vemos o bullying como umproblema de escola. O bullyingé um problema socioeducativo,que quanto mais for inibido,melhor, porque nós vamos criaruma sociedade mais justa.

O SENHOR DISSE QUE ISSO COMEÇANA INFÂNCIA, MAS NÓS REPARAMOSQUE O BULLYING TEM UM PESO MUI-TO GRANDE NA ADOLESCÊNCIA. OSENHOR ACHA QUE ISSO ACONTECEDEVIDO AO PERÍODO DELICADO DETRANSIÇÃO EM QUE O JOVEM SEENCONTRA?Existe o bullying desde a primeirainfância, mas é o chamadobullying indireto. Acontecequando o bully isola a vítima, criafofocas e etc., quando a criançachega ao sexto ou sétimo ano, quesão os anos mais complicados,essas crianças estão vivendo seusprimeiros momentos de liberda-de, e com um detalhe: deixa deter aquele único professor, que oacompanhou durante toda suatrajetória no primário, que conhe-ce os pais, e passa a ter professo-res que são indiferentes ao quese passa no lar dessas crianças, eesse vácuo de poder, para algu-mas crianças, pode ser avassala-dor, então eu proponho aos paisque não se usem muito comoexemplo na hora de dar essa li-berdade aos filhos, que busquemfazer isso de acordo com a neces-sidade da própria criança, do pró-prio adolescente, porque depen-dendo de como for, ele pode sen-tir a falta dessa autoridade, e acriança e o adolescente tem ten-dência a testar o limite do adul-to o tempo inteiro, para saber atéonde ele pode agir, e ele vai fa-zer isso como o colega que estána escola. Ele irá testar o limitedo outro. Se você tem uma reli-gião e eu tenho outra, eu vou testaro seu limite para saber se você

realmente tem certeza do quevocê está falando. E daí para partirpara agressões ou preconceito,para uma situação de estresse, éum pulo. E se eu começar a fazerisso todo dia com você, ou se poracaso já fizeram isso comigo al-guma vez e eu acho que assim eucresci e eu acho que você devecrescer assim e passo a aplicar essemétodo com você, a gente vê es-tabelecida uma situação debullying na escola.

O SENHOR ACREDITA, ENTÃO, QUE ALIBERDADE DEMASIADA É UM DOSFATORES QUE PROPICIAM O DESEN-VOLVIMENTO DISSO?Eu não diria que a liberdade de-masiada, eu diria que esse é ummomento propício para que ascrianças e os adolescentes come-cem a tomar suas primeiras de-cisões e é evidente que ali have-rá erros. Mas os pais têm que es-tar atentos para continuar dandoos limites necessários, e de acor-do com a necessidade daquelacriança. Todo pai tem que ser umpouco pedagogo, essa história decriar os filhos a sua própria ma-neira não funciona bem. Eu di-ria, inclusive, que os pais deve-riam buscar base em livros depedagogia e cidadania, pois elesestão cuidando de uma vidamuito importante, porque essacriança vai se tornar um adulto eprecisará de certos elementos prase sentir seguro.

O SENHOR JÁ DEVE TER FALADO IN-CLUSIVE PARA PAIS. O SENHOR, APÓSAS PALESTRAS, NOTA ALGUM RETOR-NO POSITIVO?Sim. Eu acompanho os efeitosapós as minhas palestras, porqueo que fazemos aqui é suscitarideias para que os professoresentrem no cenário e discutam comos alunos. Nós não temos a pre-

tensão de resolver o problema enem impedir que a violênciaaconteça na escola, mas a genteplanta uma semente. Lembro deuma escola, em Presidente Pru-dente, interior de São Paulo, queum aluno se identificou comobully (o agressor) e falou quepraticava sem saber, porque, naverdade, antigamente ele tam-bém sofria bullying, então eleachava que era uma conduta na-tural. Depois de assistir à pales-tra, ele sentiu o que estava fazen-do e pediu desculpas à vítima. Foiuma cena muito bonita, e todosficaram muito emocionados. Te-nho muitas histórias para contarsobre resoluções de problemas.Há pessoas que ainda adultaslembram daquele garoto ou ga-rota que as perseguiram, isso émuito ruim.

ALÉM DE PROMOVER PALESTRAS EEVENTOS COMO ESSES, QUE OUTRASMEDIDAS O SENHOR ACHA QUE AESCOLA PODE TOMAR PARA CONSCI-ENTIZAR AS CRIANÇAS?Adoção de livros; é importante,também, identificar aquela pes-soa que tem uma propensãomaior a ser a agressora e aquelapessoa que tem a propensãomaior a ser a vítima, porque exis-tem vários tipos de vítimas. Nóstemos, na literatura de hoje damedicina comportamental, oassunto bullying sendo tratadocom muita clareza. Antigamen-te não era. Ou seja, nós temosum apoio que torna mais fácil aidentificação desses persona-gens. E depois se identificar isso,é importante ter paciência, por-que o agressor também é umaespécie de vítima das circunstân-cias. Você não sabe o que essapessoa sofre em casa, o que alevou a agir dessa forma, etc.Lembro de uma escola em Bra-sília que tinha 300 alunos mui-to bem comportados, e apenasum que não se comportava deacordo com as diretrizes da es-cola. A freira, que era professo-ra da escola, disse que no anoseguinte teria que convidá-lo ase retirar. Eu falei: “Você tem300 alunos bons e uma missão,resto está resolvido. Você temuma missão que é com esse me-nino e você vai tirá-lo da esco-la?” Ela me ouviu, depois medisse que não iria expulsá-lo. Eufiquei feliz com isso, porque nóstemos, também, que carregarnossa cruz. Há pessoas na vidada gente que nós temos que li-dar com elas, temos que apren-der a ter neuroplasticidade paralidar com essas pessoas. Pormais que você não goste de certapessoa, você deve aprender aconviver com ela.