escritor invisível

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EDITOR-COORDENADOR: ADALBERTO MEIRELES / [email protected] SÁB SALVADOR 27/2/2010 SEG PERSONA TER POP QUA VISUAIS QUI CENA SEX CINE HOJE LETRAS DOM SHOP 2 BEATLES LIVRO DE STEVE TURNER MERGULHA NO PROCESSO DE CRIAÇÃO DA BANDA 7 DVD GLOBO LANÇA ADAPTAÇÃO DE WALTER AVANCINI PARA GRANDE SERTÃO: VEREDAS, DE JOÃO GUIMARÃES ROSA 10 TV Globo / Divulgação LETRAS Autor premiado, João Silvério Trevisan questiona a falta de visibilidade da sua obra pelo fato de ser homossexual. Em abril, Rei do cheiro recebe o prêmio de Melhor Romance de 2009, concedido pela APCA Escritor invisível Lima Trindade / Divulgação Trevisan: 34 anos de carreira e 11 livros publicados PEDRO FERNANDES João Silvério Trevisan é desses autores que inexplicavalmente passam batidos pela mídia. Com 34 anos de carreira, 11 livros publicados e grande ha- bilidade e inventividade narra- tiva, já foi vencedor de três prê- mios Jabuti, o mais importante do Brasil. Ainda assim o silêncio após o lançamento de um de seus livros pode ser bastante revelador. Ser escritor no Brasil pode ser frus- trante, pela falta de público lei- tor, mas ser escritor e homos- sexual é pior ainda. João, sem medo de bancar o coitado, pois não reclama, pro- testa, se sente ignorado pelo fato de ser homossexual e de parte dos seus livros tratarem dessa temática. “Meus livros não têm interesse por serem es- critos por um viado , para via- dos”, disse em entrevista à re- portagem de A TARDE. O rótulo que pesa sobre sua produção, em vez de garantir de público cativo, como muitos po- dem pensar, para ele só afasta potenciais consumidores. “Uma literatura de temática homos- sexual, se carimbada, não vai ser lida pelo público heteros- sexual, que não tem nenhum motivo para ler, se o livro tiver interesse”, diz. Longe da temática homosse- xual, seu último livro ainda sofre com as consequências do rótulo. Rei do Cheiro trata da formação da fortuna da elite paulista sob o ponto de vista de um filho de imigrantes e, embora vá receber em abril deste ano o prêmio de Melhor Romance de 2009, con- cedido pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), João acredita que o livro tem sido pouco lido e comentado. LEIA MAIS NA PÁGINA 4 O rótulo que pesa sobre sua produção, para ele, só afasta potenciais consumidores

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Matéria e entrevista com o escritor e militante gay João Silvério Trevisan sobre o livro Rei do Cheiro, publicada no Caderno 2+

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Page 1: Escritor Invisível

EDITOR-COORDENADOR: ADALBERTO MEIRELES / [email protected]

SÁBS A LVA D O R2 7/ 2 / 20 1 0

SEG P E R SO N ATER POPQUA V I S UA I SQUI CENASEX CINEHOJE L E T R ASDOM SHOP 2 BEATLES LIVRO DE STEVE TURNER MERGULHA

NO PROCESSO DE CRIAÇÃO DA BANDA 7

DVD GLOBO LANÇAADAPTAÇÃO DE WALTERAVANCINI PARA G RA N D ESERTÃO: VEREDAS, DE JOÃOGUIMARÃES ROSA 10

TV Globo / Divulgação

LETRAS Autor premiado, João SilvérioTrevisan questiona a falta de visibilidade dasua obra pelo fato de ser homossexual. Emabril, Rei do cheiro recebe o prêmio de MelhorRomance de 2009, concedido pela APCA

Escritorinvisível

Lima Trindade / Divulgação

T r ev i s a n :34 anosde carreirae 11 livrospublicado s

PEDRO FERNANDES

João Silvério Trevisan é dessesautores que inexplicavalmentepassam batidos pela mídia.Com 34 anos de carreira, 11livros publicados e grande ha-bilidade e inventividade narra-tiva, já foi vencedor de três prê-mios Jabuti, o mais importantedo Brasil.

Ainda assim o silêncio após olançamento de um de seus livrospode ser bastante revelador. Serescritor no Brasil pode ser frus-trante, pela falta de público lei-tor, mas ser escritor e homos-sexual é pior ainda.

João, sem medo de bancar ocoitado, pois não reclama, pro-

testa, se sente ignorado pelofato de ser homossexual e departe dos seus livros trataremdessa temática. “Meus livrosnão têm interesse por serem es-critos por um viado , para via-dos”, disse em entrevista à re-portagem de A TARDE.

O rótulo que pesa sobre suaprodução, em vez de garantir depúblico cativo, como muitos po-dem pensar, para ele só afastapotenciais consumidores. “Umaliteratura de temática homos-sexual, se carimbada, não vaiser lida pelo público heteros-sexual, que não tem nenhummotivo para ler, se o livro tiverinteresse”, diz.

Longe da temática homosse-xual, seu último livro ainda sofrecom as consequências do rótulo.Rei do Cheiro trata da formaçãoda fortuna da elite paulista sobo ponto de vista de um filho deimigrantes e, embora vá receberem abril deste ano o prêmio deMelhor Romance de 2009, con-cedido pela Associação Paulistade Críticos de Arte (APCA), Joãoacredita que o livro tem sidopouco lido e comentado.

LEIA MAIS NA PÁGINA 4

O rótulo quepesa sobre suaprodução, paraele, só afastapotenciaisconsumidores

Page 2: Escritor Invisível

5SALVADOR SÁBADO 27/ 2 / 201 04 SALVADOR SÁBADO 27/ 2 / 201 02 2

Uma literaturade temáticahomossexual, secarimbada, não vaiser lida pelo públicoheterossexual

Veja o Big Brotheragora, que colocoutrês homossexuaise um homofóbicono programa parater Ibope

Um escritor naminha idade esituação vive umamarginalidade desolução bastantecomplicada

ENTREVISTA João Silvério Trevisan

L I V R OS NO TWITTER DA EDITORA COSACNAIFY, O LEITOR FICA SABENDO DOSLANÇAMENTOS, PROMOÇÕES E EVENTOSw w w .t w i t t e r . c o m /c o s a c n a i f y

“LITERATURA NEGRA, GAY,FEMINISTA. TUDO ISSOCRIA SUBCATEGORIAS“PEDRO FERNANDES

João Silvério Trevisan está desconfiado. Já tem tempo demais de estrada para saber que o terrenoonde pisa é árido, mas não deixa de espalhar suas sementes por aí. Reclama, protesta, mas não saide vítima. Sem se render ao cinismo e ao jogo fácil, o autor de Devassos no paraíso (livro que contaa história dos homossexuais no Brasil desde a época da colônia) e Ana em Veneza não desiste de exporsuas ideias contundentes sobre a nossa sociedade. Militante homossexual, fundou em 1978, entrea repressão da direita e a ortodoxia da esquerda, o jornal O Lampião da Esquina que discutia direitose identidade gay. No ano passado, lançou O rei do cheiro, livro que conta a história de Ruan CarlosCoronado, um filho de imigrantes espanhóis que experimenta a ascensão social por meio de umafábrica de perfumes que serve de fachada para negócios escusos como o tráfico de drogas. Com umanarrativa rapsódica, à qual se justapõem referências à cultura radiofônica, televisiva e musical dosúltimos 50 anos, o autor alude à formação da elite paulista e seus desdobramentos sociais, comoas redes de corrupção e a criação da facção criminosa PCC. O livro recebeu o prêmio de melhor romanceda Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) para a admiração de João, que disse acreditar queninguém estivesse lendo. “Fiquei surpreso com o prêmio, com o reconhecimento e com a lembrançade que existo e de que estou no pário”. A entrega do prêmio será realizada no dia 6 de abril de 2010.Em entrevista concedida por telefone, o paulista João Silvério Trevisan falou sobre O rei do cheiro,televisão, literatura com temática homossexual, a falta de diversidade das atuais revistas específicaspara o público gay (“se você ler uma, tem a impressão que leu todas“), do roteiro que escreveu parao filme Fortunato e Justina, de Reinaldo Pinheiro, e sobre discriminação (positiva ou negativa, paraele é a mesma coisa).

Essa violência nãofoi uma coisa quecaiu do céu. Vemdesde a escravidão,pelas mãos daselites sugadoras

Whitney Houstondesmente rumores

A diva pop norte-americanaWhitney Houston garante quesua turnê australiana está indomuito bem, mas não é essa aopinião de fãs e críticos. Desdeque iniciou a turnê de seisshows, na segunda-feira, emBrisbane, Houston vem enfren-tando queixas. Alguns fãs saí-ram no meio das apresenta-ções, outros pediram o reem-bolso dos ingressos e ainda ou-tros reclamaram, dizendo quesua voz está desafinada e elaparecia exausta nos shows. Suaagente divulgou nota desmen-tindo os rumores segundo osquais a cantora estaria com pro-blemas de saúde.

Cantora enfrenta críticassobre sua performance

Divulgação

A editora Abril lançou ontem sua nova coleção de Clássicos Abril.São 35 volumes, incluindo títulos como Orgulho e preconceito, deJane Austin. O livro virou filme com a atriz Keira Nightley

Abril relançaclássicos

Gibi de Batman porUS$ 1,075 milhão

As primeiras aparições de Su-perman e Batman em gibis que-braram recordes de valor devenda em leilões e romperam abarreira de US$ 1 milhão, emuma época em que os inves-timentos tradicionais vêm sesaindo mal. Um gibi de 1939,em que a figura do mascaradoBatman combatendo o crimeapareceu pela primeira vez, foivendido em leilão, em Dallas,pelo valor recorde de US$ 1,075milhão, segundo a HeritageAuction Galleries. Três dias an-tes, um comprador pagou US$1 milhão pela estreia mundialde Superman, na primeira edi-ção da Action Comics.

Clarividência emAlém da Escuridão

A escritora inglesa Hilary Man-tel, conhecida no Brasil por umvolumoso romance históricosobre a Revolução Francesa,A sombra da guilhotina (Re-cord/2009), volta ao mercadoeditorial nacional com o lan-çamento de Além da escuridão(Bertrand Brasil, 420 páginas,R$ 45), seu nono livro, consi-derado uma obra-prima de hu-mor negro e que conta o ajustede contas de uma clarividentede meia-idade com seu passa-do. Mantel é vencedora do ManBooker Prize 2009, o prestigia-do prêmio literário inglês que jádestacou autores como IanMcEwan e J. M. Coetzee.

Vinil volta com tudoem quatro LPs

A tão alardeada volta dos discosde vinil nacionais finalmente seconcretiza. Com a Polysom, úni-ca do gênero na América Latina,reativada no Rio, em abril de2009, a Deckdisc anuncia parao início de março o relançamen-to de quatro álbuns do pop-rocknacional, que fizeram barulhonos três últimos anos. São elesOnde Brilhem os Olhos Seus (deFernanda Takai), Fome de Tudo(Nação Zumbi), Chiaro s curo(Pitty) e Cinema ( Ca c h o r r oGrande). O mais recente, de2009, é o de Pitty, que faráshow para marcar o lançamen-to do LP na próxima sexta-feira,no Circo Voador, no Rio.

★★★★★

W W W. C A D E R N O 2 M A I S . ATA R D E . C O M . B R

Em vídeo gravado na Balada Literária, em 2009, o autor de Rei doc h e i r o, João Silvério Trevisan, lê trecho de seu livro em que opersonagem Ruan Carlos Coronado, num delírio de cocaína, resolveengarrafar o cheiro de Deus.

Um mergulhono mundopatético daselites brasileiras

MARCELO DANTASJornalista, mestre emadministração e doutor emsociologia

O novo romance de João SilvérioTrevisan reafirma o seu papel dedupla importância na literaturabrasileira: por um lado, ampliaras possibilidades estilísticas danarrativa e da linguagem e, poroutro, usar da sua capacidadede ousar, para provocar o leitor,tirá-lo das certezas confortáveise levá-lo a uma experiência es-tética para ser desfrutada comaguçado espírito crítico.

Rei do cheiro (Record) é maisuma demonstração da versati-lidade desse autor, que se ini-ciou na literatura através decontos, publicados nos livrosTestamento de Jônatas deixa-do a David (1976), O livro doa ve s s o (1992) Troços e destro-ç os (1997). O talento de Tre-visan e o seu impacto como au-tor levaram a que um dos seuscontos mais célebres O onanistafigurasse na coletânea os Cemmelhores contos do Brasil. Tre-visan estreou no gênero roman-ce com Em nome do desejo(1983), uma ode à sacralidadedo amor e um grito contra aopressão religiosa.

Em Vagas notícias de MelinhaM a rc h i o t i (1984), seu segundoromance, Trevisan se reencon-tra com sua trajetória de artistade vanguarda e contrói um ro-mance de signos. História e dis-curso seguem sempre a mesmalinha de desconstrução narra-tiva e o caos é ordenado me-ticulosamente pelo seu talentode escritor rigoroso e livre. Masé com seu terceiro romance, Anaem Veneza, que a literatura deJoão Silvério Trevisan alcança osublime e ele consegue realizara sua obra prima, indicado aoprêmio Jabuti, o mais impor-tante da literatura brasileira.Também publicado na Alema-nha, o livro é um dos mais im-portantes da literatura contem-porânea nacional.

Com Rei do cheiro, Trevisanabandona o lirismo da obra an-terior e produz um romance delinguagem telegráfica, de pará-grafos curtos, de capítulos rá-pidos, e, através de elementosda música popular, propagan-das, novelas de rádio e TV, recriao Brasil dos anos 50 até a atua-lidade tendo como personagemcentral um brasileiro de origemhumilde que, graças à inteligên-cia, charme e falta de escrúpu-los, torna-se um membro danossa elite empresarial.

É impressionante como o livromais leve até agora escrito porTrevisan, essa obra cheia de hu-mor, que usa e abusa da ba-nalidade através dos elementosde comunicação de massa, aca-be sendo ao mesmo tempo suaobra mais cáustica, sua críticamais feroz às nossas mazelas.Página a página, Trevisan vaitecendo um panorama patéticoe estarrecedor do mundo dosricos e poderosos.

Esse percurso de canalhice im-pune chega ao auge no momen-to em que 1200 VIPs ficam pre-sos num teatro em São Paulo,sequestrados por uma milíciacriminosa. Milionários, políti-cos, celebridades e golpistas for-mam a fauna humana expostaa suas fragilidades, numa situa-ção de imobilidade. Essa partefinal da trama lembra uma dasobras primas de Buñuel, O AnjoExterminador: ninguém escapade se defrontar com a própriacondição abjeta. Sem piedade,Trevisan coloca a nata das elitesbrasileiras mergulhada em su-jeira e excrementos.

Humanista e terno, Trevisannão consegue, felizmente, es-capar ao seu impulso de vida eacaba permitindo, ao seu pro-tagonista, um pouco de ar.

Ilustração Gentil

Logo no início do livro, o senhorescreve: “Esse olhar procura acara do Brasil”. Os irmãos gê-meos Ruan Carlos e Carlos Ruansão as possíveis caras Brasil?

Eu acho que sobretudo oRuan Carlos. Minha preten-são era escrever um persona-gem com a cara do Brasilatual, com toda contradição etoda arquitetura psicológicade um típico personagem doBrasil de hoje, que é um paístodo voltado para a articula-ção de um projeto de poder in-ternacional, pretensão de li-derança no mundo, mas comgraves problemas sociais, es-truturais, que configuram umpouco a imagem de uma ma-deira bonita por fora mas co-mida por cupim por dentro.

Pensei no Carlos Ruan, por tal-vez representar um Brasil mar-ginalizado, que manteve seusideais, mas não deu certo.

Eu não poderia entrar em de-talhes sobre o Carlos, porqueele é um personagem muitosecundário e não chega a fa-zer uma contraposição aoRuan. Há um determinadomomento em queele se tornavagamente protagonista.Mais uma testemunhado queprotagonista. A minha gran-de contraposição é o final dasduas crianças mamando nastetas da cadela sarnenta, é aimagem de contraposição aoprojeto deBrasil queproduziuoPCCe todaviolênciacoletivade todo o País. Essa violêncianão foi uma coisa que caiu docéu. Vem desde a escravidão,pelas mãos das elites sugado-ras de energia do País e de to-doquadro decorrupçãotrata-do na segunda parte do livro.

O livro tem muitas referências àcultura televisiva e musical até

os anos 80. Depois disso há me-nos referências a novelas e mú-sica pop. Por que motivo?

Não é poraí. A questão éque asegunda parte do romancetem um outro enfoque. A pri-meira parte é toda costuradaem cima da produção da in-dústria cultural brasileira,porque o personagem tam-bém é um produto dessa in-dústria. Quando você entrana segunda parte, já não meinteressa tanto isso, o que meinteressa são os raps ligadosao PCC eaos bandidos, sobre-tudo aqui em São Paulo. En-tão fiz uma pesquisa aqui naGaleria do Rock que tem mui-tas pequenas produtoras etambém na internet. O focomuda da primeira parte, on-do é micro, centrado no per-sonagem principal, para a se-gunda parte onde o foco émais panorâmico. Então nãome interessou tanto essa col-cha de retalhos da cultura demassa. Me interessava maiscaracterizar a elite paulistana.Então, recorte de jornal, en-trevistas, tudo isso continuana segunda parte.

O personagem tem uma trajetó-ria parecida com a de um heróide telenovela, que saido nada echega ao topo. Como acontece,por exemplo, em Rainha da Su-cata, que o senhor cita em al-gum momento. O senhor con-some telenovelas?

Não, apesar de gostar muitodas ideias do Silvio de Abreu,da sua ironia, mas, em todocaso, a Rainha daSucata é queé parecida com o Ruan. Elanão saiu da cabeça do Silviode Abreu, assim como o Ruan,até certo ponto, não saiu daminha. Num estado comoSão Paulo, todo povoado porimigrantes e netos de imi-

grantes, esse processo de as-cenção social é muito forte.Essas histórias permeiam to-doomapa socioculturaldoes-tado de São Paulo.

Num país como o Brasil, comuma cultura televisiva tão forte,o senhor acha que as telenove-las podem ser úteis no avançoda discussão dos direitos doshomossexuais? “Um beijo gayexibido pela TV ajudaria?

A minha ideia eu já expresseivárias vezes. Qualquer coisafunciona nas novelas se aju-dar a Globo a aumentar o Ibo-pe. Veja o Big Brother a g o ra ,que colocou três homosse-xuais e um homofóbico noprograma para ter Ibope. E es-tão conseguindo. A mídia temuma capacidade de manipu-lação espantosa. Para o beme para o mal. Mas não entro

Sony Music / Divulgação

BIBLIOGRAFIA

Testamento de Jônatasdeixado a David (conto s,1976, Brasiliense)

As incríveis aventuras de ElCóndor (romance, 1980,B ra s i l i e n s e )

Em nome do desejo(romance, 1983, Record)

Vagas notícias de MelinhaMarchiotti (romance, 1984,Global)

Devassos no paraíso(ensaio, 1986, Record)

O livro do avesso (romance,1992, Ars Poética)

Ana em Veneza (romance,1994, Record)

Troços & destroços (conto s,1997, Record)

Seis balas num buraco só: acrise do masculino ( e n s a i o,1998, Record)

Pedaço de mim (ensaios eartigos, 2002, Record)

Rei do cheiro (romance,2009, Record)

no mérito, pois para mim tu-do é manipulação.

O Ministério da Cultura e a Se-cretaria de Cultura do Estado daBahiacult têm editais de fomen-to à literatura LGBT. Você achaque existe uma literatura gay,um cinema gay? Ou só são te-máticas?

Eu não vejo nenhum motivopara separar, a não ser paradiminuir. Literatura negra,gay, feminista. Tudo isso sãoadjetivos que criam subcate-gorias. Acho que segmenta-ção prejudica muito. Dar prê-mio especial para livros de te-mática homossexual é muitodiscutível, porque pode atéincentivar a produção, masnão vai desová-la. A tendên-cia é que uma literatura mar-cada, carimbada, só seja con-sumida pelas pessoas que es-

tejam enquadrada pelo ca-rimbo. Uma literatura de te-mática homossexual, se ca-rimbada, não vai ser lida pelopúblico heterossexual, que éum público que não tem ne-nhum motivo para ler. Nóshomossexuais lemos comprazer imenso obras primascomo Romeu e Julieta. Achoque há por trás disso um pre-conceito muito sutil, a pesarda coisa se articular muitas ve-zes em meio à boa vontade.Mas, como tem todo esse de-mocratismo multiculturalis-ta, que me deixa com um péatrás, começamos a ter todasessas segmentações que, nolimite, são prejudiciais. A Edi-tora Record abriu uma cole-ção chamada Contra Luz quefechou porque nãoteve públi-co consumidor. Era uma cole-ção que discutia temas de se-

xualidade destoante, acaba-va sendo basicamente ho-mossexualidade, e não foipra frente. Ela se dirige a umpúblico muito restrito.O restodo público não consome por-que olha para aquilo como sefossem cartas marcadas.

O senhor fundou a primeira pu-blicação gay do Brasil, o jornal OLampião da Esquina. Hoje te-mos algumas revistas de temá-tica homossexual nas bancas. Osenhor lê alguma delas? O quepensa sobre elas?

Conheço mais a G Magazine,onde tenho uma coluna. Àsoutras eu tenho pouco acessoe as considero muito pareci-das. Se você ler uma, tem aimpressão que leu todas.Achoqueelas visamomesmopúblico, tem o mesmo objeti-vo, mesmos temas e trata-

mento gráfico, inclusive.

O fato de elas conseguirem semanter, ter anunciantes, refleteuma mudança na sociedade?Como o senhor avalia?

Se você olhar bem para osanúncios dessas revistas, sãode pequenas empresas liga-das ao público gay. De modoque acho que as coisas nãomelhoraram muito. Para con-trapor a isso que você está di-zendo, perceba o número derevistas voltadas parao públi-co LGBT ou GLS que desapare-ceram. Isso não acontece porfalta de público, mas por faltade publicidade. Sem isso nãohá possibilidadede semanterno mercado.

O senhor escreveu o roteiro deFortunato e Justina. Em que faseestá a produção do longa?

Fortunato e Justina é a histó-ria de amor entre uma meni-na negra e um velho ladrãodecadente. O filme tem dire-ção de Reinaldo Pinheiro(Nossa Vida Não Cabe NumOpala) e está em fase de cap-tação e não sei quando come-çará a ser filmado. Tenho ou-tros roteiros, mas que estãoem situações mais frágeis.

O senhor afirmou em entrevistarecente que o silêncio da crítica édoloroso e frustrante após o lan-çamento do livro. Num país detão poucos leitores, é frustranteser escritor no Brasil?

Até certo ponto. Mas é muitomais frustrante ser escritorhomossexual no Brasil. Por-que a mídia não te perdoa.Basicamente é isso. Você ficacarimbado de uma maneirapreconceituosa. Não interes-

sa porque é o livro de um via-do escrevendo para viados.Esse é o subtexto.

Como recebeu a notícia que foipremiado pela Associação Pau-lista de Críticos de Arte (APCA)?

Fiquei muito feliz, porqueachei que ninguém estavalendo meu livro. Saíram noti-nhas minúsculas. Tenho 34anos de carreirae nunca tinhasaído uma resenha sobre umlivromeuna Ve j a . E agora saiuuma notinha. Fiquei surpresocom o prêmio da APCA, com oreconhecimento e com a lem-brança de que existo e de queestou no pário.Um escritor naminha idade ena minha situa-ção acaba vivendo uma mar-ginalidade de solução bas-tante complicada. Digo issonão para reclamar, mas parap r o t e s t a r.

Capa do gibique bateurecorde deve n d a

AFP