luiz carlos dos santos gonçalves · advogado, presidente da comissão de reforma política da oab...
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Procurador Regional Eleitoral de São Paulo
DEBATE
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Sim
mesmo partido concorrem entre si e as circunscrições eleitorais podem serimensas, os custos da campanha são enormes e foram buscados lícita e, comdenodo, ilicitamente.
É certo que o voto distrital é uma possível solução. Ocorre que a tarefa de criardistritos no país demanda reforma constitucional e será controversa e demora-da. Ao se formarem, haverá favorecidos e prejudicados, sem falar nas escolhascaprichosas (gerrymandering). As contestações judiciais e alterações legislati-vas perdurarão por anos.
A lista fechada pode colaborar para o aprimoramento da representação populare o fortalecimento dos partidos. O eleitor, ao votar numa lista, saberá exatamen-
te quem se beneficiará de seu voto. O custo das cam-panhas será bem menor, abrindo a possibilidade dofinanciamento público (inviável com a lista aberta:quem vai dar dinheiro a mais de quatrocentos milcandidatos?).
A ideia de que a lista fechada ajudará gente às voltascom a Justiça a manter o foro privilegiado é ingênua:com o método atual, eles já se saem muito bem.
O correto seria a mesma reforma instituidora da listapreordenada criar regras obrigatórias de democracia interna nos partidos, pres-tigiando os filiados em detrimento de lideranças autocráticas. Sim, a lei podefazê-lo. A autonomia partidária não pode ser óbice para a regulamentação dacláusula democrática, constitucionalmente implícita, para todas as instituiçõespúblicas ou que recebem recursos públicos. Por igual, a ordem de preferênciados candidatos não pode ficar exclusivamente ao talante das lideranças partidá-rias. A lei precisa assegurar, em posições competitivas, a diversidade de gêneroe de cor e assegurar espaços para as minorias.
Portugal, Espanha, África do Sul, Uruguai, Paraguai e Argentina, entre outrospaíses, adotam a lista fechada. Que tal tentarmos?
m política, não há panaceias. Isso não retira da cidadania odireito de encontrar alternativas para o que não funciona bem.É o caso do sistema proporcional de listas abertas. Suas pro-paladas vantagens são: a) fortalecer os partidos políticos; b)favorecer a liberdade de escolha do eleitor; c) propiciar o sur-gimento de novas lideranças; e d) representar minorias.
É fácil de ver que, em todos esses itens, ele provou mal:a) os partidos políticos não se encontram fortalecidos, masmultiplicados. Tendem a ser conclaves sem ideologia definida
e sem a capacidade de representar segmentos sociais;b) a liberdade de escolha do eleitor é ilusória: menos de 10% dos deputadosfederais foi eleito com votação nominal, por exem-plo. Todo cidadão, ao ver o rol dos candidatos pro-porcionais eleitos, se surpreende: de onde eles vie-ram? Ao votar, o eleitor não tem condição de saberquem “pegará carona” na sua escolha. Os partidosse valem dos “puxadores de votos” e carreiam re-cursos para os candidatos que preferem. A trans-parência e previsibilidade, para o eleitor, são próxi-mas de zero;c) novas lideranças não têm surgido. Quando sur-gem, é à margem dos partidos;d) no quesito “representação de minorias”, a lista aberta é um desastre. Ondeestão os índios, o segmento LGBT, as pessoas com deficiência, os quilombo-las? Aliás, onde estão as mulheres? Embora elas não sejam minoria na socie-dade, são nos cargos eletivos. O Brasil ocupa a 167ª posição no “Ranking daigualdade de gênero”. O “Mapa da Desigualdade” preparado pela ProcuradoriaRegional Eleitoral de São Paulo mostra que cerca de um quarto dos municípi-os paulistas não elegeu nenhuma mulher nas últimas eleições. O que dizer dosnegros?
As vantagens, portanto, não são efetivas. Já nas desvantagens, a lista abertacontribuiu fortemente para nossa crise política. Como os candidatos de um
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A lista fechada pode colaborar para oaprimoramento da representação populare o fortalecimento dos partidos. O eleitorsaberá quem se beneficiará de seu voto
Advogado, presidente da Comissão de Reforma Política da OAB SP
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Não
Estado Democrático de Direito é aquele em que o cidadãoelege seus governantes pelo voto e os controla pela lei, exi-gindo que sirvam ao país e ao povo, como determinado noordenamento legal. Para tanto, é necessário que o eleitor co-nheça, conviva e controle o seu representante. Ora, tal famili-aridade com o governante é plenamente possível nos siste-mas parlamentares de governo, onde os partidos são poucose com claríssima linha de atuação política, e a fidelidade parti-dária, mera decorrência natural do sistema.
Sendo assim, muitos dos sistemas parlamentares adotam o voto em lista associ-ado ao voto distrital misto, pois uma simples lista fechada, sem considerar adivisão distrital proporcional ao número de eleitores,inevitavelmente deixaria várias regiões sem represen-tação política no Parlamento. Assim, os políticos par-lamentaristas fazem primeiro carreira no partido e, emfunção de seu trabalho, afinidade ideológica e fidelida-de à linha partidária, têm os seus nomes submetidosnas listas apresentadas, quando não são líderes distri-tais reconhecidos.
Já no Brasil, que é um sistema presidencial de gover-no, o voto em lista teria efeito oposto: perpetuaria os “donos” dos partidos, mui-tos deles sem jamais terem passado pelo teste eleitoral, mas que, por teremconseguido o registro de sua agremiação, terminariam encabeçando o topo darespectiva lista. Com isso, teríamos forte tendência à valorização dos “puxadoresde votos”, até porque os candidatos no topo da lista teriam muito mais chances deserem eleitos.
O presidencialismo brasileiro é um festival de interesses pessoais e de partidos,sem linhas ideológicas praticadas, pois, sempre que há coligações, tais linhas sãopisoteadas em todos os estados brasileiros, não poucas vezes ocorrendo a uniãoem uma coligação de esquerda e direita, em função, não da ideologia partidária,mas dos interesses imediatos naquele estado ou município.
É por isto que no Brasil proliferam os partidos – são 35 e 56 em formação –,todos eles recebendo fundo partidário e negociando “segundos eleitorais” nastelevisões e rádios, numa verdadeira banca de negócios que macula nossa demo-cracia. Ora, considerando que voto em lista fechada se caracteriza por sua nature-za ideológica, tal número de partidos impede a identificação clara de qualquerideologia partidária para o eleitor.
O argumento, ainda, de que este tipo de voto reduziria os custos de uma eleição,parece-me frágil, mormente num país em que as redes sociais e toda a espécie decomunicação eletrônica ganharam proporções pouco conhecidas em outros países.
A Comissão de Reforma Política da OAB SP, por unanimidade, entre seus doze funda-mentos para rejeição do voto em lista, lembrou que: (...)oito – A lista fechada acaba por se converter em impesso-alidade dos candidatos para o eleitor, que se hoje já temdificuldade de se reconhecer representado no CongressoNacional, não mais encontrará vínculos com os detento-res de cargos eletivos, posto que a formação das listas(...), podem tirar a percepção de escolha pessoal do elei-tor, principalmente em grandes distritos; (...) doze – Aimplantação do voto em lista fechada na atual conjunturabrasileira se traduz mais em um projeto de poder do que
em um projeto político, que é a essência deste sistema de votação.
Num sistema presidencial, o voto em lista, que afasta o direito do cidadão deescolher o candidato que deseja, não merece acolhida e o povo tem que se mani-festar em oposição a ele. A sua adoção equivaleria à perpetuação, nas casas legis-lativas, que necessitam de renovação parlamentar, confirmando os donos dospartidos, que nunca concorreram a eleição alguma. É como se um restauranteoferecesse cardápios dizendo que não caberia ao consumidor escolher seu prato,mas exclusivamente ao próprio maître.
Neste contexto, a adoção do voto em lista fechada, em verdade, agravaria a crisepolítica brasileira; jamais a resolveria!
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RESOLVER A CRISE POLÍTICA BRASILEIRA?
Jornal do Advogado – Ano XLII – nº 426 – Abril de 2017SÃO PAULO
Num sistema presidencial, o voto emlista, que afasta o direito do cidadãode escolher o candidato que deseja,
não merece acolhida