luis roberto cardoso de oliveira - a vocação crítica da antropologia

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A VOCAÇÃO CRÍTICA DA ANTROPOLOGIA LUÍS R. CARDOSO DE OLIVEIRA Universidade de Brasilia Nos últimos vinte ou trinta anos os antropólogos têm se voltado para um esforço de reflexão crescente sobre o caráter e o status teórico do co- nhecimento gerado no interior da disciplina. Neste sentido, o debate britâni- co sobre a Racionalidade (Wilson 1970; Hollis & Lukes 1982) e as discus- sões em torno do desenvolvimento de uma Antropologia Interpretativa nos E.U.A. (Geertz 1973 e 1983; Rabinow & Sullivan 1979) seriam, talvez, os exemplos mais famosos e paradigmáticos deste esforço, e sua repercussão no Brasil tem sido bem representada nas últimas reuniões da ABA. É exata- mente com o objetivo de contribuir para a continuidade destas discussões que propusemos a organização deste Simpósio. A idéia seria discutir alguns desdobramentos deste debate a partir da seguinte questão: se, como sugerem os esforços mencionados acima, a assunção de uma consciência hermenêuti- ca — isto é, o reconhecimento do caráter local e contextualizado do conhe- cimento produzido pelos antropólogos — é constitutiva do empreendimento antropológico, como equacionar esta situação com a preocupação; igualmen- te constitutiva da disciplina, com questões de validade? Embora estas condições não sejam exclusivas da Antropologia, no âmbito das demais ciências sociais, a radicalidade do enfrentamento destas questões na elaboração da interpretação antropológica faz com que a consti- tuição da disciplina esteja profundamente marcada por uma relação dialética entre a ciência e a filosofia, entre a empiria e a metafísica, ou entre o dado e o significado. E só trabalhando na interface entre estes domínios do saber e da experiência que o antropólogo consegue comunicar o produto de seu trabalho e persuadir o leitor quanto às pretensões de validade do mesmo. Da Anuário Antropológico/90 Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1993 67

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Luis Roberto Cardoso de Oliveira - A Vocação Crítica Da Antropologia

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  • A VOCAO CRTICA DA ANTROPOLOGIA

    LUS R. CARDOSO DE OLIVEIRA Universidade de Brasilia

    Nos ltimos vinte ou trinta anos os antroplogos tm se voltado para um esforo de reflexo crescente sobre o carter e o status terico do conhecimento gerado no interior da disciplina. Neste sentido, o debate britnico sobre a Racionalidade (Wilson 1970; Hollis & Lukes 1982) e as discusses em torno do desenvolvimento de uma Antropologia Interpretativa nos E.U.A. (Geertz 1973 e 1983; Rabinow & Sullivan 1979) seriam, talvez, os exemplos mais famosos e paradigmticos deste esforo, e sua repercusso no Brasil tem sido bem representada nas ltimas reunies da ABA. exatamente com o objetivo de contribuir para a continuidade destas discusses que propusemos a organizao deste Simpsio. A idia seria discutir alguns desdobramentos deste debate a partir da seguinte questo: se, como sugerem os esforos mencionados acima, a assuno de uma conscincia hermenutica isto , o reconhecimento do carter local e contextualizado do conhecimento produzido pelos antroplogos constitutiva do empreendimento antropolgico, como equacionar esta situao com a preocupao; igualmente constitutiva da disciplina, com questes de validade?

    Embora estas condies no sejam exclusivas da Antropologia, no mbito das demais cincias sociais, a radicalidade do enfrentamento destas questes na elaborao da interpretao antropolgica faz com que a constituio da disciplina esteja profundamente marcada por uma relao dialtica entre a cincia e a filosofia, entre a empiria e a metafsica, ou entre o dado e o significado. E s trabalhando na interface entre estes domnios do saber e da experincia que o antroplogo consegue comunicar o produto de seu trabalho e persuadir o leitor quanto s pretenses de validade do mesmo. Da

    Anurio Antropolgico/90Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1993

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    mesma forma, a constatao do carter constitutivo desta dialtica radical que nos faz pensar na idia de uma Vocao Crtica da Antropologia.

    Se, como disse, somente nos ltimos anos o carter constitutivo desta dialtica radical veio a ser amplamente reconhecido pelos antroplogos1, gostaria de argumentar que as implicaes desta condio (enquanto possibi- litadora de gerao de conhecimento no sentido kantiano) sempre se fizeram notar de maneira mais ou menos explcita nas etnografas produzidas pelos profissionais da disciplina, ainda que nem sempre fossem objeto de reflexo das mesmas. Isto , pelo menos no que diz respeito s etnografas produzidas na era moderna da antropologia, a partir dos trabalhos de Malinowski sobre os Trobiandeses, quando a prtica do trabalho de campo passou a ser a marca registrada da disciplina e uma caracterstica fundamental da identidade de seus praticantes2. Neste contexto, ainda que no se pudesse falar numa antropologia crtica, em sentido estrito, as implicaes do que estou chamando de "dilema constitutivo" da disciplina se manifestavam na percepo generalizada de que o empreendimento etnogrfico no poderia chegar a bom termo sem que, no processo de pesquisa, o antroplogo fizesse nm mnimo de crtica (ou ao menos relativizasse) s suas categorias nativas de entendimento3.

    1. Isto particularmente verdadeiro para o universo anglo-saxo, onde a tradio empirista conseguia esconder sem maiores dificuldades o carter problemtico da relao sujeito/ objeto. No toa, pois, que os debates recentes sobre a importncia da assuno de uma conscincia hermenutica tenham se desenvolvido de forma mais intensa e dinmica no interior deste universo, onde a descoberta do carter constitutivo desta situao teve o significado de uma revelao. Da mesma forma, acredito que a radicalidade de algumas posies defendidas nestas discusses (e.g., Tyler 1986: 122-140) se devam ao impacto desta revelao no contexto da tradio empirista.

    2. Embora a prtica do trabalho de campo, que marca o incio do perodo moderno da antropologia, tenha se desenvolvido tambm entre Boas e seus discpulos mais ou menos na mesma poca, o trabalho de Malinowski tem sido reconhecido como o divisor de guas em relao ao perodo anterior dos "armchair anthropologists" e enquanto smbolo desta transformao que seu trabalho nos interessa aqui.

    3. A nfase de Malinowski (1922) no ponto de vista nativo, assim como a preocupao de Evans-Pritchard com a idia de traduo, ou a malfadada discriminao da antropologia cognitiva entre conceitos micos e ticos so apenas alguns exemplos que sugerem esta interpretao. Por outro lado, mesmo nos contextos em que esta percepo nunca foi generalizada, ou mesmo aceita, como no caso dos estudos em "cross-cultural anthropology (e.g., Whiting & Child 1953) ou de ecologia cultural (Harris 1975), as etnografas bem sucedidas revelam sempre um mnimo de relativizao das categorias de entendimento do

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    A questo, portanto, seria por que na antropologia, diferentemente das demais cincias sociais, o trabalho do pesquisador "sempre" envolve um mnimo de reflexo crtica, ainda que sua perspectiva terica encontre respaldo na tradio empirista e suas pretenses cientficas situem a disciplina no campo das cincias naturais ou hard sciences?4

    Acredito que esta caracterstica da antropologia se deve a duas razes principais: (a) a especializao quase absoluta da disciplina, pelo menos at o final dos anos cinqenta, no estudo das sociedades ditas primitivas ou exticas; e, (b) a prtica do trabalho de campo. Enquanto a primeira razo ensejou a experincia do estranhamento, que veio a se tomar um recurso importante para as interpretaes antropolgicas (Merleau-Ponty 1980; DaMatta 1981), a segunda radicalizou o impacto da primeira e forou uma soluo de continuidade para a crise interpretativa (e existencial) advinda do choque cultural caracterstico do perodo inicial no campo5.

    No contexto do trabalho de campo, as dificuldades de compreenso decorrentes do contato com prticas ou tradies desconhecidas e "fatos" inusitados pode atingir propores absolutamente radicais, como no caso do choque cultural, onde um enigma intelectual acompanhado por um forte componente emocional ou, ao contrrio, um desentendimento com repercusso emocional pode detonar um grande enigma intelectual. Seja como for, o choque cultural sempre implica numa conjuno de fatores cognitivos e emocionais, e traz consigo um potencial de agravamento significativo para a crise interpretativa que, normalmente, no tem incio a. Esta contempornea dos primeiros esforos interpretativos realizados pelo antroplogo quan-

    autor, ainda que sua revelia.I. Com exceo de uma famosa e extempornea manifestao de Radcliffe-Brown (1957), e

    de alguns metodlogos radicais trabalhando na interface entre ecologia cultural e antropologia biolgica (Lee & Devore 1973), a maioria dos pesquisadores que procuram uma aproximao s cincias naturais no deixam de fazer ressalvas quanto especificidade de seu empreendimento.

    V O estranhamento tambm caracteriza o trabalho do historiador, especialmente daquele que se dedica ao estudo dos perodos histricos (ou das sociedades) mais distantes (no tempo) de sua contemporaneidade. Entretanto, dada a inexistncia de um contato direto com os atores sociais da sociedade estudada, a experincia do estranhamento suavisada pela impossibilidade de transformar a situao dialgica da "fuso de horizontes (Gadamer 1982) no dilogo em sentido estrito do qual o antroplogo desfruta em seu trabalho de campo (Habermas 1984: 134-36; Cardoso de Oliveira 1989: 248, nota 4).

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    do chega no campo. Alm disto, a perspectiva de realizao do projeto intelectual do pesquisador (a elaborao da etnografa), somada necessidade de conviver com os "nativos", no campo, por longos perodos de tempo, faz com que o antroplogo enfrente desafios interpretativos que em outras circunstncias seriam (provavelmente) postos de lado, devido ao esforo ou custo pessoal que estes demandam.

    Se, para facilitar o desenvolvimento da argumentao, me fosse permitido caricaturar a crise de entendimento pela qual passa o antroplogo em sua introduo ao campo, eu apresentaria a situao da seguinte maneira: digamos que ao chegar no campo o antroplogo se defronte com um evento qualquer e que, ao conect-lo com sua experincia scio-cultural (em sentido amplo) consiga classific-lo de alguma maneira e arrisque uma interpretao que, a princpio, lhe parea satisfatria; ocorre com freqncia que o desenrolar dos acontecimentos toma esta interpretao inicial incompatvel com as novas tentativas de compreenso do evento como um todo. Deste modo, para conseguir dar sentido aos respectivos acontecimentos, e a sua prpria experincia, o pesquisador se v obrigado a questionar (ou duvidar de) seu entendimento imediato da situao e a colocar em cheque suas categorias "nativas"; no para neg-las (em conjunto), o que seria impossvel, mas para renovar o poder explicativo das mesmas.

    O caso da antropologia econmica paradigmtico quanto s implicaes do dilema constitutivo da disciplina, e o texto de Dalton sobre "Moeda Primitiva" um bom exemplo deste processo interpretativo marcado pela crise de entendimento que procurei caracterizar acima. Neste contexto interessante notar que, apesar do debate em antropologia econmica, polarizado entre formalistas e substantivistas, ser quase que exclusivamente restrito ao mundo anglo-saxo (Dmonio 1978), de tradio empirista, mesmo a posio formalista, que defende a universalidade/homogeneidade dos fenmenos econmicos stritu sensu, faz consesses importncia da dimenso cultural na elucidao do significado destes fenmenos (e.g., Firth 1952)6.

    6. O debate no foi restrito aos antroplogos, tendo contado tambm com a participao de economistas, os quais se caracterizavam por assumir de forma mais radical a posio formalista quanto autonomia do "comportamento econmico (Cardoso de Oliveira 1984). Por outro lado, significativo o fato de que o autor de maior influncia entre os substantivistas tenha sido um historiador, Polanyi, que, como tal, partilha com o antroplogo a experincia do estranhamento.

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    Da mesma forma, no surpresa o fato de que a grande maioria dos antroplogos envolvidos no debate se identifica com a perspectiva substantivista (LeClair & Schneider 1968), que reivindica o reconhecimento do papel das representaes sociais na constituio mesmo dos fenmenos estudados (Polanyi 1957; Dalton 1968).

    Mas, vamos ao texto de Dalton, que me parece exemplar enquanto portador (e revelador) da vocao crtica intrnseca ao empreendimento etnogrfico. O texto bastante didtico a este respeito e se desenvolve a partir de um comentrio crtico do autor ao trabalho de um economista, Armstrong, que, ao no relativizar suas categorias de entendimento, teria apresentado uma viso totalmente distorcida do papel/significado da "moeda" na ilha Rossel (Dalton 1965)7.

    Partindo da concepo ocidental de "moeda" enquanto meio de troca mercantil, Armstrong teria atribudo mais ou menos as mesmas funes "moeda dos ilhus, fornecendo uma interpretao insustentvel de grande parte das prticas em que estes objetos estavam envolvidos, e atribuindo uma lgica artificialmente complexa para algumas destas prticas. Depois de identificar trs grupos e vinte e duas classes de "moedas" (conchas n d a p f , Armstrong atribui denominaes cardinais a elas, sugerindo a vigncia de uma escala de valores9 nos mesmos moldes das "moedas" ocidentais e, ante a inexistncia de trocas diretas entre "moedas" de denominaes diferentes, se baseia em evidncias absolutamente precrias para desenvolver uma teoria de convertibilidade atravs de estratgias de emprstimos a juros compostos. Tais estratgias sugerem o funcionamento de um sistema monetrio cuja operacionalidade difcil imaginar, e a descoberta da no convertibilidade direta entre as conchas ndap seria um bom exemplo da seqncia de acontecimentos que, no contexto de minha caricatura sobre a crise de entendimento no campo, invalida a interpretao inicial do antroplogo para o evento como um todo.

    7. A no ser que seja assinalado de forma diferente, todas as citaes feitas no contexto desta discusso tm como referncia o texto de Dalton (1965).

    8. De acordo com uma ordem de valor crescente, os grupos de conchas ndap estariam divididos da seguinte maneira: (1) classes de 1 a 10; (2) classes de 11 a 17; (3) classes de 18 a 22 .

    9. Onde a ordem numrica das moedas corresponderia ao valor (monetrio) relativo das mesmas.

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    Segundo Dalton, e de acordo com os prprios dados fornecidos por Armstrong, alm das "moedas ndap estarem divididas em trs grupos cujas unidades no so cambiveis entre si, as unidades do grupo mais alto no so cambiveis em hiptese alguma, mesmo no interior do grupo (: 55), e apenas as conchas ndap das cia: ses mais baixas so utilizadas como meio de troca mercantil10. Deste modo, na grande maioria das transaes envolvendo as conchas ndap, estas estariam sendo usadas como meio de troca recproco ou como meio de troca redistributivo. Isto nestes casos, as conchas no so utilizadas para viabilizar uma mera troca ou aquisio de bens, mas "para validar importantes eventos e transaes sociais no mesmo sentido que os itens da riqueza da noiva validam um casamento" (: 56)11. Pois exatamente esta dimenso significativa, fundamental para a compreenso do uso das conchas ndap e das prticas sociais nas quais elas esto envolvidas, que no teria sido percebida por Armstrong.

    Pode-se dizer, ento, que Armstrong no pde compreender adequadamente o significado das conchas ndap, ou da "moeda" na ilha Rossel, porque no relativizou sua noo nativa de moeda enquanto meio de troca mercantil. Assim, acabou naturalizando esta noo, no julgando necessrio, dar a devida ateno s representaes dos nativos sobre as respectivas conchas12. A meu ver, este teria sido o pecado capital de Armstrong, o qual, alis, no passou desapercebido por Dalton que, na posio de antroplogo, afirmou o que voz corrente na disciplina: "... A viso do povo estudado com relao a estas conchas ajuda a explanar seu papel como

    10. De acordo com o argumento de Armstrong, em termos substantivos a converso se daria da seguinte maneira: um indivduo "A" emprestaria, por exemplo, uma moeda n 1 para um indivduo "B, que aps um certo perodo de tempo teria que devolver seu credor uma moeda n 2. Assim esta estratgia poderia ser utilizada sucessivamente at que o credor pudesse conseguir a "moeda" adequada para realizar a transao desejada (: 54).

    11. Por exemplo: "... Pagamentos com uma [concha ndap] n 18 so uma parte necessria da ordinria riqueza da noiva, bem como o pagamento necessrio por esposas compartilhadas e pelo patrocinio de uma festa do porco ou do cachorro ou de uma festa que inicia o uso de um tipo especial de canoa..." (: 56).

    12. Como Dalton sugere neste artigo, a naturalizao da noo de moeda enquanto meio de troca mercantil no apenas dificulta a compreenso do fenmeno "moeda" em outras sociedades/culturas, mas empobrece o entendimento das situaes em que a moeda utilizada como meio de troca redistributivo (e.g., arrecadao e alocao de impostos) ou recproco (e.g., troca de presentes de aniversrio, Natal etc.) na prpria sociedade do pesquisador.

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    moeda de propsito limitado em transaes recprocas e redistributivas" (: 56). De acordo com a argumentao de Dalton, fica claro que, ao no atentar para o "ponto de vista nativo", Armstrong no teria deixado apenas de ter acesso a uma interpretao alternativa e enriquecedora do fenmeno, mas teria ficado mesmo impossibilitado de compreend-lo.

    neste sentido que o trabalho de Dalton me parece um bom exemplo para a minha argumentao de que o dilema constitutivo da antropologia entre a assuno de uma conscincia hermenutica e a preocupao com questes de validade tem como implicao necessria uma vocao crtica.

    Para tomar mais clara esta especificidade da situao do antroplogo, poderamos represent-la graficamente no contexto de uma comparao com a perspectiva do cientista natural, onde enfatizada a importncia epistemolgica da idia de participao no famoso lema da disciplina da "observao participante".

    CINCIAS N ATUR AIS ANTROPOLOGIAE

    comunidade de . . , .sociedade A Npesquisadores C

    ONTRO

    Sparticipao>

    observao

    inundo natural

    O>observao

    sociedade B

    - S/O

    *

    ETNOGRF

    S = sujeito O = objeto

    c l e c2 = reas de contedoscio-cultural especfico

    CO

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    Enquanto nas cincias naturais a construo do objeto feita a partir dos problemas ou preocupaes definidos na comunidade de pesquisadores (Peirce 1932) com a mediao de processos de observao do mundo exterior, nas cincias sociais em geral, e na antropologia em particular, o objeto s comea a ser desvelado quando os problemas definidos na comunidade de pesquisadores encontram algum respaldo (ou referencial) nas representaes da sociedade (ou grupo social) que est sendo estudada. E s ento que a observao assume um papel de mediao importante neste processo de construo. E neste sentido que se pode falar na "dupla hermenutica" (Giddens 1976: 158) ou dupla reflexividade das cincias sociais. Pois, como o mundo social simbolicamente pr-estruturado e, portanto, as representaes dos atores sobre as prticas sociais nas quais esto envolvidos so parte constitutiva destas prticas, estas ltimas no podem ser entendidas sem que aquelas sejam levadas em considerao. Os problemas desenvolvidos no mbito da comunidade de pesquisadores constituem apenas uma das duas dimenses interpretativas que condicionam o entendimento e a definio de um objeto de pesquisa nas cincias sociais.

    Olhando para o grfico referente situao da antropologia, vemos que a rea de interseo entre os dois conjuntos representando, respectivamente, a sociedade do pesquisador "A" e a sociedade pesquisada B", est totalmente coberta por traos escuros de modo a chamar a ateno para a sua importncia no processo de investigao. Esta rea de interseo temati- za a importncia da "fuso de horizontes" ou "encontro etnogrfico" no processo de negociao, com os nativos, da "realidade" estudada pelo antroplogo13. No se trata apenas da negociao da identidade do pesquisador, cuja relevncia e eventual dramaticidade tem sido assinalada por vrios autores (e.g., Bachnik 1979; Favret-Saada 1980; Kondo 1986), mas, sobretudo, da negociao do problema de pesquisa, cuja definio envolve um dilogo mais explcito entre os universos simblicos (categorias culturais e tradies em sentido amplo) de pesquisador e pesquisado.

    13. A rea de interseo corresponderia mais ou menos ao que DaMatta chama de "rea de interao complexa entre o pesquisador e seus informantes, em sua cativante introduo antropologia (1981: 22-27). A idia de "negociao da realidade" foi difundida nas cincias sociais atravs do trabalho de Berger & Luckmann (1967). Sob uma perspectiva um pouco diferente, Goffman tambm deu uma contribuio importante neste contexto (1969).

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    Em outras palavras, se tomarmos, analticamente, os conjuntos "A" e "B" como uma representao da totalidade dos respectivos universos scio- culturais, esta situao significa que o antrpologo s pode pretender estudar adequadamente aquilo que ele consegue trazer para o interior da rea de interseo. Por exemplo, tomando como referncia o texto do Dalton, e supondo que as reas "cl" e "c2" no contexto dos conjuntos "A e "B" representam o contedo etnogrfico das prticas econmicas em vigor nas duas sociedades, poderamos dizer que Armstrong, ao no atentar para o papel constitutivo das representaes dos nativos, no teria conseguido trazer o contedo de suas prticas econmicas para a rea de interseo, inviabilizando o seu acesso a elas. Deste modo, ao invs de desvendar o contedo destas prticas (c2), Armstrong teria simplesmente "reencontrado" as prticas vigentes em sua prpria sociedade (cl), cujo contedo teria sido indevidamente atribudo a outrem14.

    Por outro lado, como a interpretao do antroplogo produto de um dilogo, os contedos scio-culturais que ele consegue trazer para a rea de interseo estaro sempre marcados pelo seu olhar de "estrangeiro"15. Isto , a entrada do "material etnogrfico" na rea de interseo est condicionada ao seu potencial de interao efetivo com o universo scio-cultural de origem do antroplogo. Pois, s despertando algum sentido no contexto deste universo que os contedos scio-culturais nativos podem ser percebidos e transformados em dados pelo antroplogo. Desta maneira, para que as

    14. Da mesma maneira, a cada vez que o antroplogo consegue trazer um aspecto ou caracterstica scio-cultural da sociedade estudada para a rea de interseo, seus recursos interpretativos so renovados, proporcionando uma viso enriquecedora das prticas sociais vigentes em sua prpria sociedade, e fazendo com que seu horizonte scio-cultural seja ampliado. Em princpio, isto tambm vale para os nativos da sociedade estudada, o que significa que os conjuntos "A" e "B" so universos dinmicos permanentemente envolvidos em processos de expanso. De outro modo, se estes processos so radicalizados no contexto da fuso de horizontes caracterstica do encontro etnogrfico, eles tambm ocorrem, ainda que de forma mais sutil e menos freqente, na vida cotidiana que tem lugar no interior de sociedades ou culturas especficas. E por esta razo que, enquanto houver vida social, o objeto das cincias sociais ser sempre inesgotvel.

    15. No incio dos anos 60, Lvi-Strauss caracterizou a perspectiva antropolgica atravs da expresso "olhar de fora" (1962), chamando ateno para o potencial renovador da antropologia no que concerne ampliao do horizonte histrico-cultural das humanidades. Embora no discorde desta viso, gostaria de enfatizar, no momento, a importncia do papel desempenhado pelo sujeito na construo do objeto.

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    conchas ndap fossem entendidas por Dalton enquanto "moeda de propsito limitado" (essencialmente como meio de troca recproco e redistributivo), a noo de moeda e a idia de meio de troca tinham que fazer parte do repertrio conceituai do pesquisador. neste sentido que dissemos que as categorias de entendimento (nativas) do antroplogo no deveriam ser negadas, mas sim renovadas, para que seu poder explicativo fosse ampliado e no obstrudo; como foi o caso de Armstrong ao reificar a noo de moeda enquanto meio de troca mercantil (dominante em nossa sociedade), ou como teria sido o caso de um pesquisador hipottico que tentasse superar o descompasso de significados vivido no campo atravs da rejeio in totum das categorias de entendimento vigentes em seu universo scio-cultural de origem.

    Na realidade, isto no significa que estudos como o de Armstrong, onde privilegiada a perspectiva do observador, caracterstica das cincias naturais, sejam totalmente improdutivos ou estreis de significado16. Mas, quer dizer, sim, que seu potencial de esclarecimento est restrito s eventuais contribuies crticas que, na confrontao com universos scio-cultu- rais diversos, estes estudos possam trazer para a compreenso das sociedades de ofigem de seus autores. Ainda que, nestes casos, a dimenso crtica esteja sempre demasiadamente implcita.

    J o antroplogo no pode abrir mo de sua condio de participante. Aqui, eu gostaria de chamar a ateno para o duplo sentido desta participao: (1) o existencial; e (2) o epistemolgico. Normalmente o trabalho do antroplogo concebido atravs do primeiro, que tematiza sua experincia pessoal no campo, e torna imediatamente inteligvel a idia de "observao participante". Entretanto, no contexto de nossa discusso sobre o status terico do conhecimento gerado no interior da disciplina, o segundo sentido o mais importante, apesar de, como vimos no caso do empreendimento etnogrfico , este sentido estar intimamente associado ao primeiro. O

    16. No quero negar, de forma absoluta, a fecundidade da perspectiva objetivista no estudo da sociedade ou dos problemas sociais. O sucesso da psicologia social e, de maneira diferente, a importncia sociolgica do paradigma funcionalista esto a para provar o contrrio. Quero apenas chamar a ateno para o fato de que a partir desta perspectiva no se tem acesso ao universo simblico-significativo, sem o qual no se pode compreender as aes (prticas) sociais (em oposio idia de comportamento), objeto privilegiado das cincias sociais.

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    sentido epistemolgico da participao aquele que enfatiza a necessidade do antroplogo de colocar suas pr-concepes em risco, expondo-se a idias estranhas e a interpretaes alternativas, sem que este processo implique numa aceitao ingnua, sem questionamentos, do ponto de vista nativo (Cardoso de Oliveira 1989: 260)17.

    Neste sentido que as tentativas de caracterizao do trabalho do antroplogo, tendo como foco o processo de elaborao da etnografa, como estando dividido entre aspectos objetivos e subjetivos (Clifford 1986) ou entre estilos descritivos e narrativos (Pratt 1986) me parecem pouco satisfatrias. Isto , apesar destas tentativas assinalarem dimenses importantes do texto etnogrfico s quais nem sempre se d a devida ateno. Meu problema com estas dicotomas que, tendo como referencial a relao entre observao e participao, transposta do campo para a etnografa, elas acabam privilegiando o sentido existencial da participao, ainda que estejam preocupadas com as repercusses deste no processo de construo do objeto. Pois, me parece que nestes trabalhos os autores no deixam suficientemente claro que no s o pesquisador tem que participar (no sentido epistemolgico) primeiro para poder observar, mas18, tambm, que esta participao no traz qualquer prejuzo para as pretenses de objetividade/validade das interpretaes do antroplogo.

    necessrio explicitar que as contribuies do sujeito cognocente na definio do objeto cognocvel, atravs de sua participao, no esto marcadas pelas idiossincrasias do pesquisador, mas pelas categorias e tradies que ele comparte intersubjetivamente com os atores sociais de sua sociedade/cultura de origem. O mesmo pode ser dito em relao s representaes dos "nativos" que permitem ao antroplogo elucidar o significado de suas prticas. Em ambos os casos a objetividade dos significados em pauta deve- se ao seu carter intersubjetivo, da mesma forma que a objetividade das

    17. Deve-se dizer que, apesar desta intimidade entre os dois sentidos da participao no empreendimento etnogrfico, do ponto de vista terico eles so absolutamente independentes. Pois, no sentido epistemolgico, esta participao tambm pode ter lugar quando se l um livro ou se v um filme. Para uma discusso sobre o estudo da ao social enquanto texto, ver os trabalhos de Ricoeur (1981) e Geertz (1973).

    18. E por isto que a "participao", em oposio "observao", aparece com um sinal de "maior que" ( > ) no grfico referente relao sujeito/objeto na antropologia.

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    observaes cientficas depende das possibilidades delas virem a ser compartilhadas pelos membros da comunidade de cientistas19.

    Deste modo, a impossibilidade terica do antroplogo abdicar de suas pr-concepes em seus esforos de compreenso das prticas sociais dos "nativos" e, portanto, no poder jamais conhec-las de forma absoluta, no contextualizada, no quer dizer que suas interpretaes no possam nutrir pretenses de validade, ou que os fatos dos quais elas falam sejam apenas "relativos". Embora, no mais das vezes, a validade das interpretaes etnogrficas no possa reivindicar exclusividade, elas sempre tem, em princpio, amplas possibilidades de demonstrar sua superioridade cognitiva na confrontao com interpretaes arbitrrias e/ou preconceituosas20. Como, alis, fica evidenciado no exemplo do texto do Dalton discutido acima. E, da mesma forma, gostaria de enfatizar que os fatos etnogrficos so FATOS com todas as letras.

    A constatao de que os fatos etnogrficos so fruto de um empreendimento duplamente reflexivo e que, com freqncia, apresentam dimenses significativas que possivelmente no viriam tona fora do "encontro etnogrfico", no os toma menos fidedignos ou elucidativos quanto s condies de existncia dos povos ou grupos sociais estudados pelos antroplogos. No limite, poder-se-ia dizer que, mesmo nos casos em que estas dimenses significativas s se transformam em fatos, ou que estes s acontecem, aps o "encontro etnogrfico", isto no diminui a facticidade destes "acontecimentos".

    Voltando formulao inicial do problema, so estas caractersticas dos fatos etnogrficos que nos fazem pensar que na antropologia no se tem o dado sem o significado, ou a descrio sem a interpretao. E tambm por causa delas que pensamos a constituio da disciplina como estando

    19. Num ensaio seminal, Apel argumenta de forma insofismvel que o "objetivismo (o principal mtodo de investigao nas cincias naturais) representa apenas um tipo especial de intersubjetividade, o qual, inclusive, supe um nvel de intersubjetividade anterior no domnio da tica (1980).

    20. Neste sentido, as interpretaes etnogrficas vlidas tem um status cognitivo anlogo ao das decises ou acordos equnimes na esfera judicial. Para uma discusso detalhada sobreo carter destes ltimos no contexto das "pequenas causas", ver Cardoso de Oliveira (1989).

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  • A VOCAO CRTICA DA ANTROPOLOGIA

    "profundamente marcada por uma relao dialtica entre a cincia e a filosofia, entre a empiria e a metafsica, ou entre o dado e o significado.

    Finalmente, queria dizer que, no que concerne epistemologa da disciplina, apesar da antropologia interpretativa e seus desdobramentos no terem feito mais do que (re)descobrir uma vocao constitutiva do empreendimento antropolgico, ainda que nem sempre estes esforos tenham desembocado numa perspectiva crtica21, a radicalidade com que a discusso sobre o "encontro etnogrfico (e suas implicaes) foi desenvolvida no universo anglo-saxo provocou a realizao de uma srie de experimentos etnogrficos bastante inovadores (Marcus & Fischer 1986). Ao procurar temas e estratgias de investigao pouco convencionais, os pesquisadores envolvidos nestes experimentos contriburam para a erupo de novos fatos etnogrficos. Isto , na medida em que estes empreendimentos ampliaram o potencial de absoro etnogrfica da "rea de interseo", de acordo com o grfico exposto acima.

    Pois foi exatamente no contexto de uma reflexo sobre a renovao deste debate, quanto ao carter criativo do processo de erupo dos fatos etnogrficos, que nasceu a idia de organizao deste Simpsio. A proposta ento, seria que os expositores focalizassem problemticas especficas onde o estudo de domnios particulares da experincia e/ou o dilogo com disciplinas (campos de conhecimento) afins, tivesse revelado um potencial especialmente interessante no que diz respeito a erupo de novos fatos etnogrficos. Fatos estes, cuja revelao possibilitaria no s um melhor equaciona- mento daquelas problemticas, mas tambm uma (re)avaliao crtica da teoria e da perspectiva antropolgicas.

    AgradecimentosGostaria de agradecer aqui os comentrios de Alcida Ramos e Jos Jorge de Carvalho.

    21. Num artigo interessante, Fischer procura equacionar o desenvolvimento de uma antropologia crtica como um desdobramento da antropologia interpretativa (1985). Embora esteja mais preocupado aqui em discutir as implicaes epistemolgicas das condies que possibilitam a interpretao antropolgica, do que em substantivar as caractersticas de uma perspectiva crtica determinada, acredito que as reflexes esboadas acima vo na mesma direo da proposta elaborada por Fischer.

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  • LUS CARDOSO DE OLIVEIRA

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