livro branco da inovacao tecnologica

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LIVRO BRANCO DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

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  • LIVRO BRANCO

    DA INOVAO

    TECNOLGICA

  • Oferecimento

    Desenvolvimento e Inovao so indissociveis. A inovao o caminho

    para a estabilidade econmica, a sobrevivncia das empresas e a melhoria

    das condies de trabalho.

    Por isso, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES)

    oferece um conjunto de produtos, linhas de financiamento, fundos e

    programas dedicados inovao, seja ela incremental ou radical, concebida

    por centros de pesquisa e por grandes, mdias e pequenas empresas.

    Em funo dos pertinentes registros histricos que traz e das reflexes para

    o futuro que enseja, o Livro Branco da Inovao Tecnolgica ser valioso no

    aprofundamento desses instrumentos.

    O patrocnio do BNDES publicao uma oportunidade de investir numa

    obra de referncia para os estudiosos do tema no Brasil. Uma iniciativa que

    contribuir para que o Banco e outros agentes pblicos e privados possam

    continuar avanando nas Polticas de Inovao no pas.

  • Patrocnio

    O desafio de promover a inovao em

    uma Regio em que so grandes as

    disparidades tecnolgicas entre o semirido e

    as grandes metrpoles localizadas na zona

    costeira um desafio singular, pois as grandes

    cidades, em consequncia de contar com

    maior arcabouo tcnico-cientfico, detm

    maior potencial inovador.

    A promoo da inovao em regies

    economicamente deprimidas s pode ser

    realizada por instituies financeiras que

    contem com instrumentos customizados, com

    condies diferenciadas sobretudo para

    pequenas e mdias empresas e produtores

    agroindustriais localizados em regies

    economicamente menos favorecidas. Justifica-

    se por isso a importncia do Banco do

    Nordeste como mais importante indutor do

    desenvolvimento da Regio Nordeste.

    A Agncia Brasileira de Desenvolvimento

    Industrial (ABDI) foi criada com o objetivo de

    promover a execuo da poltica industrial , em

    consonncia com as polticas de cincia,

    tecnologia, inovao e de comrcio exterior.

    Ligada ao Ministrio do Desenvolvimento,

    Indstria e Comrcio Exterior (MDIC), atua

    como elo entre o setor pblico e privado,

    contribuindo para o desenvolvimento

    sustentvel do Pas por meio de aes que

    ampliem a competitividade da indstria.

    Atuando na articulao e gerenciamento da

    nova poltica industrial (Plano Brasil Maior) e

    com a oferta de estudos conjunturais,

    estratgicos e tecnolgicos para diferentes

    setores da indstria, a ABDI contribui para a

    construo de agendas de ao setoriais e para

    os avanos no ambiente institucional,

    regulatrio e de inovao no Brasil.

  • EMBRAER S.A.

    FEDERAO DAS INDSTRIAS DO ESTADO

    DE SO PAULO

    INDSTRIAS QUMICAS E FARMACUTICAS S.A.

    KLABIN

    NORTEC QUMICA S.A.

    ULTRAPAR PARTICIPAES S.A

    INDSTRIAS ROMI S.A.

    WEG S.A.

    ASSOCIAO BRASILEIRA DA INDSTRIA DE HIGIENE

    PESSOAL, PERFUMARIA E COSMTICOS

    ASSOCIAO DOS FABRICANTES DE PRODUTOS

    MDICOS E ODONTOLGICOS

    ASSOCIAO BRASILEIRA DA INDSTRIA ELTRICA E

    ELETRNICA

    LABORATRIOS FARMACUTICOS S.A.

    SANUS FARMACUTICA LTDA.

    BIOMEDICA IND COM REPRESENTAES LTDA.

    PRODUTOS QUMICOS FARMACUTICOS LTDA.

    Apoio

    ASSOCIAO BRASILEIRA DA INDSTRIA DE

    MQUINAS E EQUIPAMENTOS

    ASSOCIAO BRASILEIRA DAS INDSTRIAS DE

    QUMICA FINA, BIOTECNOLOGIA E SUAS ESPECIALIDADES

  • LIVRO BRANCO

    DA INOVAO

    TECNOLGICA

    LIVRO BRANCO

    DA INOVAO

    TECNOLGICA

  • Este Livro Branco da Inovao Tecnolgica procura contar toda a

    saga para se construir uma economia alavancada pela inovao

    tecnolgica, a partir da conscincia da indispensabilidade de polticas

    pblicas. Os vrios momentos da histria do Marco Legal revelam que o

    Brasil comea a compreender um conceito mais simples, direto e

    abrangente de inovao.

    No so apenas as grandes indstrias de tecnologia de ponta que

    tm direito s polticas pblicas para P&D. Um fabricante de telhas

    tambm pode inovar e se diferenciar no mercado. Imagine a exploso

    inovativa que o Brasil teria se fosse dado este direito de acesso s dezenas

    de milhares de micro, pequenas e mdias empresas dos segmentos mais

    heterogneos.

    Deixaramos de sonhar em ser professor Pardal, com invenes

    mirabolantes que terminam fechadas em laboratrio, para termos

    profissionais produtivos em ao. Criaramos, cada vez mais, produtos e

    processos teis para a sociedade, lucrativos, impulsionadores do

    desenvolvimento econmico e da exportao pela conquista de mais e

    mais mercados.

    As prximas pginas refletem o esforo de reconstituir a jornada

    percorrida, por meio de memrias, documentos e depoimentos de

    pessoas de contriburam para que se alcanasse o objetivo proposto.

    Considerando a mxima de compreender o passado para planejar o

    futuro, esperamos que esta obra contribua para o Brasil adentrar um

    segundo estgio, o de aplicar, plena e corretamente, as leis estabelecidas e

    to caras ao setor produtivo.

    Joo Carlos Basilio

    Presidente da Protec

    Apresentao

  • Sumrio

    1. Introduo ........................................................................................................ 13

    2. A conquista do incentivo fiscal automtico ........................................... 29

    3. A polmica criao da subveno econmica ................................ 37

    4. O uso do poder de compras do Poder Pblico ................................ 53

    5. O financiamento subsidiado inovao tecnolgica ....................... 71

    6. O incentivo inovao nas micro e pequenas empresas .................. 81

    7. Consideraes finais .................................................................................... 89

  • 1

  • segunda Guerra Mundial , ao

    Aenfraquecer os pases centrais,

    acelerou a desar t iculao de

    praticamente todo o sistema colonial

    poca, com exceo de alguns

    pequenos pases que ainda tm esse

    estado at os dias atuais. Tambm mudou

    substancialmente as zonas de influncia e at

    dependncias econmicas em diversas regies do

    mundo. Pases, antes dominados, passaram a

    empreender o caminho do desenvolvimento prprio,

    geralmente baseados no processo da industrializao,

    ainda que tardia.

    Introduo

    Introduo

    13

  • A possibilidade de se inserir de maneira

    autnoma no novo cenrio de comrcio mundial, que

    passou a ser regulado pelo Acordo de Bretton Woods

    ( EUA em julho de 1944, em reunio com a firmado nos

    presena de 45 pases), abriu um novo horizonte at

    para os pases derrotados Alemanha, Itlia e Japo ,

    cuja nsia por mercados prprios deflagrara a

    Segunda Guerra Mundial. Para tanto, mobilizaram-se

    para a conquista do mercado internacional e criaram

    polticas pblicas objetivando a recuperao de suas

    indstrias preexistentes e, especialmente o Japo,

    uma forte expanso para setores produtivos que

    antes no dominavam. E ainda mais para os pases

    chamados de emergentes, alguns at colnias ou

    economicamente dominados antes da guerra. Todos

    os que tiveram xito na continuidade do crescimento

    se basearam no prpr io desenvolv imento

    tecnolgico, gerando e agregando inovaes

    tecnolgicas, cujo montante pode ser bem avaliado

    pelas patentes concedidas a esses pases pelo USPTO

    (sigla em ingls do escritrio de patentes americano).

    A nossa opo

    O Brasil no fez a opo pelo desenvolvimento

    tecnolgico sistmico nos anos de 50 a 70, e no criou

    nas dcadas dos anos 80 e 90 um arcabouo de

    polticas pblicas de fomento efetivo nossa indstria

    inovadora, embora tenha havido iniciativas positivas

    de financiamento a juros baixos. O nosso esforo de

    competio ficou, principalmente, por conta daquelas

    empresas que se dispuseram a assumir o prprio risco

    tecnolgico do desenvolvimento das inovaes

    necessrias para poder disputar o comrcio mundial.

    Algumas, infelizmente poucas, tiveram

    reconhecido xito e asseguraram a presena bem-

    sucedida de seus produtos. A comparao com os

    demais pases emergentes, porm, mostra que nos

    faltavam as polticas pblicas indispensveis de

    desenvolvimento tecnolgico e inovao. Era,

    portanto, uma questo essencial criar essas polticas

    pela construo de um Marco Legal de fomento e

    estmulo notadamente a criao e a direcionado para

    agregao de inovaes competitivas.

    A incorporao s polticas pblicas dos anseios

    da sociedade, ou de parte desta, um processo que

    exige criatividade para mobilizar os interessados e

    iniciativa para executar o procedimento formal em cada

    caso, no havendo uma receita nica que possa ser

    aplicada indiscriminadamente. Ainda h bem pouco

    tempo, tivemos o exemplo bem-sucedido da petio

    pblica que resultou no projeto de Lei da Ficha Limpa,

    hoje implementada. Alm disso, h a necessidade de se

    criar as condies ambientais apropriadas, como a

    estabilidade da moeda, uma taxa de cmbio adequada,

    um controle satisfatrio das contas pblicas e o

    investimento pblico em infraestrutura.

    IntroduoIntroduo

    14

  • Em 1994 ocorreu a bem-sucedida implantao

    do Plano Real e a consequente queda vertiginosa da

    inflao, viabilizando a estabilizao econmica. O

    panorama no Brasil mudou completamente. Era

    possvel pensar-se em longo prazo, desde que se

    acreditasse que o real daria certo. A questo do

    crescimento econmico assumiu nova relevncia e os

    seus baixos nveis desde o incio da dcada dos anos

    80 passaram a incomodar alguns segmentos da

    sociedade. Isso ensejou a oportunidade de se pleitear

    uma mudana de atitude em relao inovao

    tecnolgica e competitividade dos nossos

    manufaturados no cenrio mundial.

    A conscincia da necessidade de se criar

    polticas pblicas para o fomento ao desenvolvimento

    tecnolgico brasileiro veio, ento, com os exemplos

    conhecidos dos acelerados crescimentos, pela via do

    desenvolvimento tecnolgico, de alguns dos pases

    emergentes de industrializao tardia que se

    destacavam principalmente nas dcadas de 80 e 90.

    Naqueles anos, as economias da Coreia do Sul, Taiwan

    e China estavam alis, como ainda esto em plena

    ascenso, em contraste com as nossas dcadas

    perdidas, acompanhadas de intensa evoluo

    tecnolgica a ndia ainda no estava nesse grupo.

    No Brasil, inovao ainda era uma palavra rara.

    Naquele mesmo ano, circulou a edio do

    relatrio da Unesco World Science Report 1993,

    mostrando um amplo panorama mundial do que,

    internacionalmente, se chama de R&D (Research and

    Development), explicitando com exemplos o papel

    fundamental exercido pelas polticas pblicas de

    fomento s atividades de pesquisa e desenvolvimento

    (P&D) no mbito do setor produtivo desses pases

    emergentes asiticos, especialmente a Coreia. Nada

    do que ocorrera nesses pases fora fruto das

    chamadas leis de mercado, que hbito cultuar em

    certos crculos. Muito ao contrrio, prevaleceu a

    determinao dessas sociedades em construir as suas

    economias para competir com as economias

    dominantes no mercado mundial. E venc-las

    amplamente, como est evidenciado hoje pela

    profunda e longa crise dos pases centrais que esto

    perdendo a competitividade de seus produtos.

    Esse tema passou a ser objeto das atenes de

    um pequeno ncleo na Universidade Federal do Rio

    de Janeiro (UFRJ) e no Conselho Empresarial de

    Tecnologia da Federao das Indstrias do Estado do

    Rio de Janeiro (Firjan), de onde sairiam, mais tarde, as

    concepes dos atos que deveriam ser executados

    para termos uma resposta brasileira ao desafio da

    competit ividade e crescimento pela via do

    desenvolvimento tecnolgico.

    Para iniciar esse posicionamento, o fsico

    Roberto Nicolsky, ento coordenador do Laboratrio

    de Aplicaes de Supercondutores (Lasup) da UFRJ,

    Introduo

    15

  • publicou um artigo na pgina 2 do caderno Mercado

    da Folha de So Paulo, no dia 5 de janeiro de 1995,

    quando comeava um novo governo. Nesse artigo,

    cujo ttulo era O que faz falta cincia e tecnologia,

    discutia-se, talvez pela primeira vez, com dados do

    relatrio da Unesco sobre a Coreia, a necessidade de

    polticas pblicas de fomento ao desenvolvimento

    tecnolgico em seu lcus natural, a empresa. No

    primeiro momento, esse artigo provocou forte reao

    nos crculos acadmicos que atuavam na poltica

    cientfica oficial.

    Em sequncia a esse artigo, o professor

    publicou outros, debatendo o tema atravs da

    imprensa e de palestras em universidades, institutos

    tecnolgicos, rgos pbl icos e entidades

    empresariais. Nos anos que se seguiram, foram mais

    de 20 artigos na imprensa, que hoje podem ser

    encontrados na pgina especfica no site da Protec

    (www.protec.org.br). Outros autores tambm o

    fizeram, e o tema foi ganhando flego em meio

    polmica sobre a questo crtica do papel das

    polticas pblicas e do processo de mobilizao do

    setor produtivo para esse tipo de competitividade. A

    palavra inovao surgiu como um polo atrator,

    abrindo novos espaos na mdia impressa e at

    televisiva.

    Nessa fase, Nicolsky encontrou a oportunidade

    de expor essa nova preocupao a alguns gestores

    pblicos especficos da rea, como presidentes e

    diretores do Conselho Nacional de Desenvolvimento

    Cientfico e Tecnolgico (CNPq) e da Financiadora de

    Estudos e Projetos (Finep), e tambm a dois ministros

    de Cincia e Tecnologia, Israel Vargas e Ronaldo

    Sardenberg. Duas constataes emergiram dessa

    fase. Inicialmente, ficou evidenciada a necessidade de

    leis especficas para dar base a polticas pblicas de

    fomento tecnolgico. Em segundo, mostrou-se

    necessrio que a atuao individual fosse substituda

    por uma entidade do setor produtivo com

    representatividade especfica para expressar esse

    posicionamento.

    Modelos internacionais

    Em 1999, Nicolsky visitou a Coreia do Sul para

    conhecer tanto as polticas pblicas de fomento

    inovao, quanto a entidade Koita (sigla em ingls da

    Associao Coreana de Tecnologia Industrial). A

    viagem foi propiciada pela participao em uma

    conferncia cientfica. Para melhor aproveitar essa

    ocasio rara, solicitou a colaborao da embaixada

    brasileira em Seul atravs do Itamaraty. O embaixador

    Srgio Serra, que ento ocupava o cargo (ver

    depoimento), agendou reunies no principal rgo de

    gesto da poltica industrial e tecnolgica (Stepi),

    assim como na entidade Koita.

    Introduo

    16

  • O professor coreano Linsu Kim, prematuramente falecido em fevereiro

    de 2003, era um homem de grande viso que se destacava, no mundo

    acadmico, por preconizar a inovao tecnolgica como propulsora do

    desenvolvimento econmico. Seus livros e sua ao pessoal foram de

    certa forma determinantes para o rumo tomado pela poltica sul-coreana de

    apoio inovao tecnolgica.

    Era tambm um grande amigo do Brasil, tendo chegado a integrar a

    chamada Comisso Brasil-Coreia para o Sculo XXI, uma comisso de

    sbios, reunindo personalidades dos meios governamentais, acadmicos e

    empresariais dos dois pases, que elaborou, na virada do sculo, um mapa

    do caminho para as relaes bilaterais - que ainda hoje consultado. Achei

    que seria o interlocutor perfeito para o professor Roberto Nicolsky, e agendei

    um almoo entre os dois.

    Srgio Serra

    Ex-embaixador do Brasil na Coreia do Sul

    17

  • Tambm ofereceu um almoo na embaixada,

    para o qual convidou o professor Linsu Kim, que por

    12 anos esteve frente do Stepi, justamente durante

    os anos 80 e parte dos anos 90, e que poca

    presidia o rgo de planejamento estatal da

    economia. Linsu Kim, certamente o principal

    pensador sobre o desenvolvimento tecnolgico de

    pases emergentes de industrializao tardia,

    conhecia muito bem o Brasil, a Finep e a poltica

    brasileira de desenvolvimento, pois aqui esteve

    d iver sas vezes . O d i logo va leu por uma

    aprendizagem intensiva sobre a poltica tecnolgica.

    A visita Koita instituio formada em 1979

    para dar suporte, capacitao e certificao ao

    estabelecimento de centros de P&D corporativos foi

    proveitosa para compreender a forma de atuao do

    sistema coreano. A entidade edita regularmente um

    livreto com todos os dados sobre o desenvolvimento

    tecnolgico do pas, sempre se comparando aos

    principais pases centrais, para ter uma ideia clara do

    quanto ainda lhes falta para tornar-se um desses, em

    termos de tecnologia. O esprito dominante medir

    resultados e no se satisfazer com o que j se fizera

    at ento.

    1.1. Bases Conceituais

    O encontro com Linsu Kim, e a leitura dos

    artigos fornecidos por ele e de seu livro Imitation to

    innovation (traduzido e publicado em 2005 pela

    Editora Unicamp), mostrou ao professor Nicolsky a

    inadequao do modelo assumido pela poltica

    brasileira de C&T nessa poca, o chamado Modelo

    Linear (Figura 1), para um pas emergente.

    Introduo

    DESCOBERTA CIENTFICA

    DESCOBERTA/PESQUISA TECNOLGICA (P)

    DESENVOLVIMENTO TECNOLGICO (D)

    PRODUTO INOVADO NO MERCADO

    CONEXO IRREALISTA

    RECURSOS

    Figura 1:

    Modelo Linear

    Em seu artigo publicado em Industry and

    Innovation, pgina 168, volume 4 (1997), Linsu Kim

    d i z : Em pa se s desenvo l v idos , ap rende r

    pesquisando (learning by research) por empresas,

    universidades e institutos tem um papel dominante

    na expanso da fronteira tecnolgica. Em pases em

    18

  • desenvolvimento, ao contrrio, aprender fazendo

    (learning by doing) e engenharia reversa por

    empresas, com limitada assistncia de universidades

    e institutos, o padro dominante de acumulao da

    competncia tecnolgica.

    No Modelo Linear, os recursos pblicos so

    direcionados essencialmente para as universidades,

    esperando-se que estas desenvolvam conhecimento

    que depois seria transferido para o tecido produtivo.

    o que est proposto nas leis que criaram os brasileiras

    diversos fundos setoriais e que retiram recursos do

    setor produtivo para esse fim. Segundo Linsu Kim, a

    conexo com o setor produtivo s eficiente quando

    as indstrias j se encontram na fronteira tecnolgica,

    o que irreal em uma economia ainda em

    desenvolvimento, como a nossa, salvo raros nichos de

    excelncia. Havia, portanto, a necessidade de um

    novo conceito de poltica pblica para a tecnologia.

    Isso fica ainda mais claro quando examinamos o

    resultado da tabulao realizada pelo economista

    russo Guenrich Altshuller com mais de 200 mil

    patentes, em sua teoria Innovatrix, como mostra a

    Figura 2. Vemos que as descobertas de novos

    conhecimentos respondem por menos de 1% das

    patentes dos pases centrais. Ainda que um pas

    emergente produza uma descoberta, a sua base

    industrial provavelmente no estar apta a

    transform-la em produto, salvo raros nichos de

    Introduo

    excelncia, pois se encontra em processo de

    acumulao da competncia tecnolgica.

    A ida Coreia mostrou, tambm, que o principal

    indicador universalmente utilizado como medida da

    eficcia das polticas pblicas de fomento inovao

    o nmero de patentes outorgadas no prprio pas e

    no USPTO, quando se deseja comparar o desempenho

    de pases. bvio que o nmero de patentes no

    explica, isoladamente, o domnio tecnolgico, mas

    es t fo r temente co r re l ac ionado , po i s ao

    desenvolvimento tecnolgico corresponde sempre

    um crescimento da gerao de patentes.

    Assim, a Coreia, um pas que obteve teve apenas

    oito patentes nos EUA em 1980, quando iniciou o seu

    processo de desenvolvimento, j alcanara 3.562 em

    CONHECIMENTO

    NA

    TU

    RE

    ZA

    DA

    INO

    VA

    O

    Problemas rotineiros de projeto (resolvidos

    com o conhecimento da especialidade)

    Pequenas melhorias em sistemas existentes

    (usa o conhecimento de dentro da empresa)

    Melhorias fundamentais no sistema existente

    (usa o conhecimento de dentro e de fora da

    empresa)

    Novas invenes (usa o conhecimento

    sobre uma dada tecnologia)

    1%

    Descobertas raras (usa o

    conhecimento cientfico)

    50%

    25%

    15%

    9%

    Figura 2:

    Grfico de patentes de inveno de Guenrich Altshuller

    (Elaborao: Marcelo de Matos)

    19

  • 1999, ano da visita. Em 2011, chegou s 12.262,

    ultrapassando a Alemanha e, assim, tornando-se o

    terceiro pas no ranking americano de patentes, atrs

    apenas dos EUA e do Japo. E Taiwan, apenas uma ilha,

    cresceu em proporo semelhante. Esse desempenho

    pode ser visto na Figura 3, comparado ao do Brasil.

    Introduo

    Figura 3:

    Coreia e Taiwan comparados ao Brasil

    (Patentes nos EUA, 1980-2011)

    1.2. Modelo de Entidade

    O modelo da entidade coreana (Koita) exigia

    uma integrao com os rgos pblicos executores

    das polticas industriais e tecnolgicas. Isso no era

    ainda vivel em nosso pas. Portanto, seria

    interessante conhecer outro modelo de estruturao

    do setor produtivo. Assim, foi identificada a Cotec,

    uma fundao para inovao tecnolgica da Espanha

    um pas que precisa ainda desenvolver a sua

    tecnologia que parecia inspiradora. Foi ento

    visitada por Roberto Nicolsky em 2001, na

    oportunidade de outra conferncia cientfica

    europeia. A visita mostrou que essa organizao,

    ainda que tenha sido replicada posteriormente em

    Portugal e na Itlia, no seria um modelo adequado,

    pois seu foco eram a disseminao de informaes e a

    capacitao de empreendedores e empresas, e no a

    construo de polticas pblicas especficas.

    Assim, ficou claro que a entidade deveria atuar

    prioritariamente na construo de polticas pblicas

    de fomento, pois a que o Brasil tinha Lei 8.661/1993

    era inapropriada, uma vez que foi concebida com

    carter acadmico. Ou seja, a lei exigia que o projeto

    da empresa (PDTI) fosse submetido anlise e

    aprovao da Finep para que lhe fosse autorizado o

    uso de um pequeno incentivo fiscal do Imposto de

    Renda, que frequentemente no chagava a 5% do

    investimento. A empresa perdia, com isso, a iniciativa

    e a confidencialidade, e os projetos levavam dois anos

    ou mais para a contratao, perdendo-se todo o

    sentido de oportunidade para a inovao.

    Com essas constataes, restava, portanto,

    encontrar o nosso prprio caminho para alcanar o

    objetivo de dotar o pas de um Marco Legal de

    fomento ao seu desenvolvimento tecnolgico. Para

    20

  • Introduo

    L pelos anos 2000, o professor Roberto Nicolsky foi convidado por mim

    para participar do Conselho de Tecnologia da Firjan, e eu percebi que embora

    fosse um fsico da universidade, ele tinha uma experincia pregressa na indstria

    e o discurso de que a inovao se faz na indstria. Foi uma conquista muito boa

    para o nosso Conselho, porque no era gente da indstria que falava aquilo, era

    gente da universidade. E destoava, porque a universidade estava preocupada

    consigo mesma, basicamente. Depois o Roberto veio me procurar para discutir o

    esquema funcional que hoje a Protec. Ento, em 2002, com as coisas j

    mudando, fundada a Protec. Fundamos a Protec com grande entusiasmo. Eu

    achava que cabia muito bem uma entidade de carter nacional, que falasse

    sobre inovao num mesmo discurso que o nosso, era mais uma instituio a

    fazer este tipo de pregao no Brasil. E para isso, a gente achou que o professor

    Nicolsky iria dar conta de alar voo.

    Era necessrio que no fosse uma coisa da Federao, mesmo porque ns

    achvamos que tinha que ter uma conotao nacional, e a partir desse ponto o

    Roberto lutou por isso e conseguiu apoio da Abimaq. A Firjan uma instituio

    de carter regional, enquanto a Abimaq uma instituio de carter nacional,

    uma associao de indstria de mquinas e equipamentos. A voc j tinha

    duas coisas: Federao de um lado e Abimaq do outro. Foram essas duas que

    deram o primeiro apoio decisivo neste sentido e logo depois foi fundada a

    Protec. Nesse movimento de fazer, mais algumas Federaes entraram, e logo

    outras entidades aderiram.

    Fernando Sandroni

    Presidente do Conselho de Tecnologia da Firjan

    21

  • Conheci o Roberto Nicolsky no Conselho Empresarial de Tecnologia da

    Firjan, onde ele era conselheiro e eu tambm. Essas ideias sobre inovao

    tecnolgica - de que necessariamente tinha que ser conduzida pela empresa,

    pela indstria - ns dois tnhamos bem. Quando se cristalizou ento a ideia

    de criar a Protec, naquele momento j ofereci espao na nossa sede. Acho

    muito importante o trabalho conduzido pela Protec. Um trabalho srio de

    convencimento de autoridades, com a sistemtica e consistente repetio

    conceitual, contribuindo decisivamente para a implementao das polticas

    de interesse da indstria nacional.

    Nelson Brasil

    1 vice-presidente da Associao Brasileira das Indstrias

    de Qumica Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (Abifina)

    22

  • Introduo

    tanto, era indispensvel procurarem-se as entidades

    empresariais da indstria. E assim, por indicaes de

    uma entidade a outras, foi possvel criar uma rede de

    discusso sobre a forma de organizao.

    1.3. Criando uma entidade com fins especficos

    A proposta de criar uma sociedade reunindo

    entidades do setor industrial ganhou logo, ainda em

    2001, a adeso de duas entidades sediadas no Rio de

    Janeiro, a Federao das Indstrias do Estado do Rio

    de Janeiro (Firjan) e a Associao Brasileira das

    Indstrias de Qumica Fina, Biotecnologia e suas

    Especialidades (Abifina), que cedeu um espao para o

    incio das atividades de captao, a partir de

    articulao promovida por Roberto Nicolsky. Alguns

    conhecidos do tempo em que o professor trabalhara

    em P&D na indstria de So Paulo e um artigo-

    manifesto publicado com forte impacto em 4 de

    junho de 2001 ocupando todo o espao da pgina

    A3, de Opinio, da Folha de So Paulo

    imediatamente resultaram na adeso da Associao

    Brasileira da Indstria de Mquinas e Equipamentos

    (Abimaq). Seu ento presidente, Luiz Carlos Delben

    Leite, tornou-se o articulador da base operacional em

    So Paulo, catalisando a adeso de outras entidades.

    Diversas entidades foram, ento, convidadas

    para integrar o ncleo para ampla discusso do

    Entidades fundadoras da Protec

    Associao Brasileira da Indstria de Mquinas e Equipamentos

    (Abimaq)

    Associao Brasileira da Indstria Eltrica e Eletrnica (Abinee)

    Associao Brasileira da Infraestrutura e Indstrias de Base (ABDIB)

    Associao Brasileira das Indstrias de Qumica Fina, Biotecnologia

    e suas Especialidades (Abifina)

    Associao dos Laboratrios Farmacuticos Nacionais (Alanac)

    Associao Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas

    Inovadoras (Anpei)

    Centro das Indstrias do Estado de So Paulo (Ciesp)

    Centro de Integrao de Tecnologia do Paran (Citpar)

    Centro Industrial do Rio de Janeiro (Cirj)

    Federao das Indstrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg)

    Federao das Indstrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc)

    Federao das Indstrias do Estado de So Paulo (Fiesp)

    Federao das Indstrias do Estado do Paran (Fiep)

    Federao das Indstrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan)

    Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas

    (Sebrae - Nacional)

    1 presidente: Luiz Carlos Delben Leite

    23

  • Nunca tive dvida da importncia de se constituir uma entidade para

    a defesa de polticas pblicas de fomento inovao tecnolgica. Primeiro,

    pela importncia do tema. Faz muito tempo que o Brasil tem dado menos

    ateno do que devia ao contedo de sua produo, e, consequentemente,

    de sua pauta de comrcio. Tambm via - e vejo - o tema com uma dinmica

    pblico-privada, de maneira que algum precisava, com iseno, fazer essa

    costura. A Protec exerceu esse papel. Trouxe o tema para a superfcie, criou

    desequilbrios para que avanssemos. Teria sido muito difcil a construo

    do marco legal da inovao diretamente pelas entidades fundadoras da

    Protec, sem uma organizao transversal a todos os setores. da natureza

    humana e corporativa a busca por melhores resultados, e o risco de

    assimetria entre os setores seria muito grande. No estando todos no mesmo

    patamar, seja tecnolgico, seja financeiro, adensaramos as diferenas. Este

    assunto necessita de uma embaixada tcnica e poltica, que faa ajustes e

    dedique-se. Este tem sido o papel da Protec.

    Horcio Lafer Piva

    Ex-presidente da Federao das Indstrias do Estado de So Paulo (Fiesp) e do

    Centro das Indstrias do Estado de So Paulo (Ciesp), entidades fundadoras da Protec

    24

  • Sempre fui bastante sensvel questo da inovao tecnolgica no

    setor industrial, prevendo que esta realmente a chave do futuro para o pas.

    O discurso do Roberto, ento um homem da universidade ou seja, com

    menor contato com o setor industrial , era tambm muito sensvel a isso.

    Ento as propostas se somaram e surgiu a Protec. Uma entidade que pudesse

    representar o setor industrial e fazer com que houvesse uma convergncia

    em torno dessa ideia. Um lugar onde pudssemos estabelecer as bases

    necessrias para criarmos os instrumentos que estimulassem o setor

    industrial a se voltar de forma mais consistente para a questo da inovao

    tecnolgica. Levamos a proposta de criao da Protec a vrias entidades

    setoriais, e a receptividade foi muito boa. A Abimaq recebeu a proposta de

    braos abertos e procurou dar fora a esse projeto para que ele se tornasse

    realidade, e me lembro tambm da Abinee (associao de fabricantes de

    eletroeletrnicos), Abifina (farmacutica), e Federaes como a Firjan, Fiesp,

    e Fiemg (MG).

    Luiz Carlos Delben Leite

    Ex-presidente da Associao Brasileira da Indstria de

    Mquinas e Equipamentos (Abimaq)

    25

  • Introduo

    formato da nova entidade e da sua misso e valores,

    em sucessivas reunies na sede da Abimaq e da

    Federao das Indstrias do Estado de So Paulo

    (Fiesp). A adeso foi crescendo e as discusses

    finalmente levaram a uma convergncia final,

    resultando um modelo prprio, baseado na

    associao apenas de entidades industriais, vedada a

    rgos pblicos e empresas.

    Com o texto dos Estatutos em mos, partiu-se

    para a convocao da assembleia de fundao, com

    editais publicados em trs jornais de grande

    circulao. A reunio aconteceu no dia 20 de fevereiro

    de 2002 na Abimaq, com a presena de 15 entidades,

    quando foi fundada a Sociedade Brasileira Pr-

    Inovao Tecnolgica - Protec.

    Em sua misso institucional, est estabelecido

    que como associao civil voltada para a atuao em

    prol da inovao tecnolgica nacional, ter como

    objetivo e finalidade estimular, fomentar e mobilizar

    os diversos segmentos da sociedade e dos poderes

    pblicos em toda e qualquer atividade que promova a

    pesquisa e o desenvolvimento de inovaes

    tecnolgicas realizadas no pas, tendo em vista elevar

    a competitividade e a eficincia das empresas em

    geral na produo de bens, processos e servios,

    buscando satisfazer as demandas de seus usurios e

    consumidores.

    Imediatamente aps sua fundao, a Protec

    solicitou uma audincia com o presidente da

    Repblica, Fernando Henrique Cardoso, que ocorreu

    no dia 4 de maro de 2002. Ento, o Conselho

    Deliberativo da Protec, recm eleito, foi recebido no

    Palcio do Planalto com a participao dos ministros

    Ronaldo Sardenberg, da Cincia e Tecnologia, e Pedro

    Parente, da Casa Civil, alm de outras autoridades,

    para uma importante audincia (Figura 4). Nessa

    oportunidade, Luiz Carlos Delben Leite, o presidente

    do Conselho Deliberativo, exps ao presidente da

    Repblica a misso e os valores da nova entidade,

    alm da importncia e oportunidade de se construir

    um Marco Legal para a promoo do fomento

    Figura 4:

    Audincia com Fernando Henrique Cardoso

    Foto

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    Pa

    ulo

    26

  • Introduo

    inovao tecnolgica, agora que esta se tornara o

    modo de competio no cenrio mundial.

    Aps a audincia, os membros do Conselho

    concederam uma entrevista coletiva imprensa no

    Palcio do Planalto, quando a Protec e o seu iderio de

    contribuir para a construo de um arcabouo legal

    de fomento ao desenvolvimento de inovaes

    tecnolgicas como via para o crescimento foram

    apresentados sociedade.

    Um importante passo para a mudana foi dado

    com a articulao das entidades industriais com os

    rgos pblicos geradores e executores de polticas

    um movimento viabilizado pela Protec, juntamente

    com os seus associados. A mobilizao iniciada pela

    indstria se desdobrou na construo do Marco

    Legal brasileiro da inovao tecnolgica, que teve

    como primeiro instrumento o incentivo fiscal

    automtico.

    27

  • 2

  • inovao tecnolgica deve ser a base

    Ada estratgia competitiva das

    empresas. Isso deve ser levado em

    c o n t a p o r q u a l q u e r n a o

    emergente que pretenda, pelo

    menos, acompanhar a indstria dos

    demais pases, sem ter de amargar seu confinamento

    condio de produtor e exportador de matrias-

    primas naturais ou outros itens de baixo valor

    agregado. Portanto, essencial que a empresa seja

    estimulada por polticas pblicas como, por exemplo,

    os incentivos fiscais para os seus investimentos de

    A conquista do

    incentivo fiscal

    automtico

    A conquista do incentivo fiscal automtico

    29

  • risco tecnolgico. Dessa forma, a empresa desejar

    conhecer as regras do fomento e aplic-las sempre

    que tiver de atender a demandas do seu mercado,

    principalmente sob presso da concorrncia

    internacional. Mais ainda se pensar em exportar.

    At se poderia dizer que o incentivo fiscal j

    existia anteriormente no Brasil, ainda que em pequena

    dose, porm no na forma conveniente para as o

    empresas. Desde 1993, a Lei n 8.691 proporcionava

    uma pequena renncia fiscal do Imposto de Renda

    caso a empresa apresentasse previamente um

    complexo projeto (PDTI) Financiadora de Estudos e

    Projetos (Finep) para avaliao e aprovao, revelando

    as suas entranhas e estratgias. Alm disso, o

    processo de aprovao levava um longo tempo para

    ser finalizado e sufocava a oportunidade da inovao.

    Uma lei eficiente tinha de ter o conceito de

    automatismo no acesso ao benefcio fiscal, deixando

    empresa a oportunidade do uso.

    A importante questo do automatismo no uso

    do incentivo ao desenvolvimento e agregao de

    inovaes tecnolgicas, como o modo de assegurar a

    competitividade da indstria, comeou a mudar em

    2002, em presena da Protec. Mas como ser

    mostrado, essa no foi uma tarefa fcil, pois

    encontrou muita resistncia nos setores ligados

    receita tributria federal.

    poca, o governo federal, os empresrios e a

    sociedade discutiam a chamada minirreforma

    tributria para eliminar, ou pelo menos reduzir, a

    cascata do Pis/Pasep que elevava o custo dos

    produtos para os consumidores. A proposta foi

    materializada na Medida Provisria (MP) n 66, de 29

    de agosto de 2002, no intuito de aliviar a acumulao

    de impostos na cadeia produtiva e elevar a

    competitividade, incentivando as exportaes.

    Um pouco antes da publicao da MP, em 4 e 5

    de julho de 2002, a Protec organizou o I Encontro

    Nacional da Inovao Tecnolgica para Exportao e

    Competitividade (Enitec), para debater estratgias

    que levassem criao de polticas pblicas de

    fomento inovao na empresa. Durante o encontro,

    o presidente da Protec, Luiz Carlos Delben Leite,

    defendeu que o mais eficaz para aquele momento

    seria criar um sistema de automatismo para incentivar

    os investimentos em inovao tecnolgica. Por meio

    dele, qualquer empresa que investisse em P&D de

    inovaes poderia abater os seus dispndios do

    Imposto de Renda, sem solicitar prvia autorizao

    como est exigido na Lei 8.691.

    A proposta foi redigida pela Protec, com

    contribuies da Abimaq, Abifina, Firjan e Abinee, e

    apresentada em incio de agosto de 2002, na forma de

    quatro artigos, ao titular da Secretaria da Receita

    Federal, Everardo Maciel, que aprovou o conceito do

    automatismo e os introduziu na MP 66. Meses depois,

    A conquista do incentivo fiscal automtico

    30

  • oessa medida provisria foi convertida na Lei n 10.637,

    sancionada em 30 de dezembro de 2002, e a proposta

    foi transformada nos artigos 39, 40, 42 e 43 do que

    ficou chamado de Lei da Minirreforma Tributria (ver o

    texto da lei no anexo).

    Os quatro artigos representaram o primeiro

    fomento inovao tecnolgica dentro do essencial

    conceito do automatismo, disposio da indstria

    brasileira. Essencialmente, os incentivos eram o

    abatimento adicional, como custo, de 100% dos

    dispndios em P&D e, ainda, outros 100% se a

    empresa depositasse uma patente no INPI ou pelo

    Patent Cooperation Treaty (PCT).

    O aspecto mais relevante e inovador na criao

    dessa nova lei foi o fato de que as empresas no

    precisavam de autorizao prvia de qualquer rgo

    governamental para solicitarem, como incentivo

    fiscal, a restituio de parte do seu investimento em

    P&D atravs do abatimento no Imposto de Renda e na

    Contribuio Social sobre o Lucro Lquido (CSLL). O

    mecanismo semelhante ao sistema de restituio de

    Imposto de Renda para pessoa fsica no que se refere,

    por exemplo, aos gastos com educao.

    A lei, porm, veio com uma forte restrio,

    introduzida pela Receita Federal na redao desses

    artigos. Ou seja, a sua aplicabilidade foi limitada a

    empresas que estivessem no regime fiscal de

    apurao de lucro real, ou seja, menos de 8% das

    empresas brasileiras, apenas as de grande porte, que

    em geral j desenvolvem inovaes. E entre essas

    esto as empresas transnacionais, quase todas

    geradoras de inovaes em suas matrizes.

    Os artigos, porm, no foram aplicados de

    imediato por falta de regulamentao. A nova gesto

    da Secretaria da Receita Federal, que assumira em 1

    de janeiro de 2003, demorou quase um ano para

    produzir a regulamentao dos quatro artigos,

    mesmo com a insistncia direta da Protec atravs de

    audincia. Afinal, em 23 de dezembro de 2003, foi o

    emitido o Decreto n 4.928 (ver anexo) que,

    surpreendentemente, conseguiu interpretar os quatro

    artigos de uma tal maneira que anulava o incentivo

    recm criado.

    Fora encontrada uma maneira de dizer que a o

    nova lei repetia o que j era praxe desde o Decreto n

    3.000, de 26 de maro de 1999 que, em seu artigo o

    349, regulamentava o artigo 53 da velha Lei n 4.506,

    de 1964, a Lei do Imposto de Renda, autorizando

    contabilizar os dispndios correntes em P&D como

    simples despesa, dispensando trat-los como

    investimento a ser amortizado. Ou seja, tudo ficou

    como dantes, na casa de Abrantes, desaparecendo o

    incentivo que acabara de ser criado.

    Quando o decreto foi publicado, diversas

    empresas, que se estimularam com o advento dos

    incentivos, no aceitaram a ideia passivamente, pois

    A conquista do incentivo fiscal automtico

    31

  • oaquele no era o esprito da Lei n 10.637/2002.

    I n c o n f o r m a d a s , pa s s a r a m e n t o a f a z e r

    questionamentos formais Receita Federal, no

    aceitando a sua interpretao. Graas a essas presses

    em vrias frentes, aqueles quatro artigos mal

    regulamentados foram desdobrados e incorporados

    MP 255 como Captulo III. A Medida Provisria foi

    enviada pelo Governo ao Congresso Nacional no ano

    de 2005.

    A MP 255 reproduzia em seu artigo 19

    praticamente o mesmo texto do artigo 39 da lei

    anterior, porm com uma grande diferena: o

    incentivo que era de 100% dos dispndios em P&D

    havia sido reduzido para 60%. O pargrafo 1 desse

    artigo ampliava a deduo para 80%, se houvesse

    contratao adicional de pessoal para as atividades de

    P&D. Entretanto, o incentivo de 100% para

    patenteamento, da lei anterior, fora reduzido para

    20% e somente aps a sua concesso, gerando um

    forte estmulo para o patenteamento externo, de

    custos muito elevados e sem validade . Havia no Brasil

    ainda outros artigos de menor interesse.

    Na Cmara Federal, a MP 255 teve por relator o

    deputado Custdio Mattos, de Minas Gerais. Ao

    procurar o relator, a Protec recebeu a informao de

    que os ndices de incentivo fiscal, substancialmente o

    reduzidos em relao Lei n 10.637/2002, eram

    clusulas ptreas, no aceitando a SRF nenhuma

    discusso a respeito. Ante esse fato, a Protec solicitou

    ao relator que marcasse uma audincia na SRF para

    discutir a limitao do benefcio a empresas que

    apuram lucro real. O secretrio adjunto recebeu a

    Protec, ouviu, mas no discutiu a posio, tornando

    esse quesito em outra clusula inamovvel, assim

    como a limitao de s aceitar as despesas incorridas

    no ano fiscal.

    No entanto , a Le i do Bem apresenta

    insegurana jurdica. A SRF tem contestado alguns

    usos do benefcio, praticamente s aceitando

    pesquisa de bancada. Por exemplo, se uma empresa

    investe no desenvolvimento de um produto que no

    fabrica, criando competncias e ganhando espao no

    mercado, ainda assim ela corre o risco de no

    conseguir o benefcio fiscal. O problema resultado

    da falta de um entendimento mais amplo do que

    P&D e uma viso menos ortodoxa do conceito de

    inovao, que no consiste apenas em invenes

    radicais, mas tambm e sobretudo em melhorias

    de produtos e processos.

    O benefcio final depende das condies de sua

    aplicao, representando uma recuperao at o

    limite mximo de 27,2% das despesas correntes

    incorridas no ano fiscal. lcanarem o valor Isto se elas a

    integral do lucro apurado e, ainda, houver aumento

    de recursos humanos contratados, atendendo

    complexa regulamentao do Captulo III da Lei do

    A conquista do incentivo fiscal automtico

    32

  • oBem, conforme o Decreto n 5.798 de 7 de julho de

    2006 (ver anexo). Outros 6,8% dos dispndios podem

    ser recuperados se for concedida uma patente,

    porm apenas no exerccio fiscal em que esta for

    outorgada, o que no Brasil pode significar numa

    empresa de muitos anos.

    Apesar das limitaes, o incentivo da Lei do Bem

    hoje o que melhor funciona no Brasil. O Quadro 2.1

    mostra o nmero de empresas que recorreram ao

    benefcio, o valor total recuperado e o percentual

    deste valor em relao aos investimentos realizados

    pelas empresas beneficirias, desde o ano de 2006,

    quando comeou a ser aplicada.

    Em 2011, informa-se extraoficialmente que o

    nmero de empresas chegou a mais de 800, com

    valores de investimento e incentivo. Nota-se que h

    uma saturao dos valores de investimento e renncia

    fiscal. O valor desta renncia ainda insignificante por

    representar menos de 0,05%, ou seja, menos de cinco

    centsimos de por cento, ainda sem impacto na

    competitividade da economia.

    Quadro 2.1: Lei do Bem

    Fonte: Ministrio da Cincia, Tecnologia e Inovao

    A conquista do incentivo fiscal automtico

    Ano

    2006 130 2.190 229

    2007 300 5.130 884

    2008 460 8.800 1.583

    2009 542 8.330 1.383

    2010 639 8.620 1.727

    Empresas

    Investimento

    em P,D&I

    (R$ milhes)

    Renncia

    fiscal

    (R$ milhes)

    (%) Sobre

    investimento

    10,5%

    17,2%

    18%

    16,6%

    20%

    33

  • Os instrumentos de incentivo inovao representam um avano,

    mas so claramente insuficientes. O nmero de empresas que usam os

    incentivos fiscais da Lei do Bem cerca de 800 por ano. um nmero ridculo,

    dado o tamanho do parque industrial brasileiro. A Lei do Bem no se aplica a

    empresas que contribuem para o Imposto de Renda pelo lucro presumido.

    Elas esto automaticamente excludas dos benefcios. No entanto, elas

    constituem a grande maioria das empresas industriais brasileiras.

    Existem obstculos que j esto razoavelmente mapeados. A Protec, a

    Mobilizao Empresarial pela Inovao da CNI e a Associao Nacional de

    Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei) so trs orga-

    nizaes que encaminharam diversas vezes para o governo propostas para a

    maioria dos instrumentos legais. E o governo tem pelo menos em alguns

    casos adotado parte dessas sugestes.

    Pedro Wongtschowski

    Diretor-presidente da Ultrapar,

    holding controladora das empresas Ultra

    34

  • 3

  • m paralelo s articulaes junto

    E

    Secretaria da Receita Federal para

    e s t a b e l e c e r o i n c e n t i v o f i s c a l

    automtico, o Ministrio da Cincia e

    Tecnologia ( poca MCT, hoje MCTI

    com a incluso da inovao na sigla)

    enviou ao Congresso Nacional no quarto trimestre de

    2002, ltimos meses de gesto, o projeto da chamada

    Lei de Inovao. O texto foi submetido consulta

    pblica na internet. Predominou o debate sobre a

    flexibilizao da mobilidade e o empreendedorismo

    dos pesquisadores acadmicos, que de resto o tema

    central das atenes deste projeto de lei (PL).

    Contudo, o PL desagradou amplamente a academia.

    Apesar do nome que lhe fora atribudo, e de

    conter um artigo versando sobre a possibilidade

    A polmica

    criao da

    subveno

    econmica

    A polmica criao da subveno econmica

    37

  • eventua l e a regu lao de encomendas

    tecnolgicas pelo Estado, o PL no foi debatido

    previamente com as entidades industriais, nem

    tinha qualquer tipo de fomento ou incentivo

    inovao tecnolgica nas empresas. Ou seja, foi

    elaborado na falsa concepo de que inovao

    seria um produto exclusivamente acadmico.

    Portanto, no era exatamente um PL de

    inovao o que fora proposto; era uma lei que

    facilitava a mobilidade temporria de pesquisadores

    da universidade para a iniciativa privada. O PL

    tambm proporcionava maior liberdade para as

    empresas usarem as instalaes das universidades.

    O que faltava, ento, no topo da legislao brasileira

    de incentivo? J tnhamos o incentivo fiscal

    automtico. Portanto, faltava uma lei de subsdio,

    semelhana do que acontece em pases

    desenvolvidos. Tal proposta havia sido rejeitada na

    consulta pblica.

    Sabidamente, o subsdio ao desenvolvimento

    tecnolgico de inovaes o ponto fulcral das

    polticas pblicas tanto dos pases emergentes,

    quanto a prtica consagrada nos pases

    desenvolvidos, geradores de tecnologia. Alis, por

    isso que tm economias produtoras de novas

    tecnologias. Est consagrado, inclusive, como parte

    do artigo 8 (non-actionable subsidies, em ingls)

    do acordo que criou a Organizao Mundial de

    Comrcio (OMC), na rodada Uruguai, em 1994.

    A polmica criao da subveno econmica

    Acordo da OMC sobre subsdios

    e medidas compensatrias

    Parte 4 Artigo 8

    Os seguintes subsdios devem ser considerados no-acionveis:

    (a) assistncia para atividades de pesquisa realizadas por empresas

    ou instituies de ensino superior ou de pesquisa com base em

    contratos com empresas, se: a assistncia cobre no mais do que 75

    por cento dos custos com pesquisa industrial, ou 50 por cento dos

    custos de atividade de desenvolvimento pr-competitivo; e desde

    que tal assistncia seja limitada exclusivamente a:

    (i) custos com pessoal (pesquisadores, tcnicos e outro

    pessoal de apoio empregado exclusivamente na atividade

    de pesquisa);

    (ii) custos com instrumentos, equipamentos, terrenos e

    imveis utilizados exclusiva e permanentemente (exceto

    em caso de cesso de uma base comercial) para a atividade

    de pesquisa;

    (iii) custos de consultoria e servios equivalentes utilizados

    exclusivamente para a atividade de pesquisa, incluindo

    pesquisa adquirida, conhecimento tcnico, patentes etc;

    (iv) despesas gerais adicionais incorridas diretamente em

    virtude da atividade de investigao;

    (v) outras despesas correntes (como as de materiais,

    suprimentos e afins) incorridas diretamente em resultado

    da atividade de investigao.

    38

  • Uma das providncias iniciais do novo titular da

    Secretaria de Desenvolvimento Tecnolgico (Setec)

    do MCT, Francelino Grando, em 2003, foi retirar o PL

    de inovao do Congresso Nacional para reviso do

    seu texto, notadamente nas questes da mobilidade

    do pesquisador, que produzira forte oposio no

    ambiente acadmico. Esta foi a oportunidade perfeita

    para a indstria, atravs das suas entidades e da

    Protec, inserir a proposta de subsdio na lei, alm de

    outras clusulas de incentivos.

    As primeiras reunies feitas para discutir as

    mudanas no PL contabilizaram dezenas de

    interlocutores, principalmente das universidades

    pblicas, alm de representantes de algumas

    entidades industriais. A Protec participou de todo este

    c i c l o que teve , no i n c i o , um a d inm ica

    essencialmente acadmica. Logo ficou claro que ao

    setor produtivo no interessava esse debate, mas

    exclusivamente o exame da possibilidade de incluso

    de incentivos que justificassem o nome do PL.

    Assim, num processo natural as reunies

    comearam a se especializar e os representantes do

    setor industrial comearam a atuar diretamente com a

    Setec. Levou-se, ento, ao secretrio a sugesto de

    um conjunto de artigos propondo os trs principais

    fomentos internacionalmente utilizados: os subsdios

    prvios, os incentivos posteriores e o uso do poder de

    compras do Estado. Mas a resposta da Casa Civil, que

    deveria aprovar as alteraes do PL, foi desanimadora.

    Os incentivos, por ser rea da SRF/MF, ficaram

    prometidos no artigo 28 para dentro de 120 dias (algo

    muito curioso, uma lei que prometia outra lei), e o uso

    do poder de compras foi vetado sob a alegao de o

    interferia na Lei de Licitaes n 8.666/1993, rea do

    Ministrio de Planejamento. E o subsdio foi rejeitado

    por ser considerado sem base jurdica.

    Assim as nossas sugestes de artigos foram

    rejeitadas. Nesse momento levou-se ao secretrio

    Francelino Grando o texto do prprio artigo 8 do

    acordo da OMC e argumentou-se que o subsdio era o

    nico fomento capaz de romper nas empresas a

    barreira inicial de rejeio ao risco, por oferecer-lhes o

    seu compartilhamento com o Estado, posto que este

    era o maior beneficirio direto e indireto da

    agregao de inovaes competitivas. O secretrio

    convenceu-se da fundamental necessidade do Pas

    dispor desse fomento por isonomia com os

    emergentes dinmicos e os desenvolvidos.

    Muito contribuiu para o resultado dessas

    reunies o assessor da Setec, o advogado Beto

    Vasconcelos, que alertou para o fato de no existir na

    legislao brasileira o conceito de subsdio a

    empresas. Havia, porm, a subveno econmica,

    limitada a despesas correntes. Essa notcia nos foi

    dada pelo assessor em reunio havida na Abimaq, em

    So Paulo. Assim, esta contribuio ao novo PL foi

    A polmica criao da subveno econmica

    39

  • includa como pargrafo 2, do artigo 19, e aprovada

    pela Casa Civil. A alterao e o artigo 28, que

    anunciava uma nova lei de incentivos fiscais em 120

    dias, foram mudanas relevantes no fomento ao

    desenvolvimento de inovaes tecnolgicas de

    competio.

    Quando a redao saiu do forno da Setec para a

    aprovao do ministro do MCT, poca Eduardo

    Campos, surgiram ataques proposta de subveno

    partidos at de dirigentes de agncias do prprio

    MCT. A nossa cultura ainda resistia em aceitar o

    conceito de que uma parceria pblico-privada

    pudesse gerar valor para a sociedade. No

    reconhecia, mesmo ante evidncias esmagadoras,

    que o maior beneficirio de inovaes sistmicas era a

    sociedade. A empresa ainda hoje vista como um

    corpo parte da sociedade, de funo privada e

    destinada a dar benefcios apenas aos donos.

    A ideia de que a subveno econmica se

    traduzia em simples doao a empresas obscurecia o

    fato de que investir em inovao tecnolgica, cujo

    lcus a empresa, signif ica impulsionar o

    desenvolvimento socioeconmico do pas, pois a

    sociedade o maior beneficirio da conquista de

    competitividade pelas suas empresas. Tambm se

    eclipsava o fato relevante de que os recursos do

    Fundo Nacional de Desenvolvimento Cientfico e

    Tecnolgico (FNDCT), a serem usados para financiar a

    subveno, seriam recolhidos das prprias empresas,

    e no da arrecadao tributria.

    As leis especficas que criavam os fundos

    setoriais e a Contribuio de Interveno no Domnio

    Econmico (Cide) sobre as remessas ao exterior para

    pagamento de despesas tecnolgicas, como

    licenciamento de patentes e servios tecnolgicos,

    destinam recolhimentos compulsrios ao FNDCT com

    o objetivo de fomentar o desenvolvimento cientfico e

    tecnolgico. Quanto ao ltimo, o lgico seria esses

    recursos voltarem para o fomento do desenvolvimento

    tecnolgico das empresas.

    Os argumentos embasaram a defesa da

    subveno econmica. Como a proposta estava em

    perigo, a Protec e a Abifina tiveram um dilogo

    preliminar com o ministro Eduardo Campos, em um

    almoo no recinto em que se realizava o congresso de

    seu partido, em um hotel de Braslia, em 25 de maro

    de 2004. O dilogo foi uma importante oportunidade

    para discutir a fundo com o ministro o papel da

    subveno econmica, e sua funo nica de

    compartilhamento do risco tecnolgico, estimulando

    mais e mais empresas a assumirem programas de

    inovao.

    Alm disso, a Protec solicitou o apoio do ento

    presidente do Conselho Temtico de Poltica

    Industrial e Desenvolvimento Tecnolgico (Copin),

    da Confederao Nacional da Indstria (CNI),

    A polmica criao da subveno econmica

    40

  • Rodrigo Loures, poca tambm presidente da

    Federao das Indstrias do Estado do Paran (Fiep),

    para criar uma mobilizao das entidades industriais

    em defesa da nova redao do PL de inovao.

    Por uma dessas felizes coincidncias que

    ajudam a escrever a histria, um grupo desses

    representantes estaria presente em Braslia, dentro

    de poucos dias, para uma reunio dos comits

    gestores de fundos setoriais. Foi a oportunidade

    certa para argumentar em favor da subveno em

    uma audincia com o ministro Eduardo Campos. Ele

    recebeu um grupo de mais de 15 representantes e se

    comprometeu a manter a subveno no projeto que

    enviaria Cmara. E a promessa foi integralmente

    cumprida.

    Quando a proposta chegou ao Congresso, o

    relator, deputado Ricardo Zarattini, aceitou a ideia

    imediatamente. A indstria trabalhava para que

    toda a verba do FNDCT fosse para a subveno

    econmica. Nisto, ganhou um apoiador. Roberto

    Jaguaribe, titular da Secretaria de Tecnologia

    Industrial (STI), do Ministrio do Desenvolvimento,

    Indstria e Comrcio Exterior (Mdic), tambm era a

    favor de que, se no toda, pelo menos a maior parte

    da verba do FNDCT tivesse como destino a

    subveno. A Casa Civil no permitiu que a proposta

    fosse frente. Tentou-se ento baixar o percentual

    para 80%, o que foi igualmente rejeitado. O mesmo

    se deu com a alternativa de 40%.

    A Lei de Inovao acabou sendo aprovada em

    07 de julho de 2004, sob o nmero 10.973, e

    sancionada em 2 de dezembro de 2004, criando a

    subveno, porm sem um piso para esse

    investimento. A lei menciona apenas que ser

    destinado um percentual mnimo para a subveno, a

    ser def inido em por tar ias interminister iais

    posteriores. Elas s foram editadas de 2004 a 2009 e,

    ainda assim, o dispndio estabelecido - 20% do

    FNDCT - nunca foi cumprido e, em 2006, se restringiu

    a 2% dos recursos. O Quadro 5 mostra a execuo dos

    recursos do FNDCT.

    (R$ milhes ) (R$ milhes )

    Pago Ano Previsto

    2006

    2007

    2008

    2009

    2010

    2011

    40,04

    81,66

    270,31

    154,54

    349,16

    337,08

    209,60

    277,18

    322,54

    129,39

    527,15

    358,60

    A polmica criao da subveno econmica

    Quadro 5:

    Recursos aplicados na subveno

    41

  • A subveno econmica o principal

    mecanismo de fomento inovao tecnolgica para

    empresas pequenas e mdias, e para o incentivo a

    priori no Brasil. Na Organizao para a Cooperao e

    Desenvolv imento Econmico (OCDE) e em

    emergentes dinmicos, o mecanismo se chama

    subsdio. Mas, desde o incio, imps-se forte restrio

    ao acesso universal das indstrias. A limitao do

    benefcio a apenas seis reas de atuao, ditas

    estratgicas, e a trs tpicos especficos para cada

    uma dessas reas, impede a capilaridade em todos os

    setores, assim deixando de impactar a economia. Os

    critrios de execuo da subveno tm gerado muita

    polmica e esto em constante debate, assim como a

    regularidade das chamadas pblicas para a sua

    aplicao. Isso gera insegurana jurdica e incerteza

    quanto disponibilidade desse fundamental recurso

    para a inovao.

    As sugestes para o formato do edital foram

    contnuas ao longo dos anos, coletadas pela Protec

    nas edies anuais do Enitec, onde representantes da

    indstria trocavam suas impresses, dificuldades e

    propostas. Os relatrios eram encaminhados Finep.

    A tenso se manteve, at que, no ltimo edital, em

    agosto de 2010, a Financiadora o modificasse

    substancialmente. Finalmente, passou-se a exigir que

    a empresa postulante estivesse ativa durante, pelo

    menos, todo o ano anterior; apresentasse um plano

    de negcios; e comprovasse a contrapartida,

    identificando a origem desses recursos. Tambm foi

    introduzida a defesa oral do projeto e a visita tcnica

    s ins ta laes onde as inovaes se r iam

    desenvolvidas.

    As alteraes possibilitavam o acesso de

    empresas realmente produtivas aos recursos

    disponibilizados, dificultando a participao de

    empreendimentos criados somente para concorrer

    subveno, sem qualquer passado nem instalaes

    prprias. Dificultou tambm empreendimentos

    acadmicos sem foco no mercado ou condies de

    produzir e comercializar, ainda que o produto viesse a

    ser desenvolvido.

    Oito anos depois de a subveno econmica ter

    sido criada, e seus editais reavaliados e modificados,

    comea a ganhar corpo na sociedade o debate sobre

    o uso de sua fonte de recursos, o Fundo Nacional de

    Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (FNDCT). A

    aplicao deste fundo direcionada tambm para

    outras atividades, como financiamento e aes

    transversais. Porm, a gesto desses recursos sofre

    constantes retenes ara a reserva de pelo governo p

    contingncia.

    Entre 2006 e 2011, mais de um quarto da verba

    foi retido em nome dessa reserva, o que resultou em

    R$ 3,2 bilhes indisponveis para as atividades de

    A polmica criao da subveno econmica

    42

  • pesquisa e a subveno. S em 2011, a arrecadao do

    FNDCT alcanou o recorde de R$ 3,5 bilhes, valor

    7,7% maior do que a receita prevista em oramento.

    Mas, desse total, apenas R$ 800 milhes (22,3%)

    foram efetivamente utilizados em programas de

    apoio pesquisa e subveno. O fomento criado com

    tanto esforo da sociedade est sendo anulado,

    comprometendo a capacitao da economia para a

    competitividade global.

    Com a subveno econmica, o FNDCT

    comeou a induzir o desenvolvimento tecnolgico, ao

    possibilitar a aplicao de uma pequena parcela dos

    seus recursos nas empresas, e no somente na

    pesquisa acadmica. So essas aplicaes que vo

    viabilizar o incio do processo de desenvolvimento

    FNDCT Arrecadao LOA Pago

    (R$ milhes)

    2004 1.408,40 1.413,08 486,88

    2005 1.616,83 1.617,86 571,07

    2006 1.850,36 1.716,04 540,17

    2007 2.016,07 1.761,98 764,21

    2008 2.510,19 2.076,74 767,21

    2009 2.639,35 1.701,68 650,25

    2010 2.789,07 3.072,94 1.906,49

    2011 3.536,98 3.252,98 1.584,63

    2012/jan-abril 1.406,33 3.733,45 150,75

    Histrico de arrecadao e dispndio do FNDCT

    Fonte: Ministrio da Cincia, Tecnologia e Inovao

    A polmica criao da subveno econmica

    tecnolgico de inovaes nas empresas. E nisto reside

    a nossa possibilidade de competir no mercado

    globalizado e escapar do alapo de produzir

    commodities e matrias-primas de baixo valor

    agregado, que o perfil atual da nossa economia.

    Sabemos que isso no nos d uma insero

    verdadeiramente autnoma no cenrio mundial e

    limita o nosso crescimento, alm de nos tornar

    dependentes dos crescimentos dos pases

    consumidores, sem termos controle das cotaes no

    mercado.

    43

  • Introduo

    Em 2004, o governo do presidente Lula enviou ao Congresso Nacional

    um projeto de lei sobre inovao tecnolgica. Na poca, exercendo o mandato

    de deputado federal, propus a criao de uma Comisso Especial para agilizar

    a tramitao deste projeto e aprovar um substitutivo antes da deliberao

    sobre a matria pelo Plenrio da Cmara dos Deputados.

    Para a redao final desse substitutivo, no mbito da Comisso

    Especial, importantes emendas foram apresentadas por parlamentares

    interessados na matria e por mim mesmo na qualidade de relator. As

    sugestes que recebi, especialmente de representantes da Embrapa, Fiocruz,

    alm daquelas encaminhadas por conceituadas entidades da rea de

    inovao, como a Protec, foram extremamente relevantes para o processo.

    Tambm foram importantssimas as presenas, sempre constantes, de

    inmeros especialistas na matria durante os debates que ocorreram na

    Comisso Especial, destacando-se entre eles Ozires Silva e Roberto Nicolsky.

    O substitutivo foi aprovado sem emendas, no Plenrio da Cmara, em

    07 de julho de 2004. Em novembro desse ano, o Senado Federal havia apro-

    vado a matria, tambm sem emendas, o que possibilitou a sano do

    Presidente Lula da Lei n 10.973 a Lei da Inovao em 2 de dezembro de

    2004, sem ter recebido nenhum veto. Observo que sem a colaborao de dili-

    gentes consultores da Cmara e o apoio que recebemos do ento ministro de

    Cincia e Tecnologia, Eduardo Campos, e tambm do ministro da Casa Civil,

    Jos Dirceu, no poderamos ter alcanado a aprovao da Lei de Inovao em

    tempo to curto.

    Ricardo Zarattini

    Ex-deputado federal e relator da Lei de Inovao na Cmara dos Deputados

    44

  • Como relator da Lei de Inovao, no substitutivo

    da Cmara, aprovei vrias emendas de minha autoria,

    destacando-se entre elas a concesso de subveno

    econmica em programao oramentria especfica,

    para atender s prioridades da poltica industrial e

    tecnolgica definidas no primeiro mandato do

    Presidente Lula. Infelizmente, na poca, a rea econ-

    mica do Governo no fez a devida dotao de recursos

    oramentrios para subveno econmica, o que veio

    a ocorrer de fato somente a partir de 2006.

    Aprovei tambm, por meio de emenda de minha

    autoria, o artigo 28, propondo que a Unio fomentasse

    a inovao na empresa, mediante a concesso de

    incentivos fiscais, e determinando no pargrafo nico

    desse artigo 28 que o Poder Executivo enviasse, em at

    120 dias, contados da publicao da Lei, projeto neste

    sentido. Todavia esse prazo no foi obedecido pelo

    ministro da Fazenda da poca, Antonio Palocci.

    Somente no final de novembro de 2005, graas s

    nossas sugestes aceitas pelo ento relator da Medida

    Provisria que deu origem Lei do Bem, deputado

    Custdio Mattos, que se aprovou nesta Lei, de n

    11.196, de 21 de julho de 2005, o Captulo III Dos

    Incentivos Fiscais a Inovao Tecnolgica (art. 17 ao 26).

    Por meio de emendas do relator, introduzi

    tambm na Lei de Inovao artigos prevendo na sua

    aplicao algumas prioridades, como assegurar trata-

    mento favorecido empresa de pequeno porte, dando

    tratamento preferencial nas compras governamentais

    s empresas que investem em pesquisa e no desenvol-

    vimento de tecnologia do Pas o Buy Brazilian Act

    para a inovao.

    45

  • No possvel, na legislao, tratar um projeto de cincia, tecnologia e

    inovao da mesma forma que se trata um projeto de construo de uma ponte

    ou de uma estrada. Neste, voc calcula quanto material vai gastar na obra. J

    em um projeto de inovao, voc observa o caminho que percorrer at o resul-

    tado final. Ou seja, sabe-se onde ele comea, mas no aonde vai parar. Por isso,

    s vezes voc mira em uma coisa, depois v que aquilo impossvel e precisa

    mudar o rumo.

    A legislao era e ainda , em certa parte muito amarrada nesse

    aspecto. Ento, se trabalhou muito para que fosse criada uma lei que conferisse

    flexibilidade aos projetos de inovao. No final de 2004, saiu a Lei de Inovao.

    Tnhamos uma ferramenta legal que permitiria s agncias de financiamento

    repassar recursos para empresas.

    Porm, um grande problema ainda no resolvido era a forma como os

    rgos controladores viam tudo isso. Um projeto de inovao muitas vezes pode

    ir por gua abaixo, pois realmente algo novo e que no oferece garantias dos

    resultados esperados. Para o rgo controlador, isso uma forma de desperdcio

    do dinheiro pblico. O que precisa ser entendido que esse o risco natural da

    inovao.

    Por exemplo, o maior problema que eu via na poca era o chamado plano

    de trabalho. Um projeto que est sendo desenvolvido pode evoluir e ter a

    necessidade de mudar o plano. Para os rgos controladores, essa mudana

    um pecado mortal. J fizemos reunies com os rgos de controle, como o

    Tribunal de Contas da Unio (TCU) e a Advocacia Geral da Unio (AGU), para

    tentar demonstrar isso. Afinal, uma cultura nova que se estabelece.

    Odilon Marcuzzo do Canto

    Presidente da Finep de 2005 a 2007. Atual secretrio da Agncia Brasileiro-Argentina

    de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares (Abacc)

    46

  • Os tcnicos da Finep entendiam que, para a

    inovao realmente acontecer, precisvamos envolver

    as empresas. Aquela ideia de que a inovao se faz na

    universidade j no existia mais. O sistema

    universitrio um sistema de apoio, um sistema base,

    mas o lcus da inovao a empresa.

    Como presidente da Finep, evidentemente tive

    muito receio ao elaborar o primeiro Edital de

    Subveno, porque sabia que seria responsvel por

    algo absolutamente novo no Brasil, onde existe a

    cultura de que dinheiro pblico no de ningum.

    Tivemos o cuidado de fazer um balizamento firme para

    que no ocorressem desvios. Quando as empresas se

    inscreviam, tinham que preencher determinados

    requisitos. Mesmo assim, teve empresas que entraram

    com seus projetos e depois descobrimos que eram

    apenas de fachada.

    Estvamos mirando em algo fundamental: criar

    condies no Brasil para que recursos pblicos

    pudessem ser investidos como certa garantia para as

    empresas desenvolverem novos produtos e processos

    inovar, portanto. Dificilmente o empresrio brasileiro

    vai colocar recursos prprios em um projeto de risco. Ele

    prefere ganhar menos, mas em algo seguro. Acredito

    que o encaminhamento foi feito nessa direo, para

    que ele entendesse que a inovao fundamental,

    porque a competitividade no mercado internacional

    grande e s com a inovao o produto brasileiro vai

    conseguir se posicionar.

    47

  • Sem dvida, atribuo a gerao de um mecanismo to importante no

    Brasil como a Lei de Inovao a uma posio articulada e consistente da

    indstria. E digo mais: a subveno um artigo da Lei de Inovao, mas um

    artigo que vale uma lei, tamanha sua importncia. Ele um grande motor

    para a consecuo dos diversos objetivos que vm tratados na Lei. Por

    exemplo, o compartilhamento de instalaes pblicas e privadas, como

    laboratrios, era impossvel antes no direito brasileiro. Hoje, alm de ser

    legal, ele estimulado.

    A subveno chocou nos primeiros momentos os rgos de controle,

    que se depararam com uma novidade revolucionria. Uma novidade que

    no se apoia em fundamentos consolidados do direito administrativo com os

    quais os rgos de controle lidam. Afinal, a ideia de que possvel transferir

    recursos do Tesouro diretamente para o caixa de empresas, que

    naturalmente visam ao lucro, muito nova. Por sculos nosso direito foi

    pautado pela separao entre o pblico e o privado, com canais de

    comunicao sempre tortuosos.

    Porm, nesse arco de 10 anos, podemos perceber o efeito do tempo e os

    resultados da modificao que a Lei de Inovao trouxe, como essa

    facilitao do relacionamento pblico e privado, que teve seu pice na

    subveno econmica. Ento, foram os setores industriais os responsveis

    por, democraticamente, pressionar setores de governo e o Parlamento para

    chegarmos onde estamos hoje.

    Francelino Grando

    Coordenador da rea de educao na equipe de transio do

    Governo Lula e ex-secretrio de Inovao do Ministrio do Desenvolvimento

    48

  • Na poca da finalizao da Lei de Inovao, eu participava do Comit

    Gestor do Fundo Verde-Amarelo, assim como o professor Roberto Nicolsky.

    Havia acontecido um encontro do comit em Braslia e estvamos fazendo

    vrias reunies preparatrias para nossos congressos de inovao, o que

    mostrava o nmero expressivo de empresrios e pesquisadores j

    comprometidos com a causa. A dificuldade que estvamos tendo com o

    processo da lei era fazer com que a subveno fosse acolhida a tempo de

    fazer parte da Lei de Inovao, por conta dos cuidados tpicos da burocracia.

    Foi quando consegui uma audincia com o ministro da Cincia e Tecnologia

    Eduardo Campos, de ltima hora, e aproveitamos esse colegiado que j

    tnhamos reunido para levar o movimento ao Ministrio. Na reunio,

    coloquei o assunto como algo de importncia estratgica, disse que o Brasil

    precisava experimentar essa poltica de subveno, uma vez que esse

    instrumento usado por pases com os quais temos que competir. Diante

    dessas evidncias, o ministro Eduardo Campos se convenceu de que era uma

    boa proposta e, por conseguinte, adotou essa poltica. Assim, superamos

    aquelas interminveis discusses tcnicas e legais, prprias de quando se

    examina a aprovao de um novo instituto. No fim, a iniciativa se mostrou

    vivel e houve uma grande receptividade - a demanda foi bem maior do que

    o oramento definido. E o melhor de tudo foi que o projeto possibilitou a

    participao das empresas - e pequenas empresas - no acesso a esses

    recursos voltados para a cincia e tecnologia.

    Rodrigo Loures

    Presidente do Conselho de Poltica Industrial da CNI poca e

    atual vice-presidente da CNI

    49

  • Na dcada de 90, houve um enorme esforo para organizar um

    conjunto de leis que estimulassem as atividades de inovao. Parte desse

    alicerce se deve Lei n 10.973/04 a Lei de Inovao -, que dispe sobre

    incentivos inovao e pesquisa cientfica e tecnolgica, com a

    ampliao dos mecanismos de subveno e equalizao dos custos de

    financiamento. Alm da consolidao dos incentivos fiscais na Lei n

    11.196, a Lei do Bem.

    Apesar do notrio avano, h questes de insegurana jurdica e

    problemas na eficcia da Lei de Inovao. No mbito dessa lei especfica,

    foi institudo um importante mecanismo de apoio s empresas por meio

    do artigo 19, que autoriza as instituies de fomento a aportarem

    recursos no-reembolsveis diretamente nas empresas a subveno

    econmica. No entanto, possvel identificar entraves administrativos e

    jurdicos, como, por exemplo, a demora na aprovao e liberao dos

    recursos; a complexidade dos formulrios; e tambm a dependncia da

    aprovao dos gastos realizados para que haja fluxo de recursos. O

    agravante de ordem jurdica a ausncia de um entendimento comum

    entre os rgos pblicos de controle e auditoria, levando insegurana

    aos gestores pblicos na tomada de deciso acerca dos projetos.

    Paulo Skaf

    Presidente da Federao das Indstrias do Estado de So Paulo (Fiesp)

    desde setembro de 2004

    50

  • 4

  • o novo texto do projeto de lei

    N(PL) de inovao no foi

    possvel incluir um artigo que

    formalizasse a possibilidade

    de uso do poder de compras

    do Estado como um incentivo

    direto ao desenvolvimento tecnolgico e de

    inovaes nas empresas brasileiras. Aps a

    designao do relator do PL, deputado Ricardo

    Zarattini, foi feita novamente a sugesto,

    trazendo j redigido o artigo que havia sido

    re je i tado no mbi to da Secre ta r ia de

    Desenvolvimento Tecnolgico (Setec) do

    Ministrio da Cincia e Tecnologia. O relator

    O uso do poder de compras do Poder Pblico

    O uso do poder de compras do Poder Pblico

    53

  • encampou imediatamente a ideia e levou o

    artigo, bem como outras emendas que foram

    propostas Comisso de anlise do PL,

    apreciao da Casa Civil. Como j era previsto o

    seu insucesso, foi preparado um plano B, que

    consistia em acrescentar ao artigo 27, que tinha

    trs incisos versando sobre detalhes muito

    diferentes entre si (ver no anexo), um novo inciso,

    o IV, com uma declarao de princpio: dar

    tratamento preferencial, na aquisio de bens e

    servios pelo Poder Pblico, s empresas que

    invistam em pesquisa e no desenvolvimento de

    tecnologia no Pas.

    O deputado relator entusiasmou-se com a

    ideia que at chamou de Buy Brazilian Act,

    semelhana da lei americana e incluiu o novo

    inciso imediatamente. O novo texto do PL foi

    aprovado na Comisso e no plenrio em 7 de

    julho de 2004, tornando-se a Lei de Inovao (n

    10.973). Mas a nova lei foi sancionada pelo

    presidente Lula apenas em 2 de dezembro de

    2004, sem vetos. Estava institudo, ainda que de

    modo muito conciso, o novo conceito fora da Lei

    de Licitaes de que as compras de rgos

    pblicos devem promover o desenvolvimento

    tecnolgico do Pas.

    No foi tarefa fcil transformar um texto de

    duas linhas de uma nova lei em realidade.

    Enquanto se esperava a regulamentao da Lei de

    Inovao, a primeira providncia foi a Protec

    colocar esse tema em um dos painis do 5 Enitec,

    que se realizou em 9 e 10 de maio de 2005, na

    Firjan, Rio de Janeiro. Para participar do evento e

    do painel, foi convidado Eduardo Costa, diretor

    da Farmanguinhos, rgo da Fiocruz dedicado

    produo de medicamentos.

    Neste painel, representantes da Petrobras e

    Eletrobras mostraram como as empresas

    procediam para assegurar que o fornecedor fosse

    uma indstria brasileira: a licitao visava

    contratar a fabricao local de modo a viabilizar a

    inspeo de surpresa e, assim, assegurar a

    qualidade necessria na data da entrega. Contou-

    se, at, com o relato do j falecido engenheiro

    Antonio Sergio Fragomeni, que por muito tempo

    foi superintendente de compras da Petrobras,

    que fazia as encomendas. O decreto de

    regulamentao, n 5.563 (ver anexo), foi

    publicado em 11 de outubro de 2005, quase um

    ano depois, e apenas reproduziu os quatro

    incisos do artigo 27 da lei.

    Assim, foi substituindo a tradicional licitao

    O uso do poder de compras do Poder Pblico

    54

  • de compras pela encomenda direta de fabricao

    dos medicamentos Lamivudina e Zidovudina por

    Farmanguinhos (antes importados), que se

    introduziu de fato o uso do poder de compra do

    Estado como desenvolvedor de tecnologia. A

    iniciativa contou tambm com o apoio do novo

    titular da Setec, Luiz Antonio Rodrigues Elias, e da

    assessoria jurdica de Denis Borges Barbosa.

    Pouco depois, foi decretado o licenciamento

    compulsrio do medicamento Efavirenz e

    encomendada a sua fabricao no pas.

    Criou-se, ento, uma situao estranha,

    pois a Lei de Licitaes estava vigente, mas havia

    um procedimento para encomendar a fabricao

    local dos produtos com maior exigncia

    tecnolgica. Esse aparente impasse foi resolvido

    com o envio da MP 455 ao Congresso Nacional,

    que a transformou na Lei n 12.349, sancionada

    em 15 de dezembro de 2010, alterando e

    regulamentando o inciso IV do artigo 27 da Lei de

    Inovao. A sua regulamentao foi estabelecida

    pelo Decreto n 7.546, de 2 de agosto de 2011

    (institui a Comisso Interministerial de Compras

    Pblicas); Decreto n 7.713, de 3 de abril de 2012

    (frmacos e medicamentos); e Decreto n 7.767,

    de 27 de junho de 2012 (produtos mdicos).

    O uso do poder de compras do Poder Pblico

    55

  • Quando eu estava na Fundao Oswaldo Cruz (Fiocruz) como professor,

    encontrei o Carlos Gadelha, um jovem economista que tambm trabalhava

    na fundao, e comeamos a desenvolver o conceito do Complexo Industrial

    da Sade. Um pouco mais frente em 2000, 2001 fizemos um estudo para

    o BNDES, um diagnstico da indstria de vacinas no Brasil: capacidade de

    produo, modelo de gesto, perspectivas, potencialidades.

    Na Fiocruz, em torno de 2002, criamos o Projeto Inovao, que era um

    estudo prospectivo das indstrias do segmento do complexo mdico-

    industrial e que nos permitiu desenvolver e refinar um pouco mais essa viso

    inovadora que a das relaes entre sade e desenvolvimento. E quando fui

    para o Ministrio da Sade, em 2007, levei toda esta discusso debaixo do

    conceito de Complexo Industrial da Sade.

    No plano que implantei durante minha gesto, um dos sete eixos era a

    questo do Complexo Industrial da Sade, envolvendo j toda a discusso

    sobre compras pblicas, o uso do poder de compras do Estado, o

    estabelecimento de parcerias pblico-privadas, o fortalecimento da produo

    de genricos e a ampliao dos investimentos em pesquisa e inovao. E em

    2008 e 2009, quando o presidente Lula lanou a nova poltica de

    desenvolvimento produtivo do Brasil, o Complexo Industrial da Sade estava

    l como eixo estratgico do Governo. E evidentemente que algumas

    Jos Gomes Temporo

    Ministro da Sade do Governo Lula de maro de 2007 a dezembro de 2010.

    Atual coordenador-executivo do Instituto Sul-Americano de Governo e Sade,

    entidade ligada Unio de Naes Sul-Americanas (Unasul)

    56

  • experincias que aconteceram durante essa trajetria fortaleceram nossa

    estratgia, como a experincia das PPPs e o licenciamento compulsrio do

    Efavirenz.

    O licenciamento compulsrio do Efavirenz foi uma experincia impor-

    tante do ponto de vista poltico para o Pas. Vnhamos negociando com o labo-

    ratrio que detinha a patente a questo do preo do medicamento. No houve

    grandes avanos na negociao. Ento, pela primeira vez na histria do Brasil

    - ao contrrio de outros momentos, quando o Governo ameaava fazer o licen-

    ciamento compulsrio, mas recuava quando conseguia um acordo econmico

    que considerava razovel -, o processo foi at o fim. Ou seja, publiquei uma

    portaria declarando o Efavirenz medicamento de interesse da sade pblica,

    com base na legislao internacional, no tratado de Trips, no acordo de Doha.

    Pela norma vigente, o laboratrio teve 30 dias para rever a sua posio e tentar

    chegar a um acordo com o Governo, o que no aconteceu.

    Durante esse perodo, houve um trabalho extremamente integrado

    entre o Ministrio da Sade; das Relaes Exteriores, Indstria e Comrcio; e

    Advocacia Geral da Unio, para que nos cercssemos de todas as garantias

    jurdico-institucionais, legais, econmicas, de que aquela deciso no seria

    passvel de qualquer tipo de questionamento, sequer jurdico. E 30 dias depois,

    o presidente Lula assinou o decreto determinando o licenciamento compul-

    srio do produto.

    Em um primeiro momento, importamos o genrico da ndia, com o apoio

    da Unicef, para substituir o produto de marca, enquanto preparvamos

    Farmanguinhos e um conjunto de farmoqumicas privadas para o

    desenvolvimento do genrico brasileiro - o que aconteceu no muito tempo

    depois. Hoje o Brasil domina totalmente a tecnologia e esse produto

    entregue ao Ministrio da Sade por Farmanguinhos. Isso nos permitiu

    economia de divisas. Mais ainda, permitiu que o Brasil passasse a deter todo o

    processo de produo desse produto.

    57

  • Quando eu estava em Farmanguinhos, surgiram questes graves dos

    preos que o Ministrio da Sade estava pagando para a aquisio dos

    antirretrovirais e tambm de outros medicamentos. Ento propusemos a

    licena compulsria do Efavirenz, publicamente. Foi uma inovao

    importante no campo gerencial da aquisio dos insumos para a produo

    farmacutica estatal.

    Porm, tnhamos muitos problemas, porque as compras satisfeitas

    atravs de importao, em geral pelo preo mais baixo, nos deixavam a

    merc de uma srie de falcatruas. Produtos rejeitados em outros lugares

    vinham para c.

    Ento uma situao louca, em que o maior nome de laboratrio no

    Brasil, em termos pblicos, uma instituio super respeitada como a Fiocruz,

    no tem nenhum instamento jurdico-administrativo que possibilite

    trabalhar a produo com eficincia. E comea por isso, porque no

    conseguia comprar produto bom dentro dos parmetros legais, ou a tempo.

    A cada vez que a Anvisa faz uma inspeo, se voc trocar o princpio

    ativo tem que ter uma nova anlise da produo. A sistemtica? Tinha um

    ano de validade. Ento, por que comprar o produto? Em vez de comprar o

    produto vamos comprar o servio de produo. Com isso eu fao um contrato

    Eduardo de Azevedo Costa

    Ex-diretor de Farmanguinhos, laboratrio farmacutico federal da

    Fundao Oswaldo Cruz (Fiocruz). Presidente da Fundao Nacional de

    Segurana e Medicina do Trabalho (Fundacentro)

    58

  • de at cinco anos e posso ir melhorando.

    Ento a grande inovao, a histria do Ovo de Colombo, : em vez de

    comprar o produto, comprar o servio de produo. E teve um detalhe que

    colocamos a: para nossa capacidade de fiscalizao ser boa, queramos

    produo local. Por estmulo nosso, depois saiu uma portaria assinada pelos

    ministros do Planejamento, da Sade e do Desenvolvimento, dizendo que

    esse era o modo preferencial de aquisio de produtos na rea dos

    laboratrios oficiais.

    Tivemos muitas contestaes dos importadores na Justia. Lembro de

    uma reunio com a juza que ia julgar o caso. Expliquei para ela o que era

    medicamento, coisa e tal. No meio da conversa, quando a juza ia fazer uma

    anotao, pegou a caneta, olhou e jogou no lixo. Era uma caneta tipo

    esferogrfica. Ento ela disse assim: Doutor Eduardo, se licitao pblica

    no serve nem para comprar caneta que funcione, que dir para comprar

    remdio. E fez um despacho favorvel gente.

    59

  • Em 1990, a Finep encomendou um estudo sobre a importncia das

    compras pblicas governamentais no desenvolvimento da tecnologia e

    como motor especfico para inovao. E o que esse estudo aponta que as

    compras pblicas representam um dos meios de interao do Estado mais

    importantes para a promoo de um processo inovador, em particular nas

    reas ligadas ao desenvolvimento de novas tcnicas, como acontece no setor

    espacial e no setor militar.

    (...) Algumas empresas vinham