literatura popular
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TEMPO DA LÍNGUA
O português é falado, como língua oficial, por habitantes de quatro continentes.
A floresta pariu de novoo cimento uma alma novasinfonia da patchangae um cântico de liberdade!Vasco Cabral, Guiné-Bissau
És tu minha Ilha e minha África forte edesdenhosa dos que te falam à volta.Francisco José Tenreiro, São Tomé e Príncipe
As luzes da cidade brilham no morro. Ainda há pouco vinha do morro um baticum de candomblés e macumbas. Porém agora a cidade está longe e o brilho das estrelas está muito mais perto deles que as lâmpadas eléctricas.Jorge Amado, Brasil
Nha Chica conte-me aquela história dos meus irmãos hoje perdidos no mundo grande...António Nunes, Cabo Verde
Era o tempo dos catetes no capim e das fogueiras no cacimbo. Das celestes e viúvas em gaiolas de bordão à porta de casas de pau-a-pique. As buganvílias floriam e havia no céu um azul tão arrogante que não se podia olhar. Era o tempo da paz e do silêncio à sombra de mulembas.Luandino Vieira, Angola
A terra treme, a areia salta, o suor escorre, as peles brilham e a voz do chigubo soa. São dois e o sangue à volta é o do chigubo. Os pés batem e o ritmo é bangue, o sangue esquece e só a dança fica, é sura e céu.José Craveirinha, Moçambique
Tata-MailauÉ o pico-avô da minha ilha.Fernando Sylvan, Timor
À medida que as navalhas avançavam, as vinhas iam perdendo a graça, a força e a virgindade. E com esta desolação morria também um pouco da alegria dos vindimadores, que chegavam da Montanha sem sono, a cantar e a dançar, e que agora dormiam como lajes.Miguel Torga, Portugal
Em ilhas e em faixas costeiras de África, da América e da Ásia sobreviveram até hoje línguas crioulas formadas a partir da língua portuguesa.
Os crioulos são línguas naturais, de formação rápida, criadas pela necessidade de expressão e comunicação plena entre indivíduos inseridos em comunidades multilingues relativamente estáveis.Chamam-se de base portuguesa os crioulos cujo léxico é, na sua maioria, de origem portuguesa. No entanto, do ponto de vista gramatical, os crioulos são línguas diferenciadas e autónomas. Os crioulos de base portuguesa são habitualmente classificados de acordo com um critério de ordem predominantemente geográfica embora, em muitos casos, exista também uma correlação entre a localização geográfica e o tipo de línguas de substrato em presença no momento da formação.
História da Língua
período pré-românicoOs linguistas têm hoje boas razões para sustentar que um grande número de línguas da Europa e da Ásia provêm de uma mesma língua de origem, designada pelo termo indo-europeu. Com excepção do basco, todas as línguas oficiais dos países da Europa ocidental pertencem a quatro ramos da família indo-europeia: o helénico (grego), o românico (português, italiano, francês, castelhano, etc.), o germânico (inglês, alemão) e o céltico (irlandês, gaélico). Um quinto ramo, o eslavo, engloba diversas línguas actuais da Europa Oriental.
O período românico
Embora a Península Ibérica fosse habitada desde muito antes da ocupação romana, pouquíssimos
traços das línguas faladas por estes povos persistem no português moderno.
A língua portuguesa desenvolveu-se na costa oeste da Península Ibérica (actuais Portugal e região da
Galiza, ou Galícia) incluída na província romana da Lusitânia.
A partir de 218 a.C., com a invasão romana da península, e até o século IX, a língua falada na região é
o romance, uma variante do latim que constitui um estágio intermediário entre o latim vulgar e as
línguas latinas modernas (português, castelhano, francês, etc.).
Durante o período de 409 d.C. a 711, povos de origem germânica instalam-se na Península Ibérica. O
efeito dessas migrações na língua falada pela população não é uniforme, iniciando um processo de
diferenciação regional. O rompimento definitivo da uniformidade linguística da península irá ocorrer
mais tarde, levando à formação de línguas bem diferenciadas. Algumas influências dessa época
persistem no vocabulário do português moderno em termos como roubar, guerrear e branco
A partir de 711, com a invasão moura da Península Ibérica, o
árabe é adoptado como língua oficial nas regiões conquistadas,
mas a população continua a falar o romance. Algumas
contribuições dessa época ao vocabulário português actual são
arroz, alface, alicate e refém.
No período que vai do século IX ao XI, considerado uma época
de transição, alguns termos portugueses aparecem nos textos
em latim, mas o português (ou mais precisamente o seu
antecessor, o galego-português) é essencialmente apenas falado
na Lusitânia.
Galego-português
No século XI, à medida que os antigos domínios foram
sendo recuperados pelos cristãos, os árabes são
expulsos para o sul da península, onde surgem os
dialectos moçárabes, a partir do contacto do árabe
com o latim.
Mapa da reconquista cristã do território de Portugal
Com o início da reconquista cristã da Península Ibérica, o galego-português consolida-se como língua falada e escrita da Lusitânia. Em galego-português são escritos os primeiros documentos oficiais e textos literários não latinos da região, como os cancioneiros (colectâneas de poemas medievais):
Os mais antigos textos escritos em português
De princípios do século XIII eram já conhecidos dois textos originais escritos em português - a Notícia de Torto e o Testamento de Afonso II. Recentemente foi descoberto um outro documento original, também escrito em português, mas de 1175 - a Notícia de Fiadores
1214 Junho 27Testamento de D. Afonso II.Existem dois exemplares deste testamento, a cópia que foi enviada ao arcebispo de Braga e aquela que foi enviada ao arcebispo de Santiago.
linha 1En'o nome de Deus. Eu rei don Afonso pela gracia de Deus rei de Portugal, seendo sano e saluo, temëte o dia de mia morte, a saude de mia alma e a proe de mia molier raina dona Orraca e de me(us) filios e de me(us) uassalos e de todo meu reino fiz mia mãda p(er) q(ue) de
O português arcaicoÀ medida em que os cristãos avançam para o sul, os dialetos do
norte interagem com os dialetos moçárabes do sul, começando o
processo de diferenciação do português em relação ao galego-
português. A separação entre o galego e o português inicia-se com a
independência de Portugal (1185) e consolida-se com a expulsão
dos mouros em 1249 e com a derrota em 1385 dos castelhanos que
tentaram anexar o país.
Entre os séculos XIV e XVI, com a construção do império português
de ultramar, a língua portuguesa faz-se presente em várias regiões
da Ásia, África e América, sofrendo influências locais (presentes na
língua actual em termos como jangada, de origem malaia, e chá, de
origem chinesa). Com o Renascimento, aumenta o número de
italianismos e palavras eruditas de derivação grega, tornando o
português mais complexo e maleável. O fim desse período de
consolidação da língua (ou de utilização do português arcaico) é
marcado pela publicação do Cancioneiro Geral de Garcia de
Resende, em 1516.
O Pai Nosso ao longo dos séculos
Antroponímia antiga e moderna
Vemos toda a nossa história passar efectivamente diante de nós, ao olharmos para as listas antroponímicas: os barões medievais com os seus solares (uso da partícula de), a vaidade da sua prosápia (apego aos patronímicos); a nobreza, que lhe sucede, não menos orgulhosa de encadeamento de apelidos geográficos, e de outros tidos como raros e sonoros.
Os descobrimentos trazem-nos directa ou indirectamente Brasil, Ceita ou Ceuta, Índio, Samorim, Ternate. Quando encontramos as alcunhas ou alcunhas-apelidos de Espadeiro, Meleiro, Monteiro, evocamos indústrias ou cargos hoje extintos, mas que desempenharam certo papel na antiga sociedade portuguesa.
É tal a intimidade entre o gosto do nome e as circunstâncias políticas da nação, que nos tempos da guerra da Liberdade se escolhiam os nomes Pedro ou Miguel, consoante a paixão política das respectivas famílias; e a mesma intimidade continua a revelar-se hoje no regime democrático.
Os dialectos do português:fronteiras fonéticas
No território português continental e insular é variável a maneira como se designam os mesmos conceitos.
As Comunidades Portuguesas no Mundo
Quando a colmeia está completa, os enxames saem. Também com o Homem este é um fenómeno que se repete ao longo dos tempos. À deslocação de uma população, acompanhada de uma mudança de domicílio, que pode ser temporária, periódica ou definitiva, chama-se migração.
O fenómeno das migrações
Artigo 13.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que, expressamente, refere: «Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado.»
As migrações devem-se a causas:
Religiosas (judeus) Económicas (desemprego, baixos salários…) Políticas (refugiados) Socioculturais (desejo de mudança) Naturais
Ao longo da História, pode dizer-se que as migrações contribuíram para o povoamento do mundo
Desde os século XII que os portugueses se começaram a espalhar pelo mundo.
Primeiro fizeram-no pela Europa (Flandres, Inglaterra, França). A partir do século XV espalharam-se por África, depois pela América, a seguir pela Ásia e a Oceania.
Em todo o lado fundaram milhares de cidades, criaram vários países ou estiveram na origem da sua independência, ajudando-nos com a sua criatividade e trabalho a desenvolverem-se.
A emigração constitui, no nosso país, um fenómeno demográfico muito antigo
Emigração: acto de deixar, espontaneamente, o seu local de residência para se estabelecer numa outra região ou país. É a mesma coisa que imigração mas vista da perspectiva do lugar de origem
Os portugueses tiveram um papel importante nos descobrimentos, em parte, devido ao seu espírito aventureiro, à curiosidade de conhecer novas terras e novas gentes e ao seu “espírito missionário”
No entanto, a emigração portuguesa teve sempre como causa básica a procura de bens materiais em nações mais ricas e que a terra de origem a muitos negava
Devido à expansão ultramarina a cidade de Lisboa torna-se a metrópole comercial do mundo:
Concentra uma diversidade de gentes e etniasTem abundância de produtos oriundos dos mais diversos locais do mundoConstrói-se um notável conjunto de obras públicas da responsabilidade de D. ManuelPassa a ser metrópole políticaTem grande dinamismo demográficoTorna-se um centro difusor de novidades e saberes
Esta situação está relacionada com as migrações que ocorrem neste período dentro do nosso país, e que levam mesmo, o poeta Sá de Miranda a escrever:
“Não me temo de Castela donde inda guerra não soa,mas temo-me de Lisboaque, ao cheiro desta canela,o reino nos despovoa.”
Sá de Miranda foi um autor com uma sólida formação humanística
Na sua temática vemos uma forte atitude moralizadora que realiza através da oposição entre a cidade e o campo. A cidade mostra a degradação da sociedade portuguesa que estava a esquecer os seus verdadeiros valores que para o autor se encontram na pureza do campo.
Tendo em conta a orientação dos nossos emigrantes, podemos considerar, na história da emigração portuguesa, três ciclos:
Primeiro Ciclo: decorre até aos princípios da década de 60 Foi essencialmente uma emigração transoceânica, orientada
para o Brasil, Venezuela e Argentina, por um lado, e para os Estados Unidos e Canadá, por outro
Segundo ciclo: Dos princípios da década de 60 até por volta de 1974
A corrente emigratória portuguesa orientou-se sobretudo para os países industrializados da Europa Ocidental: França, ex-República Federal da Alemanha, Luxemburgo , Reino Unido, Suíça e Holanda
O abrandamento do crescimento económico nos princípios dos anos 70 levou os países receptores a impor restrições à emigração, o que provocou um intenso movimento emigratório clandestino, especialmente para a França
Terceiro ciclo: Corresponde ao renascimento das correntes migratórias
antigas, apoiadas em redes de acolhimento e de solidariedade local, desenvolvidas pelas anteriores gerações de emigrantes. Orientou-se sobretudo para os Estados Unidos, Canadá, Austrália e Venezuela
Nos últimos anos a emigração definitiva tem-se voltado de novo para a Europa, especialmente para a França
Se do ponto de vista demográfico a emigração pode representar um empobrecimento para o país natal , traduz-se ela também por um afluxo de riqueza humana
Através da difusão da língua e da cultura, que naturalmente enriquecem o património universal
Quanto à língua , é preciso não esquecer que ela constitui o primeiro instrumento do florescimento e da projecção das culturas e, indirectamente, da afirmação política e dos interesses económicos das nações e dos Estados
Saliente-se a este propósito, que o português, falado por mais de 200 milhões de pessoas, é uma das línguas oficiais na Organização dos Estados Americanos e na União Europeia, é utilizada frequentemente na Organização da Unidade Africana e impõe-se como língua de trabalho, de facto, em muitas reuniões internacionais
Através de uma multiplicidade de meios de veiculação cultural, como, por exemplo, manifestações de natureza cultural, exposições, jogos, etc.
e ainda pelos domínios das artes, das ciências, das letras ou do desporto, os portugueses, onde quer que se encontrem, são portadores e veículos da cultura que há em si e que têm o direito de preservar e enriquecer.
O apoio às Comunidades Portuguesas está a cargo do IACP (Instituto de Apoio às Comunidades Portuguesas), que actua nas áreas cultural, dos seus direitos, dos acordos com os países de acolhimento, da educação, do emprego, etc.
Outro organismo importante de apoio às Comunidades Portuguesas é o Instituto Camões, essencialmente vocacionado para o apoio ao ensino da língua lusa.
A expansão da língua portuguesa também está condicionada: pela política externa do Estado português pela atitude dos organismos internacionais relativamente às línguas
oficiais por eles utilizadas pela posição de outros Estados na promoção internacional da nossa
língua e também pela inclusão (ou não) da Língua Portuguesa, mesmo
como língua de opção, nos planos de estudo dos países de acolhimento
Assim, as migrações ao longo da História também contribuíram para um encontro de culturas
Os migrantes, quando se deslocam, levam também os seus valores, preconceitos, medos, tradições e costumes, e nem sempre é fácil a sua integração e aceitação na nova sociedade
Por vezes o preço desta dificuldade resulta em segregação social e racial –xenofobia- e perda de identidade
Quando uma sociedade consegue absorver e integrar os seus migrantes, esse é um factor de progresso e de avanço social, pois torna-se mais rica em valores entre os povos do Mundo
Ei-los que partem
Ei-los que partemnovos e velhosbuscando a sortenoutras paragensnoutras aragensentre outros povosei-los que partemvelhos e novos
Ei-los que partemde olhos molhadoscoração tristee a saca às costasesperança em ristesonhos douradosei-los que partemde olhos molhados
Virão um diaricos ou nãocontando históriasde lá de longeonde o suorse fez em pãovirão um diaou não
Manuel Freire (Técnico de computadores, poeta e cantor português, 1942 - )
Multiculturalismo e Diálogo de Culturas
Através do diálogo intercultural poderemos promover os seguintes objectivos:
• Compreender a natureza pluralista da nossa sociedade e do nosso mundo.
• Compreender a complexidade e a riqueza da relação entre as várias culturas, tanto no plano pessoal como no comunitário.
• Colaborar na busca de respostas aos problemas mundiais que se colocam nos âmbitos social, económico, político e ecológico.
• Promover o diálogo entre as culturas.
O diálogo entre culturas corresponde a uma exigência do nosso tempo, dada a necessidade de dar respostas comuns a desafios que se colocam a todos os povos. Para levar a cabo esta tarefa, é necessário ter como base um conjunto de valores partilhados, entre os quais se evidenciam os seguintes:
• Salvaguarda dos direitos humanos• Apreço pela liberdade, igualdade e solidariedade• Respeito pelas diferenças culturais• Promoção de uma atitude dialogante• Implementação de uma tolerância activa
O diálogo entre povos de diferentes culturas é o meio de possibilitar o enriquecimento mútuo de todas elas.
Maria Antónia Abrunhosa e Miguel Leitão, Um outro olhar sobre o mundo
Literatura Popular / tradicional
Sofia Carvalho
Aprendo mais com abelhas do que com aeroplanos.É um olhar pra baixo que eu nasci tendo.É um olhar para ser menor, para oInsignificante que eu me criei tendo.O ser que na sociedade é chutado como uma barata - cresce de importância para o meu olho.Ainda não entendi porque herdei esse olhar para baixo.Sempre imagino que venha de ancestralidades machucadas.Fui criado no mato e aprendi a gostar das coisinhas do chão- antes que das coisas celestiais.Pessoas pertencidas de abandono me comovem:tanto quanto as soberbas coisas ínfimas.
Manoel de Barros
E assim, lição por lição,o que aos poucos aprendemosde outros a outros daremosque outros a outros darão.
António Aleixo
A tradição é o vento que a tua passagem levantar.
António José Saraiva,"Uma carta" in Para a História da Cultura em Portugal
Nomenclatura
literatura tradicional",
"literatura popular",
“literatura oral",
"literatura oral popular",
"literatura popular de tradição oral“
ou como "literatura popular tradicional de
expressão e transmissão oral".
João David Pinto Correia apresenta uma proposta de definição: 4 subgrupos de literatura tradicional:
composições de curta duração
contribuições de autores consagrados e que usam
técnicas tipicamente populares, como as quadras
composições produzidas por elementos do povo
a produção colectiva e anónima do povo - afirma
serem os dois últimos subgrupos os que mais
próximos se encontram da essência do povo e,
consequentemente, da literatura tradicional.
Composições líricas de pendor prático e intenção mágica e religiosa - As orações, dentro deste grupo, podemos
acentuar a importância de algumas rezas, tais como o "Padre Nosso Pequenino", a "Oração ao Levantar" ou a "Oração ao Deitar".
- Os ensalmos, benzeduras e exorcismos têm como objectivo influenciar a realidade por meio da palavra.
- As cantigas de embalar são outra forma de manifestação da literatura tradicional, assumindo-se como a forma à qual a mãe recorre para adormecer o seu filho, tecendo-lhe elogios, temendo pela sua sorte e expulsando o Papão de perto da criança.
Composições líricas de pendor prático e demonstração de sabedoria
- A parameologia (onde se incluem os adágios, provérbios, anexins, máximas...),
- Os ditos populares
Composições líricas de pendor prático e intenção utilitária
- Os pregões
- As lengalengas
- Os trava-línguas
- As cantigas
- A adivinha
Composições narrativo-dramáticas - As lendas
- O mito
- As fábulas
Composições registadoras-elementares
- Os romances
- O conto ****
- Os contos de fadas
- As anedotas
Composições dramáticas
- O teatro popular
*** versões do conto Capuchinho Vermelho dos irmãos Grimm
e de Perrault: versão de Perrault, o lobo come a menina, retirando-lhe
qualquer possibilidade de salvação. Charles Perrault escrevia para a corte de Versalhes, um
meio social rigoroso na moral e onde se movimentavam muitos "lobos maus", pelo que as meninas corriam imensos riscos e deviam, por isso, ter muito cuidado. O deslize de uma jovem, perante uma tentação, seria irremediável.
versão dos irmãos Grimm, o lobo come-a, mas a menina acaba por ser salva. Por sua vez, a versão alemã dirige-se a um mundo caracteristicamente burguês, onde as coisas não se passam assim. O deslize de uma jovem, após o arrependimento, pode sempre permitir o perdão e resultar, inclusive, num desenlace feliz.
A literatura tradicional envolve, necessariamente, um processo de escrita
e de oralidade. Sendo que esta oralidade comporta em si o estigma da
transmissão.
Por receio da morte, inventou-se, para a voz (perecível e efémera),
regulada pelo ritmo do tempo, uma hipótese de sobrevivência: a escrita
(estável e duradoura)
E esta transmissão acaba por ser uma forma de garantir uma herança
milenar que nos passa de pais para filhos, ficando os que a recebem com
a missão de continuar a prolongá-la.
Além disso, se reflectirmos, cedo nos apercebemos de que nós mesmos
participamos activamente num processo de conservação da literatura
tradicional e ajudamos à sua passagem de geração em geração, seja
através da reprodução das cantigas, contos populares, adivinhas ou
lendas que vamos ouvindo de pessoas mais velhas e murmurando por aí.
Viegas Guerreiro adianta mesmo que a literatura tradicional nasce para ser ouvida, condição que comporta em si o gérmen da transmissão oral que, por sua vez, vai dar passo ao anonimato.
Ou seja, é de crer que os provérbios, os contos, as lengalengas levem quase sempre impressos a marca de várias gerações que os foram modificando, ainda que quase imperceptivelmente, marcas essas que se prendem com a forma como foram ditos, aplicados ou alterados, consoante o momento em que eram ditos e segundo a boca de onde saíam.
A literatura tradicional é sinónimo de acção, de intervenção, de vida, seiva.
A literatura tradicional relaciona-se com a literatura e a arte produzida no seio popular
há que distinguir dois grupos que a criam : o grupo do povo propriamente dito, constituído por analfabetos ou semiletrados citadinos ou campesinos o grupo do não povo formado pelos autores eruditos, que podem escrever para o povo de forma intencional ou não
História da literatura tradicional século VI/VII, já que existe legislação que
proíbe danças profanas, cantos e momos
do século IX e princípios do X tem-se igualmente prova da existência de um escritor que escreve pequenas composições líricas - as moaxaha - de cariz popular, num sincretismo entre a tradição cristã e a língua árabe. Mais tarde, estas composições convertem-se nas nossas conhecidas cantigas de amigo
Desde os finais do século XII até aos finais do século XV os textos tradicionais são poucos, o que pode ser explicado pela perda de colecções ou pela escassez de compiladores.
Os séculos XVII, XVIII e XIX foram palco da divulgação do teatro de cordel com cantigas tradicionais, sendo que no XVII e XVIII veio a lume a poesia popular contra o domínio filipino e as famosas "Trovas de Bandarra".
Almeida Garrett, com o seu Cancioneiro e Romanceiro Geral (1843 e 1851), terá sido o primeiro colector a reunir em publicação as jóias da tradição popular.
Actualmente, há que encarar a literatura tradicional como uma forma de identidade daquilo que fomos e daquilo que enforma parte do nosso ser, que é o mesmo que dizer que há que valorizar aquilo que, efectivamente, é nosso e está vivo.
Projectos No âmbito do Ano Internacional da Astronomia, o
Museu da Ciência da Universidade de Coimbra e o Instituto de Estudos de Literatura Tradicional da Universidade Nova de Lisboa promovem o projecto O Céu dos nossos avós, a desenvolver em países de língua oficial portuguesa.
Este projecto consiste na recolha de histórias
tradicionais relacionadas com astronomia, mas também com a identificação de conhecimentos empíricos de astronomia que possam ter sido usados - ou ainda sejam usados - por pescadores, pastores ou lavradores nos seus diversos ofícios.
Projectos: Passos Contados: Passeios pedestres de interpretação da paisagem Começa em Abril em Cacela a 3ª edição do ciclo anual de
passeios pedestres de interpretação da paisagem "Passos Contados". Passos Contados... porque os caminhos, os lugares, as pessoas contam estórias.
O Centro de Investigação e Informação do Património de Cacela / CMVRSA propõe este ano novas experiências de interpretação e descodificação das paisagens culturais e naturais do sotavento algarvio. Nesta terceira edição iremos à descoberta das plantas e dos seus antigos usos na medicina e alimentação; de vestígios da presença romana em Cacela; vamos observar o céu durante a noite e conhecer as antigas mitologias ligadas aos astros; com os pés na água vamos procurar os animais da maré baixa; vamos escutar os morcegos e procurar a fauna nocturna; e terminaremos na ria formosa observando as aves.
O projecto “MEMORIAMEDIA e-Museu de Património Imaterial” concretiza-se na recolha e difusão da literatura
tradicional/ oral/ popular e de todas as formas de manifestação desta cultura – tradicionais e contemporâneas – enquanto parte do património imaterial, nacional e universal da humanidade.
Fundamenta-se na urgente necessidade de identificar, registar, preservar e divulgar um património que está em risco de se perder: os contos, as lendas, os provérbios, as lenga-lengas e demais expressões da cultura oral; o “saber-fazer” de antigos artesãos, da pequena indústria tradicional e do comércio tradicional; os costumes e ritos que ainda se manifestam em quotidianos da esfera profissional, familiar e social das populações.
Os vocábulos “estória” e “história” Não existe diferença significativa entre os vocábulos “estória” e “história”, que
partilham a mesma etimologia (do grego ‘historía’). Contudo, “estória” é a grafia antiga de “história” que, entretanto, caiu em desuso no
português falado em Portugal. Por conseguinte, este vocábulo não aparece registado nos mais recentes dicionários
de língua portuguesa editados em português de Portugal. Porém, ainda o podemos encontrar no Michaelis. Moderno Dicionário da Língua
Portuguesa, editado em São Paulo (em 2002), com um significado diferente de “história”.
Estória (segundo Michaelis): 1) Narrativa de lendas, contos tradicionais de ficção. No que se refere aos dicionários mais recentes editados em Portugal, todas as
acepções supra-referidas são parte integrante da entrada “história”.
História 1) Narração ordenada, escrita dos acontecimentos e actividades humanas ocorridas
no passado. 2) Ramo da ciência que se ocupa de registar cronologicamente, apreciar e explicar os
factos do passado da humanidade em geral, e das diversas nações, países e localidades em particular.
3) O futuro, considerado como juiz das acções humanas (ex: A história o julgará.) 4) Biografia de uma personagem célebre. 5) Exposição de factos, sucessos e particularidades relativas a determinado objecto
digno de atenção pública. 6) Narração de uma aventura particular.
ADIVINHAS Há milhares de anos que existem adivinhas, que têm feito pensar e rir muitas gerações de adultos e crianças. Já se perdeu a memória de quem as inventou e são hoje um tesouro da nossa cultura que não pára de crescer porque há sempre gente
Ex. Quem é que não resolve nada mas vive a tomar medidas?
PROVÉRBIOS, sentenças, os saberes do povo têm um enorme interesse. Mostram o que os antigos já pensavam e, deste modo, constatamos que se mantém igual ao pensamento dos nossos dias.
Ex. Do trabalho e experiência aprendeu o homem a ciência
LENGALENGAS é um texto com frases curtas (que normalmente rimam) e muitas repetições, que nos ajudam a decorá-lo com facilidade.
Era, não era,
Andava lavrando,
Recebeu carta,
Do seu tio Fernando,...
TRAVA-LÍNGUAS é uma brincadeira com palavras difíceis de pronunciar quando estão juntas, como por exemplo: três tristes tigres
Lendas Portugal é um país de lendas. Há lendas sobre
fenómenos astrológicos, batalhas históricas, toponímia, mouras encantadas, enfim, sobre variadíssimos assuntos.
A lenda é uma pequena história de origem popular, que tem por base uma verdade concreta. Na sua essência, a lenda pretende ser uma explicação acessível e estruturalmente coerente, mas sempre fantasiosa, de um facto, nome ou acontecimento real.
Como tal, é vulgar dizer-se que a lenda tem sempre um fundo de verdade, porque efectivamente se apropria da realidade, mas assimilando-a e alterando-a, acrescentando, por vezes, elementos sobrenaturais.
Tipos de lendas Significado
RELIGIOSAS Intervenção de entidades cristãs: Cristo, santos, etc.
MÍTICASIntervenção de entidades do maravilhoso pagão: Diabo, feiticeiros, fantasmas, gigantes.
ETIOLÓGICAS Pretendem explicar um nome, um fenómeno físico.
HISTÓRICAS Intervenção de personagens ou factos históricos.
De mouros e mourasIntervenção de mouros (as), representantes de antigas divindades do paganismo ligadas à história peninsular e nacional.
CONTOS POPULARES Transmitidos de boca em boca, de pais para
filhos, faziam parte integrante de um legado transmitido de geração em geração
O conto é um tipo de narrativa que se opõe, pela extensão, quer à novela, quer ao romance. De facto, é sempre uma narrativa pouco extensa e a sua brevidade tem implicações estruturais: reduzido número de personagens; concentração do espaço e do tempo, acção simples e decorrendo de forma mais ou menos linear.
O que disse Paula Rego,
em entrevista a Alexandra Prado
Coelho do Público, acerca do
quadro «Mulher Cão»:
«Era uma senhora de idade que estava rodeada dos bichinhos todos de casa, as galinhas, os coelhos. Depois veio uma voz pela chaminé abaixo, como um vento, a dizer umas coisas esquisitas. A mulher agachou-se, abriu a boca, os bichos começaram a andar à volta, e meteram-se pela boca dela dentro e ela comeu-os todos. Parece-me que é um conto tradicional português. São extraordinários esses contos, são de uma violência extraordinária».
Os contos tradicionais do povo lusitano são conhecidos pela sua afinidade com a religião e pela sua carga simbólica. É interessante verificar como a tradição oral de um povo o retrata a si e à sua história, sendo por isso um modo fiel de caracterização de uma cultura.O Menino Sem Olhos (um rapaz arranca os seus próprios olhos a pedido do irmão) ou "O Caldo de Pedra", descobrimos uma característica tão nossa conhecida e tão incutida nas nossas raízes: a capacidade de improvisação e a astúcia.
PROVÉRBIOS PARA GENTE CULTA!....
Expõe-me com quem deambulas e a tua idiossincrasia augurarei.
Espécime avícola na cavidade metacárpica, supera os congéneres revolteando em duplicado.
Ausência de percepção ocular, insensibiliza o órgão cardial.
Equino objecto de dádiva, não é passível de auscultação odontológica.
O globo ocular do perfeito torna obesos os bovinos.
Idêntico ascendente, idêntico descendente.
Descendente de espécime piscícola sabe movimentar-se em líquido inorgânico.
Pequena leguminosa seca após pequena leguminosa seca atesta a capacidade de ingestão de
espécie avícola.
Tem a monarquia no baixo ventre.
Quem movimenta os músculos supra faciais mais longe do primeiro, movimenta-os
substancialmente.
Quem aguarda longamente, atinge a exaustão