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JULGAMENTO HISTÓRICO Competência da Justiça do Trabalho Indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidentes do trabalho ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO

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JULGAMENTO HISTÓRICO

Competência da Justiça do Trabalho

Indenização por danos moraise patrimoniais decorrentesde acidentes do trabalho

ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO

VITÓRIA HISTÓRICA DOS JUÍZES DO TRABALHO

A decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal em 29 de junho de2005, não encerra apenas um mero conflito de competência. A data en-tra para a história associativa como marco da definição da competênciamaterial da Justiça do Trabalho para julgamento das ações de indeniza-ção por dano moral e patrimonial decorrente de acidente do trabalho ede doença ocupacional.

A Emenda Constitucional 45/2004 (Reforma do Judiciário), que forta-lece a Justiça do Trabalho como instrumento de concretização de direi-tos e garantias do trabalhador brasileiro, reafirmando o papel do Estadona defesa do cidadão, corroborou a consistência da tese defendida pe-los muitos magistrados brasileiros que, independentemente do ramo doJudiciário, já pugnavam, em reiteradas decisões, pela competência doJuiz do Trabalho para o julgamento da matéria.

Não obstante a inserção de comando constitucional específico,estatuído no inciso VI, do art. 114, que deveria ter pacificado o tema, oPleno do STF, em 09 de março de 2005, atribui à Justiça Estadual a com-petência para o julgamento das ações de indenização por acidente detrabalho. No mesmo mês, a Anamatra realiza, em São Paulo, o primeiroSeminário Nacional de Ampliação da Competência da Justiça do Traba-lho, no qual, com a participação de mil associados, aprovou-se a Carta deSão Paulo, contendo críticas à decisão da STF.

Dando encaminhamento ao deliberado no Seminário, enviamos aoSTF dois pareceres elaborados por Reginaldo Melhado (9ª Região) e Se-bastião Geraldo de Oliveira (3ª Região), sendo importante anotar ahercúlea tarefa associativa desempenhada por este último magistrado eespecialista na matéria, ao debater pessoalmente com os Ministros da-quela Corte, no intuito de obter a reversão da situação gerada pelamalfada decisão.

O acórdão, reproduzido integralmente nas páginas deste folheto re-gistra, nas palavras dos próprios Ministros, o episódio final da conquistado reconhecimento da competência da Justiça do Trabalho para julga-mento das ações de indenização por dano moral e patrimonial decorren-te de acidente do trabalho.

Boa leitura!

José Nilton PandelotPresidente da Anamatra

JULGAMENTO HISTÓRICO - Competência da Justiça do TrabalhoIndenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidentes do trabalho 3

Numa primeira interpretação do incisoI do art. 109 da Carta de Outubro, o Su-premo Tribunal Federal entendeu que asações de indenização por danos morais epatrimoniais decorrentes de acidente dotrabalho, ainda que movidas pelo empre-gado contra seu (ex-)empregador, eramda competência da Justiça comum dos Es-tados-Membros.

2. Revisando a matéria, porém, o Ple-nário concluiu que a Lei Republicana de1988 conferiu tal competência à Justiçado Trabalho. Seja porque o art. 114, jáem sua redação originária, assim deixavatransparecer, seja porque aquela primei-ra interpretação do mencionado incisoI do art. 109 estava, em boa verdade,influenciada pela jurisprudência que sefirmou na Corte sob a égide das Consti-tuições anteriores.

3. Nada obstante, como imperativode política judiciária haja vista o signifi-cativo número de ações que já tramita-ram e ainda tramitam nas instâncias or-dinárias, bem como o relevante interes-se social em causa, o Plenário decidiu,por maioria, que o marco temporal dacompetência da Justiça trabalhista é o

Ementa Constitucional

COMPETÊNCIA JUDICANTE EM RAZÃO DA MATÉRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO PORDANOS MORAIS E PATRIMONIAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO, PRO-POSTA PELO EMPREGADO EM FACE DE SEU (EX-)EMPREGADOR.

COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 114 DA MAGNA CARTA. REDAÇÃOANTERIOR E POSTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/04. EVOLUÇÃO DA JURIS-PRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCESSOS EM CURSO NA JUSTIÇA CO-MUM DOS ESTADOS. IMPERATIVO DE POLÍTICA JUDICIÁRIA.

advento da EC 45/04. Emenda queexplicitou a competência da JustiçaLaboral na matéria em apreço.

4. A nova orientação alcança os pro-cessos em trâmite pela Justiça comumestadual, desde que pendentes de jul-gamento de mérito.

É dizer: as ações que tramitam pe-rante a Justiça comum dos Estados, comsentença de mérito anterior à promul-gação da EC 45/04, lá continuam até otrânsito em julgado e correspondenteexecução.

Quanto àquelas cujo mérito aindanão foi apreciado, hão de ser remeti-das à Justiça do Trabalho, no estadoem que se encontram, com total apro-veitamento dos atos praticados atéentão. A medida se impõe, em razãodas características que distinguem aJustiça comum estadual e a Justiçado Trabalho, cujos sistemas recursais,órgãos e instâncias não guardam exa-ta correlação.

5. O Supremo Tribunal Federal,guardião-mor da Constituição Republica-

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A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do SupremoTribunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na conformidade da ata do julgamentoe das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em conhecer do conflito e,por maioria, definir a competência da justiça trabalhista a partir da EmendaConstitucional nº 45/2004, para julgamento das ações de indenização por danosmorais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho, vencido, no caso, oSenhor Ministro Marco Aurélio, na medida em que não estabelecia a edição daemenda constitucional como marco temporal para competência da justiça tra-balhista. Votou a Presidente.

Brasília, 29 de junho de 2005.

ELLEN GRACIE - PRESIDENTECARLOS AYRES BRITTO - RELATOR

na, pode e deve, em prol da seguran-ça jurídica, atr ibuir ef icáciaprospectiva às suas decisões, com adelimitação precisa dos respectivosefeitos, toda vez que proceder a re-visões de jurisprudência definidora decompetência ex ratione materiae. Oescopo é preservar os jurisdicionadosde alterações jurisprudenciais queocorram sem mudança formal do Mag-no Texto.

6. Aplicação do precedenteconsubstanciado no julgamento do In-quérito 687, Sessão Plenária de 25.08.99,ocasião em que foi cancelada a Súmula394 do STF, por incompatível com a Cons-tituição de 1988, ressalvadas as decisõesproferidas na vigência do verbete.

7. Conflito de competência que seresolve, no caso, com o retorno dos au-tos ao Tribunal Superior do Trabalho.

29/06/2005 TRIBUNAL PLENOCONFLITO DE COMPETÊNCIA 7.204-1 MINAS GERAIS

RELATOR: MIN. CARLOS BRITTOSUSCITANTE(S): TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHOSUSCITADO(A/S): TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DE MINAS GERAISINTERESSADO(A/S): VICENTE GIACOMINI PERONADVOGADO(A/S): HÉLCIO DE OLIVEIRA FERNANDES E OUTRO(A/S)INTERESSADO(A/S): BANCO BEMGE S/AADVOGADO(A/S): JOSÉ MARIA RIEMMA E OUTRO(A/S)

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R E L A T Ó R I O

O SENHOR MINISTRO CARLOS AYRES BRITTO (Relator)

do daí a interposição de recurso deapelação pelo Banco demandado.

4. Acontece que, ao apreciar oapelatório, o Tribunal de Alçada de MinasGerais declinou de sua competência e de-terminou a devolução dos autos à Juntade Conciliação e Julgamento de Ubá/MG.Esta última, agora sim, aceitou oprocessamento da ação e, também ela, jul-gou parcialmente procedente o pedido doautor. Fato que ensejou a interposição derecurso ordinário - apenas parcialmenteprovido pelo TRT/3ª Região- e, posterior-mente, recurso de revista.

5. Foi quando, na análise desta últimaimpugnação, a 5 a Turma do egrégio Tri-bunal Superior do Trabalho reconheceua incompetência da Justiça especial, demaneira a suscitar o presente conflitonegativo de competência (tendo em vis-ta a recusa anteriormente externada peloTribunal de Alçada de Minas Gerais).

6. Prossigo neste relato para consig-nar que o Ministério Público Federal opi-nou pela procedência da suscitação, emparecer assim ementado:

Trata-se de conflito negativo de com-petência, suscitado pelo Tribunal Supe-rior do Trabalho em face do recente-mente extinto Tribunal de Alçada do Es-tado de Minas Gerais.

2. Por meio dele, conflito, discu-te-se a competência para processare julgar ação indenizatória por danosmorais e patrimoniais decorrentes deacidente do trabalho, quando tal açãoé proposta por empregado contra oseu empregador. Donde a controvér-sia: competente é a Justiça comumestadual, ou a Justiça especializadado trabalho?

3. Pois bem, o fato é que VicenteGiacomini Perón ajuizou, na Justiça doTrabalho e contra o então Banco doEstado de Minas Gerais/BEMGE, açãode indenização por motivo de doençaprofissional. O que levou a Junta deConciliação e Julgamento de Ubá/MGa se dar por incompetente e determi-nar a remessa dos autos a uma das Va-ras Cíveis daquela mesma Comarca. Peloque a Justiça estadual julgou o pedi-do parcialmente procedente, resultan-

“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. QUINTA TURMA DO TST E TRIBUNALDE ALÇADA DE MINAS GERAIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAISE MORAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRABALHO. ART. 109, INCISO I, DACF, E ART. 114, DA CF, COM A NOVA REDAÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITU-CIONAL Nº 45/2004. REMANESCE A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL PARAJULGAR AÇÃO INDENIZATÓRIA FUNDADA EM ACIDENTE DE TRABALHO.PRECEDENTES. PARECER PELO CONHECIMENTO DO CONFLITO, PARA QUE SEDECLARE COMPETENTE A JUSTIÇA COMUM ESTADUAL”.

É o relatório, que submeto ao egrégio Plenário desta Casa (RI/STF,art. 6º, inciso I, “d”).

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V O T O

a matéria. É que, a meu sentir, a normaque se colhe do inciso I do art. 109 daLei das Leis não autoriza concluir que aJustiça comum estadual detém compe-tência para apreciar as ações que oempregado propõe contra o seu empre-gador, pleiteando reparação por danosmorais ou patrimoniais decorrentes deacidente do trabalho. É dizer: quantomais reflito sobre a questão, mais meconvenço de que a primeira parte dodispositivo constitucional determinamesmo que compete aos juízes federaisprocessar e julgar “as causas em que aUnião, entidade autárquica ou empresapública federal forem interessadas nacondição de autoras, rés, assistentesou oponentes...”. Mas esta é apenas aregra geral, plasmada segundo o crité-rio de distribuição de competência emrazão da pessoa. Impõe-se atentar paraa segunda parte do inciso, assimvocalizada: “...exceto as de falência, asde acidente de trabalho e as sujeitas àJustiça Eleitoral e à Justiça do Traba-lho”. E esta segunda parte, como exce-ção que é, deve ser compreendida nocontexto significante daquela primeira,consubstanciadora de regra geral. Emdiscurso quiçá mais elucidativo: à luz dasegunda parte do inciso I do art. 109 daConstituição Federal, tem-se que as cau-sas de acidente do trabalho em que aUnião, entidade autárquica ou empresapública federal forem interessadas, nacondição de autora, ré, assistente ouoponente, não são da competência dosjuízes federais.

11. Remarque-se, então, que as cau-sas de acidente do trabalho, excepcio-nalmente excluídas da competência dosjuízes federais, só podem ser as chama-das ações acidentárias. Ações, comosabido, movidas pelo segurado contra

O SENHOR MINISTRO CARLOS AYRESBRITTO (Relator) Conforme visto, a ques-tão que se põe neste conflito consisteem saber a quem compete processar ejulgar as ações de reparação de danosmorais e patrimoniais advindos do aci-dente do trabalho. Ações propostas peloempregado em face de seu empregador,de sorte a provocar o seguintequestionamento: a competência é daJustiça comum estadual, segundo con-cluiu o órgão suscitante (TST), ou é daJustiça Obreira, como entendeu o sus-citado (antigo Tribunal de Alçada de Mi-nas Gerais)?

9. Começo por responder que a ju-risprudência do Supremo Tribunal Fede-ral proclama a competência da Justiçatrabalhista para o conhecimento dasações indenizatórias por danos moraisdecorrentes da relação de emprego.Pouco importando se a controvérsiacomporta resolução à luz do Direito Co-mum, e não do Direito do Trabalho.

Todavia, desse entendimento o STFvem excluindo as ações reparadoras dedanos morais, fundadas em acidente dotrabalho (ainda que movidas pelo empre-gado contra seu empregador), para in-cluí-las na competência da Justiça co-mum dos Estados. Isso por conta doinciso I do art. 109 da Constituição Re-publicana. Foi o que o Tribunal Plenodecidiu, por maioria de votos, quandodo julgamento do RE 438.639, Sessão dodia 09/03/2005, na qual fiquei vencido,como Relator, na companhia do eminen-te Ministro Marco Aurélio.

10. Nada obstante, valendo-me do art.6º do Regimento Interno da Casa, tragoo presente conflito ao conhecimentodeste colendo Plenário para rediscutir

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o INSS, a fim de discutir questãoatinente a benefício previdenciário.Logo, feitos em que se faz presente in-teresse de uma autarquia federal, é cer-to, mas que, por exceção, se deslocampara a competência da Justiça comumdos Estados. Por que não repetir? Taisações, expressamente excluídas da com-petência dos juízes federais, passam acaber à Justiça comum dos Estados, se-gundo o critério residual de distribui-ção de competência. Tudo conformeserena jurisprudência desta nossa Cor-te de Justiça, cristalizada no enunciadoda Súmula 501.

12. Outra, porém, é a hipótese dasações reparadoras de danos oriundos deacidente do trabalho, quando ajuizadaspelo empregado contra o seu emprega-dor. Não contra o INSS. É que, agora,não há interesse da União, nem de enti-dade autárquica ou de empresa públicafederal, a menos, claro, que uma delasesteja na condição de empregadora. Ointeresse, reitere-se, apenas diz respei-to ao empregado e seu empregador. Sen-do desses dois únicos protagonistas alegitimidade processual para figurar nospólos ativo e passivo da ação, respecti-vamente. Razão bastante para se per-ceber que a regra geral veiculada pelaprimeira parte do inciso I do art. 109da Lei Maior —— definidora de compe-tência em razão da pessoa que integrea lide —— não tem como ser erigida anorma de incidência, visto que ela nãotrata de relação jurídica entre empre-gados e empregadores. Já a parte finaldo inciso I do art. 109 da Magna Carta,segundo demonstrado, cuida é de ou-tra coisa: excepcionar as hipóteses emque a competência seria da própriaJustiça Federal.

13. Deveras, se a vontade objetiva doMagno Texto fosse excluir da competên-cia da Justiça do Trabalho matéria

ontologicamente afeita a ela, JustiçaObreira, certamente que o faria no pró-prio âmbito do art. 114. Jamais no con-texto do art. 109, versante, este último,sobre competência de uma outra cate-goria de juízes.

14. Noutro modo de dizer as coisas,não se encaixando em nenhuma das duaspartes do inciso I do art. 109 as açõesreparadoras de danos resultantes de aci-dente do trabalho, em que locus da Cons-tituição elas encontrariam sua específi-ca norma de regência? Justamente noart. 114, que proclama a competênciada Justiça especial aqui tantas vezesencarecida. Competência que de pron-to se define pelo exclusivo fato de olitígio eclodir entre trabalhadores eempregadores, como figura logo noinício do texto normativo em foco. Ejá me antecipando, ajuízo que a novaredação que a EC nº 45/04 conferiu aesse dispositivo, para abrir significati-vamente o leque das competências daJustiça Laboral em razão da matéria,só veio robustecer o entendimentoaqui esposado.

15. Com efeito, estabelecia o caputdo art. 114, em sua redação anterior,que era da Justiça do Trabalho a com-petência para conciliar e julgar osdissídios individuais e coletivos entre tra-balhadores e empregadores, além deoutras controvérsias decorrentes darelação de trabalho. Ora, um acidentede trabalho é fato ínsito à interação tra-balhador/empregador. A causa e seu efei-to. Porque sem o vínculo trabalhista oinfortúnio não se configuraria; ou seja,o acidente só é acidente de trabalho seocorre no próprio âmago da relaçãolaboral. A possibilitar a deflagração deefeitos morais e patrimoniais imputáveisà responsabilidade do empregador, emregra, ora por conduta comissiva, orapor comportamento omissivo.

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16. Como de fácil percepção, parase aferir os próprios elementos do ilíci-to, sobretudo a culpa e o nexo causal,é imprescindível que se esteja mais pró-ximo do dia-a-dia da complexa realidadelaboral. Aspecto em que avulta a espe-cialização mesma de que se revestem osórgãos judicantes de índole trabalhista.É como dizer: órgãos que se debruçamcotidianamente sobre os fatos atinentesà relação de emprego (muitas vezesquanto à própria existência dela) e quepor isso mesmo detêm melhores condi-ções para apreciar toda a trama dosdelicados aspectos objetivos e subjeti-vos que permeiam a relação de empre-go. Daí o conteúdo semântico da Súmula736, deste Excelso Pretório, assim dida-ticamente legendada: “Compete à Jus-tiça do Trabalho julgar as ações que te-nham como causa de pedir odescumprimento de normas trabalhistasrelativas à segurança, higiene e saúdedos trabalhadores”.

17. Em resumo, a relação de traba-lho é a invariável matriz das controvérsi-as que se instauram entre trabalhado-res e empregadores. Já a matéria genu-inamente acidentária, voltada para obenefício previdenciário corresponden-te, é de ser discutida com o INSS, pe-rante a Justiça comum dos Estados, poraplicação da norma residual que se ex-trai do inciso I do art. 109 da Carta deOutubro.

18. Nesse rumo de idéias, renove-sea proposição de que a nova redação doart. 114 da Lex Maxima só veio aclarar,expletivamente, a interpretação aquiperfilhada. Pois a Justiça do Trabalho,que já era competente para conciliar ejulgar os dissídios individuais e coletivosentre trabalhadores e empregadores,além de outras controvérsias decorren-tes da relação trabalhista, agora é

confirmativamente competente para pro-cessar e julgar as ações de indenizaçãopor dano moral ou patrimonial, decor-rentes da relação de trabalho (inciso VIdo art. 114).

19. Acresce que a norma fundamen-tal do inciso IV do art. 1 o da Constitui-ção Republicana ganha especificação tra-balhista em vários dispositivos do art. 7o , como o que prevê a redução dosriscos inerentes ao trabalho, por meiode normas de saúde, higiene e seguran-ça (inciso XXII), e o que impõe a obriga-ção do seguro contra acidente do tra-balho, sem prejuízo, note-se, da inde-nização por motivo de conduta dolosaou culposa do empregador (incisoXXVIII). Vale dizer, o direito à indeniza-ção em caso de acidente de trabalho,quando o empregador incorrer em doloou culpa, vem enumerado no art. 7 o daLei Maior como autêntico direito traba-lhista. E como todo direito trabalhista,é de ser tutelado pela Justiça especial,até porque desfrutável às custas doempregador (nos expressos dizeres daConstituição).

20. Tudo comprova, portanto, que alonga enunciação dos direitos trabalhis-tas veiculados pelo art. 7 o da Constitui-ção parte de um pressuposto lógico: ahipossuficiência do trabalhador peran-te seu empregador. A exigir, assim, inter-pretação extensiva ou ampliativa, desorte a autorizar o juízo de que, anteduas defensáveis exegeses do textoconstitucional (art. 114, como penso, ouart. 109, inciso I, como tem entendidoesta Casa), deve-se optar pela queprestigia a competência especializada daJustiça do Trabalho.

21. Por todo o exposto, e forte noart. 114 da Lei Maior (redações anteriore posterior à EC 45/04), concluo que nãose pode excluir da competência da Jus-

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tiça Laboral as ações de reparação dedanos morais e patrimoniais decorren-tes de acidente de trabalho, propostaspelo empregado contra o empregador.Menos ainda para incluí-las na compe-tência da Justiça comum estadual, combase no inciso I do art. 109 da Carta deOutubro.

22. No caso, pois, julgo improceden-te este conflito de competência e de-termino o retorno dos autos ao egrégioTribunal Superior do Trabalho, para queproceda ao julgamento do recurso derevista manejado pelo empregador.

23. É o meu voto.

V O T O

O Sr. Ministro CARLOS VELLOSO - Senhora Presidente, na verdade não há falar emprocedência ou improcedência.

Sugiro: conheço do conflito e dou pela competência da Justiça do Trabalho.O Sr. Ministro CARLOS BRITTO (Relator) – Pode ser também assim.O Sr. Ministro CARLOS VELLOSO - Esta parece-me ser, tecnicamente, a melhor.O Sr. Ministro MARCO AURÉLIO - Quando o conflito seria procedente?A Sra. Ministra ELLEN GRACIE (Presidente) – Seria procedente se o conflito fossepositivo.

TRIBUNAL PLENO

CONFLITO DE COMPETÊNCIA 7.204

RETIFICAÇÃO DE VOTO

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO (RELATOR) – Acho melhor essa forma sugeridapelo Ministro Carlos Velloso. Perfeito, conheço do conflito para determinar o re-torno dos autos ao egrégio Tribunal Superior do Trabalho a fim de que proceda aojulgamento do recurso.

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V O T O

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO- Senhor Presidente, peço vênia aos emi-nentes Ministros, especialmente aos queme antecedem, tendo em conta que,no julgamento do Recurso Extraordiná-rio nº 438.639/MG, julgado no dia 9 demarço último, insisti muito sobre a con-clusão que, afinal, foi adotada pela Cor-te, contra os votos dos eminentes Mi-nistros Relator e Marco Aurélio.

Recebi, depois, um trabalho muito bemfundamentado e muito bem documenta-do de um juiz do TRT de Minas Gerais, Dr.Sebastião Geraldo de Oliveira, cujas con-siderações levaram-me a rever aquelaposição. E tal posição, que teve modestainfluência no teor do acórdão, baseou-se no princípio fundamental da chamadaunidade de convicção, segundo o qual,por conta dos graves riscos de decisõescontraditórias, sempre ininteligíveis paraos jurisdicionados e depreciativas para aJustiça, não convém que causas, com pe-didos e qualificações jurídicos diversos,mas fundadas no mesmo fato histórico,sejam decididas por juízos diferentes. Oprincípio, a meu ver, é irretocável e ain-da é o que deve presidir a solução daquestão da competência neste caso.

Mas parece-me que, conforme pro-pôs o eminente Ministro-Relator, deva seroutra a resposta que promana daqueleprincípio.

É que a revisão do tema me conven-ceu de que tanto as ações acidentárias,evidentemente oriundas de relação detrabalho, como, sem exceção, todas asdemais ações resultantes de relação detrabalho, devam, em nome do mesmoprincípio, ser atribuídas à Justiça do Tra-balho. A especialização e a universali-dade desta já recomendariam, quando

menos em teoria, tal solução, por ra-zões mais que óbvias, como acabou dedemonstrar o voto do eminente Minis-tro Carlos Britto.

Pesaram-me, sobretudo, duas outrasordens de consideração.

A primeira, porque o que dava suporteconstitucional à jurisprudência da Cortequanto à competência da Justiça estadualpara as ações de acidente do trabalho, àluz da Constituição atual, era menos o fatode nesta já não constar norma expressaequivalente às prescrições do art. 123, §1º, da Constituição de 1946, e do art. 142,§ 2º, da Constituição de 1967, os quais atri-buíam aquelas causas à Justiça ordináriados Estados, do que o fato de tirar-se doartigo 109, caput, da Constituição vigen-te, por exclusão hermenêutica, igual con-seqüência normativa.

Antes da Emenda nº 45, parecia de-veras consistente a leitura de que, se es-tavam excetuadas da competência daJustiça Federal as causas de acidente dotrabalho, em que sempre é interessadaautarquia federal, só podiam elas caberna competência da Justiça dos Estados,porque a mesma norma as excluía das queeram, por outras regras, sujeitas à Justi-ça do Trabalho.

Mas, de lá para cá, a evolução da le-gislação acidentária, sobretudo com aequiparação dos valores dos benefíciosacidentários e previdenciários, e a disse-minação dos órgãos da Justiça trabalhis-ta, competentes para tantas outras cau-sas ligadas à própria segurança do traba-lho, desenharam nova realidade judiciá-ria, que as próprias exigências da unida-de de convicção e da especialização deconhecimentos não poderiam deixar de

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considerar nas perspectivas da revisãodaquela exceção constitucional. Isso,sem cogitar da necessidade de coerên-cia axiológica que impunha a vigenteConstituição da República, ao concebera indenização acidentária como direitotípico da condição jurídica do empre-gado e, portanto, como irradiação darelação de trabalho, como se vê ao art.7º, inc. XXVIII, da mesma Constituição.

É, portanto, dentro desse quadro, quehá de interpretar-se a Emenda nº 45,quando, explicitando, no inc. I do art.114, o caráter geral da competência daJustiça do Trabalho, nela incluiu todas asações oriundas da relação de trabalho.

Suposto não tenha sido essa a inten-ção do constituinte derivado, a cujo olharatento não poderia escapar a necessida-de de, para guardar congruência com oeventual propósito de submissão das cau-sas de acidente de trabalho àquela Justi-ça especializada, dar nova redação aoartigo 109, caput - para evitar dúvidas -,de modo algum pode esquivar-se, diantedo papel precário e relativo do materialhistórico e das correlatas intenções dolegislador, a conclusão de que outra háde ser a leitura da norma que excepcionaas ações acidentárias da competência daJustiça Federal.

O que com isso pretendo dizer é que,perante a novidade representada pelostermos da Emenda nº 45, em particularpela redação introduzida no inc. I do art.114, deve o art. 109, caput, significarapenas que as ações de acidente do tra-balho não são da competência da JustiçaFederal e, por conseguinte, que a sededessa competência deve buscar-se alhu-res, agora designadamente no próprio art.114, que a açambarcou.

Essa interpretação acomoda ambas ascláusulas constitucionais, reverencia a es-

pecialização e a funcionalidade da Jus-tiça do Trabalho, alivia a Justiça estadu-al e sustenta-se na necessária unidadede convicção, sem esvaziar o disposto noinc. VI, onde apenas se divisa apositivação, mediante relevo destinadoa superar todas as dúvidas, da jurispru-dência desta Corte, que, sob a redaçãooriginal do art. 114, caput, entendia – ameu ver, com indiscutível acerto - que,para efeito dessa competência distribu-ída com apoio em vários princípios, en-tre os quais o da unidade de convicção,era e é irrelevante a província taxinômicadas normas aplicáveis ao caso, se direi-to trabalhista ou civil, e, pois, também anatureza mesma da responsabilidade, senegocial ou aquiliana.

Essa conjugação conduz, portanto, ameu ver, ao seguinte resultado prático:são, agora, da competência exclusiva daJustiça do Trabalho todas as ações oriun-das da relação de trabalho, sem exceçãoalguma, trate-se de ações acidentáriastípicas ou de indenização de outra espé-cie e de outro título.

Senhor Presidente, a única objeçãoque me ocorreria, na hipótese, é que talexegese poderia, eventualmente, impli-car sobrecarga à Justiça do Trabalho. Masas considerações daquele eminente Juiztrabalhista mineiro provaram que, sobre-tudo depois da equiparação dos valoresdos benefícios acidentários e dos benefí-cios previdenciários, cuja diferença jus-tificava que os empregados recorressemàs ações acidentárias, estas são hoje ra-ras, e a sua transferência não vai agravara Justiça do Trabalho.

Com essa proposta, acompanho o votodo eminente Relator, para declarar quetodas as ações de indenização resultan-tes de relação do trabalho, inclusive asacidentárias típicas, são da competênciada Justiça do Trabalho.

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V O T OD E B A T E

RELATOR : MIN. CARLOS BRITTOSUSCITANTE(S) : TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHOSUSCITADO(A/S) : TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DE MINAS GERAISINTERESSADO(A/S) : VICENTE GIACOMINI PERONADVOGADO(A/S) : HÉLCIO DE OLIVEIRA FERNANDES E OUTRO(A/S)INTERESSADO(A/S) : BANCO BEMGE S/AADVOGADO(A/S) : JOSÉ MARIA RIEMMA E OUTRO(A/S)

À revisão de apartes dos Ministros Carlos Britto (Relator),Carlos Velloso, Gilmar Mendes e Ellen Gracie (Presidente).

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDAPERTENCE - Gostaria de trazer ao Tri-bunal uma preocupação. No mérito tam-bém me convenci da necessidade da re-visão do entendimento majoritário do RE438639: o Ministro Cezar Peluso mesmoacaba de nobremente reconhecer que asrazões do seu voto naquele precedente– que pelo menos a mim haviam conven-cido efetivamente – não procediam: sejasob prisma da unidade de convicção, sejasob aquele de política judiciária, ao qualnos referimos.

O excelente trabalho de amicuscuriae do ilustre magistrado SebastiãoGeraldo de Oliveira me fez despertarpara que, há muitos anos, não ouvia fa-lar, aqui no Distrito Federal – das mi-nhas origens forenses –, sobre a Vara deAcidentes de Trabalho. Simplesmenteporque ela desapareceu, em razão des-te fato econômico que S.Exa. realça: aequiparação do benefício previdenciárioà indenização tarifada do acidente detrabalho. Isso fez com que a açãoacidentária contra o INSS sirva hoje, na

maioria das vezes, apenas ao trabalha-dor informal, porque o trabalhador for-mal terá igual cobertura do sistemaprevidenciário.

Agora, preocupa-me o problemaintertemporal. Vamos decidir assim, emrecurso extraordinário, mesmo em casosanteriores à emenda constitucional?

Vejam bem: alguns Tribunais de Al-çada mudaram a sua orientação em faceda nossa jurisprudência anterior, queafirmava, na hipótese, a competência daJustiça comum estadual. Realmente meangustia, em ações do tipo “acidente detrabalho”, destruir, em recurso extraor-dinário, todo um processo feito para fa-zer tudo recomeçar, quando se seguira aorientação jurisprudencial do Supremoao tempo.

Então, embora não tenha objeções –aqui, revendo a minha convicção anteri-or – de que, mesmo anteriormente à EC45, caberia decidir pela competência daJustiça do Trabalho, estou em que se há

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de evitar que a nossa viragemjurisprudencial de hoje atinja os proces-sos anteriores em que se haja observa-do o nosso entendimento de então.

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO(RELATOR) – O meu voto é nesse sentido.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDAPERTENCE - Creio que, pelo menos na ju-risdição do recurso extraordinário, deve-ríamos deixar claro que aplicaremos a ju-risprudência anterior.

Coloco o problema para o Tribunal.

O SR. MINISTRO CARLOS VELLOSO –Esta decisão tomada aqui terá efeito exnunc, não é verdade?

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDAPERTENCE – Sim, o que já temos firmadoem matéria de competência.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES– De certa forma, em outros casos muda-se de orientação.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDAPERTENCE – Lembro o caso do cancela-mento da Súmula nº 394 (Inq 687), quan-do o Tribunal ressalvou da nova orienta-ção os processos anteriormente julgados,numericamente, muito menos do que osde acidentes de trabalho.

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO(RELATOR) – Então aplicaremos o efeitoex nunc à nossa decisão?

A SRA. MINISTRA ELLEN GRACIE (PRE-SIDENTE) – Ressalvam-se os atos pratica-

dos. O que foi praticado perante a Jus-tiça comum segue valendo.

O SR. MINISTRO CARLOS VELLOSO –Devem existir dezenas de recursos ex-traordinários.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDAPERTENCE – O que está nas instâncias or-dinárias, temos de decidir - e estou deacordo com o eminente Relator - que anova orientação, reforçada pela EmendaConstitucional nº 45, é de aplicar-se ime-diatamente. Agora, na instância extraor-dinária, aplicaremos a jurisprudênciaantiga sobre os casos pendentes.

A SRA. MINISTRA ELLEN GRACIE (PRE-SIDENTE) – Há ainda o problema, Minis-tro Sepúlveda Pertence, de termos súmulaa esse respeito, teria de ser proposta arevisão da Súmula nº 235. Seria o caso deo eminente Relator, desde logo, propor oseu cancelamento.

Gostaria de colher o voto do MinistroEros Grau, até porque Sua Excelência éRelator do precedente exatamente emsentido contrário, o RE nº 394.943.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDAPERTENCE – A Súmula é anterior. VossaExcelência citou a mudança a partir dequando a Constituição deixou de ser ex-plícita no estabelecer que competia àJustiça estadual, como nos textos de 1946e 1967. Ela está prejudicada, é apenasanotar nas novas edições.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MEN-DES – Mas é bom dizer.

JULGAMENTO HISTÓRICO - Competência da Justiça do TrabalhoIndenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidentes do trabalho14

V O T O

O SENHOR MINISTRO EROS GRAU: -Senhora Presidente, também fiquei ex-tremamente impressionado com esse tra-balho, que chegou às minhas mãos deum juiz do Trabalho, e desejo reformulara minha posição para, a exemplo do quefez o Ministro Carlos Velloso, acompa-nhar o Ministro Carlos Britto.

Quero, ainda, relembrar o fato deque na Primeira Turma, quando se deci-diu esse caso, havia uma preocupaçãomuito grande no sentido de não tornarnulo um longuíssimo processo. De modoque estou muito sensibilizado pela pre-ocupação do Ministro Sepúlveda Perten-ce com relação aos efeitos.

Acompanho o voto do Ministro-Relator.

À revisão de aparte do Sr. Ministro Sepúlveda Pertence.

V O T O

O SENHOR MINISTRO GILMAR MEN-DES - Senhor Presidente,bna assentadaem que se proferiu a decisão no outrosentido, eu tinha me manifestado, apriori, preocupado com o esvaziamentodo texto constitucional ex novo, umavez que estávamos a dizer, de certa for-ma, que, a despeito da mudança consti-tucional, haveria de se fazer, pelo me-nos, uma interpretação e, talvez, umaredução teleológica. Isso foi até obser-vado no voto do Ministro Marco Aurélio.

Agora, gostaria de fazer um outro re-gistro da importância da abertura proces-sual no âmbito da jurisdição constitucio-nal. Antes de receber esse trabalho, tiveoportunidade de conversar com o Dr. Se-bastião de Oliveira e ele fez uma série deconsiderações que, a meu ver, invalida-vam as premissas fático-jurídicas daqueladecisão. À época, tive oportunidade dedizer-lhe: lamentavelmente o senhor nãoapresentou um memorial ou não se habili-tou como amicus curiae perante o Tribu-nal. Por isso, gostaria de ressaltar a impor-tância dessas considerações sobre aquiloque hoje chamamos os fatos, nome iurigenericus, legislativos no âmbito da juris-

dição constitucional. Já o disse o Minis-tro Cezar Peluso quanto às premissas equi-vocadas, o Ministro Sepúlveda Pertencetambém tinha feito considerações a pro-pósito de p lítica judiciária como um ins-trumento decisivo para a formulação deum juízo sobre competência. Na época, oDr. Sebastião de Oliveira até observava quetambém o Ministro Carlos Velloso laboraraem equívoco ao considerar que não haviavaras trabalhistas suficientes. Até mesmoem relação ao Estado de Minas Gerais, oMinistro Carlos Velloso se equivocou, por-que hoje há, sem dúvida, uma maior de-mocratização.

Portanto, essa relação fatos e normas,essa relação intrincada, é extremamen-te relevante e mostra a necessidade des-sa abertura processual e procedimental,em sede de ADI.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDAPERTENCE – É um caso em que devíamoster aberto uma instrução, pelo menos,estatística.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES– Isso já foi destacado no belíssimo voto do

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Ministro Celso de Mello, em outra opor-tunidade, sobre a importância do amicuscuriae, mas gostaria de fazer esse registroporque este caso me parece emblemático,por todas as considerações feitas naquelecaso da importância de um julgamento de-vidamente informado, que pode levar aresultados outros. Isso é célebre nos Esta-dos Unidos, a partir do chamado BrandeisBrief, em 1908, que focava exatamenteesses fatos. Na Alemanha, tem também sidoobjeto de tanta consideração.

Só gostaria, portanto, de fazer essebreve e pequeno registro, essa nota de péde página, tendo em vista o prosseguimen-to dessas nossas cogitações em torno doschamados fatos e prognoses legislativos.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO- Senhora Presidenta, quando do pronun-ciamento anterior, tivemos um escore quepoderia enquadrar como acachapante. Eouvi vozes cogitando, até mesmo, da edi-ção da primeira súmula vinculante a ver-sar a óptica da maioria.

Talvez a evolução que ocorre hoje, emum espaço de tempo que diria até dimi-nuto, sirva a uma reflexão maior quantoà necessidade de se marchar com abso-luta segurança na edição de verbetes quevenham a compor a súmula vinculante dajurisprudência predominante do Supre-mo Tribunal Federal.

Defrontamo-nos com um conflito decompetência negativo a envolver proces-

so subjetivo, e não processo objetivo. De-vemos atuar, consideradas as balizas des-se mesmo processo, nos limites doconflitode competência, já que não nos cabe,aqui, proceder como se fôssemos órgãoconsultivo, pretendendo solucionar pen-dências não compreendidas, sob os ângu-los objetivo e subjetivo, neste processo.

É certo que, para emitir entendimen-to a respeito, devemos levar em contaoutros dispositivos da Constituição Fede-ral, em uma interpretação sistemática daLei Fundamental – aí está o ponto, e que-ro deixar muito claro o meu pensamento-, sem chegarmos à definição da compe-tência para julgamento de ações de se-gurados contra o Instituto Nacional doSeguro Social, ações que surjam em vir-tude de acidente do trabalho. Somosconvocados a dirimir a competênciaquanto à ação ajuizada por um ex-em-pregado - creio contra um ex-emprega-dor, que se diz ter origem na relaçãoempregatícia, revelando, como causa depedir, dano moral e, como pedido, a cor-respondente indenização.

Circunscrevo, portanto, o âmbito deatuação a essa matéria e reafirmo aóptica exteriorizada - acompanhei, nocaso, o ministro Carlos Ayres Britto - noprocesso anterior, quando o Plenário as-sentou que a competência para julgar aação movida pelo ex-empregado contrao ex-empregador, considerado o danomoral, seria da Justiça comum e não daJustiça do Trabalho.

Diria que antes mesmo da Emenda Constitucional nº45/2004 já se tinha a definição da competência daJustiça do Trabalho para julgar essas ações. Por queassim afirmo? Porque o artigo 114 da Constituição Fe-deral, na redação primitiva, previa a competência daJustiça do Trabalho para conciliar e julgar os dissídiosindividuais e coletivos. Por que a alusão aqui a dissídio?Esse vocábulo vem de uma época em que a Justiça doTrabalho não integrava o Judiciário. Ela veio a integrá-

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lo em 1946. Antes, era um apêndice do Ministério do Trabalho, eaí se tem, na Consolidação das Leis do Trabalho, a referência,não a ação, mas a dissídio. Eis o antigo teor do artigo 114:

Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar dissídiosindividuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abran-gidos os entes de direito público externo e da administração pú-blica direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dosEstados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias de-correntes da relação de trabalho, (...)

Essa cláusula ficou jungida a outrascontrovérsias decorrentes da relação detrabalho, mas sem o envolvimento, a meuver - porque a premissa para a compe-tência da Justiça do Trabalho já estavana primeira parte do artigo 114 -, de tra-balhadores e empregadores. Veio a Emen-da nº 45 e, em bom vernáculo, de formaclara e precisa, explicitou competir à Jus-tiça do Trabalho e não à Justiça comumprocessar e julgar as ações de indeniza-ção por dano moral ou patrimonial decor-rentes da relação de trabalho, envolven-do, evidentemente - porque aí temos departir para a interpretação sistemática,e não podemos desprezar o artigo 109, §3º, da Carta -,empregado e empregador.

Não vou adiante para definir se, coma emenda aludida,cessou a competên-

cia da Justiça comum para julgar açõesde segurados, empregados, ou não - nãoimporta -, contra o Instituto, tendo emconta acidente de trabalho.

Não adentro essa matéria - se o fi-zesse, concluiria de forma diversa dalançada pelo ministro Cezar Peluso - paradefinir pelo menos, para explicitar aconclusão quanto ao conflito negativo.A emenda não versou sobre o desloca-mento da competência para processar ejulgar essas ações da Justiça comum paraa Justiça do Trabalho. A Emenda nãotrouxe qualquer preceito derrogando aLei Fundamental quanto ao artigo 109,inciso I, que, relativamente à competên-cia da Justiça Federal stricto sensu -porque a do Trabalho também é umaJustiça Federal -, prevê:

“Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I -as causas em que a União, entidade autárquica” – portantoinstituto – “ou empresa pública federal forem interessadas nacondição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, excetoas de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas àJustiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;”

Poderíamos concluir que, antes daEmenda nº 45, as ações excepcionadassob o ângulo dos acidentes, contra oInstituto, estariam compreendidas na

competência da Justiça do Trabalho? Aresposta desta Corte foi negativa, reve-lando a competência da Justiça comum,presente o § 3º do artigo 109:

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“§ 3º Serão processadas e julgadas” – e esse parágrafocontinua a compor o arcabouço normativo constitucional– “na justiça estadual, no foro do domicílio dos seguradosou beneficiários, as causas em que forem parte institui-ção de previdênci social e segurado, (...)”

Ocorrido o acidente, buscada a ver-ba devida em face do seguro existente,tem-se ação ajuizada contra o Instituto.E ajuizada no foro próprio, definido pelaLei Fundamental, que é a Justiça Fede-ral. Mas fica essa parte do voto apenascomo lastro para solucionar o conflito emmesa, para julgamento, e concluir serextremo de dúvidas - muito embora as-sim não tenha parecido e, aí, vejo que aprimeira instância, o juiz que preparouo trabalho encaminhado a todos nós enesta assentada muito elogiado, é maisconvincente do que por vezes integran-tes do próprio Tribunal - competência daJustiça do Trabalho.

Concluo que competente, no caso,reafirmando a óptica anterior, é a Justi-ça do Trabalho. Talvez, houvesse à épocado julgamento no Tribunal Superior doTrabalho o que contido na Emenda nº 45,o julgamento da minha ex e eterna Cortetivesse sido outro.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO– Peço permissão aos eminentes Minis-tros para tornar a manifestar-me. Comofoi chamada à colação a minha nova pos-tura sobre a competência das ações tí-picas de acidente do trabalho, e paraque não pareça seja só por gosto deexercício intelectual ou falta de assun-to que Ministro do Supremo Tribunal Fe-deral faz certas considerações, querodizer, em primeiro lugar, que o art. 109,I, da Constituição da República, comoqualquer outra disposição constitucio-nal ou legal, é sujeito a interpretação.Em segundo lugar, que a questão da com-

petência para as ações acidentárias tí-picas está umbilicalmente ligada ao ob-jeto deste conflito. E está por quê? Por-que, conforme já acentuei no julgamentoanterior e torno agora a acentuar, o cri-tério último para responder a ambas asquestões é o da unidade de convicção.Se o fato jurídico pode, ao mesmo tem-po, ser qualificado por normas de duastaxinomias, uma de caráter acidentárioe outra concernente a responsabilida-de aquiliana ou negocial, as ações pro-cessuais que se irradiam de ambas essasqualificações jurídicas não podem seratribuídas a Justiças diferentes e, pois,a órgãos jurisdicionais diversos. Doutromodo, teremos uma conseqüência prá-tica gravíssima, que é a possibilidade dedecisões contraditórias baseadasnaapreciação retórica e na valoração ju-rídica do mesmo fato histórico.

Noutras palavras, se o mesmo fatopode ser tomado como acidente do tra-balho e, ao mesmo tempo, como fontede responsabilidade contratual ouaquiliana, não vejo como, atribuindo-sea Justiças diferentes ambas as causas,não se corra o risco de, numa, oórgãojurisdicional reconhecer que o fatoem si não existiu e, na outra, o juízo de-clarar que o mesmíssimo fato existiu. Talcontradição lógica – embora não jurídi-ca - é absolutamente ininteligível paraos jurisdicionados e altamente depre-ciativa para o Judiciário. Como enten-der-se que a Justiça, por dois órgãosdistintos, proclame que o fato existiue que não existiu? É esta preocupaçãocom a absorção social das decisões

JULGAMENTO HISTÓRICO - Competência da Justiça do TrabalhoIndenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidentes do trabalho18

jurisdicionais e com a necessidade deevitar - já estamos, por conta de outrascausas, sujeitos a isso – o desprestígioda função jurisdicional que me obriga asustentar que a competência para asações de indenização por dano moralou material, fundadas em fato que pode

também caracterizar acidente do tra-balho, deva ser da mesma Justiça quea tenha para as ações de indenizaçãoacidentária típica.

É o que eu gostaria de deixar regis-trado, Senhora Presidente.

V O T O

O Sr. Ministro CARLOS VELLOSO – Se-nhora Presidente, os eminentes Minis-tros Carlos Britto e Cezar Peluso já disse-ram tudo. Assim, direi apenas duas pala-vras. Primeiro, para louvar o trabalho doJuiz Sebastião Geraldo de Oliveira, meucoestaduano. No seu trabalho, Sua Ex-celência, autêntico amicus curiae, trou-xe-nos esclarecimentos valiosos. Na con-dição de um juiz diligente, trabalhador,ele quer ver cada vez maior a sua justiça.

Confesso até que votei – e o disse aomeu eminente Colega Ministro SepúlvedaPertence - mais tendo em consideraçãoum motivo de política judiciária. Temiamandar para a Justiça do Trabalho mi-lhares de ações; a carga brutal de pro-cessos resultaria em detrimento dos tra-balhadores. Laborava, de outro lado, emengano, pois não sabia que a Justiça tra-balhista havia se expandido tantonoBrasil, especialmente no meu Estadonatal, a minha Minas.

Penitencio-me pelo engano e ficomuito contente pela salutar expansão daJustiça do Trabalho.

Eliminado o motivo de política judi-ciária, estou plenamente à vontadepara, diante do disposto na Emenda nº45/2004, art. 114, dizer que a compe-tência, no caso, é da Justiça do Traba-lho, a partir da Emenda nº 45, não só

para as ações de indenização por danomoral ou patrimonial decorrente da re-lação de trabalho - art. 114, inciso VI -, mas, como bem acentuou o SenhorMinistro Cezar Peluso, para as ações deacidente do trabalho.

Com efeito, a exceção inscrita no incisoI do art. 109 da Constituição, que dispõesobre a competência dos juízes federais,“exceto as de acidente do trabalho”, nãoestabelece competência da Justiça co-mum, só diz que essas causas não são dacompetência dos juízes federais.

Posta assim a questão, com o adven-to da Emenda nº 45, a ampliar sobrema-neira a competência da Justiça do Traba-lho, .”compete à Justiça do Trabalho pro-cessar e julgar as ações oriundas da rela-ção de trabalho” ., observa-se a exceçãoque retira da competência dos juízes fe-derais o julgamento dessas ações de aci-dente do trabalho, tendo, de um lado,uma autarquia federal, e reconhece-seque a competência é, a partir da Emen-da nº 45, da Justiça do Trabalho.

Com essas breves considerações, Se-nhora Presidente, louvando mais umavez o trabalho do meu eminente cole-ga, Juiz Sebastião Geraldo de Oliveira,do Tribunal Regional do Trabalho da 3ªRegião, acompanho o voto do eminen-te Ministro-Relator.

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À revisão de apartes dos Ministros Celso de Mello e Sepúlveda Pertence.

V O T O

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PER-TENCE – Senhora Presidente, evito sem-pre uma citação de Hughes quanto aopapel de cortes como esta: a de que aConstituição seria o que a Suprema Cor-te diz que ela é. Sempre preferi, porrazões até de modéstia, outra definição:aquela de termos a grave e às vezes tris-te responsabilidade de errar por último.Por isso estou muito à vontade, passa-dos três meses da nossa decisão no REnº 438.639, para voltar atrás como osdemais Colegas que então compuserama maioria.

Também fui impressionado com otema e levado a nova reflexão e conven-cido ao final do equívoco da decisão an-terior por este exemplar trabalho deamicus curiae do ilustre Juiz SebastiãoGeraldo de Oliveira, do TRT de Minas. E,com o Ministro Marco Aurélio, penso aténão estar em causa, aqui, o problema dasações acidentárias propriamente ditas.

Mas, para a minha convicção, na li-nha do voto do Ministro Cezar

Peluso, esse ponto é essencial, pois,ao que entendi do voto de Sua Excelên-cia - que também me levou, naquela oca-sião, a acompanhá-lo - ao argumento daunidade de cognição era essencial a in-terpretação do art. 109, I, comodeterminante da competência da Justiçacomum ordinária estadual para a açãoacidentária, hoje sempre proposta con-

tra o INSS, detentor do monopólio deseguros de acidente.

Acontece que essa interpretaçãoera tipicamente o que Barbosa Moreirachama de “interpretação retrospectiva”,que não observou que, quando se fir-mou, por exemplo, a Súmula nº 235, nãohavia apenas a regra excludente da com-petência da Justiça Federal, mas, tam-bém, o art. 123 da Constituição de 1946,o art. 134, § 2º da Constituição de 1967,e o art. 142, § 2º da Carta de 1969, istoé, havia também uma outra normaexcludente, no capítulo da Justiça doTrabalho, para deixar explícito que a elanão competiria, mas, sim, à Justiça co-mum dos Estados e do Distrito Federal ojulgamento das ações de acidente detrabalho.

Só por isso é que, na verdade, naminha linha de convicção, estamos sen-do obrigados a avançar e dizer que asações acidentárias comuns já eram, soba Constituição vigente, da competên-cia da Justiça do Trabalho. No entanto,persisto na opinião de que, na instân-cia extraordinária, só a partir de agoradevemos aplicar esse entendimento aoscasos novos.

Com isso, Senhora Presidente, acom-panho o voto do eminente Ministro CarlosBritto, com escusas pelo erro anterior,e declaro a competência, neste confli-to, do Tribunal Superior do Trabalho.

JULGAMENTO HISTÓRICO - Competência da Justiça do TrabalhoIndenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidentes do trabalho20

TRIBUNAL PLENO

CONFLITO DE COMPETÊNCIA 7.204

EXPLICAÇÃO

RELATOR : MIN. CARLOS BRITTOSUSCITANTE(S) : TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHOSUSCITADO(A/S) : TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DE MINAS GERAISINTERESSADO(A/S) : VICENTE GIACOMINI PERONADVOGADO(A/S) : HÉLCIO DE OLIVEIRA FERNANDES E OUTRO(A/S)INTERESSADO(A/S) : BANCO BEMGE S/AADVOGADO(A/S) : JOSÉ MARIA RIEMMA E OUTRO(A/S)

RELATOR : MIN. CARLOS BRITTOSUSCITANTE(S) : TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHOSUSCITADO(A/S) : TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DE MINAS GERAISINTERESSADO(A/S) : VICENTE GIACOMINI PERONADVOGADO(A/S) : HÉLCIO DE OLIVEIRA FERNANDES E OUTRO(A/S)INTERESSADO(A/S) : BANCO BEMGE S/AADVOGADO(A/S) : JOSÉ MARIA RIEMMA E OUTRO(A/S)

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO(RELATOR) – Senhora Presidente, nãofalei, por equívoco, e agora penitencio-me por isso, o nome do eminente Dou-tor Sebastião. Mas quero dizer que avisita que recebi dele em grande parteme honra, confirmando o meu primeirovoto proferido, em 1º/02/2005, no REnº 394.943, na Primeira Turma. Essa vi-sita alentou-me sobremodo e levou-mea reelaborar o voto, claro que manten-do o núcleo do primeiro, de 1º de feve-reiro de 2005, mas com um ânimo novono sentido de convencer Vossas Exce-lências de que, efetivamente, quandose trata não de ação acidentária, pro-priamente dita, perante o INSS, mas de

indenização por danos morais resultan-tes de acidente do trabalho, nas açõespropostas pelos empregados contra osseus empregadores, a Justiça é,cristalinamente, a do Trabalho.

O Doutor Sebastião homenageou-mecom sua visita e muito me animou a pros-seguir na luta. De sorte que é muito bo-nito ver-se num Plenário como este umvoto vencido tornar-se um voto vencedor,todos de espírito aberto para arediscussão do tema. O Direito só tem aganhar com isso e, certamente, a Justiçatambém. Quero fazer o registro, portan-to, da valiosa contribuição recebida doeminente magistrado de Minas Gerais.

JULGAMENTO HISTÓRICO - Competência da Justiça do TrabalhoIndenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidentes do trabalho 21

V O T O

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PER-TENCE – Senhora Presidente, penso quea melhor fórmula é essa mesmo. Direitointertemporal é isso: só a partir da Emen-da; fica o resto como obter dictum.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO– Senhora Presidenta, peço a Vossa Exce-lência para registrar o meu entendimen-to sobre o alcance do artigo 114, consi-derada a redação primitiva: já entendiacompetente a Justiça do Trabalho.

A SRA. MINISTRA ELLEN GRACIE (PRE-SIDENTE) – Ministro Marco Aurélio, VossaExcelência vai declarar voto?

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉ-LIO – Sim. Fico vencido. Não adotarei aprática de cancelar as notastaquigráficas, vou declarar o voto. Ape-nas pediria para consignar que fico ven-cido quanto ao termo inicial da compe-tência.

A SRA. MINISTRA ELLEN GRACIE (PRE-SIDENTE) – Vossa Excelência retroage essacompetência?

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO(RELATOR) – Entendi assim –desde o meuprimeiro voto, porém acompanho o Mi-nistro Sepúlveda Pertence quanto a essemarco temporal necessário.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MEN-DES – Quando do julgamento anterior,falamos logo na eventual edição de umasúmula.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDAPERTENCE – Digo, apenas para registrohistórico, que antes de nos chegar otrabalho do Juiz mineiro, eu quis propô-

la. Parei, porque a edição da Súmulaexige “reiteradas decisões sobre a mes-ma questão”.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MEN-DES – Sim, mas logo teremos decisõesque não chegarão ao Plenário, porqueteremos decisões monocráticas e, de-pois, os tradicionais agravos regimen-tais, como conhecemos nas Turmas.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDAPERTENCE – A primeira súmula tem deter pelo menos umas três decisões, comrelatório lido. A SRA. MINISTRA ELLENGRACIE (PRESIDENTE) – Bem discutidas.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MEN-DES – Estaríamos pelo menos em proces-so de elaboração. Eu estava concitandoo Ministro Carlos Britto a pensar alto,uma vez que ele é o autor do voto.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO– Até porque é um mecanismo novo quedeve ser aplicado.

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO(RELATOR) – Está sugerido.

A SRA. MINISTRA ELLEN GRACIE (PRE-SIDENTE) – Gostaria que a Taquigrafiaapenas incluísse na proclamação a ob-servação de que o Ministro Marco Au-rélio, no caso, fica parcialmente venci-do, na medida em que não estabeleciaa edição da Emenda Constitucional nº45 como marco temporal para a com-petência da Justiça trabalhista.

É isso Ministro Marco Aurélio?

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉ-LIO – Sim, Excelência. O SR. MINISTRO

JULGAMENTO HISTÓRICO - Competência da Justiça do TrabalhoIndenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidentes do trabalho22

CARLOS BRITTO (RELATOR) – Veja bem,aí é atribuir efeitos à nossa decisão apartir da Emenda nº 45. Isso não impli-ca deixar de reconhecer que a compe-tência já existisse anteriormente àEmenda nº 45. Não é isso, MinistroSepúlveda Pertence?

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PER-TENCE – A Justiça não é uma academia.Adoto, por razões de política judiciária,a fórmula proposta no enunciado pelaSenhora Presidente, da Emenda Consti-tucional nº 45.

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO

(RELATOR) – Simplesmente como um im-perativo de política judiciária.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PER-TENCE – Pouco importa esteja eu a con-fessar que, desde 1988, descobri que esta-va errado. Mas essa era a orientação doTribunal e aí não me animo a dar provimen-to a recurso extraordinário para desfazerprocessos de acidentes de trabalho emrazão da minha nova visão do problema.

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO(RELATOR) – Então, em se tratando deimperativo de política judiciária, concor-do inteiramente.

TRIBUNAL PLENOEXTRATO DE ATA

CONFLITO DE COMPETÊNCIA 7.204-1 MINAS GERAIS

RELATOR : MIN. CARLOS BRITTOSUSCITANTE(S) : TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHOSUSCITADO(A/S) : TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DE MINAS GERAISINTERESSADO(A/S) : VICENTE GIACOMINI PERONADVOGADO(A/S) : HÉLCIO DE OLIVEIRA FERNANDES E OUTRO(A/S)INTERESSADO(A/S) : BANCO BEMGE S/AADVOGADO(A/S) : JOSÉ MARIA RIEMMA E OUTRO(A/S)

Decisão: O Tribunal, por unanimi-dade, conheceu do conflito e, por mai-oria, definiu a competência da justiçatrabalhista, a partir da Emenda Consti-tucional nº 45/2004, para julgamentodas ações de indenização por danosmorais e patrimoniais decorrentes deacidente do trabalho, vencido, no caso,o Senhor Ministro Marco Aurélio, na

medida em que não estabelecia a edi-ção da emenda constitucional comomarco temporal para competência dajustiça trabalhista. Votou a Presidente.Ausente, justificadamente, o Senhor Mi-nistro Nelson Jobim (Presidente). Pre-sidiu o julgamento aSenhora MinistraEllen Gracie (Vice-Presidente). Plená-rio, 29.06.2005.

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