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O JULGAMENTO

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O JULGAMENTO

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ApresentAção O Grupo Domo vem apresentar o espetáculo “O Julgamento”, estreado em novembro de

2008 (Centro Cultural de Brasília), com temporadas em novembro de 2009 (Teatro Goldoni) e abril de 2010 (Teatro SESC Garagem). Também em 2010 o espetáculo foi contemplado com o patrocínio do Fundo de Arte e Cultura - FAC, do Governo do Distrito Federal, para a difusão do espetáculo em nova temporada, que será realizada em abril de 2011.

A peça mostra um tribunal surreal onde um jovem rapaz está sendo julgado por um Estado totalitário por difundir idéias sobre política e sociedade que divergem daquelas que os seus governantes antevêem e pretendem inalteráveis.

O espetáculo pode ser considerado uma “distopia” (antítese da “utopia”), ao projetar uma sociedade atemporal, onde os direitos humanos e civis são renegados em prol da manutenção do status quo de uma ordem autocrática. A linguagem utilizada é a tragicomédia, muitas vezes com toques de surrealismo e absurdo, que ressaltam os desvios de pensamento daquela sociedade, além de servir como alegoria para a nossa própria contemporaneidade.

Assim, as mazelas de nossos conceitos pré-concebidos vão sendo exibidas, dando lugar a uma reflexão mais severa sobre como admitimos, inconscientemente, certos valores. E também, quanto nossa sociedade tem ainda que caminhar para superar sua adolescência evolutiva, para nos tornarmos mais afins com o nome que recebemos: Humanos.

O texto, escrito em 1995/1996 e finalizado em 2008, vem dar continuidade a um projeto de elaboração e montagem de textos autorais do próprio Grupo Domo, que neste trabalho levanta importantes discussões sobre os limites sociais, poder, política e liberdade de expressão, temas importante de serem revistos, sobretudo num mundo que anda tão oprimido pela descrença na política da atualidade, tão carente de desenvolver melhor a relação homem/natureza, e tão estigmatizado na idéia do que o homem deve ser, como ser social.

Os trabalhos do Grupo Domo, que já atua há dezesseis anos, de certa forma, giraram sempre em torno das relações entre as pessoas (mesmo em ambientes e com personagens não naturalistas), as suas crenças, e a maneira com que encaramos nossa cultura, nossa sociedade e civilização.

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SINOPSE

O desenvolvimento do enredo dramatúrgico se dá no “Tribunal Popular” um tipo de picadeiro onde o público vem assistir a julgamentos de pessoas seqüestradas pelo Estado. O tribunal é um tipo de “circus máximus”, um dramático espetáculo promovido pelas lideranças ocultas. O circo da vida real num mundo de fantasia.

Um Juiz autoritário, que ao mesmo tempo é o advogado de defesa e o promotor, confronta-se com um Réu, considerado pelo Estado como ativista político e social, no que diz respeito às suas liberdades civis, as noções de ordem e justiça, os limites do poder sobre o cidadão e sobre como a sociedade sofre pelos paradigmas criados por ela própria.

Sete personagens, o Réu, o Juiz, sua Assistente, o Guarda e as Testemunhas, interpretados por apenas quatro atores, com o auxílio de um contra-regra/ator, dão conta da encenação propriamente dita.

Composta de cinco cenas (prólogo, julgamento de três crimes e veredicto), a peça tem como argumento o modus operandi do Tribunal Popular. Assim, a peça é aberta com um Prólogo, que deixa clara a posição de cada um ao longo da tragicomédia que virá: O juiz em seu papel de acusador e redentor das vítimas, os funcionários da

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repartição, marionetes raivosas de uma engrenagem massificante, e o Réu, o reflexo de uma ética que está em formação, mas ainda assim ética, que pode até ser encoberta por sete palmos de terra, mas que sempre existirá. Todos humanos, todos no mesmo jogo, todos na mesma condição terrenal, a despeito de desfechos diversos. OJuiz fala aos seus, mas fala também diretamente à platéia, rompendo a quarta parede (que se restabelece quando necessário), envolvendo a todos na movimentação da máquina industrial do direito estatal

Em seguida vêm os crimes, o julgamento deles propriamente dito. Sorteados pela platéia (mas sempre em ordem determinada) vêm em seqüência os temas do Assalto, onde o Réu é acusado de roubar mentalmente as jóias do pensamento ocidental e transformá-las em armas anti-manutenção da calma e ordem das massas; a Propaganda Enganosa, onde o Réu é acusado de prometer um mundo utópico e fictício de bem aventurança que não pode e não deve se materializar, um bem prometido que ele não tem como entregar; e por fim a Heresia, no qual o Réu é confrontado com suas crenças mais profundas na fogueira da Inquisição ideológica do Estado.Para cada crime há uma testemunha, sempre de acusação, pois o Réu não tem direito à defesa.

Assim, depois desta jornada, vem o Veredicto, que sentencia o Réu de forma a não deixar dúvidas de que a realidade da distorção do poder existe, mas que em contrapartida não se poderá calar a Verdade nunca.

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CONCEPÇÕES DA ENCENAÇÃO

A idéia deste espetáculo vem dos primórdios do Grupo Domo. Quando André Garcia estava escrevendo os primeiros textos para o espetáculo “O Grito” (primeiro espetáculo do Grupo, encenado pelo Grupo em 1995) elaborou três pequenas cenas chamadas “O Julgamento”, inspiradas num artigo lido em um jornal, que tratava de comentário sobre alguma obra literária onde um juiz perverso sentenciava um réu à morte. Isso despertou uma reflexão muito profunda, em diversos níveis, desde nossos direitos estabelecidos como cidadãos e entes sociais ao longo dos séculos, até um ponto de vista mais filosófico, onde o livre-arbítrio, a conduta acima de regras temporais, o estabelecimento de princípios éticos ante um decadentismo das instituições são temas que se mostram tão atuais quanto convenientes (aos que querem avançar no pensamento sobre a condição humana, mas certamente inconveniente para quem prefere a manutenção do status quo de Estados totalitários, mesmo que disfarçados de democráticos).

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O intuito original não era político num sentido mais direto, mais stricto sensu da palavra em sua aplicação partidarista e/ou institucional, mas político num nível mais profundo, filosófico mesmo, porque as instituições e o Estado são, em suma, formado por pessoas, que atendem a conceitos que idealizam e/ou que alimentam. No fim das contas, a questão central é essa: Nós mesmos, como membros e produtos desta civilização, como parte do mundo.

A despeito de ser uma distopia alegórica e quase atemporal, trata diretamente de nossa estrutura social hodierna, e de nossa conduta íntima, aquela que tentamos atribuir a uma “tradição”, mas que são de fato nossas pequenas e/ou grandes vontades reveladas em ato. E cada pessoa com o tipo de ato que escolhe, com as conseqüências advindas disto, e com o alerta, sobre a importância de nossas decisões pessoais como seres pensantes e atuantes, e de que cada um, ator ou platéia, está inserido neste contexto.

As três cenas curtas foram retiradas do texto de “O Grito”, e transformadas então no espetáculo “O Julgamento”, por ter seu autor percebido a profundidade e extensão do tema, que gerou uma motivação muito estimulante no Grupo. Levamos muitos anos para montar este espetáculo. Não por não querer, mas por entender a necessidade de maturação de nossa própria forma de encenação para atender a qualidade da peça. A peça foi quase toda escrita no ano de 1995/1996, e guardada na gaveta, passando por pequenas reformas ao longo dos anos, e chegando a sua versão definitiva, encenada pelo Grupo em 2009.

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FIGURINOS

O Figurino foi criado a partir de uma mescla de elementos de épocas diversas, com símbolos que remetem a condição de cada íntimo, de cada papel das personagens no drama desenvolvido. O Juiz possui coturnos e casaco com insígnias militares, um uniforme, mas que nem por isso deixa de lado o tom de realeza desse poder naquela sociedade, pois que feito do mais puro veludo cromo alemão, mangas de renda importada, botões com brasão, gola elisabetana, peruca de cachos brancos. O preto, o branco e o dourado são as cores mestras desta composição de estilos. O guarda segue o padrão militar, mas com elementos não tão nobres, nem tão rigorosamente sóbrios no acabamento e na cor. O pobre guarda tenta ser como ele, o grande Juiz, mas ainda não o alcança, nem mesmo na graça pensada de seus movimentos.

O Réu vem com uma camisola, aquela dos hospícios do século XVIII, com longas mangas amarráveis. No peito a marca de nosso tempo: Um imenso código de barras que definem quem ele é, sem a necessidade de um nome para designá-lo, além daquilo que ele é, um réu. Por baixo, um macacão, com o mesmo código, que é mostrado quando este aprende a se comportar melhor, demonstrando que não vai morder os funcionários. Na boca, um arreio de bestas impacientes e agressivas, um freio de cavalos, que, se preciso, são puxados. Nos olhos, máscara, vendando a visão, enxotando aquela consciência ao mundo do temor, do não

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saber o que está havendo. Conforme a peça se desenvolve, a máscara e o arreio são retirados, para que ele possa fazer sua defesa, inútil cena, pois que o desfecho geral já o ronda desde a primeira palavra dita.

A Assistente, com ar de coquete de luxo, anda em saltos vermelhos e meia arrastão, num corpete de veludo roxo e cartola acompanhando, que confunde e ilude os desavisados de sua posição subserviente, com um glamour garimpado nas melhores imagens de apresentadoras de espetáculos de um Moulin Rouge imaginário.

As testemunhas, cada uma com seu padrão de cor e textura, dão um colorido à multiplicidade de atuação do tribunal. Uma bibliotecária idosa, com sua longa saia marrom drapeada, sua blusinha de seda branca com bordados de borboletas, seu imenso óculos para horas infindas de leitura e consulta. Uma secretária neurastênica e desequilibrada, com seu chapéu de plumas de luto, seu vestido amarelo a La Brigitte Bardot, sua bolsa repleta de cigarros, de pó compacto e chicletes. A Freira, que desliza pelo palco com patins invisíveis, usa uma túnica que esconde seu conteúdo, mas revela na aparência a sordidez das intenções. Seu Chapéu, branco e antigo, ostenta a suposta autoridade de um poder sacerdotal perdido, e por isso mesmo, cômico em sua flacidez simbólica. No dorso, o bordado da cruz e da coroa, requerendo a ascensão das instituições religiosas sobre qualquer outro poder.

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As Máscaras

Ainda na composição estética da peça, todas as personagens ligadas diretamente ao Estado usam máscaras, símbolo do poder oculto, da impossibilidade de se revelar o que de fato vai por trás das aparências imperialistas. As outras personagens não a usam, porque não são partícipes das lideranças que manobram, mas massas móveis nas mãos destas lideranças. As mulheres, todas com perucas, procurando dar forma particular áquilo que na verdade não consegue se diferir. Os homens, por regra do Estado, têm cabelos tosados à moda militar, sejam réus, sejam juízes, afinal, por trás deles, também tem alguém que decide tudo isto, alguém ainda mais oculto, alguém ainda mais enterrado nas engrenagens que governam a política.

Cenários

Os cenários e objetos de cena englobam essa visão lúdica das partes dissonantes que compões o todo, o universo das personagens, cada uma contribuindo com um aspecto. De um lado, o Juiz e seus acessórios, sua escrivaninha pequena, deixando-o desconfortavelmente grande em relação a qualquer objeto. Sobre a mesa, o telefone vermelho com o qual o Juiz conversa com lideranças ocultas, aqueles que realmente estão definindo o destino do réu. Ainda sobre a mesa, sua caneta/pluma dourada, seus instrumentos de trabalho, carimbos diversos, e o processo de milhares de páginas. Seus charutos, brinquedos e livros. Os réus possuem um lugar próprio, uma piscina de bolinhas, embaixo de um móbile de sórdidos e distorcidos bichinhos. Esses objetos pseudo infantis, essa infantilização obscura, revela uma aura de tentativa de

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inocência, um acobertamento do lôdo espúrio de uma moral altamente questionável, e de uma imposição da imagem do estado como o grande adulto que conhece seu meio e o rege, frente a criança que precisa ser corrigida por seus atos falhos. Ao fundo, um painel de personagens bizarras apresentando a entrada das testemunhas (pintado por Leopoldo Wolf, que elaborou toda a cenografia juntamente com André Garcia), e uma cadeira a espera delas, rodeadas pelos inocentes espectadores de pelúcia. O Juiz ainda possui, para momentos de maior descontração, um trono, um urso rosa que serve de assento a própria barriga, e que assiste sorridente e impassível ao desenrolar dos acontecimentos.

O tribunal ainda é munido de uma parafernália tecnológica e engenhosa, que às vezes remete a um certo futurismo, e que está sempre à mão do Juiz, seja para apoiar sua posição acusadora (como um capacete que o juiz utiliza para “ouvir” a testemunha com problemas nas cordas vocais) ou para ameaçar o réu, em freqüentes torturas, a fim de obter a confissão (equipamento de eletro-choque).

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Preparação de Ator

O caráter argumentativo e denso do texto, em que muitas frases dão sentido a várias interpretações, exigiu dos atores um longo período de estudo de leitura dramática, na busca de uma compreensão mais profunda sobre cada palavra e intenção superficial e oculta do texto.

Numa peça onde aspectos cômicos são abruptamente convertidos em trágicos e aspectos trágicos são muitas vezes travestidos de cômicos, e onde o público transita entre o espectador passivo e o sentenciador do julgamento, foi necessário por parte dos atores um profundo trabalho de sensibilização para que se pudesse buscar a imersão nos diversos climas da peça, num fluxo contínuo, num redemoinho de ações e de sensações. Além disso, foram necessárias aulas de preparação física e vocal, a fim de alcançar as diferentes texturas de voz e de movimentação que exige a peça.

A movimentação, por sua vez, é algo sempre marcante na cena, sendo que os personagem que representam o Estado têm seu próprio ritmo, mas todos pactuam de uma mesma dança. Essa dança é o próprio status quo, e o Juiz o promulga sempre com movimentos

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amplos e elegantes, que acompanham sua argumentação envolvente, como se quisesse arrebatar os espectadores numa seqüência sedutora. O guarda sempre busca acompanhá-lo, às vezes imitando-o, como que ensaiando para galgar futuros degraus na hierarquia governante, mas seus movimentos ainda são muito desengonçados, nunca alcançam a perfeição do Juiz.

Especial atenção aos quatro papéis femininos, que em cada temporada são representados por uma única atriz. André Garcia e Leudo Lima, que protagonizam e produzem o espetáculo, passaram por anos de leitura e refinamento do entendimento da cena desta peça, e revelam no palco o resultado de seus esforços.

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Direção e Texto: André Garcia

Atores: André GarciaLeudo LimaLina BorbaTiago Medeiros

Ficha Técnica

Assistente de Direção: Magno Telles

Cenografia: Leopoldo WolfAndré Garcia

Figurinos: André Garcia

Iluminação: Lina Borba

Sonoplastia: André Garcia

Produção: Leudo LimaAndré Garcia

Arte Gráfica: Leudo Lima

Fotos: Camila RussiFernando NisioImagem BSBMurici Galasso Ivan Marques

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Jornal Correio Braziliense, 14 de novembro de 2008.

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Jornal da Comunidade, 15 de novembro de 2008.