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24 BE DEZEMBRO. N.° 20. mit ¦;* GABINETE DE LEITURA, 83SKST-SERÕES DAS FAMILMS BRAZILEIRAS, &KiH STJBSCRIPÇAO. Na Typographia Commercial rua do PREÇO. Um anno 6$000. JORNAL PARA TODAS AS CLASSES, SEXOS E IDADES. % <& BIOGRAPH1A. Wolfgand-Amcdeu Mozart, um dos mais célebres compositores, nasceu em Saltz- burgo a 27 de janeiro de 1756. Foi um dos gênios mais precoces que se haja en- coiitrado. Desde a mais tenra idade, de seis annos, iniciado por seu pae na ar- te musical, compòz muitas peças parii o cravo que alie mesmo executava com mui- ta facilidade. Seu pae aproveitou-se d'esse extraordinário talento, elevou o maravi- lhoso menino de corte em corte ; em 1Í62 apresentou-o em Vienna ao imperador Fran- cisco I, e em 1763 na corte" de Versa- lhes. ¦ N'esta" épocha, tendo apenas oito annos de idade , compòz duas sonatas. De- pois foi conduzido a Inglaterra à. presen- sa de George III, d'ahi passou parí os Paizes-Baixos e Hollanda,- e por* toda a parte o jóven Mozart excitava o mais vi- vo enthusiasmo', seü retrato "circulava pe- Ias/ iqà.ps,^de seus admiradores/ De'volta*á sua cidade natal, Mozart deu-se.'¦'epjjr ardír ao estudo da composi- ção. Seus mestres de predileeção eram Manuel Bach , Hasse e Handel. Em 1768, tendo doze*annos, foi cha- mado a Vienna por José Hque lhe en- commendou uma opera-bufa; esta com- posição intitulada. ía Finta sempliee obte- ve o maior friümpho ; em Í770 ," quator- ze annos, fez. para oitheatro de Milão uma opera sfria, Müridate, ,-que foi rei presentada vinte vezes seguidas; Chama- do á Itália pela execução de suas obras, Mozart recebeu as maiores honras das ac- cademias e dos príncipes. Mas o que elle sobre tudo desejava era ver Roma e as. sistir ás grandes ceremonias da semana santa em S., Pedro. Na sexta feira san-' ta ouviu na capella Sixtina o magnífico Miserere de Allegri. Para conservar a es- ta musica toda suSrHrigitíalidade local, os papas prohibiram sob penas mui seve- ras, que se tirassem copias. Mozart ouve o sublime canto no mais piedoso recolhi, mento; e voltando á sua caza nota-o to- do inteiro de memória, e no dia seguin-, te cantou-o em um conceito acqmpanhan- do com o cravo. Isto augmentou o en- thusiasmo pelo grande artista , e o papa Cie, mente XIV o encheu de honras. Mozart ligou-se em amizade com os dous mais celebres compositores de seu tlmpo, Haydn e Gluck. Em 1776 achou-se em Pariz na épocha em que Gluck fazia represen- tar o seu Alceste; esta bella obra não foi então couiprehendida pelo publico parisien- se ; Mozart assistia á primeira represen- tação , sahe do-theatro e vae com as la- griulas nos olhos lançar-se nos braços de Gluck:—Ah! que bárbaros! exclamava ello," ah ! que corações de bronze ! que é necessário para commovel-os? Conso- la-te , pequeno , respondeu Gluck ; d'a- qui á trinta annos me farão justiça. De volta a Allemanha'', Mozart íigou-se para sempre a José II. Em 1736 coinpoz o Cazamento de Figaro,_e em 1787 sua divina obra DonJuan. Esta opera foi.com- posta para o theatro italiano de Praga. Sua derradeira grande compozição foi a famosa missa de Requiem, sobre a qual se conta uma interessante anecdota. Um desconhecido se apresenta um dia em casa de Mozart e entrega-lhe uma carta anonyma na qual pedem-lhe que' se encarregue da compo- zição d'uma missa de Requiem; Mozart acceita. Pouco tempo depois, elle entrava em uma carruagem para ir a Praga onde devia compor uma grande opfyra , quando o desconhecido se lhe apresenta de novo, e lhe pergunta pela sua missa. Mozart promette que se occupará d'ella logo que volte; cora .effeito, de volta a Vienna, entregou-se com o maior ardor a ssta com- posição, persuadido por fim> que trabalha- va para seu próprio funeral. Alguns annos depois, extenuada sua*saude pelo traba- lho e seus excessos, Mozart, sentindo que se aproximavam seus derradeiros momen- tos .,- exclamou : Morro quando ia gozar de meus trabalhos; ê mister renunciar a mi- nha arte}quando podia dar-me a ella todo inteiro, quando , superados todos os obs- taculòs , ia escrever o que me dictasse o coração!—Poucas horas antes de dar o u]t|mo suspiro, mandou que lhe trouxes- sem a partição do Requiem.- Não tinha eu dito que era para mim mesmo que compunha este canto de morte ? Moasrt expirou a 5 de dezembro de 1791, não tendo ainda completado 36 annos. Este bello gênio musical se distingue por uma grande variedade que abraça com igual superioridade, todos os gêneros, des- de o romance e o quarteto até a sympho- nia ,e a opera. Era dotado de maravilhosa facilidade de compozição que em nada des- merecia á candura e á profundidade. Nun- ca se chegava ao piano nos seus momen- tos de inspiração ; elle notava de seguida com a penna sua creação , eacripta toda inteira em sua cabeça. Os cantos de Mo- zart são d'uma melodia encantadora pela pureza e originalidade , e em sua oíches- tra prodigalisa thesoiros de harmonia ; nin-' guem possue melhqfca sciencia instrumen- tal , a arte de fazer fallar a cada instru- mento sua linguagenf; e de os unir em mágico accordo. Eis aqui a lista de suas compozioCes dramáticas: La Finta sempliee fi768>, Mitridate (1770), Ascanio inAlba .'177-1), Lúcio- Silla (1772), il sosno de Sápione (l<7á), ta Giardinera (1774), Idomewo (1780), le Nozze di Figaro (1780), Don Gwvanni (17S7), Cosi fan títtte (1790), Ia clemenza de Tito (1791), die Enfia- hrung aus dem serail (1782), der Scham- piel-direktor (1786), die Zumbcr ttote (I7W)." . <ff*an á\^ D'U3tt I»IAKI\JHIItO iffGLEZ.* Tenho, a honra de pertencer a esta raça amphibiá, que se costuma chamar soldados do mar , quero dizer, que tenho a-honra détèr;.empregado n'uma commissão nobilissimo, magnífico, e antiqüissimo cor- po da marinha real. Eu tive a desgraça de ser empregado a bordo-d'um d'os na- vios , que estavam de observação no Dou- ro, em quanto durou o cerco do .Porto. Por desgraça não se entenda, que tenha de me queixar do almirante , do capitão, - so,b cujas oíderis eu então estava, e muito menos dos meiwf camaradas , pois . elles tinham bravura , e eram alegres; mas eu quero fallar da cidade- è de seus habitai). tes, e do quanto me custou fazer eonhe. cido-,o meu brilhante uniforme, 8 o ca- valleiro ainda mais brilhante, que o vestia. -Além disto-, nós não tínhamos um tao- mento de repouso; e posto que no domin-. go algumas jovens senhoras, em quanto os miguelistas davam folga a. seus inimigos, se. apresentassem n'aquelle logar para serem vistas e conhecidas , todos estavam seguros de ver tantos rivaes disputarem ehtre si um dos seus sorrisos, que me obrigava a não ser tão amável, quanto eu presumo de o ser.'

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24 BE DEZEMBRO. N.° 20. mit ¦;*

GABINETE DE LEITURA,83SKST-SERÕES DAS FAMILMS BRAZILEIRAS, &KiH

STJBSCRIPÇAO.

Na TypographiaCommercial rua do

PREÇO.Um anno 6$000.

JORNAL PARA TODAS AS CLASSES, SEXOS E IDADES.% <&

BIOGRAPH1A.

Wolfgand-Amcdeu Mozart, um dos maiscélebres compositores, nasceu em Saltz-burgo a 27 de janeiro de 1756. Foi umdos gênios mais precoces que se haja en-coiitrado. Desde a mais tenra idade, deseis annos, iniciado por seu pae na ar-te musical, compòz muitas peças parii ocravo que alie mesmo executava com mui-ta facilidade. Seu pae aproveitou-se d'esseextraordinário talento, elevou o maravi-lhoso menino de corte em corte ; em 1Í62apresentou-o em Vienna ao imperador Fran-cisco I, e em 1763 na corte" de Versa-lhes. ¦ N'esta" épocha, tendo apenas oitoannos de idade , compòz duas sonatas. De-pois foi conduzido a Inglaterra à. presen-sa de George III, d'ahi passou parí osPaizes-Baixos e Hollanda,- e por* toda aparte o jóven Mozart excitava o mais vi-vo enthusiasmo', seü retrato "circulava

pe-Ias/ iqà.ps,^de seus admiradores/De'volta*á sua cidade natal, Mozart

deu-se.'¦'epjjr ardír ao estudo da composi-ção. Seus mestres de predileeção eramManuel Bach , Hasse e Handel.

Em 1768, tendo doze*annos, foi cha-mado a Vienna por José Hque lhe en-commendou uma opera-bufa; esta com-posição intitulada. ía Finta sempliee obte-ve o maior friümpho ; em Í770 ," quator-ze annos, fez. para oitheatro de Milãouma opera sfria, Müridate, ,-que foi reipresentada vinte vezes seguidas; Chama-do á Itália pela execução de suas obras,Mozart recebeu as maiores honras das ac-cademias e dos príncipes. Mas o que ellesobre tudo desejava era ver Roma e as.sistir ás grandes ceremonias da semanasanta em S., Pedro. Na sexta feira san-'ta ouviu na capella Sixtina o magníficoMiserere de Allegri. Para conservar a es-ta musica toda suSrHrigitíalidade local,os papas prohibiram sob penas mui seve-ras, que se tirassem copias. Mozart ouveo sublime canto no mais piedoso recolhi,mento; e voltando á sua caza nota-o to-do inteiro de memória, e no dia seguin-,te cantou-o em um conceito acqmpanhan-do com o cravo. Isto augmentou o en-thusiasmo pelo grande artista , e o papa Cie,mente XIV o encheu de honras. Mozartligou-se em amizade com os dous mais

celebres compositores de seu tlmpo, Haydne Gluck. Em 1776 achou-se em Parizna épocha em que Gluck fazia represen-tar o seu Alceste; esta bella obra não foientão couiprehendida pelo publico parisien-se ; Mozart assistia á primeira represen-tação , sahe do-theatro e vae com as la-griulas nos olhos lançar-se nos braços deGluck:—Ah! que bárbaros! exclamavaello," ah ! que corações de bronze ! queé necessário para commovel-os? — Conso-la-te , pequeno , respondeu Gluck ; d'a-qui á trinta annos me farão justiça.De volta a Allemanha'', Mozart íigou-separa sempre a José II. Em 1736 coinpozo Cazamento de Figaro,_e em 1787 suadivina obra DonJuan. Esta opera foi.com-posta para o theatro italiano de Praga. Suaderradeira grande compozição foi a famosamissa de Requiem, sobre a qual se conta umainteressante anecdota. Um desconhecidose apresenta um dia em casa de Mozarte entrega-lhe uma carta anonyma na qualpedem-lhe que' se encarregue da compo-zição d'uma missa de Requiem; Mozartacceita. Pouco tempo depois, elle entravaem uma carruagem para ir a Praga ondedevia compor uma grande opfyra , quandoo desconhecido se lhe apresenta de novo,e lhe pergunta pela sua missa. Mozartpromette que se occupará d'ella logo quevolte; cora .effeito, de volta a Vienna,entregou-se com o maior ardor a ssta com-posição, persuadido por fim> que trabalha-va para seu próprio funeral. Alguns annosdepois, extenuada sua*saude pelo traba-lho e seus excessos, Mozart, sentindo quese aproximavam seus derradeiros momen-tos .,- exclamou : Morro quando ia gozar demeus trabalhos; ê mister renunciar a mi-nha arte}quando podia dar-me a ella todointeiro, quando , superados todos os obs-taculòs , ia escrever o que me dictasse ocoração!—Poucas horas antes de dar ou]t|mo suspiro, mandou que lhe trouxes-sem a partição do Requiem.- — Não tinhaeu dito que era para mim mesmo quecompunha este canto de morte ? — Moasrtexpirou a 5 de dezembro de 1791, nãotendo ainda completado 36 annos.

Este bello gênio musical se distingue poruma grande variedade que abraça comigual superioridade, todos os gêneros, des-de o romance e o quarteto até a sympho-nia ,e a opera. Era dotado de maravilhosafacilidade de compozição que em nada des-merecia á candura e á profundidade. Nun-ca se chegava ao piano nos seus momen-

tos de inspiração ; elle notava de seguidacom a penna sua creação , eacripta todainteira em sua cabeça. Os cantos de Mo-zart são d'uma melodia encantadora pelapureza e originalidade , e em sua oíches-tra prodigalisa thesoiros de harmonia ; nin-'guem possue melhqfca sciencia instrumen-tal , a arte de fazer fallar a cada instru-mento sua linguagenf; e de os unir emmágico accordo.

Eis aqui a lista de suas compozioCesdramáticas: La Finta sempliee fi768>,Mitridate (1770), Ascanio inAlba .'177-1),Lúcio- Silla (1772), il sosno de Sápione(l<7á), ta Giardinera (1774), Idomewo(1780), le Nozze di Figaro (1780), DonGwvanni (17S7), Cosi fan títtte (1790),Ia clemenza de Tito (1791), die Enfia-hrung aus dem serail (1782), der Scham-piel-direktor (1786), die Zumbcr ttote(I7W). " .

<ff*aná\^

D'U3tt I»IAKI\JHIItO iffGLEZ.*

Tenho, a honra de pertencer a esta raçaamphibiá, que se costuma chamar soldadosdo mar , quero dizer, que tenho a-honradétèr;.empregado n'uma commissão n«nobilissimo, magnífico, e antiqüissimo cor-po da marinha real. Eu tive a desgraçade ser empregado a bordo-d'um d'os na-vios , que estavam de observação no Dou-ro, em quanto durou o cerco do .Porto.Por desgraça não se entenda, que tenhade me queixar do almirante , do capitão, -so,b cujas oíderis eu então estava, e muitomenos dos meiwf camaradas , pois . ellestinham bravura , e eram alegres; mas euquero fallar da cidade- è de seus habitai).tes, e do quanto me custou fazer eonhe.cido-,o meu brilhante uniforme, 8 o ca-valleiro ainda mais brilhante, que o vestia.-Além disto-, nós não tínhamos um só tao-mento de repouso; e posto que no domin-.go algumas jovens senhoras, em quanto osmiguelistas davam folga a. seus inimigos,se. apresentassem n'aquelle logar paraserem vistas e conhecidas , todos estavamseguros de ver tantos rivaes disputaremehtre si um dos seus sorrisos, que meobrigava a não ser tão amável, quanto eupresumo de o ser. '

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'W?''

m 154 GABINETE DE LEITURA.

Õ imperador D. Pedro «ue foi já en.contrar-se com seus maiores ria eterna mo-rada -. . . ... .':í. . -.- ¦ • • «

Àccresce também que ó marquez de Loulév cunhado do Imperador je como elleseparado de sua esposa, vivia sempre riascampinas em procura de alguma beldade.Posto que o marquez seja um,dos homensmais elegantes da Europa, entrétapm^se-.ja-nos permittido dizer entre nôs) é diffiçilehcóritrai»uhia figura ião insignificante. A'primeira vista seduz todos os corações,mas perde todas as suas conquiltas coma mesma velocidade com que as faz. De-pois vinham o conde de Villa-Flòr, e mui.tas outras illustráçoes militares, não compre-hendèhdo ri'êsise 'numeroo

prestito de gene-raes, coronéis dó exercito, brilhantes, e em-prehendédórèà ofnciálPda lègiáò angló-fran-cezá, capitães , è^irimeirós. teneittes danossa esquadra.

Pelo tempo em que esta historia tevecomeço , o commandante de nossa esquá.dra projectou- estabelecer um posto , parapor meio de signaes abrir çommunicaçôescom os navios inglezes, que se conserva-vam fóra da barra* Ora, não podendo desço-brir-se para esse fim logar appropriado nacosta do rio, pediu-se ao general Santa Mar.ta, commandante dos rniguélistas a permis-são de marcar um logar na margem esquer-da, que lhe pertehcia. A authórisáçâo foiofficiosarriente concedida. Principiou-se a

v obra, e em poucos diascohstruiu-se.umalindissima casa^ para' receber os officiaes,e a todos aquelles a quem o almirantetinha de commaridar. Para esse serviço mehaviam escolhido , em companhia d'umtenente da esquadra, com quem vivi namais perfeita harmonia. Era-nos permti-tido passeiar por entre meio dos rniguélistas,ou„ si .isto nos nâo bastava, podíamos, irpasseiar áo Porto', »uma vez que nos mu-nissemos da competente licença

Poucos dias se passaram depois que to-mamos parte do dito posto , quando asbaterias rniguélistas , collocadas na foz dorio coriieçaram a 'fazer seus terríveis ef-feit03, e por esse meio conseguiram im.possibilitar a entrada de viveres, que, abas-tecendo a cidade , evitasse a fome, quejá se principiava a sentir. E' Herdade, quecom abundância havia muito bacalhau evinho; mas os melhores estômagos eus-tam a sugeitar-se a semelhante íegimem ,e perraitta.se-me dizer , que peixe salga-do para o almoço, para o jantar, e paraceia rjão é tão bom' manjar , que seja de-sejado pelos officiaes, é pela gente.

"Nossocbjnmandante com a prudência , q°ue ca.racterisa um offieial inglez, já havia pre.• visto a difficuldadé; por cujo motivo tambémtinha combinado com o general miguelistaps meios de obter provisões frescas , car-"'nps i aves, legumes, para os navios, queCompunham a esquadra , sob a condiçãode nâo ceder aos sitiados nada do queobtivesse.-

A. esquadra vivia n'abundancia, ao pas.so que a guarnição vivia na miséria ," enós passeiavamos pelas ruas com a pM-

sioqprnia risonha, elegantes x e esbeltos ydevendo isto á previdência d° nosso :com-mandante, e appresentavamos um contrastebem diverso do dos soldados, que morriamde fome em honra da Carta. Os habitantesda cidade tambérS oomecáram a soffrer,e algumas das bellesas, dignas de admi-ração ,' principiavam a sentir-' o mesmoefteito. .0 viulia.. do Porto,-je o peixesalgado nãó -podiam formar- j^ajngüe • puroe generoso. Por esla oceasião tive de ob-servar , què as senhoras do Porto sè-nãocobriam coiji °s seus véos pela mesmamaneira porque o faziam no começo dositio. D'ahi nasceu o desejo de formar oplano attrevido , é aUda7 , que passo a ex-pòr-vos , e que bastará para provar a todasas universidades, que náo ha aventureiro,que possa ser equiparado a um soldadode marinha.

A mais bella moça do Porto era umajovem Hespahhola, chamada Carolina. Era;filha do alcaide de Ponte,Vedra na Galiza,e tinha seguido a seu pae , quando estese viu forçado a exillar-se. Ò bravo ,. einfeliz pae , tendo perdido a existência ,deixou Carolina exposta a todas as pri-vações d'um sitio, e ás seduções d'umacorte militar ^e corrompida. Jamais vicreatura tão. linda : seus olhos eram ne-gros , como a noite , e sua pclle tinhaas cores desconhecidas nos tristes paizesdo Norte. Nem um senão se lhe podianotar : suas mãos, e seus pés eram peque-uinos :' andava com essa magestade e ele'.*gancia dc que sâo dotadas as Hespanholas.A pobre Carolina era tão bôa , corno bella,e posto que o presumpçoso cunhado doimoerador, bem como todos os namoradosdo exercito, a adorassem de joelhflã, ellase sabia'condiizir com tanta discrição, quetinha merecido a estima de todos, corh.jprehendéndo a guarnição dá nossa esqua-dra. Mas, como os mais abrasadosj tinhaeu sido arrebatado <j'encanto pela angélica"Carolina, e empregava todos os instantes,das folgas ordinárias do serviço em pas-seiar pela frente^da sua janella, esperan-do obter , e attrahir seus bellos Olhos so-bre minha pessoa. Tinha-rríe tornado tãoamoroso por ella quanto um marinheiroo pôde ser; e minha paixão sem esperançase tinha tornado tão publica , que cons-tantemente á mesa j§p me dirigiam grace-jos, e o nosso digno commandante, quejulgo ter sido por ella dèspresâdo , nãóperdia, momento para interrogar-me comum tom sentimental^ , no meu ordiria-.rio passeio, havia sido tão feliz , quantoeü desejava, ' '. »

Calculai *o pra_sér qúétive , quando sou-

be que a fome augmentándo gradativa-mente, "o mesmo Imperador estava re-dusido a triste pitança de bacalhau, pãode rala , e vinho do Porto. Com vergo-nha confesso que o meu coração pulloiide prasçr , quando soube d'üm emisàario,.a quem havia incumbido a vigilância dacasa de Carolina, que aquella desgraça-da se aohava -redusida á ultima miséria,não tendo recurso algum de que lançassemão, Como acima disse, nossos navios es-

tavâm ,providos do necessário , c o logarem que então me achava, e que haviasido o destinado para.os signaes, posauiatudo com abundância. Os rniguélistas sus-tentavam' lealmente sua palavra , e diária-mente recebíamos novas "rações de carne,animaes domésticos., legumes b frutas. Ocoinmandante da esquadra «era tão fiel ásua palavra que, não obstante as reitera-das proposições , que p'-imperador lhe fa-zia , e náo obstante as sollicitações dos'officiaes do estado maior , havia- prohibi-do a remessa d'uma só libra de carne páraa cidado.. Alguns residentes inglezes im-petraram sua protecçâo, mas de balde, quea nada attendeu: preferiu tudo à viola-ção da palavra , dàdá áo general de D.Miguel. Não é fácil cóncpber o preço porque se vendia na cidade uma cocha dèfrango : d'aqiii descobri eu que o melhormeio' de domar o coração da bella Hes-panhola, seria sem duvida levar-lhe detempos, erri tempos tudo "o

que era possi-vel dispensar de nossa mesa. '

Um dia determinei-me a seguir até ocarnpo para descobrir alguma áve; e sub-traliindo.a á vigilância do despenseiro , aguardei iiicontiiientc no meu saCco , e pe-ditido uma licença me dirigi.á cidade. Em'poucos momentos me achei na rua, onderespirava o objecto de minhas aíleições ;e depois de haver reconhecido, que nemo imperador, e nem alguns* de seus offi-ciaes , que , como eu , tributavam home-najem á bella 'Iiespanhola, ali se acha-vámf determinei puxar pela corda da cam-paiilha* Repentinamente senti o rossard'um' Vestido pela parede e a doce voz'de Carolina.

Queln está ahi ? .Respondi-lhe : um offieial inglez ,

um amigo , que vos qu?r fafhir.Senhor. éu não tenho á honra de

conhecer-vos. •Tendes rasão , senhorita ; mas eu

tenho em vista somente servir-vos , por-tanto julgo merecer desculpa-se me apre-sento ante vós com táo pouca ceremoniá.

Desejando-vos milhares de felícida-des, não posso acceitar as offertas d'umestrangeiro, maxime não ás havendo eureclamado. -

Oh bella Carolina ! ( exclamei eu )detende-vos, deleude-vos , eu vol-o sufi-plico. Senhor , continuo a desejar que go-seis saúde.

Oh ! detende-vos , visão angélica,um momento ainda, eu vol-o peço! Eusou offieial de marinha.

Que mé impSrxa , que sejaes offieialde marinha? ¦'' '

Eu venho dedicar-me a vosso.ser-viço ?- \

.— Senhor, na verdade é levar muilonge vossas zombadas. Eu dispenço avesita, que fora de propósito me viestesaqui fazer. Pela ultima vez tenho a honrade dar-vôs as boas tardes. s »

A cruel Carolina ia certamente.feicharo postigo por onde "entretinhamos esta con-versacão , quando de repente, desesperado

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por tanta barbaridade , puz uma mão sobrea estreita passagem , o com a outra tiran.do a ave de meu saccp, expuz meu the-souro a seus olhos. Oh! si tivesseis viston'esse momento seu olhar, julgarieis verHamlet, quando descobre a sombra de seupae: pois ainda era melhor, por quanto aminha ave era urna realidade.

—. Senhgrita , lho disse eu , impacien-te fle aproveitar as vantagens , que aca-bava de conquistar, esta ave é uma pró.va do verdadeiro interesse que torno portudo aquillo que vos diz respeito. Tivenoticia que soflrieis do'cruel flagelo queora dessola esta cidade; e posto que euaventure comprometter a minha honra,e a da esquadra de S. M. B., introdusindona ^^Éf ^0 Porto Palte ^os viveres", re-servadoTa mantença de nossas equipagens,todavia náo pude resistir .ao desejo de of.ferecer-vos esta%vo i que. deponho ante. vossos pés.¦* Ella nada me respondeu ; porque o or.galho se achava a braços corn-o apetite.Com tudo a natureza acabou por venceUa.— Senhor disse ellà, aceito com sum-mo prazer, e reconhecimento o vosso pre-, sente , e. não posso occuJtar-vos o senti-mento de que me acho possuída pelo in-teresse que me acabaes d<««*tacmunhar.Deus vos guarde ; o*temp^pta, e eutemo que com esta demora não^íossaes vol.tar para bondo.

Depois de ter ultimado- a sua exposi.ção, ella feixoú o postigo , e eu perma-neci a pé quedo no mesmo logar, cppfun-didp d'espanto , abismado em delicias, eadmirando a» ingenhosa e nova receita ,que tinha inventado para ser amado. Con-'servei-me ahi~por mais algum tempo , cui-dando quo de novo se abriria o postigo ;mas Carolina *ta|a , eu o creio , muitopreocupa do Wfm que lhe havia offerta-do ; por isso não pôde vir dar-me o ultimoadeus ; á vista do que me retirei alegre ,vendo que o meu estratagema me fora pro'veitoso. ^

Saiba-se que%uardei em muito segredomeu ejixir de amor: não me attrevia mes-mo a submettel-o a uma nova experien.cia, antes de dois, ou» tres dias. Entro-tanto, uem por isso diminuiu em mim avigilância, que costumava ter da rua , ondehabitava. Carolina; queria saber qual seriaa recepção, que d'ella teriam os meus ri-vaes. Não poderia manifestar o praser quetive, quando vi se" lhes recusar a entradada casa a um por um. Ella está ferradaaos ossos da minha ave, dizia, isto é me-lhor que ouvir suas vãás declarações. Per-teuce-me agora captivar as affeições daminha amada , e procurar perpetuar a bôaopinião , que de mim fez. Eis que chegaa oceasião; na próxima destribuição dosviveres, podendo subtrahir um pato, tra-tei de voar sobre as azas do amor paradepor meu thesouro ante seus pés. Ape.sar de minha tremula mao não poder pu-

; xar pela corda da campainha, e de minhavoz não ter pronunciado meu nome, assimmesmo eu destingui as passadas de minhaamada. Çom efTeito o postigo se abre. Para

GABINETE Í)E LEITURA.

que se certificasse" da minha chegada, im-mediatainente íhemosjfér" a minha' offerèn.da, fazendo-a passar, o repassar'diantede seus olhes, dá mesma maneira porqueuma ama affaga seu pequeno. Carolina sor-riu-se , e to soltar a presa , ella dirigiu-me expressões de gratidão tão agradáveis,que me fez perder a rasão ; e prostrando-me,com o jo.clho ém,terra nó meio dariw, prestei o juramento d'um eterno amor.Carolina não pôde resistir aos signaes deminha sinceridade, e ás ternas demonstra-ções de minha affeição. Muito me recusouella a entrada de sua casa ; mas promet-teu.me consultar sua tia sobre a;conve-niéncia de .minhas visitas, e-asseverbu-meque si a prudente matrona annuisse á mi-nha exigência, ella se julgaria bastante-,mente feliz , por isso que ia "ter de mimmais amplo conhecimento. Suppliquei, queme uão 'fizessem esperar por muito tempoínstftiites tâo afTortunados, e fixei para aquinta feira seguinte a entrevista, quedesejava ter com a formidável tia." Passei toda a"noite em clnro, cuidandouo presente» que devia oiTcu-ocèr á velhasenhora. Depois, de meditar bem , resolviemfim procurar um, quarto traseiro de car-neiro , q:ie se achava peudiirado no quartodo despenseiro , e'para o suardar ijem ,fiz um buraco na minha algibeira : Tvo.

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lume ficou bem guardado porque havia da-do um iió na extremidade da algibeira,ficando para a parte de fora a extremida-

ijde do quarto'db carneiro: depois de bem,ãcondicionado me transportei para o Porto.

Desgraçadamente uma multidão d'essescães errantes , e esfaimados , que, pululamem todas as cidades portuguêzas se. ha-ida«r*r,eunido em conselho no mesmo lu-gar , onde eu desembarcava. Um d'èntreelles, sentindo a qualidade da bagagem, fezsignal ao. resto da multidão , e\°um' ins-tante eu os vi todos juntos a mim , lat-tindo e grunhindo ém derredor de minhasalgibeiras. Então tive de amontoar muitaspedras para que elles de mim se affugeii-tassem , meio unico de desfazer-se qual-quer d'um cão portuguez ; porém não meanimei a deixar a posição perpendicular,pois sabia , que abaixando-me não podiaevitar os boles d'esses animaes. Resignei.me pois a soffrer tudo de bom grado ,fazendo algumas vezes frente, quando meuscompanheiros de viagem se tornavam de-masiado importunps.

Carplina e sua tia estavam na janella,esperando provavelmente a minha chega-da, e entregues ás tristes recordações d'umjantar composto unicamente de bacalhau :e certo, ellas contavam, graças a meusdesvelados cuidados, ter Uma muito melhorceia ; porém quando me viram voltar ocanto da rua escoltado de duas, ou trezdusias de cães, que faziam um ruído in-fernal, nãô ppderara suster o riso. Ao mes.mo tempo uma multidão de petit-maitrespassavam" pela frente das janellas de Ca-rolina, paVoneando.se, e esperando cadaum receber signaes de affeiçáo dã beldade :'nada mais me faltava ver para ficar aca-brunhado. Com efleito. quando ouviram as !

gargalhadas, .procuraram adevinhar a causad isso ,*e -eu pensei, que elles se divertiam4 minha çusta,'ppf'tne verem á frente d'umcorpo musical,>0mo o que me seguiae marchando corn ã mesma gravidade comflue marcha um tambor-mór na «irente dpseu regimento.; ¦¦-,'¦'.

ü-ffi Áue íornava rainha posição ainda maisdifficil: era porquê me não ánimavá-;entrarna ^a de Carolmá, temendo compromet-tel-áre mortifiquei-me< bastantemehíe porter de passar por sua porta, é ter de aindaandar muito, afim d'escapar áímpertinen-cia.de presumidps , que me seguiam corriar zombador; e áminha cruel escolta. Oh'que prazer teria eu áo tirar a espada, paradesafiar" toda a multidão, não á dos cães- *mas a dos táfúes ! Si em Vez de quarto do:carneiro tivesse-eu outra arma, com queprazer não desancaria a algum d'esses redj-culos personagens !- Mas para salvar mi-oha honra, éíPteria compromettido a-jdaesquadra-ingleza, e era preciso supportartudo ; càes, petit-maitrçs, o quarto de car-neiro, o sol, meu máu humor mesmo, porhonra de S. M. B. e do serviço. Por ul-timo, atravessando duas ou trez poquénasruas, cheguei á porta . da 'casa

da minhaamada. Ella, e sua velha tia esperavam-me á janella; porém amestradas pela ex-penencia, e temeifdo sem duvida perderuma boa ceia , nâo mais se poseram a rir,como antes o haviam feito. Entretanto, ob-servei o riso constrangido com que á portafui recebido , e o ar mofador da velha tiaao retirar-se da janellt.

Os cães, os amaldiçoados cães sempreme seguiam, e com grande trabalhe pudeimpedir, que esta multidão insolente meacompanhasse até a presença da minhaamada. Ainda mesmo depois deter entrado,elles estavam na porta latindo, grunhindo',excitando as conjecturas, e a tagarekcedos visinhos, que âpinhoados faziam mais,ou menos algazarra que os quadrúpedes.Emfim , depois de tantos infortúnios pude.entrar. A seiihorita me apresentou porto-das as formas á sua tia.— Concedei-me, disse ella, que vpsapresente umcavalleirogalante, osnr.Gal-lina,.; perdoae, snr. marinheiro , concedei,

me a honra de. vos apresentar á minha mui-to respeitável tia, donaFrancisca Azanereu.Ao vel-a, respeitosamente a saudei, mas

ella não me respondeu cousa alguma: vientão que a minha amada se oeçupava maisdo presente que ella esperava do que demim. Assim vae o mundo , e os que fazema corte ás snras. devem esperar Triuitasmprtifieações. A velha sara. não se cança.va de comprimentar.me; sua sobrinha lhehavia feito ve* o quanto era eu amável, e .perfeito.. Observei que durante os bellos "discursos de sua tia, Carolina nào cessava •de fitar seus curiosos olhos sobre a mkhaalgibeira, procurando saber que objectopodia toEaajjs&ie tão *

pesado , e desfigurard'este iç||r uih elegante corpo. Depois deter excitado sua impaciência por algumtempo, tesolvi dar o golpe, para o quettmei um canivete, e cortando minha ai-

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gibeira, deixei cahir magnificamente áseuspés minha ofTerenda.

Despedi-me então com grandeprazer dassnras., por que imaginava, que nas cir-cumstancias actuaes , um pedaço de quartode carneiro lhes seria infinitamente maisagradável, que todas as minhas protesta-cões de serviços c devoção. Avénturei^al-guns cumprimentos; mas via ao mesmotempo os olhos de Carolina fitos na-ípernado carneiro, cm quanto que sua tia, inatten-ta ás minhas cortezias, estava absorvidaem discussões internas , afim de saber siYaria cozinhar o carneiro na estufa , si oassaria, ou si o ferveria. Levantei entãoo cerco, e tive a honra de ser-conduzido áminha embarcação, não pelas duas snras.,mas pelo mesmo < séquito que me haviaacompanhado na minha amorosa expedição.

Ao amanhecer do dia seguinte, recebiuma ordem do capiiáo , que me chamava ábordo. Ali achei tudo prep^ráuo para a au-.diencia' d'um conselho de guerra. Persua-dindo-me de que se tratava de julgar certomarinheiro , que tinha cometudo um crimed'insubordinação bastante grave , me dirigia tomar logar entre os outros ofliciaes,quando fui impedido pelo capitão que medisse :

Tenentó, vós sois aceusado por teresintroduzido viveres na cidade sitiada , nãoobstante a convenção feita com Santa Mar-tha. Surprehendido, ia pedir explicaçõesou talvez negar o que se me imputava, po-rem não tive mais tempo.

* — Hontem, prdtseguiu o capitão, umquarto de carfíeiro foi tirado da casa dodespenseiro, sendo vós quem tal acto pra-tiçou, como nobo disse a sentinella. Demais, o commandante Johnson , convidadopara ir cear á casa da senhorita Carolina ,foi mui bem servido de carne de carneira,qye essa senhora, e sua-tia se gabavamde ter recebido , graças ás suas intelligen-cias com a esquadra de S. M. B. Acres,ce além d'isso , que sois indigitado comotendo ido a essa casa , acompanhado de umasingular equipagem ! Que respoudeis a isco 1

—- Nada, disse eu confusamepte.Ide pois para a prisão , em quanto o

conselho passa a deliberar. ¦*A sentença foi logo publicada: decidiu,

se que eu seria enviado para Inglaterra, eficaria , até nova ordem., riscado do qua-dro effectivo. O peor do negocio , foi queo general Santa Martha , que nos vigiava ,ficou ao alcance do oceorrido. Dirigiu aocenselho , e ao commandante da esquadra ,uma queixa em forma.

Es\e suecesso deu causa a uma longacorrespondência diplomática , que' se devever nos archivos do foreign-ofrice , (secre-taria deextrángeiros); devo lambem julgar-me feliz por me haver retirado , sem tersido julgado por tribunal marcial. Presen-temente acho-me a meio soldo ; jurei éter-no ódio ás mulheres , e vos ficarei suma-mente agradecido, si me mostrardes um

•paiz onde não existam mulheres tão indis-cretas como Carolina , ingratas como ella fque não esperou pela minha parida , paraentão me esquecer nos braços d'outro. •

GABINETE DE LEITURA.

O que pode a miséria.,

N'uma d'aquellas noites em que todos os jelementos parecem querer desprender-secontra os infelizes, cujo maior crime é não |terem asylo, nem anilgos ; n'uma d'aquellas jlongas noites d'inverno em que a neve ca-1hia e cobria as ruas de Londres d'üm len-;çol gelado , nào se encoutrava , com um .tempo tão medonho , sinão alguns guardasnocturnos embuçados nos seus capotes,perseguindo os desgraçados para obrigal-osa trocar a sua penosa liberdade pelas do-curas d'uma prisão.

N'esSa noite pois, em qué ninguém po-ria fora da porta nem o cáo do seu inimigo,!atravessava uni homem mal vestido , a pas-sos lentos, as ruas da cidade sem lhe im-portar o tempo , nem á opinião que delle sepoderia formar, como si nem um ente de-vesscinteressar.se pela sua sorte. E com.tudo não acontecia assiíh ; a sua misériaera partilhada , elle tinha mulher e uma fi-lha, uma muHier rapariga e bella , outr'oráfeliz e de vigorosa saúde , a quem agora amiséria, a horrorosa miséria tinha impri-mído nas faces as rugas da velhice: suafilmTchorava pelo grosseiro alimento de quesua mãe se tinha privado havia quatro diaspara lhe dar. ... Ah! quantas desgraçasha oceultas sobre as quaes a charidade der-rama lagrimas , em tanto que algumas go-,tas do seu balsamo poderiam cicatrizar mui-'tas chagas ignoradas ! mas não , a hypo-crisia quer a publicidade das ruas e dossalões, e dá com a ponta do dedo a suaofTerenda, por não dizer a sua contribuição,calcando aos pés esta máxima: a esmoladeve sahir do coração e não passar doslábios.

A desgraça havia-se fortemente apodera-do do infeliz Arnold , elle tinha tido bellosdias e immensos amigos ; porem agora és-tava desgraçado , e a sociedade não lhe im.portava a causa dp sua indigencia ; elle es.tavá pobre , e a pobreza é uma offença quese condemna sem ser julgada : por muitotempo Arnold tinha luttado contra a hydradã calamidade ; porem tinha sido vencido,estava pobre, e pobre sem esperança demelhorar a sua sorte. "

Chegou á sua casa (eram qmas águasfurtadas) cujas paredes vertiam humidade ,e mobjlhadas com um enxergão, algumascadeiras, e uma mesa velha de mogn.unico resto do seu explendor passado. Asua companheira tinha nos braços sua fi-lhinha, por nome Maria, e recebeu-o comum d'esses tristes sorrisos que eqüivalem auma aguda punhalada.

Estou sem emprego, diz Arnold, che-gando-se para uma cadeira ; e minha mulher e minha filha morrendo á fome !...minha Mariquinhas, meu anjinho! excla.mou este afflicto pae, e a innocente e infe-liz creança sorriu-se para elle.

Querida filha, acrescentou Arnold, quemterá cuidado de ti, quando fores orphah ?Quem te tratará quando estiveres doente ?

LU U^tlUl

B(Étepagar...ild^Pendo-seTresolvido finalmente a

Quem entenderá a tua linguagem ? Quemfará as vezes do teu pae?... Oh ! Deus !Deus ! a vida do infeliz é uma agonia per-petua ; porém por mais horrenda que seja ,conservae.m'a para amparo d'este anji-nho ! . ...

Anima-te , meu querido Arnold , lhe dizsua mulher, amanhãa serás mais feliz doquo hoje; a tua actividade e honradez sãoconhecidas , portanto nao poderás estarmuito Jempo sem emprego : espera pois, aProvidencia velará sobre nós.

A Providencia ! exclamou Arnold , comironia, ella vela sobre o rico : a Providen-cia! Ella é surda á voz do pobre.. . N'es-te momento já nào havia lagrimas nos seusolhos afogueadós. Entregou um shilling asua mulher. *£

E' o ultimo, lhe diz elle, compra alimene.tos para ti,, e tua filha , em quanto a mim,não tenho fome ... já coWi. .. depois ,.semdar mais palavra, deita-se no seu enxergão.

Assim se passaram quatro dias, e cad#hora tornava - mais deplorável a posiçãod'esta infeliz familia. O frio augmentavacomo a fome , e esta pobre mãe, para aque-cer sua filha , não se tirava da cama, epor cumulo de infortúnio , o padeiro tinharecusado -continuar a dar-lhe páo, que jálhe nào

Arnoldsahir, tornou a entrar ; sua filha dormia,e sua mulher , com as máos p*bstas , estavaem oração. Que terrível quadro para estepae! . . .

Já não posso, diz elle , suffocar a vozda.natureza , já me não é possivel por maistempo procurar'a agonia de<*minha mulhere de minha filha, e tão certo como haverum Deus que domina tudo, hão de ter pão.

No mesmo instante sahe ; a- rua estavadeserta, a noite muiladRançada , e comum tempo tão tenebroso^-pareci^ que áexcepção d'elle, nem um vivente estariafora de casa.

A final passa um indivíduo pela esquinaà'0tm rua visinha ; o coração de Arnoldpalpitava com violência; iá retirar-se ; masjulgando ouvir os gritos de sua filha , apro-xima-se do sugeito com timidez, e suppli-ca-lhe que lhe dê uma esmola. Vá-se d'a-qui,-mandrião, diz o venturesó Fariseu, nãotem vergonha de se deitar a essa vida ? vá-se com o diabo. . .' trabalhe; e dito istft ,afastou-se a passos largos..

Arnold estava desesperado: Trabalha ,diz elle, eie#a phrase trivial tíéque se servea avareza ! Trabalha ! quando apenas.*, te-nho força para" me sustei-1, quando ha seisdias que nada tenho comido ! Trabalha !!!Talvez diga a sociedade que este homem éestimavel, é humano ? Ah ! sociedade ! so-ciedade !! ! A outro que appareça já. nãolhe vou pedir . .. preciso pão ... pão paraminha filha ; e preciso delle já.. .

Poucos minutos depois aproxima-se ummancebo;—Arnold agarradhe pela' golada casaca : a sua bolsa, lhe diz elle, minhafilhalnão tem que comer ! — Tendes máuofficio, lhe responde o sujeito surprehendi-do de semelhante attaque; porém vou sa-tisfazer-vüs, aqui está minha bolsa. — Quç

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contem ella? perguntou Arnold.—.Umasmoedas d'oiro e alguma prata. — ArrUbldabriu-a, tirou-lhe dez shillings , e restituiu-lh'a. Não quero mais , diz elle , agora játenho pão para minha filha. — Ide-vos empaz , e perdoae-me!...

Admirado o indivíduo de uma tal conduc-ta, seguiu Arnold. A poucos passos vê-obater á porta d'um padeiro e sahir carregardo.de pão : ali sabe que Arnold se via re-duzido á maior miséria , 9§que havia mui-tos dias, que elle, sua mulher e sua filhaestavam privados de todo o alimento. Sen-sibilisado pela narração do padeiro, dá-lheum guinéo , para que forneça o pão a estainfeliz familia, e promette voltar. Entran.do em casa, pôe Arnold o'pão sobre amesa,"te diz: Toma, minha querida mu-Iher, eis aqui pão para uma semana, jáarranjei tudo, a nossa menina não morreráde fome , e tu mesma não jejuarás : quantoa mim acho-me cariçado : boa noite ; e dei-tou-se opprimido de remorsos. Por muitotempo procurou conciliar o somno, que sólhe veio escoltado de muita febre.

Raiou finalmente o dia, e Arnold jnãofoi como era de costume , procurar empre-go ; julgava que todos qs homens descobri-riam n'elle a expressão do crime. Paraacalmar a sua agitação , pôz-se a uma ja-nella que deitava para a rua, e logo repa-rou, em dous indivíduos , que pareciam ob-servar a casa com attenção ; n'üm julgoureconhecer o sujeito da véspera , tinha a

i mesma estatura, as mesmas feições , omesmo fato ; finalmente não havia mais queduvidar, era elle ! Arnold ficou assombradocomo de*»um raio , fugiu-lhe a luz dos.olhos, tornou-se pallido como um mori-bundo, e retirou-se , n'uma convulsão, pa-ra o canto mais recôndito do seu quarto ;depois aproxircando.se de sua mulher e suafilha, as chega convulsamente ao seu co-ração.

Ouve passos pela escada , e percebendoque era gente que subia, foge para um quar-to imniodiato , e feixa a porta. #

Os dous estranhos entraram n'estc mo-mento ;' Snra., diz o mais moço, temo a im-portunidade'da minha visita, porém, attentoo seu motivo t espero pe desculpeis: vósestaes em desgraça, permitti-me que vos of-fereça o meu prestimo , c. dizendo isto ,

• poz sobre a mesa uma bolsa effeia de ouro.A mulher de Arnold levantou os olhos parao generoso visitador ,

"cujo olhar maviosoparecia implorar o perdão do seu beneficio,e chorando de reconhecimento, lhe cahi-ram algumas lagrimas sobre a innocentefilhinha que tinha nos seus braços. Arnold!Arnold ! náo foram baldadas as minhas ora-ções! Vem cá , vem dgpressa , eu bem te li-nha dito que a Providencia velaria sobre nós!

Porem Arnold nada responde... Sua mu-lher corre ao gabinete, e não acha nin-guem....

No mesmo momento ouve-se um estron-do na rua, e os gritos da multidão que ro-deava o corpo de um homem , que se haviaprecipitado da janella a baixo n'um acces-so de desesperação.

Era o corpo de Arnold.

GABINETE VE LEITURA.

O ULTIMO HYMJYO DE SAMTEUIL.TERCEIRA* PARTE.

(Vid. o n. 19.)'

Quando o bom padre sahiu do somno,ou da embriaguez, ou talvez d'uma pe-quena dose d'opio que por mais de 24 horaso havia adormecido, achava.se com a maiorsurpreza estendido em uma cama no meiode um quarto, que não conhecia, e ondeuma fraca- luz penetrava ao travez dasfendas das janellas interiores. Uma portaestava diante d'elle, levantou-se e procu-rou abril-a, achou-a feixada, elle yse poza abalal-a gritando com todas as forças.Um criado appareceu...—.Que vejo! bra-dou Santeuil com espanto , reconhecendo alibre do duque de Bourbon. Não estou naabbadia ? — Nâo snr.,' vós e3taes no pala-cio do príncipe. — E por que meu Deus ?

Como, snr. , respondeu o criado queestava muito bem ensaiado, não vos lem-braes que no momento d&entrar no cochetostes attacado de áÊòao mcommodo , quenos obrigou a transportar-vos para aqui ?O príncipe ficou muito inquieto ; felizmen-te adormecestes e o medico de S. A. de-clarou que seria sufficiente algum repousopara vos restabelecer. — Ah! que sou uminfame! disse em voz baixa o padre; talvezbebesse muito, eu que tinha promettido., .

Depois reflectiu um pouco, e disse : —Mas parece-me què por muito tempo ouvidistiiictámente a bulha do rodar do cochesobre as lages e ás vezes o estalo do.chjcote. — Foi algum sonho. — Pôde bemsèfr : dormi muito tempo ?'— Nào, quandomuito duas ou trez horas.

Bem , voltarei depressa á abbadia : po-bre' Pedro! Eslou certo que me estás es-perando , e que pensas que já conclui teuhymno. Oh ! por pouco que seja inspiradoterei tempo de sobra. Vamos. Fallandoassim Santeuil se dirigiu para a pqrta ,e tocava já o lumiar quando o criado se pòzdiante d'elle para o reter. M. de Brisacum dos escudeiroip do duque appareceun'esse instante. -— Para onde correis assimM. Santeuil? bradoü-lhe o jovem fidalgo.Eu venho informar-me de vossa saúde daparte de S. A. Náo vos deixaremos partirassim, depois de vos termos visto tão en-fermo. — Eu enfermo ! Ha mqita urbani-dade de vossa parte M. de Brisac, empre-gando tal expressão. Uma conheço eu quemelhor conviria. Em fim , não é grandepeccado que um padre cultive a vinha doSenhor. E* mesmo üm dever* não é assim ?Mas estou muito afflicto : deixo-vos por is-so: adeus. Julgava que houvesseis acom-panhado o príncipe.

.Brisac não sabendo como impediria queSanteuil sahisse", agarrou-se á estas pala-vras como a um ramo de salvação.

— Ninguém partiu; disse vivamente, o"príncipe ainda está aqui, todos ainda es.tamos. Julgaes que S. A. apartar-se.-hil devós deixando.vos doente em seu palácio,

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não , mil vezes não ; sabei que o príncipedemorou süa viagerm

—- Demorou... por minha causa. .. Ahiquanto me confunde tamanha bondade ; ideannunciar-lhe que já estou bom, que nadative .. . mas o dia vae acabando, deixo-voscom saudade.—Esperae M. Santeuil, julgoq^e seria melhor que visseis o príncipe...— PòíÁem : eu vos sigo. — M. de Brisacnão deu um passo. Elle estava cruelmentecoujiindido. Si Santeuil sah|sse do'quartoém que se achava , em quanto fosse dia,,era impossível que acreditasse ainda'estarno palácio de Bourbon. Muito difficultosaé a arte de enganar ainda mesmo ás pessoasas ma& crédulas. — E' impossível! répli-cou-lhe emfim M. Brisac. O rei acaba dechegar de Versailles, e mandou chamar oduque : assim convém que vos resqjvaes aèsperal-o. — Então vou-me embora, porque prorríetti dar hoje um hymno, e aindanào fiz nein^ primeiro verso. — E' mó istoí.Quem vosVpede de fazer aqui vosso hym-no, em quanto não chega o príncipe ?...acresce que já agora deveis ficar para aceia, S. A. conta com vosco , e obrar deoutro modp < seria faltar á gratidão que lhedeveis. Assim náo haja^ obstáculo , fiqueApollo em vossa companhia. Entretanto es-te quarto vai tornar-se bastante precioso.Estou certo que^ahirá uma obra prima. Euvos saüdo, ó graftde poeta.

Depois de ter dito com volubilidade essaspalavras M. Brisac, aproveitando a espéciede pasmo com que Santeuil o havia es-cutado , sahiu , e feixou a porta. — Estaacção restituiu ao poota o uso de suas fa-culdades. — M. de Brisac, M. de Brisac ,abri-me a porta, clamou , para que é queme feixaes assim? — Começou o dialogoseguinte ao travez da feixadura : — E' paraque ninguém vos venha perturbar. — Poisbem ! Ficarei, mas fazei-me o obzequio demandar chamar meu criado que está naabbadia Já o mandei vir. — E prbmet-teis-me que me náo excitar.eis a beber de-mais na ceia ? D'esta vez não teve resposta,M. de Brisac já estava longe. Eis que dão*10 horas da noite na cathedral de Dijon. Odesfeixo d'esta comedia aproxima-se tristee cruel para, uma comedia , principiada tãoelegantemente na véspera no meio das li.bações e das gargalhadas de um festim! Enem libações, nem gargalhadas deviam fal.tar-lhe ao seu desfeixo.

Em torno' de uma mesa profusamentecoberta de manjares e de flores, „esclare-cida por vellas, sentados estão, como navéspera, alegres convivas, no numero dosquaes ha trez que facilmente reconhecemos,é o duque de Bourbon , M. efe Brisac,e «/padre Santeuil que se acha collocado

, entre ambos. Ainda que a mesma ingenui-dade estivesse sempre pintada em seu sem-blante, era fácil ver como um sentimentodoloroso deduvida talvez , ou de remorso»lhe tinha traçado signaes que aos olhos deum observador -pouco experimentado pode-riam confundir-se com as rugas da velhice.De tempos a tempos lançava em derredor desi vistas espantadas, vendo todos os cria-dos abandonarem-se a uma alegria tal, que

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158 •. seu3 melhores transportes nunca excitaram;volta-se para elle set»visinho M. de Bri-s^c para fazerparte de suas observações.-'- Este é o único que conserva algum sangue

frio, eque está enuestado de lhe respoli-der, por que a embriaguez propagada peloriso, começa a se apoderar de todas as ca?becas * e é de temer que algum indisGr|(onãodéscubra ao pobre padre a buÀde qúeéf.victiroa. E quando Santeuil numífestousiia^surpreza pelo novo aparato da salla, do.festim , o duque não podendo conter o riso:^respondeu : —Sim, é uma sàlla nova quemandei fazer de propósito para vos receber.t Um instante depois, Santeuilvirando-secom inquietação para perguntar a&m la-caio si seu criado tinha jâ chegado . o jo-vem duque gritou incorisideradamente,

GABINETE Dl LEITURA.

frenéticos soltam-se de toda a parte sm tor.no d'elle. O duque*de Bourbon precipita-'se em seus braços, os convivas êrguem.setodos, rodeiam-o-, suffocam.o com eiitlui-sinsticos abraços. Então o bom padre é ac.comtnettido de. vertigem , ma cabeça seperde na embriaguez de seu triumpho ; ellechora , e rise alternadamonte, pede Cliam.pague, canta e diz disparates. Mudou-sea scena ; elle de serio passou a louco, e osoutros que estavam como loucos ficaramsérios. — Confessem-o snrs., os maioraesda França náojulgar-se.hiara felizes si fos.sem meus criados sobre o Parnaso? Quan-to mais quando ouvírdes as duas últimasestrophes Um riso geral se segue a estapresumpçosa exclamação. — Vamos ! dizo jovem duque ainda um copo de Champa-

SvTOiL:,TMb'^'03r,é,íl,2'"CO,U- ffe paia M-'S»"M1-, edle será hoje o¦^!?-I'J?_^, í*eZ Samfas de vinho por Deus da poesia. Santeuil depois de ter esqúe recommendei., que o tratassem optima-mente* por ter a honra de pertencermos.-- E cada qual começou a rir^ldesprega-damepte, admirando o espirito inventor dopríncipe. — Dürauto este tempo Santeuilmal sé anima a beber e coraer. Este ho-mem de um espirito tão vivo, e tão alegretorna-se quasi taciturno, e por isso todos osda mesa lhe repetem á porfia : — Na ver-dade, Aí. Santeuil, nunca-esti vestes tão pes-simo conviva comp esta noite ?

No fim da ceia Brisac*levantou-se e de-pois de ter reclamado silencio. — Rogo-vosmeus snrs., que peçaes a M. de Santeuilque vos recite um hymno que acaba decompor.

—\ Um novo hymno dé Santeuil! quemilagre ! Será verdade o que nos dizeis,Brisac ? — A noticia foi recebida com gri-tes unanimes de alegria. — Sim ! Sim ! brá-dam ps jovens perdidos de alegria, repetire-mos em coro cada strophe. •— Julgaes porventura, snrs., replica o padre poeta i qúese devam misturar os cânticos da Igrejacom bs estribilhos da orgia ? E' além d'issoimpossível,,meu hymno ainda não está ter-minado, faltam-me ainda duas strophes.

•Melhor! meu velho araigo, exclama o du-que, fal-as.heis de improviso, vamos? Esó por isto venha Champagne! Vamos ávossa saude, meu caro. padre, e agora re-citae vosso hymuo. Si é peccado t*tno-osobre mim. — E nós também. — Hymno!Hymno! tale o grito que se ouve em todaa salla. Santeuil não tem já forças para. re-sistir; levantá.se, seus olhos sè animam,sua larga testa resplende, e então com umavoz inspirada começa a recitar versoscheios de pompa, e de harmonia em que

vasiado seu copo d'uma vez, improvisa umanova strophe mais bella ainda que as pre-cedentes, e os bravos recomeçam com maisfervor. Esta vez elle viu que as fumaçasdo vinho começavam a expellir completa.mente de todos os cérebros o sentimentoda poesia , e qqjLJá se não applaudia sinãopor confiança.— Ainff um copo de Cham-pagne para M. Sàn'euil, n'elle ache ellesua ultima strophe. —- De quem falia 1 Nin.guem o sabe. Só os criados viram ao mes-mo tempo circular de mào efn mão etn rodada meza uma boceta d'oiro, aberta , fcheiade tabaco de Hespanha. Quando esta bo-cela que trazia esculpidas as armas da casade Bourbon, chegou a seu snr. estava va-sia, bem que nenhum dos convivas lhe ti-vesse introduzido seus dedos^ e entre oscopos em que resplendiam es mil glóbulostransparentes do vinho, d'ahi distinguia.seum mais deslustrado que os outros, e compcheio d'um pó amarello: era o do padreSanteuil.

Este já levava o copo a seus lábios nomeio da.s risadas de toda a assembléa, quan-do uma das portas de S. M. abriu-se e deupassagem a inesperado hospede. Era Pé-dro, com ps cabelios desgrenhados, inflam-mados os olhos e o rosto , banhado {Tumsuor frio, veio elle collocar-se immovelcomo um espectro dia£e de seu amo : tre-miam-lhe os lábios , e não foi sem difficul.dade que pôde com pasmo geral articularesta? palavras.-r- Meu hymno? Vossa pro-messa... Ali J snr. esqueceste-vos de mim.Eu venho, de Pariz procurar meu hymno ,emendeis?. Meu pae, e meu irmão espe-ram... Santeuil muito surprehendido detão incivil proceder, virou-se para o du-i»nIV y K ' . e narmonia em q«e tao mcivil proceder, virou-se para o du-v? ooucp™an""J

AfumpÇ!,0 daVÍrgeJm- <ÍUe' <M des™>P^ seü criado DepoisA ppuco«fh,dos dos bancos da universida- exclamou com sua habitual ingenuidade: —dè, e ainda encantados das recordações" docoüegio seus ouvintes bebem ávidos estashellas strophes, echos tão puros B maravi-'lhosos da lyra antiga. Aos gritos tumultuo,«sosjpe ainda ha pouco retumbavam nasabobadas da salla , suecede religioso silen-cio,- que tanto pôde a fascinação que pro-duz o gemo do poeta. Santeuil desconfiavade sua velhice, e seu hymno era talvez asua obra prima. — Quando emfim exhaustode forças cahiu sobre sua cadeira, bravos

Mas, meu pobre Pedro, aqui não é logarpróprio na presença d'esses snrs., vae-te,retira.te; o hymno está feito, menos a ul-tima strophe, só/alta escrevel-o. — Pro-meteste-m'o para hontem, respondeu Pedrosoluçaudo* hontem em Pariz, hoje eu vosacho em Dijon ! Apenas tinha ellepronun-ciado estas palavras que a um signal dopríncipe, os lacaios o levaram.-^ Fora! fora d'aqui, este homem está"ebado.--O infeliz , foi assim expulso da

salla, e d'esta maneira privado íe fallar.D«f ois de sua partida ,. Santeuil profunda-mente commovldo per esta scena de vio.tencia disse ac duque : — Espero snr., quevos digneis perdoar a este homem ; o vinhoperturbou-lhe a razão. Vós o vedes ;. . elíeme julga era Dijon.-r e.. . „ã0 estaremosem Pariz ? Ah ! si o nào estamos ; paraque zombar d'um pobrevelho, que vos temsempre amado e respeitado , e a quem vos-sa familia líó^ja .com alguma amizade.Fallando assim as lagrihjaVcorrianj.Jhe dosolhos. O joven duque , cuja embriaguez co-meçava a dissipar-se pela influencia d'estascena," estende-lhe a mão, sem dar pala-vra, e dppois inçlitiando-se para- um dos.cortezãos. — Parece-me (disse) que é tem--pb dé pôr termo a esta comedia. —* Entre--tanto ^ ninguém, notou, qne Santeuil tinhatom." !o o seu copo, e que depois de o terlevantado acima da cabeça gritando. " Eubebo pela últiiiia vez á vossa saude, princi-pe "tinha rapidamente o esgotado. — Ape-nas o desgraçado esgotou a fatal bebida,deu um grito horrível, (que expelira o risode todos os- lábios ,) e cahiu em atrozes,convulsões. A este aspecto todos os convi-vas levantaram-se pa maior perturbação , ese poseram etn roda da victima. O princi.pe percorria a salla rasgando as vestes obatendo com a cabeça pelas paredes ; en-tretanto que os criados corriam de todos oslados em procura de raediccs. Cheguu em-fim ura que fnandpu que se deitasse ira-mediatamente o enfermo para se lhe minis-,trar os soecorros uecessarios» cujo resultadoannunciou serem muito duvidosos. — N'es..se instante Santeuil teve a força para gritar,apezar de suas intoleráveis dores. — Aquinão ! aqui não ! quero morrer na abbadia.A' estas palavras o duque não pôde susterpor mais tempo o seu pezar,, elle chora ,e lançando-se aos joel hos do moribundo. —Ah! lhe diz; meu velho mestre, amaldi-çoai.me, eu vos enganei, vós estaes emDijon..

Santeuil levantou os ollros ao ceo , dandoüm profundo suspiro, depois feixou-os semarticular uma palavra. Assim o conduziram,ao quarto'em que compozera seu ultimohymno. ¦

A 10 de agosto de 1697 um co.che comas' armas da casa -de Bourbon chegou ánoite ao pateo gótico da abbadia de S. Vic- . 'tor. Pedro desceu primeiro, e passou si.lencioso p lumiar áo mosteiro. Elle se en-controu então face a face com o vigário de'Notre Dame, quo tendo-o reconhecido odeteve e lhe disse: — Ghegaes de Dijon ,trar-nos-heis o hymno que nos prometteuM. Santeuil? .

— Nào, respondeu tristemente o criado;mas trago M. Santeuil.

,Aomesrao tempo quatro conduetores che?garam ao pórtico trazendo uma urna emqué estavam os restos do desgraçado frade,que, segundo.suas ultimas intenções, eramconduzidos a^abbadia. Toda a coramunida-'de estava> então celebrando trindades. Osconduetores entraram no mosteiro, e de.pois de o ter atravessado depozeram-o 6porta da Igreja. O orgam soava então , e

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as vozes cios meninos' do coro entoavam co-:mo,os_anjos no:ceo estes doces versos dohymnõ da tarde- ' '

Site *tiii.siiprerriam cito ¦ ' ¦'•;'.•'.'," Fèstiríat ,ad metam gradu.

Oito dias antes Santeuil tinha parado«'este mesmo logar onde jazia agora" seucadáver para escutar estas mesmas pala-vraí. Haviam sido pressentimentos!! Seusdespejos mortaes foram..sepultados no mos-teiro daabbadia, não longe de /Guilhermede Champeaux. Pódia-se ainda ver seu tu-mulo antes da revolução. ; .-?*-

O pae de Pedro morreu de dôr sabendoque Sauteuil tinha partido para Dijon semcumprir sua promessa.. Seu joven irmão,

¦ forçado a reunir-se immediatamente a seuregimento na Hollanda , ahi morreu na pri-mei ra'escaramuça. -

Assi#o divertimento do duque de Bour-bon custou a vida de trez pessoas. .*#,

ria f a.] «ro campo.

(Víd. .19.).

4#^

—- Então quárido me dará vrn.ò/esto|do artigo que mandou para o Gabinete ,;*£m que descrevia o seu jantar na casa?do campo de seu amigo Florindo?"spTal- foi a pergunta que me dirigiu o'editor d'aquelle -jornal ¦, e eu remexendo^na fmmensi^de de papeis, jornaes,, li-vros, etc ,. que tenho em çirria da rnézae em roda de mim , puxei por uma. com*-prida tira escriptá de ambos os lados, e:lh'a dei. ' ' .'.-¦;. —- Tende aibondade de lêr. ~\

— Sabeis que tínhamos ficado, no pre^cedente artigo , sentados todos á meza ,-e que o snr. Bento com muito sangue frioatara seu guardanapo a uma dás 'casas docollete. -' . i

A' vista do jantar, notei:nos olhos deBento uma expressão que ainda mio tinhaobservado Lpuxou pela caixa e tomou umagrande pitada, lançando tão maviosos olhospara uma bella empada «que; lhe ficavadefronte , comove lhe qjiizessejierguntar

• como ia o estado de suá saudV?Principiou o jantar,-Bento comia como

dous officiaes de justiça em diligencia,e acompanhava Cada üm dos pratos deque comia com dous ou trez copos de vi-nho, sem duvida para confortar-o estadoda saúde de seu '-'estômago.- EntretantoEmilia, continuava ê*n seu propósito, quejrendo-me fazer fallar: metia-níe á hulhasobre minha taciturrüdade, e só mirihápà-chôtra, ou preguiça de fallar poderia re-sistir á conversação cândida é Cheia desal a que ella se abandonava,, querendo^me fazer confidente de seus sentimentos,corri* o intuito por Certo de que lhe eupagasse ria mesma'moeda.

Sem duvraa alguma coisa vos afflige,me disse ella.

Nãó, senhora.

GABINETE DE LEITURA.

A*ausencia d'algum objecto amado..,:Pôde ser.O amor....

1Õ!>

— Quereis tabaco?perguntou-me muito Bento passeando, tomando tabaco', e sus

tas e eu e. Florindo jogamos .-o segarté,porque o marido de*Emilia —-'-sW_..:_acompanhar >no voltarete.

nos nao quizAffligia-no,s ver

a propósito o meuvisinho Bento¦'—Não, sgr, Pêlo que vejo gostaes iriui-to de cheirar, ¦ ;

E' verdade , e tanto que quando mi-nha mulher me quer castigar, prohibeimeo uso d'elle-por certo espaço de tempo,e passe vm. híuito bem.

Contejite por poder evitar a conversa-,"ção de Emilia, perguntei a Bento si erabázkdo. -

Ha trinta e cinco annos.E porque não vei» vossa mulher.

-b, — Porque está hoje muito occupada,Tfazendo chouriços.—"Bento continuou a-comer; vi que me era impossível conver-'c&r com' elle. por mais tempo, e Emilia,

a quem nada escapava, voltou-se de novopara-roeu lado.-. -- Não gostaes do estado de cazado?ij.—- Aítida não o experimentei para po-

der; responder-vos.- -h- .Náo tendes intenção de cazar-vos ?

—: Talvez as circumstancias.... ^ ;•r- Sem duvida já tendes escolhido....¦*-- Pode ser.E assim continuou aconyersaçãó , sem

..que-*eu- me explicasse categoricamente.Reparei que Emilia se ia zangando, e?por fim ouvi estas palavras que ella di-rigia, em - voz baixa a seus cuidados : --Este moço é uma besta. --¦¦»¦

Agradeci interiomiente a fineza, e con-tinuei a entréter-me com o meu amigo

í]|éiito„, que comia , bebiae tomava pi-tadas. •

- Florindo não p homem de ceremoriias,;.irias gosta de demorar-se á meza, porque;lhe dizia seu páè que era o logar onde:a gente não envelhecia. Eram mais de!seis. horas quando ,;:irivestimos contra asobremeza, e também o snr. Bento queparecia não ter ainda jantado. Circuloud CKatíipagne, e Emilia tornou-se alegrecomo d'antes , e como sabia que nada mefazia: fallar, dirigiu-se também para JBento;que -a todos: os doces perguntou corno iao estado'de sua saúde. *-

De repente toldou-se o ar, as nuvens seamontoaram, e cahiu uma trovoada es-pantosa. Betato atemorisou-se tanto comum trovão ,qué, julgando ter na mão umapitada?? levou ao nariz o garfo com uni"bello sonho. -

Ai! e a minha Rita mus tem tantomedo détrovoádas ! exclamou Bento comtom -Iastímoso*mas preferindo .acabar dejantar a ir consolar siia Rita , continuoucomo d'antes.1 Emilia perdeu as cores, nãoquiz-mais :cómer,e! ficou calada.

Era «oite quando: nos levantamos da;meza, cahia chuva - a: potes, e nós nãolquizemos deixar que Bento sahisse, ate-morisando-ó comralgunmapópléxia que po-^dia ter; Florindo ôífereceu*rios camas, edeterminamos passar ali a noite , nósosda cidade , porque Bento determinava irconsolar sua mulher logo que passasse5 achuva. Para passarmos a noite vieram car-

pirándo; convidamol-ó para que viesseapostar contra um dé nós^ e eu meoffereci para fazer-lhe. frente. Aceitou,sem saber- o .que fazia ; apostou - dousvinténs ,te nos disse, que não 'costumava

jogar mais forte. Não tive, remédio sinãpconcordar. Eu ganhava ; florindo éstayamuito infeliz , e Bento o acompanhava nainfelicidade.- ,,' -

De repente abre-se a porta. da.üalla, -enós vimos entrar uma mulher magra, ak%roxa de. cólera, vestida extravaganteiwejhte,com tamancos nos pés. e uni grandeiguar^da-chuva de paninho encarnado. ( Bento-estava .-com as costas para a porta y e-pre-parava-se para tomar uma bôá pitada.r,quando se voltou para jrer quem entrava.

"Cahiu-lbe .ajCaixa, -qtíasi atirou ¦ coai^umamanga de wdro rio chão , metteu o lençode tabaco náalgibeira do colete, e^artedo baralho *de cartas na da cazaca, de-pois foi-se chegando como simples para atal mulher, e-disserlhe como uma creança,que não soube lição , a seu mestre zan»gad0: Á- ¦'"Então como -vaé^ estado de vossa....

Agora, agora, brejeiro, ,é que quersaber do estado de minha sáude. Ouviua tfbvoada eliàó "me foi fazer companhia...

—^ Cahiu a chuva, estes; snrs. me acon^selharám qúe náo- sahisse:-.porque me po-dia dar algum attaque de perpZeíia/por is.sofiquei, e passe vm. :'~ u"™ ^muito ibetn.

«-T- São desculpas que não grudam \ estádecidido , snr. Bento , vm. por esta faltanão tomará tabaco oito dias. ,

Bento não teve anilho de levantarmosolhos do chão, nem ao menos pôde ar-ticiilar o grito que lhe morreu nos lábios. ¦

¦— Vá para onde estava$ continuou Ri-ta , veja que eu.... Ora , mi.nhas"senliorase senhores , Deus-os guarde.: ¦

Estamos hoje muito infelizes .,-¦ snr.Bento, disse Florindo, é a oitava vez ique perdemos, e todas; ellas a fio.

Gomo! pois você.,: sôtoleirâo , "estájogando l Quem Jhe deu licença para tanto?

-r^Jfão vês,- minha querida Rita, queeu pensava.... mas estes senhores me conV.vidaram.... e eu' aposto só -dous vinten»de cada vez; tenho perdido, mas possoganhar , e passe vm.piuito "bem. -... i#;

—-Nâo quero que jogue mais, vm.steai ¦%posto as manguinhas de fóra , eu o en-sinarei. •

Bento retirou-se .e foi sentar-rse j.a umcanto; eu e Florindo deixamos *o jogo,e eu* chegando-me a Emilia lhe -disse :*— Que tal é o estado d» cazadp, mi-

nha. senhora. ¦, .¦r- Nem todas : se íparecem com esta.—!¦ A escolha¦ 4ktudo, si eju -podesse •

conseguir..,. E iâ-me escapando umn.onie.Quem ?; .» - '

—F;NãOTJogàmos!«nãÍ37, agora,as senho-ras podem «Cantar ou tocar alguma coisa,disse Florindo. .

¦— E' fuisto, disse eu ; e pedi a -Batí-

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>,

íeolia qgjE tios cantasse alguma peça de seugosto. Ella-levantou-se" um pouco desgos-

# tosa , por tão: depressa nos haverem in-tèrróippidq a'conversação. Emfim, iáprín-ctpiar o piano, quando Bento Jevaritou-sede seu logar, e dirigiu-se a sua mulher.,'• /-•-•—' Si'quereis ir para casa.... lhe dis-se. élle. : "» '¦'

;— Tinha, que ver , ainda aÇora ohe-gueiejárae heide retirar : parece-mequetem lidado sempre com burros.;

.— Vós o diseis.—• Não pude deixarde rit-me da resposta maliciosa de Bento.

Emilia cantou divinamente , acompa-nhada no piano por seus cuidados.

Em um dos"intervallos , Emilia pergun-tou a snr.a" Rita si não cantava algumacoisa. '¦'

AJj! disse ella ; em minha mocida-de não havia funcção pára que não fosseconvidada; o meiifc Bento tocava viola, eeu estava. Com que graça. garganteava.<

¦'; . --¦¦ - -..

j-^

,5, Passarinho, que cantaes'No ramo â'essa figueira ,Náo me faças alembrarO amor da Cachoeira.

-' •' — O grito que davas no fim é que erao bonito. Si querj||F; para darmos gosto aestes snrs., vou buscar a viola.

Não , são horas qp nos recolhermos.Assim o.fiseram, Rita/azapdo-nos gran-des mesuras , e Bento desejando que se

não alterasse o estado de nossa saúde.No outro dia retirei-me para casa, não

semI saudades de Emilia, e principalmentedo "Irlr. Bento.

.,,-,, -- O Editor. — Agora vejo, que vm.I enganou-me, eu queria um artigo original,

/ e vm. dá-me uma imitação de Paul deI Koc/c. ,*\ —*'!Pois .então , meu amigo, diga isso

mesmo para me não pilharem com o furtonas. unhas. "" *•<

*Collaboraçào do Gabinete.

W2mmmhiu$m&ç>

*#. Um drama de sangue teve logar em"Tétiton, no condado; deStaffoíd, Uma noiteouviram-se gritos do-»lado da habitação de

. ©Borges Colley, í|atigo guarda da policia:que tem uma.mulher e cinco filhos. Nornesmo momento dous meninos se atirampela janella abaixo, um de 8f outro de

'11 annòs, Ambos estavam em camisa e..-.c,0Jí8-rt09 de sangue, e pareciam estar pos-íámpos da maior consternação. Os viSinhos-correram á pressa, entraram n'essa casa

«com luzes , e recuaram de espantados empresença do mais horroroso espetáculo. No• qilarto de dormir, trez meninos de menosde 7 annos de idade jaziam por terra , ba-nhados em seu sangue, e com a cabeçaquasi inteiramente s<jparada do corpo, esuet niãè que tinha uma grande ferida nopescoço , foi achada de joelhos. Esta mu-lher cuja ferida' nâo era mortal, confessou

•6

GABINETE DE LEITURA.

ser ella quem comettera tão horroroso cri-me; a miséria a tinha compellidó,

Não 'podia,ver as privações e ps soflri-mentos de seus filhos. Esta mulher estáem um estado de alienação mental quasicompleta: ella não cessa de dirigir sup-plicas ao ceo para que tire deste mun-do os dous filhos que seu braço nào póde privar da vida : ->- Ò futuro para ellesé terrível! —Pediu uma biblia e lê frequentemente, Será salva a.sforçã. .de.zello ,bem que no primeiro moníelito tenha despedaçado as ligaduras, O menino de§annos que se evadiu peTá janella tinha umaferida na cabeça, mas não é perigosa. Seuirmão de 11 annos, que fez sua dépoziçáoem presença do corôner tem um dos polegares e uma orelha cortada ; parece que ò1marido d'esta desgraçada a tinha ameaçado,ha algum tempo, de niandal-a prender , porque ha alguns mezes , seu procedimentotinha alguma cõusa de extrauho. As trezvictimas são uma menina e dois meninos.O crime foi cometido -em profunda1 obscuri-dade e quando os meninos principiavam -Mdormif. A deposição do menino, de jgiizeíannqg faz estrepiecer : acordado repentina-mente por sua mãe, sentiu cortada a orelhaesquerda; levou a mão á cabeça , e,ten-do-se.Ihe cortado o polegar, pòí-se a gritar:— Mamãe não me façaes mal!—>Sim,meu filho ! fyi a resposta de sua mãe abra.çatído-o. Elle conseguiu desembaraçar-sede seus braços , e,logo depois ouviu queella cahia atraz d'elleC O crime foi comet-tido com uma faca de*cozinha.

O jury pronunciou contra esta mulheruma sentença que a accusa de homicídiovoluntário.

MODO DE SUPPOTRTAR AS DESGRAÇAS.

Amru , Sultão de. Gazna, tendo ¦ .sidodestroçado e aprisionado n'uma batalha porIsmael Samain, Sultão de Karisma, foiconduzido a um castello , onde O vencedoro mandou guardar com a maior cautella.Amru, que nada havia comido em todoo dia, e que se achava em - extremo en-fraquecido pelas fadigas do combate, ro-gou aos seus guardas que lhe dessem ai-gum alimento ainda que parco fosse , etrazehdo-lhes estes um bocado de carnecrua, foi necessário, para assal-a, servi-rern.se do mesmo fogo que pouco antesse havia accendido pára aquecer o infelizprisioneiro. /

Mas ainda bem esta refeição si nãó tinhaposto ao lume, quando aproximando-se umcão, se lançou sobre ella, e deitou a fu-gir. O Sultão, impellido pela fome, quizao principio perseguil-o para lhe fazer lar-gar a preza, mas logo depois desatou a rir,olhando para as cadeias que. tão seguro oretinham.

Compadecidos os guardas da sua sorte,trouxeram-lhe outro bocado de carne, elhe manifestaram a sua admirçâo pelo ve-rem rir em táo triste situação.

Rio-me da fragilidade das grandezas hu-manas, respondeu ,0 príncipe, pois esta

manhãa quando dilpunha o meu exercitoem ordem de batalha , notei na 'retaguardade immensas bagagens-, trezentos cpmellõs,que, segundo me assegurou o meu mordo,mo, eram apenas suficientes para trans,.;portar a minha uxaria, e agora vejo. quesó basta um pequeno cãó para m'a leyár.

ACHADA -PARA OS PHILARMONICOS.

*.Lê-se na jofnal inglez Doncaster-Chr®.nicle: ,-*.--

Pravine-sep publico de que John Allan,de Malton, no Yorkshire, professor deW.sobio natural-, está prompto a apostar comqualquer cavalheiro iuglez ou de out,ra na-çãô , que se apresente para lutar .copii o.ati.nunciante, cinco guiriéos contra-Sflin., emcoirio nem um é capaz de lhe exceder naexecução de qualquer ária que sequeiraouvir tocar nó mesmo instrumento.'

.*...'<.-JÉr» ."v * » ¦

O BOFETAO PORTABELLA.

Estando certo mancebo a uma mesa aolado de seu predecessôr, este lhe deu umatremenda bofetada dela falta de respeito : —querendo porem o rapaz vingar-se do mes-tre applicou*- logo outra no seu immediató',dizendo-lhe : — Passe para diante.

fi A Vf DA DOS ITIEÜrCOS.Mui curiosas indagações tem provado

que a duração commum da vida humanaé menor para os que exercem a medicina,do que para os que ee apphcajrn as outrasprofissões. Tomando por termo de compa-ração a idade de -70 annos, achou-se queem 100 Theologos 43 pelo menos a alcan-çam,*em 100 lavradores .40: em 10D em-pregados publicoá-35 : em lOO^negociantes33:. em 100 militares 32 : ^e%' 100 advo-gados 29 : em- t)0 artistas 28 : era 100

- - i

professais 27:» em 100 médicos 24.

IMPRENSA INGLEZA.

Ppblica.se em Inglaterra 217 jornaes deprovincia; 112 são*de opinião liberal, 84forys e 21 neutros. Nós primeiros Seis me- **zes do anno timbrarani.se para os jornaesliberaes 4,466,572 folhas ; para os jornaes **toiys 2,319,543, para os neutros 403*745.Assim os • leitores dos jornaes liberaes são'duas vezes mais numerosos do que os dasfolhas torys, e Jia muito poucos, leitoresneutros. * ê »

1837. — Rio de Janeiro. Typ. de J. do N. Silva.