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Revista Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário ANO VI – Nº 34 – SET-OUT 2016 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Portaria CONJUD nº 610-001/2013 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087 Tribunal Regional Federal da 3ª Região – Portaria nº 04, de 31.05.2012 – Registro nº 27 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – Portaria nº 942, de 13.08.2013 – Ofício – 1528443 – GPRES/EMAGIS Tribunal Regional Federal da 5ª Região – Informação nº 001/2013-GAB/DR EDITORIAL SÍNTESE DIRETOR EXECUTIVO: Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA: Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL: Cristiano Basaglia EDITOR: Cristiano Basaglia EDITORIAL IEM – INSTITUTO DE ESTUDOS MARÍTIMOS DIRETORES: André Benevides de Carvalho CONSELHO EDITORIAL Adolpho Bergamini, André Benevides de Carvalho, Benjamin Gallotti Beserra (in memoriam), Demes Britto, Edison de Oliveira Vianna Júnior, Fábio Gustavo Alves de Sá, Luiz Leonardo Goulart, Marcelo David Gonçalves, Murillo de Moraes Rego Corrêa Barbosa, Osvaldo Agripino de Castro Júnior, Rodrigo Fernandes More, Vicente Marotta Rangel, Welber de Oliveira Barral, Wilen Manteli COMITÊ TÉCNICO Augusto Fauvel de Moraes, Benjamin Caldas Gallotti Beserra, Claudio Ribeiro Huguet, Denis Gamell, Felipe de Assis Serra, Henrique Santos Costa de Souza, Maria Augusta Paim, Mateus Soares de Oliveira COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Augusto Fauvel de Moraes, Denis Gamell, Felippe Alexandre Ramos Breda, José Augusto Dias de Castro, Kelly G. Martarello, Ligia Ferreira de Faria, Lucas Navarro Prado, Mateus Soares de Oliveira, Rafael Pinheiro Lucas Ristow, Ronaldo Manzo, Shin Jae Kim ISSN 2236-5338

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RevistaDireito Aduaneiro,

Marítimo e PortuárioAno VI – nº 34 – Set-out 2016

RepoSItóRIo AutoRIzAdo de JuRISpRudêncIA

Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Portaria CONJUD nº 610-001/2013 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087

Tribunal Regional Federal da 3ª Região – Portaria nº 04, de 31.05.2012 – Registro nº 27 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – Portaria nº 942, de 13.08.2013 – Ofício – 1528443 – GPRES/EMAGIS

Tribunal Regional Federal da 5ª Região – Informação nº 001/2013-GAB/DR

edItoRIAl SÍnteSedIRetoR executIVo: Elton José Donato

GeRente edItoRIAl e de conSultoRIA: Eliane BeltraminicooRdenAdoR edItoRIAl: Cristiano Basaglia

edItoR: Cristiano Basaglia

edItoRIAl IeM – InStItuto de eStudoS MARÍtIMoS

dIRetoReS: André Benevides de Carvalho

conSelho edItoRIAl

Adolpho Bergamini, André Benevides de Carvalho, Benjamin Gallotti Beserra (in memoriam), Demes Britto,

Edison de Oliveira Vianna Júnior, Fábio Gustavo Alves de Sá, Luiz Leonardo Goulart, Marcelo David Gonçalves,

Murillo de Moraes Rego Corrêa Barbosa, Osvaldo Agripino de Castro Júnior, Rodrigo Fernandes More,

Vicente Marotta Rangel, Welber de Oliveira Barral, Wilen Manteli

coMItê técnIco

Augusto Fauvel de Moraes, Benjamin Caldas Gallotti Beserra, Claudio Ribeiro Huguet, Denis Gamell, Felipe de Assis Serra,

Henrique Santos Costa de Souza, Maria Augusta Paim, Mateus Soares de Oliveira

colAboRAdoReS deStA edIçãoAugusto Fauvel de Moraes, Denis Gamell, Felippe Alexandre Ramos Breda,

José Augusto Dias de Castro, Kelly G. Martarello, Ligia Ferreira de Faria, Lucas Navarro Prado, Mateus Soares de Oliveira,

Rafael Pinheiro Lucas Ristow, Ronaldo Manzo, Shin Jae Kim

ISSN 2236-5338

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2011 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE e do IEM – Instituto de Estudos Marítimos.

Publicação bimestral de doutrina, jurisprudência, legislação e outros assuntos aduaneiros, marítimos e portuários.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 2.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected].

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Revista Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário. – Vol. 6, n. 34 (set./out. 2016)- . – São Paulo: IOB, 2011- . v.; 23 cm.

ISSN 2236-5338 Bimestral.

1. Direito aduaneiro. 2. Direito marítimo. 3. Direito portuário. CDU 347.79 CDD 342.29

Bibliotecária responsável: Nádia Tanaka – CRB 10/855

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.sage.com.br

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Carta do Editor

A trigésima quarta edição da Revista Direito Aduaneiro, Marítimo e Por-tuário traz no seu Assunto Especial estudos sobre as “Penalidades Aduaneiras”.

No primeiro artigo do Assunto Especial, os Advogados Rafael Pinheiro Lucas Ristow, Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e em Economia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Pós-Gra-duado em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas, Professor do Curso de Especialização em Direito Tributário do IBDT, Membro Efetivo da Comissão de Direito Tributário e do Contencioso Administrativo Tributário da OAB/SP, Advogado em São Paulo, e Ligia Ferreira de Faria, Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Pós-Graduada em Direito Tribu-tário pela Fundação Getúlio Vargas, abordam em seu artigo o recente “Julga-mento de Paradigma” no CARF e a definição do entendimento sobre denúncia espontânea em multas aduaneiras. A seguir, a “Ilegalidade da Retenção de Mer-cadorias para a Cobrança de Tributos e Penalidades Aduaneiras” é tema abor-dado por Kelly G. Martarello, Advogada, Especialista em Direito Tributário pela Faculdade de Direito de Curitiba (UniCuritiba) e UBA (Universidad de Buenos Aires), Processo Tributário pelo IBET (Instituto Brasileiro de Direito Tributário) e Escola da Magistratura do Paraná, Membro da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB Santa Catarina. Encerrando a doutrina do Assunto Especial, Augusto Fauvel de Moraes, Advogado, Sócio do Escritório Fauvel e Moraes Socieda-de de Advogados, Presidente da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP, Vice-Presidente da Comissão de Direito Marítimo e Portuário da OAB/SP, Es-pecialista em Direito Tributário pela Unisul e Pós-Graduado em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra, e Mateus Soares de Oliveira, tam-bém Advogado, Sócio da MSO Negócios Internacionais, Mestre em Direito In-ternacional pela PUC-Minas, Especialista em Direito e Negócios Internacionais pela UFSC, Membro-Efetivo da Comissão Especial de Direito Aduaneiro pela OAB/SP, buscam em seu texto elucidar algumas questões referentes às sanções e penalidades aduaneiras, de modo conjunto com os princípios constitucionais do Texto de 1988, bem como com a legislação ordinária. Completa o Assunto Especial a tradicional seleção de ementas sobre o tema e Acórdão na Íntegra.

O “Subfaturamento no Direito Aduaneiro” é tema que abre a Parte Geral deste volume, em estudo assinado por Felippe Alexandre Ramos Breda, Advo-gado e Consultor, Pós-Graduado em Processo Civil pela PUC/SP, Pós-Gradua-do em Processo Tributário pela PUC/SP, Professor do Curso de Pós-Graduação (Lato Sensu) em Processo Tributário da PUC/SP/Cogeae (2005-2015), Membro da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP, Docente na Aduaneiras, em que são analisados alguns pontos polêmicos, tais como, a distinção com a sub-valoração, o seu caráter extrafiscal de controle aduaneiro, as hipóteses de ar-bitramento do valor aduaneiro pelo seu reconhecimento e a sua apuração no curso do despacho aduaneiro. Na sequência, o Advogado Ronaldo Manzo, Es-pecialista em Direito Marítimo e Aduaneiro, Pós-Graduado e Mestre em Direito, debruça-se sobre questões pertinentes à demurrage e sua interpretação diante

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do ordenamento jurídico. Encerrando a doutrina geral, o artigo “Compliance e Mecanismos Anticorrupção nos Contratos de Afretamento de Embarcações”, da lavra de Shin Jae Kim, Mestre em Direito Internacional e Comparado pela Vrije Universiteit Brussel, Bélgica, cursou a Academy of American and International Law, organizada pelo Center for American and International Law, EUA, Espe-cialista em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Graduada pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Membro do Conselho Consultivo da Society of Corporate Compliance and Ethics (SCCE), Premiada no ano de 2007 com o International Compliance Professional Award, pela SCCE, Head da área de Compliance e Investigação do Escritório Tozzini Freire Advogados em São Paulo, e José Augusto Dias de Castro, LL.M. em Direito Público pela London School of Economics – LSE, Mes-tre em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP, Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET, Graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Advogado do Escritório Tozzini Freire Advogados em São Paulo, apresentam um ensaio que aborda as iniciativas legislativas e contratuais para combate a práticas corruptas junto a agentes públicos operando em portos, com especial enfoque no setor portuário brasileiro, e, posteriormente, abordam o mecanis-mo anticorrupção recentemente inserido pela Baltic and International Maritime Council (BIMCO) em seu tradicional modelo de contrato de afretamento por tempo e por viagem. A jurisprudência, que compõe a Parte Geral, apresenta o repositório dos Tribunais Regionais Federais sobre os temas atuais julgados por estas Cortes, além do ementário comentado.

Na Seção Especial é apresentado o Parecer nº 0090/2016/CJU-MS/CGU/AGU, da Consultoria Jurídica da União no Estado de Mato Grosso do Sul, re-lativo à consulta sobre propriedade dos espaços físicos em água e terra dos reservatórios das Usinas Hidrelétricas. A seguir, na Seção Especial “Direito em Debate”, Lucas Navarro Prado, Advogado do Navarro Prado Advogados, Gra-duado em Direito pela USP, Pós-Graduado em Finanças pela FIA/USP, Profes-sor do Programa de Pós-Graduação do Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP, e Denis Gamell, Advogado do Navarro Prado Advogados, Graduado em Direito pela UnB, Pós-Graduando do MBA em Finanças e Gestão Econômica e Financeira de Empresas da FGV Brasília, comentam as mudanças na exploração de Portos Organizados impostas pela Resolução Normativa Antaq nº 07/2016.

A íntegra da Resolução Normativa nº 7-Antaq, de 30 de maio de 2016 (Retificada pela Resolução nº 4843-Antaq, de 6 de junho de 2016) pode ainda ser consultada na Seção Resenha Legislativa, que fecha o presente volume.

Aproveite este interessantíssimo conteúdo e tenha uma ótima leitura!

Eliane Beltramini André Benevides de Carvalho

Gerente Editorial e de Consultoria Diretor do IEM

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Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ....................................................................7

Assunto EspecialPenalidades aduaneiras

doutrinas

1. Estreia do “Julgamento de Paradigma” no CARF e a Definição do Entendimento sobre Denúncia Espontânea em Multas AduaneirasRafael Pinheiro Lucas Ristow e Ligia Ferreira de Faria ................................9

2. Ilegalidade da Retenção de Mercadorias para a Cobrança de Tributos e Penalidades AduaneirasKelly G. Martarello ...................................................................................16

3. Infrações e Penalidades AduaneirasAugusto Fauvel de Moraes e Mateus Soares de Oliveira ...........................29

JurisPrudência

1. Acórdão na Íntegra (TRF 1ª R.) .................................................................552. Ementário .................................................................................................58

Parte Geral

doutrinas

1. Subfaturamento no Direito AduaneiroFelippe Alexandre Ramos Breda ...............................................................65

2. Questões Pertinentes à Cobrança de Sobrestadia de ContêinerRonaldo Manzo ........................................................................................80

3. Compliance e Mecanismos Anticorrupção nos Contratos de Afretamento de EmbarcaçõesShin Jae Kim e José Augusto Dias de Castro .............................................92

JurisPrudência Judicial

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Tribunal Regional Federal da 1ª Região ..................................................1042. Tribunal Regional Federal da 2ª Região ..................................................1273. Tribunal Regional Federal da 3ª Região ..................................................1304. Tribunal Regional Federal da 4ª Região ..................................................1375. Tribunal Regional Federal da 5ª Região ..................................................146

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ementário

1. Ementário de Jurisprudência ...................................................................166

Seção EspecialParecer

1. Parecer nº 0090/2016/CJU-MS/CGU/AGU Consultoria Jurídica da União no Estado de Mato Grosso do Sul Advocacia-Geral da União .....................................................................211

direito em debate

1. Resolução Normativa Antaq nº 07/2016 – O Que Mudou na Exploração de Portos Organizados?Lucas Navarro Prado e Denis Gamell .....................................................225

resenha legislativa

1. Resolução Normativa nº 7-Antaq, de 30 de Maio de 2016 (Retificada pela Resolução nº 4843-Antaq, de 6 de Junho de 2016). .........................................................................232

Índice Alfabético e Remissivo .............................................................................249

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Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi- cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

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Assunto Especial – Doutrina

Penalidades Aduaneiras

Estreia do “Julgamento de Paradigma” no CARF e a Definição do Entendimento sobre Denúncia Espontânea em Multas Aduaneiras

RAfAEL PInhEIRO LuCAS RISTOwGraduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e em Economia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Pós-Graduado em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas, Professor do Curso de Especialização em Direito Tributário do IBDT, Mem-bro Efetivo da Comissão de Direito Tributário e do Contencioso Administrativo Tributário da OAB/SP, Advogado em São Paulo.

LIgIA fERREIRA DE fARIAGraduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Pós-Graduada em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas, Advogada em São Paulo.

RESUMO: O novo Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”) prevê, dentre os mecanismos para agilizar os julgamentos administrativos, a ferramenta do julgamento de paradigma, que permite a extensão do julgamento de um caso a casos análogos, desde que o objeto da discussão seja exclusivamente de direito. No dia 26 de abril de 2016, o referido instituto foi utilizado pela primeira vez para julgamento de uma gama de casos envolvendo a possibilidade ou não de aplicação da denúncia espontânea às multas aduaneiras. O presente artigo tem por escopo avaliar o posicionamento do CARF a respeito da matéria e os impactos do recente julgamento sob a sistemática do julgamento de paradigma sobre os demais processos envolvendo essa matéria.

PALAVRAS-CHAVE: CARF; julgamento de paradigma; jurisprudência; uniformização; denúncia espon-tânea; multa aduaneira; aplicabilidade; impactos; precedentes.

Em 2015, foi disponibilizado, no sítio eletrônico do Conselho Adminis-trativo de Recursos Fiscais (“CARF”), o relatório de gestão referente ao exercício de 20141. Referido documento relata as ações desempenhadas no CARF ao longo do ano e também os projetos em andamento. O relatório trazia ainda a informação a respeito do volume de processos julgados em 2014, que soma-ram 23.094, bem como do estoque de processos administrativos pendentes de julgamento, no volume de 116.000, sendo que o crédito tributário referente a

1 Disponível em: <http://idg.carf.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/relatorio-de-gestao/2014-relatorio-de--gestao.pdf/view>. Acesso em: 06 jun. 2016, p. 6.

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10 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

esses processos alcançava R$ 550 bilhões, conforme divulgado no relatório de gestão de 20152.

Tendo em vista a elevada quantidade de processos que aguardavam apre-ciação em todas as instâncias, iniciou-se uma movimentação, ainda em 2015, buscando implementar alterações no modus operandi do CARF. Um exemplo dessas modificações pode ser notado na Portaria CARF nº 11, de 13 de fevereiro de 2015, que previa a perda de mandato aos conselheiros que deixassem de formalizar acórdãos ou retivessem indevidamente os autos.

Para a definição das modificações a serem implementadas, uma minu-ta do novo Regimento Interno do CARF foi submetida a consulta pública em meados de 2015.

Como resultado de todo esse processo, foi publicado, em 9 de junho de 2016, o novo Regimento do CARF (Portaria do Ministério da Fazenda nº 343) prevendo algumas modificações significativas na sistemática de julgamentos, sendo que a maior parte delas visava a imprimir maior agilidade às decisões administrativas. Como exemplo dessas medidas, podemos citar a possibilidade de vinculação dos processos por conexão, decorrência ou reflexo (art. 6º), jul-gamento de paradigma (art. 47, § 1º), e as sessões de julgamento não presencial por videoconferência ou tecnologia similar (art. 53, § 1º).

O relatório de “Evolução do Estoque de Recursos Especiais em Análise de Admissibilidade” disponível no sítio eletrônico do CARF3 evidencia a efetiva redução no estoque de processos no CARF nos últimos doze meses. Na Primeira Seção, houve uma redução de 2.390 recursos especiais pendentes de admis-sibilidade em junho de 2015 para 695 em maio de 2016; na Segunda Seção, os recursos passaram de 4.265 para 1.547 no mesmo período; e, por fim, na Terceira Seção, a redução foi ainda mais expressiva: de 4.858 recursos especiais para 243.

No último dia 26 de abril, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) fez uso, pela primeira vez, do instituto do “julgamento de paradigma”.

Referido instituto permite que, ante a existência de diversos recursos fun-dados na mesma questão de direito, um deles seja eleito como paradigma pelo presidente da Turma.

Para que a decisão proferida no caso paradigmático possa ser aplicada aos processos similares, deve haver a indicação, por ocasião do sorteio e da inclusão em pauta do paradigma, dos processos vinculados.

2 Disponível em: <http://idg.carf.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/relatorio-de-gestao/relatorio-de-gestao--do-exercicio-de-2015-do-carf-versao-final.pdf/view>. Acesso em: 06 jun. 2016, p. 6.

3 Disponível em: <https://idg.carf.fazenda.gov.br/dados-abertos/relatorios-gerenciais/201605-resp.pdf>. Aces-so em: 08 jun. 2016.

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������11

Foi sob essa sistemática que a Terceira Turma da Câmara Supe-rior de Recursos Fiscais apreciou os Processos nºs 10715.004458/2010-15, 11128.007573/2006-48 e 10715.000019/2010-33, que versavam sobre a pos-sibilidade de denúncia espontânea para multas por descumprimento de obri-gações acessórias aduaneiras, matéria já há muito debatida tanto pelo CARF quanto pelo extinto Conselho de Contribuintes.

O Decreto-Lei nº 37, de 1966, dispõe sobre o Imposto de Importação e reorganiza os serviços aduaneiros, trazendo, entre suas disposições, a previsão de diversas multas em virtude do descumprimento de obrigações acessórias no âmbito aduaneiro. Dentre as diversas multas ali previstas, uma em especial vem sendo objeto de intensa discussão pelo CARF: a prevista pelo art. 107, IV, e, do Decreto-Lei nº 37/1966.

O referido dispositivo determina a aplicação de multa para a empresa de transporte internacional que “deixar de prestar informação sobre veículo ou car-ga nele transportada, ou sobre as operações que execute, na forma e no prazo estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal”.

Por sua vez, o art. 22 da Instrução Normativa nº 800/2007 (“IN 800”) atualmente dispõe sobre os prazos mínimos para as referidas empresas presta-rem as informações em questão. Note-se que, para a grande maioria das infor-mações exigidas, os prazos são bastante exíguos, fixados, inclusive, em horas.

Em decorrência da exiguidade do prazo para cumprimento dessas obri-gações acessórias, não é incomum a sua apresentação com atraso, por absoluta inviabilidade de adimplemento dos prazos fixados pela IN 800. Por conta disso, muito se discutiu sobre a possibilidade de ser aplicado o instituto da denúncia espontânea nos casos em que, embora fora do prazo, as declarações fossem prestadas antes do início de qualquer procedimento fiscalizatório.

Em breve síntese, os contribuintes aduziam que, ainda que fosse descum-prido o prazo determinado pela Receita Federal, as declarações apresentadas anteriormente ao procedimento fiscalizatório configurariam uma denúncia es-pontânea da infração e, consequentemente, afastaria a cobrança da multa exigi-da, com fulcro no disposto no art. 138 do Código Tributário Nacional.

A despeito de a matéria discutida já ser de amplo conhecimento, os jul-gamentos em questão são de extrema relevância não apenas por ter sido inau-gurado o mecanismo do julgamento de paradigma, mas sobretudo em razão de o resultado de mérito desses julgamentos representar um posicionamento da Câmara Superior do CARF acerca da impossibilidade de denúncia espontânea para multas por descumprimento de declarações aduaneiras.

Até 2010, todos os julgados do CARF sobre a matéria reconheciam a im-possibilidade de aplicação da denúncia espontânea para as multas aduaneiras

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12 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

amparados muitas vezes na Súmula nº 49 (“A denúncia espontânea – art. 138 do Código Tributário Nacional – não alcança a penalidade decorrente do atraso na entrega de declaração”)4.

Entendia-se, à época, que as obrigações acessórias, por serem autôno-mas, não teriam relação com o fato gerador do tributo e, portanto, não estariam sob o crivo do instituto da denúncia espontânea.

Com o advento da Lei nº 12.350, de 20 de dezembro de 2010, o cenário jurisprudencial alterou-se. Isso porque a referida norma modificou a redação do § 2º do art. 102 do Decreto-Lei nº 37/1966 acrescentando que a denúncia espontânea excluiria não somente a aplicação de penalidades de natureza tri-butária, mas também aquelas de natureza administrativa:

Antiga redação:

§ 2º A denúncia espontânea exclui somente as penalidades de natureza tributária.

Redação dada pela Lei nº 12.350/2010:

§ 2º A denúncia espontânea exclui a aplicação de penalidades de natureza tribu-tária ou administrativa, com exceção das penalidades aplicáveis na hipótese de mercadoria sujeita a pena de perdimento.

Em virtude dessa alteração normativa, parte das Turmas do CARF pas-saram a julgar no sentido de que a denúncia espontânea abarcaria também as obrigações acessórias, ou seja, a prestação de informações fora do prazo, mas, antes de qualquer intimação por parte da Administração Tributária, configuraria denúncia espontânea e, consequentemente, afastaria a eventual cobrança de multa administrativa.

A razão de decidir da maior parte desses julgados é bastante simples, fundando-se no princípio da legalidade e na existência de dispositivo legal, ex-presso e taxativo autorizando a utilização do instituto da denúncia espontânea no caso de informação aduaneira prestada extemporaneamente.

Em outras palavras, essas decisões calcaram-se no fato de o dispositivo legal ter passado expressamente a contemplar o instituto da denúncia espon-tânea para as obrigações administrativas e, em alguns desses precedentes, fo-ram avaliados, de forma detalhada, os meandros do processo de desembaraço aduaneiro e o momento específico desse ritual, que seria o divisor de águas para o reconhecimento da espontaneidade do contribuinte.

Não obstante isso, algumas Turmas do CARF mantiveram o entendimento ante-rior de ser incabível o instituto da denúncia espontânea, mesmo após o advento da já mencionada Lei nº 12.350/2010. Segundo tal corrente, as infrações caracte-rizadas pelo fazer ou não fazer não são compatíveis com a denúncia espontânea,

4 Esse foi o racional adotado, por exemplo, no Acórdão CSRF/03-05.218, de 12.02.2007.

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uma vez que, se for aceito o cumprimento da obrigação a qualquer momento, esvaziar-se-ia o dever instrumental.

Vejamos abaixo tabela indicando o posicionamento a respeito do tema pelas Turmas que compunham a 3ª Seção do CARF, responsável pelo julgamen-to de infrações relacionadas à matéria aduaneira:

Turma Posicionamento

1ª Turma Ordinária da 1ª Câmara Indefinida (julgados favoráveis à denúncia espontânea em 2012 e desfavoráveis em 2011 e 2014)

2ª Turma Ordinária da 1ª Câmara Não é aplicável a denúncia espontânea

1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara É aplicável a denúncia espontânea

2ª Turma Ordinária da 3ª Câmara É aplicável a denúncia espontânea

1ª Turma Especial Indefinida (julgados desfavoráveis à denúncia espontâ-nea em 27.01.2015 e favoráveis em 19.03.2015)

2ª Turma Especial Não é aplicável a denúncia espontânea

Ocorre que a consolidação jurisprudencial foi vista em 26.04.2016, quan-do a Terceira Turma da Câmara Superior do CARF incluiu em sua pauta de julga-mento mais de 250 processos sobre o tema, cujos montantes em discussão alcan-çam a cifra de R$ 17 milhões. Como dito anteriormente, a referida Turma estreou o instituto do “julgamento de paradigma”, ao reconhecer três processos como paradigmas (Processos nºs 10715.004458/2010-15, 11128.007573/2006-48 e 10715.000019/2010-33) e estender o seu resultado para os demais processos similares incluídos na pauta da mesma sessão.

No julgamento dos Processos nºs 10715.004458/2010-15 e 10715. 000019/2010-33, a argumentação trazida pelo respectivo relator (Conselheiro Henrique Pinheiro Torres) para manter a cobrança da multa foi no sentido de que não seria cabível a denúncia espontânea para as multas em questão, haja vista que a declaração aduaneira teria um prazo preestabelecido para o seu cumprimento.

Nas palavras do ilustre Conselheiro,

se a obrigação era apresentar declaração até determinada data, e se esta não foi apresentada no prazo determinado, não há como cumprir a obrigação acessória tempestivamente, salvo se se voltar no tempo, ainda não possível com a tecno-logia disponível hoje.

Em outras palavras, entendeu o Conselheiro Relator que, em havendo prazo fixado para o cumprimento de determinada obrigação, a simples mora comprometeria o próprio adimplemento da obrigação, não sendo admitida a denúncia espontânea, uma vez que já teria se esvaído o momento adequado para a prestação das informações.

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Afirmou ainda que o objetivo da multa em questão não é sancionar o descumprimento da obrigação acessória, mas, sim, coibir o atraso no seu cum-primento e, por conta disso, não seria cabível a exclusão da penalidade quando a declaração for cumprida fora do prazo regulamentar.

Sustentou, por fim, que a atual redação do art. 102 do Decreto-Lei nº 37/1966 não seria aplicável ao caso em comento. Para tanto, fez uso de deci-são anteriormente proferida no acórdão nº 3102 00.988, no qual foi consignado que, para algumas infrações tributárias, a mera conduta configuraria o ilícito, não havendo possibilidade física ou jurídica de repará-las, evitando o seu re-sultado. No entender do Conselheiro Relator, seria exatamente essa a hipótese de infração por cumprimento intempestivo de obrigação acessória, que se ma-terializaria na data limite para apresentação da obrigação, sem que, contudo, o prazo seja observado.

Em relação ao Processo nº 11128.007573/2006-48, o Conselheiro Rela-tor, Rodrigo da Costa Pôssas, seguiu o raciocínio que prevalecia antes de 2010 e sustentou que a denúncia espontânea não abarcaria obrigações acessórias, ou seja, somente seria cabível para obrigações principais, quando a intenção é estimular o pagamento, ainda que a destempo, pelo contribuinte. A análise mais detalhada da decisão proferida neste último processo ficou comprometida em razão de o referido acórdão não ter sido formalizado até o momento de conclusão desse artigo.

Durante os mencionados julgamentos, foi apresentado voto de divergên-cia pela Conselheira Tatiana Midori Migiyama, representante dos contribuintes, que iniciou a divergência. Para a Conselheira, a denúncia espontânea aduanei-ra não se confunde com a denúncia espontânea do Código Tributário Nacional, haja vista ser objeto de legislação específica (art. 102, § 2º, do Decreto-Lei nº 37/1966), que prevê a sua aplicação para obrigações acessórias. Também representante dos contribuintes, a Conselheira Maria Teresa Martínez López acompanhou a divergência, afastando a aplicação da Súmula nº 49 por haver lei específica sobre o tema.

Os debates foram bastante acirrados, havendo empate em todos os pro-cessos. Para desempatar, foi necessário coletar o voto de qualidade do Presiden-te da Turma, Conselheiro Carlos Alberto Barreto, que votou favoravelmente ao Fisco para afastar a possibilidade de denúncia espontânea nos casos julgados.

Tecidas as considerações a respeito da evolução da jurisprudência do CARF a respeito do tema nos últimos anos, cumpre-nos avaliar os efeitos e as implicações que o recente julgamento de paradigma terá sobre os demais pro-cessos tratando da mesma questão jurídica.

Já há algum tempo vem sendo notada, em nosso sistema jurídico, a im-plantação de medidas visando à uniformização de jurisprudência. Como exem-

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plos dessa tendência processualista, podemos citar os institutos da repercussão geral, dos recursos repetitivos, das súmulas vinculantes e, mais recentemente, do incidente de resolução de demandas repetitivas (“IRDR”), introduzido recen-temente no ordenamento pátrio pelo novo Código de Processo Civil.

Apesar desse ambiente jurídico, faz-se necessário avaliar, de forma iso-lada, o mecanismo de julgamentos de paradigmas pelas Turmas do CARF a fim de verificar a extensão de seus efeitos.

Em tese, os efeitos dessa espécie de julgamento devem ser restritos ape-nas aos demais casos apreciados na mesma sessão, não tendo os precedentes qualquer força jurídica sobre os demais casos em que discute ou se venha a discutir a mesma tese.

Isso porque o art. 47, § 2º, da Portaria MF nº 343/2015 prevê que o resul-tado do julgamento paradigma deverá ser aplicado aos demais processos com fundamento em idêntica questão de direito incluídos em pauta da mesma ses-são. Em outras palavras, o mencionado instituto não tem o condão vinculante para outros processos ou demais órgãos julgadores, como ocorre, por exemplo, com as súmulas do CARF.

Não há dúvidas, porém, de que o entendimento exarado pela Terceira Turma da Câmara Superior do CARF será amplamente replicado para os demais processos em andamento perante as Delegacias Regionais de Julgamento e Tur-mas da 3ª Seção de Julgamento do CARF.

Não obstante isso, caberá aos contribuintes autuados atentaram às es-pecificidades de seus casos, buscando a aplicação escorreita dos precedentes. Deverão demonstrar, quando o caso, que as suas autuações não se amoldam perfeitamente aos casos recentemente julgados pela Terceira Turma da Câmara Superior do CARF, devendo ser apreciados com base em suas particularidades.

A título de exemplo, podemos citar as hipóteses em que houve apresen-tação tempestiva das declarações, tendo ocorrido mera retificação após o pra-zo. Para os demais casos, ou seja, aqueles idênticos aos julgados pela Terceira Turma na sessão em análise, provavelmente será necessário levar seu pleito ao Judiciário com o intuito de reverter tais autuações.

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Assunto Especial – Doutrina

Penalidades Aduaneiras

Ilegalidade da Retenção de Mercadorias para a Cobrança de Tributos e Penalidades Aduaneiras

KELLY g. MARTARELLOAdvogada, Especialista em Direito Tributário pela Faculdade de Direito de Curitiba (UniCuriti-ba) e UBA (Universidad de Buenos Aires), Processo Tributário pelo IBET (Instituto Brasileiro de Direito Tributário) e Escola da Magistratura do Paraná, Membro da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB Santa Catarina.

RESUMO: A Administração Fazendária, não raramente, promove a interrupção do despacho aduanei-ro de importação, exigindo o recolhimento da diferença de tributos e multas, em especial, nos casos relativos ao valor aduaneiro e à classificação fiscal, como condição para o desembaraço aduaneiro e a consequente entrega das mercadorias ao importador. Ocorre que essa atuação fiscalizatória configura meio coercitivo para cobrança de tributos, o que vai de encontro ao conteúdo da Súmula nº 323 do Supremo Tribunal Federal, por ser análogo à apreensão de mercadorias. O ponto central da discussão neste trabalho versa acerca da ilegalidade desta retenção como meio transverso para cobrança de tributos e de outras obrigações tributárias, uma vez que a Fazenda Nacional possui todo o aparato legal para a persecução de seus créditos sem impor prejuízos exacerbados ao contribuinte. Por fim, busca-se apresentar uma resposta à problemática em questão, uma vez que não há como aquiescer com a postura arbitrária do Fisco no exercício do controle aduaneiro.

PALAVRAS-CHAVE: Despacho aduaneiro; lançamento tributário; pagamento de tributos; retenção de mercadorias; princípio da legalidade; princípio do devido processo legal; princípio da proporcionalida-de; precedentes do STF e STJ.

ABSTRACT: The Treasury Administration not rarely interrupts the import’s customs clearance, de-manding the payment of taxes and penalties concerning specially the goods’ customs value and tax classification, as condition to the liberation of the imported goods and its delivery to the importer. It happens that this kind of tax assessment is actually a coercive means of payment of taxes, which meets the Precedent 323 of the Federal Supreme Court, being similar to the seizure of goods. The essential point of discussing on this article is about the illegality of this kind of goods’ seizure, used as transverse way of taxes and penalties assessment. This, because the Treasury Administration has its legal apparatus to assessing taxes without impairing the taxpayers. Finally, it seeks to present an answer to the issue in question, since there’s no way to agree to this Revenue’s arbitrariness.

KEYWORDS: Customs clearance; tax assessment; payment of tax; retention of goods; princicle of le-gality; principle of due process of law; principle of proporcionality; legal precedents from STF and STJ.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Despacho aduaneiro na importação; 2 Do lançamento tributário na importa-ção; 3 Das exigências realizadas no curso do despacho aduaneiro e da ilegalidade na retenção para pagamento de tributos; Conclusões.

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INTRODUÇÃO

O comércio internacional representa atualmente uma parcela significa-tiva da economia mundial, já que a globalização é uma realidade presente no dia a dia, tanto dos negócios, quanto no intercâmbio cultural entre os povos.

E o Brasil está inserido neste contexto de globalização do comércio mun-dial, eis que representa uma parcela significativa das operações de comércio internacional mundial, além de possuir a condição de membro originário da Organização Mundial do Comércio (OMC), internalizando os acordos resul-tantes das negociações no âmbito da Rodada do Uruguai, por meio do Decreto nº 1.355/1996.

Por conseguinte, em razão desta condição do Brasil nas relações interna-cionais, é de fundamental importância que todos os intervenientes do comér-cio exterior pautem as relações jurídicas de comércio exterior dentro da estrita legalidade, em especial os órgãos de controle aduaneiro. Assim, estes devem obediência não só às normas pátrias, como também aos tratados internacionais do qual o nosso país é signatário.

Contudo, não é essa a realidade que se verifica nas aduanas brasileiras, pois vem se tornando prática comum pela Receita Federal do Brasil, principal órgão interveniente do comércio exterior brasileiro, a retenção de mercadorias como meio oblíquo e transverso para a cobrança de tributos e penalidades, em evidente afronta aos princípios da legalidade, do devido processo legal, propor-cionalidade, da livre iniciativa econômica, dentre outros.

Por essa razão, entende-se de grande valia o tema ora abordado, pois há relevante interesse prático no estudo das penalidades aduaneiras aplicadas pela alfândega brasileira, principalmente em razão das sanções decorrentes da im-precisão técnica legislativa que culminam com a apreensão de mercadorias nos portos brasileiros, bem como a aplicação de onerosas autuações em desfavor dos importadores/exportadores.

1 DO DESPACHO ADUANEIRO NA IMPORTAÇÃO

Antes de adentrarmos no estudo das penalidades aduaneiras, é funda-mental realizar uma breve exposição sobre o procedimento administrativo do despacho aduaneiro, em especial o despacho aduaneiro de importação, eis que o tema abordado no presente estudo são exatamente as sanções e penalidades aplicadas no curso das operações de importação.

Destarte, trata-se o despacho aduaneiro de importação de procedimento administrativo realizado pela autoridade aduaneira destinado à verificação do-cumental e física de todas as mercadorias procedentes do exterior, importadas a título definitivo ou não, com ou sem incidência de tributos.

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Ou seja, trata-se de um conjunto de atos e ações, os quais, ordenada-mente, objetivam uma finalidade que, no caso do despacho aduaneiro de im-portação, é o de verificar a exatidão dos dados declarados pelo importador em relação à mercadoria importada, aos documentos apresentados e à legislação específica.

Portanto, podemos classificar o despacho aduaneiro como “um procedi-mento administrativo destinado a fiscalizar a importação ou exportação, lançar e cobrar os tributos eventualmente incidentes e desembaraçar o produto”1.

No Brasil, o procedimento do despacho aduaneiro está normatizado pelo Regulamento Aduaneiro, aprovado por meio do Decreto nº 6.759/2009, bem como através das normas infralegais (Instrução Normativa nº 680/2006 e Por-taria Secex nº 23/2011 etc.), sendo que todos os atos referentes ao despacho aduaneiro de importação deverão ser registrados por meio eletrônico, perante o Siscomex (Sistema Integrado de Comércio Exterior).

Assim, o despacho aduaneiro inicia por meio do registro da declaração de importação (DI) perante o Siscomex e, via de regra, deve ter o seu início em até 90 dias após a descarga da mercadoria em recinto alfandegado de zona pri-mária. Após essa fase inicial, segue a fase da conferência aduaneira e, depois, a última fase – o desembaraço.

Na fase de conferência aduaneira, subsequente ao registro da declaração de importação, a operação é submetida a um dos canais de conferência adua-neira (verde, amarelo, vermelho ou cinza), pelo qual a autoridade fiscal irá ve-rificar a exatidão das informações lançadas pelo contribuinte, além de realizar uma análise acerca dos tributos incidentes na operação de comércio exterior.

Ademais, a regulação do desembaraço indica os critérios de seleção para os canais de conferência aduaneira, o qual deverá levar em consideração diver-sos aspectos do importador e da mercadoria, devendo, obviamente, a autorida-de levar em conta os critérios lógicos para análise da operação de importação (regularidade fiscal e habitualidade do importador; natureza, volume ou valor da importação; tratamento tributário e o valor dos impostos incidentes na im-portação; capacidade econômico-financeira do importador; eventuais ocorrên-cias em outras operações de importação).

Desta forma, se as mercadorias forem parametrizadas em canal verde de conferência aduaneira, a mercadoria estará dispensada de análise física e documental, devendo ser finalizado o despacho aduaneiro, com a consequente liberação das mercadorias para consumo.

1 FOLONI, André Parmo. Tributação sobre o comércio exterior. 1. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 93.

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Caso a operação seja parametrizada em canal amarelo, a fiscalização aduaneira irá analisar tão somente os documentos relacionados à mercadoria, sendo que, se não forem constatadas irregularidades, a mercadoria será desem-baraçada para consumo. E, se constatadas irregularidades ou suspeitas, a auto-ridade fiscal direcionará as mercadorias para o canal vermelho.

Por sua vez, a parametrização da operação para o canal vermelho im-porta na verificação documental e física da operação de importação pela auto-ridade fiscal, e, em caso de inexistirem irregularidades, a fiscalização permite a liberação das mercadorias; caso contrário, realiza as exigências que julga pertinentes para a continuidade do despacho aduaneiro.

Já no canal cinza de conferência aduaneira, a fiscalização ocorre de for-ma mais rigorosa, compreendendo não só o exame físico e documental, como também os elementos indiciários de fraude ou qualquer outro ato tendente a burlar a fiscalização aduaneira, podendo até mesmo ser instaurado procedi-mento de fiscalização aduaneira e a retenção das mercadorias.

Independente do canal de conferência aduaneira, após concluída a fisca-lização, será finalizado o despacho aduaneiro, com a consequente emissão do comprovante de importação (CI), ato pelo qual é formalizada a nacionalização das mercadorias e a disponibilização dos bens para livre circulação no território nacional.

Da sequência lógica exposta, verifica-se que os atos realizados durante o procedimento administrativo do despacho aduaneiro são preparatórios para o ato administrativo final: o ato de desembaraço aduaneiro, no qual o produto é entregue ao importador.

Todavia, a atividade do Fisco não cessa com o desembaraço aduaneiro das mercadorias, haja vista que a autoridade fiscal pode realizar, nos 5 (cinco) anos posteriores à data do registro da declaração de importação, a fiscalização da regularidade dos pagamentos dos impostos e demais gravames devidos à Fa-zenda Nacional, bem como a exatidão dos dados declarados nas operações de comércio exterior, consoante a dicção do art. 638 do Regulamento Aduaneiro c/c art. 54 do Decreto-Lei nº 37/1966.

Isto é, caso a Fazenda Nacional constate a posteriori alguma irregulari-dade nas operações de importação e/ou exportação, poderá realizar o controle administrativo do procedimento de despacho aduaneiro, mediante a formaliza-ção do procedimento da “revisão aduaneira”, ato pelo qual a autoridade fiscal poderá eventualmente impor o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária, por meio de lançamento de ofício (auto de infração) e/ou outra obrigação a ser cumprida pelo importador/exportador.

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Importante esclarecer que não se trata a revisão aduaneira de uma re-visão do lançamento tributário, mas sim do procedimento administrativo do despacho aduaneiro, o qual é mais amplo e abrange todos os atos da autoridade administrativa correlatos à internalização de mercadorias estrangeiras no terri-tório nacional, tema esse que foge ao objeto deste artigo introdutório.

Esclarecidas, assim, as premissas acerca do procedimento administrativo do despacho aduaneiro, passaremos a expor uma breve análise acerca do lan-çamento tributário para os tributos incidentes no comércio exterior, eis que são esclarecimentos essenciais para o estudo das exigências e penalidades impostas no curso deste ato.

2 DO LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO NA IMPORTAÇÃO

O lançamento tributário é atividade privativa da autoridade administra-tiva com vistas à constituição do crédito tributário, pressupondo a verificação da ocorrência da hipótese de incidência, a delimitação da matéria tributável, a identificação do sujeito passivo e o cálculo do montante devido ao ente tribu-tante, nos termos do art. 142 do Código Tributário Nacional, e que se aperfeiçoa com a notificação ao sujeito passivo para que efetue o pagamento ou apresente impugnação.

Como não poderia deixar de ser, trazemos a lume o conceito de Paulo de Barros Carvalho acerca do lançamento tributário:

Lançamento tributário é um ato jurídico administrativo, da categoria do simples, constitutivos e vinculados, mediante o qual se insere na ordem jurídica brasileira uma norma individual e concreta, que tem como antecedente o fato jurídico tributário e, como consequente, a formalização do vínculo obrigacional, pela individualização dos sujeitos ativo e passivo, e determinação do objeto da pres-tação, formado pela base de cálculo e correspondente alíquota, bem como pelo estabelecimento dos termos espaço temporais em que o crédito há de ser exigido.

[...] Podemos aludir ao “lançamento” concebido como norma, como procedi-mento ou como ato. Norma, no singular, para reduzir as complexidades de refe-rências aos vários dispositivos que regulam o desdobramento procedimental para a produção do ato (i); procedimento, como a sucessão de atos praticados pela autoridade competente, na forma da lei (ii); e ato, como o resultado da atividade desenvolvida no curso do procedimento (iii).2

A legislação e a doutrina classificam o lançamento tributário em três mo-dalidades, as quais se diferenciam entre si em razão da participação do contri-buinte, a saber: lançamento misto ou por declaração (art. 147 do CTN); lança-

2 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 421 e 426.

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mento de ofício (art. 149 do CTN); lançamento por homologação (art. 150 do CTN).

Na modalidade do lançamento por ofício, o sujeito ativo não participa do lançamento. Cabe à Fazenda Pública, por si só, a verificação e a ocorrência do fato gerador, identificação do sujeito passivo, cálculo do montante devido, formalização do crédito e notificação do sujeito passivo para pagamento.

Isto é, nos casos especificamente determinados por lei, no qual caberia ao contribuinte realizar o lançamento, e este não o fez ou o fez de forma equi-vocada ao não prestar as informações e apurar e pagar o tributo devido, caberá então à Fazenda Pública realizar o lançamento supletivo, de modo a formalizar o crédito tributário.

Já na modalidade do lançamento por declaração, o sujeito passivo presta declarações sobre os fatos pertinentes à imposição tributária, cabendo ao sujei-to ativo, valendo-se das informações do contribuinte, verificar a ocorrência do fato gerador, identificar o sujeito passivo, realizar o cálculo do montante devi-do, formalizar o crédito e notificar o sujeito passivo para pagamento. Alguns doutrinadores classificam essa espécie de lançamento como lançamento misto.

Por sua vez, no lançamento por homologação, o sujeito passivo deve verificar a ocorrência da hipótese de incidência do tributo, calcular o montante devido e efetuar o pagamento no prazo previsto em lei, cabendo ao ente tribu-tante tão somente a conferência da apuração e do pagamento realizados.

Vale esclarecer que, em nosso sistema jurídico, a grande maioria dos tributos estão sujeitos ao lançamento tributário por homologação, pois,

tendo em conta que vivemos em uma sociedade de massa, extremamente com-plexa e na qual o número de contribuintes é extremamente elevado, não ensejan-do que haja um lançamento individualizado, pelo Fisco, de cada tributo devido em cada competência, as leis preveem, normalmente, que o próprio contribuinte verifique o montante devido a título de cada tributo e efetue o pagamento, ou seja, estabelecem a modalidade de lançamento por homologação para a maioria dos tributos.3

Pois bem, no caso específico dos tributos incidentes nas operações de comércio exterior, em especial nas operações de importação, a grande maioria da doutrina entende tratar-se da espécie do lançamento por homologação, haja vista que, no ato do despacho aduaneiro, o contribuinte registra a respectiva declaração de importação perante o Siscomex, declara o montante devido e realiza o pagamento dos tributos incidentes nessas operações.

3 PAULSEN, Leandro. Op. cit., p. 1044.

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Trata-se, a nosso ver, da caracterização típica do lançamento por homo-logação, na medida em que a Fazenda Pública não tem qualquer participação no ato do lançamento tributário, cabendo-lhe, tão somente, a conferência dos dados no prazo de 5 (cinco) anos do registro da declaração de importação.

Assim, à exceção dos casos expressamente previstos em lei os quais estão sujeitos ao lançamento de ofício (art. 73, II, do RA) e dos casos em que há lança-mento por declaração (regimes aduaneiros especiais), a maior parte dos tributos incidentes nas operações de comércio exterior estão sujeitos ao lançamento por homologação (imposto de importação, imposto sobre produtos industrializados, PIS/Cofins importação, ICMS).

Neste sentido, válido trazer a lição de André Parmo Folloni acerca do percurso de constituição da relação jurídica tributária e sua extinção:

No momento em que realiza o registro da declaração de importação, o sujei-to passivo, então, determina a matéria tributável, calcula o montante do tributo devido e realiza ainda o pagamento do tributo. Ao realizar a primeira providên-cia (registro), desencadeia a incidência da norma tributária, nesse caso efectual. Ao realizar a providência subsequente (cálculo do valor do tributo), cumpre a prescrição normativa, realizando o procedimento mental. Há lançamento por homologação. Com a última (pagamento), extingue a relação jurídica tributária (obrigação e crédito), também em atividade de cumprimento daquilo que vinha prescrito na norma tributária impositiva. Trata-se, portanto, de um lançamento por homologação. Havendo a incidência, há imediata constituição da relação ju-rídica tributária, e fica a cargo do contribuinte promover o cálculo dos tributos e, havendo débito, adimpli-lo via Siscomex. Não há, ainda, qualquer participação da autoridade administrativa. (grifos nossos)4

Verifica-se, portanto, que o nascimento da obrigação tributária imponível ocorre no momento do registro da declaração de importação, momento no qual também é devido o pagamento dos tributos incidentes nas operações de im-portação, ao passo que a extinção da obrigação tributária ocorre em momento posterior, naquele no qual a autoridade fiscal analisa a exatidão dos dados de-clarados pelo importador e do pagamento realizado, mediante a homologação dos dados lançados pelo contribuinte.

Sendo assim, enquanto não houver a homologação do lançamento tri-butário pela Fazenda Pública, não terá ocorrido a extinção da obrigação tribu-tária, podendo a autoridade fiscal, a qualquer momento, realizar o lançamento tributário de ofício das obrigações tributárias suplementares que eventualmente julgar pertinentes.

4 FOLLONI, André Parmo. Op. cit., p. 173.

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Ou seja, caso a autoridade fiscal verifique a inexatidão de algum dado lançado pelo contribuinte no momento do registro da declaração de importa-ção, poderá realizar o lançamento de ofício das obrigações que considera devi-das, formalizando a constituição do respectivo crédito tributário.

Pois bem, o objeto do presente estudo compreende exatamente as exi-gências realizadas no curso do despacho aduaneiro, em geral, dos despachos aduaneiros parametrizados em canal vermelho ou amarelo de conferência adua neira, já que, em muitos casos, a Receita Federal do Brasil vem exigindo o pagamento de eventual diferença tributária e multas como condição sine qua non para o desembaraço aduaneiro das mercadorias.

Contudo, é evidente a ilegalidade dessas exações fiscais, tendo em vista que, no despacho aduaneiro, a obrigação tributária só finaliza após o exame da autoridade fiscal, quando homologa o lançamento tributário (lançamento por homologação), sendo-lhe facultado, a qualquer momento, realizar o lançamen-to tributário suplementar por meio da constituição formal do crédito tributário (auto de infração), não havendo a extinção da relação jurídica com o mero desembaraço aduaneiro das mercadorias.

Não é demais lembrar que a autoridade fiscal possui a faculdade de, no prazo decadencial previsto em lei, realizar a revisão aduaneira dos tributos declarados nas operações de importação, nos termos dos dispositivos legais, realizando o respectivo lançamento de ofício das obrigações tributárias porven-tura devidas.

Desta feita, somente após o transcurso do prazo decadencial é que po-derá ser considerada extinta a relação jurídica tributária entre o importador e o Fisco, momento no qual o Fisco homologará tácita ou expressamente as opera-ções de importação.

Portanto, a relação jurídica tributária entre importador e Fazenda Federal só se encerra após a respectiva homologação do Fisco acerca do lançamento tributário, possuindo o ente tributante todo o aparato legal para a cobrança do que considerar eventualmente devida, revelando-se medida desproporcional a retenção dos bens como meio transverso para o pagamento de tributos e/ou do cumprimento de outras obrigações tributárias.

Ademais, importante esclarecer que a incidência dos tributos na importa-ção está sujeita a um procedimento fiscal diferente dos demais, pois, consoante lição de Hugo de Brito Machado,

o lançamento tributário é apenas uma das consequências no bojo de um procedi-mento fiscal maior, que visa não só determinar e exigir tributos devidos, mas sim propiciar a efetivação da operação de comércio exterior: importar ou exportar bens.

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Em outras palavras, no controle administrativo do despacho aduaneiro, a fiscalização não se cinge somente à verificação dos tributos incidentes nas operações de importação/exportação, mas tem um objetivo maior que o efetivo poder de polícia aduaneiro, a ser exercido pelas autoridades governamentais, com vista a resguardar a legalidade das operações de comércio exterior.

Portanto, se as mercadorias importadas não apresentarem vício intrínse-co, risco ao consumo doméstico, não sendo produto contrafeito, importação proibida, contrabando ou descaminho, não há qualquer óbice à conclusão do despacho aduaneiro, com a entrega dos bens ao importador, consoante especi-ficado no próximo tópico.

3 DAS EXIGÊNCIAS REALIZADAS NO CURSO DO DESPACHO ADUANEIRO E DA ILEGALIDADE DA RETENÇÃO PARA PAGAMENTO DE TRIBUTOS

Com efeito, consoante descrito nas linhas anteriores, é prática habitual da autoridade fiscal brasileira a imposição de exigências fiscais aos importado-res no curso do despacho aduaneiro de importação, materializadas por meio de exigência da diferença dos tributos e a imposição de multa de ofício no montan-te de 75% e/ou 150% do valor dos tributos supostamente exigíveis, obrigação esta que, se não for cumprida, culmina com a retenção das mercadorias e a consequente não finalização do despacho aduaneiro.

Em sua grande maioria, essas imposições ocorrem em razão de divergên-cia do entendimento do importador e da Receita Federal acerca da classificação fiscal das mercadorias e/ou dos preços declarados nas operações de importação.

Ou seja, o importador realiza registro da operação perante o Siscomex mediante a apresentação da declaração de importação e dos documentos obri-gatórios ao despacho aduaneiro, e, no ato da conferência aduaneira, a auto-ridade fiscal julga que a classificação fiscal e/ou os preços declarados estão incorretos, realizando a exigência não só dos tributos que julga devidos, como também da multa de ofício e por vezes dos direitos antidumping.

Em outras oportunidades, a autoridade fiscal discorda da valoração das mercadorias objeto do despacho aduaneiro, fixando unilateralmente o valor aduaneiro das mercadorias e exigindo como condição para o prosseguimento do despacho de importação o recolhimento da diferença dos tributos e da multa fixada no art. 711 do Regulamento Aduaneiro.

Quer dizer, não concordando o Fisco com o valor aduaneiro das mer-cadorias declarado pelo importador nos documentos de importação (DI, fatura comercial, romaneio), a autoridade fiscal procede à fixação do valor aduaneiro por arbitramento, em evidente afronta às normas internacionais e brasileiras que regulamentam a valoração aduaneira das mercadorias, obstando ainda o

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prosseguimento do despacho aduaneiro, até que não seja paga a diferença dos tributos e eventualmente das penalidades aduaneiras.

Ora, tal conduta configura evidente desobediência da autoridade fiscal aos princípios que norteiam o Estado Democrático de Direito, haja vista que a autoridade fiscal não pode obstruir a finalização do despacho aduaneiro como meio oblíquo para a cobrança de tributos que sequer poderão ser considerados como realmente devidos.

Como principal órgão interveniente do comércio exterior, é inquestioná-vel que a Fazenda Nacional deve estrita obediência aos princípios constitucio-nais que regem a Administração Pública, em especial os princípios da legalida-de, da razoabilidade, da proporcionalidade em sentido estrito, da livre iniciativa do trabalho, entre outros.

E a lei em sentido formal expressamente determina que, mesmo nas hi-póteses em que há exigência fiscal em aberto, não existe obrigação legal de manter as mercadorias retidas, nos termos do § 1º do art. 51 do Decreto-Lei nº 37/1966, impondo-se, assim, a liberação das mercadorias, verbis:

Art. 51. [...]

§ 1º Se, no curso da conferência aduaneira, houver exigência fiscal na forma deste artigo, a mercadoria poderá ser desembaraçada, desde que, na forma do regulamento, sejam adotadas as indispensáveis cautelas fiscais.

Da norma contida no citado dispositivo legal depreende-se a evidente arbitrariedade dos atos dos agentes aduaneiros quando exigem o pagamento de tributos e penalidades para a conclusão do despacho aduaneiro, eis que o Fisco pode adotar outras cautelas fiscais para assegurar o cumprimento das obriga-ções aduaneiras e tributárias.

Inclusive, o Supremo Tribunal Federal já exarou o seu entendimento acerca destas manobras do Fisco para a cobrança oblíqua de tributos, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 33.933/AL, que aprovou a Súmula nº 323, segundo a qual “é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos”.

Aliás, não somente no despacho aduaneiro a Fazenda Pública utiliza meios transversos para cobrança de tributos, mas também em outras situações, o que levou a Suprema Corte brasileira a consolidar o entendimento no sentido de vedação de sanções políticas para a cobrança de tributos, consoante se infe-re das Súmulas nºs 70 e 527, verbis:

Súmula nº 70. É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coerci-tivo para cobrança de tributo.

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Súmula nº 547. Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias na alfândega e exerça suas ativida-des profissionais.

Oportuno extrairmos a lição de Leandro Paulsen acerca das sanções po-líticas5 praticadas pela Fazenda Pública:

Os denominados meios coercitivos indiretos de cobrança, ou sanções políticas, são quaisquer imposições ou limitações de ordem administrativa, ainda que esta-belecidas em lei, que obstem o exercício de direitos das pessoas físicas ou jurídi-cas (mais frequentemente, destas últimas), com a finalidade de forçá-las a pagar tributos. Possibilitam ao Fisco compelir o sujeito passivo que possua débitos a quitá-los sem que seja utilizada a via adequada, que é a da cobrança administra-tiva ou judicial (execução fiscal). Podemos afirmar com segurança que, no plano teórico, o Supremo Tribunal Federal considera inconstitucional todo e qualquer meio coercitivo indireto de cobrança, ainda que estabelecido em lei, porque se trata de instrumentos que – embora indiretamente – obrigam o sujeito passivo a pagar tributos sem observância do devido processo legal. A forma legítima de cobrança de tributos pelo Fisco, como regra, deve ser a realização de um lança-mento tributário, dando-se possibilidade ao contribuinte de impugnar e discutir a respectiva exigência, assegurados o contraditório e a ampla defesa, bem como os demais princípios que regem os processos administrativos. Depois disso, se ainda estiver mantido o lançamento e o sujeito passivo permanecer inadimplente, en-tão, deve ser promovida a execução fiscal (ação judicial de cobrança), novamen-te assegurando ao contribuinte todas as garantias processuais derivadas direta ou indiretamente do postulado do devido processo legal.

Portanto, é incontestável a afronta às garantias constitucionais pelo Fisco ao exigir o pagamento da diferença de tributos e multas para dar continuidade ao despacho aduaneiro de importação, não podendo o Fisco dar interpretação diversa ao texto constitucional.

A propósito, o descumprimento de qualquer dever instrumental aduanei-ro implica a adoção de medidas fiscalizatórias e a cobrança por meio da forma-lização do crédito tributário e na sua impossibilidade por meio do processo de execução dos créditos fiscais porventura não satisfeitos.

Todavia, o apelo a tais expedientes que se mostrem aptos a provocar a tutela estatal não pode inviabilizar as atividades do particular, promovendo a retenção de mercadorias, sob pena de violação aos princípios da legalidade, razoabilidade, livre iniciativa e da liberdade do exercício profissional, pois, a pretexto de facilitar a arrecadação tributária, impõe proibições ou limitações ao exercício de atividades empresariais lícitas.

5 PAULSEN, Leandro. Direito tributário na Constituição e no STF: teoria e jurisprudência. 17. ed. São Paulo: Método, 2014. p. 125.

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Desta feita, em razão das arbitrariedades perpetradas pela autoridade aduaneira, o Superior Tribunal de Justiça também vem rechaçando esta condu-ta, na esteira do entendimento da Suprema Corte constitucional, conforme se verifica dos julgados abaixo transcritos:

Tributário. Importação. Questionamento quanto à classificação tarifária. Libera-ção da mercadoria condicionada ao pagamento de multa. Aplicação analógica da Súmula nº 323/STF. 1. A retenção de mercadorias como meio coercitivo para o pagamento de tributos é providência ilegal, rechaçada pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal, nos termos das Súmulas nºs 70, 323 e 547/STF. 2. Agravo regimental não provido. (AgRg-REsp 1259736/PR, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, J. 27.09.2011, DJe 03.10.2011)

Processual civil e tributário. Recurso especial. Admissibilidade. Prequestiona-mento. Importação. Retenção de mercadoria como meio coercitivo para o pa-gamento de tributo. Impossibilidade. 1. É inviável o processamento do recurso especial quando ausente o prequestionamento da questão nele versada. 2. A retenção de mercadorias como meio coercitivo para o pagamento de tributos é providência ilegal, rechaçada pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal. Súmulas nºs 70, 323 e 547/STF. 3. Recurso especial não conhe-cido. (REsp 643.167/CE, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, J. 28.09.2004, DJ 25.10.2004, p. 255)

Tributário e aduaneiro. Importação. Paralisação do despacho aduaneiro. Re-colhimento de multa. Exigência que não obsta o prosseguimento do despacho. Excesso de prazo. Concessão da segurança. 1. O não recolhimento de multa não impede a continuidade do despacho de importação, devendo a autoridade instaurar o devido procedimento fiscal para intimação e defesa do contribuin-te, independentemente da prestação de garantia. 2. No que se refere à questão dos prazos legais considerados pela jurisprudência para o transcurso regular do despacho de importação, nota-se uma tendência à uniformização dos oito dias previstos no Decreto nº 70.235/1972, que dispõe sobre o processo administrativo fiscal. (TRF 4ª R., Remessa Necessária nº 5002996-79.2016.4.04.7208, 2ª T., Rel. Des. Otávio Roberto Pamplona, DJ 05.07.2016)

Em vista do exposto, constata-se que os Tribunais Pátrios vêm afastando a imposição de penalidades que não estejam em consonância com as garantias constitucionais do Estado de Direito, obrigando a autoridade administrativa à obediência dos princípios da legalidade, devido processo legal, livre iniciativa econômica, razoabilidade e proporcionalidade, consoante abaixo exposto.

CONCLUSÕES

Diante do exposto, verifica-se que, não obstante ser adotado pela autori-dade aduaneira do Brasil a retenção das mercadorias como método de arreca-dação aduaneira para a para a cobrança de tributos e penalidades no curso do

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despacho aduaneiro, tal conduta vem sendo rechaçada pelos tribunais pátrios, os quais adotaram o entendimento de que as sanções políticas não podem ser utilizadas como meio transverso para a cobrança de tributos.

Em especial, com relação ao procedimento do despacho aduaneiro, o Superior Tribunal Federal já firmou o entendimento de que “é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos” (Súmula nº 323/STF).

E, se assim agir, estará a autoridade fiscal violando as garantias constitu-cionais do Estado Democrático de Direito, em especial o princípio da legalida-de, devido processo legal, proporcionalidade, não confisco e da livre iniciativa e valorização do trabalho, eis que, por se tratar de cobranças de tributos e pena-lidades que afetam e limitam os direitos e, em especial, o patrimônio dos con-tribuintes – importadores –, devem necessariamente ser respeitados pelo Estado.

Do contrário, estaria o contribuinte à mercê de um Estado de Exceção, onde a ânsia arrecadatória e predatória é proporcionalmente maior que o poder de polícia do Estado, valendo qualquer manobra para a cobrança exacerbada dos tributos.

E não é demais lembrar que o Estado de Direito possui todo o aparato legal para realizar a cobrança dos tributos que julgar eventualmente devidos, em especial no que se refere aos tributos incidentes na importação, eis que uma espécie de lançamento por homologação, o qual poderá ser revisado a qualquer momento pela Fazenda Pública dentro do prazo decadencial previsto em lei.

A relação jurídica tributária estampada no despacho aduaneiro de impor-tação somente se encerra com a homologação do Estado acerca das obrigações tributárias, sendo facultado à autoridade fiscal realizar o lançamento tributário suplementar do que julgar devido, motivo pelo qual é arbitrária e ilegal a uti-lização da retenção de mercadorias para obrigar o contribuinte importador ao cumprimento de tal exigência fiscal.

Por via de consequência, caso a autoridade fiscal paralise o despacho aduaneiro de importação, com a finalidade única e exclusiva de exigir o paga-mento de tributos para prosseguimento do despacho aduaneiro, deve o contri-buinte recorrer ao Poder Judiciário, o qual exerce o controle dos atos praticados pela aduana, a fim de afastar as ilegalidades cometidas.

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Assunto Especial – Doutrina

Penalidades Aduaneiras

Infrações e Penalidades Aduaneiras

AuguSTO fAuVEL DE MORAES Advogado, Sócio do Escritório Fauvel e Moraes Sociedade de Advogados, Especialista em Direito Tributário pela Unisul, Pós-Graduado em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra, Presidente da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP.

MATEuS SOARES DE OLIVEIRAAdvogado, Sócio da MSO Negócios Internacionais, Especialista em Direito e Negócios Inter-nacionais pela UFSC, Mestre em Direito Internacional pela PUC-Minas, Membro da Comissão Aduaneira da OAB.SP.

RESUMO: Este artigo tem como objetivo elucidar algumas questões referentes às sanções e pe-nalidades aduaneiras, de modo conjunto com os princípios constitucionais do Texto de 1988, bem como com a legislação ordinária. Temas como a distinção entre infrações aduaneira e tributária foram abordados em consonância com o sistema aduaneiro de modo a buscar entender qual o limite do poder da presunção do Poder Público nos atos fiscalizatórios. Para alcançar esses objetivos, o método utilizado centrou-se na revisão bibliográfica em livros, artigos de periódico e informações em meio eletrônico. Em linhas gerais, chegou-se à conclusão de que o sistema aduaneiro e todas as normas existentes nele devem ser interpretados de forma global, a fim de que direitos e garantias individuais não sejam violados quando de fiscalizações ocorridas em procedimentos especiais, as quais, via de regra, adotam a interpretação literal, contrariando princípios e garantias individuais.

PALAVRAS-CHAVE: Sanções e penalidades aduaneiras; inconstitucionalidade; sistema aduaneiro.

ABSTRACT: This article aims to clarify some issues regarding the sanctions and customs penalties, set mode with the constitutional principles of the 1988 text, as well as ordinary legislation. Topics such as the distinction between customs and tax offenses has been addressed in accordance with the customs system in order to seek to understand what the limits of power of the Government presumption in fiscalization acts. To achieve these goals the method focused on the literature review in books, journal articles, and information electronically. In general, we came to the conclusion that the customs system and all existing on the same standards should be interpreted globally, so that individual rights and guarantees are not violated when inspections occurred in special procedures, which, as a rule, adopt a literal interpretation, contrary to individual principles and guarantees.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Breves considerações acerca do sistema e o direito aduaneiro; 1.1 O sis-tema aduaneiro – Fatos aduaneiros, relação aduaneira e realidade aduaneira; 1.2 Direito aduaneiro; 2 Distinção entre infrações aduaneiras e tributárias e a questão das responsabilidades objetiva e subjetiva; 3 Da presunção de irregularidades no processo tributário e aduaneiro; 4 Das sanções e

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penalidades aduaneiras; 4.1 Perdimento; 4.2 Multas; 5 Da simulação na prática de ilícitos aduaneiros; infração, sonegação e fraude fiscal à luz do artigo 112 do CTN versus poder de atuação do servidor; 6 Embaraço à fiscalização na área aduaneira; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃOA política comercial de um país que, no comércio exterior, é exercida

através da política aduaneira, é caracterizada, dentre outros pontos, pelo for-te intervencionismo estatal. Esse cenário influencia e molda todas as relações adua neiras estabelecidas no território aduaneiro nacional, o qual, conforme arts. 2º e seguintes do Regulamento Aduaneiro, é compreendido como sendo todo o território nacional.

O Estado brasileiro, como poder central de toda matéria aduaneira, pau-tado na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tem atuado nos mais variados segmentos do comércio internacional, buscando implemen-tar políticas econômicas condizentes com os interesses nacionais.

No plano das relações internacionais, os acordos bilaterais, plurilaterais e multilaterais buscam regulamentar os interesses colocados em pauta pelos negociadores.

Em se tratando do sistema de incorporação e recepção dos acordos in-ternacionais adotado pela Carta Magna brasileira, doutrinariamente podemos encontrar ricos posicionamentos defendendo autoaplicabilidade de tratados que versem sobre direitos humanos. De outro lado, não vinculam à autoapli-cabilidade o comércio internacional, a política aduaneira, o desenvolvimento.

O Supremo Tribunal Federal, mantendo uma postura conservadora, de-fende uma incorporação e recepção, no máximo, com status supralegal, no tocante às normas de direitos humanos. Todos os outros tratados e acordos internacionais alcançam o status da legislação ordinária.

O comportamento adotado pelo Brasil em relação à incorporação e re-cepção dos tratados e demais acordos celebrados no plano internacional afeta diretamente a política aduaneira, assim como o labor de todos os operadores do comércio internacional, sejam do setor público ou privado.

1 BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DO SISTEMA E O DIREITO ADUANEIRO

1.1 O sistema aduaneirO – FatOs aduaneirOs, relaçãO aduaneira e realidade aduaneira

Por sistema aduaneiro compreende-se um conjunto de institutos e prin-cípios jurídicos, órgãos públicos e privados, regulamentações tidas sob as mais variadas nomenclaturas, efeitos e processos de formação peculiar, atos e fatos jurídicos que expressam a política aduaneira brasileira.

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A realidade aduaneira é o funcionamento deste sistema; quando acio-nado, o qual envolve ainda uma infinidade de operadores, cada qual em sua seara de atuação, representantes dos órgãos públicos e privados envolvidos no comex. Tal fato promove uma movimentação de inúmeros subsistemas que atuam, coordenadamente, no sistema aduaneiro.

Administrativo, tributário, comercial são exemplos clássicos. Teorica-mente esses subsistemas deveriam integrar-se e atuar de forma harmônica. Mas a realidade prática aduaneira brasileira não reflete isso. Por vezes refletem har-monia e, noutros momentos, resultam em pura desintegração ocasionada pela falta de aproximação de políticas públicas eficazes de forma a promover uma sustentação efetiva ao comex brasileiro.

Excesso de normas contraditórias, políticas governamentais obscuras, órgãos públicos descentralizados, profissionais mal capacitados e mal remune-rados, corrupção são alguns casos que dificultam a harmonização do sistema aduaneiro, assim como o afasta dos preceitos básicos da Carta Constitucional.

Não obstante, esse sistema é uma realidade. Seus subsistemas atuam quando, direta ou indiretamente, são provocados, já que caracterizados pelos fatos jurídicos que refletem nas áreas administrativas, tributárias e comerciais do comércio cosmopolita.

Assim como em outros países, a Constituição é a Carta Magna. É o funda-mento desta disciplina. Através de princípios constitucionais, como proteção do trabalho nacional, desenvolvimento econômico, dignidade da pessoa humana, todo o ordenamento aduaneiro é norteado. Mas, nesse ponto, a influência das relações internacionais e do direito internacional, público e privado, é impres-sionante, como se observará no decorrer deste trabalho.

O comércio exterior brasileiro representa, atualmente, cerca de 1,26% de todo o comércio internacional. Encontra-se envolvido em cerca de 10% dos litígios internacionais no campo da OMC.

Essas informações são apresentadas para reiterar a necessidade de se aperfeiçoar o sistema aduaneiro brasileiro. Um país com o potencial como este não pode se render apenas a posição de 24º, por exemplo, no ranking de paí-ses exportadores e encontrar-se em tantos litígios internacionais. Vale destacar ainda que somente ocupa essa posição por ser o 4º país exportador do mundo em commodities.

O aperfeiçoamento desse sistema se dará com uma aproximação entre os setores público e privado, pautados nos princípios e objetivos fundamentais constitucionais. Se assim não for, o Brasil continuará sendo uma promessa em desenvolvimento, cercado de problemas internos que, se não resolvidos ou pelo menos melhorados, não conseguirá resolver problemas externos e implementar o texto constitucional na realidade da política aduaneira.

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Por fim, vale destacar a importância que a OMA – Organização Mundial das Aduanas tem promovido no sentido de nortear e estabelecer diretrizes bási-cas no campo internacional, as quais servem de fundamento e inspiração para muitas legislações internas em matéria aduaneira.

No Brasil, essa organização é representada pela Secretaria da Receita Fe-deral e pelo Ministério das Relações Exteriores, que, em sua página eletrônica, dispõe que:

A Organização Mundial das Aduanas (OMA) iniciou suas atividades em 1948, com a criação do Comitê Aduaneiro, sucedido pelo Conselho de Cooperação Aduaneira (CCA). Com o crescimento do número de membros, em 1994 o Con-selho adotou o nome de Organização Mundial das Aduanas. Com sede em Bruxelas, a OMA é responsável pela simplificação, harmonização e cumprimen-to dos procedimentos aduaneiros, e administra os aspectos técnicos dos acordos da OMC sobre Valoração Aduaneira e Regras de Origem.

O Conselho da OMA tem como objetivo assegurar o mais alto grau de harmonia e uniformidade dos sistemas aduaneiros dos Países-membros e, especialmente, estudar os problemas inerentes ao desenvolvimento e aprimoramento de técnicas de aduanas e da legislação aduaneira. É o órgão supremo da OMA e, como tal, toma as decisões finais de trabalho e atividades.

O Conselho funciona com o apoio administrativo prestado pela Secretaria e re-úne todos os membros, uma vez por ano, em uma reunião presidida por um re-presentante eleito. Esta reunião é assistida pela Comissão Política (24 membros), com aconselhamento financeiro da Comissão de Finanças (17 membros).

A Comissão Política trata das questões políticas gerais determinantes das ativi-dades da OMA e atua como um grupo de orientação dinâmica para o Conselho. Atuam sob a direção geral da Comissão Política o Subcomitê de Integridade, que revisa e recomenda a aprovação do Plano de Ação para Integridade, e o Grupo de Trabalho de Capacitação (TTA), que tem como função fornecer orientação para o trabalho nas áreas de capacitação, assistência técnica e formação da OMA.

Em junho de 2009, o Brasil passou a integrar a Comissão de Política, como um dos representantes do Grupo das Américas e do Caribe na OMA. A Comissão de Finanças atua sob a direção geral do Conselho da OMA e tem como papel pri-mordial prestar apoio e aconselhamento à Comissão Política e ao Conselho em matéria orçamentária e financeira. Cabe à Comissão, assim, examinar as estima-tivas de todos os recursos da Organização e seus usos, assim como preparar um relatório ao Conselho a respeito. Entre as estimativas estão as de lucro e perda de conta, declaração sobre o fluxo de caixa e a de balanço.

Quanto aos Comitês, são 5 principais:

– Comitê Técnico de Regras de Origem, que colabora com o Comitê da OMC sobre as Regras de Origem (CRO) e tem o estatuto de observador junto à Organi-zação para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE), à Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), à Divisão

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de Estatística das Nações Unidas (UNSD) e à Câmara de Comércio Internacional (ICC);

– Comitê Técnico de Valoração Aduaneira, que busca assegurar a interpretação uniforme das regras da OMC que regem o valor das mercadorias;

– Comitê do Sistema Harmonizado, cujo objetivo é, em cooperação com outros organismos internacionais, garantir a interpretação e aplicação uniforme do Sis-tema Harmonizado (SH) pelos Países-membros, atualizar o SH – incorporando desenvolvimentos tecnológicos e mudanças no padrão de comércio – e promo-ver a mais ampla utilização do SH pelas autoridades aduaneiras;

– Comitê Executivo, que trabalha para a proteção da sociedade e coopera com uma ampla rede de parceiros, incluindo a Interpol e o Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC) entre outros;

– Comitê Técnico Permanente, responsável pelas atividades relacionadas com a harmonização e simplificação de procedimentos aduaneiros. O Comitê co-labora regularmente com uma variedade de atores no cenário do comércio internacional, incluindo a Câmara de Comércio Internacional (ICC) e da União Postal Universal (UPU).

Hoje, a OMA representa 176 administrações aduaneiras em todo o mun-do, que coletivamente processam cerca de 98% do comércio mundial. Como centro global de especialização aduaneira, a OMA é a única organização inter-nacional com competência em matéria aduaneira. A representação do Brasil a OMA é de competência da Receita Federal brasileira, com o apoio do Ministé-rio das Relações Exteriores. Em 2009, foi aprovada a criação de centro regional de capacitação aduaneira em Brasília, por meio de entendimento tripartite assi-nado entre a Receita Federal, a OMA e a Escola de Administração Fazendária.

1.2 direitO aduaneirO

O objetivo básico do direito aduaneiro é nortear as operações comerciais internacionais de mercadorias, pessoas, veículos sob o ponto de vista admi-nistrativo-aduaneiro e, por vezes, aduaneiro-tributário. Tem como objeto de estudo o controle aduaneiro através do poder de polícia.

A dificuldade de se formar efetivamente um sistema aduaneiro faz este ramo jurídico confrontar-se constantemente com a Carta Magna, através de uma infinidade de subsistemas inseridos nessa disciplina, fato que reforça sua importância e autonomia.

O objetivo básico do direito aduaneiro é nortear as operações comerciais internacionais de mercadorias, pessoas, veículos sob o ponto de vista admi-nistrativo-aduaneiro e, por vezes, aduaneiro-tributário. Tem como objeto de estudo o controle aduaneiro através do poder de polícia. Possui objeto próprio formado por um complexo de relações jurídicas surgidas da prática do comér-cio exterior. Alguns princípios constitucionais que o embasam lhes são peculia-

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res, como o das exações aduaneiras submetidas ao Poder Central, assim como o controle aduaneiro de mercadorias.

Seus institutos jurídicos são específicos e próprios, como os regimes adu-aneiros, a vistoria, a fiscalização. Outros exemplos encontram-se na caracterís-tica própria que o depósito realizado na área aduaneira possui, as quais diferen-ciam do depósito regulado pela área cível.

A transmissão de propriedade se efetiva por meio do B.L., enquanto que, no direito civil, ocorre por meio da tradição ou registro. Outras diferenças po-dem ser encontradas na questão do abandono e também do regime das exone-rações. Todas as normas aduaneiras possuem natureza pública.

Possui conceitos próprios, como classificação de mercadorias, valores, tarifas. A propósito, por importação deve-se compreender o processo por meio do qual uma mercadoria ou serviço consegue transpor uma fronteira aduaneira com destino ao nosso país. Exportação é a mesma coisa, mas em sentido in-verso. O contencioso aduaneiro possui características e prazos próprios, com forte influência das políticas econômicas. Ademais, o acelerado dinamismo do comércio exterior se deve, em grande parte, pelo impacto do intervencionis-mo estatal no plano internacional através da celebração de tratados e acordos. Como fontes do direito aduaneiro na perspectiva internacional, tem-se que os acordos internacionais sobre dupla tributação afetam diretamente as normas aduaneiras nacionais.

Nem toda mercadoria importada é inserida na economia nacional. Esse fato somente ocorre quando há a nacionalização do produto ou serviço por meio do pagamento de toda a carga tributária brasileira.

Diante do emaranhado de normas editadas e publicadas por diversos órgãos, recorre-se constantemente à analogia, resultando numa forte atividade discricionária, especialmente por partes da fiscalização.

O contencioso aduaneiro possui características e prazos próprios, com forte influência das políticas econômicas. Ademais, o acelerado dinamismo do comércio exterior se deve, em grande parte, pelo impacto do intervencionismo estatal no plano internacional através da celebração de tratados e acordos.

Como fontes do direito aduaneiro na perspectiva internacional, tem-se que os acordos internacionais sobre dupla tributação afetam diretamente as normas aduaneiras nacionais. Seguem alguns acordos neste e noutros sentidos, aprovados pelo Brasil e já incorporados:

– Decreto nº 18.850/1929 – Convenção Internacional para Simplifi-cação das Formalidades Aduaneiras.

– Lei nº 313/1948 – Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comér-cio – GATT 1947.

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– Decreto nº 1.355/1994 – Acordo Constitutivo da Organização Mun-dial de Comércio – OMC. Antidumping, subsídios e medidas com-pensatórias, salvaguardas, valoração aduaneira.

– Decreto nº 350/1991 – Tratado de Assunção – Mercosul.

– Decreto nº 91.366/1985 – Convênio Multilateral sobre Cooperação e Assistência Mútua entre as Direções Nacionais de Aduanas da América Latina.

– Decreto nº 6.797/2009 – Promulga o Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte para Evitar a Dupla Tributação dos Lucros Decorrentes do Transporte Marítimo e Aéreo, firmado em Brasília, em 27 de julho de 2005.

– Decreto nº 6.332/2007 – Promulga a Convenção Adicional Alteran-do a Convenção entre a República Federativa do Brasil e o Reino da Bélgica para Evitar a Dupla Tributação e Regular Outras Questões em Matéria de Impostos sobre a Renda e o Protocolo Final, assina-dos em Brasília em 23 de junho de 1972, celebrada em Brasília, em 20 de novembro de 2002.

– Decreto nº 4.510/2002 – Dispõe sobre a execução do Trigésimo Primeiro Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Eco-nômica nº 14, entre os Governos da República Federativa do Brasil e da República Argentina, de 11 de novembro de 2002.

– Decreto nº 4.089/2002 – Promulga a Convenção Internacional do Café – AICafé/2001.

– Decreto nº 2.975/1999 – Promulga o Acordo de Transporte Rodovi-ário Internacional de Passageiros e Carga, celebrado entre o Gover-no da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Venezuela, em Caracas, em 4 de julho de 1995.

– Decreto nº 1.765/1995 – Dispõe sobre a vigência das Resoluções do Grupo Mercado Comum e das Decisões do Conselho do Merca-do Comum que menciona.

No plano constitucional, a relação com o direito aduaneiro é notada em inúmeros dispositivos constitucionais, citando-se a título exemplificativo:

Art. 1º [...]

IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa são um dos cinco fun-damentos da República Federativa do Brasil, ao lado da Soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana e do pluralismo político;

[...]

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Art. 3º [...]

II – Um dos quatro objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: garantir o desenvolvimento nacional;

III – erradicação da pobreza e a marginalização e redução das desigualdades sociais e regionais;

Art. 4º [...]

IX e parágrafo único: nas relações internacionais, a República Federativa do Brasil rege-se, entre outros, pelo princípio da cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, e no tocante à América Latina, buscando a integração econômica, política, social e cultural;

Art. 5º [...]

XXXVII – não haverá juízo ou tribunal de exceção;

[...]

LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade compe-tente;

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

LVI – são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;

LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

[...]

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

[...]

VII – política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores;

VIII – comércio exterior e interestadual;

[...]

Art. 205. A educação, direito de todos, e dever do Estado e da família, será pro-movida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desen-volvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualifica-ção para o trabalho;

[...]

Art. 237. A fiscalização e o controle sobre o comércio exterior, essenciais à defesa dos interesses fazendários nacionais, serão exercidos pelo Ministério da Fazenda.

A legislação ordinária, específica sobre esta área, é o Regulamento Aduaneiro, Decreto nº 6.759/2009. Sua especificidade é tão impactante na área

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de comércio exterior que pode ser ilustrada pela redação do art. 1º, onde se lê: “A administração das atividades aduaneiras, e a fiscalização, o controle e a tri-butação das operações de comércio exterior serão exercidos em conformidade com o disposto neste decreto”. Trata-se do livro base de qualquer operador de comércio exterior.

O Código Tributário Nacional, na qualidade de lei complementar, dispõe sobre as normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, sem prejuízo da respectiva legislação com-plementar, supletiva ou regulamentar que, no plano do direito aduaneiro, sofre intensa influência do Regulamento Aduaneiro.

Os crimes são tratados pelo direito penal, especificamente o contrabando e o descaminho, pelo art. 334 e parágrafos do Código Penal.

Subsidiariamente, em grau hierárquico inferior, a Secretaria da Receita Federal do Brasil normatiza, através de portarias, instruções normativas, ato de-claratórios, uma infinidade de institutos jurídicos próprios do direito aduaneiro previstos no Regulamento Aduaneiro.

2 DISTINÇÃO ENTRE INFRAÇÕES ADUANEIRAS E TRIBUTÁRIAS E A QUESTÃO DAS RESPONSABILIDADES OBJETIVA E SUBJETIVA

No decorrer das atividades aduaneiras, os operadores de comércio exte-rior se deparam, naturalmente, com as fiscalizações por parte do Poder Público; afinal de contas, são inúmeros os princípios e interesses públicos envolvidos, a exemplo da soberania, segurança, balança comercial, economia, meio ambien-te, saúde pública, política fazendária, entre outros.

Com o escopo de proteger a sociedade nacional no que toca ao tráfego internacional de mercadorias, veículos e pessoas, o legislador brasileiro esta-beleceu, através de legislação e normas infralegais – como decretos, instruções normativas e portarias –, conceitos e parâmetros de modo a auxiliar o Poder Público na fiscalização e prevenção de prejuízos aos cofres públicos e crimes.

Grande parte das normas de direito aduaneiro são reflexos das políticas implementadas durante regimes de exceção, muitas delas em vigência até os dias atuais. Ao contrário do sustentado por grande parte do Governo, bem como por muitos – mas não todos – Auditores Fiscais, essas normas refletem um atraso e um prejuízo econômico a todos os envolvidos no comércio exterior.

Frise-se que a essência do direito aduaneiro é regulatória. Explica-se isto na medida em que sua essência é administrativa. E essas relações de comércio internacional que afetam a Aduana fazem os órgãos intervenientes atuarem so-mente quando provocados.

Neste meio tempo, através do poder de polícia, as autoridades iniciam a fiscalização aduaneira a fim de saber se as obrigações aduaneiras estão sendo

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devidamente cumpridas. Essas obrigações são entendidas como sendo o devido cumprimento das formalidades exigidas no âmbito administrativo pelos órgãos provocados na operação de comércio exterior.

E o problema ocorre quando os representantes do Poder Público en-tendem que a operação comercial declarada configura infração aduaneira ou mesmo que esteja acompanhada de simples indícios neste sentido. Mas o que se deve entender como sendo infração aduaneira? O Decreto-Lei nº 37/1966 estabelece um conceito a respeito no art. 94. Eis sua redação:

Art. 94. Constitui infração toda ação ou omissão, voluntária ou involuntária, que importe inobservância, por parte da pessoa natural ou jurídica, de norma estabe-lecida neste decreto-lei, no seu regulamento ou em ato administrativo de caráter normativo destinado a completá-los.

Ao se observar o art. 673 do Regulamento Aduaneiro – Decreto nº 6.759/2009 –, tem-se que o legislador adotou o conceito anteriormente men-cionado e o transpôs na sua integralidade.

Art. 673. Constitui infração toda ação ou omissão, voluntária ou involuntária, que importe inobservância, por parte de pessoa física ou jurídica, de norma estabele-cida ou disciplinada neste decreto ou em ato administrativo de caráter normativo destinado a completá-lo. (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 94, caput)

Portanto, tem-se que qualquer ato ou omissão que contrarie as normas deste decreto ou regulamento serão entendidos como infrações aduaneiras. Não bastasse tratar-se de um termo genérico, vale lembrar, a título exemplifi-cativo, que o Decreto-Lei nº 1.455/1976, bem como as Instruções Normativas nºs 1169/2011 e 228/2002, em caso de suspeitas de infração vinculada ao des-tinatário final, valor, origem, capacidade e disponibilidade financeira, permitem a apreensão de até 180 dias de uma mercadoria e procedimentos direcionados a perdimentos.

Estudiosos do direito aduaneiro lecionam que as infrações podem ser classificadas em até três grupos: a) aquelas que violam diretamente os cofres públicos; b) infrações resultantes de violações administrativas; c) mistas. Neste sentido:

[...] a legislação aduaneira brasileira estabelece dois grupos de infrações adua-neiras: as infrações fiscais (tributárias) e as infrações administrativas ao controle das importações (de natureza não tributária). Assim, a infração aduaneira possui contornos mais amplos do que ser simplesmente uma subespécie das infrações tributárias.

Com apoio na doutrina (Ruy Barbosa Nogueira, Rubens Gomes de Souza, Sacha Calmon Navarro Coelho), podem-se distinguir dois tipos de infrações: as substanciais ou materiais e as formais, aquelas caracterizadas pelo desrespeito à obrigação tributária principal, e estas as que vulneram a obrigação acessória. As infrações substanciais atingem diretamente o poder de tributar, enquanto as

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formais o poder de regulamentar e acarretam apenas uma punição disciplinar (multas isoladas). (Carlucci, 2000, p. 218)1

Desenvolvendo estudos a respeito, a Comissão Especial de Direito Adua-neiro da OAB/SP – no triênio 2012-2015 –, sob a minha presidência, publicou em seu site uma apostila que, dentre outros assuntos, contempla esta temática, a qual é transcrita neste trabalho, a saber:

Dependendo do ramo jurídico que se trate, teremos uma infração de nature-za administrativa, civil, penal etc. Nesse sentido, as infrações aduaneiras são gênero, cujas espécies serão: infração aduaneiro-tributária; infração aduaneira não-tributária e infração aduaneira de caráter misto. Todas elas podem derivar de um único fato e desencadear sanções de naturezas diversas, aplicadas cumu-lativamente, o que é inadequado, desnecessário e injusto (proporcionalidade em sentido estrito). Sempre se doutrinou que no campo das penalidades a mais grave é a que deve prevalecer e absorver as mais brandas. Nesse panorama, o direito aduaneiro comporta inúmeras infrações decorrentes do ingresso de bens e pes-soas. Na relação aduaneira, poderíamos adotar três principais relações jurídicas, lembrando a posição da Prof. Regina Helena em sua recente e abalizada obra (Curso de direito tributário). São elas: (i) relação jurídica de cunho formal (fazer ou deixar de fazer algo em virtude do interesse da fiscalização e arrecadação); (ii) relação jurídica de dar (pagar tributos); e (iii) relação jurídica sancionadora (aplicação de penalidades decorrentes de infrações).2

O fato é que a essência, não só das relações aduaneiras, mas também das infrações aduaneiras, é o caráter administrativo/regulatório. A infração aduaneira decorre do não atendimento de uma obrigação. Por isso não se en-tende pela pertinência de se falar em obrigação principal e acessória no campo do direito aduaneiro. Uma vez descumprida, o poder de polícia agirá, posto que a violação estará caracterizada.

A Convenção de Quioto, não ratificada pelo Brasil, estabelece alguns parâmetros em seu anexo H.2 no sentido de caracterizar infrações aduaneiras. Não por menos prevê neste cenário quaisquer oposições, obstruções à adua-na, falsidade de documentos, enfim, formas de violação aduaneiras. O Código Tributário Nacional – Lei nº 5172/1966 – é aplicado à realidade aduaneira de forma complementar e subsidiária, motivo pelo qual se torna imprescindível esclarecer a infração tributária. Mas não há que se confundir. A propósito:

Não há que se confundir o direito aduaneiro com o direito tributário, na sua porção disciplinadora dos tributos sobre o comércio exterior, uma vez que as relações jurídicas compreendidas no primeiro são de natureza necessariamente administrativa, ainda que, por vezes, voltadas à realização de fins tributários. O

1 CARLUCCI, José Lence. Uma introdução ao direito aduaneiro. 2. ed. São Paulo: Aduaneiras, 2000.2 Vide Cartilha. Disponível em: <http://www.oabsp.org.br/comissoes2010/direito-aduaneiro/cartilhas>.

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caráter regulatório, típico do direito aduaneiro, faz exsurgir o ponto de toque entre essa disciplina e o direito tributário: a extrafiscalidade.3 (Costa, 2004, p. 36)

No campo tributário, entende-se que o descumprimento, omissivo ou co-missivo, de preceitos decorrentes de normas tributárias voltadas à preservação dos cofres públicos e das instituições correspondentes, representa a infração tributária. Vale lembrar que esta omissão ou ação pode-se correlacionar com di-versas áreas jurídicas, atingindo, portanto, não só o cofre público, mas a própria sociedade. Não por outro motivo, as legislações preveem as penalidades e res-ponsabilidades correspondentes, tanto na esfera aduaneira quanto na tributária.

Neste sentido:

O ordenamento jurídico, como forma de tornar possível a coexistência do ho-mem em comunidade, garante, efetivamente, o cumprimento das suas ordens, ainda que, para tanto, seja necessária a adoção de medidas punitivas que afetem a propriedade ou a própria liberdade das pessoas. Daí por que, ao criar uma prestação jurídica, concomitantemente o legislador enlaça uma providência san-cionatória ao não cumprimento do referido dever.4 (Carvalho, 2011)

A diferença prática entre ambas as infrações reside única e exclusiva-mente no fato de elas se originarem de uma relação em que, de um lado, a obrigação violada tem caráter regulatório e, de outro, fiscalista direcionado à arrecadação tributária. A natureza da obrigação violada aduaneira, configura-dora da infração aduaneira, é extrafiscal.

No decorrer deste trabalho, foi mencionado que grande parte das normas que afetam o cotidiano dos operadores em comércio exterior são decorrentes de regimes de exceção, elaboradas sob fortes regimes ditatoriais. E o tema da responsabilidade dos agentes de comércio exterior e dos importadores não é diferente, conforme se observa da redação do art. 136 do Código Tributário Nacional e do parágrafo único do art. 673 do Regulamento Aduaneiro:

Art. 136. Salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato.

Art. 673. [...]

Parágrafo único. Salvo disposição expressa em contrário, a responsabilidade por infração independe da intenção do agente ou do responsável e da efetivida-de, da natureza e da extensão dos efeitos do ato. (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 94, § 2º).

Da leitura dos artigos comentados, lamentavelmente se observa que:

3 COSTA, Regina Helena. Notas sobre a existência de um direito aduaneiro. In: FREITAS, Vladimir P. Importação e exportação no Direito brasileiro. São Paulo: RT, 2004.

4 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

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Não é necessário o querer fraudar e/ou enganar; é desnecessário o resultado material; o ônus da prova é simplesmente invertido. Princípios norteadores da Constituição da República Federativa do Brasil, tidos como Direitos Fundamen-tais, simplesmente estão sendo contrariados e o pior, entendimento este acompa-nhado por grande parte do Poder Judiciário.5

As conclusões apontadas resultam em diversas sanções: perdimento de bens, moedas e veículos; multas; advertência, suspensão, cassação. E vale lem-brar que nenhuma das penalidades aplicadas implica exclusão das execuções fiscais que porventura se fizerem necessárias.

Citando posicionamento de Luiz Flávio Gomes, Eduardo Sabbag leciona que:

Por fim, destacamos a lição do eminente Professor Luiz Flávio Gomes, para quem o art. 136 é inconstitucional, pois trata da “responsabilização no sentido obje-tivo”, permitindo a aplicação de sanção sem dolo ou culpa, conflitando com o princípio constitucional da presunção de inocência.

Frise-se, a esse respeito, que as ocorrências de uma infração tributária pressupõem, todavia, no mínimo, a culpabilidade do agente. Por isso, a legisla-ção tributária alberga, em alguns dispositivos, o princípio da verdade material, em razão do qual os fatos favoráveis ao contribuinte devem ser considerados, como no caso dos arts. 112 (interpretação benigna) e 108, § 2º (utilização da equidade), ambos do CTN.

Vale dizer que o contribuinte não pode ser punido quando tenha agido com boa-fé, sem pretender ludibriar o Fisco, nem lhe ter abrandado o tratamen-to quando o rigor da norma se mostrar inafastável. (Sabagg, 2005, p. 760)6

Salienta-se que a responsabilidade não se limita apenas ao agente. Ela pode alcançar terceiros, sem que seja caracterizada como sendo solidária, con-junta ou subsidiária, como se nota pelos arts. 137 do CTN e 674 do RA:

Art. 137. A responsabilidade é pessoal ao agente:

I – quanto às infrações conceituadas por lei como crimes ou contravenções, sal-vo quando praticadas no exercício regular de administração, mandato, função, cargo ou emprego, ou no cumprimento de ordem expressa emitida por quem de direito;

II – quanto às infrações em cuja definição o dolo específico do agente seja ele-mentar;

5 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; [...] LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; [...]”

6 SABAGG, Eduardo. Manual de direito tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

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III – quanto às infrações que decorram direta e exclusivamente de dolo especí-fico:

a) das pessoas referidas no art. 134, contra aquelas por quem respondem;

b) dos mandatários, prepostos ou empregados, contra seus mandantes, preponen-tes ou empregadores;

c) dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito priva-do, contra estas.

Art. 674. Respondem pela infração (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 95):

I – conjunta ou isoladamente, quem quer que, de qualquer forma, concorra para sua prática ou dela se beneficie;

II – conjunta ou isoladamente, o proprietário e o consignatário do veículo, quanto à que decorra do exercício de atividade própria do veículo, ou de ação ou omis-são de seus tripulantes;

III – o comandante ou o condutor de veículo, nos casos do inciso II, quando o veículo proceder do exterior sem estar consignado a pessoa física ou jurídica estabelecida no ponto de destino;

IV – a pessoa física ou jurídica, em razão do despacho que promova, de qualquer mercadoria;

V – conjunta ou isoladamente, o importador e o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por conta e ordem des-te, por intermédio de pessoa jurídica importadora (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 95, inciso V, com a redação dada pela Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 78); e

VI – conjunta ou isoladamente, o importador e o encomendante predeterminado que adquire mercadoria de procedência estrangeira de pessoa jurídica importa-dora (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 95, inciso VI, com a redação dada pela Lei nº 11.281, de 2006, art. 12).

Parágrafo único. Para fins de aplicação do disposto no inciso V, presume-se por conta e ordem de terceiro a operação de comércio exterior realizada mediante utilização de recursos deste, ou em desacordo com os requisitos e condições estabelecidos na forma da alínea b do inciso I do § 1º do art. 106 (Lei nº 10.637, de 2002, art. 27; e Lei nº 11.281, de 2006, art. 11, § 2º).

A respeito da responsabilidade pessoal prevista no inciso I do art. 137 do CTN, há claro direcionamento da responsabilidade pela infração ao agente exe-cutor do ato. Não que a pessoa jurídica que ele porventura represente deixe de ser responsável administrativamente. Mas incidirá no agente a responsabilidade específica pelo ato violador de regras.

Não por acaso estas exceções trata-se de crimes ou situações em que há necessidade de existir, além do dolo genérico, o específico, seja para prejudicar o Fisco, como no caso do inciso II, como para prejudicar o próprio empregador ou representado, a exemplo do inciso III do art. 137.

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Ao abordar as situações nas quais há configuração de crime ou con-travenção, Sabagg aponta um exemplo clássico e costumeiro que ocorre nas importações, a saber:

Não raras as vezes, os fatos que são crimes tributários apresentam-se também como infrações fiscais, implicando sanções penais (pelo juiz, no processo judi-cial) e sanções fiscais (pela autoridade administrativa, no processo administrati-vo). Assim, exemplificadamente, se uma empresa importadora comete infração à legislação aduaneira tipificada como crime ou contravenção (infração penal cometida por intermédio ou em benefício da pessoa jurídica), a responsabilidade é exclusiva da pessoa natural que tiver cometido a infração aduaneira. A regra, entretanto, pode ser excepcionada em duas situações: a prova, pelo agente, de que teria agido no “regular exercício da administração”: embora pareça estranho alguém estar no regular exercício de gestão e cometer crime ou contravenção, a situação torna-se factível no casos em que o agente comete o ilícito na condição de mero portador da vontade da empresa (e de seus sócios). É natural que se deva, portanto, desonerar o infrator da responsabilização, cujo ônus deve recair sobre a pessoa jurídica; a prova, pelo agente, de que teria cumprido ordem expressa por quem de direito: seguindo a interpretação semelhante à do item precedente, é natural que se deva privilegiar a responsabilização de quem tenha ordenado a ação ou omissão, em benefício daquele que se viu no dever e cumprir ordem expressa por quem de direito. Aqui, de igual modo, o infrator será, com justiça, desonerado. (Sabbag, 2005, p. 761-762)

Frise-se que a pessoa jurídica, embora possa não ser alcançada em casos específicos, a exemplo do art. 137 do CTN, no campo fiscal, continua respon-sável pelo pagamento de todos os tributos. Em linhas gerais, a responsabilidade é objetiva. Excepcionalmente, o subjetivismo – análise de dolo ou culpa – é levado em consideração pela Secretaria da Receita Federal.

Tratando-se de infrações, ultrapassadas as diferenciações teóricas entre a aduaneira e a meramente tributária, bem como das responsabilidades, os dois campos do Direito se entrelaçam novamente no que tange aos aspectos que antecedem a configuração das atividades compreendidas como infrações.

Por isso, entende-se pela pertinência de se abordar as temáticas da si-mulação, dos indícios, da fraude e dos limites da utilização das presunções em processos administrativos aduaneiros, o que se faz no tópico a seguir.

3 DA PRESUNÇÃO DE IRREGULARIDADES NO PROCESSO TRIBUTÁRIO E ADUANEIRO

Tomando-se por base a segurança jurídica, reflexo do princípio da tipi-cidade fechada, nobre pilar constitucional, quando do lançamento ou da la-vratura do auto de infração fiscal aduaneiro, cabe aos auditores fiscais buscar a verdade material na investigação a respeito do objeto das instruções normativas a que se aborda neste trabalho.

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A presunção quanto à suspeita de fraude vinculada à origem do capital ou produto envolvido na operação de comex, assim como na identificação do verdadeiro importador ou exportador, deve ser analisada com limitações. Por presunção entende-se que se trata do exercício de se extrair, de uma lógica ou fatos corriqueiros na realidade aduaneira, uma verdade. Legalmente, não é proibida sua utilização, inclusive por parte do Fisco, motivo pelo qual a legis-lação prevê a presunção absoluta – iuris et de juris – e relativa – iuris tantum. Trabalha-se em algo inexistente, supondo sê-lo existente, diante de outros fatos conhecidos7.

Tarefa árdua esta de se presumir uma simulação, fraude, indícios de quaisquer irregularidades, e, sem o devido processo legal, contraditório e am-pla defesa, submeter uma empresa aos procedimentos especiais que poderão, inclusive, resultar em perda de CNPJ, perdimento da mercadoria, representação fiscal para apuração de sonegação e também representação ao Ministério Públi-co Federal para averiguação de práticas criminosas.

De um lado o agente da fiscalização intui a ocorrência de algo irregular, diante de outros fatos conhecidos, motivo pelo qual se instauram os procedi-mentos especiais a que as instruções normativas disciplinam. Inexiste ilegalida-de nesta conduta.

Todavia, é preciso parcimônia nesta tarefa. Não por outro motivo que o Fisco, na busca incessante por sonegações fiscais ou práticas que atentem contra a legislação nacional, jamais poderá presumir uma irregularidade com base em meros indícios e afrontar princípios do devido processo legal e contra-ditório, legalidade, tipicidade fechada, de forma a suprimir um dos pilares de equilíbrio social que é a segurança jurídica.

A partir do momento, porém, em que as conjecturas da autoridade administrati-va começam a materializar-se em atos concretos contra o contribuinte, é mister venham observados alguns pressupostos e requisitos, de modo a não lhe violen-tar direitos subjetivos fundamentais. Noutros falares, o Estado deve comprovar a culpabilidade do contribuinte, que é constitucionalmente presumido inocente. Esta é uma presunção iuris tantum, que só pode ceder passo com mínimo de provas produzidas, já na órbita administrativa, por meio do devido processo legal e com a garantia da ampla defesa. A pretexto de combater a fraude ou agilizar a arrecadação, à Fazenda Pública não é dado presumir fatos para compelir os contribuintes a pagar tributos ou a suportar multas fiscais.8

Neste sentido:

Tributário. Liberação de mercadorias importadas. Pena de perdimento. Declara-ção errônea quanto à procedência das mercadorias. Erro suscetível de regulari-

7 Vide valiosíssimos comentários de CARRAZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 525.

8 CARRAZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 527-528.

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zação. 1. Caso em que, por não constar nas DIs a correta procedência das mer-cadorias, a autoridade competente entendeu ter ocorrido infração consistente na “falsificação de característica essencial de mercadoria importada, capaz de difi-cultar a sua identificação”, insuscetível de regularização. 2. Não há confundir er-rônea declaração de procedência com mercadorias falsas. Havendo divergência a respeito da correta identificação ou classificação das mercadorias importadas, deve ser concedida ao importador a possibilidade de regularizar essa situação, não podendo a autoridade fiscal, desde logo, decretar a pena de perdimento, porquanto, implicando aqueles atos interpretação da legislação aduaneira, não se pode exigir do empresário que conheça a adotada pelo Fisco. (TRF 4ª R., Ag 63640/PR, 1999.04.01.063640-3, 2ª T., Relª Tânia Terezinha Cardoso Escobar, DJ 18.11.1999, publ. DJ 02.02.2000, p. 24)

Partindo da premissa de que o indício não leva à certeza, embora, pelo menos em tese, a aproxime de forma substancial, uma determinação adminis-trativa pautada apenas em indícios sempre deixará aberta a porta da incerteza. Não por acaso, defende-se que direitos fundamentais do ser humano, a exem-plo da liberdade e propriedade, tidos como da órbita dos direitos humanos, em hipótese alguma poderão ser limitados ou censurados pelo Fisco com base em presunções ou indícios, ainda mais quando fundamentados em instruções nor-mativas, as quais, sob o ponto de vista hierárquico, são infinitamente inferiores aos princípios constitucionais acima identificados. Diante disto, é de funda-mental importância identificar corretamente quais as atitudes configuradoras da fraude e simulação aduaneira, de forma a ilidir quaisquer irregularidades nas operações financeiras de comex, bem como a interposição fraudulenta de pessoas para fins de sonegação fiscal, o que se fará no tópico a seguir.

4 DAS SANÇÕES E PENALIDADES ADUANEIRASPara se identificar as penalidades de caráter aduaneiro, deve-se recorrer

à leitura do art. 675 do Regulamento Aduaneiro. Entre os arts. 676 ao 687 do Regulamento Aduaneiro, são tratadas as questões da aplicação e graduação das penalidades. Mas quais seriam essas penalidades?

Art. 675. As infrações estão sujeitas às seguintes penalidades, aplicáveis separada ou cumulativamente (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 96; Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, arts. 23, § 1º, com a redação dada pela Lei nº 10.637, de 2002, art. 59, e 24; Lei nº 9.069, de 1995, art. 65, § 3º; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 76):

I – perdimento do veículo;

II – perdimento da mercadoria;

III – perdimento de moeda;

IV – multa; e

V – sanção administrativa.

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Por sanções administrativas não pecuniárias, conforme art. 735 do Regu-lamento Aduaneiro, identificam-se as seguintes: advertência, suspensão e cassa-ção ou cancelamento. Importante lembrar que a lei tributária, em seu art. 112, prevê interpretação mais favorável ao acusado, quando houver dúvidas quanto à capitulação legal do fato, autoria/imputabilidade/punibilidade, natureza da penalidade aplicável ou sua graduação.

No mesmo sentido, é preciso frisar que não haverá aplicação de pena-lidades, consoante redação do art. 681 do Regulamento Aduaneiro, enquan-to prevalecer entendimento de acordo com interpretação fiscal favorável ao agente, interessado ou parte em processos administrativos, bem como em atos expedidos pela SRFB.

4.1 PerdimentO

A pena do perdimento é considerada a mais gravosa no procedimen-to aduaneiro. Tratada de forma específica no Regulamento Aduaneiro – arts. 688 a 701 do RA –, decorre de infrações aduaneiras cuja finalidade especí-fica é resultar em danos aos cofres públicos, segundo entendimento do Decreto--Lei nº 1.455/1976. Os procedimentos adotados em processos administrativos aduaneiros cuja pena pode resultar em perdimento são variados conforme a finalidade. Se constatada intenção do agente em causar danos ao Erário, aplica--se o procedimento do decreto acima citado; caso contrário, a exemplo do que ocorre no abandono de mercadorias, pelo art. 642 do RA, em que os prazos são distintos quando da configuração do abandono. Consoante redação dos arts. 660 c/c 689, ambos do Regulamento Aduaneiro, a pena de perdimento poderá ser convertida em multa proporcional ao valor aduaneiro caso a merca-doria importada tenha sido consumida ou não localizada, cujo processamento ocorrerá por meio do rito previsto no art. 73 da Lei nº 10.833/2003. Outro ponto em que a pena de perdimento poderá ser convertida em multa decorre da comprovação de responsabilidade de infração aduaneira perpetrada pelo operador de transporte multimodal.

De qualquer maneira, a competência para decidir o processo de perdi-mento, nos termos do art. 27 do DL 1.455/1976 c/c 690, § 5º do RA, é do Minis-tro da Fazenda. Ocorre que, através do art. 12 do DL 200/1967 e do Regimento Interno da SRFB e Portaria MF nº 203, de 2012, esta competência foi delegada aos Delegados e Inspetores da Receita Federal. Diferentemente de outros proce-dimentos de fiscalização aduaneiros, a instância é única, vale dizer, da decisão que aplicar a pena de perdimento, não caberá recurso ao CARF. O contribuinte ou o interveniente em nome deste deverá procurar um advogado para impetrar ação ordinária de nulidade de auto de infração ou mandado de segurança.

Sugere-se que ambas as ações contenham um pedido liminar a fim de tentar sustar uma hasta pública/leilão ou demonstrar ilegalidade de eventual ato praticado pela Administração Pública e liberar a mercadoria.

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O perdimento pode ser aplicado a veículos. Costumeiramente, essa pena é aplicável quando, por exemplo, veículo usado é importado, ou a fiscalização crê em subfaturamentos ou tenha dúvidas quanto a destinatários finais, poten-cial financeiro do importador e disponibilidade efetiva financeira, ou, conforme art. 688, VI, do RA, quando o veículo terrestre utilizado em trânsito aduaneiro desviar-se da rota previamente estabelecida sem motivo justificado.

Aplica-se também essa pena a mercadorias. Extremamente comum. Infe-lizmente. Mensalmente clientes procuraram o escritório a fim de impugnarem autos de infrações decorrentes de procedimentos especiais de fiscalização pelos procedimentos previstos no Decreto-Lei nº 1.455/1976, IN 1.169/2011 e IN 228/2002, ambas da SRFB.

4.2 multas

A multa pode ser de ofício ou de mora, sendo a primeira consistente na-quela aplicada no próprio auto de infração em face de alguma infração perpe-trada pelo agente. No que tange à segunda, entende-se que, por não ter caráter punitivo, sua finalidade desestimula o cumprimento da obrigação fora de prazo.

O Anexo II desta apostila contém todas as situações em que são aplicá-veis, bem como os percentuais respectivos de cada multa, seja na importação/exportação, seja em ambos.

Vale destacar que esse tema será abordado no tópico da denúncia espon-tânea, especificamente pela falta de apresentação de documentos e sua relação com a Lei nº 12.350, de 2010.

De qualquer maneira, importa elucidar a matéria correlacionando-se al-guns dispositivos referentes a uma situação muito corriqueira, vale dizer, a mul-ta de ofício, prevista nos arts. 725 do RA e 44 da Lei nº 9.430/1996:

Nos casos de lançamentos de ofício, relativos a operações de importação ou de exportação, serão aplicadas as seguintes multas, calculadas sobre a totalida-de ou a diferença dos impostos ou contribuições de que trata este decreto (Lei nº 9.430, de 1996, art. 44, inciso I, e § 1º, com a redação dada pela Lei nº 11.488, de 2007, art. 14):

I – de setenta e cinco por cento, nos casos de falta de pagamento, de falta de de-claração e nos de declaração inexata, excetuada a hipótese do inciso II; e

II – de cento e cinquenta por cento, independentemente de outras penalidades administrativas ou criminais cabíveis, nos casos previstos nos arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502, de 1964.

Se o agente não cumprir o exigido pelo Fisco, a multa será elevada ao percentual de 112,5% e 225%, nos termos do parágrafo único, que se segue:

Parágrafo único. As multas a que se referem os incisos I e II passarão a ser de cento e doze inteiros e cinco décimos por cento e de duzentos e vinte e cinco

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por cento, respectivamente, nos casos de não atendimento pelo sujeito passivo, no prazo marcado, de intimação para (Lei nº 9.430, de 1996, art. 44, § 2º, com a redação dada pela Lei nº 11.488, de 2007, art. 14):

I – prestar esclarecimentos;

II – apresentar a documentação técnica referida no § 1º do art. 19; ou

III – apresentar os arquivos ou sistemas de que trata o § 2º do art. 19.

Esta multa será exigida juntamente com o tributo ante o não-pagamento ou, de forma isolada, caso tenham sido recolhidos os pagamentos relativos aos tributos ou às contribuições.

Há possibilidade de redução dessas multas, desde que sejam atendidos os requisitos previstos nos arts. 732 do RA, com amparo na Lei nº 9.430/1926, art. 44, § 3º, e art. 28 da Lei nº 11.941, de 2009, desde que, no prazo para im-pugnação – 30 dias – ocorra ou pagamentos ou parcelamentos, nas seguintes proporções: 50% se pago no período da impugnação; 40% se requerer parce-lamento no prazo da impugnação; 30% para pagamento em 30 dias da ciência da decisão de primeira instância; 20% se requerer parcelamento em 30 dias da ciência da decisão de primeira instância.

Nos casos de multa, o contribuinte tem a possibilidade, ao contrário do perdimento, de impetrar recurso administrativo junto ao CARF. Por fim, o art. 682 destaca a impossibilidade de se aplicar multas de ofícios na constituição de créditos tributários destinados a prevenir decadência, referente a tributos fe-derais nos casos de o interessado obter liminares judiciais a seus favores. Ponto condicionante é que referida medida judicial seja obtida antes de instauração de auto de infração e outro procedimento de ofício. Portanto, inaplicável nos casos de despacho aduaneiro iniciado.

5 DA SIMULAÇÃO NA PRÁTICA DE ILÍCITOS ADUANEIROS; INFRAÇÃO, SONEGAÇÃO E FRAUDE FISCAL À LUZ DO ARTIGO 112 DO CTN VERSUS PODER DE ATUAÇÃO DO SERVIDOR

De início, vale reportar-se à regra prevista no art. 110 do CTN, que prega o respeito aos institutos, conceitos, efeitos, formas e regras de direito privado. Eis sua redação:

Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou impli-citamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.

A importância deste artigo em relação ao ato simulatório justifica-se na medida em que o sistema tributário e aduaneiro adota o mesmo conceito de simulação, posta, estudada e legislada no Código Civil, especificamente,

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arts. 167 e 169. O ato simulado inexiste, motivo pelo qual não se convalesce pelo tempo, nos termos do art. 169 do CC, assim como não pode ser confirmado por lapsos temporais. Suas características centrais podem ser assim elencadas: discrepância entre a vontade convencionada pelas partes originárias, daquela manifestada em documento escrito; intenção de prejudicar terceiros, pessoas privadas ou públicas; objetivo de esconder a real situação de forma a fraudar a legislação pública.

Sob a vigência atual, inexiste a antiga divisão entre simulação absoluta ou maliciosa e a relativa ou inocente. Prevaleceu o entendimento de que o ato simulado deve ser banido das relações sociais, diante dos inúmeros prejuízos causados a todos interessados, inclusive ao Fisco. Desta feita, a ineficácia total dos efeitos do ato simulatório tornou-se medida imperativa e, no entender deste trabalho, correta.

Resta evidente, destarte, que o ato simulado não produz nenhum efeito, até porque ele inexiste quanto a sua substância, motivo pelo qual importadores e exportadores que porventura se sujeitarem a esta prática deverão responder cível e criminalmente.

O devido processo legal, tanto na órbita administrativa quanto judiciária, mostra-se de vital importância. No caso, tendo em vista a gravidade do fato e de suas consequências, há de se preservar amplo direito de defesa e, a partir daí, uma vez constatada e comprovada esta conduta maliciosa, que sejam aplicadas as sanções correspondentes.

O Regulamento Aduaneiro, por meio do art. 673, conceitua a infração. Eis sua redação:

Constitui infração toda ação ou omissão, voluntária ou involuntária, que importe inobservância, por parte de pessoa física ou jurídica, de norma estabelecida ou disciplinada neste decreto ou em ato administrativo de caráter normativo destina-do a completá-lo (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 94, caput).

Discorrendo a respeito, Paulo Cesar Alves Rocha entende que:

É muito comum a confusão entre indício de infração e infração propriamente dita. A primeira serve como orientação para apuração de uma possível infração. A segunda deve ser provada com elementos consistentes, não sendo cansativo lembrar que deve haver necessariamente um processo. Este processo deve seguir os preceitos do artigo quinto da Constituição Federal no tocante à existência de processo formal, do direito ao contraditório e ao direito de defesa. Deve ser cumprido também o item IV do art. 150 da Constituição Federal que proíbe a existência de penas de confisco, ou seja, a aplicação de pena de perdimento de mercadoria só pode ser aplicada a mercadoria abandonada, pois enquanto existir um sujeito passivo da obrigação tributária e este não abandonar a mercadoria, a Fiscalização deve aplicar penas pecuniárias.9

9 ROCHA, Paulo Cesar Alves. Regulamento aduaneiro anotado. 14. ed. São Paulo: Aduaneiras, 2009. p. 666.

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O Regulamento Aduaneiro não conceitua a diferença entre simulação, fraude e mera infração aduaneira no texto do artigo em comento. De todo modo, não foi por acaso a anterior menção ao art. 110 do CTN. Uma vez res-peitados os institutos de direito privado, os arts. 167 e seguintes do Código Civil respondem à questão da simulação.

Em relação à infração aduaneira, o dispositivo 673 do RA, mesmo que de forma genérica, estabelece os requisitos básicos para sua configuração. Res-ta abordar a temática da sonegação e da fraude aduaneira a fim de compre-ender o seu real significado, posto que também não é conceituada pelo RA. Todavia, ditos conceitos mereceram atenção especial nos arts. 71 e 72 da Lei nº 4.502/1964:

Art. 71. Sonegação é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retar-dar, total ou parcialmente, o conhecimento por parte da autoridade fazendária:

I – da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natureza ou circunstâncias materiais;

II – das condições pessoais de contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tri-butária principal ou o crédito tributário correspondente.

Art. 72. Fraude é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária prin-cipal, ou a excluir ou modificar as suas características essenciais, de modo a reduzir o montante do imposto devido a evitar ou diferir o seu pagamento.

A diferença básica entre a infração e a fraude fiscal é notada que, na primeira, basta o não pagamento do tributo, independente de dolo, para fins de sua configuração, ao passo que, na segunda, a intenção de não pagar me-diante artifícios simulados é essencial10. Dito isto, anota-se que a fraude adua-neira antecede a sonegação, posto que busca evitar ou retardar a realização do próprio fato imponível, ao passo que na sonegação evita-se, dolosamente, o seu conhecimento por parte das autoridades fazendárias. Persistindo dúvidas quanto à prática, perfilha-se do entendimento de que o auditor fiscal necessitará interpretar a legislação de maneira favorável ao contribuinte, pois, assim o fa-zendo, nos moldes do art. 112 do CTN, estará lhe garantindo a ampla defesa e o contraditório e, após a devida comprovação de irregularidades, terá liberdade e segurança para aplicar as sanções e promover as representações às autoridades competentes.

As atividades de comércio exterior demandam extrema agilidade por par-te de todos os envolvidos, especialmente no Brasil, onde o custo das atividades

10 “Na infração tributária, prevalece o elemento objetivo, pelo que basta o fato externo do não-pagamento tempestivo do tributo para que se tenha por configurada. Já a fraude fiscal requer, para configurar-se subje-tivamente, a intenção deliberada de lesar o Fisco, e objetivamente, a realização de expedientes enganosos cujo propósito é induzi-lo em erro, visando subtrair-se ao pagamento do tributo.” (CARLUCI, José Lence. Uma introdução ao direito aduaneiro. 2. ed. São Paulo: Aduaneiras, 2000. p. 220)

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envolvidas em operação de comex é um dos mais altos do mundo. As normas são inúmeras e, não raro, confusas e contraditórias entre elas e com outras leis e princípios.

Esse contexto exige do servidor público atuante na aduana constante atualização. Não há exagero em se falar da impossibilidade de se atualizar in-tegralmente das normas aduaneiras, assim como sua vinculação aos textos su-periores, a exemplo da Carta Constitucional.

Consequência dessa realidade é a necessidade que o auditor fiscal tem de se recorrer a uma margem de liberalidade na solução dos casos normatiza-dos pelas instruções normativas ora abordadas, desde que previsto em lei11. E esse recurso será pautado no seu poder discricionário, que, nos dizeres de Car-luci, pode ser entendido como:

O poder discricionário tem como seu pressuposto uma lei que o plasma. Daí surge a possibilidade legal de avaliar, dentro de uma margem determinada no texto da lei, a oportunidade de soluções possíveis a fim de realizar a eficácia da lei. Avaliada a oportunidade de todas, escolhe-se uma, que se constitui no ato discricionário, exercendo-se o poder discricionário.12

No caso em tela, são poucos os dispositivos que conferem à Administra-ção Pública, através de seus auditores, esta margem de liberdade. A possibilida-de de se utilizar outra unidade aduaneira senão a do local da mercadoria para desenvolver o procedimento especial por razões de conveniência e liberdade, opção do responsável pelo início do procedimento, opção por uma averiguação mais específica através da exigência de outros documentos e, especialmente, a possibilidade de se estender prazos do procedimento (arts. 2º, § 3º, 3º, caput, 7º ao 9º da IN 1.169/2011 e parágrafo único dos arts. 3º e caput do 6º da IN 228/2002) são exemplos do que se trata.

Entende-se que, fora deste contexto, o auditor estará vinculado ao de-sempenho de seus atos, posto inexistir margem de liberdade de atuação. A pro-pósito, por poder vinculado tem-se que:

Sendo a competência sempre vinculada, pois cuida de estabelecer atribuições, estas atribuições, por sua vez, podem ou franquear a possibilidade de a Adminis-tração Pública optar por uma dentre duas ou mais opções igualmente legítimas, ou podem definir, previamente, uma única opção possível. No primeiro caso, trata-se da competência discricionária, no segundo, da competência vinculada.13

11 “Na discricionariedade administrativa existe, nos termos da norma de competência, uma pluralidade de de-cisões legítimas. Tanto faz, em princípio, acolher-se esta ou aquela diretriz desde que o caso concreto revele que ambas atendem ao interesse público [...] é a liberdade de escolher uma diante da pluralidade de opções legítimas.” (PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa: dos concei-tos indeterminados às políticas públicas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 146)

12 CARLUCI, José Lence. Uma introdução ao sistema aduaneiro. São Paulo: Aduaneiras, 1996. p. 133.13 PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa: dos conceitos indeter-

minados às políticas públicas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 150.

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Ao menos em tese, a margem de subjetividade que o auditor fiscal de-tém para entender ou não haver indícios de fraude, simulação, sonegação ou outra infração aduaneira de forma a submeter a operação de comércio exterior aos procedimentos estabelecidos e já apresentados neste trabalho se pauta no art. 237 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, como tam-bém no Regulamento Aduaneiro.

Não se compartilha da tese de que o subjetivismo disponibilizado aos auditores, com base em indícios e presunções, para fins de enquadramento da operação de comércio exterior ao procedimento especial, como disposto na introdução das instruções normativas, é constitucional, muito menos legal.

6 EMBARAÇO À FISCALIZAÇÃO NA ÁREA ADUANEIRAComo último ponto deste trabalho, faz-se a análise do embaraço à fisca-

lização na área aduaneira e suas consequências. Não se trata de uma temática extensa, a exemplo das penalidades que comportam inclusive dois anexos. De início, para a devida compreensão do tema, imprescindível que se analisem os arts. 728, IV, c, do Regulamento Aduaneiro.

Art. 728. Aplicam-se ainda as seguintes multas (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 107, incisos I a VI, VII, alínea a e c a g, VIII, IX, X, alíneas a e b, e XI, com a redação dada pela Lei nº 10.833, de 2003, art. 77):

IV – de R$ 5.000,00 (cinco mil reais):

c) a quem, por qualquer meio ou forma, omissiva ou comissiva, embaraçar, di-ficultar ou impedir ação de fiscalização aduaneira, inclusive no caso de não--apresentação de resposta, no prazo estipulado, a intimação em procedimento fiscal.

Consoante dispositivo do art. 734, I, do RA não há redução de multas para estas espécies de infrações aduaneiras. Portanto, cometido ato, sanção multa será aplicada na sua integralidade.

No tópico específico das penalidades, foram elencadas as administrativas consistentes em advertência, suspensão e cassação. Pois bem. Não foram abor-dadas de forma individualizada anteriormente pois decorrem, em sua grande maioria, de atitudes decorrentes de embaraços aduaneiros.

Com base no art. 735 do RA, pautado na Lei nº 10.833/2003, podem se verificar que:

a) as sanções administrativas são aplicadas aos intervenientes ao co-mércio exterior;

b) por agentes intervenientes, entende-se qualquer pessoa com rela-ção direta ou indireta com a operação do comércio exterior – im-portador, exportador, despachantes aduaneiros e auxiliares, trans-portador, dentre outros;

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c) a advertência é a sanção mais branda e que acarreta menos prejuí-zos ao agente;

d) a suspensão pode alcançar até 12 meses contados do registro, licen-ça, autorização, credenciamento ou habilitação para utilização de regime aduaneiro ou de procedimento simplificado, bem como de-mais exercícios de atividades relacionadas com o despacho adua-neiro, ou com a movimentação e armazenagem de mercadorias sob controle aduaneiro, serviços conexos;

e) ademais, a cassação, prevista no III do art. 735 do RA, contempla as hipóteses onde o agente fica simplesmente proibido de até mesmo se credenciar, ingressar em áreas aduaneiras sem autorizações, den-tre todas as outras atividades relacionadas ao comex;

f) por fim, há que se destacar o fato de o legislador estabelecer a possi-bilidade de relevação de penalidades nos termos do art. 736, desde que inexistam prejuízos tributários principais e acessórios e, desde que o erro seja escusável, boa-fé e utilização da própria equidade.

CONCLUSÃOConsoante estudo abordado ao longo deste trabalho, tem-se que as san-

ções e penalidades aduaneiras devem ser interpretadas e aplicadas de forma sistêmica com todo o conjunto de princípios constitucionais, os quais irradiam o ordenamento jurídico nacional. Procedimento especial de fiscalização não comporta interpretação literal. No desempenho do ato fiscalizatório, cabe ao servidor tomar por base todo o conjunto probatório e correlacioná-lo com o or-denamento jurídico nacional, e não, apenas, normas infralegais, a exemplo das instruções normativas e portarias e/ou mesmo apenas o Regulamento Aduaneiro de modo isolado.

A aplicação das penalidades pautadas em suspeitas de irregularidades, bem como o encaminhamento para o procedimento especial de fiscalização, não pode ser realizado à revelia dos direitos e garantias individuais, não se es-quecendo, por óbvio, de que é direito constitucional da pessoa jurídica o livre desempenho de suas atividades econômicas. De outro turno, tem-se que haverá ainda clara violação a toda principiologia que rege as relações da Administra-ção Pública para com os indivíduos, pessoas física e/ou jurídica.

REFERÊNCIASCARLUCCI, José Lence. Uma introdução ao direito aduaneiro. 2. ed. São Paulo: Aduaneiras, 2000.

______. Uma introdução ao sistema aduaneiro. São Paulo: Aduaneiras, 1996.

CARRAZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2012.

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54 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

CARTILHA. Disponível em: <http://www.oabsp.org.br/comissoes2010/direito-aduanei-ro/cartilhas>.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

COSTA, Regina Helena. Notas sobre a existência de um direito aduaneiro. In: FREITAS, Vladimir P. Importação e exportação no Direito brasileiro. São Paulo: RT, 2004.

FERNANDES, Rodrigo Mineiro. A denúncia espontânea nas infrações aduaneiras. Re-vista Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário, São Paulo: IOB, v. 5, n. 25, 2015.

PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa: dos conceitos indeterminados às políticas públicas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.

ROCHA, Paulo Cesar Alves. Regulamento aduaneiro anotado. 14. ed. São Paulo: Aduaneiras, 2009.

SABAGG, Eduardo. Manual de direito tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

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Assunto Especial – Acórdão na Íntegra

Penalidades Aduaneiras

2525

Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoPoder JudiciárioAgravo de Instrumento nº 0048330‑38.2015.4.01.0000/DF (d)Processo Orig.: 0035537‑52.2015.4.01.3400Relator: Desembargador Federal Marcos Augusto de SousaRelator Convocado: Juiz Federal Itelmar Raydan EvangelistaAgravante: GTP Tecnologia Importação e Exportação Ltda. – MEAdvogado: Augusto Fauvel de MoraesAdvogado: Maryanne Rodrigues de OliveiraAgravado: Fazenda NacionalProcurador: Cristina Luisa Hedler

deCisãO

Cuida-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que deferiu a antecipação da tutela judicial para afastar a pena de perdimento de mercadoria importada, por não ser sanção cabível para o fato, subfaturamento de preço, considerado pela administração tributária. A sanção cabível, segundo explicitou a decisão agravada, “seria a multa de 100% (cem por cento) sobre a diferença entre o preço declarado e o preço efetivamente praticado na importa-ção ou arbitrado pelas autoridades aduaneiras, a teor do art. 108 do Decreto-Lei nº 37/1966”.

Porém, indeferiu a antecipação da tutela relativamente à liberação das mercadorias importadas, à míngua de oferta de caução, por parte da autora.

O cerne da controvérsia cinge-se à possibilidade de condicionamento da liberação de mercadorias e do regular desembaraço aduaneiro, ao pagamento de encargos decorrentes da operação de importação, em especial tributos e multas.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, consubstanciada na Sú-mula nº 323, tem repudiado a exigência de pagamento de tributos como condi-ção para liberação de mercadoria importada, no sentido de ser cabível sanção administrativa como meio coercitivo de cobrança de quaisquer débitos, ainda que legítimos.

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Em mesma linha de convicção, a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, bem como deste Tribunal Regional Federal, sintetizadas nos seguintes julgados:

ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – REDUÇÃO DE ALÍQUOTA – EXIGÊNCIA PARA O DESEMBARAÇO ADUANEIRO QUE SE CONFUNDE COM O REQUISITO PARA A FRUIÇÃO DA ALÍQUOTA REDUZI-DA – SÚMULA Nº 323 DO STF – RECURSO ESPECIAL PROVIDO

1. Recurso especial no qual se discute a possibilidade de desembaraço aduaneiro de mercadoria importada, que foi retida pela autoridade aduaneira em razão da não apresentação, pelo importador, da certidão negativa de débitos, a qual é condição para o reconhecimento do direito à redução de alíquota do imposto de importação.

2. No caso, o Tribunal de origem reconheceu a necessidade de apresentação da Certidão Negativa de Débito para que o importador, por ocasião do desembaraço aduaneiro, tenha o reconhecimento do seu direito à redução de alíquota prevista na Lei nº 10.182/2001. Todavia, considerou que, tendo a autoridade fiscal todos os elementos para lançar eventual crédito tributário contra o importador, mesmo que não reconhecido o direito à alíquota reduzida por ausência da CND, não pode interromper o procedimento de despacho aduaneiro, à espera da compro-vação da quitação de tributos, sob pena de configurar sanção política e enqua-drar o caso no entendimento da Súmula nº 323 do STF.

3. Analisando-se as disposições do DL 37/1966 e do Decreto nº 6.759/2009 (re-gulamento aduaneiro), não se encontra margem para que, legitimamente, mer-cadorias sejam retidas pela autoridade fiscal, quando o não cumprimento do requisito necessário ao desembaraço se confunde com alguma providência que implique no recolhimento a maior de tributos ou na comprovação de que foram recolhidos em sua totalidade.

4. E isso porque, no procedimento do despacho aduaneiro, a autoridade fiscal pode lançar o crédito tributário que considera devido, o que oportuniza sua co-brança por meios próprios, sem que a mercadoria importada fique à mercê do tempo e da burocracia, deixando, assim, de onerar o patrimônio do particular e o setor produtivo a que se destina.

5. Nessa linha, não pode a autoridade aduaneira exigir, para o desembaraço aduaneiro, requisito legal que se exige para a redução de alíquota de tributo fe-deral, mormente porque, afinal, ele não é autoridade competente para reconhe-cer o direito do contribuinte a tal benefício (apenas confere o preenchimento dos requisitos que autorizam o benefício) e, de outro lado, o recolhimento do crédito tributário estará assegurado porque recolhido na maior alíquota, sendo do importador o ônus de, posteriormente, pleitear o que pagou a maior, se for o caso.

6. In casu, a autoridade fiscal está a exigir, para fins de desembaraço aduaneiro, que o importador comprove o pagamento de tributos e contribuições federais; situação que se amolda ao entendimento da Súmula nº 323 do STF.

(REsp 1372708/PR, STJ, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 15.08.2014)

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PROCESSUAL CIVIL – TRIBUTÁRIO – ADMINISTRATIVO – AGRAVO DE INS-TRUMENTO – DESEMBARAÇO ADUANEIRO – ERRO NA CLASSIFICAÇÃO FIS-CAL – RETENÇÃO DO PRODUTO ATÉ CONCLUSÃO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO FISCAL – IMPOSSIBILIDADE

1. A liberação da mercadoria não pode estar condicionada ao cumprimento das determinações e penalidades decorrentes de reclassificação fiscal ainda que ob-jeto de discussão administrativa.

2. É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para paga-mento de tributos (Súmula nº 323 do STF).

(TRF 1ª R., Ag 0007710-28.2008.4.01.0000/DF, 8ª T., Relª Desª Fed. Maria do Carmo Cardoso, e-DJF1 de 14.06.2013)

A decisão agravada foi explícita em reconhecer a ilegalidade da pena de perdimento para as mercadorias importadas.

Se efetivamente ocorreu subfaturamento para a mercadoria importada, seus efeitos jurídicos, tributários e/ou sancionatórios, afora a hipótese de perdi-mento já descartada pela decisão agravada, deverão ser identificados e exigidos no curso do procedimento de lançamento fiscal, ou em decorrência da decisão judicial de mérito a ser proferida na ação de origem. E, se confirmado, serão objeto de posterior exigência pela Fazenda Pública em regular procedimento de cobrança.

Ao reconhecer a ilegalidade do perdimento das mercadorias, mas condi-cionar sua liberação ao pagamento de penalidade por prática de possível subfa-turamento, ou do tributo adicional a ser pago após identificado o valor real das mercadorias importadas, a decisão agravada mostrou-se em desarmonia com orientação jurídica diversa, nos termos em que exposta nos precedentes citados.

Pelo exposto, presentes os pressupostos processuais, dou provimento ao agravo de instrumento, na forma do art. 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, para reformar a decisão agravada.

Sem manifestação, arquivem-se os autos.

Publique-se e intimem-se.

Brasília, 29 de janeiro de 2016.

Juiz Federal Itelmar Raydan Evangelista Relator Convocado

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Assunto Especial – Ementário

Penalidades Aduaneiras

2526 – Conhecimentos eletrônicos – auto de infração – atraso na prestação de informações – obrigação acessória – denunciação espontânea – impossibilidade – redução da pe-nalidade – possibilidade – apelação – provimento parcial

“Direito processual civil. Direito tributário. Aduaneiro. Conhecimentos eletrônicos. Auto de infração por atraso na prestação de informações. Obrigação acessória. Denunciação espontâ-nea. Impossibilidade. Redução da penalidade. Possibilidade. Apelação parcialmente provida. 1. Em que pese as hipóteses mencionadas na apelação, quais sejam, tributo sujeito a lança-mento por homologação e mercadoria sujeita à pena de perdimento, de fato não se aplicarem ao caso em tela, a sentença analisou os pontos relevantes para o deslinde da controvérsia, apreciando adequadamente os pedidos, pelo que incabível a declaração de sua nulidade. 2. No que toca à alegação de ocorrência de denúncia espontânea, esta deve ser afastada. Não há que se falar em aplicação do instituto da denúncia espontânea diante de descumprimento de obrigação acessória, independentemente da nova redação conferida ao art. 102, § 2º, do Decreto-Lei nº 12.350/2010. 3. A prestação de informações sobre cargas transportadas pela autora estão inseridas entre as obrigações tributárias acessórias ou deveres instrumentais tri-butários, que decorrem da legislação tributária e têm por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas, no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos (art. 113, § 2º, do CTN), e a multa cobrada por atraso ou falta na entrega das declarações em questão tem como fundamento legal o art. 113, § 3º. 4. Possibilitar a denúncia espontânea diante de obrigações acessórias somente estimularia a ocorrência de mais casos de descumprimento, na medida em que o contribuinte visualizaria oportunidade de desrespeitar os prazos im-postos pela legislação tributária. 5. A tipificação da conduta infracional, no caso dos autos, é a prestação de informação a destempo, observação que conduz à necessária conclusão de que a tutela legal é dirigida à instrução documental tempestiva, de modo a permitir a regular fiscalização alfandegária das atividades portuárias. 6. A análise acurada desta premissa revela que o elemento temporal é essencial ao tipo: a infração deriva do desrespeito ao prazo esta-belecido pela legislação de regência para a apresentação de informações. Logo, a conduta, que pretende a apelante caracterizar como denúncia espontânea, é, na verdade, a própria infração (prestar informação fora do prazo), a evidenciar a fragilidade da alegação. 7. Há im-possibilidade lógica de incidência de denúncia espontânea, enquanto excludente de sanção, em relação às infrações que têm como seu próprio cerne a conduta extemporânea do agente, daí porque a impertinência da invocação do art. 102, § 2º, do Decreto-Lei nº 37/1966, na esteira do art. 138 do Código Tributário Nacional. 8. Mesmo que se tomassem por válidas, por hipótese, a tese da apelante a respeito da inaplicabilidade da torrencial jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça quanto ao não aproveitamento do art. 138 do CTN às obrigações acessórias, ainda assim, não seria possível concluir pelo cabimento do benefício legal invoca-do. 9. Analisando as ocorrências imputadas à autora, verifica-se que, embora autuada como ocorrências autônomas, o inadimplemento de obrigações acessórias referentes à embarcação Log In Amazônia, CEs 011105012719420/011105012731390 referem-se a uma única ope-ração e, consequentemente, de um único fato sobre o qual pode recair penalidade. Nota-se que se trata de informações acerca da carga transportada na mesma embarcação, com mesma data (25.01.2011), devendo recair apenas uma multa pelo atraso para a inclusão de informa-ções. 10. Assim, a multa deve ser reduzida para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). 11. Apelação parcialmente provida.” (TRF 3ª R. – AC 0009932-35.2014.4.03.6100 – 3ª T. – Rel. Juiz Conv. Leonel Ferreira – DJe 13.05.2016)

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Transcrição Editorial• Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966:

“Art. 102. [...]

[...]

§ 2º A denúncia espontânea exclui a aplicação de penalidades de natureza tributária ou admi-nistrativa, com exceção das penalidades aplicáveis na hipótese de mercadoria sujeita a pena de perdimento.” (Redação dada pela Lei nº 12.350, de 2010)

• Código Tributário Nacional:

“Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.

§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, po-sitivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.

§ 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.”

“Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanha-da, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração.Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qual-quer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração.”

2527 – Contrabando – mercadoria estrangeira – veículo utilizado no transporte – pena de perdimento – não cabimento

“Administrativo. Mercadoria estrangeira. Contrabando. Pena de perdimento. Veículo utiliza-do no transporte. Não cabimento. 1. A aplicação da pena de perdimento de bens, como forma de reparação de danos ao Erário, somente pode ocorrer nos casos de ilícito penal, quando houver envolvimento do proprietário do bem na prática da infração passível de tal penalida-de. 2. Preceitua o art. 104, V, do Decreto-Lei nº 37/1966, que dispõe sobre o imposto de im-portação e reorganiza os serviços aduaneiros que se aplica a pena quando o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de perda, se pertencente ao responsável por infração punível com aquela sanção. 3. Destarte, não pode o proprietário do veículo sofrer a pena de perdimento do bem, sem que tenha contribuído para a prática do ato ilícito. 4. Corroborando tal entendimen-to, dispõe a Súmula nº 138 do extinto Tribunal Federal de Recursos. 5. O autor comprovou exercer a profissão de taxista (fl. 12) e o passageiro transportado apontou que as mercadorias apreendidas eram de sua propriedade (fl. 23). Assim, pelos elementos colacionados aos autos, não restou comprovado, quer que o autor tenha concorrido para a prática delituosa, quer que, de alguma forma, esta lhe trouxe algum benefício, o que torna inaplicável a pena de perdi-mento do veículo de sua propriedade utilizado para prestar serviço de transporte a terceiro que efetuou a importação irregular de bens. 6. Deixo de conhecer do pedido de condenação ao pagamento em honorários advocatícios, visto que a parte não interpôs o recurso cabível. 7. Apelação e remessa oficial improvidas. Pedido de condenação em verba honorária formu-lado em contrarrazões não conhecido.” (TRF 3ª R. – Ap-Reex 0001548-45.2012.4.03.6006 – Relª Desª Fed. Consuelo Yoshida – DJe 13.05.2016)

Transcrição EditorialSúmula do Tribunal Federal de Recursos: “138 – Contrabando. Cabimento. Perda do veículo. A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regu-lar, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito.”

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2528 – Despacho aduaneiro – início – prazo descumprido – inscrição das declarações de importação antes de aplicação da penalidade – abandono da mercadoria – inocor-rência – pena de perdimento – desproporcionalidade

“Direito aduaneiro e tributário. Desembaraço aduaneiro. Início do despacho aduaneiro. Prazo descumprido. Inscrição das declarações de importação antes de aplicação da penalidade. Abandono da mercadoria. Inocorrência. Pena de perdimento. Desproporcionalidade. Con-denação em honorários. Impossibilidade. 1. O Decreto-Lei nº 1.455/1976 (art. 23, inc. II) e a Instrução Normativa da SRF nº 69/1999 (art. 1º, inc. I) preveem a pena de perdimento do bem quando o importador não inicia o despacho aduaneiro dentro do prazo de 90 dias, a contar do desembarque da mercadoria importada. 2. Hipótese em que se apresenta desproporcional a aplicação da aludida norma, no caso concreto, ante a constatação de que o impetrante realizou o registro das Declarações de Importação antes da aplicação da sanção, inexistin-do, portanto, intenção de abandonar a mercadoria, tampouco a extrapolação do prazo legal importou em prejuízo ao Erário. Precedentes jurisprudenciais. 3. Não é possível, em sede de mandado de segurança, a condenação em honorários advocatícios, em face de expressa determinação legal constante do art. 25 da Lei nº 12.016/2009. 4. Apelação e remessa oficial parcialmente providas para afastar a condenação da Fazenda Nacional em honorários advo-catícios.” (TRF 5ª R. – Ap-Reex 0803440-17.2015.4.05.8100 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Machado Cordeiro – DJe 22.07.2016)

Transcrição Editorial• Decreto-Lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976:“Art. 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias:[...]II – importadas e que forem consideradas abandonadas pelo decurso do prazo de permanência em recintos alfandegados nas seguintes condições:a) 90 (noventa) dias após a descarga, sem que tenha sido iniciado o seu despacho; oub) 60 (sessenta) dias da data da interrupção do despacho por ação ou omissão do importador ou seu representante; ouc) 60 (sessenta) dias da data da notificação a que se refere o art. 56 do Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966, nos casos previstos no art. 55 do mesmo Decreto-Lei; oud) 45 (quarenta e cinco) dias após esgotar-se o prazo fixado para permanência em entreposto aduaneiro ou recinto alfandegado situado na zona secundária.”• Instrução Normativa SRF nº 69, de 16 de junho de 1999: “Art. 1º O procedimento para a aplicação da pena de perdimento decorrente das infrações a que se referem os incisos II e III do art. 23 do Decreto-Lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976, de mercadorias que permaneçam em recintos alfandegados será iniciado, imediatamente ao decurso dos seguintes prazos:I – noventa dias após a descarga, sem que tenha sido iniciado o seu despacho aduaneiro;”

2529 – Importação – infração punível com a pena de perdimento – ausência de indícios – liberação – exigência de garantia – caução – impossibilidade

“Tributário. Importação. Ausência de indícios de infração punível com a pena de perdimento. Exigência de garantia para a liberação da mercadoria apreendida (caução). Impossibilidade. A partir da análise dos arts. 793 e 794 do Regulamento Aduaneiro, assim como dos arts. 1º, 4º e 5º da IN RFB 1.169/2011, conclui-se que a prestação de garantias (caução) para a liberação de mercadorias importadas está condicionada à existência de indícios de infração punível com a pena de perdimento a serem apurados mediante procedimento fiscal de investigação. No caso em análise, devido à ausência de indícios de infração punível com pena de perdimento, afastada está a exigência de garantia (caução) para a liberação das mercadorias importadas.” (TRF 4ª R. – AC 5012758-92.2015.404.7002 – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Jorge Antonio Maurique – DJe 18.08.2016)

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Transcrição EditorialInstrução Normativa RFB nº 1169, de 29 de junho de 2011: “Art. 1º O procedimento especial de controle aduaneiro estabelecido nesta Instrução Norma-tiva aplica-se a toda operação de importação ou de exportação de bens ou de mercadorias sobre a qual recaia suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento, independen-temente de ter sido iniciado o despacho aduaneiro ou de que o mesmo tenha sido concluído.[...]Art. 4º O procedimento especial de controle aduaneiro previsto nesta Instrução Normativa será instaurado pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil (AFRFB) responsável mediante termo de início, com ciência da pessoa fiscalizada, contendo, dentre outras informações:I – as possíveis irregularidades que motivaram sua instauração; eII – as mercadorias ou declarações objeto do procedimento.§ 1º O disposto no caput não afasta a possibilidade de que o procedimento especial venha a apurar suspeita de irregularidade, nos termos do art. 1º, distinta daquela que motivou a instauração, ou a incluir outras operações, com a ciência do interessado, não especificadas no termo de início.§ 2º No caso de mercadoria amparada por conhecimento de carga endossado em branco e ainda não submetida a despacho aduaneiro, o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil res-ponsável pela condução do procedimento especial intimará os intervenientes que considerar aptos a identificar o importador e, se for o caso, o adquirente ou encomendante.Art. 5º A mercadoria submetida ao procedimento especial de controle de que trata esta Instru-ção Normativa ficará retida até a conclusão do correspondente procedimento de fiscalização.Parágrafo único. A retenção da mercadoria antes de iniciado o despacho aduaneiro não preju-dica a caracterização de abandono, quando for o caso, nem impede o registro da correspon-dente declaração por iniciativa do interessado. Neste caso, o despacho aduaneiro deverá ser imediatamente interrompido, prosseguindo-se com o procedimento especial.”

2530 – Importação irregular de mercadorias – terceiro de boa-fé – interposição fraudulenta – pena de perdimento – descabimento

“Tributário e administrativo. Mandado de segurança. Importação irregular de mercadorias. Terceiro de boa-fé. Interposição fraudulenta. Descabimento da pena de perdimento. 1. Trata--se de mandado de segurança objetivando a devolução de bens de informática apreendidos por fiscais da Receita Federal. 2. Em seu decreto sentencial, o magistrado sentenciante con-signou: ‘[...] A nota fiscal do equipamento que, apesar de importado, foi adquirido no Brasil, demonstra a boa-fé do Impetrante. Logo, eventual irregularidade na expedição da menciona-da nota deve ser suportada pela empresa que o vendeu e não pelo consumidor. A introdução dos demais equipamentos importados em território nacional foi declarada à Receita Federal como bagagem acompanhada, conforme documentos de fls. 18/23. Os bens apreendidos foram isentos de tributo porque, internalizados como bagagem, não ultrapassaram a quota permitida. Logo, não há que se falar em dano ao Erário, em virtude de pequeno valor dos bens. Deve-se considerar ainda que esses bens, quando apreendidos, não estavam expostos à venda, nem se destinavam a essa finalidade. Estavam sendo usados pelo Impetrante como instrumento para prestação de serviços. Conforme mencionado na decisão de fls. 57/60, o Decreto-Lei nº 1.455/1976 isenta de tributo os objetos de uso profissional trazido do exterior pelo passageiro em sua bagagem. [...] A própria Receita Federal menciona como exemplos de bagagem “ferramentas, máquinas, aparelhos e instrumentos necessários ao exercício de sua profissão, arte ou ofício”. Assim, impõe-se a concessão da segurança, tendo em vista que: i) os bens apreendidos não foram introduzidos clandestinamente no país, mas devidamente declarados ao fisco como bagagem ou adquiridos no mercado interno; ii) não estavam expos-tos à venda, sendo usados profissionalmente para prestação de serviço; iii) não houve dano ao Erário, em face do pequeno valor dos bens. [...]’. 3. ‘O Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que a aquisição de mercadoria importada, no mercado interno, por terceiro de boa-fé, com a exibição de nota fiscal fornecida por firma regularmente estabelecida, não

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autoriza a pena de perdimento do bem, imposta em decorrência de sua entrada irregular no País’ (Processo REsp 763464/DF, Recurso Especial nº 2005/0102370-1, Rel. Min. João Otávio de Noronha (1123), Órgão Julgador T2 – 2ª T., Data do Julgamento 21.03.2006, Data da Pu-blicação/Fonte DJ 19.04.2006 p. 126). 4. Por outro lado, em relação aos demais bens, salien-tou o d. MPF: ‘Com relação aos outros equipamentos apreendidos, conforme se verifica dos documentos acostados às fls. 18/23, a recorrida apresentou apenas cópias de Declaração de Bagagem Acompanhada, emitidas em nome de pessoas diversas. Assim, o que se depreende dos autos é que o autor utilizou-se de interpostas pessoas para introduzir no país o material apreendido.’ 5. No tocante à pena de perdimento, o art. 33 da Lei nº 11.488/2997 estabeleceu pena mais branda (multa) para a interposição fraudulenta de terceiros, sem ressalvar a possi-bilidade de aplicação concomitante de outras penas já previstas em lei. Assim sendo, não se justifica mais a decretação do perdimento do bem unicamente com base nesse fundamento (AC 0015301-26.2008.4.01.3400/DF, Relª Desª Fed. Maria do Carmo Cardoso, 8ª T., e-DJF1 p. 1190 de 28.03.2014; REsp 1144751/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 01.03.2011, DJe 15.03.2011). 6. ‘A presumida constatação de interposição de terceiro no procedimento de importação, por si só, não justifica seja aplicada a pena de perdimento, seja com fundamento no Decreto nº 4.543/2002 – vigente à época dos fatos –, seja no Decreto nº 6.759/2009’ (AC 0015301-26.2008.4.01.3400/DF, Relª Desª Fed. Maria do Carmo Cardoso, 8ª T., e-DJF1 p. 1190 de 28.03.2014). 7. Apelação e remessa oficial não providas. Sentença mantida.” (TRF 1ª R. – AMS 0001534-88.2007.4.01.3000 – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Reynaldo Fonseca – Rel. Conv. Juiz Fed. Rafael Paulo Soares Pinto – DJe 08.05.2015)

2531 – Mercadoria estrangeira – apreensão – importação regular – documentos comproba-tórios – pena de perdimento – suspensão até o julgamento final – possibilidade

“Processual civil. Agravo de instrumento. Mercadorias de procedência estrangeira. Apreen-são. Documentos comprobatórios da importação regular. Suspensão da pena de perdimento até o julgamento final. Possibilidade. 1. Agravo de Instrumento manejado por particular em face da decisão que indeferiu a Tutela Antecipada pleiteada para suspender a eficácia da pena de perdimento nos autos do processo administrativo nº 19615.720419/2014-95, bem como a liberação das mercadorias de procedência estrangeira. 2. No momento da autuação os produtos encontravam-se sem a documentação fiscal correspondente. Intimada a apresen-tar os documentos que comprovassem a sua regularidade, a Agravante manteve-se inerte na seara administrativa. 3. Nos autos da presente ação, a Autuada anexou fatura comercial e o extrato de declaração de importação de produtos idênticos aos apreendidos. Possibilidade de os produtos apreendidos serem os mesmos dos descritos nos referidos documentos, o que teria o condão de comprovar a regularidade da internalização das mercadorias no país. 4. Infere--se do Termo de Retenção que, a despeito de a Administração Tributária exigir o número de série dos produtos para a comprovação da regularidade da importação das mercadorias, na ocasião em que efetuou a retenção da mercadoria ela também não registrou os números de séries dos produtos apreendidos. 5. Agravo de Instrumento provido, em parte, para suspender a eficácia da decisão que decretou a pena de perdimento nos autos do processo adminis-trativo nº 19615.720419/2014-95, até o final julgamento da lide.” (TRF 5ª R. – AI 0807503-38.2015.4.05.0000 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Cid Marconi – DJe 08.07.2016)

2532 – Mercadoria importada – liberação condicionada à garantia – Instruções Normativas nºs 228 e 206/2002 da SRF – Medida Provisória nº 2.158/2001 – precedentes – pro-vimento

“Tributário e processo civil. Liberação da mercadoria importada. Instruções Normativas nºs 228 e 206/2002 da SRF. Liberação condicionada à garantia. Medida Provisória nº 2.158/2001. 1. As Instruções Normativas nºs 228 e 206/2002 disponibilizam instrumentos

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que permitem à autoridade aduaneira proceda a retenção de mercadorias importadas para procedimento especial de controle, punível com pena de perdimento, sobre as quais haja suspeita de irregularidades. 2. A autora foi submetida ao controle especial de fiscalização, em razão de suspeita de incompatibilidade da capacidade econômica da mesma e o valor das importações. 3. A Medida Provisória nº 2.158/2001, regulamentada pelo art. 7º da Instrução Normativa nº 228/2002, permite o desembaraço, mediante medida de cautela fiscal, con-dicionada a prestação de garantia até a conclusão do procedimento especial. Precedentes. 4. Apelação e remessa oficial providas.” (TRF 3ª R. – Ap-Reex 0014576-70.2004.4.03.6100 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Nery Junior – DJe 30.03.2016)

Transcrição EditorialInstrução Normativa SRF nº 228, de 21 de outubro de 2002:

“Art. 7º Enquanto não comprovada a origem lícita, a disponibilidade e a efetiva transferência, se for o caso, dos recursos necessários à prática das operações, bem assim a condição de real adquirente ou vendedor, o desembaraço ou a entrega das mercadorias na importação fica condicionado à prestação de garantia, até a conclusão do procedimento especial.

§ 1º A garantia será equivalente ao preço da mercadoria apurado com base nos procedimentos previstos no art. 88 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, acrescido do frete e seguro internacional, e será fixada pela unidade de despacho no prazo de dez dias úteis contado da data da instauração do procedimento especial.

§ 2º No caso de despacho aduaneiro de mercadoria iniciado após a instauração do procedi-mento especial, o prazo para fixação de garantia será contado da data de registro da decla-ração aduaneira.

§ 3º A garantia a que se refere este artigo poderá ser prestada sob a forma de depósito em moeda corrente, fiança bancária ou seguro em favor da União.

§ 4º A Coana poderá fixar, mediante Ato Declaratório Executivo, valores mínimos de garantia para tipos específicos de mercadorias.”

2533 – Pena de perdimento – importação por conta e ordem – importação por encomenda – ocultação fraudulenta de terceiros – não configuração

“Tributário. Aduaneiro. Perdimento. Importação por conta e ordem. Importação por encomen-da. Ocultação fraudulenta de terceiros. Não configuração. Honorários advocatícios. 1. A cir-cunstância de a impetrante ter realizado a operação de importação em virtude da necessidade de uma terceira empresa não implica concluir, por si só, que tal importação obrigatoriamente tenha que ser caracterizada como sendo operação por encomenda. 2. As evidências dos au-tos demonstram que as empresas envolvidas na operação estavam devidamente habilitadas no radar, possuíam plena capacidade financeira para realizar a importação, não tendo sido ocultada da Fiscalização nenhuma informação tampouco a origem dos recursos despendidos, que foram custeados pela empresa adquirente. 3. A empresa que necessitava do produto (suposta encomendante) não teve qualquer participação na dinâmica do processo de importa-ção, não foi responsável por qualquer etapa, seja comercial, financeira, ou desembaraço, não arcou com o pagamento de tributos ou quaisquer outros pagamentos, e tampouco arcou com quaisquer riscos inerentes ao despacho aduaneiro. 4. O que se pode depreender no caso sub examine é que ocorreu um negócio lícito, orientado pela boa-fé e pelo binômio necessidade/especialização técnica das empresas envolvidas, em consonância com a agilidade inerente aos ditames relativos à livre iniciativa. 5. Não se conhece de questões em relação as quais não houve efetiva controvérsia nos autos, as quais, além de demandar dilação probatória, não foram objeto de pronunciamento de mérito pela sentença. 6. Honorários advocatícios majora-dos para 10% do valor da causa, devidamente atualizados pelo IPCA-E.” (TRF 4ª R. – Ap-Reex 5007803-79.2015.404.7208 – 2ª T. – Relª Desª Fed. Cláudia Maria Dadico – DJe 24.08.2016)

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2534 – Pena de perdimento – imposição – importação – interposição fraudulenta – art. 33 da Lei nº 11.488/2007 – descabimento

Tributário. Agravo regimental. Pena de perdimento. Interposição fraudulenta na importação. Art. 33 da Lei nº 11.488/2007. Imposição da pena de perdimento. Descabimento. 1. No caso dos autos, a Receita Federal acatou o pedido da autora e determinou a aplicação do disposto no art. 33 da Lei nº 11.488/2007, sem ressalvas. 2. Esta Corte, em consonância com a juris-prudência do STJ, entende que não se justifica a decretação de pena de perdimento, nos casos de interposição fraudulenta de terceiros, em que possível a aplicação do disposto no art. 33 da Lei nº 11.488/2007, ressalvada a possibilidade de aplicação de outras penas previstas em lei (AC 0015924-56.2009.4.01.3400/DF, Relª Conv. Juíza Federal Maria Cecília de Marco Rocha, 7ª T., e-DJF1 de 13.02.2015; AC 0015301-26.2008.4.01.3400/DF, minha relatoria, 8ª T., e-DJF1 de 28.03.2014; e REsp 1144751/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe de 15.03.2011). 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – AgRg--AC 0023504-11.2007.4.01.3400 – 8ª T. – Relª Desª Fed. Maria do Carmo Cardoso – DJe 01.04.2016)

Comentário EditorialA decisão acima reflete a atual posição da jurisprudência ao afirmar que o Fisco não pode aplicar a pena de perdimento a quem simplesmente não conseguiu comprovar a origem dos recursos usados em operação de comércio exterior – autuada como interposição fraudulenta. Seguindo jurisprudência do TRF-1 e do Superior Tribunal de Justiça, o Decreto-Lei nº 1.455/1976 penalizava a conduta de interposição fraudulenta de terceiros com o perdi-mento das mercadorias.Entretanto, o art. 33 da Lei nº 11.488/2007 estabeleceu uma pena mais branda para a con-duta, uma vez que não ressalvou a possibilidade de aplicação concomitante de outras penas já previstas em lei, que assim dispões:Art. 33. A pessoa jurídica que ceder seu nome, inclusive mediante a disponibilização de docu-mentos próprios, para a realização de operações de comércio exterior de terceiros com vistas no acobertamento de seus reais intervenientes ou beneficiários fica sujeita a multa de 10% (dez por cento) do valor da operação acobertada, não podendo ser inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais).Desta forma, tendo em vista a jurisprudência pacificada nas Cortes superiores acerca da impossibilidade de aplicação de pena de perdimento nos casos de interposição fraudulenta bem como pela possibilidade de liberação das mercadorias mediante caução, considerando a previsão do supramencionado art. 33 da Lei nº 11.488/2007, de rigor a liberação das mercadorias em procedimento especial de fiscalização ou que já tenham sido objeto de pena de perdimento sob o fundamento de interposição fraudulenta no percentual de 10% (dez por cento) do valor da operação acobertada, nos limites da multa disposta no art. 33 da Lei nº 11.488/2007, como forma de precaução para o fisco e liberação das mercadorias até eventual discussão final.A decisão representa grande avanço e servirá de precedente para os casos de interposição fraudulentas existentes e penas de perdimento aplicadas com este fundamento.O mesmo fundamento pode ser usado nas retenções de mercadorias cuja motivação seja investigação de eventual interposição fraudulenta, devendo o importador buscar logo no início a liberação mediante caução nos termos acima relatados evitando assim gastos elevados com demurrage, armazenagem e atrasos com fornecedores e multas contratuais.

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Parte Geral – Doutrina

Subfaturamento no Direito Aduaneiro

fELIPPE ALExAnDRE RAMOS BREDAAdvogado e Consultor, Pós-Graduado em Processo Civil pela PUC/SP, Pós-Graduado em Pro-cesso Tributário pela PUC/SP, Professor do Curso de Pós-Graduação (Lato Sensu) em Processo Tributário da PUC/SP/Cogeae (2005-2015), Membro da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP, Docente na Aduaneiras.

RESUMO: Abordaremos a infração aduaneira, conhecida como subfaturamento, analisando algumas de suas polêmicas, como a distinção com a subvaloração, o seu caráter extrafiscal de controle adua-neiro, as hipóteses de arbitramento do valor aduaneiro pelo seu reconhecimento e a sua apuração no curso do despacho aduaneiro. Nosso diálogo apoia-se em interpretação pós-positivista, com análise nos textos legais, jurisprudência e alguma doutrina.

PALAVRAS-CHAVE: Subfaturamento; subvaloração; controle aduaneiro; valor aduaneiro; despacho aduaneiro.

ABSTRACT: We will cover in this written composition the Custom Law infraction know as Under Invoicing, analyzing some of its polemic aspects, as, distinction with Under Valuation (AVA-GATT article 8º), the Legal Nature of Customs Law Control, Custom Valuation determinate by the Custom Clearance, and Verification in the course of Custom Dispatch. Our dialogue will be constructed based in post-positivist doctrine, looking into written legal texts, jurisprudence and some doctrine.

KEYWORDS: Under invoicing; under valuation (AVA-GATT article 8º); custom law management; cus-toms value; custom dispatch.

SUMÁRIO: 1 Colocação do tema; 2 Distinção entre subvalorar e subfaturar; 3 O subfaturamento é infração formal extrafiscal; 4 O arbitramento aos casos de subfaturamento; 5 O subfaturamento no despacho aduaneiro; Conclusão.

1 COLOCAÇÃO DO TEMA

O subfaturamento no direito aduaneiro tem forte divergência interpreta-tiva entre Fisco e contribuinte. De um lado, o entendimento de que se trata in-fração sujeita ao perdimento aos casos de falsidade material e ideológica. Pelo outro, infração regulamentar, sujeita à multa sobre o valor aduaneiro, cobrança de tributos e multa de ofício, aos casos de falsidade ideológica.

Colocamos-nos a enfrentar essa polêmica, abordando, ainda, a forma de arbitramento de mercadoria subfaturada e a sua liberação em despacho aduaneiro. Partimos de uma interpretação pós-positivista e análise sistemática, apoiando nosso diálogo nos textos legais1, jurisprudência e alguma doutrina.

1 Nossa definição de texto legal abarca todo o ordenamento jurídico físico, na concepção do art. 110 do Código Tributário Nacional.

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2 DISTINÇÃO ENTRE SUBVALORAR E SUBFATURAR

A legislação diferencia o subfaturamento e a subvaloração, que muitas vezes são compreendidos e tratados como face da mesma moeda pelos intér-pretes e aplicadores do Direito.

Devemos observar e firmar como premissa, desde já, que a subvaloração desencadeia um regime jurídico distinto daquele conferido ao subfaturamento.

Visualizaremos e definiremos a subvaloração, para melhor compreensão do subfaturamento.

Iniciamos com o Acordo de Valoração Aduaneira, aprovado Decreto-Le-gislativo nº 30/1994, e o Decreto nº 1.355/1994 – que promulgou o AVA-GATT –, estabelecendo métodos específicos para apuração da base de cálculo, numa ordem sequencial e obrigatória, do valor (aduaneiro) de mercadorias negocia-das internacionalmente entre países aderentes do AVA-GATT.

Por ser o AVA-GATT fruto da reestruturação mundial do pós-Guerra (Se-gunda Grande Guerra), início da globalização que se anunciava, funda-se na ideia de igualdade entre os países, de modo a evitar novos conflitos, possibili-tando e protegendo o Comércio Internacional2.

O Comércio Exterior e o Direito das Aduanas que se criou nesse contexto fundam-se na livre iniciativa e nos mercados livres, sem subsídios estatais. O va-lor aduaneiro3 caracteriza-se como expressão de livre transação comercial, sem interferências estatais, decorrente da operação de compra e venda internacio-nal, ao qual se confere nível de proteção de modo a identificar práticas desleais em comércio exterior e sua proteção, a exemplo das medidas (i) antidumping, (ii) de salvaguarda e (iii) compensatórias, razão para a existência de um acordo sobre valoração aduaneira.

Visualizamos, assim, que o AVA-GATT buscou regular o direito das Gen-tes (Estados).

A distinção do que seja uma prática desleal em comércio exterior – ain-da que decorrente de particular, de forma difusa – do que seja uma infração à legislação aduaneira pátria implica quando será caso de subvaloração ou subfa-turamento, esta infração aduaneira específica, como já veremos.

A atribuição de valor aduaneiro para verificação e controle da operação em comércio exterior, por meio de valoração do AVA-GATT, dita de perto com a incidência dos tributos aduaneiros, tal e qual o subfaturamento, mas decor-rente do ato de subvalorar. Subvalorar, no contexto do GATT, entende-se como

2 ROCHA, Paulo Cesar Alves. A valoração aduaneira e comércio internacional. São Paulo: Aduaneiras, 2003. p. 15/39.

3 Art. 149, § 2º, III, a, da CRFB/1988.

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o ato de declarar a menor uma transação comercial de compra e venda inter-nacional, sem a intenção de fuga aos tributos-aduaneiros, mas por erro na for-mação do valor aduaneiro, diante das regras específicas do próprio AVA-GATT.

Para compreensão da repercussão que o valor aduaneiro tem aos casos de subvaloração e subfaturamento, devemos ter uma noção do fato gerador do Imposto de Importação e o desencadeamento dos atos relacionados ao proce-dimento de despacho aduaneiro4, constituído do Registro da Declaração de Importação, da Conferência Aduaneira e do Desembaraço Aduaneiro.

Comecemos com a definição do fato imponível do Imposto de Importa-ção, que se materializa com a entrada da mercadoria em território nacional5. Percebe-se que o núcleo do fato imponível do Imposto de Importação e, por-tanto, sua materialidade, é importar produtos (bens/mercadorias) estrangeiros. Compreende-se importar como portar para dentro ou trazer para dentro do território nacional (aduaneiro) produtos/mercadorias/bens estrangeiros, efetivo ingresso nas palavras da doutrina6. Mas que se considera ocorrido, para fins de cálculo dos tributos aduaneiros7, com o registro da Declaração de Importação (DI) (art. 23 do DL 37/1966)8, documento hábil ao Fisco para verificação e con-trole da regularidade das operações de importação.

Aludido controle e fiscalização se inicia com o registro da Declaração de Importação no Siscomex, sistema virtual (informatizado) que interliga exporta-dores, importadores, despachantes aduaneiros, comissários, transportadores e outras entidades ao Decex – Departamento de Operações de Comércio Exterior, Banco Central e à Secretaria da Receita Federal.

Feito o registro da DI, toma lugar o despacho aduaneiro9 (procedimento de fiscalização10), para fins de ser realizada a Conferência Aduaneira11 (verifica-ção dos dados da operação de importação), em que se analisam, grosso modo, (i) o importador, (ii) a mercadoria, (iii) a classificação fiscal (posição tarifária que implicará no recolhimento dos tributos respectivos), (iv) o valor aduaneiro

4 Arts. 542 c/c 545 do Regulamento Aduaneiro.5 “Art. 1º O Imposto sobre a Importação incide sobre mercadoria estrangeira e tem como fato gerador sua

entrada no Território Nacional. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988).”6 LACOMBE, Amércio Masset. Imposto de importação. São Paulo: RT, 1979. p. 12/26.7 Concebemos que os únicos tributos verdadeiramente aduaneiros sejam o Imposto de Importação e Imposto de

Exportação. Os demais, como, IPI-Importação, PIS/Cofins-Importação e ICMS-Importação (etc.) são tributos incidentes, de uma forma ou outra, sobre a realidade fática do Imposto de Importação, cuja materialidade é ora o ingresso em território aduaneiro, ora o desembaraço; mas todos pressupõem o Registro da Declaração de Importação como o suporte físico da incidência. Assim, percebendo essa dinâmica em relação ao Imposto de Importação, compreende-se a relevância e a implicação às apurações de subfaturamento e subvaloração.

8 “Art. 23. Quando se tratar de mercadoria despachada para consumo, considera-se ocorrido o fato gerador na data do registro, na repartição aduaneira, da declaração a que se refere o art. 44.”

9 Art. 44 do Decreto-Lei nº 37/1966 e arts. 542 e 543 do Decreto nº 6.759/2009.10 Art. 7º, III, do Decreto nº 70.235/1972.11 Arts. 50 e 51 do Decreto-Lei nº 37/1966 e art. 564 do Decreto nº 6.759/2009.

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e o (v) cumprimento de todas as obrigações, fiscais (RFB), cambiais (Bacen) e administrativas (Secex/MDIC) exigíveis em razão da importação.

Todo esse procedimento de registro da DI, despacho aduaneiro e confe-rência aduaneira visa ao desembaraço aduaneiro12 (liberação da mercadoria).

Por conta de a base de cálculo dos tributos aduaneiros ser o valor adua-neiro13 (preço da transação comercial, acrescido dos custos com frete e seguro14), sua identificação pela autoridade fiscal servirá para adoção do AVA-GATT, se vislumbrada prática desleal na formação do valor aduaneiro segundo as regras do GATT, ou arbitramento, em caso de verificação de uma infração aduaneira, aqui entendida como o subfaturamento que já tratamos mais logo.

Atualmente, a valoração aduaneira, tal e qual prevista pelo AVA-GATT, só tem lugar em ato de revisão aduaneira, após desembaraço aduaneiro, e não durante o despacho aduaneiro, por conta da regra do art. 3115 da IN/SRF 327/2003.

A distinção do que seja reconhecido pela autoridade fiscal como prática desleal difere da verificação de uma infração à legislação aduaneira por subfa-turamento.

A legislação diferencia subfaturamento e subvaloração, pela discipli-na da valoração aduaneira no Direito brasileiro, disciplinada pelo Decreto nº 6.759/2009, que consolida a aplicação das regras do Artigo VII do Acordo Geral de Tarifas e Comércio – Gatt (Anexo 1º Acordo de Valoração Aduaneira AVA da Ata Final, que incorpora os Resultados da Rodada Uruguai de Negocia-ções Comerciais Multilaterais), aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30/1994 e promulgado pelo Decreto nº 1.355/1994.

Esses diplomas determinam a definição jurídica de valor aduaneiro ao Direito brasileiro ser aquela conferida pelo Acordo Geral Sobre Tarifas Adua-

12 Art. 51, caput, do Decreto-Lei nº 37/1966 e art. 571 do Decreto nº 6.759/2009.13 “Art. 2º A base de cálculo do imposto é: (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988) I – quan-

do a alíquota for específica, a quantidade de mercadoria, expressa na unidade de medida indicada na tarifa; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988) II – quando a alíquota for ad valorem, o valor aduaneiro apurado segundo as normas do art. 7º do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988).”

14 Pela ressalva do § 2º do art. 8º do Acordo sobre a Implementação do artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio 1994, cada País-Membro, ao elaborar sua legislação, poderia prever a inclusão ou a exclusão, no valor aduaneiro, no todo ou em parte, dos seguintes elementos: (i) o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; (ii) os gastos relativos ao carregamento, descarregamento e manuseio, associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; e (iii) o custo do seguro. Assim, como se esperava, o Brasil incluiu o custo do transporte, carga, descarga, manuseio e seguro.

15 “Art. 31. Os procedimentos fiscais para verificação da conformidade do valor aduaneiro declarado às regras e disposições estabelecidas na legislação serão realizados após o despacho aduaneiro de importação, sob a responsabilidade da unidade da SRF com jurisdição sobre o domicílio fiscal do importador e que possua atribuição regimental para executar a fiscalização aduaneira.”

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neiras e Comércio – GATT/94 (Artigo I, Parte I), acordo multilateral do qual o Brasil é signatário, inserido no ordenamento nacional pela promulgação do Decreto Legislativo nº 1.355/1994, como “o valor de transação, isto é, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias, em uma venda para exporta-ção para o país de importação”.

As regras de valoração aduaneira do AVA-Gatt compreendem um cri-tério base, incidente na grande maioria das operações (método (i) o valor da transação), e cinco critérios substitutivos, que são aplicados sucessivamente e em caráter excludente da forma seguinte: o método do (i) valor de transação de mercadorias idênticas (comerciantes do mesmo país e época); do (ii) valor da transação de mercadorias similares (comerciantes do mesmo país e época); o do (iii/iv) valor de revenda ou do valor dedutivo do custo de produção ou do valor computado; e o método do último recurso, também denominado (v) critério da razoabilidade.

De acordo com método do valor da transação, o valor aduaneiro, base de cálculo dos tributos aduaneiros, deve corresponder ao preço efetivamente pago ou a pagar pela mercadoria importada, ajustado de acordo com o art. 8º do AVA-Gatt e os arts. 77 e seguintes do Decreto-Lei nº 37/1966. A autoridade fiscal, discordando do preço declarado na DI, pela divergência no valor de mercadorias idênticas ou similares em operações envolvendo compradores não vinculados situados no mesmo país de destino (art. 2º, a e b, do AVA-Gatt), após manifestação do importador, não aceitando o valor aduaneiro declarado, deve aplicar um dos métodos substitutivos. Concluindo pela incorreção do valor adua neiro formado e formalizado com a declaração de importação, deve exigir a diferença do crédito tributário-aduaneiro, acrescido de juros de mora e, em caso de lançamento de ofício, da multa de 75% (Lei nº 9.430/1996, art. 42, I).

É nesse contexto que se opera com o conceito de subvaloração, que nada mais é do que a aplicação indevida de um dos métodos de valoração aduaneira pelo importador, sem a ocorrência da prática de fraude de valor16.

Na subvaloração, a fiscalização não concorda com o preço da transação comercial, mas por critérios atinentes à formação do valor aduaneiro declara-do. Podemos exemplificar os casos em que não se relaciona um desconto, pois entendido como mera redução de preço; condições facilitadas de venda que tenham afetado a transação comercial e, assim, o preço; interdependência en-tre partes (exportador/importador) capazes de influenciar o preço, que não seja declarada; inclusões relativas aos incoterms etc.

A subvaloração diferencia-se do subfaturamento justamente em razão da licitude da conduta do importador, que não teria incorrido em ilícito algum,

16 Opinião Consultiva nº 10.1 do Comitê Técnico de Valoração Aduaneira.

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diferentemente do ato de subfaturar, voltado à prática de ilícito de natureza formal (extrafiscal), com reflexos diretos no campo da exação aduaneira.

Feita essa singela, mas importante distinção, caminhemos ao subfatura-mento.

3 O SUBFATURAMENTO É INFRAÇÃO FORMAL EXTRAFISCAL

Iniciamos nossa análise sobre a figura jurídica do subfaturamento com uma afirmação forte, a de que não é mera infração regulamentar. Ao final de nossa exposição, sintetizaremos e concluiremos esse pensar.

O subfaturamento é infração aduaneira tipificada em vários normativos legislativos, que implica, grosso modo, a supressão17 da base de cálculo sobre a qual recaem os tributos aduaneiros. Ou seja, o contribuinte utiliza-se de alguma conduta no sentido de minorar a incidência dos tributos devidos pelo ato de importar/exportar bens.

Como vimos, o valor aduaneiro, para fins de valoração aos aderentes do AVA-GATT, é o valor da transação comercial de compra e venda internacio-nal18, e também a base sobre a qual incidem os tributos aduaneiros (II, IPI, PIS/Cofins-Importação, ICMS-Importação, Cide-Importação).

Desta maneira, por ser a base de incidência tributário-aduaneira, a legis-lação imputa infração aduaneira ao ato de subtrair os tributos devidos na im-portação com diversas penalidades19, como (i) perdimento, (ii) multa de 100% sobre o valor aduaneiro e (iii) multa pela diferença de tributos.

O perdimento tem previsão no inciso VI do art. 105 do DL 37/196620 em caso de apresentação de qualquer documento necessário ao embarque ou desembaraço da mercadoria falsificado ou adulterado. Vemos que a nor-ma refere-se a todas as espécies de falsificação, sem distinção, se ideológica e/ou material. Exemplifica-se se a apresentação de fatura comercial falsa em seu aspecto ideológico, quanto ao preço das mercadorias, é passível da pena de perdimento. Veremos nossas conclusões daqui um bocado.

17 Analisemos o vocábulo faturar. Derivado de fatura, quer significar o ato de se proceder à extração ou formação da fatura, a que se diz propriamente faturamento (SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Priscila Pereira Vasques Gomes. 31. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014). Subfaturamento, portanto, é o ato de faturar a menor.

18 No Brasil, pela ressalva ao AVA-GATT, acresce-se o valor gasto com o seguro e frete da mercadoria, o chamado valor CIF – Cost, Freight e Insurance.

19 Não abordaremos as penalidades de natureza penal, a exemplo do descaminho do art. 334 do Código Penal, mas apenas as de natureza fiscal-aduaneira.

20 DL 37/1966: “Art. 105. Aplica-se a pena de perda da mercadoria: [...] VI – estrangeira ou nacional, na im-portação ou na exportação, se qualquer documento necessário ao seu embarque ou desembaraço tiver sido falsificado ou adulterado”.

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O Regulamento Aduaneiro, em seu art. 68921, VI, repete a regra do inciso VI do art. 105 do DL 37/1966, mas diz mais, pois seu § 3º22 define que a aludida falsificação aplica-se tanto aos casos de falsidade ideológica quanto material.

Conceberiam os normativos até aqui citados, ao caso de subfaturamento, tanto a falsidade material quanto a ideológica?

Apoiemos-nos na lição de Damásio E. de Jesus a respeito:

Na falsidade material, o vício incide sobre a parte exterior do documento, recain-do sobre o elemento físico do papel escrito e verdadeiro. O sujeito modifica as características originais do objeto material por meio de rasuras, borrões, emen-das, substituição de palavras ou letras, números etc. [...] Na falsidade ideológica (ou pessoal), o vício incide sobre as declarações que o objeto material deveria possuir, sobre o conteúdo das ideias. Inexistem rasuras, emendas, omissões ou acréscimos. O documento, sob o aspecto material, é verdadeiro; falsa é a ideia que ele contém. Daí também se chamar ideal. Distinguem-se, pois, as falsidades material e ideológica.23

Essa distinção nos será importante para identificarmos se aos casos de falsidade ideológica, dos documentos instrutivos ao despacho aduaneiro, é pas-sível de aplicação da pena de perdimento.

Por sua vez, o inciso II do art. 169 aponta que o subfaturamento é infra-ção regulamentar sujeita à multa de 100% do valor da mercadoria24, em contra-posição à pena de perdimento do inciso VI do art. 105 do DL 37/1966 por falsa declaração de preço (ideológica).

Em nova antinomia de normas, o § 5º do art. 169 do DL 37/1966 aduz que “a aplicação das penas previstas neste artigo: I – não exclui o pagamento dos tributos devidos, nem a imposição de outras penas, inclusive criminais, previstas em legislação específica”; reforça a ideia de que o perdimento seria possível, já que seria imposição de outra pena, assim como autoriza a cobrança da diferença de tributos decorrentes da declaração subfaturada, que não se ex-clui (1ª parte da norma do inciso I).

21 “Art. 689. Aplica-se a pena de perdimento da mercadoria nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário: [...] VI – estrangeira ou nacional, na importação ou na exportação, se qualquer documento necessário ao seu embarque ou desembaraço tiver sido falsificado ou adulterado.”

22 Decreto nº 6.759/2009: “Art. 689. [...] § 3º-A. O disposto no inciso VI do caput inclui os casos de falsidade ideológica na fatura comercial. (Incluído pelo Decreto nº 7.213, de 2010)”.

23 Código Penal anotado. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 771.24 “Art. 169. Constituem infrações administrativas ao controle das importações: (Redação dada pela Lei

nº 6.562, de 1978): [...] II – subfaturar ou superfaturar o preço ou valor da mercadoria: (Redação dada pela Lei nº 6.562, de 1978). Pena: multa de 100% (cem por cento) da diferença.”

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A MP 2158-35/2001, por sua vez, em seu art. 88, parágrafo único, refor-ça a ideia de que o subfaturamento é infração sujeita à multa de 100%25 e res-salva ser devida a diferença de tributos, mas nada refere quanto ao perdimento.

O Regulamento Aduaneiro (arts. 8226 e 8627, c/c art. 703, § 1º e § 1º-A) também trata o subfaturamento como causa para aplicação de multa de 100%, mas admite o perdimento. Deve a autoridade fiscal optar em caso de subfatura-mento por uma ou outra penalidade, ou seja, aplicado o perdimento, afasta-se a cobrança conjunta da multa de 100%; optando-se pela multa, não cabe o perdimento28.

Por fim, o parágrafo único do art. 108 do DL 37/196629 volta a deter-minar a cobrança da diferença de tributos e a multa de 100% relativa à falsa declaração de valor, natureza e quantidade, trazendo à tona referir-se à con-duta de subfaturar o preço (falsidade ideológica). Percebe-se logo, apenas por curiosidade, que o percentual da multa pela diferença de tributos fora revogada

25 “Parágrafo único. Aplica-se a multa administrativa de cem por cento sobre a diferença entre o preço declarado e o preço efetivamente praticado na importação ou entre o preço declarado e o preço arbitrado, sem prejuízo da exigência dos impostos, da multa de ofício prevista no art. 44 da Lei nº 9.430, de 1996, e dos acréscimos legais cabíveis.”

26 “Art. 82. A autoridade aduaneira poderá decidir, com base em parecer fundamentado, pela impossibilidade da aplicação do método do valor de transação quando (Acordo de Valoração Aduaneira, art. 17, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994): I – houver motivos para duvidar da veracidade ou exatidão dos dados ou documentos apresentados como prova de uma declaração de valor; e II – as explicações, documentos ou provas complementares apresentados pelo importador, para justificar o valor declarado, não forem suficientes para esclarecer a dúvida existente. Parágrafo único. Nos casos previstos no caput, a autoridade aduaneira poderá solicitar informações à administração aduaneira do país exportador, inclusive o fornecimento do valor declarado na exportação da mercadoria.”

27 “Art. 86. A base de cálculo dos tributos e demais direitos incidentes será determinada mediante arbitramento do preço da mercadoria nas seguintes hipóteses: I – fraude, sonegação ou conluio, quando não for possível a apuração do preço efetivamente praticado na importação (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 88, caput); e II – descumprimento de obrigação referida no caput do art. 18, se relativo aos documentos obrigató-rios de instrução das declarações aduaneiras, quando existir dúvida sobre o preço efetivamente praticado (Lei nº 10.833, de 2003, art. 70, II, a). Parágrafo único. O arbitramento de que trata o caput será realizado com base em um dos seguintes critérios, observada a ordem sequencial (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 88, caput; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 70, II, a): I – preço de exportação para o País, de mercadoria idêntica ou similar; ou II – preço no mercado internacional, apurado: a) em cotação de bolsa de mercadoria ou em publicação especializada; b) mediante método substitutivo ao do valor de transação, observado ainda o princípio da razoabilidade; ou c) mediante laudo expedido por entidade ou técnico especializado.”

28 “Decreto nº 6.759/2009. [...] Art. 703. Nas hipóteses em que o preço declarado for diferente do arbitrado na forma do art. 86 ou do efetivamente praticado, aplica-se a multa de cem por cento sobre a diferença, sem prejuízo da exigência dos tributos, da multa de ofício referida no art. 725 e dos acréscimos legais cabíveis (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 88, parágrafo único). (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010). § 1º A multa de cem por cento referida no caput aplica-se inclusive na hipótese de ausência de apresentação da fatura comercial, sem prejuízo da aplicação de outras penalidades cabíveis (Lei nº 10.833, de 2003, art. 70, II, b, item 2, e § 6º). (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010). § 1º-A. Verificando--se que a conduta praticada enseja a aplicação tanto de multa referida neste artigo quanto da pena de perdimento da mercadoria, aplica-se somente a pena de perdimento. (Incluído pelo Decreto nº 8.010, de 2013).” (grifos nossos)

29 “Aplica-se a multa de 50% (cinquenta por cento) da diferença de imposto apurada em razão de declaração indevida de mercadoria, ou atribuição de valor ou quantidade diferente do real, quando a diferença do imposto for superior a 10% (dez por cento) quanto ao preço e a 5% (cinco por cento) quanto a quantidade ou peso em relação ao declarado pelo importador. Parágrafo único. Será de 100% (cem por cento) a multa relativa à falsa declaração correspondente ao valor, à natureza e à quantidade.”

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pelo art. 88 da MP 2.158-35/2001 (determina que se aplique o art. 44 da Lei nº 9.430/1996).

Como se está a ver, não existe uma regra pronta para o caso de subfatu-ramento, já que todos os normativos citados, à exceção do RA, vigorariam com força de lei30 e abordam condutas semelhantes.

Mas, voltando ao subfaturamento, o que percebemos é uma antinomia de normas em relação à falsidade ideológica. No que tange à falsidade mate-rial, não temos dúvida de que se sujeita ao perdimento do art. 105, VI, do DL 37/1966.

O ponto de análise, assim, fica em duas situações distintas: (i) a divergên-cia de valor (aduaneiro) com alegação de falsa declaração de preço (falsidade ideológica) e (ii) divergência de valor (aduaneiro) com imputação da prática de adulteração/falsificação de documentos relativos ao preço (falsidade material). Ambas as condutas se sujeitam ao perdimento?

Cremos que não. Ainda que a norma do inciso VI do art. 105 do DL 37/1966 não distinga o tipo de falsidade, para compatibilizá-la com as disposi-ções dos arts. 108 e 169 do DL 37/1966 e art. 88 da MP 2.158-35/2001 – não vamos considerar a regra do RA (Decreto nº 6.759/2009, § 3º do art. 689), pelas razões acima31 –, somos obrigados a compreender que o subfaturamento por falsidade ideológica afasta a pena de perdimento e demanda apenas a multa de 100% sobre o valor aduaneiro, a diferença de tributos e a multa de ofício.

É dizer, quando a divergência quanto ao valor aduaneiro referir-se à tran-sação comercial (preço) que o Fisco entenda incabível, por não concordar com o preço das mercadorias e presuma a falsidade ideológica, consistente no valor aduaneiro declarado, a penalidade de perdimento é incabível.

Como se nota, o perdimento, nesse caso (falsidade ideológica), pena das mais severas em comércio exterior, decorre da mera divergência quanto ao valor aduaneiro (preço da transação comercial) inserido nos documentos instru-tivos da operação de importação (fatura comercial e declaração de importação), despida, portanto, de imputação de falsificação/adulteração de documentos (falsidade material).

A acusação, deste modo, fundar-se-ia somente em divergência quanto ao valor aduaneiro, que, ao entender da fiscalização, teria sido feita para suprimir a base de cálculo dos tributos aduaneiros, com vistas ao menor pagamento de tributos aduaneiros, e não na inculpação da utilização de documentos falsos ou

30 Ressalvamos nossa opinião de que os Decretos-Leis nºs 37/1966 e 1.455/1976 têm constitucionalidade discutível, por eventual afronta ao art. 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), já que não foram apreciados pelo Congresso Nacional após 180 dias da promulgação da Constituição Federal.

31 Não cabe ao Regulamento inovar a ordem jurídica ou contrariar disposição legal (art. 84, IV, da CF/1988).

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adulterados materialmente (fatura comercial, DI, BL e demais documentos ins-trutivos do despacho aduaneiro) quanto ao preço declarado, cujo perdimento é inevitável e não se discute.

Em sentido estrito, conclui-se que a fraude no valor aduaneiro a determi-nar o perdimento, na forma do art. 105, VI, do Decreto-Lei nº 37/1966, é aquela decorrente de falsificação/adulteração de documentos (falsidade material) ins-trutivos do despacho de importação que não se refira à divergência de preço entre Fisco e contribuinte decorrentes de falsidade ideológica.

Aos casos de falsa declaração de preço (falsidade ideológica), cremos que a penalidade a ser aplicada é a multa de 100% do valor aduaneiro, acres-cida da diferença de tributos e multa de ofício, como traçado pelas disposições dos arts. 108 e 169 do DL 37/1966, e art. 88 da MP 2.158-35/2001, e nunca o perdimento.

Nossa pesquisa jurisprudencial mostrou que o Superior Tribunal de Justi-ça endossa por completo nosso pensar32.

Outra conclusão importante ao subfaturamento, após nosso estudo e in-terpretação, é a nossa afirmação inicial, no sentido de que não cabe falar ser infração regulamentar. Infração é penalidade, e pena só tem vez por meio de previsão normativa com status de lei. Nossa CF/1988 (art. 84, IV) abriga esse entendimento, ao prescrever que os regulamentos não inovam a ordem jurídica, quanto mais para prever penalidade. Ficamos com a posição de que o subfa-turamento, ao aspecto da falsidade ideológica, decorre unicamente de instru-mentos legais em sentido estrito, DL 37/1966 e MP 2158-35/2001. Para nós, interpretamos que o subfaturamento, por falsidade ideológica, é infração formal de caráter extrafiscal, em vista dos interesses jurídicos33 defendidos pelo ato importar bens. Daí a sua consequência prever sanção forte, a multa em 100% do valor aduaneiro, a diferença de tributos e multa de ofício.

4 O ARBITRAMENTO AOS CASOS DE SUBFATURAMENTO

Quando o Fisco parte para o arbitramento, por não confiar na declara-ção de preço do contribuinte, estamos diante do subfaturamento por falsidade

32 AgRg-REsp 1341312/PR, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 08.03.2013; REsp 1242532/RS, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJe 02.08.2012; REsp 1448678/SC, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, DJe 19.08.2014; REsp 1240005/RS, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJe 17.09.2013; REsp 1.217.708/PR, DJe 08.02.2011; REsp 1218798.

33 Soberania; art. 1º, I, da CF/1988, que pode se traduzir na proteção do mercado nacional, na dignidade da pessoa humana, art. 1º, III, da CF/1988; valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, art. 1º, IV, da CF/1988; objetivo republicano, art. 3º, I e II, da CF/1988: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária e II – garantir o desenvolvimento nacional; extrafiscalidade, art. 153, § 1º, da CF/1988. Esses fundamentos (valores/princípios) expressos da Constituição da República implicam e traduzem os interesses primários do Estado, exemplificados como: proteção do mercado nacional, política pública de desenvolvimento, economia pública (balança comercial), segurança pública, saúde pública etc.

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ideológica, como afirmamos, já que a falsificação material, em casos tais, impli-ca o perdimento da mercadoria.

A legislação que trata o tema é a MP 2158-35/2001, em seu arts. 8634 e 8835 (repetida nos arts 84, 85 e 8636 do Decreto nº 6.759/2009), que determina, grosso modo, o arbitramento (art. 14837 do CTN), na ordem sequencial estam-pada nos incisos de seu art. 88.

O lançamento por arbitramento do art. 148 do CTN, ainda que seja ato administrativo vinculado, encarado por alguns como penalidade e não forma de lançamento, já que desconsideradas as declarações do contribuinte pela eventual irregularidade ou má-fé, possibilita grande margem discricionária à Autoridade Fiscal lançadora, que deve apenas criar linha de raciocínio condi-zente com o arbitramento que realiza, dentre as hipóteses legais (art. 88 da MP 2158-35/2001).

34 “Art. 86. O valor aduaneiro será apurado com base em método substitutivo ao valor de transação, quando o importador ou o adquirente da mercadoria não apresentar à fiscalização, em perfeita ordem e conservação, os documentos comprobatórios das informações prestadas na declaração de importação, a correspondência comercial, bem assim os respectivos registros contábeis, se obrigado à escrituração.”

35 “Art. 88. No caso de fraude, sonegação ou conluio, em que não seja possível a apuração do preço efetiva-mente praticado na importação, a base de cálculo dos tributos e demais direitos incidentes será determinada mediante arbitramento do preço da mercadoria, em conformidade com um dos seguintes critérios, observada a ordem sequencial: I – preço de exportação para o País, de mercadoria idêntica ou similar; II – preço no mercado internacional, apurado: a) em cotação de bolsa de mercadoria ou em publicação especializada; b) de acordo com o método previsto no Art. 7 do Acordo para Implementação do Art. VII do GATT/1994, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 15 de dezembro de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 30 de dezembro de 1994, observados os dados disponíveis e o princípio da razoabilidade; ou c) mediante laudo expedido por entidade ou técnico especializado. Parágrafo único. Aplica-se a multa administrativa de cem por cento sobre a diferença entre o preço declarado e o preço efetivamente praticado na importação ou entre o preço declarado e o preço arbitrado, sem prejuízo da exigência dos impostos, da multa de ofício prevista no art. 44 da Lei nº 9.430, de 1996, e dos acréscimos legais cabíveis.”

36 “Art. 84. O valor aduaneiro será apurado com base em método substitutivo ao valor de transação, no caso de descumprimento de obrigação referida no caput do art. 18, se relativo aos documentos comprobatórios da relação comercial ou aos respectivos registros contábeis, quando houver dúvida sobre o valor aduaneiro declarado (Lei nº 10.833, de 2003, art. 70, I, a). Art. 85. Na apuração do valor aduaneiro, presume-se a vinculação entre as partes na transação comercial quando, em razão de legislação do país do vendedor ou da prática de artifício tendente a ocultar informações, não for possível (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 87): I – conhecer ou confirmar a composição societária do vendedor, de seus responsáveis ou dirigentes; ou II – verificar a existência, de fato, do vendedor. Art. 86. A base de cálculo dos tributos e demais direitos incidentes será determinada mediante arbitramento do preço da mercadoria nas seguintes hipóteses: I – fraude, sonegação ou conluio, quando não for possível a apuração do preço efetivamente praticado na importação (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 88, caput); e II – descumprimento de obrigação referida no caput do art. 18, se relativo aos documentos obrigatórios de instrução das declarações aduaneiras, quando existir dúvida sobre o preço efetivamente praticado (Lei nº 10.833, de 2003, art. 70, II, a). Parágrafo único. O arbitramento de que trata o caput será realizado com base em um dos seguintes critérios, observada a ordem sequencial (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 88, caput; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 70, II, a): I – preço de exportação para o País, de mercadoria idêntica ou similar; ou II – preço no mercado internacional, apurado: a) em cotação de bolsa de mercadoria ou em publicação especializada; b) mediante método substitutivo ao do valor de transação, observado ainda o princípio da razoabilidade; ou c) mediante laudo expedido por entidade ou técnico especializado.”

37 “Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.”

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Com efeito, o arbitramento na forma do art. 88 da MP 2.158-35/2001 (e incisos) permite ao Fisco adotar

I – preço de exportação para o País, de mercadoria idêntica ou similar;

II – preço no mercado internacional, apurado:

a) em cotação de bolsa de mercadoria ou em publicação especializada;

b) de acordo com o método previsto no Artigo 7 do Acordo para Implementação do Artigo VII do GATT/1994, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 15 de dezembro de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 30 de dezem-bro de 1994, observados os dados disponíveis e o princípio da razoabilidade; ou

c) mediante laudo expedido por entidade ou técnico especializado.

O arbitramento, nessas situações, leva em conta inúmeras informações por parte da fiscalização, já que ela acessa sua base de dados contábil-fiscal e de comércio exterior, exercendo seu poder de polícia (art. 237 da CF/1988).

Na medida em que o valor aduaneiro de mercadorias, em geral, varia muito de acordo com as características de cada negociação realizada, levando em conta (i) quantidades, (ii) época, (iii) margem de lucro, (iv) custo operacional estrangeiro, nacional, (v) tributação de cada país, (vi) qualidade, (vii) performan-ce, (vii) prazo e condições de pagamento, (viii) composição e material, entre outros, o arbitramento realizado por suposta prática de fraude no preço é muito específico e peculiar em cada processo de arbitramento realizado pelo Fisco, não passível de generalização.

Esse arbitramento feito pelo Fisco é perfeitamente possível e legal para fins de aposição de valor aduaneiro (preço da transação comercial de compra e venda), dentro das hipóteses elencadas pelo art. 88 e incisos da MP 2.158-35/2001, sendo que cada caso tem apreciação e análise específica, não ge-nérica, dentro do controle e fiscalização aduaneiros feitos com o registro da declaração de importação de determinada importação fiscalizada.

5 O SUBFATURAMENTO NO DESPACHO ADUANEIRO

Conforme o art. 570 do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2.009), verificada, durante a conferência aduaneira, ocorrência que impeça o prosse-guimento do despacho, este terá seu curso interrompido, após o registro da exigência correspondente pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal responsável.

Na hipótese de a exigência referir-se a crédito tributário, o importador poderá efetuar o pagamento correspondente, independentemente de processo (art. 570, § 2º, do decreto em comento).

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA ����������������������������������������������������������������������������������������������������������������������77

Havendo manifestação de inconformidade, por parte do importador, em relação à exigência de que trata o § 2º do art. 570 (diferença do valor decla-rado em DI e o entendido pela fiscalização como o correto), o Auditor-Fiscal da Receita Federal deverá efetuar o respectivo lançamento, na forma prevista no Decreto nº 70.235/1972 (art. 570, § 3º), conforme dispõe o art. 768 do RA. Quando exigível o depósito ou o pagamento de quaisquer ônus financeiros ou cambiais ou o cumprimento de obrigações semelhantes, o despacho será inter-rompido até a satisfação da exigência.

Ou seja, a questão se resume na cobrança da diferença do eventual cré-dito tributário.

Ao discorrermos sobre o subfaturamento, nota-se que as exigências pas-síveis de ocorrência durante o ato de Conferência Aduaneira são aquelas que ditem de perto com a multa de 100% sobre o valor aduaneiro, a diferença de tributos da base subfaturada e a multa de ofício, em interpretação sistêmica dos arts. 108, parágrafo único, e 169, II, do DL 37/1966, c/c o parágrafo único do art. 88 da MP 2.158-35/2001.

Ora, se a norma prevê que a Administração Aduaneira deve substituir a declaração “supostamente” falsa pela correta e aplicar a multa expressamente tipificada, cobrando os tributos devidos, não é cabível qualquer outro procedi-mento, inclusive o perdimento.

Ainda que haja divergência, no que diz respeito ao valor consignado às mercadorias e, por consequência, o valor do tributo devido, resta ao Fisco pro-ceder ao lançamento, na forma no § 3º do art. 570 do Regulamento Aduaneiro, a fim de cobrar o que entende, seguindo-se o rito do Decreto nº 70.235/1972, diante da prescrição do inciso III do art. 151 do Código Tributário Nacional.

Ilegal, assim, condicionar-se a liberação de mercadorias aos pagamentos das exigências fiscais aduaneiras ao auspício de serem inerentes à nacionali-zação da mercadoria, se discorremos de diferença de tributos cuja exigência repousa no rito da cobrança dos créditos fiscais federais, com incidência de norma de sobreposição, o art. 151, III, do Código Tributário Nacional.

A infração imputada, subfaturamento com falsidade ideológica, dessa ma-neira, resume-se à cobrança da diferença de tributos-aduaneiros, ex vi do Decreto nº 70.235/1972 c/c o arts. 5700, §§ 2º e 3º, e 768, do Regulamento Aduaneiro, e arts. 42, §§ 1º e 2º, e 43, da IN/SRF 680/2006, c/c o art. 142 do CTN.

Ademais, a obrigação tributária de recolher tributos, e, entre eles, os tri-butos aduaneiro-tributários, ainda antes de Cristo – Lex Poetelia Papiria38, de

38 “Estabeleceu que o inadimplemento passaria a ensejar não mais a execução pessoal, mas tão somente a execução patrimonial do devedor, com exceção do inadimplemento das dívidas provenientes de delitos, que

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78 ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������ RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA

326 a.C., envolve relação obrigacional de dar, a ser sentida no bolso do infra-tor, não se cogitando de meios indiretos à sua satisfação, como a retenção da mercadoria.

Imprópria, assim, a jurisprudência39 que decide pela constitucionalida-de e legalidade da Portaria MF nº 389/1976, regulando o art. 39 do Decreto nº 1.455/1979, base na qual foi editada, que impõe o dever de se prestar ga-rantia (depósito em dinheiro, títulos da dívida pública ou fiança bancária), na pendência de litígio fiscal sobre a exigibilidade de tributos aduaneiros, para o fim de desembaraço antecipado de produtos importados.

Reputamos que o confronto dessa legislação (Portaria nº 389), em confli-to40 com as normas do § 3º do art. 570 do Regulamento Aduaneiro, o Decreto nº 70.235/1972, e a prescrição do inciso III do art. 151 do Código Tributário Nacional, não se sustenta, por qualquer prisma que se análise o expurgo da antinomia dessa norma, seja adotando o critério hierárquico (CTN), cronológi-co (Decreto nº 70.235/1972) ou da especialidade (§ 3º do art. 570 do RA c/c o Decreto nº 70.235/1972).

CONCLUSÃO

Após nossa digressão, podemos sintetizar nosso pensar da forma se guinte:

(i) subvaloração é a declaração errônea de valor aduaneiro, sem frau-de, em descompasso com as regras do AVA-GATT, regime jurídico esse que a disciplina;

(ii) subfaturamento é infração formal, de cunho extrafiscal, não regula-mentar, em vista dos valores/princípios que ordenam a atividade de comércio exterior e do direito aduaneiro;

permitia a execução da própria pessoa.” (AZEVEDO, A. V. Prisão civil por dívida. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 18)

39 TRF 3ª R., AMS 0208682-64.1997.4.03.6104, 6ª T., Relª Desª Fed. Consuelo Yoshida, J. 02.12.2010, e-DJF3 Judicial 1; TRF 3ª R., REOMS 0004178-57.2001.4.03.6104, 4ª T., Rel. Juiz Conv. em Auxílio Miguel Di Pierro, J. 29.07.2010, e-DJF3 Judicial 1; TRF 3ª R., AMS 0010689-64.1993.4.03.6100, 3ª T., Rel. Juiz Conv. Roberto Jeuken, J. 22.11.2006, DJU 17.01.2007; TRF 3ª R., AMS 0012099-30.2002.4.03.6105, 3ª T., Rel. Des. Fed. Carlos Muta, J. 24.05.2006, DJU 07.06.2006.

40 A hipótese de antinomia real decorre do conflito entre critérios (conflito de 2º grau) em três casos: (1) critério cronológico versus critério hierárquico, tal como lei ordinária posterior à Constituição (prevalecendo a hie-rarquia, já que a norma inferior não pode contrariar a superior); (2) especialidade versus cronológico, como no código posterior à lei especial, prevalecendo, então, a especialidade, já que se aplica o adágio de que a lei geral posterior não revoga as disposições contrárias; e (3) hierarquia versus especialidade, caso em que, segundo Bobbio, a solução dependerá da situação concreta, pois há dois valores em jogo, vale dizer, princípio da hierarquia versus o princípio da justiça. Por sempre prevalecerem em relação ao critério cronológico, os critérios de hierarquia e especialidade são chamados de critérios “fortes” (BOBBIO, Norberto. Teoria do orde-namento jurídico, p. 81-111). (BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Trad. Cláudio de Cicco e Maria Celeste C. J. Santos. São Paulo: Polis; Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1989. 184 p.)

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA ����������������������������������������������������������������������������������������������������������������������79

(iii) o subfaturamento sujeito ao perdimento é o que decorra de falsida-de material (art. 105, VI, do DL 37/1966); ao caso de falsidade ideo-lógica, aplica-se multa de 100% sobre o valor aduaneiro, diferença de tributos e multa de ofício (parágrafo único do art. 108 e inciso II do art. 169, ambos do DL 37/1966 c/c o parágrafo único do art. 88 da MP 2.158-35/2001);

(iv) o arbitramento aos casos de subfaturamento por falsidade ideológi-ca segue o regime da MP 2.158-35/2.001 (art. 88 e seus incisos);

(v) constatado o subfaturamento por falsidade ideológica, no curso do despacho aduaneiro, cabe o lançamento de ofício com a cobrança da multa de 100% sobre o valor aduaneiro, a diferença de tributos e a multa de ofício; segue-se o rito do Decreto nº 70.235/1972, com possibilidade de suspensão da exigibilidade do crédito (151, III, do CTN), se ofertada impugnação, sendo imprópria a retenção de mer-cadorias como condição à liberação das mercadorias.

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Parte Geral – Doutrina

Questões Pertinentes à Cobrança de Sobrestadia de Contêiner

Issues Pertaining to the Collection Container Demurrage

ROnALDO MAnZOAdvogado em Santos, Especialista em Direito Marítimo e Aduaneiro, Pós-Graduado e Mestre em Direito.

RESUMO: As questões pertinentes à demurrage e sua interpretação diante do ordenamento jurídico pátrio e suas distorções trazem sempre muito calor e pouca luz na solução dos conflitos, gerando insatisfação aos jurisdicionados pela instabilidade de posicionamentos em razão da necessidade de um regramento eficaz e definitivo.

PALAVRAS-CHAVE: Demurrage; indenização.

ABSTRACT: The issues related to demurrage and its interpretation before the law and its distortions always bring a lot of heat and little light in the solution of conflicts causing dissatisfaction to jurisdic-tional instability ratio positions of the need for an effective and definitive law.

KEYWORDS: Demurrage; indemnity.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Prescrição; 2 Cláusula penal; 3 Indenização pré-fixada; 4 Valoração da inde-nização; 5 Termo de responsabilidade; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

A beleza e a imantação que o Direito tem sobre seus operadores está arraigada exatamente na possibilidade da aplicação direta da hermenêutica, em que cada operador faz um silogismo próprio e individual, sempre muito particu-lar, com relação à letra da lei. Muitas vezes, bailando entre os prismas possíveis, dependendo da necessidade de se explicar ou justificar determinadas posições.

Invariavelmente, vemos na literatura jurídica textos ou posicionamentos que concretizam ideias deveras distantes da realidade, que divagam na beleza da interpretação e se afastam do pensamento e da vontade do legislador quando da lavra da lei.

Um clássico exemplo é o posicionamento da demurrage no nosso orde-namento jurídico. Esse pequeno ramo do Direito vem sofrendo e muito com distorções em suas regras, mesmo porque são utilizadas normas emprestadas, por faltar vontade do Poder Legislativo em colocar uma pá de cal sobre o as-sunto e assim não deixar para que os operadores do Direito façam as vezes do poder legiferante.

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Quando a letra positivada inexiste ou quando deixa margem para inter-pretações díspares, certamente isso vai ocorrer, e assim o jurisdicionado, ou seja, as pessoas que são destinatárias dessa regra, são flageladas com as incer-tezas. E não há nada pior do que não saber ou não ter a certeza do que é certo ou errado, ou mesmo do que pode ou não pode, considerando o ordenamento jurídico vigente. A insegurança jurídica só faz crescer as lides e a insatisfação de todos que são, de uma forma ou de outra, afetados pela falta de uma norma clara e objetiva.

No direito marítimo, há uma eterna discussão sobre a regra, ou sua falta, no tocante à regulamentação das cobranças de sobrestadias dos contêineres, as chamadas demurrages.

Vamos abordar neste singelo arrazoado alguns aspectos que permeiam esse inebriante assunto. Colocaremos as premissas para que os leitores façam seu próprio silogismo, e assim colaborar com a busca de uma luz sobre a dis-cussão que se avoluma a cada dia em todos os tribunais de nosso querido país.

1 PRESCRIÇÃO

O primeiro tema recorrente que necessita sempre ser tratado em prelimi-nar de defesa é o prazo para que o credor possa se utilizar da tutela jurisdicional a fim de haver o que entende ser-lhe devido, ou seja, a prescrição.

A prescrição, na acepção técnica jurídica, é a perda do direito de ação, ou seja, o jurisdicionado tem o direito, mas não pode mais utilizar o Poder Ju-diciário para concretizá-lo – diferente da decadência, que é a perda do direito. Agora avancemos na questão!

A Lei nº 10.406/2002, nosso aclamado Código Civil, revogou parte do Código Comercial, trazendo para seu bojo todo o regramento das relações co-merciais, com inúmeras inovações, e assim o legislador, com acerto, revogou a letra antiga do Código Comercial. Entretanto, dentro do texto revogado havia a regra da prescrição, mais precisamente no art. 449, que assim dizia: “Prescreve igualmente em um ano as ações de frete e primagem, estadias e sobrestadias e as de avaria simples a contar do dia da entrega da carga”.

Como a regra revogada era objetiva sobre o tema “prescrição de sobres-tadia”, alguns operadores do Direito rapidamente buscaram no próprio Código Civil o balizamento para seus direitos. Assim, utilizam hoje o art. 206 dessa lei. Infelizmente, mesmo os que entendem que a regra para a prescrição do demurrage está no Código Civil não definem se o prazo é de 5 ou de 10 anos, pois o próprio Superior Tribunal de Justiça – STJ tem entendimento tanto para um lado quando para outro, dependendo das circunstancias do caso.

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Isso beira as raias do absurdo; afinal, qual é a segurança jurídica que os operadores do comércio exterior podem ter se nem mesmo o Poder Judiciário diz qual prazo é aplicável? A resposta para a recorrente pergunta referente ao prazo será... depende! Cremos que todos que labutam no Comex de nosso país merecem um pouco mais de respeito, afinal geram milhares de empregos e pa-gam milhões em impostos!

Por outro lado, há uma corrente, à qual nos filiamos, que entende que o prazo para essa cobrança é de um ano a contar da descarga, pois esse é o tempo previsto no art. 22 da Lei nº 9.911/1998, lei que regula o transporte multimodal de cargas, assim lavrada:

As ações judiciais oriundas do não cumprimento das responsabilidades decor-rentes do transporte multimodal deverão ser intentadas no prazo máximo de um ano, contado da data da entrega da mercadoria no ponto de destino ou, caso isso não ocorra, do nonagésimo dia após o prazo previsto para a referida entrega, sob pena de prescrição.

O fato de essa lei regular o transporte feito por mais de uma modalidade, no entender de alguns, impede que a regra seja aplicada quando se tratar de somente uma modalidade de transporte; desta feita, os armadores que efetiva-mente disponibilizam um modal para transporte não seriam alcançados por essa regra.

Não é demais lembrar que os modais são totalmente independentes e, quando utilizados juntos, através de um único conhecimento de transporte ou separados, com um conhecimento de transporte para cada modalidade, em nada afeta a estrutura de cada um. Cada modal individualmente continua com as mesmas características, os mesmo riscos e as mesmas responsabilidades. Diante disso, subsumir o fato (transporte) a norma (Lei nº 9.611/1998) é perfei-tamente possível e justo, bastando um rápido perlustrar na própria lei para ver que se encaixa perfeitamente no transporte marítimo quando utilizado separa-damente.

Sem essa lei, a natureza jurídica do cofre de carga ficaria indefinida, pois esse equipamento é um bem estrangeiro que ingressa em território nacional e, portanto, deveria seguir as regras pertinentes à importação. Entretanto, não é isso que ocorre, pois os armadores utilizam o art. 24 para justificar a sua pro-priedade, assim lavrado:

Para os efeitos desta lei, considera-se unidade de carga qualquer equipamento adequado à unitização de mercadorias a serem transportadas, sujeitas a movi-mentação de forma indivisível em todas as modalidades de transporte utilizadas no percurso.

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA ����������������������������������������������������������������������������������������������������������������������83

Parágrafo único. A unidade de carga, seus acessórios e equipamentos não cons-tituem embalagem e são partes integrantes do todo.

Nas demandas manejadas em juízo, os armadores ratificam que o con-têiner é seu, que não é embalagem da carga e que deve ser devolvido. Sem sombra de dúvida, devemos concordar com tais assertivas, pois refletem a exata realidade.

O que não podemos assentir é que um artigo da lei, o 24, sirva para os armadores e outro artigo, o 22, não sirva! Não se pode cingir uma lei utilizando o que lhe é benéfico e afastando o que não lhe interessa. Não existe meia lei. Ou a lei se aplica, ou a lei não se aplica. Concordamos plenamente com os termos do art. 24. Ato contínuo, entendemos também haver validade ao art. 22, por ser questão de justiça e respeito ao cumprimento legal.

O tema é tão controverso que nossa Corte Superior, o STJ, tem dentro de seus ministros um claro antagonismo sobre esse assunto. À guisa de curiosida-de, pedimos a devida vênia para colacionar a este trabalho dois informativos exarados pelo STJ, totalmente díspares: o primeiro definindo a prescrição ânua; o segundo, a de cinco ou dez anos:

Direito civil. Prazo prescricional para cobrança de sobre-estadia de contêiner. Prescreve em um ano a pretensão de cobrar despesas de sobre-estadia de contêiner (demurrage), quer se trate de transporte multimodal, quer se trate de transpor-te unimodal. Embora existam dispositivos legais em vigor que tratam de pres-crição no âmbito do transporte marítimo, nenhum deles versa especificamente acerca da sobre-estadia de contêiner. Assim, a solução da controvérsia deve ser buscada no regramento do art. 22 da Lei nº 9.611/1998, que estabelece prazo prescricional de um ano para as ações judiciais oriundas do não cumprimen-to das responsabilidades decorrentes do transporte multimodal. Observe-se que esse dispositivo legal não se limita às ações entre o contratante e o operador do transporte multimodal. A sua redação foi abrangente, incluindo todas as ações judiciais oriundas do transporte multimodal. A propósito, esclareça-se que, no transporte multimodal, uma pessoa jurídica, denominada operador de transporte multimodal (OTM), assume a responsabilidade de transportar a carga da origem até o destino, utilizando-se de duas ou mais modalidades de transporte, podendo subcontratar terceiros. Nesse passo, a Lei nº 9.611/1998, além de tratar da res-ponsabilidade do OTM, dispõe também acerca da responsabilidade dos subcon-tratados, conforme se verifica, dentre outros dispositivos, dos arts. 12 e 16. Desse modo, a redação abrangente do art. 22 da referida lei, regulando a prescrição ânua, teve como objetivo abarcar não somente a relação jurídica do contratan-te com o operador, mas também as que envolvem estes e os subcontratados. Nessa medida, a pretensão de cobrança da demurrage, deduzida pelo armador (subcontratado) contra o operador de transporte multimodal, também deve estar sujeita ao mesmo prazo prescricional de um ano previsto no art. 22 da referi-da lei, tendo em vista a inexistência de prazo diverso em legislação específica.

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Assim, se a demurrage, no transporte multimodal, está sujeita ao prazo prescri-cional de um ano, e considerando a necessidade de coerência entre as normas de um mesmo sistema jurídico, é recomendável que a prescrição no transporte unimodal também deva ocorrer no mesmo prazo. Isso porque, do ponto de vista do armador, titular da pretensão, a demurrage é sempre o mesmo fato, seja o transporte marítimo o único meio de transporte (unimodal), seja ele apenas uma parte do transporte multimodal. Dessa maneira, é possível, inclusive, que em um mesmo contêiner existam mercadorias sujeitas a um contrato de transporte multimodal e outras a um unimodal. Além disso, nada obsta que um operador de transporte multimodal celebre também contratos de transporte unimodal. Nessas circunstâncias, caso haja atraso na devolução do contêiner, haveria um conflito entre a prescrição anual, prevista no art. 22 da Lei nº 9.611/1998, e a prescrição quinquenal, prevista no art. 206, § 5º, I, do Código Civil. A melhor solução, portanto, é entender que a prescrição do art. 22 da Lei nº 9.611/1998 aplica-se também ao contrato unimodal, pois o transporte multimodal, no plano dos fatos, nada mais é do que a integração de dois ou mais transportes unimodais. Em ver-dade, as normas referentes à prescrição devem ser interpretadas restritivamente; entretanto, há de se lembrar, também, que a interpretação não pode conduzir a resultados contraditórios, como ocorreria na hipótese de se estabelecer prazos prescricionais diversos para a demurrage em transporte multimodal e unimodal. Além do mais, concluir-se pela prescrição anual também tem a vantagem de tra-tar de maneira uniforme a pretensão deduzida pelo armador quanto à demurrage e a pretensão deduzida contra o armador, quanto aos danos à carga transportada (art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967). (REsp 1.355.095/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, J. 09.12.2014, DJe 12.03.2015)

Direito empresarial. Prazo de prescrição da pretensão de cobrança de demurrage. Prescreve em cinco anos a pretensão de cobrança de valores estabelecidos em contrato de transporte marítimo de cargas (unimodal) para as despesas de sobre--estadia de contêiner (demurrage). A distinção entre o que se denominou ser trans-porte multimodal e o transporte dito unimodal, pelo menos para fins de definição do prazo prescricional aplicável à eventual pretensão de cobrança de despesas de sobre-estadia de contêineres, não se fazia relevante até a entrada em vigor do novo Código Civil, já que, ainda que se admitisse a existência de demurrage no transporte multimodal, para ambos os casos o prazo previsto necessariamente seria ânuo. No caso do transporte unimodal, por força do estabelecido pelo Có-digo Comercial, e, no do transporte multimodal, em virtude da específica regra do art. 22 da Lei nº 9.611/1998. Ocorre que o artigo do Código Comercial que estabelecia o prazo de prescrição de um ano para a hipótese (art. 449, 3) foi expressamente revogado pelo Código Civil de 2002 (art. 2.045). Já quanto ao não cumprimento das responsabilidades decorrentes do transporte multimodal, o prazo prescricional permanece sendo de um ano por expressa previsão no art. 22 da Lei nº 9.611/1998. Ademais, nenhuma relação com a hipótese guarda o art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967, haja vista dispor no sentido de que prescrevem “ao fim de um ano, contado da data do término da descarga do navio transportador”, as ações decorrentes do eventual extravio da carga transportada, bem como da falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou danos a esta. Quanto à apli-

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cação analógica do art. 22 da Lei nº 9.611/1998, esta é absolutamente incabível, pois não se coaduna com os princípios gerais que regem o direito civil brasileiro, além de constituir verdadeiro atentado à segurança jurídica. É justamente a dife-rença existente entre as atividades desempenhadas pelo transportador marítimo e aquelas legalmente exigidas do operador de transporte multimodal que revela, por si só, a manifesta impossibilidade de se estender à pretensão de cobrança de despesas decorrentes da sobre-estadia de contêineres (pretensão do transpor-tador unimodal contra o contratante do serviço) a regra que estabelece o prazo prescricional ânuo para as ações fundadas no não cumprimento das responsa-bilidades decorrentes do transporte multimodal (pretensões dos contratantes do serviço contra o operador de transporte multimodal). Vale destacar que, no caso do transporte unimodal (marítimo), a responsabilidade do transportador é restrita ao percurso marítimo, que se inicia após o recebimento da carga a bordo do navio no porto de origem, cessando imediatamente após o içamento das cargas e o consequente desembarque no porto de destino. Ou seja, os demais serviços e atos correlatos, como desembaraço aduaneiro, transporte, desunitização dos contêineres etc., são de exclusiva responsabilidade do afretador, e, por tal mo-tivo, a demora na conclusão desse procedimento pode resultar em demasiado atraso na devolução dos contêineres utilizados no transporte da carga ao trans-portador. Essa situação que não se verifica no transporte multimodal de cargas, visto que este compreende, consoante expressamente disposto no art. 3º da Lei nº 9.611/1998, “além do transporte em si, os serviços de coleta, unitização, desu-nitização, movimentação, armazenagem e entrega da carga ao destinatário, bem como a realização dos serviços correlatos que forem contratados entre a origem e o destino, inclusive os de consolidação e desconsolidação documental de car-gas”. Em outras palavras, em nenhum momento a unidade de carga deixa de estar sob a posse e o controle do operador de transporte multimodal, sendo descabido, portanto, falar, em tal caso, na existência de responsabilidade do contratante por suposta sobre-estadia de contêineres. Além da dessemelhança das situações em apreço, certo é que, em se tratando de regras jurídicas sobre prazos prescricio-nais, a interpretação analógica ou extensiva sequer é admitida pelo ordenamento jurídico. A própria inteligência do caput do art. 205 do Código Civil evidencia a impossibilidade de interpretação analógica ou extensiva de norma sobre pres-crição, visto que estabelece o prazo prescricional decenal como regra geral a ser aplicada nas hipóteses em que prazo inferior não seja expressamente fixado por lei. Desse modo, diante da certeza de que o art. 22 da Lei nº 9.611/1998 não alcança as ações de cobrança de despesas de sobre-estadia decorrentes da exe-cução de contrato de transporte de cargas unimodal e de que inexiste lei especial vigente que defina prazo prescricional específico para a referida pretensão, a matéria deve ser regida pelas disposições insertas no Código Civil. Não por outro motivo é que ambas as Turmas julgadoras integrantes da Segunda Seção do STJ já haviam reconhecido que, em se tratando de transporte unimodal de cargas, quando a taxa de sobre-estadia objeto da cobrança for oriunda de disposição contratual que estabeleça os dados e os critérios necessários ao cálculo dos valo-res devidos a título de ressarcimento pelos prejuízos causados em virtude do re-torno tardio do contêiner, será quinquenal o prazo prescricional (art. 206, § 5º, I,

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do CC); caso contrário, ou seja, nas hipóteses em que inexistente prévia estipula-ção contratual, aplica-se a regra geral do art. 205 do CC, ocorrendo a prescrição em dez anos. Precedentes citados: REsp 1.192.847/SP, 3ª T., DJe 01.08.2014; e REsp 1.355.173/SP, 4ª T., DJe 17.02.2014. (REsp 1.340.041/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, J. 24.06.2015, DJe 04.09.2015)

Fica claro que o tema não é simples, muito menos pacificado no Judi-ciário brasileiro, razão pela qual devemos fomentar as discussões a fim de que os pensamentos se alinhem e assim trazendo a tão decantada, em verso e prosa, segurança jurídica. Nessa linha de raciocínio, defendemos fervorosamente que a prescrição para a cobrança de demurrage é ânua, mesmo porque, com o ad-vento do novo Código Civil, o legislador diminuiu todos os prazos que estavam no código antigo. É um contrassenso elevar o prazo de um para cinco ou dez anos, remando, claramente, contra a maré do legislador que reduziu os prazos na nova legislação.

2 CLÁUSULA PENAL

Outra tese que vem sendo debatida fervorosamente nos processos judi-ciais assenta-se na natureza jurídica dessa cobrança. Seria uma cláusula penal ou uma indenização pré-fixada?

Vejamos o que diz a lei sobre ambas as teses. Vale lembrar que nunca devemos nos afastar da regra positivada, ou seja, da lei escrita, quando tirarmos nossas conclusões sobre qualquer tema, pois, se assim o fizermos, certamente estaremos nos aproximando de um estado anárquico. Se não seguimos as leis, então para que devemos produzi-las? Bom seria se nosso grau de civilidade al-cançasse esse nirvana onde resolvêssemos nossos conflitos através do diálogo e através do bom-senso comum; contudo, devemos reconhecer que muito ainda nos falta para sequer pensar nessa possibilidade.

Cabe-nos então buscar, no ordenamento jurídico vigente, o caminho a percorrer para a solução. Dito isso, indagamos: qual a natureza jurídica da so-brestadia de contêiner? Vejamos a primeira hipótese.

O que é uma clausula penal? Inicialmente, pedimos vênia para colacio-nar o texto legal, arts. 408 e 409 do Código Civil:

Art. 408. Incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que, culpo-samente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.

Art. 409. A cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, pode referir-se à inexecução completa da obrigação, à de alguma cláusula especial ou simplesmente à mora.

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Para o eminente Professor R. Limongi França, publicado na obra Enciclo-pédia Saraiva do Direito, volume 15, página 116, é um instituto anexo dos con-tratos, dos quais é um pacto acessório, cuja finalidade é garantir, em benefício do credor através do estabelecimento de uma pena, o fiel e exato cumprimento da obrigação principal.

A mesma obra traz a definição lavrada pelo não menos ilustre e festejado jurista Clovis Beviláqua: é um pacto acessório, em que estipulam penas ou, an-tes, multas contra aquele que deixa de cumprir o ato ou fato, a que se obrigou, ou apenas retarda a sua execução (Direito das obrigações, p. 64).

Trazendo à baila o suporte fático que permeia a operação, lembramos que, quando da chegada da mercadoria acondicionada no cofre de carga, o importador, para sua retirada, assina um termo de responsabilidade obrigando--se a devolver o equipamento dentro de um determinado tempo (free time) ao armador. Assim ocorrendo, nada será devido.

Por outro lado, superado esse “tempo livre” (free time), poderá o armador exigir um valor pecuniário por cada dia de atraso até sua efetiva devolução. Vemos claramente que os fatos narrados se encaixam perfeitamente na hipótese criada pela lei, portanto inexiste margem para outros silogismos senão a defini-ção de que demurrage é uma cláusula penal.

Em sendo uma cláusula penal, suas regras devem ser observadas, mais precisamente a contida no art. 412 da mesma lei: o valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal. Vale dizer que o valor que é exigido pela sobrestadia do contêiner não pode ser maior que o valor do próprio contêiner. Os armadores rechaçam essa tese, pois impediria os expressivos ganhos com essa cobrança que hoje não tem limites a atingir, podendo chegar, como chegam, à cifra de milhões de reais.

Certamente, engrossamos as fileiras que aquiescem com o pensamento de que demurrage tem como natureza jurídica a condição de penalidade, por-tanto é uma cláusula penal; todavia, superado esse entendimento, e respeitando posicionamentos outros, caso o leitor entenda que não se trata de cláusula pe-nal, e sim de uma indenização pré-fixada, temos também que analisar essa pos-sibilidade sob a ótica e o manto do Código Civil brasileiro, Lei nº 10.406/2002, que acoberta todas as relações cíveis em nosso País.

3 INDENIZAÇÃO PRÉ-FIXADA

Somente por amor à argumentação, deixemos de lado a cláusula penal e acreditemos que a natureza jurídica da demurrage seja uma indenização pré-fi-xada. Podemos afirmar que essa tese já nasce morta, considerando o regramen-to contido no art. 944 do Código Civil, assim escrito: “A indenização mede-se

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pela extensão do dano”. Quando o legislador assim definiu, objetivou elidir que o prejudicado se locupletasse diante de um eventual dano.

Não percamos de vista que estamos falando de “indenização”. Vale di-zer que aquele que sofrer qualquer dissabor deverá ser reparado; contudo, a reparação deve ser estendida até o limite exato do dano, caso contrário haverá a incidência de ganho, fato proibido pela mesma lei, pois a extensão do dano é o limite para o ressarcimento – nada mais, além disso, pode ser exigido.

Eventualmente, se o ofendido receber mais do que o necessário para retornar ao status quo ante, certamente haverá enriquecimento sem causa, ou seja, incidindo nos arts. 884 e 885 do mesmo diploma legal, que assim reza:

Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido feita a atualização dos valores mo-netários.

Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que jus-tifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.

Diante disso, vemos que a lei, regra básica e necessária para a vida em sociedade, diz que, em havendo um dano, o ofendido deve ser ressarcido no exato montante do prejuízo; havendo qualquer recebimento além do que seria necessário a obturar o dano, há ganho sem justificativa, ou seja, enriquecimento sem causa, também previsto em lei.

Em um aprofundamento sobre o tema, mister se faz consignar que não há, em todo o sistema legal brasileiro, qualquer linha escrita que justifique a tese de que é possível pré-fixar uma indenização. Inexiste lei que permita essa construção; o que há é exatamente o contrário, o art. 944 transcrito em epígrafe.

Esse entendimento é uma aberração jurídica gerada no ventre do Poder Judiciário, certamente fecundada por parte daqueles que queriam, como que-rem, distância do art. 409 (cláusula penal), encontrando as condições perfeitas de procriação quando do devaneio de alguns Magistrados no momento de de-cidirem sobre esse assunto.

Desde então a inércia e a inação em pensar, sobre o tema, por parte des-ses operadores do Direito fez com que o argumento se repetisse de maneira re-tórica, encontrando eco dentre seus pares, repetindo esse posicionamento inú-meras vezes seguidas. Esse fato repelimos veementemente, pois não podemos nos divorciar na letra da lei, o Código Civil brasileiro, que é claro em limitar qualquer indenização ao teto do dano.

Assim sendo, se uma indenização deve limitar-se ao teto do dano, como vamos então calcular para se chegar a um valor monetário claro e evidente que

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possa ser exigido pelos armadores quando da sobrestadia de seu equipamento? Lembrando que estamos no campo da indenização!

4 VALORAÇÃO DA INDENIZAÇÃO

Mais uma vez, em razão do apreço ao argumento e excepcionalmente aceitando ser a demurrage uma indenização, qual seria então o valor justo que o armador deveria receber pela sobrestadia de seu equipamento, pela indispo-nibilidade que a demurrage o impinge, respeitando o art. 944 do CC? É essa questão de simples aritmética que vamos tentar elucidar apresentando um caso concreto. Para aprofundarmos o estudo, tomemos como exemplo o seguinte:

Embarque de uma unidade do porto Ningbo com destino ao porto do Rio de Janeiro. Tempo exato calculado desde a liberação da unidade vazia no porto de origem até o último dia de free time concedido pelo Armador: 65 dias. Em 31.01.2015, o contêiner foi liberado vazio para o exportador em Ningbo. Em 04.02.2015, o contêiner foi embarcado cheio. Em 07.03.2015, o contêiner foi descarregado cheio no Rio de Janeiro. Em 07.04.2015, deu-se o final do free time do armador (considerando 30 dias livres). Total: 65 dias que o Armador disponibilizou para o embarque acima, considerando um frete de US$ 1.750,00 para remunerá-lo por esse período.

O importador em questão somente retornou a unidade vazia no dia 14.08.2015, portanto incorrendo em 130 dias de demurrage. Se considerarmos as seguintes premissas: o Armador aceita que 65 dias seja o tempo normal para cobrir uma viagem, ao frete de US$ 1.750,00; o Armador aceita que essa remu-neração seja justa pelo prazo de 65 dias de utilização da unidade; o importador ficou com a unidade 130 dias fora do período que o Armador considera como normal. O Armador teria sido penalizado pela perda de dois fretes pelo período que ficou sem a unidade (65 + 65 = 130), ou seja, US$ 1750,00 + US$ 1750,00 = US$ 3.500,00, ou seja, US$ 26,92 por dia.

Dentro do exemplo acima, a perda máxima do Armador seria de US$ 3.500,00. Entretanto, dentro do exemplo acima exposto, o Armador está cobrando da empresa o valor de US$ 11.440,00, cerca de US$ 87,69 por dia, ou seja, está sendo cobrado 226,86% acima do valor da perda, ferindo brutal-mente o art. 944 do CC.

O limite da indenização é repor o valor da perda; temos, então, um ab-surdo ganho de capital. As empresas de navegação que operam no país têm em seu escopo de atuação o ganho com a remuneração da venda e espaço em navio (frete) ao terem ganho de capital de outra forma. Essa atividade deveria constar de seu escopo de atuação – fato inexistente!

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Excepcionalmente, se não aceitarmos ser a sobrestadia uma cláusula pe-nal, mas uma indenização, então essa indenização deve ser calculada no exato montante que seu proprietário deixou de auferir pela sua indisponibilidade, ou seja, se seu equipamento deixou de gerar fretes, então que seja indenizado pelos fretes não realizados, que deverá ser calculado dividindo-se o seu valor pelos dias compreendidos entre a disponibilização do equipamento para em-barque, viagem marítima, até o ultimo dia do tempo livre.

Não resta dúvida de que esse cálculo é o mais justo e correto e em total respeito aos preceitos contidos no nosso Código Civil.

5 TERMO DE RESPONSABILIDADE

Quando o armador fala em pré-fixação da indenização, ele se refere aos valores constantes no termo de responsabilidade que, por uma questão de logís-tica, os importadores são obrigados a assinar, sob pena de terem que desovar os contêineres nos terminais alfandegados, e isso implicaria custo e uma estratégia operacional a mais, sem considerar a disponibilidade que o terminal teria que oferecer para essa realização.

Assim, por uma simples questão de agilizar a operação, os importadores retiram o contêiner contendo sua carga e somente em seus depósitos é que farão a desova, devolvendo posteriormente esse equipamento.

Não há o menor problema ou questionamento em se assinar um docu-mento comprometendo-se a devolver algo que pertence ao cedente. A resis-tência nasce quando esse documento impõe pagamentos elevadíssimos a título de sobrestadia – valores que desrespeitam o art. 944 do Código Civil acima já referido.

No momento da chegada de sua carga, resta ao importador somente uma simples dicotomia: assinar o termo que contém valores anabolizados para pa-gamento em caso da não devolução em um prazo preestabelecido, ou retificar através de uma carta de correção o Conhecimento de Transporte Marítimo, para a imediata desova e assim estabelecer uma logística de transporte até suas dependências.

Parece simples, todavia não é; optar pela carta de correção e retirada de sua carga do equipamento impõe ao importador um custo extra na operação e, muitas vezes, terá que contar com a boa vontade e colaboração do terminal alfandegado para que tenha sucesso na realização dessa empreitada.

Visando a uma operação rápida e limpa, fica muito mais fácil retirar o contêiner com sua carga e desová-lo diretamente em seu armazém. Optando por esse procedimento, este somente será concretizado após assinar o termo de

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responsabilidade que voltamos a asseverar, prevendo valores elevadíssimos em caso de demurrage.

Resta claro que exigir a assinatura contendo valores com os quais os importadores não concordam incide claramente no art. 151 do Código Civil, assim lavrado:

Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.

Em uma semântica simples, salta aos olhos o fato de que o importador se vê obrigado a assinar o termo de responsabilidade sujeitando-se aos valores ali inseridos para que não sofra maiores elevações no custo de sua operação.

CONCLUSÃO

Sempre é salutar a apresentação de teses e antíteses sobre os temas re-levantes para a sociedade, nosso ordenamento jurídico e, em especial, para os operadores do direito marítimo. Desta feita, expusemos, neste arrazoado, pon-tos que entendemos verossímeis no tocante aos fatos originários do transporte marítimo com a interpretação da norma positivada e a subsunção do fato.

Não podemos nos permitir ficar à deriva no mar da legislação, pois sem-pre haverá um porto seguro para atracação do pensamento ou pelo menos uma área periférica segura para fundeio, trazendo a almejada segurança jurídica na construção de uma tese.

Inexistindo uma lei clara e objetiva sobre qualquer assunto, devemos buscar a solução na regra que mais se aproxima da questão de mérito, nunca criando algo que navegue por mares estranhos ou díspares do que temos em nossa legislação; no mais, meditemos sobre o tema.

REFERÊNCIASFRANÇA, Limongi. Enciclopédia Saraiva do Direito. Edição comemorativa do sesqui-centenário da fundação dos cursos jurídicos no Brasil, 1827-1977.LEI Nº 9.611/1998. Dispõe sobre o transporte multimodal de cargas e dá outras provi-dências.

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Parte Geral – Doutrina

Compliance e Mecanismos Anticorrupção nos Contratos de Afretamento de Embarcações

ShIn JAE KIMMestre em Direito Internacional e Comparado pela Vrije Universiteit Brussel, Bélgica, Cursou a Academy of American and International Law, organizada pelo Center for American and Interna-tional Law, EUA, Especialista em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Graduada pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Mem-bro do Conselho Consultivo da Society of Corporate Compliance and Ethics (SCCE). Em 2007, foi premiada com o International Compliance Professional Award, pela SCCE. Head da área de Compliance e Investigação do Escritório TozziniFreire Advogados em São Paulo.

JOSÉ AuguSTO DIAS DE CASTROLL.M. em Direito Público pela London School of Economics – LSE, Mestre em Direito Cons-titucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP, Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET, Graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Advogado do Escritório TozziniFreire Advogados em São Paulo.

RESUMO: O ensaio aborda iniciativas legislativas e contratuais para combate a práticas corruptas junto a agentes públicos operando em portos, com especial enfoque no setor portuário brasileiro. Faz-se, inicialmente, uma exposição das legislações brasileira e internacional sobre o tema e, pos-teriormente, passa-se à abordagem do mecanismo anticorrupção recentemente inserido pela Baltic and International Maritime Council (BIMCO) em seu tradicional modelo de contrato de afretamento por tempo e por viagem, com análise de vantagens e desvantagens.

PALAVRAS-CHAVE: BIMCO; afretamento; embarcações; corrupção; cláusula anticorrupção; Brasil; Lei Anticorrupção; transporte; marítimo.

ABSTRACT: The essay addresses legislative and contractual initiatives for the combat against corrupt practices involving public officials operating in ports, with focus on the Brazilian port sector. The study starts with an overview of Brazilian and international legal framework and afterwards it approaches strengths and weaknesses of the anticorruption mechanism recently inserted by the Baltic and Inter-national Maritime Council (BIMCO) into its sample time and voyage charter parties.

KEYWORDS: BIMCO; charter party; vessels; corruption; anticorruption clause; Brazil; Anticorruption Act; transport; maritime.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O marco legal anticorrupção no Brasil e no mundo; 1.1 Evolução normativa; 1.2 O marco legal brasileiro; 2 A corrupção no setor marítimo e portuário: descrição do problema; 3 Uma proposta de solução: a cláusula anticorrupção para contratos de afretamento; Conclusão.

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INTRODUÇÃO

Em 2010, a United States Securities and Exchange Commission (“SEC”) iniciou processo contra uma empresa suíça diante de uma Corte Distrital nos Estados Unidos com base em alegações de pagamentos impróprios em nome de seus clientes para autoridade alfandegárias no mundo todo. Os pagamentos ha-viam ocorrido de 2002 a 2007 em diferentes países, tais como Nigéria, Angola, Brasil, Rússia e Cazaquistão.

A intenção era acelerar o desembaraço aduaneiro e, quando necessá-rio, resolver questões referentes à alfândega e quaisquer pendências ligadas ao processo de importação. Conforme demonstraram as investigações promovidas pela SEC, as propinas eram comumente autorizadas pelos clientes e posterior-mente registradas nos livros de forma fraudulenta nas faturas como taxas devi-das por “procedimentos locais” ou “intervenção especial” e, ainda, “manuseio especial”. Após longas negociações, a companhia concordou em pagar com-pensações e penalidades que ultrapassaram os 80 milhões de dólares.

Este exemplo não é um episódio isolado e representa uma grande preo-cupação para corporações engajadas em atividades de transporte internacional, seja de seus próprios bens ou dos de terceiros. Em uma pesquisa conduzida entre empresas com negócios na América Latina em 20121, autoridades adua-neiras em portos foram classificadas como a segunda maior preocupação em termos de corrupção na região, atrás apenas da polícia.

Relatório da consultoria Control Risks descreve uma ampla gama de ilí-citos em áreas portuárias do continente latino-americano2. Em novembro de 2013, o Exército mexicano tomou o controle das operações de segurança na Cidade portuária de Lázaro Cárdenas como parte das operações continuadas para combater o cartel de drogas Cavaleiros Templários e suas práticas de co-mércio ilegal e extorsão. Desde 2012, ao menos duas empresas de petróleo e gás foram multadas em conformidade com o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) nos Estados Unidos após admitirem terem pagado propina a autoridades aduaneiras na Argentina e no Brasil para acelerar o desembaraço para impor-tação e exportação de mercadorias em portos. Em junho de 2013, autoridades aduaneiras no Porto de La Guaira, em Caracas, na Venezuela, foram levadas sob custódia por crimes de extorsão contra empresas do ramo de transporte internacional. Em abril de 2013, uma empresa de roupas americana admitiu ter pagado cerca de 600 mil dólares em propina a oficiais argentinos por meio de um terceiro para possibilitar a entrada de seus bens no país sem necessidade de inspeção alfandegária.

1 Latin America Corruption Survey – June 2012. Miller & Chevalier Chartered e Matteson Ellis Law.2 FAVARO, Thomaz; LINDHOLM, Niels. Stuck in the bottleneck: corruption in Latin American ports. Control

Risks, 2013.

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Preocupações relacionadas a propinas em portos tomam maior propor-ção quando se consideram a dimensão e a capilaridade das operações de trans-porte marítimo, diariamente submetidas a uma extensa gama de jurisdições, em que interações com autoridades governamentais são conduzidas em base constante como requisito para que se permitam a entrada e a saída de embar-cações e bens de cada país. Enquanto o crescimento da inserção dos países da América Latina no comércio internacional é bem-vindo, o aumento das práticas corruptas em seus portos é um efeito colateral negativo.

1 O MARCO LEGAL ANTICORRUPÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO

O Brasil, a exemplo do que se observa há algum tempo no plano inter-nacional, vem experimentando, nos últimos anos, um intenso e positivo movi-mento na direção da adoção de práticas de prevenção e combate à corrupção, inclusive no meio corporativo. Embora haja fatores externos, como a adequa-ção das unidades brasileiras de multinacionais aos programas impostos por suas matrizes, o incentivo a tal prática pode ser atribuído a recentes incentivos do-mésticos.

Este movimento reflete uma percepção geral da sociedade brasileira quanto à necessidade de o País aprimorar-se cultural e institucionalmente no combate à corrupção. Em junho de 2013, houve protestos generalizados que tinham a revolta popular contra este tipo de ilícito como uma de suas principais reivindicações.

Pouco depois, no início de 2014, foi desencadeada a “Operação Lava Jato”, que, em dois anos, expandiu-se de uma investigação de alegados paga-mentos de propina para obtenção de contratos com a Petrobras para tornar-se a maior e mais reveladora operação de combate à corrupção já vista no País.

Vale lembrar ainda, no plano internacional, o escândalo da Fifa trazido à tona em 2015 envolvendo venda de votos em eleições para escolha das se-des de Copas do Mundo. Conduzido pelo Department of Justice do Governo americano e baseado na legislação doméstica daquele país, o caso demonstra o caráter global do atual esforço anticorrupção, atingindo figuras centrais da alta administração do futebol brasileiro.

Tais eventos refletem uma mudança em curso tanto na postura do País frente à corrupção quanto na forma de se combatê-la, com maior cobrança po-pular, empresas mais conscientes, instituições públicas melhor preparadas e um marco legal com melhores instrumentos.

Este cenário explica o crescente interesse de empresas instaladas no País em introduzir seus próprios mecanismos de prevenção, detecção e combate a práticas ilícitas. Mais do que uma obrigação de atender aos novos requisitos le-

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gais, gestores têm entendido este movimento não apenas como um diferencial, mas como uma necessidade para a manutenção de sua competitividade.

1.1 evOluçãO nOrmativa

O marco legal da transparência corporativa e do combate à corrupção de funcionários públicos nacionais ou estrangeiros costuma movimentar-se a partir de casos notórios de corrupção e fraudes, que obrigam os países a promoverem mudanças em sua legislação doméstica.

Foi assim no surgimento do Foreign Corrupt Practices Act – FCPA ameri-cano, de 1977, aprovado pelo Congresso como resposta a investigações condu-zidas por autoridades dos Estados Unidos que revelaram a prática generalizada de pagamento de propina a funcionários públicos estrangeiros por diversas em-presas com sede no país3.

Escândalos também envolveram fraudes contábeis em prejuízo de acio-nistas. Este último problema atingiu grandes corporações americanas como a Enron, Arthur Andersen e WorldCom no início dos anos 2000, o que deu en-sejo à aprovação da Lei Sarbanes-Oxley (“SOX”) em 2002, com o objetivo de prevenir fraudes nas demonstrações financeiras e garantir a transparência e a credibilidade das informações divulgadas pelas empresas.

A partir do final dos anos 1990, houve movimentação da comunidade internacional para aprovação de tratados pelos quais os países signatários se comprometessem a adotar mecanismos internos de combate à corrupção. Se até então as práticas corruptas eram vistas como questões domésticas e culturais de cada país, a partir de tais tratados, adotou-se a postura de punir empresas pela prática de ilegalidades junto a administrações públicas estrangeiras, como forma de cortar-se a fonte de parte significativa dos recursos que alimentavam a prática de propinas.

Atualmente, o marco regulatório internacional anticorrupção possui como referências centrais os seguintes tratados internacionais:

• ConvençãoInteramericanacontraaCorrupção(“CICC”)daOrga-nização dos Estados Americanos (“OEA”), firmada em 29 de março de 1996, em Caracas, Venezuela;

• ConvençãosobreoCombateàCorrupçãodeFuncionáriosPúblicosEstrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da Organi-

3 Envolveram-se nesta investigação especialmente o Federal Bureau of Investigation (“FBI”), a U.S. Securi-ties and Exchange Commission (“SEC”) e uma comissão parlamentar do Congresso (batizada de “Church Committee”, liderada pelo Senador Frank Church). Sobre a origem do FCPA: KOEHLER, Mike. The story of the Foreign Corrupt Practices Act. Disponível em: <http://moritzlaw.osu.edu/students/groups/oslj/files/2013/02/73.5.Koehler.pdf>. Acesso em: 17 mar. 2016.

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zação para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (“OCDE”), firmada em 17 de dezembro de 1997 (“Convenção da OCDE”);

• Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (“CNUCC”),aprovada pela Assembleia-Geral da Organização das Nações Uni-das (“ONU”) em 2003.

Tal mudança trouxe impacto relevante para o setor de transporte inter-nacional, que diariamente se vê obrigado a interagir com autoridades públicas de dezenas de países diferentes. Se antes as eventuais práticas impróprias em países longínquos eram tidas como expediente de menor impacto e compen-satório em função da impunidade, o movimento internacional incentivou uma importante mudança de comportamento.

1.2 O marCO legal brasileirO

O Brasil, por sua vez, é um dos países mais afetados pelas práticas cor-ruptas junto a órgãos estatais. Relatório da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) constata que, todo ano, entre 1,38% e 2,3% do Produto Interno Bruto do Brasil (PIB) são perdidos em práticas corruptas4. No Índice de Transparência Internacional de 20155 (ranking internacional que mede a corrupção), o Brasil encontra-se na 76ª posição, tendo caído sete posições em relação a 2014 em decorrência, principalmente, das investigações da Operação Lava Jato.

No âmbito legislativo, a punição na esfera criminal de pessoas físicas por atos contra a Administração Pública, inclusive de corrupção, já existe no Brasil desde 1940, quando entrou em vigor o Código Penal brasileiro (Decreto-Lei no 2.848/1940).

Após quase cinquenta anos, mudanças reforçaram o combate a tais prá-ticas ilícitas no País, encorajadas especialmente a partir da edição da Constitui-ção Federal de 1988, que claramente estabeleceu que “os atos de improbidade administrativa importassem na suspensão dos direitos políticos, na perda da função pública, na indisponibilidade dos bens e no ressarcimento ao Erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível” (art. 37, § 4º).

A partir daí, importantes diplomas legais foram inseridos no marco legal anticorrupção nos anos 1990. O primeiro deles foi a Lei de Improbidade Admi-nistrativa (Lei no 8.429/1992), que passou a prever a possibilidade de punição

4 Relatório Corrupção: custos econômicos e propostas de combate. São Paulo: Fiesp, 2010. 5 Relatório elaborado anualmente desde 1995, o qual analisa atualmente 168 países e territórios, baseando-se

em diferentes estudos e pesquisas sobre a percepção da corrupção no setor público (http://www.transparency.org/cpi2015).

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civil de agentes públicos, além de outras pessoas físicas e jurídicas igualmente envolvidas, em decorrência de atos ímprobos. Logo em seguida, aprovou-se a Lei de Licitações (Lei no 8.666/1993), prevendo punições administrativas e ju-diciais cíveis para empresas e indivíduos, bem como cominações criminais às pessoas físicas envolvidas em práticas ilegais em processos licitatórios.

Outras leis foram inseridas no ordenamento jurídico desde então, com relevância para o tema da transparência e da punição a atos de corrupção, como as Leis de Lavagem de Dinheiro (Lei no 9.613/1998 e Lei no 10.467/2002), Lei de Crimes contra a Ordem Tributária (Lei no 8.130/1990), Lei Eleitoral (Lei nº 9.504/1997), Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar no 101/2000), Lei de Crimes Fiscais (Lei no 10.028/2000), Lei Antitruste (Lei no 12.529/2011), o Marco Regulatório do Terceiro Setor (Lei no 13.019/2014), entre outras.

Anos mais tarde, teve especial destaque a edição da já mencionada Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), aprovada em agosto de 2013, tendo entra-do em vigor em janeiro de 2014. A lei foi aprovada pelo Congresso Nacional a partir da pressão popular decorrente dos protestos de junho de 2013, que tive-ram na insatisfação com a corrupção uma de suas reivindicações.

A lei prevê essencialmente a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública nacional ou estrangeira. Foca, portanto, em caracterizar a pessoa jurídica como agente corruptor, e não os indivíduos que a representam. Ademais, visa a atender aos compromissos internacionais anteriormente mencionados firmados pelo Brasil, inclusive ao caracterizar como prática punível no Brasil a corrupção de agentes públicos de outros países.

Um dos pontos abordados pela Lei Anticorrupção é a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas, nos âmbitos civil e administrativo, pelos atos lesivos, cometidos em seu interesse e benefício. Permite, assim, que empresas sejam responsabilizadas sem qualquer necessidade de comprovação de culpa ou dolo, bastando evidenciar-se a ocorrência do ato lesivo à Administração Pública em conexão com suas atividades. Entre as punições previstas, há multas na esfera administrativa que podem chegar a significativos vinte por cento do faturamento bruto apurado no exercício anterior ao da instauração do processo.

A responsabilização da pessoa jurídica não exclui, contudo, a responsa-bilidade de seus dirigentes ou administradores, inclusive no âmbito criminal.

Já em processo judicial, a pessoa jurídica está sujeita a sanções que vão desde o perdimento de bens, direitos ou valores e proibição de contratar ou receber incentivos do poder público até a mais drástica dissolução compul-sória da pessoa jurídica, para os casos em que se comprove a sua criação ou utilização sistemática para o fim de praticar atos ilícitos contra a Administração Pública.

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Também foi instituída a possibilidade de celebração de acordos de leniência, a exemplo do que já existia na legislação brasileira antitruste (Lei nº 12.529/2011). Tais acordos permitem que pessoas jurídicas envolvidas em atos ilícitos contra a Administração Pública possam colaborar com as investiga-ções, desde que os elementos de prova trazidos possam levar à identificação de outros envolvidos no caso e à comprovação dos casos sob investigação.

2 A CORRUPÇÃO NO SETOR MARÍTIMO E PORTUÁRIO: DESCRIÇÃO DO PROBLEMA

Pagamentos ilegais a agentes públicos são normalmente feitos para agi-lizar questões burocráticas e de desembaraço aduaneiro no porto. O exemplo da empresa suíça mencionado na Introdução reflete a lógica por trás da decisão de dar, prometer ou oferecer uma vantagem indevida: as investigações condu-zidas pela SEC durante o caso evidenciaram que, no momento da chegada das embarcações ao Brasil, os empregados da empresa responsável por ela deter-minavam se um pagamento ilícito para agentes no porto seria necessário para garantir que as mercadorias poderiam ser desembaraçadas e importadas dentro dos prazos contratados junto aos clientes.

Em outras palavras, em caso de risco de atrasos na disponibilidade dos bens ou da embarcação devido à burocracia portuária, a propina era paga. Fica clara, portanto, a existência de incentivos econômicos como força motriz da corrupção.

Com relação a contratos de afretamento de embarcação (em que o objeto é a preparação e disponibilização de uma embarcação para uso de terceiro), é importante entender a racionalidade por trás da alocação de riscos. A regra geral é a de que o armador detenha o risco de atrasos em disponibilizar a em-barcação para o afretador, a não ser que haja uma cláusula de exceção. Uma vez que o NOR (notice of readiness) é emitido pelo comandante, o navio é considerado em laytime (que é o período de tempo acordado entre as partes durante o qual o armador irá colocar e manter a embarcação disponível para o afretador sem qualquer pagamento adicional ao frete).

Caso a emissão do NOR atrase e ocorra em momento posterior ao pe-ríodo ajustado para tanto (chamado de laycan), o armador detém o risco e o afretador possuirá o direito de cancelamento do frete, além das indenizações cabíveis. Todavia, se a embarcação adentra o período de laytime dentro do prazo previsto, o risco por atrasos é transferido para o afretador. E, caso o afre-tador mantenha a embarcação por tempo superior ao período laytime contrata-do, inicia-se o período de demurrage, ou “sobre-estadia”, quando pagamento adicional ao frete é devido pelo afretador de forma proporcional ao tempo de duração.

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Tal mecanismo representa um importante incentivo econômico para que o armador ponha o navio à disposição do afretador o quanto antes, de forma a transferir o risco de atrasos para a outra parte. Neste momento é que se estabe-lece um campo propício para práticas corruptas: a burocracia e a infraestrutura precária nos portos brasileiros e da América Latina como um todo são uma causa constante de atrasos em operações com embarcações.

Por exemplo, no Porto brasileiro de Santos, o desembaraço aduaneiro de um simples container toma em média 21 dias, mais de dez vezes o período médio observado no Porto de Rotterdam, por exemplo, que é de dois dias. Já o tempo médio de espera para que um navio possa atracar é de 16 horas – quase três vezes maior do que costumava ser em 20036.

Portanto, há situações em que armadores tomam a iniciativa condená-vel de dar, oferecer ou prometer vantagens indevidas (propinas ou facilitation payments, conforme previsto em legislações estrangeiras, como no FCPA, que são pequenos pagamentos para aceleração de procedimentos) para agentes pú-blicos de forma a tornar mais célere o processo de disponibilização da embar-cação, evitando, assim, as pesadas multas contratuais por atrasos.

No Brasil, a burocracia para o desembaraço da embarcação para ser pos-ta à disposição do afretador toma contornos dramáticos, com uma profusão de órgãos com poderes fiscalizatórios e cujo aval faz-se necessário: Polícia Federal, Receita Federal, Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, Marinha do Brasil por meio da Capitania dos Portos, órgãos ambientais, Agência Nacional de Transporte Aquaviário – Antaq, a autoridade portuária do porto onde o navio deverá atracar (normalmente as chamadas “Companhias Docas”).

Apesar da importância da atuação de todos os órgãos envolvidos neste processo para garantir a segurança da navegação e do território e a regularida-de das embarcações envolvidas, o atraso para obtenção de todas as licenças e certificados acaba sendo significativo. Cria-se, portanto, ambiente convidativo para a corrupção como instrumento para mitigação da exposição econômica a que estão sujeitas as empresas em função de tal burocracia.

Vale lembrar que há iniciativas importantes para diminuir este quadro. Entre elas, o Projeto Porto sem Papel, que é um sistema de informação que tem como objetivo principal reunir em um único meio de gestão as informações e a documentação necessárias para agilizar a análise e a liberação das mercadorias no âmbito dos portos brasileiros. Conforme informações da Secretaria de Portos (recentemente incorporada ao Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Ci-vil por meio da Medida Provisória nº 726/2016), o projeto já foi implementado

6 FAVARO, Thomaz; LINDHOLM, Niels. Op. cit.

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em 34 portos públicos, eliminando mais de 140 formulários em papel, que foram convertidos para um único documento eletrônico.

Também merece destaque o Programa Brasileiro de Operador Econô-mico Autorizado (Programa OEA), instituído pela Receita Federal do Brasil por meio da Instrução Normativa nº 1.598/2015, que, entre outros benefícios, dis-põe que as unidades de despacho aduaneiro da Receita dispensarão o OEA de exigências formalizadas na habilitação a regimes aduaneiros especiais ou aplicados em áreas especiais que já tenham sido cumpridas no procedimento de certificação no Programa.

Todavia, estas e outras iniciativas demonstraram efeitos tímidos até o mo-mento em termos de redução do grave problema dos atrasos operacionais nos portos brasileiros e de práticas corruptas que a situação termina por estimular.

3 UMA PROPOSTA DE SOLUÇÃO: A CLÁUSULA ANTICORRUPÇÃO PARA CONTRATOS DE AFRETAMENTO

Pagamentos como aqueles descritos nas seções anteriores são tratados como propina na legislação doméstica de um número crescente de jurisdições e podem levar à imposição de sanções administrativas e criminais.

Sabe-se que a multiplicidade de jurisdições é característica marcante no setor de transporte internacional de cargas. Empresas estão normalmente sujeitas tanto à jurisdição do país onde estão sediadas em função de práticas corruptas no exterior (e.g., FCPA, UB Bribery Act, Lei no 12.846/2013, a Lei An-ticorrupção no Brasil) quanto à do país onde o ato ilícito é praticado.

Sob as regras anticorrupção do Direito brasileiro, descritas no capítulo 1, tanto empresas estrangeiras que pratiquem atos de corrupção junto a agen-tes públicos no Brasil quanto empresas brasileiras que corrompam agentes de outros países poderão ser punidas nas esferas administrativa e judicial. Sem falar nas possíveis penalidades de natureza criminal a que se sujeitam os indivíduos envolvidos.

Os contratos de afretamento, no entanto, não seguiram esta tendência até recentemente, e a alocação de riscos padrão de tais instrumentos serve como um estímulo econômico para práticas corruptas. Tal situação levou a Baltic and International Maritime Council (BIMCO), a maior das associações de navegação representativas dos armadores e reconhecida fonte de padrões de contratos ma-rítimos, a formar uma equipe internacional de advogados e outros especialistas para sugerir uma alternativa às cláusulas atualmente em utilização pelo merca-do de afretamento marítimo.

A cláusula anticorrupção para contratos de afretamento da BIMCO (afre-tamentos por viagem e por tempo) foi publicada em novembro de 2015 e, além

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das provisões tradicionais relativas à obrigação de observância da legislação an-ticorrupção aplicável ao contrato e manutenção de registros contábeis precisos, sugere um interessante mecanismo para desencorajar a prática de pagamentos ilícitos sempre que demandas desta natureza partirem de agentes públicos.

Pela cláusula proposta, se um pedido de vantagem indevida for feito ao comandante da embarcação ou diretamente ao armador por qualquer agente público, contratado ou subcontratado pelo armador ou afretador, ou, ainda, agindo em nome do armador ou do afretador, ou também a qualquer outra pessoa não empregada pelo armador ou afretador, e houver aparência de que o atendimento a tal pedido levaria à violação de qualquer legislação anticor-rupção, então, o comandante (ou o armador diretamente por qualquer meio) deve notificar o afretador assim que praticável, e as partes devem cooperar na tomada de medidas razoáveis para resistir à demanda.

Se, a despeito de tais esforços, a demanda não for retirada, o comandante ou o armador deverá emitir uma carta-protesto para os afretadores e, na ausên-cia de qualquer evidência do contrário, deve-se considerar que qualquer atraso na disponibilidade da embarcação será um resultado da resistência do coman-dante à demanda imprópria, sendo: (i) a embarcação considerada como em serviço; ou (ii) qualquer tempo perdido como resultado deste evento contado como laytime ou então como tempo em demurrage (se a embarcação já estiver entrado no período de demurrage).

A redação sugerida para a cláusula propõe uma nova alocação de riscos entre armadores e afretadores sempre que propinas ou outras vantagens indevi-das forem requeridas ou exigidas por agentes governamentais. Primeiramente, o afretador não poderá negar o pagamento do valor do afretamento alegando que o navio está fora de operação (off hire) sempre que esta circunstância resultar de uma resistência do comandante ao pagamento da vantagem solicitada.

Além disso, qualquer tempo perdido devido a pedidos impróprios deve ser tratado como tempo em que a embarcação estava à disposição do afretador (laytime). Caso a embarcação já esteja em demurrage quando o pedido ocorrer, este período será contabilizado como tempo em demurrage.

Algumas dificuldades podem surgir durante a aplicação desta nova so-lução. Primeiramente, afretadores podem não se sentir confortáveis com a as-sunção da maior parte do risco de corrupção, que é grave no setor portuário. É possível que a fase de negociações entre armadores e afretadores consuma tempo considerável e que novas saídas sejam encontradas.

Outro ponto refere-se às dificuldades na demonstração da suposta van-tagem indevida solicitada pelo agente público, a qual fundamenta as alega-ções do comandante, bem como da sua conexão com o atraso. A cláusula está atualmente redigida de forma que, assim que a carta-protesto for emitida pelo

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comandante, surja presunção de que o atraso resulta da resistência à demanda imprópria, a não ser que haja evidências em sentido contrário. Os afretadores podem argumentar que não estão na posição mais favorável para suportar o ônus da prova em situação desta natureza.

Diferenças relativas à avaliação da ilegalidade de determinada demanda também precisam ser consideradas. Deve-se ter em mente que certas jurisdi-ções permitem pequenos pagamentos para agilidade de processos burocráti-cos, os chamados facilitation payments, por exemplo. As partes podem não concordar quanto à caracterização da vantagem requisitada como contrária à legislação. As empresas precisarão estar muito bem-orientadas a respeito das peculiaridades de cada jurisdição onde operam.

O grande desafio, todavia, será de ordem cultural. A inclusão de cláusula desta natureza em contratos de afretamento precisará vir no bojo de extensa mudança comportamental no âmbito das empresas e seus operadores. Os co-mandantes de embarcações, funcionários engajados na parte operacional da expedição e intermediários deverão estar cientes da proteção garantida pela cláusula e de que posturas antiéticas não serão mais toleradas. A simples previ-são contratual terá pouco efeito se não houver um amplo processo de conscien-tização por meio da adoção de programas efetivos de compliance empresarial.

CONCLUSÃO

A maior inserção de países da América Latina como o Brasil no comércio internacional foi significativa ao longo das últimas décadas: 14% de crescimen-to de 1990 até 2010, de acordo com a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe – ECLAC. No caso específico do Brasil, o dado é ainda mais positivo: o valor total das exportações e importações no País pulou de US$ 64 bilhões em 1993 para US$ 362,6 bilhões em 2015.

Entretanto, a infraestrutura portuária não vem seguindo o mesmo ritmo de desenvolvimento, estando a capacidade de atender a tal crescimento restrita a alguns países na região. Como resultado, o congestionamento de portos tem empurrado os custos logísticos para cima, estabelecendo, assim, condições bas-tante convenientes para práticas ilícitas.

A comunidade internacional não está dando as costas ao problema. Importantes tratados internacionais foram aprovados para atacar a corrupção (OCDE, Nações Unidas e Organização dos Estados Americanos são as prin-cipais) e um número expressivo de países aprovou legislação doméstica so-bre a questão, como recentemente ocorreu no Brasil, Peru, Colômbia, Chile e México.

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No âmbito corporativo, a adoção de novos arranjos contratuais como este ora analisado precisa vir acompanhada de mudanças comportamentais no âmbito das empresas envolvidas no transporte aquaviário de cargas. Deve-se, acima de tudo, garantir a assimilação dos conceitos de conduta ética por quem de fato atue na operação de embarcações e possua interação constante com agentes públicos do mundo todo, tais como comandantes e intermediários.

Entre os instrumentos capazes de auxiliar nesta mudança de postura, es-tão os programas de compliance corporativo. Desde que efetivamente aplica-dos, sua existência pode inclusive ser critério atenuante na aplicação de penas pecuniárias à empresa em diversas jurisdições. No Brasil, a redução pode che-gar a até dois terços do valor inicialmente fixado (Lei no 12.846/2013, em seu art. 7º, VIII).

Sua implementação traz para o dia a dia das companhias a noção de que negócios devem surgir e manter-se unicamente de forma lisa, ainda que sob pena de verem-se perdidas oportunidades comerciais originadas de ilegalida-des. A criação de um ambiente corporativo com princípios de legalidade bem solidificados e plenamente integrados no comportamento de todos os funcio-nários leva tempo. Incentivos normativos ou institucionais desempenham papel importante para isso.

A cláusula anticorrupção proposta pela BIMCO vai nesta direção e re-presenta uma importante iniciativa da comunidade marítima internacional ao demonstrar que entidades privadas também estão a bordo do esforço para com-bater a corrupção mundo afora.

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoApelação/Reexame Necessário nº 0008027‑59.2010.4.01.3814/MGRelator(a): Juiz Federal Guilherme Fabiano Julien de RezendeApelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSProcurador: Adriana Maia VenturiniApelado: Edson JavariniAdvogado: Jose Luciano FerreiraRec. Adesivo: Edson JavariniRemetente: Juízo Federal da Subseção Judiciária de Ipatinga/MG

ementaMANDADO DE SEGURANÇA – PREVIDENCIÁRIO – APOSENTADORIA – RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL – CONVERSÃO EM TEMPO COMUM – ATIVIDADE INSALUBRE – COMPROVAÇÃO POR DOCUMENTOS – ADEQUAÇÃO DO WRIT – EFICÁCIA DOS EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL E COLETIVA QUE NÃO DESCARACTERIZA A ATIVIDADE ESPECIAL DO AGENTE INSALUBRE RUÍDO – DECISÃO DO STF NO ARE 664.335/SC – REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA – SERVIDOR PÚBLICO – FILIAÇÃO A REGIME ESTATUTÁRIO – POSSIBILIDADE DE CONTAGEM DE PERÍODO ESPECIAL – JURISPRUDÊNCIA DO STF – SÚMULA VINCULANTE Nº 33 – APLICAÇÃO APENAS À HIPÓTESE DE APOSENTADORIA ESPECIAL – CONTAGEM RECÍPROCA DO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO NO RGPS E NO REGIME ESTATUTÁRIO – ART. 94 DA LEI Nº 8.213/1991 E ART. 201, § 9º DA CF/1988 – COMPENSAÇÃO FINANCEIRA DOS SISTEMAS – ATIVIDADE PERIGOSA – VIGILANTE – DEMONSTRAÇÃO DO USO DE ARMA DE FOGO PARA RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE ESPECIAL ATÉ 05.03.1997 – JURISPRUDÊNCIA DO TRF 1ª REGIÃO – LAUDO TÉCNICO OU PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO EXTEMPORÂNEOS – VALIDADE – PRECEDENTES

1. Somente há inadequação da via mandamental na hipótese de o exame judicial do pedido exigir dilação probatória, situação afastada quando a petição inicial é satisfatoriamente instruída com prova documental.

2. A emissão do Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP pelo empre-gador passou a ser obrigatória apenas a partir de 01.01.2004, nos termos da Instrução Normativa/INSS/DC nº 99, de 05.12.2003. No período ante-rior, os formulários emitidos pelas empresas (SB 40, Dises BE 5235, DSS 8030 e Dirben 8030), acompanhados de laudos técnicos, são suficientes para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes nocivos à saúde.

3. Relativamente à utilização de equipamentos de proteção coletiva ou individual, nos termos do § 2º do art. 58 da Lei nº 8.213/1991, o Supremo

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Tribunal Federal concluiu, nos autos do ARE 664.335/SC, com repercus-são geral, que “na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria”.

4. Na decisão mencionada restaram duas teses. A primeira, no sentido de que a eficácia do EPI afasta o reconhecimento da atividade especial. A segunda, na esteira de que, em relação ao ruído, o posicionamento adotado pela TNU na Súmula nº 09 deve prevalecer, ou seja, quando o trabalhador estiver submetido ao agente nocivo ruído, ainda que utilize EPI eficaz, tal circunstância não se mostrará suficiente para afastar o ca-ráter especial da atividade.

5. O Superior Tribunal de Justiça firmou posição, quanto à incidência dos níveis de ruído, que não há como atribuir retroatividade à norma regula-mentadora sem expressa previsão legal, sob pena de ofensa ao disposto no art. 6º da LICC, devendo, portanto, ser considerada especial a ativida-de exercida com exposição a ruídos superiores a 80 dB até a edição do Decreto nº 2.171/1997, sendo considerado prejudicial após essa data o nível de ruído superior a 90 dB e, a partir da entrada em vigor do Decreto nº 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância de ruído ao agente físico foi reduzido a 85 dB (REsp 1.320.470).

6. Comprovação da submissão do impetrante ao agente ruído em con-dição insalubre nos períodos de 01.03.1989 a 31.05.2000 e 19.11.2003 a 23.03.2010, pois os níveis considerados prejudiciais ultrapassaram os limites de 80 dB e 85 dB, tolerâncias normativamente previstas para esse agente insalubre nos lapsos temporais respectivos. Ausente configuração de labor insalubre no período de 01.06.2000 a 18.11.2003, visto que a intensidade do ruído não superou o limite normativo de 90 dB. To-davia, o juiz de 1º grau afastou o reconhecimento da natureza especial da atividade nos períodos de 27.05.1995 a 20.06.1995 e 10.11.2003 a 31.03.2004, considerando que o impetrante esteve em gozo de auxílio--doença, devendo a sentença ser mantida quanto a tal aspecto, apesar do seu desacerto, à míngua de apelação do impetrante especificamente contra esse ponto, bem como em razão da impossibilidade de, pela via da remessa oficial, haver reforma em prejuízo da Fazenda Pública (Sú-mula nº 45 do STJ).

7. Submissão ao regime estatutário, vinculado à Marinha do Brasil, com o exercício da atividade de marinheiro do serviço geral de máquinas. No que tange à possibilidade de cômputo de atividade especial para fins de

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aposentadoria do servidor público, a Constituição Federal, desde a sua promulgação, previu a possibilidade de serem consideradas as atividades penosas, insalubres ou perigosas para fins de obtenção de aposentadoria, mas sempre condicionando o exercício do respectivo direito à regula-mentação mediante lei complementar (art. 40, § 1º na redação original e, posteriormente, no § 4º (EC 20/1998) e no § 4º, III (EC 47/2005)). Trata-se, portanto, de norma de eficácia contida. Ocorre que a lei complementar prevista na Carta Constitucional ainda não foi editada.

8. A fim de contornar a mora legislativa, o Supremo Tribunal Federal firmou sua jurisprudência mediante a edição da Súmula Vinculante nº 33, após o julgamento de diversos mandados de injunção. Entretan-to, referida súmula apanha apenas as situações que envolvem o labor exclusivo em atividade que prejudique a saúde ou a integridade física e que dá ensejo à aposentadoria especial, com a aplicação excepcional da regra prevista no art. 57, § 1º da Lei nº 8.213/1991, na medida em que os precedentes daquela Corte que deram suporte para a sua edição não contemplam a mera contagem de tempo especial para fins de conversão em tempo comum com vistas à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição, consoante pode ser aferido nos debates ligados à proposta de edição da súmula vinculante em tela.

9. Acolhimento, portanto, da pretensão do impetrante ligada à contagem do período de 23.01.1984 a 31.07.1987 como insalubre, pelo enquadra-mento no item 2.4.4 do Anexo II ao Decreto nº 83.080/1979 (transporte marítimo – trabalhadores em casa de máquinas), visto como o documen-to de fl. 33 descreve a atividade de “marinheiro do serviço geral de má-quinas” perante a Marinha do Brasil.

10. Afasta-se o argumento do INSS no sentido de que eventuais con-tribuições ligadas ao período em tela estavam relacionadas ao serviço público federal e que competiria à União averbar tal período, já que se trata do regime jurídico estatutário. Isso porquanto, antes mesmo da disciplina contida no § 9º do art. 201 da Constituição Federal, introdu-zido pela Emenda Constitucional nº 20/1998, o caput do art. 94 da Lei nº 8.213/1991 já previa que para efeito dos benefícios previstos no Re-gime Geral de Previdência Social ou no serviço público é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na atividade privada, rural e urbana, e do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social se compensarão financeiramente (§ 1º do art. 94), pelo que cabe ao INSS buscar tal acerto perante o ente responsável pelo regime de previdência anterior.

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11. O formulário DSS-8030 de fl. 34 informa que no período de 14.10.1987 a 16.02.1989 o impetrante exerceu a profissão de vigilan-te, com a utilização de arma de fogo. A jurisprudência do TRF da 1ª Região é firme no sentido de admitir o reconhecimento dessa atividade como especial até 05.03.1997, por equiparação à de guarda (prevista no item 2.5.7 do Anexo ao Decreto nº 53.831/64) (v.g. AMS 0004828-96.2009.4.01.3803, Relª Desª Fed. Gilda Sigmaringa Seixas, e-DJF1 de 09.10.2015 e AC 00112324720064013811, Relª Desª Fed. Ângela Catão, e-DJF1 de 27.05.2013).

12. Desnecessidade de o formulário DSS-8030 ser contemporâneo ao exercício da atividade laborativa tida como especial, à míngua de pre-visão legal quanto ao tema e considerando a equivalência das condi-ções ambientais no ambiente de trabalho. Precedentes desta Corte (AMS 00240521020014013800, Rel. Des. Fed, Cândido Moraes; AMS 00002615220104013814, Rel. Juiz Federal Henrique Gouvea da Cunha (Convocado)).

13. O perfil profissiográfico previdenciário de fls. 35/37 descreve que no período de 01.06.2000 a 31.03.2004 houve sujeição a agentes biológi-cos (bactérias). Entretanto, a previsão contida no item 3.0.1 do Anexo IV ao Decreto nº 3.048/1999 diz respeito aos trabalhos realizados em galerias, fossas e tanques quando realizados em esgoto. Considerando que o impetrante desenvolvia a atividade de bombeiro na área industrial e administrativa da empresa Celulose Nipo-Brasileira S/A – Cenibra no período em tela, descabe presumir que o seu labor era exercido em am-biente de esgoto, o que afasta o enquadramento desse lapso temporal.

14. Ausente o direito à aposentadoria especial pleiteada, pois o somató-rio dos períodos enquadrados precedentemente atinge o tempo total de 22 anos e 11 dias na DER (16.04.2010).

15. Desprovimento das apelações das partes e da remessa oficial.

aCÓrdãO

Decide a Primeira Câmara Regional Previdenciária de Juiz de Fora, por unanimidade, negar provimento às apelações das partes e à remessa oficial, nos termos do voto do relator.

1ª Câmara Regional Previdenciária de Juiz de Fora do TRF da 1ª Região, 7 de abril de 2016.

Juiz Federal Guilherme Fabiano Julien de Rezende Relator Convocado

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relatÓriO

Trata-se de apelação em mandado de segurança cujo objetivo é a per-cepção do benefício de aposentadoria especial, com o reconhecimento de pe-ríodo trabalhado em condições especiais de insalubridade – agentes nocivos ruído e biológicos + atividade de vigilante e serviço na Marinha do Brasil –, que tramitou perante a Vara Federal da Subseção Judiciária de Ipatinga/MG. Foram juntados aos autos os documentos de fls. 24, 33-verso/337 a fim de fazer prova do tempo trabalhado em condições especiais.

A sentença de fls. 80/86 concedeu parcialmente a segurança, apenas para reconhecer como tempo de serviço em atividade especial aquele exercido nos períodos de 23.01.1984 a 31.07.1987, 14.10.1987 a 16.02.1999, 01.03.1989 a 26.05.1995, 26.01.1995 a 31.05.2000 e 01.04.2004 a 23.03.2010. A sentença foi submetida ao duplo grau de jurisdição.

O INSS interpôs recurso de apelação às fls. 90/108, arguindo, preliminar-mente, a inadequação da via eleita, dada a necessidade de dilação probatória quanto ao tempo de atividade laboral do impetrante. No mérito, pugnou pela reforma da sentença, ao argumento de que não houve submissão do impetrante a níveis de ruído acima do tolerado, notadamente em virtude da neutralização dos agentes nocivos pela utilização de EPI eficaz. Alega, ainda, que não houve comprovação da sujeição aos agentes físicos e biológicos em caráter habitual e permanente. Aduz que não é possível o reconhecimento de tempo especial em relação a trabalho vinculado a regime de previdência próprio, dada a ausência de previsão legal para tanto relativamente ao servidor público. Defendeu a au-sência de previsão para contagem da atividade profissional de vigilante como especial, bem como a extemporaneidade do formulário DSS-8030 juntado aos autos.

Apelação adesiva do impetrante às fls. 118/120, requerendo o reconhe-cimento da insalubridade no período de 01.06.2006 a 31.03.2004 pela sub-missão a agentes biológicos, com a consequente concessão da aposentadoria.

Parecer do Ministério Público Federal às fls. 126/131, opinando pelo des-provimento da apelação do INSS e pelo provimento da apelação do impetrante.

É o relatório.

vOtO

Afasto, inicialmente, a preliminar de inadequação da via eleita arguida pelo INSS, porquanto os documentos carreados aos autos dão suporte para o exame meritório do pleito inaugural, sendo desnecessária dilação probatória com vistas à análise do tempo de labor em condições especiais.

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A questão meritória há de ser dirimida mediante a análise da legislação previdenciária aplicável à espécie.

Antes, porém, salienta-se que a aposentadoria especial é um benefício previdenciário voltado à adequação de determinadas atividades laborativas que são prestadas em condições distintas daquelas que ordinariamente são desen-volvidas pelos segurados em geral e que, portanto, requerem uma normatização também diferenciada, conferindo um privilégio legal àqueles que estão sub-metidos a esse regime com o intuito de igualar substancialmente as diversas situações de trabalho.

Com efeito, a redação atual da Lei nº 8.213/1991 sobre a matéria, após algumas alterações, está vazada nos seguintes termos:

“Subseção IV Da Aposentadoria Especial

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exi-gida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vin-te) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, con-sistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de--benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 2º A data de início do benefício será fixada da mesma forma que a da aposen-tadoria por idade, conforme o disposto no art. 49.

§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, do tempo de tra-balho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudi-ciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, se-gundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício. (Incluído pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos prove-nientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24

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de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cin-co anos de contribuição, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.1998) (Vide Lei nº 9.732, de 11.12.1998)

§ 7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide exclusivamente sobre a remuneração do segurado sujeito às condições especiais referidas no caput. (Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.1998)

§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.1998)

Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associa-ção de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será defini-da pelo Poder Executivo. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)

§ 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Se-guro Social – INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.1998)

§ 2º Do laudo técnico referido no parágrafo anterior deverão constar informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva ou individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.1998)

§ 3º A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o res-pectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista no art. 133 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)

§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abran-gendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica desse documento. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)”

No entanto, o tratamento legislativo acerca da matéria já era previsto no ordenamento jurídico anterior. A Lei nº 3.807/1960, ao instituir a aposentadoria especial, registrou a incumbência de sua regulamentação por decreto do poder executivo.

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Consequentemente, veio a lume o Decreto nº 53.831/1964 que, nos ter-mos de seu art. 2º e se utilizando de quadro a ele anexo, promoveu a classifica-ção das atividades submetidas à aposentadoria especial.

Verifico, também, a condição imposta pelo art. 3º do referido decreto, pela qual a concessão do benefício da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado do tempo de trabalho permanente e habitualmente prestado em serviços considerados insalubres, perigosos ou penosos, durante o prazo mínimo fixado.

Cabe salientar que o Decreto nº 53.831/1964 foi revogado pelo Decreto nº 62.755/1968, não constando menção a anexo neste último ato normativo regulamentar. Em sequência, foi editado o Decreto nº 63.230/1968 que tratou em seu art. 2º sobre as atividades penosas, insalubres ou perigosas arroladas em seus quadros Anexos I e II. O aludido decreto vigorou até a edição do Decreto nº 72.771, de 06.09.1973, regulando a matéria no art. 71 e seguintes, apresen-tando os Anexos I e II ao registrar as atividades consideradas especiais.

Posteriormente, surge o Decreto nº 83.080/1979, que instituiu novos anexos I e II, classificando as atividades profissionais segundo os agentes noci-vos e em relação aos grupos profissionais.

Com a edição da Lei nº 8.213/1991, que dispôs sobre o Plano de Benefí-cios da Previdência Social, nos termos do art. 57, § 3º, na sua redação original, estabeleceu-se que o tempo de serviço exercido em atividade profissional sob condições especiais, que fossem ou viessem a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física, seria somado com o tempo de serviço exercido em atividade comum, após a respectiva conversão.

Os Decretos nºs 357, de 07.12.1991, e 611, de 21.07.1992, ambos no art. 64, reiteraram a possibilidade acima referida, apresentando, ainda, tabe-la com os fatores a serem utilizados na conversão. Além disto, os arts. 295 e 292 destes decretos, respectivamente, realizaram a repristinação do Decreto nº 53.381/1964 e a ratificação do Decreto nº 83.080/1979.

Posteriormente, a Lei nº 9.032, de 28.04.1995, alterou a redação original da Lei nº 8.213/1991, impondo novo requisito para a obtenção da contagem especial, qual seja, a obrigação do segurado comprovar, além do tempo de tra-balho, a exposição aos agentes nocivos químicos, físicos e outros, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício, conforme atual redação do art. 57, § 4º, da Lei nº 8.213.

A Medida Provisória nº 1.523, publicada em 14.10.1996 e convertida na Lei nº 9.528/1997, por sua vez, alterou o art. 58 da Lei nº 8.213/1991, criando a exigência de que o formulário preenchido pela empresa fosse emitido com base em laudo técnico.

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Com a edição de novo Regulamento de Benefícios com o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, que operou a substituição dos Anexos I e II dos Decre-tos nºs 53.831/1964 e 83.080/1979, disciplinando a relação de agentes nocivos, constantes de seu anexo IV, disposto em seu art. 66, manteve-se a imposição da apresentação de laudo técnico para comprovação da exposição.

Em seguida, a Medida Provisória nº 1.663/2010 limitou a possibilidade de conversão do tempo especial em comum até o dia 28.05.1998, revogando o § 5º da Lei nº 8.213/1991, que previa, justamente, a possibilidade de conversão de tempo de serviço. Contudo, nas edições posteriores da MP 1.663, bem como em sua transformação na Lei nº 9.711/1998, não houve revogação expressa da possibilidade de conversão.

Conquanto houvesse a limitação da possibilidade de conversão do tem-po especial em comum até a data de 28.05.1998, de acordo com a disposição da MP 1.663/2010, conforme já destacado, as edições posteriores desta Medida Provisória não repetiram a referida limitação, tampouco quando de sua transfor-mação na Lei nº 9.711/1998.

Dessarte, encontra-se em vigor o § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/1991, dado que a vedação contida na referida Medida Provisória não foi convertida em lei, perdendo sua eficácia desde a edição, nos termos do parágrafo único do art. 62 da CF/1988.

Ademais, na Emenda Constitucional nº 20/1998, restou esclarecedora a disposição do art. 15:

“Art. 15. Até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º, da Consti-tuição Federal, seja publicada, permanece em vigor o disposto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8213, de 24 de julho de 1991, na redação vigente à data da publicação desta Emenda.”

A própria previdência consignou a possibilidade de reconhecimento de tempo de atividade especial após a data mencionada como restou regulamen-tado no Decreto nº 4.827/2003 que deu nova redação ao art. 70 do Decreto nº 3.048/1999, consoante se aquilata:

“Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:

TEMPO A CONVERTERMULTIPLICADORES

MULHER (PARA 30) HOMEM (PARA 35)

DE 15 ANOS 2,00 2,33

DE 20 ANOS 1,50 1,75DE 25 ANOS 1,20 1,40

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§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.

§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho pres-tado em qualquer período.” (NR)

Por conseguinte, a vedação da possibilidade da conversão de tempos sucessivos de trabalhos em atividade especial em seu art. 70, ressalvando, po-rém, as situações consolidadas até 05 de março de 1997, com observância da exposição do trabalhador aos agentes nocivos enumerados no seu Anexo IV se revelou ilegal visto que extrapolou o limite do poder regulamentar, porquanto a tarefa de inovar o ordenamento jurídico pertence à lei no sentido amplo, mediante as espécies legislativas constantes no rol do art. 59 da Constituição Federal.

Com a referida alteração do art. 70 do Decreto nº 3.048/1999 ficou expli-citado que a caracterização e comprovação do tempo de atividade especial es-tão vinculadas às disposições legais em vigor na época da prestação do serviço.

Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/1998, novos critérios foram estabelecidos para a concessão de aposentadoria no âmbito do Regime Geral da Previdência Social, em face da transformação ocorrida na sistemática de concessão do benefício que deixou de se basear no tempo de serviço para adotar em seu lugar o fator tempo de contribuição, ficando estabelecida regra de transição para quem já estivesse filiado à previdência.

O impasse reside na interpretação legal a ser realizada para fins de con-tagem do tempo de serviço do segurado em atividade especial.

Indaga-se: pode lei nova estabelecer novos critérios e atingir situações pretéritas já consolidadas sob a égide de outra legislação?

Cabe salientar que a lei nova ou medida provisória, que possui força de lei, poderá retroagir, todavia, respeitando o direito adquirido, o ato jurídico per-feito e a coisa julgada, nos termos do art. 5º, inciso XXXVI, da CF/1988.

Com efeito, as situações já consolidadas pelo tempo e que, portanto, estão incorporadas ao patrimônio do titular do direito não podem ser atingidas, sob pena de ferir o direito adquirido, gerando insegurança jurídica.

Resta aquilatar se a atividade exercida anteriormente pelo segurado, nos termos da legislação da época, gozava de presunção de insalubridade, sujei-tando-se, apenas, às condições legalmente exigidas: comprovação de trabalho permanente e habitual no serviço, durante o prazo mínimo fixado.

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Pois bem, as exigências impostas a partir da Lei nº 9.032/1995 não têm o condão de atingir situações pretéritas, visto que violariam direito adquirido que o segurado possuía à contagem do tempo de serviço especial exercido até a data de sua edição, sob condições diversas. Outra interpretação seria injusta, porquanto desconsideraria o tempo de atividade especial a que o segurado teria se submeti-do, ignorando o seu desgaste físico e as situações perigosas suportadas.

Em suma, a situação ligada à verificação da atividade especial para fins de aposentadoria no Regime Geral de Previdência, quanto ao aspecto regula-mentar, ficou distribuída da seguinte maneira:

PERÍODOS ENQUADRAMENTOS

25.03.1964 a 22.05.1968 Decreto nº 53.831/1964 – Anexo

22.05.1968 a 10.09.1968 Decreto nº 62.755/1968

10.09.1968 a 06.09.1973 Decreto nº 63.230/1968 – Anexos I e II

06.09.1973 a 01.03.1979 Decreto nº 72.771/1973 – Anexos I e II

01.03.1979 a 07.12.1991 Decreto nº 83.080/1979 – Anexos I e II

07.12.1991 a 21.07.1992 Decreto nº 357/1991, art. 295 – repristina anexos dos Decretos nºs 53.831/1964 e 83.080/1979

21.07.1992 a 05.03.1997 Decreto nº 611/1992, art. 292 – repristina anexos dos Decretos nºs 53.831/1964 e 83.080/1979

05.03.1997 a 06.05.1999 Decreto nº 2.172/1997 – Anexo IV

06.05.1999 em diante Decreto nº 3.048/1999

Importa ponderar, ainda, se as atividades desempenhadas pelo segurado podem ser enquadradas na definição genérica das categorias mencionadas nos anexos dos decretos regulamentares, ou se a categorização é restritiva para en-sejar direito à aposentadoria especial.

A esse respeito pronunciou-se o extinto Tribunal Federal de Recursos no sentido da possibilidade de que outras atividades não previstas expressamente no Regulamento pudessem ensejar a aposentadoria especial, como registrou a Súmula nº 198:

“Súmula nº 198. Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria espe-cial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigo-sa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento.”

A questão foi objeto de decisão do Superior Tribunal de Justiça:

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO – APOSENTADORIA ESPECIAL – SERRALHEIRO – ATIVIDADE INSALUBRE –DECRETO Nº 83.080/1979 – ART. 60 – RBPS

A atividade exercida como serralheiro, reconhecida pela legislação vigente como insalubre, confere ao segurado direito à aposentadoria especial, após vinte e cin-co anos de trabalho, em analogia a outras atividades similares.

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Recurso conhecido, mas desprovido. (STJ, 5ª T., REsp 250780/SP, Rel. Min. Jorge Scartezzini, Decisão: 07.11.2000, DJ 18.12.2000, p. 228)”

Sobressai dos posicionamentos que as relações contidas nos anexos dos decretos não são taxativas, ou melhor, que a realidade de situações justificado-ras de proteção deve preponderar ao nominalismo arraigado da Administração.

No que se refere à utilização de equipamentos de proteção coletiva ou individual, nos termos do § 2º do art. 58 da Lei nº 8.213/1991, ressai imperativa a incidência da conclusão dada pelo Supremo Tribunal Federal nos autos do ARE 664.335/SC, com repercussão geral, segundo a qual “na hipótese de expo-sição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descarac-teriza o tempo de serviço especial para aposentadoria”.

Na decisão mencionada restaram duas teses. A primeira, no sentido de que a eficácia do EPI afasta o reconhecimento da atividade especial. A segunda, na esteira de que, em relação ao ruído, o posicionamento adotado pela TNU na Súmula nº 09 deve prevalecer, ou seja, quando o trabalhador estiver submetido ao agente nocivo ruído, ainda que utilize EPI eficaz, tal circunstância não se mostrará suficiente para afastar o caráter especial da atividade.

O efeito ligado à utilização do EPI é, ordinariamente, o de amenizar os danos causados pelos agentes nocivos, não os afastando por completo. Assim, pode ser constatada a exposição a determinado agente nocivo por parte do segurado em níveis acima do limite regulamentar ainda que seja efetivamente utilizado por este o equipamento de proteção.

Feitas tais considerações, passo à análise do caso concreto.

Pois bem, o impetrante requer que seja considerada como sujeitas à con-tagem especial as atividades desempenhadas nos períodos de 23.01.1984 a 31.07.1987, 14.10.1987 a 16.02.1989 e 01.03.1989 a 23.03.2010.

Esclareça-se que até 28.04.1995 ressai suficiente somente o enquadra-mento do segurado nas atividades especiais. A partir dessa data, por imposição da Lei nº 9.032/1995, passou a se exigir a comprovação de sua exposição a agentes nocivos.

Anoto que o formulário perfil profissiográfico previdenciário – PPP serve para comprovação de atividade sujeita a condições insalubres, nos termos dos §§ 2º, 3º e 4º do art. 68 do Decreto nº 3.048/1999:

“Art. 68. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associa-ção de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria especial, consta do Anexo IV.

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[...] § 2º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário denominado perfil profissiográfico previdenciário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. (Redação dada pelo Decreto nº 4.032, de 2001)

§ 3º Do laudo técnico referido no § 2º deverá constar informação sobre a existên-cia de tecnologia de proteção coletiva, de medidas de caráter administrativo ou de organização do trabalho, ou de tecnologia de proteção individual, que elimi-ne, minimize ou controle a exposição a agentes nocivos aos limites de tolerância, respeitado o estabelecido na legislação trabalhista. (Redação dada pelo Decreto nº 4.882, de 2003)

§ 4º A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à multa prevista no art. 283.

[...] § 7º O laudo técnico de que tratam os §§ 2º e 3º deverá ser elaborado com observância das normas editadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego e dos atos normativos expedidos pelo INSS. (Alterado pelo Decreto nº 4.882, de 2003)”

Como já analisado anteriormente, no decorrer do período em exame, houve alteração nos requisitos exigidos para a caracterização de atividades es-peciais, em função das várias leis que se sucederam, razão pela qual se faz necessário verificar se o autor demonstrou o preenchimento dos requisitos para a contagem especial, de acordo com a legislação da época.

A matéria afeta à sujeição de atividades laborativas a condição especial encontra-se pacificada na jurisprudência. Confira-se:

“EMENTA: APOSENTADORIA – ATIVIDADE ESPECIAL – RUÍDO – RETROA-ÇÃO DE NORMA – IMPOSSIBILIDADE

1. Trata-se, originariamente, de Ação ordinária que debate a averbação de ativi-dade rural e especial no cômputo de aposentadoria. A sentença de procedência parcial foi reformada em parte pelo Tribunal de origem. O recorrente propõe o debate sobre a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o grau de ruído apto à contagem especial de tempo de serviço.

2. É considerada especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. A partir da entrada em vigor do Decreto nº 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis. Precedentes do STJ.

3. Impossível atribuir retroatividade à norma sem expressa previsão legal, sob pena de ofensa ao disposto no art. 6º da LICC.

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4. Recurso Especial provido para determinar que o reconhecimento e a conver-são de tempo de serviço especial, no caso de exposição a ruído, observem a le-gislação vigente na época da prestação dos serviços, consoante a fundamentação e os valores supra delimitados. (STJ, REsp 1.320.470, Rel.Min. Herman Benjamin, DJe de 11.09.2012)”

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO – PROCESSUAL CIVIL – MANDADO DE SEGU-RANÇA – APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – RECONHE-CIMENTO DE TEMPO ESPECIAL – EXPOSIÇÃO À AGENTE NOCIVO – NÍVEIS DE RUÍDO – PRECEDENTE STJ – CONVERSÃO APÓS 28.05.1998 – POSSIBILI-DADE – EPIS

1. O tempo de serviço especial é aquele decorrente de atividades prestadas sob condições prejudiciais à saúde ou em atividades com riscos superiores aos nor-mais para o segurado que, cumprido os requisitos legais, lhe confere direito à aposentadoria especial.

2. Quanto aos níveis de ruído para o direito à contagem com tempo especial aplica-se o entendimento do STJ: ‘Assim, é considerada especial a atividade exer-cida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, até a edição do Decreto nº 2.171/1997, sendo considerado prejudicial após essa data o nível de ruído su-perior a 90 decibéis. Somente, a partir da entrada em vigor do Decreto nº 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância de ruído ao agente físico foi reduzido a 85 decibéis. 2. Hipótese em que o período controvertido, qual seja, de 06.03.1997 a 18.11.2003, deve ser considerado como atividade comum, a teor do Decreto nº 2.171/1997, uma vez que o segurado esteve exposto a níveis de ruído inferiores a 90 decibéis. Não há como atribuir retroatividade à norma regulamentadora sem expressa previsão legal, sob pena de ofensa ao disposto no art. 6º da Lei de In-trodução às Normas do Direito Brasileiro’ (EMEN: (STJ, Ag-REsp 201202318500, Humberto Martins, 2ª T., DJe Data: 08.02.2013 ..DTPB:.).

3. A despeito da utilização dos equipamentos de proteção individual ou coleti-va, vislumbra-se que tal fato não descaracteriza a condição especial do trabalho exercido pelo empregado, pois destinado à proteção da vida e da saúde do tra-balhador (ressalva do relator).

4. Pacífico o entendimento de que cabível a conversão de tempo especial em tempo comum, mesmo após 28.05.1998. Isso porque o ‘§ 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/1991 está em plena vigência, sendo que, atualmente, não cabe mais dúvida quanto à possibilidade de conversão de todo tempo trabalhado em con-dições especiais, para ser somado ao restante do tempo sujeito a contagem co-mum e, consequentemente, fazer jus à aposentadoria por tempo de serviço’ (AMS 2000.38.00.018667-4/MG, Rel. Des. Fed. Antonio Sávio de Oliveira Chaves, DJ 25.08.2003).

5. Tempo de serviço total: 39 anos, 04 meses e 20 dias na data do requerimento administrativo.

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6. Os efeitos financeiros da concessão da segurança operam-se a partir da impe-tração.

7. Consectários legais: a) correção monetária e juros de mora pelo MCJF; b) ho-norários de sucumbência incabíveis na espécie (Súmulas nºs 512 do Supremo Tribunal Federal e 105 do Superior Tribunal de Justiça); c) o INSS goza de isenção de custas nas ações ajuizadas perante a Justiça Federal (Lei nº 9.289/1996).

8. Apelação do impetrante provida, recurso adesivo do INSS improvido, remessa oficial parcialmente provida. (TRF 1ª R., AMS 00002018420074013814, Rel. Juiz Federal Cleberson José Rocha, e-DJF1 de 18.08.2014)”

Além disso, o Enunciado AGU nº 29/2008 vai ao encontro da citada ju-risprudência, delineando a questão com objetividade, ao dispor:

“Atendidas as demais condições legais, considera-se especial, no âmbito do RGPS, a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis até 05.03.1997, superior a 90 decibéis desta data até 18.11.2003, e superior a 85 decibéis a partir de então.”

O documento de fls. 35/37 informa que o impetrante esteve submetido de forma habitual e permanente ao agente ruído nos seguintes períodos/inten-sidades:

– 01.03.1989 a 31.05.2000 – 91,7 dB;

– 01.06.2000 a 23.03.2010 – 87 dB.

Infere-se, portanto, que há caracterização de atividade especial nos pe-ríodos de 01.03.1989 a 31.05.2000 e 19.11.2003 a 23.03.2010, pois os níveis considerados prejudiciais ultrapassaram os limites de 80 dB e 85 dB, tolerâncias normativamente previstas para esse agente insalubre nos lapsos temporais res-pectivos. Não há configuração de labor insalubre no período de 01.06.2000 a 18.11.2003, visto que a intensidade do ruído não superou o limite normativo de 90 dB.

Todavia, o juiz de 1º grau afastou o reconhecimento da natureza espe-cial da atividade nos períodos de 27.05.1995 a 20.06.1995 e 10.11.2003 a 31.03.2004, considerando que o impetrante esteve em gozo de auxílio-doença (fls. 72/73), devendo a sentença ser mantida quanto a tal aspecto, apesar do seu desacerto1, à míngua de apelação do impetrante especificamente contra esse ponto, bem como em razão da impossibilidade de, pela via da remessa oficial, haver reforma em prejuízo da Fazenda Pública (Súmula nº 45 do STJ).

1 No que tange ao período em que o segurado esteve em gozo do auxílio-doença previdenciário, o TRF 1ª Região tem jurisprudência sólida no sentido de que tal lapso temporal deve ser computado como tempo especial quando ocorrido na vigência de contrato de trabalho em atividade especial. v.g. AMS 0000261-52.2010.4.01.3814/MG, e-DJF1 de 09.05.2014.

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Dessarte, o reconhecimento de labor insalubre pela submissão ao agen-te ruído cinge-se aos períodos de 01.03.1989 a 26.05.1995, 21.06.1995 a 31.05.2000 e 01.04.2004 a 23.03.2010.

O impetrante requer o enquadramento do período em que esteve subme-tido ao regime estatutário, vinculado à Marinha do Brasil e exercendo atividade de marinheiro do serviço geral de máquinas (fl. 33).

No que tange à possibilidade de cômputo de atividade especial para fins de aposentadoria do servidor público, a Constituição Federal, desde a sua pro-mulgação, previu a possibilidade de serem consideradas as atividades penosas, insalubres ou perigosas para fins de obtenção de aposentadoria, mas sempre condicionando o exercício do respectivo direito à regulamentação mediante lei complementar (art. 40, § 1º na redação original e, posteriormente, no § 4º (EC 20/1998) e no § 4º, III (EC 47/2005)).

Trata-se, portanto, de norma de eficácia contida. Todavia, a lei comple-mentar prevista na Carta Constitucional ainda não foi editada.

A fim de contornar a mora legislativa, o Supremo Tribunal Federal firmou sua jurisprudência mediante a edição da Súmula Vinculante nº 33, após o julga-mento de diversos mandados de injunção, cujo verbete é o seguinte:

“Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o art. 40, § 4º, in-ciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica.” (grifei)

Destaca-se que referida súmula apanha apenas as situações que envol-vem o labor exclusivo em atividade que prejudique a saúde ou a integridade física e que dá ensejo à aposentadoria especial, com a aplicação excepcional da regra prevista no art. 57, § 1º da Lei nº 8.213/1991, na medida em que os prece-dentes da Corte Suprema que deram suporte para a sua edição não contemplam a mera contagem de tempo especial para fins de conversão em tempo comum com vistas à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.

Nos debates ligados à proposta de edição da súmula vinculante em tela, foram citados, exemplificativamente, decisões proferidas nos Agravos Regimen-tais dos Mandados de Injunção nºs 1.481 e 1.596 das relatorias, respectiva-mente, dos Ministros Teori Zavascki e Rosa Weber. Neles, restou assentado o seguinte:

“A conversão de períodos especiais em comuns, para fins de contagem diferen-ciada e averbação nos assentamentos funcionais de servidor público, não cons-titui pretensão passível de tutela por mandado de injunção, pois, à míngua de dever constitucional de legislar sobre a matéria, [...]” (MI 1.481)

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“Não se admite a conversão de períodos especiais em comuns, mas apenas a concessão da aposentadoria especial mediante a prova do exercício de ativida-des exercidas em condições nocivas.” (MI 1.596)

Noutro trecho dos debates, em discussão a possibilidade de aplicação da súmula a situações outras que não apenas a concessão de aposentadoria espe-cial, o Ministro Teori Zavascki destacou a posição do STF em sentido contrário, verbis:

“[...] A respeito desse ponto específico da contagem de tempo de serviço também se decidiu que não se comportam, no âmbito dos mandados de injunção sobre o art. 40, § 4º, da Constituição, pretensões no sentido de dirimir controvérsias espe-cíficas sobre conversão de tempo de serviço prestado em atividades exercidas em condições nocivas, para fins de aproveitamento, como serviço comum, de outra espécie de aposentadoria.

O Ministro Ricardo Lewandowski citou vários precedentes nesse sentido. Refiro outros, começando até por um precedente do Ministro Ricardo Lewandowski em fevereiro, que afirma:

‘O Plenário dessa Casa posicionou-se, definitivamente, pela inviabilidade do mando de injunção, quando pretendida a mera contagem diferenciada e a averbação de tempo de serviço prestado em condições especiais.

Não se diz se tem direito ou não tem direito. O que se diz é que não se comporta no âmbito do mandado de injunção.’

Também, um precedente do Ministro Luiz Fux:

‘O alcance da decisão proferida por esta Corte, quando na integração legislativa do § 4º do art. 40, não tutela o direito à contagem diferenciada do tempo de serviço, prestada em condições prejudiciais de saúde e a integridade física. Não tem procedência injuncional o reconhecimento da contagem diferenciada e da averbação do tempo de serviço prestado pelo impetrante, em condições insalubres, por exorbitar da expressa disposição constitucional.’

Precedente da Ministra Rosa Weber, foi citado pelo Ministro Ricardo Lewandowski:

‘A conversão do tempo de serviço especiais em comuns, para fins de contagem diferenciada e averbação dos assentamentos funcionais do servidor público, não constitui pretensão passível de tutela por mandado de injunção, à míngua de dever constitucional de legislar sobre a matéria.’

Precedente do Ministro Dias Toffoli:

‘A pretensão de garantia de conversão de tempo especial em tempo comum mostra-se incompatível com a presente via processual, uma vez que, no

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mandado de injunção, cabe ao Poder Judiciário, quando verificada a mora legislativa, viabilizar o exercício subjetivo constitucionalmente previsto, no qual não está incluído o direito vindicado.’

Precedente da Ministra Cármem Lúcia:

‘Impossibilidade de assegurar a contagem e averbação de tempo de serviço, art. 57 da Lei nº 8.213, para futuro pedido de aposentadoria especial. Inexistência do pressuposto de inviabilidade do exercício de prerrogativa constitucional. Precedentes.’”

Dessarte, conclui-se que a Súmula Vinculante nº 33 tem aplicação aos casos de servidores públicos com vistas, unicamente, à obtenção de aposenta-doria especial, afastada a possibilidade da sua incidência para fins de conta-gem de tempo especial e conversão em tempo comum com o fito de obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição. Em abono a esse entendimento, confira-se precedente do TRF 2ª Região:

“APELAÇÃO CÍVEL – CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO – EXERCÍCIO DE ATIVIDADES INSALUBRES – APOSENTADORIA ESPECIAL – APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO RGPS (LEI Nº 8.213/1991) – MATÉRIA DECIDIDA PELO STF A PARTIR DO JULGAMENTO DO MI 721 – LIMITES DO JULGADO QUE NÃO CONTEMPLAM O DIREITO À CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM CONDIÇÕES INSA-LUBRES PARA COMUM, NEM SUA CONSEQUENTE AVERBAÇÃO PARA FINS DE APOSENTADORIA POR IDADE OU TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – GRA-TUIDADE DE JUSTIÇA – CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – CABIMENTO – EXIGIBILIDADE SUSPENSA – ART. 12 DA LEI Nº 1.060/1950 – RECURSO DO AUTOR IMPROVIDO E APELO DA RÉ PROVIDO

[...] 2. O cerne da controvérsia ora posta a deslinde cinge-se em analisar a pos-sibilidade de conversão em comum do tempo de serviço trabalhado pelo servi-dor público em locais ou condições insalubres. Isso porque os demais pedidos formulados pelo autor, tal como o de retroação do abono de permanência e de devolução dos valores pagos a título de contribuição previdenciária, têm como premissa a admissibilidade daquela conversão.

3. Enfrentando a questão relacionada ao direito à aposentadoria nas condições previstas no § 4º do art. 40 da CF/1988, carente, porém, de regulamentação legal, o STF, a partir do julgamento do Mandado de Injunção nº 721, passou a precei-tuar que a omissão legislativa na regulamentação do referido dispositivo consti-tucional deve ser suprida mediante a aplicação das normas do Regime Geral de Previdência Social previstas na Lei nº 8.213/1991 e no Decreto nº 3.048/1999. Isso, porém, quando o próprio direito à aposentadoria especial restar obstaculado por força da omissão legislativa.

4. O suprimento normativo da questão ali tratada limitou-se a assegurar, nas hipóteses previstas no texto constitucional, o direito à aposentadoria especial mediante a aplicação dos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213/1991, não indo além a

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ponto de também assegurar e normatizar o direito à conversão de tempo de ser-viço especial em comum.

5. Segundo a jurisprudência firmada no STF, não se admite a conversão de perío- dos especiais em comuns, mas apenas a concessão da aposentadoria especial, condicionada à prova do exercício de atividades exercidas em condições insalu-bres. Apesar de ser permitida no RGPS, no serviço público é expressamente veda-da a contagem de tempo ficto, com fundamento no art. 40, § 10, da Constituição (“A lei não poderá estabelecer qualquer forma de contagem de tempo de contri-buição fictício”). Nesse sentido: MI 3875 AgR/RS, Pleno, Relª Min. Cármen Lúcia, J. 09.06.2011, DJe 03.08.2011 e AgRg no Mandado de Injunção nº 1.929/DF, Relator: Min. Teori Zavascki.

[...] 11. Apelação do autor improvida e apelo da ré provido. (AC 2013511 81174496, Relª Desª Fed. Carmen Silvia Lima de Arruda, e-DJF2 de 15.09.2014)”

Logo, deve ser acolhida a pretensão do impetrante ligada à contagem do período de 23.01.1984 a 31.07.1987 como insalubre, pelo enquadramento no item 2.4.4 do Anexo II ao Decreto nº 83.080/1979 (transporte marítimo – traba-lhadores em casa de máquinas), visto como o documento de fl. 33 descreve a atividade de “marinheiro do serviço geral de máquinas” perante a Marinha do Brasil.

Afasto o argumento do INSS no sentido de que eventuais contribuições ligadas ao período em tela estavam relacionadas ao serviço público federal e que competiria à União averbar tal período, já que se trata do regime jurí-dico estatutário. Isso porquanto, antes mesmo da disciplina contida no § 9º do art. 201 da Constituição Federal, introduzido pela Emenda Constitucional nº 20/1998, o caput do art. 94 da Lei nº 8.213/1991 já previa que para efeito dos benefícios previstos no Regime Geral de Previdência Social ou no serviço público é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na ati-vidade privada, rural e urbana, e do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social se compensarão financeiramente. Nessa esteira, confira-se, mutatis mu-tandis, aresto desta Corte:

“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL – ACÓRDÃO – OMISSÃO – OCORRÊNCIA – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS

1. Havendo omissão na fundamentação do acórdão acerca da questão relativa à qualidade de servidora pública municipal da autora e a possibilidade de requerer o benefício de aposentadoria por idade junto ao Regime Próprio de Previdência dos Servidores Municipais de Conquista/MG, os embargos devem ser acolhidos.

2. A Lei nº 9.717/1998 estabeleceu em seu art. 10 que no caso de extinção de regime próprio de previdência social, a União, o Estado, o Distrito Federal e os Municípios assumirão integralmente a responsabilidade pelo pagamento dos

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benefícios concedidos durante a sua vigência, bem como daqueles benefícios cujos requisitos necessários a sua concessão foram implementados anteriormente à extinção do regime próprio de previdência social.

3. Pretendendo o servidor se aposentar valendo-se apenas de tempo de serviço prestado durante o período em que esteve vinculado ao regime próprio, deverá requerer o benefício à entidade à qual é vinculado e que mantinha o respectivo regime extinto. Caso pretenda agregar tempo anterior ou posterior à migração para o regime próprio, o pedido deverá ser dirigido INSS.

4. Com a extinção do Regime de Previdência do Município de Conquista/MG, poderia a autora requerer junto ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS a concessão do benefício de aposentadoria por idade, até porque a contagem recíproca é assegurada pelo § 9º do art. 201 da Constituição Federal, e pelos arts. 94 a 99 da Lei nº 8.213/1991, com previsão apenas de compensação financeira entre os diferentes sistemas.

5. Embargos de declaração acolhidos para suprir a omissão, sem, contudo, alte-rar a conclusão do acórdão. (EDAC 00022322620014013802, Rel. Juiz Federal Miguel Angelo de Alvarenga Lopes (Convocado), e-DJF1 de 25.05.2010)”

A compensação financeira a que alude a lei deve ser realizada entre os sistemas de previdência oficiais, consoante previsão do § 1º do art. 94 da Lei nº 8.213/1991, pelo que cabe ao INSS buscar tal acerto perante o ente respon-sável pelo regime de previdência anterior.

Por sua vez, o formulário DSS-8030 de fl. 34 informa que no período de 14.10.1987 a 16.02.1989 o impetrante exercia a atividade de vigilante, em caráter habitual e permanente, com a utilização de arma de fogo. A jurispru-dência do TRF da 1ª Região é firme no sentido de admitir o reconhecimento da atividade de vigilante como especial até 05.03.1997, por equiparação à de guarda (prevista no item 2.5.7 do Anexo ao Decreto nº 53.831/1964), quando restar demonstrado o porte de arma de fogo. Confira-se:

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – APOSENTADO-RIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – ENQUADRAMENTO POR CATEGO-RIA PROFISSIONAL – DECRETOS NºS 53.831/1964 E 83.080/1979 – RECONHE-CIMENTO DO CARÁTER ESPECIAL – VIGILÂNCIA ARMADA – EQUIPARAÇÃO À ATIVIDADE DE GUARDA – PORTE DE ARMA DE FOGO – NÃO COMPRO-VAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO – TEMPO INSUFICIENTE – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – CUSTAS PROCESSUAIS

1. O tempo de serviço especial é aquele decorrente de labor prestado sob con-dições prejudiciais à saúde ou em atividades com riscos superiores aos normais para o segurado e, cumpridos os requisitos legais, pode ser utilizado para fins previdenciários.

2. Antes da vigência da Lei nº 9.032/1995, a contagem do tempo de serviço como especial se dava em função da atividade profissional desempenhada pelo segura-

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do, conforme previsão dos Decretos nºs 53.831/1964 (Anexo III) e 83.080/1979 (Anexos I e II), consoante disposto no caput do art. 57 da Lei nº 8.213/1991. A partir do advento da referida lei, não se trata mais de identificar a qual categoria profissional pertence o trabalhador, mas se exerceu atividade, qualquer que seja ela, sujeito a condições que prejudiquem sua saúde ou integridade física, pela efetiva exposição a algum agente físico, químico ou biológico, ou combinação destes, constantes de relação definida pelo Poder Executivo.

3. A atividade de vigilante deve ser enquadrada como perigosa, conforme previ-são contida no código 2.5.7 do Decreto nº 53.831/1964, por equiparação à ati-vidade de guarda até a vigência da Lei nº 9.032/1995. Tal equiparação, contudo, somente se afigura possível mediante comprovação de que o segurado exercia a atividade com porte de arma de fogo. Precedentes.

4. Posteriormente à vigência da Lei nº 9.032/1995, em ajuste ao entendimento do relator, o reconhecimento da especialidade da função de vigia depende da comprovação da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou à integri-dade física – como o uso de arma de fogo (riscos à integridade física e à própria vida), por exemplo –, mediante apresentação de formulários SB-40 e DSS-8030 expedidos pelo INSS e preenchidos pelo empregador até 05.03.1997 (anterior à vigência do Decreto nº 2.172/1997), e, a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico ou perícia judicial (Lei nº 9.528/1997).

5. No caso concreto, a prova trazida aos autos (anotações em CTPS, apenas) se afigura insuficiente à comprovação do efetivo porte de arma de fogo pela parte impetrante, o que inviabiliza o enquadramento da referida atividade como es-pecial.

6. Considerando o cômputo dos períodos em análise como tempo de serviço co-mum, a parte impetrante não totaliza tempo suficiente à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (proporcional ou integral), razão pela qual a segurança deve ser denegada.

7. Honorários incabíveis na espécie (art. 25 da Lei nº 12.016/2009).

8. Custas na forma da lei.

9. A parte autora está dispensada da devolução de parcelas recebidas em virtude de antecipação dos efeitos da tutela, diante do seu caráter alimentar, consideran-do ainda a hipossuficiência e o fato de tê-las recebido de boa-fé. Precedentes.

10. Apelação do INSS e remessa necessária providas. (AMS 0004828-96. 2009.4.01.3803, Relª Desª Fed. Gilda Sigmaringa Seixas, e-DJF1 de 09.10.2015)” (destaquei)

Assim, o período de 14.10.1987 a 16.02.1989 deve ser enquadrado como especial.

Rechaço a assertiva do INSS no sentido de que o laudo técnico e/ou o perfil profissiográfico previdenciário devem ser contemporâneos ao exercício

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da atividade laborativa tida como especial, porquanto esta Corte tem jurispru-dência sólida em posição contrária. Confiram-se, entre outros, os seguintes jul-gados:

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO EM MANDA-DO DE SEGURANÇA. – APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM – POSSIBILI-DADE – RUÍDO – POEIRA MINERAL – POSSIBILIDADE DE CONTAGEM DIFE-RENCIADA – LAUDO EXTEMPORÂNEO – ART. 3º DA EC 20/1998 – TERMO INICIAL – CONSECTÁRIOS LEGAIS

[...] 4. A partir da Lei nº 9.032/1995 e até a entrada em vigor da Medida Pro-visória nº 1.596-14/1997 (convertida na Lei nº 9.528/1997) a comprovação do caráter especial do labor passou a ser feita com base nos formulários SB-40 e DSS-8030, expedidos pelo INSS e preenchidos pelo próprio empregador. Com o advento das últimas normas retro referidas, a mencionada comprovação passou a ser feita mediante formulários elaborados com base em laudo técnico de con-dições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.

5. A circunstância de o laudo não ser contemporâneo à atividade avaliada não lhe retira absolutamente a força probatória, em face de inexistência de previsão legal para tanto e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral.

[...] 13. Apelação do INSS não provida.

14. Remessa oficial parcialmente provida. (AMS 00240521020014013800, Rel. Des. Fed. Cândido Moraes, e-DJF1 de 30.03.2015)”

“EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL – MANDADO DE SEGU-RANÇA – APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – TRABALHA-DOR URBANO – TEMPO LAVORADO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS – CONVER-SÃO – EXPOSIÇÃO A RUÍDO MÉDIO SUPERIOR AO LIMITE DE TOLERÂNCIA – EPI – INSALUBRIDADE NÃO DESCARACTERIZADA – GOZO DE AUXÍLIO--DOENÇA NA VIGÊNCIA DE CONTRATO DE TRABALHO EM ATIVIDADE ES-PECIAL – TEMPO ESPECIAL – CÔMPUTO – TROCADOR DE ÔNIBUS – ATIVI-DADE LABORAL PENOSA – DECRETOS NºS 53.831/1964 E 83.080/1979

[...] 8. Os perfis profissiográficos anexados às fls. 41/49 e os laudos às fls. 73/77 foram emitidos com base em medições realizadas na empresa em que o autor trabalhou, considerando as condições ambientais de trabalho idênticas àquelas a que ele esteve exposto.

9. Inexiste exigência legal de que o perfil profissiográfico previdenciário e os lau-dos sejam, necessariamente, contemporâneos à prestação do trabalho, servindo como meio de prova quando atestam que as condições ambientais periciadas equivalem às existentes na época em que o autor exerceu suas atividades.

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[...] 12. Apelação e Remessa Oficial a que se nega provimento. (AMS 00002615220104013814, Rel. Juiz Fed. Henrique Gouvea da Cunha (convoca-do), e-DJF-1 de 09.05.2014)”

O impetrante requer, ainda, na sua apelação adesiva, que o período de 01.06.2000 a 31.03.2004 seja reconhecido como especial pela submissão a agentes biológicos. Razão não lhe assiste, pois embora o PPP de fls. 35/37 des-creva que no período citado havia sujeição a agentes biológicos (bactérias), a previsão contida no item 3.0.1 do Anexo IV ao Decreto nº 3.048/1999 diz res-peito aos trabalhos realizados em galerias, fossas e tanques quando realizados em esgoto.

Considerando que o impetrante desenvolvia a atividade de bombeiro na área industrial e administrativa da empresa Celulose Nipo-Brasileira S/A – Cenibra no período em tela, descabe presumir que o seu labor era exercido em ambiente de esgoto, o que afasta o enquadramento desse lapso temporal.

O impetrante não faz jus à aposentadoria especial pleiteada, pois o so-matório dos períodos enquadrados precedentemente atinge o tempo total de 22 anos e 11 dias na DER (16.04.2010 – fl. 77).

Ante o exposto, nego provimento às apelações das partes e à remessa oficial.

É como voto.

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoPetição – Turma Espec. III – Administrativo e Cível0007462‑54.2016.4.02.0000(2016.00.00.007462‑6)Relator: Sergio SchwaitzerPolo Ativo: Agência Nacional de Transportes Aquaviários – AntaqAdvogado(s): Procurador FederalPolo passivo: Ministério Público FederalAdvogado(s): Procurador Regional da RepúblicaOrigem: 4ª Vara Federal Cível (00066476020144025001)

deCisãO

Trata-se de requerimento por meio do qual a Agência Nacional de Trans-portes Aquaviários – Antaq, pede que a Apelação por ela interposta nos autos da Ação Civil Pública Processo nº 0006647-60.2014.4.02.5001 seja recebida no efeito suspensivo.

Segundo relata o Requerente, o objeto da ação subjacente, proposta pelo Ministério Público Federal, é a declaração de ilegalidade dos arts. 2º, VIII e 36 a 47 da Resolução Antaq nº 2.240/2011, dispositivos que, segundo o parquet, ao autorizarem a celebração de contrato de uso temporário de áreas portuárias mediante processo seletivo simplificado (vale dizer, sem licitação), violara o art. 37, XXI, da CR/1988, o art. 2º da Lei nº 8.666/1993, e os arts. 1º, § 1º; 4º e 8º da Lei nº 12.815/2013.

O Requerente noticia, outrossim, que, na sentença (com eficácia imedia-ta) por ele proferida, o MM. Juízo da 4ª Vara Federal Cível de Vitória/ES, julgara procedente o pedido para declarar a nulidade dos arts. 2º, VIII e 36 a 47 da Re-solução nº 2.240 de 04 de outubro de 2011, editada pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários – Antaq, impondo a esta, em sequência, a obrigação de comunicar a suspensão da eficácia dos aludidos dispositivos a todos os Portos organizados e determinar que estes suspendam todos os processos de seleção simplificada em curso e com contratos ainda não assinados, que tiverem por objeto o uso temporário de áreas e instalações portuárias, localizadas dentro do poligonal dos portos e que adotasse medidas a impedir a renovação de contra-tos com os mesmos objetos.

Neste requerimento, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários – Antaq alega que a Ação Civil Pública não se prestaria para controle abstrato de

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constitucionalidade, como – sustenta – seria tranquilo na jurisprudência do E. STF. Consigna que o contrato de uso temporário teria natureza distinta do arren-damento, por se tratar de exploração de atividade econômica, e não de serviço público, bem assim, que a Resolução/Antaq nº 2.240/2011 (arts. 2º, VIII, 36 a 47) estaria conforme às Leis nºs 8.630/1993 (antiga Lei dos Portos – revogada), 10.233/2001 e 12.815/2013 (nova Lei dos Portos) e com a Constituição Federal (art. 174).

Decorreria, portanto, que haveria probabilidade de provimento da ape-lação por ela interposta e reforma da sentença a quo, razão por que impõe a atribuição do efeito suspensivo ao recurso, mormente em razão de risco de dano grave ou de difícil reparação, vez que teriam sido concedidas 18 (dezoito) autorizações com base nos artigos declarados nulos.

A Requerente pede, conseguintemente, a atribuição de efeito suspensivo ao recurso de Apelação por ela interposto.

É o Relatório. Decido.

O requerimento deve ser deferido.

Inauguralmente, convém consignar que o presente requerimento encon-tra esteio no § 4º do art. 1.012, do CPC de 2015, que disciplina o pedido de reforma de decisão proferida por juiz de primeiro grau que, ao apreciar os efei-tos em que a apelação será recebida, indefere a atribuição de efeito suspensivo.

De fato, o pedido de atribuição de efeito suspensivo à apelação em ação civil pública não se encontra no rol do art. 1.015 do CPC de 2015 (como antes previsto no inciso III, do art. 527, do CPC de 1973), mas em requerimento do § 3º do art. 1.012 do mesmo diploma legal, a ser dirigido ao tribunal, se o re-querimento for formulado entre a interposição da apelação e a sua distribuição ou ao relator, se distribuída a apelação (incisos I e II, § 3º do art. 1.012, do CPC de 2015).

Noutro giro, anote-se que se evidencia razoável reconhecer o risco de dano grave e irreparável se imediatamente cumprida a sentença, máxime por-que a suspensão dos processos de autorização em curso e a obstaculização de renovação dos contratos de uso temporário frustraria a realização de atividades empresariais, investimentos, recolhimento de tributos e geração de empregos.

Nas informações prestadas pela Advocacia-Geral da União juntada às fls. 16/26, é noticiado que a “paralisação dos contratos de uso temporário car-reta descompasso com as situações fáticas concretas, desconsidera aspectos técnicos importantes envolvidos nos ajustes e gera impacto financeiro negativo de grande monta”. Registra, dentre outros exemplos, que, em Acórdão profe-rido pelo Plenário do Tribunal de Contas da União nos autos do Processo TC nº 046.138/2012-9 (nº 1.514/2013), somente para o Estado de Alagoas, os in-

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vestimentos foram de cerca de R$ 12 milhões, que geraram 800 empregos dire-tos e indiretos. No aludido Acórdão, a Corte de Contas positivara que a Reso-lução inquinada de inconstitucional contribuíra para a exploração do petróleo naquele Estado.

No que toca ao Estado do Rio Grande do Sul, o modelo de contratação, estabelecido nos moldes da Resolução/Antaq nº 2240/2011, fora responsável pelo aumento de arrecadação da Superintendência de Portos e Hidrovias na ordem de 20%, ademais de gerar mais de 2 mil empregos diretos e indiretos. A conveniência da contratação não passou despercebida pelo TCU no que toca contrato celebrado entre a Flexibrás e a Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), notadamente quanto às vantagens para a exploração de petróleo e geração de empregos.

Portanto, a prudência recomenda que seja atribuído efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto pela Antaq, vez que idoneamente demons-trada a iminência de lesão grave e de difícil reparação de que trata o § 4º do art. 1.012, do CPC de 2015.

Face ao exposto, defiro o Requerimento da Agência Nacional de Transportes Aquaviários – Antaq para atribuir efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto pela Requerente nos autos do Processo nº 0006647-60.2014.4.02.5001.

Oficie-se, com urgência, o MM. Juízo da 4ª Vara Federal Cível de Vitória/ES acerca do teor deste decisório e Intimem-se o Ministério Público Fe-deral para ciência.

Rio de Janeiro, 21 de julho de 2016.

Assinado eletronicamente Sergio Schwaitzer Relator

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 27.06.2016Apelação Cível nº 0015827‑74.2014.4.03.6100/SP2014.61.00.015827‑6/SPRelator: Desembargador Federal Carlos MutaApelante: M. Cassab Com. e Ind. Ltda.Advogado: SP173624 Franco Mauro Russo Brugioni e outro(a)Apelado(a): União Federal (Fazenda Nacional)Advogado: SP000003 Julio César Casari e Claudia Akemi OwadaNº Orig.: 00158277420144036100 10ª Vr. São Paulo/SP

ementaDIREITO TRIBUTÁRIO – ADUANEIRO – IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – BASE DE CÁLCULO – VALOR ADUANEIRO – DESPESAS DE CAPATAZIA – INCLUSÃO – INSTRUÇÃO NORMATIVA SRF Nº 327/2003 – IMPOSSIBILIDADE – COMPENSAÇÃO DOS INDÉBITOS – SELIC

1. Caso em que o contribuinte pretende a exclusão das despesas de capa-tazia da base de cálculo do imposto de importação (valor aduaneiro) sob o entendimento de que o preceito do art. 4º, § 3º, da Instrução Norma-tiva SRF nº 327/2003 (“os gastos relativos à descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional serão incluídos no valor aduaneiro, independentemente da responsabilidade pelo ônus financeiro e da denominação adotada”) é ilegal, porque alarga indevida-mente o valor aduaneiro, a partir de despesas fora de seu alcance, decor-rentes de serviços prestados após a entrada da mercadoria em território nacional.

2. Tanto o Acordo sobre Valoração Aduaneira do Gatt quanto o Regula-mento Aduaneiro, conforme os dispositivos supratranscritos, limitam-se a dispor sobre a possibilidade de inclusão no valor aduaneiro de gastos até o porto ou local de importação da mercadoria. Nesta linha, o enten-dimento de que a redação do art. 77, I, do Regulamento Aduaneiro, ao incluir no valor aduaneiro as despesas “até o porto ou o aeroporto alfan-degado de descarga ou ponto de fronteira alfandegado”, compreenderia os gastos de capatazia não supera sequer o exame dos demais termos da norma, “onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro”. Ora, não há como se furtar à compreensão de que a norma em questão, até mesmo pela utilização do verbo “dever” no futuro, dispõe sobre gastos efetuados antes das formalidades de entrada

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no território aduaneiro. Não há que se falar que a zona primária não componha o território aduaneiro, pelo que não há como acolher a argu-mentação fazendária.

3. As Declarações de Importação constantes das mídias encartadas aos autos prestam-se à comprovação dos recolhimentos indevidos, a justifi-car a procedência do pedido de declaração do direito à compensação dos indébitos. Os valores devem ser atualizados pela Selic, inacumulável com qualquer outro índice de correção monetária ou com juros de mora, conforme o entendimento assentado pelo Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do Ag-REsp 862.572 (Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 16.06.2008).

4. Apelação do contribuinte provida.

aCÓrdãO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, de-cide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo do contribuinte, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 17 de junho de 2016.

Carlos Muta Desembargador Federal

relatÓriO

Trata-se de apelação à sentença, no que denegou a segurança, em man-dado impetrado objetivando, essencialmente, a declaração de inexigibilidade de inclusão, na base de cálculo do imposto de importação (valor aduaneiro), de despesas de carga e descarga das mercadorias após a chegada em porto alfan-degado (serviços de capatazia), ante a ilegalidade do art. 4º, § 3º, da Instrução Normativa SRF nº 327/2003. Requereu-se, ainda, o reconhecimento do direito de compensação ou restituição dos valores indevidamente pagos a tal título, nos cinco anos anteriores à impetração e desta em diante, até decisão definitiva, corrigidos pela Selic, a partir de cada desembolso.

Alegou o contribuinte, em síntese: (1) violação ao princípio da legali-dade estrita, nos termos do art. 150, I, CF, desrespeitando também “os limites impostos pelo Acordo de Valoração Aduaneira e ao Decreto nº 6.759/2009”; (2) o art. 150, I, CF, dispõe ser vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça, compe-

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tindo à União instituir impostos sobre importação, nos termos do art. 153, I, CF, sendo ilegal a tributação do II imposta pela IN SRF 327/2003: “admitir que IN SRF 327/2003 permita que o valor cobrado pelos portos para a realização do serviço de capatazia seja tributado pelo Imposto de Importação, amplia, por via oblíqua, a base de cálculo do referido tributo”; (3) assim, nos termos do art. 156, CF, compete aos municípios a tributação, através do ISS, do imposto sobre ser-viços, dos serviços que compreendem o recebimento, conferência, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, atracadas em portos brasi-leiros, tendo havido, na espécie, invasão da competência tributária municipal; (4) violação do limite de ordem cronológica imposto pelo GATT, pois a RFB, no art. 77 do Decreto nº 6.759/2009, Regulamento Aduaneiro, considerou que os gastos com os serviços de movimentação e manuseio de mercadorias prestados nos portos brasileiros devem ser considerados no valor aduaneiro, desprezando o disposto no art. 7º, item 2, a e b da Parte II do Gatt, incorporado pelo art. 77, I, do Regulamento Aduaneiro, que estabelece que apenas as despesas ocorridas até a chegada do bem no porto devem ser incluídas no valor aduaneiro (parte final do inciso II), excluindo as despesas realizadas após o recebimento dessas mercadorias, ou seja, exclui os gastos ocorridos entre a chegada da mercado-ria no porto brasileiro e o seu desembaraço aduaneiro; (5) sendo inexigível o recolhimento dos custos de capatazia na base de cálculo do imposto de impor-tação, há o direito à restituição ou compensação dos valores indevidamente recolhidos a este título nos últimos 5 (cinco) anos anteriores à propositura da ação, com aplicação da taxa Selic; (6) necessidade de efeito suspensivo a fim de não promover quaisquer medidas visando a cobrança destes custos, ou de impor sanções pelo não recolhimento, tais como negar emissão de certidão de regularidade fiscal ou inclusão do nome do apelante no Cadin.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte, opinando o MPF pelo provimento do recurso (fls. 148/150).

Os autos vieram conclusos e foram recebidos fisicamente no Gabinete em 16.05.2016, com inclusão em pauta para julgamento na sessão de 17.06.2016.

É o relatório.

Carlos Muta Desembargador Federal

vOtO

Senhores Desembargadores, a controvérsia dos autos cinge-se à inter-pretação da legislação de regência a respeito dos custos que integram o valor aduaneiro da mercadoria importada e, assim, a base de cálculo do imposto

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de importação. Cumpre a transcrição dos dispositivos legais pertinentes (grifos nossos):

Decreto nº 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro):

“Art. 77. Integram o valor aduaneiro, independentemente do método de valo-ração utilizado (Acordo de Valoração Aduaneira, art. 8º, §§ 1º e 2º, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994; e Norma de Aplicação sobre a Valoração Aduaneira de Mercadorias, art. 7º, aprovado pela Decisão CMC nº 13, de 2007, internalizada pelo Decreto nº 6.870, de 4 de junho de 2009):

I – o custo de transporte da mercadoria importada até o porto ou o aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;

II – os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao trans-porte da mercadoria importada, até a chegada aos locais referidos no inciso I; e

III – o custo do seguro da mercadoria durante as operações referidas nos incisos I e II.”

Acordo sobre Valoração Aduaneira do Gatt (Decreto nº 1.355/1994):

“Art. 8º. [...]

[...]

2. Ao elaborar sua legislação, cada Membro deverá prever a inclusão ou a exclu-são, no valor aduaneiro, no todo ou em parte, dos seguintes elementos:

(a) o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação;

(b) os gastos relativos ao carregamento descarregamento e manuseio associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; e

(c) o custo do seguro;”

Afirma o contribuinte que o preceito do art. 4º, § 3º, da Instrução Nor-mativa SRF 327/2003 (“os gastos relativos à descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional serão incluídos no valor adua-neiro, independentemente da responsabilidade pelo ônus financeiro e da de-nominação adotada”) é ilegal, porque alarga indevidamente a base de cálculo do imposto de importação – valor aduaneiro – a partir de despesas fora de seu alcance, decorrentes de serviços prestados após a entrada da mercadoria em território nacional.

O entendimento fazendário, em síntese, é o de que, “para efeitos práti-cos”, a chegada da mercadoria ao território se perfaz com o descarregamento em solo nacional, de modo que a inclusão dos custos de capatazia no valor

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aduaneiro possui previsão legal, nos termos do Regulamento Aduaneiro, nor-matização apenas aclarada pela Instrução Normativa SRF nº 327/2003.

Sucede que, diversamente do alegado pela autoridade impetrada e pelo órgão fazendário, tanto o Acordo sobre Valoração Aduaneira do GATT quanto o Regulamento Aduaneiro, conforme os dispositivos supratranscritos, limitam--se a dispor sobre a possibilidade de inclusão no valor aduaneiro de gastos até o porto ou local de importação da mercadoria. Nesta linha, o entendimento de que a redação do art. 77, I, do Regulamento Aduaneiro, ao incluir no valor aduaneiro as despesas “até o porto ou o aeroporto alfandegado de descarga ou ponto de fronteira alfandegado”, compreenderia os gastos de capatazia não supera sequer o exame dos demais termos da norma, “onde devam ser cumpri-das as formalidades de entrada no território aduaneiro”. Ora, não há como se furtar à compreensão de que a norma em questão, até mesmo pela utilização do verbo “dever” no futuro, dispõe sobre gastos efetuados antes das formalidades de entrada no território aduaneiro. Não há que se falar que a zona primária não componha o território aduaneiro, pelo que não há como acolher a argumenta-ção fazendária.

Deste modo, inafastável a conclusão de que os gastos a título de capata-zia não podem ser incluídos no valor aduaneiro da mercadoria, pelo que ilegal o art. 4º, § 3º, da Instrução Normativa SRF nº 327/2003, que assim o faz.

Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a exem-plo do seguinte julgado:

AgRg-REsp 1434650, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 30.06.2015: “TRIBUTÁ-RIO – IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – BASE DE CÁLCULO – VALOR ADUANEI-RO – DESPESAS COM MOVIMENTAÇÃO DE CARGA ATÉ O PÁTIO DE ARMA-ZENAGEM (CAPATAZIA) – INCLUSÃO – IMPOSSIBILIDADE – ART. 4º, § 3º, DA IN SRF 327/2003 – ILEGALIDADE – 1. O STJ já decidiu que ‘a Instrução Norma-tiva nº 327/2003 da SRF, ao permitir, em seu art. 4º, § 3º, que se computem os gastos com descarga da mercadoria no território nacional, no valor aduaneiro, desrespeita os limites impostos pelo Acordo de Valoração Aduaneira e pelo De-creto nº 6.759/2009, tendo em vista que a realização de tais procedimentos de movimentação de mercadorias ocorre apenas após a chegada da embarcação, ou seja, após a sua chegada ao porto alfandegado’ (REsp 1.239.625/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 04.11.2014). 2. Agravo Regimental não provido.”

No mesmo sentido já julgou esta Turma:

AMS 00096091820144036104, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, e-DJF3 31.05.2016: “CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE IMPOR-TAÇÃO – DESPESAS DE ARMAZENAMENTO E SERVIÇOS DE CAPATA-ZIA – IMPOSSIBILIDADE – COMPENSAÇÃO – I – A Instrução Normativa SRF nº 327/2003, extrapolou o contido no art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira e art. 77 do Decreto nº 4.543, de 2002. II – Assim, devem ser excluídos do valor

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �������������������������������������������������������������������������������135

aduaneiro, para fins de cálculo da tributação devida na importação, as despesas relativas à descarga do bem, posteriores ao ingresso das mercadorias no porto. III – Quanto à compensação dos valores indevidamente recolhidos, esta deverá ser realizada nos termos do art. 74, da Lei nº 9.430/1996, com as modificações perpetradas pela Lei nº 10.637/2002, visto que o presente mandamus foi ajuizado em 17.12.2014, observando-se a prescrição quinquenal. IV – Conforme enten-dimento jurisprudencial e, tendo em vista o ajuizamento da ação é necessário o trânsito em julgado da decisão para que se proceda a compensação dos valores recolhidos indevidamente, nos termos do art. 170-A, do Código Tributário Nacio-nal. V – A compensação requerida não poderá ser realizada com contribuições previdenciárias, conforme jurisprudência sedimentada nesta Corte. VI – Quanto à correção monetária, é aplicável a taxa Selic como índice para a repetição do indébito, nos termos da jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça, julgado sob o rito do art. 543-C, do Código de Processo Civil. O termo inicial para a in-cidência da taxa Selic, como índice de correção do indébito tributário, é desde o pagamento indevido, nos termos da jurisprudência da Corte Superior. VII – Ape-lação e remessa oficial não providas.”

Quanto ao requerimento concernente à declaração do direito à compen-sação dos indébitos, as Declarações de Importação, que constam dos DVDs de fl. 39, prestam-se à comprovação dos recolhimentos indevidos, a justificar a procedência do pedido, nos termos da jurisprudência do STJ, firmada sob o regime do art. 543-C da Lei nº 5.869/1973:

REsp 1.111.164, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe de 25.05.2009: “TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – MANDADO DE SEGURANÇA – COMPENSAÇÃO TRIBU-TÁRIA – IMPETRAÇÃO VISANDO EFEITOS JURÍDICOS PRÓPRIOS DA EFETIVA REALIZAÇÃO DA COMPENSAÇÃO – PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA – NECESSI-DADE – 1. No que se refere a mandado de segurança sobre compensação tributá-ria, a extensão do âmbito probatório está intimamente relacionada com os limites da pretensão nele deduzida. Tratando-se de impetração que se limita, com base na Súmula nº 213/STJ, a ver reconhecido o direito de compensar (que tem como pressuposto um ato da autoridade de negar a compensabilidade), mas sem fazer juízo específico sobre os elementos concretos da própria compensação, a prova exigida é a da ‘condição de credora tributária’ (EREsp 116.183/SP, 1ª S., Min. Adhemar Maciel, DJ de 27.04.1998). 2. Todavia, será indispensável prova pré--constituída específica quando, à declaração de compensabilidade, a impetração agrega (a) pedido de juízo sobre os elementos da própria compensação (v.g.: re-conhecimento do indébito tributário que serve de base para a operação de com-pensação , acréscimos de juros e correção monetária sobre ele incidente, ine-xistência de prescrição do direito de compensar), ou (b) pedido de outra medida executiva que tem como pressuposto a efetiva realização da compensação (v.g.: expedição de certidão negativa, suspensão da exigibilidade dos créditos tributá-rios contra os quais se opera a compensação ). Nesse caso, o reconhecimento da liquidez e certeza do direito afirmado depende necessariamente da comprovação dos elementos concretos da operação realizada ou que o impetrante pretende

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realizar. Precedentes da 1ª Seção (EREsp 903.367/SP, Min. Denise Arruda, DJe de 22.09.2008) e das Turmas que a compõem. 3. No caso em exame, foram deduzi-das pretensões que supõem a efetiva realização da compensação (suspensão da exigibilidade dos créditos tributários abrangidos pela compensação , até o limite do crédito da impetrante e expedição de certidões negativas), o que torna impres-cindível, para o reconhecimento da liquidez e certeza do direito afirmado, a pré--constituição da prova dos recolhimentos indevidos. 4. Recurso especial provido.

Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ nº 08/2008.”

Por fim, acerca da correção dos valores, a Corte Superior, por ocasião do julgamento do Ag-REsp 862.572 (Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 16.06.2008), assen-tou o entendimento de que o indébito fiscal posterior a 1º de janeiro de 1996 – caso dos autos – deve ser atualizado pela Selic, inacumulável com qualquer outro índice de correção monetária ou com juros de mora.

Ante ao exposto, dou integral provimento ao apelo do contribuinte, para reformar a sentença, nos termos acima.

É como voto.

Carlos Muta Desembargador Federal

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoEmbargos Infringentes nº 5002639‑57.2015.4.04.7201/SCRelator: Amaury Chaves de AthaydeEmbargante: União – Fazenda NacionalEmbargado: Orientador Alfandegário Comercial Importadora e Exportadora Ltda.Advogado: Oswaldo Gonçalves de Castro Neto

Murilo Cerdeira Pires

ementaEMBARGOS INFRINGENTES – TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – VALOR ADUANEIRO – DESPESAS INCORRIDAS APÓS A CHEGADA AO PORTO – ART. 8º DO ACORDO DE VALORAÇÃO ADUANEIRA – REGULAMENTO ADUANEIRO – ILEGALIDADE DO § 3º DO ART. 4º DA INSTRUÇÃO NORMATIVA SRF Nº 327/2003

1. A interpretação sistemática da legislação permite concluir que a ex-pressão “até o porto” não abarca as despesas com movimentação das mercadorias após a atracação do navio no porto nacional.

2. A liberdade conferida pelo item 2 do art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira a cada Estado-membro para definir o que pode ser incluído ou excluído no valor aduaneiro limita-se aos gastos relativos ao carrega-mento, descarregamento e manuseio associados ao transporte das mer-cadorias importadas até o porto ou local de importação. O art. 77 do Decreto nº 6.759/2009, por sua vez, está em consonância com o Acordo de Valoração Aduaneira, estabelecendo que integram o valor aduaneiro apenas as despesas ocorridas até a chegada da mercadoria no porto de destino ou local de importação.

3. O art. 40, § 1º, inciso I, da Lei nº 12.815/2013 (Lei dos Portos), ao con-ceituar capatazia, trata de procedimentos posteriores à chegada da mer-cadoria no porto, cujos custos não podem ser incluídos na composição do valor aduaneiro para fins de incidência do imposto de importação.

4. O § 3º do art. 4º da Instrução Normativa SRF nº 327/2003, ao ampliar a base de cálculo do imposto de importação, excedeu o limite meramente regulamentar, incorrendo em ilegalidade.

5. Não procede o argumento de que, enquanto não ocorrer o desembara-ço aduaneiro da mercadoria ou a sua nacionalização, os gastos relativos à descarga, ao manuseio e ao transporte no porto de destino são compo-nentes do valor da mercadoria. Com efeito, o item 1 do art. 8º do Acordo

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de Valoração Aduaneira não arrola as despesas com movimentação das mercadorias após a atracação do navio no porto nacional entre os ele-mentos acrescidos ao preço das mercadorias importadas.

aCÓrdãO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, deci-de a Egrégia 1ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimi-dade, negar provimento aos embargos infringentes, nos termos do relatório, vo-tos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 14 de julho de 2016.

Desembargador Federal Amaury Chaves de Athayde Relator

relatÓriO

O Sr. Desembargador Federal Amaury Chaves de Athayde (Relator):

Trata-se de embargos infringentes opostos a acórdão que, por maioria, deu provimento à apelação da parte autora, julgando procedente o pedido para declarar a ilegalidade da inclusão das despesas de capatazia na base de cál-culo do imposto de importação e condenar a União à restituição dos valores indevidamente recolhidos a esse título nos últimos cinco anos. Eis a ementa do julgado:

TRIBUTÁRIO – IMPORTAÇÃO – VALOR ADUANEIRO – DESPESAS OCORRI-DAS APÓS A CHEGADA AO PORTO – CAPATAZIA – IN SRF 327/2007 – ILE-GALIDADE

1. A IN SRF 327/2007, ao determinar a inclusão no valor aduaneiro, de gastos ocorridos após a chegada ao porto de destino, com a capatazia em particular, incidiu em flagrante ilegalidade, tendo em vista que a legislação de regência não contempla tal hipótese.

2. Há margem legal para a exclusão dos gastos com a capatazia, da base de cál-culo do Imposto de Importação, porquanto não estão compreendidos no valor aduaneiro.

A Fazenda Nacional aduz que os gastos após a chegada das mercadorias no porto, em especial com capatazia, integram a base de cálculo do imposto de importação, segundo se depreende do art. 77 do Decreto nº 6.759/2009. Sustenta, nos termos do voto vencido, que o referido dispositivo evidencia que o valor aduaneiro abrange as despesas do deslocamento das mercadorias não apenas até o atracadouro dos portos, mas também até os recintos ou locais alfandegados, onde serão cumpridas as formalidades de entrada no território

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aduaneiro. Pondera que a preposição “até” não tem o sentido de excluir o pon-to de destino, como pretende a autora, devendo ser examinado o contexto do discurso. Defende que, enquanto não ocorrer o desembaraço aduaneiro da mercadoria ou a sua nacionalização, os gastos relativos à descarga, manuseio e transporte no porto de origem e no porto de destino são componentes do va-lor da mercadoria, porquanto, na fase anterior ao desembaraço, a mercadoria ainda não foi nacionalizada e depende da execução desses serviços, que ainda estão compondo o preço ou valor da mercadoria importada.

Assevera que o Decreto nº 6.759/2009 (assim como as normas que o an-tecederam) e a IN SRF 327/2003 conformam-se à legislação de regência.

A embargada apresentou resposta, pugnando pela manutenção do acórdão.

É o relatório. Peço dia.

Desembargador Federal Amaury Chaves de Athayde Relator

vOtO

O Sr. Desembargador Federal Amaury Chaves de Athayde (Relator):

Discute-se a inclusão das despesas incorridas depois da chegada da mer-cadoria estrangeira ao porto brasileiro na base de cálculo do imposto de im-portação, exigida com base no art. 4º da Instrução Normativa nº 327/2003 da Receita Federal.

Vejamos o teor do art. 4º da Instrução Normativa SRF nº 327/2003:

Art. 4º Na determinação do valor aduaneiro, independentemente do método de valoração aduaneira utilizado, serão incluídos os seguintes elementos:

I – o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;

II – os gastos relativos à carga, descarga e manuseio, associados ao transporte das mercadorias importadas, até a chegada aos locais referidos no inciso anterior; e

III – o custo do seguro das mercadorias durante as operações referidas nos incisos I e II.

§ 1º Quando o transporte for gratuito ou executado pelo próprio importador, o custo de que trata o inciso I deve ser incluído no valor aduaneiro, tomando-se por base os custos normalmente incorridos, na modalidade de transporte utilizada, para o mesmo percurso.

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§ 2º No caso de mercadoria objeto de remessa postal internacional, para determi-nação do custo que trata o inciso I, será considerado o valor total da tarifa postal até o local de destino no território aduaneiro.

§ 3º Para os efeitos do inciso II, os gastos relativos à descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional serão incluídos no valor aduaneiro, independentemente da responsabilidade pelo ônus financeiro e da denominação adotada. (sem grifo no original)

Por sua vez, o Decreto-Lei nº 37/1966 e o Regulamento Aduaneiro (De-creto nº 6.759/2009) dispõem:

Decreto-Lei nº 37/1966:

Art. 2º A base de cálculo do imposto é:

I – quando a alíquota for específica, a quantidade de mercadoria, expressa na unidade de medida indicada na tarifa;

II – quando a alíquota for ad valorem, o valor aduaneiro apurado segundo as normas do art. 7º do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988)

Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009):

Art. 77. Integram o valor aduaneiro, independentemente do método de valoração utilizado (Acordo de Valoração Aduaneira, art. 8º, §§ 1º e 2º, aprovado pelo De-creto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994)

I – o custo de transporte da mercadoria importada até o porto ou o aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;

II – os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao trans-porte da mercadoria importada, até a chegada aos locais referidos no inciso I; e

III – o custo do seguro da mercadoria durante as operações referidas nos incisos I e II.

Art. 79. Não integram o valor aduaneiro, segundo o método do valor de transa-ção, desde que estejam destacados do preço efetivamente pago ou a pagar pela mercadoria importada, na respectiva documentação comprobatória (Acordo de Valoração Aduaneira, art. 8º, § 2º, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994):

I – os encargos relativos à construção, à instalação, à montagem, à manutenção ou à assistência técnica, relacionados com a mercadoria importada, executados após a importação; e

II – os custos de transporte e seguro, bem como os gastos associados ao trans-porte, incorridos no território aduaneiro, a partir dos locais referidos no inciso I do art. 77.

O art. 8º do Acordo sobre a implementação do art. VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio 1994 (Acordo de Valoração Aduaneira) atribui a cada

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������141

Membro a competência para incluir ou não tais despesas no valor aduaneiro, nos seguintes termos:

Art. 8º [...]

2. Ao elaborar sua legislação, cada Membro deverá prever a inclusão ou a exclu-são, no valor aduaneiro, no todo ou em parte, dos seguintes elementos:

(a) o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação;

(b) os gastos relativos ao carregamento descarregamento e manuseio associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; e

(c) o custo do seguro.

A interpretação sistemática da legislação permite concluir que a expres-são “até o porto” não abarca as despesas com movimentação das mercadorias após a atracação do navio no porto nacional.

A Instrução Normativa SRF nº 327/2003 extrapolou as disposições do art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira e do art. 77 do Regulamento Adua-neiro. Deveras, ao prever a inclusão dos gastos relativos à descarga no território nacional (§ 3º do art. 4º), a Instrução Normativa acabou por ampliar a base de cálculo do imposto de importação, pois estabelece que os gastos relativos à carga e à descarga das mercadorias, ocorridos após a chegada no porto alfande-gado, sejam considerados na determinação do valor aduaneiro.

A liberdade conferida pelo item 2 do art. 8º do Acordo de Valoração Adua- neira a cada Estado Membro para definir o que pode ser incluído ou excluído no valor aduaneiro limita-se aos gastos relativos ao carregamento, descarrega-mento e manuseio associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação. O art. 77 do Decreto nº 6.759/2009, por sua vez, está em consonância com o Acordo de Valoração Aduaneira, estabelecendo que integram o valor aduaneiro apenas as despesas ocorridas até a chegada da mercadoria no porto de destino ou local de importação.

Cabe salientar que o art. 40, § 1º, inciso I, da Lei nº 12.815/2013 (Lei dos Portos), conceitua capatazia como a atividade de movimentação de mer-cadorias nas instalações dentro do porto, compreendendo o recebimento, con-ferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário. Trata-se, portan-to, de procedimentos posteriores à chegada da mercadoria no porto, cujos cus-tos não podem ser incluídos na composição do valor aduaneiro para fins de in-cidência do imposto de importação. Dessa forma, o § 3º do art. 4º da Instrução Normativa SRF nº 327/2003, ao ampliar a base de cálculo do imposto, excedeu o limite meramente regulamentar, incorrendo, portanto, em ilegalidade.

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Não convence o argumento da Fazenda Nacional de que, enquanto não ocorrer o desembaraço aduaneiro da mercadoria ou a sua nacionalização, os gastos relativos à descarga, ao manuseio e ao transporte no porto de destino são componentes do valor da mercadoria. Com efeito, o item 1 do art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira não arrola as despesas com movimentação das mercadorias após a atracação do navio no porto nacional entre os elementos acrescidos ao preço das mercadorias importadas. Eis o teor do item 1:

1. Na determinação do valor aduaneiro, segundo as disposições do art. 1º, deve-rão ser acrescentados ao preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas:

(a) os seguintes elementos na medida em que sejam suportados pelo comprador mas não estejam incluídos no preço efetivamente pago ou a pagar pelas merca-dorias:

(i) comissões e corretagens, excetuadas as comissões de compra;

(ii) o custo de embalagens e recipientes considerados, para fins aduaneiros, como formando um todo com as mercadorias em questão;

(iii) o custo de embalar, compreendendo os gastos com mão-de-obra e com ma-teriais.

(b) o valor devidamente atribuído dos seguintes bens e serviços, desde que forne-cidos direta ou indiretamente pelo comprador, gratuitamente ou a preços reduzi-dos, para serem utilizados na produção e na venda para exportação das merca-dorias importadas e na medida em que tal valor não tiver sido incluído no preço efetivamente pago ou a pagar:

(i) materiais, componentes, partes e elementos semelhantes incorporados às mer-cadorias importadas;

(ii) ferramentas, matrizes, moldes e elementos semelhantes empregados na pro-dução das mercadorias importadas;

(iii) materiais consumidos na produção das mercadorias importadas;

(iv) projetos da engenharia, pesquisa e desenvolvimento, trabalhos de arte e de design e planos e esboços necessários à produção das mercadorias importadas e realizados fora do país de importação.

(c) royalties e direitos de licença relacionados com as mercadorias objeto de va-loração que o comprador deve pagar, direta ou indiretamente, como condição de venda dessas mercadorias, na medida em que tais royalties e direitos de licença não estejam incluídos no preço efetivamente pago ou a pagar;

(d) o valor de qualquer parcela do resultado de qualquer revenda, cessão ou utilização subsequente das mercadorias importadas que reverta direta ou indire-tamente ao vendedor.

A corroborar o entendimento expendido neste voto, colaciono preceden-tes do STJ e desta Corte:

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TRIBUTÁRIO – RECURSO ESPECIAL – IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – BASE DE CÁLCULO – VALOR ADUANEIRO – DESPESAS DE CAPATAZIA – INCLUSÃO – IMPOSSIBILIDADE – ART. 4º, § 3º, DA IN SRF 327/2003 – ILEGALIDADE

1. Cinge-se a controvérsia em saber se o valor pago pela recorrida ao Porto de Itajaí, referente às despesas incorridas após a chegada do navio, tais como des-carregamento e manuseio da mercadoria (capatazia), deve ou não integrar o conceito de “Valor Aduaneiro”, para fins de composição da base de cálculo do Imposto de Importação.

2. Nos termos do art. 40, § 1º, inciso I, da atual Lei dos Portos (Lei nº 12.815/2013), o trabalho portuário de capatazia é definido como “atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduanei-ra, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário”.

3. O Acordo de Valoração Aduaneiro e o Decreto nº 6.759/2009, ao mencionar os gastos a serem computados no valor aduaneiro, referem-se a despesas com carga, descarga e manuseio das mercadorias importadas até o porto alfandegado. A Instrução Normativa nº 327/2003, por seu turno, refere-se a valores relativos à descarga das mercadorias importadas, já no território nacional.

4. A Instrução Normativa nº 327/2003 da SRF, ao permitir, em seu art. 4º, § 3º, que se computem os gastos com descarga da mercadoria no território nacional, no valor aduaneiro, desrespeita os limites impostos pelo Acordo de Valoração Aduaneira e pelo Decreto nº 6.759/2009, tendo em vista que a realização de tais procedimentos de movimentação de mercadorias ocorre apenas após a chegada da embarcação, ou seja, após a sua chegada ao porto alfandegado.

5. Recurso especial não provido.

(REsp 1239625/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., Julgado em 04.09.2014, DJe 04.11.2014)

TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – BASE DE CÁLCULO – VALOR ADUANEIRO – DESPESAS COM MOVIMENTAÇÃO DE CARGA ATÉ O PÁ-TIO DE ARMAZENAGEM (CAPATAZIA) – INCLUSÃO – IMPOSSIBILIDADE – ART. 4º, § 3º, DA IN SRF 327/2003 – ILEGALIDADE

1. O STJ já decidiu que “a Instrução Normativa nº 327/2003 da SRF, ao permitir, em seu art. 4º, § 3º, que se computem os gastos com descarga da mercadoria no território nacional, no valor aduaneiro, desrespeita os limites impostos pelo Acordo de Valoração Aduaneira e pelo Decreto nº 6.759/2009, tendo em vista que a realização de tais procedimentos de movimentação de mercadorias ocorre apenas após a chegada da embarcação, ou seja, após a sua chegada ao por-to alfandegado” (REsp 1.239.625/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 04.11.2014).

2. Agravo Regimental não provido.

(AgRg-REsp 1434650/CE, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., Julgado em 26.05.2015, DJe 30.06.2015)

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TRIBUTÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – VALOR ADUANEIRO – DES-PESAS POSTERIORES À CHEGADA DO NAVIO AO PORTO – IN RF 327/2007 – ART. 8º DO ACORDO DE VALORAÇÃO ADUANEIRA – ART. 77 DO REGU-LAMENTO ADUANEIRO

1. A expressão “até o porto” contida no Regulamento Aduaneiro não inclui des-pesas ocorridas após a chegada do navio ao porto.

2. O § 3º do art. 4º da IN SRF 327/2003 ampliou a base de cálculo e extrapolou o limite regulamentar, incidindo em ilegalidade, na medida em que o art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira e o art. 77 do Regulamento Aduaneiro autori-zam a inclusão das despesas ocorridas até a chegada da mercadoria importada no porto alfandegado.

3. Considerando que a capatazia é a atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, logo, que se dá após a chegada na mercadoria no porto, não pode ser incluída na composição do valor aduaneiro para fins de incidência do Imposto de Importação.

(TRF 4ª R., Ap-Reex 5085693-73.2014.404.7000, 1ª T., Relª p/ Ac. Maria de Fátima Freitas Labarrère, juntado aos autos em 17.12.2015)

TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO – VALOR ADUANEIRO – DES-PESAS OCORRIDAS APÓS A CHEGADA AO PORTO – CAPATAZIA – IN SRF 327/2007 – ILEGALIDADE

1. A IN SRF 327/2007, ao determinar a inclusão no valor aduaneiro, de gastos ocorridos após a chegada ao porto de destino, com a capatazia em particular, incidiu em flagrante ilegalidade, tendo em vista que a legislação de regência não contempla tal hipótese.

2. Há margem legal para a exclusão dos gastos com a capatazia, da base de cál-culo do Imposto de Importação, porquanto não estão compreendidos no valor aduaneiro.

(TRF 4ª R., Apelação Cível nº 5012297-30.2014.404.7205, 2ª T., Juiz Federal Andrei Pitten Velloso, por unanimidade, juntado aos autos em 24.06.2015)

Em arremate, consigno que o enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamen-tam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronuncia-mento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão-somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de co-minação de multa.

Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento aos embargos in-fringentes.

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Desembargador Federal Amaury Chaves de Athayde Relator

eXtratO de ata da sessãO de 14.07.2016

Embargos Infringentes nº 5002639-57.2015.4.04.7201/SC

Origem: SC 50026395720154047201

Relator: Des. Federal Amaury Chaves de Athayde

Presidente: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

Procurador: Dra. Carmem Elisa Hessel

Embargante: União – Fazenda Nacional

Embargado: Orientador Alfandegário Comercial Importadora e Exportadora Ltda.

Advogado: Oswaldo Gonçalves de Castro Neto Murilo Cerdeira Pires

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14.07.2016, na sequência 26, disponibilizada no DE de 22.06.2016, da qual foi intimado(a) União – Fazenda Nacional, o Ministério Público Federal e as demais Procura-dorias Federais.

Certifico que o(a) 1ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A seção, por unanimidade, decidiu negar provimento aos embargos infringentes.

Relator Acórdão: Des. Federal Amaury Chaves de Athayde

Votante(s): Desª Federal Amaury Chaves de Athayde Juiz Federal Roberto Fernandes Junior Juiz Federal Luiz Carlos Cervi Juíza Federal Cláudia Maria Dadico Juiz Federal Altair Antonio Gregório Desª Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère

Ausente(s): Desª Federal Luciane Amaral Corrêa Münch

Jaqueline Paiva Nunes Goron Diretora de Secretaria

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoProcesso nº 0801665‑62.2014.4.05.8500 – ApelaçãoApelante: Ministério Público Federal (e outro)Advogado: Ana Paula Machado dos AnjosApelado: Petróleo Brasileiro S/A – Petrobras (e outros)Advogado: Ana Paula Machado dos Anjos (e outro)Relator(a): Desembargador(a) Federal Manoel de Oliveira Erhardt – 1ª Turma

ementaAPELAÇÃO – DANO AMBIENTAL – PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DA PETROBRAS, INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL E FALTA DE INTERESSE DE AGIR DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL – REJEIÇÃO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DA PETROBRAS E SULNORTE SERVIÇOS MARÍTIMOS LTDA. – FIXAÇÃO DE QUANTUM INDENIZATÓRIO – UTILIZAÇÃO DE FÓRMULA DA CETESB – ATENDIMENTO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM FAVOR DO MPF – IMPOSSIBILIDADE – RECURSO DO MPF PARCIALMENTE PROVIDO – RECURSO DA PETROBRAS IMPROVIDO

1. Trata-se de apelação contra sentença que decretou a indenização no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), a ser paga solidariamente pelas rés, em decorrência de danos ambientais causados pelo derramamento de aproximadamente 150 litros de resíduos de água suja e mistura oleosa no mar, durante abastecimento de água potável na área das Plataformas, por força de contrato firmado entre as rés.

2. Primeiramente, não merece prosperar a preliminar de ilegitimidade passiva da Petrobrás, visto que a atividade de abastecimento da platafor-ma, da qual resultou o dano ao meio ambiente, decorria da existência de contrato de prestação de serviços firmado entre a tratada socieda-de empresária e a Sulnorte Serviços Marítimos Ltda. A responsabilidade é objetiva (ou pelo risco integral) e solidária, conforme disposto na Lei nº 6.938, de 31.08.1981, em seu art. 3º, não possibilitando à recorrente ser eximida de sua responsabilidade por ter terceirizado suas atividades ou mesmo por alegar ter tomado medidas cabíveis a fim de mitigar o incidente.

3. Quanto à inépcia da inicial, alega a recorrente a inexistência de causa de pedir e de correlação lógica entre esta e os pedidos deferidos. Afirma que não há descrição do dano material a se reparar. Também resta in-fundada. Isso porque nem sempre o dano ambiental será passível de de-

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monstração, o qual é presumido no presente caso, haja vista o derrama-mento de aproximadamente 150 litros de resíduos de água suja e mistura oleosa no mar. Ademais, não há qualquer falta de correlação lógica entre os fatos e pedidos na petição inicial, a qual é clara ao narrar o ocorrido e indicar as condutas e existência do dano que almeja ver indenizados.

4. Por fim, em relação à falta do interesse de agir do Ministério Público, também não merece prosperar. Sabe-se que o exame do interesse de agir passa pela verificação das circunstâncias de utilidade e necessidade de pronunciamento judicial, as quais se encontram presentes, haja vista o objetivo de ver indenizados os danos provocados ao meio ambiente pelas Rés.

5. Segundo o Parquet, “conforme apurado no Inquérito Civil Público nº 1.35.000.001028/2012-35, conduzido pelo MPF, o incidente afetou área considerada de extrema importância biológica, onde há a predo-minância de ambientes de grande sensibilidade ambiental, produzindo efeitos perniciosos no ecossistema marinho. Saliente-se que o Laudo Téc-nico Ambiental da Marinha (fls. 80/82 e 192/193) indicou que, no dia do incidente, o rebocador e empurrador SN Palmares estava localizado nas proximidades da Bacia Sergipe e a cerca de 10km da costa e da desem-bocadura do Rio Sergipe (Lat. 10º58’59,25’’S e Long. 36º55’58,55’’W). E, também nos termos do aludido documento técnico, a região costeira mais ao sul do Estado de Sergipe, que apresenta um complexo estuarino importante, onde fica a foz do rio Vaza-Barris e o Rio Sergipe, possui elevado índice de sensibilidade ambiental litorânea ao óleo (ISL)”.

6. Com relação ao meio ambiente, assim dispõe o art. 225, da vigente Constituição Federal: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as pre-sentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”

7. A Lei nº 6.938/1981, no art. 14, § 1º, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, preceitua: Art. 14. Sem prejuízo das pe-nalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos

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inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambien-tal sujeitará os transgressores: § 1º Sem obstar a aplicação das penalida-des previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsa-bilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

8. Pelos dispositivos acima transcritos conclui-se que tanto a Constitui-ção Federal quanto a legislação infraconstitucional preocuparam-se em estabelecer mecanismos de proteção ao meio ambiente.

9. No caso vertente, o Inquérito Civil instaurado pelo MPF demonstrou, com base em processos administrativos investigatórios da Capitania dos Portos e da Petrobras, a existência de ação danosa causada por embarca-ção rebocadora que, no mister de manobra operacional a mando da pró-pria Petrobrás, para fins de abastecimento de água na plataforma PCM-6, em 29.08.2010, possibilitou que os resíduos de substância oleosa se es-palhassem pelo mar num volume aproximado de 150 litros.

10. Na seara ambiental, como se deflui dos dispositivos de lei acima transcritos, a responsabilidade civil por danos ambientais é objetiva, bas-tando para a responsabilização do agente a comprovação do dano e o nexo de causalidade, independentemente da existência de culpa.

11. É evidente, portanto, que a conduta dos réus pôs em risco o meio ambiente, não devendo se perquirir acerca da sua boa ou má-fé.

12. Além do que, por serem sociedades empresárias cujas atividades envolvem sérios riscos, deveriam, pela natureza de suas atividades, ter procedido com cautela a fim de que fosse evitado o derramamento em testilha.

13. Ambas as recorrentes se insurgem contra o valor fixado, por não ter o Juízo a quo utilizado critérios objetivos para tal.

14. De fato, a discussão sobre a compensação de dano ambiental, sobre o critério para fixação do que constitui dano ambiental e como este deve ser reparado é matéria de difícil resposta, mesmo porque a adoção de um valor arbitrado tem a desvantagem de estabelecer um macabro sistema pelo qual aqueles que possuem recursos financeiros poderão pagar uma soma para compensar a área ou espécie prejudicada. (ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 253).

15. Dito isto, deve-se atentar para a lógica da reparação do dano ao meio ambiente, considerada como macrobem, incorpóreo e imaterial, visto

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como um conjunto de fatores que interagem e condicionam a vida das pessoas, cuja reparabilidade é indireta no dizer da doutrina especializa-da, in verbis: “Dano ambiental de reparabilidade indireta, quando diz respeito a interesses difusos, coletivos e eventualmente individuais de dimensão coletiva, concernentes à proteção do macrobem ambiental e relativos à proteção do meio ambiente como bem difuso, sendo que a reparabilidade é feita, indireta e preferencialmente, ao em ambiental de interesse coletivo e não objetivando ressarcir interesses próprios e pesso-ais. Observe-se que, nesta concepção, o meio ambiente é reparado indi-retamente no que concerne à sua capacidade funcional ecológica e à ca-pacidade de aproveitamento humano e não, por exemplo, considerando a deterioração de interesses dos proprietários do bem ambiental.” (LEITE, José Rubens Morato, in Dano Ambiental: do individual ao coletivo ex-trapatrimonial. 2. ed. rev., atual. e ampl. Revista dos Tribunais, p. 96/97)

16. Nesta linha de raciocínio, quando a sentença determina o pagamento de uma indenização pecuniária pelos danos já causados, ou seja, pelos danos ambientais já sentidos, considera dois pressupostos: 1) que os au-tores cessarão com a ação predatória; e 2) o dano ambiental, pelo seu próprio conceito, por não ter reparação imediata, deve ser considerado pelo impacto ambiental causado.

17. Feitas estas considerações, tem-se que dois fatores relevantes devem ser considerados no momento de valorar a gravidade do dano para fins de se calcular o valor da indenização devida: possibilidade de recupera-ção do meio ambiente degradado e a efetiva recuperação.

18. Tais fatores são adotados como pressupostos para restaurar a pro-porcionalidade da condenação e, assim, viabilizar o cumprimento da obrigação pecuniária em favor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.

19. Propõe o MPF a utilização do método de “Proposta de Critério para Valoração Monetária de Danos Causados por Derrames de Petróleo ou de seus Derivados no Ambiente Marinho” da Cetesb, de autoria da Biólo-ga Íris Regina Fernandes Poffo, em sua dissertação de mestrado oferecida à USP.

20. Apesar de várias propostas metodológicas tencionadas a buscar solu-ção para quantificação do dano ambiental, o fato é que não existe méto-do preciso, perfeito ou exclusivo para fixar tais valores, cabendo ao juízo no caso concreto, sempre buscando parâmetros objetivos e contando com o bom senso do julgador.

21. Destarte, não prosperam os argumentos dos autores no sentido de que a referida metodologia restaria inaplicável ao caso, porquanto, dife-rentemente do que se afirma, tal proposta não está atrelada aos interesses

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do Ministério Público quando da propositura da ação civil pública, mas se trata de um estudo genérico direcionado à quantificação do dano am-biental de várias espécies.

22. Como proposta, o estudo apresenta soluções objetivas, partindo de uma diretriz genérica, mas que tenta abranger o maior número de situa-ções possíveis, o que não dispensa adaptações em cada caso concreto.

23. Neste ponto vale frisar o seguinte: a utilização do valor de recupera-ção serve apenas para se ter um parâmetro para quantificar o dano e não significa que se está desconsiderando a recuperação ambiental e nem o fato que o autor colaborou para o êxito da recomposição do ecossistema.

24. Nesta tentativa de servir às mais diversas situações, o método da Dra. Íris Regina Fernandes Poffo, além de estimar o valor do dano, em nú-meros absolutos, propõe-se a majorá-lo, conforme a nocividade da ação predatória, mediante multiplicação por um fator numérico (fator de mul-tiplicação), este obtido a partir da qualificação dos agravos perpetrados.

25. Referido método leva em consideração cinco aspectos, quais sejam: i) o volume derramado; ii) o grau de vulnerabilidade da área atingida; iii) a toxidade do produto; iv) a persistência do produto no meio ambiente e v) a mortandade de organismos. A cada aspecto atribui-se um peso que pode variar de 0 a 0,5, de acordo com a gravidade. A equação é repre-sentada da seguinte forma: Valor (US$) = k [ 10(4.5+x) ].

26. Da equação exposta, tem-se x como a soma de todos os pesos dados aos critérios supramencionados, e k como a indicação do número de reincidências (aplicado em progressão geométrica, partindo de 2, 4, 8, e assim por diante).

27. Assim, dada a ausência de um critério objetivo para se aferir o quantum indenizatório de determinado dano ambiental e tendo como norte o Princípio da Reparação Integral, que tem como objetivo propiciar a recomposição do meio ambiente, na medida do possível, ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do dano, parece-nos razoável a adoção do critério proposto com vistas a incutir no poluidor o caráter punitivo-pedagógico que deve possuir a reparação.

28. Múltiplos precedentes do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

29. Não obstante o método da Cetesb se apresente em dólares, o quan-tum deve ser explicitado em moeda corrente nacional, ou seja, a ser convertido em reais segundo a cotação oficial de fechamento Divulgada pelo Banco Central do Brasil para a data do evento danoso, como dispõe a legislação pátria (art. 1º da Lei nº 10.192/2001, art. 315 do Código Civil

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e arts. 1º e 2º do Decreto-Lei nº 857/1969), sendo, ao final, revertido ao Fundo para a Reconstituição de Bens Lesados (Lei nº 7.347/1985), e in-tegralmente aplicado em medidas para o controle e restabelecimento do ecossistema aquático na área do estuário e adjacências.

30. No que se refere à fixação de honorários de sucumbência em favor do Ministério Público, não assiste razão ao apelante, visto que “confor-me o entendimento jurisprudencial do STJ, não é cabível a condena-ção da parte vencida ao pagamento de honorários advocatícios em favor do Ministério Público nos autos de Ação Civil Pública” (Nesse sentido: REsp 1.099.573/RJ, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJe 19.05.2010; REsp 1.038.024/SP, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 24.09.2009; EREsp 895.530/PR, 1ª S., Relª Min. Eliana Calmon, DJe 18.12.2009).

31. Apelação do MPF parcialmente provida. Apelação da Petrobrás im-provida.

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima mencionadas, Acordam os Desembargadores Federais da Primeira Turma do TRF da 5ª Região, por unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo do MPF e negar provimento ao apelo da Petrobras, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte do presente julgado.

Assinado eletronicamente por Manoel de Oliveira Erhardt Magistrado

relatÓriO

1. Cuida-se de apelações cíveis interpostas pela Petróleo Brasileiro S/A – Petrobras e pelo MPF, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Federal da SJ/SE que, nos autos da ação civil pública de origem, julgou procedentes os pedidos autorais para condenar as rés a pagarem indenização pelo dano am-biental causado, no importe de R$ 30.000,00, de forma solidária.

2. O MPF pleiteia: a) majoração do montante de indenização fixado, com base na fórmula Cetesb apresentada na inicial, haja vista o valor ter sido irrisório e não ter atendido a um critério objetivo para sua estipulação, além do fato de os danos ambientais em questão serem irreversíveis; b) condenação dos réus em honorários advocatícios, fundamentando que o art. 128, § 5º, inciso II, a, veda, efetivamente, a destinação de verba honorária aos membros do Ministério Público, mas não à Instituição ou ao ente federativo ao qual esta integra.

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3. Por sua vez, a Petrobras pugna: a) preliminarmente, a ilegitimidade passiva da Petrobras, a inépcia da inicial pela ausência de correlação lógica entre os fatos e o pedido e a falta do interesse de agir; b) no mérito, sustenta a inexistência de danos a reparar, a ausência de nexo causal entre o suposto dano e ação ou omissão praticadas pela Petrobras vinculadas ao evento descrito na exordial, bem como que não há comprovação nos autos dos danos causados nem a demonstração da extensão dos danos suscitados ou a participação da Petrobras no evento descrito na exordial. Ainda, aduz que a condenação à in-denização deve se dar de forma subsidiária, que ela foi estipulada sem base em critérios objetivos e que não há solidariedade; c) subsidiariamente, pugna pela redução do valor indenizatório, afastando a solidariedade e delimitando a res-ponsabilidade civil conforme a participação de cada litisconsorte no incidente.

4. Apresentadas contrarrazões pelo MPF, pela Petrobras e pela Sulnorte Serviços Marítimos Ltda. Aduzem, em breves linhas:

Ministério Público Federal: a) legitimidade passiva da Petrobrás, vez que não é possível se isentar de responsabilidade mediante terceirização das suas ativida-des; b) ausência de inépcia da inicial, com base no art. 286, II, CPC, que permite a formulação de pedido genérico no caso dos autos, em que não há possibilidade de mensuração dos danos advindos do derramamento de óleo no mar; c) o inte-resse de agir, pois que a necessidade e adequação se fazem evidentes na presente ação civil pública; d) que os documentos adunados aos autos comprovam à sa-ciedade tanto o dano ocorrido quanto o nexo de causalidade entre a conduta do grupo empresarial formado pela Petrobrás e sua preposta Sulnorte e a poluição em águas marinhas no litoral sergipano; d) em se tratando de dano ambiental, a responsabilidade é objetiva, não se cogitando da ocorrência de culpa ou dolo.

Petrobrás: a) a inaplicabilidade da fórmula da Cetesb, a qual possui caráter ex-clusivamente punitivo e é completamente arbitrária e desprovida de metodologia técnico-científica, devendo a fixação do quantum indenizatório ser norteada pela razoabilidade e proporcionalidade; b) impossibilidade de majoração do valor da condenação, posto que este montante, pela ausência de comprovação do dano, já se mostra em descompasso com o regramento vigente; c) impossibilidade de condenação em honorários sucumbenciais, haja vista que nas ações promovidas pelo Ministério Público descabe a condenação em honorários advocatícios, pois esses se destinam exclusivamente aos advogados, inexistindo previsão legal para que os membros do Parquet os recebam em qualquer ação.

Sulnorte Serviços Marítimos Ltda.: a) inaplicabilidade da fórmula Cetesb, pois que – (i) É de outro estado, uma vez que o suposto dano do presente caso ocorreu em Sergipe e a Cetesb é do MPE de São Paulo, (ii) foi desenvolvida para condenar danos de vazamento de óleo – e o caso em tela é de derramamento de água com substância oleosa, o que não se confundem, (iii) de rara aplicação pelo próprio MPE por ser ultrapassada, e (iv) é arbitrária, punitiva e não retrata a realidade; b) impossibilidade de condenação em honorários de sucumbência, pois confor-

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me o critério da simetria, uma vez que o MP não paga os honorários da parte vencedora, ele também não deve recebê-los.

5. Parecer do MPF pelo improvimento do apelo da Petrobrás e provimen-to do apelo do MPF

6. É o relatório.

vOtO

1. Primeiramente, não merece prosperar a preliminar de ilegitimidade passiva da Petrobras, visto que a atividade de abastecimento da plataforma, da qual resultou o dano ao meio ambiente, decorria da existência de contrato de prestação de serviços firmado entre a tratada sociedade empresária e a Sulnorte Serviços Marítimos Ltda. A responsabilidade é objetiva (ou pelo risco integral) e solidária, conforme disposto na Lei nº 6.938, de 31.08.1981, em seu art. 3º, não possibilitando à recorrente ser eximida de sua responsabilidade por ter ter-ceirizado suas atividades ou mesmo por alegar ter tomado medidas cabíveis a fim de mitigar o incidente.

2. Quanto à inépcia da inicial, alega a recorrente a inexistência de causa de pedir e de correlação lógica entre esta e os pedidos deferidos. Afirma que não há descrição do dano material a se reparar. Também resta infundada. Isso porque nem sempre o dano ambiental será passível de demonstração, o qual é presumido no presente caso, haja vista o derramamento de aproximadamente 150 litros de resíduos de água suja e mistura oleosa no mar. Ademais, não há qualquer falta de correlação lógica entre os fatos e pedidos na petição inicial, a qual é clara ao narrar o ocorrido e indicar as condutas e existência do dano que almeja ver indenizados.

3. Por fim, em relação à falta do interesse de agir do Ministério Público, também não merece prosperar. Sabe-se que o exame do interesse de agir passa pela verificação das circunstâncias de utilidade e necessidade de pronuncia-mento judicial, as quais se encontram presentes, haja vista o objetivo de ver indenizados os danos provocados ao meio ambiente pelas Rés.

4. Passemos ao mérito.

5. Trata-se de apelação contra sentença que decretou a indenização no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), a ser paga solidariamente pelas rés, em decorrência de danos ambientais causados pelo derramamento de aproxima-damente 150 litros de resíduos de água suja e mistura oleosa no mar, durante abastecimento de água potável na área das Plataformas, por força de contrato firmado entre as rés.

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6. Segundo o Parquet, “conforme apurado no Inquérito Civil Público nº 1.35.000.001028/2012-35, conduzido pelo MPF, o incidente afetou área considerada de extrema importância biológica, onde há a predominância de ambientes de grande sensibilidade ambiental, produzindo efeitos perniciosos no ecossistema marinho. Saliente-se que o Laudo Técnico Ambiental da Mari-nha (fls. 80/82 e 192/193) indicou que, no dia do incidente, o rebocador e em-purrador SN Palmares estava localizado nas proximidades da Bacia Sergipe e a cerca de 10km da costa e da desembocadura do Rio Sergipe (Lat. 10º58’59,25’’S e Long. 36º55’58,55’’W).

E, também nos termos do aludido documento técnico, a região costeira mais ao sul do Estado de Sergipe, que apresenta um complexo estuarino impor-tante, onde fica a foz do rio Vaza-Barris e o Rio Sergipe, possui elevado índice de sensibilidade ambiental litorânea ao óleo (ISL)”.

7. Com relação ao meio ambiente, assim dispõe o art. 225, da vigente Constituição Federal:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as pre-sentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que co-loquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, in-dependentemente da obrigação de reparar os danos causados.

8. A Lei nº 6.938/1981, no art. 14, § 1º, que dispõe sobre a Política Na-cional do Meio Ambiente, preceitua:

Art. 14. Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, esta dual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou cor-reção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade am-biental sujeitará os transgressores:

§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

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9. Pelos dispositivos acima transcritos conclui-se que tanto a Constitui-ção Federal quanto a legislação infraconstitucional preocuparam-se em estabe-lecer mecanismos de proteção ao meio ambiente.

10. No caso vertente, o Inquérito Civil instaurado pelo MPF demonstrou, com base em processos administrativos investigatórios da Capitania dos Portos e da Petrobras, a existência de ação danosa causada por embarcação rebocado-ra que, no mister de manobra operacional a mando da própria Petrobras, para fins de abastecimento de água na plataforma PCM-6, em 29.08.2010, possibili-tou que os resíduos de substância oleosa se espalhassem pelo mar num volume aproximado de 150 litros.

11. Compulsando os autos, entendo por escorreitas as razões de decidir delineadas pelo julgador monocrático, in verbis:

Dito isso, vale frisar que inexiste controvérsia em relação aos fatos ensejadores da presente demanda. Nada obstante a empresa Sulnorte se oponha à efetiva existência do dano e a sua extensão, houve uma descarga líquida da embarcação rebocadora SN Palmares nas imediações da plataforma PCM-6.

De forma incontroversa, os documentos referem-se aos fatos, constatados por meio de um sobrevoo da Petrobras em monitoramento da região das praias e plataformas, sob o seguinte enfoque:

Ficou constatado, pelo laudo pericial indireto (id 149482), como causa determi-nante do fato:

Após a análise dos fatores contribuintes e a reconstituição do ocorrido, conclui-se portanto, que durante o fornecimento de água potável do Rebocador Palmares para a plataforma PCM-6, a válvula do sistema de esgoto em emergência da praça de máquinas, conhecida como a válvula de descarga da Dala, foi aberta equivocadamente pelo Sr. Gerson Adelino dos Santos, condutor de máquinas do rebocador Palmares. Desta forma, foi lançado ao mar, pelo Rebocador Palmares, resíduos compostos de água suja e mistura oleosa que se estendeu em volta da embarcação (sic).

Os fatos ainda foram confirmados no Laudo Técnico Ambiental nº 001/2011 (id 149482, p. 11 e ss.), que também noticiou a diligência da Petrobrás ao acionar o Plano de Emergência para a dispersão mecânica do produto derramado e susta-ção da atividade de abastecimento, e pontuou que a área degradada trata-se de um espaço ecológico de desova e reprodução de animais marinhos, marcado por elevado índice de sensibilidade a óleo, e com grande influência ambiental nos mangues, nas zonas costeiras e nos estuários dos rios próximos, além de influir na economia, com atividades de pesca e turismo.

O mesmo Laudo Técnico Ambiental (id 149482), de acordo com o comunicado preliminar do acidente e os esclarecimentos prestados pela empresa Sulnorte, constatou que a causa do derramamento foi uma válvula de descarga do porão da

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casa de máquinas semiaberta, permitindo a descarga de água contaminada para o mar juntamente com a água de resfriamento do bow thruster.

A Petrobras também diligenciou, no mesmo mês, a constituição de uma comissão para a apuração dos fatos (id 149483). Os depoimentos confirmam a ocorrên-cia do incidente, inclusive pela própria tripulação da embarcação, Luciavaldo Oliveira Santos (id 149518, p. 09), que, tão logo observou o derramamento, chamou o chefe de máquinas, tendo este ordenado parar imediatamente o bow thruster. O depoente contou que verificou que a válvula da Dala (caverna da embarcação) estava aberta, o que gerou o descarte do líquido para o mar, e que esse líquido pode conter resíduo oleoso. Esclareceu que, por duas vezes, o descarte desse líquido já havia sido feito por volta de 12 milhas da costa e que o procedimento de fornecimento de água potável não tem nenhuma relação com o descarte do líquido da Dala.

Em seguida, o Chefe de Máquinas, também tripulante, Willington Sobral da Silva, esclareceu que acompanhava o fornecimento de água para a plataforma, quando foi avisado por Lucivaldo que estava saindo água pelo bow thruster e se dirigiu à praça de máquinas para desligar o equipamento. Afirmou ter visto o líquido sujo ao redor da embarcação e, durante o trajeto para o Porto, viu uma válvula indevi-damente aberta que ligava a Dala ao bow thruster e esclareceu que o líquido da Dala é resultante da limpeza da praça de máquinas, sendo que o descarte desse líquido normalmente era executado para o mar a uma distância de 12 milhas da costa (id 149518, p. 10).

Na mesma direção, o Comandante da Embarcação, Francisco Ernande Queiroz Dantas, afirmou que, no dia, foi comunicado pelo imediato Luiz Carlos, que havia manchas escuras próximas à embarcação, durante a operação de abaste-cimento da plataforma, e percebeu que o bow thruster estava desligado. No ato do depoimento, quando lhe foram apresentadas as fotos do dia do ocorrido, ele afirmou não ter dúvidas de que houve o derramamento de água suja da embarca-ção para o mar (id 149518, p. 11)

E o Marinheiro de Convés da Embarcação, Luiz Carlos de Oliveira Santos, que estava embarcado trabalhando no convés, disse que, no momento em que co-meçava a fornecer água para a PCM-6, foi alertado pelo operador da plataforma sobre um derrame de um líquido escuro no lado bombordo da embarcação, dela oriundo, e que avisou imediatamente ao Sr. Lucivaldo sobre o derramamento e retornou à sua atividade (id 149518, p. 12).

Também os depoimentos colhidos na seara da Capitania dos Portos, em março/abril/2011, são confirmadores do fato, ratificando que a sua causa determinante foi uma manobra incorreta da embarcação, a qual resultou no derramamento de óleo porque a válvula da descarga da Dala encontrava-se indevidamente aber-ta, o que ocorreu por falta de inspeção das instalações da embarcação, e que dita válvula deveria ser definitivamente isolada por não ser utilizada a bordo (id 149528, p. 09, 149531, p. 06, 149534, p. 05 e 149537, p. 02).

Somando-se aos relatos, a Petrobras também inspecionou a embarcação e cons-tatou que havia alguns defeitos operacionais quanto ao esvaziamento da Dala e a

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������157

existência de vazamento de água (id 149522, p. 05/06), nada obstante portar re-gularidade documental, apresentar-se em bom estado de conservação, conforme atestaram os peritos da Capitania do Portos, além de ter passado por periódicas vistorias (id 149482, p. 03 e 149528, p. 02).

12. Na seara ambiental, como se deflui dos dispositivos de lei acima transcritos, a responsabilidade civil por danos ambientais é objetiva, bastando para a responsabilização do agente a comprovação do dano e o nexo de causa-lidade, independentemente da existência de culpa.

13. Neste sentido veja-se a seguinte decisão do eg. STJ:

PROCESSUAL CIVIL – ADMINISTRATIVO – DANOS AMBIENTAIS – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – RESPONSABILIDADE DO ADQUIRENTE – TERRAS RURAIS – RECOMPOSIÇÃO – MATAS – TEMPUS REGIT ACTUM – AVERBAÇÃO PER-CENTUAL DE 20% – SÚMULA Nº 07 STJ – 1. A responsabilidade pelo dano ambiental é objetiva, ante a ratio essendi da Lei nº 6.938/1981, que em seu art. 14, § 1º, determina que o poluidor seja obrigado a indenizar ou reparar os danos ao meio-ambiente e, quanto ao terceiro, preceitua que a obrigação per-siste, mesmo sem culpa. Precedentes do STJ: REsp 826976/PR, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 01.09.2006; AgRg-REsp 504626/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 17.05.2004; REsp 263383/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 22.08.2005 e EDcl-AgRg-REsp 255170/SP, desta relatoria, DJ de 22.04.2003. 2. A obrigação de reparação dos danos ambientais é propter rem, por isso que a Lei nº 8.171/1991 vigora para todos os proprietários rurais, ainda que não sejam eles os responsáveis por eventuais desmatamentos anteriores, máxime porque a referida norma referendou o próprio Código Florestal (Lei nº 4.771/1965) que es-tabelecia uma limitação administrativa às propriedades rurais, obrigando os seus proprietários a instituírem áreas de reservas legais, de no mínimo 20% de cada propriedade, em prol do interesse coletivo. Precedente do STJ: REsp 343.741/PR, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 07.10.2002. 3. Consoante bem pontuado pelo Ministro Herman Benjamin, no REsp 650728/SC, 2ª T., unânime: “[...] 11. É in-compatível com o Direito brasileiro a chamada desafetação ou desclassificação jurídica tácita em razão do fato consumado. 12. As obrigações ambientais deri-vadas do depósito ilegal de lixo ou resíduos no solo são de natureza propter rem, o que significa dizer que aderem ao título e se transferem ao futuro proprietário, prescindindo-se de debate sobre a boa ou má-fé do adquirente, pois não se está no âmbito da responsabilidade subjetiva, baseada em culpa. 13. Para o fim de apuração do nexo de causalidade no dano ambiental, equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam, e quem se beneficia quando outros fazem. 14. Constatado o nexo causal entre a ação e a omissão das recorrentes com o dano ambiental em questão, surge, objetivamente, o dever de promover a recuperação da área afetada e indenizar eventuais danos remanescentes, na for-ma do art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1981. [...]”. DJ 02.12.2009. 4. Paulo Affonso Leme Machado, em sua obra Direito Ambiental Brasileiro, ressalta que “[...] A responsabilidade objetiva ambiental significa que quem danificar o ambiente tem

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o dever jurídico de repará-lo. Presente, pois, o binômio dano/reparação. Não se pergunta a razão da degradação para que haja o dever de indenizar e/ou reparar. A responsabilidade sem culpa tem incidência na indenização ou na reparação dos danos causados ao meio ambiente e aos terceiros afetados por sua atividade” (art. 14, § III, da Lei nº 6.938/1981). Não interessa que tipo de obra ou atividade seja exercida pelo que degrada, pois não há necessidade de que ela apresente risco ou seja perigosa. Procura-se quem foi atingido e, se for o meio ambiente e o homem, inicia-se o processo lógico-jurídico da imputação civil objetiva am-bienta!. Só depois é que se entrará na fase do estabelecimento do nexo de causa-lidade entre a ação ou omissão e o dano. É contra o Direito enriquecer-se ou ter lucro à custa da degradação do meio ambiente. O art. 927, parágrafo único, do CC de 2002, dispõe: “Haverá obrigarão de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direi-tos de outrem”. Quanto à primeira parte, em matéria ambiental, já temos a Lei nº 6.938/1981, que instituiu a responsabilidade sem culpa. Quanto à segunda parte, quando nos defrontarmos com atividades de risco, cujo regime de res-ponsabilidade não tenha sido especificado em lei, o juiz analisará, caso a caso, ou o Poder Público fará a classificação dessas atividades. “É a responsabilidade pelo risco da atividade.” Na conceituação do risco aplicam-se os princípios da precaução, da prevenção e da reparação. Repara-se por força do Direito Positivo e, também, por um princípio de Direito Natural, pois não é justo prejudicar nem os outros e nem a si mesmo. Facilita-se a obtenção da prova da responsabilidade, sem se exigir a intenção, a imprudência e a negligência para serem protegidos bens de alto interesse de todos e cuja lesão ou destruição terá consequências não só para a geração presente, como para a geração futura. Nenhum dos poderes da República, ninguém, está autorizado, moral e constitucionalmente, a concordar ou a praticar uma transação que acarrete a perda de chance de vida e de saúde das gerações [...]” in Direito Ambiental Brasileiro, Malheiros Editores, 12. ed., 2004, p. 326-327. 5. A Constituição Federal consagra em seu art. 186 que a fun-ção social da propriedade rural é cumprida quando atende, seguindo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, a requisitos certos, entre os quais o de “utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente” 6. A adoção do princípio tempus regit actum, impõe obediência à lei em vigor quando da ocorrência do fato. 7. In casu, os fatos apurados como infra-ção ambiental ocorreram no ano de 1997, momento em que já se encontrava em vigor o Código Florestal Lei nº 4.771/1965, não havendo que se perquirir quanto à aplicação do Decreto nº 23.793/1994, que inclusive foi revogado por aquela lei. 8. O Recurso Especial não é servil ao exame de questões que demandam o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, em face do óbice contido na Súmula nº 07/STJ. 9. In casu, a verificação da comprovação de que a proprie-dade não atinge o mínimo de 20% de área coberta por reserva legal, bem como a exploração de florestas por parte do proprietário, implicaria o revolvimento de matéria fática-probatória, o que é interditado a esta Corte Superior. 10. Deveras, o Tribunal a quo à luz de ampla cognição acerca de aspectos fático-probatórios concluiu que: A escusa dos requeridos de que não se pode impor a obrigação de

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reparar dano ambiental a particular que adquiriu a terra já desmatada ou que a averbação não pode ultrapassar o remanescente de mata nativa existente na área não convence; como bem exposto pelo Procurador de Justiça a fls. 313/314: “não se pretende que a averbação seja feita anteriormente à entrada em vigor da Lei nº 7.803/1989 que alterou disposições da Lei nº 4.771/1965. Ocorre que, a par-tir da vigência daquela primeira lei em nosso ordenamento jurídico, os antigos proprietários (Sr. Renato Junqueira de Andrade e Sra. Yolanda Junqueira de An-drade – fl. 77) tinham desde então a obrigação de ter averbado a reserva legal, sendo que a Ré, ao comprar uma propriedade sem observar os preceitos da lei, assumiu a obrigação dos proprietários anteriores ficando ressalvada, todavia, eventual ação regressiva (fl. 335). 11. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela viola-ção do art. 535, II, do CPC, tanto mais que, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. 12. Recurso parcial-mente conhecido e, nesta parte, desprovido” (REsp 1090968, Rel. Luiz Fux, 1ª T., DJe 03.08.2010).

14. É evidente, portanto, que a conduta dos réus pôs em risco o meio ambiente, não devendo se perquirir acerca da sua culpa.

15. Esta Corte de Justiça, analisando questão semelhante a esta, já se ma-nifestou no sentido aqui esboçado, conforme se vê neste acórdão:

CONSTITUCIONAL – PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – RESPON-SABILIZAÇÃO CIVIL – INDENIZAÇÃO – COMPENSAÇÃO POR DANOS AM-BIENTAIS – PESCA DE LAGOSTAS DURANTE PERÍODO DE DEFESO – INTE-RESSE DE AGIR – JUSTA CAUSA – EXISTÊNCIA – ARTS. 127 E 225, CAPUT, § 1º, VII E § 3º DA CF/1988 – ART. 14, § 1º DA LEI Nº 6.938/1981 – ART. 34, DA LEI Nº 9.605/1998

I – Seguindo os ditames constitucionais, ao Ministério Público incumbe a defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis, dentre eles, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Incumbindo ao Poder Público proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade, onde as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

II – “Na análise da legitimação para agir do Ministério Público no campo da Ação Civil Pública, descabe a utilização de critério estritamente aritmético. Nem sempre o Parquet atua apenas em razão do número de sujeitos vulnerados pela conduta do agente, mas, ao contrário, intervém por conta da natureza do bem

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jurídico tutelado e ameaçado” (STJ, AGA 928652, DJe 13.11.2009, Rel. Min. Herman Benjamin).

III – A tutela ambiental possui cunho preventivo, de maneira que a dimensão da quantidade apreendida (no caso dos autos, dezesseis quilos de lagosta) não revela a ausência de justa causa para a pretensão de reparação do dano alegado, posto que o bem jurídico protegido é a higidez do meio ambiente.

IV – Qualquer atividade é lesiva quando põe em risco a preservação do meio ambiente, não devendo ser desconsideradas ações degradatórias, mesmo que de pequena repercussão, na medida em que devem ser pensadas e consideradas conjuntamente e concomitantemente, em face do efeito nocivo cumulativo das condutas praticadas por agentes diversos consideradas em seu conjunto. Em sede de matéria ambiental, não há lugar para intervenções tardias, sob pena se permi-tir que a degradação ao bem tutelado tome proporções devastadoras e incontro-láveis e, consequentemente, o dano se revista de irreversibilidade.

V – Apelação provida, para reconhecer o interesse de agir do Ministério Público Federal e determinar a baixa dos autos e o prosseguimento do feito. (AC508014/CE, Relª Desª Fed. Margarida Cantarelli, 4ª T., DJe 04.11.2010, p. 451)

16. Além do que, por serem sociedades empresárias cujas atividades en-volvem sérios riscos, deveriam, pela natureza de suas atividades, ter procedido com cautela a fim de que fosse evitado o derramamento em testilha.

17. Ultrapassada a análise da existência do dano ambiental e de sua responsabilidade, passamos à análise do quantum indenizatório arbitrado (R$ 30.000,00).

18. Ambas os recorrentes se insurgem contra o valor fixado, por não ter o Juízo a quo utilizado critérios objetivos para tal.

19. De fato, a discussão sobre a compensação de dano ambiental, sobre o critério para fixação do que constitui dano ambiental e como este deve ser reparado é matéria de difícil resposta, mesmo porque a adoção de um valor ar-bitrado tem a desvantagem de estabelecer um macabro sistema pelo qual aque-les que possuem recursos financeiros poderão pagar uma soma para compensar a área ou espécie prejudicada. (ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 253)

20. Dito isto, devemos atentar para a lógica da reparação do dano ao meio ambiente, considerada como macrobem, incorpóreo e imaterial, visto como um conjunto de fatores que interagem e condicionam a vida das pessoas, cuja reparabilidade é indireta no dizer da doutrina especializada, in verbis:

“Dano ambiental de reparabilidade indireta, quando diz respeito a interesses di-fusos, coletivos e eventualmente individuais de dimensão coletiva, concernentes à proteção do macrobem ambiental e relativos à proteção do meio ambiente

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como bem difuso, sendo que a reparabilidade é feita, indireta e preferencialmen-te, ao em ambiental de interesse coletivo e não objetivando ressarcir interesses próprios e pessoais. Observe-se que, nesta concepção, o meio ambiente é re-parado indiretamente no que concerne à sua capacidade funcional ecológica e à capacidade de aproveitamento humano e não, por exemplo, considerando a deterioração de interesses dos proprietários do bem ambiental.” (José Rubens Morato Leite, in Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2. ed. rev. atual. e ampl. Revista dos Tribunais, p. 96/97)

21. Nesta linha de raciocínio, quando a sentença determina o pagamento de uma indenização pecuniária pelos danos já causados, ou seja, pelos danos ambientais já sentidos, considera dois pressupostos: 1) que os autores cessarão com a ação predatória; e 2) o dano ambiental, pelo seu próprio conceito, por não ter reparação imediata, deve ser considerado pelo impacto ambiental cau-sado.

22. Feitas estas considerações, tenho que dois fatores relevantes devem ser considerados no momento de valorar a gravidade do dano para fins de se calcular o valor da indenização devida: possibilidade de recuperação do meio ambiente degradado e a efetiva recuperação.

23. Tais fatores são adotados como pressupostos para restaurar a propor-cionalidade da condenação e, assim, viabilizar o cumprimento da obrigação pecuniária em favor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.

24. Pois bem, propõe o MPF a utilização do método de “Proposta de Cri-tério para Valoração Monetária de Danos Causados por Derrames de Petróleo ou de seus Derivados no Ambiente Marinho” da Cetesb, de autoria da Bióloga Íris Regina Fernandes Poffo, em sua dissertação de mestrado oferecida à USP.

25. Apesar de várias propostas metodológicas tencionadas a buscar so-lução para quantificação do dano ambiental, o fato é que não existe método preciso, perfeito ou exclusivo para fixar tais valores, cabendo ao juízo no caso concreto, sempre buscando parâmetros objetivos e contando com o bom senso do julgador.

26. Destarte, não prosperam os argumentos dos autores no sentido de que a referida metodologia restaria inaplicável ao caso, porquanto, diferentemente do que se afirma, tal proposta não está atrelada aos interesses do Ministério Público quando da propositura da ação civil pública, mas se trata de um estudo genérico direcionado à quantificação do dano ambiental de várias espécies.

27. Como proposta, o estudo apresenta soluções objetivas, partindo de uma diretriz genérica, mas que tenta abranger o maior número de situações possíveis, o que não dispensa adaptações em cada caso concreto

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28. Neste ponto vale frisar o seguinte: a utilização do valor de recupera-ção serve apenas para se ter um parâmetro para quantificar o dano e não signi-fica que se está desconsiderando a recuperação ambiental e nem o fato que o autor colaborou para o êxito da recomposição do ecossistema.

29. Nesta tentativa de servir às mais diversas situações, o método da Dra. Íris Regina Fernandes Poffo, além de estimar o valor do dano, em números absolutos, propõe-se a majorá-lo, conforme a nocividade da ação predatória, mediante multiplicação por um fator numérico (fator de multiplicação), este obtido a partir da qualificação dos agravos perpetrados.

30. Referido método leva em consideração cinco aspectos, quais sejam: i) o volume derramado; ii) o grau de vulnerabilidade da área atingida; iii) a toxi-dade do produto; iv) a persistência do produto no meio ambiente e v) a mortan-dade de organismos. A cada aspecto atribui-se um peso que pode variar de 0 a 0,5, de acordo com a gravidade. A equação é representada da seguinte forma:

Valor (US$) = k [ 10(4.5+x) ]

31. Da equação exposta, tem-se x como a soma de todos os pesos dados aos critérios supramencionados, e k como a indicação do número de reinci-dências (aplicado em progressão geométrica, partindo de 2, 4, 8, e assim por diante).

32. Assim, dada a ausência de um critério objetivo para se aferir o quan-tum indenizatório de determinado dano ambiental e tendo como norte o Princí-pio da Reparação Integral, que tem como objetivo propiciar a recomposição do meio ambiente, na medida do possível, ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do dano, parece-me razoável a adoção do critério proposto com vistas a incutir no poluidor o caráter punitivo-pedagógico que deve possuir a reparação.

33. Assim já se manifestou o Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região em inúmeros julgados:

CONSTITUCIONAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO AMBIENTAL – DERRA-MAMENTO DE ÓLEO NO MAR – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – CONDU-TA, DANO E NEXO CAUSAL COMPROVADOS – RESPONSABILIDADE SO-LIDÁRIA ENTRE OS CAUSADORES DO DANO – VALOR DA INDENIZAÇÃO – FÓRMULA DE CÁLCULO DESENVOLVIDA PELA CETESB – DANO MORAL – INCABÍVEL – REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA, E APELAÇÕES IM-PROVIDAS

Embora a Lei nº 7.347/1985 silencie a respeito, a r. sentença deverá ser submetida ao reexame necessário (interpretação analógica do art. 19 da Lei nº 4.717/1965), conforme entendimento da 4ª Turma deste Tribunal e jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. O art. 225 da Constituição Federal consagrou o direito ao

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meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental, criando o dever de o agente degradador reparar os danos causados e estabeleceu o fun-damento de responsabilização de agentes poluidores, pessoas físicas e jurídicas. Com relação à tutela ambiental, se aplica a responsabilidade objetiva, ou seja, não há espaço para a discussão de culpa, bastando a comprovação da atividade e o nexo causal com o resultado danoso. Tal responsabilização encontra funda-mento nos arts. 4º, VII, c/c 14, § 1º, ambos, da Lei nº 6.938/1981. Após análise do conjunto probatório, não há dúvidas que houve vazamento de óleo, ocorrido em 16.02.2008, durante abastecimento realizado da barcaça Serra Polar para o navio Rio Blanco, em Santos/SP. Configurado o dano, basta ratificar a comprovação da atividade e o nexo causal com o resultado danoso. Neste aspecto, está evidente de que o resultado decorreu do exercício da atividade de risco exercido pelas rés. No polo passivo das ações ambientais, todos os causadores de dano, diretos ou indiretos, respondem solidariamente pelos prejuízos causados ao meio ambiente. Dizer que é solidária esta responsabilidade é o mesmo que dizer que o autor de uma ação civil ambiental pode escolher responsabilizar um, alguns ou todos os que tenham concorrido direta ou indiretamente para o dano. Considerando o inconteste prejuízo ao meio ambiente, entendo que o montante da indenização deve ser mantido em US$ 398.107,17 (trezentos e noventa e oito mil, cento e sete dólares americanos e dezessete centavos de dólar). O valor apontado no laudo de fls. 252/265, assinado por dois analistas periciais (engenheiro sanitário e eco-nomista), com base na fórmula criada pela Cetesb, mostra-se adequado ao caso concreto. O dano moral coletivo depende da ofensa a interesses legítimos, valo-res e patrimônio ideal de uma coletividade que devam ser protegidos. Entretanto, no presente caso, não há qualquer elemento capaz de indicar que tenha havido dano moral (coletivo). Remessa oficial, tida por interposta, e recursos do Ministé-rio Público Federal e das empresas Navegação São Miguel, Compañia Navieira Rio Blanco S.A. e CSAV – Group Agencies Brazil Agenciamento de Transportes Ltda. improvidos. Com relação à indenização fixada pela r. sentença, ressalto que, não obstante o método da Cetesb se apresente em dólares, o quantum deve ser explicitado em moeda corrente nacional, ou seja, em reais, como dispõe a le-gislação pátria (art. 1º da Lei nº 10.192/2001, art. 315 do Código Civil e arts. 1º e 2º do Decreto-Lei nº 857/1969). Assim, os US$ 398.107,17 (trezentos e noventa e oito mil, cento e sete dólares e dezessete centavos de dólar), convertidos em real, pelo câmbio da data dos fatos (1,75 em 16.02.2008), resultam em R$ 696.687,54 (seiscentos e noventa e seis mil, seiscentos e oitenta e sete reais e cinquenta e quatro centavos) a serem atualizados monetariamente, a partir da data do dano ambiental (http://www4.bcb.gov.br/pec/taxas/port/ptaxnpesq.asp?id=txcotacao).

(TRF 3ª R., AC 00072316020124036104, Desª Fed. Mônica Nobre, 4ª T., e-DJF3 Judicial 1 Data: 16.12.2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

CONSTITUCIONAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – REEXAME NECESSÁRIO – DANO AMBIENTAL – DERRAMAMENTO DE ÓLEO NO MAR – PRELIMINARES DE CERCEAMENTO DE DEFESA, INÉPCIA DA INICIAL E FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL AFASTADAS – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – CONDUTA, DANO E NEXO CAUSAL COMPROVADOS – VALOR DA INDENIZAÇÃO –

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FÓRMULA DE CÁLCULO DESENVOLVIDA PELA CETESB – REINCIDÊNCIA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – INDEVIDOS PARA O MINISTÉRIO PÚBLICO – DEVIDOS PARA A UNIÃO FEDERAL QUE FIGURA COMO LITISCONSORTE ATIVO – JUROS MORATÓRIOS DO EVENTO DANOSO (SÚMULA Nº 54, STJ) – RECURSO DA EMPRESA IMPROVIDO – REMESSA OFICIAL, TIDA POR IN-TERPOSTA, E APELAÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E DA UNIÃO PARCIALMENTE PROVIDAS – Embora a Lei nº 7.347/1985 silencie a respeito, a r. sentença deverá ser submetida ao reexame necessário (interpretação analógica do art. 19 da Lei nº 4.717/1965), conforme entendimento da 4ª Turma deste Tri-bunal e jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Não há que se falar em inépcia da inicial, pois os fatos encontram-se devidamente descritos na petição inicial, bem como os fundamentos jurídicos do pedido. Quanto ao cerceamento de defesa, o magistrado, no uso de suas atribuições, deverá estabelecer a pro-dução de provas que sejam importantes e necessárias ao deslinde da causa, é dizer, diante do caso concreto, deverá proceder à instrução probatória somente se ficar convencido da prestabilidade da prova. O art. 225 da Constituição Fe-deral consagrou o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental, criando o dever de o agente degradador reparar os danos causados e estabeleceu o fundamento de responsabilização de agentes polui-dores, pessoas físicas e jurídicas. Com relação à tutela ambiental, se aplica a responsabilidade objetiva, ou seja, não há espaço para a discussão de culpa, bas-tando a comprovação da atividade e o nexo causal com o resultado danoso. Tal responsabilização encontra fundamento no art. 4º, VII, c/c art. 14, § 1º, ambos, da Lei nº 6.938/1981. Após análise do conjunto probatório, não há dúvidas que houve vazamento de óleo hidráulico envolvendo a embarcação DG Colúmbia de propriedade da empresa Di Gregório Navegações Ltda. Configurado o dano, basta ratificar a comprovação da atividade e o nexo causal com o resultado da-noso. Neste aspecto, está evidente de que o resultado decorreu do exercício da atividade de risco exercida pela ré. Considerando o inconteste prejuízo ao meio ambiente marinho e a reincidência da empresa, o montante da indenização deve ser majorado. O valor apontado no laudo de fls. 396/405, com base na fórmula criada pela Cetesb, mostra-se adequado ao caso concreto. Indenização fixada em US$ 79.621,43 (setenta e nove mil, seiscentos e vinte e um dólares americanos e quarenta e três centavos de dólar), a ser convertida em reais segundo a cotação oficial de fechamento divulgada pelo Banco Central do Brasil para a data do evento – 4 de agosto de 1997, a qual deverá ser revertida para o Fundo para a Reconstituição de Bens Lesados (Lei nº 7.347/1985), e integralmente aplicada em medidas para o controle e restabelecimento do ecossistema aquático na área do estuário e adjacências. – Na ação civil pública, sagrando-se vencedor o Minis-tério Público, autor da demanda, são indevidos honorários advocatícios, em seu favor, por força do que dispõe art. 128, inciso II, § 5º, II, alínea a, da Constituição Federal, da aplicação, por simetria de tratamento, das disposições do art. 18 da Lei nº 7.347/1985. A União Federal, figurando como litisconsorte ativo, deve receber a verba honorária em face do princípio da causalidade. Considerando o valor da causa e a matéria discutida nos autos, os honorários advocatícios deve ser arbitrados em 1% (um por cento) do valor da causa, devidamente atualizados,

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conforme a regra prevista no § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil. Os juros moratórios incidem a contar da data do evento danoso, nos termos da Súmula nº 54 do E. Superior Tribunal de Justiça. Recurso da empresa Di Gregório Nave-gações Ltda. improcedente. Remessa oficial, tida por interposta, e apelações do Ministério Público Federal e da União parcialmente providas.

(TRF 3ª R., AC 00018973120014036104, Desª Fed. Mônica Nobre, 4ª T., e-DJF3 Judicial 1 Data: 16.12.2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

34. Ressalto que, não obstante o método da Cetesb se apresente em dó-lares, o quantum deve ser explicitado em moeda corrente nacional, ou seja, a ser convertido em reais segundo a cotação oficial de fechamento divulga-da pelo Banco Central do Brasil para a data do evento danoso, como dispõe a legislação pátria (art. 1º da Lei nº 10.192/2001, art. 315 do Código Civil e arts. 1º e 2º do Decreto-Lei nº 857/1969), sendo, ao final, revertido ao Fundo para a Reconstituição de Bens Lesados (Lei nº 7.347/1985), e integralmente apli-cado em medidas para o controle e restabelecimento do ecossistema aquático na área do estuário e adjacências.

35. No que se refere à fixação de honorários de sucumbência em fa-vor do Ministério Público, não assiste razão ao apelante, visto que “conforme o entendimento jurisprudencial do STJ, não é cabível a condenação da par-te vencida ao pagamento de honorários advocatícios em favor do Ministério Público nos autos de Ação Civil Pública” (Nesse sentido: REsp 1.099.573/RJ, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJe 19.05.2010; REsp 1.038.024/SP, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 24.09.2009; EREsp 895.530/PR, 1ª S., Relª Min. Eliana Calmon, DJe 18.12.2009).

36. Com essas considerações, nego provimento à apelação da Petrobras e dou parcial provimento à apelação do MPF para reformar a sentença no capí-tulo atinente ao valor indenizatório pelos danos ambientais perpetrados, deven-do ser aplicada a fórmula da Cetesb, com incidência de juros moratórios contar da data do evento danoso, nos termos da Súmula nº 54 do E. Superior Tribunal de Justiça.

37. É como voto.

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Parte Geral – Ementário de Jurisprudência2540 – Abastecimento das embarcações – comunicação do sinistro – Resolução nº 398, do

Conama – responsabilidade – identificação – Ibama – auto de infração – anulação

“Administrativo. Ibama. Anulação de auto de infração. Ausência de responsabilidade da parte autora. Verba honorária reduzida. 1. Embora a gestão e apoio de toda a operação de abas-tecimento das embarcações (programação de carregamento para as barcaças que procedem a entrega ao cliente final) seja realizada pela Transpetro, ela não está obrigada a acionar seu Plano de Emergência Individual (onde consta a obrigatoriedade do comunicado), nos termos do que determina a Resolução nº 398, do Conama. 2. A legislação que serviu de base para o auto de infração não determina com clareza que a responsabilidade da comunicação do sinistro. 3. Alteração da sentença apenas no tocante à verba honorária. Aplicação do art. 20, § 4º, do CPC.” (TRF 4ª R. – Ap-Reex 5056010-25.2013.404.7000 – 4ª T. – Relª Loraci Flores de Lima – DJe 28.07.2016)

Transcrição EditorialResolução nº 398, do Conama, de 11 de junho de 2008:“3.2 Comunicação do incidenteEsta seção deverá conter a lista de indivíduos, organizações e instituições oficiais que devem ser comunicadas no caso de um incidente de poluição por óleo. A lista deverá conter, além dos nomes, todos os meios de contato previstos, incluindo, conforme o caso, telefone (comercial, residencial e celular), fax, rádio (prefixo ou frequência de comunicação), etc. A comunicação inicial do incidente deverá ser feita ao Orgão Ambiental Competente, à Capitania dos Portos ou à Capitania Fluvial da jurisdição do incidente e ao órgão regulador da indústria de petróleo, com base no formulário constante do Apêndice 1 deste Anexo.”

2541 – Ação anulatória – duplicata – tarifas portuárias – tabela progressiva da “Taxa Míni-ma” – utilização – eventos ocorridos antes da entrada em vigor da tabela atual – im-possibilidade

“Recurso. Agravo retido. Interposição da decisão interlocutória que considerou suspeita a tes-temunha arrolada pela autora. Testemunha que foi ouvida como informante do juízo. Autora que não requereu, nas razões do apelo, a apreciação desse recurso. Aplicação do art. 523, § 1º, do CPC. Agravo retido da autora não conhecido. Recurso. Agravo retido. Interposição da decisão interlocutória que rejeitou a contradita levantada contra a testemunha arrolada pela ré. Fato de a testemunha arrolada ser funcionária da ré que não a impede de depor em juízo. Agravo retido da autora desprovido. Ação anulatória. Duplicata. Tarifas portuárias. Pretendi-da pela autora a anulação das duplicatas de prestação de serviços de nºs 6169, 6262, 6422, 6684, 6709, 6716, 6774, 6776, 6792, 6811, 6830, 6898, 6899 e 6925, ‘perfazendo o total de R$ 171.620,75’. Autora que se insurgiu contra a utilização da denominada ‘Taxa Mínima’, ao invés da tonelagem bruta ‘TPB’. Descabimento. Caso em que compete à ré, como adminis-tradora do Porto de São Sebastião, fixar os valores das tarifas portuárias. Art. 33, § 1º, IV, da Lei nº 8.630, de 25.02.1993, revogada pela Lei nº 12.815, de 05.06.2013. Valores que, para terem validade, deveriam ser homologados pelo Conselho de Autoridade Portuária (CAP). Art. 30, § 1º, VIII, da Lei nº 8.630/1993. Caso em que incumbe à Agência Nacional de Trans-portes Aquaviários – Antaq aprovar as propostas de revisão e reajustes das tarifas portuárias formuladas pelas administradoras portuárias. Art. 27, VII, da Lei nº 10.233, de 05.06.2001, com redação dada pela MP 2.217-3, de 04.09.2001. Ação anulatória. Duplicata. Tarifas por-tuárias. Alegado pela autora que a ré, para tarifar a armazenagem de cargas soltas, passou a usar a ‘Taxa Mínima’, em desacordo com a tabela de tarifas portuárias em vigor, que previa a incidência de alíquotas progressivas, levando em conta o período de permanência de cada carga e a tonelagem bruta. Descabimento. ‘Taxa Mínima’ que já se encontrava prevista na tabela de tarifas portuárias em vigor àquela época. Aplicação dessa metodologia de cálculo

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que não é abusiva, já que ‘equilibra a relação negocial com aqueles operadores portuários que armazenam cargas que, embora tenham peso baixo, ocupam muito espaço’. Previsão da taxa mínima, no valor de R$ 30,00, que foi aprovada pela Antaq por meio da Resolução nº 1.206, de 27.11.2008, homologada pelo Conselho de Autoridade Portuária de São Sebas-tião por meio da Resolução CAP/PSS nº 005/2008, de 19.12.2008. Ação anulatória. Duplica-ta. Tarifas portuárias. Insurgência da autora contra a cobrança pela armazenagem de ‘equi-pamentos próprios’ que não há de prevalecer. Cobrança que se encontrava prevista na tabela de tarifas portuárias vigente àquela ocasião. Resolução CAP/PSS nº 004/2011, de 30.09.2011. Ação anulatória. Duplicata. Tarifas portuárias. Caso em que, no que concerne à progressivi-dade da ‘Taxa Mínima’, assiste razão à autora. Progressividade da ‘Taxa Mínima’ que só está prevista na atual tabela de tarifas portuárias da ré. Tabela que foi homologada pelo Conselho de Autoridade Portuária de São Sebastião por intermédio da Resolução CAP/PSS nº 001/2012, de 30.03.2012, com vigência a partir de 01.04.2012. Ré que não poderia usar a tabela pro-gressiva da ‘Taxa Mínima’ para eventos ocorridos antes da entrada em vigor da tabela atual. Fato que se verificou em relação às duplicatas de nºs 6774, 6776, 6811, 6898 e 6899. Ação parcialmente procedente, para declarar inexigíveis as referidas duplicatas. Apelo da autora provido em parte para esse fim.” (TJSP – Ap 0001524-03.2012.8.26.0587 – 23ª CDPriv. – Rel. Des. José Marcos Marrone – DJe 15.07.2016)

2542 – Acidente ambiental – explosão do Navio Vicuña – responsabilização das empresas proprietárias da carga – caráter multitudinário – recursos repetitivos – afetação – julgamento perante a Segunda Seção do STJ

“Decisão: Trata-se de dois recursos especiais interpostos respectivamente por Arauco do Brasil S.A. (e-STF fls. 1.886/1.932) e Momentive Química do Brasil Ltda. (e-STJ fls. 1.974/2.000), com fulcro no art. 105, inciso III, alíneas a e c, da Constituição Federal, con-tra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná assim ementado: ‘Apelação cível. Responsabilidade civil. Ação de indenização por danos morais. Acidente ambiental. Explosão do Navio Vicuna. Vazamento de metanol e óleos combustíveis e lubrificantes nas baias de Paranaguá, Antonina e Guaraqueçaba. Pretensão de responsabilização das empresas proprietárias da carga. Sentença de improcedência. Preliminares levantadas pelas requeridas em sede de contrarrazões. Ilegitimidade ativa e ausência de interesse processual. Questões devidamente afastadas na sentença. Ausência de recurso competente. Não conhecimento. Mérito. Reforma da sentença que se impõe. Teoria do risco integral. Responsabilidade obje-tiva e solidária entre todos aqueles que, direta ou indiretamente, se aproveitam da atividade poluidora. Art. 3º, inciso IV, da Lei nº 6.938/1981. Ação civil pública perante a Justiça Fede-ral decorrente do mesmo fato. Manutenção dos compradores da mercadoria/carga no polo passivo da ação. Nexo causal verificado. Dano moral patente. Proibição da pesca por 60 dias. Angústia e aflição presentes. Impossibilidade do desempenho das atividades de pescador profissional. Sentença reformada. Inversão do ônus da sucumbência. Recurso provido por unanimidade. 1. ‘Art. 3º Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: [...] IV – poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental; (Lei nº 6.938/1981)’. 2. ‘Assim sendo, surgem como responsáveis solidários pela reparação do dano ambiental todos aqueles que, direta ou indiretamente, se aproveitam da atividade poluidora. Portanto, não há como afastar da cadeia causal, geradora do prejuízo ao meio ambiente, a participação dos compradores e vendedora da mercadoria, já que a presença da substância tóxica no território, pressupõe o negócio jurídico firmado entre as partes (TRF 4ª R., Ag 2006.04.00.003071-7/PR, 3ª T., Relª Desª Vânia Hack de Almeida, DOU 09.05.2007)’. 3. ‘Configuração de dano moral. Patente o sofrimento intenso de pescador profissional artesanal, causado pela privação das condições de trabalho, em consequência do dano ambiental, é também devida a indenização por dano

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moral, fixada, por equidade, em valor equivalente a um salário-mínimo. e) termo inicial de incidência dos juros moratórios na data do evento danoso. Nos termos da Súmula nº 54/STJ, os juros moratórios incidem a partir da data do fato, no tocante aos valores devidos a título de dano material e moral (REsp 1114398/PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, 2ª S., J. 08.02.2012, DJe 16.02.2012)’. 4. ‘Sopesadas as nuances da espécie em litígio, aliadas as condições econômi-cas das partes litigantes – pescador profissional e empresas de grande porte –, bem ainda as próprias condições que envolveram o evento danoso e objetivando uma valoração razoável e proporcional ao dano moral ocorrido, deve ser provido o recurso, para o fim de condenar os requeridos/apelados, solidariamente, ao pagamento de indenização a título de dano moral no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pois suficiente para compensar o abalo sofrido pela apelante, sem lhe causar enriquecimento ilícito, e para alcançar o caráter pedagógico do dano moral. Justifica-se, ainda, a fixação do dano moral neste patamar, tendo em vista o período de incidência dos juros moratórios (desde 15.11.2004)’ (e-STJ fls. 1.826/1.829). Em seu recurso especial, a primeira recorrente, que tal e qual a segunda figurou como ré na ação indenizatória que deu origem aos presentes autos, aponta, além da existência de dissídio jurisprudencial, violação dos arts. 3º, 267, inciso VI, 283, 295, inciso II, 301, inciso X, 396 e 458, 535 do Código de Processo Civil de 1973 (CPC/1973), 2º da Lei nº 9.605/1998, 3º, inciso IV, da Lei nº 6.938/1981, e 407 e 944 do Código Civil (e-STJ fls. 1.886/1.935). A se-gunda recorrente, por sua vez, aponta violação dos arts. 3º e 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1981, 20 da Lei nº 9.605/1998, 333, inciso II, do CPC/1973 e 407, 884, 927, parágrafo único, e 944 do Código Civil. A Primeira Vice-Presidência da Corte estadual admitiu os apelos nobres, indicando-os como representativos de controvérsia, nos seguintes termos: ‘1. Os presentes recursos especiais trazem em seu bojo matéria repetitiva, sujeita a reproduzir-se em recursos multitudinários, na medida em que neles discute-se acerca da responsabilidade objetiva das empresas adquirentes da carga do Navio Vicuña pelo dano ambiental decorrente da explosão na baía de Paranaguá. 2. A questão tem se mostrado polêmica neste Tribunal, o que tem feito com que centenas de ações estejam recebendo tratamento distinto, ora sendo reconhecido o dever de indenizar, ora afastando o nexo de causalidade. 3. Com efeito, a Oitava Câmara Cível desta Corte entende que se aplica ao caso a teoria do risco integral, de modo que, sendo objetiva a responsabilidade das empresas proprietárias da carga e exercendo atividade que acarrete risco ao meio ambiente, devem responder pelos danos decorrentes independente da perquirição de culpa. Sustenta ainda que, com base no art. 3º, inciso IV, da Lei nº 6.938/1981, presente o nexo de causalidade, diante da aplicação do princípio do poluidor pagador. Por sua vez, a Nona Câmara Cível deste mesmo Tribunal, em idêntica situação, concluiu que a adoção da teoria do risco integral não afasta a necessidade de comprovar a existência do nexo de causalidade, como pressuposto necessário para caracterizar a responsabilidade civil. E entende que, no caso, ‘não há como estabelecer nexo de causalidade entre o simples fato da carga transportada pelo navio ter sido adquirida pelas rés e os danos reclamados na inicial’, concluindo que ‘não se revela razoável imputar às rés a responsabilidade pelos prejuízos cau-sados pela explosão do navio, já que o evento danoso ocorreu antes da tradição’ (Apelação Cível nº 1.335.427-7). Em assim sendo justifica-se, de pronto, seja o tema submetido à Corte Superior, para os efeitos do art. 543-C, § 1º, do Código de Processo Civil de 1973’ (e-STJ fls. 2.030/2.031 – grifou-se). A questão dos autos gira em torno da responsabilidade das empresas adquirentes da carga do Navio Vicuña pelo dano ambiental decorrente da explosão na baía de Paranaguá. Considerando que há, na hipótese, como informado pela Corte de origem, centenas de ações recebendo tratamento distinto, e que, por isso, estamos diante da iminência de que ascendam a esta Corte Superior um grande número de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, evidenciando o caráter multitudinário da controvérsia, impõe-se a afetação do presente feito a julgamento perante a Segunda Seção pela sistemática dos recursos

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repetitivos (arts. 1.036 e 1.037 do Código de Processo Civil de 2005 – CPC/2005). Oficie-se aos Presidentes dos Tribunais de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais comunicando a instauração deste procedimento, a fim de que seja suspensa a tramitação dos processos, indi-viduais ou coletivos, que versem a mesma matéria. Após, abra-se vista ao Ministério Público Federal para manifestação. Comunique-se ao Ministro Presidente e aos demais integrantes da Segunda Seção. Publique-se. Intimem-se. Brasília/DF, 23 de junho de 2016. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Relator.” (STJ – REsp 1.602.106 – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 01.08.2016)

Transcrição EditorialCódigo de Processo Civil de 2015:“Art. 1.036. Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e no do Superior Tribunal de Justiça.”

2543 – Agente marítimo – informações – prazo – descumprimento – multa – responsabilida-de – Decreto-Lei nº 37/1966

“Agente marítimo. Multa. Responsabilidade. Decreto-Lei nº 37/1966. Desde a Lei nº 10.833, de 2003, que deu nova redação ao art. 37 do Decreto-Lei nº 37, de 1966, o agente de carga passou a ter obrigação legal de prestar informações, na forma e prazo estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, sobre as operações que executa e as respectivas cargas (DL 37, de 1966, art. 37, § 1º, com a redação da Lei nº 10.833, de 2003), sendo-lhe aplicável a pena de multa (prevista no art. 107, IV, alínea e, do Decreto-Lei nº 37/1966), no caso de não ob-servância de tal dever.” (TRF 4ª R. – AC 5006247-42.2015.404.7208 – 2ª T. – Relª Desª Fed. Cláudia Maria Dadico – DJe 06.07.2016)

2544 – Agente marítimo – responsabilidade fiscal – atuação como transportador – processo administrativo – inexistência de nulidade – redução da multa – possibilidade – de-núncia espontânea rejeitada

“Apelação. Ação ordinária. Inexistência de prescrição. Depósito que suspendeu a exigibili-dade do crédito efetuado antes do término do prazo quinquenal. Responsabilidade fiscal do agente marítimo. Atuação como transportador. Processo administrativo: inexistência de nu-lidade. Devida a redução da multa. Denúncia espontânea rejeitada. Sucumbência recíproca mantida. Apelo improvido. 1. De acordo com os arts. 138 e 139 do Decreto-Lei nº 37/1966 e art. 753 do Decreto nº 6.759/2009, o prazo de prescrição para a extinção do direito de exigir o tributo é de 5 (cinco) anos para, a contar da data da infração. 2. Considerando que a notifica-ção sobre o descumprimento da obrigação acessória foi realizada em 26.11.2009 e a apelante efetuou o depósito, que suspendeu a exigibilidade do crédito, em 24.03.2010, resta descarta-da a hipótese de prescrição. 3. Ademais, verifico configurada a responsabilidade do apelante no momento da omissão quanto ao envio dos dados de embarque da carga transportada no ano de 2004 à RFB, conforme apurado pela autoridade fiscal, sendo legítima a cobrança da multa, nos termos do Regulamento Aduaneiro, ex vi arts. 37, § 2º e 44 da Instrução Normativa SRF nº 510/05, c/c art. 107, alínea e do Decreto-Lei nº 37/1966. 4. Não há se falar em nulida-de no PA 10711.007871/2009-38, já que devidamente observado o contraditório e a ampla defesa. Contudo, devida a redução da multa ao montante de R$ 5.000,00, tendo em vista que a apelante praticou apenas uma infração no momento em que descumpriu o Regulamento Aduaneiro, deixando de efetuar o registro no sistema de dados (Siscomex) e de repassar à Receita Federal os dados de embarque das mercadorias transportadas ao estrangeiro, no prazo legal de 7 (sete) dias. 5. Tampouco, restou configurada a hipótese de denúncia espontânea à

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espécie, nos termos do art. 138 do CTN. Independentemente do momento em que iniciado o procedimento de fiscalização no vertente caso, a jurisprudência do Col. STJ está consolidada no sentido de que o dispositivo em questão é inócuo se articulado ao afastamento de infrações referentes a obrigações de caráter acessório. 6. Por fim, no tocante ao arbitramento da verba sucumbencial, por se tratar de regra de direito material, deve ser aplicada a lei vigente na data da prolação da sentença. Porém, como houve sucumbência recíproca in casu, fica mantida a r. sentença que determinou a distribuição e compensação do ônus sucumbencial, nos termos do art. 21 do CPC/1973, com a ressalva de que seja convertido em renda em favor da União, 50% do valor depositado às fls. 68, após o trânsito em julgado. 7. Apelo improvido.” (TRF 3ª R. – AC 0002618-65.2010.4.03.6104 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Nery Junior – DJe 29.07.2016)

2545 – Agente marítimo contratado – natureza jurídica – mandato mercantil – existência da dívida – penhora de embarcação – possibilidade

“Agravo de instrumento. Penhora de embarcação. Posterior substituição por caução dos crédi-tos detidos pela ré com a American Express. 1. O agravante alega que a responsabilidade pelo pagamento do serviço prestado pela agravada é do agente marítimo contratado. 2. O agente marítimo atua como mandatário mercantil do proprietário do navio, do armador, do gestor ou do afetador/transportador, recebendo poderes para, em nome daqueles, praticar atos e admi-nistrar seus interesses de forma onerosa (REsp 246107/RJ). 3. A natureza jurídica desta relação é de mandato mercantil. 4. A responsabilidade perante terceiros é do mandante, ressalvado o direito de regresso. 5. Nesse contexto, a alegação de ilegitimidade passiva não merece pros-perar. 6. Ademais, ao apreciar as provas coligidas nos autos, o juízo a quo, atento ao princípio do livre convencimento motivado, entendeu que ficou comprovada a existência da dívida e a relação jurídica entre as partes, além do perigo na demora do provimento jurisdicional diante do fato de não ter a requerida bens no Brasil que possam garantir futura cobrança ou execu-ção do crédito. 7. Exame perfunctório próprio da via estreita do presente recurso, no qual se verificam presentes os requisitos necessários à concessão da liminar possessória. 8. Súmula nº 58 do E. TJRJ. Recurso desprovido.” (TJRJ – AI 0013173-33.2016.8.19.0000 – 11ª C.Cív. – Rel. Des. Fernando Cerqueira Chagas – DJe 14.07.2016)

2546 – Apoio marítimo – qualificação como contribuinte do ICMS – impossibilidade – con-trato de afretamento marítimo – hipóteses de incidência – não enquadramento

“Apelação Cível. Ação anulatória de débito fiscal. Empresa que presta serviço de apoio ma-rítimo. Qualificação como contribuinte do ICMS. Impossibilidade. Contrato de afretamento marítimo que não se enquadra nas hipóteses de incidência do tributo. Ausência de prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal. Distinção entre o contrato de afre-tamento por tempo, contrato complexo, e o contrato de transporte, previsto no art. 730 do Código Civil. Impossibilidade de desmembramento para fins fiscais. Orientação do STJ. Não incidência do ICMS sobre contratos de afretamento por tempo. Entendimento manifestado pelo TJRJ e STJ. Autora que não é contribuinte do imposto. Diferencial de alíquota previsto nos arts. 3º, inciso VI, da Lei nº 2.657/1996 e 155, inciso II, e § 2º, incisos VII, alínea a, e VIII, da Constituição Federal que não é devido. Procedência do pedido. Manutenção da sentença. Desprovimento do recurso.” (TJRJ – Ap-Reex 0120754-12.2013.8.19.0001 – 5ª C.Cív. – Relª Desª Cláudia Telles de Menezes – DJe 14.07.2016)

2547 – Armazenamento portuário – cobrança – excesso – tabela de serviços e valores – ho-mologação pelo poder público – parâmetros oficiais de tarifa portuária – verificação – cerceamento de defesa – acolhimento

“Apelação. Prestação de serviços. Armazenamento portuário. Ação declaratória de inexigibi-lidade de débito em excesso. Sentença de improcedência. Apelo da autora. Alegada irregu-

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laridade na cobrança. Ré que teria imputado débito em desconformidade com os parâmetros estabelecidos para o setor portuário. Atividade portuária que é serviço público, sujeito à re-gulação. Eventuais limitações à política tarifária que emanam da autoridade portuária. Ré que apresentou tabela de serviços e valores elaborada pela operadora do terminal portuário, não pela autoridade portuária. Impugnação específica na réplica. Questão controvertida. Julga-mento antecipado da lide sem a indispensável fase de instrução. Inaplicabilidade automática das tabelas. Necessário verificar se as tabelas tarifárias foram ou não homologadas pelo poder público ou, pelo menos, se os valores cobrados da autora estão ou não de acordo com os parâmetros oficiais de tarifa portuária. Acolhimento da preliminar de cerceamento de defesa. Anulação da r. sentença para que se verifique, perante a autoridade portuária, se houve ho-mologação das tabelas apresentadas pela ré perante a autoridade portuária do Porto de Santos (Codesp) ou, se não for o caso de homologação, se tais valores atendem aos parâmetros ofi-ciais de tarifa portuária. Caso necessário, ficando a critério do MM. Juízo, poderá ser realizada perícia contábil. Mérito que fica prejudicado. Apelo provido, com observação.” (TJSP – Ap 1008587-69.2014.8.26.0562 – 29ª CDPriv. – Rel. Des. Carlos Dias Motta – DJe 11.08.2016)

Transcrição Editorial• Código de Processo Civil de 2015:“Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando:I – não houver necessidade de produção de outras provas;II – o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349.”• Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001:“Art. 27. Cabe à Antaq, em sua esfera de atuação:[...]II – promover estudos aplicados às definições de tarifas, preços e fretes, em confronto com os custos e os benefícios econômicos transferidos aos usuários pelos investimentos realizados;[...]VII – promover as revisões e os reajustes das tarifas portuárias, assegurada a comunicação pré-via, com antecedência mínima de 15 (quinze) dias úteis, ao poder concedente e ao Ministério da Fazenda; (Redação dada pela Lei nº 12.815, de 2013)”

2548 – Atendimento aduaneiro e alfandegário – suspensão – ato discricionário – legitimida-de – critérios de conveniência e oportunidade – vicio – inocorrência

“Administrativo. Ação civil pública. Suspensão de atendimento aduaneiro e alfandegário em porto Vera Cruz/RS. Ato discricionário. Honorários. Descabidos em ação civil pública. 1. A decisão tomada pela Administração Pública em suspender o atendimento aduaneiro e alfandegário na localidade, através de seus órgãos representativos, constitui legítimo ato discricionário, pautado em critérios de conveniência e oportunidade do administrador, que possibilitam a escolha da solução que melhor satisfaça o interesse público envolto no caso concreto. Não se vislumbra a existência de qualquer vício passível de macular a edição e publicização do Ato Declaratório executivo nº 18/2013 e a Portaria nº 731/2013, mormente porque parecem razoáveis os fundamentos adotados como razão de decidir pelo ente público ao suspender o atendimento aduaneiro na localidade de Porto Vera Cruz. 2. O art. 18 da Lei nº 7.347/1985 dispõe que ‘nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associa-ção autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas proces-suais’. Inocorrendo qualquer indício de má-fé por parte do autor desta ação civil pública, des-cabe a condenação na verba honorária.” (TRF 4ª R. – Ap-Reex 5003383-53.2014.404.7115 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Sérgio Renato Tejada Garcia – DJe 27.07.2016)

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2549 – Autoridade portuária – norma de atracação – infração e penalidade não previstas na Lei dos Portos (Lei nº 8.630/1993) – ilegalidade – preço público por armazenagem em equipamento próprio – legalidade

“Apelações cíveis. Processual civil e administrativo. Preliminar. Agravo retido. Incompetência da Justiça Estadual. Desprovido. Poder regulamentar. Autoridade portuária. Norma de atra-cação. Infração e penalidade não previstas na lei dos portos (Lei nº 8.630/1993). Ilegalidade. Preço público por armazenagem em equipamento próprio. Legalidade. 1. A competência para julgar causas envolvendo sociedade de economia mista e empresa privada é da Justiça Comum Estadual, conforme enunciados das Súmulas nºs 556 e 42, respectivamente do STF e do STJ. Agravo retido desprovido. 2. A cobrança do ‘valor adicional a título de compen-sação’ em razão de não cumprimento da meta de produtividade a que se refere o item 2.2, berço 201, b e berço 202, b, da Norma de Atracação nº 006/2008, está a revelar indevida estipulação de infração, e respectiva penalidade, pois o ato normativo em relevo vai além do que preceitua a Lei nº 8.630/1993. 3. Ao tipificar infrações e respectivas penalidades, a Lei nº 8.630/1993 é expressa quanto à vedação de definição de infração ou cominação de pena-lidade não autorizada ou prevista em lei. 4. Ao editar atos gerais e abstratos, a Administração apenas exerce atividade complementar à lei formal, regulamentando-a, explicitando-a, dan-do-lhe operacionalidade, jamais lhe sendo dado criar deveres e obrigações, porquanto nin-guém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (CF/1988, art. 5º, II). 5. Ainda que válida a norma que ensejou as cobranças objeto da lide, não se sustentariam as multas cobradas pela recorrente em decorrência da ausência de alcance da produtividade dos berços 201 e 202, na medida em que não comprovado o atraso à outra em-barcação, o que se faz necessário de acordo com o item 2 da Deliberação nº 14/2008 da CAP. 6. A Lei nº 8.630/1993, prevê no inciso IV de seu art. 33, ser competente a Administração do Porto, exercida diretamente pela União ou pela entidade concessionária do porto organizado, para fixar os valores e arrecadar a tarifa portuária dentro dos limites da área do porto. 7. É vá-lida a tarifa fixada em razão da utilização do espaço portuário para a armazenagem de carga, mesmo quando utilizado armazém pertencente ao operador portuário 8. Apelo interposto na ação ordinária nº 0005981-56.2011.8.08.0024 desprovido. Apelo aviado na ação de cobran-ça nº 0037377-51.2011.8.08.0024 parcialmente provido. Acorda a Egrégia Segunda Câmara Cível, em conformidade da ata e notas taquigráficas da sessão, que integram este julgado, à unanimidade, conhecer dos recursos para (i) negar provimento ao agravo retido; (ii) negar provimento ao apelo interposto na ação ordinária nº 0005981-56.2011.8.08.0024; e, (iii) dar parcial provimento ao recurso aviado na ação de cobrança nº 0037377-51.2011.8.08.0024, para afastar a declaração de nulidade das notas fiscais nºs 9489 e 9250 e condenar a recorrida a adimplir o valor nelas consubstanciado, o qual deve ser acrescido de juros legais e correção monetária a contar do vencimento das faturas. Vitória, 12 de julho de 2016. Desembargador Presidente. Desembargador Relator.” (TJES – Ap 0005981-56.2011.8.08.0024 – 2ª C.Cív. – Rel. Des. José Paulo Calmon Nogueira da Gama – DJe 03.08.2016)

Comentário EditorialAcorda a Egrégia Segunda Câmara Cível, em conformidade da ata e notas taquigráficas da ses-são, que integram este julgado, à unanimidade, conhecer dos recursos para (i) negar provimen-to ao agravo retido; (ii) negar provimento ao apelo interposto na ação ordinária nº 0005981-56.2011.8.08.0024; e, (iii) dar parcial provimento ao recurso aviado na ação de cobrança nº 0037377-51.2011.8.08.0024, para afastar a declaração de nulidade das notas fiscais nºs 9489 e 9250 e condenar a recorrida a adimplir o valor nelas consubstanciado, o qual deve ser acrescido de juros legais e correção monetária a contar do vencimento das faturas.A matéria aqui gira em torno da análise quanto à legalidade ou não da previsão contida no item 2.2, b da Norma de Atracação do Porto Organizado de Vitória, que, conforme termos transcri-

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tos abaixo, impõe a necessidade de compensação financeira em caso de não alcance da quan-tidade mínima de movimentação em determinado berço de atracação. O referido item dispõe:“(b) Na eventualidade de um navio não cumprir a prancha de 4.000 toneladas por dia, por navio, a Codesa cobrará um valor adicional a título de compensação, correspondente a duas vezes o valor da tabela III vigente, proporcional ao tempo excedente ao previsto, caso a pran-cha tivesse sido de 4.000 toneladas por dia.”Nos termos do Acórdão em comento, a Turma do Tribunal de Justiça do Espírito Santo adotou o entendimento no sentido de que tal previsão é ilegal e, portanto, nula, pelo fato de não ser amparada por Lei, mas tão somente por uma norma de atracação elaborada pela Administra-ção Portuária.Noutras palavras, o TJES fez prevalecer o entendimento previsto no art. 37, § 1º da Lei dos Portos anterior (Lei nº 8.630/1993), que dispunha que “os regulamentos do porto não po-derão definir infrações ou cominar penalidade que não esteja autorizada ou prevista em lei”.De fato, independentemente dessa previsão legal, não restam dúvidas de que uma previsão de infração e de consequente punição, devem necessariamente estar contidas em lei, não poden-do derivar da edição de uma norma editada por uma Administração Portuária, por exemplo, salvo nas hipóteses em que a lei autorizar.Todavia, a matéria de direito aqui em debate exige um pouco mais de cuidado. Explica-se.Conforme prevê o art. 4º, inciso I do Decreto nº 8.033/2013, compete à Administração Por-tuária “estabelecer o regulamento de exploração do porto, observadas as diretrizes do poder concedente”.O referido dispositivo legal confere à Administração Portuária a autonomia para elaborar seu regulamento interno, incluindo-se as normas de atracação.Há que se dizer, portanto, que todo e qualquer ato normativo elaborado pela Administração Portuária com fundamento no referido dispositivo legal, consiste num ato de gestão daquela autoridade.No caso em análise, a Norma de Atracação do Porto Organizado de Vitória não pode ser di-ferente. Tratou-se de um ato de gestão da Companhia Docas do Espírito Santo – Codesa, ora quem administra aquele porto.Como gestora de Porto Organizado, a Codesa deve seguir conjuntamente com os demais ór-gãos e entidades da administração pública, as seguintes diretrizes trazidas pelo art. 3º da Lei nº 12.815/2013:I – expansão, modernização e otimização da infraestrutura e da superestrutura que integram os portos organizados e instalações portuárias;II – garantia da modicidade e da publicidade das tarifas e preços praticados no setor, da qua-lidade da atividade prestada e da efetividade dos direitos dos usuários; III – estímulo à modernização e ao aprimoramento da gestão dos portos organizados e insta-lações portuárias, à valorização e à qualificação da mão de obra portuária e à eficiência das atividades prestadas; IV – promoção da segurança da navegação na entrada e na saída das embarcações dos portos; e V – estímulo à concorrência, incentivando a participação do setor privado e assegurando o amplo acesso aos portos organizados, instalações e atividades portuárias. O que fez a Codesa em consignar em sua norma de atracação a previsão questionada em juízo, foi exatamente atender as diretrizes acima listadas, principalmente aquela referente ao Item III na parte em que prevê a necessidade de se garantir a eficiência das atividades prestadas.Tal previsão se equipara com aquelas que costumam constar nos Contratos de Arrendamento, as chamadas Cláusulas de Movimentação Mínima Contratual (MMC), que exatamente estabe-lecem a necessidade de compensação de valores em caso do não alcance de uma determinada quantidade mínima de movimentação de cargas por determinado arrendatário.Esses tipos de previsão nada mais são do que uma forma de estimular o setor portuário, den-tro da área de jurisdição da Administração Portuária, mediante prática de ato de gestão, em observância às diretrizes do setor portuário definidas por lei.É sob essa ótica que se deve enxergar a previsão contida no Item 2.2, b da Norma de Atra-cação do Porto Organizado de Vitória, não podendo tal previsão jamais ser confundida como uma forma de punição, como sinalizou ter entendido o Tribunal de Justiça do Espírito Santo.

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Transcrição EditorialConstituição Federal de 1988:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”

2550 – Cofins-Importação – base de cálculo – ICMS do desembaraço aduaneiro – não inci-dência

“Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins. Ementa: Cofins--Importação. Base de cálculo. ICMS. O valor do ICMS incidente no desembaraço adua- neiro não integra a base de cálculo da Cofins-Importação, instituída pelo art. 1º da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004. Solução de Consulta Vinculada à Solução de Consulta Cosit nº 85, de 08 de junho de 2016. Dispositivos legais: Lei nº 10.522, de 2002, art. 19; Lei nº 10.865, de 2004, art. 7º; Lei nº 12.865, de 2013, art. 26; Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 1, de 2014. Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep. Ementa: Contribuição para o PIS/Pasep--Importação. Base de cálculo. ICMS. O valor do ICMS incidente no desembaraço aduaneiro não integra a base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep-Importação, instituída pelo art. 1º da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004. Solução de Consulta Vinculada à Solução de Consulta Cosit nº 85, de 08 de junho de 2016. Dispositivos legais: Lei nº 10.522, de 2002, art. 19; Lei nº 10.865, de 2004, art. 7º; Lei nº 12.865, de 2013, art. 26; Portaria Con-junta PGFN/RFB nº 1, de 2014. (DISIT 6ª RF – SC 6027 – Rel. Mário Hermes Soares Campos – Chefe – DOU 24.06.2016)

2551 – Cofins-Importação – base de cálculo – ICMS do desembaraço aduaneiro – não inci-dência

“Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins. Ementa: Cofins-Importa-ção. Base de cálculo. ICMS. O valor do ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e o valor das próprias contribuições não integram a base de cálculo da Cofins-Importação, instituída pelo art. 1º da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004. O direito de pleitear restituição tem o seu prazo regulado pelo art. 168 do CTN, com observância dos prazos e procedimentos constantes da Instrução Normativa RFB nº 1.300, de 20 de novembro de 2012. Solução de Consulta Vinculada à Solução de Consulta Cosit nº 152, de 17 de junho de 2015 e à Solução de Consulta Cosit nº 85, de 08 de junho de 2016. Dispositivos legais: Código Tributário Na-cional, art. 168; Lei nº 10.522, de 2002, art. 19; Lei nº 10.865, de 2004, art. 7º; Lei nº 12.865, de 2013, art. 26; Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 1, de 2014. Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep. Ementa: Contribuição para o PIS/Pasep-Importação. Base de cálculo. ICMS. O valor do ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e o valor das próprias contribuições não integram a base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep-Importação, instituída pelo art. 1º da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004. O direito de pleitear restituição tem o seu prazo regulado pelo art. 168 do CTN, com observância dos prazos e procedimentos constan-tes da Instrução Normativa RFB nº 1.300, de 20 de novembro de 2012. Solução de Consulta Vinculada à Solução de Consulta Cosit nº 152, de 17 de junho de 2015 e à Solução de Con-sulta Cosit nº 85, de 08 de junho de 2016. Dispositivos legais: Código Tributário Nacional, art. 168; Lei nº 10.522, de 2002, art. 19; Lei nº 10.865, de 2004, art. 7º; Lei nº 12.865, de 2013, art. 26; Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 1, de 2014.” (DISIT 6ª RF – SC 6028 – Rel. Mário Hermes Soares Campos – Chefe – DOU 24.06.2016)

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2552 – Compensação do indébito – Inspetor-Chefe da Alfândega da Receita Federal do Brasil no Porto de Rio Grande – ilegitimidade passiva – PIS e Cofins-Importação – base de cálculo – valor aduaneiro – restituição – inadequação da via eleita

“Tributário. Mandado de segurança preventivo. Prazo decadencial. Art. 23 da Lei nº 12.016/2009. Não aplicação. Exame da pretensão vertida na inicial. Art. 1.013, § 3º, do novo CPC. Possibilidade. Ilegitimidade passiva. PIS e Cofins-Importação. Base de cálculo. Valor aduaneiro. Restituição. Inadequação da via eleita. 1. Tratando-se de mandado de se-gurança preventivo, utilizado como sucedâneo de ação declaratória, é inaplicável o prazo decadencial previsto no art. 23 da Lei nº 12.016/2009. 2. O Inspetor-Chefe da Alfândega da Receita Federal do Brasil no Porto de Rio Grande/RS é autoridade ilegítima em relação ao pe-dido de compensação do indébito, o qual deverá ser postulado perante o Delegado da Receita Federal do Brasil com jurisdição sobre o domicílio tributário da impetrante, após prévio reco-nhecimento do direito creditório pela a autoridade aduaneira. 3. Segundo entendimento desta Corte e do egrégio STF, é inconstitucional a expressão ‘acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS incidente no desembaraço aduanei-ro e do valor das próprias contribuições’, contida no inc. I do art. 7º da Lei nº 10.865/2004, em sua redação original, porquanto desbordou do conceito corrente de valor adua neiro, violando o art. 149, § 2º, III, a, da Constituição. 4. Inviável o reconhecimento do direito da impetrante à restituição dos valores recolhidos indevidamente a título de PIS/Cofins--Importação, porquanto o mandado de segurança não se presta para a obtenção de efeitos patrimoniais pretéritos, os quais devem ser buscados pela via ordinária, consoante entendi-mento sumulado do e. STF (Súmulas nºs 269 e 271). 5. Sentença parcialmente reformada.” (TRF 4ª R. – AC 5003416-51.2015.404.7101 – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona – DJe 06.07.2016)

Transcrição Editorial• Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009:“Art. 23. O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado.”• Constituição Federal de 1988:“Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instru-mento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.[...]§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)[...]a) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)”• Súmulas do Supremo Tribunal Federal:“269 – O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança.”“271 – Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria.”

2553 – Complexo Portuário de Suape – empresa pública estadual – personalidade jurídica de direito privado – patrimônio público – posse indireta – usucapião – impossibilidade

“Direito constitucional. Direito processual civil. Recurso de agravo em face de decisão ter-minativa que negou seguimento ao recurso por sua manifesta improcedência. Sentença que

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julgou procedente o pedido da inicial para reintegrar à Suape, a posse do imóvel situado no Engenho Tiriri mediante pagamento de indenização. Valor de indenização justo. Recurso de agravo não provido. 1. Trata-se de Recurso de Agravo interposto contra decisão terminativa de minha lavra, proferida na Apelação Cível nº 0280473-1, na qual neguei seguimento ao recur-so, por sua manifesta improcedência, mantendo em todos os termos a sentença impugnada. A sentença proferida pelo Juízo da Vara da Fazenda Pública do Cabo de Santo Agostinho, julgou procedente o pedido da inicial para reintegrar à Suape, a posse do imóvel situado no Engenho Tiriri, no qual residia a recorrente, e condenou a Suape ao pagamento de uma indenização de R$ 19.680,00 (dezenove mil, seiscentos e oitenta reais) pelas construções e benfeitorias exis-tentes conforme laudo técnico elaborado por perito judicial. 2. Insurgindo-se contra a decisão terminativa de minha lavra, Eliete Maria Alves interpôs este Recurso de Agravo (fls. 298/302) argumentando, em suma, que havendo interesse do Incra a competência absoluta seria da Justiça Federal. Reitera os argumentos contidos em sua inicial e no recuso de apelação re-questando a retratação deste Relator, ou a apreciação do recurso pela 3ª Câmara de Direito Público. 3. Analisando os autos, percebe-se que, ao contrário do que alega a recorrente, o juiz prolator da sentença conduziu e concluiu toda a instrução do processo com audiências, apresentação de laudo pericial, prazo renovado para apresentação de quesitos e nomeação de assistente técnico pelas partes (fl. 135). Ademais é entendimento assente em nossos tribunais que não deve ser declarada nulidade processual quando não resultar prejuízo comprovado para a parte que a alega. 4. Da análise dos autos, percebe-se que o processo foi devidamente instruído, as partes tiveram oportunidade de apresentar suas defesas e impugnações nos mo-mentos processuais adequados. Com relação à suposta ausência de fundamentação válida alegada na peça recursal, restou evidente que se trata de mera irresignação da parte com o resultado do julgado que lhe foi desfavorável, uma vez que o princípio do livre convenci-mento motivado permite ao juiz afastar de sua análise elementos probatórios que considere irrelevantes, a exemplo de diligências desnecessárias ao esclarecimento dos fatos, a teor do art. 131 do Código de Processo Civil. 5. Desse modo, frisa-se que, o magistrado não está obrigado a rebater um a um os pontos levantados pelas partes em suas peças processuais. Destarte, as omissões apontadas pela apelante, na verdade, fazem parte da análise de mérito da ação e ao proferir a sentença, o juiz entendeu por bem não se manifestar sobre eles. Sendo assim, não há que se falar em nulidade da sentença, uma vez que ela foi bem fundamentada e decidiu de forma lógica. 6. No mais, a parte discorre novamente, excessivamente sobre os problemas sociais e a questão agrária advindos com a implantação do Complexo Portuário de Suape, mas resta evidente que sua irresignação é com o valor arbitrado como indeniza-ção pelas benfeitorias no valor de R$ 19.680,00 (dezenove mil, seiscentos e oitenta reais), embora, ao final, apenas requer que a ‘ação seja julgada improcedente’. 7. Com relação ao regime jurídico dos bens integrantes do patrimônio da Suape, temos que a Lei nº 7.763/1978 do Estado de Pernambuco criou a empresa pública estadual denominada Suape dotada de personalidade jurídica de direito privado, cujo fim é a implantação de complexo industrial portuário nas áreas delimitadas em decretos de declaração de utilidade ou necessidade pú-blica. Dessa forma fica caracterizada a afetação do bem em discussão, porquanto a empresa é prestadora de serviço público. Consequentemente, as terras em contenda não são passíveis de prescrição aquisitiva, conforme se depreende da leitura do art. 102, do Código Civil, qual seja, os bens públicos não estão sujeitos a usucapião. 8. Ademais, apesar de a Suape possuir personalidade jurídica de direito privado, a maioria de seu capital é de propriedade do Estado de Pernambuco e conforme a Lei Estadual nº 7.763/1978, apenas admite-se a participação de outras pessoas jurídicas de direito público interno, bem como entidades de administração indireta da União, denotando-se, portanto, que o patrimônio da apelada é totalmente público. Assim as áreas destinadas à sua implantação devem ser consideradas bens públicos em razão

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do significativo interesse coletivo que envolve, bem como pelo fato de que suas atividades são consideradas serviços públicos, uma vez que seu principal objetivo não é a obtenção de lucro, mas desenvolver a atividade portuária, conforme a lei acima referida que criou o Complexo Portuário. Diante de todos esses fatos não se pode negar que a posse da apelante era totalmen-te precária. Ademais, a posse direta da apelante não é suficiente para afastar a posse indireta de Suape, que pode reivindicá-la a qualquer tempo, desde que atendidos e observados os direitos dos possuidores de boa-fé, que é a situação da recorrente. 9. Observa-se que no caso dos autos, a apelante possuiu diretamente o sítio durante anos (mais de 5 anos sucedendo a posse do Sr. Amaro da Silva Costa), nele estabelecida com a sua família, sob o consentimento do primitivo proprietário do Engenho e mesmo após o negócio jurídico celebrado com Suape permaneceu naquela localidade. 10. No entanto, a discussão atualmente cinge-se ao valor da indenização. Na sentença o juiz de piso entendeu ser cabível a indenização calculada pelo perito judicial no valor de R$ 19.680,00 (dezenove mil, seiscentos e oitenta reais). No entanto, a apelante defende ser o valor irrisório, sem, contudo, declarar o valor que entende justo para indenização de suas benfeitorias. 11. Verifica-se que não assiste razão à recorrente. O laudo elaborado pelo perito judicial às fls. 63/67 trouxe registro fotográfico, levantamento de todas as partes da edificação ‘casa com 2 dois quartos sala, banheiro, cozinha com piso cimentado, coberta com telha canal, perfazendo uma área total de 82,0 m², com descrição em alvenaria e designação de uso residencial, com padrão de acabamento baixo, donde se con-clui que o valor médio do metro quadrado para construção em idênticas condições, de acordo com a Sinduscon/PE, deduzindo os percentuais de desvalorização, está estimado hoje em R$ 240,00 (duzentos e quarenta reais), incluindo mão de obra do profissional, serventes e gas-tos indiretos inerentes a obra’, e fundamentou o cálculo do valor das benfeitorias. 12. Logo, diante do que se apurou, conclui-se que, conforme entendeu o juiz de piso, o laudo pericial atendeu a todos os requisitos necessários para ser utilizado como parâmetro para o cálculo da indenização. Ademais, diante das benfeitorias encontradas e apuradas revela-se bastante razoável o valor total de R$ 19.680,00 (dezenove mil, seiscentos e oitenta reais) arbitrados na sentença. 13. Recurso de Agravo não provido.” (TJPE – Ag 0003584-43.2007.8.17.0370 – 3ª CDPúb. – Rel. Des. Alfredo Sérgio Magalhães Jambo – DJe 15.07.2016)

2554 – Contrato de afretamento – causa que versa sobre direito marítimo – tutela de urgên-cia – rescisão contratual – cobrança de multa – valor elevado

“Direito marítimo. Afretamento de embarcação. Rescisão contratual. Decisão agravada que deferiu a suspensão de cobrança de multa contratual e eventual compensação em outros contratos pactuados entre as partes. Alegação de incompetência absoluta do juízo empresarial e não preenchimento dos requisitos da tutela de emergência. Descabimento. Aplicação do princípio da função social e preservação da empresa. A controvérsia do presente recurso de agravo gira em torno da preliminar arguida de incompetência absoluta do juízo e, no mérito, pela falta de fundamentação dos requisitos autorizadores da tutela de urgência previstos no art. 300 do NCPC. Deve-se rechaçar a arguição de incompetência absoluta do juízo da vara empresarial calcada na falsa premissa de que o objeto da presente ação não versa sobre di-reito marítimo, mas sobre inadimplemento contratual, tema de competência das varas cíveis e não incluso no rol ‘taxativo’ do art. 50, antigo art. 90 do CODJERJ. Da leitura da petição inicial, verifica-se que na presente causa discutem-se cláusulas e obrigações decorrentes de um contrato de afretamento marítimo celebrado entre as partes. O referido contrato é instituto integrante do ramo da Ciência Jurídica a que se dá o nome de Direito Marítimo. Ademais, entendo se tratar de rol exemplificativo e não taxativo àquele previsto no art. 91, II, g, atual art. 50 do Código de Organização Judiciária, o que se extrai do termo ‘especialmente’ que consta do texto normativo. Quanto ao mérito, melhor sorte também não assiste à agravante,

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pois, compulsando os autos, constata-se que a cobrança de multa por inadimplemento contra-tual se estendeu além do prazo da solicitação de rescisão contratual requerida pela agravante. Tal fato, por si só, acarreta flagrante perigo de dano à parte autora/agravada, tendo em vista o alto valor cobrado pela ré. Eventual cobrança indevida de multa contratual poderá afetar seriamente o desenvolvimento da atividade empresarial da agravada, o que viola os princípios da função social e da preservação da empresa. Isto porque, ao contrário do que sustentou a agravante, a ora agravada demonstrou sim, em sua inicial, que a cobrança ilícita de multa contratual no valor de mais de 3 milhões de reais poderia comprometer o bom funcionamento de suas atividades e, principalmente, a manutenção de postos de trabalho e a remuneração de seus empregados (que chegam a quase 400 funcionários). Nesse contexto, embora impli-citamente demarcado na Constituição Federal de 1988 que inaugurou, nos termos do seu art. 170, caput, uma ordem econômica fundada na livre iniciativa e na valorização do tra-balho humano (o que demonstra, nitidamente, a importância da manutenção da empresa), importante enfatizar a mudança da perspectiva contratualista para a concepção instituciona-lista das empresas, após a edição da Lei nº 11.101/2005 (Lei de Recuperação e Falências). Cabe anotar, ainda, que o princípio da preservação da empresa não pode ter a sua aplicação restrita tão somente à superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, tal como poderia se concluir da leitura isolada do art. 47 da Lei nº 11.101/2005, mas também à ideia de função social da empresa e à capacidade econômica da sociedade empresária, relativa ao exercício da atividade empresarial, assumindo, assim, a feição de nítido limite aos abusos contratuais. Negado provimento ao recurso.” (TJRJ – AI 0020174-69.2016.8.19.0000 – 17ª C.Cív. – Relª Desª Flávia Romano de Rezende – DJe 01.07.2016)

Comentário EditorialO caso em questão trata de pedido de tutela de urgência relativo ao pagamento de valor por multa de rescisão de contrato de afretamento.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (“TJRJ”), primeiramente enfrentou a prelimi-nar de incompetência da vara empresarial. A competência da vara empresarial foi reconhecida para julgar causas que versem sobre direito marítimo, nos termos do art. 91, I, g do Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado do Rio de Janeiro – CODJERJ:

“Art. 91. Compete aos Juízes de Direito, especialmente em matéria de falências e concordatas:

I – processar e julgar:

[...]

g) as causas relativas a Direito Marítimo, especialmente nas ações: a. que envolverem indenização por falta, extravio, ou avarias, inclusive às relativas a sub-rogações; b. relativas à apreensão de embarcações; c. ratificações de protesto formado a bordo; d. relativas à vistoria de cargas; e. relativas à cobrança de frete e sobrestadia.”

No mérito, discutiu-se a presença dos requisitos da tutela de urgência nos termos do art. 300 do Novo Código de Processo Civil (“NCPC”), sob a seguinte redação:

“Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”

O TJRJ entendeu que os requisitos autorizativos da tutela de urgência não estavam presentes. Isso porque em uma primeira análise, a cobrança de multa pelo inadimplemento contratual, no valor de mais de R$ 3 milhões ultrapassaria o prazo do pedido de rescisão contratual. Tal situação por si somente é passível de causar danos à parte contrária, na hipótese de deferi-mento da tutela de urgência em valores superiores aos devidos.

Além disso, o TJRJ reconheceu o risco de comprometimento das atividades empresariais da parte, em violação aos princípios da preservação da empresa e da função social. Isso foi decidido com base na alegação da parte no sentido de que poderiam ser afetados os postos e os salários dos mais de 400 empregados da empresa, em prejuízo da atividade econômica desenvolvida livremente nos moldes do art. 170 da Constituição Federal.

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2555 – Contrato de arrendamento – aditivo – alteração do objeto do arrendamento inicial – anulação – outorga de terrenos estranhos à licitação – atos lesivos à moralidade administrativa e ao princípio da legalidade

“Direito administrativo. Processual civil. Interesse público/jurídico. Inexistência. Legitimação à causa. Ausente. Interesse econômico. Presente. Apelação improvida. Ausente o interesse público/jurídico autoral. A bem da verdade, a autora tem o interesse econômico em uma área aproximadamente de 27.000 m² no Porto de Santos. A autora pretende anular o referido 5º aditivo ao contrato de arrendamento entre a Codesp e a Tecondi celebrado em 30 de dezem-bro de 2002, que acabou por alterar o objeto do arrendamento inicial, incluindo área objeto de pedido de processo licitatório pela da autora. Nesse contexto, convém destacar algumas afirmações da Carlog: ‘Enfim, vê-se que a troca da área arrendada , além de beneficiar a Te-condi, causou graves danos aos interesses da União, visto que esta não mais viria a receber (ao final do arrendamento), as obras que a contratada (Tecondi) deveria realizar na área objeto da licitação – água).’ Diz também: ‘Como se sabe, a administração não pode fazer nada que não tenha calço na lei. Nos termos do que dispõe o art. 37, inciso XXI da Constituição Fede-ral, a Administração Pública direta e indireta (e aqui se incluem as sociedades de economia mista) da União, Estados, Distrito Federal e Municípios devem obediência, dentre outros, ao princípio da licitação pública.’ Em face, dentre outros, de tais fatos/circunstâncias, res-tou por aforada em 11.09.2002 a devida Ação Popular distribuída nº 2005.61.04.002925-5, sob os seguintes fundamentos: ‘[...] Argumenta a impossibilidade jurídica da cessão dos imó-veis portuários em razão dessas áreas constituírem o complexo portuário de Santos, de titu-laridade exclusiva da União, e serem afetadas a um serviço público do qual não podem ser desviadas, o que exclui dos poderes atribuídos à Codesp e a seus dirigentes, também corréus, a prática de tal ato. Conclui, portanto, que o ato está eivado de ilegalidade, por diminuir subs-tancialmente as obrigações assumidas pela Tecondi, por extrapolar dos limites estatutários da autarquia federal, e porque a transferência da área à Tecondi impede que outras empresas disputem o certame para o arrendamento portuário. Sustenta que tais irregularidades têm origem comum no interesse da arrendatária Tecondi de desobrigar-se dos altos investimentos previstos no contrato de arrendamento e pleitear o uso de áreas mais vantajosas e menos dis-pendiosas para o início das operações portuárias. Narra que a partir da assinatura do contrato PRES/028.98 advieram uma série de concessões de áreas à Tecondi não incluídas no edital, além de dilações de prazo para cumprimento de obrigações pela arrendatária, em indevido favorecimento desta. Aduz que a pretensa cessão à Prefeitura e a outorga de terrenos estra-nhos à licitação para a Tecondi configuram atos lesivos à moralidade administrativa e ao princípio da legalidade, por violar disposições normativas contidas na Constituição Federal (art. 37, XXI) e legislação infraconstitucional (Lei nº 8.666/1993, arts. 40, § 2º, III, 41, caput, 54, § 2º e 55, I). [...]’ Na referenciada ação popular se procedeu à apreciação relativa à cele-bração do 5º Termo Aditivo formulado entre a Codesp e a Tecondi. Transcrevo: ‘[...] Os fatos narrados nestes autos fortalecem o entendimento de que se trata de hipótese de exigibilidade de licitação, do que não se olvidou o Conselho de Autoridade Portuária (CAP) quando, na véspera da deliberação da Diretoria da Codesp impugnada pelos autores populares, assentou que ‘tendo em vista os vários questionamentos que chegaram a este conselho envolvendo o Terminal em referência, e visando o bom andamento para tal tema, vimos recomendar a essa Companhia que todas as ações envolvendo o contrato em questão mantenham a isonomia comercial em relação às demais empresas do Porto de Santos, conforme previsto no item VI do § 1º do art. 30 da Lei nº 8.630/1993’. Referida recomendação, oriunda de manifesto interesse da empresa ‘Cargolog’ (fl. 3.856), foi, todavia, comunicada à Codesp somente no dia seguinte à assembleia de sua Diretoria, embora antes da assinatura do último aditivo ao contrato de arrendamento. Por esses motivos não assiste razão aos réus ao sustentar a permuta

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das áreas com fundamento nos arts. 17, 24, 58 e 65 da Lei de Licitações (Lei nº 8.666/1993). O art. 17, I, c, daquele diploma legal refere-se à permuta atinente a alienações de bens imóveis pela Administração, situação distinta da verificada in casu, e pressupõe prévia avaliação dos bens em questão, o que não se resume a comparar a ‘metragem’ dos imóveis trocados, como insiste a ré Tecondi para justificar prejuízos particulares, com deliberada omissão dos réus, diga-se a propósito, do fato de que restaria para a arrendatária, no futuro, a cessão de novas áreas (não especificadas) até completar os 170.000 metros quadrados inicialmente arrendados (Cláusula 2ª do Quinto Aditamento). Esta condição, registre-se, trata-se de verdadeiro ‘cheque em branco’ emitido em favor da Tecondi para lograr o arrendamento de área cujo valor e importância serão relevados apenas no futuro e por instrumentos incertos. [...]’ Em consulta ao sistema informatizado desta Corte, verifico que a Ação Popular nº 2005.61.04.002925-5 foi julgada pela 1ª Vara Federal de Santos, cuja r. sentença de procedência disponibilizada no Diário Eletrônico em 30.07.2012 foi confirmada pelo v. Acórdão exarado em 26.02.2015 pela Sexta Turma desta Corte Regional. Na ação popular o pedido foi julgado procedente, com resolução de mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC de 1973, para, declarar a nuli-dade da licitação nº 06/1997 – PROAPS 13 e dos respectivos aditivos. Atente-se, até mesmo, ao fenômeno do caráter prejudicial do julgamento da Ação Popular nº 2005.61.04.002925-5 em face das razões contidas neste processo. Por pertinente, o fato do C. STJ em Suspensão de liminar e de sentença nº 1335/SP – originária dos autos de nº 0010874-75.2002.4.03.6104 em apenso à ação popular (fls. 4.141/4.156 daqueles autos) –, ter determinado a suspensão dos atos constritivos da sentença popular, até o seu trânsito em julgado, para evitar solução de continuidade do serviço portuário. De ser confirmada, in totum, a r. sentença a quo me-diante a qual o processo restou por extinto, sem julgamento de mérito, à vista da ausência de interesse jurídico autoral ensejador de sua legitimação, pois evidenciado somente o interesse econômico, bem assim levada em conta a inadequação da via eleita, a qual se eventualmente instrumentalizada, a autora não tem legitimidade ao exercício do direito subjetivo relaciona-do. Apelação improvida.” (TRF 3ª R. – AC 0003328-32.2003.4.03.6104 – 4ª T. – Relª Desª Fed. Mônica Nobre – DJe 18.07.2016)

Transcrição Editorial• Constituição Federal de 1988:“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impes-soalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)[...]XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alie-nações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. (Regulamento)”• Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993:“Art. 41. A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada.[...]Art. 54. Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado.[...]§ 2º Os contratos decorrentes de dispensa ou de inexigibilidade de licitação devem atender aos termos do ato que os autorizou e da respectiva proposta.

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Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:I – o objeto e seus elementos característicos;

Observação Editorial - Posição “contra” (alegações vencidas)“Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:I – quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos: [...]c) permuta, por outro imóvel que atenda aos requisitos constantes do inciso X do art. 24 desta Lei; [...]Art. 24. É dispensável a licitação: [...]Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Admi-nistração, em relação a eles, a prerrogativa de:I – modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado;II – rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei; III – fiscalizar-lhes a execução;IV – aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste;V – nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo.§ 1º As cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos administrativos não pode-rão ser alteradas sem prévia concordância do contratado.§ 2º Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual.Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: I – unilateralmente pela Administração:a) quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação téc-nica aos seus objetivos; b) quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou dimi-nuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei;II – por acordo das partes:a) quando conveniente a substituição da garantia de execução;b) quando necessária a modificação do regime de execução da obra ou serviço, bem como do modo de fornecimento, em face de verificação técnica da inaplicabilidade dos termos contra-tuais originários; c) quando necessária a modificação da forma de pagamento, por imposição de circunstâncias supervenientes, mantido o valor inicial atualizado, vedada a antecipação do pagamento, com relação ao cronograma financeiro fixado, sem a correspondente contraprestação de forneci-mento de bens ou execução de obra ou serviço; d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do con-trato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)

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§ 1º O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equi-pamento, até o limite de 50% (cinquenta por cento) para os seus acréscimos.§ 2º Nenhum acréscimo ou supressão poderá exceder os limites estabelecidos no parágrafo anterior, salvo: (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998)I – (Vetado) (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)II – as supressões resultantes de acordo celebrado entre os contratantes. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)§ 3º Se no contrato não houverem sido contemplados preços unitários para obras ou serviços, esses serão fixados mediante acordo entre as partes, respeitados os limites estabelecidos no § 1º deste artigo.§ 4º No caso de supressão de obras, bens ou serviços, se o contratado já houver adquirido os materiais e posto no local dos trabalhos, estes deverão ser pagos pela Administração pelos custos de aquisição regularmente comprovados e monetariamente corrigidos, podendo caber indenização por outros danos eventualmente decorrentes da supressão, desde que regular-mente comprovados.§ 5º Quaisquer tributos ou encargos legais criados, alterados ou extintos, bem como a super-veniência de disposições legais, quando ocorridas após a data da apresentação da proposta, de comprovada repercussão nos preços contratados, implicarão a revisão destes para mais ou para menos, conforme o caso.§ 6º Em havendo alteração unilateral do contrato que aumente os encargos do contratado, a Administração deverá restabelecer, por aditamento, o equilíbrio econômico-financeiro inicial.§ 7º (Vetado)§ 8º A variação do valor contratual para fazer face ao reajuste de preços previsto no próprio contrato, as atualizações, compensações ou penalizações financeiras decorrentes das condi-ções de pagamento nele previstas, bem como o empenho de dotações orçamentárias suple-mentares até o limite do seu valor corrigido, não caracterizam alteração do mesmo, podendo ser registrados por simples apostila, dispensando a celebração de aditamento.”

2556 – Dano ambiental – canal do Porto de Santos – erosão da orla da praia – operação de dragagem – relação entre os fatos – não demonstração

“Agravo de instrumento. Ação civil pública. Dano ambiental. Canal do Porto de Santos. Ero-são. Operação de dragagem. Não demonstrada relação entre os fatos. Os documentos acosta-dos aos autos, a priori, demonstram que não há relação direta entre a alegada erosão da orla da praia de Santos e o aprofundamento do canal do Porto da referida cidade. Sem a produção de prova pericial, seria prematura a alteração dos critérios técnicos. Agravo de instrumento a que se nega provimento.” (TRF 3ª R. – AI 0028429-30.2015.4.03.0000 – 4ª T. – Rel. Juiz Fed. Conv. Marcelo Guerra – DJe 03.08.2016)

2557 – Desembaraço aduaneiro – abandono de carga pelo importador – retenção de contê-iner – descabimento

“Direito administrativo. Remessa necessária. CPC/1973. Mandado de segurança. Desemba-raço aduaneiro. Abandono de carga pelo importador. Retenção de contêiner. Descabimento. 1. A sentença concedeu a segurança para determinar a devolução do contêiner TCNU 955.422-5 à empresa-impetrante, fundada em que as irregularidades da mercadoria trans-portada ou do procedimento de liberação não podem afetar a utilização do contêiner de pro-priedade da impetrante, pena de coibir o desenvolvimento e continuidade de suas atividades. 2. Os dirigentes dos terminais alfandegários são depositários e executores das ordens da Se-cretaria da Receita Federal, órgão despersonalizado e hierarquicamente vinculado ao Minis-tério da Fazenda, que administra a destinação das mercadorias apreendidas. A responsabi-lidade pelo esvaziamento do contêiner é do Poder Público, que deve liberar a unidade de carga. Aplicação dos Decretos nºs 1.910/1996 e 6.759/2009. 3. A delegação de competência ao recinto alfandegado para o procedimento de desunitização das mercadorias objeto de

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apreensão (OS 4, de 17.10.2006) não exclui a responsabilidade do Inspetor da Alfândega do Porto do Rio de Janeiro de desunitizar contêineres. 4. O contêiner não é acessório da mercadoria transportada, e por isso não se sujeita à pena de perdimento, sendo indevida a retenção das unidades de carga de propriedade da empresa de navegação marítima, a teor do art. 24, parágrafo único, da Lei nº 9.611/1998. 5. Remessa necessária desprovida.” (TRF 2ª R. – Reex 0502548-44.2015.4.02.5101 – 6ª T.Esp. – Relª Desª Fed. Nizete Lobato Carmo – DJe 20.07.2016)

2558 – Desembaraço aduaneiro – desunitização de carga e devolução de contêiner – mer-cadorias – abandono – perdimento – contêiner – propriedade de sociedade de trans-porte marítimo – retenção – impossibilidade

“Administrativo. Desembaraço aduaneiro. Desunitização de carga e devolução de contêiner. Aplicação da penalidade de perdimento das mercadorias transportadas em razão de aban-dono pelo importador. Contêiner de propriedade de sociedade de transporte marítimo. Re-tenção. Impossibilidade. Desprovimento da remessa necessária. 1. A controvérsia instaurada nos autos cinge-se em verificar a legalidade ou não do ato perpetrado pelo Inspetor-Chefe da Receita Federal no Porto de Itaguaí, consistente na retenção do contêiner de propriedade da impetrante, sociedade do ramo de transporte marítimo, em razão do abandono das mercado-rias transportadas contidas em seu interior pelo importador. 2. Da leitura dos arts. 642 e 689, do Decreto nº 6.759/2009, constata-se que, não cumpridas as exigências legais pelo importa-dor, os bens importados são retidos pela autoridade aduaneira, sujeitando-se a procedimento administrativo fiscal para aplicação da penalidade de perdimento, de modo que a guarda e ar-mazenamento de tais mercadorias passa a ser atribuição da administração pública. 3. O con-têiner possui como finalidade a realização de transporte de cargas, não se confundindo com a própria carga ou com a embalagem das mercadorias transportadas, de maneira que não há que falar em identidade entre o contêiner e sua carga, tampouco em existência de relação de acessoriedade entre eles, conforme se depreende do disposto no art. 24, da Lei nº 9.611/1998. 4. Mostra-se, pois, ilegal a conduta da autoridade impetrada em penalizar o proprietário da unidade de carga, com a retenção do equipamento, uma vez que a infração foi cometida pelo proprietário da mercadoria importada, devendo apenas este último sujeitar-se aos pre-juízos decorrentes do abandono de carga. 5. Remessa necessária desprovida.” (TRF 2ª R. – Reex 0079749-72.2015.4.02.5101 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Firly Nascimento Filho – DJe 11.07.2016)

2559 – Direito marítimo – zonas de praticagem – área de abrangência – redefinição

“Processual civil. Administrativo. Agravo de instrumento. Mandado de segurança. Direito ma-rítimo. Zonas de praticagem. Área de abrangência. Redefinição. Segundo a redação do art. 1º da Lei nº 12.016/2009, cabe mandado de segurança para a proteção de direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente, ou com abuso de poder, alguém sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, podendo o juiz conceder a liminar se atendidos os requisitos previstos no art. 7º, III, do citado diploma legal. Hipótese em que não restou evidenciada a urgência ou risco de perecimen-to do direito a recomendar a concessão da medida liminar, devendo ser ressaltado que o prejuízo econômico ou patrimonial, por si só, não é apto a configurar o periculum in mora. Precedentes desta Corte.” (TRF 4ª R. – AI 5019310-93.2016.404.0000 – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Ricardo Teixeira do Valle Pereira – DJe 29.07.2016)

2560 – Embarcação – afretamento a casco nu – ausência de transferência da titularidade – ICMS – incidência – descabimento

“Embargos de declaração. Apelação cível. Mandado de segurança. Embarcação. Afretamento a casco nu. Ausência de transferência da titularidade. Incidência de ICMS. Descabimento.

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Tese de simulação sustentada pelo recorrente e, por conseguinte, a eventual aplicabilidade da regra inserta no parágrafo único do art. 116 do CTN, é questão atinente ao mérito da deman-da, tendo sido, por isso, rejeitada pelo i. magistrado sentenciante como preliminar. Impetrado que não logrou comprovar a alegada tese de simulação, inexistindo elementos aptos a de-monstrarem que a locação do navio ocorreu entre empresas do mesmo grupo econômico. O fato de ser exigível ao impetrante a prova pré-constituída no Mandado de Segurança não é im-peditivo para que o ente comprove a alegada tese por ele levantada acerca da simulação. Ine-xistência de vícios no julgado. Embargos declaratórios rejeitados.” (TJRJ – Ap-Reex 0216293-15.2007.8.19.0001 – 2ª C.Cív. – Relª Desª Elisabete Filizzola Assunção – DJe 15.07.2016)

Transcrição EditorialCódigo Tributário Nacional:“Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e exis-tentes os seus efeitos:[...]Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (Incluído pela LCP 104, de 10.01.2001)”

2561 – Estivador – acidente típico – nexo causal – reconhecimento – auxílio-doença aciden-tário – valores em atraso – IPCA-E – incidência

“Acidentária. Estivador. Acidente típico. Lesão no membro superior esquerdo. Nexo causal reconhecido. Redução parcial e permanente da capacidade laborativa. Conversão do auxílio--doença previdenciário em seu homônimo acidentário, sem vantagem pecuniária. Auxílio--acidente devido a partir do dia seguinte ao da alta médica. Valores em atraso que devem ser atualizados mês a mês. Incidência do IPCA-E a partir da elaboração da conta de liquidação. Juros moratórios devidos desde a citação, de forma englobada sobre o montante até aí apura-do e, depois, mês a mês, de modo decrescente. Aplicação do art. 5º da Lei nº 11.960/2009, porém apenas no que concerne aos juros, ante o resultado do julgamento da ADI 4.357 pelo STF. Honorários advocatícios fixados segundo a orientação da Súmula nº 111, do STJ. Recurso oficial parcialmente provido.” (TJSP – Reex 1022446-55.2014.8.26.0562 – 16ª CDPúb. – Rel. Des. Cyro Bonilha – DJe 18.07.2016)

2562 – Hidrovia Paraná-Tietê – normas de licenciamento de obras de relevante impacto ambiental – observância – Ibama – competência – estudo de impacto ambiental – relatório de impacto ambiental – necessidade

“Ação civil pública. Hidrovia Paraná-Tietê. Observância das normas de licenciamento de obras de relevante impacto ambiental. Nulidade da sentença por extra petita. Incompetência da Justiça Federal de Umuarama. Ilegitimidade da União. Ilegitimidade da Cesp. Licencia-mento ambiental das obras de engenharia no Rio Paraná visando a fomentar o transporte aquaviário. Competência do Ibama. Necessidade de estudo de impacto ambiental e respec-tivo relatório de impacto ambiental. A sentença não é extra petita porque o pedido inicial é mais específico e assim engloba as demais medidas necessárias para que sejam devidamente observadas as normas de licenciamento para as obras em questão, entre as quais a obriga-ção de não fazer estabelecida na sentença. As preliminares de incompetência da Subseção Judiciária de Umuarama e de ilegitimidade passiva da União foram enfrentadas pelo juízo de origem e pela Turma, restando superadas neste feito. A Companhia Energética de São Paulo – Cesp tem legitimidade para responder a ação porque há pedido na inicial direcionado a ela e porque foi apontada como responsável por várias obras para a implementação da navegação nos Rios Paraná e Tietê, tal como a construção da eclusa na barragem da Usina Hidrelétrica

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de Jupiá. Ao Ibama compete analisar os pedidos de licenciamento ambiental para obras de en-genharia relacionadas ao fomento do transporte aquaviário, considerando toda a extensão da hidrovia, porque essas obras, mesmo que se entenda sejam de pequeno porte se consideradas isoladamente, devem ser examinadas à luz de toda a hidrovia e de todas as intervenções já sofridas naquele meio ambiente, enquadrando-se então no art. 10, § 4º, da Lei nº 6.938/1981 (‘no caso de atividades e obras com significativo impacto ambiental, de âmbito nacional ou regional’). Diante da impossibilidade de se avaliar todas as obras em conjunto num mesmo processo de licenciamento, a solução encontrada para o caso é de padronizar os processos de licenciamento, tratando todos como ‘obra ou atividade potencialmente causadora de signifi-cativa degradação do meio ambiente’ (art. 225, § 1º, IV, da CF/1988), o que se justifica neste caso devido ao fato de o Rio Paraná já ter sofrido consideráveis intervenções, principalmente pelas Hidrelétricas Itaipu Binacional e de Porto Primavera. É importante que os reflexos de cada pedido isolado sejam sopesados pelo Ibama a partir do estudo mais aprofundado pos-sível, como é o caso do EIA/Rima, porque nele será avaliada a situação global da hidrovia. Incumbe aos réus a obrigação de não realizar, por conta própria, por seus entes e órgãos, ou por delegação, permissão, concessão ou autorização a terceiros, inclusive particulares, obras de engenharia no Rio Paraná (inclusive nos reservatórios), para fomentar o transporte aquavi-ário, sem antes obter do Ibama o competente Licenciamento Ambiental, o qual somente pode ser concedido após criteriosa análise de Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente (EIA/Rima). Sentença mantida.” (TRF 4ª R. – Ap-Reex 5001163-66.2010.4.04.7004 – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Cândido Alfredo Silva Leal Junior – DJe 31.03.2016)

Comentário EditorialLegalmente o licenciamento ambiental está definido como:Resolução nº 237, de 19 de dezembro de 1997:[...]Art. 1º Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições:I – Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental com-petente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e ativi-dades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso. [...].Diversos autores definem como sendo ato complexo com diversas etapas e tendo como objeti-vo final a obtenção das licenças, sejam elas a prévia, de instalação ou de operação1.As atitudes “ambientais”, teoricamente em prol da defesa do meio ambiente, chegam a extre-mos como a proibição de estudos prévios, encontrando guarida nas decisões judiciais, o que tem impedido, por exemplo, a instrução de pedidos de autorização ao Congresso Nacional para as intervenções em áreas indígenas (atendimento ao § 3º do art. 231 da Constituição Federal), criando-se uma retroalimentação entre os dois pontos de paralisação do desenvolvi-mento hidroviário2.O próprio tempo de tramitação do processo sob liminar tem se transformado em obstáculo que se tem imposto ao desenvolvimento hidroviário, bem como a falta de compreensão e desres-peito aos princípios e normas que parametrizam uso múltiplo das águas, resultam em grande confusão às linhas gerais do planejamento, chegando a um anticlímax programático para

1 Para maiores informações, ver, por exemplo, Licenciamento ambiental e responsabilidade empresarial de Talden Queiroz Farias disponível em http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/26881-26883-1-PB.pdf.

2 Uma questão importante foi abordada no Agravo de Instrumento nº 602.244/MT (2004/0069892-8), o cabi-mento dos recursos processuais previstos na Lei nº 8.437/1992 contra liminares eventualmente concedidas. Destaque-se o embate entre o possível dano ambiental e o certo dano à economia e à segurança públicas, conforme prevê o art. 4º da referida Lei.

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pretendida revisão da matriz de transportes brasileira (o PNLT, antes de sua revisão de 2012 pretendia triplicar a participação do modal hidroviário na matriz brasileira de transportes).Entre os pontos de atraso no desenvolvimento hidroviário nacional, tema que é suscitado pela presente decisão devem ser citados os seguintes: a) a aplicação inadequada do princípio da precaução, b) a necessidade já suscitada em alguns momentos processuais de “licenciamento de hidrovia inteira” e, c) frequentes excessos do Ibama, como, por exemplo, a situação em que após formalizar a autorização para instalação de placas de balizamento fixas na margem aplicou multa, iniciando-se processo judicial para anulação desta, baixado há pouco3.Um primeiro exemplo de radicalismo pode ser constatado nas decisões que determinaram, por exemplo, em um primeiro momento, a impossibilidade de aumento do fluxo na Hidrovia Tietê--Paraná em ação civil pública proposta contra o desenvolvimento da hidrovia, observando-se ainda pedidos e decisões impossíveis juridicamente, como o licenciamento de toda hidrovia dentre outros4.Embora não se possa afirmar peremptoriamente que é o caso da presente apelação ora co-mentada, verificou-se através de diversos estudos e auditorias5 que muitas vezes os órgãos ambientais nem mesmo sabem o que deve ser, ou o que de fato é objeto de licenciamento, com duas consequências paralisantes ao desenvolvimento das vias de navegação interior: a demora excessiva do licenciamento ambiental e a transmissão da falta de clareza na compreensão acerca do licenciamento à instrução probatória pericial nos processos judiciais abertos contra a ampliação e manutenção da navegabilidade em diversas bacias hidrográficas brasileiras em grande parte devido à falta de um background técnico ou tecnológico robusto, consistente e confiável tanto no executivo como no judiciário.Apenas de modo ilustrativo, destaca-se que os itens que compõem os passos de aplicação do princípio da prevenção são: mapeamento e inventário, ordenamento territorial, licenciamento ambiental, fiscalização e monitoramento e auditoria periódica, conforme os Princípios 14, 15, 17 e 18 da Carta de 1972, produzida na Conferência de Estocolmo e Princípios 4, 8, 11, 14 17, 18 e 19 da Carta de 1992 (produzida na Conferência do Rio de Janeiro).Se fosse o caso de aplicação automática do princípio da precaução, como parece ser a posição da Turma, de um modo um pouco obscurantista, como é que os países desenvolvidos teriam desenvolvido extensos e intensos sistemas de navegação interior?Veja-se, como exemplo da demora que antecipa condenação, em outra Ação Civil Públi-ca sobre a mesma hidrovia (JFPR: Ação Civil Pública nº 9850105275/PR, distribuída em 17.02.1998), em que o Ministério Público Estadual do Paraná e o Ministério Público Federal, em litisconsórcio ativo, impugnaram o desenvolvimento da Hidrovia Paraná-Tietê em processo que vem se arrastando por uma década apenas na 1ª instância.Observa-se na ementa do Acórdão da Ap-Reex 5001163-66.2010.4.04.7004 algum avanço diante de posicionamento bem mais complicados, como o da ACP de 1998 citada anterior-mente onde ficou patente a impossibilidade jurídica do segundo pedido:Seja julgada procedente a ação6 e condenados os réus (União Federal, Companhia Energética de São Paulo – Cesp e Companhia Docas do Estado de São Paulo – Codesp) a elaborarem, nos termos da legislação vigente, Estudo de Impacto Ambiental relativo à implantação da Hidro-via Paraná-Tietê, considerada toda a extensão do território brasileiro afetado. (Grifos nossos)Vê-se, por fim, retomando o tema na amplitude em que deve ser analisado, o eventual impacto de uma intervenção, que a maioria dos magistrados tem tratado o atraso no desenvolvimento de importantíssimo modal de transporte como mero detalhe, reproduzindo a visão reducionista de grande parte dos ambientalistas conformando um tipo de ambientalismo chamado por Fre-derico Bussinger de “Ambientalismo Anti-ambiental” no qual se leva em conta apenas o impac-to imediato e concreto para a tomada de decisões, ignorando as dimensões regional e global em relação aos efeitos que o desenvolvimento do modal hidroviário traria, como, por exemplo,

3 Esses pontos estão desenvolvidos no 25º número desta Revista no artigo O Direito (em suas Diversas Mani-festações) como Limite ao Desenvolvimento das Vias Navegáveis Interiores.

4 JFPR, Ação Civil Pública nº 9850105275/PR.5 Como, por exemplo, o Acórdão nº 351/2003-TCU-Plenário, que traz o resultado de realização de auditoria

sobre o Programa de Manutenção de Hidrovias.6 Observa-se inclusive erro comum entre estudantes de graduação em direito: pedir que seja procedente a ação

ao invés de pedir pela procedência dos pedidos feitos na inicial.

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menor consumo de recursos naturais (energia), economia, diminuição da sobrecarga do modal rodoviário, dentre inúmeros outros efeitos benéficos que resultam em ganhos ambientais muito maiores que os impactos isolados no desenvolvimento das hidrovias.

2563 – Importação – livros infantis – classificação tarifária – interrupção do despacho aduaneiro – restrição do conceito de livro para fins de imunidade – impossibilidade

“Tributário. Importação. Livros infantis. Classificação tarifária. Interrupção do despacho aduaneiro. Despesas de armazenagem e demurrage. 1. A mercadoria importada não pode ser considerada como um jogo de quebra-cabeças propriamente dito, por se tratar de livro infantil acompanhado do referido brinquedo. Sobre o tema, já decidiu o E. STF que não cabe à autori-dade fazendária realizar juízo sobre o conteúdo e o valor cultural da publicação, ressaltando a inexistência de qualquer ressalva no Texto Constitucional que permita a restrição do conceito de livro para fins de imunidade. Precedente. 2. Comprovado o equívoco da Receita Federal na classificação da mercadoria importada pela autora, resta confirmada a procedência do feito. Precedentes desta Corte.” (TRF 4ª R. – Ap-Reex 5012796-77.2015.404.7205 – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona – DJe 09.06.2016)

2564 – Importação – registro da DI – pena de perdimento – regulamento aduaneiro – arts. 71, III, e 250, do Decreto nº 6.759/2009 – tributos incidentes – restituição – deferimento

“Aduaneiro e tributário. Importação. Pena de perdimento aplicada após o registro da DI. Regulamento aduaneiro. Arts. 71, III, e 250, do Decreto nº 6.759/2009. Restituição de tribu-tos incidentes na operação. Deferimento. 1. A decretação da pena de perdimento afasta da incidência do imposto de importação e a Cofins-Importação e o PIS-Importação, consoante o disposto no art. 1º, § 4º, III, do Decreto-Lei nº 37/1966 e art. 2º, III, da Lei nº 10.865/2004, e arts. 71, III, e 250, ambos do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009). 2. O fato gera-dor do imposto de importação é a entrada da mercadoria no território nacional. Assim, ainda que a pena de perdimento tenha sido aplicada antes do registro da Declaração de Importação, há ocorrência do fato gerador já ocorreu, o que torna irrelevante perquirir se a pena de per-dimento foi aplicada antes ou depois da DI.” (TRF 4ª R. – AC 5014871-25.2015.404.7000 – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona – DJe 10.06.2016)

Comentário EditorialA pena de perdimento é um confisco decretado por meio de ato administrativo ou sentença. Trata-se de uma pena que consiste na perda ou privação de bens do particular em favor do Estado. Esta sanção é muito comum muito na importação de bens do exterior, quando se configuram as hipóteses descritas no art. 105 do Decreto-Lei nº 37/1966.Ocorre que, quando a pena de perdimento é aplicada, tornam-se inexigíveis os tributos inciden-tes sobre operação de importação. Desta forma, se o contribuinte desembolsou os valores de tributos pode reavê-los por meio de restituição, ou compensação com outros tributos federais.Isso fica claro da leitura do art. 1º, § 4º, inciso III do Decreto-Lei nº 37/1966, que tem o seguinte teor:“Art. 1º O Imposto sobre a Importação incide sobre mercadoria estrangeira e tem como fato gerador sua entrada no Território Nacional.[...]§ 4º O imposto não incide sobre mercadoria estrangeira:[...]III – que tenha sido objeto de pena de perdimento, exceto na hipótese em que não seja locali-zada, tenha sido consumida ou revendida.”A exceção à regra ocorre apenas quando a mercadoria estrangeira, objeto da pena de perdi-mento não é encontrada, ou é consumida, ou revendida.

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Por outro lado, o PIS e a Cofins incidentes sobre as operações de importação também devem ser restituídos ou compensados no caso de aplicação de pena de perdimento, nos termos do art. 2º, III da Lei nº 10.864/2004:“Art. 2º As contribuições instituídas no art. 1º desta Lei não incidem sobre:[...]III – bens estrangeiros que tenham sido objeto de pena de perdimento, exceto nas hipóteses em que não sejam localizados, tenham sido consumidos ou revendidos;”Portanto, em relação ao Imposto de Importação entendo ser simples sua recuperação pela via administrativa, na qual a hipótese de não incidência é clara. No entanto havendo resistência na restituição administrativa, de rigor o ajuizamento de ação judicial, nos termos da decisão supramencionada.

2565 – Imposto de Importação – valor aduaneiro – despesas incorridas após a chegada ao porto – art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira – rol de elementos acrescido ao preço da mercadoria – inocorrência

“Embargos infringentes. Tributário. imposto de importação. Valor aduaneiro. Despesas in-corridas após a chegada ao porto. Art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira. Regulamento aduaneiro. Ilegalidade do § 3º do art. 4º da Instrução Normativa SRF nº 327/2003. 1. A inter-pretação sistemática da legislação permite concluir que a expressão ‘até o porto’ não abarca as despesas com movimentação das mercadorias após a atracação do navio no porto nacio-nal. 2. A liberdade conferida pelo item 2 do art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira a cada Estado Membro para definir o que pode ser incluído ou excluído no valor aduaneiro limita-se aos gastos relativos ao carregamento, descarregamento e manuseio associados ao transpor-te das mercadorias importadas até o porto ou local de importação. O art. 77 do Decreto nº 6.759/2009, por sua vez, está em consonância com o Acordo de Valoração Aduaneira, estabelecendo que integram o valor aduaneiro apenas as despesas ocorridas até a chegada da mercadoria no porto de destino ou local de importação. 3. O art. 40, § 1º, inciso I, da Lei nº 12.815/2013 (Lei dos Portos), ao conceituar capatazia, trata de procedimentos posteriores à chegada da mercadoria no porto, cujos custos não podem ser incluídos na composição do valor aduaneiro para fins de incidência do imposto de importação. 4. O § 3º do art. 4º da Instrução Normativa SRF nº 327/2003, ao ampliar a base de cálculo do imposto de importa-ção, excedeu o limite meramente regulamentar, incorrendo em ilegalidade. 5. Não procede o argumento de que, enquanto não ocorrer o desembaraço aduaneiro da mercadoria ou a sua nacionalização, os gastos relativos à descarga, ao manuseio e ao transporte no porto de destino são componentes do valor da mercadoria. Com efeito, o item 1 do art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira não arrola as despesas com movimentação das mercadorias após a atracação do navio no porto nacional entre os elementos acrescidos ao preço das mercadorias importadas.” (TRF 4ª R. – EINF 5002639-57.2015.404.7201 – 1ª S. – Rel. Des. Fed. Amaury Chaves de Athayde – DJe 15.07.2016)

2566 – Incêndio em tanque de combustível – acesso ao porto – bloqueio – indenização – desprovimento

“Apelação cível. Responsabilidade civil. Indenização. Incêndio em tanque de combustível. Empresa localizada na cidade portuária de Santos. Autores caminhoneiros que pretendem o recebimento de lucros cessantes em razão da paralisação das atividades enquanto houve o combate ao incêndio, que durou nove dias. Sentença de improcedência que merece ser confirmada. Ausência de nexo causal. Acesso ao porto que ficou bloqueado aos caminhões e depois às vias urbanas por determinação da administração pública, por medida de segurança. Ademais, é notória a falta de logística de transporte e das vias públicas que margeiam o Por-

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to de Santos. Recurso desprovido (Voto 10440).” (TJSP – Ap 1012050-82.2015.8.26.0562 – 8ª CDPriv. – Rel. Des. Silvério da Silva – DJe 05.08.2016)

Transcrição EditorialLei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.[...]Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”

2567 – Incêndio em terminal – poluição das águas do estuário de Santos – pesca – inexistên-cia de prova de dano efetivo – região degradada – recurso improvido

“Cerceamento de defesa. Inocorrência. Matéria dos autos que permitiu ao juiz o julgamento antecipado da lide. Suficiência dos elementos dos autos para o julgamento da ação. Devido processo legal observado na íntegra. Juiz que é destinatário da prova, incumbindo-lhe o de-ver de velar pela rápida solução do litígio, indeferindo as diligências inúteis (arts. 125, II e 130 do CPC). Sistema da livre apreciação da prova ou da persuasão racional adotado pelo direito processual pátrio (art. 131, do CPC). Preliminares afastadas. Legitimidade. Pretensão de reconhecimento da legitimidade passiva das Empresas Ultracargo e Ultrapar. Rés figuraram no polo passivo da demanda, que foi julgada improcedente em relação a elas. Regularidade da atividade exercida pelo apelante. Matéria que não constituiu fundamento para a rejeição da pretensão. Pedidos não conhecidos. Apelação cível. Ação de indenização. Ocorrência de incêndio em terminal administrado pela coapelada Tequimar, com consequente poluição das águas do estuário de Santos e lagos contíguos. Alegação do apelante de que teria sofrido prejuízo na sua atividade de pescador artesanal. Inexistência de prova de dano efetivo. Local descrito conhecido por ser região degradada em razão de ocupação irregular em área de man-gue e intenso trânsito de embarcações. Situação que implicava a contaminação do ambiente marítimo e inviabilizava a prática de pesca artesanal. Precedentes desta e. Corte. Apelante que não se desincumbiu do ônus probatório imposto pelo art. 333, I, do CPC, demonstrando de maneira cabal a ocorrência de prejuízo à sua atividade profissional. Incidência do art. 252, do RI do TJSP. Argumentos do recurso foram incapazes de abalar os fundamentos do da sen-tença. Decisão recorrida que analisou corretamente as questões suscitadas e avaliou com pro-priedade o conjunto probatório. Sentença mantida. Recurso improvido.” (TJSP – Ap 1033590-89.2015.8.26.0562 – 2ª CDPriv. – Rel. Des. José Joaquim dos Santos – DJe 03.08.2016)

2568 – Incêndio em terminal portuário – danos materiais – indenização – exploração econô-mica da pesca artesanal no local – impossibilidade

“Ação de indenização por danos materiais e morais. Incêndio em terminal portuário. Der-ramamento no mar de resíduos derivados de incêndio em terminal portuário. Sítio atingido pelos resíduos, ou seja, região do Porto de Santos, notoriamente degradada, sendo inviável a exploração econômica da pesca artesanal no local. Impossibilidade, à vista desse cenário, da ocorrência de qualquer dano em relação ao autor. Alternativa, outrossim, do exercício da pes-ca artesanal em outro local não atingido pelo derrame de resíduos do incêndio. Fatos notórios que dispensavam a produção de outros elementos de convicção. Alegação de cerceamento de defesa afastada. Descabimento, ainda, de inversão do ônus da prova. Improcedência da ação preservada. Precedente desta Câmara. Sentença preservada. Apelo desprovido.” (TJSP – Ap 1000385-35.2016.8.26.0562 – 3ª CDPriv. – Rel. Des. Donegá Morandini – DJe 05.08.2016)

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2569 – ISSQN – serviços de dragagem – mar territorial – competência tributária – art. 12 do DL 406/1968 – local do estabelecimento do prestador do serviço – tema decidido em recurso repetitivo – improcedência manifesta – multa

“Processual civil e tributário. Agravo interno no agravo de instrumento. Imposto Sobre Servi-ços de Qualquer Natureza – ISSQN. Serviços de dragagem em mar territorial. Competência tributária. Art. 12 do DL 406/1968. Local do estabelecimento do prestador do serviço. Tema decidido em recurso repetitivo. Improcedência manifesta. Multa. 1. Conforme decidido pela Primeira Seção no julgamento do REsp 1.060.210/SC, realizado na sistemática dos recursos repetitivos, por força do art. 12, a, do DL 406/1968, o ISSQN deve ser recolhido no município em que localizado o estabelecimento do prestador do serviço. Entendimento aplicável a todos os fatos geradores do imposto, com exceção dos casos de construção civil e de exploração de rodovias. 2. Na hipótese dos autos, o acórdão a quo decidiu que a ‘competência para a respectiva instituição e arrecadação é conferida ao Município da orla litorânea, e não ao da sede da empresa’, sem manifestação quanto ao enquadramento do serviço como espécie de construção civil, o que reforça o entendimento pela violação do art. 12, a, do DL 406/1968. 3. ‘Quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa’ (art. 1.021, § 4º, do CPC/2015). 4. Agravo interno não provido, com aplicação de multa.” (STJ – AgInt-Ag 1390732/RJ – 1ª T. – Rel. Min. Gurgel de Faria – DJe 05.08.2016)

2570 – Lei nº 9.535/1997 (Lesta) – autoridade administrativa – intervenção – disponibilidade da praticagem – garantia – essencialidade do serviço – fixação do preço – embargos de declaração – vícios – art. 535 do CPC – não configuração – prequestionamento – não cabimento

“Processual civil. Embargos de declaração. Vícios enumerados no art. 535 do CPC. Não configuração. Prequestionamento. Não cabimento. Precedentes. 1. Embargos de Declaração opostos com o propósito de sanar suposta omissão, invocando o Embargante o disposto no CPC/2015, que impõe o modelo de fundamentação exauriente, em substituição ao sistema de fundamentação suficiente. 2. Recurso cabível nos casos de omissão, contradição e obscuri-dade, nos moldes do art. 1.022, I e II, do CPC/2015, apresentando como objetivo esclarecer, completar e aperfeiçoar as decisões judiciais, prestando-se a corrigir distorções do ato judicial que podem comprometer sua utilidade. 3. Uma interpretação literal da Lei nº 9.535/1997 (Lesta) é suficiente para extrair a conclusão de que a norma sempre permitiu a intervenção da autoridade administrativa de forma a garantir a disponibilidade da praticagem em vista da es-sencialidade do serviço. Não há que se falar em interpretação histórica da lei, buscando-se a vontade do legislador, posto que a norma não contem ambiguidades que suscitem a aplicação desse método interpretativo. 4. O acórdão é claro ao dispor que a excepcional intervenção da autoridade marítima, quanto à fixação do preço de praticagem, derivava do disposto no Decreto nº 2.596/1998, não tendo o Decreto nº 7.860/2012, por essa razão, ofendido a Lesta. 5. Descabida a alegação de que o Decreto nº 7.860/2012, ao instituir a CNAP, atribuindo à comissão a competência para propor, em caráter permanente e em nome do Estado, preços de serviço de praticagem, teria violado o Princípio da Reserva Legal e a própria Lesta. Órgão pú-blico deve ser compreendido como uma unidade, cujas atribuições são praticadas por agentes públicos que o integram, com o objetivo de manifestar a vontade do Estado. Nesse contexto, a CNAP, tecnicamente não pode ser considerada órgão público, posto que a comissão foi criada apenas com o fim específico de ‘propor’ a metodologia de regulação, preços máximos, medidas de aperfeiçoamento da regulação do serviço de praticagem e a abrangência de cada zona. Suas propostas, embora vinculativas, submetem-se ao crivo da autoridade marítima que

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a homologa, não estando a sua constituição a depender de lei. 6. O Decreto nº 7.860/2012 não afastou ‘a competência da autoridade marítima para fixar os preços dos serviços de prati-cagem, mas apenas distribuiu melhor as tarefas no processo, permitindo que a decisão, antes submetida unicamente à autoridade marítima, passe a ser compartilhada por representantes de setores envolvidos no transporte marítimo. A autoridade continua a participar de todas as decisões tomadas na fixação dos preços, na medida em que preside, vota e homologa as deliberações’. 7. Descabida a alegação de que a autoridade marítima teria passado a realizar apenas o ato vinculado de homologação da decisão da CNAP, ficando relegado, por decreto regulamentar, à condição de mera divulgadora de decisão de outro órgão público, a uma porque a aludida autoridade tem papel efetivo na fixação dos preços do serviço, presidindo, votando e deliberando sobre a questão e a duas porque a comissão não pode ser considerada, na essência, um órgão público, nem substituiu a autoridade marítima, que tem atribuição específica prevista na norma. 8. A análise da razoabilidade e proporcionalidade exige um juízo de ponderação dos valores em jogo. No caso vertente, o julgado, por mais de uma vez, destacou a importância do serviço de praticagem para a sociedade e para a navegação, sendo uma das facetas da disponibilidade do serviço não estar a sua prestação condicionada a preços abusivos, não podendo a livre iniciativa ser confundida com a liberdade ilimitada dos agentes econômicos, no tocante a sua atuação no mercado. O julgado expressamente agasalhou o entendimento de que ‘diante da essencialidade da atividade desempenhada pelo prático, a qual é estratégica para a economia do país, posto que ligada ao transporte marítimo nacional e internacional, justifica-se a intervenção estatal na fixação do preço do serviço’. Ademais, não há nos autos elementos que permitam, de imediato, extrair a conclusão de que a combatida fixação de preço do serviço de praticagem seria inadequada para atingir as finalidades estabelecidas na Lesta, desnecessária ou desproporcional. 9. A divergência sub-jetiva da parte, resultante de sua própria interpretação jurídica, não justifica a utilização dos embargos declaratórios. Se assim o entender, a parte deve manejar o remédio jurídico próprio de impugnação. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte: 4ª T.Esp., AC 201251010456326, Rel. Des. Fed. Guilherme Couto, e-DJF2R 13.06.2014; 3ª T.Esp., AC 2002.5110.006549-7, Relª Desª Fed. Salete Maccalóz, e-DJF2R 05.03.2013. 10. Embargos de Declaração não provi-dos.” (TRF 2ª R. – Ap-Reex 0146404-94.2013.4.02.5101 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Ricardo Perlingeiro – DJe 14.07.2016)

2571 – Liberação e devolução de contêiner – impossibilidade de cumprimento da decisão – prova – ausência – tutela provisória – reforma – impossibilidade

“Agravo de instrumento. Direito processual civil. Tutela provisória. Liberação e devolução de contêiner. Agravante que alega impossibilidade de cumprimento da decisão. Trata-se de agravo de instrumento contra a decisão que concedeu a tutela provisória para determinar que a ré, ora agravante, providencie a liberação e a devolução à autora/agravada do contêiner alu-gado para a atividade de importação de mercadorias. Agravante que alega a impossibilidade de cumprimento da ordem judicial: a uma, porque o Terminal Portuário não possuiria espaço suficiente para acomodar todas as mercadorias; a duas porque, ante a inatividade do radar, a habilitação da agravante foi suspensa, comprometendo a possibilidade de trânsito aduaneiro; a três, porque foi aplicada a penalidade de perdimento das mercadorias pela Receita Fede-ral. À míngua de qualquer prova que efetive demonstre a impossibilidade do cumprimento, impossível reformar a tutela provisória deferida em favor da agravada, que não tem nenhuma responsabilidade sobre quaisquer das circunstâncias alegadas e considerando-se, ademais, que inexiste qualquer relação de acessoriedade entre o contêiner e o seu conteúdo eventu-almente declarado perdido. Decisão recorrida que não apresenta manifesta contrariedade à lei ou à evidente prova dos autos. Súmula nº 59, desta Corte. Recurso desprovido.” (TJRJ – AI 0027834-17.2016.8.19.0000 – 21ª C.Cív. – Rel. Des. Andre Emilio Ribeiro – DJe 28.07.2016)

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2572 – Mercadorias importadas – perdimento – transporte – barco de cruzeiro – ausência de documentação – dano ao Erário – presunção – boa-fé não demonstrada – substi-tuição por multa – impossibilidade

“Mandado de segurança. Direito tributário e aduaneiro. Perdimento de mercadorias importa-das, encontradas em barco de cruzeiro, supostamente destinadas ao abastecimento do navio. Ausência de documentação (prova) idônea a amparar a operação, e também as alegações da impetrante. Pretendida isenção tributária sobre os bens, que afastaria a penalidade: inexistên-cia (mercadoria que não seria comercializada em ‘Zona Franca’). Presumida ocorrência legal de dano ao Erário não afastada por iniciativa da parte. Boa-fé da impetrante não demonstrada. Substituição da pena de perdimento por multa: impossibilidade, in casu. Apelo conhecido em parte (fundamentação inovadora posta na apelação que não é conhecida) e desprovido no que sobeja, mantendo-se a denegação. 1. Trata-se de mandado de segurança – dene-gado em sentença – que objetiva a liberação das mercadorias importadas pela impetrante/apelante, acondicionados no contêiner MSCU 564141-0, afastando-se a aplicação da pena de perdimento pretendida pela autoridade impetrada. Subsidiariamente, pugna pela substitui-ção da referida pena por multa, nos termos dos arts. 736 e 737 do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009). 2. A alegação de nulidade do processo administrativo ante suposta ausência de intimação do termo de retenção não foi aventada em primeiro grau de jurisdição, tratando-se de fundamentação inovadora que, em prestígio ao princípio da não surpresa (am-plamente abrigado no cenário do Processo Civil) e em reverência à preservação das instâncias judiciais, não pode ser conhecida e analisada no âmbito deste recurso. Nesse sentido: AgRg--PET-RHC 61.765/RJ, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., Julgado em 19.04.2016, DJe 29.04.2016 – AgRg-AREsp 745.399/RJ, Relª Min. Assusete Magalhães, 2ª T., Julgado em 19.04.2016, DJe 29.04.2016 – AgInt-AREsp 864.540/SP, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., Julgado em 07.04.2016, DJe 15.04.2016. Apelo não conhecido no ponto. 3. De acordo com o apurado administrativamente, a apelante não apresentou documentação fiscal suficiente a comprovar a regularidade da importação das mercadorias acondicionadas no contêiner MSCU 564141-0. Tampouco há, nestes autos, referida prova, posto que a apelante juntou ao processo apenas a primeira página de cada uma das faturas comerciais que, supostamente, subsidiariam a operação. A pena de perdimento, no caso, encontra amparo no art. 689, IV, do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009). 4. Há que se afastar a alegação de que não se verificaria, no presente caso, a ocorrência de dano ao Erário a justificar a aplicação da pena de perdi-mento, vez que os itens importados estariam abarcados por isenção tributária. A uma, porque não procede a suscitada isenção, havendo tributação nos termos da Instrução Normativa SRF nº 137/1998. A duas, pois que o dano ao Erário não se limita a eventual prejuízo financeiro, restando configurado com o desrespeito à legislação e ao controle aduaneiro, em detrimento da política fiscal e alfandegária do País. Precedentes. 5. Pelas informações trazidas aos autos, sequer a boa-fé da apelante resplandece. Veja-se que, diante das inconsistências apontadas pela autoridade aduaneira quando da conferência física das mercadorias, num primeiro mo-mento a apelante apresentou pedido de alteração da data da entrega das unidades de carga e de exclusão do contêiner MSCU-564.141-0 da relação. Posteriormente, porém, pugnou pela inclusão no referido processo administrativo das faturas comerciais nºs 90176675, 90176676, 90176677, 90176678 e 87379, correspondentes às mercadorias contidas no citado contêiner. 6. Por fim, improcede também o pedido de relevação da pena de perdimento, nos termos dos arts. 736 e 737 do Regulamento Aduaneiro, porquanto referido benefício somente pode ser aplicado à ‘pena de perdimento decorrente de infração de que não tenha resultado fal-ta ou insuficiência de recolhimento de tributos federais’, o que não se verifica no presente caso. 7. Apelação conhecida em parte e, nesta, desprovida.” (TRF 3ª R. – AMS 0003627-28.2011.4.03.6104 – 6ª T. – Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo – DJe 12.07.2016)

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Transcrição EditorialDecreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009:

“Art. 736. O Ministro de Estado da Fazenda, em despacho fundamentado, poderá relevar penalidades relativas a infrações de que não tenha resultado falta ou insuficiência de reco-lhimento de tributos federais, atendendo (Decreto-Lei nº 1.042, de 21 de outubro de 1969, art. 4º, caput):

I – a erro ou a ignorância escusável do infrator, quanto à matéria de fato; ou

II – a equidade, em relação às características pessoais ou materiais do caso, inclusive ausência de intuito doloso.

§ 1º A relevação da penalidade poderá ser condicionada à correção prévia das irregularidades que tenham dado origem ao processo fiscal (Decreto-Lei nº 1.042, de 1969, art. 4º, § 1º).

§ 2º O Ministro de Estado da Fazenda poderá delegar a competência que este artigo lhe atribui (Decreto-Lei nº 1.042, de 1969, art. 4º, § 2º).

Art. 737. A pena de perdimento decorrente de infração de que não tenha resultado falta ou insuficiência de recolhimento de tributos federais poderá ser relevada com base no disposto no art. 736, mediante a aplicação da multa referida no art. 712 (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 67).

§ 1º A relevação não poderá ser deferida:

I – mais de uma vez para a mesma mercadoria; e

II – depois da destinação da respectiva mercadoria.

§ 2º A aplicação da multa a que se refere este artigo não prejudica:

I – a exigência dos tributos, de outras penalidades e dos acréscimos legais cabíveis para a regularização da mercadoria no País; ou

II – a exigência da multa a que se refere o art. 709, para a reexportação de mercadoria sub-metida ao regime de admissão temporária, quando sujeita a licença de importação vedada ou suspensa.

§ 3º A entrega da mercadoria ao importador, na hipótese deste artigo, está condicionada à comprovação do pagamento da multa e ao cumprimento das formalidades exigidas para o respectivo despacho de importação, sem prejuízo do atendimento das normas de controle administrativo.”

2573 – Mercadorias sujeitas ao perdimento – retenção do contêiner – unidade de carga – impossibilidade

“Tributário. Processual civil. Aduaneiro. Mandado de segurança. Concessão de liminar. Perda de objeto do mandamus não configurada. Mercadorias sujeitas ao perdimento. Retenção do contêiner. Unidade de carga. Impossibilidade. 1. Não há falar em perda de objeto do man-dado de segurança em razão de liminar concedida. 2. Há expressa disposição legal (art. 24 e parágrafo único, da Lei nº 9.611/1998) equiparando os contêineres a unidades de carga e, como tal, não podem ser confundidos com as mercadorias neles acondicionadas, pelo que não se submetem ao tratamento jurídico a elas conferido quando do desembarque no porto de destino. É que os contêineres prestam-se ao transporte de produtos, encerrando uma exis-tência autônoma, e não uma relação de acessoriedade com aqueles. Precedentes. 3. Portanto, é ilegal a retenção de contêineres pelo fato de não ter o importador efetuado o despacho das mercadorias neles contidas no prazo hábil, tampouco pelo simples fato de que não resta con-cluído o procedimento especial, que decidirá pela aplicação ou não da pena de perdimento.” (TRF 4ª R. – Ap-Reex 5004884-50.2015.404.7101 – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Amaury Chaves de Athayde – DJe 04.07.2016)

Transcrição EditorialLei nº 9.611, de 19 de fevereiro de 1998:

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“Art. 24. Para os efeitos desta Lei, considera-se unidade de carga qualquer equipamento ade-quado à unitização de mercadorias a serem transportadas, sujeitas a movimentação de forma indivisível em todas as modalidades de transporte utilizadas no percurso.Parágrafo único. A unidade de carga, seus acessórios e equipamentos não constituem embala-gem e são partes integrantes do todo.”

2574 – Operador de movimentação de cargas em área portuária – auxílio-acidente – conces-são – parcial perda da capacidade laboral – princípio in dubio pro misero

“Apelação. Ação previdenciária. Concessão de auxílio-acidente. Sentença de improcedência. Insurgência do autor. Pretendido Reconhecimento da percepção do benefício acidentário. Subsistência do alegado. Lesão no ligamento cruzado anterior do joelho esquerdo. Comunica-ção de acidente do trabalho que evidencia a ocorrência de infortúnio decorrente do exercício da atividade como operador de movimentação de cargas em área portuária. Nexo etiológico demonstrado. Parcial perda da capacidade laboral. Laudo pericial que, apesar de atestar a ausência de qualquer inaptidão, afirma haver redução de grau leve na mobilidade do membro inferior esquerdo. aplicabilidade do princípio in dubio pro misero. Diminuição da aptidão para trabalhar configurada, ainda que de forma mínima. Entendimento do STJ. Impositiva concessão do benefício. pagamento que tem como marco inicial o dia subsequente ao da cessação do auxílio-doença. Art. 86, § 2º, da Lei nº 8.213/1991. Reforma que se impõe. Con-sectários legais. Aplicação da Lei nº 11.960/2009, que conferiu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997. Juros aplicáveis à caderneta de poupança a contar da citação. Correção monetária dos índices preconizados na sobredita norma legal, a partir de sua vigência. Em-prego, após a inscrição do débito em precatório, do índice IPCA-E até o efetivo pagamento. Ônus sucumbenciais. Honorários. Fixação em 10% sobre o valor das parcelas corrigidas e vencidas até a data da publicação da sentença. custas pela metade. Art. 33 da Lei Comple-mentar nº 161/1997. Art. 85, §§ 2º e 3º, inc. I, do Novo CPC, e Enunciado nº 111 da Súmula do STJ. Pleito formulado em contrarrazões para reconhecimento da prescrição com relação às parcelas pretéritas ao quinquênio anterior ao ajuizamento da demanda. Pretensão afastada. Prestações que não restaram alcançadas pelo aludido lapso temporal. Recurso conhecido e provido.” (TJSC – Ap 0013427-68.2013.8.24.0033 – 1ª CDPúb. – Rel. Des. Luiz Fernando Boller – DJe 11.08.2016)

2575 – Pena de perdimento – importação por conta e ordem de terceiros – simulação – ofe-recimento de seguro garantia – procedimento já concluído – dano ao Erário – provi-mento

“Tributário. Agravo de instrumento. Suspensão de efeitos de decisão liminar no primeiro grau que concedeu o desembaraço e a liberação de mercadorias. Pena de perdimento. Importação por conta e ordem de terceiros. Simulação. Oferecimento de seguro garantia. Procedimento já concluído. Dano ao Erário. Provimento. 1. Cinge-se a controvérsia em verificar se é cabível a liberação das mercadorias sobre as quais recaiu a pena de perdimento, mediante ofereci-mento de seguro garantia pela agravada. 2. Na hipótese em tela, verifica-se que a pena de perdimento foi aplicada em decorrência da conclusão de que, apesar de a operação de impor-tação em análise ter sido registrada na modalidade ‘por encomenda’, foram contatados traços característicos da importação feita na modalidade ‘por conta e ordem’. 3. O elemento prin-cipal e suficiente para a descaracterização da importação na modalidade ‘por encomenda’ foi o repasse de recursos da empresa encomendante para a importadora, por meio de cheque administrativo com valor correspondente a todo o montante da operação, como adiantamen-to, antes da realização da operação de comércio exterior, tendo sido tais fatos descritos com clareza no auto de infração, colacionado nos autos originários. 4. Ao se promover a importa-ção com recursos financeiros da empresa tida por encomendante, mas em nome da empresa

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importadora, resta descaracterizada a importação na modalidade ‘por encomenda’, à luz do disposto no § 3º do art. 11 da Lei nº 11.281/2006. 5. Além disso, há notícias nos autos de que foi utilizada empresa detentora de benefícios fiscais (Fundap) para constar como adquirente, quando, na verdade, o real adquirente não possui direito a tais benefícios. Merece destaque que já proferi inúmeras decisões relativas à importação realizada por empresas que opera-vam no Fundap, por conta e ordem de terceiro, nas quais o entendimento foi no sentido de que essa negociação é realizada pelo terceiro que, não sendo sediado no Espírito Santo nem consistindo em empresa integrante do sistema, não pode gozar dos benefícios do Fundap, configurando essa prática em verdadeira simulação. 6. O oferecimento do seguro garantia pela agravada nos autos originários, por si só, não tem o condão de autorizar o desembaraço e a liberação das mercadorias em comento, introduzidas sob suspeita de irregularidade pu-nível com pena de perdimento, em consonância com o procedimento especial de controle aduaneiro previsto nos arts. 65 e 69 e seus parágrafos únicos, da Instrução Normativa da RFB nº 206/2002. 7. Ademais, o caso em comento não se enquadra na hipótese prevista pelo art. 68, parágrafo único, da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, e pelo art. 7º da Instrução Normativa da RFB nº 208/2002, os quais versam acerca da possibilidade de entrega e de de-sembaraço de mercadorias submetidas a procedimento de fiscalização, desde que a garantia seja prestada uma antes da conclusão do processo administrativo, pois o procedimento já havia sido concluído, com a edição de ato administrativo de aplicação de pena de perdimen-to, o que torna inviável a liberação da mercadoria importada, ainda que oferecida caução. 8. Agravo de instrumento provido.” (TRF 2ª R. – AI 0013309-71.2015.4.02.0000 – 4ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Luiz Antonio Soares – DJe 25.07.2016)

Transcrição Editorial• Lei nº 11.281, de 20 de fevereiro de 2006:“Art. 11. A importação promovida por pessoa jurídica importadora que adquire mercadorias no exterior para revenda a encomendante predeterminado não configura importação por conta e ordem de terceiros.[...]§ 3º Considera-se promovida na forma do caput deste artigo a importação realizada com re-cursos próprios da pessoa jurídica importadora, participando ou não o encomendante das ope-rações comerciais relativas à aquisição dos produtos no exterior. (Incluído pela Lei nº 11.452, de 2007)”• Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001:“Art. 68. Quando houver indícios de infração punível com a pena de perdimento, a mercadoria importada será retida pela Secretaria da Receita Federal, até que seja concluído o correspon-dente procedimento de fiscalização.Parágrafo único. O disposto neste artigo aplicar-se-á na forma a ser disciplinada pela Secretaria da Receita Federal, que disporá sobre o prazo máximo de retenção, bem assim as situações em que as mercadorias poderão ser entregues ao importador, antes da conclusão do procedimento de fiscalização, mediante a adoção das necessárias medidas de cautela fiscal.”

2576 – Previdência privada – suplementação de aposentadoria – Codesp – ilegitimidade “Previdência privada. Ilegitimidade da corré Companhia Docas do Estado de São Paulo – Codesp para figurar no polo passivo, dada sua condição de mera patrocinadora. Pedido de revisão de suplementação de aposentadoria. Prescrição quinquenal que não alcança o direito abstrato do Autor, atingindo apenas as parcelas vencidas anteriores a 05 anos contados da data da propositura da ação. Pretensa aplicação do Regulamento de Benefícios vigente à épo-ca da sua adesão. Descabimento. Incidência do Regulamento vigente a data em que poderia requerer a aposentação, quando adquirira seu direito. Ação improcedente. Recurso negado, com observação.” (TJSP – Ap 0012353-84.2013.8.26.0562 – 36ª CDPriv. – Relª Desª Maria de Lourdes Lopez Gil – DJe 30.06.2016)

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2577 – Registro do trabalhador portuário avulso – cancelamento – Justiça Comum Estadual – competência – reconhecimento – Fundo de Indenização do Trabalhador Portuário – ilegitimidade passiva

“Apelação. Ação de cobrança. Indenização decorrente de cancelamento do registro do tra-balhador portuário avulso, prevista na Lei nº 8.630/1993. Reconhecimento da competência da E. Justiça Federal do Trabalho para julgamento da lide. Indeferimento da petição inicial. Sentença de extinção. Competência. Inexistência de pleito ou controvérsia em relação a dissí-dio individual entre empregador e trabalhador. Remessa do processo para Justiça do Trabalho injustificável. Competência da Justiça Comum Estadual já pronunciada pelo C. STJ. Ilegiti-midade passiva. Ação ajuizada em face do gestor do Fundo de Indenização do Trabalhador Portuário, Banco do Brasil. Instituição financeira que atua como mero depositário dos valores. Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo) é o responsável por verificar quais trabalhadores fa-zem jus ao benefício e ordenar o pagamento. Extinção do feito mantida, porém com fulcro no art. 267, inciso VI, do CPC/1973, ante a ilegitimidade passiva da instituição financeira. Re-curso não provido, com observação.” (TJSP – Ap 1016208-83.2015.8.26.0562 – 18ª CDPriv. – Rel. Des. Edson Luiz de Queiróz – DJe 01.07.2016)

Transcrição Editorial• Lei nº 12.815/2013 (atual legislação sobre Ogmo; lei que substituiu e revogou a Lei nº 8630/1993):“Art. 32. Os operadores portuários devem constituir em cada porto organizado um órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário, destinado a: I – administrar o fornecimento da mão de obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso; II – manter, com exclusividade, o cadastro do trabalhador portuário e o registro do trabalhador portuário avulso; III – treinar e habilitar profissionalmente o trabalhador portuário, inscrevendo-o no cadastro; IV – selecionar e registrar o trabalhador portuário avulso; V – estabelecer o número de vagas, a forma e a periodicidade para acesso ao registro do trabalhador portuário avulso; VI – expedir os documentos de identificação do trabalhador portuário; e VII – arrecadar e repassar aos beneficiários os valores devidos pelos operadores portuários re-lativos à remuneração do trabalhador portuário avulso e aos correspondentes encargos fiscais, sociais e previdenciários. Parágrafo único. Caso celebrado contrato, acordo ou convenção coletiva de trabalho entre trabalhadores e tomadores de serviços, o disposto no instrumento precederá o órgão gestor e dispensará sua intervenção nas relações entre capital e trabalho no porto. Art. 33. Compete ao órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário avulso: I – aplicar, quando couber, normas disciplinares previstas em lei, contrato, convenção ou acordo coletivo de trabalho, no caso de transgressão disciplinar, as seguintes penalidades: a) repreensão verbal ou por escrito; b) suspensão do registro pelo período de 10 (dez) a 30 (trinta) dias; ou c) cancelamento do registro; II – promover: a) a formação profissional do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso, ade-quando-a aos modernos processos de movimentação de carga e de operação de aparelhos e equipamentos portuários; b) o treinamento multifuncional do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso; e c) a criação de programas de realocação e de cancelamento do registro, sem ônus para o trabalhador; III – arrecadar e repassar aos beneficiários contribuições destinadas a incentivar o cancelamen-to do registro e a aposentadoria voluntária;

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IV – arrecadar as contribuições destinadas ao custeio do órgão;

V – zelar pelas normas de saúde, higiene e segurança no trabalho portuário avulso; e

VI – submeter à administração do porto propostas para aprimoramento da operação portuária e valorização econômica do porto.

§ 1º O órgão não responde por prejuízos causados pelos trabalhadores portuários avulsos aos tomadores dos seus serviços ou a terceiros.

§ 2º O órgão responde, solidariamente com os operadores portuários, pela remuneração devida ao trabalhador portuário avulso e pelas indenizações decorrentes de acidente de trabalho.

§ 3º O órgão pode exigir dos operadores portuários garantia prévia dos respectivos pagamen-tos, para atender a requisição de trabalhadores portuários avulsos.

§ 4º As matérias constantes nas alíneas a e b do inciso II deste artigo serão discutidas em fórum permanente, composto, em caráter paritário, por representantes do governo e da socie-dade civil.

§ 5º A representação da sociedade civil no fórum previsto no § 4o será paritária entre traba-lhadores e empresários.

Art. 34. O exercício das atribuições previstas nos arts. 32 e 33 pelo órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário avulso não implica vínculo empregatício com trabalhador por-tuário avulso.

Art. 35. O órgão de gestão de mão de obra pode ceder trabalhador portuário avulso, em caráter permanente, ao operador portuário.

Art. 36. A gestão da mão de obra do trabalho portuário avulso deve observar as normas do contrato, convenção ou acordo coletivo de trabalho.

Art. 37. Deve ser constituída, no âmbito do órgão de gestão de mão de obra, comissão pa-ritária para solucionar litígios decorrentes da aplicação do disposto nos arts. 32, 33 e 35.”

• Código de Processo Civil de 2015:

“Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:

I – indeferir a petição inicial;

II – o processo ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das partes;

III – por não promover os atos e as diligências que lhe incumbir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias;

IV – verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo;

V – reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada;

VI – verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;

VII – acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo arbitral reconhecer sua competência;

VIII – homologar a desistência da ação;

IX – em caso de morte da parte, a ação for considerada intransmissível por disposição legal; e

X – nos demais casos prescritos neste Código.

§ 1º Nas hipóteses descritas nos incisos II e III, a parte será intimada pessoalmente para suprir a falta no prazo de 5 (cinco) dias.

§ 2º No caso do § 1º, quanto ao inciso II, as partes pagarão proporcionalmente as custas, e, quanto ao inciso III, o autor será condenado ao pagamento das despesas e dos honorários de advogado.

§ 3º O juiz conhecerá de ofício da matéria constante dos incisos IV, V, VI e IX, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não ocorrer o trânsito em julgado.

§ 4º Oferecida a contestação, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação.

§ 5º A desistência da ação pode ser apresentada até a sentença.

§ 6º Oferecida a contestação, a extinção do processo por abandono da causa pelo autor de-pende de requerimento do réu.

§ 7º Interposta a apelação em qualquer dos casos de que tratam os incisos deste artigo, o juiz terá 5 (cinco) dias para retratar-se.”

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2578 – Reporto – PIS e Cofins – créditos – âmbito de incidência – restrição – remessa oficial – provimento

“Tributário. PIS e Cofins. Créditos. Regime não cumulativo. Redução das bases de cálculo (Lei nº 10.485/2002). Art. 17 da Lei nº 11.033/2004. Âmbito de incidência restrito ao Reporto. Jurisprudência do STJ e deste regional. Apelação da União (FN) e remessa oficial providas. Apelação da autora prejudicada. 1. A disposição do art. 17 da Lei nº 11.033/2004, que funda-menta o pedido deduzido na inicial de aproveitamento de créditos de PIS e Cofins resultantes do recolhimento das contribuições sob o regime não cumulativo, com redução das bases de cálculo (art. 1º da Lei nº 10.485/2002), tem o seu âmbito de incidência restrito ao Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária – Reporto, do qual não faz parte a apelante. Precedentes do STJ e deste Regional. 2. Apelação da União (FN) e remessa oficial providas. Apelação da autora prejudicada.” (TRF 1ª R. – AC 0038957-07.2011.4.01.3400 – 8ª T. – Rel. Des. Fed. Marcos Augusto de Sousa – DJe 08.07.2016)

Comentário EditorialO julgado aqui em comento faz parte do tema do artigo publicado na última edição da revista, o qual analisou, naquela oportunidade, a possibilidade de aplicação do benefício do Reporto aos titulares dos Contratos de Uso Temporário celebrados com as Administrações Portuárias situadas pelo país, já que a Lei nº 11.033/2004 prevê que somente podem ser beneficiários do Reporto o operador portuário, o concessionário de porto organizado, o arrendatário de instalação portuária de uso público e a empresa autorizada a explorar instalação portuária.O entendimento que prevaleceu no caso foi que o art. 111 do Código Tributário Nacional prevê a literalidade na interpretação da legislação tributária que disponha sobre suspensão, ou exclusão do crédito tributário, outorga de isenção ou dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.Contudo, esse parece não ser o melhor entendimento a ser dado ao caso, de vez que conside-rando a finalidade principal do benefício do Reporto, na forma prevista na Exposição de Moti-vos da lei acima citada, deve-se haver a relativização da interpretação quanto aos beneficiários desse instituto, abrangendo outras pessoas jurídicas que equivalem ao rol de beneficiários.

2579 – Serviço aduaneiro – agente de cargas – informações – legitimidade – obrigação aces-sória – multa – legalidade

“Serviço aduaneiro. Agente de cargas. Informações. Legitimidade. Obrigação acessória. Mul-ta. Legalidade. 1. Trata-se na espécie, em síntese, de pedido de anulação de multa aplicada por infração ao art. 107, IV, e, do DL 37/1966. Cito, também, por oportuno, os arts. 32, pará-grafo único, b e 37, § 1º, do DL 37/1966. 2. Observo, inicialmente, que a obrigação do agente de carga exsurge do próprio teor dos indigitados dispositivos legais, afastando-se as alegações de ausência de responsabilidade pela infração imputada. Ademais, independe se o agente de cargas atua no transporte marítimo ou aéreo de mercadorias, visto que a lei regula os serviços aduaneiros em geral. 3. Quanto ao mérito, a multa cobrada por falta na entrega ou atraso das declarações, como aconteceu no caso em espécie, tem como fundamento legal o art. 113, §§ 2º e 3º do CTN. 4. A prestação tempestiva de informações relativas às cargas procedentes do exterior está inserida entre as obrigações tributárias acessórias ou deveres instrumentais tributários, que decorrem da legislação própria e têm por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas, no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos (art. 113, § 2º, do CTN). 5. Ainda que a autora afirme que não possui legitimidade pela inclusão de in-formações no Sistema Mantra, o auto de infração relata que os dados foram inseridos em atra-so e os documentos acostados às fls. 44/48 demonstram que a parte autora conseguiu realizar o procedimento necessário, ainda que posteriormente. 6. Apelação improvida.” (TRF 3ª R. – AC 2153059 – (0010591-66.2013.4.03.6104) – 6ª T. – Relª Desª Fed. Consuelo Yoshida – J. 30.06.2016 – e-DJF3 Judicial 1 Data 12.07.2016)

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Transcrição Editorial• Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966:“Art. 37. O transportador deve prestar à Secretaria da Receita Federal, na forma e no prazo por ela estabelecidos, as informações sobre as cargas transportadas, bem como sobre a chegada de veículo procedente do exterior ou a ele destinado. (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)§ 1º O agente de carga, assim considerada qualquer pessoa que, em nome do importador ou do exportador, contrate o transporte de mercadoria, consolide ou desconsolide cargas e preste serviços conexos, e o operador portuário, também devem prestar as informações sobre as operações que executem e respectivas cargas. (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)”“Art. 32. É responsável pelo imposto: (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988)[...]Parágrafo único. É responsável solidário: (Incluído pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988) [...]b) o representante, no País, do transportador estrangeiro. (Incluído pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988) Parágrafo único. É responsável solidário: (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001)I – o adquirente ou cessionário de mercadoria beneficiada com isenção ou redução do imposto; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001)II – o representante, no País, do transportador estrangeiro; (Redação dada pela Medida Provi-sória nº 2.158-35, de 2001)III – o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001)[...]c) o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora; (Incluída pela Lei nº 11.281, de 2006)d) o encomendante predeterminado que adquire mercadoria de procedência estrangeira de pessoa jurídica importadora. (Incluída pela Lei nº 11.281, de 2006)”“Art. 107. Aplicam-se ainda as seguintes multas:[...]IV – de R$ 5.000,00 (cinco mil reais):[...]e) por deixar de prestar informação sobre veículo ou carga nele transportada, ou sobre as operações que execute, na forma e no prazo estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, aplicada à empresa de transporte internacional, inclusive a prestadora de serviços de transpor-te internacional expresso porta-a-porta, ou ao agente de carga; e”• Código Tributário Nacional:“Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.[...]§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, po-sitivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.§ 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.”

2580 – Serviço de praticagem prestado – preço – ausência de pagamento – inexistência de consenso – requisitos do protesto – falta de liquidez da obrigação – sustação de pro-testo – contracautela (caução)

“Direito civil e direito processual civil. Demanda cautelar de sustação de protesto. Serviço de praticagem prestado, apesar da inexistência de consenso entre as partes em relação ao preço.

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Ausência de pagamento pelo tomador do serviço. Protesto da nota fiscal pelo prestador do serviço de praticagem. Ausência de um dos requisitos do protesto, diante da falta de liquidez da obrigação, por não haver consenso, havendo necessidade de arbitramento do valor devido. Sustação do protesto. Determinação de prestação de contracautela (caução) pelo tomador do serviço. Cobrança da dívida que não fica obstada pela sustação do protesto. Ausência de irreversibilidade dos efeitos da tutela. Recurso a que se nega provimento.” (TJRJ – AI 0012209-40.2016.8.19.0000 – 2ª C.Cív. – Rel. Des. Alexandre Antônio Franco Freitas Câmara – DJe 15.07.2016)

2581 – Siscomex – habilitação – greve – fiscalização – serviço essencial – análise do pedido – cabimento

“Administrativo. Siscomex. Habilitação. Greve. Fiscalização. Serviço essencial. 1. A devo-lução consiste no cabimento da determinação da análise do pedido de habilitação para uso do sistema Siscomex pela Impetrante em período de greve dos servidores responsáveis pela emissão de documentos e habilitação de importadores e exportadores. 2. A Impetrante atua no transporte aquaviário de apoio marítimo, prestando suporte logístico de operações offshore de petróleo e gás natural, e, para a realização de seu objeto social necessita da outorga da Antaq para atuar como empresa brasileira de navegação, nos termos da Resolução Antaq nº 2.510, de 19.06.2012. 3. Em 07 de outubro de 2015 realizou o referido pedido administra-tivo, que não havia sido analisado até o momento da impetração do mandado de segurança (30.11.2015), em razão de greve dos servidores, sendo que, de acordo com o disposto na Instrução Normativa nº 1.288/2012 da Receita Federal, que regulamenta o processo de ha-bilitação no Siscomex, tal prazo teria se encerrado em 17 de outubro de 2015. 4. Embora o processo não tenha a vocação de dar uma resposta imediata ao administrado nas suas preten-sões perante o poder público, não se pode permitir que a administração pública postergue, indefinidamente, a sua conclusão, sobretudo quando o próprio órgão estipula o prazo no qual o processo deve ser analisado, como no caso dos autos, sendo necessário compatibilizar o direito de greve com as expectativas razoáveis do administrado na prestação de serviços pú-blicos essenciais. 5. O plenário do STF, em sessão de julgamento concluída em 25.10.2007, por maioria, deu provimento aos mandados de injunção nºs 670, 708 e 712, impetrados pelo Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo, pelo Sindicato dos Traba-lhadores em Educação do Município de João Pessoa e pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Pará, respectivamente, reconhecendo a mora do Congresso Nacional na regulamentação do direito de greve dos servidores públicos, garantia constitucional prevista no art. 37, VII, da Constituição Federal e propôs, como solução para a omissão legislativa, a aplicação da Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989, no que couber. 6. Aplicando-se a Lei nº 7.783/1989, os serviços essenciais devem ser prestados de forma contínua, em observância ao princípio da continuidade do serviço público, competindo ao Estado prever mecanismos com vistas a evitar a interrupção total da atividade. 8. Considerando que a fiscalização consti-tui serviço público essencial, a sua interrupção em virtude de greve revela-se manifestamente arbitrária, sobretudo porque viola, frontalmente, os princípios da continuidade do serviço público, da eficiência e da supremacia do interesse público, norteadores da Administração Pública. 9. Remessa improvida, com a manutenção da sentença que determinou a análise do pedido de habilitação da impetrante.” (TRF 2ª R. – Reex 0506981-91.2015.4.02.5101 – 6ª T.Esp. – Relª Desª Fed. Salete Maccalóz – DJe 30.06.2016)

Comentário EditorialPrimeiramente destacamos que a Constituição Federal dispõe expressamente que incumbe ao Poder Público, na forma da lei, a prestação de serviços públicos (art. 175 da CF/1988).

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O serviço público é sempre incumbência do Estado, que poderá fazê-lo diretamente (por meio dos próprios órgãos que compõem a Administração Pública), ou indiretamente (por meio de concessão ou permissão, ou de pessoas jurídicas criadas pelo Estado com essa finalidade).Dentre os princípios do serviço público, inclui-se o princípio da permanência ou da continuida-de, em decorrência do qual este não pode sofrer paralisação.“O princípio da continuidade do serviço público”, ressalta Maria Sylvia Zanella di Pietro, “em decorrência do qual o serviço público não pode parar, tem aplicação especialmente em relação aos contratos administrativos e ao exercício da função pública (in Direito administrativo. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 95)”.A despeito do direito de greve previsto no art. 9º da Constituição Federal de 1988, é preciso. em casos gerais. que seja mantido um mínimo de continuidade nos serviços, mormente quan-do se trata de serviços públicos essenciais, a teor do § 2º do citado artigo.Em relação ao direito de greve dos servidores públicos, a Constituição Federal estabelece:“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impes-soalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:[...]VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;”Desse modo, conquanto o direito de greve seja uma garantia constitucional, assegurada in-clusive aos servidores públicos, deve ser exercido nos termos e nos limites da lei, devendo ser mantidos os serviços essenciais, de forma a não prejudicar os direitos dos demais cidadãos.Assim, o exercício do direito de greve no setor público, assegurado constitucionalmente não pode prejudicar a liberação de mercadorias importadas, Habilitação no Siscomex e nenhum dos serviços essenciais ao desenvolvimento do comércio exterior e a ele inerentes que porquan-to essa descontinuidade do serviço pode trazer prejuízos aos particulares, na medida em que obstaculiza o exercício de seu objeto social.Portanto, é ilegal a greve que paralise integralmente os serviços públicos, porquanto essa descontinuidade pode trazer prejuízos irreparáveis ao prosseguimento das atividades do im-portador, devendo como já afirmado, preservar a continuidade do serviço público essencial, sob pena de inconstitucionalidade do movimento grevista e violação do direito líquido e certo do administrado.

Transcrição EditorialConstituição Federal de 1988:“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impes-soalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)[...]VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”

2582 – Siscoserv – responsabilidade pelo registro – serviços de transporte internacional – agente de carga – importação por conta e ordem – importação por encomenda

“Assunto: Obrigações acessórias. Ementa: Siscoserv. Responsabilidade pelo registro. Serviços de transporte internacional. Agente de carga. Importação por conta e ordem. Importação por encomenda. A responsabilidade pelo registro no Siscoserv decorre da relação jurídica esta-belecida pelo contrato de prestação dos serviços firmado entre residentes e domiciliados no Brasil e residentes e domiciliados no exterior e não das responsabilidades mutuamente as-sumidas no contrato de compra e venda de mercadorias, as quais dizem respeito apenas ao importador e ao exportador. Quem age em nome do tomador ou do prestador de serviço de transporte não é, ele mesmo, prestador ou tomador de tal serviço. Mas é prestador ou tomador de serviços auxiliares conexos (que facilitam a cada interveniente cumprir suas obrigações relativas ao contrato de transporte) quando o faz em seu próprio nome. O valor a informar

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no Siscoserv pelo tomador de um dado serviço é o montante total transferido, creditado, empregado ou entregue ao prestador como pagamento pelos serviços prestados, incluídos os custos incorridos, necessários para a efetiva prestação, sendo irrelevante que tenha havido a discriminação das parcelas componentes, mesmo que se refiram a despesas que o prestador estaria apenas ‘repassando’ ao tomador. Quando o agente de cargas, domiciliado no Bra-sil, contratar, com residente ou domiciliado no exterior, em seu próprio nome, o serviço de transporte internacional de carga e os serviços a ele conexos, caberá a ele o registro desse serviço no Siscoserv. Na importação por conta e ordem de terceiros, se o agente de carga, domiciliado no Brasil, apenas representar a pessoa jurídica tomadora do serviço de transporte internacional e dos serviços a ele conexos perante os prestadores desses serviços, residentes ou domiciliados no exterior, a responsabilidade pelo registro no Siscoserv será: da pessoa jurí-dica adquirente, se a pessoa jurídica importadora atuar como interposta pessoa, na condição de mera mandatária da adquirente; da pessoa jurídica importadora, quando ela contratar esses serviços em seu próprio nome. Na importação por encomenda, é da pessoa jurídica importa-dora, que importar mercadorias do exterior para revenda a encomendante predeterminado, a responsabilidade pelo registro no Siscoserv do serviço de transporte internacional e dos servi-ços a ele conexos, na hipótese de o agente de carga apenas representá-la perante o prestador do serviço residente ou domiciliado no exterior. Solução de Consulta vinculada às soluções de Consulta Cosit nº 257, de 26 de setembro de 2014, nº 222, de 27 de outubro de 2015, e nº 23, de 7 de março de 2016. Siscoserv. Responsabilidade pelo registro. Contratação de seguro. Importação por conta e ordem de terceiro. Importação por encomenda. A responsabi-lidade pelo registro no Siscoserv é do residente ou domiciliado no País que mantém relação contratual com residente ou domiciliado no exterior para contratação do seguro e não das res-ponsabilidades mutuamente assumidas pelo contrato de compra e venda de mercadorias, as quais dizem respeito apenas ao importador e ao exportador. O valor a informar no Siscoserv pelo tomador de um dado serviço é o montante total transferido, creditado, empregado ou entregue ao prestador como pagamento pelos serviços prestados, incluídos os custos incorri-dos, necessários para a efetiva prestação, sendo irrelevante que tenha havido a discriminação das parcelas componentes, mesmo que se refiram a despesas que o prestador estaria apenas ‘repassando’ ao tomador. Na importação por conta e ordem de terceiros, a responsabilidade pelo registro no Siscoserv das informações acerca da contratação de seguro com empresa se-guradora domiciliada no exterior, ainda que haja intermediação de uma corretora de seguros domiciliada no Brasil, será: da pessoa jurídica adquirente, se a pessoa jurídica importadora atuar como interposta pessoa, na condição de mera mandatária da adquirente; da pessoa jurídica importadora, quando ela contratar o seguro em seu próprio nome. Na importação por encomenda, a responsabilidade pelo registro no Siscoserv do seguro contratado com em-presa seguradora domiciliada no exterior, mesmo que haja intermediação de uma corretora de seguros domiciliada no Brasil, é da pessoa jurídica importadora, que importar mercado-rias do exterior para revenda a encomendante predeterminado. Na hipótese de a seguradora domiciliada no exterior ser contratada e paga por um estipulante, residente ou domiciliado no Brasil, ele será o contratante e, por consequência, o responsável pelo registro do seguro no Siscoserv, seja no âmbito de uma importação realizada por conta e ordem de terceiros ou para revenda a encomendante predeterminado. Solução de Consulta vinculada às soluções de Consulta Cosit nº 257, de 26 de setembro de 2014, nº 222, de 27 de outubro de 2015, e nº 23, de 7 de março de 2016. Dispositivos legais: Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 37, § 1º; Medida Provisória nº 2158-35, de 2011, art. 80; Lei nº 10.406, de 2002, arts. 730 e 744; Lei nº 11.281, de 2006, art. 11; Lei nº 12.546, de 2011, art. 25; Lei nº 12.995, de 2014, art. 8º; Portarias Conjuntas RFB/SCS nº 1.895, de 2013, e nº 768, de 2016; Instrução Normativa SRF nº 225, de 2002, arts. 1º, parágrafo único, 2º, caput e 3º; Instrução Normativa SRF nº 247, de

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2002, arts. 12, 86 e 87; Instrução Normativa SRF nº 634, de 2006; Instrução Normativa RFB nº 800, de 2007, arts. 2º, II, e 3º; Instrução Normativa RFB nº 1.277, de 2012, art. 1º, §§ 1º, II, e 4º; e Instrução Normativa RFB nº 1.396, de 2013, art. 22.” (DISIT 10ª RF – SC 10053 – Relª Iolanda Maria Bins Perin – Chefe – DOU 24.06.2016)

2583 – Siscoserv – responsabilidade pelo registro – serviços de transporte internacional – agente de carga – importação por conta e ordem – importação por encomenda

“Assunto: Obrigações acessórias. Ementa: Siscoserv. Serviço de transporte internacional. Importação por conta e ordem. Responsabilidade pelo registro. Na importação por conta e ordem de terceiros, se o agente de carga, domiciliado no Brasil, apenas representar a pes-soa jurídica tomadora do serviço de transporte internacional perante o prestador do serviço, residente ou domiciliado no exterior, a responsabilidade pelo registro no Siscoserv será: da pessoa jurídica adquirente, se a pessoa jurídica importadora atuar como interposta pessoa, na condição de mera mandatária da adquirente; da pessoa jurídica importadora, quando ela con-tratar esse serviço em seu próprio nome. Quando o agente de cargas, domiciliado no Brasil, contratar, com residente ou domiciliado no exterior, em seu próprio nome, o serviço de trans-porte internacional de carga, caberá a ele o registro desse serviço no Siscoserv. Solução de Consulta vinculada à solução de Consulta Cosit nº 23, de 7 de março de 2016. Dispositivos legais: Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 80; Lei nº 11.281, de 2006, art. 11; Lei nº 12.995, de 2014, art. 8º; Instrução Normativa SRF nº 225, de 2002, arts. 1º, parágrafo úni-co, 2º, caput e 3º; Instrução Normativa SRF nº 247, de 2002, arts. 12, 86 e 87.” (DISIT 10ª RF – SC 10057 – Relª Iolanda Maria Bins Perin – Chefe – DOU 09.08.2016)

2584 – Siscoserv – responsabilidade pelo registro – serviços de transporte internacional – agente de carga – importação por conta e ordem – importação por encomenda

“Assunto: Obrigações acessórias. Ementa: Siscoserv. Serviço de transporte internacional. Im-portação por conta e ordem. Responsabilidade pelo registro. A responsabilidade pelo registro no Sistema Integrado de Comércio Exterior de Serviços, Intangíveis e Outras Operações que Produzam Variações no Patrimônio (Siscoserv) é do residente ou domiciliado no País que mantém relação contratual com residente ou domiciliado no exterior para prestação do ser-viço. Na importação por conta e ordem de terceiros, se o agente de carga, domiciliado no Brasil, apenas representar a pessoa jurídica tomadora do serviço de transporte internacional perante o prestador do serviço, residente ou domiciliado no exterior, a responsabilidade pelo registro no Siscoserv será: da pessoa jurídica adquirente, se a pessoa jurídica importadora atuar como interposta pessoa, na condição de mera mandatária da adquirente; da pessoa jurí-dica importadora, quando ela contratar esse serviço em seu próprio nome. Quando o agente de cargas, domiciliado no Brasil, contratar, com residente ou domiciliado no exterior, em seu próprio nome, o serviço de transporte internacional de carga, caberá a ele o registro desse serviço no Siscoserv. Solução de consulta vinculada à Solução de Consulta Cosit nº 23, de 7 de março de 2016. Dispositivos legais: Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 80; Lei nº 12.995, de 2014, art. 8º; Instrução Normativa SRF nº 225, de 2002, arts. 1º, parágrafo único, 2º, caput e 3º; Instrução Normativa SRF nº 247, de 2002, arts. 12, 86 e 87.” (DISIT 10ª RF – SC 10058 – Relª Iolanda Maria Bins Perin – Chefe – DOU 09.08.2016)

2585 – Taxas e tarifas portuárias de armazenagem – empresa de logística – serviços presta-dos – cobrança – legitimidade

“Ação de cobrança, decorrente do pagamento das taxas e tarifas portuárias de armazenagem, depósito, movimentação e acondicionamento de unidade de carga no recinto alfandegado, bem como de desembaraço aduaneiro, de liberação da mercadoria importada, do transporte

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local e a efetiva entrega dos produtos. Subsistência da obrigação. Legitimidade da cobrança. Retribuição devida em virtude dos serviços efetivamente prestados pela empresa de logística, cujos preços obedeceram aos parâmetros definidos nas tabelas em vigor na data da operação mercantil. Demonstração inequívoca do percentual acordado para o pagamento dos valores, de 0,40% do CIF (cost insurance and freight), referentes à taxa de armazenagem. Recursos não providos.” (TJSP – Ap 1003976-43.2015.8.26.0011 – 38ª CDPriv. – Rel. Des. César Peixoto – DJe 24.06.2016)

2586 – Terminal aquaviário – vazamento de óleo – indenização por danos materiais e morais – competência

“Competência recursal. Ação de indenização por danos materiais e morais, ajuizada em face da Transpetro e da Petrobras, em decorrência do vazamento de óleo ocorrido no dia 05.04.2013, oriundo de um dos dutos que interliga tanque do Terminal Aquaviário Almirante Barroso ao respectivo píer, na cidade de São Sebastião. Matéria regida pelo Direito Privado (1ª a 10ª Câmaras), nos termos do art. 5º, item I.17, da Res. 623/2013. Recurso não conhecido com determinação de remessa à E. Presidência da Seção Direito Privado, para redistribuição à Primeira Subseção.” (TJSP – Ap 0012084-92.2013.8.26.0126 – 8ª CDPúb. – Rel. Des. Ponte Neto – DJe 20.07.2016)

2587 – Terminal marítimo – liberação de fumaça tóxica – danos morais – indenização – re-debate – impossibilidade

“Embargos de declaração em apelação cível. Ação de indenização por danos morais. Libera-ção de fumaça tóxica decorrente de combustão de materiais químicos em terminal marítimo. Togado de origem que julgou improcedente o pleito inicial, o que foi mantido por este órgão fracionário. Alegada omissão quando à aplicação dos arts. 283 e 284 do Código Buzaid e ofensa ao princípio da máxima efetividade processual. Vício ausente. Manifestação clara e inteligível no acórdão sobre todas as matérias devolvidas a enfoque a este paço da justi-ça. Interessado que pretende o redebate sobre o acerto ou desacerto da decisão embargada. impossibilidade. Veículo processual inadequado. Aclaratórios Que se destinam exclusiva-mente para sanar eventual omissão, contradição ou obscuridade eventualmente contidos no decisum atacado. Exegese do art. 1.022 do Código Fux. Inconformismo oposto com finalidade de prequestionamento. Vedação. Situação que se mostra plausível somente quando presente alguma das hipóteses indicadas no comando normativo susoapontado. Ausente a mácula, sobressai inviável o prequestionamento expresso acerca da matéria. Irresignação rejeitada.” (TJSC – ED 0500729-83.2013.8.24.0061 – 5ª CDCív. – Rel. Des. Rosane Portella Wolff – DJe 06.05.2016)

2588 – Trabalhador avulso – marco inicial – prescrição bienal – encerramento do engaja-mento do trabalhador

“Recurso de embargos. Regência da Lei nº 11.496/2007. Trabalhador portuário avulso. Prescrição bienal. Termo inicial. 1. A eg. Quinta deu provimento ao recurso de revista para ‘declarar prescritas as prestações relativas aos contratos findos até dois anos antes da pro-positura da presente ação’, sob o fundamento de que o marco inicial da prescrição bienal é o encerramento do engajamento do trabalhador portuário avulso com o navio tomador dos serviços. 2. O único aresto colacionado se revela inespecífico, nos termos das Súmulas nºs 23 e 296, I, do TST, pois aborda situação fática diversa, sem contemplar o debate em torno do início da prescrição bienal. Recurso de embargos de que não se conhece.” (TST – E-RR 245-54.2010.5.04.0121 – SBDI-I Esp. – Rel. Min. Walmir Oliveira da Costa – DJe 29.07.2016)

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2589 – Transporte de coisas – cobrança – divergência de conteúdo da carga – laudo de vistoria – troca de mercadorias na origem, anteriormente ao embarque marítimo – cobrança devida

“Transporte de coisas. Cobrança. Falha na prestação do serviço. Ausência de comprovação. Empresa transportadora autora que ‘conduziu a coisa ao seu destino, tomando todas as cau-telas necessárias para mantê-la em bom estado e entregá-la no prazo ajustado ou previsto’ (art. 749, CC/2002). Hipótese de divergência de conteúdo da carga, não de avaria. Laudo de vistoria, ofertado pela ré, que concluiu pela ocorrência de troca de mercadorias na origem, anteriormente ao embarque marítimo. Cobrança devida. Sentença mantida. Recurso não pro-vido.” (TJSP – Ap 1012545-63.2014.8.26.0562 – 13ª CDPriv. – Rel. Des. Alfredo Attié – DJe 29.07.2016)

2590 – Transporte de passageiros – acidente aquaviário – falha na condução da embarcação – danos morais – danos materiais – danos estéticos – redução da capacidade labora-tiva – pensionamento

“Apelação cível. Relação de consumo. Acidente aquaviário. Falha comprovada na condução da embarcação por funcionário da empresa ré, não havendo que se falar na suscitada culpa exclusiva de terceiro. Sentença que julgou procedente a demanda, condenando o réu ao pagamento de R$ 40.000,00 a título de indenização por danos morais, R$ 486,53 por danos materiais, R$ 10.000,00 por danos estéticos, e ao pensionamento em decorrência da redução da capacidade laborativa, acrescido de correção monetária a partir do julgado e juros mo-ratórios a contar da citação, e, ainda, ao pagamento de ônus de sucumbência e honorários periciais, este a ser depositado no prazo de 48 horas da publicação da sentença, sob pena de multa diária de R$ 300,00. Inconformado, o réu apelou, alegando a necessidade de reforma da sentença atacada com o consequente julgamento de improcedência do pedido autoral e, subsidiariamente, a redução do quantum fixado a título de indenização por danos estéticos e danos morais, este último com incidência de juros a partir do julgado, e a inversão do ônus de sucumbência. A autora também apelou, pleiteando a majoração do pensionamento em percentual coerente e proporcional ao dano mecânico sofrido, bem como do dano moral e estético. O valor do dano moral fixado na sentença em R$ 40.000,00 se mostra superior ao patamar estabelecido por esta Corte em casos semelhantes, devendo ser reduzido para R$ 20.000,00, verba razoável e proporcional para atender a finalidade compensatória, aten-dendo ao caso em tela e servindo de desestímulo à desídia dos fornecedores na prestação de serviços no mercado de consumo. Negado provimento ao recurso da autora. Recurso do réu parcialmente provido.” (TJRJ – Ap 0318809-11.2010.8.19.0001 – 25ª C.Cív. – Rel. JDS. Des. Jean Albert de Souza Saadi – DJe 15.07.2016)

2591 – Transporte de passageiros – óbito – indenização por danos morais e materiais – pen-são alimentícia – responsabilidade objetiva da transportadora – cláusula de incolu-midade – riscos da atividade de transporte

“Apelação cível. Transporte de pessoas. Ação de indenização por danos morais e materiais, estes na forma de pensão alimentícia. Pretensão deduzida por esposa e filhas da vítima fatal em face da proprietária da embarcação. Sentença de parcial procedência. Insurgência da ré. Responsabilidade objetiva da transportadora. Cláusula de incolumidade. Inteligência do art. 734 do Código Civil e art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. Alegação de cul-pa exclusiva da vítima. Não acolhimento. Fato relacionado com a organização e riscos da atividade de transporte. Dano moral in re ipsa. Valor fixado com razoabilidade, tendo em vista as circunstâncias do caso. Dano material. Pensão mensal devida à viúva supérstite e às duas filhas, menores impúberes na época do óbito. Dependência econômica presumida em

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relação ao de cujus. Valor da pensão, porém, que deve corresponder a 2/3 dos rendimentos comprovados nos autos, cabendo 50% à viúva e 25% a cada filha, até que completem 24 anos. Vitaliciedade da pensão afastada em relação à viúva. Termo final da pensão devida a ela que deverá observar a expectativa média de vida da vítima, conforme apurado pelo IBGE na época do óbito. Precedente do E. STJ. Observação, por fim, quanto ao marco inicial da correção monetária e dos juros moratórios para as parcelas pretéritas. Sentença reformada em parte. Recurso parcialmente provido.” (TJSP – Ap 0141838-84.2007.8.26.0001 – 22ª CDPriv. – Rel. Des. Hélio Nogueira – DJe 18.07.2016)

2592 – Transporte marítimo – avaria – carga – defeito container – indenização – prescrição ânua – regra especial – Decreto-Lei nº 116/1967 – Súmula nº 151, do STF – ação do segurador sub-rogado

“Recurso especial. Transporte marítimo. Prescrição ânua. Aplicação do Decreto-Lei nº 116/1967 e Súmula nº 151, do STF. Carga avariada. Responsabilidade das depositárias. Ação do segurador sub-rogado para ressarcimento dos valores pagos. 1. Nos termos do art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967, é de um ano o prazo para a prescrição da pretensão indeni-zatória, no caso das ações por extravio, falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou danos à carga a ser transportada por via d’água nos portos brasileiros. 2. A Súmula nº 151, do STF, orienta que prescreve em um ano a ação do segurador sub-rogado para haver inde-nização por extravio ou perda de carga transportada por navio. 3. A seguradora sub-roga-se nos direitos e ações do segurado, após o pagamento da indenização securitária, inclusive no que tange ao prazo prescricional, para, assim, buscar o ressarcimento que realizou. 4. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1278722/PR – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 29.06.2016)

Comentário EditorialO Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) examinou o prazo prescricional da pretensão de segu-radora de reaver valores pagos à segurada pela deterioração de mercadorias estocadas, contra a administradora de terminal portuário e a proprietária do container. A mercadoria consistia em frango congelado para exportação, e em virtude de vazamento de gás no sistema de refri-geração do container o produto foi rejeitado para consumo humano, perdendo-se a totalidade da carga.

O STJ decidiu contrariamente às primeira e segunda instâncias que tinham dado ganho de causa à seguradora condenando as rés por responsabilidade objetiva solidária.

O Recurso Especial tratou única e exclusivamente do prazo prescricional. Para o STJ, o prazo prescricional do art. 206, § 3º, inciso V é prazo geral para a reparação civil, que não preva-lece diante de prazos especiais, como ocorre no caso concreto, em que se aplica o art. 8º do Decreto-Lei nº 116/1967, que dispõe sobre as operações inerentes ao transporte de mercado-rias por via d’água nos portos brasileiros, delimitando suas responsabilidades e tratando das faltas e avarias:

“Art. 8º Prescrevem ao fim de um ano, contado da data do término da descarga do navio transportador, as ações por extravio de carga, bem como as ações por falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou danos à carga.

Parágrafo único. O prazo prescricional de que trata êste artigo somente poderá ser interrompido da forma prevista no art. 720 do Código de Processo Civil, observado o que dispõe o § 2º do art. 166 daquele Código.”

No entanto, o art. 449 do Código Comercial, também invocado pelos recorrentes não foi apli-cado por estar expressamente revogado pelo art. 2.045 do Código Civil.

O Tribunal comentou que tal decisão “guarda forte comprometimento com a sistemática que acabou por ser adotada pelo Código Civil de 2002, que, como dito, prestigiou a segurança jurídica reduzindo os prazos prescricionais em relação ao diploma legal de 1916”.

Também foram rechaçados os entendimentos da seguradora de que a relação teria cunho consumerista ainda que com base em julgados do próprio STJ (REsp 302.212 e 286.441),

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eis que o contrato de transporte é relação comercial, disciplinada pelo art. 730 do Código Civil.

Assim, o STJ reconheceu a prescrição e julgou extinta a demanda com julgamento de mérito, com a ressalva de que a seguradora sub-rogou-se nos direitos do segurado, inclusive no que tange ao prazo prescricional para poder assim buscar o ressarcimento do que despendeu.

Por fim, o STJ também aplicou ao caso a Súmula nº 151 do Supremo Tribunal Federal, que anuncia especificamente o prazo prescricional para a ação do segurador da carga avariada. Confira-se:

“Súmula nº 151 – Prescreve em um ano a ação do segurador sub-rogado para haver indenização por extravio ou perda de carga transportada por navio.”

2593 – Transporte marítimo – danos e avaria na carga – legitimidade passiva do agente de carga – agente que atua como representante do transportador no país – transpor-tador NVOCC – responsabilidade integral – danos da carga durante o seu percurso – responsabilidade solidária

“Apelação. Transporte Marítimo. Ação de regresso ajuizada por seguradora. Danos e avarias na mercadoria transportada. Sentença de procedência. Pleito de reforma. Admissibilidade, em parte. Preliminar de ilegitimidade passiva. Afastamento. Apelantes que atuaram, respecti-vamente, como agente de carga e transportador NVOCC. Responsabilidade solidária. Agente marítimo que atua como representante do transportador no país, com ele respondendo soli-dariamente. Transportador NVOCC que, contratado para o transporte das mercadorias até o destino, tem responsabilidade integral pelos danos ocorridos durante o percurso. Necessida-de, todavia, de correção do montante da condenação, de modo a evitar o enriquecimento sem causa da autora. Sentença reformada, em parte. Recurso parcialmente provido.” (TJSP – Ap 0045102-88.2013.8.26.0002 – 19ª CDPriv. – Relª Desª Claudia Grieco Tabosa Pessoa – DJe 11.07.2016)

Comentário EditorialTrata-se de recurso de apelação julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (“TJSP”), em que se discute o direito de regresso de companhia de seguro contra o agente de carga e o transportador NVOCC (Non-Vessel Operating Common Carrier) pela avaria de carga ocorridas durante o transporte.

O TJSP negou a alegação de ilegitimidade passiva da agente de carga, pois atuou no caso como agente, representando o transportador NVOCC no país, de modo que responde solida-riamente pelos danos. Foram citados no mesmo sentido os seguintes precedentes do TJSP: Apelação nº 0132793-74.2012.8.26.0100 e Apelação nº 1018643-64.2014.8.26.0562.

No mérito, foram rechaçados os pedidos do transportador NVOCC de exclusão de sua respon-sabilidade sob os argumentos de que a mercadoria estava sob a guarda e responsabilidade do armador e que este teria manuseado a carga incorretamente, dando causa aos danos. Para o TJSP, a responsabilidade do transportador NVOCC com a carga perdura até o alcance do seu destino final. O Tribunal destacou que tal modalidade de transportador “atua como uma espé-cie de armador virtual” e que embora não opere nem administre o navio “tem como atividade viabilizar o transporte em navios de armadoras em exercício”, de modo que seria irrelevante a discussão referente a quem se encontrava com a mercadoria no momento em que ocorreu a avaria.

Na ocasião foi invocado ainda o precedente do TJSP que também tratou da responsabilidade

do transportador NVOCC, o recurso de Apelação nº 0034884-49.2012.8.26.0562.

2594 – Transporte marítimo – frete – Prepaid – comprovação – retenção das mercadorias – ilegalidade

“Transporte marítimo. Frete. Pagamento prévio pelo importador (Prepaid) comprovado. Re-tenção das mercadorias por 76 dias. Medida ilegal. Transportadora que, em não recebendo o

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adimplemento, deveria buscá-lo perante a exportadora, e não com o contratante do transpor-te. Importadora que, para não prolongar ainda mais o armazenamento indevido, paga o valor, mas perseguiu judicialmente sua inexigibilidade, afinal reconhecida. Alegação, ademais, de prescrição do débito. Art. 22 da Lei nº 9.611/1998 que só incide após a devolução efetiva dos contêineres. Entendimento pacificado no STJ de que rege a espécie o prazo quinquenal do art. 206, § 5º, I, do Código Civil. Débitos vencidos em agosto de 2013, ação de cobrança ajuizada em setembro de 2014. Prescrição inocorrente. Sentença mantida. Recurso desprovi-do.” (TJSP – Ap 1021712-07.2014.8.26.0562 – 15ª CDPriv. – Rel. Des. Mendes Pereira – DJe 02.08.2016)

Transcrição EditorialLei nº 9.611, de 19 de fevereiro de 1998:“Art. 22. As ações judiciais oriundas do não cumprimento das responsabilidades decorrentes do transporte multimodal deverão ser intentadas no prazo máximo de um ano, contado da data da entrega da mercadoria no ponto de destino ou, caso isso não ocorra, do nonagésimo dia após o prazo previsto para a referida entrega, sob pena de prescrição.”

2595 – Transporte marítimo – impugnação pelas rés – verificação dos danos enquanto na posse dos produtos avariados – exame da prova – pedido improcedente

“Processo civil. Petição inicial. Requisitos presentes. Do exame da inicial verifica-se a presença de todos os requisitos exigidos pela lei processual, não se inferindo a inépcia alegada. Questões relacionadas, mais propriamente, ao mérito. Preliminar rejeitada. Ação regressiva. Responsabilidade civil. Transporte marítimo. Impugnação pelas rés da verificação dos danos enquanto na posse dos produtos avariados. Exame da prova. Pedido improcedente. Infere-se do exame dos autos que a própria autora afirmou que, quando a mercadoria foi recepcionada pela Cia. de Armazéns, foram ressalvadas algu-mas avarias, mas que não foi realizada a vistoria naquele momento por gerar mais des-pesas. A vistoria realizada somente quando a mercadoria já havia sido entregue à sua segurada, depois de ser feito transporte por outra empresa, sendo constatada, ademais, avaria diversa da ressalvada pelo Armazém, não permite concluir sobre quem teria sido o efetivo causador do dano. A ausência de vistoria que, à vista das avarias ressalvadas pelo Armazém, já deveria ter sido realizada pela Segurada ou sua Seguradora naquele momento, não justifica que atribua a responsabilidade a todas as empresas rés. Ainda que se aplicassem, além disso, ao caso as normas do Código de Defesa do Consumidor, estaria a autora apenas desobrigada da prova da culpa do fornecedor de serviços, mas não com relação aos demais pressupostos da responsabilidade civil. Honorários advo-catícios fixados adequadamente à vista da importância da causa e trabalho dos patro-nos, estando de acordo com o princípio da razoabilidade. Recurso desprovido.” (TJSP – Ap 0014967-96.2012.8.26.0562 – 15ª CDPriv. – Rel. Des. Luiz Arcuri – DJe 10.08.2016)

2596 – Transporte marítimo – liberação de mercadoria – tutela antecipada – premência da medida – inexistência – instauração do contraditório – necessidade

“Transporte marítimo. Ação de obrigação de fazer. Tutela antecipada. Inaudita altera par-te. Pedido de imediata liberação de mercadoria. Não vislumbrada a premência da medida. Necessidade de instauração do contraditório. Manutenção da decisão. Insta consignar que a concessão de tutelas de urgência sem a oitiva da parte contrária deve ser resguardada a situações excepcionais, nas quais se constata que a própria citação (ou o tempo necessário para concretizar a citação) coloca em risco o resultado final do processo. Ausente a situ-ação excepcional, a cautela impõe aguardar a formação completa da relação processual,

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concedendo-se oportunidade de defesa à parte contrária. Fica ressalvada a possibilidade de reexame da plausibilidade do direito invocado pela autora, após a citação e o decurso do pra-zo de defesa. Agravo não provido com observação.” (TJSP – AI 2095526-04.2016.8.26.0000 – 12ª CDPriv. – Relª Desª Sandra Galhardo Esteves – DJe 12.07.2016)

2597 – Transporte marítimo internacional – original de conhecimento de transporte – au-sência de apresentação – retenção de mercadorias pelo agente marítimo – cabimento

“Apelação cível. Obrigação de fazer. Transporte marítimo internacional. Retenção de mer-cadorias pelo agente marítimo. Ausência de apresentação do original de conhecimento de transporte (BL). Cabimento. 1. A controvérsia dos autos cinge-se sobre a documentação idô-nea para a liberação de mercadoria objeto de contrato de importação. Sustenta a autora que a ré, agente do armador contratado pela vendedora, reteve indevidamente as mercadorias, pois apresentou cópia do conhecimento de transporte (BL) e documentos comprobatórios da propriedade da carga. A ré, por sua vez, alegou que, agindo sob as ordens do armador, so-mente poderia liberar as mercadorias mediante apresentação do conhecimento de transporte (BL) original. 2. Como é cediço, o conhecimento de transporte (Bill of Lading) é documento peculiar, pois pode ser considerado recibo, contrato autônomo, documento de propriedade e título de crédito. Sua apresentação é fundamental em contratos de transporte marítimo, já que as mercadorias passam por diversos intermediários, sendo necessária à segurança jurí-dica, quanto à identificação do destinatário final. Não se pode reputar indevida a conduta da agente que se limita a requisitar a apresentação da documentação exigida, conforme as instruções do armador agenciado. 3. A norma que franqueia o levantamento de mercadoria sem o conhecimento de transporte (Decreto nº 6.759/2009) destina-se às autoridades fiscais, sendo descabido invocá-la também contra o particular, preposto do armador, que busca ape-nas cumprir seu dever de atuar de forma diligente no atendimento das instruções que lhe fo-ram dirigidas. Recurso a que se nega provimento.” (TJRJ – Ap 0213895-85.2013.8.19.0001 – 17ª C.Cív. – Relª Desª Marcia Ferreira Alvarenga – DJe 15.07.2016)

2598 – Transporte por barcaça – contrato de prestação recíproca de serviços e outros pactos – embarcações – devolução – inavegabilidade – inquérito administrativo – autorida-de portuária – prova pericial – necessidade – cerceamento de defesa – configuração

“Apelação cível. Ação de cobrança c/c obrigação de fazer com pedido de antecipação dos efeitos da tutela. Contrato de prestação recíproca de serviços e outros pactos envolvendo transporte de sal por barcaças (‘dix-sept rosado’, ‘Antônio Florêncio’ e ‘Osmundo Faria’) no Estado do Rio Grande do Norte. Rescisão unilateral do contrato por parte da ré, aqui apelada Salinor, com posterior devolução das barcaças. Alegação autoral de que foram devolvidas em precaríssimo estado de manutenção, apresentando ‘graves não conformidades técnicas, suficientes para impedir a operação e a navegabilidade das embarcações no estado que se encontram, necessitando de reparos com a maior brevidade possível’. Prova pericial. Reque-rimento pela parte ré. Deferimento pelo juízo a quo. Desistência. Juízo que, após deferir a prova pericial e diante da anômala desistência, fundamenta sua sentença de improcedência exatamente na prova emprestada do juízo administrativo portuário consubstanciada em laudo pericial que outrora entendeu desnecessário. Documentação apresentada pela ré referente ao inquérito administrativo instaurado junto à autoridade portuária, sem oportunizar a parte autora manifestar-se acerca de tais peças, inclusive aquilatar a necessidade dela, demandan-te, produzir prova pericial. Cerceamento de defesa. Configuração. Necessidade de dilação probatória. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal de Justiça. Sentença que se anula.” (TJRJ – Ap 0083867-29.2013.8.19.0001 – 22ª C.Cív. – Rel. Des. Marcelo Lima Buhatem – DJe 08.08.2016)

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2599 – Valor aduaneiro – despesas incorridas após a chegada ao porto – IN SRF 327/2007 – art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira – Decreto nº 4.543/2002 – sentença ultra petita – adequação

“Tributário. Processual civil. Valor aduaneiro. Despesas incorridas após a chegada ao porto. IN SRF 327/2007. Art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira. Decreto nº 4.543/2002. Sen-tença ultra petita. Adequação. 1. O provimento jurisdicional deve estar adstrito ao pedido formulado na inicial, suprimindo-se a parte ultra petita. 2. A expressão ‘até o porto’ contida no Regulamento Aduaneiro não inclui despesas ocorridas após a chegada do navio ao porto. 3. A Instrução Normativa SRF nº 327/2003, extrapolou o contido no art. 8º do Acordo de Va-loração Aduaneira e art. 77 do Decreto nº 4.543, de 2002. 4. Devem ser excluídos, do valor aduaneiro, para fins de cálculo da tributação devida na importação, as despesas relativas à descarga do bem, posteriores ao ingresso das mercadorias no porto. 5. Considerando que a capatazia é a atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, logo, que se dá após a chegada na mercadoria no porto, não pode ser considerada na com-posição do valor aduaneiro para fins de incidência do Imposto de Importação.” (TRF 4ª R. – Ap-Reex 5005002-93.2015.404.7208 – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Amaury Chaves de Athayde – DJe 04.07.2016)

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Seção Especial – Parecer

Parecer nº 0090/2016/CJU-MS/CGU/AGU

Consultoria-Geral da União

Consultoria Jurídica da União no Estado de Mato Grosso do Sul

Advocacia-Geral da União

Processo nº 04921.001277/2013‑41Interessado: Superintendência do Patrimônio da União no Mato Grosso do SulAssunto: Consulta sobre propriedade dos espaços físicos em água e terra dos reservatórios das Usinas Hidrelétricas

I – Consulta sobre propriedade dos espaços físicos em água e terra dos reservatórios das Usinas Hidrelétricas.

II – Resposta às indagações formuladas na consulta.

III – A União é proprietária dos espaços físicos em água e terra dos reservatórios das Usinas Hidrelétricas, desapropriados mediante de-claração de utilidade pública federal.

IV – Possibilidade de “inscrição de ocupação” para a regularização de espaços utilizados por particulares dentro dos limites da área desapropriada para construção das Usinas Hidrelétricas (art. 9º da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998).

V – Recomendação à SPU/MS de adoção dos procedimentos previs-tos na Portaria SPU nº 404, de 28 de dezembro de 2012, que prevê o fornecimento da “certidão declaratória acerca da situação de re-gularidade da área em terra sob o domínio da União, bem como se há disponibilidade do espaço físico em águas públicas”.

VI – Recomendação à requerente para que formule consulta ao Mi-nistério das Minas e Energia/ANEEL.

VII – Informação sobre o andamento da ADI nº 4.819-DF.

1. A Secretaria do Patrimônio da União – SPU/MS encaminhou a esta CJU consulta sobre a propriedade de espaço físico em água localizado em terminal hidroviário e de área de terreno desapropriada pela concessionária, contíguos à represa da Usina Hidrelétrica de Jupiá, situada no Rio Paraná.

2. A consulta fora formulada inicialmente por meio do Ofício nº 3191/2016-MP, acompanhada do Despacho Dicap SEI nº 1263181, no qual

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a SPU/MS faz questionamentos sobre o enquadramento de algumas áreas como propriedade da União e sobre a possibilidade de realizar a inscrição de ocupa-ção. Foi informado no despacho que: a) a Empresa ABC123 solicitou a cessão onerosa de espaço físico em águas públicas para operação de um Terminal Hidroviário adjacente ao reservatório da Usina Hidrelétrica Jupiá, nas proximi-dades do antigo córrego Bebedouro, afluente do Rio Paraná, existente antes da formação da represa; b) também é necessário que o espaço em terra adjacente ao espaço físico em águas seja regularizado junto à SPU, no caso deste perten-cer à União; c) a Usina Hidrelétrica Engenheiro de Souza Dias – UHE Jupiá, que está situada sobre o Rio Paraná na intersecção do Rio Sucuriú, foi executada pela Companhia Energética de São Paulo – CESP, após a desapropriação de uma área de 330 km2, para a formação do reservatório, onde estão incluídos os terrenos situados no seu entorno; d) a atual concessionária é a Empresa Chi-na Three Gorges (CTG). Diante disso, surgiram dúvidas sobre a propriedade das seguintes áreas: a) o espaço físico em águas do Terminal Hidroviário a ser utilizado para atracação e evolução de embarcações, situado em proprieda-de particular, contíguo à represa da Usina Hidrelétrica de Jupiá, localizada no Rio Paraná, executada pelo interessado para atracação de embarcações; b) o trecho do terreno desapropriado em torno da borda da represa, situado no Ter-minal Hidroviário. Ao final, a SPU/MS fez as seguintes indagações: a) O espaço do reservatório formado pela Usina Hidrelétrica é de propriedade da União?; b) O espaço da água para a atracação e evolução das embarcações, formado por um pequeno lago artificial situado em área particular contíguo ao reservató-rio da Usina Hidrelétrica, também é de propriedade da União?; c) O terreno do entorno do reservatório desapropriado pela concessionária é de propriedade da União?; d) No caso positivo, é recomendável utilizar a inscrição de ocupação para o trecho do terreno desapropriado localizado no terminal, como é normal-mente utilizado para as ocupações de terrenos marginais de Rio Federal?

3. Considerando o disposto no art. 3º, inciso IV, da Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 19961, que institui a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL e disciplina o regime das concessões de serviços públicos de energia elétrica, devolvemos o referido ofício ao órgão consulente, por meio da Nota nº 003/2016/CJU-MS/CGU/AGU, com a solicitação de que a consulta fosse re-

1 “Art. 3º Além das atribuições previstas nos incisos II, III, V, VI, VII, X, XI e XII do art. 29 e no art. 30 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, de outras incumbências expressamente previstas em lei e observado o disposto no § 1º, compete à ANEEL: (Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004) (vide Decreto nº 6.802, de 2009).

[...]

IV – gerir os contratos de concessão ou de permissão de serviços públicos de energia elétrica, de concessão de uso de bem público, bem como fiscalizar, diretamente ou mediante convênios com órgãos estaduais, as concessões, as permissões e a prestação dos serviços de energia elétrica; (Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004)

[...].”

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encaminhada a esta CJU após a juntada dos seguintes documentos: a) cópia do decreto de desapropriação; b) cópia dos contratos de concessão celebrados com a CESP e com a Empresa CTG.

4. Posteriormente, a SPU/MS encaminhou, via mensagens eletrônicas de 24.02.2016, os documentos a seguir: a) Contrato de Concessão nº 003/2004 – ANEEL – CESP, para geração de energia elétrica destinada a serviço público, celebrado em 12.11.2004, referente à UHE Jupiá; b) Decreto nº 71.111, de 15 de setembro de 1972, que “declara de utilidade pública, para fins de desa-propriação, áreas de terra e benfeitorias situadas em diversos Municípios dos Estados de Mato Grosso, Goiás, São Paulo e Minas Gerais destinadas à bacia de acumulação do aproveitamento hidrelétrico de Ilha Solteira”, referente à UHE Jupiá (Engº Souza Dias); c) Contrato de Concessão nº 01/2016-MME-UHEs Ilha Solteira e Jupiá, para prestação do serviço de geração de energia elétrica, cele-brado entre a União a concessionária Rio Paraná Energia S/A, com interveniên-cia e anuência da Empresa China Three Gorges Brasil Energia Ltda. (CTG Brasil), de 05.01.2016; d) Despacho de 19.02.2016, no qual a SPU/MS encaminha os documentos mencionados nas alíneas anteriores. Adicionalmente, a socieda-de empresária ABC123 encaminhou, via mensagem eletrônica de 24.02.2016, os seguintes documentos: a) Portaria nº 170, de 4 de fevereiro de 1987, do Ministro de Estado das Minas e Energia, que autoriza os concessionários de serviços públicos de energia elétrica e os titulares de manifestos a celebrarem, com terceiros, contratos de concessão de direito de uso das áreas marginais a reservatórios, glebas remanescentes de desapropriação e de outras áreas de sua propriedade, rurais e urbanas; b) Contrato de Concessão nº 01/2016-MME--UHEs Ilha Solteira e Jupiá, para prestação do serviço de geração de energia elétrica, celebrado entre a União e a concessionária Rio Paraná Energia S/A, com interveniência e anuência da Empresa China Three Gorges Brasil Energia Ltda. (CTG Brasil), de 05.01.2016; c) Requerimento formulado pela Empresa ABC123 à SPU/MS em 14.12.2015.

5. A consulta foi motivada pelo requerimento da Empresa ABC123, da-tado de 14.12.2015, do qual consta que: a) visando a realizar operações por-tuárias de movimentação e armazenamento, a empresa pretende obter a auto-rização para exploração de Terminal Portuário de Uso Privado – TUP, situado no trecho do córrego Bebedouro, próximo ao Reservatório da Hidroelétrica de Jupiá, dentro de área de influência e competência da União; b) nesse sentido, requereu a outorga de TUP à Agência Nacional de Transportes Aquaviários – Antaq, nos termos do art. 9º da Lei nº 12.815/2013; c) um dos documentos obrigatórios para instruir o requerimento junto à Antaq é a certidão prevista no art. 12 da Portaria SPU nº 404, de 28.12.20122, ou seja, a certidão declaratória

2 “Art. 1º Esta portaria estabelece normas e procedimentos para a instrução de processos visando à cessão de espaços físicos em águas públicas e fixa parâmetros para o cálculo do preço público devido, a título de retribuição à União.

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acerca da situação de regularidade da área em terra sob o domínio da União; d) por essa razão, a empresa solicitou a expedição da certidão à SPU/MS, bem como a cessão onerosa da área em água pretendida; e) como a área preten-dida havia sido incluída no escopo do Contrato de Concessão de Geração nº 004/2004-ANEEL, firmado com a CESP, houve o entendimento de que ca-beria àquela concessionária expedir a referida certidão; f) diante disso, a CESP expediu os Documentos nº C/A1B2 e nº CT/C3D4, através dos quais certificou a disponibilidade e autorizou o uso da área, enquanto que o processo de outorga de autorização teve prosseguimento na Antaq, instruído com a documentação que fora expedida pela CESP, sendo ao final aprovado por intermédio da Re-solução nº E5F6-Antaq; g) em sequência, os autos foram encaminhados para a Secretaria de Portos da Presidência da República – SEP/PR, poder concedente do Setor Portuário, que solicitou a renovação da autorização emitida pela CESP; h) com o fim da concessão da União para a CESP, tornou-se impossível renovar a autorização; i) o processo que tramitava junto à SPU/MS foi concluído com o indeferimento do pedido, pois a SPU/MS entendeu que as instalações da re-querente estariam localizadas em área de titularidade do Estado de Mato Grosso do Sul, fora da competência da União; j) diante disso, a requerente formulou o pedido de cessão de área e expedição da respectiva certidão ao Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul – Imasul, com base no Decreto Estadual nº 13.990, de 02.07.2014, art. 3º, § 1º3; k) porém, o Imasul também indeferiu o pedido, por entender que a área referente ao TUP situa-se em águas de domínio da União; l) a fim de esclarecer a competência sobre a área, a requerente en-trou em contato com a Gerência de Recursos Hídricos (GRH) do Imasul, a qual informou que as instalações da requerente encontram-se em área legalmente delimitada como área de influência do Reservatório da Hidrelétrica de Jupiá; m) uma vez dirimida a dúvida existente sobre a competência da SPU, torna-se ne-cessário que a SPU/MS, após a instrução do processo, proceda à expedição da certidão de regularidade em terra e disponibilidade do espaço físico em águas, a fim de que a requerente possa dar continuidade ao processo de outorga atual-mente em trâmite na SEP/PR. Ao final, a requerente solicita: a) que a cessão seja

Art. 2º São enquadradas nesta portaria as estruturas náuticas em espaço físico em águas públicas de domínio da União, tais como lagos, rios, correntes d’água e mar territorial, até o limite de 12 milhas marítimas a partir da costa.

[...]

Art. 12 A SPU/UF, quando solicitada, expedirá certidão declaratória acerca da situação de regularidade da área em terra sob o domínio da União, bem como se há disponibilidade do espaço físico em águas públicas, para que o interessado possa dar início aos demais licenciamentos.”

3 “Art. 3º A outorga de direito de uso dos recursos hídricos é o ato administrativo mediante o qual o Poder Exe-cutivo Estadual faculta ao outorgado o uso de recursos hídricos, em condições pré-estabelecidas e por tempo determinado, nos termos e nas condições expressas no respectivo ato, considerando as legislações especificas vigentes.

§ 1º Compete ao Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), autarquia vinculada à Secretaria de Estado de Meio Ambiente, do Planejamento, da Ciência e Tecnologia (Semac), outorgar e fiscalizar o direito de uso de recursos hídricos.”

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feita pelo período inicial de vinte e cinco anos, prorrogáveis indefinidamente; b) que a cessão incluía os pequenos trechos de terrenos marginais laterais, con-forme precedentes da SPU, exemplificado pela Portaria nº 64/2014; c) o desar-quivamento e continuidade do processo; d) a emissão da certidão declaratória de regularidade em terra e disponibilidade do espaço físico em águas públicas federais, conforme a planta de localização e memorial descrito anexados ao requerimento; e) a conclusão do processo de cessão onerosa de uso; f) a pere-nidade da cessão, a fim de que não seja afetada por superveniente outorga do uso à companhia hidrelétrica.

6. É o relatório.

7. Trata-se de consulta formulada pela SPU/MS sobre a titularidade da propriedade do espaço físico em água, localizado em terminal hidroviário, e de área de terreno desapropriada por concessionária de energia elétrica, contíguos à represa da UHE Jupiá, situada no Rio Paraná, e também sobre a possibilidade de realizar a inscrição da ocupação das referidas áreas em favor da Empresa ABC123.

8. A fim de facilitar o entendimento, analisaremos as questões na ordem em que foram formuladas no Despacho Dicap SEI nº 1263181:

8.1 Questão a): O espaço do reservatório formado pela Usina Hidrelétri-ca é de propriedade da União?

8.1.1 Sim, porque as áreas de terra utilizadas pela UHE Jupiá foram obje-to de desapropriação decretada pela União, de modo que passaram a integrar o patrimônio do ente federal. O espaço físico em águas também é de propriedade da União, em decorrência do regime jurídico das águas internas.

8.1.2 De acordo como o Decreto nº 71.111, de 15 de setembro de 19724, a CESP foi autorizada a promover a desapropriação das áreas de terra e benfei-torias constantes das plantas ali mencionadas. A autorização contida no referido decreto atende à exigência do Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, que contém as normas básicas de desapropriação e cujo art. 3º dispõe que os concessionários poderão promover a desapropriação mediante autorização ex-pressa constante de lei ou contrato5. Após a declaração de utilidade pública por meio do Decreto nº 71.111/1972, a CESP promoveu a desapropriação das áreas

4 Que declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, áreas de terra e benfeitorias situadas em diversos Municípios dos Estados de Mato Grosso, Goiás, São Paulo e Minas Gerais destinadas à bacia de acumulação do aproveitamento hidrelétrico de Ilha Solteira.

5 “Art. 3º Poderão promover a desapropriação mediante autorização expressa constante de lei ou contrato: (Redação dada pela Medida Provisória nº 700, de 2015)

I – os concessionários, inclusive aqueles contratados nos termos da Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, permissionários, autorizatários e arrendatários; (Incluído pela Medida Provisória nº 700, de 2015)

[...].”

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ali mencionadas. Ao assim proceder, aquela empresa concessionária atuou em nome da União, com base na expressa autorização que lhe foi conferida pelo decreto mencionado, de modo que as áreas desapropriadas passaram a integrar o patrimônio público, embora em benefício da concessionária prestadora dos serviços de energia elétrica, que explora o potencial de energia hidráulica por meio da UHE Jupiá. A celebração do contrato de concessão não implica a trans-ferência da propriedade dos bens da União para a empresa, pois, no contrato de concessão de serviços públicos, “o poder concedente não transfere propriedade alguma ao concessionário, nem se despoja de qualquer direito ou prerrogativa pública. Delega apenas a execução do serviço, nos limites e condições legais ou contratuais, sempre sujeita regulamentação e fiscalização do concedente”. (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 29. ed. São Paulo, Malheiros, 2004. p. 368) Assim sendo, mesmo na vigência dos sucessivos con-tratos de concessão, a propriedade das áreas desapropriadas continua a ser da União, uma vez que a concessão não transfere ao concessionário o domínio so-bre as mesmas. Por esse motivo, caso a SPU/MS constate que as instalações da requerente estão localizadas dentro dos limites da área desapropriada, deverá considerar as áreas em terra como propriedade da União.

8.1.3 Para responder a essa questão no caso específico da Empresa ABC123, é necessário que a SPU/MS verifique a exata localização das insta-lações da empresa requerente. Foi informado na consulta que as instalações da requerente estão situadas nas proximidades do antigo córrego Bebedouro, afluente do Rio Paraná, existente antes da formação da represa. A par disso, a empresa interessada informou, em seu requerimento, que, segundo a Gerência de Recursos Hídricos do Imasul, o Terminal Portuário de Uso Privado – TUP está contido em área legalmente delimitada como de influência do Reservatório da Hidrelétrica de Jupiá. Se essa informação for confirmada pela SPU/MS, te-remos a conclusão de que as áreas objeto do requerimento são de propriedade federal.

8.1.4 Mesmo que o referido curso d’água – córrego Bebedouro – não seja considerado rio federal, nos termos do Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, nada impede que os terrenos marginais sejam enquadrados como pro-priedade da União, pois o domínio, no caso, é decorrente do decreto de desa-propriação, que declarou a utilidade pública da área, com base no art. 1º, alínea “l”, do referido decreto6, e não na alínea “c”, que trata dos terrenos marginais.

6 “Art. 1º Incluem-se entre os bens imóveis da União:

[...]

c) os terrenos marginais de rios e as ilhas nestes situadas na faixa da fronteira do território nacional e nas zonas onde se faça sentir a influência das marés;

[...]

l) os que tenham sido a algum título, ou em virtude de lei, incorporados ao seu patrimônio.”

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8.1.5 Adicionalmente, com o advento da Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, as águas internas (que banham exclusivamente o território nacional ou lhe servem de divisa com Estados estrangeiros7) passaram a ser tratadas como bem de domínio público, recurso natural limitado e dotado de valor econômi-co. O uso da água para qualquer fim, salvo para os aproveitamentos conside-rados insignificantes, fica sujeito à outorga onerosa do Poder Público, na esfera federal ou estadual, conforme o domínio da corrente aquífera (arts. 12 e 14 da referida lei8). Assim, se a corrente aquífera pertencer ao domínio da União, a outorga deverá ser federal. De acordo com a Constituição Federal de 1988, art. 20, inciso III, são bens da União os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio ou que banhem mais de um Estado, constituam limite com outros países ou se estendam em território estrangeiro ou dele pro-venham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais. A partir da norma constitucional, pode-se concluir que os espaços em água que estejam situa-dos sobre terras federais também pertencem ao domínio da União. Portanto, a União é proprietária do espaço do reservatório formado pela Usina Hidrelétrica de Jupiá, uma vez que o espaço em águas, no caso, está situado em terreno de seu domínio, em decorrência da desapropriação que antecedeu à instalação da referida UHE. Especificamente quanto ao espaço físico em águas públicas que é objeto do requerimento da Empresa ABC123, é necessário que a SPU/MS veri-fique a sua exata localização. Caso esteja situado dentro dos limites da área de-sapropriada, será considerado propriedade da União, como dito anteriormente.

8.1.6 Assim, respondemos afirmativamente à primeira indagação, no sentido de que o espaço do reservatório formado pela Usina Hidrelétrica é de propriedade da União, por estar situado em terras de seu domínio, com funda-mento nos seguintes diplomas: Constituição Federal de 1988, art. 20, III; Lei

7 Conceito de Hely Lopes Meirelles (op. cit., p. 533).8 “Art. 12. Estão sujeitos a outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos hídricos:

[...]

IV – aproveitamento dos potenciais hidrelétricos;

V – outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água.

§ 1º Independem de outorga pelo Poder Público, conforme definido em regulamento:

I – o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distri-buídos no meio rural;

II – as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes;

III – as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes.

§ 2º A outorga e a utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica estará subordinada ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, aprovado na forma do disposto no inciso VIII do art. 35 desta Lei, obedecida a disciplina da legislação setorial específica.

Parágrafo único. A outorga de uso dos recursos hídricos deverá preservar o uso múltiplo destes.

[...]

Art. 14. A outorga efetivar-se-á por ato da autoridade competente do Poder Executivo Federal, dos Estados ou do Distrito Federal.”

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nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, arts. 12 e 14; Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, art. 1º, alínea l; e Decreto nº 71.111, de 15 de setembro de 1972.

8.2 Questão b): O espaço da água para a atracação e evolução das em-barcações, formado por um pequeno lago artificial situado em área particular contíguo ao reservatório da Usina Hidrelétrica, também é de propriedade da União?

8.2.1 A resposta à segunda questão decorre da solução da primeira: se a área de que se cogita está situada fora dos limites das terras desapropriadas pela União, está excluída de seu domínio, integrando o patrimônio particular; caso contrário, será de propriedade da União; se estiver situada em área utilizada pela concessionária de energia elétrica, dentro dos limites da área desapropria-da, também será de propriedade da União, embora esteja sendo utilizada por um particular, uma vez que o contrato de concessão não transfere a proprieda-de da União para a concessionária.

8.3 Questão c): O terreno do entorno do reservatório desapropriado pela concessionária é de propriedade da União?

8.3.1 Sim, todas as terras compreendidas nos limites da área desapropria-da pelo Decreto nº 71.111, de 15 de setembro de 1972, são de propriedade da União.

8.4 Questão d): Em caso positivo, é recomendável utilizar a inscrição de ocupação para o trecho do terreno desapropriado localizado no terminal, como é normalmente utilizado para as ocupações de terrenos marginais de Rio Federal?

8.4.1 Para responder a essa questão, temos que analisar a legislação es-pecífica do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Já tivemos opor-tunidade de pesquisar o tema da Inscrição de Ocupação de terrenos marginais de rio federal quando elaboramos o Parecer nº 0032/2014/CJU-MS/CGU/AGU, de 05.02.2014. Naquele opinativo, registramos que, consoante o entendimento já consolidado no âmbito da Conjur/MP, a inscrição da ocupação é ato admi-nistrativo aplicável aos terrenos marginais da União que estejam sendo ocupa-dos por particulares. Para proceder à inscrição da ocupação, deve-se observar as disposições contidas na Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, e no Decreto--Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946. Há que se observar também os casos em que é vedada a inscrição de ocupação, que estão definidos no art. 9º da Lei nº 9.636/1998, a seguir transcrito:

Art. 9º É vedada a inscrição de ocupações que:

I – ocorreram após 27 de abril de 2006; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

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II – estejam concorrendo ou tenham concorrido para comprometer a integridade das áreas de uso comum do povo, de segurança nacional, de preservação am-biental ou necessárias à preservação dos ecossistemas naturais e de implantação de programas ou ações de regularização fundiária de interesse social ou habita-cionais das reservas indígenas, das áreas ocupadas por comunidades remanes-centes de quilombos, das vias federais de comunicação e das áreas reservadas para construção de hidrelétricas ou congêneres, ressalvados os casos especiais autorizados na forma da lei. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007) (grifou--se)

8.4.2. Assim, entendemos, salvo melhor juízo, que as áreas de proprieda-de da União destinadas a usinas hidrelétricas ou congêneres poderão ser objeto de inscrição de ocupação, desde que não incidam nas vedações do art. 9º da Lei nº 9.636/1998. Além disso, a própria lei faz a ressalva relativa aos casos previstos em legislação específica. Em se tratando de solicitação de autorização da SPU para instalação de estruturas náuticas em águas públicas de domínio da União, a legislação específica é a Portaria SPU nº 404, de 28 de janeiro de 2012, expedida com base no art. 67 do Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946; arts. 18 e 42 da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 20089;, art. 18, inciso IV, do Decreto nº 3.725, de 10 de janeiro de 2001; e art. 6º, do Decreto-Lei nº 2.398, de 21 de dezembro de 1987.

9 “Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob

qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:

I – Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assis-tência social ou saúde; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

II – pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

§ 1º A cessão de que trata este artigo poderá ser realizada, ainda, sob o regime de concessão de direito real de uso resolúvel, previsto no art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, aplicando-se, inclusive, em terrenos de Marinha e acrescidos, dispensando-se o procedimento licitatório para associações e coopera-tivas que se enquadrem no inciso II do caput deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

§ 2º O espaço aéreo sobre bens públicos, o espaço físico em águas públicas, as áreas de álveo de lagos, rios e quaisquer correntes d’água, de vazantes, da plataforma continental e de outros bens de domínio da União, insusceptíveis de transferência de direitos reais a terceiros, poderão ser objeto de cessão de uso, nos termos deste artigo, observadas as prescrições legais vigentes. (grifou-se)

§ 3º A cessão será autorizada em ato do Presidente da República e se formalizará mediante termo ou contrato, do qual constarão expressamente as condições estabelecidas, entre as quais a finalidade da sua realização e o prazo para seu cumprimento, e tornar-se-á nula, independentemente de ato especial, se ao imóvel, no todo ou em parte, vier a ser dada aplicação diversa da prevista no ato autorizativo e consequente termo ou contrato.

§ 4º A competência para autorizar a cessão de que trata este artigo poderá ser delegada ao Ministro de Estado da Fazenda, permitida a subdelegação.

§ 5º A cessão, quando destinada à execução de empreendimento de fim lucrativo, será onerosa e, sempre que houver condições de competitividade, deverão ser observados os procedimentos licitatórios previstos em lei.

[...]

§ 7º Além das hipóteses previstas nos incisos I e II do caput e no § 2º deste artigo, o espaço aéreo sobre bens públicos, o espaço físico em águas públicas, as áreas de álveo de lagos, rios e quaisquer correntes d’água, de vazantes e de outros bens do domínio da União, contíguos a imóveis da União afetados ao regime de afora-mento ou ocupação, poderão ser objeto de cessão de uso. (Incluído pela Lei nº 12.058, de 2009)”

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8.4.3 A Lei nº 9.636/2008, no art. 18, § 2º, prevê que o espaço físico em águas públicas poderá ser objeto de cessão de uso. Como base na autorização legal, a Portaria SPU nº 404/2012 “estabelece normas e procedimentos para a instrução de processos visando à cessão de espaços físicos em águas públicas e fixa parâmetros para o cálculo do preço público devido, a título de retribuição à União” (art. 1º). De acordo com o art. 2º, são abrangidas pela portaria “as estruturas náuticas em espaço físico em águas públicas de domínio da União, tais como lagos, rios, correntes d’água e mar territorial, até o limite de 12 milhas marítimas a partir da costa”. Mais adiante, no art. 12, a portaria dispõe que “a SPU/UF, quando solicitada, expedirá certidão declaratória acerca da situação de regularidade da área em terra sob o domínio da União, bem como se há dis-ponibilidade do espaço físico em águas públicas, para que o interessado possa dar início aos demais licenciamentos”.

8.4.4 Como afirmado anteriormente, as áreas de propriedade da União destinadas a usinas hidrelétricas ou congêneres poderão ser objeto de ins-crição de ocupação, desde que não incidam nas vedações do art. 9º da Lei nº 9.636/1998. Porém, diante da existência de legislação específica (Decreto--Lei nº 9.760/1946, Lei nº 9.636/2008, Decreto nº 3.725/2001, Decreto-Lei nº 2.398/1987 e Portaria nº 404/2012), entendemos que o instituto mais ade-quado para a regularização das referidas áreas é a cessão, a qual, caso conce-dida pela SPU/MS ao particular interessado, tornará desnecessária a inscrição de ocupação. Pelo princípio da especialidade, que é regra de hermenêutica ju-rídica, a norma especial afasta a incidência da norma geral. Assim, embora seja admissível a inscrição de ocupação das referidas áreas, com fundamento no art. 9º da Lei nº 9.636/1998, há que prevalecer a aplicação das normas especiais em detrimento da norma geral.

8.4.5 Assim sendo, em se tratando de requerimento no qual a interes-sada pede à SPU a expedição de certidão declaratória, necessária para instruir o procedimento de outorga de TUP junto à Antaq, bem como a cessão onero-sa da área, a SPU/MS deverá adotar o procedimento previsto na Portaria SPU nº 404/2012, do qual resultará o deferimento ou indeferimento dos pedidos de expedição de certidão declaratória de regularidade e de cessão da área.

8.4.6 Observamos, ainda, que a Lei nº 12.815, de 5 de junho de 2013 (que dispõe sobre a exploração direta e indireta pela União de portos e instala-ções portuárias e sobre as atividades desempenhada pelos operadores portuá-rios), prevê, no parágrafo único do art. 11, que “o interessado em autorização de instalação portuária deverá apresentar título de propriedade, inscrição de ocupação, certidão de aforamento, cessão de direito real ou outro instrumento jurídico que assegure o direito de uso e fruição do respectivo terreno”. Isto é, para fins de instrução do requerimento feito pela empresa interessada à Antaq, faculta-se a apresentação da inscrição de ocupação ou de outro instrumento

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que assegure o direito de uso e fruição do terreno. Desta forma, caso a SPU/MS expeça a certidão declaratória acerca da situação de regularidade da área em terra sob o domínio da União, a ausência da inscrição de ocupação não preju-dicará o andamento do processo de outorga junto à Antaq.

9. Uma vez respondidas as questões formuladas pelo órgão assessorado, passaremos a tratar de dificuldade suscitada no requerimento da empresa inte-ressada.

9.1.1 A requerente já havia obtido anteriormente a certidão de re-gularidade junto à CESP, com base no Contrato de Concessão de Geração nº 004/2004-ANEEL, celebrado entre a referida empresa e a União, por inter-médio da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. A CESP teria expedido os Documentos nº CT/A1B2 e nº CT/C3D4, através dos quais certificou a dis-ponibilidade e autorizou o uso da área. O processo de outorga de autorização teve prosseguimento na Antaq, instruído com a documentação que fora expe-dida pela CESP, sendo ao final aprovado por intermédio da Resolução nº E5F6--Antaq. Em sequência, os autos foram encaminhados para a Secretaria de Portos da Presidência da República – SEP/PR, poder concedente do Setor Portuário, que solicitou a renovação. Porém, com a extinção do contrato de concessão, a requerente informou que não foi mais possível renovar a autorização junto à CESP.

9.1.2 Por força da Lei nº 12.783, de 11 de janeiro de 2013 (que dispõe sobre as concessões de geração, transmissão e distribuição de energia elétri-ca), em caso de extinção da concessão, e caso a antiga concessionária não tenha interesse na prestação do serviço, o poder concedente deverá designar órgão ou entidade que responderá pelas obrigações, até a assunção do novo concessionário10. De acordo com a cláusula quarta, subcláusula segunda, do contrato celebrado entre a União/Ministério de Minas e Energia e a Empresa

10 “Art. 9º Não havendo a prorrogação do prazo de concessão e com vistas a garantir a continuidade da prestação do serviço, o titular poderá, após o vencimento do prazo, permanecer responsável por sua prestação até a assunção do novo concessionário, observadas as condições estabelecidas por esta Lei.

§ 1º Caso não haja interesse do concessionário na continuidade da prestação do serviço nas condições esta-belecidas nesta Lei, o serviço será explorado por meio de órgão ou entidade da administração pública federal, até que seja concluído o processo licitatório de que trata o art. 8º.

§ 2º Com a finalidade de assegurar a continuidade do serviço, o órgão ou entidade de que trata o § 1º fica autorizado a realizar a contratação temporária de pessoal imprescindível à prestação do serviço público de energia elétrica, até a contratação de novo concessionário.

[...]

§ 5º As obrigações contraídas pelo órgão ou entidade de que trata o § 1º na prestação temporária do serviço serão assumidas pelo novo concessionário, nos termos do edital de licitação.

Art. 10. O órgão ou entidade responsável pela prestação temporária do serviço público de energia elétrica deverá:

I – manter registros contábeis próprios relativos à prestação do serviço; e

II – prestar contas à ANEEL e efetuar acertos de contas com o poder concedente.”

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Rio Paraná Energia S/A (Contrato de Concessão nº 01/2016- MME-UHEs Ilha Solteira e Jupiá), a assunção do serviço de geração ocorrerá após 180 dias da assinatura do contrato, ocasião na qual a empresa passará à condição de con-cessionária. Nesse intervalo de 180 dias, as empresas designadas no art. 9º da Lei nº 12.783/2013 continuarão sendo responsáveis pela prestação de serviços.

9.1.3 Entre as obrigações da futura concessionária está a de adotar o que estabelece a Portaria MME nº 170, de 4 de fevereiro de 198711, no que diz respeito à Cessão de Direito de Uso de Áreas Marginas ao Reservatório, Glebas Remanescentes e Ilhas (cláusula décima, subcláusula primeira). Desta forma, verifica-se que o novo contrato de concessão de energia elétrica atribui à con-cessionária a faculdade de ceder o direito de uso das áreas marginas ao reser-vatório, com base na Portaria nº 170, de 4 de fevereiro de 1987, do Ministério de Minas e Energia. A referida portaria, além de autorizar as concessionárias a celebrar contrato de concessão de direito de uso das áreas marginais a reser-vatórios, estabelece que as mesmas também são responsáveis pela fiscalização das áreas objeto de concessão, de forma a garantir sua utilização mais adequa-da. Portanto, a nova concessionária será responsável pela fiscalização das áreas anteriormente concedidas pela CESP. Assim, não obstante tudo que foi dito sobre a expedição de certidão de regularidade pela SPU, há que se observar que ainda subsiste a responsabilidade da concessionária de energia elétrica, ou do ente designado pela União, pela concessão de áreas de terrenos marginais de reservatórios a terceiros, bem como pela fiscalização das referidas áreas.

9.1.4 Considerando-se que a empresa requerente informou já ter obtido autorização de ocupação da área junto à CESP, autorização essa que não foi renovada devido à extinção do contrato de concessão então vigente, recomen-damos à empresa requerente que solicite ao Ministério de Minas e Energia ou à ANEEL12 a indicação do órgão/entidade responsável pela renovação da referida

11 “Portaria nº 170, de 4 de fevereiro de 1987

O Ministro de Estado das Minas e Energia, usando de suas atribuições, e

Considerando estudos desenvolvidos pelo Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica constantes do Processo nº 27100.003772/84-68, que visa dar maior proteção aos reservatórios de acumulação de água para geração de energia elétrica, quanto ao assoreamento;

Considerando ainda a necessidade de disciplinar o uso das áreas marginais a esses reservatórios, privilegiando a destinação social, resolve:

I – Autorizar os concessionários de serviços públicos de energia elétrica e os titulares de Manifestos a cele-brarem, com terceiros, contratos de concessão de direito de uso das áreas marginais a reservatórios, glebas remanescentes de desapropriação e de outras áreas de sua propriedade, rurais e urbanas;

[...]

III – Determinar que, nos contratos de que trata o item I desta Portaria, fique estabelecido que os concessioná-rios continuarão fiscalizando as áreas objeto de concessão, de forma a garantir sua utilização mais adequada, conforme estabelecido no item anterior;

[...].”12 Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996, que institui a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL e

disciplina o regime das concessões de serviços públicos de energia elétrica:

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autorização até a assunção dos serviços pela nova concessionária. Tal medida é necessária em virtude da disposição contratual contida no atual contrato de concessão, que atribui à futura concessionária de energia elétrica a responsabi-lidade pela fiscalização das áreas de terrenos marginais eventualmente conce-didas com base na Portaria MME nº 170/1987.

9.1.5 Em resumo, concluímos que, para responder ao requerimento da empresa interessada, a SPU/MS precisará verificar a exata localização do em-preendimento. Se estiver dentro da área desapropriada pela União, estaremos diante de área federal, de modo que caberá à SPU fornecer ou não a certidão prevista no art. 12 Portaria SPU nº 404/2012, bem como a cessão de uso soli-citada, mediante o procedimento administrativo ali previsto. O processo admi-nistrativo respectivo deverá ser instruído com a documentação relacionada no art. 10 da portaria, inclusive a nota técnica na qual a SPU/MS se posicionará sobre a conveniência e oportunidade administrativa da cessão da área. Em adi-ção, recomendamos a SPU/MS que oriente a empresa interessada no sentido de formular ao Ministério das Minas e Energia ou a ANEEL a indicação do ente responsável pela emissão da autorização, anteriormente expedida pela CESP, até a assunção dos serviços pela nova concessionária.

10. Por último, consideramos também oportuno informar que se encon-tra em andamento no Supremo Tribunal Federal a Ação Direta de Inconstitu-cionalidade (ADI) nº 4.819-DF, na qual a Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP) contesta os valores cobrados pela União a título de ocupação dos espelhos d’água em portos e assemelhados. A ação foi dirigida, original-mente, contra o art. 18, §§ 2º, 5º e 7º, da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, e contra a Portaria nº 24, de 26 de janeiro de 2011, da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), na redação conferida pela Portaria nº 231, de 15 de julho de 2011. Aditou-se a petição inicial em virtude da revogação da primeira portaria pela Portaria nº 404, de 28 de dezembro de 2012. O Ministério Público Federal manifestou-se pelo não conhecimento da ação, ou, caso conhecida, pela im-procedência do pedido. No mérito, o MPF opinou pela constitucionalidade da cobrança, por entender que a Lei nº 9.636/1998, no art. 18, permite que a SPU autorize, de forma onerosa, a utilização extraordinária dos bens de uso comum nas hipóteses em que for extrapolado o seu uso ordinário, ainda mais se a ati-

“Art. 3º Além das atribuições previstas nos incisos II, III, V, VI, VII, X, XI e XII do art. 29 e no art. 30 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, de outras incumbências expressamente previstas em lei e observado o disposto no § 1º, compete à ANEEL: (Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004) (vide Decreto nº 6.802, de 2009).

[...]

IV – gerir os contratos de concessão ou de permissão de serviços públicos de energia elétrica, de concessão de uso de bem público, bem como fiscalizar, diretamente ou mediante convênios com órgãos estaduais, as concessões, as permissões e a prestação dos serviços de energia elétrica; (Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004)

[...].”

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vidade tiver fins lucrativos, como no caso dos portos, e que não há qualquer inconstitucionalidade, pois “o domínio da União sobre os bens de uso comum não se restringe à esfera meramente política, mas, diversamente, abrange a titu-laridade, inclusive, de direitos reais sobre esse patrimônio comum”. Concluiu também que a Portaria nº 404/2012 é resultado do poder regulamentar do chefe do Poder Executivo e encontra amparo legal na Lei nº 9.636/1998 e do Decreto nº 3.725/2001, sendo que a fixação dos valores cobrados pela ocupação de áreas públicas, dada sua natureza de preço público, não constitui matéria re-servada à lei.

10.1. A manifestação do Parquet Federal é bastante clara no que concer-ne à propriedade da União sobre os espaços sobre águas públicas e também no tocante à legalidade da cobrança pelo seu uso, motivo pelo qual entendemos oportuno transcrever o trecho a seguir:

Por outro lado, o fato de as empresas do sistema portuário já estarem sob regime de concessão ou autorização para a exploração da atividade respectiva não ex-clui a possibilidade da cobrança pelo uso dos espaços sobre águas públicas, pois não se deve confundir os valores cobrados em razão de contrato firmado com a Antaq, daqueles cobrados em virtude da ocupação dos espelhos d’água perten-centes à União. Enquanto aqueles têm natureza contratual, sendo cobrados a título de arrendamento da atividade econômica, esses, embora também firmados em contrato, decorrem do direito de propriedade da União sobre os bens de uso comum.

10.2. Embora a ADI 4.819-DF ainda não tenha sido julgada, podemos concluir pela constitucionalidade da Portaria nº 404/2012, com base no prin-cípio da presunção de constitucionalidade das leis e dos atos normativos do poder público13. Por conseguinte, a SPU/MS poderá dar continuidade aos pro-cedimentos instaurados com base na citada portaria, até que sobrevenha deci-são judicial em contrário.

11. Pelo exposto, a Advocacia-Geral da União, por intermédio de seu membro (art. 131 da Constituição Federal, art. 11 da Lei Complementar nº 73/1993 e art. 38, parágrafo único, da Lei nº 8.666/1993), responde às in-dagações contidas na consulta, conforme o item 8, com as recomendações dos itens 9.1.5 e 10.2, para os fins da lei, tudo nos termos e limites deste parecer.

Campo Grande, 2 de março de 2016.

Onercilene Ricarte de Oliveira Advogada da União

13 De acordo com esse princípio, as leis e os atos normativos em geral são reputados constitucionais, somente perdendo sua validade e eficácia mediante a declaração judicial em contrário obtida no controle concentrado de constitucionalidade ou por força de Resolução do Senado Federal, na hipótese de a inconstitucionalidade ter sido reconhecida incidentalmente por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal.

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Seção Especial – Direito em Debate

Resolução Normativa Antaq nº 07/2016 – O Que Mudou na Exploração de Portos Organizados?

LuCAS nAVARRO PRADOAdvogado do Navarro Prado Advogados, Graduado em Direito pela USP, Pós-Graduado em Finanças pela FIA/USP, Professor do Programa de Pós-Graduação do Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP.

DEnIS gAMELLAdvogado do Navarro Prado Advogados, Graduado em Direito pela UnB, Pós-Graduando do MBA em Finanças e Gestão Econômica e Financeira de Empresas da FGV Brasília.

SUMÁRIO: I – Porto organizado; II – Unificação contratual; III – Alteração unilateral dos contratos; IV – Bens reversíveis; V – Ilícitos contra a ordem econômica; VI – Contratos de uso temporário; VII – Contratos de passagem; VIII – Contratos de transição; IX – Instalações portuárias não operacio-nais; X – Administração Portuária; XI – Adaptação dos contratos.

Recentemente, a Diretoria-Geral da Antaq aprovou, após longa trami-tação e discussão, a nova norma que dispõe sobre a exploração de instala-ções em Portos Organizados. Trata-se da Resolução Normativa nº 7, de 30 de maio de 2016. A referida norma tem por propósito substituir a antiga Resolução nº 2.240/2011, de modo a adequar a regulação da exploração de instalações dentro de Portos Organizados aos marcos legais e regulamentar vigentes, isto é, a Lei nº 12.815/2013 e o Decreto nº 8.033/2013. O texto da nova resolução consolida alterações substanciais em relação ao originalmente proposto pela Resolução nº 3.708/2014, refletindo parte das contribuições apresentadas por empresas reguladas e entidades de representação do setor durante a audiência pública à qual esta foi submetida.

As principais modificações em relação à Resolução nº 2.240/2011 dizem respeito aos seguintes tópicos: (i) alteração da definição de Porto Organizado; (ii) a possibilidade de unificação contratual; (iii) exclusão das referências sobre alteração unilateral nos arrendamento; (iv) exclusão de disposições sobre bens reversíveis nos arrendamentos; (v) necessidade de prévio processo administra-tivo com garantia de ampla defesa e contraditório para representação ao Con-selho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre ilícitos contra a ordem econômica; (vi) definição de carga com mercado não consolidado e alteração do regime do contrato de uso temporário; (vii) alterações no regime do contrato de passagem; (viii) definição de contrato de transição e disposições mais espe-cíficas sobre seu regime; (ix) exclusão de disposições específicas sobre explo-

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ração de Instalações Portuárias não Operacionais; (x) exclusão das disposições sobre a Administração Portuária; e (xi) exclusão da obrigação de adaptação dos contratos já existentes.

I – PORTO ORGANIZADO

A adaptação da definição de Porto Organizado, na qual acrescentou-se a expressão “bem público”, reflete o disposto na Lei nº 12.815/2013, art. 2º, inci-so I. A alteração conceitual proposta na Lei de Portos teve o condão de promo-ver a revisão da poligonal dos Portos Organizados no sentido de excluir as áreas que são de propriedade privada, situação, por exemplo, do Porto de Antonina e Paranaguá, cujas poligonais foram revistas pelo Decreto s/nº de 11 de fevereiro de 2016 para esse fim. Atualmente, a poligonal dos Portos Organizados deve ser revista seguindo o princípio da transparência e da publicidade por meio dos instrumentos da audiência e consulta pública, sendo, por fim, fixada mediante decreto do Presidente da República.

II – UNIFICAÇÃO CONTRATUAL

A possibilidade de unificação contratual de arrendamentos foi explicita-da no texto da nova resolução (cf. Resolução Normativa nº 7/2016, art. 2º, inci-so XXVI, c/c art. 3º, parágrafo único). A unificação pode ser realizada em con-tratos independentes, porém com mesmo arrendatário, devendo-se promover o reequilíbrio econômico-financeiro e a estipulação de um prazo unificado. Até que a Antaq ultime uma norma específica sobre a unificação de arrendamentos, a unificação dos contratos de arrendamento deve levar em conta o disposto no Acórdão do TCU nº 774/2016-Plenário, Relator Ministro Walton Alencar, que impede a estipulação do prazo mais longo como prazo do contrato unificado.

III – ALTERAÇÃO UNILATERAL DOS CONTRATOS

As referências sobre alteração unilateral do contrato de arrendamento por decisão do poder concedente foram removidas do texto. O art. 28 da pro-posta aprovada pela Resolução nº 3.708/2014 dispunha sobre a prerrogativa de alteração unilateral do contrato como uma consequência do regime jurídico de contrato administrativo do contrato de arrendamento. Essa disposição foi eliminada após contribuição, principalmente da ABTP – Associação Brasileira de Terminais Portuários, durante a audiência pública. A alteração unilateral do contrato torna o planejamento dos investimentos sujeito à discricionariedade do poder concedente, de modo a aumentar consideravelmente o risco do empre-endimento da perspectiva do investidor.

Muito se tem discutido na doutrina jurídica se ainda faz sentido manter a previsão de poderes exorbitantes para a Administração Pública, tais como o

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de alterar unilateralmente o contrato administrativo. Como esse tipo de poder aumenta o risco para o contratado, é intuitivo que gere aumento dos preços pro-postos nas licitações, embora seja muito difícil estimar o quantum. De qualquer forma, vale notar que alguns juristas já insistem na importância de rever esse paradigma tradicional do direito administrativo brasileiro, de maneira que, ao menos nos contratos mais complexos e de valor mais elevado, deixem de ser aplicáveis as tais cláusulas exorbitantes. Vale lembrar que a Administração Pú-blica por vezes já abre mão desses poderes, como, por exemplo, nos contratos de financiamento e em alguns contratos internacionais para aquisição de bens e serviços.

Nesse contexto, a exclusão dessa disposição do âmbito da resolução da Antaq permite levantar uma discussão interessante, qual seja, a de saber se é ou não possível a alteração unilateral em contratos de arrendamento portuário.

A Lei nº 12.815/2013 e o seu decreto regulamentador não trazem como cláusulas essenciais do contrato de arrendamento as que dizem respeito à prer-rogativa de alteração unilateral, como as que existem nos contratos administra-tivos tradicionais regidos pela Lei nº 8.666/1993 ou pelos contratos de conces-são regidos pela Lei nº 8.987/1995. Além disso, as únicas referências da Lei de Portos à aplicação de legislação subsidiária dizem respeito apenas ao procedi-mento licitatório. Assim, a legislação portuária atual não prevê, ao menos não expressamente, a existência de cláusulas exorbitantes, o que abre espaço para se interpretar que o contrato de arrendamento portuário não admite alteração unilateral. Dessa perspectiva, seria questionável inclusive se a Antaq poderia prever em favor da Administração o poder alteração unilateral, na medida em que a própria Lei de Portos deixou de prevê-la.

Importa lembrar que a utilização de poderes exorbitantes pela Adminis-tração Pública não decorre de um regime abstrato ou pressuposto dos contratos administrativos, mas da lei. É a lei que estabelece o regime de um contrato em que é parte a Administração Pública. Nesse sentido, pensamos que não se deve admitir alteração unilateral em contratos de arrendamento portuário, nem a Antaq tem poder para incluir essa previsão por via regulamentar, ressalvada a hipótese em que esse poder de alteração unilateral tenha sido previsto nos documentos da licitação.

Apesar dessas considerações, não desconhecemos que há efetivamente uma corrente doutrinária com tendência a considerar que, sendo os contratos de arrendamento espécies de contratos administrativos, a eles se aplicariam todas as prerrogativas e cláusulas exorbitantes usualmente tidas como inerentes aos contratos administrativos tradicionais, pois estaria “pressuposta” na relação vertical entre Administração Pública (autoridade) e contratado (subordinado) a

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tutela do interesse público por aquela em detrimento do interesse privado deste a justificar tais poderes.

IV – BENS REVERSÍVEIS

As disposições sobre os bens reversíveis também foram retiradas. Desse modo, as disposições sobre bens reversíveis para fins dos novos arrendamentos permanecem sendo apenas as da Lei de Portos e de seu regulamento. Pode--se sintetizar essas disposições como sendo: (i) cláusula essencial do contrato de arrendamento sobre reversão de bens (cf. Lei de Portos, art. 5º, inciso VIII); (ii) reversão dos bens ao patrimônio da União (cf. Lei de Portos, art. 5º, § 2º); (iii) definição no edital de licitação da relação de bens afetos ao arrendamento (cf. Decreto nº 8.033/2013, art. 8º, inciso V); (iv) possibilidade de o edital fixar ao licitante vencedor a indenização dos bens reversíveis não amortizados do arrendatário anterior (cf. Decreto nº 8.033/2013, art. 8º, parágrafo único).

Entendemos que a ausência de disposições mais específicas sobre bens reversíveis consiste em uma perda da oportunidade para definir duas questões: (i) critérios objetivos que permitam a adequada identificação dos bens rever-síveis ao término dos contratos; e (ii) metodologia de avaliação do valor dos bens reversíveis. A definição adequada dessas questões tem o condão de preve-nir o surgimento de conflitos envolvendo bens reversíveis, como tem ocorrido atual mente entre poder concedente, Antaq, Administrações Portuárias e arren-datárias. Por um lado, a Antaq e o poder concedente, baseados nas informa-ções fornecidas pelas Administrações Portuárias, chegaram a declarar, no bojo do Processo do TCU nº 004.440/2014-5, como ficou registrado no Acórdão nº 1.555/2014-Plenário, Relª Min. Ana Arraes, que não haveria bens reversíveis a indenizar nas áreas a serem levadas à licitação. Por outro lado, essa questão não é plenamente aceita pelas empresas que já exploravam as instalações, ha-vendo forte possibilidade de judicialização da matéria. A princípio, a SEP/PR, na época de elaboração dos estudos para as licitações portuárias, utilizou o mé-todo Ross-Heidecke para avaliar a depreciação física dos ativos, não obstante não se tenha clareza sobre o método utilizado para determinação do valor de novo dos bens.

V – ILÍCITOS CONTRA A ORDEM ECONÔMICA

A constatação de ilícitos contra a ordem econômica e consequente repre-sentação ao Cade ficou condicionada à prévia instrução de processo adminis-trativo no qual sejam garantidos a ampla defesa e o contraditório.

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VI – CONTRATOS DE USO TEMPORÁRIO

Em relação aos contratos de uso temporário, que servem à exploração de instalações portuárias destinadas a cargas não consolidadas e a atender platafor-mas offshore, a definição de carga com mercado não consolidado foi fornecida pela norma (cf. Resolução Normativa nº 07/2016, art. 2º, inciso VIII). Trata-se daquela não movimentada regularmente no porto nos últimos 5 (cinco) anos, tendo demandado, em média, menos de uma atracação mensal no mesmo pe-ríodo. A prorrogação do contrato para além do prazo original de no máximo 18 (dezoito) meses foi restringida apenas ao caso de atendimento de plataformas offshore (cf. idem, art. 27, § 1º).

VII – CONTRATOS DE PASSAGEM

O contrato de passagem, por sua vez, teve seu regime alterado de modo a admitir que interessados que não desenvolvam atividade portuária (movimenta-ção e armazenagem de carga ou transporte de passageiros) requeiram o direito de passagem (cf. idem, art. 36, parágrafo único). Além disso, os investimentos realizados pelo beneficiário do contrato de passagem não serão indenizados, exceto no caso de estarem vinculados a contrato de arrendamento, podendo fazer parte de eventual recomposição do equilíbrio econômico-financeiro (cf. idem, art. 37, § 3º). Outra alteração importante é a que trata da possibilidade de prorrogações sucessivas do contrato de passagem, desde que seja mantida a atividade e haja investimento em modernização das instalações, e não mais por uma única vez (cf. idem, art. 41, incisos I e II)

VIII – CONTRATOS DE TRANSIÇÃO

O contrato de transição também sofreu alterações importantes. A princí-pio, pode-se interpretar que a figura contratual pode ser utilizada tanto para os casos de extinção de um arrendamento sem que tenha se efetivado o procedi-mento licitatório, como para os casos em que já havia exploração de instalação sem um instrumento jurídico adequado, mas em que a situação fática recomen-de a continuidade da prestação do serviço dado o interesse público envolvido (cf. idem, art. 46, caput).

Também foram inseridas disposições sobre o processo de instrução do requerimento para celebração do contrato de transição (cf. idem, art. 46, pa-rágrafo único), de modo a refletir, em parte, a prática adotada internamente pela própria Antaq antes da edição da norma. Uma das novidades é a previ-são de processo seletivo simplificado para seleção do arrendatário transitório, nos casos em que não seja essencial a continuidade do serviço público. Foram previstas cláusulas essenciais, entre elas a sobre a tutela dos bens reversíveis,

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assim como sobre anexos, sendo um deles o da relação de bens existentes no terminal.

Foi definido como prazo máximo de vigência do contrato de transição o de 180 (cento e oitenta) dias improrrogáveis ou a ultimação do procedimento licitatório. Essa disposição reflete a prática da Agência e, aparentemente, deriva de uma tentativa de enquadrar o contrato de transição como uma espécie de contrato emergencial, uma das hipóteses de dispensa de licitação, nos termos da Lei nº 8.666/1993 (cf. art. 24, inciso IV). Na prática, essa concepção do con-trato de transição tem levado a que os contratos tenham que ser sucessivamente recelebrados a cada 180 dias sem um fundamento sólido de emergencialidade, conforme exige a Lei de Licitações. Aumenta-se, assim, o risco de impasses entre as partes que veem na oportunidade de celebração sucessiva novas oca-siões de barganhar, sempre pautadas pelo receio de penalização por parte da agência.

Tem-se a impressão de que a celebração sucessiva sobrecarrega desne-cessariamente os quadros da Agência com a necessidade de análise dos con-tratos. Como defendemos em artigo específico sobre o tema dos Contratos de Transição, a Agência poderia apenas permitir a continuidade do vínculo ante-rior enquanto não se ultima o procedimento licitatório, uma vez que essa pos-sibilidade vem sendo aos poucos admitida na jurisprudência do TCU. Veja-se, por exemplo, o caso do setor elétrico (cf. Acórdãos nºs 2.253/2015-Plenário e 2.520/2015-Plenário). Mais recentemente, no próprio setor portuário (cf. Acór-dão nº 650/2016-Plenário, Rel. Min. Augusto Nardes), o TCU determinou que a SEP/PR poderia excepcionalmente prorrogar contrato de arrendamento até que se ultimasse o procedimento licitatório

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que se aprecia pedido de reexame interposto contra o Acórdão nº 648/2014-TCU-Plenário, acordam os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo 2º Revisor, em:

[...]

9.1. com fundamento no art. 48, caput e parágrafo único, da Lei nº 8.443, de 1992, conhecer do recurso interposto pela Empresa Transitária Brasileira Ltda. – Transbrasa para, no mérito, negar-lhe provimento, conferindo-se a seguinte re-dação ao item 9.1 e seus subitens 9.1.1 e 9.1.2 do Acórdão nº 648/2014-Plenário:

[...]

9.1.2. a SEP/PR, no uso de suas competências previstas no art. 16 da Lei nº 12.815/2013 e no art. 2º, incisos I e II, do Decreto nº 8.033/2013 pode, excep-cionalmente, prorrogar o Contrato de Arrendamento CA nº 007/91 pelo prazo es-tritamente necessário à realização do certame para novo arrendamento portuário, cujo início dos procedimentos deverá ser imediato;

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – SEÇÃO ESPECIAL – DIREITO EM DEBATE ����������������������������������������������������������������������������������������������231

[...].

Essa situação gera, ainda, um incentivo econômico perverso que leva os exploradores de instalações a terem menos razões ainda para investir na manu-tenção e conservação das instalações e equipamentos, uma vez que sequer con-seguem ter segurança de: (i) quais bens são ou não reversíveis; e (ii) se obterão indenização pelos ativos não amortizados. Consequentemente, há maior proba-bilidade de deterioração da área e perda do seu valor para futuros arrendatários.

IX – INSTALAÇÕES PORTUÁRIAS NÃO OPERACIONAIS

As disposições sobre a exploração de áreas e instalações não operacio-nais foram removidas, remetendo-se à regulamentação emanada pelo poder concedente que, atualmente, consiste na Portaria nº 409/2014 da Secretaria de Portos. Os contratos devem apenas ser apresentados à Antaq e ao poder concedente no prazo de trinta dias de sua celebração (cf. Resolução Normativa nº 07/2016, art. 50).

X – ADMINISTRAÇÃO PORTUÁRIA

As disposições sobre a Administração Portuária foram removidas. O re-gime das Administrações Portuárias permanece, desse modo, regido pelas dis-posições contidas na Lei nº 12.815/2013, especialmente no Capítulo IV, e no Decreto nº 8.033/2013, também no Capítulo IV.

XI – ADAPTAÇÃO DOS CONTRATOS

As disposições sobre a necessidade de adaptação dos contratos celebra-dos anteriormente foram removidas. Em relação à remoção da adaptação, sua consequência é que não haverá necessidade de atuais arrendatários promove-rem alteração de seus contratos, resguardando-se as cláusulas anteriormente pactuadas e evitando a realização de reequilíbrios econômico-financeiros sim-plesmente em função de uma alteração do regime normativo.

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Resenha Legislativa

Resolução Normativa nº 7-Antaq, de 30 de Maio de 2016 (Retificada pela Resolução nº 4843-Antaq, de 6 de Junho de 2016)�

Agência Nacional de Transportes Aquaviários

Aprova a norma que regula a exploração de áreas e instalações portuá-rias sob gestão da administração do porto, no âmbito dos portos organizados.

O Diretor-Geral Substituto da Agência Nacional de Transportes Aquaviários – Antaq, no uso da competência que lhe é conferida pelo art. 27, inciso IV da Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001, e pelo art. 20, inciso IV do Regimento Interno, consideran-do o que consta do Processo nº 50300.000213/2002 e o deliberado pela Diretoria Colegiada na 405ª Reunião Ordinária, realizada em 25 de maio de 2016,

Resolve:

Art. 1º Aprovar a Norma que regula a exploração de áreas e instalações portuárias sob gestão da Administração do Porto, no âmbito dos portos organizados, na forma do Anexo desta Resolução.

Art. 2º Revogar a Resolução nº 2.240-Antaq, de 4 de outubro de 2011, publicada no Diário Oficial da União, de 07/10/2011, seção l.

Art. 3º Esta Resolução Normativa entra em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União.

Fernando José de Pádua Costa Fonseca Diretor-Geral Substituto

aneXO

tÍtulO i dO ObJetO

Art. 1º Esta Norma tem por objeto disciplinar e regular a exploração de áreas e instalações portuárias delimitadas pela poligonal do porto organizado, nos termos da Lei nº 12.815, de 5 de junho de 2013, da Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001, da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e do Decreto nº 8.033, de 27 de junho de 2013, excetuadas aque-las nas modalidades de terminal de uso privado (TUP), estação de transbordo de cargas (ETC), instalação portuária pública de pequeno porte (IP4) e instalação portuária de turismo (IPTur).

tÍtulO ii das deFiniçÕes

Art. 2º Para efeitos desta Norma, consideram-se:

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – RESENHA LEGISLATIVA �������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������233

I – administração do porto organizado: a autoridade portuária exercida diretamente pela União, por suas controladas, pela delegatária ou pela concessionária do porto organi-zado;

II – área do porto organizado: área delimitada por ato do Poder Executivo, que com-preende as instalações portuárias e a infraestrutura de proteção e de acesso ao porto organi-zado;

III – áreas e instalações portuárias não operacionais: as áreas e instalações localizadas dentro da área do porto organizado e não afetas às atividades portuárias, compreendidas como aquelas com comprovada inviabilidade econômica ou técnica para a operação portu-ária ou aquelas destinadas, predominantemente, à realização de atividades culturais, sociais, recreativas, comerciais, industriais ou a outras atividades ligadas à exploração do porto;

IV – áreas e instalações portuárias operacionais: as áreas e instalações localizadas dentro da área do porto organizado destinadas à movimentação e armazenagem de mercado-rias e ao embarque e desembarque de passageiros;

V – arrendamento: cessão onerosa, pelo poder concedente, de área e infraestrutura públicas operacionais, localizadas dentro do porto organizado, mediante prévio procedimen-to licitatório, e contrato para exploração por prazo determinado;

VI – arrendatária: pessoa jurídica que detém a titularidade do contrato de arrenda-mento;

VII – autorização de uso: delegação, pela administração do porto, de áreas e instala-ções portuárias não operacionais disponíveis, localizadas dentro da área do porto organizado, para utilização onerosa, a título precário, visando à realização de eventos de curta duração, de natureza recreativa, esportiva, cultural, religiosa ou educacional;

VIII – carga com mercado não consolidado: mercadoria não movimentada regular-mente no porto nos últimos 5 (cinco) anos, tendo demandado, em média, menos de uma atracação mensal no mesmo período;

IX – cessão de uso não onerosa: cessão gratuita de áreas portuárias localizadas dentro do porto organizado, a entidades da administração pública e seus órgãos, com vistas ao exer-cício de suas competências vinculadas às atividades portuárias;

X – cessão de uso onerosa de área não operacional: cessão onerosa de áreas portuá-rias não operacionais localizadas dentro do porto organizado, mediante prévio procedimento licitatório, observado o disposto no respectivo plano de desenvolvimento e zoneamento do porto;

XI – controle: poder conferido a sócio ou acionista que lhe assegure, de modo per-manente, a maioria dos votos nas deliberações da assembleia-geral e a faculdade de eleger a maioria dos administradores da companhia, sendo efetivamente utilizado para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia;

XII – empresa de navegação: pessoa jurídica cujo objeto social inclui a prestação de serviço de transporte aquaviário de mercadorias e/ou pessoas, autorizada a operar pelo órgão competente;

XIII – instalação portuária: instalação localizada dentro da área do porto organizado, utilizada em movimentação de passageiros, em movimentação ou armazenagem de merca-dorias destinadas ou provenientes de transporte aquaviário;

XIV – operação portuária: movimentação e armazenagem de mercadorias e/ou em-barque e desembarque de passageiros, destinados ou provenientes de transporte aquaviário;

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XV – operador portuário: pessoa jurídica pré-qualificada pela administração do porto para execução de operação portuária na área do porto organizado, segundo as normas, crité-rios e procedimentos estabelecidos pelo poder concedente;

XVI – passagem: acesso em área do porto organizado, arrendada ou sob gestão da ad-ministração do porto, pactuado mediante instrumento contratual oneroso junto ao interessado em desenvolver atividade de movimentação e armazenagem de mercadorias destinadas ou provenientes de transporte aquaviário;

XVII – plano de desenvolvimento e zoneamento portuário (PDZ): instrumento de pla-nejamento da administração do porto, que visa ao estabelecimento de estratégias e metas para o desenvolvimento racional e a otimização do uso de áreas e instalações do porto organizado;

XVIII – plano geral de outorgas (PGO): lista de referência das instalações portuárias a serem arrendadas ou autorizadas, e dos portos organizados a serem concedidos, elaborada e atualizada periodicamente pelo poder concedente;

XIX – poder concedente: União, representada pelo Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil;

XX – porto organizado: bem público construído e aparelhado para atender a necessi-dades de navegação, de movimentação de passageiros ou de movimentação e armazenagem de mercadorias, cujo tráfego e operações portuárias estejam sob jurisdição de autoridade portuária;

XXI – preço: valor livremente negociado entre as partes, devido pelos usuários à arren-datária ou aos operadores portuários como contrapartida aos serviços prestados;

XXII – serviço adequado: serviço afeto a operação portuária que satisfaz as condições de regularidade, pontualidade, continuidade, eficiência, conforto, segurança, atualidade, ge-neralidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas e preços, e atende aos critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade da atividade prestada, assim como às metas e prazos para o alcance de determinados níveis de serviço, conforme dispuser o contrato e a regulamentação vigentes;

XXIII – tarifa de serviço: valor devido pelo usuário à arrendatária como contrapartida aos serviços prestados, que tenha sido fixado e regulado nos termos do contrato de arrenda-mento;

XXIV – tarifa portuária: valor devido à administração do porto organizado relativo à utilização das instalações portuárias ou da infraestrutura portuária, ou à contratação de servi-ços de sua competência na área do porto organizado;

XXV – transição: interregno contratual da exploração de área ou instalação portuária que esteja relacionada pelo poder concedente como passível de arrendamento, por motivo de rescisão, anulação, exaurimento do prazo contratual ou qualquer outra forma de encer-ramento de instrumento jurídico, ou risco à continuidade da prestação de serviço portuário de interesse público, até a conclusão dos procedimentos licitatórios das respectivas áreas ou instalações;

XXVI – unificação contratual: procedimento por meio do qual escolhe-se um dentre os contratos a serem unificados, ao qual aglutinam-se os demais contratos, seguido da neces-sária recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato remanescente, conforme metodologia definida em normativo próprio editado por esta Agência;

XXVII – uso temporário: utilização de áreas e instalações portuárias operacionais sob gestão da administração portuária, contidas na poligonal do porto organizado, pelo interessa-do na movimentação e armazenagem de cargas com mercado não consolidado no porto, ou

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por detentor de contrato de prestação de serviços destinados às plataformas offshore, median-te o pagamento das tarifas portuárias pertinentes;

XXVIII – usuários: importadores, exportadores, consignatários, empresas de navega-ção e outros demandantes de serviços prestados no porto organizado;

XXIX – valor do arrendamento: valor apurado mensalmente como devido pela arren-datária à administração do porto como contrapartida pela exploração econômica de áreas, instalações e equipamentos arrendados, na forma prevista no respectivo contrato de arrenda-mento; e

XXX – valor do contrato: valor correspondente ao montante estimado de receitas a serem obtidas pelo titular do contrato para explorar as atividades durante o prazo de vigência do contrato.

Parágrafo único. Os valores fixados nos contratos de arrendamento vigentes, em rela-ção aos serviços prestados pela arrendatária, são equiparados a tarifa de serviços.

tÍtulO iii dOs PrinCÍPiOs gerais

Art. 3º As áreas e instalações portuárias localizadas dentro da área do porto organi-zado deverão ser exploradas na forma dos institutos previstos na Lei nº 12.815, de 2013, no Decreto nº 8.033, de 2013, e nesta Norma, respeitadas as especificidades e peculiaridades de cada porto organizado.

Parágrafo único. Se for o caso, poderá haver a unificação de contratos de arrenda-mento independentes, celebrados entre a administração do porto e um mesmo arrendatário, devendo o processo respectivo abranger o reequilíbrio econômico-financeiro e o prazo de encerramento contratual unificado.

Art. 4º A exploração de áreas e instalações portuárias operacionais está condicionada ao compromisso, por parte das arrendatárias, bem como dos titulares de outros contratos, de prestação de serviço adequado aos usuários, observando, quando compatível com a destina-ção da área:

I – a adoção de procedimentos que evitem atrasos operacionais, e perda, dano ou extravio de mercadorias;

II – a prestação de serviços ou disponibilização de bens de forma isonômica e não dis-criminatória, de acordo com as disposições legais, regulamentares e contratuais pertinentes;

III – a fixação de valores condizentes com a complexidade e com os custos dos ser-viços, respeitados os limites das tarifas de serviço fixadas e reguladas nos termos do contrato;

IV – a utilização de pessoal capacitado para atendimento às demandas dos usuários e ao tratamento adequado das reclamações apresentadas;

V – as metas e indicadores para aferição dos objetivos definidos no projeto do empre-endimento, tendo como referência padrões estabelecidos no contrato e na regulamentação vigentes;

VI – a prestação de informações sobre a atividade, quando solicitadas, à administra-ção do porto, à Antaq e ao poder concedente, com vistas ao acompanhamento da execução do contrato; e

VII – quando envolver a movimentação de passageiros, os requisitos mínimos fixados em regulamento da Antaq.

§ 1º As condições estabelecidas no presente artigo deverão ser apuradas e acom-panhadas periodicamente, por meio de indicadores que possibilitem a avaliação, pela ad-

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ministração do porto, do desempenho operacional, inclusive ambiental, da arrendatária ou contratada.

§ 2º O disposto no parágrafo anterior não afasta ou substitui a fiscalização e apuração direta das atividades realizadas no porto organizado pela Antaq, na forma da regulamentação.

§ 3º Após a instauração de processo administrativo, garantido o contraditório e a ampla defesa, caso sejam constatadas práticas que possam caracterizar lesão à ordem econô-mica, a Antaq representará junto ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, na forma da Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011, sem prejuízo da representação por qualquer interessado.

Art. 5º O regime de ocupação de áreas e instalações portuárias deverá ocorrer em total observância ao disposto no PDZ do porto organizado.

Parágrafo único. O PDZ, que será elaborado pela administração do porto e submetido à aprovação do poder concedente, conterá as áreas e instalações portuárias individualizadas suscetíveis de arrendamento, com vistas:

I – ao atendimento às políticas e diretrizes nacionais para o setor portuário, em conso-nância com as demais políticas e diretrizes nacionais de desenvolvimento social, econômico e ambiental;

II – à compatibilização com as políticas de ocupação territorial, uso do solo e de-senvolvimento urbano dos municípios, do estado e da região onde se localiza o porto or-ganizado; e

III – à sua adequação ao planejamento e às necessidades de movimentação e ar-mazenagem de mercadorias e de movimentação de passageiros, à luz das potencialidades regionais.

Art. 6º A autoridade portuária elaborará e submeterá à aprovação da Secretaria de Portos da Presidência da República o respectivo Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto.

Art. 6º A autoridade portuária elaborará e submeterá à aprovação do Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil o respectivo Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto (PDZ) (Retificado pela Resolução nº 4843-Antaq, de 6 de junho de 2016).

§ 1º A Antaq ou os usuários poderão propor à autoridade portuária a revisão ou atua-lização do PDZ, em atendimento às necessidades de desenvolvimento do porto.

§ 2º A proposta de revisão do PDZ deverá contemplar os institutos previstos nesta Norma para exploração e utilização de áreas e instalações portuárias localizadas dentro da área do porto organizado.

tÍtulO iv das Áreas e instalaçÕes POrtuÁrias OPeraCiOnais CaPÍtulO i

dO arrendamentO

seçãO i da avaliaçãO

Art. 7º Os estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental, em obediência ao disposto na Lei nº 12.815, de 2013, e no Decreto nº 8.033, de 2013, poderão ser realizados pelo poder concedente, pela Antaq, pela administração do porto ou por qualquer interessado.

§ 1º A Antaq analisará os estudos de viabilidade apresentados pelos interessados e previamente autorizados pelo poder concedente, que serão ressarcidos conforme o § 3º do art. 6º do Decreto nº 8.033, de 2013, salvo em caso de doação.

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – RESENHA LEGISLATIVA �������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������237

§ 2º Para fins de elaboração dos estudos de viabilidade, o poder concedente e a Antaq poderão solicitar a apresentação de informações pela administração do porto, pelos arrenda-tários ou por qualquer interessado.

§ 3º Os estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental poderão ser realizados em versão simplificada nas hipóteses previstas no § 1º do art. 6º do Decreto nº 8.033, de 2013.

§ 4º Quando for o caso, o poder concedente ouvirá a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), nos termos do § 2º do art. 16 da Lei nº 12.815, de 2013.

seçãO ii da liCitaçãO

subseçãO i das disPOsiçÕes gerais

Art. 8º A Antaq deverá elaborar os editais e promover os procedimentos de licitação e seleção para os arrendamentos, de acordo com as diretrizes do poder concedente e os estudos de viabilidade a que se refere o artigo anterior.

Art. 9º O arrendamento de áreas e instalações portuárias localizadas dentro da área do porto organizado será objeto de prévio procedimento licitatório regido pelo disposto na Lei nº 12.815, de 2013, no Decreto nº 8.033, de 2013, e, subsidiariamente, nas Leis nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, nº 8.666, de 21 de junho de 1993, nº 8.987, de 1995, e no Decreto nº 7.581, de 11 de outubro de 2011, com vistas a garantir a seleção da proposta mais van-tajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável, com observância dos princípios da isonomia, legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento convocatório, julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

§ 1º O poder concedente poderá determinar a transferência à administração do porto, delegado ou não, das seguintes competências, conforme § 5º do art. 6º da Lei nº 12.815, de 2013:

I – a elaboração do edital; e

II – a realização dos procedimentos licitatórios.

§ 2º No caso de transferência de competência referida no § 1º, a administração do porto seguirá o disposto nesta Norma, sem prejuízo do acompanhamento pela Antaq dos atos por ela praticados.

§ 3º Caso constate vícios no procedimento licitatório conduzido pela administração do porto, a Antaq ou qualquer interessado deverá comunicar o fato ao poder concedente.

Art. 10. A Antaq instaurará processo administrativo, protocolado e numerado, com a indicação sucinta do objeto da licitação e a autorização do poder concedente para sua aber-tura, que registrará todos os atos praticados e conterá:

I – comprovação de convocação da consulta e audiência públicas;

II – ata da audiência pública e consolidação das contribuições e respostas, devida-mente fundamentadas, decorrentes da consulta pública;

III – edital de licitação e seus anexos, minuta de contrato e termo de referência, con-tendo todos os elementos enumerados pela Lei nº 12.815, de 2013;

IV – comprovante de publicidade do ato convocatório;

V – ato de designação da comissão especial de licitação;

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VI – original das propostas com os documentos que as instruíram; VII – atas, relatórios e deliberações da comissão especial de licitação;

VIII – cópia do ato do Tribunal de Contas da União (TCU) que deliberou sobre o pro-cedimento licitatório, quando for o caso;

IX – pareceres técnicos e jurídicos emitidos sobre a licitação;

X – impugnações e recursos porventura interpostos e respectivas manifestações e de-cisões devidamente fundamentadas;

XI – atos de homologação do processo licitatório e da adjudicação do objeto;

XII – despacho fundamentado de anulação ou de revogação da licitação, se for o caso; e

XIII – outros comprovantes de publicações e demais documentos relativos à licitação.

subseçãO ii da COnsulta e audiênCia PúbliCas

Art. 11. A Antaq deverá convocar consulta e audiência públicas, na forma do § 1º do art. 34-A da Lei nº 10.233, de 2001, e do § 3º do art. 11 do Decreto nº 8.033, de 2013.

Art. 12. Para a consulta e audiência públicas serão divulgadas as minutas do edital, do contrato de arrendamento, seus anexos e demais documentos que lhes dão suporte, devendo constar:

I – a finalidade do empreendimento;

II – a descrição das áreas e instalações portuárias a serem arrendadas;

III – a relação dos principais equipamentos a serem arrendados; e

IV – o estudo de avaliação do empreendimento, nos padrões estabelecidos pela An-taq, contendo os critérios utilizados para composição do valor do arrendamento e, quando for o caso, o valor máximo da tarifa de serviço, a capacidade de movimentação, além das metas mínimas de movimentação estabelecidas.

seçãO iii dO COntratO de arrendamentO

subseçãO i da assinatura dO COntratO de arrendamentO

Art. 13. Somente poderão atuar como arrendatárias empresas ou entidades constituí-das sob as leis brasileiras, com sede e administração no País.

Art. 14. Como condição para a assinatura do contrato, deverá o licitante vencedor, nacional ou estrangeiro, constituir Sociedade de Propósito Específico (SPE), com prazo de duração indeterminado, patrimônio próprio e objeto social específico e exclusivo para a exe-cução do objeto do arrendamento, bem como previamente exibir seu acordo de quotistas ou acionistas ou declaração de sua inexistência, firmada pelo representante legal do consórcio ou da empresa licitante.

Parágrafo único. O contrato de arrendamento será celebrado com o poder conce-dente.

Art. 15. O atendimento a esta Norma não exime o particular de observar o disposto na Lei nº 12.529, de 2011, quando for o caso.

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Art. 16. A assinatura do contrato de arrendamento será precedida da adoção das pro-vidências mencionadas no art. 14 da Lei nº 12.815, de 2013.

subseçãO ii das nOrmas gerais dO COntratO

Art. 17. O contrato de arrendamento de áreas e instalações portuárias de que trata esta Norma reger-se-á pela Lei nº 12.815, de 2013, pela Lei nº 10.233, de 2001, pela Lei nº 8.987, de 1995, pelo Decreto nº 8.033, de 2013, e pelos preceitos de direito público, aplicando-se, supletivamente, a Lei nº 8.666, de 1993, assim como os princípios da teoria geral dos contra-tos e as disposições do direito privado.

Art. 18. O prazo contratual do arrendamento deverá ser suficiente para amortização ou depreciação dos investimentos previstos no contrato a serem feitos pela arrendatária, e para lhe proporcionar adequada remuneração, conforme parâmetros adotados no estudo de avaliação do empreendimento, respeitado o limite de vigência de até 25 (vinte e cinco) anos, prorrogável uma única vez, por período não superior ao originalmente contratado, a critério do poder concedente.

Parágrafo único. A realização de investimento não previsto no contrato de arrenda-mento e não autorizado previamente pelo poder concedente correrá por conta e risco da arrendatária e não ensejará nenhuma alteração do contrato de arrendamento ou direito à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, sem prejuízo das penalidades eventual-mente aplicáveis.

Art. 19. A fiscalização exercida pelos órgãos competentes não exclui, limita ou ate-nua a responsabilidade da arrendatária por prejuízos causados à administração do porto, aos usuários ou a terceiros, na forma da regulamentação.

Art. 20. A arrendatária é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fis-cais e comerciais resultantes da execução do contrato de arrendamento.

Art. 21. As arrendatárias de áreas e instalações portuárias deverão se pré-qualificar para realizar a movimentação e a armazenagem de mercadorias diretamente, ou optar pela contratação de operadores portuários pré-qualificados, ressalvadas as hipóteses do art. 28 da Lei nº 12.815, de 2013.

§ 1º O operador portuário que, a qualquer título, utilize bens ou serviços objeto de contrato de arrendamento deverá observar integralmente suas condições, inclusive no que tange às tarifas de serviço praticadas e aos parâmetros de qualidade e eficiência.

§ 2º Os contratos celebrados entre a arrendatária e operadores portuários reger-se-ão pelo direito privado, não se estabelecendo qualquer relação jurídica com o poder conceden-te, pressupondo o cumprimento:

I – das normas aplicáveis aos serviços contratados; e

II – das condições estabelecidas no edital de licitação e no contrato de arrendamento, inclusive quanto às tarifas e aos preços praticados.

Art. 22. Com vistas à preservação da competição e manutenção das condições legais, regulamentares e contratuais, as transferências de controle societário ou de titularidade do arrendamento somente poderão ocorrer na forma regulamentada pelo poder concedente, e desde que o novo controlador ou titular atenda aos respectivos requisitos técnicos, econômi-cos e jurídicos.

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§ 1º Para efeito do disposto no caput, serão consideradas como transferência de titu-laridade de arrendamento a transferência integral dos direitos e deveres provenientes desse contrato a outra pessoa jurídica, e a transformação societária decorrente de cisão, fusão e incorporação ou formação de consórcio de empresas.

§ 2º Considera-se transferência de controle a obtenção dos direitos de sócio ou acio-nista que assegure, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e poder de eleger a maioria dos administradores da arrendatária, nos termos dos arts. 116 e 243, § 2º, da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, inclusive mediante a celebração de acordos de sócios ou de acionistas, ou sob acordo comum.

§ 3º A realização das transferências de que trata o caput em desacordo com a forma regulamentada pelo poder concedente ensejará a aplicação das sanções correspondentes.

Art. 23. A arrendatária deverá apresentar à Antaq, na forma e periodicidade previstas no contrato e na regulamentação, relatórios referentes à execução dos investimentos estabele-cidos no contrato, bem como ao desempenho e às condições de operação.

§ 1º Os eventuais atrasos em relação aos prazos contratualmente estabelecidos para a realização dos investimentos deverão ser justificados quando do envio do relatório de que trata o caput.

§ 2º A Antaq poderá, a seu critério, exigir a apresentação dos dados a que se refere o caput em meio eletrônico e/ou por meio de sistema próprio.

subseçãO iii da PrOrrOgaçãO dO COntratO

Art. 24. A arrendatária deverá manifestar formalmente ao poder concedente, com ciência à administração do porto, seu interesse na prorrogação do contrato nos termos do art. 19 do Decreto nº 8.033, de 2013, com antecedência mínima de 24 (vinte e quatro) meses ao seu término.

§ 1º A solicitação de que trata o caput deverá estar acompanhada de estudo de viabi-lidade, bem como deverá dispor das informações necessárias à avaliação quanto à recompo-sição do equilíbrio econômico-financeiro contratual no curso do prazo adicional solicitado.

§ 2º O poder concedente, em concordando com a prorrogação proposta, encaminha-rá a solicitação para a Antaq, que procederá à abertura de processo administrativo, analisará a solicitação de prorrogação do contrato de arrendamento de áreas e instalações portuárias e apresentará parecer conclusivo.

§ 3º Os novos valores de arrendamento, tarifas, capacidade de movimentação, parâ-metros de qualidade e o prazo da prorrogação poderão ser fixados com base na previsão de novos investimentos e na movimentação de mercadorias, segundo os critérios da modelagem estabelecidos pela Antaq para os estudos de viabilidade de arrendamento.

§ 4º Indeferido o pedido de prorrogação do contrato, ou decaído o direito previsto no caput, deverá a Antaq iniciar os procedimentos previstos nesta Norma para licitar as áreas e instalações portuárias, salvo se tal medida for incompatível com os motivos que justificaram a não prorrogação do contrato anterior.

§ 5º Na hipótese descrita na parte final do § 4º, o poder concedente deverá adotar as providências visando à utilização eficiente das áreas e instalações portuárias, de acordo com o PDZ e com o PGO.

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CaPÍtulO ii dO usO temPOrÁriO

Art. 25. A administração do porto poderá pactuar com o interessado na movimenta-ção e armazenagem de cargas com mercado não consolidado no porto, ou com o detentor de titularidade de contrato para atendimento de plataformas offshore, o uso temporário de áreas e instalações portuárias disponíveis, contidas na poligonal do porto organizado, mediante o pagamento das tarifas portuárias pertinentes, inclusive aquela relativa à área disponibilizada.

§ 1º A administração do porto deverá publicar, previamente, a relação de áreas e instalações portuárias disponíveis para uso temporário, conferindo-lhe publicidade em seu respectivo sítio eletrônico.

§ 2º Ocorrendo, por hipótese, mais de um interessado na utilização de áreas e ins-talações portuárias na forma de que trata o caput, e inexistindo disponibilidade física para alocá-los concomitantemente, a administração do porto deverá promover processo de seleção simplificada, assegurada sua isonomia e impessoalidade, para escolha do projeto que melhor atenda o interesse público e do porto.

§ 3º A área objeto de contrato de uso temporário deverá estar compatível com o PDZ aprovado pelo poder concedente.

Art. 26. O requerimento de celebração de contrato de uso temporário deverá ser sub-metido pelo interessado à administração do porto, acompanhado, no mínimo, dos seguintes documentos:

I – minuta do contrato segundo modelo definido pela Antaq;

II – declaração do interessado, expondo os motivos que justificam o pleito pelo uso temporário das áreas e instalações portuárias, discriminando o perfil do empreendimento; e

III – descrição detalhada da área e de sua localização, inclusive fazendo constar plan-ta e memorial descritivo.

§ 1º A administração do porto se manifestará a respeito no prazo de até 30 (trinta) dias, dando ciência ao Conselho de Autoridade Portuária (CAP), podendo indeferir o pedido de imediato ou encaminhá-lo, instruído com a documentação correspondente, à análise e aprovação da Antaq.

§ 2º Do indeferimento do pedido pela administração do porto caberá recurso à Antaq.

Art. 27. O contrato de uso temporário poderá ser firmado pelo prazo de até 18 (dezoi-to) meses, podendo ser prorrogado uma única vez, no máximo por igual período.

§ 1º Excepcionalmente, quando comprovada a celebração prévia de contrato de pres-tação de serviço para atendimento de plataforma offshore que justifique a ocupação de áreas e instalações portuárias em prazo superior a 18 (dezoito) meses, a administração do porto poderá, observado o interesse público, celebrar contrato de uso temporário com prazo de vigência máximo, improrrogável, de até 60 (sessenta) meses.

§ 2º O pedido de prorrogação, quando previsto, deverá ser devidamente fundamenta-do e encaminhado à administração do porto em até 60 (sessenta) dias antes do vencimento do contrato original, manifestando expressamente o interesse, ou não, em transformar a explora-ção da área em arrendamento, mediante licitação.

§ 3º A administração do porto analisará o pedido de prorrogação e se manifestará em até 30 (trinta) dias antes do vencimento do contrato.

§ 4º A prorrogação será efetivada mediante a celebração de instrumento de aditamen-to contratual firmado entre as partes.

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§ 5º A administração do porto comunicará à Antaq, no prazo de até 30 (trinta) dias, acerca da prorrogação do contrato de uso temporário, mediante o encaminhamento do res-pectivo termo aditivo.

§ 6º Caso a prorrogação do contrato de uso temporário preveja o interesse a que alu-de o § 2º deste artigo, a Antaq o comunicará ao poder concedente para fins de autorização acerca do procedimento licitatório.

Art. 28. A administração do porto deverá prever, no bojo das tabelas tarifárias, as rubricas destinadas a remunerar o uso temporário de áreas e instalações portuárias, fixando seus respectivos valores, que necessariamente levarão em conta o valor do metro quadrado ocupado, submetendo-as à aprovação da Antaq.

Art. 29. O contrato de uso temporário deverá especificar tarifas aplicáveis ao empre-endimento, com base na tabela tarifária de que trata o artigo anterior.

Art. 30. A administração do porto designará, no âmbito do instrumento contratual de uso temporário, as áreas e instalações portuárias disponibilizadas ou passíveis de disponibili-zação ao contratado.

Parágrafo único. A administração do porto poderá, a qualquer tempo e no interesse público, reaver área ou instalação objeto do instrumento pactuado, designando nova área ao contratado, observados os prazos previstos no art. 27.

Art. 31. A critério da administração do porto, a área ocupada pela contratada poderá ser delimitada e isolada para fins de segurança operacional ou patrimonial, atendimento a determinações de outras autoridades intervenientes com atuação no porto ou em decorrência de outras razões relacionadas às peculiaridades da exploração prevista.

Art. 32. O interessado deverá dispor de equipamentos e instalações de fácil desmobi-lização, necessários à prática da atividade, de modo a preservar as condições iniciais do local e possibilitar a sua imediata desocupação, ao término do contrato ou quando determinada pela administração do porto.

§ 1º Os investimentos vinculados ao contrato de uso temporário deverão ocorrer ex-clusivamente às expensas do interessado, mediante anuência da administração do porto, sem direito a indenização de qualquer natureza.

§ 2º A extinção do contrato ou a designação de nova área confere ao contratado o direito de realocar os bens removíveis de sua titularidade, sendo os demais desmobilizados às expensas do contratado ou transferidos ao patrimônio do porto, sem direito a indenização, ainda que não integralmente depreciados ou amortizados.

Art. 33. O alfandegamento perante a Receita Federal do Brasil das áreas e instalações portuárias afetadas ao uso temporário permanecerá sob a titularidade da administração do porto.

Art. 34. São cláusulas essenciais do contrato de uso temporário, as relativas:

I – à descrição das atividades previstas e indicação do operador portuário pré-qualifi-cado junto à administração do porto;

II – ao prazo, com indicação do início e término de vigência do contrato, inclusive a possibilidade de sua prorrogação;

III – à remuneração da administração do porto por meio de tarifas pertinentes e respec-tivas condições de pagamento, com periodicidade mensal;

IV – às penalidades, sua gradação e formas de aplicação, conforme regulamentação da Antaq;

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V – à competência da Antaq para arbitrar na esfera administrativa, mediante solici-tação de qualquer das partes, conflitos envolvendo a administração do porto e o contratado relativos à interpretação e à execução do contrato;

VI – à possibilidade de rescisão unilateral antecipada;

VII – à transferência ao patrimônio do porto de eventuais bens não removíveis, oriun-dos de investimentos realizados pelo contratado, sem direito a indenização;

VIII – à vedação, em qualquer hipótese, da transferência da titularidade do contrato de uso temporário;

IX – à legislação aplicável à execução do contrato e especialmente aos casos omis-sos, qual seja Lei nº 8.666, de 1993, Lei nº 8.987, de 1995, Lei nº 12.815, de 2013, Decreto nº 8.033, de 2013, e esta Norma;

X – ao foro;

XI – às obrigações do contratado, em especial as relativas:

a) à responsabilidade por danos ambientais ou de outra ordem causados a terceiros em decorrência das atividades desenvolvidas;

b) à manutenção das condições de segurança operacional e de proteção ambiental em conformidade com as normas em vigor, respeitado o regulamento de exploração do porto;

c) à prestação de informações de interesse da administração do porto, da Antaq e das demais autoridades com atuação no porto;

d) à contratação de seguro de responsabilidade civil compatível com suas responsabi-lidades perante a administração do porto e terceiros;

e) ao livre acesso de agentes credenciados da administração do porto e da Antaq às áreas e instalações portuárias designadas no contrato para fins de fiscalização e outros pro-cedimentos;

f) à observação da programação aprovada pela administração do porto para atracação das embarcações, respeitando-se o regulamento de exploração do porto;

g) à utilização adequada das áreas e instalações dentro de padrões de qualidade e eficiência, de forma a não comprometer as atividades do porto;

h) à realização de investimentos necessários à execução do contrato às suas expensas, mediante anuência da administração do porto, sem direito à indenização;

i) à utilização de equipamentos e instalações móveis e removíveis, de modo a pre-servar as condições iniciais do local e possibilitar a sua imediata remoção, ao término do contrato ou quando determinada pela administração do porto;

j) à responsabilidade por prejuízos causados à administração do porto, aos usuários ou a terceiros, independentemente da fiscalização exercida pelos órgãos competentes;

k) à responsabilidade pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato;

l) à manutenção de garantia voltada à plena execução do contrato, no termos do inci-so VI do art. 55 da Lei nº 8.666, de 1993, e do inciso XI do art. 5º da Lei nº 12.815, de 2013;

m) à manutenção, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, de todas as condições de habilitação e qualificação exigíveis daqueles que contratam com a Administração, nos moldes do inciso XIII do art. 55 da Lei nº 8.666, de 1993; e

n) à obediência aos critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qua-lidade do serviço;

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XII – às obrigações da administração do porto, em especial as relativas:

a) à manutenção das condições de acessibilidade às áreas e instalações portuárias designadas no contrato;

b) ao cumprimento e imposição do cumprimento das disposições legais e contratuais aplicáveis aos serviços prestados ou atividades desenvolvidas no contrato;

c) ao acompanhamento e fiscalização do contrato, sem prejuízo da atuação da Antaq;

d) ao encaminhamento à Antaq e ao poder concedente de cópia do contrato e seus aditamentos, no prazo de 30 (trinta) dias após a sua celebração;

e) ao cumprimento e imposição do cumprimento das exigências relativas à segurança e à proteção do meio ambiente; e

f) à prestação, no prazo estipulado, das informações requisitadas pela Antaq no exer-cício de suas atribuições.

Art. 35. É vedada, em qualquer hipótese, a transferência de titularidade do contrato de uso temporário.

CaPÍtulO iii da Passagem

Art. 36. O interessado que desenvolva atividade de movimentação e armazenagem de mercadorias destinadas ou provenientes de transporte aquaviário poderá pactuar com a admi-nistração do porto, mediante remuneração adequada, a passagem em área de uso comum ou já ocupada por terceiros no âmbito da poligonal do porto organizado.

Parágrafo único. O interessado que não desenvolva a atividade descrita no caput também poderá pactuar o instituto da passagem, com observância, naquilo que couber, das disposições desta Norma.

Art. 37. A passagem deverá observar o trajeto mais racional e disponível, nos limites da necessidade do interessado, impondo-se o menor ônus para a administração do porto e para terceiros.

§ 1º O instituto de que trata o caput não poderá inviabilizar o uso de áreas contíguas para outras finalidades de interesse para o desenvolvimento das atividades portuárias.

§ 2º A passagem caberá para a instalação de dutos, esteiras transportadoras, passarelas ou outros meios que viabilizem a movimentação de mercadorias ou passageiros.

§ 3º Os investimentos vinculados ao contrato de passagem deverão ocorrer às expen-sas do interessado, mediante anuência da administração do porto, sem direito a indenização, salvo quando referido contrato estiver vinculado a contratos de arrendamento, situação em que os investimentos poderão ser considerados na recomposição do equilíbrio econômico- -financeiro do arrendamento.

Art. 38. O contrato de passagem será sempre pactuado entre o interessado e a ad-ministração do porto e, quando se tratar de área do porto já arrendada a terceiros, haverá a interveniência do titular de direito de uso dessa área, a quem será submetido previamente o projeto básico para implementação da passagem.

Parágrafo único. A Antaq, na esfera administrativa, arbitrará conflitos envolvendo a administração do porto, o interessado na passagem e terceiros.

Art. 39. O requerimento para celebração do contrato de passagem deverá ser subme-tido à administração do porto, devidamente justificado e acompanhado de:

I – minuta de contrato;

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II – respectivo projeto, com indicação dos equipamentos que se pretende utilizar e descrição do procedimento operacional;

III – trajeto da passagem, com memorial descritivo e planta;

IV – quando se tratar de área do porto já arrendada a terceiros, carta de anuência do titular de direito de uso dessa área;

V – comprovação de ser o requerente detentor da titularidade do imóvel ou de direito de uso da área associada à passagem;

VI – comprovação de que foi dada ciência ao Conselho de Autoridade Portuária (CAP);

VII – cálculo do valor da remuneração a ser paga pelo beneficiário da passagem; e

VIII – estudo do impacto na utilização do bem público e interferência em relação aos demais arrendatários.

Art. 40. A administração do porto deverá manifestar-se no prazo de 30 (trinta) dias sobre o requerimento.

Parágrafo único. Do indeferimento do pedido pela administração do porto caberá recurso à Antaq.

Art. 41. O prazo do contrato de passagem será pactuado com a administração do porto, nos limites da necessidade do interessado, levando-se em conta critérios de conveniên-cia e oportunidade, com o prazo limitado a 25 (vinte e cinco) anos, prorrogável por períodos sucessivos, quando couber, desde que:

I – a atividade portuária seja mantida; e

II – o beneficiário promova os investimentos necessários para a modernização das instalações.

Art. 42. O valor da remuneração a ser paga deverá ser calculado pela administração do porto com base no impacto direto ou indireto causado nas áreas afetadas, sem prejuízo do pagamento das tarifas pertinentes.

§ 1º O valor a que se refere o caput será pago mensalmente à administração do porto.

§ 2º Quando envolver área arrendada a terceiros, a administração do porto lhes repas-sará os valores devidos, oriundos de parte da remuneração recebida do interessado no direito de passagem.

Art. 43. São cláusulas essenciais do contrato de passagem, as relativas:

I – ao objeto, com descrição dos equipamentos e trajeto previstos para a passagem; II – ao prazo, com indicação do início e término da vigência do contrato;

III – ao valor, às condições de pagamento e às tarifas pertinentes;

IV – às penalidades, sua gradação e formas de aplicação, na forma da regulamentação da Antaq;

V – à competência da Antaq para arbitrar na esfera administrativa, mediante solici-tação de qualquer das partes, conflitos entre a administração do porto e o beneficiário da passagem relativos à interpretação e à execução do contrato;

VI – à possibilidade de rescisão unilateral por parte da administração do porto, ouvida a Antaq;

VII – às obrigações do beneficiário da passagem, em especial as relativas:

a) à responsabilidade por danos ambientais ou de outra ordem causados a terceiros, em decorrência das atividades desenvolvidas;

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b) à manutenção das condições de segurança operacional, em conformidade com as normas em vigor, respeitado o regulamento de exploração do porto;

c) à prestação de informações de interesse do poder concedente, da administração do porto, da Antaq e das demais autoridades com atuação no porto;

d) à contratação de seguro de responsabilidade civil compatível com suas responsabi-lidades perante o poder concedente, a administração do porto e terceiros;

e) ao livre acesso de agentes credenciados do poder concedente, da administração do porto e da Antaq às áreas e instalações portuárias designadas no contrato para fins de fiscali-zação e outros procedimentos; e

f) à utilização adequada das áreas e instalações dentro de padrões de qualidade e eficiência, de forma a não comprometer as atividades do porto.

VIII – à prioridade de atracação de embarcações destinadas ao atendimento de arren-datário, na hipótese de utilização de instalações de acostagem vinculadas ao arrendamento de que é titular, com previsão, inclusive, de desatracação da embarcação às expensas do interessado na passagem, de forma a não prejudicar a regular operação da área arrendada;

IX – às obrigações da administração do porto, em especial as relativas à manutenção das condições de acessibilidade às instalações;

X – à impossibilidade de indenização ao beneficiário da passagem; e

XI – à reversão dos bens ou remoção às expensas do beneficiário na extinção do contrato.

Parágrafo único. A autoridade portuária poderá impor ao beneficiário do contrato de passagem a obrigação de realizar investimentos em construção ou manutenção de infraestru-tura comum dentro da área do porto organizado que seja por ele utilizada.

Art. 44. Os critérios técnicos para construção e instalação dos equipamentos neces-sários à utilização da passagem, assim como a definição das áreas e do trajeto, deverão ser definidos no contrato de passagem, considerando-se os interesses dos usuários atuais e futuros das áreas afetadas, conforme previsão contida no PDZ do porto.

Parágrafo único. Na extinção do contrato de passagem, as instalações e os equipa-mentos afetados ao seu exercício serão, a critério da autoridade portuária, revertidos ao patri-mônio da União ou removidos às expensas do beneficiário.

Art. 45. A celebração do contrato de passagem deverá ser comunicada à Antaq e ao poder concedente pela administração do porto, no prazo de até 30 (trinta) dias contados de sua assinatura, mediante o encaminhamento de cópia do instrumento contratual.

CaPÍtulO iv da transiçãO

Art. 46. A administração do porto, mediante prévia autorização da Antaq, poderá pactuar a exploração de uma área ou instalação portuária com o objetivo de promover a sua regularização temporária enquanto são ultimados os respectivos procedimentos licitatórios, nas situações em que o interesse público do porto organizado ou de sua região de influência requeira a manutenção da prestação de um serviço com essa relevância, ou a continuidade de atividade regida por instrumento jurídico rescindido, anulado ou encerrado.

Parágrafo único. Ao encaminhar o pleito à Antaq, a administração do porto o instruirá com:

I – declaração da Autoridade Portuária contendo:

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a) justificativa de que o terminal portuário presta importante serviço à comunidade, de interesse público, explicitando sua relevância para o porto;

b) justificativa de que a empresa pactuante possui as melhores condições técnicas para manter a prestação do serviço; e

c) declaração de adimplência da empresa pactuante com as obrigações financeiras perante a administração do porto; e

II – minuta de contrato de transição com seus dados e o da empresa pactuante.

Art. 47. Na hipótese em que não esteja presente a tutela relativa ao princípio da continuidade, a administração do porto deverá efetuar processo seletivo simplificado para a escolha do arrendatário transitório.

Art. 48. São cláusulas essenciais do contrato de transição, as relativas: I – aos anexos do contrato:

a) Anexo I: planta de localização da instalação portuária arrendada transitoriamente;

b) Anexo II: relação dos bens integrantes da instalação portuária arrendada; e

c) Anexo III: termo de arrolamento de bens;

II – ao objeto e valor do arrendamento transitório;

III – ao tipo de carga movimentada, se for o caso;

IV – ao prazo de até 180 (cento e oitenta) dias, improrrogável, ou até que se encerre o processo licitatório da área em questão, o que ocorrer primeiro;

V – ao não cabimento de indenização da arrendatária transitória pelos recursos neces-sários à manutenção da instalação portuária ou de bens integrantes alocados durante o prazo de vigência do contrato de transição, excetuados os investimentos emergenciais necessários para atender a exigências de saúde, segurança ou ambientais impostas por determinação regulatória, hipótese em que a Antaq indicará os parâmetros para o cálculo de eventual inde-nização em face da não depreciação do investimento no prazo de vigência contratual, caso aplicável no caso concreto;

VI – às responsabilidades da arrendatária transitória perante o poder concedente, à Antaq e à administração do porto;

VII – à tutela dos bens reversíveis;

VIII – às responsabilidades pela inexecução das atividades; IX – às hipóteses de extin-ção do contrato;

X – ao prazo para desocupação da instalação portuária ao fim do prazo contratual; e

XI – ao foro.

Parágrafo único. Aplicam-se, também, ao contrato de transição, no que couberem, as cláusulas essenciais especificadas nos incisos XI e XII do artigo 34 desta Norma.

tÍtulO v das Áreas e instalaçÕes POrtuÁrias nãO OPeraCiOnais

Art. 49. Aplicam-se à cessão ou à exploração direta pela administração do porto de áreas e instalações portuárias não operacionais as disposições do poder concedente regula-mentares da exploração direta e indireta de áreas não afetas às operações portuárias em portos organizados.

Art. 50. A celebração do contrato de cessão e autorização de áreas e instalações portuárias não operacionais deverá ser comunicada à Antaq e ao poder concedente pela ad-

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ministração do porto, no prazo de até 30 (trinta) dias, contado de sua assinatura, mediante o encaminhamento de cópia do instrumento contratual.

tÍtulO vi das inFraçÕes e Penalidades

Art. 51. O arrendatário e os pactuantes de contratos de uso temporário, passagem, transição, cessão de uso onerosa, cessão de uso não onerosa e autorização de uso deverão ob-servar as disposições legais e regulamentares da Antaq, notadamente as relativas à execução da operação portuária, à modicidade e publicação das tarifas e preços praticados, à prestação do serviço adequado e à efetividade dos direitos dos usuários, assim como os termos e as condições expressas ou decorrentes dos respectivos contratos, sob pena de seu descumpri-mento implicar a cominação de sanções administrativas, nos termos da norma que disciplina o processo administrativo sancionador da Antaq.

tÍtulO vii das disPOsiçÕes gerais e transitÓrias

Art. 52. A administração do porto deverá promover o levantamento de todas as áreas e instalações portuárias operacionais e não operacionais, sob sua gestão, localizadas dentro da área do porto organizado, encaminhando-o em até 180 (cento e oitenta) dias da publicação desta Norma, em forma de relatório circunstanciado, à Antaq e ao poder concedente.

Parágrafo único. A Antaq publicará, em seu sítio eletrônico, o relatório a que se refere o caput deste artigo.

Art. 53. No caso de arrendamento de instalações portuárias utilizadas em embarque, desembarque e trânsito de passageiros, tripulantes e bagagens, a arrendatária deverá prestar os serviços inerentes às atividades do terminal portuário, de modo a garantir a eficiência, presteza e cortesia.

Art. 54. A Antaq poderá determinar a movimentação ou armazenagem de cargas ou a movimentação de passageiros na instalação portuária arrendada, em caráter emergencial, nas seguintes situações:

I – em caso de emergência ou de calamidade pública, quando estiver caracterizada a urgência de atendimento, que possa ocasionar prejuízos ou comprometer a segurança de pessoas, obras, atividades, equipamentos e de outros bens públicos ou privados; ou

II – para atender situação que ponha em risco a distribuição de cargas destinadas ou provenientes do transporte aquaviário.

Parágrafo único. Na hipótese do caput, o arrendatário será remunerado diretamen-te pelos proprietários ou consignatários das cargas, pelas atividades portuárias executadas, utilizando-se como referência, para efeito de cálculo da referida remuneração, os valores das tarifas ou das atividades executadas pelo porto organizado mais próximo do terminal.

Art. 55. A administração do porto poderá utilizar-se dos institutos e procedimentos previstos na presente Norma, quando aplicáveis, ou de outros estabelecidos pela legislação em vigor, com vistas à ocupação de áreas, sob sua gestão, localizadas fora dos limites da área do porto organizado.

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Índice Alfabético e Remissivo

Índice por Assunto Especial

DOUTRINAS

Assunto

Penalidades aduaneiras

• Estreia do “Julgamento de Paradigma” no CARF e a Definição do Entendimento sobre Denúncia Es-pontânea em Multas Aduaneiras (Rafael Pinheiro Lucas Ristow e Ligia Ferreira de Faria) ......................... 9

• Ilegalidade da Retenção de Mercadorias para a Cobrança de Tributos e Penalidades Aduaneiras(Kelly G. Martarello) .................................................. 16

• Infrações e Penalidades Aduaneiras (Augusto Fauvel de Moraes e Mateus Soares de Oliveira) .................... 29

Autor

augusto Fauvel de moraes e mateus soares de oliveira

• Infrações e Penalidades Aduaneiras ........................... 29

Kelly g. martarello

• Ilegalidade da Retenção de Mercadorias para a Co-brança de Tributos e Penalidades Aduaneiras ............ 16

ligia Ferreira de Faria e raFael Pinheiro lucas ristow

• Estreia do “Julgamento de Paradigma” no CARF e a Definição do Entendimento sobre Denúncia Espon-tânea em Multas Aduaneiras........................................ 9

mateus soares de oliveira e augusto Fauvel de moraes

• Infrações e Penalidades Aduaneiras ........................... 29

raFael Pinheiro lucas ristow e ligia Ferreira de Faria

• Estreia do “Julgamento de Paradigma” no CARF e a Definição do Entendimento sobre Denúncia Es-pontânea em Multas Aduaneiras ................................. 9

ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Assunto

desembaraço aduaneiro

• Administrativo e Tributário – Imposto de impor-tação – Redução de alíquota – Exigência para o desembaraço aduaneiro que se confunde com o requisito para a fruição da alíquota reduzida – Sú-mula nº 323 do STF – Recurso especial provido(TRF 1ª R.) ....................................................... 2525, 55

EMENTÁRIO

Assunto

Penalidades aduaneiras

• Conhecimentos eletrônicos – auto de infração – atraso na prestação de informações – obrigação

acessória – denunciação espontânea – impossibi-lidade – redução da penalidade – possibilidade – apelação – provimento parcial ........................2526, 58

• Contrabando – mercadoria estrangeira – veículo utilizado no transporte – pena de perdimento – não cabimento ................................................2527, 59

•Despacho aduaneiro – início – prazo descum-prido – inscrição das declarações de importação antes de aplicação da penalidade – abandono da mercadoria – inocorrência – pena de perdimento – desproporcionalidade ...................................2528, 60

• Importação – infração punível com a pena de perdimento – ausência de indícios – liberação – exigência de garantia – caução – impossibilidade ........................................................................ 2529, 60

• Importação irregular de mercadorias – terceiro de boa-fé – interposição fraudulenta – pena de per-dimento – descabimento .................................2530, 61

•Mercadoria estrangeira – apreensão – importação regular – documentos comprobatórios – pena de perdimento – suspensão até o julgamento final –possibilidade ...................................................2531, 62

•Mercadoria importada – liberação condiciona-da à garantia – Instruções Normativas nºs 228 e 206/2002 da SRF – Medida Provisória nº 2.158/2001– precedentes – provimento.............................2532, 62

• Pena de perdimento – importação por conta e or-dem – importação por encomenda – ocultaçãofraudulenta de terceiros – não configuração ....2533, 63

• Pena de perdimento – imposição – importa-ção – interposição fraudulenta – art. 33 da Lei nº 11.488/2007 – descabimento ......................2534, 64

Índice Geral

DOUTRINAS

Assunto

ComplianCe

• Compliance e Mecanismos Anticorrupção nos Contratos de Afretamento de Embarcações (Shin Jae Kim e José Augusto Dias de Castro) ..................... 92

sobrestadia de contêiner

•Questões Pertinentes à Cobrança de Sobrestadiade Contêiner (Ronaldo Manzo) .................................. 80

subFaturamento

• Subfaturamento no Direito Aduaneiro (FelippeAlexandre Ramos Breda) ........................................... 65

Autor

FeliPPe alexandre ramos breda

• Subfaturamento no Direito Aduaneiro ....................... 65

José augusto dias de castro e shin Jae Kim

• Compliance e Mecanismos Anticorrupção nos Con-tratos de Afretamento de Embarcações ...................... 92

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250 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

ronaldo manzo

•Questões Pertinentes à Cobrança de Sobrestadia de Contêiner ............................................................. 80

shin Jae Kim e José augusto dias de castro

• Compliance e Mecanismos Anticorrupção nos Con-tratos de Afretamento de Embarcações ...................... 92

JURISPRUDÊNCIA

Assunto

aPosentadoria

•Mandado de segurança – Previdenciário – Apo-sentadoria – Reconhecimento de tempo especial – Conversão em tempo comum – Atividade insalu-bre – Comprovação por documentos – Adequação do writ – Eficácia dos equipamentos de proteção individual e coletiva que não descaracteriza a ati-vidade especial do agente insalubre ruído – De-cisão do STF no ARE 664.335/SC – Repercussão geral reconhecida – Servidor público – Filiação a regime estatutário – Possibilidade de contagem de período especial – Jurisprudência do STF – Súmula Vinculante nº 33 – Aplicação apenas à hipótese de aposentadoria especial – Contagem recíproca do tempo de contribuição no RGPS e no regime estatu-tário – Art. 94 da Lei nº 8.213/1991 e art. 201, § 9º da CF/1988 – Compensação financeira dos sistemas – Atividade perigosa – Vigilante – demonstração do uso de arma de fogo para reconhecimento da atividade especial até 05.03.1997 – Jurisprudência do TRF 1ª Região – Laudo técnico ou perfil profis-siográfico previdenciário extemporâneos – Valida-de – Precedentes (TRF 1ª R.) ..........................2535, 104

dano ambiental

• Apelação – Dano ambiental – Preliminares de ilegitimidade passiva da Petrobras, inépcia da pe-tição inicial e falta de interesse de agir do minis-tério público federal – Rejeição – Responsabili-dade objetiva e solidária da Petrobras e Sulnorte Serviços Marítimos Ltda. – Fixação de quantum indenizatório – Utilização de fórmula da Cetesb – Atendimento aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade – Honorários advocatícios em favor do MPF – Impossibilidade – Recurso do MPF parcialmente provido – Recurso da Petrobras improvido (TRF 5ª R.) ....................................2539, 146

imPosto de imPortação

•Direito tributário – Aduaneiro – Imposto de impor-tação – Base de cálculo – Valor aduaneiro – Despe-sas de capatazia – Inclusão – Instrução Normativa SRF nº 327/2003 – Impossibilidade – Compensa-ção dos indébitos – Selic (TRF 3ª R.) ..............2537, 130

• Embargos infringentes – Tributário – Imposto de importação – Valor aduaneiro – Despesas incorri-das após a chegada ao porto – Art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira – Regulamento aduaneiro – Ilegalidade do § 3º do art. 4º da Instrução Norma-tiva SRF nº 327/2003 (TRF 4ª R.) ...................2538, 137

transPorte aquaviário

• Transporte aquaviário (TRF 2ª R.) ..................2536, 127

EMENTÁRIO

Assunto

abastecimento das embarcações

• Abastecimento das embarcações – comunicação do sinistro – Resolução nº 398, do Conama – res-ponsabilidade – identificação – Ibama – auto deinfração – anulação .......................................2540, 166

ação anulatória

• Ação anulatória – duplicata – tarifas portuárias – tabela progressiva da “Taxa Mínima” – utilização – eventos ocorridos antes da entrada em vigor da tabela atual – impossibilidade .......................2541, 166

acidente ambiental

• Acidente ambiental – explosão do Navio Vicuña – responsabilização das empresas proprietárias da carga – caráter multitudinário – recursos repe-titivos – afetação – julgamento perante a SegundaSeção do STJ ..................................................2542, 167

agente marítimo

• Agente marítimo – informações – prazo – descum-primento – multa – responsabilidade – Decreto-Leinº 37/1966 ....................................................2543, 169

• Agente marítimo – responsabilidade fiscal – atua-ção como transportador – processo administrati-vo – inexistência de nulidade – redução da mul- ta – possibilidade – denúncia espontânea rejeitada ......................................................................2544, 169

agente marítimo contratado

• Agente marítimo contratado – natureza jurídica – mandato mercantil – existência da dívida – pe-nhora de embarcação – possibilidade ...........2545, 170

aPoio marítimo

• Apoio marítimo – qualificação como contribuinte do ICMS – impossibilidade – contrato de afreta-mento marítimo – hipóteses de incidência – nãoenquadramento .............................................2546, 170

armazenamento Portuário

• Armazenamento portuário – cobrança – exces-so – tabela de serviços e valores – homologação pelo poder público – parâmetros oficiais de tarifa portuária – verificação – cerceamento de defesa – acolhimento ..................................................2547, 170

atendimento aduaneiro e alFandegário

• Atendimento aduaneiro e alfandegário – suspen-são – ato discricionário – legitimidade – critérios de conveniência e oportunidade – vicio – inocor-rência ............................................................2548, 171

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ��������������������������������������������������������������������������������������������������������251 autoridade Portuária

• Autoridade portuária – norma de atracação – infra-ção e penalidade não previstas na Lei dos Portos (Lei nº 8.630/1993) – ilegalidade – preço público por armazenagem em equipamento próprio – le-galidade ........................................................2549, 172

coFins-imPortação

• Cofins-Importação – base de cálculo – ICMS dodesembaraço aduaneiro – não incidência .....2550, 174

• Cofins-Importação – base de cálculo – ICMS dodesembaraço aduaneiro – não incidência .....2551, 174

comPensação do indébito

• Compensação do indébito – Inspetor-Chefe da Al-fândega da Receita Federal do Brasil no Porto de Rio Grande – ilegitimidade passiva – PIS e Cofins--Importação – base de cálculo – valor aduaneiro –restituição – inadequação da via eleita ..........2552, 175

comPlexo Portuário de suaPe

• Complexo Portuário de Suape – empresa pública estadual – personalidade jurídica de direito priva-do – patrimônio público – posse indireta – usuca-pião – impossibilidade ..................................2553, 175

contrato de aFretamento

• Contrato de afretamento – causa que versa sobre direito marítimo – tutela de urgência – rescisão contratual – cobrança de multa – valor elevado ......................................................................2554, 177

contrato de arrendamento

• Contrato de arrendamento – aditivo – alteração do objeto do arrendamento inicial – anulação – ou-torga de terrenos estranhos à licitação – atos lesi-vos à moralidade administrativa e ao princípio dalegalidade ......................................................2555, 179

dano ambiental

•Dano ambiental – canal do Porto de Santos – ero-são da orla da praia – operação de dragagem –relação entre os fatos – não demonstração ....2556, 182

desembaraço aduaneiro

•Desembaraço aduaneiro – abandono de carga pelo importador – retenção de contêiner – desca-bimento .........................................................2557, 182

•Desembaraço aduaneiro – desunitização de carga e devolução de contêiner – mercadorias – aban-dono – perdimento – contêiner – propriedade de sociedade de transporte marítimo – retenção – im-possibilidade .................................................2558, 183

direito marítimo

•Direito marítimo – zonas de praticagem – área de abrangência – redefinição .............................2559, 183

embarcação

• Embarcação – afretamento a casco nu – ausên-cia de transferência da titularidade – ICMS – in-cidência – descabimento ...............................2560, 183

estivador

• Estivador – acidente típico – nexo causal – reco-nhecimento – auxílio-doença acidentário – valoresem atraso – IPCA-E – incidência ....................2561, 184

hidrovia Paraná-tietê

•Hidrovia Paraná-Tietê – normas de licenciamento de obras de relevante impacto ambiental – obser-vância – Ibama – competência – estudo de im-pacto ambiental – relatório de impacto ambiental– necessidade ................................................2562, 184

imPortação

• Importação – livros infantis – classificação tarifá-ria – interrupção do despacho aduaneiro – restri-ção do conceito de livro para fins de imunidade– impossibilidade ..........................................2563, 187

• Importação – registro da DI – pena de perdimen-to – regulamento aduaneiro – arts. 71, III, e 250, do Decreto nº 6.759/2009 – tributos incidentes – restituição – deferimento ...............................2564, 187

imPosto de imPortação

• Imposto de Importação – valor aduaneiro – des-pesas incorridas após a chegada ao porto – art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira – rol de elementos acrescido ao preço da mercadoria –inocorrência ..................................................2565, 188

incêndio em tanque de combustível

• Incêndio em tanque de combustível – acesso ao porto – bloqueio – indenização – desprovimento ......................................................................2566, 188

incêndio em terminal

• Incêndio em terminal – poluição das águas do es-tuário de Santos – pesca – inexistência de prova de dano efetivo – região degradada – recurso im-provido ..........................................................2567, 189

incêndio em terminal Portuário

• Incêndio em terminal portuário – danos materiais – indenização – exploração econômica da pesca artesanal no local – impossibilidade ..............2568, 189

issqn

• ISSQN – serviços de dragagem – mar territorial – competência tributária – art. 12 do DL 406/1968 – local do estabelecimento do prestador do serviço – tema decidido em recurso repetitivo – improce-dência manifesta – multa ...............................2569, 190

lei nº 9.535/1997 (lesta)

• Lei nº 9.535/1997 (Lesta) – autoridade administra-tiva – intervenção – disponibilidade da praticagem – garantia – essencialidade do serviço – fixação do preço – embargos de declaração – vícios – art. 535 do CPC – não configuração – prequestio-namento – não cabimento .............................2570, 190

liberação e devolução de contêiner

• Liberação e devolução de contêiner – impossibi-lidade de cumprimento da decisão – prova – au-

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252 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

sência – tutela provisória – reforma – impossibi-lidade ............................................................2571, 191

mercadorias imPortadas

•Mercadorias importadas – perdimento – transpor-te – barco de cruzeiro – ausência de documen-tação – dano ao Erário – presunção – boa-fé não demonstrada – substituição por multa – impossibi-lidade ............................................................2572, 192

mercadorias suJeitas ao Perdimento

•Mercadorias sujeitas ao perdimento – retenção do contêiner – unidade de carga – impossibilidade ......................................................................2573, 193

oPerador de movimentação de cargas em área Portuária

•Operador de movimentação de cargas em área portuária – auxílio-acidente – concessão – parcial perda da capacidade laboral – princípio in dubio pro misero .....................................................2574, 194

Pena de Perdimento

• Pena de perdimento – importação por conta e or-dem de terceiros – simulação – oferecimento de seguro garantia – procedimento já concluído – dano ao Erário – provimento .........................2575, 194

Previdência Privada

• Previdência privada – suplementação de aposenta-doria – Codesp – ilegitimidade .....................2576, 195

registro do trabalhador Portuário avulso

• Registro do trabalhador portuário avulso – cance-lamento – Justiça Comum Estadual – competência – reconhecimento – Fundo de Indenização do Tra-balhador Portuário – ilegitimidade passiva ...... 2577, 196

rePorto

• Reporto – PIS e Cofins – créditos – âmbito de inci-dência – restrição – remessa oficial – provimento ......................................................................2578, 198

serviço aduaneiro

• Serviço aduaneiro – agente de cargas – infor-mações – legitimidade – obrigação acessória – multa – legalidade .........................................2579, 198

serviço de Praticagem Prestado

• Serviço de praticagem prestado – preço – au-sência de pagamento – inexistência de consen-so – requisitos do protesto – falta de liquidez da obrigação – sustação de protesto – contracautela(caução) ........................................................2580, 199

siscomex

• Siscomex – habilitação – greve – fiscalização – serviço essencial – análise do pedido – cabimento ......................................................................2581, 200

siscoserv

• Siscoserv – responsabilidade pelo registro – ser-viços de transporte internacional – agente de carga – importação por conta e ordem – im-portação por encomenda...............................2582, 201

• Siscoserv – responsabilidade pelo registro – ser-viços de transporte internacional – agente de car-ga – importação por conta e ordem – importação por encomenda ............................................2583, 203

• Siscoserv – responsabilidade pelo registro – ser-viços de transporte internacional – agente de car-ga – importação por conta e ordem – importaçãopor encomenda .............................................2584, 203

taxas e tariFas Portuárias de armazenagem

• Taxas e tarifas portuárias de armazenagem – em-presa de logística – serviços prestados – cobrança – legitimidade ..................................................2585, 203

terminal aquaviário

• Terminal aquaviário – vazamento de óleo – in-denização por danos materiais e morais – com-petência ........................................................2586, 204

terminal marítimo

• Terminal marítimo – liberação de fumaça tóxica – danos morais – indenização – redebate – im-possibilidade .................................................2587, 204

trabalhador avulso

• Trabalhador avulso – marco inicial – prescrição bienal – encerramento do engajamento do traba-lhador ............................................................2588, 204

transPorte de coisas

• Transporte de coisas – cobrança – divergência de conteúdo da carga – laudo de vistoria – troca de mercadorias na origem, anteriormente ao embar-que marítimo – cobrança devida ...................2589, 205

transPorte de Passageiros

• Transporte de passageiros – acidente aquaviário – falha na condução da embarcação – danos morais – danos materiais – danos estéticos – redução dacapacidade laborativa – pensionamento ........2590, 205

• Transporte de passageiros – óbito – indenização por danos morais e materiais – pensão alimentícia – responsabilidade objetiva da transportadora – cláusula de incolumidade – riscos de atividade detransporte ......................................................2591, 205

transPorte marítimo

• Transporte marítimo – avaria – carga – defeito con-tainer – indenização – prescrição ânua – regra es-pecial – Decreto-Lei nº 116/1967 – Súmula nº 151,do STF – ação do segurador sub-rogado ........2592, 206

• Transporte marítimo – danos e avaria na carga – legitimidade passiva do agente de carga – agente que atua como representante do transportador no país – transportador NVOCC – responsabilidade

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RDM Nº 34 – Set-Out/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ��������������������������������������������������������������������������������������������������������253 integral – danos da carga durante o seu percurso –responsabilidade solidária .............................2593, 207

• Transporte marítimo – frete – Prepaid – compro-vação – retenção das mercadorias – ilegalidade ......................................................................2594, 207

• Transporte marítimo – impugnação pelas rés – ve-rificação dos danos enquanto na posse dos produ-tos avariados – exame da prova – pedido impro-cedente .........................................................2595, 208

• Transporte marítimo – liberação de mercadoria – tutela antecipada – premência da medida – ine-xistência – instauração do contraditório – necessi-dade ..............................................................2596, 208

transPorte marítimo internacional

• Transporte marítimo internacional – original de conhecimento de transporte – ausência de apresen-tação – retenção de mercadorias pelo agente ma-rítimo – cabimento ........................................2597, 209

transPorte Por barcaça

• Transporte por barcaça – contrato de prestação recíproca de serviços e outros pactos – embarca-ções – devolução – inavegabilidade – inquérito administrativo – autoridade portuária – prova peri-cial – necessidade – cerceamento de defesa – con-figuração .......................................................2598, 209

valor aduaneiro

• Valor aduaneiro – despesas incorridas após a chegada ao porto – IN SRF 327/2007 – art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira – Decreto nº 4.543/2002 – sentença ultra petita – adequação ......................................................................2599, 210

Seção Especial

PARECER

Assunto

usinas hidrelétricas

• Parecer nº 0090/2016/CJU-MS/CGU/AGU Consul-toria Jurídica da União no Estado de Mato Grossodo Sul Advocacia-Geral da União ........................... 211

DIREITO EM DEBATE

Assunto

exPloração de Portos

• Resolução Normativa Antaq nº 07/2016 – O Que Mudou na Exploração de Portos Organizados?(Lucas Navarro Prado e Denis Gamell) .................... 225

Autor

denis gamell e lucas navarro Prado

• Resolução Normativa Antaq nº 07/2016 – O QueMudou na Exploração de Portos Organizados? ........ 225

lucas navarro Prado e denis gamell

• Resolução Normativa Antaq nº 07/2016 – O Que Mudou na Exploração de Portos Organizados? ........ 225

RESENHA LEGISLATIVA

• Resolução Normativa nº 7-Antaq, de 30 de Maio de 2016 (Retificada pela Resolução nº 4843-Antaq, de 6 de Junho de 2016) ........................................... 232