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ISBN: 978-972-9171-86-4

a) título da comunicação: “Regularização do iva de créditos incobráveis e créditos de

cobrança duvidosa”

b) Autores:

SUZANA FERNANDES DA COSTA E OSCAR RODRIGUES VELOSO

c) Emails:

[email protected]

[email protected]

d) Área temática: A7 Fiscalidade

e) Palavras chave: Regularização, IVA, créditos incobráveis; créditos de cobrança

duvidosa

f) Metodologia: M6 - interdiciplinary/critical

REGULARIZAÇÃO DO IVA DE CRÉDITOS INCOBRÁVEIS E CRÉDITOS DE

COBRANÇA DUVIDOSA

PALAVRAS CHAVE: regularização; IVA; créditos incobráveis

ABSTRACT:

Com a presente comunicação pretendemos abordar a problemática das regularizações do

IVA respeitante a créditos incobráveis e créditos de cobrança duvidosa, matéria de grande

interesse prático para o Técnicos Oficiais de Contas. Propomo-nos, nomeadamente,

analisar a evolução do regime legal e identificar as principais críticas ao regime

consagrado na lei, numa perspetiva jurídica e contabilística.

Analisando as alterações que entram em vigor em 2015, veremos, quanto aos créditos

incobráveis, as importantes mudanças no regime das insolvências de carácter pleno, e o

diferimento do momento da regularização do IVA para o trânsito em julgado da sentença

de verificação e graduação de créditos.

Nos créditos de cobrança duvidosa veremos o novo regime de regularização extrajudicial

que entra em vigor no segundo semestre de 2015, e que prevê a intervenção obrigatória de

revisor oficial de contas.

Terminaremos com uma análise crítica do regime, identificando algumas omissões do

legislador e alguns aspetos controversos do novo regime.

With this paper we intend to analyse the VAT regularizations regarding bad debt relief and

credits of uncertain payment, a subject with great practical interest to certified accountants.

We wish to analyse the evolution of the legal frame and to identify the main critical points

of the legal regulation of this matter, in a juridical and accounting perspective.

We will go through the changes that will take place in 2015, especially regarding the

bankruptcy procedure and the moment of the VAT regularization (the final decision on the

creditor’s demands).

In which regards credits of uncertain payment, we´ll see the new extrajudicial procedure of

VAT regularization, that starts producing effects in July 2015, and that will demand the

intervention of a certified auditor.

We´ll end with a critical analysis of the legal regimen, pinpointing some of the main

omissions of the legislator and some controversial issues of the new regulation.

1. INTRODUÇÃO:

A regularização do IVA referente a créditos incobráveis e a créditos de cobrança

duvidosa a favor dos sujeitos passivos tem sofrido importantes alterações, que justificam, a

nosso ver, um esclarecimento dos direitos e deveres dos sujeitos passivos nesta matéria.

As revisões mais relevantes foram introduzidas com a Lei n.º 66-B/2012, de 31/12,

que aprovou o Orçamento de Estado para 2013, entretanto complementada com a Lei n.º

82-B/2014 de 31/12/2014, que aprovou o Orçamento do Estado para 2015, e com a

Portaria n.º 172/2015, de 05/06. As alterações legais, juntamente com a doutrina

administrativa da Autoridade Tributária e Aduaneira (A.T.A), vieram condicionar as

opções que os sujeitos passivos possuem para a regularização do IVA dos créditos

incobráveis e de cobrança duvidosa, nomeadamente quanto aos formalismos necessários

para assegurar a devida regularização, assunto que afeta grande parte dos sujeitos passivos

de IVA.

No Código do IVA a regularização do imposto respeitante ao presente assunto está

prevista nos artigos 78º, n.ºs 7 e 8 e 78.º-A a 78º-D. Para além destes artigos, importa

consultar também o Ofício Circulado nº 30161/2014 de 08-07 da Área de Gestão Tributária

do IVA, em que a A.T.A. exprime a sua opinião relativamente a esta temática1.

1 Convém lembrar que o ofício circulado não é uma norma jurídica mas antes um regulamento interno,

obrigatório apenas para os funcionários situados hierarquicamente abaixo da entidade que os emite, e cujo

regime jurídico conta dos artigos 78.º-A da LGT e 55.º e 56.º CPPT. Sobre o valor dos ofícios circulados ver

TABORDA DA GAMA, J.: “Tendo surgido dúvidas sobre o valor das circulares e outras orientações

genéricas”, Estudos em Memória do Prof. Doutor J. L. Saldanha Sanches - Vol III, Coimbra Editora, 2011,

págs. 157 a 225 e LEITE DE CAMPOS, SILVA RODRIGUES, B. e LOPES DE SOUSA, J: Lei Geral

Tributária anotada e comentada, 4ª edição, Encontro da Escrita, 2012, págs. 636.

Na presente comunicação iremos abordar numa perspetiva crítica o regime dos

créditos incobráveis e os créditos de cobrança duvidosa à luz das referidas leis de

Orçamento e da doutrina administrativa disponível.

CRÉDITOS INCOBRÁVEIS

Para efeitos da regularização do IVA (artigos 78º, n.ºs 7 e 8 e 78º-A do CIVA), o

sujeito passivo poderá deduzir o IVA dos créditos incobráveis nas seguintes situações:

Em processo de execução, após o registo a que se refere a alínea b) do n.º 2 do

artigo 717.º do Código do Processo Civil;

Em processo de insolvência, quando a mesma for decretada de caráter limitado,

após o trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos

prevista no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ou, quando

exista, a homologação do plano objeto da deliberação prevista no artigo 156.º do

mesmo Código;

Em processo especial de revitalização, após homologação do plano de

recuperação pelo juiz, previsto no artigo 17.º-F do Código da Insolvência e da

Recuperação de Empresas;

Nos termos previstos no Sistema de Recuperação de Empresas por Via

Extrajudicial (SIREVE), após celebração do acordo previsto no artigo 12.º do

Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto.

O artigo 78º do CIVA, no que diz respeito à regularização do IVA dos créditos

incobráveis e de cobrança duvidosa, aplica-se apenas aos créditos vencidos antes de 1 de

Janeiro de 2013, ao passo que os artigos 78º-A a 78º-D do CIVA se aplicam aos créditos

vencidos após 1 de Janeiro de 20132.

Segundo o n.º 3 do art.º 78.º-A CIVA “considera-se que o vencimento do crédito

ocorre na data prevista no contrato celebrado entre o sujeito passivo e o adquirente ou, na

ausência de prazo certo, após a interpelação prevista no artigo 805.º do Código Civil, não

2 Para uma análise da diferença de regime até 31-12-2012 e depois dessa data ver D´OLIVEIRA MARTINS,

G.W. e FRANCO, R.: “Regularizações de IVA: Pistas para Auditoria e Contabilidade”, in Cadernos de IVA

2014, coord. Sério Vasques, Almedina, 2014, págs. 169 a 180.

sendo oponível pelo adquirente à Autoridade Tributária e Aduaneira o incumprimento dos

termos e demais condições acordadas com o sujeito passivo”.

Veremos em seguida cada um dos casos referidos nestes artigos em que a regularização

do IVA é possível:

a) Em processo de execução, após o registo a que se refere a alínea b) do n.º 2 do

artigo 717.º do Código do Processo Civil;

A Lei n.º 82-B/2014, de 31/12/2014, atualizou a remissão que constava da lei para o

antigo Código de Processo Civil. O artigo 717.º refere-se ao registo informático das

execuções, e determina que dele devem constar as execuções em curso e também as

execuções findas. Relativamente a estas, a al.ª b) do n.º 2 refere-se aos processos extintos

“por não terem sido encontrados bens penhoráveis”.

Na prática revela-se difícil esta regularização pelo facto de nem sempre os agentes de

execução promoverem um célere registo da extinção da execução por inexistência de

bens3. Lembre-se que um credor só poderá deitar mão a um processo executivo quando

estiver na posse de título executivo (o que em muitos casos obriga ao prévio recurso a uma

injunção ou ação declarativa).

b) Em processo de insolvência, quando a mesma for decretada de caráter limitado,

após o trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos

prevista no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ou, quando

exista, a homologação do plano objeto da deliberação prevista no artigo 156.º do

mesmo Código;

Nos casos previstos no art.º 39º CIRE (Código da Insolvência e da Recuperação de

Empresas), em que a insolvência é decretada de carácter limitado (por inexistência ou

insuficiência da massa insolvente), os sujeitos passivos de IVA podem regularizar o IVA a

seu favor após o trânsito em julgado da sentença que declarou a insolvência com carácter

limitado e desde que estejam na posse da correspondente certidão judicial de onde constem

3 Nesse sentido CLARO, S. e SALGUEIRINHO MAIA, H.: “Recuperação de IVA de Créditos incobráveis

ou de cobrança duvidosa”, in Cadernos de IVA 2014, coord. Sério Vasques, Almedina, 2014, pág. 482

estes elementos, bem como a data do respetivo trânsito. Neste tipo de processos não há

sequer lugar à reclamação de créditos4.

A nosso ver a exigência de certidão judicial não decorre da lei mas apenas do ofício

circulado nº 30161/2014 de 08-07, pelo que deve ser reconhecida igualmente a

regularização quando o sujeito passivo se encontre na posse de certidão permanente da

qual conste o registo da declaração de insolvência com carácter limitado, já que o art.º 50.º

do CPPT e o art.º 72.º da LGT admitem que no procedimento tributário possam ser usados

todos os meios de prova admitidos em direito5.

Nos casos de insolvência plena, e desde 01-01-2015, os sujeitos passivos de IVA

poderão apenas regularizar o IVA após o trânsito em julgado da sentença de verificação e

graduação de créditos6, nas situações de liquidação do devedor, ou após a homologação do

plano de insolvência previsto no artigo 156º CIRE, quando este tenha sido aprovado.

O legislador faz avançar em alguns meses (ou até anos) o momento em que pode ter

efeito a regularização do IVA, já que até 2015 ela ocorreria aquando da pela homologação

da deliberação prevista no art.º 156.º do CIRE. A assembleia de credores apreciava nesta

altura o relatório do administrador de insolvência e deliberava sobre o encerramento ou a

manutenção em atividade do(s) estabelecimento(s) compreendidos na massa insolvente

(art.º 156.º, n.º 2); para além disso podia “cometer ao administrador de insolvência o

encargo de elaborar um plano de insolvência” (art.º 192.º)7 e determinar a suspensão da

liquidação e partilha da massa insolvente (156.º, n.º 3 e 156.º). A assembleia podia

também, em reunião ulterior, modificar ou revogar as deliberações tomadas8.

Até 2015, o legislador optou por fixar um momento dentro do processo de insolvência

em que era já possível conhecer os créditos reclamados no prazo legal e os créditos que o

administrador de insolvência reconhecera, e em que se verificaria se haverá plano de

4 Sobre o caráter limitado da insolvência ver MARTINS, L: Processo de Insolvência, 3ª edição, Almedina,

2014, págs. 175 a 182 e EPIFÂNIO, Mª. R.: Manual de Direito da Insolvência, 4ª edição, Almedina, 2012,

págs. 46 a 48. Quanto Às dificuldades na regularização do IVA nas insolvências limitadas ver PESTANA DE

VASCONCELOS, M: “Insolvência e IVA, op. cit., págs 205 a 218 e D´OLIVEIRA MARTINS, G.W. e

FRANCO, R.: “Regularizações de IVA…, op. cit, pág. 174. 5 Referem-se criticamente à exigência de certidão pela Autoridade Tributária CLARO, S. e

SALGUEIRINHO MAIA, H.: “Recuperação de IVA…, op. cit, pág. 487. 6 Acerca desta sentença, ver EPIFÂNIO, Mª. R.: Manual de Direito da Insolvência, op. cit., págs. 219 a 221

e MARTINS, L: Processo de Insolvência…, op.cit., págs 347 a 249. 7 Para uma análise detalhada do plano de insolvência ver PIDWELL, P.: O Processo de Insolvência e a

Recuperação da Sociedade Comercial de Responsabilidade Limitada, Coimbra Editora, 2011, págs. 178 a

286 e MARTINS, L: Processo de Insolvência…, op.cit., págs. 422 a 472. 8 Sobre o funcionamento e as competências desta assembleia pode ver-se EPIFÂNIO, Mª. R.: Manual de

Direito da Insolvência, op. cit., págs. 71 a 74 e PIDWELL, P.: O Processo de Insolvência…, op.cit., págs.

175 a 178.

insolvência9. Com as alteração de 2015, o momento da regularização avança no tempo,

voltando-se ao “velho” momento defendido pela A.T.A. nas interpretações administrativas

anteriores a 2013 (que não encontravam nenhum suporte na lei).

Parece-nos claro que a lei não faz depender a regularização do IVA da reclamação de

créditos, podendo ser regularizado o IVA de créditos reconhecidos pelo Administrador de

Insolvência ainda que não reclamados – que constarão da sentença de verificação e

graduação de créditos. Da mesma forma, ocorrendo uma ação para verificação ulterior de

créditos em sede de IVA10

, os créditos que venham a ser reconhecidos constarão da mesma

forma da sentença de verificação e graduação de créditos.

Veja-se que já no Ofício Circulado nº 30161/2014 de 08-07 a A.T.A. defende que no

caso das insolvências plenas sem aprovação de plano de insolvência o momento para a

regularização do Iva seria só a sentença de verificação e graduação de créditos. No entanto

tal interpretação não tinha até 01/01/2015 qualquer suporte legal, pelo que a nosso ver é

claramente ilegal, podendo ser regularizado o IVA pelas empresas que se encontrem na

posse de certidão respeitante a créditos vencidos até 31/12/2014 que ateste a realização da

assembleia de credores prevista na lei e as deliberações que aí tenham sido tomadas.

Ainda segundo a interpretação da A.T.A., no caso de aprovação de plano de

recuperação com perdão parcial de dívida, o credor apenas poderá regularizar o IVA

respeitante ao montante da dívida perdoada, o que coloca alguns problemas.

Com efeito, surgem algumas dificuldades de interpretação relativamente ao n.º 5 do

art.º 78.º-A nestes casos, já que a dedução do imposto nos termos do n.º 4 exclui a

possibilidade de dedução nos termos do n.º 2. Sendo assim, o IVA da parte do crédito não

perdoado não poderá ser regularizado nem nos termos do n.º 2 (com base na mora) nem

nos termos do n.º 4 (com base na incobrabilidade) só o sendo mais tarde, se o plano de

insolvência se frustrar.

A partir de 2015, para a regularização do IVA nos processos de insolvência, os

sujeitos passivos deverão ter na sua posse a certidão judicial que certifique o teor da

9 Para uma análise da alteração legal de 2013 na perspetiva do momento da regularização nos processos de

insolvência veja-se FERNANDES DA COSTA, S. “A Regularização do IVA nos processos de insolvência”,

in Revista TOC, N.º 154, Janeiro de 2013, págs. 41 a 47 e CLARO, S. e SALGUEIRINHO MAIA, H.:

“Recuperação de IVA de Créditos incobráveis ou de cobrança duvidosa”, in Cadernos de IVA 2014, coord.

Sério Vasques, Almedina, 2014, pág. 483 e ´OLIVEIRA MARTINS, G.W. e FRANCO, R.: “Regularizações

de IVA…, op. cit, pág. 176 e 177. 10

MARTINS, L: Processo de Insolvência…, op.cit., pág. 354 a 358.

sentença e a data do respetivo trânsito em julgado, a identificação do credor, os créditos

reconhecidos e os respetivos montantes, bem como prova da comunicação prevista no nº 9

do artigo 78º-B do CIVA (identificação das faturas, montante do crédito e do imposto a ser

regularizado, processo ou acordo em causa e o período em que a regularização é efetuada).

Alguns autores como CLARO e SALGUERINHO MAIA11

repudiam a necessidade de

comunicação da regularização aos devedores.

c) Em processo especial de revitalização, após homologação do plano de

recuperação pelo juiz, previsto no artigo 17.º-F do Código da Insolvência e da

Recuperação de Empresas;

Nos casos de Processo Especial de Revitalização (PER), previsto nos artigos 17.º-A a

17.º-I do CIRE, o momento para a regularização do IVA nasce apenas com a homologação

por parte do juiz do plano de recuperação negociado e aprovado pelos credores. Também

neste caso, segundo interpretação da A.T.A., o credor apenas poderá regularizar o IVA

respeitante ao montante da dívida perdoada12

.

Como vimos supra poder-se-ão colocar alguns problemas já que o IVA não se recupera

nem pela mora, nem pela incobrabilidade, só havendo regularização mais tarde se o

processo vier a redundar numa insolvência.

d) Nos termos previstos no Sistema de Recuperação de Empresas por Via

Extrajudicial (SIREVE), após celebração do acordo previsto no artigo 12.º do

Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto.

O SIREVE (Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial) foi aprovado

pelo Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto e corre os seus termos junto do IAPMEI.

Neste tipo de procedimento extrajudicial não á luar a homologação de um juíz, sendo

determinante a celebração do acordo por pelo menos 50% dos credores.

11

CLARO, S. e SALGUEIRINHO MAIA, H.: “Recuperação de IVA…, op. cit, pág. 487. 12

Sobre o PER ver SILVA VIEIRA, N. “Insolvência e Processo de Revitalização”, Quid Juris, 2012 e REIS

SILVA, F. “A verificação de créditos no processo de revitalização”, II Congresso de Direito da Insolvência,

Coord. Catarina Serra, Almedina, 2014, págs. 255 a 265.

Também neste caso, segundo interpretação da A.T.A., o credor apenas poderá

regularizar o IVA respeitante ao montante da dívida perdoada - o que coloca as mesmas

dúvidas já apontadas nos pontos anteriores.

2. CRÉDITOS DE COBRANÇA DUVIDOSA

Por força do nº 2 do artigo 78º-A do CIVA, consideram-se créditos de cobrança

duvidosa aqueles que apresentem um risco de incobrabilidade devidamente justificado, o

que se verifica quando:

O crédito esteja em mora há mais de 24 meses desde a data do respetivo

vencimento e existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas

diligências para o seu recebimento;

O crédito esteja em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo

vencimento, o valor do mesmo não seja superior a € 750, IVA incluído, e o devedor

seja particular ou sujeito passivo que realize exclusivamente operações isentas que

não confiram direito à dedução.

Com esta disposição verifica-se uma aproximação ao tratamento fiscal das imparidades

das dívidas a receber previstas no CIRC, distinguindo-se claramente a perda fiscal

resultante da mora no recebimento da resultante da incobrabilidade “total”.

A regularização do IVA sob o regime dos créditos incobráveis (nº 4 do artigo 78º-A)

impossibilita a regularização do IVA sob o regime dos créditos de cobrança duvidosa (nº 2

do artigo 78º-A), por força do nº 5 do artigo 78º-A do CIVA, o que colocará alguma

dificuldades de aplicação do regime.

Tendo esta norma entrado em vigor a 1 de Janeiro de 2013, ultrapassou-se agora em

2015 pela primeira vez o prazo de 24 meses para a verificação da mora, só agora estando

assim disponível este mecanismo de regularização do IVA para os sujeitos passivos.

Convirá em todo o caso verificar se do contrato celebrado entre as partes consta uma data

de cumprimento, caso em que a mora se contará dessa data.

Na ausência de prazo certo, a mora conta-se após a interpelação prevista no artigo 805.º

do Código Civil, interpelação que poderá ser judicial ou extrajudicial mas em todo o caso,

que terá de ser documentalmente provada. Nos termos da al.º c) do n.º 3 do referido artigo

do CC: “se o próprio devedor impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste

caso, na data em que normalmente o teria sido” (será, por ex.º, o caso de carta enviada com

aviso de receção que o devedor se tenha recusado a levantar).

Recomenda-se que naqueles casos em que não há contrato escrito e o prazo de

vencimento consta apenas da fatura, que o sujeito passivo faça interpelação formal após

decurso do prazo da fatura e tenha prova disso mesmo.

Uma vez constatada a mora, a regularização do IVA à luz do art.º 78.º- A CIVA

depende da elaboração de pedido de autorização prévia por via eletrónica de acordo com os

modelos aprovados pela Portaria n.º 172/2015 de 05/06; este pedido de autorização deve

ser apresentado no prazo de seis meses contados a partir da data em que os créditos sejam

considerados de cobrança duvidosa. Este prazo é fundamental, dado que uma vez

ultrapassado o sujeito passivo perde a possibilidade de regularização do IVA por esta via,

restando-lhe a regularização do IVA via dos créditos incobráveis.

O referido pedido de autorização prévia é apresentado por via eletrónica, e deve ser

confirmado pelo ROC dez dias após a entrada do pedido, nos termos do art.º 4.º, 2 da

referida Portaria, sob pena de rejeição automática do pedido. O sujeito passivo que

pretenda a regularização deve apresentar um requerimento por cada adquirente (art.º 3.º, n.º

2 da Portaria), ainda que junte várias faturas num só pedido. A retificação e substituição

dos formulários só é possível antes da validação pelo ROC.

O pedido é depois apreciado pela A.T.A. no prazo máximo de oito meses, findo o qual

se considera tacitamente deferido (caso os créditos sejam inferiores a 150.000€, IVA

incluído, por fatura), ou tacitamente indeferido (caso os créditos sejam superiores a

150.000€, IVA incluído, por fatura);

A documentação de suporte exigida está prevista no artigo 78º-D do CIVA. O sujeito

passivo deverá possuir:

- A identificação da fatura relativa a cada crédito de cobrança duvidosa;

- A identificação do adquirente;

- O valor da fatura e o imposto liquidado;

- A prova da realização de diligências de cobrança por parte do credor e do insucesso,

total ou parcial, de tais diligências, bem como outros elementos que evidenciem a

realização das operações em causa;

- a certificação da documentação acima por revisor oficial de contas.

Veremos adiante em que termos está prevista a intervenção do ROC na regularização

do IVA.

3. Exclusão do regime dos créditos incobráveis e de cobrança duvidosa: o art.º

78.º-A. n.º 6

Este artigo só se aplica para créditos vencidos desde 01-01-2013 (pese embora uma das

suas alíneas - a c) - se encontre também prevista no art.º 78.º, 17 CIVA).

Segundo esta norma:

6 - Não são considerados créditos incobráveis ou de cobrança duvidosa:

a) Os créditos cobertos por seguro, com exceção da importância correspondente à

percentagem de descoberto obrigatório, ou por qualquer espécie de garantia real;

b) Os créditos sobre pessoas singulares ou coletivas com as quais o sujeito passivo

esteja em situação de relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 63.º do Código

do IRC;

c) Os créditos em que, no momento da realização da operação, o adquirente ou

destinatário conste da lista de acesso público de execuções extintas com pagamento

parcial ou por não terem sido encontrados bens penhoráveis e, bem assim, sempre que

o adquirente ou destinatário tenha sido declarado falido ou insolvente em processo

judicial anterior;

d) Os créditos sobre o Estado, regiões autónomas e autarquias locais ou aqueles em

que estas entidades tenham prestado aval.

A nosso ver é de constitucionalidade duvidosa a impossibilidade de regularização do

IVA quando existam relações especiais entre as partes, prevista no art.º 78.º-A, n.º 6. A

noção de relações especiais consta do n.º 4 do art.º 63.º do CIRC e há casos em que basta

para o preenchimento do conceito a existência de uma forte dependência económica entre

as partes13

. Proibir-se que, em caso de insolvência da empresa devedora, a credora possa

regularizar o IVA é manifestamente injusto e desproporcional, podendo estar em causa a

boa-fé e o princípio da segurança jurídica. A nosso ver a lei deveria permitir a prova da

contratação em condições objetivas de mercado e o afastamento da proibição legal. Da

mesma forma também não é claro o período a que devam referir-se as relações especiais: o

do vencimento do crédito? O da regularização do IVA?

Mesmo relativamente a outras alíneas – como a da lista pública de execuções –

verifica-se que haverá casos em que será muito difícil ao credor a regularização o IVA por

não ter tido acesso em tempo útil à referida consulta (por ex.º por não ter acesso à internet

no momento da emissão da fatura ou por o tipo de negócio não permitir a paralisação das

operações de venda pelo tempo suficiente à consulta da lista). Nesses casos também poderá

ser posta em causa a constitucionalidade da proibição (por violação do princípio da boa-

fé).

Outros autores como CLARO e SALGUEIRINHO MAIA14

, criticam também a não

regularização quando crédito está coberto por seguros.

4. O PAPEL DO ROC

Como vimos supra, tanto para os créditos incobráveis (com a ressalva que faremos

adiante) como para os créditos de cobrança duvidosa, a regularização do IVA está

dependente da certificação por parte do ROC (nos termos do n.º 9 do art.º 78.º e do nº 3 do

artigo 78º-D do CIVA).

O ROC verificará, consoante o caso, a regularidade formal e substancial da

regularização.

É discutível se se justificará a intervenção do ROC, por ex.º, relativamente a créditos

reconhecidos em processo de insolvência, principalmente agora que o momento nas

13

A alínea g) do n.º 4 fala, por ex.º, na existência de relações especiais entre “entidades entre as quais, por

força das relações comerciais, financeiras, profissionais ou jurídicas entre elas, direta ou indiretamente

estabelecidas ou praticadas, se verifica situação de dependência no exercício da respetiva atividade,

nomeadamente quando ocorre entre si qualquer das seguintes situações: (…) 2) O aprovisionamento em

matérias-primas ou o acesso a canais de venda dos produtos, mercadorias ou serviços por parte de uma

dependem substancialmente da outra;” Teremos assim relações especiais quando uma entidade forneça a

outra, por ex.º, 90% das matérias-primas.

14 CLARO, S. e SALGUEIRINHO MAIA, H.: “Recuperação de IVA…, op. cit, pág.485.º

insolvências plenas sem plano de insolvência passou para o trânsito em julgado da

sentença de verificação e graduação de créditos15

.

O Oficio Circulado nº 30161/2014 de 08-07, a esse propósito, distingue a data da

verificação da incobrabilidade, nos créditos incobráveis vencidos até 31-12-2013. Segundo

a A.T.A. se a incobrabilidade se verificar antes de 01-01-2013 o ROC não deve certificar

se os requisitos legais para a regularização do IVA estão verificados. Se se verificar depois

disso é obrigatória a intervenção do ROC. A interpretação do oficio circulado é, a nosso

ver, discutível, mas a A.T.A., enquanto ele estiver em vigor, não exigirá a certificação para

créditos vencidos até essa data, por se encontrar vinculada ao regulamento interno.

Outro aspeto que o ROC deve verificar é o do prazo para o exercício do direito à

regularização. O prazo máximo para o sujeito passivo deduzir o IVA respeitante a créditos

incobráveis é de 2 anos a contar do 1º dia do ano civil seguinte ao do nascimento do direito

à dedução (nº 3 do artigo 78º-B do CIVA), não se aplicando para estes casos o prazo geral

do direito à dedução de 4 anos previsto no nº 2 do artigo 98º do CIVA.

5. PROBLEMAS QUE SUBSISTEM

O CIVA não refere a possibilidade de regularização quando o devedor é extinto por

força de uma dissolução e liquidação oficiosas, institutos previstos no RJPADLEC -

Regime Jurídico dos Procedimentos Administrativos de Dissolução e Liquidação de

Entidades Comerciais. A nosso ver, nos casos em que é o Estado que dissolve e liquida

uma entidade comercial deveria ser dada aos credores a possibilidade de regularização do

IVA a partir do registo do encerramento da liquidação. Da mesma forma, nos restantes

casos de dissolução e liquidação previstos nessa norma e no Código das Sociedades

Comerciais, deveria ser regulado no CIVA em que termos pode um credor regularizar o

IVA por si adiantado ao Estado relativo a uma entidade que perdeu a sua personalidade

jurídica.

Por outro lado, e como já referimos supra, é de constitucionalidade duvidosa a

impossibilidade de regularização do IVA quando existam relações especiais entre as partes

ou quando o devedor conste da lista pública das execuções.

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Referindo-se criticamente ao reforço da intervenção do ROC operada pela lei de 2013 estão CLARO, S. e

SALGUEIRINHO MAIA, H.: “Recuperação de IVA…, op. cit, pág. 479.

Finalmente, não se justifica a nosso ver que para os créditos de cobrança duvidosa

anteriores a 2013 se aplique o art.º 78.º, 7 (que prevê o recurso obrigatório a tribunal) e

para os vencidos após 01-01 se permita a regularização do IVA através de requerimento.

Relativamente aos documentos necessários para prova dos pressupostos legais, perdeu-

se uma oportunidade tanto em 2013 como em 2015 de clarificar eu documentos podem ser

usados pelos sujeitos passivos.

Como já afirmamos supra, não deixarão de colocar-se também problemas quanto à

aplicação do Ofício Circulado nº 30161/2014 de 08-07, na medida em que até 31-12-2014

este exigiu que a regularização só ocorresse nas insolvências plenas sem plano de

insolvência após a sentença de verificação e graduação de créditos, o que, como se

afirmou, não tinha nenhuma expressão na lei.

CONCLUSÕES

1. A regularização do IVA respeitante a créditos incobráveis e de cobrança duvidosa

tem sido objeto de constantes alterações, sendo a última a constante da Lei que

aprovou o Orçamento de Estado para 2015.

2. No regime dos créditos incobráveis, destaca-se a alteração aos processos de

insolvência de caráter pleno: nestes, o momento da regularização do IVA, quando

não seja aprovado plano de insolvência, passa a ser o do trânsito em julgado da

sentença de verificação e graduação de créditos.

3. Quanto a créditos de cobrança duvidosa, entra em vigor em 01/07/2015 o

procedimento extrajudicial de regularização de IVA, com intervenção obrigatória

de ROC.

4. As exclusões à regularização do IVA podem vir a colocar questões de

inconstitucionalidade, quando estejam em causa princípios como a boa-fé e a

segurança jurídica.

5. O regime que consta dos artigos 78 a 78.º-D do CIVA deixa por resolver alguns

problemas, como a regularização do IVA em caso de dissolução e liquidação de

sociedades.

BIBLIOGRAFIA:

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ou de cobrança duvidosa”, in Cadernos de IVA 2014, coord. Sério Vasques, Almedina,

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D´OLIVEIRA MARTINS, G.W. e FRANCO, R.: “Regularizações de IVA: Pistas para

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PESTANA DE VASCONCELOS, M: “Insolvência e IVA: A regularização do IVA

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