isabel faria martins o questionário caracterológico...

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Isabel Faria Martins * O questionário caracterológico: resultados de uma aplicação experimental Um número considerável de empresas tem vindo a adoptar, no sosso País, métodos mo- dernos de gestão do pessoal. Para fins de selecção ou orientação profissional, e depois de haverem recorrido aos testes de aptidões, começam assim a utilizar-se questionários de personalidade, entre os quais o questionário caracterológico de G. BERGER. Mas a aná- lise estatística dos resultados de uma aplica- ção experimental deste último suscita fortes dúvidas acerca do seu fundamento teórico e obriga a formular sérias objecções à legi- timidade da sua utilização pelas empresas. INTRODUÇÃO HEYMANS e WIERSMA estabeleceram as bases da caractero- logia, definindo os três traços fundamentais constitutivos do «carácter»: a emotividade, capacidade de se emocionar, isto é, o grau maior ou menor de perturbação que qualquer facto provoca na vida orgânica e psicológica; a actividade, grau de energia de que cada indivíduo dispõe para desenvolver a sua acção, para remover * O presente estudo foi efectuado no quadro dos trabalhos em curso no Serviço de Produtividade do Instituto Nacional de Investigação Industrial, a cujo Ex. mo Director se agradece a possibilidade de o publicar nesta revista. Deram a sua colaboração os Senhores Eng.° QUADROS E COSTA, na rea- lização dos cálculos e na orientação da interpretação dos resultados, Eng. GOMES CARDOSO, na tradução do questionário, e Eng. PINTO DOS SANTOS, na programação dos cálculos das correlações. Estes foram efectuados no compu- tador do Centro de Cálculo Científico da Fundação Calouste Gulbenkian. A autora agradece a colaboração deste Centro, em especial a que lhe foi prestada pelo Senhor Dr. CADETE,

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IsabelFaria

Martins *

O questionáriocaracterológico:resultados de umaaplicação experimental

Um número considerável de empresas temvindo a adoptar, no sosso País, métodos mo-dernos de gestão do pessoal. Para fins deselecção ou orientação profissional, e depoisde haverem recorrido aos testes de aptidões,começam assim a utilizar-se questionários depersonalidade, entre os quais o questionáriocaracterológico de G. BERGER. Mas a aná-lise estatística dos resultados de uma aplica-ção experimental deste último suscita fortesdúvidas acerca do seu fundamento teóricoe obriga a formular sérias objecções à legi-timidade da sua utilização pelas empresas.

INTRODUÇÃO

HEYMANS e WIERSMA estabeleceram as bases da caractero-logia, definindo os três traços fundamentais constitutivos do«carácter»: a emotividade, capacidade de se emocionar, isto é, ograu maior ou menor de perturbação que qualquer facto provoca navida orgânica e psicológica; a actividade, grau de energia de quecada indivíduo dispõe para desenvolver a sua acção, para remover

* O presente estudo foi efectuado no quadro dos trabalhos em curso noServiço de Produtividade do Instituto Nacional de Investigação Industrial,a cujo Ex.mo Director se agradece a possibilidade de o publicar nesta revista.

Deram a sua colaboração os Senhores Eng.° QUADROS E COSTA, na rea-lização dos cálculos e na orientação da interpretação dos resultados, Eng.GOMES CARDOSO, na tradução do questionário, e Eng. PINTO DOS SANTOS, naprogramação dos cálculos das correlações. Estes foram efectuados no compu-tador do Centro de Cálculo Científico da Fundação Calouste Gulbenkian.A autora agradece a colaboração deste Centro, em especial a que lhe foiprestada pelo Senhor Dr. CADETE,

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Grandes progressos na racionalidade das decisões podem ser con-seguidos mesmo no estado actual da teoria económica.

Há, no entanto, um problema fundamental de avaliação quenão parece ainda susceptível de satisfatório tratamento teórico.Trata-se de, ao nível macro-económico, definir em dada sociedadeáreas prioritárias de investigação científica e técnica, e ao nívelmicro-económico, seleccionar projectos alternativos de investiga-ção. É esta uma temática que tem os seus pontos de contacto como estabelecimento de prioridades no campo do desenvolvimentoindustrial e a avaliação de projectos industriais. Tal como nestesúltimos domínios, certas «receitas» mais ou menos empíricas po-dem ser utilizadas, na alternativa da completa irracionalidade dasescolhas; assim, certos caminhos de bom senso podem ser explora-dos no que se refere à investigação científica. Mas uma zonaobscura, sobretudo, permanece: a permeabilidade maior ou menordo contexto sócio-econónúco à inovação.

É, afinal, um grande salto para diante que o progresso dasciências exactas e naturais exige das ciências sociais, para queaquelas possam ser melhor utilizadas ao serviço do homem.

Novembro de 1966

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eventuais obstáculos; a secundaridade-primaridade, duração daressonância dos acontecimentos no indivíduo, a secundaridade re-presentando a tendência para que os elementos dum dado estadopsicológico continuem a agir após o desaparecimento da cons-ciência desse estado, a primaridade representando a tendênciainversa.

Os três traços definidos por estes autores baseiam-se emnoções que já existiam, em tipologias anteriores; relativamente aessas tipologias, a caracterologia representou um progresso —foi o primeiro estudo deste género não exclusivamente dedutivo,baseado também num inquérito. Mas o tratamento estatístico dosresultados desse inquérito limitou-se a simples comparações depercentagens — na época, os métodos estatísticos aplicados àpsicologia estavam ainda muito pouco desenvolvidos.

A caracterologia de HEYMANS e WIERSMA obteve êxito e tevemuitos continuadores, sobretudo em França. Desses continuadores,destacamos apenas os mais importantes — LE SENNE, BERGER,LE GALL, GEX, MUCCHIELLI. Não é possível discriminar, neste breveespaço, as diferentes contribuições destes autores, e as diferentesfases do desenvolvimento da caracterologia. Tentaremos por issodar apenas uma ideia dos conceitos, métodos e aplicações que de-finem a caracterologia no seu estado actual.

Em primeiro lugar, o termo «carácter» tem aqui um signifi-cado particular: conjunto de disposições congénitas e estáveis queconstitui a primeira «camada» da personalidade. Essa primeira«camada» representa como que o «esqueleto psicológico do indi-víduo», sendo, portanto, uma estrutura organizada de diversoselementos ou «traços».

Os «traços fundamentais» são os já enunciados; como se deduzdas definições sumárias apresentadas, cada traço tem um «pólo»positivo —o máximo da sua intensidade— e um «pólo» negativo— a sua ausência ou o aparecimento da tendência inversa. As com-binações possíveis destes três «traços», tomados no seu «pólo»positivo ou negativo, formam os oito «tipos» fundamentais. Alémdos «traços fundamentais», por uma necessidade de diferenciação,foram acrescentados os «complementares», também bipolares; ostraços complementares são já sete actualmente, e a sua investiga-ção mantêm-se ainda em aberto. A própria designação desses tra-ços, bem como a leitura das perguntas do questionário que se lhesreferem, poderão dar uma definição suficientemente clara dos seusconteúdos.

Sobre esta estrutura básica que a caracterologia investiga,vem actuar a história pessoal, isto é, a educação, as várias expe-riências vividas, a acção exercida pelo indivíduo sobre si mesmo,a situação ou posição social, etc. A todas essas influências, porém,cada um reagirá segundo as tendências do seu próprio «carácter»;

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por outro lado, essa sucessiva justaposição e combinação de in-fluências e tendências vai dando origem às diferentes «camadas»ou «níveis» da personalidade. O homem é assim explicado comouma organização de complexidade crescente.A vantagem da carac-terologia, segundo os seus próprios adeptos, está no próprio objectode estudo: «Ia connaissance de rhomme est d'autant plus scien-tifique... qu'elle descend plus bas dans les régions de Ia vie hu-maine par lesquelles Thumanité tend à se reduire à Tanimalité...» \

No que se refere a métodos de investigação na caracterolo-gia, são muitos os estudos dedutivos — análises de biografias dehomens célebres, sobretudo, onde se pretende detectar os indica-dores dos diferentes traços. Além disso, a caracterologia utilizaquestionários, constituídos por perguntas ou «items» — pressu-pondo-se que cada pergunta constitui um indicador, isto é, repre-senta uma característica inerente a determinado traço. Os es-tudos estatísticos dos questionários não «abundam, no entanto —e os caracterólogos continuam a adoptar, em grande maioria, assimples comparações de percentagens, agora numa época em quea análise factorial é um instrumento de investigação primordial.

Os questionários tiveram êxito como método prático de«conhecimento» das pessoas, em campos variados: relações huma-nas nas empresas, pedagogia, etc. Entre nós, o sucesso da caracte-rologia avalia-se por um curso dedicado a educadores em 1962, umcongresso em 1966, e um crescente uso dos diferentes questionários,principalmente o de Gaston BERGER. O êxito da caracterologiaestá nas suas características, avaliáveis até no breve resumo queexpusemos: simplicidade terminológica e conceptual, preocupa-ção de completar o processo analítico (os traços são analisadoscomo elementos independentes que são) por uma síntese (o ca-rácter representa relações entre traços) e é nesse logo de relaçõesque os caracterólogos centram a compreensão fundamental dasua teoria.

Por outro lado, enquadrando um pouco este êxito da carac-terologia, relembremos o sucesso dos testes de aptidões para selec-cionar pessoal. Esse sucesso foi sendo ofuscado por vários motivos,os mais importantes dos quais são: as condições variáveis do«mercado» de trabalho (em épocas ou regiões de escassez demão-de-obra, o empresário não pode permitir-se «seleccionar»; aideia de «orientação» profissional começa a substituir a de «selec-ção») ; a constatação da importância de factores até aí não con-siderados, tais como as motivações, e em geral, a consciênciacrescente de que, em cada acto, é o homem na sua totalidade queage e não a sua «inteligência» ou a sua «habilidade manual»; eainda, o facto de as «relações humanas» ou a «gestão do pessoal»

1 LE SENNE, Traité de Cwractérologie, P.U.F., Paris, 1957.

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terem atingido escalões superiores, onde as funções nao se redu-ziam a aptidões elementares, mas compreendiam a intervenção decritérios tais como «responsabilidade» ou «iniciativa». Estes trêsfactores conjugaram-se para concretizar uma ideia de «orienta-ção», de «adaptação» do homem às suas funções, considerandotodas as suas potencialidades e características. Os testes depersonalidade começaram a ser utilizados nas empresas. Em Por-tugal, nota-se também uma procura crescente de questionáriosde personalidade e caracterológicos, por parte dos que se ocupamde problemas de pessoal nas empresas — e essa procura não serelaciona muitas vezes com uma real necessidade; a preocupaçãode «seleccionar» ou de «orientar» pessoal no estado actual de or-ganização duma grande parte das nossas empresas é perfeitamentedeslocada e contraproducente. Ainda outros problemas se levan-tam aqui: neste campo da personalidade é, ainda, mais difícil«cotar» ou «apreciar» pessoas, e julgar das características adequa-das a funções; e, ainda, problemas de ordem moral e social queos testes de aptidão já levantavam surgem agravados, sobretudo,porque a ideia de «selecção» persiste ainda.

Deixando estes problemas para uma fase posterior, a utiliza-ção crescente de questionários caracterológicos permanece umfacto; questionários mal conhecidos, não estudados para a popu-lação do país, sendo ainda a teoria caracterológica matéria muitocontroversa, justamente pela falta de estudos estatísticos apro-fundados.

Nos objectivos deste estudo, de início visámos simultanea-mente um fim teórico — o estudo do questionário de BERGER e,mais geralmente, o estudo das hipóteses postas pela caracterologia— e um fim prático, dependente do primeiro — a definição daspossibilidades de utilização dum questionário caracterológico, no-meadamente pelas empresas industriais, no capítulo das relaçõeshumanas.

Estes objectivos, considerados nas suas linhas gerais, per-manecem; mas os objectivos parciais foram alterados por condi-cionantes diversos. Pensamos por isso que não é oportuno referi--los aqui, mas apenas evocá-los conforme formos descrevendo odecorrer do trabalho efectuado, e na medida em que objectivosiniciais e alterações posteriores determinaram a sua estruturaçãoe o seu âmbito.

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II

O QUESTIONÁRIO UTILIZADOE A POPULAÇÃO EXAMINADA

Foi utilizada na nossa experiência uma adaptação (que inse-rimos em Anexo) do questionário caracterológico de GastonBERGER2. Essa adaptação implicou a tradução das 90 perguntasoriginais e a inclusão de 10 novas perguntas respeitantes ao traço«sociabilidade».

1. Tradução das 90 perguntas originais

A tradução dum questionário deste tipo põe, logo de início,um problema por vezes difícil de resolver: o melhor processoconsistirá em traduzir literalmente, ou dever-se-á procurar antesuma forma correspondente cujo conteúdo seja efectivamente omesmo,, mas abandonando assim o rigor formal, visto que, por vezes,em línguas diferentes são diferentes os conteúdos de expressõesidênticas?

Poder-se-á optar por uma rigorosa tradução literal, esperandoque os resultados da experiência indiquem ou não a necessidadede futuras adaptações. Mas a validade deste método será postaem causa por novas reflexões: o questionário não pode atingirsenão as pessoas com um dado nível de formação, e ficará assimexcluída toda uma classe social; tentando realizar uma experiênciaconcludente, através dum número suficiente de aplicações do ques-tionário em dois países, neste caso em França e em Portugal, asdiferenças constatadas referir-se-iam a certas camadas de popu-lação e não seria possível comparar as diferenças entre classessociais muito distanciadas num mesmo país, com aquelas existen-tes entre populações de países diferentes. Referindo-nos apenas acertas camadas de população, a que nível situaríamos as diferen-ças encontradas? Ao nível dos símbolos linguísticos, ao nível dumcontexto cultural condicionando os comportamentos individuaise as reacções aceites pelo consciente individual, ou ainda ao nívelde reais diferenças caracterológicas entre dois povos condiciona-dos por uma situação e um passado diferentes? Estas questõesrepõem em causa a teoria caracterológica e a validade dos seusmétodos; para além disso, integram-se num vasto contexto e paraserem convenientemente examinadas — não dizemos «respondidas»— haveria que atender a todos os dados, vários, que a psicologiafornece na hora actual.

2 Vd. o texto deste questionário in Gaston BERGER, Traité Pratiqueâ/Analyse du Caractere, P.U.F., Paris, 5.a ed.f 1961, Anexo III.

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Não ê nossa intenção remontar aos aspectos teóricos dos pro-blemas; no âmbito deste trabalho, apenas nos limitamos a referiras dúvidas que nos foram surgindo nas diversas fases do nossotrabalho.

No caso presente, e em resumo, interessaria procurar umatradução estritamente literal,, optando assim por uma normaliza-ção do instrumento de medida? Ou procurar antes uma formaadaptada, pensando que a este domínio não se adequa, pelo menosainda, o rigor dum instrumento de medida? Começámos o nossotrabalho sem tentarmos responder a esta questão; se tivéssemostido a preocupação de proceder sempre de modo justificado, asprimeiras dúvidas surgiriam na escolha do teste a experimentar,ou relativamente à oportunidade de fazer estudos sobre testes,e ainda estaríamos tentando resolver esse problema que, salienta-mos agora, envolve não só os aspectos que já focámos e a quepoderemos chamar teóricos, como ainda as possibilidades e con-tingências próprias, alheias e de conjuntura.

A tradução foi feita por duas pessoas, e comparada com outratradução; foi o processo de trabalho possível na altura. Não pro-curamos justificar as alterações introduzidas (algumas talvezinjustifiçáveis), indicamo-las a seguir e sublinhamos os erros aque podem dar origem.

Emotividade:

Pergunta 51 — «Êtes-vous angoissé devant une tache nouvelleou devant un changement en perspective?

Ou abordez-vous Ia situation avec calme?».

Conforme se pode ver na tradução inserida em anexo o termo«angoissé» foi traduzido por outros menos vincados (perturbado,atrapalhado); além disso, cortou-se a frase «devant un change-ment. ..», ficando assim a pergunta com um âmbito mais limitado.

Pergunta 81 — Vous arrive-t-il parfois d'être si violemmentému que ce que vous désirez faire vous devienne complètementimpossible?...».

«Complètement», que para mais está sublinhado no originalfrancês, foi substituído por «quase».

Actividade:

Pergunta 12 — «Vous faut-il fournir un effort pénible...».

Em português: «É-lhe necessário um esforço nítido...». Foi

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retirado à pergunta o conteúdo desagradável que pode conter òtermo «pénible».

Secundaridade:

Pergunta 63 — «Avez-vous des habitudes três strictes aux-quelles vous teniez beaucoup? Êtes-vous attaché au retour régulierde certains faits?

Ou avez-vous horreur de tout ce qui est habituei et prévu(Tavance, Ia surpri&e étant pour vous un élément essentiel duplaisir?».

«Três strictes» foi traduzido por «regulares» e «avez-voushorreur» por «não gostar de»; as duas alternativas da perguntadeixaram de se situar em extremos tão distanciados, tão vincada-mente opostos. A tradução de «plaisir» por «satisfação» parece-noscorrecta, pensando que em português o termo «prazer» tem umsentido menos geral, sendo empregue sobretudo em relação a con-teúdos afectivos duma determinada intensidade. Esta reflexãopode ser, em parte, generalizável: existem em francês vários ter-mos, referentes ao aspecto afectivo (afectividade compreendidaaqui no seu sentido lato, englobando não só os «sentimentos», comoas simples sensações de «agradável» e «desagradável»), que abran-gem uma gama muito extensa de significados, sendo por isso em-pregues correntemente (aimer, beau, etc), enquanto que os termoscorrespondentes em português se especificaram mais, definindoum conteúdo muito mate restrito; foi esta ideia que motivou algunsdos «abrandamentos» de termos já citados: angoissé, pénible,horreur. No entanto, estamos no nível das impressões pessoais;não sabemos se estes termos podem ser legitimamente abrangidospêlo raciocínio feito. Seria útil conhecer as informações de quea este respeito dispõe a filologia; e repetimos a ideia atrás ex-pressa, pensando que perante um exemplo concreto ela se tornamais clara: se se concluiisse que o francês utiliza termos mais«fortes» relativamente ao português, que tipo de fenómeno estariaaí reflectido? Um fenómeno de ordem linguística, pensando que autilização de certos termos é tão dificilmente relacionável comcausas psicológicas como a evolução dos vocábulos partindo dumalíngua original comum para línguas diferentes? Ou um fenómenode ordem caracterológica, admitindo que a utilização de certostermos reflecte uma dada maneira de reagir, definível por estru-turas caracterológicas? Ou ainda um fenómeno que poderemoschamar psicossociológico, considerando a utilização de certos ter-mos como reflexo duma escala de valores socialmente aceite e dumconjunto de relações, entre indivíduos e entre indivíduos e objectos,defiínido por um contexto cultural?

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Pergunta 73 —«Aimez-Vòus Pordre, Ia symétrie, Ia regu-larité?

Ou bien Tordre vous semble-t-il ennuyeux...».

Na tradução da segunda alínea substituiu-se «ordre» por «re-gularidade, método»; a pergunta pode ter adquirido um sentidodiferente.

Largura do Campo de Consciência:

Pergunta 4 — «Êtes-vous pris tout entier par ce que vousfaites...».

Em português: «é absorvido pelo seu trabalho...» Restrin-giu-se o sentido da pergunta focando-se apenas a situação «traba-lho» em relação à qual se pode assumir uma atitude particular, oupensar que se deve assumir essa atitude (abordamos aqui um outroproblema, que se encontrara já implícito nas observações ante-riores e que oportunamente retomaremos: embora seja explicadoque são de excluir quaisquer juízos de valor, e esperando que osujeito queira assumir nas suas respostas essa isenção, conse-gui-lo-á apenas ao nível das suas reacções conscientes).

Pergunta 14 — «Attachez-vous une grande importance à Iaprécision? Aimez-vous les idées nettes, les missions bien définies?

Ou vous plaisez-vous à ce qui est vague, indetermine, à cequi vaut par les «nuances»?»

A segunda alínea, em português («ou agrada-lhe o que é vago,indeterminado, aquilo que se traduz por «nuances») transmiteapenas uma ideia aproximada, em parte porque não se conseguiuuma forma mais literal e aceitável. A expressão «que se traduzpor nuances» omitiu a ideia de que essas «nuances» poderiam,por si, constituir um valor.

Pergunta 24 — «Repoussez-vous vivement et instinctivementtout ce qui vient vous déranger dans Poccupation à laquelle vousvous consacrez?...».

Como se pode ver na tradução, a pergunta também foi restrin-gida ao aspecto trabalho.

Pergunta 54 — «Êtes-vous méticuleux (dans votre travail,dans vos vêtements, dans Ha détermination d'un fait qui vousinteresse, etc.) ?

Ou êtes-vous négligent, peu soigneux?»

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Õ termo «négliigent» foi substituído pôr «desprendido»; oaspecto negativo que se poderia ligar a «negligente» (em francêstambém a palavra terá esse conteúdo negativo?) desapareceu.

Pergunta 94 — Êtes-vous sujet aux redites, aux gestes plu-sieurs fois répétés, aux idées fixées en manies?...»

«Ideias fixadas em manias» seria uma expressão pouco usualem português; por outro lado o termo «mania» em português temum sentido um tanto pejorativo. Não sabemos até que ponto sealterou a pergunta.

Polaridade:

Pergunta 25 — «Êtes-vous três aimable, três prévenant, cher-chez-vous à charmer, à séduire ceux qui vous approchent?...»

Em português «procura agradar àqueles com quem con-tacta?...»; considerou-se que «encantar» e mesmo «seduzir» seriamtermos um tanto estranhos. No entanto «agradar» tem um con-teúdo mais atenuado e portanto mails generalizável.

Pergunta 75 — «Aimez-vous le risque? Trouvez-vous un plaisirparticulier à affronter un danger?

Ou redoutez-vous les aventures incertaines...».

«Aventuras» foi substituído por «empreendimentos»; o sen-tido da pergunta pode ter sido alargado e englobar agora aspectosdependentes doutros factores.

Avidez:

Pergunta 16 — «Prêtez-vous volontiers vos livres, vos outils,vos instruments ?...».

Em português: «os seus livros, os seus utensílios, os seus ins-trumentos de trabalho». A palavra «trabalho», que se pretendialigar apenas a «instrumentos» pode influenciar toda a pergunta,que transmitirá assim, não uma atitude «ávida» em geral, masuma atitude «cuidadosa dum profissional zeloso».

Pergunta 56 — «Êtes-vous interesse par vos performances?(Succés obtenus dans le sport, dans les affaires, à Ia chasse, dansle monde, etc). En suivez-vous de près Taméltoration, soit parrapport à votre activité passée, soit par rapport aux autres?

Ou ce souci vous est-il étranger?».

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Foram necessárias várias adaptações nesta pergunta, que in-cluia expressões intraduzíveis.

Interesses sensoriais:

Pergunta 7 — «Êtes-vous três attentif à Ia qualité de vos sen-sations ?

Êtes-vous vivement interesse par les formes, les couleurs,les sons pris en eux-mêmes?...»

Foi omitida a expressão «pris en eux mêmes».

Pergunta 17 — «Attachez-vous beaucoup d'importance à ceque vous mangez?...»

Em português especificou-se mais a pergunta: «Dá muita im-portância ao aspecto, ao sabor, daquilo que come?...».

Pergunta 37 — «Trouvez-vous beaucoup d'intérêt aux sensa-tions tactiles?

Le contact de Ia soie, de Ia fourrure...».

Na tradução não figura a primeira parte da pergunta.

Pergunta 87 — «Êtes-vous três sensible au cadre dans lequelse déroule votre existence (tapisserie, ameublement, déco-ration...) ? Par exemple, vous serait-il insupportable de vivre dansune chambre que vous jugeriez laide?...».

«Insupportable» foi traduzido por «difícil»; a pergunta ficoumais ambígua.

Ternura:

Pergunta 8 — «Vous attendrissez-vous facilement sur le sortdes autres?

Foi acrescentado o termo «comover».

Pergunta 68 — «Préférez-vous être aimé qu'obéi?Ou y a-t-il, pour vous, des choses bien plus importantes que

Famour et dont Ia réalisatión exige qu^on mette Famour ausecond plan?».

Na segunda alínea da tradução incluiu-se também o termo«amizade», o que foi motivado pelo sentido vasto do verbo

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«aimer», empregue iia primeira alínea (em português traduzidopor «gostar de»); no entanto, não sabemos se a pergunta se re-feria efectivamente ao sentido lato do termo «amour».

Inteligência Abstracta:

Pergunta 59 — «La vie sociale vous paraít-elle quelque chosede três important?

Pensez-vous que chacun ait le devoir de s'y engager?Ou avez-vous de Ia méfiance pour le social et tendez-vous à

vous en «dégager»...?».

«Social», que é francamente um termo equívoco, foi assimi-lado a «sociedade». Escolhemos um dos sentidos possíveis dapergunta, mas não sabemos se acertámos com a ideia do autor.

2. Inclusão de dez perguntas respeitantes ao trago «Sociabilidade»

Num estudo efectuado por F. GAUCHET e R. LAMBERT*,as correlações encontradas entre os items referentes ao traço «Po-laridade» indicam a existência de dois factores, um factor «Marte»«saturando sobretudo os items 15 (gosto pelo comando), 5 (com-batividade), 75 (gosto pelo risco), 65 (aptidão para se impor),95 (necessidade de independência)»; e um factor «Vénus» satu-rando os items 25 (amabilidade, necessidade de seduzir), 55 (ne-cessidade de afeição), 35 (maleabilidade no comportamento social),85 (necessidade de ser lamentado, consolado), 45 (repugnânciaem praticar desportos violentos)», este segundo factor tomadono seu polo negativo. Acrescentam ainda estes autores: «todosos indivíduos não seriam portanto «Marte» ou «Vénus», algunssendo uma coisa e outra, procurando alternadamente, ou mesmosimultaneamente, constranger e seduzir, impondo-se segundo ascircunstâncias pela força ou pela insinuação. Outros não seriamnem «Marte», nem «Vénus». Indiferentes aos que os rodeiam,não teriam a ambição de fazer prevalecer a sua opinião, mastambém não procurariam nem agradar nem seduzir». E ainda, emnota: «... O tipo oposto ao «Marte» não seria o tipo «Vénus», maso «não-Marte»; o tipo oposto ao «Vénus» não seria o «Marte», maso «não-Vénus».

Baseando-se neste estudo, Roger MUCCHIELLI, no seu livroLa Caractérologie à VÂge Sdentifique4, introduz um novo traço

3 La Caractérologie d'Heymans et Wiersma, étude statistique sur lequestionnaire de Gastou Berger, P.U.F., Paris, 1959.

4 Éditions du Griffon, Neuchatel, Suisse, 1961.

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denominado «Sociabilidade», do qual os dois pólos seriam «Júpi-ter», pólo positivo, e «Saturno», pólo negativo. Vejamos o que,sobre este traço, diz MUCCHIELLI: «O estudo estatístico empreen-dido por GAUCHET e LAMBERT... levou a uma decomposição da Pola-ridade. Este factor aparece como não simples, dizem os autores,no fim da análise matemática dos resultados do inquérito. Tudose passa como se a polaridade M e a polaridade V não fossem domesmo «grupo». O factor M opôr-se-ia não ao factor V mas aum factor «não-M», o factor V opôr-se-ia a um factor «não-V».Este novo grupo V-nV corresponderá para nós aos factores J-Sa,e conservámos a oposição M-V para o grupo M-nM». Salientamosque MUCCHIELLI denomina «factores» o que os outros autoresgeralmente denominam «pólos» dum mesmo factor; além disso oseu traço «Sociabilidade» provém ainda duma «depuração» da«Avidez», e liga-se ao factor L de CATTELL e ao factor Extraver-são-Introversão de outros «inventários de personalidade». No quese refere ao traço «Polaridade» MUCCHIÍSLLI liga-o ao factor «Domi-nação-Submiissão» de CATTELL, retomado este, por sua vez, dofactor «Ascendência-Submissão» de ALLPORT, e também aos «fa-mosos factores «Masculinidade-Feminilidade» de outros numerosos«inventários». Mais adiante: «O factor M... é expresso pela crí-tica, o desacordo, a combatividade; o factor V... é expresso pelaconciliação, a obediência ou o acordo, a sedução e a insinuação».

Não sobrecarregamos este texto com mais citações; procurá-mos apenas transcrever o suficiente para basear a conclusão aque chegámos, conclusão que poderá ser confirmada pela leiturados princípios através dos quais MUCCHIELLI define, em detalhe,os factores «M-V» e «J-Sa»: embora reportando-se ao estudo deGAUCHET e LAMBERT, OS dois traços definidos por MUCCHIELLI nadatêm a ver com os dois factores encontrados por aqueles autores;o factor M-V mantêm-se idêntico ao que fora anteriormente defi-nido, tendo sido apenas sublinhado o facto de se referir a reacçõesdum sujeito, relativas a uma indivíduo ou a um obstáculo, e ofactor J-Sa aparece como um complemento do primeiro, referin-do-se ao comportamento do sujeito perante um grupo e na sua«vida de grupo» em geral. O importante aspecto, sublinhado porGAUCHET e LAMBERT, de que, em qualquer situação haveria umaatitude «fechada», definida pelo desinteresse, e uma atitude«aberta», definida, quer por combatividade, quer por conciliação,é abandonado.

Em face disto, resolvemos introduzir dez perguntas relativasa este novo traço «Júpiter-Saturno», mantendo inalteradas as per-guntas do traço «Polaridade».

597

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3. Alterações no modo de aplicação dt> questionário

Enumeramos a seguir as demais alterações introduzidas, emprimeiro lugar aquelas que modificaram sensivelmente as condi-ções de aplicação do questionário:

— o questionário foi aplicado colectivamente a grupos de di-mensões variáveis;

— conforme se pode ver no exemplar inserido em anexo, asperguntas seguem-se por ordem numérica, modificação impor-tante, porque ao contrário do que acontece no questionário francêsonde as perguntas estão agrupadas por traços, os examinados des-conheciam o traço a que se ligava cada item;

— as alíneas de cada pergunta foram referenciadas por umaletra,o que possibilita a utilização duma folha de respostas e,consequentemente, a utilização duma grade de correcção;

— foram dadas intruções orais (e não escritas, como é habi-tual) relativas à atitude a adoptar pelos examinados: sinceridade,isenção de qualquer critério valorativo, visto não existirem «boas»ou «más» respostas;

— as instruções relativas ao modo de preenchimento da folhade respostas, apensas ao questionário, foram lidas em voz alta,tendo sido fornecidas as explicações pedidas;

— para o traço denominado por BERGER «Passion Intelec-tuelle», utilizámos a designação, mais generalizada, «InteligênciaAbstracta-Inteligência Concreta»;

— na notação das respostas, utilizaram-se as cotações 0, 5 e 10,e não 1,5 e 9.

A maneira como iniciámos a nossa experiência liga-se estrei-tamente a alguns dos objectivos parciais, e a considerações de quepartimos, e por esse motivo cabe agora referi-los mais detalha-damente.

Em primeiro lugar, seria uma vantagem inegável a homoge-neização da nomenclatura caracterológica, e ainda dos símbolosde notação dos questionários caracterológicos; propusemo-nosinicialmente aplicar também o questionário de Maurice GEX, parao qual se utiliza a notação 0, 5 e 10, e deparámos com a dificuldadede comparar os resultados dos dois testes; adoptámos esta nota-ção, que é bastante mais fácil para a realização de cálculos.

No que respeita a condições de aplicação definidas por instru-ções mais ou menos detalhadas aos examinados, também variamos questionários. No questionário de Maurice GEX, as perguntassão inseridas numericamente ordenadas e os indivíduos testadosnão têm conhecimento do traço caracterológico a que se ligam ositems. Antes de optar pelas vantagens deste sistema ou doutro,

598

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seria interessante analisar o problema através dum estudo compa-rativo dos dois questionários em questão, por exemplo. Os limi-tados meios de que dispusemos impediram-nos esta experiência;esses mesmos meios limitados fizeram-nos optar pela aplicaçãocolectiva e pela redução das instruções iniciais — condições queconstituem também uma vantagem relativamente a futuras possi-bilidades de utilização do questionário. Mas, para além disso, umcerto número de considerações podem ser postas anteriormente àrealização duma experiência, e salientando justamente as dificul-dades de que essa experiência venha a ser concludente.

As reservas apontadas quanto à possibilidade de adopçãoduma atitude isenta, por parte da pessoa testada em relação àsperguntas, poderão ser ainda agravadas quando essas perguntasse ligam a traços de carácter que, comumente, são objecto dejuízos de valor. O esclarecimento que se pretende fornecer nãointroduzirá novos «erros» na atitude da pessoa? Conseguir-se-áuma abolição de juízos de valor, uma «libertação» de preconceitoscomuns? Ou apenas a substituição de uns juízos por outros? Valea pena salientar a dificuldade dos caracterólogos em conseguirdescrições igualmente positivas dum «apaixonado» ou dum «apá-tico», embora repitam, com ligeiras variações de pontos de vista,que todos os tipos caracterológicos se equivalem em princípio,surgindo o problema dos valores apenas quanto à maneira comoo indivíduo «efectiva» o seu «tipo»; a afirmação de que não hátipos «melhores» ou «piores» é negada por potencialidades, real-mente «melhores» e mais numerosas, atribuídas a certos «tipos»,e os items do questionário, embora visem «potencialidades», inter-rogam o indivíduo sobre as suas «efectivações», sobre atitudes oucomportamentos. S de considerar a permanência do hábito devalorizar certas atitudes e comportamentos em relação a outros»hábito arreigado, e a tendência, mesmo inconsciente, para melho-rar a própria imagem; um sujeito «esclarecido» quanto ao signi-ficado das perguntas talvez «rectifique» a sua posição em rela-ção às perguntas, mas talvez procure então responder de maneiraa tornar-se «possuidor» do traço abrangido pela pergunta.

Um outro aspecto que nos parece de considerar é o condicio-namento introduzido num estudo que se limita a verificar a viabi-lidade duma hipótese prevista, sem verificação de outras hipó-teses igualmente possíveis. Pressupor como certo que determi-nados items se ligam a determinados traços, teoricamente defi-nidos, informar as pessoas testadas dessa ligação pressupostaentre items e traços, e limitarmo-nos em seguida a calcular assaturações de cada grupo de items no factor pressuposto, é, anosso ver, um método de estudo viciado, em que as afirmações,antecedendo a verificação de hipóteses, vão condicionar o compor-

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tamento dos sujeitos examinados e provocar o aparecimento decorrelações fictícias.

A modificação das instruções iniciais integra-se na orienta-ção que pretendemos seguir. Propusemo-nos inicialmente dar aeste trabalho uma dimensão mais vasta e poder assim efectuaruma análise factorial do conjunto da matriz de intercorrelações.Não pudemos prosseguir neste objectivo; os cálculos que efectuá-mos são limitados. O trabalho resultou defeituoso: é uma pequenacontribuição para o estudo dum problema, porque não alcançamosconclusões; por outro lado, as condições especiais da experiênciaefectuada dificultam a comparação com outros estudos, especial-mente com o de GAUCHET e LAMBERT, já referido, o único estudoestatístico sobre o questionário de BERGER, que conhecemos.

4. A população examinada

A população examinada consta de 158 estudantes, universi-tários ou recém-formados.

No quadro a seguir descrimina-se a composição dessa popu-lação quanto aos aspectos: formação, sexo, idade.

Letras

Direito

Económicas e Financei-ras

Engenharia

Biologia, Farmácia eArquitectura

Total

MULHERES

Número

19

17

20

1

2

59

Idades

20-36

18-26

19-25

34

26-32

18-36

HOMENS

Número

6

42

33

16

2

99

Idades

21-30

19-37

19-33

22-34

27-34

19-37

Total

25

59

53

17

4

158

A completa ausência de estruturação da amostra examinadaé devida a dois factores:

— dificuldades de colaboração e de contacto com as organi-zações escolares;

— boa-vontade e possibilidades variáveis, por parte dos alu-nos, em se prestarem à aplicação do teste.

600

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II

ESTUDO DIFERENCIAL

1. Critérios atendidos; símbolos utilizados

Pensou-se que os critérios sexo, formação, idade e «situaçãode resposta» ao questionário deveriam ser considerados comocritérios prováveis de diferenciação. Não foi, no entanto, possívelsubdividir a população segundo todos estes critérios; a «situaçãode resposta» difere apenas para 20 indivíduos — finalistas ourecém-formados que se candidataram a uma bolsa de estudos eque foram submetidos a um conjunto de provas, tendo portantorespondido a este teste numa situação semelhante a dum exame—16 homens, dos quais 12 formados pelo I. S. T. e 4 formadospelo I. S. C. É. F., e 4 mulheres, das quais uma do I. S. T. e 3 doI. S. C. E. F.; levando em conta as idades que vão, como se podever no quadro da população examinada, dos 18 aos 37 anos, comuma concentração entre os 22 e os 27, muitos dos grupos resulta-riam demasiado pequenos.

Atendemos, por isso, apenas aos critérios formação e sexo;poder-se-ia ainda, depois de concluir sobre a significação dasdiferenças encontradas, ter reagrupado a população segundo ocritério «idade», e depois segundo a «situação de resposta» e ir com-parando a importância das sucessivas diferenças, mas não pros-seguimos nestes cálculos que alongariam o trabalho para alémdos limites possíveis. Para cada grupo considerado, apresenta-mos nos quadros I a IX a distribuição das «notas» nos diferen-tes traços, as médias e os desvios padrões.

Os símbolos que se utilizam e o respectivo significado são osseguintes:

E —Emotividade, também designada a seguir por critério 1A — Actividade, também designada a seguir por critério 2S/P —Secundaridade/Primaridade, designada por critério 3L — Largura do Campo de Consciência, designada por critério 4M/V — Polaridade Marte/Vénus, designada por critério 5Av —Avidez, designada por critério 6IS —Interesses Sensoriais, critério 7T —Ternura, critério 8Ia/Ic—Inteligência Abstracta/Inteligência Concreta, critério 9J/Sa—Sociabilidade, critério 10M — média<r —desvio padrão

601

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QUADRO I

Distribuição das notas para cada um dos 10 critériosdo questionário

Letras-Mulheres (F = 19)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

65

70

75

80

85

90

95

100

M

E

2

2

2

1

1

2

3

1

1

4

70

20,13

A

1

4

2

1

2

4

1

1

1

1

1

51,32

19,31

S/P

1

2

3

4

2

1

3

2

1

56,05

15,95

L

1

1

2

1

1

6

2

1

2

1

1

51,32

18,97

M/V

3

3

1

1

3

2

1

1

2

1

1

46,84

22,73

Av

1

1

1

5

1

3

2

2

2

1

50,53

16,36

IS

1

1

2

1

2

1

2

2

2

1

2

2

52,63

22,44

T

1

1

1

2

1

1

4

1

2

2

2

1

68,95

17,58

Ia/Tc

1

1

2

T-l

1

7

3

1

1

1

58,68

20,97

J /Sa

1

2

1

1

1

1

1

1

1

2

4

1

2

54,63

25,36

ffl*

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QUADRO II

Distribuição das notas para cada um dos 10 critériosdo questionário

Letras-Homens (F = 6)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

65

70

75

80

85

90

95

100

M

(7

E

1

1

1

2

1

70

17,32

A

1

2

1

1

1

36,67

20,13

>S/P

1

2

1

1

1

54,17

13,96

L

2

1

1

1

1

42,50

10,70

M/V

1

1

1

1

1

1

1

35

11,90

Av

1

2

1

1

1

47,50

21,75

IS

1

1

1

1

1

1

59,17

26,98

T

1

1

1

2

1

55,83

11,35

Ia/Ic

2

3

1

72,50

10,31

J/Sa

1

1

1

1

1

1

47,50

14,93

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QUADRO III

Distribuição das notas para cada um dos 10 critériosdo questionário

Direito-Mulheres (F = 17)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

65

70

75

80

85

90

95

100

M

<7

E

1

2

2

2

1

2

2

2

1

1

1

60,59

23,44

A

2

1

1

1

3

1

2

2

1

2

1

60,59

18,38

iS/P

2

1

4

1

2

1

2

1

1

2

50,59

21,95

L

1

1

1

4

2

1

2

3

2

49,12

18,72

M/V

3

3

2

1

2

2

2

1

1

53,53

16,52

Av

1

1

4

1

2

1

3

2

1

1

49,41

15,43

IS

1

1

2

1

3

2

1

3

1

2

56,76

16,01

T

1

3

1

2

2

2

2

1

1

2

67,94

18,08

Ia/Ic

1

1

1

1

3

4

2

3

1

57,65

17,15

J /Sa

2

1

1

3

1

4

2

1

1

1

49,41

18,39

604

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QUADRO IV

Distribuição das notas para cada um dos 10 critériosdo questionário

Direito-Homens (F — 42)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

65

70

75

80

85

90

95

100

M

cr

E

1

2

2

2

4

1

3

2

2

3

2

3

1

3

4

2

2

1

2

55,83

25,24

A

1

2

3

2

1

2

1

4

5

5

1

4

1

7

1

1

1

55,60

22,78

S/P

1

1

3

4

4

2

1

1

8

2

3

5

4

3

57,14

20,07

L

2

1

2

2

2

4

3

5

7

1

5

1

3

2

2

46,67

18,34

M/V

3

1

3

3

7

4

5

3

3

1

3

1

3

1

1

50

18,28

Av

1

1

1

2

2

1

4

4

8

8

2

4

2

2

61,19

18,95

IS

1

4

3

2

3

6

4

4

1

5

1

1

4

1

1

1

46,90

23,64

T

1

1

3

1

3

6

5

3

2

1

6

3

4

2

1

57,02

18,69

Ia/Ic

1

1

3

2

2

1

5

6

2

4

2

2

2

1

4

4

54,17

23,47

J/Sa

4

3

4

7

9

3

3

4

2

2

2

2

2

1

56,07

18,63

605

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QUADRO V

Distribuição das notas para cada um dos 10 critériosdo questionário

Económicas-Mulheres (F = 20)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

65

70

75

80

85

90

95

100

M

<J

E

1

2

1

2

3

1

3

2

2

1

1

1

67,75

20,83

A

1

1

3

3

2

2

4

3

1

59,25

16,75

S/P

1

1

1

1

2

1

2

5

1

1

1

1

2

61,25

20,43

L

1

3

2

5

1

3

2

1

1

1

42,50

18,87

M/V

1

1

3

2

2

3

1

2

1

1

1

2

48,50

19,11

Av

1

1

1

1

2

1

1

2

1

3

3

1

1

1

60,25

23,21

IS

1

1

2

3

2

3

1

3

1

1

2

64,75

20,09

T

2

2

1

1

1

3

1

3

1

2

2

1

63,50

18,58

Ia/Ic

l

1

2

1

2

5

1

2

1

3

1

36,75

20,75

J/Sa

1

1

1

3

2

3

5

2

1

1

56

15,22

606

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VI

Distribuição das notas para cada um dos 10 critériosdo questionário

Económicas-Homens (F = 33)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

65

70

75

80

85

90

95

100

M

cr

E

1

2

7

1

3

3

2

1

6

1

2

2

1

1

42,27

21,51

A

1

2

1

1

3

3

2

3

7

1

3

3

3

64,55

17,49

.S/P

1

1

1

1

1

2

4

3

4

6

1

4

2

2

64,24

17,29

L

3

1

1

5

3

7

1

5

1

1

3

2

42,42

18,40

M/V

1

2

2

3

2

5

2

4

2

4

1

2

2

1

52,58

20,11

Av

2

2

6

5

3

1

7

1

2

1

2

1

62,12

16,47

IS

1

1

2

2

1

3

2

1

3

4

3

3

1

3

2

1

45,61

21,86

T

1

1

2

2

2

1

4

2

3

1

3

3

4

1

3

54,09

21,90

Ia/Ic

1

1

1

2

4

8

2

3

3

2

1

1

1

1

1

1

47,58

17,70

J/Sa

1

1

2

1

5

1

5

3

3

4

4

2

1

58,03

15,37

607

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QUADRO Vil

Distribuição das notas para cada um dos 10 critériosdo questionário

Engenharia-Homens (P = 16)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

65

70

75

80

85

90

95

100

M

E

1

2

2

1

2

1

1

1

2

1

2

45?31

23,82

A

1

2

1

1

2

2

1

1

2

1

2

71,56

23,24

S/P

1

1

3

5

1

2

2

1

62,19

13,79

h

1

1

1

4

1

3

1

1

2

1

39,38

15,18

M/V

1

1

1

4

1

1

3

1

1

2

54,06

21,53

Av

1

1

2

1

1

1

3

2

1

2

64,06

22,52

IS

1

2

2

2

3

1

2

2

1

51,88

19,26

T

4

1

2

1

2

1

2

3

65,94

19,45

Ia/Ic

1

1

1

2

2

2

1

2

1

1

1

1

50,62

17,41

J/Sa

1

2

1

1

1

2

2

1

1

1

2

1

50

20,31

608

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VIÍ1

Distribuição das notas para cada um dos 10 critériosdo questionário

Total-Mulheres (P = 59)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

65

70

75

80

85

90

95

100

M

cr

E

1

1

4

2

3

3

2

3

3

5

5

5

7

4

4

5

2

66,36

21,71

A

1

1

1

6

4

4

2

6

2

8

5

7

2

6

3

1

56,10

18,87

S/P

2

1

3

1

6

5

6

5

5

8

5

4

2

2

1

3

56,95

19,79

L

r-l

1

5

1

5

1

10

5

11

6

2

6

4

1

47,71

18,83

M/V

1

4

1

10

3

7

8

4

5

4

5

2

3

1

1

48,14

20,57

Av

1

1

1

2

3

5

8

3

6

2

8

3

7

4

2

2

1

52,80

19,89

IS

1

1

4

1

3

5

3

7

4

4

6

5

1

7

3

1

3

58,14

21,10

T

1

4

2

2

5

4

7

4

9

2

7

3

5

1

3

66,61

18,10

Ia/Ic

1

1

3

1

3

3

6

3

1

3

5

14

1

5

4

1

1

2

1

51,02

22,91

J/Sa

1

2

1

4

2

3

8

2

5

3

7

8

2

6

2

2

1

52,71

19,84

609

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QUADRO IX

Distribuição das notas para cada um dos 10 critériosdo questionário

Total-Homens (F = 99)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

60

65

70

75

80

85

90

95

100

M

Q

E

1

2

4

11

6

5

4

8

6

4

11

4

5

5

5

6

4

4

1

3

50,51

24,86

A

1

1

3

3

3

4

3

5

2

7

10

7

5

14

4

11

5

7

2

2

60,15

22,79

S/P

1

2

1

5

6

5

4

8

6

16

7

10

9

10

1

6

2

60,10

18,72

L

5

2

4

4

14

8

14

7

15

2

9

2

7

2

4

43,69

17,58

M/V

1

2

6

2

6

7

11

14

9

8

8

1

7

4 -

6

3

4

50,76

19,60

Av

2

1

2

4

4

5

4

11

9

13

2

18

5

7

1

7

4

60,66

19,45

IS

2

1

4

2

7

2

7

7

10

8

12

4

9

3

6

8

2

3

1

1

47,78

22,82

T

1

1

1

4

5

3

9

12

8

6

7

6

9

9

6

4

7

1

57,42

20,35

Ia/Ic

1

1

2

4

3

5

6

15

4

11

6

10

4

5

8

3

5

6

52,93

20,94

J/Sa

1

5

6

7

6

15

7

9

8

8

8

6

6

4

2

1

54,95

18,07

610

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Por comodidade abreviou-se a designação dos grupos:

«Letras-Mulheres»—agrupo das alunas da Faculdade de Letras«Letras-Homens» —grupo dos alunos da Faculdade de Letras,

etc.

2. Composição das distribuições pelo calculo de X2

Conforme já referimos, cada pergunta admite três possibili-dades de resposta, cifradas em 0, 5 ou 10. A «nota» referente acada traço ou critério é obtida pela soma das «notas» das res-postas. Relativamente às respostas, a posição intermédia, segundoas instruções do teste, deve ser escolhida apenas nos poucos casosem que o examinado se encontra na impossibilidade de escolherentre as outras duas (é expressa a recomendação de evitar a res-posta intermédia). No que respeita aos traços, a teoria caracte-rológica pressupõe que os indivíduos se repartem, por exemplo,em «não-emotivos» (quando a pontuação referente a este traçonão atinge os 50) e «emotivos» (quando a pontuação ultrapassaos 50). Teoricamente as pontuações iguais a 50 ou próximas destevalor proviriam dos poucos indivíduos com posição ambivalente,não inteiramente definida, possuindo características de «emoti-vos» e de «não-emotivos»; o mesmo acontecendo em relação aosoutros traços. Aceitando estas hipóteses — de que as respostas eas «notas» médias seriam as menos frequentes — as curvas de dis-tribuição seriam bimodais e não seria correcto tratá-las comocurvas normais. Por outro lado, no já mencionado estudo deGAUCHET e LAMBERT, são estudadas detalhadamente as distribui-ções das «notas» das respostas; as respostas cotadas em 5 são,com efeito, as menos frequentes. As «notas» referentes aos traçosconcentram-se, no entanto, à volta dos valores médios; os autorestratam portanto as curvas como normais, mas não se referem àcontradição existente com a hipótese teórica. Com efeito, se sepodem ainda classificar 03 indivíduos em «emotivos» e «não-emo-tivos» relativamente a um nível médio de emotividade, já não setrata de dois grupos distintos, conforme fora pressuposto, massim duma distribuição contínua em que a maioria dos indivíduosse coloca justamente na posição não inteiramente definida, comcaracterísticas de «emotivos» e de «não-emotivos» 5.

5 Os diferentes tratados de caracterologia não apontam os valores pró-ximos de 50 (ou equivalentes, conforme as escalas utilizadas) como os menosfrequentes. No entanto as descrições de «emotivos», de «ternos», ou dos oitotipos fundamentais formados pelas combinações da Emotividade, da Activi-dade e da Secundaridade — e o núcleo mais importante da caracterologiaé constituído pelos estudos descritivos — assentam, de modo implícito, nestahipótese. É verdade que muitos autores falam de tipos mistos ou intermédios,e alguns apresentam mesmo os tipos puros como modelos de referência. Masaceitando totalmente o facto de que os valores próximos de 50 são os mais

611

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No nôââo estudo considerou-ãe óômô verdadeira a hipótese danormalidade das distribuições. Partindo daqui, aplicámos o testedo x2 às distribuições dos diferentes grupos para verificar se essesgrupos poderiam ser confundidos, isto é, se as distribuições nãoapresentam diferenças significativas (quadros X, XI e XII).

Consideraram-se os valores de P=0,05 e P=0,95 como limitesde aceitação (P indica a probabilidade de surgir um valor x2 supe-rior ao encontrado). Os valores de P iguais ou inferiores a 0,05mostram que, havendo uma probabilidade de 5% ou inferior desurgir um valor de x2 superior ao achado, nos aproximamos dosextremos da distribuição do x2 e aumenta o risco de se falhar nahipótese de que as distribuições sejam confundíveis; os valoresde P que atingem 0,95 representam uma coincidência das distri-buições quase total, o que também é excessivo.

No que respeita ao grupo de mulheres, os valores de P forados limites de aceitação (sublinhados no quadro) são todos dema-

QUADHO X

Comparação das distribuições pelo cálculo doMulheres

Critério 1> 2» 3> 4» 5» 6» 7» 8» 9» 10

Letras/Direito

Y2

19,823

10,719

13,268

13,840

11,929

12,596

12,596

10,055

10,272

17,740

P

0,30-0,50

0,95-0,980,80-0,90

0,80-0,90

0,90J),9ô

0,80-0,90

0,80-0,90

0,90J0,95

0,9ÕJ0,98

0,50-0,70

Letras/Económicas

Y2

15,321

20,127

14,983

10,983

5,979

14,516

12,380

9,791

23,253

15,409

P

0,70-0,80

0,30-0,50

0,70-0,80

0,90J),9õ

0,900,80-0,90

0,90J),95

0,9ÔJ0,98

0,20-0,30

0,70-0,80

Económicas/Direito

Y2

12,36910,02618,8736,4459,690

13,23312,7098,144

21,03814,052

P

0,90-0,950,95-0,980,50-0,70

0,990,98J0,99

0,80-0,900,80-0,90

0,990,30-0,500,80-0,90

frequentes, as perspectivas da caracteroiogia seriam invertidas: esta passariaa ser o estudo de tipos anormais — não no sentido de patológico, mas de «forado normab— em relação aos quais o «indivíduo médio» seria referenciadopor aproximação; ora por princípio e de modo bem expresso, as descriçõescaracterológicas pretendem definir indivíduos médios, comuns, e os oito tiposcaracterológicos são tomados como categorias classificativas universais. A con-tradição que apontámos torna-se evidente quando se passa do plano teóricopara uma análise estatística, mas existe já na ambiguidade das posiçõestomadas ao nível teórico.

612

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QUADRO XI

Comparação das distribuições pelo cálculo do

Homens

Critérios

123

456789

10

Letras/Direito

13,71828,49617,1058,763

13,64018,88416,84811,75817,52513,333

P

0,80-0,900,05-0,100,50-0,700,98-0,990,80-0,900,50-0,700,50-̂ 0,700,90-0,950,50-0,700,80-0,90

Letras/Económicas

x2

23,44721,15610,0017,238

16,36222,94216,5059,566

21,5357,863

•p

0,20-0,300,30-0,500,95-0,98

0,990,5(M),700,20-0,300,50-0,700,95-0,980,30-0,50

0,99

Letras/Engenharia

x2

13,46316,24912,7765,754

13,11713,70618,87415,54713,2907,012

P

0,80-0,900,70

0,80-0,900,99

0,80-0,900,80-0,900,50-0,700,70-0,800,89-0,90

0$9

Económicas/Direito

x2

23,57215,82918,05312,6667,623

10,59316,64016,65612,39410,517

P

0,20-0,300,70-0,800,50-0,700,80-0,90

0,990,95-0,980,50-0,700,50-0,700,90-0,950,95-0,98

Engenharia/Direito

x2

13,04720,52214,03213,10515,54915,65014,38224,15015,17513,258

P

0,80-0,900,30-0,500,80-0,900,80-0,900,70-0,800,70-0,800,80-0,900,20-0,300,70-0,800,80-0,90

Engenharia/Econ.

x2

20,44116,75817,47211,14812,36016,97712,48021,1117,997

11,132

P

0,30-0,500,50-0,700,50-0,700,90-0,950,90-0,950,50-0,700,80-0,900,30-0,50

0,990,90-0,95

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QUADRO XII

Comparação das distribuições pelo cálculo do

Mulheres/Homens

Critérios

123456789

10

Letra3

x2

8,5515

14,9476

10,3790

5,6797

15,4045

10,3790

14,9474

14,2166

12,3590

14,0337

P

0,98-0,99

0,70-0,80

0,95-0,98

0,99

0,70-0,80

0,95-0,98

0,70-0,80

0,80-0,90

0,90-0,95

0,80-0,90

Económicas

x2

33,9683

11,4920

8,0935

10,1841

13,8070

11,7249

17,5664

11,6847

18,7353

10,3254

P

Ofil-0,02

0,90-0,95

0,99

0,95-0,98

0,80-0,90

0,90-0,95

0,50-0,70

0,90-0,95

0,50-0,70

0,96-0,98

Direito

x2

21,788

15,872

16,186

20,272

20,716

19,696

18,135

13,701

18,534

18,573

P

0,30-0,50

0,70-0,80

0,70-0,80

0,30-0,50

0,30-0,50

0,50-0,70

0,50-0,70

0,80-0,90

0,50-0,70

0,30-0,50

Global

x2

23,1943

15,5312

21,0730

15,5057

26,4310

18,1670

21,9671

21,2214

29,0323

19,8245

P

0,20-0,30

0,70-0,80

0,30-0,50

0,70-0,80

0,10-0,20

0,50-0,70

0,30-0,50

0,30-0,50

0,05-0,100,30-0,50

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siado elevados. Em dois dos traços (Marte/Vénus, designado por 5,e Ternura, 8) esses valores surgem demasiado elevados em todasas comparações entre os grupos diferenciados pela formação. Ostraços Actividade (critério 2) e Largura do Campo de Consciência(critério 4) apresentam também valores demasiado altos, paraLetras/Direito e Económicas/Direito, e para Letras/Económicase Económicas/Direito, respectivamente. É curioso notar que osdois traços em que surge uma coincidência excessiva nas distri-buições de todos os grupos são justamente os dois traços que maisse ligam ao «comportamento feminino», tal como é socialmentedefinido e aceite. Poder-se-á pensar que, para estes traços, asrespostas das mulheres são formuladas, não ao nível profundodo carácter (disposições congénitas e estáveis), mas ao nível dosmodelos sociais adquiridos em relação aos quais o indivíduo tentaconformar-se.

No grupo de homens, surge um valor de P demasiado baixopara Letras/Direito, no traço Actividade (critério 2). Os outrosvalores situados fora dos limites de aceitação são todos dema-siados altos, e dispersos, se exceptuarmos os traços Largura doCampo de Consciência (critério 4) e Sociabilidade (critério 10),para os quais os valores de P ss.o demasiado altos em 4 das com-parações inter-grupos. Eí de evidenciar o facto de o critério 4 (Lar-gura do Campo de Consciência) já surgir com valores demasiadoaltos para o grupo das mulheres em dois casos. Este facto nãosugere, em princípio, uma hipótese explicativa e seria interes-sante analisar detalhadamente a distribuição das respostas.

Na comparação entre homens e mulheres, para o grupo deLetras os valores de P são demasiado altos em 5 dos traços; nogrupo de Económicas, um valor de P demasiado baixo (Emotivi-dade) e 6 valores demasiado altos — isto é, fortes probabilidadesde as distribuições de mulheres e homens se distinguirem quantoao critério 1, excessiva coincidência das distribuições em 6 dostraços. Na população de Direito todos os valores de P se situamdentro dos limites de aceitação. Poder-se-iam formular hipótesesinteressantes: nos cursos de Letras, onde a população masculinaestá actualmente em franca minoria e portanto «desintegrada»,os poucos homens que surgem são «excepções», não acompanhandoas correntes «atitudes masculinas», por verdadeiras disposiçõescaracterológicas que determinam a escolha do curso ou por reac-ção compensatória frente a uma posição insegura, e valorizandoatitudes que pela sociedade são confusamente classificadas entre«artísticas», «sentimentais», «femininas», ou ainda «intelectuais»— por oposição à orientação utilitária vulgarmente valorizada; éde notar que a população masculina de Letras tem uma média ele-vada de Emotividade, uma Actividade baixa, Interesses Sensó-rias com uma média alta. No curso de Económicas, a popula-

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ção feminina que se encontra em minoria, frequentando um cursorecentemente acessível às mulheres, bastante distanciado das«aptidões» e funções que tradicionalmente se qualificam de femi-ninas; neste caso, talvez seja a população feminina que tentaaproximar-se do comportamento da população masculina, afir-mando uma posição insegura e mal aceite, e revelando uma emoti-vidade alta. No grupo de Direito, as duas populações masculinase femininas, apresentam distribuições confundíveis com todos osvalores de P dentro dos limites de aceitação — tratar-se-á dumcurso onde a frequência de homens e de mulheres é igualmenteaceite e equilibrada? Estas hipóteses são interessantes, mas care-cem de fundamento. Até que ponto a semelhança das distribuiçõesde dois grupos, analisada pelo x2» reflecte a semelhança da estru-tura desses grupos?

Quanto à influência dum dado contexto social sobre os resul-tados do teste de BERGER, não se trata já duma hipótese nossa.No estudo de GAUCHET e LAMBERT são estudados 3 grupos: estu-dantes de Paris, estudantes de Aix-en-Provence e assalariados. Osautores concluem que as diferenças inter-sexos são mais marcadasno grupo «assalariados» do que nos grupos de estudantes, «o queconfirma, pelo menos parcialmente, a tese dos que sustentam queessas diferenças são devidas a condições sociais ou muito aumen-tadas por estas»; os baixos níveis económicos e sociais influemna conservação dos modelos «masculino» e «feminino» tradicionaise determinam, portanto, nos indivíduos, comportamentos mais con-formistas e estereotipados.

Na população global, os valores de P demasiado altos desa-parecem — tratar-se-ia apenas dum fenómeno devido às propor-ções pequenas dos grupos? No critério 9 (Inteligência Abstracta— Inteligência Concreta) surge um valor de P demasiado baixo,enquanto que, para este critério, no grupo de Letras o valor de Pé demasiado alto, e aceitável nos outros grupos; não sabemos expli-car este facto.

Comparação das distribuições pelo cálculo do t de Student

Comparando as médias das populações pelo cálculo do t deSTUDENT (quadros Xm, XIV e XV), são também poucas as dife-renças inter-grupos.

Escolheu-se como limite de aceitação a probabilidade de 5%— probabilidade de erro na afirmação de que os dois grupos consi-derados de cada vez têm a mesma média. As probabilidades de1% e 0,1% se, deste ponto de vista indicam uma menor probabi-lidade de erro visto haver quase 100 í% de probabilidade dos valoresde t serem inferiores aos achados, implicam, por outro lado, um

616

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maior risco porque nos aproximamos dos valores extremos dadistribuição normal tomada como hipótese.

A maior parte dos valores de t situam-se dentro do limite 5%.No grupo de mulheres, apenas para o traço 9 («Inteligência Abs-tracta-Inteligência Concreta»), nos grupos Letras/Económicas eEconómicas/Direito o valor de P é de 1% — enquanto que o testede x2 apresentava valores aceitáveis.

Na população masculina, os valores de P demasiado baixossituam-se sobretudo nos grupos Letras/Económicas e Letras/En-genharia, e para os critérios «Emotividade», «Actividade» e «Inte-ligência Abstracta/Inteligência Concreta», o que poderia levar aformular a hipótese, muito plausível e já abordada, duma dife-renciação entre a população de Letras e a dos cursos técnicos supe-riores- No entanto, o grupo de Letras é muito pequeno e as dife-renças entre médias surgem nos traços onde o teste de x2 indica queas distribuições são confundíveis.

Na comparação Homens/Mulheres, em Económicas temos 2valores de P=0,l % («Emotividade» e «Interesses Sensoriais»), e,ao contrário do que acontecia com o teste do x2 surgem mais valo-res de P fora dos limites de aceitação na população global.

Em conjunto, os valores indicativos duma possível diferen-ciação, quer por formação quer por sexos, são poucos. Para o teste

QUADRO XIII

Comparação das médias dos diferentes grupos pelo t de Student

Mulheres

Critérios

123456789

10

Letras/Direito

t

1,29351,46810,85870,34890,99780,21020,62760,16950,16950,4308

P

5%5%5%5%5%5%5%5%5%5%

Letras/Económicas

t

0,34261,37160,88231,45450,24711,50351,77780,93943,28010,5061

p

5%5%5%5%5%5%5%5%1%5%

Económicas/Direito

t

0,98350,23181,52801,06690,84811,63981,32020,73333,30001,1929

P

5%5%5%5%5%5%5%5%1%5%

617

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QUADRO XIV

Comparação das médias dos diferentes grupos pelo t de Student

Homens

Critérios

1

23

456789

10

Letras//Direito

t

1,32381,92660,34880,5404

1,94081,6261

1,16970,15111,87231,0742

P

5%5%5%5%5%5%5%5%5%

5%

Letras//Económicas

t

3,11813,51051,34240,01042,05901,90371,34820,18833,31971,5476

p

0,1 %0,1 %

5%5%1%5%5%5%

í %

5%

Letras//Engenharia

t

2,30673,2410

1,21200,4592

2,03551,54990,71041,18842,86870,2734

p

i%

0,1%5%5%5%5%5%5%1%

5%

Económicas//Direito

t

2,46221,86531,61550,99550,58090,22320,24250,62481,34030,4876

p

1%

5%5%

5%5%5%5%

5%5%5%

Engenharia//Direito

t

1,43822,36950,92311,41240,71840,48820,75071,60480,5484

1,0805

p

5%5%5%5%

5%5%

5%5%5%5%

Engenharia//Económicas

t

0,44771,17850,41360,57170,23580,34180,97611,83780,56611,5393

F

5 %5 %5 %5 %5 %

5 %5 %5 %5 %

5 %

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QUADRO XV

Comparação das médias dos diferentes grupos pelo t de Student

Homens/Mulheres

Critérios

12

34 .56789

10 ,

Letras

t

01,60960,25891,07861,21470,36700,59531,70881,54360,4674

Direito

P t

5%5%5%5%5%5%5%5%5%5%

0,66920,80281,10590,46250,69012,27381,57682,05180,55331,2486

P

5%5%5%5%5%1%5%5%5%5%

Económicas

t

4,23071,08650,56970,01520,72970,34283,18411,60232,02270,4681

P

5%5%5%5%5%

01 %5%5%5%

Global

t

4,05901,14971,00141,35340,79772,43692,83882,85820,53560,7266

P

<oi%5%5%5%5%i%91 %9,1 %5%5%

do x2> apenas os valores de P demasiado altos são em número con-siderável; não sabemos se se trata dum fenómeno estatísticodevido às reduzidas dimensões dos grupos ou a qualquer outrofactor introdutor de erros, se do reflexo dum fenómeno psico--sociológico (estruturação de grupos segundo modelos estereoti-pados). Admitindo esta segunda hipótese, só poderemos explicar,como dissemos, em relação às comparações entre homens e mulhe-res, por formações diferentes; os valores de P para o critério 4(«Largura do Campo de Consciência»), por exemplo, não parecemjustificáveis por esta hipótese. De qualquer forma, estes valores deP demasiado elevados apenas indicam uma coincidência dema-siada para ser aceite sem pressupor qualquer anomalia. Os valoresde P demasiado baixos, ainda para o x2» que indicam que nosencontramos nos valores extremos da distribuição onde a hipótesetomada como verdadeira é mais falível, são muito poucos.

Os valores de t parecem indicar, em princípio, uma diferen-ciação, para alguns traços — devida aos factores formação (entrea população masculina de Letras e dos cursos técnicos) e sexo —que se acentua na população global, o que leva a pensar que aíinterferem conjuntamente os dois factores. No entanto, o carácterum tanto esporádico destas possíveis diferenças, a sua não verifi-cação para todos os grupos diferenciáveis pelos mesmos critérios,

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e a discordância entre os valores de x2 e os de t não aceitáveis,sugerem um estudo sobre uma população mais vasta, a fim de seesclarecer estes problemas.

No que respeita ao presente trabalho e aos dados de quedispomos, a hipótese mais viável permanece a de considerarmosos grupos confundíveis, constituindo no seu conjunto uma popula-ção homogénea distribuindo-se normalmente em relação às variá-veis consideradas.

III

ESTUDO DAS CORRELAÇÕESENTRE OS ITEMS

1. Considerações sobre a matriz de interoorrela^ões

Foram calculadas as correlações entre os 100 items, tendo-seutilizado o coeficiente de BRAVAIS-PEARSON; uma vez aceite ahomogeneidade da população, considerou-se, para estes cálculos,o seu total.

Supondo a existência dos dez traços definidos teoricamente,e a sua inter-independência, a matriz de intercorrelações deveriaapresentar uma concentração dos valores mais elevados para cadagrupo de items correspondentes a um traço (isto é, nas correla-ções intra-criteriais) e valores fracos no restante da matriz, (nascorrelações extra-criteriais). Verifica-se, no entanto, que há dis-persão das corrrelações mais fortes, enquanto que as intercorre-lações dos items de alguns traços são bastante fracas (algumasvezes negativas).

Conforme já referimos, pensámos inicialmente efectuar umaanálise factorial do conjunto da matriz, a fim de, independente-mente de qualquer hipótese teórica, se isolar os factores deter-minantes das correlações entre os items. Na impossibilidade derealizar esse trabalho, limitamo-nos a algumas considerações. Parapermitir a apreciação dos valores das correlações construiu-se oquadro XVI6 onde figuram as percentagens de correlações iguaisou superiores a .20, .30, e .40, para cada matriz parcial, e para ototal de correlações extra-criteriais de cada traço. As afirmaçõesdo parágrafo antecedente confirmam-se: nas matrizes parciaiscorrespondentes às correlações intra-criteriais a percentagem decorrelações iguais ou superiores a .20 atinge o seu máximo na

« Utiliza-se a notação .00, correspondente a 0,00, por ser a mais vulgar-mente usada para expressar correlações.

620

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«Emotividade», com 6&,&7%; o traço que tem a percentagem ime-diatamente mais elevada, a «Actividade», apresenta também per-centagens de correlações extra-criteriais» > .20 consideráveis, porvezes superiores às percentagens de correlação intra-criteriais dosoutros critérios (ex: percentagem de correlações dos items de«Actividade» com «Secundaridade» — 22%; percentagem das in-tercorrelações dos items da «Secundaridade» — 17,77%).

Ordenando as percentagens por ordem decrescente:

68,87 % — Intercorrelações> .20 dos items «Emotividade»48,88% — Intercori*elações>.20 dos items «Actividade»35,54% — Intercorrelações>,20 dos items «Inteligência Abstrac-31,10% — Inter correlações >.20 dos items «Interesses Sensoriais»27% —Correlações>.20 dos items «Emotividade» e «Activi-

dade»24,43% — Intercorrelações>.20 dos items «Marte-Vénus»22,21%—Intercorrelações>.20 dos items «Ternura»22% —Correlações;>.20 dos items «Actividade» e «Secunda-

ridade»21!% —Correlações>.20 dos items «Actividade» e «Largura do

Campo de Consciência»20% —»Intercorrelações>.20 dos items «Sociabilidade»18% — Correlações>.20 dos items «Secundaridade» e «Largura

do Campo de Consciência»17,77%—Intercorrelações>.20 dos items «Secundaridade»15,55% — Intercorrelações>.20 dos items «Largura do Campo de

Consciência»15 % — Correlações > .20 dos items «Actividade» e Marte-Vénus»14% —Correlações>.20 dos items «Actividade» e «Avidez»13,32% — Intercorrelações>.20 dos items «Avidez»22% —Correlações>.20 dos items «Emotividade» e «Ternura»12% —Correlações > .20 dos items «Marte-Vénus» e «Sociabi-

lidade»12% —Correlações>.20 dos items «Interesses Sensoriais» e

«Ternura»12% —^Correlações>.20 dos items «Interesses Sensoriais» e

«Inteligência Abstracta-Inteligência Concreta»10% —Correlações>.20 dos items «Marte-Vénus» e «Avidez»

As restantes percentagens são todas inferiores a 10 %. Comose pode ver por esta ordenação, as correlações mais fortes estãomuito dispersas,e muitos items de traços supostamente indepen-dentes estão mais ligados entre si do que os items referentes aum traço.

621

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Em princípio poder-se-á concluir que:

—>A «Emotividade» é o traço mais «consistente», mas temgrandes ligações com a «Actividade»,, e ainda com a «Ternura»;

— A «Actividade», a ser considerada como um «factor», dadaa relativa coesão entre os seus items, é um «factor geral» com in-terferências consideráveis em muitos outros traços;

— «Inteligência Abstraeta-Inteligência Teórica» e «InteressesSensoriais» apresentam ainda ligações intracriteriais considerá-veis, mas há ainda a notar o seu grau de interdependência, e ascorrelações de «Interesses Sensoriais» com «Ternura»;

— O traço «Marte-Vénus» põe um problema especial, comoveremos adiante.

Chamamos ainda a atenção para dois factos:

— Em muitos casos, as correlações surgem ora positivas, oranegativas (correlações entre «Emotividade» e «Actividade», «Acti-vidade» e «Secundaridade», «Interesses Sensoriais» e «InteligênciaAbstracta», e ainda intercorrelações de «Largura do Campo deConsciência»);

— Limitámo-nos a apreciar o conjunto de correlações supe-riores ou iguais a .20; atendendo às percentagens de correlaçõesiguais ou superiores a .30, e ainda às correlações muito fortes(>.4O) que surgem isoladamente, surgiriam novas hipóteses deconclusões.

Estes factos acentuam a complexidade, já constatada, dasligações entre os items. As nossas considerações sumárias nãopodem conduzir-nos senão ao ponto de partida: necessidade dumaanálise factorial da matriz de intercorrelações.

2. Análise factorial intracriterial

2.1 Comparação com o estudo de GAUCHET e LAMBERT

Para cada matriz parcial, correspondente às intercorrelaçõesdos items de cada traço, foi efectuada uma análise factorial.Apresentamos a seguir as saturações de cada item nos factoresextraídos 7, e a comparação com as saturações encontradas porGAUCHET e LAMBERT.

7 A «cammunauté» dum item, quer dizer, o seu conteúdo factorial total,é dada pela soma dos quadrados das saturações; neste caso, tendo-se extraídoapenas um factor, a «communauté» h2 é igual ao quadrado da saturaçãoS2. A «especificicfeade» — em termos simplificados significa o grau de in-dependência do item — é dada subtraindo h2 da unidade 1-h?. Neste caso,por se ter extraído apenas um factor, a «especificidade» não vem acrescentarqualquer informação, mas ajuda a ressaltar os baixos valores das saturações.

622

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EmotividadeReportando-nos às alterações que foram introduzidas na tra-

dução do questionário de BERGER, as diferenças das saturações dasduas perguntas modificadas (51 e 81) são muito díspares. Aumen-tou a saturação da pergunta cujo conteúdo foi «afectivamenteatenuado» e cujo âmbito foi reduzido.

Emotwidade

Saturaçãomais baixa

Saturaçãomais alta

Item

1

11

21

31

41

51

61

71

81

91

s

.52

.48

.52

.47

.30

.58

.55

.63

.47

.42

.27

.23

.27

.22

.09

.34

.30

.40

.22

.17

.73

.77

.74

.78

.91

.67

.70

.60

.78

.83

Saturações apresentadas Diferen-por GAUCHET e LAMBERT ças

.63 —.11

.45 H-.03

.39 +.13

.49 —.02

.29 . . . . +.01

.46 +.12

.59 —.14

.63 00

.51 04

.54 —.12

S = 4,92.

ActividadeA maior diferença entre as saturações regista-se na pergunta

12, a única que sofreu alterações na tradução: a sua saturaçãodiminuiu, o seu conteúdo foi também «afectivamente atenuado».

Actividade

Saturação„-• 14.

mais alta

Saturaçãomais baixa

Item

2

12

22

32

42

52

62

72

92

S

.40

.49

.61

.45

.55

.50

.07

.57

.21

h*

.40

.24

.38

.21

.30

.25

.01

.32

.04

1-h2

.84

.76

.62

.80

.70

.76

1.00

.68

.96

Saturações apresentadas Diferempor GAUCHET e LAMBERT «as

.48 —.08

.70 —.12

.55 +.06

.61 —.16

.48 +.07

.47 +.03

.06 . . . +.01

.51 +.06

32 , .11

S = 4,25.

623

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SecundaridadePara este traço, dos dois items modificados na tradução,

apenas varia consideravelmente, para mais, a saturação do 63;a modificação introduzida pode ser considerada equivalente àsapontadas nos items precedentes.

Secundaridade

Saturaçãomais baixaSaturaçãomais alta

Item

3

13

23

^3

43

53

63

73

83

93

s

.31

.47

.24

.41

.21

.01

.60

.56

.49

.12

ha

.09

.22

.06

.17

.04

0

.36

.32

.24

.01

.91

.78

.94

.83

.96

1.00

.64

.69

.76

.99

Saturações apresentadaspor GAUCHET e LAMBERT

.46 . . .

.54

.44 . . .

.46

.48

.15 . , . .

.47

.53

.48

.20

Difere

—.15

—.07

— 20

- .05

—.27

—.14

+.13

+.03

+.01

—.07

S = 3,402.

Largura do Campo de ConsciênciaDas seis perguntas assinaladas como sendo aquelas cuja sa-

turação mais variou, apenas duas, a 24 e a 94 sofreram alteraçõesna tradução; na 24 o conteúdo foi restringido ao aspecto trabalho.

Largura do Campo de Consciência

Saturaçãomais alta

Saturaçãomais baixa

Saturaçãonegativa

Item

4

14

24

34

44

54

64

74

84

94

S

.23

.52

.20

.42

.04

.46

-.10

.36

.49

.20

h2

.05

.27

.04

.17

.00

.21

.01

.13

.24

.04

l -h 2

.95

.73

.96

.83

1.00

.79

.99

.87

.76

.96

Saturações apresentadas Diferen-por GAUCHET e LAMBERT çaa

32 —.09

.55 —.03

.45 —.25

.43 —.01

.26 —-.22

£8 +.08

.23 —.33

.47 —.11

.36 -f .13

.44 —.24

S = 2,805.

624

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Avidez

Na tradução, o item 16 foi modificado de modo idêntico aoitem 24; a saturação também aparece agora mais baixa. O item56 também não foi traduzido textualmente.

Avidez

Saturaçãomais baixa

Saturaçãomais alta

Item

6

16

26

36

46

56

66

76

86

96

S

.40

.24

.38

.28

.42

.31

.54

.34

.35

.32

.16

.06

.14

.08

.18

.09

.29

.12

.12

.10

l-h»

.84

.94

.86

.92

.82

.91

.71

.88

.88

.90

Saturações apresentadas Diferen-por GAUCHET e LAMBERT ças

.55 15

.42 —.18

.36 i-.O2

.15 +.13

.41 +.01

.41 —.10

.51 +.03

.28 +.06

.51 —.16

.45 —.13

S = 3,59

Polaridade

Os resíduos resultantes da extracção do primeiro factoreram suficientemente importantes para justificar a extracção dumsegundo factor.

O item 25, alterado na tradução, apresenta uma diferençaimportante na saturação, aparecendo agora com saturações quaseiguais no factor I (identificado como «Marte/não-Marte» porGAUCHET e LAMBERT,) e no factor II (Vénus/não-Vénus).

A pergunta 75 também variou, mais ligeiramente, mas assaturações nos dois factores também se aproximam.

Além disso, o agrupamento dos items em dois factores (5,15,65, 75 e 95 ligando-se a «Marte», os restantes a «Vénus») desa-parece.

625

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Polaridade

Item

5

15

25

35

45

55

65

75

85

95

Si

.37

.52

.49

.19

.05

.13

.44

.41

.45

.32

Sn

.24

.28

-.45

-,10

.15

-.23

.40

.19

-.25

-.24

h2=Sl2 + SlU2

.20

.35

.45

.05

.02

.07

.35

•20

.27

.16

1-H2

.80

.65

. .56

.96

.97

.93

.65

.80

.73

.84

Quadro de saturações e especificidades apresentadopor GAUCHET e LAMBERT

Item

5

15

25

35

45

55

65

75

85

95

Saturação depois da rotação

I

.65

.66

.13

-.26

.24

.04

.49

.51

.09

.36

II

.21

-.01

.66

.46

.28

.52

.18

.12

;30

.14

Proporá da variância devidaa cada factor

I

.42

.44

.02

.07

.06

.00

.24

.26

.01

.13

II

.04

.00

.44

.21

.08

.27

.03

.01

.09

.02

Espec.

.54

.56

.54

.72

.86

.73

.73

.73

.90

.85

= 3,37 = 0,002.

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Interesses SensoriaisNenhuma das saturações assinaladas como tendo variado

mais amplamente corresponde a items alterados na tradução.

Interesses Sensoriais

Saturaçãomais baixa

Saturaçãomais alta

Item

7

17

27

37

47

57

67

77

87

97

s

.44

.32

.38

.47

.31

.44

.22

.34

.44

.58

.20

.11

.14

.22

.10

.19

.05

.11

.19

.34

i-ha

.80

.90

.86

.78

.90

.81

.95

.89

.81

.66

Saturações apresentadas Diferen-por GAUCHET e LAMBERT ças

46 . . —.02

.37 . - . 0 5

.46 —.08

.46 +.01

.40 —.09

.51 —.07

.35 —.13

.47 —.13

.43 +.01

.42 +.16

S = 3,93.

TernuraPerguntas modificadas:

aparentemente generalizado,8 e 68. Na pergunta 68 o conteúdo foia saturação subiu consideravelmente.

Ternura

Saturaçãomais alta

Saturaçãomais altaSaturaçãomais baixa

Item

8

18

28

38

48

58

68

78

88

98

s

.39

.39

.29

.48

.53

.40

.53

.16

.22

.22

h2

.15

.15

.09

.23

.28

.16

.28

.03

.05

.05

l-h3

.85

.85

.92

.77

.72

.84

.72

.98

.95

.95

Saturações apresentadas míeren-por GAUCHET e LAMBERT ças

.46 —.07

.52 —.13

.18 +.11

.18 +.10

.25 +.28

.33 +.07

.18 +.35

.36 —.20

.47 —.25

.46 —.24

S = 3,599.

627

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inteligência Abstracta-Inteligencia Concreta

O item 59 foi o único alterado na tradução.

Inteligência Abstracta-Inteligencia Concreta

Saturaçãomais alta

Saturaçãomais baixa

Item

9

19

29

39

49

59

69

79

89

99

S

.43

.63

.19

.65

.53

.24

.13

.43

.40

.33

h3

.19

.39

.04

.43

.28

.06

.02

.18

.16

.11

.81

.61

.96

.58

.72

.95

.98

.82

.84

.89

Saturações apresentadas Diferen-por GAUCHET e LAMBERT çaa

.58 —.15

.56 +.07

.16 -f.03

.64 -f.01

.58 —.05

.32 —.08

.22 —.09

.64 . . . . —.21

.32 +.08

.24 +.09

S = 3,952.

Sociabilidade

Saturaçãomais baixa

Saturaçãomais alta

Item

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

S

-.01

.42

.29

.26

.42

.57

.26

.28

.36

.37

h8

0

.17

.09

.07

.18

•33

.07

.08

.13

.14

l-h3

1.00

.83

.91

.94

.82

.67

.93

.92

.87

| .87

S = 3,212.

628

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2.2 Comentário dos resultados obtidos

As maiores diferenças constatadas entre as saturações donosso estudo e as do estudo de GAUCHET e LAMBERT muitas vezesnão correspondem a perguntas cuja tradução foi alterada. Poroutro lado, alterações aparentemente correspondentes — con-teúdo da pergunta «afectivamente atenuado» e sequente genera-lização do seu âmbito — ligam-se tanto a aumentos como a redu-ções das saturações, de ura estudo para outro.

Será, portanto, difícil relacionar a tradução com as variaçõesde saturação, devendo estas ser atribuídas às diferenças entrepopulações e condições de aplicação do teste.

Estas diferenças motivaram, portanto, variações iguais ousuperiores a .10 em 45 % das saturações, assim distribuídas:

EmotividadeActividadeSecundaridadeLargura C. ConsciênciaAvidezInteresses SensoriaisTernuraInt. Abstr.-Int. Concr. ..

40%30%50%60%60%30%80%10%

É difícil, dada a disparidade de critérios, indicarmos quaisas saturações «fortes» e «fracas»]. GAUCHET e LAMBERT parecemconsiderar as saturações inferiores a .25 como fracas. Seguindoesta classificação resulta que:

Emotividade

Actividade

Secundaridade

Largura C. Consciência

Avidez

Interesses Sensoriais

Ternura

Int. Abstr.-Int.Concr.

Sociabilidade

Saturações fortesO 25)

10

8

6

5

9

9

7

7

9

%

100

80

60

50

90

90

70

70

90

Saturações fracas«25)

0

2

4

5

1

1

3

3

1

%

0

20

40

50

10

10

30

30

10

629

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As conclusões referidas a propósito das correlações entre ositems parecem, de certo modo, infirmadas. Para os critérios «Emo-tividade», «Avidez», «Interesses Sensoriais», «Sociabilidade»,«Actividade» e ainda «Ternura» e «Inteligência Abstracta-Inte-ligência Concreta», a percentagem de saturações fortes pareceindicar uma coesão destes factores.

Os traços «Secundaridade-Primaridade» e «Largura do Campode Consciência» confirmam-se como inconsistentes. A este propó-sito relembramos que «Largura do Campo de Consciência» apre-sentava na comparação das distribuições dos vários grupos, valo-res de x2 £<>m probabilidades excessivamente elevadas para umnúmero considerável de casos; a não verificação dum factor doqual dependeriam os items invalida qualquer hipótese explicativaà base dum «condicionamento» na atitude dos grupos, devendoexistir neste caso uma coincidência por acumulação de erros.

3. Análise factorial extracriterial

Voltando a referir a importância do condicionamento intro-duzido num estudo que se limita a verificar a viabilidade de hipó-teses previstas, sem verificação de outras hipóteses igualmentepossíveis, chamamos a atenção para a influência directa que aescolha das correlações a analisar exerce sobre os valores dassaturações encontradas. Este facto ê evidente, uma vez que asaturação é o quociente da soma das correlações relativas a umitem sobre a raiz quadrada da soma das correlações de toda amatriz considerada. Exemplificando: a soma das correlações doitem 71 com os outros items de «Emotividade» é de 2.72 (nenhumadas correlações inferior a .21); a soma das correlações do item 39com os restantes items do traço «Inteligência Abstracta-Inteligên-cia Concreta» é de 2,17 (três destas correlações inferiores a .20,.03, .11 e .16); no entanto, a saturação do item 71 no factor «Emo-tividade» é inferior (.63) à saturação do item 39 (.65) no factorrespectivo.

Na impossibilidade de efectuar uma análise factorial do con-junto das intercorrelações, quisemos salientar devidamente esteaspecto, e ainda a importância de certas correlações entre itemsde critérios diferentes.

As saturações de alguns items num factor extraído das suasintercorrelações são as que se indicam na página seguinte:

630

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Item

1

21

31

51

61

71

91

36

8

98

s

.53

.48

.52

.56

.54

.58

.51

.51

.36

.37

.28

.23

.27

.31

.29

.34

.26

.26

.13

.14

l -h '2

.72

.77

.73

.69

.71

.66

.74

.74

.87

.86

52

52

47

58

55

63

42

Saturação destes items nofactor «Emotividade»

28 — Saturação no factor«Avidez»

39

22Saturação no factor «Ter-nura»

Item

11

21

31

51

61

91

2

12

22

32

42

72

s

.31

.39

.28

.61

.46

.58

.43

.42

.52

.42

.53

.43

h2

.10

.15

.08

.37

.21

.34

.18

.18

.27

.18

.28

.18

l -h!2

.90

.85

.92

.63

.79

.66

.82

.82

.73

.82

.72

.82

48

52

47

58

55

42

40

49

61

45

55

57

Saturações destes items nofactor «Emotividade»

Saturações destes items nofactor «Actividade»

691

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Para o cálculo destas saturações inverteram-se os sinais dascorrelações -entre os item referentes à «Emotividade» e os referen-tes à «Actividade», correlações que eram negativas; isto é, con-siderou-se a correlação positiva da «não-Emotividade» com«Actividade», ou da «Emotividade» com «não-Actividade».

Item

12

22

32

42

52

33

14

84

5

46

s

.53

.62

.47

.56

.45

.52

.44

.54

.46

.50

.28

.38

.22

.31

.20

.27

.19

.29

.21

.25

l-h2

.72

.62

.78

.69

.80

.73

.81

.71

.79

.75

.49

61

45

.55

50

Saturações destes items nofactor «Actividade»

£1 — Saturação deste item nofactor «Secundaridade»

-52

4937e.24 "

42 -

Saturações destes items nofractor «Largura»

— Maturações deste itemno factor I e II da«Polaridade»

- Saturações deste item nofactor «Avidez»

Como se pode constatar, as saturações que encontramos, paraalguns items, em factores não definidos, são mais fortes do queas saturações desses mesmos items nos factores definidos pelateoria caracterológica. Os limites deste estudo não nos permitemoutras conclusões senão que seria de todo o interesse aprofundaresta questão.

4. Observações sobre as correlações de algumas perguntas

As correlações mais elevadas (iguais ou superiores a .40)são nove no total, quatro intracriteriais e cinco entre items decritérios diferentes. Sintetizando o conteúdo destes items:

61 — tendência ciclotímica71 — tendência para a obsessão, para a mania do es-

crúpulo

15 — gosto pelo comando )65 — crença nas possibilidades próprias de comandar J

corr. = .40

corr. — .44

6S2

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38 — alocentrismo, empatia 1 c o r r = ^68 — importância dos sentimentos afectivos J

9 — actividade não dirigida para fins imediatamente júteis > corr. = .46

39 — tendência para a abstracção, para as ideias gerais J

22—• desencorajamento perante obstáculos 1 c o r r = ^33 — constância nos objectivos visados J

14 — precisão e exactidão 1 co r l , _ ^g73 — apreço pela ordem e pela regularidade J

26 — sentido do valor do tempo, rapidez executiva j ^ ^ = 4144 — pontualidade J

46 — defesa dos direitos próprios 1 « = 4284 — decisão e teimosia nas afirmações e projectos J

58 — gosto por crianças 167 — gosto de acariciar J

Estas correlações sugerem algumas observações, que de modonenhum se situam ao nível de conclusões ou mesmo de críticasconsistentes, mas que são aqui inseridas como tópicos possíveispara futuras reflexões.

Relembremos que as correlações fortes deveriam existir ape-nas entre items dum mesmo traço, o que não acontece.

As correlações altas indicam que um determinado compor-tamento ou atitude acompanha geralmente outro comportamentoou atitude. Na hipótese caracterológica não se supõe que esseparalelismo implique uma relação causa-efeito entre os dois com-portamentos ou atitudes, mas que ambos derivam duma causacomum, mais profunda (o «traço»), assim detectada.

Dentro desta hipótese interessa não considerar dois com-portamentos dos quais um implique o outro numa relação de causa-efeito; neste caso, os dois comportamentos situar-se-iam a níveisdiferentes da personalidade. Esta observação aplica-se, pelomenos aparentemente, à correlação entre os items 15 e 65. O gostopelo comando não estará situado nas tendências profundas, sur-gindo a crença nas possibilidades de comando como um efeitodlessa tendência, ao nivel da imagem que o indivíduo forma a seurespeito? Do mesmo modo, não se poderá considerar que a cons-tância nos objectivos visados (item 33) depende do grau deenergia disponível para resistir aos obstáculos a esses objectivos(item 22) ?

6SS

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Interessa também não diferenciar dois comportamentos efec-tivamente confundíveis. Os erros de observação e os erros de comu-nicação através da linguagem podem fazer supor a existência dedois comportamentos, quando na realidade apenas existe um,observado ou descrito por duas formas diferentes.

Por outro lado, a intenção da pergunta pode ser seriamentedesviada pelo indivíduo que responde; as perguntas deste questio-nário, embora se refiram a situações e atitudes correntes, emtermos correntes, pretendem estar depuradas dos conteúdos cor-rentes ou comuns — afectivos, valorativos, complexos — atribuídosa essas situações e atitudes pela sociedade em, que se inserem osindivíduos. Acontece, muito naturalmente, que as respostas nãosurgirão dentro desse conteúdo depurado em que foi concebido oquestionário, mas condicionadas pelos factores sociais, pelas ca-pacidades pessoais de introspecção, pela imagem que o indivíduopretende mostrar de si próprio, etc.

Temos, portanto, dois pólos possíveis de confusão: a análiseem que assentou a elaboração do questionário (cada uma das per-guntas, e só cada uma, visa apenas uma atitude?); e as causascomplexas das respostas individuais.

O aparecimento duma correlação igual a um indica que duasvariáveis podem ser confundidas; as correlações fortes indicamque um factor comum condiciona duas variáveis, e as correlaçõesfracas ou nulas demonstram a independência de variáveis. Emlinhas gerais, este critério é o utilizado para a construção de di-versos questionários de personalidade. Questionários que nãoassentam em nenhuma teoria de causalidade, e cujos factoressão definidos exclusivamente a partir do âmbito das perguntasque os compõem. Neste caso, não havendo qualquer tentativa deexplicação, mas apenas o constatar da ligação de certas atitudes,a simplicidade do método das correlações é uma vantagem evidente.

No caso de questionários que se ligam a prévias teorias cau-sais, em particular no caso da caracterologia ,a formulação mate-mática das ligações entre as perguntas é unicamente um meiopara atingir uma interpretação teórica que se nos afigura difícil.

Considerando novamente os dois pólos possíveis de confusãoentre os quais se situa o questionário, é fácil conceber a extensagama de variáveis que podem intervir nas correlações.

Concretamente, e uma vez que a caracterologia propõe todauma teoria de traços independentes, detectáveis através de10 items indicadores mas cujo âmbito ultrapassa o conteúdo dessesitems, porque surgem correlações tão fortes entre as perguntas14 e 73, 58 e 67? Trata-se, afinal, duma dependência entre os traçosa que se ]|igam estes items? Ou os items 14 e 73, e o 58 e 67 des-crevem duas aparências dum mesmo comportamento, diferencian-

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do-se apenas por expressões verbais diferentes? Ou ainda a análiseque lhes atribuiu causas diferentes é válida e as correlações apa-recem por um erro de interpretação por parte dos indivíduos querespondem?

IV

CONCLUSÕES

Se dum aspecto teórico não podemos formular conclusões,podemos no entanto sistematizar as dúvidas postas nas diferentesfases do trabalho, e formular assim algumas conclusões relativasao nosso objectivo de ordem prática: possibilidade de utilizaçãodum questionário caracterológico, nomeadamente nas empresasindustriais. Estas conclusões cingem-se, portanto, às vantagensou desvantagens que a caracterologia oferece para a compreensãodas pessoas e para o seu bom enquadramento profissional, cin-gem-se a questões de método, ainda que perante um objecto deestudo impreciso, os problemas de método e de princípio se con-fundam. As nossas conclusões podem ser generalizáveis nos as-pectos em que o método caracterológico é idêntico a outros mé-todos.

Verifica-se uma fraca consistência dos «traços» enunciados(correlações fracas entre os items correspondentes) e ligaçõesapreciáveis entre esses «traços» (correlações fortes entre itemsde «traços» diferentes). Seria necessária uma análise que revelassea verdadeira estrutura factorial.

Para além deste aspecto, relativo a conceitos teóricos, umavez que a caracterologia não se contenta com a simples expressãomatemática dos factores, e pretende defini-los em termos dumaestrutura psicológica essencial constituindo a primeira «camada»da personalidade, põe-se imediatamente um problema de método:como distinguir os níveis de personalidade a que se dirigem asperguntas? Como provar que os factores encontrados representamuma estrutura horizontal, isto é, situando-se um único nível da per-sonalidade, e não uma estrutura vertical abrangendo vários níveis?

Uma vez que a maioria das distribuições ®e aproxima da nor-mal, a classificação em «tipos» é uma abstracção que se afastada realidade, e só serão legitimamente classificáveis os casos ex-tremos. Este aspecto, de grande importância, incide directamentesobre tentativas de orientação e de «ajustamento» de indivíduosa funções, baseadas em classificações tipológicas. Alargando um

635

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pouco as nossas considerações, poderemos equacionar o problemade modo mais verdadeiro: os testes nasceram por se pretenderobjectivar as diferenças entre indivíduos; essa objectividade éconseguida referindo cada indivíduo a classes, a níveis médios,a tipos comuns previamente estabelecidos; assim, os testes in-dicam a existência duma maioria de indivíduos «normais», comum comportamento «normal» — uma vez que o que define essa«normalidade» é precisamente o facto de que uma maioria aassume— e no campo profissional há uma maioria de indivíduosque, duma maneira ou doutra, poderão preencher todas as funçõesque não apresentem cacacterísticas excepcionais. Por outro lado,constata-se comumente a variedade do ser humano, o conceito de«indivíduo médio» é um conceito vazio, e a tradução das diferen-ças individuais em termos comuns vem demonstrar, de cada vez,que essas diferenças existem na medida em que são originais eportanto, intraduzíveis; o maior ou menor êxito que cada umalcança no desempenho duma função liga-se, em grande parte, àssuas características particulares. Relembremos que, mesmo noque se refere a testes de aptidões (deliberadamente centrados sobreuma única faceta da pessoa, e cujo valor preditivo parece maiscomprovado), estes são, hoje em dia, utilizados sobretudo paradetectar os casos nítidos de contra-indicação. Dirigidos a umconteúdo mais complexo, os testes de personalidade mais forte-mente acusam essa posição de difícil equilíbrio em que se encon-tram as tentativas de «medição» das características psicológi-cas: entre a objectivação que exige uma simplificação falseadora,e a complexidade individual que escapa ao método científico. Nemsempre os que se servem de testes têm consciência desta posiçãoequívoca, da imprecisão do instrumento que ujtilizam.

Podemos dizer que a caracterologia se debruça sobre este pro-blema, tendo, de certo modo, tomado forma sobre ele. Os caracte-rólogos (Gaston BERGER, por exemplo) apontam a desaptação doscálculos estatísticos para o estudo dos testes caracterológicos. Osoito tipos caracterológicos são uma contemporização entre o «indi-víduo médio» e as particularidades individuais. Contemporizaçãoinsuficiente, como se vê pela sucessiva adição de novos factorescomplementares, e a caracterologia debate-se entre a simplificaçãodas fórmulas e a preocupação de diferenciação. Os caracterólogosacentuam também, como dissemos, que os traços caracterológicossão apenas «tendências», havendo muitas maneiras de efectivarum determinado «tipo»; isto é um ponto de vista teórico, mastambém uma ressalva para interpretações abusivas. Vimos que,efectivamente, os conceitos caracterológicos se diluem, submetidosa um tratamento estatístico. Mas confrontados com a realidadeindividual esses conceitos também se diluem, uma vez que se trata,

6S6

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na mesma, de «medir» pessoas em relação a tipos comuns. Arecusa de utilizar a validação estatística é a base de acusação dosque negam a categoria de ciência à caracterologia; mas para alémdessa acusação, a caracterologia parece-nos sobretudo atacávelpor propor testes, escalas, e se opor a validáJas, isto é, utilizar-seum tanto dos métodos matemáticos, mas não tanto como isso. Acontemporização resulta numa posição equívoca, o problema pri-meiro da caracterologia ê um problema de método.

A média teórica para cada traço é 50, como é sabido. Nos cál-culos que efectuámos, as médias afastam-se desse valor; e variamde grupo para grupo, com diferenças não significativas, em prin-cípio. Os critérios que adoptámos para o estudo diferencial forama formação e o sexo, e nalguns casos surgiram particularidadesnão directamente relacionáveis com os critérios adoptados e quelevam a suspeitar da intervenção doutros factores. No estudo deGAUCHET e LAMBERT, efectuado sobre três grupos sociais diferen-tes, aparecem diferenças significativas para os traços «Emotivi-dade», «Actividade», «Secundaridade» e «Largura do Campo deConsciência», «os mais importantes para a descrição do carácter»,como fazem notar os autores.

A variedade das médias por um lado, as diferenças entre ascorrelações do nosso estudo e as do estudo francês, por outro, evi-denciam um conjunto de factores condicionantes das respostas aoteste, factores que vão desde a «situação» em que se responde(«situação» de exame, «situação» desinteressada) até às com-plexas inter-acções indivíduo-meio.

Não aparecem, nos cálculos que efectuámos paxá o estudo di-ferencial, características relacionáveis com tipos de formação.Neste ponto não há contradição com caracterologia, que não atri-bui um aspecto determinante aos traços caracterológicos; asescolhas do indivíduo são complexas, dependendo de vários facto-res, e será no estilo da escolha e da realização posterior que serevela o carácter — aspecto importante a reter para o problemada orientação profissional, para a adaptação a funções.

Apenas surgiram os já citados casos dos alunos de Letras edas alunas de Económicas, donde não podemos tirar conclusões,é certo, mas que parecem dever-se associar aos outros indíciosreveladores de incidências sociais nas respostas. Isto é, um «traçocaracterologico» pode surgir num indivíduo ou num grupo comoreacção a uma situação.

Neste ponto, podemos repor explicitamente a questão de mé-todo — pretender atingir a «primeira camada» de personalidade,a estrutura caracterológica imutável, através de perguntas e res-postas, será um método errado.

Alargando mais uma vez as nossas considerações, é de notarque sempre se deverá considerar a «situação de resposta» a um

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teste — sobretudo num ambiente profissional, essa situação poderáser decisiva — e que para a «medição» duma pessoa o questionárioserá sempre o processo sujeito a maiores deformações — entre aescala de referência e os resultados obtidos, a relação é efectuadapor quem responde; ainda que a escala esteja cuidadosamente afe-rida para diversos grupos sociais identificados, não se sabe con-cretamente se essa escala mede comportamentos diferentes ousignificados diferentes atribuídos a certos termos. O problema de«o que é medido» pelo teste tem sido contornado por todos aquelesque justamente evitam propor hipóteses, e definem os factores apartir dos grupos de items intercorrelacionados; assim, o factoré sem dúvida «aquilo que é medido». Esta atitude é viável quandose trata de testes de aptidões, não verbais; nesse campo, tem-seprocurado que o teste esteja tão livre quanto possível de factoresestranhos, nomeadamente sociais, e é fácil correlacionar as res-postas ao teste com rendimentos em operações perfeitamente defi-nidas. Mas o que se mede num teste de personalidade são respostasverbais, na situação artificial que todos os testes criam. Se se pre-tende extrapolar os factores encontrados para respostas compor-tamentais, isto é, se se pretende que o teste tenha alguma relação,algum valor preditivo, quanto ao comportamento real dos testados,será necessário estudar as correlações entre respostas e compor-tamentos — e esse estudo será difícil, sendo a avaliação dos com-portamentos feita por uma observação subjectiva.

Ao propôr-se estudar uma estrutura estável e congénita, livrede influências exteriores, a caracterologia aumenta ainda as possi-bilidades de erro. Os desvios já não se situam apenas entre com-portamentos reais e descritos, mas entre comportamentos reais,comportamentos descritos e dedução dos traços motivadores doscomportamentos descritos. Não interessa tanto discutir a reali-dade desses traços, como a sua utilidade; limitando-nos a consi-derar a fluidez com que surgem os traços que se pretendemdetectar, pelo método proposto —o questionário—, a sua utili-dade, como termos de referência para a compreensão das condutasindividuais, revela-se também bastante vaga.

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ANEXO

ADAPTAÇÃO DO QUESTIONÁRIO DE G. BERGER

Instruções

Este questionário compreende 100 perguntas, respeitantes a traços de

Cada pergunta está subdividida em 2 alíneas, por vezes em 3, descrevendodois comportamentos nitidamente opostos e por vezes um terceiro comporta-mento intermediário. Deve escolher aquele que corresponde ao seu própriocarácter.

Na folha de respostas figuram os números e as alíneas correspondentesaos das perguntas. A resposta é dada marcando uma cruz no quadrado de-signado pela letra da alínea escolhida.

Quando a sua própria reacção não está exactamente expressa nas per-guntas que apenas descrevem dois comportamentos opostos, quer dizer quandoa sua resposta for «nem um nem outro» ou «entre os dois», marque a crusno quadrado c, embora essa alínea não esteja expressa no questionário. Masdeverá esforçar-se por responder em a ou 6; a escolha de c deve limitar-seàs ocasiões em que lhe pareça impossível decidir entre a e b.

Perguntas

(Items)

1 — a) Preocupa-se muito com pequenas coisas, sabendo no entanto que nãotêm importância? Fica, às vezes, impressionado com insignifi-câncias?

6) Ou não se perturba senão com acontecimentos graves?2 — a) Ocupa-se activamente durante as suas horas livres (estudos, acção,

social, trabalhos manuais, e em geral todo o trabalho não imposto) ?6) Ou aproveita para repousar?c) Ou fica muito tempo sem fazer nada, a sonhar ou distrair-se (leitura

de diversão, telefonia, etc.)?3- -a ) É muitas vezes guiado na sua acção pela ideia dum futuro longín-

quo (poupar para a velhice, juntar material para um trabalho degrande fôlego) ou pelas consequências remotas que os seus actospossam ter.

b) Ou interessa-se sobretudo pelos resultados imediatos?4 — a) É absorvido pelo seu trabalho, ao ponto de ficar insensível ao que

acontece à sua volta?b) Ou é fácil, para si, fazer o que tem a fazer, continuando a seguir

o que se passa à sua volta?5 — a) É combativo? Procura a competição, a luta?

b) Ou evita os combates e as disputas? Prefere ceder antecipadamente(pelo menos aparentemente) a dar aso a um conflito?

6 — a) É muito ambicioso (desejo ardente de aumentar a sua fortuna, osseus conhecimentos, o seu poder, de melhorar a sua situação, etc.)?

6) Ou é moderadamente sensível a estes progressos e pensa que nãovale a pena esforçar-se a procurar estas coisas?

7 — a) Dá muita atenção à qualidade das suas sensações? Interessa-seacentuadamente pelas formas, cores e sons?

6) Ou as formas sensíveis não são para si senão «informações» sobrenatureza dos objectos (por exemplo, interessa-se pelo sentido daspalavras ouvidas sem dar grande atenção ao timbre das vozes, pelautilidade dum objecto, mais do que pela sua cor, etc.)?

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8 — a) Enternece-se, comove-se facilmente com a sorte dos outros?6) Ou fica calmo, mesmo quando procura efectivamente ajudá-los?

9 — a) Acontece-lhe muitas vezes procurar resolver um problema despro-vido de toda a aplicação prática?

6) Ou não se interessa senão pelos resultados positivos e afasta-se doque não conduz a nada de concreto?

10 — a) Não se importa que mexam nos seus objectos pessoais?6) Ou ainda que injustificadamente, sente a sua intimidade devassada,

e é-lhe desagradável a ideia de que alguém possa ter visto ou lido,objectos ou papéis, que podem até não ter nada de secreto?

11 — a) Entusiasma-se ou indigna-se facilmente?6) Ou aceita as coisas, tranquilamente, como são?

12 — a) É-lhe necessário um esforço nítido para passar da ideia ao acto,da decisão à execução?

6) Ou executa imediatamente e sem dificuldade o que decidiu?13 — a) Encara tudo «o que pode acontecer» e prepara-se cuidadosamente

(equipamento minucioso, estudo dos itinerários, previsão de inciden-tes possíveis, etc.)?

b) Ou entrega-se à inspiração do momento?14 — a) Liga grande importância à exactidão, à precisão? Gosta das ideias

precisas, das missões bem definidas?b) Ou agrada-lhe o que é vago, indeterminado, aquilo que se traduz

por «nuances»?15 — a) Gosta de comandar, mesmo quando é necessário constranger os

outros a obedecer e forçar a sua obediência?b) Ou repugna-lhe impor aos outros a sua vontade, preferindo mano-

brar, seduzir?16 — a) Empresta de boa vontade os seus livros, os seus utensílios, os seus

instrumentos de trabalho?6) Ou não gosta de emprestar o que lhe pertence?

17 — a) Dá muita importância ao aspecto, ao sabor, daquilo que come? Comelentamente, saboreando? É guloso?

b) Ou come sem prestar grande atenção, «para se alimentar»?18 — a) Considera os sentimentos dos outros mais importantes do que os

actos que praticam?b) Ou pensa, ao contrário, que o que conta verdadeiramente são os

actos, os resultados?19 — a) Prefere as distracções que têm um carácter intelectual (estudo,

discussão de ideias, jogos de reflexão como o xadrez, etc.) ?6) Ou as distracções doutra ordem: físicas (desportos, excursões), so-

ciais (visitas, reuniões diversas) ou sentimentais (leituras roma-nescas, música) ?

20 — a) Agrada-lhe participar em reuniões, pertencer a grupos, (associa-ções, clubes, etc.) que lhe permitam intensificar ou estabelecerrelações?

6) Ou pelo contrário, prefere dar-se apenas com um pequeno númerode amigos escolhidos, e dificilmente alarga o círculo das suasrelações?

21 — a) É susceptível? Fica facilmente ferido com uma crítica um poucoviva, um reparo desagradável ou trocista?

6) Ou suporta a crítica sem ficar magoado?22 — a) Desencoraja-se facilmente diante das dificuldades ou diante de uma

tarefa que se anuncia demasiado fatigante?6) Ou, pelo contrário, sente-se estimulado pelas dificuldades e excitado

pela ideia do esforço a despender?23 — a) Tem princípios estritos em relação aos quais procura conformar-se?

b) Ou prefere adaptar-se às circunstâncias com maleabilidade?

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24 — a) Afasta viva e instintivamente tudo o que vem incomodá-lo quandoestá a trabalhar? Irrita-se contra toda a distracção?

b) Ou acolhe essas perturbações sem se irritar, apenas reagindo bran-damente?

25— a) É muito amável, muito atencioso, procura agradar àqueles comquem contacta?

6) Ou trata-os com simplicidade, por vezes até com uma certa rudez?a?26 — a) Tem o sentido do valor do tempo? Faz rapidamente o que tem

a fazer para poder passar a outra coisa?6) Ou é pouco sensível ao valor próprio do tempo e liga pouco impor-

tância às noções de rapidez e rendimento? (máximo de coisas feitasnum mínimo de tempo).

27 — a) Interessa-se pela preparação de iguarias, pelas receitas de cozinha?6) Ou isso é-lhe indiferente (não vendo, por exemplo, nas receitas,

se as suas funções o obrigam a ocupar-se disso, senão meios de darsatisfação aos outros ou de conseguir rápida e seguramente umresultado) ?

28 — a) Gosta dos animais como de seres tendo uma personalidade, inquie-tando-se com o que eles sentem?

b) Ou, sem lhes fazer mal, considera-os como gado, quer dizer, umpouco como coisas?

29 — a) Pensa que há mistérios a respeitar e que, em certos domínios, a ra-zão deve ceder lugar, renunciando a prosseguir a sua pesquisa?

b) Ou pensa que o respeito do mistério é, pelo contrário, uma faltade honestidade intelectual e, de certa maneira, um pecado contrao espírito?

30 — a.) Inicia facilmente uma conversa com uma pessoa desconhecida (narua, nas lojas, nos transportes públicos) ?

6) Ou raramente fala com pessoas desconhecidas, e quando alguémse lhe dirige responde o estritamente necessário (independentementeda maneira, amável ou não, como o faz)?

31 — a) Fica facilmente emocionado, com um acontecimento imprevisto?Sobressalta-se quando o chamam bruscamente? Empalidece ou coracom facilidade?

ò) Ou dificilmente se perturba?32 — a.) Gosta de sonhar, quer com o passado, quer com o futuro que poderia

vir, quer mesmo com factos absolutamente imaginários?6) Ou prefere agir, ou pelo menos fazer projectos concretos que prepa-

rem realmente o futuro?33 — a) É constante nos seus desígnios? Acaba sempre o que começou?

b) Ou abandona muitas vezes uma tarefa antes que esteja terminada(começando tudo, não acabando nada) ?

34 — a) Tem necessidade de analisar para compreender? É a partir do deta-lhe que* o problema, a máquina, o processo que lhe interessa se tornainteligível?

6) Ou basta-lhe apreender o conjunto?35 — a) Adopta espontaneamente as maneiras das pessoas no meio das quais

tem de viver?b) Ou conserva em todos os meios as suas maneiras habituais?

30 — a) É ciumento nas1 suas amizades, nas suas afeições?6) Ou é pouco acessível ao ciúme?

37 — a) O contacto da seda, das peles, do veludo é, para si, uma fonte deemoções vivas (agradáveis ou desagradáveis, pouco importa) ?

b) Ou interessa-se pouco por esta espécie de sensações?38 — a) Os outros interessam-lhe, essencialmente em relação àquilo que de-

seja pessoalmente realizar? Considera-os um tanto como instrumen-tos a utilizar ou obstáculos a afastar?

6) Ou, pelo contrário, «entra» nos pontos de vista deles esquecendo os

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seus, sentindo, por simpatia, o que eles sentem e procurando servi--los, mais do que servir-se deles?

39 — a) Interessa-se pelos factos concretos?6) Ou pelas ideias e teorias?

40 — a) Quando uma pessoa que apenas conhece superficialmente lhe falade si própria, sente que confia em si e considera isso um sinal deestima que procura retribuir compreendendo ou aconselhando?

b) Ou pensa que lhe fazem confidências apenas por uma questão deestado de espírito, de gosto de tagarelar, como fariam a outra pessoaqualquer, e chega a ficar incomodado se essas confidências tiveremcarácter íntimo?

41 — a) Entusiasma-se quando fala? Eleva a voz quando conversa? Expe-rimenta a necessidade de empregar palavras violentas ou termosmuito expressivos?

b) Ou fala sem pressa, de maneira calma, ponderada?42 — a) Faz o que tem para fazer imediatamente e sem que isso lhe custe

muito (escrever uma carta, resolver um assunto, etc.) ?b) Ou é levado a adiar, a «guardar» para o dia seguinte?

43 —a) É muito constante nas suas simpatias (continua com amizades deinfância, convive regularmente com as mesmas pessoas, os mesmosgrupos) ?

6) Ou muda muitas vezes de amigos (deixando, por exemplo, sem ra-zões graves, de ver pessoas com quem se dava)?

44 — a) É pontual, chegando mesmo por vezes adiantado para não faltara um encontro?

6) Ou chega frequentemente atrasado?45 — a) Pratica ou gostaria de praticar exercícios ou desportos violentos?

b) Ou teria repugnância em os praticar?46 — a) É muito caloroso a fazer valer os seus direitos, a reclamar o que

lhe é devido?b) Ou detesta reclamar e abandona facilmente o que poderia reivin-

dicar?47 — a) Gasta de se ver ao espelho para estudar as suas expressões? Vigia

os seus gestos, o tom da sua voz?b) Ou isso interessa-o mediocremente?

48 — a) Afeiçoa-se aos seus colaboradores, aos seus servidores, aos seuscamaradas de trabalho ao ponto de continuar as suas relações, mes-mo quando estas lhe são nitidamente desfavoráveis (não mandarembora um criado negligente, um empregado medíocre)?

ò) Ou não hesita em levar a cabo essas separações úteis (substituir umcolaborador, mudar de relações, etc.) ?

49 — a) Entre os romances prefere aqueles onde «se passa» alguma coisae onde todos os acontecimentos são contados em detalhe?

6) Ou os que permitem 'apreender o jogo dos mecanismos psicológicos,ou o valor duma ideia filosófica (moral, social, etc.) ?

50 — a) Quando tem qualquer preocupação gosta de se confiar, sente^senitidamente aliviada pelo facto de comunicar a alguém o que o ator-menta?

b) Ou apenas faz confidências às pessoas <a quem se sente intimamenteligado? Ou ainda, expõe o caso em termos gerais, evitando dar-lheum tom pessoal?

c) Ou guarda exclusivamente para si as suas preocupações, achandoque só a si dizem respeito?

51 — a) Fica perturbado (atrapalhado...) diante de uma nova tarefa?a) Ou aborda os problemas, as situações com calma?

52 — a) Toma decisões imediatas, mesmo nos casos difíceis?b) Ou fica indeciso hesitando muito tempo?

53 — a) Depois de um acesso de cólera (ou se nunca se encoleriza, depois

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de ter sofrido uma afronta) reconcilia-se imediatamente (tal comoantes, sem pensar mais nisso) ?

b) Ou fica algum tempo de mau humor?c) Ou é dificilmente reconciliavel (rancor persistente)?

54 — a) É meticuloso (no seu trabalho, no seu vestuário, na determinaçãodum facto que lhe interessa, etc.) ?

6) Ou é desprendido, pouco cuidadoso?55 — a) Sente a necessidade de ter o afecto de todos aqueles com quem con-

tacta, mesmo daqueles de quem não espera nada?b) Ou fica indiferente aos seus sentimentos e não procura o afecto

senão daqueles de quem gosta?56 — a) Interessa-se pelos resultados das suas realizações (sucesso obtido

no desporto, nos negócios, em sociedade, etc.) ? Segue de perto osseus progressos, seja em relação à sua actividade passada, seja emrelação aos outros?

6) Ou é indiferente a esses factos?57 — a) Gosta do luxo pelo luxo (quer dizer, independentemente das satisfa-

ções de vaidade que ele proporciona) ?6) Ou é pouco afectado pelo luxo?

58 — a) Gosta muito de crianças? Sente-se bem na sua companhia? Gostade participar nas suas brincadeiras?

6) Ou as crianças enervam-no?c) Ou são-lhe simplesmente indiferentes? Ou ainda, gosta delas duma

maneira teórica, «de longe»?59 — a) A vida de sociedade parece-lhe muito importante? Pensa que cada

um tem o dever de participar nela?b) Ou sente desconfiança pela sociedade e tende para se «afastar»,

para pensar com toda a liberdade, para lá das tradições, mas semceder também às solicitações da época e do meio?

60 — a) Quando tem uma grande alegria sente necessidade de comunicaro seu estado de espírito, de fazer os outros participar?

ò) Ou pensa que os outros não compreenderão os motivos da suaalegria porque isso não lhes diz respeito, e guarda para si os seussentimentos, contentando-se quando muito em participá-los a umnúmero restrito de amigos?

61 — a) Passa alternadamente da exaltação ao abatimento, da alegria à tris-teza e vice-versa, por um motivo insignificante ou mesmo sem motivoaparente?

ò) Ou tem o humor constante?62 — a) Está geralmente agitado, mexe-se muito (gesticular, levantar-se

bruscamente, ir e vir dentro dum quarto) independentemente de todaa emoção forte?

6) Ou está geralmente calmo, quieto, quando uma emoção não o agita?63 — a) Tem hábitos regulares aos quais é muito apegado? Aprecia o re-

torno, a repetição, de certos factos?b) Ou não gosta do que é habitual e previsto com antecedência, sendo

a surpresa para si um elemento essencial de satisfação?64 — a) Sente o tempo como qualquer coisa de contínuo, correndo sem in-

terrupção e levando tudo com ele?b) Ou o tempo parece-lhe sobretudo a sucessão de instantes relativa-

mente fixos, separados uns dos outros e sucedendo-se diante dumaconsciência imóvel?

65 — a) Sabe impôr-se? Toma por si próprio o comando dum grupo, a direc-ção dum trabalho, a organização duma reunião social?

6) Ou não consente em guiar os outros (se isso lhe acontece) senãoquando eles lho pedem ou, pelo menos, quando aceitam espontanea-mente a sua direcção?

66— a) Gosta de ser o primeiro em toda a parte? De passar à frente dosoutros?

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6) Ou é levado a apagar-se diante dos outros?c) Ou é completamente indiferente às precedências?

67 —a) Gosta de acariciar as crianças ou os animais?b) Ou isso é-lhe indiferente em si (quer dizer, independentemente dos

sentimentos ternos que possa experimentar a seu respeito) ?68 — a) Prefere que gostem de si a que lhe obedeçam?

b) Ou há, para si, coisas bem mais importantes do que o amor, a ami-zade, e cuja realização exige que se ponham esses sentimentos emsegundo plano?

69 — a) Experimenta diante de problemas complexos um sentimento de hu-mildade? Ou, pelo contrário, tem por vezes movimentos de orgulhodiante dos progressos da ciência ou diante das suas próprias des-cobertas?

b) Ou estes sentimentos (humildade ou orgulho) parecem-lhe deslocadosaqui, onde se trata simplesmente de compreender?

70 — a) Quando participa numa reunião, num grupo, sente que o seu com-portamento mudou por influência do ambiente do grupo (anima-se,excita-se, participa nos sentimentos colectivos, etc.) ?

ò) Ou comporta-se sempre do mesmo modo, não sendo influenciado, oumesmo fechando-se perante o grupo?

71 — a) Acontece-lhe muitas vezes ter o espírito obcecado por dúvidas,escrúpulos a propósito de actos sem importância? Conserva muitasvezes no espírito um pensamento perfeitamente inútil e que o im-portuna?

b) Ou apenas excepcionalmente conhece este penoso estado de preo-cupação?

72 — a) Nunca hesita em empreender uma modificação útil mesmo quandosabe que ela exigirá de si um grande esforço?

6) Ou recua diante do trabalho a empreender e prefere contentar-secom o statu quo?

73 — a) Gosta da ordem, da simetria, da regularidade?6) Ou acha a regularidade, o método, aborrecidos e tem necessidade

de encontrar em toda a parte a fantasia?74 — a) Tem necessidade de levar até à perfeição aquilo que empreende?

b) Ou é menos exigente e contenta-se do que, por alto, correspondemais ou menos ao que deseja?

75 — a) Gosta do risco? Sente um prazer particular em afrontar um perigo?6) Ou receia os empreendimentos incertos (o que não quer dizer que não

tenha coragem frente a um perigo que não procurou) ?76 — a) É naturalmente desconfiado?

b) Ou espontaneamente confiante?77 — a) Tem necessidades estéticas profundas? O valor da arte é, a seus

olhos, tão grande como o da moral?b) Ou a arte tem na sua vida apenas um lugar secundário e não a

considera senão como um meio agradável de se distrair?78 — a) Quando sente afeição por alguém, sente-se levado a exprimi-la por

palavras ternas, por atenções delicadas?6) Ou antes por actos de amabilidade positiva (prestar serviço, infor-

mar, ajudar, etc.)?79 — a) Gosta das pessoas simples, das poesias fáceis de compreender, das

histórias sem complexdade?b) Ou depressa se aborrece com as coisas demasiado simples e prefere

as obras e as pessoas que dão à inteligência a ocasião de se exercerintensamente?

80 — a) Comunica geralmente os seus projectos, intenções, decisões impor-portantes, esperando que lhe dêem conselhos úteis ou apenas parase sentir acompanhado?

b) Ou evita cuidadosamente comunicar projectos e decisões importantes,

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pensando que não há qualquer vantagem ou que isso lhe poderiaser mesmo prejudicial?

81 — a) Acontece-lhe por vezes estar tão violentamente emocionado queaquilo que quer fazer se torna quase impossível (medo que impedeos movimentos, timidez que o impede de falar, etc.)?

ò) Ou isso só lhe acontece raramente?c) Ou isso nunca lhe acontece?

82 — a) Quando deu ordens para um trabalho, desinteressa-se da execução,sentindo que se desembaraçou duma preocupação?

b) Ou vigia esta execução de perto, assegurando-se que tudo está bemfeito nas condições e no momento requerido?

83 — a) Prevê com antecedência o emprego do seu tempo e das suas ener-gias? Gosta de fazer planos, horários, programas?

6) Ou inicia a acção sem uma regra precisa, fixada com antecedência?84 — a) É decisivo, até mesmo categórico, nas suas afirmações e nos seus

projectos?6) Ou evita fixar-se, procurando compensar uma ideia por outra,

recusando-se a ligar-se a alguma?85 — a-) Gosta que o consolem, que o lamentem?

6) Ou detesta que o consolem e sente-se ferido quando têm piedadede si?

86 — a) Interessa-se pelo valor dos objectos? Conserva muito tempo a lem-brança do preço dos objectos que comprou?

b) Ou o valor material interessa-lhe pouco, e depressa esquece o preçoda compra?

87 — a) É muito sensível ao ambiente no qual se desenrola a sua existência(tapeçarias» móveis, decoração) ? Por exemplo, ser-lhe-ia difícil vivernuma casa que achasse feia?

6) Ou isso tem menos importância,, aos seus olhos, que o carácter prá-tico, cómodo, higiénico, etc., da instalação?

88 — a) Tem necessidade de ver frequentemente os seus amigos?b) Ou fica muito tempo, x>or vezes, sem os ver (sem que isso, de resto,

enfraqueça necessariamente a sua amizade)?89 — a) Experimenta a necessidade de analisar os sentimentos dos seus ami-

gos e de procurar compreender as obras de arte que admira?b) Ou basta-lhe abandonar-se ao prazer que lhe dá a sua presença ou

a sua contemplação?90 — a) Sente frequentemente necessidade de sair, de falar, de ver pessoas,

de estar acompanhado?6) Ou prefere isolar-se, gosta de passar sozinho dias inteiros, de dar

sossegados passeios solitários, etc?91 — a) Tem frequentemente o sentimento de ser infeliz?

6) Ou está geralmente contente com a sua vida? Ou ainda quando ascoisas não correm como quer, pensa mais no que seria necessárioemendar, do que nos seus próprios sentimentos?

92 — a) Gosta mais de ver fazer do que fazer (achar agradável ver muitasvezes e durante muito tempo um jogo que não se pratica, porexemplo) ?

b) Ou gosta mais de fazer do que de olhar, o simples espectáculo de-pressa se tornando aborrecido ou incitando-o a passar à acção?

93 — a) Quando adoptou uma opinião agarra-se a ela com obstinação?6) Ou facilmente se convence e se deixa seduzir pela novidade de uma

ideia?94 — a) É atreito às repetições, aos. gestos várias vezes repetidos, às ideias

fixas?b) Ou pelo contrário, as suas ideias são fluentes, nunca absolutamente

idênticas ao que foram no passado e como que afogadas na cor-rente da consciência e da vida?

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95 — a) Tem um grande desejo de independência e é-lhe difícil submeter-sea uma direcção exterior?

b) Ou aceita sem esforço ser guiado, dirigido, adapta-se com facili-dade à maneira de ver e de trabalhar dum chefe, dum mestre,dum patrão?

96 — a) Tem vontade de tirar partido de todas as ocasiões que se apresentam,mesmo se não deseja particularmente o que estas lhe oferecem, esomente para «aproveitar a ocasião»?

b) Ou deixa passar com indiferença as ocasiões cujo objectivo, não lheinteressava anteriormente?

97— a) Repara naturalmente no vestuário dos seus amigos (cor, forma,grão de tecido, etc.) ?

6) Ou não presta atenção a isso?98 — a) Considera penoso trabalhar num meio indiferente ou hostil?

b) Ou isso não o afecta sensivelmente?99 — a) Em presença dum aparelho ou duma. máquina que não conhece, inte-

ressa-lhe sobretudo as aplicações que podem ter?b) Ou interessa-lhe o engenho do mecanismo?c) Ou os princípios que aí estão aplicados?

100 — a) Sente-se atraído pelas grandes manifestações colectivas, pelos ceri-moniais que acompanham os actos solenes — paradas militares,festas religiosas, etc. (independentemente dos raciocínios que possafazer sobre o assunto)?

b) Ou fica indiferente a essas manifestações, a essas cerimónias, vendonelas apenas um formalismo que não o afecta (também independen-temente das suas ideias sobre o assunto, isto é, pode, por exemplo,achar necessários esses formalismos) ?

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