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i Índice Agradecimentos............................................................................................................................. ii Resumo......................................................................................................................................... iii Abstract ......................................................................................................................................... v Índice de Tabelas...........................................................................................................................vi Lista de Abreviaturas ...................................................................................................................vii Introdução ..................................................................................................................................... 1 Metodologia .............................................................................................................................. 6 Revisão de Literatura ................................................................................................................ 9 Capítulo I..................................................................................................................................... 16 O Sputnik ................................................................................................................................ 19 A Crise dos Mísseis de Cuba................................................................................................... 27 A conquista da Lua.................................................................................................................. 36 A década de 70 e 80: os Tratados SALT ................................................................................. 39 A Guerra das Estrelas .............................................................................................................. 45 A Guerra do Golfo de 1991 ..................................................................................................... 47 Capítulo II ................................................................................................................................... 51 China no Espaço as origens.................................................................................................. 51 China no Espaço: o que a motiva? .......................................................................................... 55 Relações Internacionais espaciais da China ............................................................................ 62 1. China versus Europa.................................................................................................... 62 2. China versus EUA ....................................................................................................... 64 3. China versus América do Sul ...................................................................................... 67 4. China versus África ..................................................................................................... 70 5. China versus Ásia ........................................................................................................ 71 Conclusão .................................................................................................................................... 75 Bibliografia ................................................................................................................................. 77 Monografias ............................................................................................................................ 77 Artigos ..................................................................................................................................... 79

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i

Índice

Agradecimentos ............................................................................................................................. ii

Resumo ......................................................................................................................................... iii

Abstract ......................................................................................................................................... v

Índice de Tabelas ...........................................................................................................................vi

Lista de Abreviaturas ................................................................................................................... vii

Introdução ..................................................................................................................................... 1

Metodologia .............................................................................................................................. 6

Revisão de Literatura ................................................................................................................ 9

Capítulo I ..................................................................................................................................... 16

O Sputnik ................................................................................................................................ 19

A Crise dos Mísseis de Cuba................................................................................................... 27

A conquista da Lua .................................................................................................................. 36

A década de 70 e 80: os Tratados SALT ................................................................................. 39

A Guerra das Estrelas .............................................................................................................. 45

A Guerra do Golfo de 1991 ..................................................................................................... 47

Capítulo II ................................................................................................................................... 51

China no Espaço – as origens .................................................................................................. 51

China no Espaço: o que a motiva? .......................................................................................... 55

Relações Internacionais espaciais da China ............................................................................ 62

1. China versus Europa.................................................................................................... 62

2. China versus EUA ....................................................................................................... 64

3. China versus América do Sul ...................................................................................... 67

4. China versus África ..................................................................................................... 70

5. China versus Ásia ........................................................................................................ 71

Conclusão .................................................................................................................................... 75

Bibliografia ................................................................................................................................. 77

Monografias ............................................................................................................................ 77

Artigos ..................................................................................................................................... 79

ii

Agradecimentos

Estou grata a todos os meus familiares pelo incentivo recebido ao longo destes anos. Em

especial aos meus pais: obrigada pelo amor, alegria e atenção sem reservas...

Agradeço à Mestre Margarete Couto pela ajuda, aconselhamento e por ter sempre

acreditado que seria possível.

Ao Professor Doutor António Horta Fernandes, orientador da dissertação, agradeço o

apoio, a partilha do saber e as valiosas contribuições para o trabalho.

O meu profundo e sentido agradecimento a todas as pessoas que contribuíram para a

concretização desta dissertação, estimulando-me intelectual e emocionalmente.

iii

Resumo

O lançamento do Sputnik pela União Soviética deu ao espaço extra-

atmosférico uma nova dimensão política e estratégica. Desde então, o espaço tem sido

usado de acordo com interesses de poder a curto prazo pelas várias potências espaciais.

O desafio colocado ao futuro do espaço centra-se na existência de duas visões que

competem entre si: uma promove o uso pacífico do espaço e a cooperação internacional

na sua exploração e considera que um regime legal multilateral é a melhor forma de

equilibrar os vários interesses em jogo e evitar uma hegemonia que coloque em risco o

acesso ao espaço por toda a comunidade internacional. A segunda visão vê o espaço

numa lógica de interesse nacional, onde é necessário negar o uso do espaço por

adversários.

Contudo, nos últimos anos têm-se assistido a um maior envolvimento de países

que até agora não tinham aspirações no espaço, como é o caso da Nigéria, que com o

apoio de potências espaciais, neste caso a China, alcançaram o clube espacial.

Os avanços tecnológicos, o crescente interesse na promoção do espaço e os

investimentos privados realizados na área espacial, demonstram que o espaço se tornou

num dos elementos essenciais para a não dependência de outros quer na política interna

quer externa por parte de um Estado além de conferir um respeito acrescido pelas outras

nações pelas implicações estratégicas dos sucessos espaciais.

Pelo exposto, este focará os motivos que levam as nações a procurar uma

posição no espaço, mesmo que isso signifique a violação da regulamentação

internacional existente acerca do uso pacífico do espaço, assim como as consequências

que poderá trazer para a segurança internacional uma militarização do espaço. Pretende

ainda demonstrar que o espaço é uma fonte importante de soft power para países como a

China. Este tópico é importante e atual em matéria de segurança internacional, tendo em

conta os mais recentes episódios: anúncio de um lançamento pela Coreia do Norte, fim

do programa vaivém da National Aeronautics and Space Administration (NASA),

entrada em funcionamento do Galileu. As reações mundiais a estes episódios

demonstram que dependência do espaço é cada vez maior, não só a nível militar, mas

também a nível económico, mas também é fonte de preocupação de todos os que se

ocupam com questão de segurança nacional e internacional. O espaço faz parte do dia-a-

iv

dia de cada Estado e é um dos pontos mais vulneráveis da segurança económica e

militar de um Estado.

Palavras-Chave: Astropolítica, China, Guerra Fria, Ciência Politica, Política Espacial

v

Abstract

The launch of the Sputnik by the Soviet Union gave the outer space a new

political and strategic dimension. Since then the space has been used by various spatial

powers in accordance with their short term power interests. The challenge for the future

of the space is the existence of the two competing visions: one promotes the peaceful

use of the space and international cooperation in its exploration and considers that a

multilateral legal regime is the best way to balance the various interests in questions and

to avoid a hegemony that puts at risk the access to the space by the whole of the

international community. The second view sees the space in the national interest where

it is necessary to deny the use of space by its opponents.

However, in recent years we have seen a greater involvement of countries that

until now did not have spatial aspirations, such as Nigeria, which with the support of

other spatial powers, China in this instance, created the spatial club.

The technological advances, the increasing interest in promoting the space and

the private investment in this area, demonstrate that the space has become an essential

element for the non-dependency on others, both in the domestic policy as well as

foreign policy, by a country besides commanding a great respect by other countries for

the strategic implementation of the spatial successes.

Therefore, this thesis will focus on what motivates a nation to seek a position in

space, even if that means a violation of the existing international regulations regarding

the peaceful use of space, as well the consequences it may bring to the international

security by the militarization of the space. It is also intended to demonstrate that the

space is an important source of soft power for countries such as China. This topic is

important and current with regard to the international security, in view of the most

recent events: the announcement by North Korea of a launch into space, the end of the

NASA space programme, Galileo commencing operations. The international reaction to

these events demonstrates that the dependency on space is increasing, not only on a

military level but also economic, but it is also a source of concern for everyone dealing

with national and international security. The space is part of the daily life of each State

and is the most vulnerable aspect of the economic and military security of a Nation.

Keywords: Astropolitics, China, Cold War, Political Science, Space Policy

vi

Índice de Tabelas

Tabela 1: Código dos projetos do programa espacial Chinês...................................................... 53

Tabela 2: Rating Nações ............................................................................................................. 58

Tabela 3: A China vista por outros países ................................................................................... 58

Tabela 4 - Projectos Cooperação entre China e Europa .............................................................. 64

vii

Lista de Abreviaturas

ABM - antimísseis balísticos

ASAT - arma antissatélites

COPUOS - Committee on the Peaceful Uses of Outer Space

CBERS - Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres

CTBT - Comprehensive Nuclear Test Ban Treaty

CE - Comissão Europeia

CNN - Cable News Network

DSP - Defense Support Programm

ESPI - European Space Policy Institute

EUA - Estados Unidos de América

ESA - Agência Espacial Europeia

FRS - Foundation pour la Recherche Stratégique

GPS - Global Positioning System

ICBM - Intercontinental Ballistic Missile

IFRI - Institut Français des Relations Internationales

INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

ITAR - International Traffic in Arms Regulations

IESD - Identité Européenne de Sécurité et de Défense

KGB - Comité de Segurança do Estado

MRBM - Mísseis Balísticos de Médio Alcance

NASA - National Aeronautics and Space Administration

NATO/OTAN - Organização do Tratado do Atlântico Norte

NSA - National Security Agency

NKVD - Comissariado do Povo para Assuntos Internacionais

PRC - Pew Research Center

viii

SIGINT - Signals Intelligence

URSS - União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

1

Introdução

A política espacial, ou comummente apelidada de Astropolítica, tem sido uma

área de estudo que tem ganho relevo nos últimos anos, destacando-se o seu estudo nos

Estados Unidos de América (EUA), mas também a ganhar a alguma relevância na

França, Itália, Reino Unido e Alemanha. Trata-se de uma área da ciência política e das

relações internacionais que aborda a exploração espacial do ponto de vista político,

geopolítico e da estratégica. Nesta área de estudo aparentemente peculiar e particular

são debatidas temáticas transversais relacionadas com política internacional, segurança

internacional, militarização e estratégia militar.

No auge da exploração espacial, o Presidente norte-americano John F.

Kennedy afirmou que “quem dominar o Espaço dominará a Terra” e, tendo isto em

mente, importa analisar as dinâmicas e as alterações da política internacional no

caminho para o domínio do e no Espaço. Para além de um interesse sociopolítico, não

se pode deixar de verificar a dependência das sociedades atuais dos meios espaciais e

das suas aplicações, o que tanto demonstra a sofisticação e modernização desta

sociedade como a sua vulnerabilidade. Este constante jogo de equilíbrio entre

modernização tecnológica e vulnerabilidade torna a dinâmica da política internacional

particularmente interessante de ser estudada e analisada.

Comparado com, por exemplo as ancestrais técnicas de medicina chinesa, a

história espacial é bem mais curta. Contudo, a exploração espacial vai já na quarta

geração: a primeira começou ainda durante a II Guerra Mundial, a segunda geração é

identificada com as missões era Apolo e a chegada do Homem à Lua, a terceira geração

é pós-Apolo, e por fim a geração pós-Guerra Fria. Esta última geração, em oposição à

primeira e à segunda, não fala sobre o Espaço como sendo um sonho, mas como sendo

uma ferramenta.1

1 JONHSON-FREESE, Joan e HANDBERG, Roger, (1997), “Space the dormant frontier – Changing the

paradigma for the 21st century”, London, Praeger, p. 264

2

Quando, em plena Guerra Fria, o Sputnik é lançado pela União das Repúblicas

Socialistas Soviéticas (URSS) estava-se longe de perceber as implicações que este

acontecimento traria para a dinâmica mundial, quer a nível civil quer a nível politico e

militar. Nesta altura da conquista espacial, a disputa pelo domínio do Espaço centrava-

se apenas entre as duas superpotências de cada lado da cortina de ferro, EUA e URSS.

Atualmente, a disputa foi consideravelmente alargada a mais intervenientes, sejam eles

Estados ou organizações governamentais ou entidades privadas.

Porém, durante a Guerra Fria, EUA e URSS não eram os únicos a desenvolver

programas espaciais pois vários países europeus mesmo estando a passar a fase da

reconstrução, investiam igualmente no desenvolvimento de futuras capacidades

espaciais, tais como: França; Alemanha; Itália e Inglaterra. Estes países europeus no

pós-guerra começaram a investir e a desenvolver o seu próprio programa espacial ainda

na década de 1950, em simultâneo com os primeiros passos da cooperação europeia. Do

outro lado do globo, na Ásia, estados como a China e o Japão começaram igualmente a

desenvolver tecnologia espacial, estabelecendo objetivos e prioridades neste campo

durante a década de 1960. Em alguns dos casos os projetos destes Estados fizeram-se à

custa de uma estreita cooperação com uma das duas superpotências. Isolado, o Brasil foi

um pioneiro no investimento tecnológico em meios espaciais e, apesar de tardio, tem

neste momento um dos programas espaciais mais desenvolvidos e antigos da América

do Sul.

O inigualável crescimento de meios envolvidos e/ou dependentes de tecnologia

espacial, que mantêm em equilibro periclitante a (des)confiança entre parceiros e meios

económicos consideráveis, levou-nos a debruçar-nos sobre o novo ator de relevo nesta

matéria: a China. Procurando perceber não só como surgiu, em que ambiente político-

histórico, mas também qual o seu percurso num meio altamente competitivo e qual as

suas perspetivas futuras.

O tema central debatido nesta dissertação: “de que forma a exploração

espacial influencia e é usada na política internacional?”; é de extrema importância

no contexto das relações internacionais. De facto, questões relacionadas com ativos

espaciais têm estado na ordem do dia, porque a presença dos avanços tecnológicos da

exploração espacial no dia-a-dia da sociedade é já tão vincada, que muitos de nós já

3

nem concebe viver sem elas, por exemplo, o uso quotidiano e imprescindível do

telemóvel.

Em relações internacionais, quando dois ou mais Estados estão em conflito

eminente apesar de nenhum desses Estados realmente desejar o confronto, está-se

perante um dilema de segurança. Robert Jervis escreveu sobre este tipo de situações em

que um Estado com o receio de ser dominado ou ultrapassado de alguma forma toma

decisões que nem sempre são do seu melhor interesse. O que Jervis e outros autores

escreveram e estudaram descreve o que se passa na área espacial. As ações dos atores

internacionais poderão ser melhor entendidas sob o dilema do prisioneiro2 mesmo

quando se trata de formas de adquirir soft power sobre terceiros.

Durante a Guerra Fria a utilização da exploração espacial como fonte de

prestígio, poder e supremacia sobre o oponente ficou bem patente. O que se passou, e

será sucintamente descrito nesta dissertação mostra, de forma clara, o dilema do

prisioneiro ou pelo menos aquilo que o jogador acha que atingirá com a sua decisão de

seguir sozinho: “cada jogador, levando unicamente em conta o seu próprio interesse,

recebe uma recompensa superior se abandonar a cooperação do que se cooperar”.3 Não

obstante a cooperação ser benéfica e trazer vantagens às partes envolvidas, durante a

Guerra Fria URSS e EUA optaram por competir. Ainda nos dias de hoje, e apesar das

alianças que se formam com outros parceiros na exploração espacial, a nível macro,

continua a refletir esta realidade. É o caso da China e dos EUA que é enunciado na

segunda parte desta dissertação que evitam cooperar para de certa maneira garantir um

nível de supremacia mundial que lhes dê vantagem assimétrica sobre o outro. A nível

regional, o caso asiático também enunciado na segunda parte, é demonstrativo da

procura de vantagem comparativa em relação aos outros jogadores espaciais.

Não existe nenhuma solução que seja a melhor para todos os intervenientes e

por isso o dilema do prisioneiro é uma boa analogia para a política espacial. Isto porque

2 JONHSON-FREESE, Joan, (2007 - 1) “Space as a strategic asset”, Columbia University Press, E-Book,

Kindle version, loc 229 3 DOUGHERTY, James E e PFAKTZFRAGG, Robert L, (2003) “Relações Internacionais – As teorias

em confronto”, Gradiva, p. 720

4

neste modelo há tanto de incentivos defensivos como de cooperação. Se um Estado vê

outro como sendo um potencial adversário ou mesmo um adversário, isso irá influenciar

a sua intenção e até postura.4 Nos últimos 50 anos de exploração espacial encontra-se

inúmeros exemplos disto mesmo: durante a Guerra Fria, claramente entre EUA e URSS,

nos dias de hoje entre EUA e China, e até entre EUA e União Europeia.

O estudo da política internacional do Espaço permite corrigir a ideia

generalizada da opinião pública que a exploração espacial é levada a cabo apenas ou

sobretudo para fins científicos, mais do que por políticas realistas de ideologias e

nacionalismo, como forma de propaganda e ajuda externa. Não se deverá descurar que o

objetivo primário que conduziu ao avanço nesta área centrou-se sobretudo na segurança

nacional e a procura dessa segurança através da aquisição de capacidades militares.

Mais de 50 anos de exploração espacial demonstram que esta tem sido um espelho da

tensão entre os países mais ricos, entre os países mais industrializados e a evolução de

perceções de segurança que integram dimensões sociais, ambientais e económicas.5

A nível estratégico, os ativos espaciais são usados para controlo de armamento

e sistemas defensivos de aviso prévio. Mas o Espaço oferece também outro tipo de

capacidades: recolha de informação, melhorias na área da educação, expansão dos

recursos médicos, criação de emprego, gestão e monitorização de recursos naturais entre

outros.6 Considerando que a exploração espacial nos traz toda a informação que

utilizamos diariamente, conscientemente ou não, assim como formas alternativas de a

interpretar através de satélites e da revolução computacional.7

Em 2007, o teste antissatélite da China veio demonstrar o quão vulnerável os

sistemas espaciais estão e, consequentemente, a segurança e bem-estar da Humanidade,

não só a fatores naturais (como os meteoritos, radiações solares, etc.) mas também a

fatores humanos e vontades políticas. O que revela, sem sombra de dúvidas, a

importância de conhecer e controlar o Espaço.

4 JONHSON-FREESE, Joan, (2007 -1), ibid, loc 248-264

5 SHEEHAN, Michael, (2007), “The international politics of space”, Routledge, New York, p. 1

6 JONHSON-FREESE, Joan, (2007 - 1) ibid, loc 248

7 SHEEHAN, Michael, (2007) ibid, p. 3

5

Ainda há quem negue a existência da militarização do Espaço como sendo o

objetivo primário da exploração espacial, desde dos seus primórdios na era moderna.

Mas, concordamos com a maioria de que se trata de uma perspetiva enganadora. O

Espaço sempre foi, e ainda é, militarizado. As considerações militares estiveram desde o

início no cerne dos esforços para a conquista espacial. A tentativa de manter o Espaço

desmilitarizado poderá ser desejável, mas não menos utópica. Contudo, se de facto for

conseguida, poderá significar um total desinteresse do investimento público nesta área.8

A ambiguidade tecnológica espacial, que tanto pode ser usada para fins civis

pacíficos, como fins militares bélicos, levanta questões importantes no âmbito do

dilema do prisioneiro: um míssil tanto pode ser usado para destruir outro míssil como

um satélite, que poderá ser de comunicações civis como de recolha de informação

classificada para uso militar.

A exploração espacial e a política civil e militar andaram sempre de mãos

dadas. Para provar essa declaração basta considerar o que fez com que os programas

espaciais avançassem foram objetivos políticos e a forma como foram e são

implementados revelam as ideologias politicas e nacionais na altura e no momento, quer

fosse procura de poder político, internacionalização do comunismo, integração europeia,

ou outro ponto qualquer.9

Enquanto a política ajudou a moldar os programas espaciais, também a

exploração espacial ajudou a moldar a forma de fazer política. Nas palavras de Henry

Lambright: “Policy shapes technology, which in turn influences policy”10

. A ligação

entre ambos os vectores tornou-se indissociável nos últimos cinquenta anos. Desde o

lançamento do Sputnik à realidade de fazer guerras assentes em tecnologia espacial, do

Homem na Lua à utilização do Espaço como forma de garantir a satisfação de

necessidades de recursos de nações, a exploração espacial e a forma de fazer política

8 SHEEHAN, Michael, (2007), ibid , p. 2

9 SHEEHAN, Michael, (2007), ibid, p. 2

10 LAMBRIGHT, W. Henry (ed), (2003), “Space policy in the 21

st century”, John Hopkins University

Press, p. 7

6

internacional e até mesmo política nacional (embora esta não seja o foco principal nesta

dissertação), ficará demonstrada nos capítulos seguintes.

Durante a Guerra Fria, presidentes norte-americanos como J. F. Kennedy

elevaram a exploração espacial ao limite para aumentar o prestígio e credibilidade

americana através da suas capacidades tecnológicas, tais como colocar um Homem na

Lua, por exemplo. Porém, nessa mesma altura foram tidos em consideração outro tipo

de projetos para atingir o mesmo fim, por exemplo a dessalinização dos Oceanos, que

foram rejeitados. O Espaço representa a última fronteira, a fronteira que ainda não havia

sido transposta, e por esse misticismo inerente ao desconhecido a vontade política optou

por mostrar que era capaz de dominá-la.11

Tal como Vasco da Gama e Cristóvão Colombo definiram uma Era com as

suas descobertas, a conquista e domínio do Espaço define a Era em que vivemos: a Era

Espacial. Com a Era Espacial, a Humanidade conseguiu fontes de poder inigualáveis,

mas também experiência e conhecimento e, mesmo que nem sempre esteja

completamente ciente disso, uma vulnerabilidade humana, social e política sem

precedentes.

Metodologia

Preferindo um esquema que favoreça a clareza de apresentação dos

conhecimentos e estabeleça uma linha cronológica que reflita adequadamente o impacto

da Astropolítica, optou-se por estruturar esta dissertação em duas partes distintas.

Procuramos, assim, garantir uma abordagem mais lata daquilo que foi a evolução da

relação entre exploração espacial e política internacional. Acreditamos que esta escolha

de metodologia de apresentação permita uma retrospetiva histórica que favoreça uma

melhor compreensão do surgimento da influência da exploração espacial na política

internacional, ainda durante a Guerra Fria. E, de que forma a política internacional

11 JONHSON-FREESE, Joan, (2007 - 1) ibid, loc 284

7

serviu como pedra basilar ao desenvolvimento tecnológico potenciado pela conquista do

Espaço.

Assim, e considerando o facto da corrida ao Espaço entre os EUA e a URSS

ser a mais emblemática, documentada e exemplificativa desta relação entre Espaço e

política, a primeira parte é-lhe dedicada.

Na segunda parte, entramos no que tem acontecido nos anos após a Guerra Fria

e focando mais na atualidade, utilizando como referência o caso paradigmático de

entrada na corrida a todo gás da China. De facto, com o fim de uma época de relevo

político na História mundial recente, a corrida ao Espaço a duas velocidades vivida

durante a Guerra Fria também chega ao fim. Em parte porque a URSS deixa de ter

condições políticas e económicas para continuar a investir de forma competitiva face

aos EUA. Durante algumas décadas, e apesar de haver outros programas espaciais com

progressos interessantes, como é o caso europeu, a verdade é que nenhum deles estava

tão avançado ou tecnologicamente tão independente como o americano. A China com o

seu primeiro voo tripulado em 2003, tornou-se num forte candidato a superpotência dos

tempos modernos capaz de igualar e talvez superar os EUA em muitas áreas, incluindo

a área espacial. Neste momento, os EUA mantêm a liderança em termos tecnológicos e

de know-how na área espacial, mas com os constrangimentos orçamentais e as

mudanças de prioridades politicas desde 2001, colocaram-se numa posição mais

vulnerável ao, por exemplo, dependerem da Rússia ou, mais recentemente, de privados

para realizar lançamentos orbitais.

Em muitas áreas a China tem avançado rapidamente para lugar de pole position

nos últimos 10 anos, a conquista das tecnologias espaciais é uma dessas áreas onde o

gigante asiático tem primado pela iniciativa e competitividade. Os seus avanços não só

tecnológicos, mas também sociológicos, em conjugação com as opções políticas e as

limitações orçamentais americanas tornam muito provável que nos próximos 10 anos o

mundo assista a uma segunda corrida espacial, desta vez entre a China e os EUA.

Para dar um panorama mais claro da China e da forma como usa o seu recém-

adquirido poder espacial para conseguir bens e meios estratégicos adequados à sua

ascensão a superpotência, iremos analisar de forma necessariamente sucinta, as relações

entre a China e os seus parceiros/ rivais mais prementes na América do Sul, na África,

os EUA, na Europa e os seus vizinhos asiáticos (Índia e Japão).

8

A exploração espacial que, desde 1957, é utilizada como fonte de poder através

do prestígio, do avanço tecnológico, das indústrias que são criadas, da geração de

recursos humanos qualificados. A exploração espacial gera tanto admiração como

inveja por parte dos restantes Estados e traduz-se, naquilo a que o cientista político

norte-americano Joseph Nye Jr apelidou de, soft power.

Ao longo desta dissertação pretende-se demonstrar que o poder político usou a

exploração espacial como fonte de soft power, quer para reunir mais aliados

ideológicos, como aconteceu na Guerra Fria, quer seja para conseguir os recursos que se

necessita na ascensão a superpotência e o reconhecimento nacional num regime

ditatorial. A questão central que se pretende responder com este ensaio é: de que forma

a exploração espacial influencia e é usada na política internacional?

Para responder a esta questão e às questões subjacentes, recorreu-se à recolha

qualitativa de bibliografia, método de investigação em ciências sociais proposto por

Raymond e Quivy em “Manual de Investigação em Ciências Sociais”. O percurso

metodológico utilizado consistiu na pesquisa bibliográfica e documental na área das

relações internacionais, mais em concreto da política espacial, geopolítica e estratégias

espaciais. Recorreu-se, por isso, a autores de referência nesta área académica específica,

sobretudo ingleses, norte-americanos, franceses e chineses. De realçar, que sendo esta

área académica pouco ou nada explorada em Portugal, traduz-se na quase inexistência

de bibliografia em português que incida especificamente nesta área. Note-se igualmente,

que por constrangimentos linguísticos, optou-se por bibliografia em inglês, francês e

português, o que significou que mesmo as obras de autores chineses tiveram que ser

selecionadas pelo critério de existir tradução de mandarim para uma das três línguas

atrás referidas.

Assim, optou-se preferencialmente pela leitura de autores de renome na área de

Astropolítica, como Joan Jonhson-Freese, Laurence Nardon, Everett C. Dolman, entre

outros, ou de trabalhos de investigação desenvolvidos por centros de investigação

conhecidos internacionalmente pela qualidade e rigor das suas publicações como, o

Institut Français des Relations Internationales (IFRI), o Pew Research Center (PRC), a

RAND e o European Space Policy Institute (ESPI), entre outros.

9

Após as leituras realizou-se um resumo crítico das ideias chave, analisadas e

contextualizada com aquilo que é a história das relações internacionais, da geopolítica e

da estratégia.

Revisão de Literatura

As obras literárias de política espacial proliferam a nível internacional há

largas décadas, com destaque para os autores norte-americanos que têm produzido

incontável doutrina e opiniões valorizando o seu pretenso domínio do espaço desde dos

anos 50. Somente alguns dos mais conhecidos e relevantes pensadores e teóricos serão

utilizados neste estudo, de forma a estabelecer uma base de conhecimentos que nos

permita pôr em perspetiva a entrada crítica ou vantajosa do Oriente nesta competição.

Os europeus, num esforço coordenado em parte pela Agência Espacial Europeia, tendo

iniciado a corrida mais tardiamente, têm contudo criado algum alvoroço na doutrina

político-jurídica do espaço, sobretudo destacando as vantagens empresariais que o tema

tem e pode vir a ter. Mais recentemente, esta nova corrida ao espaço tem contado com a

participação de novos atores literários e políticos, tais como os brasileiros e os chineses.

São estes últimos que têm causado alguma celeuma na repartição arbitrária e política do

espaço, pois têm entrado discretamente mas em força neste mundo altamente

competitivo. A doutrina internacional tem posto em perspetiva esta entrada face ao

crescimento exponencial da economia e da população chinesa, entre o risco e as

vantagens de mega Estado que não requer parceiros.

Nas bases das primeiras teorias da astropolítica encontramos o famoso

Professor Doutor Everett Carl Dolman, professor de Estudos Militares Comparados na

Academia da Força Aérea na School of Advanced Air and Space Studies (SAASS). As

suas inúmeras publicações incluem Astropolitik: Classical Geopolitics in the Space Age

(2002); The Warrior State: How Military Organization Structures Politics (2005) e

Pure Strategy: Power and Principle in the Information Age (2005). Publicou vários

artigos para o Journal of Strategic Studies, Comparative Strategy, Journal of Small

Wars and Insurgencies, Soviet and Post-Soviet Review Citizenship Studies, Politics and

Society, e o Journal of Political and Military Sociology, assim como na reconhecida

publicação em que ele é co-fundador a Astropolitics: The International Journal of

10

Space Power and Policy. As teorias por ele desenvolvidas são inegavelmente a base do

conhecimento que iremos desenvolver nesta análise.

Algumas das bases teóricas utilizadas ao longo deste estudo provêm de ideias

promovidas pelo conhecido cientista político norte-americano e professor em Harvard

Joseph Samuel Nye Jr., co-criador, com Robert Keohane, da teoria da interdependência

e da interdependência complexa nas relações internacionais e da teoria do

neoliberalismo, desenvolvido em 1977 no seu livro Power and Interdependence.

Juntamente com Keohane, desenvolveu os conceitos de assimetria e interdependência

complexa, exploraram, igualmente, as relações transnacionais e da política mundial.

Mais recentemente, na área das relações internacionais, foi o pioneiro na teoria do soft

power, no final dos anos 1980, o seu primeiro registo encontra-se utilizado num artigo

da Foreign Policy. Nas palavras de Nye, “o conceito básico de poder é a habilidade de

influenciar outros a fazer o que queremos. Há três maneiras de se conseguir isto: uma

delas é ameaçá-los com paus; a segunda é comprá-los com cenouras; e a terceira é atrai-

los ou cooperar com eles para que queiram o mesmo. Se conseguir atraí-los a querer o

que se quer, custará muito menos que cenouras e paus.” Assim, soft power, é um termo

usado para descrever a habilidade de um corpo político, como um Estado, para

influenciar indiretamente o comportamento ou interesses de outros corpos políticos por

meios culturais ou ideológicos. Representa o terceiro meio de conseguir os resultados

desejados. Contrastando com hard power, que historicamente foi a medida realista de

poder predominante, normalmente por meio de grandes números, quer fosse o tamanho

da população, ou da tecnologia militar, ou do PIB de um país. Mas ter tais recursos nem

sempre produz os resultados desejados, como os Estados Unidos descobriram na Guerra

do Vietnam. O sucesso do soft power depende em grande medida da reputação do Actor

na comunidade internacional, assim como do fluxo de informações entre atores. Por

isso, soft power é geralmente associado à ascensão da globalização e a teoria neoliberal

nas relações internacionais. A cultura popular e a comunicação social são geralmente

identificados como uma fonte de soft power muito influente. A noção de Nye de smart

power, de utilização pelos Estados da informação e de estratégias de comunicação para

o interesse de segurança do Estado a menor custo, tornou-se popular com o uso deste

conceito pela administração Clinton e, mais recentemente, na administração Obama. Em

2011, foi nomeado pela Foreign Policy um dos principais pensadores globais com a sua

"melhor ideia": Um preço para o carbono. E a sua "pior": Ceticismo climático. Este

11

premiado autor tem publicado várias obras nos últimos anos, sendo as mais recentes The

Future of Power (2011), Understanding International Conflicts, (2009), The Powers to

Lead (2008), The Power Game: A Washington Novel (2004), Soft Power: The Means to

Success in World Politics (2004), e The Paradox of American Power (2002). Obras que

serão utilizadas como fonte ou inspiração constante ao longo do estudo e análise por

serem imprescindível à compreensão da importância da política espacial no

desenvolvimento das relações internacionais.

Na colocação de outros atores na conquista espacial surge invariavelmente

Brian Harvey, que expõe excelentes estudos sobre a história de diversos programas

espaciais. Um dos mais conhecidos é sobre o histórico inimigo dos americanos: a

URSS. A obra de Harvey apresenta um bom sumário de todos os aspetos do programa

russo para o espaço desde da Guerra Fria. Introduz documentos e histórias que revelam

uma investigação rigorosa e interessante do que durante décadas foi segredo, podendo

revelar hipoteticamente uma linha de conduta do que a China, atualmente, se prepara

para fazer. O autor descreve em Russia in Space: The Failed Frontier? vários

programas de colocação de satélites, de instalações, cooperação internacional e de

indústria espacial local, que simultaneamente faz a ligação com o passado hegemónico

da Rússia e o seu futuro proporcionalmente mais modesto que se quer empresarial e

competitivo. As obras de Harvey sobre o programa espacial russo são uma referência

para entender os diferentes programas com fins militares e/ou científicos da Rússia,

compara-os e coloca-os historicamente. Contudo, a obra bibliográfica de Harvey é

bastante abrangente, contemplando também a história de vários programas espaciais:

China, Índia, Japão e Europa são apenas exemplos de outras obras que nos permite, no

nosso estudo, apresentar uma perspetiva da evolução da conquista espacial face a

acontecimentos historicamente relevantes.

Na perspetiva histórica abordada na primeira parte deste estudo, há ainda

outros autores que importa referir: William E. Burrows, John Lewis Gaddis e Deborah

Cadbury.

William E. Burrows, professor de jornalismo na Universidade de Nova Iorque

e fundador e director do curso “Science and Enviromental Reporting Program” na

mesma Universidade, foi repórter sobre aviação e espaço para vários jornais de renome:

12

The New York Times, The Washington Post, The Wall Street Journal e o Richmond

Times-Dispatch. Escreveu ainda vários artigos para a The New York Times Magazine,

Foreign Affairs, The Sciences e entre outras, e contribui como editor para a Air & Space

/Smithosian. É também autor de vários livros: A True History Of The Red Baron

(1969); Vigilante (1976); On Reporting The News (1977); Deep Black: Space

Espionage And National Security (1987); Exploring Space: Voyages In The Solar

System And Beyond (1990); Critical Mass: The Dangerous Race For Superweapons In

A Fragmenting World (with Robert Windrem)(1993); Mission To Deep Black:

Voyager's Journey Of Discovery (1993); This New Ocean: The Story of the First Space

Age (1998); The Infinite Journey: Eyewitness Accounts of NASA and the Age of Space

(2000); By Any Means Necessary: America's Secret Air War in the Cold War (2001);

The Survival Imperative: Using Space to Protect Earth (2006). Burrows recebeu vários

prémios pelo livro “This new ocean – The Story of the first Space Age”: além de ser

considerado como referência da história da Era Espacial, foi um dos três finalistas do

Prémio Pulitzer em 1998 na área de História e também ganhou o Prémio Eugene M.

Emme da Sociedade Americana de Astronáutica para literatura na área de astronáutica.

John Lewis Gaddis, historiador de reputação internacional a quem o The New

York Times chamou «o decano dos historiadores da Guerra Fria», é professor de

História na Universidade de Yale e tem várias obras publicadas sobre o tema. Pertence

ao conselho consultivo do Cold War International History Project e foi consultor no

documentário da CNN, Guerra Fria. Entre as suas inúmeras obras publicadas, contam-

se: The United States and the Origins of the Cold War, 1941-1947 (1972); Strategies of

Containment: A Critical Appraisal of Postwar American National Security (1982); The

Long Peace: Inquiries into the History of the Cold War (1987);We Now Know:

Rethinking Cold War History (1997); The Landscape of History: How Historians Map

the Past (2002);Surprise, Security, and the American Experience (2004); and The Cold

War: A New History (2006). Neste estudo, teve-se por base apenas uma das obras We

Now Know: Rethinking Cold War History (1997, que foi descrita como sendo “this

brilliant study… provides an exhaustive and ever-quizzical approach to the early years

of the superpower conflict”, pelo David C. Hendrickson da Foreign Affairs.

Deborah Cadbury é autora de vários livros best-sellers e produtora da BBC. A

sua vasta obra literária e como produtora foi diversas vezes premiada, tendo-se

13

especializado sobretudo em assuntos relacionados com ciência, história e os seus efeitos

na sociedade moderna. Para este estudo, considerou-se a obra “Space Race – The untold

story of two rivals & their struggle for the moon”, que deu origem mais tarde a um

documentário BBC com o mesmo nome. Neste livro, Cadbury usou fontes que ainda

não eram do conhecimento público, descreve a Guerra Fria, a espionagem e ambição,

desde o final da II Guerra Mundial até ao final da Guerra Fria.

Face às consideráveis críticas à despesa no programa espacial norte-americano,

alguns autores têm revelado particular proficiência literária para promover o que eles

consideram como um investimento de inigualável importância. Autores como James

Clay Moltz, cientista político norte-americano, Professor na Naval Postgraduate School

(NPS), onde leciona Espaço e Segurança Nacional, Estratégia Nuclear e Segurança

Nacional, Relações Internacionais, e Segurança no Nordeste Asiático, que publicou

mais de 20 livros, dos quais Preventing Nuclear Meltdown: Managing Decentralization

of Russia's Nuclear Complex (2004), The North Korean Nuclear Program: Security,

Strategy and New Perspectives from Russia (2000) e Asia's Space Race: National

Motivations, Regional Rivalries, and International Risks (Contemporary Asia in the

World) (2011) e 30 artigos em diversas reconhecidas publicações, tais como: Arms

Control Today, Asian Survey, Astropolitics, Brown Journal of International Affairs,

Bulletin of the Atomic Scientists, Journal of Contemporary China, Journal of East Asian

Studies, Nature, Space and Defense, Space Policy, Strategic Studies Quarterly, and

World Politics. Este conhecido consultor e perito da NASA e do Senado americano tem

vindo a insistir na contínua permanência dos Estados Unidos (EUA) no espaço,

contrapondo opiniões que retiram qualquer vantagem a esse investimento ou

posicionamento militar, argumenta a necessidade de proteger o acesso a pontos

estratégicos críticos, tanto civis como militares, acessíveis através de pontos na órbita

terrestre. A participação Clay Moltz neste debate é essencial, pois definiu como seu

objetivo estabelecer as linhas de conduta para o futuro espacial, desenvolvendo o

primeiro estudo exaustivo sobre os primeiros 50 anos da segurança espacial, enfatizando

as grandes linhas do desenvolvimento militar no espaço, as suas razões subjacentes, e os

fatores que irão muito provavelmente influenciar o seu futuro. Da sua obra surge uma

surpreendente contenção do poder militar no espaço tanto dos EUA como da URSS,

único outro ator relevante nesses primeiros 50 anos, e uma conclusão de obrigatório

acordo de cooperação para o futuro, numa perspectiva que se quer essencialmente

14

ambiental e de segurança. Quanto à sua investigação relativa ao crescimento do papel da

Ásia, verifica-se uma constante comparação entre o individualismo americano, a

cooperação pacífica europeia e o carácter altamente competitivo e tenso nos países

asiáticos, apontando para um risco de uma corrida com carácter altamente militar. A

análise dos 14 programas espaciais asiáticos, com enfoque na China, no Japão, na Índia,

na Coreia do Sul leva Moltz a isolar diferentes motivações internas nestes atores

espaciais, que iremos considerar no nosso estudo.

Na subida da China ao pináculo da conquista espacial surgem autores como

Joan Johnson-Freese, Professora no Naval War College e Harvard de assuntos de

segurança nacional e autora de numerosas obras de relevo das quais “Heavenly

Ambitions: America's Quest to Dominate Space", conhecida perita nos temas

relacionados com a ocupação militar do espaço pelos norte-americanos e pelos chineses,

apresenta a convivência destes dois poderes militares como inevitável a curto prazo,

adiantando a necessidade imprescindível de estabelecer estratégias com essa

consideração.

Quanto à consideração da utilização do Espaço como meio de garantir a

segurança internacional cabe-nos referir Xavier Pasco, Doutor em Ciência Política

lecciona na Université de Paris I Panthéon-Sorbonne e investigador na Fondation pour

la Recherche Stratégique (FRS), onde coordena o departamento de Espaço, Tecnologia

e Segurança. É autor e consultor de vários organismos nacionais e europeus de

numerosos relatórios de estudos sobre atividades espaciais civis e militares nos EUA e

no Mundo. Os seus trabalhos incluem também as questões de estratégia transatlântica

relativa aos relatórios Organização do Tratado Atlântico Norte (NATO) - Identité

Européenne de Sécurité et de Défense (IESD), às operações em coligação e aos

problemas postos pela interoperabilidade de meios. Autor de La politique spatiale des

États-Unis, 1958-1997, Technologie, Intérêt national et débat public (1997), publicou

também Espace et puissance (1999) e participou na reedição de L'espace, nouveau

territoire, Atlas des satellites et des politiques spatiales(2002). Como redator de uma

das mais prestigiadas revistas europeias de política espacial, a Space Policy, já tomou

posições inovadoras, promoveu a investigação e o conhecimento que nos propomos

hoje transmitir em menor escala.

15

Outra referência na doutrina recente da ciência política espacial, a atual

consultora senior da IFRI responsável pelo departamento da política espacial e dos

EUA, a Professora Laurence Nardon promoveu na sua tese de doutoramento Space

Observation as an Instrument of Power in International Relations: the U.S. and their

Observation Satellites, 1955-1985 que recebeu incontáveis elogios e colocou o tema da

política espacial no quotidiano dos analistas políticos dos mais diversos meios de

comunicação social. A Laurence Nardon tem publicado vários artigos sobre o estado da

política americana utilizando conceitos espaciais e imagens de análises por satélite, tais

como a observação por satélites meteorológicos, revelando nova metodologia de análise

e perspetiva.

16

Capítulo I

Após a 2ª Guerra Mundial os avanços científicos na área espacial

estavam relacionados com as políticas externas das duas superpotências da

altura: EUA e a URSS. A necessidade de estar um passo à frente fez com que a

tecnologia se aliasse à política e aquela fosse utilizada como um meio para um

fim político.

O lançamento do Sputnik, a crise dos mísseis de Cuba e a Guerra do

Golfo de 1991 são exemplos claros que a exploração espacial tem mais do que

um objetivo meramente científico. Acima de tudo, a exploração espacial é um

objetivo estratégico, militar e político.

Deborah Cadbury escreveu: “On 8 September 1944, the V-2 bombardment of

London began. The age of the ballistic missile arrived in Chiswick in West London as

the first struck at 6.43p.m.”12

Sob o poder de Hitler, Werhner von Braun criou as instalações de investigação

para o maior foguetão jamais criado. O foguetão criado por Von Braun – o A-4 –

simbolizava para Hitler a arma que poderia salvar o III Reich e provar a superioridade

alemã no mundo. Após a apresentação do foguetão a Hitler, que se havia mostrado

incrédulo a que fosse possível construir um foguetão que pudesse alcançar a Inglaterra,

exclamou: “Why could I not believe in the sucess of your work? Europe and the rest of

the world will be too small to contain a war with such weapons”.13

Hitler deu então

instruções que fosse acoplado uma ogiva de 10 toneladas e que fosse feita a sua

produção em massa. O A-4 seria então renomeado para Vergeltungswaffen14

(V-2).15

Nos dias finais da II Guerra Mundial, Werhner Von Braun e alguns membros da

sua equipa eram os homens mais procurados tanto pela Intelligence americana como

soviética. O Major Robert Staver dos Estados Unidos da América (EUA) foi enviado

12 Cadbury, Deborah, (2005) “Space Race – The untold story of two rivals & their struggle for the Moon”,

Four Estate, London, p. 13 13

Idem, ibid., p. 5 14

Arma de vingança 15

Idem, ibid, p. 5

17

em Fevereiro de 1945 para Londres com a missão de descobrir tudo quanto fosse

possível sobre a arma alemã. Por seu turno, a URSS já havia colocado no encalço de

Von Braun, desde 1935, o antecessor do Comité de Segurança do Estado (KGB), o

Comissariado do Povo para Assuntos Internacionais (NKVD). Em Janeiro de 1945, os

Soviéticos estavam a avançar rapidamente sobre a Prússia.16

Após a II Guerra Mundial, o mundo ficou perante um cenário bipolar, em que

existiam duas potências mundiais com ideologias diferentes – Capitalismo versus

Comunismo, EUA versus URSS, respetivamente. Este fator esteve na origem da Guerra

Fria, uma disputa entre sociedades capitalistas e comunistas, entre Este e Oeste. Durante

este conflito o Mundo assistiu à busca de poder por ambas as potências na tentativa de

se tornarem a verdadeira superpotência e de provarem qual a ideologia que iria

sobreviver ao longo do tempo. O período inicial da Guerra Fria pode ser dividido em

três fases: 1945 a 1947 (princípio gradual), 1947 a 1949 (declaração de Guerra Fria) e

1950 a 1962 (auge).

As razões que se podem apontar para o exórdio da Guerra Fria prendem-se com

a política externa dos Estados Unidos e da União Soviética. Durante a Guerra Fria,

EUA e URSS confrontaram-se indiretamente através da política externa que praticavam

e tomando partido por partes em conflito. Nesta época existiam “duas superpotências

que se mantinham mutuamente paralisadas, com a ameaça de utilização dos arsenais

nucleares (…) digladiando-se em todo o planeta através de procuradores seus em

conflitos que controlavam, mantendo-os sempre abaixo de um patamar de intensidade

que não desembocasse no confronto direto entre as «sedes» imperiais, com o risco de

provocar a escalada ao nível nuclear estratégico”17

.

A Polónia e a Europa de Leste foram a primeira questão suscitada para que a

Guerra Fria despoletasse. Os americanos consideravam que Estaline quebrara o

compromisso de realizar eleições livres na Polónia após a II Guerra Mundial. Contudo,

nunca ficou claro que Estaline o acordara. O acordo de Ialta de 1945 continuou bastante

16 Idem, ibid. pp-16-19

17 SANTOS, Loureiro dos, (2000) “Reflexões sobre Estratégia – Temas de Segurança e Defesa”,

Publicações Europa América, Mem Martins, pp. 68

18

ambíguo neste ponto e Estaline aproveitou essa lacuna para instituir um governo-

fachada na Polónia após a expulsão dos alemães pelo exército soviético.

Em Maio de 1945, a relação económica entre americanos e soviéticos

deteriorou-se devido ao súbito corte do programa de ajuda lend-lease. Embora tenha

acontecido por causa de um erro burocrático, a situação na globalidade não melhorou e

no ano seguinte os americanos recusaram pedidos de empréstimos soviéticos. Por seu

turno, os soviéticos interpretaram estes factos como sendo pressões económicas com

intenções hostis.

Na reunião de Ialta, EUA e URSS acordaram que a Alemanha deveria pagar 10

mil milhões de dólares em reparações a cada uma das Nações. Contudo, os pormenores

deste pagamento não foram acertados. Em Potsdam, os soviéticos exigiram a sua parte e

que esta fosse paga pelas zonas ocidentais da Alemanha. Harry Truman afirmou que “se

os soviéticos queriam tirar 10 biliões [mil milhões] de dólares à Alemanha deveriam

tirá-los da zona oriental que ocupavam”18

. Assim começou uma série de divergências

entre URSS e EUA, fazendo com que americanos, britânicos e franceses iniciassem o

processo de integração da Alemanha Ocidental e os soviéticos apertassem o controlo

sobre a zona de Leste da Alemanha.

Também a Ásia Oriental constituía um problema. Os soviéticos mantiveram-se

neutrais na guerra do Pacífico até à última semana, quando ocuparam territórios

japoneses. Na reunião de Potsdam, os soviéticos solicitaram uma zona de ocupação no

Japão semelhante à que os americanos ocupavam na Alemanha. Os EUA recusaram esta

pretensão alegando o tardio envolvimento soviético naquela zona do conflito. A URSS

considerou a situação do Extremo Oriente análoga à da Europa de Leste onde o seu

exército tinha chegado primeiro e os americanos reivindicavam eleições, ficando

portanto descontente com a posição americana.

A bomba atómica também foi uma “pedra no sapato” nas relações entre os dois

blocos. Roosevelt decidiu não partilhar o segredo da bomba atómica. Em 1946, os

americanos apresentaram nas Nações Unidas o Plano Baruch de controlo de armas

18 NYE, Joseph S. Jr (2002), Compreender os Conflitos Internacionais – Uma Introdução à Teoria e à

História”, Gradiva, Lisboa, pp. 144.

19

nucleares que os soviéticos recusaram porque pretendiam construir a sua própria bomba.

Para Estaline seria melhor para a segurança da União Soviética se esta tivesse a sua

própria bomba19

e tentou por isso provar que a URSS seria também capaz de a

construir.

As questões no Mediterrâneo e Médio Oriente (invasão do Irão e mais tarde

pressões sobre a Turquia pela URSS) aumentaram o sentimento no Ocidente de que os

soviéticos estavam a expandir a sua zona de influência.20

Este foi o contexto em que a Guerra Fria surgiu e encetou uma competição sem

precedentes entre duas nações envolvendo o mundo numa terceira guerra mundial sem

confronto direto. No auge da Guerra Fria, os dois principais atores começaram a

explorar novos teatros de guerra, nomeadamente o espaço extra-atmosférico como

forma de alcançar um maior prestígio internacional mas também com propósitos

militares. O paradigma espacial da Guerra Fria é definido pelo emprego de atividades e

equipamento espaciais inseridos nos objetivos de uma política nacional e externa. “In

this view, space becomes merely another tool by which international power and prestige

are pursued by decision makers otherwise largely disinterested in space as a field of

human endeavour”21

.

O Sputnik

William Burrows afirma “the Cold War would become the engine, the supreme

catalyst that sent rockets and their cargoes far above Earth”22

. Após o final da II

Guerra Mundial desenvolveram-se aviões espiões (os U-2 e os SR-71). Contudo, as

potências vencedoras da guerra aperceberam-se que os satélites seriam muito mais

eficazes que os aviões porque, tendo em consideração a altitude em que seriam

colocados, ofereceriam uma vista mais ampla e vasta que os aviões espiões. Esta visão

19 A URSS detonou a sua bomba atómica em 1949.

20 NYE, Joseph S. Jr, ibid., pp. 142-149.

21 JONHSON-FREESE, Joan e HANDBERG, Roger, (1997) “Space the dormant frontier – changing the

paradigm for the 21st century”, Praeger, London, pp. 7 22

BURROWS, William E. (1998) “This new ocean – the story of the first space age”, New York,

Random House, pp. 147

20

poderia incluir toda a Terra se esta ficasse rodeada por uma cintura de satélites. Um

outro fator seria o aumento da margem de segurança que os satélites teriam em relação

aos aviões para além de que sobrevoar um Estado no espaço não seria ilegal, pois não

violaria o espaço aéreo nem tão pouco violaria as leis internacionais.23

Desde finais da década de 40 que os apoiantes da exploração espacial estavam a

preparar o público americano para a conquista do espaço ”with elaborate visions of

promise and fear”24

. O lançamento dos primeiros satélites combinados com a promoção

do voo espacial numa cultura popular subverteu a alternativa de Eisenhower25

e levou a

que os líderes políticos perseguissem objetivos mais ambiciosos.26

Durante a Guerra Fria nem todos partilhavam o entusiasmo duma aventura de

grandes estações espaciais, bases lunares, naves sofisticadas e viagens até outras órbitas.

Por isso, nem todos aceitavam as profecias de Werhner Von Braun e outros pioneiros

espaciais. Durante a década de 1950, um grupo de cientistas americanos, que

trabalhavam para o governo federal, avançaram com uma visão alternativa embora a

imprensa a tenha tratado como dissidente, uma vez que não tinham um porta-voz

carismático como Von Braun. Contudo, a alternativa tinha um poderoso apoiante:

Dwight Eisenhower, o primeiro presidente americano a formular uma política de

exploração espacial. 27

“President Eisenhower, as a military leader of many years standing, was

permanently worried in the early 1950s about the possibility of a surprise russian attack

on the USA”.28

A administração de Eisenhower considerava por isso a legitimação do

reconhecimento espacial como possível complemento e/ou substituto do

reconhecimento aéreo. A carta que acompanhou o relatório do Technological

Capabilities Panel, “Meeting of Surprise Attack”, para o Departamento de Estado, que

23 Idem., ibid., pp. 159

24 MCCURDY, Howard E. (1997), “Space and the American Imagination”, Washington, Smithsonian

Institution Press, pp. 54 25

A administração de Eisenhower defendia uma visão mais prática do espaço que diferia em grande

escala dos sonhos mais utópicos para a exploração humana do espaço. 26

Idem., Ibid., pp. 53-54 27

Idem, ibid., p. 54 28

LEVERINGTON, David, (2001), “New Cosmic Horizons – Space Astronomy from the V-2 to the

Hubble Space Telescope”, Cambridge University Press, p. 18

21

colocava a liberdade do espaço no topo da agenda, sugeria uma “re-examination of the

principles of freedom of space, particularly in connection with the possibility of

launching an artificial satellite into an orbit about the earth, in anticipation of use of

larger satellites for intelligence purposes”29

. Este relatório sugeria ainda que o

desenvolvimento de mísseis de longo e médio alcance se tornasse mais rápido e a

construção imediata de aviões U-2.30

Estes aviões de reconhecimento e os futuros

satélites de observação militar tinham como objetivo dar aos Estados Unidos um aviso

no caso de uma preparação de ataque e assegurar que não existiria uma repetição dos

eventos de Pearl Harbor. O desenvolvimento de mísseis de longo alcance iria assegurar

que os Estados Unidos não necessitariam de bases noutros países para lançar um ataque

balístico contra a União Soviética.31

Em 1952, durante o segundo Simpósio sobre Viagens Espaciais do Planetário

Hayden, Milton Rosen, um investigador no Naval Research Laboratory na área de

propulsão espacial, afirmou “before we can attempt to transport human beings in a ship

that orbits around the earth, we must produce a practical, reliable, unmanned

satellite”.32

A visão para o espaço de Eisenhower estava baseada em grande parte na

tecnologia de satélites. Para o Presidente e grande parte dos membros da sua

Administração, satélites e sondas automatizadas demonstravam grande parte daquilo

que pretendiam que fosse o programa espacial americano.33

Do lado soviético, Estaline tornou-se cada vez mais determinado em conseguir a

sua própria bomba atómica e em obter capacidade de lançar a grandes distâncias. O

desenvolvimento de veículos propulsores soviéticos no pós-guerra teve a mesma origem

técnica que o programa americano: os V-2 alemães.34

Alguns especialistas alemães

foram colocados nas primeiras instalações soviéticas de pesquisa e desenvolvimento de

mísseis. Estes submeteram a Estaline várias propostas para “naves” balísticas e

antibalísticas, tendo sempre como ponto de partida o V-2. O míssil que surgiu destes

29 BURROWS, William E. (1998), Ibid., p. 159

30 LEVERINGTON, David, p. 19

31 Idem, ibid., p. 19

32 MCCURDY, Howard E., ibid., p. 56

33 Idem ibid., p. 60

34 Em 1942 foi lançado com sucesso o V-2, o primeiro míssil balístico, criado pela Alemanha de Hitler e

que serviu para bombardear a Inglaterra. O V-2 foi o primeiro foguetão com combustível de hidrogénio

líquido. Após a derrota alemã na II Guerra Mundial, o V-2 passou a ser apelidado por Viking.

22

testes e experiências – o R-14 – foi um míssil de cruzeiro capaz de percorrer 3 mil km

com uma ogiva de cerca de 3 toneladas.35

Após melhoramentos, testes e experiências, surgiu o R-7 que apenas no quarto

lançamento a 9 de Agosto de 1957 conseguiu deixar o solo. O R-7 revelou-se um

falhanço como intercontinental ballistic missile (ICBM), mas um excelente veículo de

lançamento de satélites e o progenitor de longa série de propulsores.36

Em Outubro de 1957, em plena Guerra Fria, a URSS lançou para órbita terrestre

o Sputnik, o primeiro satélite artificial, provando que os Soviéticos não estavam tão

atrasados tecnologicamente como os americanos pensavam.37

Khrushchev afirmou a um

jornalista dinamarquês em Janeiro de 1958 que “o lançamento dos Sputniks soviéticos

mostra em primeiro lugar (…) que se deu uma mudança séria no equilíbrio de forças

entre os países socialistas e capitalistas a favor das nações socialistas”38

. Num só golpe,

a URSS derrotou os EUA não só a nível científico como também a nível militar,

principalmente na nova arena potencialmente decisiva: o espaço39

. Khrushchev via o

programa espacial soviético como oponente ao programa de mísseis e um desperdício

de recursos40

, apenas mudou de opinião quando se apercebeu da reação internacional ao

lançamento do satélite soviético – o Spunitk. No dia seguinte ao lançamento o jornal

soviético Pravda apenas publicava uma pequena notícia factual, seguindo o mote de

discrição do líder soviético. Contudo, no dia seguinte, o Pravda, apercebendo-se de que

o lançamento fora um tremendo êxito de propaganda no Ocidente, publicava cabeçalhos

descrevendo o feito.41

A imprensa soviética descrevia a importância dos satélites

artificiais como sendo um meio para “interplanetary travel, and apparently, our

contemporaries will witness how the freed and conscientious labor of the people of the

new socialist society makes the most daring dreams of mankind a reality”42.

35 BURROWS, William E., (1998) ibid., p. 162

36 Idem, ibid., pp. 165 - 166

37 LEVERINGTON, David, ibid., p. 21

38 KISSINGER, Henry, (1996) “Diplomacia”, Gradiva, Lisboa, p. 495

39 TAUBMAN, Philip (2003) “Secret Empire – Eisenhower, the CIA, and the hidden story of America’s

Space Espionage”, Simon & Schuster, New York, p. 212 40

BURROWS, William E (1998), ibid., p. 180 41

LEVERINGTON, David, ibid., p. 17 42

BURROWS, William E., (1998) ibid., p. 183

23

Nos EUA as notícias acerca do lançamento foram recebidas pela população com

uma mistura de surpresa e pânico, conforme se ia apercebendo de que as cidades

americanas estavam agora ao alcance de um ataque nuclear dos mísseis soviéticos.43

Tornou-se claro que a balança do poder havia-se alterado, permitindo ao potencial

inimigo largar armas nucleares de órbita sem aviso.

Antes do lançamento do Sputnik I, os Estados Unidos atravessavam um período

de crescimento económico e orgulho nacional desde os finais da II Guerra Mundial. A

nação estava “buoyed by its resolve, courage, and confidence in its scientists, engineers

and technicians ability to create stunning technological advances on short notice”44,45

.

O lançamento do Sputnik veio alterar tudo isto.

Em Janeiro de 1958, horas depois do Sputnik ter reentrado na atmosfera, Gabriel

Heatter, um comentador influente do Mutual Broadcasting System, num editorial de

rádio entitulado “Thank you Mr. Sputnik”, proferia:

“You will never know how big a noise you made. You gave us a

shock which hit many people as hard as Pearl Harbor. You hit our pride

a frightful blow. You suddenly made us realize that we are not the best in

everything. You reminded us of an old-fashioned American word,

humility. You woke us up out a long sleep. You made us realize a nation

can talk too much, too long, too hard about money. A nation, like a man,

can grow soft and complacent. It can fall behind when it thinks it is

Number One in everything. Comrade Sputnik, you taught us more about

the Russians in one hour than we had learned in forty years.”46

43 LEVERINGTON, David, ibid., p. 17

44 DICKSON, Paul, (2001)“Sputnik – The Shock of the Century”, Walker, New York, p. 223

45 Os Estados Unidos haviam num curto período de tempo desenvolvido tecnologias como o radar, o

sonar, um pesticida – DDT, a produção em larga escala de borracha sintética, a bomba atómica e a

energia nuclear. 46

DICKSON, Paul (2001), ibid., pp. 223

24

O lançamento do Sputnik foi uma derrota humilhante para os Estados Unidos,

mas também um facto que mudou a vida americana. Este evento deu um novo impulso

ao programa espacial americano. Três dias após o lançamento o Presidente Eisenhower

pressionou o Pentágono para desenvolver um satélite espião.47

O sucesso soviético

desenvolveu uma reação mundial que James Killian48

descreveu como sendo

“Confidence in American science, technology, and education suddently evaporated”49

.

A United States Information Agency, num relatório elaborado pouco depois da

colocação do Sputnik em órbita afirmava que “Soviet claims of scientific and

technological superiority over the West and especially the US have won greatly

widened acceptance. Public opinion in friendly countries shows concern over the

possibility that the balance of military power has shifted or may shift in favour of the

USSR”50

.

Allen Dulles51

reportou ao National Security Council a 10 de Outubro que a

rapidez nos avanços soviéticos que colocaram o Sputnik em órbita estava parcialmente

relacionada com o facto de os soviéticos conciliarem o programa ICBM e o programa

de satélites.52

No Inverno de 1958, o Congresso criou Comités ad hoc, presididos pelos líderes

da maioria, para considerarem as necessidades legislativas de forma a irem de encontro

aos novos problemas causados pelo começo da era espacial. No Verão do ano seguinte,

foi assinado o National Aeronautics and Space Act.

Com o lançamento do Sputnik e a reação mundial ao mesmo, Khrushchev

começou a ter a sua estratégia delineada: “Of course we tried to derive maximum

political advantage from the fact that we were the first to launch our rockets into space.

47 TAUBMAN, Philip (2003) ibid., pp. 212

48 Na década de 1950, James Killian, presidente do MIT, foi Conselheiro Presidencial para a Ciência,

Tecnologia e Intelligence. 49

TAUBMAN, Philip (2003), ibid., pp. 213 50

TAUBMAN, Philip (2003), ibid., pp. 213 51

Allen Welsh Dulles foi o primeiro civil a dirigir a CIA entre 1953 e 1961. 52

ANDREW, Christopher (1996), “For the President Eyes Only – Secret Intelligence and the American

Presidency from Washington to Bush”, Harper Collins Publishers, London, pp. 240

25

We wanted to exert pressure on American militarists – and also influence the minds of

more reasonable politicians so that the United States would start treating us better”53

.

Apesar da balança militar favorecer o Ocidente, Khrushchev fez questão de

minimizar esse facto afirmando “our missiles were still imperfect in performance and

insignificant in number”54

mas “we can launch satellites because we have a carrier for

them, namely the ballistic rocket”55

.

Os EUA consideraram o lançamento do Sputnik como um precedente em matéria

de liberdade do Espaço. Donald Quarles56

destacou “that none of the many nations that

have been overflown by the Soviet satellite appears to have raised objection on the

ground that its territorial rights have been infringed. This seems to establish the validity

of the concept that outer space is international in character”57

. Dias após a colocação

em órbita do Sputnik, o Presidente Eisenhower especificamente questionou a

possibilidade de desenvolverem satélites de reconhecimento. Donald Quarles do

Pentágono descreveu então o projeto da Air Force WS-117L. 58

Perante a imprensa, Eisenhower tentou disfarçar a preocupação americana com o

sucesso soviético descrevendo a ocorrência como “one small ball in the air”59

. No

entanto, reconhecia que a URSS tinha desenvolvido um sistema de propulsão poderoso,

mas ao mesmo tempo não demonstrava publicamente qualquer intenção de acelerar o

programa de mísseis intercontinentais ou de satélites americanos embora nesse campo

os EUA não estivessem na vanguarda da produção.60

Apesar de estarem a desenvolver

programas tecnológicos espaciais desde 1954, os esforços americanos para colocar um

satélite em órbita cresceram em larga escala com o lançamento do Sputnik. Os esforços

53 GADDIS, John Lewis, (1997), “We now know – rethinking Cold War History”, Oxford, New York, pp.

239 54

Idem, ibid., pp. 239 55

BURROWS, Wiliam E (1998), ibid., pp. 195 56

Donald Quarles foi Secretário Adjunto da Defesa de Eisenhower. 57

TAUBMAN, Phillip,(2003) ibid., pp. 216 58

Idem, ibid., pp. 217 59

Idem, ibid., pp 218 60

Idem, ibid., pp 218

26

desenvolvidos durante a década de 1950 estavam voltados para dois objetivos:

reconhecimento militar e a participação no Ano Geofísico Internacional (1957).61

Tal como fomentou a corrida espacial, o Sputnik também conduziu ao

desenvolvimento e produção de armas tecnológicas. Como George Kennan62

escreveu

nas suas memórias:

“It caused Western alarmists ... to demand the immediate

subordination of all other national interests to the launching of

immensely expensive crash programs to outdo the Russians in this

competition. It gave arguments to the various enthusiasts for nuclear

armament in the American military – industrial complex. That the

dangerousness and expensiveness of this competition should be raised to

a new and higher order just at the time when the prospects for

negotiation in this field were being worsened by the introduction of

nuclear weapons into the armed forces of the Continental NATO powers

was a development that brought alarm and dismay to many people

besides myself”.63

O lançamento do primeiro satélite americano estava previsto para Dezembro

1957, mas quem conhecia o programa Vanguard sabia que esta era uma previsão

extremamente otimista. Entretanto, os soviéticos já haviam lançado o Sputnik II e a

cadela Laika já havia iniciado o seu voo espacial. No dia 7 de Novembro, Eisenhower

fez uma comunicação ao povo americano, salientando a força militar da nação: “It’s my

conviction, supported by trusted scientific and military advisers, that, although the

Soviets are quite likely ahead in some missile and special areas and are obviously

ahead of us in satellite development, as of today the over-all military strength of the free

61 JOHNSON-FREESE, Joan, and HANDBERG, Roger, ibid., pp. 74-75

62 George Kennan, cientista político, diplomata e historiador, teve um papel central na Guerra Fria. Ficou

conhecido como pai da política de contenção. 63

DICKSON, Paul, (2001) ibid., pp. 224-225

27

world is distinctly greater than that of the Communist countries. We must see to it that

whatever advantages they have are temporary only”64

.

A Crise dos Mísseis de Cuba

A estratégia da Guerra Fria de Eisenhower passava por covert actions. Durante a

II Guerra Mundial, Eisenhower ganhou uma paixão por imagery intelligence que se

refletiu na sua presidência.65

Desde o início do seu mandato que Eisenhower tentou

desenvolver a intelligence americana e a recolha de imagens. Apesar de reconhecer que

o foto-reconhecimento por satélite seria muito mais benéfico, assumiu-se que os

problemas tecnológicos, incluindo o desenvolvimento de veículos de lançamento

viáveis, iriam adiar o funcionamento do sistema até meados de 1960, na melhor das

hipóteses. Por esse motivo, a administração Eisenhower apostou em projetos de aviação

avançados, começando pelos U-2 e depois avançando para um avião espião

supersónico, quando se aperceberam que os U-2 poderiam ser detetados pelos radares

soviéticos.66

Apesar de Eisenhower considerar as missões dos U-2 de extrema importância,

estava ansioso por uma solução alternativa de recolha de dados de modo a limitar a

provocação ao Kremlin. Por esse motivo, mostrava-se bastante relutante em autorizar

tantas missões quanto Richard Bissel67

queria. 68

A principal missão dos U-2 era

procurar e monitorizar a produção de ICBM e o desenvolvimento de instalações de

energia atómica em território soviético.69

Devido à sua aposta em satélites de reconhecimento, a CIA tornou-se interessada

no Vanguard. Em finais de 1956, Bissel apercebeu-se que o esforço americano para

64 TAUBMAN, Phillip (2003), ibid., pp 223

65 ANDREW, Christopher (1996), ibid., pp. 200-201

66 TAUBMAN, Phillip (2003), ibid., pp. 227

67 Richard Bissel foi o Chefe das Covert Operations da CIA na segunda metade da década de 1950.

68 ANDREW, Christopher (1996), ibid., pp 243

69 Idem, ibid., pp. 242

28

chegar ao espaço estava aquém das capacidades soviéticas. Eisenhower considerou que

um satélite lançado no decorrer do Ano Geofísico Internacional iria fortalecer a

liberdade dos céus numa altura em que os Estados Unidos secretamente estavam a

desenvolver aviões e satélites espiões para fazerem reconhecimento da URSS.70

Em 1960, as missões do U-2 sobre solo soviético terminaram abruptamente

quando um dos aviões foi abatido a 1 de Maio.71

O plano de voo deste U-2 pilotado por

Gary Powers dar-lhe-ia a possibilidade de fotografar a nova base de mísseis soviética

em Plesetsk, no nordeste do território soviético. Iria também sobrevoar a base nuclear

de Tyuratam e o complexo de construção de bombas em Chelyabinsk. O tempo de voo

daria imenso tempo para que os soviéticos detetassem o U-272

, o que aconteceu quando

ainda sobrevoava território afegão. Os soviéticos dispararam três mísseis SA-2 quando

o U-2 de Powers sobrevoava a zona perto de Sverdlovsk.73

Eisenhower aprovou, a 3 de Maio, uma história de fachada para encobrir a real

missão do U-2 abatido: “A NASA U-2 research plane, being flown in Turkey on a joint

NASA – USAF Air Weather Service mission, apparently went down in the Lake Van,

Turkey, area at about 9:00 AM, Sunday, May 1”74

.

Numa conferência de imprensa a 11 de Maio, Eisenhower abriu um precedente

ao explicar publicamente a necessidade de atividades de intelligence em tempo de paz:

“No one wants another Pearl Harbor. This means that we

must have knowledge of military forces and preparations around the

world, especially those capable of massive surprise attacks.

Secrecy in the Soviet Union makes this essential. In most of the

world no large-scale attack could be prepared in secret, but in the

70 DICKSON, Paul (2001), ibid., pp. 100-101

71ANDREW, Christopher (1996), ibid., pp. 243

72 Este seria o 24º voo em território soviético e o segundo para Powers. Tratava-se da missão 4154, nome

de código Operação Grand Slam. Powers já havia sobrevoado território chinês e pilotado o U-2 ao longo

da fronteira soviética 6 vezes. A máquina que Powers pilotou fora reconstruída pela Lockheed após uma

queda em 1959. Estava equipada com os mais recentes motores da Pratt & Whitney. 73

TAUBMAN, Phillip (2003), ibid., pp. 305-307 74

ANDREW, Christopher (1996), ibid., pp. 244

29

Soviet Union there is a fetish of secrecy and concealment. This is a

major cause of international tension and uneasiness today…

…Ever since the beginning of my administration I have issued

directives to gather, in every feasible way, the information required to

protect the United States and the free world against surprise attack

and to enable them to make effective preparations for defense.”75

Khrushchev emitiu um comunicado e sublinhou que “this latest flight, towards

Sverdlovsk, was an especially deep penetration into our territory and therefore an

especially arrogant violation of our sovereignty. We are sick and tired of these

unpleasant surprises, sick and tired of being subject to these indignities. They were

making these flights to show up our impotence. Well, we weren’t impotent any

longer”.76

Georgi Zhukov, decano dos teoristas espaciais russos, avisou em Outubro de

1960 que desde que a URSS provasse que podia abater aviões espiões americanos, os

Estados Unidos iriam apressar o desenvolvimento de novos métodos de colocar satélites

em órbita. O tipo de informação fornecida por satélites espiões “can be of importance …

solely for a state which contemplates aggression and intends to strike the first blow.”77

Em 1959, Eisenhower sublinhou que “the satellite, since it does not violate the

air space,… represents the greatest future in the reconnaissance area”78

. A crise do U-2

expôs o comportamento impulsivo e errático que começava a ser característico em

Khrushchev. A cimeira marcada em Paris para o mês seguinte manteve-se e apesar do

líder soviético dar indicações que pretendia que a mesma se realizasse, reviu a sua

posição: “I became more and more convinced that our pride and dignity would be

damaged if we went ahead with the meeting as though nothing had happened”79

.

75 Idem, ibid., pp. 248

76 Idem, ibid., pp. 306.

77 MCDOUGALL, Walter A., (1997), “The Heavens and the Earth – A Political History of the Space

Age”, John Hopkins University Press, London, pp. 259 78

GADDIS, John Lewis (1997), ibid., pp. 246 79

Idem, ibid., pp. 246-247

30

Quando a conferência se iniciou, Khrushchev exigiu um pedido de desculpas

formal pelo Presidente americano e a garantia de que os voos do U-2 tinham terminado.

Contudo, Eisenhower não pediu desculpas, afirmou que os U-2 eram necessários e que

iria pedir às Nações Unidas que fossem efetuados voos sobre território americano e

soviético.80

A União Soviética ameaçou com ataques de mísseis a países como a Grã-

Bretanha e Japão enquanto acolhessem os U-2, caso se verificassem quaisquer novos

voos de reconhecimento a território soviético ou a países socialistas81, 82

.

A 18 de Agosto desse ano, os Estados Unidos lançaram com sucesso o satélite

Discoverer XIV da base da Força Aérea de Vandenberg, começando uma nova era em

imagery intelligence. Este satélite mostrou o primeiro de quatro ICBMs soviéticos

operacionais.83

Entretanto, em Cuba, Fidel Castro havia chegado ao poder e as informações de

intelligence que chegavam a Eisenhower levavam-no a crer que “Communists began

permeating Cuba’s life and government”84

, pelo que deveriam ser tomadas acções

contra Castro. “We could simply not afford to appear the bully”85

. Em Dezembro de

1959, J. C. King86

, recomendou a Allen Dulles que “thorough consideration be given to

the elimination of Fidel Castro”87

. Contudo, Dulles mostrou pouco entusiasmo em

colocar em prática medidas tão drásticas. Porém foram ordenados vários assassinatos

com ou sem o conhecimento de Eisenhower com poucos resultados práticos. Em 18 de

Agosto de 1960, Bissel e Allen Dulles apresentaram um plano de operações paramilitar

a Eisenhower com o propósito de criar uma oposição cubana unificada. Em Novembro,

foi constatado que não existia qualquer tipo de resistência organizada em Cuba.88

Em 17

80 ALDRICH, Richard J, (2002), “The hidden hand – Britain, America and Cold War Secret Intelligence”,

John Murray, London, pp. 536 81

Estas ameaças foram efectuadas por Malinovsky a 30 de Maio e reiteradas por Khrushchev a 3 de

Junho numa conferência de imprensa em Moscovo. 82

Idem, ibid., pp. 537 83

ANDREW, Christopher, ibid., pp. 249-250 84

Idem, ibid., pp. 251 85

Idem, ibid., pp 251 86

J. C. King foi Chefe da Divisão do Hemisfério Ocidental do Departamento de Operações da CIA. 87

Idem, ibid., pp. 251 88

Idem, ibid., pp. 252-256

31

de Abril de 1961, já na administração Kennedy, ocorreu uma operação militar secreta

americana em Cuba, que ficou conhecida como Baía dos Porcos, tendo sido um

falhanço total89

.

Em Março de 1962, Castro solicitou ao KGB que montasse uma base de

operações em Havana para exportar a Revolução para toda a América Latina. No

seguimento desse pedido, em Maio desse ano Khrushchev decidiu construir uma base

de mísseis nucleares em Cuba. O Presidente da URSS estava parcialmente motivado

pelo seu desejo de impressionar os EUA com o poder nuclear soviético e assim

dissuadi-los de planos de first strike. Ao mesmo tempo, Khrushchev pretendia ter um

gesto de apoio à revolução cubana.90

A URSS estava convencida de que os EUA não iriam detetar a presença de

mísseis em Cuba até que fosse demasiado tarde para tomar medidas. Contudo esta

assunção estava errada uma vez que os U-2 podiam fotografar a construção das bases

dos mísseis e porque a intelligence americana possuía documentos fornecidos pelo

Coronel Oleg Vladimirovich Penkovsky, um espião ao serviço do SIS britânico e da

CIA.91

Todavia, Penkovsky apenas forneceu informação pouco relevante.92

Em 1962, foram obtidas informações fiáveis acerca das capacidades soviéticas

pelos satélites americanos e a existência de uma base de mísseis balísticos de médio

alcance (MRBM) em San Crístobal foi confirmada num voo de U-2 a 14 de Outubro.

As fotografias tiradas pelo U-2 foram decisivas para que os líderes ocidentais

percebessem que a ameaça era real. Os voos do U-2 sobre Cuba durante a crise foram

descritos como “one of the greatest contribution to American security ever made by the

intelligence community”93

. Os voos forneceram uma maior certeza de que realmente os

MRBMs haviam chegado a Cuba, apesar de não conseguirem detetar as ogivas

89 Idem, ibid., p. 258

90 ANDREW, Christopher e MITROKHIN, Vasili, (2000), “The Mitrokhin Archive – The KGB in

Europe and the West”, Penguin Books, London, p. 238 91

Idem, ibid., p. 238 92

ALDRICH, Richard J., ibid., pp. 619-620 93

Idem, ibid., p. 622

32

nucleares. O programa de satélites americano provou também então que não existia

qualquer atraso no desenvolvimento de mísseis em relação à URSS.94

Durante a crise, a comunidade de Intelligence americana tinha três funções

básicas: monitorizar os desenvolvimentos nos silos de mísseis identificados, descobrir

novos silos e monitorizar outros acontecimentos de importância relevante em Cuba;

monitorizar os movimentos dos navios soviéticos em mar alto; e ainda determinar se

havia qualquer sinal de alerta nas altas patentes militares na União Soviética que

pudessem indicar um ataque. Numa reunião a 16 de Outubro, o presidente americano

ordenou que a frequência das missões do U-2 fosse aumentada. Nos seis dias seguintes

as missões do U-2 forneceram aos intérpretes de fotografias no National Photografic

Information Center provas de que os soviéticos estavam a construir pelo menos seis

silos MRBM e silos SS-5 IRBM em Cuba.95

Entretanto a National Security Agency (NSA) e os seus componentes militares

lançaram um esforço massivo de Signals Intelligence (SIGINT), gravando todos os

sinais de radares cubanos que conseguissem. Para além de patrulharem os céus, a NSA

também tentava obter sinais no mar observando e ouvindo todos os eventos que

tivessem o ponto de origem no mar. Para reunir mais informação acerca dos

desenvolvimentos na União Soviética, a CIA e o National Reconnaissance Office

(NRO) tentaram colocar em órbita um novo CORONA96

cujo veículo de lançamento

estava na base da Força Aérea em Vandenberg, sempre a postos para colocá-lo em

órbita, mas cujo lançamento falhou.97

Os esforços feitos na recolha de informação permitiram que fosse feito um

memorando a 19 de Outubro acerca dos mísseis soviéticos em Cuba. O memorando

fornecia informação acerca da capacidade de alcance dos mísseis, precisão, peso da

94 Idem, ibid., pp. 621-622

95 RICHELSON, Jeffrey T., (1995), “A Century of Spies – Intelligence in the Twentieth Century”, New

York, Oxford Press, pp. 315 96

O CORONA foi o primeiro satélite de reconhecimento americano, operando desde Agosto de 1960 até

Maio de 1972, recolhendo intelligence e imagery. O programa CORONA obteve a aprovação do

Presidente Eisenhower em 1958, mas só foi colocado em órbita com sucesso em 1960, uns meses após a

queda do U-2 do Gary Powers. Disponível em: http://www.nro.gov/history/csnr/corona/factsheet.html

acedido em 11/05/2012. 97

RICHELSON, Jeffrey T,.(1995), ibid., pp. 315-316

33

ogiva e capacidade de destruição. Também fornecia informação acerca da quantidade de

mísseis que cada lançador poderia suportar, o refire time, e esclarecia ainda acerca dos

locais que estariam já operacionais a efetuar lançamento em Dezembro.98

Entre o dia 19 de Outubro e o anúncio de bloqueio feito por John F. Kennedy no

dia 22, a recolha de intelligence continuou. O discurso de Kennedy não afetou as

atividades de intelligence, pelo menos no que diz respeito aos seus alvos mais básicos –

Cuba, alto mar e URSS. 99

As informações de intelligence recolhidas desde então deixavam entrever

algumas preocupações. A 23 de Outubro a CIA confirmou a existência de dois canais de

comunicação alternativos, apesar de não conseguir fornecer a sua localização exata. As

fotografias recolhidas mostravam que o trabalho na construção dos silos estava a evoluir

mais depressa do que os americanos pensavam. A 27 de Outubro as imagens recolhidas

por satélite indicavam que os seis silos de MRBM estavam operacionais, num total de

24 posições, e com um potencial de fogo de 48 mísseis em duas salvas. A 28 de

Outubro, o Foreign Broadcast Information Service da CIA, informou a Casa Branca

que Moscovo emitiu uma mensagem de Khrushchev para Kennedy afirmando que “the

USSR had decided to dismantle Soviet missiles in Cuba and return them to the Soviet

Union”.100

A vigilância a Cuba não acabou com o fim da crise, particularmente porque os

Estados Unidos não tinham a certeza absoluta de que todos os mísseis e bombas que

chegaram a Cuba haviam retornado à União Soviética. A 30 de Novembro de 1962, o

“Guidelines for the Planning of Cuban Overflights” afirmava:

“The United States Government has a high priority need for the

following:

a. Continuing evidence on the removal of offensive weapons systems

from Cuba;

98 Idem, ibid., pp. 316

99 Idem, ibid., pp 317

100 Idem, ibid., pp. 318

34

b. Evidence of any reduction on the removal of offensive weapons

systems into Cuba;

c. Evidence of the concealment of offensive weapons system in

Cuba”.101

A revolução tecnológica que Khrushchev havia proclamado na segunda metade

da década de 1950, estava finalmente a ocorrer com a crise dos mísseis de Cuba, apesar

de ter ocorrido cinco anos depois do lançamento do Sputnik.102

Após a crise dos mísseis de Cuba, os Soviéticos iniciaram um plano de aumento

da capacidade militar e superioridade nuclear. Este plano teve início em 1962-1963 sob

comando de Krushchev e nasceu assim a força de ICBM soviética.

Os EUA iniciaram em 1960 o Corona: um programa de satélites de espionagem

e recolha de informações103

. O Corona esteve em funcionamento até 1972 e teve um

papel crucial na avaliação das capacidades reais de misseis inter-balísticos continentais

da URSS. Este projeto surgiu numa altura em que era particularmente difícil para os

EUA recolher informações sobre a URSS por outro método além do U-2. Entre 1959 e

1960 foram realizados 30 lançamentos de satélites Corona que falharam.104

Apenas

passado três meses e meio após a queda do U-2, os EUA conseguiram colocar em órbita

um satélite-espião.

A recolha de imagens feita pelo Corona veio demonstrar que a URSS possuía

menos ICBM’s do que os analistas americanos previam105

. A constatação dos factos

trouxe tranquilidade aos EUA e a vigilância feita a partir de satélites deu confiança para

101 Idem, ibid., pp. 319

102 MCDOUGALL, Walter A.(1997), ibid., pp. 262

103 Os soviéticos também desenvolveram um programa semelhante entre 1961 e 1994 – O Zenit.

Tecnicamente os satélites Zenit eram bastante parecidos com os satélites Corona 104

DICKSON, Paul, (2001),“Sputnik – The Shock of the Century”, New York, Walker & Company, pp.

211-212 105

Os analistas Americanos previam que a URSS possuísse cerca de 3000 ICBM’s. Nikita Kruschev

chegou a afirmar que os soviéticos movimentavam-nos como se tratasse de salsichas. O Corona veio

mostrar que afinal a URSS possuía apenas uma dúzia de ICBM’s.

35

que na década de 70 fossem negociados com os soviéticos os tratados SALT. De facto,

durante as negociações, os americanos mostraram saber mais do que os seus congéneres

soviéticos sobre o arsenal soviético, embora nunca tenham admitido que a sua fonte de

informação era a vigilância por satélite.106

Nas palavras do General George J. Keegan Jr., um dos responsáveis pela área de

Intelligence da Força Área Americana, a recolha de intelligence era “uma enorme fonte

de poder e de controlo.107

” E o que se seguiu à crise dos mísseis de Cuba veio

comprovar que ele tinha razão. A recolha de informações era e continua a manter um

estatuto de grande importância como elemento chave para ver e ouvir o inimigo e para

moldar a perceção da ameaça.

A crise dos mísseis de Cuba introduziu um novo elemento no reconhecimento

estratégico que se tornou em uso comum nos anos seguintes. Como ambas as partes

rapidamente perceberam, a dissuasão só funciona se o oponente souber o que existe e a

melhor forma de garantir que o oponente sabe, é deixá-lo fotografar e recolher dados

das armas estratégicas. Até certo ponto, tanto os EUA como a URSS dependeram do

reconhecimento estratégico do outro, especialmente dos satélites, para validar a sua

capacidade retaliatória.108

A crise dos mísseis de Cuba marcou um ritual de passagem para o

reconhecimento espacial americano que com este evento passou a ser considerado um

sistema estratégico e teve um profundo impacto nas relações internacionais e ficou claro

que no futuro viria a desempenhar um papel preponderante. Khrushchev temia e

ameaçou o U-2 porque era sua preocupação que mais cedo ou mais tarde expusesse o

programa de mísseis balísticos de longo alcance soviético por aquilo que realmente era:

essencialmente impotente.109

106 DICKSON, Paul, (2001), Ibid, pp. 213-214

107 BURROWS, William E, (1998), ibid, pp. 229

108 BURROWS, W. E. (1986). Deep black : space espionage and national security. New York, Random

House, pp. 126-127-.

109 Idem, ibid, p. 132

36

A conquista da Lua

Kennedy ganhou a presidência dos EUA em parte por atacar a política doméstica

e externa de Eisenhower, com ênfase na defesa e no espaço. Kennedy via o espaço

como área de conflito e no seu discurso de tomada de posse fez questão de salientar os

feitos norte-americanos no espaço apesar do avanço soviético na área. Nesta mesma

ocasião, apelou à cooperação soviética para explorar as estrelas enquanto avisava que

caso os Comunistas continuassem a liderar o caminho para o espaço, iriam ocupá-lo de

forma perigosa e como tal deveriam estar preparados para as consequências que

adviriam daí.110

Durante a crise dos mísseis de Cuba, foi realçado que “if there

happened to be no satellite in orbit or ready for launch when a foreign threat suddenly

materialized, no satellite images were available to assist the president and its senior

aides111

. A fraqueza realçada durante a crise dos mísseis112

foi novamente salientada

durante a crise do Médio Oriente em 1967 quando as imagens de satélite chegaram a

Washington demasiado tarde para que fosse possível monitorizar breve mas

intensivamente a Guerra dos Seis Dias entre Israel e os seus vizinhos Árabes. Em

Agosto de 1968 os dados do Corona não foram suficientemente rápidos para avisar a

Casa Branca que as forças soviéticas estavam prestes a invadir a Checoslováquia para

pôr termo às políticas liberais que Alexander Dubcek estava a implementar113

.

Bud Wheelon, Director do Office of Scientific Intelligence da CIA, relembrou

mais tarde que “Corona was totally useless during the Cuban missile crisis because of

the long delay in getting the film back. We needed the data back that day, not a month

from now”114

.

De 1961 a 1963, foram os anos em que os protestos soviéticos contra os satélites

espiões americanos alcançaram maior relevo. Muitos artigos denunciavam a

110 Idem, ibid., pp. 319-320

111 TAUBMAN, Phillip, (2001) ibid., pp. 327

112 Durante a crise dos mísseis de Cuba, Kennedy teve de confiar nos voos do U-2 e em voos de

reconhecimentos a baixa altitude por outros aviões sobre Cuba para monitorizar a instalação dos mísseis

soviéticos. O Major Rudolph Anderson, piloto de um U-2, foi morto quando o seu avião foi abatido sobre

Cuba em finais de Outubro. 113

Idem, ibid., pp. 328 114

Idem, ibid., pp. 328

37

militarização americana do espaço mas serviam ao mesmo tempo para publicitar a

importância dos sistemas de satélites soviéticos.115

No início de 1962, a era espacial

contava com 4 anos. Os Estados Unidos haviam feito 63 lançamentos para órbita (cerca

de 34 eram militares). A URSS apenas conseguira lançar 50 satélites de reconhecimento

e provavelmente outras aplicações militares entre 1959-60. Os EUA necessitavam mais

de satélites espiões do que a URSS, mas esta também tinha interesse em monitorizar as

atividades americanas e do exército chinês.116

Em Agosto de 1963, Soviéticos, Americanos e Britânicos assinaram o Limited

Test Ban Treaty banindo as explosões nucleares no ar, mar e espaço. Quando o

COPUOS117

reuniu em Setembro, a delegação soviética prometeu “new measures in

order to bring together the different points of view”118

nos princípios básicos do direito

espacial. Estas duas arenas sobrepunham-se. Para a aceitação tática de reconhecimento

baseado no espaço (objetivo americano) era necessário discutir a lei espacial no que

concerne à ilegalidade da militarização do espaço e que não fossem tomadas medidas

que permitissem que esses satélites fossem abatidos. Os primeiros planos anti-satélite

envolviam a detonação de uma ogiva nuclear na proximidade de um satélite hostil. Por

esse motivo a proibição de testes nucleares no espaço contribuiu para a legitimação

implícita de satélites espiões.119

No Verão de 1964 estavam a decorrer duas corridas espaciais: uma para colocar

humanos no espaço120

e alcançar o desenvolvimento tecnológico que o espaço

115 MCDOUGALL, Walter A. (1997), ibid., pp. 271

116 Idem, ibid., pp. 272

117 Commitee on the Peaceful Uses of Outer Space (COPUOS) criado em 1959 pela Resolução n.º 1472

(XIV) da Assembleia Geral das Nações Unidas para promover a esfera de acção da cooperação

internacional no uso pacífico do espaço, para aconselhar o desenvolvimento de programas sob alçada das

Nações Unidas, para encorajar a pesquisa e disseminação de informação em assuntos relacionados com

espaço e para estudar assuntos legais que possam ser levantados com a exploração espacial.

http://www.oosa.unvienna.org/oosa/en/COPUOS/cop_overview.html , acedido em 11/05/2012 118

BURROWS, Williams, (1986), ibid., pp. 274 119

BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 274 120

A Soviética Tereshkova havia-se tornado a primeira mulher no espaço, Yuri Gagarin havia já

completado uma volta à Terra em órbita e dentro de meses Aleksei Leonov iria realizar o primeiro passeio

espacial. O objetivo americano implementado por Kennedy seria colocar americanos na Lua como forma

de os Estados Unidos da América recuperarem o seu prestígio na arena internacional.

38

implicava, outra para satisfazer o desejo de colocar meios no espaço que permitissem

obter superioridade militar.121

A propaganda dos triunfos soviéticos resumia-se aos veículos de lançamento na

senda do Sputnik. Portanto, era inconcebível para Khrushchev ver Kennedy em 1962 a

encaminhar os americanos para a Lua e ver o seu país a atrasar-se na corrida espacial.

Khrushchev incentivou por isso Korolev122

e outros que desenvolviam planos para ir à

Lua e a Marte, já que o que era necessário era um grande nível de coordenação que não

existia.123

Korolev desenvolveu três programas separados para colocar os soviéticos na Lua

paralelamente ao programa americano. O Vostok levou cosmonautas ao espaço da

mesma forma que a Mercury e Gemini levaram astronautas. O segundo, Luna, era

idêntico aos três programas americanos de reconhecimento lunar. E o último, o

Programa N, pretendia desenvolver um lançador similar ao Saturn, embora oficialmente

não fosse reconhecido, tal como no caso americano, que o seu principal objetivo seria

levar Homens à Lua.124

Em Setembro de 1963, George Muller, o recém-nomeado administrador da

NASA para os projetos de voos tripulados, pediu a alguns subordinados para calcularem

a probabilidade de chegar à Lua no tempo estipulado por Kennedy. As hipóteses

estimadas foram uma em dez.125

Contudo, a 9 de Novembro de 1967 e após uma série

de acidentes, a Apollo 4 e os módulos lunares foram lançados por um Saturn V numa

trajetória que os poderia levar à Lua. A Apollo 4 desempenhou perfeitamente a sua

121 BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 387

122 Durante a II Guerra Mundial, Sergey Korolev foi feito prisioneiro mas passou os anos a desenhar e

testar combustível líquido para rocket boosters de aviões militares. Após a Guerra, modificou o míssil

alemão V-2, aumento o seu alcance para 685 km. Em 1953 ele começou a desenvolver a série de mísseis

balísticos que levou ao primeiro ICBM soviético. Após a morte de Estaline, Korolev foi responsável pelos

sistemas de engenharia dos lançadores e naves soviéticas (Vostok, Voskhod e Soyuz). Korolev foi o génio

por detrás dos voos espaciais tripulados. http://www.odessit.com/namegal/english/korolev.htm , acedido

em 11/05/2011 123

BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 396 124

BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 396 125

BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 405

39

missão. Este ensaio foi importante porque juntou todas as peças do programa pela

primeira vez e demonstrou que conseguiam funcionar.126

Em Julho de 1969, a Apollo11 levou uma tripulação de três homens à Lua.

Levavam consigo uma bandeira e uma placa comemorativa para colocar no Mar da

Tranquilidade dizendo:

“HERE MEN FROM THE PLANET EARTH

FIRST SET FOOT UPON THE MOON

JULY 1969 D.C

WE CAME IN PEACE FOR ALL MANKIND”

Contudo, a bandeira que levavam era o estandarte nacional dos Estados Unidos e

não representava o mundo inteiro127.

Durante anos os soviéticos fizeram passar a mensagem de que o seu objetivo

nunca tinha passado por enviar homens à superfície lunar. Para o demonstrar, um ano

depois da chegada à Lua dos americanos, a URSS prosseguiu com a investigação lunar

com sondas automáticas. A 12 de Setembro de 1970, após cuidadosas preparações,

enviaram a sonda Luna 16 ao Mar da Fertilidade para recolher amostras do solo lunar e

enviá-las de volta à Terra. Esta missão foi a primeira que trouxe para a Terra amostras

de rochas de outro corpo celeste sem presença humana no espaço exterior. Apesar de ter

sido um feito importante, uma vez que não colocava em risco vidas humanas, a

imprensa não deu o devido valor ao acontecimento.128

A década de 70 e 80: os Tratados SALT

126 BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 416-418

127 BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 426

128 BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 432

40

Em meados da década de 60, a corrida às armas nucleares tornou-se ainda mais

intensa entre EUA e URSS. Tanto um lado como outro reforçaram ao máximo a sua

capacidade de ICBM’s além de começarem a planear igualmente sistemas antimísseis

balísticos (ABM). Em 1967, o presidente norte-americano Lyndon Johnson e o seu

homólogo Alexei Kosygin levaram a cabo uma cimeira em Glassboro onde abordaram a

possibilidade de limitar os sistemas ABM. Contudo, com a invasão soviética da

Checoslováquia em Agosto de 1968 as negociações ficaram suspensas.129

Este foi o

início na alteração da estratégia de Destruição Mútua Assegurada (MAD) para uma

estratégia de coexistência pacífica e de cooperação. O Presidente Nixon viria mais tarde

a afirmar no seu discurso ao Congresso americano no dia 1 de Junho de 1972 “We took

the first step towards a new era. We have begun to check the wasteful and dangerous

growth of nuclear weapons. We have begun to reduce the level of fear by reducing the

causes of fear”.130

Só após a tomada de posse do Presidente Nixon é que se iniciaram formalmente

as negociações para o tratado SALT-I (Tratado para limitação de armas estratégicas) em

1969. As negociações do Tratado SALT-I versaram sobretudo numa limitação no

número de mísseis nucleares, ou seja, inicialmente o objetivo seria limitar armas

ofensivas, mas acabou por cair este princípio e trocou-se as limitações ofensivas por

limitações defensivas.131

Os EUA mostraram-se mais preocupados durante as

negociações em limitar a capacidade ofensiva da URSS enquanto as preocupações

soviéticas versavam a limitação do sistema antimíssil americano. Este acordo foi

bastante difícil de concretizar sobretudo pela dificuldade em chegar a uma definição

comum de “armas ofensivas”.

O Tratado SALT I (Maio de 1972) foi um marco nas relações entre as duas

superpotências, não só porque altera o modo de fazer política durante a Guerra Fria ao

proibir a prossecução de sistemas ABM mas também porque proíbe que ambas

superpotências de interferir com os meios nacionais de verificação, ou seja, satélites

espiões. Acresce ainda que com este Tratado os EUA garantiram a não militarização do

129 GRAHAM, T. and HANSEN K. A. (2007). “Spy satellites and other intelligence technologies that

changed history”, Seattle, Wash. ; London, University of Washington, pp. 48-50. 130

MURPHY, D. (2003), “Cold War 1945-1991” London, Collins Educational, pp59 131

DUNBABIN, J. P. D. (2008). “The Cold War : the great powers and their allies”, Harlow, England ;

New York, Pearson Education, p. 64.

41

espaço ao ficar expresso no tratado a proibição de sistemas ASAT (antissatélite) mas

não de satélites de pesquisa e desenvolvimento.132

Em grosso modo, este tratado divide-

se em duas áreas principais: nenhuma das potências terá uma rede de armas defensivas

que permita fazer frente de forma eficaz às represálias da outra parte; nem “nenhuma

deverá ter capacidade ofensiva que no primeiro ataque seja capaz de aniquilar a

capacidade de resposta da outra parte”133.

Contudo, no final de 1972 iniciam-se as negociações para rever o Tratado SALT

(Novembro 1972). Em parte esta renegociação ficou a dever-se ao facto de o SALT-I

assinado permitir uma superioridade numérica em armamentos balístico da União

Soviética em relação aos Estados Unidos. Na América, o Senador Jackson foi a voz do

descontentamento com esta situação e gerou uma luta interna para que esta

renegociação acontecesse. Não foram tempos fáceis para os EUA com o choque do

petróleo e a demissão de Nixon em 1974 por causa do caso Watergate. Em cima da

mesa estava mais uma vez a redução de armamento, mas também a introdução de

pontos importantes sobre a verificação, o número máximo de ogivas por míssil e o teste

e colocação de novos tipos de mísseis (algo que o SALT-I não previa).134

Contudo, o

Congresso norte-americano não ratificou o SALT-II em parte pela invasão do

Afeganistão pela URSS.

Nas negociações dos Tratados SALT o uso de satélites para recolha de

informações teve um papel vital. Richard Helms, Director da CIA de 1966 até 1972,

afirmou que o Corona foi indispensável nas negociações do SALT-I. Afirmou inclusive

anos mais tarde:

“President Nixon, for example, has told me, “If you can’t verify an

arms control treaty, we’re not going to hold any arms control negotiation.

(…) One of the pivotal points of the negotiations rested on mutual

verification; we were trying to match the Soviet’s figures with ours,

Fortunately, the Soviets said they’d agree to use our projections about

their forces, which we had, unbeknownst to them, compiled using

132 MCDOUGALL, Walter A., ibid, p. 431

133 DROZ, Bernard et ROWLEY, Anthony, (2000), “História do Século XX – Expansão e Independências

(1950-1973)”, Lisboa, Publicações D. Quixote, p. 560 134

DUNBADIN, JPD, ibid, pp. 57-68

42

CORONA. So, in other words, CORONA produced the arms control

statistics that we used to resolve the SALT I negotiations.”135

De facto, sobretudo nas negociações do Tratado Salt I, as delegações de ambos os

países tinham presentes técnicos e analistas de intelligence e reconhecimento de

imagens espaciais. Isto porque técnicos e analistas com conhecimentos na área de

estratégia e peritos responsáveis pelos sistemas de recolha de informações eram

considerados adequados para acompanhar o processo. Como conselheiros nas

delegações, reportavam as últimas novidades em matéria de informação e análises e

davam parecer em termos específicos a serem utilizados no tratado, entre outras

competências. Contudo, os conselheiros na área de intelligence não faziam nem

recomendavam políticas a seguir, apenas providenciavam análises objetivas de factos.

Nesta época era reconhecido que “the Intelligence Community helps policy

makers determine what sort of verification provisions would be desirable, should be a

treaty, to complement our own NTM capabilities and to optimize our ability to monitor

activities and ensure credible and effective verification”136

. Laurence Nardon afirma

inclusive que “satellite observation can be used for various and self-serving policy

ends”.137

Contudo, deixa também bem claro que a tecnologia de satélite não pode ser

usada para qualquer fim: “space observation technologies are therefor not flexible to all

political ends”138

, porque por exemplo, tem as suas limitações tecnológicas (outros

atores terem posse do mesmo tipo de meios tecnológicos).

Richard Helms, num discurso que proferiu no National War College em Outubro

de 1971139

vem reforçar a importância do apoio da “intelligence” no controlo de

armamento:

135 DAY, D. A., J. M. LOGSDON, et al. (1998), “Eye in the sky : the story of the CORONA spy

satellites” Washington, D.C. ; London, Smithsonian Institution Press, p. 180 136

GRAHAM, T. and HANSEN K. A. (2007). ibid, pp. 61-62 137

NARDON, Laurence, (2007), “Cold War Space Policy and Observation Satellites, Astropolitics, vol 5,

2007, p. 44 138

NARDON, Laurence, (2007), ibid, p. 58 139

Discurso entretanto desclassificado.

43

“Since 1969, it [intelligence to support to the SALT negotiations] has

grown so rapidly in importance and urgency that it now is one of our

foremost continuing concerns. Intelligence has major roles to play. We

are responsible for defining the Soviet Strategic capabilities which are

to be limited in any treaty. After any agreement is signed, we will be

even more involved in continually monitoring whether the Soviets are

observing those limits. An agreement as wide-ranging as the one

contemplated at SALT has had to await the advent of a reliable,

repeatable means of verification from outside the URSS. This brings me

into an area which I must tread with the greatest care. I am talking, of

course, of satellite reconnaissance. Everyone knows that this activity is

going on. And yet we go to considerable lengths – and endure

considerable inconvenience – to maintain a security barrier around it.

One is that certain details of the program still must be kept from the

Soviets if it is to remain fully effective. The second is that Soviets

themselves are very anxious that it not be discussed. They are aware of

what we are doing, although not of the extent of our success, and they

have a vigorous program of their own. In fact, last year they launched

about three times as many reconnaissance satellites as we did.”140

Richard Helms vai mais longe neste discurso ao referir-se aos meios de verificação do

tratado como sendo algo imprescindível e de vital importância para os EUA:

“If a treaty is finally achieved, you will find this point covered in language like

“national technical means of verification, operating within the generally

accepted principles of international law”. The will be no misunderstanding

between Whashington and Moscow about what is meant. But we’ll avoid a lot

of problems by saying it that way. The first full-system success came in 1960,

almost overlapping with the last U-2 flight over Soviet territory. Since then,

140 GRAHAM, T. and HANSEN K. A. (2007). ibid pp. 62-63

44

reliability has become excellent. The performance of the system, as well as the

quality of the product, has dramatically improved. It has come to embrace

electronic, infrared, and other kinds of intelligence in addition to imagery. We

have reached the point where we can give to the President some definite

assurances about just what sort of treaty provisions we can and cannot

monitor with confidence.”141

Mais tarde, quando o Tratado foi assinado, ficou expresso que as verificações

seriam efetuadas pelos “meios técnicos nacionais de verificação”. Não foi de forma

inocente que esta passou a ser a referência em direito internacional na área de controlo

de armamento, isto porque desta forma, e apesar de ambas as partes terem

conhecimento do uso deste tipo de tecnologia, não fica em causa a soberania dos

Estados nem a violação do espaço de cada Estado. Com os meios tradicionais de recolha

de informações, os Estados violavam o espaço soberano do outro Estado e daí a queda

do U-2 em território soviético ter gerado ainda mais celeuma.

Em meados da década de 90, no âmbito das negociações do Tratado para Banir

Testes Nucleares (em inglês: CTBT – Comprehensive Nuclear Test Ban Treaty –

negociado em 1996 mas que nunca entrou em vigor142

), o termo “meios técnicos

nacionais de verificação” continuou a ser usado por outros países, como França, Reino

Unido. Contudo nas negociações da década de 90, China, Índia e Paquistão opuseram-se

e tentaram inclusive que EUA e Rússia definissem o que queriam dizer por “meios

técnicos nacionais de verificação”. Obviamente, ambos recusaram, argumentando que

qualquer definição “would facilitate cheating and unnecessarily restrict future

developments of collection systems, which would be unwise in the contexto of an

indefinitve treaty”, facilitando inclusive exemplos: “space, aerial, sea and ground

detectors, as well as nationally owned and operated systems that paralleled those

planned for CTBT’s International Monitoring System”.143

141 GRAHAM, T. and HANSEN K. A. (2007). ibid., p.63

142 GRAHAM, T. and HANSEN K. A (2007). ibid., p. 128

143 GRAHAM, T. and HANSEN K. A (2007). Ibid,.p. 52

45

Em conclusão, a tecnologia de satélite teve um papel preponderante no controlo

de armamento desde finais da década de 1960, tendo inclusive influenciado as posições

nas negociações dos tratados ABM e SALT. Prova da sua eficácia foi o episódio em

1983 quando os satélites americanos descobriram que os soviéticos haviam construído

um novo radar para deteção de mísseis balísticos na Sibéria. No final da década de

1970, tanto EUA como URSS usavam a tecnologia espacial não para persuadir ou

dissuadir pacificamente, mas para fornecer informações para troca mútua de

acusações.144

A Guerra das Estrelas

Em 1980, ambas as superpotências dependiam de sistemas militares passivos no

espaço para C3I145

. Uma vez instalados no espaço os sistemas vitais, estes tornavam-se

alvos convidativos e métodos de defesa eram necessários.146

Esta década viu os seus padrões políticos da tecnologia espacial sofrerem um

fluxo na mesma proporção aos implementados em 1961.

Assim, em 1981, o programa espacial americano Space Shuttle entrou em

funcionamento, revitalizando o interesse nacional e parecendo restaurar o predomínio

americano no espaço. O presidente Ronald Reagan invocou então o presidente Kennedy

ao anunciar uma estação espacial num espaço de uma década, apesar dos conselhos

adversos dos seus conselheiros. Segundo Reagan, no discurso proferido em Março de

1983 anunciando a criação da Strategic Defense Iniciative (SDI): “This strategy of

deterrence has not changed. It still works. But what it takes to maintain deterrence has

144 NARDON, Laurence, (2007), “Cold War Space Policy and Observation Satellites, Astropolitics, vol 5,

2007, p. 49 145

Communications, Command, Control and Intelligence 146

Idem, ibid., pp. 433

46

changed”147

. As palavras que Reagan utilizou para anunciar a SDI foram bastante

apelativas e demonstram que os EUA queriam fazer crer que a SDI teria apenas efeitos

defensivos:

“What if free people could live secure in the knowledge that their

security did not rest upon the threat of instant U.S. retaliation to

deter a Soviet attack, that we could intercept and destroy strategic

ballistic missiles before they reached our own soil or that of our

allies?148

Os orçamentos militares eram superiores ao da NASA em 1981 pela primeira

vez desde a década de 1950, e a Strategic Defense Iniciative (SDI) de Reagan aumentou

consideravelmente os fundos para investigação de sistemas ABM baseados no espaço,

capazes de destruir mísseis na boost phase. A SDI (ou Star Wars, como foi apelidada

pelos seus críticos) desenhou novas possibilidades tecnológicas e opôs-se aos 20 anos

de adesão à estratégia americana de destruição mútua assegurada e à sua doutrina de que

o espaço era um santuário para sistemas militares passivos e fora dos limites para

armamento ativo.149

A URSS, no entanto, considerava a SDI como ofensiva, apesar de se tratar de

um sistema defensivo. Oleg Kalugin, um antigo General do KGB, afirmou: “When

President Reagan started this program, Soviet intelligence had already obtained

information on the 'Star Wars' program, and they were scared. They were convinced

they would never be able to match the U.S. program for purely financial reasons."150

147 http://pierretristam.com/Bobst/library/wf-241.htm , acedido em 11/05/2012

148 Idem, ibid., acedido em 16/10/2005

149 MCDOUGALL, Walter A,, ibid., pp. 434

150 KENNEDY, Bruce, “War Games – Soviet, fearing Western Attack, prepared for worst in ‘83”,

disponível em http://www.militaryphotos.net/forums/showthread.php?36104-Soviets-prepared-for-worst-

in-1983 acedido em 11/05/2012

47

Entretanto, os Soviéticos tinham uma nova estação espacial – a MIR – que

possibilitava a presença humana no espaço de forma continuada.151

As missões de longa

duração na MIR estavam tecnicamente planeadas para perceber se o ser humano

aguentaria uma missão tão longa como ir a Marte. Estas missões tinham também outro

propósito: pretendia-se que mostrassem que pôr um homem na Lua e depois abandonar

o local não era tão sério, nem tão importante e nem tão prestigiante quanto um programa

espacial maduro e sério que iria manter pessoas por longos períodos no espaço com

propósitos científicos.152

Durante os primeiros lançamentos do space shuttle americano, os soviéticos

estavam também a testar o seu próprio veículo reutilizável – o programa Buran. O

primeiro e único lançamento foi efetuado por uma nave não tripulada e sem nome no

Energia, em Novembro de 1988.153

A Guerra do Golfo de 1991

Apesar da Guerra de Golfo de 1991 ser famosa por ter utilizado sistemas

espaciais em tempo real com fins táticos, a primeira vez que foram utilizados foi no

Panamá em 1989.154

Contudo, e por ter sido em maior escala utilizados, iremos aqui

focar a Guerra do Golfo de 1991.

Na manhã de 2 de Agosto de 1990, o Iraque invadia o Kuwait e começava assim

o conflito que ficou conhecido como a primeira guerra espacial. A 17 de Janeiro de

1991 a Operação Tempestade no Deserto começou com os disparos dos mísseis Hellfire

dos helicópteros Apache do exército dos Estados Unidos.155

Neste conflito, o poder

espacial demonstrou o potencial de estar na vanguarda na guerra. “In 1991, spacepower

151 MCDOUGALL, Walter A., ibid., pp. 435

152 BURROWS, William E, ibid., pp. 514

153 CNN, “Cold War Technology”, disponível em

http://www.cnn.com/SPECIALS/cold.war/experience/technology/, acedido em 16/10/2005 154

NARDON, Laurence, (2007), “Cold War Space POlicy and Observation Satellites, Astropolitics, vol

5, 2007, p. 38 155

LAMBERT, Benjamim S, (1999), “Air Power, Space Power and Geography”, Geopolitcs –

Geography and Strategy, ed. Colin Gray e Geoffrey Sloan, Frank Cass, New York, pp. 65

48

demonstrated that it could enable combat arms of all kinds to be much more lethal than

otherwise would be the case. Spacepower showed that it enhanced the fighting power of

all military elements prepared technically, doctrinally, and organizationally to exploit

its services.”156

Apesar do envolvimento militar na exploração do espaço remontar aos anos 50,

foi apenas na Guerra do Golfo que a potencial sinergia entre poder aéreo e espacial

começou a ser totalmente considerada. Apesar dos equipamentos espaciais apenas terem

desempenhado um papel de apoio na atividade das forças aliadas e nas operações de

combate que se seguiram, foram indispensáveis para determinar o curso da guerra. O

aumento da capacidade de combate das forças aliadas através do espaço assumiu a

forma de apoio à navegação e comunicação, informações meteorológicas, indicações e

avisos, avisos de ataques, vigilância e reconhecimento. Cada informação assumiu um

papel preponderante em assegurar a superioridade informativa da coligação durante a

guerra.157

O NAVSTAR Global Positioning System (GPS), sistema que esteve em

desenvolvimento pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos durante 18 anos,

desempenhou um papel chave na Guerra do Golfo.158

Este sistema providenciou

informação em tempo real e informação atualizada acerca dos alvos a um vasto tipo de

armas usadas pelas forças da coligação. O GPS demonstrou ser bastante útil no

indiferenciado terreno do deserto iraquiano que colocava desafios pouco usuais à

navegação159

, sendo descrito como um avanço tecnológico que “(…) provides the

technical capacity for armed forces to revolutionize modern warfare with readily

available, highly precise sensor, weapon, and logistical systems at all echelons of

military organization”160

.

Os iraquianos duvidavam que as forças da coligação conseguissem encontrar o

caminho pelo deserto. Até porque a navegação neste tipo de terreno havia colocado

156 GRAY, Colin S., (1999), “Modern Strategy”, Oxford, Oxford University Press, New York, pp. 263.

157 LAMBERT, Benjamin S., ibid., pp 73-74

158 PBS, “Frontline: the Gulf War”, http://www.pbs.org/wgbh/pages/frontline/gulf/weapons/gps.html,

acedido em 11/05/2012 159

LAMBERT, Benjamin S., ibid., pp. 74 160

RUSSEK, Michael and HASIK, James M. (2002), “The precision Revolution – GPS and the future of

Aerial Warfare”, Naval Institute Press, Maryland, p. 5

49

inúmeros problemas a anteriores campanhas no deserto. O GPS resolveu este problema:

usando um simples recetor, um veículo ou mesmo um soldado individual pode

encontrar a sua posição com uma margem de erro pequena, em qualquer parte do

mundo. A Guerra do Kuwait foi a primeira a usar este tipo de tecnologia e foi um

sucesso tremendo, porque tornou possível manobras noturnas que sem esta tecnologia

requeriam imensos guias e scouts. O GPS tornou possível à coligação alterar os seus

planos de ataque até ao último momento, uma vez que as forças que o utilizavam não

necessitavam de referências no terreno.161

Como a constelação de GPS ainda não estava completa nesta altura, apenas era

possível dispor do sistema por curtos períodos de tempo, sete vezes por dia. Isto

limitava a ação da coligação que teria de recorrer a sistemas menos precisos que o GPS.

Para as comunicações dos aliados, três satélites do Defense Satellite Communication

System asseguravam comunicações seguras. O Defense Meteorological Support

Program providenciava aos comandantes e planeadores as informações de vigilância e

de monitorização necessárias no que concerne a condições meteorológicas. Um sistema

de vigilância espacial que provou ser de extrema importância na caça aos SCUDs

iraquianos foi a constelação de satélites de infravermelhos do Defense Support Program

(DSP) que detetava a chama do exaustor do míssil 30 segundos após o lançamento.162

A Guerra do Golfo foi a primeira guerra onde os equipamentos espaciais tiveram

um papel preponderante. Pois, uma vez que não eram conhecidos todos os

equipamentos no terreno, muito do trabalho tático normalmente feito por aviões, foi

efetuado por satélites que foram redirecionados para esse objetivo. Sem os sistemas

espaciais a guerra dificilmente seria travada. Contudo, a Guerra do Golfo também

demonstrou as limitações inerentes ao uso desta tecnologia.163

“GPS provide accurate

position during Operations Desert Shield and Desert Storm, but was never designed to

provide the required communication capability for military command-and-control”164

.

161 FRIEDMAN, Norman (1991), “Desert Victory – The War for Kuwait”, Naval Institute Press,

Maryland, pp. 222-225 162

LAMBERT, Benjamin S , ibid., pp. 74-75 163

FRIEDMAN, Norman, ibid., pp. 240-241 164

RUSSEK, Michael and HASIK, James M., ibid, p. 122

50

Um sensor do satélite DSP foi utilizado para detetar e localizar locais de

lançamento de mísseis SCUD e para calcular potenciais alvos numa questão de minutos.

Todo este sistema DSP, comunicações, mísseis terrestres) era uma versão rudimentar da

projetada pela SDI de Reagan na década anterior.165

Numa guerra com cerca de cinco meses de preparação é possível fazer uma

recolha de imagens e mapeamento do local de combate com a preparação e rigor

necessários. A Defense Mapping Agency teve de trabalhar com prazos extremamente

apertados para recolher a informação necessária à elaboração dos mapas indispensáveis

ao uso dos Tomahwaks no Iraque. Isto fazia com que GPS – Tomahwaks fosse uma

ligação importante uma vez que toda a recolha de informação teria de ser feita com base

em equipamentos espaciais.166

Nunca antes num conflito os equipamentos espaciais desempenharam um papel

tão integrado e extensivo nas operações de combate como na Guerra do Golfo de 1991.

Uma mistura de satélites civis e militares proporcionaram ligações de comunicações

inter e intra teatro de operações, asseguraram transmissão de dados, informação

meteorológica, sistema de aviso prévio de lançamento de mísseis balísticos, vigilância e

imagem de reconhecimento e ainda SIGINT. “In fact, the Desert Storm experience so

altered the Pentagon’s perception of space-based systems that since then US forces

have never entered combat without such support”167

.

165 FRIEDMAN, Norman, ibid, p. 241

166 Idem, ibid, p. 242

167 RUSSEK, Michael and HASIK, James M., ibid, p. 123

51

Capítulo II

A República Popular da China completou com sucesso a sua segunda missão

tripulada a 17 Outubro de 2005. Tornou-se assim na terceira nação, após a Rússia e os

EUA, a ser capaz de colocar humanos no espaço. O primeiro voo tripulado em 2003

demorou pouco mais de 1 dia. O de 2005 durou 5 dias e envolveu dois “taikonautas”.

Alguns especialistas consideram que com esta capacidade a China é uma ameaça

competitiva na exploração do espaço. Outros que é um potencial parceiro. Neste

capítulo, ir-se-á focar sobre o papel da China na atual exploração espacial e como

utiliza as suas capacidades espaciais para influenciar e obter recursos de outros

Estados em proveito próprio.

China no Espaço – as origens

A China tem, como é bem conhecido, um longo percurso na história da

astronomia, astronáutica e sistemas de propulsão. Para só citar este exemplo, a pólvora

foi descoberta pelos Chineses no século III, que os levou a desenvolveram ao longo dos

tempos sistemas de propulsão mais rudimentares de foguetões, semelhantes ao que é

usado em fogo-de-artifício.

A História contemporânea também nos revela o interesse dos chineses em

temas do espaço. Hoje, já não são só astrónomos a revelarem o futuro, mas cientistas

políticos com olhos posto no espaço que traçaram o futuro do gigante asiático. Tsien

Hsue Shen é o nome associado ao programa espacial chinês moderno, como a pessoa

que mais contribuiu para o seu desenvolvimento através dos seus trabalhos na área de

aeronáutica e astronáutica. No final da década de 1940, Shen desenvolveu o conceito de

um avião espacial, transcontinental, capaz de voar 400km acima da Terra, onde os

passageiros poderiam sentir por breves instantes a ausência de gravidade. O design do

seu avião espacial era bastante semelhante ao V-4 alemão. No ano seguinte, Tsien Hsue

52

Shen anteviu que o homem iria à Lua dentro de 30 anos, os seus planos visionários

inspiraram os americanos nos antecessores do space sthulle.168

A 8 de Outubro de 1956, o Partido Comunista Chinês cria a 5ª Academia de

Investigação do Ministério de Defesa Nacional para desenvolver o esforço espacial

chinês. Esta data é conhecida por ser a data oficial do início do programa espacial

chinês. Tsien foi o primeiro diretor do Instituto de Investigação de Propulsão criado

dentro da Academia. Numa primeira fase, esta instituição dedicou-se a qualificar

recursos humanos, sobretudo na área de concepção de mísseis e na sua preparação para

o voo. Como a China não possuía, naquela altura, a capacidade de construção dos

mesmos, aliou-se à União Soviética.169

O acordo de cooperação Sino-Soviética iniciou-se em 1957 e estabelecia uma

cooperação técnica entre os dois Estados entre 1957 a 1987, onde a URSS concordava

em ceder à China modelos de mísseis, documentos técnicos, design e especialistas.

Contudo, esta cooperação foi marcada por demasiada burocracia que levaram os

chineses a considerar não existir real boa-fé por parte dos soviéticos no fornecimento

total de informação, duvidando da mesma.

Apesar da incerteza, os chineses decidiram iniciar com um projeto com o nome

de código 1059, que consistia na cópia do R-2 soviético, obrigando, por isso, a

consistente intercâmbio entre especialistas soviéticos e chineses. Com a concretização

do projeto, os técnicos do programa espacial chinês perceberam então as dificuldades

técnicas em produzir um foguetão, considerando o nível de exigência e sofisticação da

tarefa.170

168 HARVEY, Brian (2004). China's space program : from conception to manned spaceflight. London;

Springer, pp. 16-21 169

HARVEY, B. (2004). Ibid, pp. 22-23 170

HARVEY, B. (2004). Ibid, pp. 23-25

53

Tabela 1: Código dos projetos do programa espacial Chinês

Código Ano Projecto

1059 1958 Cópia do R-2 soviético (1958)

581 1958 Projecto de satélite terrestre (1958)

651 1965 Projecto de satélite terrestre, renovado (1965)

911 1967 Programa de satélites recuperáveis (1967)

701 1970 Ji Shu Shiyan Weixing (1970)

714 1971 Programa Espacial Tripulado de Shuguang (1971)

761 1977 Souding rockect programme (1977)

331 1977 Satélite de comunicações (1977)

863 1986 Advanced tecnhologies for the sciences (1986)

921 1992 Programa espacial tripulado (1992)

211 2003 Sonda lunar (2003)

Fonte: Harvey, B. (2004). China's space program: from conception to manned spaceflight. London ;Springer, pp. 22-

25

Para além da ambição de lançar um satélite, a concretização do projeto

deparou-se com consideráveis divergências entre os intervenientes políticos, militares e

cientistas. Contudo, é de realçar a aspiração à grandeza patente na missão para o

primeiro satélite: um instrumento experimental de recolha dados e que ajude no

desenvolvimento de satélites de observação terrestre, meteorologia e comunicações. A

estratégia de comunicação desta missão poderia ser resumida numa única frase: “get it

up, follow it around, make it seen, make it heard”.171

Apesar de a China não ter participado ativamente na corrida espacial ainda

durante a Guerra Fria, sobretudo por questões políticas internas que estagnaram o

programa espacial chinês, na década de 70 a China lançou o seu primeiro satélite.

171KULACKI , Gregory e LEWIS, Jeffrey G. (2009) “A place for One’s Mat: China Space Program 1956

to 2003”, Cambridge, American Academy of Arts and Sciences, p. 12 (disponível em: www.amacad.org

última vez acedido em: 31/10/2005)

54

Décadas mais tarde, já na década de 90, o programa espacial chinês iniciou a sua

fulgurosa evolução. Este considerável progresso e aposta prenderam-se sobretudo com a

Guerra do Golfo de 1991, conflito internacional em que os EUA demonstraram possuir

uma vantagem assimétrica assente em tecnologia aérea e, sobretudo, espacial. Isto fez

com que a China tivesse a perceção da importância que a tecnologia espacial teria para a

melhoria da sua vertente militar, para além das vantagens civis. O programa espacial

chinês tornou-se assim, muito rapidamente, no segundo maior orçamento espacial na

Ásia, ultrapassado apenas pelo Japão. Este aumento considerável no seu orçamento

obrigou o programa espacial chinês a assumir uma posição de liderança regional, com

especial enfâse nas capacidades militares e nas capacidades de voos espaciais

tripulados.172

Em 2003, a China tentou com sucesso o seu primeiro voo tripulado colocando

em órbita apenas um taikonauta, tendo em 2005 conseguido pela primeira vez colocar

uma equipa de dois taikonautas no espaço. Tornou-se assim, em 2003, na terceira nação

a conseguir colocar homens no espaço dependendo apenas da sua própria tecnologia.

Também em 2003, a China começou a sua cooperação com o projeto de

sistema de navegação europeu: o Galileu. Apesar das negociações entre EUA e EU

terem sido intensas, sobretudo na questão da participação chinesa, o acordo sino-

europeu avançou e, ainda hoje, a China é um dos principais parceiros tecnológicos da

Europa.

Marco importante no programa espacial chinês, foi a realização de um teste

anti-satélite em Janeiro de 2007, que consistiu na destruição de um satélite

meteorológico chinês, criando inúmeros detritos que ficaram em órbita colocando em

risco os outros satélites que lá se encontram. A reação da comunidade internacional a

este teste não foi das melhores, tendo vários Estados condenado publicamente pelo

perigo da criação de lixo nas órbitas terrestres.

Apesar da polémica em torno do programa espacial, chinês, certo é que forte e

ciente dos seus sucessos em apenas uma década de investimento intensivo em

172 MOLTZ, James Clay (2011), Asias’s Space Race: National Motivations, Regional Rivaliries and

International Risks, p. 70

55

tecnologias espaciais, a China declara de forma ambiciosa mas não desmedidas, nos

poucos documentos públicos sobre o seu programa espacial, conseguir até 2020:173

:

construir um sistema de observação terrestre de longa duração

instalar uma rede independente de satélites de comunicação

implementar serviços de lançamentos comerciais

estudar no espaço a microgravidade, ciências vitais da vida, desempenho

de materiais e astronomia.

desenvolver o plano de exploração da Lua.

Pensando para a longo prazo, a partir de 2020, são objetivos divulgados da

China174

:

aumentar seu conhecimento nas ciências espaciais

construir uma estação espacial orbital

levar naves tripuladas à Lua

construir uma base lunar habitada

exploração profunda não-tripulada do Sistema Solar

China no Espaço: o que a motiva?

Teoricamente, importa referir, antes de mais, Joseph Nye Jr. Este cientista-

político desenvolveu um conceito nas relações entre os Estados: soft power. Para Nye,

soft power é a capacidade de conseguir o que queremos através da atração em vez da

coerção ou de pagamentos. O soft power surge através da atração que provoca pela

cultura, política e pelas ideias. Assim, nesta perspetiva, quando as políticas parecem ser

legítimas aos olhos dos outros, o soft power aumenta.175

O soft power de um país

assenta, por isso, sobretudo em três recursos: a sua cultura (os lugares que são atrativos

para outros), nos seus valores políticos (quando vive de acordo com ele quer dentro quer

173“China Space activities 2011”, disponível em

http://images.spaceref.com/china/ChinaSpaceActivitiesin2011.pdf , acedido última vez em 20/10/2012 174

“China Space activities 2011”, disponível em

http://images.spaceref.com/china/ChinaSpaceActivitiesin2011.pdf, acedido última vez em 20/10/2012 175

NYE JR, Joseph S., Soft Power: The Means To Success In World Politics, pp. 70-72

56

além fronteiras) e na sua política externa (quando é visto como legítimo e tendo

autoridade moral).176

O soft power traduz-se na prática na capacidade de um Estado

seduzir outros a fazer com que admirem os seus ideais, de fazê-los querer o que nós

queremos. Além disso, segundo Nye, a sedução é muito mais eficaz e menos

dispendiosa do que a coerção, para além disso a promoção de muitos valores como

democracia, direitos humanos ou oportunidades individuais são extremamente

sedutoras.177

Considerando isso, podemos afirmar com um certo grau de certeza que os

países asiáticos têm uma fonte considerável de soft power na sua cultura. As artes, moda

e cozinha asiáticas têm tido um forte impacto no mundo há séculos. A China tem tido

esse soft power em consideração na sua expansão, dando os primeiros passos para

exercer esse soft power também pelo desenvolvimento tecnológico, para fins

económicos e políticos. Existem além do sudeste asiático, outros centros para onde o

soft power chinês tem-se expandido, o que faz crer que a estratégia chinesa para a

expansão da sua esfera de influência concentra-se em avançar por regiões ao invés de

assumir uma postura que prime pela abordagem global. Contudo, a China tem como

principais desafios ligados a sua imagem propagadora do soft power, algumas questões

internas ligadas aos direitos humanos e problemas ambientais.

Assim, o programa espacial não só traz vantagens económicas e tecnológicas

diretas para a China, como ainda enaltece a reputação chinesa. Se no passado, as

motivações para investir em projetos de tanta ambição e especulativos eram a

celebração de um poder divino ou real, a procura de lucro e a guerra, na atualidade estes

três motivos misturam com outros: o respeito e prestígio perante os outros Estados, a

liderança tecnológica e científica. Atualmente é inegável que o objetivo principal do

programa espacial chinês é realçar simultaneamente o poder militar, económico e

político do estado Chinês, através do desenvolvimento de parcerias internacionais que

passam pelo reconhecimento e credibilidade do Estado chinês. Na verdade, uma das

razões para a China ter investido tão agressivamente no seu programa espacial prende-

176 NYE JR, Joseph S., ibid, pp. 299-301

177 NYE JR, Joseph S., ibid, pp. 76-80

57

se com a obtenção do reconhecimento e prestígio do Estado na comunidade

internacional, assim como, no, não menos importante, orgulho patriótico a nível interno.

O reconhecimento e o prestígio internacional, como parte de um conjunto vasto

de ações, podem ter implicações e resultados geoestratégicos consideráveis. Consciente

disso, nos últimos anos, a China pôs em prática uma campanha de charme, tanto tendo

como destinatários os seus vizinhos asiáticos como o resto do mundo. A campanha de

marketing foi cuidadosa e deliberadamente desenhada para transformar, modelar, a

imagem chinesa: de um rufia para um parceiro potencial e de confiança. Este propósito

foi realizado usando meios políticos realistas de aparente ajuda humanitária, mas nem

sempre de forma altruísta, promovendo ajuda pelos recursos: pacotes de ajuda a África,

acordos de comércio e pacotes de ajuda na Ásia, incursões nos países da América do

Sul. Como resultado, sondagens de 2005 levada a cabo pelo Pew Research Center foram

indicativas do sucesso da China nesta sua campanha de marketing junto da comunidade

internacional. De acordo com esta sondagem, levada a cabo entre Abril e Maio 2005:

“China now has a better image than the U.S. in most European nations surveyed”178

.

178 Pew Global Attitudes Project, U.S. Image Up Slightly, But Still Negative: American Character Gets

Mixed Reviews, Washington, D.C.: Pew Global Attitudes Project, 2005, p. 2, disponível em:

http://www.pewglobal.org/files/pdf/247.pdf, última vez acedido a 21/10/2012

58

Tabela 2: Rating Nações

Fonte: Pew Research Center

Tabela 3: A China vista por outros países

Fonte: Pew Research Center

59

Como demonstração do crescimento dessa popularidade, tornaram-se do

domínio público as parcerias comerciais da China com diversos Estados, tais como a

Nigéria, a Venezuela, a França, assim como as suas parcerias científicas relacionadas

com o espaço que mantém, nomeadamente, com Inglaterra e a Agência Espacial

Europeia (ESA). Apesar destas parcerias constituírem uma percentagem global ainda

reduzida, tanto nos lançamentos espaciais e como na indústria de serviços de satélite,

demonstra invariavelmente a vontade da China em cooperar com nações

geograficamente afastadas, potencialmente por objetivos políticos e estratégicos.179

A

estratégia chinesa para se promover enquanto fornecedor de serviços a outros Estados,

apesar dos custos económicos a curto prazo, teve sempre em consideração os lucros e

vantagens que possam advir da sua boa reputação.

O Astrofísico e cientista político Neil deGrasse Tyson afirma que os planos

chineses tornados públicos poderão dar origem a um “momento Sputnik” para os EUA,

forçando estes a tomar ações que reforcem o plano espacial americano, entretanto a

meio gás.180

Por exemplo, retomar os planos para voos tripulados à Lua e Marte. Neste

sentido, Joan Johnson Freese é da opinião que a “space activity, particular manned

spaceflight, also yields considerable prestige, prestige that translates to political

prowess”181

.

Sendo a China uma potência em ascensão, quer a nível regional quer a nível

mundial, é-lhe inerente a sede por prestígio como forma de afirmação geoestratégica,

em detrimento de outras potências locais. De facto, após o primeiro voo tripulado em

2003, um dirigente no Japão afirmou que “Japan is likely to be the one to take the

severest blow from the Chinese success. A country capable of launching any time will

have a large influence in terms of diplomacy at the United Nations and military affairs.

179 CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international

relations, pp. 49-50, disponível em

http://edocs.nps.edu/npspubs/scholarly/theses/2009/Mar/09Mar_Chambers.pdf 180

DEGRASSE TYSON, Neil, (2012) “The Case for Space – Why we should keep reaching for the

stars”, Foreign Affairs, Abril 2012, Kindle Edition 181

JOHNSON FREESE, Joan (2007 -2), “China’s Space Ambitions”, disponível em:

http://www.ifri.org/downloads/China_Space_Johnson_Freese.pdf, acedido última vez em 21/10/2012, p.

7

60

Moves to buy products from a country succeeding in manned space flight may

occur.”182

A China tem vindo a apresentar a sua indústria espacial como um ponto

essencial da sua política de desenvolvimento estratégico para o país. O que indicia não

só importante papel desta indústria no desenvolvimento económico e social da China,

mas também demonstra que a sua indústria espacial se fortaleceu consideravelmente,

colocando-a entre os países na liderança em algumas áreas relacionadas com tecnologia

espacial.

A China, tal como outros membros do exclusivo clube espacial, incluindo os

países europeus, defende que os investimentos em tecnologia de duplo uso, ou seja,

simultaneamente de uso civil e militar, são desejáveis por causa da maior taxa de

retorno de um investimento que é considerável. Diferentemente, os EUA vêem este tipo

de tecnologia como algo a desencorajar fora dos EUA, preferindo incentivar o

investimento em tecnologias sem qualquer tipo de uso militar. De facto, a posição dos

EUA é que se a tecnologia de duplo uso está a ser desenvolvida pela China, é para os

seus objetivos militares, quando na verdade, tem parecido que a China desenvolve a

tecnologia espacial para duplo uso, fins militares e fins civis.183

Segundo o relatório chinês sobre atividades espaciais de 2011, prevê-se que a

China trabalhe nos próximos anos nos seus objetivos estratégicos e fortaleça as suas

capacidades de inovação e expanda a cooperação internacional. Para isso, a China

pretende que a sua indústria espacial seja melhor e mais rápida, o que implica que em

simultâneo a China trabalhe em conjunto com a comunidade internacional para manter o

espaço exterior numa zona limpa e pacífica e encete esforços para contribuir na

promoção da paz mundial e no desenvolvimento.184

182 JOHNSON FREESE, Joan (2007 - 2), ibibid, p.7

183JOHNSON-FREESE, Joan (2007 - 2), ibid, p. 8

184“China Space activities 2011”, disponível em

http://images.spaceref.com/china/ChinaSpaceActivitiesin2011.pdf , acedido última vez em 20/10/2012

61

No plano apresentado em 2011, a China apresentou as suas prioridades para o

programa espacial até 2016. A China pretende fortalecer as suas capacidades básicas na

indústria espacial, acelerar a investigação em tecnologia de ponta e continuar a

implementar projetos tecnológicos e científicos na área espacial, incluindo, voos

tripulados, exploração lunar e um sistema de observação terrestre de alta resolução, um

sistema de navegação e posicionamento, uma nova geração de lançadores e outros

projetos em áreas chave. A China pretende ainda desenvolver uma plano abrangente de

construção de infraestruturas espaciais, promover os seus satélites e a indústria de

aplicações de satélites, conduzir investigação científica espacial e coordenar e

desenvolver de forma sustentável um plano para a indústria espacial chinesa.185

Apesar de no passado a China ter construído o seu programa espacial com base

na ajuda material e na cooperação efetiva de outros Estados para desenvolver as suas

capacidades espaciais, é notória a vontade de agora avançar sozinha, progredindo lenta

mas firmemente. Porém, não se tem negado a cooperações pontuais, de facto a China

poderá cooperar em atividades espaciais para acelerar um aspeto particular do seu

programa, ou para ganhar quer prestígio quer reconhecimento ao longo do caminho que

percorre, mas o seu objetivo final é claro: tornar-se um jogador de peso na corrida ao

espaço.186

Os planeadores e estrategas chineses aprenderam com a corrida espacial da

Guerra Fria que um programa espacial forte é uma forma excelente de desenvolvimento

das capacidades de engenharia.187

Caso a China seja o segundo país a colocar um homem na Lua com sucesso,

será um sinal claro e inequívoco que a China é um país em ascensão, com uma base

tecnológica forte e estável, e que os produtos made in China não poderão ser

considerados apenas imitações baratas dos produtos ocidentais. Os estrategas militares

chineses compreendem claramente o uso do espaço nas operações militares como sendo

185 “China Space activities 2011”, disponível em

http://images.spaceref.com/china/ChinaSpaceActivitiesin2011.pdf , acedido última vez em 20/10/2012, p.

8 186

SABATIER, Vincent e FAITH, G. Ryan, “Space power: a crowded field”, World Politics review

features, May 17, 2011. 187

SABATIER, Vincent e FAITH, G. Ryan, “Space power: a crowded field”.ibid.

62

uma mais-valia, principalmente depois do impacto que o uso destas capacidades tiveram

na Guerra do Golfo de 91, em que os EUA obtiveram uma vantagem assimétrica. Por

esse motivo, têm desenvolvido essas capacidades de uma forma bastante discreta.188

Relações Internacionais espaciais da China

1. China versus Europa

China e Europa têm uma visão comum sobre espaço: ambos vêm os programas

espaciais como sendo algo que gera tecnologia, e tecnologia como sendo algo que

impulsiona desenvolvimento económico. Ambos partilham ainda a mesma visão

filosófica, segundo a qual investir em tecnologia de duplo uso permite a maximização

dos retornos dos escassos recursos disponíveis. Além disso, ao ser claro que esta visão

permite usar estes ativos não numa missão mas potencialmente em duas, a sua

justificação política torna-se muito fácil.189

A crescente parceria sino-europeia, especialmente na área espacial, pode ser

explicada por interesses estratégicos comuns ou convergentes:

1) maximizar as suas posições económicas perante os seus grandes

concorrentes, EUA e Japão, e

2) de certa forma, fazer frente ao poderia americano.

Desde 2004 que a UE tornou-se no maior parceiro comercial da China,

destronando desta forma o seu vizinho o Japão. A China importou mais de 64 biliões de

euros190

em tecnologia europeia, mais do que qualquer outra origem produtiva externa.

188 SABATIER, Vincent e FAITH, G. Ryan, “Space power: a crowded field”. Ibid

189 JOHNSON-FREESE, Joan (2006), “The emerging China-EU space partnership: a geotechnological

balancer”, Space Policy n.º 22, Elsivier, pp. 12-13 190

Valores apresentados à taxa de câmbio do início de 2004.

63

Ao atingir o valor de 135 biliões de euros em 2004, o comércio entre China-EU tornou-

se 3 vezes superior ao comércio entre China-Rússia.191

E apesar das múltiplas parcerias que tem vindo a estabelecer em diferentes

projetos europeus, a China irá provavelmente até 2020 superar o comércio de ativos

espaciais europeus.

O Beidou, o sistema de navegação chinês estará previsivelmente operacional

antes do seu homólogo europeu, o Galileu. Também os veículos lançadores chineses, o

Long March 5 (com previsão de inicio de uso em 2014) irão superar a performance do

Ariane 5 (o lançador europeu) e os seus sucessores.192

Relativamente ao sistema de navegação, a UE acolheu no seu projeto Galileu

vários parceiros não europeus, como Israel, África do Sul, Índia e Coreia do Sul, cujo

interesse na proposta europeia se traduziria com uma participação mínima de 5 milhões

de euros no projeto. A China contudo, tem uma participação/cooperação mais alargada

no projeto Galileu. Primeiro porque a sua participação inicial se traduziu numa

contribuição financeira de 200 milhões de euros e porque as contrapartidas para as

empresas chinesas passariam pela participação na construção de infraestruturas tanto no

solo como no sistema espacial assim como no desenvolvimento das aplicações e do

mercado. Em contrapartida, a UE não estava disponível para que a China participasse

nos elementos duais do sistema nem no sinal de restrição PRS193

nem na colocação da

arquitetura de controlo do sistema. 194

Contudo, a participação chinesa nem sempre foi unânime entre os parceiros

europeus. Na verdade, com a rejeição da França e Alemanha em 2005 de uma

Constituição Europeia, as pressões da indústria europeia para serem estes a desenvolver

as aplicações de mercado sem a China e o receio que, devido às sanções tecnológicas

dos EUA à China, os europeus não pudessem utilizar no projeto Galileu tecnologia

191 Johnson-Freese, Joan (2006), ibid, p. 13

192 SABATIER, Vincent e FAITH, G. Ryan, “Space power: a crowded field”. Ibid

193 Sinal exclusivo para uso governamental emitido pelo sistema de navegação ou por outro tipo de

satélites 194

NARDON, Laurence et MESSERLIN, Pierre, (2004) “Les États-Unis face au défi spatial chinois”

disponível em: http://www.ifri.org/files/CFE/US_defi_spatial_chinois.pdf, última vez acedido a

29/10/2012, pp. 7-8

64

americana vital para o sucesso do projeto, fez com que a China apostasse cada vez mais

num sistema de posicionamento e navegação seu. Face a algum impasse político-

jurídico foram estabelecidas uma série de parcerias diretas com a Agência Espacial

Europeia (ESA) e a Comissão Europeia (CE) de investigação na China e até se tornou

possível a realização de joint-ventures com empresas europeias neste segmento de

mercado para que a China desenvolva o seu próprio sistema.195

Tabela 4 - Projectos Cooperação entre China e Europa

Fonte: European Space Policy Institute

2. China versus EUA

195 POLLPETER, Kevin, (2008) “Building the future china progress in space technology during the tenth

5 year plan and the US response”, disponível em

http://www.strategicstudiesinstitute.army.mil/pdffiles/pub852.pdf, última acedido a 29/10/2012, p. 14

65

A relação entre a China e EUA em matéria de exploração e tecnologia espacial

nem sempre foi pacífica, ladeada de negociações tensas e demoradas num mercado

altamente competitivo. Assim, na década de 1990, a China empenhou-se em construir

um foguetão de confiança que permitisse entrar no mercado internacional e responder às

necessidades do mercado doméstico. Neste caso, a China só conseguiu obter a

aprovação dos EUA porque concordou com um sistema de quotas que limitasse o

número de voos a concorrer para o lançamento de satélites ocidentais e a manter o preço

dentro de certos limites que não colocasse em causa os lançadores americanos. Os EUA

concordaram com estes termos porque grande parte dos satélites mundiais tinham

tecnologia americana e por terem em vigor uma série de regras à exportação de

tecnologia. Contudo, os EUA não eram de longe o único cliente possível da China.

Paquistão, Suécia, Austrália e outros países ocidentais eram também potenciais clientes

para este novo serviço proposto pela China.196

Contudo, uma série de incidentes técnicos e lançamentos falhados colocaram

em causa a relação sino-americana.

As difíceis investigações ao acidente com o Intelsat em Agosto de 1996, a

partilha de informação entre investigadores e oficiais chineses e uma China pouco

aberta em relação às investigações, provocou um incidente de maior relevo nas relações

bilaterais dos dois países. O Comité COX, criado para investigar estes incidentes, fez

uma série de alegações e acusações à China em meados de 1999 sobre a área de mísseis

e espaço. O relatório do Comité alegou que as investigações conduzidas em 1996

resultaram na transferência de know-how que beneficiou diretamente o sistema de

mísseis chinês. Seguiu-se uma troca de comentários e críticas ao Comité sobre se de

facto a tecnologia envolvida nas investigações se revestia da sensibilidade e

confidencialidade alegada pelos membros do Comité. Contudo, e apesar da polémica, as

conclusões do relatório Cox foram essenciais na aprovação de legislação sob a

Administração Clinton de recategorizar toda a tecnologia espacial e itens de munições

no US Traffic in Arms Regulations (ITAR). A cooperação americana com a China teve

por isso uma dura e demorada paragem. Durante o resto da Administração Clinton, tal

como na administração Bush, a China não lançou mais nenhum satélite americano e

196MOLTZ, James Clay (2011), ibid, p. 88-89

66

nenhum tipo de cooperação na área do programa espacial civil foi considerado com a

China. O caminho posto em prática durante a Administração Reagan tinha chegado ao

fim e um período de inimizade no que diz respeito ao espaço foi alimentado por grupos

conservadores e militares de ambos os países.197

As relações entre estes dois gigantes económicos ficaram de tal forma

degradadas que de 2003 a 2006 as sanções impostas pelos EUA consistiam no embargo

total à exportação de satélites e seus componentes americanos para a China. Da mesma

forma, os EUA não poderiam importar satélites ou fazer um lançamento que envolvesse

direta ou indiretamente entidades chinesas.198

Em termos de cooperação civil, as duas agências responsáveis pelo programa

espacial civil pouco ou nenhum contacto tiveram depois do incidente com o relatório

Cox, até porque este veio tornar difícil, quase proibitivo, todo e qualquer contacto.

Inclusive, a China ficou inibida pelos EUA de participar na Estação Espacial

Internacional. A primeira tentativa de reaproximação ocorreu em 2006, quando o vice-

presidente da agência chinesa foi convidado pelo seu homólogo americano a visitar a

NASA. Michael Griffin, presidente da NASA na altura, foi à China em Setembro de

2006. Contudo foi-lhe negado acesso ao centro de operações e outro tipo de instalações

que havia solicitado para visitar. A visita falhou no objetivo pretendido: estimular os

laços entre as duas agências e os dois países.

Durante a visita do Presidente Obama em 2009 a Pequim com o Presidente Hu

Jintao, ambos surpreenderam o mundo ao dar uma conferência de imprensa em que

referiram expressamente o seu entendimento para “expanding discussions on space

science cooperation and starting dialogue on human space flight and space

exploration”199

.

Em Janeiro de 2007 a China lançou e testou o primeiro ASAT (arma

antissatélites). Este lançamento não mudou a balança geoestratégica asiática ou

mundial, ou desafiou a superioridade espacial dos EUA. Contudo, demonstrou o alcance

ofensivo/defensivo da tecnologia balística e os limites desta tecnologia. A China que

197MOLTZ, James Clay (2011), ibid p. 90-91

198NARDON, Laurence et MESSERLIN, Pierre,(2004) ibid, p 6

199 MOLTZ, James Clay (2011), ibid p. 90

67

sempre foi um apoiante do limite de armamento no espaço, mostra uma atitude bastante

pragmática: se os EUA não podem desenvolver armas espaciais, então a China não terá

que gastar os seus limitados recursos para os contrapor.200

Este teste antissatélite originou uma vaga de indignação internacional pelo

perigo que criou: além de revelar a existência de uma arma espacial em potência contra

satélites de outros países, gerou uma quantidade enorme de lixo espacial em órbita que

acabou por colocar em perigo outros satélites já em órbita.

Na verdade e segundo Joan Johnson-Freese numa entrevista cedida à CNN, os

EUA sabem qual a tecnologia espacial que a China possui, mas não conhece as

intenções da China para o seu uso e por isso, os EUA deveriam tentar conhecer melhor

os objetivos espaciais chineses. Contudo, com a NASA proibida por lei de trabalhar

com a China não ajudará a conseguir o conhecer e a acompanhar os objetivos chineses.

Ainda segundo a autora e especialista de política espacial: “The United States can

influence the direction, but only if we engage and persuade the Chinese to engage with

us. It’s one way of preventing a scenario of a galactic Wild West in which China has

become the world’s leader in space”.201

3. China versus América do Sul

Após as sanções com os incidentes em 1989 na Praça Tiananmen, a China

procurou novos parceiros para ajudar a sua recém-nascida indústria aeroespacial.

Procurou assim parceiros na América do Sul e iniciou uma parceria com o Instituto

Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) no Brasil.

O Brasil iniciou o seu programa espacial na década de 60 e lançou o seu

primeiro satélite em 1993. Quando os EUA mudaram a gestão dos dados de deteção

remota e começaram a surgir problemas financeiros nos países emergentes, o Brasil

200 JOHNSON FREESE, Joan (2007-2), ibid , p. 25

201JOHNSON-FREESE, Joan (2012), “Will China overtake America in Space”, disponível em:

http://edition.cnn.com/2012/06/20/opinion/freese-china-space/index.html, acedido última vez em

29/10/2012

68

iniciou uma procura para acesso a dados de confiança noutras fontes. De facto, a

dependência em satélites estrangeiros, faz com que o Brasil esteja dependente da boa

vontade dos outros Estados para ter acesso à informação. 202

Com ênfase na cooperação e no desenvolvimento conjunto, o Brasil e China

aliaram-se e começaram a trabalhar no Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres

(CBERS), em Julho 1988, após a visita do Presidente brasileiro José Sarney à China.

Esta parceria ficou marcada como sendo a primeira venture de tecnologia espacial com

países emergentes que a China realizou e que conduziu ao lançamento de dois satélites:

um em 1999 e outro em 2000.

Segundo o site oficial do programa CBERS, “a união entre os dois países é um

esforço bilateral para derrubar as barreiras que impedem o desenvolvimento e a

transferência de tecnologias sensíveis impostas pelos países desenvolvidos. A parceria

conjunta rompeu os padrões que restringiam os acordos internacionais à transferência

de tecnologia e o intercâmbio entre pesquisadores de nacionalidades diferentes.”203

O projeto CBERS pretende assim ser um projeto de deteção remota, de recolha

de imagens e dados por satélite, de monitorização de terrenos agrícolas e recursos

naturais.

O Brasil viu vantagens neste tipo de parceria: primeiro conseguiria ter uma

alternativa mais barata para construir e lançar os seus próprios satélites. A China

também beneficiou deste projeto pelas mesmas razões: ou seja, a possibilidade de fazer

mais com o mesmo dinheiro. Note-se que a repartição para retorno do investimento, e

segundo o website do CBERS é de 30% para o Brasil, 70% para a China.

Atualmente, o projeto CBERS tem no total três satélites operacionais, com

acordo para lançamento de mais dois satélites durante 2013. O CBERS é considerado

como sendo uma parte importante da constelação de satélites para observação terrestre,

202 Câmara dos Deputados, “A política espacial brasileira”, disponível em: http://www2.camara.leg.br/a-

camara/altosestudos/arquivos/politica-espacial/a-politica-espacial-brasileira, última vez acedido em

29/10/2012, p24 203

CBERS, disponível em: http://www.cbers.inpe.br/, acedido última vez a: 29/10/2012

69

comparável com o LANDSAT dos EUA, o SPOT da França ou o ResourceSat da

Índia.204

Mais recentemente, a China deu início a relações bilaterais nesta área também

com a Venezuela, com quem quis estabelecer relações privilegiadas quer a nível de

assuntos de segurança nacional mas também sobre as importações de petróleo. Na

verdade a Venezuela é um país de esquerda e antiamericano na região. O Presidente

Hugo Chávez afirmou que a Venezuela tem cerca de 100 técnicos espaciais a receberem

formação completa na China205

, demonstrando assim a troca de know-how consistente

com o que será algo muito para além de uma mera parceria comercial. Em Outubro

2008, a China lançou o primeiro satélite venezuelano e, em Setembro 2012, o segundo

satélite.206

Hugo Chávez não quer ficar só por aqui. Pretende investir mais ainda num

conjunto de tecnologias espaciais, incluindo: acesso à telemedicina e teleducação a

áreas remotas do país; acesso a telecomunicações móveis a zonas na Venezuela onde

apenas há comunicações por linhas terrestres e cujo custo é elevado. Após as

negociações falhadas com o programa de recolha de imagens israelita, a Venezuela

procurou novamente a China para que possa também ter acesso à capacidade de recolha

de imagens. Apesar de não ser ainda bem conhecido esta negociação, rumores indicam

que a China irá lançar em 2013 um satélite de observação terrestre para a Venezuela.207

A China também deslocou técnicos para ministrar formação a países como a

Bolívia e Equador por causa da aquisição de equipamento militar e espacial por esses

204 CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international

relations, pp. 57-58, ibid 205

CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international

relations, pp. 58-59, ibid 206

“Segundo satélite venezuelano é lançado com sucesso da China”, disponível em:

http://noticias.terra.com.br/ciencia/noticias/0,,OI6189306-EI301,00-

Segundo+satelite+venezuelano+e+lancado+com+sucesso+da+China.html acedido última vez em

29/10/2012 207

CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international

relations, pp. 59-60, ibid

70

países. No caso da Bolívia, a deslocação dos técnicos chineses deve-se ao satélite Tupac

Katari que a China ajudará a lançar em 2014.208

A presença chinesa na América do Sul tem-se revestido de diversas formas:

onda de aquisições de empresas nos sectores de extração de recursos naturais para

garantir o controlo em áreas chave, a banca chinesa dá a alavancagem a pequenas

empresas provincianas a projetarem-se no mercado internacional e até o turismo chinês

está a beneficiar desta nova onda de prosperidade. O que está a acontecer é que a China

com base nas trocas politicas, culturais e industriais com estes países está a aumentar

significativamente a sua presença na região. Estas interações mudam radicalmente a

forma como a China é vista e como se relaciona com esta região.209

4. China versus África

A China desenhou, construiu e lançou um satélite para a Nigéria em 2007. Este

mesmo satélite, por um problema nos painéis solares do satélite acabou por deixar de

funcionar. O projeto, que custou cerca de 256 milhões de dólares, deveria melhorar as

comunicações na Nigéria. Contudo, o resultado final foi uma subida das vozes críticas a

este projeto pelas ligações de comunicações pouco fiáveis e das mais caras na região.210

Na realidade, a postura da China neste negócio revela tanto a utilização de soft

power como um dom natural de diplomacia e a forma como a China explora as suas

capacidades espaciais como ferramenta diplomática. A China doou generosamente

como contrapartida um pacote financeiro generoso à Nigéria para este projeto, tendo

como garantia as reservas de petróleo nigerianas. O lançamento do satélite foi recebido

e comentado pelas autoridades chinesas como sendo “um passo da Nigéria para o

208ELLIS, Even, (2012) “The expanding chinese footprint in Latin America – New Challenges for China

and Dilemmas for the US”, IFRI, disponível em: http://www.ifri.org/?page=contribution-detail&id=7014,

última vez acedido em: 29/10/2012, pp. 7-8 209

ELLIS, Even, (2012), op.cit. pp. 4-5 210

DAVENAC, Raoul et, NARDON, Laurence, (2009) “China and the Telecomunication Satellites of

Emerging Countries”, IFRI, disponível em: http://www.ifri.org/?page=contribution-

detail&id=3457&id_provenance=97, última vez acedido em: 22/10/2012

71

mundo digital dominado pelo Ocidente” enquanto a Nigéria considerou importante

continuar a trabalhar com os parceiros chineses para o lançamento de mais dois

satélites.211

5. China versus Ásia

Há questões que se levantam relacionadas com o crescimento e afirmação

chinesa na Ásia. A principal parece ser: como irão reagir os outros países asiáticos à

afirmação da China como potencial regional e mundial na área espacial? Irão responder

de uma forma agressiva ou ficarão calmos na sombra? Para nações mais pobres e com

pouca ou nenhuma tecnologia desenvolvida, parece mais vantajoso cooperar com a

China naquilo que serão os seus objetivos espaciais. Ou seja, as limitações financeiras

terão um papel preponderante naquilo que será a cooperação espacial asiática.212

Contudo, apesar da promissora cooperação espacial asiática, a Índia surge cada

vez mais no panorama e, tendo em conta os avanços mais recentes no seu programa

espacial, como um rival de peso à liderança chinesa. Surpreendentemente, e apesar de a

Índia ter armamento nuclear desde 1974, o seu programa espacial sempre teve

orientações pacíficas. Ao contrário da China, dos EUA e até da Rússia, os veículos de

lançamento indianos só tiveram origem em sistemas de propulsão civis e não em

mísseis balísticos convertidos em lançadores. Até muito recentemente, a Índia não tinha

qualquer tipo de programa espacial militar tendo durante décadas dedicado o seu

programa espacial a satélites de observação remota, comunicações e meteorologia para

servir a economia indiana, e a vasta e dispersa população.

Porém, o crescimento da China e a aproximação e cooperação com os EUA, e

o esforço indiano de colocar alguma ênfase das suas capacidades militares, colocaram

os holofotes sob o programa espacial indiano. Assim, já em pleno século XXI, a Índia

211 CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international

relations, pp. 62-63, ibid 212

CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international

relations, pp. 63-65, ibid

72

lançou um avançado sistema de navegação, abriu um comando militar espacial, e falou

abertamente sobre capacidades cinéticas antissatélite e possíveis armas a laser.

Os esforços espaciais da China, nomeadamente a tentativa de chegar ao

objetivo primeiro que todos os outros, colocou pressão na Índia para que evolua

rapidamente nas suas capacidades espaciais. De facto, a Índia tem colocado bastantes

esforços na exploração lunar, onde tem recolhido prestígio e admiração pela sua

pesquisa. Contudo, começa a existir alguma discussão interna sobre se a Índia deverá

focar-se e de quais serão os parâmetros para a exploração humana do espaço. Isto revela

que o tradicional foco da Índia no espaço poderá mudar nos próximos anos,

principalmente se quer competir com os seus rivais regionais, promover a sua segurança

nacional, e estabelecer uma reputação internacional assente nos seus progressos

espaciais.213

Algumas organizações internacionais relacionadas com a área científica,

tecnológica e espacial, como a UNESCAP e a CSSTEAP, estão localizadas na Índia, o

que faz com que beneficie dos privilégios de acolher estas instituições internacionais. A

Índia tem também sido procurada cada vez mais na área de lançamentos comerciais.

Além disso, o sucesso do programa espacial indiano demonstra os avanços tecnológicos

de todo o programa espacial indiano.214

Apesar de a Índia ter ratificado a maioria dos tratados internacionais na área do

Espaço, há questões que começam a surgir que colocam em causa a continuidade de

exploração espacial apenas com fins pacíficos. Na verdade, os analistas indianos

identificam a China como sendo a maior ameaça nesta área. Quando a Índia considera

que os avanços da China no campo militar assentes em tecnologia espacial e o seu

impacto na Ásia e que tendo em conta numa situação volátil o desequilíbrio regional

servirá apenas para aumentar as tensões regionais, poderá despoletar uma corrida à

militarização do espaço.215

213 MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 109-111

214 CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international

relations, pp. 63-64, ibid 215

MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 128

73

Também o Japão é uma outra nação claramente com preocupações em relação

ao poderio espacial chinês. O Japão tem o necessário para competir tecnologicamente

no espaço mas tem que definir a sua estrutura organizacional para gestão das atividades

espaciais e tem um orçamento que é cerca de 25% do orçamento da China ou dos EUA.

O Japão tem potencial para um programa espacial que abarque desde a exploração

humana do espaço, à implementação de uma vasta gama de serviços comerciais e ainda

ativos espaciais militares. Mas terá também que enfrentar uma luta política interna para

que o programa espacial seja uma prioridade dentro das prioridades nacionais nipónicas.

Isto inclui constrangimentos orçamentais, constituição pacifista que poderá levantar

questões legais, e questões relacionadas com os benefícios que a estreita cooperação

com os EUA poderá trazer. Contudo, os avanços chineses em matéria militar e

crescentes capacidades espaciais levantam sérias preocupações e desafia os dirigentes

japoneses a tomarem decisões que inicialmente pareceriam improváveis. Também o

sector espacial privado do Japão tem feito pressão na promoção dos interesses

espaciais.216

As motivações espaciais japonesas incluem aplicações tanto civis como

aplicações relacionadas com segurança. Na verdade, a autonomia e a cooperação

internacional sempre foram os pilares centrais da política espacial japonesa, apesar

destes objetivos historicamente por vezes se contradizerem. A cooperação próxima com

os EUA tem trazido a ambos benefícios incalculáveis. O Japão sempre pretendeu ser

pelo menos uma potência regional na exploração espacial, evidenciada pelo sue apoio à

Agência Regional Espacial Ásia-Pacifico. Mas o crescimento da China e os anos

seguintes a 1945 trouxeram alguns dissabores ao Japão, nomeadamente nos esforços

chineses em convencer os seus vizinhos das suas intenções pacíficas, trouxe o desafio

acrescido ao Japão em ter uma presença mais assertiva no espaço.217

As atividades já desenvolvidas pelo Japão na área espacial dão nota claramente

da utilização do espaço como soft power, numa região dominada por conflitos regionais

216 MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 43-44

217 MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 45

74

(caso por exemplo da disputa pelas Ilhas Senkaku pela China e Japão218

), que espera

utilizar os seus feitos únicos e competências técnicas adquiridas como forma de

aumentar a sua influência política na região e no mundo. Este esforço nota-se na

preocupação em ter alcançado feitos que promovam o prestígio tecnológico japonês, por

exemplo, as sondas lunares Kaguya.219

É claro também a estratégia de aumentar o seu

soft power e influência na região asiática através de protocolos de cooperação cada vez

mais significativos, não só com os EUA, mas também com a Índia e com a Coreia do

Sul, e até usar estes como forma de contrabalançar o poder chinês na região.220

218“Dois navios-patrulha chineses entram em águas japonesas“, Diário de Notícias, disponível em:

http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=2787151&seccao=%C1sia última vez

acedido em 30/10/2012

219 MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 65-67

220 MOLTZ, James Clay (2011), ibid p. 68

75

Conclusão

Este ensaio debruçou-se sobre o tema ”Influência da exploração espacial na

política internacional”. No desenvolvimento do seu estudo utilizou-se o método de

investigação em Ciências Sociais proposto por Luc Van Champenhoudt e Raymond

Quivy. Para a sua aplicação foi necessário conceber, inicialmente, uma pergunta de

partida que se ambiciona ter sido respondida ao longo do corpo deste ensaio: de que

forma a exploração espacial influencia e é usada na política internacional?

Das leituras e análise efetuadas, depreende-se que as Relações Internacionais

enfrentaram, enfrentam e enfrentarão um desafio colocado pelos avanços tecnológicos

adjacentes da exploração espacial, a vários níveis: politico, comercial, económico,

militar e científico.

Iniciou-se este estudo com uma abordagem aos avanços iniciais da era espacial

na era moderna. Os avanços tecnológicos introduzidos pelo lançamento do Sputnik

mudaram a forma de ver o mundo. A Guerra Fria e os eventos relatados na primeira

parte deste estudo, demonstram claramente como o uso da exploração espacial como

ferramenta de fazer política. É o caso da Crise dos Mísseis de Cuba e dos Tratados

SALT em que a tecnologia espacial teve um papel vital nas negociações.

A chegada do Homem à Lua e a construção de estações espaciais que

garantissem a presença humana no espaço em permanência mostrou de uma forma clara

e bastante representativa do uso da exploração espacial enquanto fonte de prestígio

perante os outros Estados. De facto, sendo o Espaço acessível apenas a uma elite,

cumpre-se um requisito essencial em qualquer campanha de marketing para projecção

de uma imagem e obtenção da admiração por terceiros: a exclusividade!

Com o fim da Guerra Fria, o investimento na exploração espacial sofre um

revés. A Rússia não consegue acompanhar financeiramente o investimento americano e

os EUA começam a ter mais dificuldade em justificar as somas avultadas de

investimento nesta área, sobretudo quando com os acidentes com os vai-e-vem

começam a implicar perdas de vidas humanas.

Com a mudança no paradigma vigente nas Relações Internacionais e com a

entrada de novos atores no cenário da exploração espacial, verifica-se que até a

exploração espacial deixa de ser bipolar para ser multipolar. Deixa de ser apenas uma

76

corrida para serem várias: a nível mundial e a nível regional. A entrada de privados na

exploração espacial traz também novos contornos. Contudo, há algo que continua a ser

comum: a visão de que o Espaço é uma fronteira a conquistar e quem conseguir fazer

mais e chegar mais longe dominará a tecnologia e reunirá a admiração dos restantes

intervenientes.

Como demonstrado ao longo do estudo, a ocupação do Espaço, ou o seu

domínio, é de vital importância para as super-potências ou para quem aspira a ser

considerado uma super-potência, sendo certo e demonstrado, que todo o projeto espacial

tem uma dimensão geopolítica subjacente. Nos dias que correm, possuir tecnologia

espacial, saber tratar a informação recolhida e aplicá-la, quer seja em cooperação ou

não, representa uma nova fonte de poder, vital quando se aposta em meios pacíficos de

influência dos outros atores internacionais.

77

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