Índice - run.unl.pt£ofinal_v2.pdf · exploração espacial no dia-a-dia da sociedade é já tão...
TRANSCRIPT
i
Índice
Agradecimentos ............................................................................................................................. ii
Resumo ......................................................................................................................................... iii
Abstract ......................................................................................................................................... v
Índice de Tabelas ...........................................................................................................................vi
Lista de Abreviaturas ................................................................................................................... vii
Introdução ..................................................................................................................................... 1
Metodologia .............................................................................................................................. 6
Revisão de Literatura ................................................................................................................ 9
Capítulo I ..................................................................................................................................... 16
O Sputnik ................................................................................................................................ 19
A Crise dos Mísseis de Cuba................................................................................................... 27
A conquista da Lua .................................................................................................................. 36
A década de 70 e 80: os Tratados SALT ................................................................................. 39
A Guerra das Estrelas .............................................................................................................. 45
A Guerra do Golfo de 1991 ..................................................................................................... 47
Capítulo II ................................................................................................................................... 51
China no Espaço – as origens .................................................................................................. 51
China no Espaço: o que a motiva? .......................................................................................... 55
Relações Internacionais espaciais da China ............................................................................ 62
1. China versus Europa.................................................................................................... 62
2. China versus EUA ....................................................................................................... 64
3. China versus América do Sul ...................................................................................... 67
4. China versus África ..................................................................................................... 70
5. China versus Ásia ........................................................................................................ 71
Conclusão .................................................................................................................................... 75
Bibliografia ................................................................................................................................. 77
Monografias ............................................................................................................................ 77
Artigos ..................................................................................................................................... 79
ii
Agradecimentos
Estou grata a todos os meus familiares pelo incentivo recebido ao longo destes anos. Em
especial aos meus pais: obrigada pelo amor, alegria e atenção sem reservas...
Agradeço à Mestre Margarete Couto pela ajuda, aconselhamento e por ter sempre
acreditado que seria possível.
Ao Professor Doutor António Horta Fernandes, orientador da dissertação, agradeço o
apoio, a partilha do saber e as valiosas contribuições para o trabalho.
O meu profundo e sentido agradecimento a todas as pessoas que contribuíram para a
concretização desta dissertação, estimulando-me intelectual e emocionalmente.
iii
Resumo
O lançamento do Sputnik pela União Soviética deu ao espaço extra-
atmosférico uma nova dimensão política e estratégica. Desde então, o espaço tem sido
usado de acordo com interesses de poder a curto prazo pelas várias potências espaciais.
O desafio colocado ao futuro do espaço centra-se na existência de duas visões que
competem entre si: uma promove o uso pacífico do espaço e a cooperação internacional
na sua exploração e considera que um regime legal multilateral é a melhor forma de
equilibrar os vários interesses em jogo e evitar uma hegemonia que coloque em risco o
acesso ao espaço por toda a comunidade internacional. A segunda visão vê o espaço
numa lógica de interesse nacional, onde é necessário negar o uso do espaço por
adversários.
Contudo, nos últimos anos têm-se assistido a um maior envolvimento de países
que até agora não tinham aspirações no espaço, como é o caso da Nigéria, que com o
apoio de potências espaciais, neste caso a China, alcançaram o clube espacial.
Os avanços tecnológicos, o crescente interesse na promoção do espaço e os
investimentos privados realizados na área espacial, demonstram que o espaço se tornou
num dos elementos essenciais para a não dependência de outros quer na política interna
quer externa por parte de um Estado além de conferir um respeito acrescido pelas outras
nações pelas implicações estratégicas dos sucessos espaciais.
Pelo exposto, este focará os motivos que levam as nações a procurar uma
posição no espaço, mesmo que isso signifique a violação da regulamentação
internacional existente acerca do uso pacífico do espaço, assim como as consequências
que poderá trazer para a segurança internacional uma militarização do espaço. Pretende
ainda demonstrar que o espaço é uma fonte importante de soft power para países como a
China. Este tópico é importante e atual em matéria de segurança internacional, tendo em
conta os mais recentes episódios: anúncio de um lançamento pela Coreia do Norte, fim
do programa vaivém da National Aeronautics and Space Administration (NASA),
entrada em funcionamento do Galileu. As reações mundiais a estes episódios
demonstram que dependência do espaço é cada vez maior, não só a nível militar, mas
também a nível económico, mas também é fonte de preocupação de todos os que se
ocupam com questão de segurança nacional e internacional. O espaço faz parte do dia-a-
iv
dia de cada Estado e é um dos pontos mais vulneráveis da segurança económica e
militar de um Estado.
Palavras-Chave: Astropolítica, China, Guerra Fria, Ciência Politica, Política Espacial
v
Abstract
The launch of the Sputnik by the Soviet Union gave the outer space a new
political and strategic dimension. Since then the space has been used by various spatial
powers in accordance with their short term power interests. The challenge for the future
of the space is the existence of the two competing visions: one promotes the peaceful
use of the space and international cooperation in its exploration and considers that a
multilateral legal regime is the best way to balance the various interests in questions and
to avoid a hegemony that puts at risk the access to the space by the whole of the
international community. The second view sees the space in the national interest where
it is necessary to deny the use of space by its opponents.
However, in recent years we have seen a greater involvement of countries that
until now did not have spatial aspirations, such as Nigeria, which with the support of
other spatial powers, China in this instance, created the spatial club.
The technological advances, the increasing interest in promoting the space and
the private investment in this area, demonstrate that the space has become an essential
element for the non-dependency on others, both in the domestic policy as well as
foreign policy, by a country besides commanding a great respect by other countries for
the strategic implementation of the spatial successes.
Therefore, this thesis will focus on what motivates a nation to seek a position in
space, even if that means a violation of the existing international regulations regarding
the peaceful use of space, as well the consequences it may bring to the international
security by the militarization of the space. It is also intended to demonstrate that the
space is an important source of soft power for countries such as China. This topic is
important and current with regard to the international security, in view of the most
recent events: the announcement by North Korea of a launch into space, the end of the
NASA space programme, Galileo commencing operations. The international reaction to
these events demonstrates that the dependency on space is increasing, not only on a
military level but also economic, but it is also a source of concern for everyone dealing
with national and international security. The space is part of the daily life of each State
and is the most vulnerable aspect of the economic and military security of a Nation.
Keywords: Astropolitics, China, Cold War, Political Science, Space Policy
vi
Índice de Tabelas
Tabela 1: Código dos projetos do programa espacial Chinês...................................................... 53
Tabela 2: Rating Nações ............................................................................................................. 58
Tabela 3: A China vista por outros países ................................................................................... 58
Tabela 4 - Projectos Cooperação entre China e Europa .............................................................. 64
vii
Lista de Abreviaturas
ABM - antimísseis balísticos
ASAT - arma antissatélites
COPUOS - Committee on the Peaceful Uses of Outer Space
CBERS - Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres
CTBT - Comprehensive Nuclear Test Ban Treaty
CE - Comissão Europeia
CNN - Cable News Network
DSP - Defense Support Programm
ESPI - European Space Policy Institute
EUA - Estados Unidos de América
ESA - Agência Espacial Europeia
FRS - Foundation pour la Recherche Stratégique
GPS - Global Positioning System
ICBM - Intercontinental Ballistic Missile
IFRI - Institut Français des Relations Internationales
INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
ITAR - International Traffic in Arms Regulations
IESD - Identité Européenne de Sécurité et de Défense
KGB - Comité de Segurança do Estado
MRBM - Mísseis Balísticos de Médio Alcance
NASA - National Aeronautics and Space Administration
NATO/OTAN - Organização do Tratado do Atlântico Norte
NSA - National Security Agency
NKVD - Comissariado do Povo para Assuntos Internacionais
PRC - Pew Research Center
1
Introdução
A política espacial, ou comummente apelidada de Astropolítica, tem sido uma
área de estudo que tem ganho relevo nos últimos anos, destacando-se o seu estudo nos
Estados Unidos de América (EUA), mas também a ganhar a alguma relevância na
França, Itália, Reino Unido e Alemanha. Trata-se de uma área da ciência política e das
relações internacionais que aborda a exploração espacial do ponto de vista político,
geopolítico e da estratégica. Nesta área de estudo aparentemente peculiar e particular
são debatidas temáticas transversais relacionadas com política internacional, segurança
internacional, militarização e estratégia militar.
No auge da exploração espacial, o Presidente norte-americano John F.
Kennedy afirmou que “quem dominar o Espaço dominará a Terra” e, tendo isto em
mente, importa analisar as dinâmicas e as alterações da política internacional no
caminho para o domínio do e no Espaço. Para além de um interesse sociopolítico, não
se pode deixar de verificar a dependência das sociedades atuais dos meios espaciais e
das suas aplicações, o que tanto demonstra a sofisticação e modernização desta
sociedade como a sua vulnerabilidade. Este constante jogo de equilíbrio entre
modernização tecnológica e vulnerabilidade torna a dinâmica da política internacional
particularmente interessante de ser estudada e analisada.
Comparado com, por exemplo as ancestrais técnicas de medicina chinesa, a
história espacial é bem mais curta. Contudo, a exploração espacial vai já na quarta
geração: a primeira começou ainda durante a II Guerra Mundial, a segunda geração é
identificada com as missões era Apolo e a chegada do Homem à Lua, a terceira geração
é pós-Apolo, e por fim a geração pós-Guerra Fria. Esta última geração, em oposição à
primeira e à segunda, não fala sobre o Espaço como sendo um sonho, mas como sendo
uma ferramenta.1
1 JONHSON-FREESE, Joan e HANDBERG, Roger, (1997), “Space the dormant frontier – Changing the
paradigma for the 21st century”, London, Praeger, p. 264
2
Quando, em plena Guerra Fria, o Sputnik é lançado pela União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS) estava-se longe de perceber as implicações que este
acontecimento traria para a dinâmica mundial, quer a nível civil quer a nível politico e
militar. Nesta altura da conquista espacial, a disputa pelo domínio do Espaço centrava-
se apenas entre as duas superpotências de cada lado da cortina de ferro, EUA e URSS.
Atualmente, a disputa foi consideravelmente alargada a mais intervenientes, sejam eles
Estados ou organizações governamentais ou entidades privadas.
Porém, durante a Guerra Fria, EUA e URSS não eram os únicos a desenvolver
programas espaciais pois vários países europeus mesmo estando a passar a fase da
reconstrução, investiam igualmente no desenvolvimento de futuras capacidades
espaciais, tais como: França; Alemanha; Itália e Inglaterra. Estes países europeus no
pós-guerra começaram a investir e a desenvolver o seu próprio programa espacial ainda
na década de 1950, em simultâneo com os primeiros passos da cooperação europeia. Do
outro lado do globo, na Ásia, estados como a China e o Japão começaram igualmente a
desenvolver tecnologia espacial, estabelecendo objetivos e prioridades neste campo
durante a década de 1960. Em alguns dos casos os projetos destes Estados fizeram-se à
custa de uma estreita cooperação com uma das duas superpotências. Isolado, o Brasil foi
um pioneiro no investimento tecnológico em meios espaciais e, apesar de tardio, tem
neste momento um dos programas espaciais mais desenvolvidos e antigos da América
do Sul.
O inigualável crescimento de meios envolvidos e/ou dependentes de tecnologia
espacial, que mantêm em equilibro periclitante a (des)confiança entre parceiros e meios
económicos consideráveis, levou-nos a debruçar-nos sobre o novo ator de relevo nesta
matéria: a China. Procurando perceber não só como surgiu, em que ambiente político-
histórico, mas também qual o seu percurso num meio altamente competitivo e qual as
suas perspetivas futuras.
O tema central debatido nesta dissertação: “de que forma a exploração
espacial influencia e é usada na política internacional?”; é de extrema importância
no contexto das relações internacionais. De facto, questões relacionadas com ativos
espaciais têm estado na ordem do dia, porque a presença dos avanços tecnológicos da
exploração espacial no dia-a-dia da sociedade é já tão vincada, que muitos de nós já
3
nem concebe viver sem elas, por exemplo, o uso quotidiano e imprescindível do
telemóvel.
Em relações internacionais, quando dois ou mais Estados estão em conflito
eminente apesar de nenhum desses Estados realmente desejar o confronto, está-se
perante um dilema de segurança. Robert Jervis escreveu sobre este tipo de situações em
que um Estado com o receio de ser dominado ou ultrapassado de alguma forma toma
decisões que nem sempre são do seu melhor interesse. O que Jervis e outros autores
escreveram e estudaram descreve o que se passa na área espacial. As ações dos atores
internacionais poderão ser melhor entendidas sob o dilema do prisioneiro2 mesmo
quando se trata de formas de adquirir soft power sobre terceiros.
Durante a Guerra Fria a utilização da exploração espacial como fonte de
prestígio, poder e supremacia sobre o oponente ficou bem patente. O que se passou, e
será sucintamente descrito nesta dissertação mostra, de forma clara, o dilema do
prisioneiro ou pelo menos aquilo que o jogador acha que atingirá com a sua decisão de
seguir sozinho: “cada jogador, levando unicamente em conta o seu próprio interesse,
recebe uma recompensa superior se abandonar a cooperação do que se cooperar”.3 Não
obstante a cooperação ser benéfica e trazer vantagens às partes envolvidas, durante a
Guerra Fria URSS e EUA optaram por competir. Ainda nos dias de hoje, e apesar das
alianças que se formam com outros parceiros na exploração espacial, a nível macro,
continua a refletir esta realidade. É o caso da China e dos EUA que é enunciado na
segunda parte desta dissertação que evitam cooperar para de certa maneira garantir um
nível de supremacia mundial que lhes dê vantagem assimétrica sobre o outro. A nível
regional, o caso asiático também enunciado na segunda parte, é demonstrativo da
procura de vantagem comparativa em relação aos outros jogadores espaciais.
Não existe nenhuma solução que seja a melhor para todos os intervenientes e
por isso o dilema do prisioneiro é uma boa analogia para a política espacial. Isto porque
2 JONHSON-FREESE, Joan, (2007 - 1) “Space as a strategic asset”, Columbia University Press, E-Book,
Kindle version, loc 229 3 DOUGHERTY, James E e PFAKTZFRAGG, Robert L, (2003) “Relações Internacionais – As teorias
em confronto”, Gradiva, p. 720
4
neste modelo há tanto de incentivos defensivos como de cooperação. Se um Estado vê
outro como sendo um potencial adversário ou mesmo um adversário, isso irá influenciar
a sua intenção e até postura.4 Nos últimos 50 anos de exploração espacial encontra-se
inúmeros exemplos disto mesmo: durante a Guerra Fria, claramente entre EUA e URSS,
nos dias de hoje entre EUA e China, e até entre EUA e União Europeia.
O estudo da política internacional do Espaço permite corrigir a ideia
generalizada da opinião pública que a exploração espacial é levada a cabo apenas ou
sobretudo para fins científicos, mais do que por políticas realistas de ideologias e
nacionalismo, como forma de propaganda e ajuda externa. Não se deverá descurar que o
objetivo primário que conduziu ao avanço nesta área centrou-se sobretudo na segurança
nacional e a procura dessa segurança através da aquisição de capacidades militares.
Mais de 50 anos de exploração espacial demonstram que esta tem sido um espelho da
tensão entre os países mais ricos, entre os países mais industrializados e a evolução de
perceções de segurança que integram dimensões sociais, ambientais e económicas.5
A nível estratégico, os ativos espaciais são usados para controlo de armamento
e sistemas defensivos de aviso prévio. Mas o Espaço oferece também outro tipo de
capacidades: recolha de informação, melhorias na área da educação, expansão dos
recursos médicos, criação de emprego, gestão e monitorização de recursos naturais entre
outros.6 Considerando que a exploração espacial nos traz toda a informação que
utilizamos diariamente, conscientemente ou não, assim como formas alternativas de a
interpretar através de satélites e da revolução computacional.7
Em 2007, o teste antissatélite da China veio demonstrar o quão vulnerável os
sistemas espaciais estão e, consequentemente, a segurança e bem-estar da Humanidade,
não só a fatores naturais (como os meteoritos, radiações solares, etc.) mas também a
fatores humanos e vontades políticas. O que revela, sem sombra de dúvidas, a
importância de conhecer e controlar o Espaço.
4 JONHSON-FREESE, Joan, (2007 -1), ibid, loc 248-264
5 SHEEHAN, Michael, (2007), “The international politics of space”, Routledge, New York, p. 1
6 JONHSON-FREESE, Joan, (2007 - 1) ibid, loc 248
7 SHEEHAN, Michael, (2007) ibid, p. 3
5
Ainda há quem negue a existência da militarização do Espaço como sendo o
objetivo primário da exploração espacial, desde dos seus primórdios na era moderna.
Mas, concordamos com a maioria de que se trata de uma perspetiva enganadora. O
Espaço sempre foi, e ainda é, militarizado. As considerações militares estiveram desde o
início no cerne dos esforços para a conquista espacial. A tentativa de manter o Espaço
desmilitarizado poderá ser desejável, mas não menos utópica. Contudo, se de facto for
conseguida, poderá significar um total desinteresse do investimento público nesta área.8
A ambiguidade tecnológica espacial, que tanto pode ser usada para fins civis
pacíficos, como fins militares bélicos, levanta questões importantes no âmbito do
dilema do prisioneiro: um míssil tanto pode ser usado para destruir outro míssil como
um satélite, que poderá ser de comunicações civis como de recolha de informação
classificada para uso militar.
A exploração espacial e a política civil e militar andaram sempre de mãos
dadas. Para provar essa declaração basta considerar o que fez com que os programas
espaciais avançassem foram objetivos políticos e a forma como foram e são
implementados revelam as ideologias politicas e nacionais na altura e no momento, quer
fosse procura de poder político, internacionalização do comunismo, integração europeia,
ou outro ponto qualquer.9
Enquanto a política ajudou a moldar os programas espaciais, também a
exploração espacial ajudou a moldar a forma de fazer política. Nas palavras de Henry
Lambright: “Policy shapes technology, which in turn influences policy”10
. A ligação
entre ambos os vectores tornou-se indissociável nos últimos cinquenta anos. Desde o
lançamento do Sputnik à realidade de fazer guerras assentes em tecnologia espacial, do
Homem na Lua à utilização do Espaço como forma de garantir a satisfação de
necessidades de recursos de nações, a exploração espacial e a forma de fazer política
8 SHEEHAN, Michael, (2007), ibid , p. 2
9 SHEEHAN, Michael, (2007), ibid, p. 2
10 LAMBRIGHT, W. Henry (ed), (2003), “Space policy in the 21
st century”, John Hopkins University
Press, p. 7
6
internacional e até mesmo política nacional (embora esta não seja o foco principal nesta
dissertação), ficará demonstrada nos capítulos seguintes.
Durante a Guerra Fria, presidentes norte-americanos como J. F. Kennedy
elevaram a exploração espacial ao limite para aumentar o prestígio e credibilidade
americana através da suas capacidades tecnológicas, tais como colocar um Homem na
Lua, por exemplo. Porém, nessa mesma altura foram tidos em consideração outro tipo
de projetos para atingir o mesmo fim, por exemplo a dessalinização dos Oceanos, que
foram rejeitados. O Espaço representa a última fronteira, a fronteira que ainda não havia
sido transposta, e por esse misticismo inerente ao desconhecido a vontade política optou
por mostrar que era capaz de dominá-la.11
Tal como Vasco da Gama e Cristóvão Colombo definiram uma Era com as
suas descobertas, a conquista e domínio do Espaço define a Era em que vivemos: a Era
Espacial. Com a Era Espacial, a Humanidade conseguiu fontes de poder inigualáveis,
mas também experiência e conhecimento e, mesmo que nem sempre esteja
completamente ciente disso, uma vulnerabilidade humana, social e política sem
precedentes.
Metodologia
Preferindo um esquema que favoreça a clareza de apresentação dos
conhecimentos e estabeleça uma linha cronológica que reflita adequadamente o impacto
da Astropolítica, optou-se por estruturar esta dissertação em duas partes distintas.
Procuramos, assim, garantir uma abordagem mais lata daquilo que foi a evolução da
relação entre exploração espacial e política internacional. Acreditamos que esta escolha
de metodologia de apresentação permita uma retrospetiva histórica que favoreça uma
melhor compreensão do surgimento da influência da exploração espacial na política
internacional, ainda durante a Guerra Fria. E, de que forma a política internacional
11 JONHSON-FREESE, Joan, (2007 - 1) ibid, loc 284
7
serviu como pedra basilar ao desenvolvimento tecnológico potenciado pela conquista do
Espaço.
Assim, e considerando o facto da corrida ao Espaço entre os EUA e a URSS
ser a mais emblemática, documentada e exemplificativa desta relação entre Espaço e
política, a primeira parte é-lhe dedicada.
Na segunda parte, entramos no que tem acontecido nos anos após a Guerra Fria
e focando mais na atualidade, utilizando como referência o caso paradigmático de
entrada na corrida a todo gás da China. De facto, com o fim de uma época de relevo
político na História mundial recente, a corrida ao Espaço a duas velocidades vivida
durante a Guerra Fria também chega ao fim. Em parte porque a URSS deixa de ter
condições políticas e económicas para continuar a investir de forma competitiva face
aos EUA. Durante algumas décadas, e apesar de haver outros programas espaciais com
progressos interessantes, como é o caso europeu, a verdade é que nenhum deles estava
tão avançado ou tecnologicamente tão independente como o americano. A China com o
seu primeiro voo tripulado em 2003, tornou-se num forte candidato a superpotência dos
tempos modernos capaz de igualar e talvez superar os EUA em muitas áreas, incluindo
a área espacial. Neste momento, os EUA mantêm a liderança em termos tecnológicos e
de know-how na área espacial, mas com os constrangimentos orçamentais e as
mudanças de prioridades politicas desde 2001, colocaram-se numa posição mais
vulnerável ao, por exemplo, dependerem da Rússia ou, mais recentemente, de privados
para realizar lançamentos orbitais.
Em muitas áreas a China tem avançado rapidamente para lugar de pole position
nos últimos 10 anos, a conquista das tecnologias espaciais é uma dessas áreas onde o
gigante asiático tem primado pela iniciativa e competitividade. Os seus avanços não só
tecnológicos, mas também sociológicos, em conjugação com as opções políticas e as
limitações orçamentais americanas tornam muito provável que nos próximos 10 anos o
mundo assista a uma segunda corrida espacial, desta vez entre a China e os EUA.
Para dar um panorama mais claro da China e da forma como usa o seu recém-
adquirido poder espacial para conseguir bens e meios estratégicos adequados à sua
ascensão a superpotência, iremos analisar de forma necessariamente sucinta, as relações
entre a China e os seus parceiros/ rivais mais prementes na América do Sul, na África,
os EUA, na Europa e os seus vizinhos asiáticos (Índia e Japão).
8
A exploração espacial que, desde 1957, é utilizada como fonte de poder através
do prestígio, do avanço tecnológico, das indústrias que são criadas, da geração de
recursos humanos qualificados. A exploração espacial gera tanto admiração como
inveja por parte dos restantes Estados e traduz-se, naquilo a que o cientista político
norte-americano Joseph Nye Jr apelidou de, soft power.
Ao longo desta dissertação pretende-se demonstrar que o poder político usou a
exploração espacial como fonte de soft power, quer para reunir mais aliados
ideológicos, como aconteceu na Guerra Fria, quer seja para conseguir os recursos que se
necessita na ascensão a superpotência e o reconhecimento nacional num regime
ditatorial. A questão central que se pretende responder com este ensaio é: de que forma
a exploração espacial influencia e é usada na política internacional?
Para responder a esta questão e às questões subjacentes, recorreu-se à recolha
qualitativa de bibliografia, método de investigação em ciências sociais proposto por
Raymond e Quivy em “Manual de Investigação em Ciências Sociais”. O percurso
metodológico utilizado consistiu na pesquisa bibliográfica e documental na área das
relações internacionais, mais em concreto da política espacial, geopolítica e estratégias
espaciais. Recorreu-se, por isso, a autores de referência nesta área académica específica,
sobretudo ingleses, norte-americanos, franceses e chineses. De realçar, que sendo esta
área académica pouco ou nada explorada em Portugal, traduz-se na quase inexistência
de bibliografia em português que incida especificamente nesta área. Note-se igualmente,
que por constrangimentos linguísticos, optou-se por bibliografia em inglês, francês e
português, o que significou que mesmo as obras de autores chineses tiveram que ser
selecionadas pelo critério de existir tradução de mandarim para uma das três línguas
atrás referidas.
Assim, optou-se preferencialmente pela leitura de autores de renome na área de
Astropolítica, como Joan Jonhson-Freese, Laurence Nardon, Everett C. Dolman, entre
outros, ou de trabalhos de investigação desenvolvidos por centros de investigação
conhecidos internacionalmente pela qualidade e rigor das suas publicações como, o
Institut Français des Relations Internationales (IFRI), o Pew Research Center (PRC), a
RAND e o European Space Policy Institute (ESPI), entre outros.
9
Após as leituras realizou-se um resumo crítico das ideias chave, analisadas e
contextualizada com aquilo que é a história das relações internacionais, da geopolítica e
da estratégia.
Revisão de Literatura
As obras literárias de política espacial proliferam a nível internacional há
largas décadas, com destaque para os autores norte-americanos que têm produzido
incontável doutrina e opiniões valorizando o seu pretenso domínio do espaço desde dos
anos 50. Somente alguns dos mais conhecidos e relevantes pensadores e teóricos serão
utilizados neste estudo, de forma a estabelecer uma base de conhecimentos que nos
permita pôr em perspetiva a entrada crítica ou vantajosa do Oriente nesta competição.
Os europeus, num esforço coordenado em parte pela Agência Espacial Europeia, tendo
iniciado a corrida mais tardiamente, têm contudo criado algum alvoroço na doutrina
político-jurídica do espaço, sobretudo destacando as vantagens empresariais que o tema
tem e pode vir a ter. Mais recentemente, esta nova corrida ao espaço tem contado com a
participação de novos atores literários e políticos, tais como os brasileiros e os chineses.
São estes últimos que têm causado alguma celeuma na repartição arbitrária e política do
espaço, pois têm entrado discretamente mas em força neste mundo altamente
competitivo. A doutrina internacional tem posto em perspetiva esta entrada face ao
crescimento exponencial da economia e da população chinesa, entre o risco e as
vantagens de mega Estado que não requer parceiros.
Nas bases das primeiras teorias da astropolítica encontramos o famoso
Professor Doutor Everett Carl Dolman, professor de Estudos Militares Comparados na
Academia da Força Aérea na School of Advanced Air and Space Studies (SAASS). As
suas inúmeras publicações incluem Astropolitik: Classical Geopolitics in the Space Age
(2002); The Warrior State: How Military Organization Structures Politics (2005) e
Pure Strategy: Power and Principle in the Information Age (2005). Publicou vários
artigos para o Journal of Strategic Studies, Comparative Strategy, Journal of Small
Wars and Insurgencies, Soviet and Post-Soviet Review Citizenship Studies, Politics and
Society, e o Journal of Political and Military Sociology, assim como na reconhecida
publicação em que ele é co-fundador a Astropolitics: The International Journal of
10
Space Power and Policy. As teorias por ele desenvolvidas são inegavelmente a base do
conhecimento que iremos desenvolver nesta análise.
Algumas das bases teóricas utilizadas ao longo deste estudo provêm de ideias
promovidas pelo conhecido cientista político norte-americano e professor em Harvard
Joseph Samuel Nye Jr., co-criador, com Robert Keohane, da teoria da interdependência
e da interdependência complexa nas relações internacionais e da teoria do
neoliberalismo, desenvolvido em 1977 no seu livro Power and Interdependence.
Juntamente com Keohane, desenvolveu os conceitos de assimetria e interdependência
complexa, exploraram, igualmente, as relações transnacionais e da política mundial.
Mais recentemente, na área das relações internacionais, foi o pioneiro na teoria do soft
power, no final dos anos 1980, o seu primeiro registo encontra-se utilizado num artigo
da Foreign Policy. Nas palavras de Nye, “o conceito básico de poder é a habilidade de
influenciar outros a fazer o que queremos. Há três maneiras de se conseguir isto: uma
delas é ameaçá-los com paus; a segunda é comprá-los com cenouras; e a terceira é atrai-
los ou cooperar com eles para que queiram o mesmo. Se conseguir atraí-los a querer o
que se quer, custará muito menos que cenouras e paus.” Assim, soft power, é um termo
usado para descrever a habilidade de um corpo político, como um Estado, para
influenciar indiretamente o comportamento ou interesses de outros corpos políticos por
meios culturais ou ideológicos. Representa o terceiro meio de conseguir os resultados
desejados. Contrastando com hard power, que historicamente foi a medida realista de
poder predominante, normalmente por meio de grandes números, quer fosse o tamanho
da população, ou da tecnologia militar, ou do PIB de um país. Mas ter tais recursos nem
sempre produz os resultados desejados, como os Estados Unidos descobriram na Guerra
do Vietnam. O sucesso do soft power depende em grande medida da reputação do Actor
na comunidade internacional, assim como do fluxo de informações entre atores. Por
isso, soft power é geralmente associado à ascensão da globalização e a teoria neoliberal
nas relações internacionais. A cultura popular e a comunicação social são geralmente
identificados como uma fonte de soft power muito influente. A noção de Nye de smart
power, de utilização pelos Estados da informação e de estratégias de comunicação para
o interesse de segurança do Estado a menor custo, tornou-se popular com o uso deste
conceito pela administração Clinton e, mais recentemente, na administração Obama. Em
2011, foi nomeado pela Foreign Policy um dos principais pensadores globais com a sua
"melhor ideia": Um preço para o carbono. E a sua "pior": Ceticismo climático. Este
11
premiado autor tem publicado várias obras nos últimos anos, sendo as mais recentes The
Future of Power (2011), Understanding International Conflicts, (2009), The Powers to
Lead (2008), The Power Game: A Washington Novel (2004), Soft Power: The Means to
Success in World Politics (2004), e The Paradox of American Power (2002). Obras que
serão utilizadas como fonte ou inspiração constante ao longo do estudo e análise por
serem imprescindível à compreensão da importância da política espacial no
desenvolvimento das relações internacionais.
Na colocação de outros atores na conquista espacial surge invariavelmente
Brian Harvey, que expõe excelentes estudos sobre a história de diversos programas
espaciais. Um dos mais conhecidos é sobre o histórico inimigo dos americanos: a
URSS. A obra de Harvey apresenta um bom sumário de todos os aspetos do programa
russo para o espaço desde da Guerra Fria. Introduz documentos e histórias que revelam
uma investigação rigorosa e interessante do que durante décadas foi segredo, podendo
revelar hipoteticamente uma linha de conduta do que a China, atualmente, se prepara
para fazer. O autor descreve em Russia in Space: The Failed Frontier? vários
programas de colocação de satélites, de instalações, cooperação internacional e de
indústria espacial local, que simultaneamente faz a ligação com o passado hegemónico
da Rússia e o seu futuro proporcionalmente mais modesto que se quer empresarial e
competitivo. As obras de Harvey sobre o programa espacial russo são uma referência
para entender os diferentes programas com fins militares e/ou científicos da Rússia,
compara-os e coloca-os historicamente. Contudo, a obra bibliográfica de Harvey é
bastante abrangente, contemplando também a história de vários programas espaciais:
China, Índia, Japão e Europa são apenas exemplos de outras obras que nos permite, no
nosso estudo, apresentar uma perspetiva da evolução da conquista espacial face a
acontecimentos historicamente relevantes.
Na perspetiva histórica abordada na primeira parte deste estudo, há ainda
outros autores que importa referir: William E. Burrows, John Lewis Gaddis e Deborah
Cadbury.
William E. Burrows, professor de jornalismo na Universidade de Nova Iorque
e fundador e director do curso “Science and Enviromental Reporting Program” na
mesma Universidade, foi repórter sobre aviação e espaço para vários jornais de renome:
12
The New York Times, The Washington Post, The Wall Street Journal e o Richmond
Times-Dispatch. Escreveu ainda vários artigos para a The New York Times Magazine,
Foreign Affairs, The Sciences e entre outras, e contribui como editor para a Air & Space
/Smithosian. É também autor de vários livros: A True History Of The Red Baron
(1969); Vigilante (1976); On Reporting The News (1977); Deep Black: Space
Espionage And National Security (1987); Exploring Space: Voyages In The Solar
System And Beyond (1990); Critical Mass: The Dangerous Race For Superweapons In
A Fragmenting World (with Robert Windrem)(1993); Mission To Deep Black:
Voyager's Journey Of Discovery (1993); This New Ocean: The Story of the First Space
Age (1998); The Infinite Journey: Eyewitness Accounts of NASA and the Age of Space
(2000); By Any Means Necessary: America's Secret Air War in the Cold War (2001);
The Survival Imperative: Using Space to Protect Earth (2006). Burrows recebeu vários
prémios pelo livro “This new ocean – The Story of the first Space Age”: além de ser
considerado como referência da história da Era Espacial, foi um dos três finalistas do
Prémio Pulitzer em 1998 na área de História e também ganhou o Prémio Eugene M.
Emme da Sociedade Americana de Astronáutica para literatura na área de astronáutica.
John Lewis Gaddis, historiador de reputação internacional a quem o The New
York Times chamou «o decano dos historiadores da Guerra Fria», é professor de
História na Universidade de Yale e tem várias obras publicadas sobre o tema. Pertence
ao conselho consultivo do Cold War International History Project e foi consultor no
documentário da CNN, Guerra Fria. Entre as suas inúmeras obras publicadas, contam-
se: The United States and the Origins of the Cold War, 1941-1947 (1972); Strategies of
Containment: A Critical Appraisal of Postwar American National Security (1982); The
Long Peace: Inquiries into the History of the Cold War (1987);We Now Know:
Rethinking Cold War History (1997); The Landscape of History: How Historians Map
the Past (2002);Surprise, Security, and the American Experience (2004); and The Cold
War: A New History (2006). Neste estudo, teve-se por base apenas uma das obras We
Now Know: Rethinking Cold War History (1997, que foi descrita como sendo “this
brilliant study… provides an exhaustive and ever-quizzical approach to the early years
of the superpower conflict”, pelo David C. Hendrickson da Foreign Affairs.
Deborah Cadbury é autora de vários livros best-sellers e produtora da BBC. A
sua vasta obra literária e como produtora foi diversas vezes premiada, tendo-se
13
especializado sobretudo em assuntos relacionados com ciência, história e os seus efeitos
na sociedade moderna. Para este estudo, considerou-se a obra “Space Race – The untold
story of two rivals & their struggle for the moon”, que deu origem mais tarde a um
documentário BBC com o mesmo nome. Neste livro, Cadbury usou fontes que ainda
não eram do conhecimento público, descreve a Guerra Fria, a espionagem e ambição,
desde o final da II Guerra Mundial até ao final da Guerra Fria.
Face às consideráveis críticas à despesa no programa espacial norte-americano,
alguns autores têm revelado particular proficiência literária para promover o que eles
consideram como um investimento de inigualável importância. Autores como James
Clay Moltz, cientista político norte-americano, Professor na Naval Postgraduate School
(NPS), onde leciona Espaço e Segurança Nacional, Estratégia Nuclear e Segurança
Nacional, Relações Internacionais, e Segurança no Nordeste Asiático, que publicou
mais de 20 livros, dos quais Preventing Nuclear Meltdown: Managing Decentralization
of Russia's Nuclear Complex (2004), The North Korean Nuclear Program: Security,
Strategy and New Perspectives from Russia (2000) e Asia's Space Race: National
Motivations, Regional Rivalries, and International Risks (Contemporary Asia in the
World) (2011) e 30 artigos em diversas reconhecidas publicações, tais como: Arms
Control Today, Asian Survey, Astropolitics, Brown Journal of International Affairs,
Bulletin of the Atomic Scientists, Journal of Contemporary China, Journal of East Asian
Studies, Nature, Space and Defense, Space Policy, Strategic Studies Quarterly, and
World Politics. Este conhecido consultor e perito da NASA e do Senado americano tem
vindo a insistir na contínua permanência dos Estados Unidos (EUA) no espaço,
contrapondo opiniões que retiram qualquer vantagem a esse investimento ou
posicionamento militar, argumenta a necessidade de proteger o acesso a pontos
estratégicos críticos, tanto civis como militares, acessíveis através de pontos na órbita
terrestre. A participação Clay Moltz neste debate é essencial, pois definiu como seu
objetivo estabelecer as linhas de conduta para o futuro espacial, desenvolvendo o
primeiro estudo exaustivo sobre os primeiros 50 anos da segurança espacial, enfatizando
as grandes linhas do desenvolvimento militar no espaço, as suas razões subjacentes, e os
fatores que irão muito provavelmente influenciar o seu futuro. Da sua obra surge uma
surpreendente contenção do poder militar no espaço tanto dos EUA como da URSS,
único outro ator relevante nesses primeiros 50 anos, e uma conclusão de obrigatório
acordo de cooperação para o futuro, numa perspectiva que se quer essencialmente
14
ambiental e de segurança. Quanto à sua investigação relativa ao crescimento do papel da
Ásia, verifica-se uma constante comparação entre o individualismo americano, a
cooperação pacífica europeia e o carácter altamente competitivo e tenso nos países
asiáticos, apontando para um risco de uma corrida com carácter altamente militar. A
análise dos 14 programas espaciais asiáticos, com enfoque na China, no Japão, na Índia,
na Coreia do Sul leva Moltz a isolar diferentes motivações internas nestes atores
espaciais, que iremos considerar no nosso estudo.
Na subida da China ao pináculo da conquista espacial surgem autores como
Joan Johnson-Freese, Professora no Naval War College e Harvard de assuntos de
segurança nacional e autora de numerosas obras de relevo das quais “Heavenly
Ambitions: America's Quest to Dominate Space", conhecida perita nos temas
relacionados com a ocupação militar do espaço pelos norte-americanos e pelos chineses,
apresenta a convivência destes dois poderes militares como inevitável a curto prazo,
adiantando a necessidade imprescindível de estabelecer estratégias com essa
consideração.
Quanto à consideração da utilização do Espaço como meio de garantir a
segurança internacional cabe-nos referir Xavier Pasco, Doutor em Ciência Política
lecciona na Université de Paris I Panthéon-Sorbonne e investigador na Fondation pour
la Recherche Stratégique (FRS), onde coordena o departamento de Espaço, Tecnologia
e Segurança. É autor e consultor de vários organismos nacionais e europeus de
numerosos relatórios de estudos sobre atividades espaciais civis e militares nos EUA e
no Mundo. Os seus trabalhos incluem também as questões de estratégia transatlântica
relativa aos relatórios Organização do Tratado Atlântico Norte (NATO) - Identité
Européenne de Sécurité et de Défense (IESD), às operações em coligação e aos
problemas postos pela interoperabilidade de meios. Autor de La politique spatiale des
États-Unis, 1958-1997, Technologie, Intérêt national et débat public (1997), publicou
também Espace et puissance (1999) e participou na reedição de L'espace, nouveau
territoire, Atlas des satellites et des politiques spatiales(2002). Como redator de uma
das mais prestigiadas revistas europeias de política espacial, a Space Policy, já tomou
posições inovadoras, promoveu a investigação e o conhecimento que nos propomos
hoje transmitir em menor escala.
15
Outra referência na doutrina recente da ciência política espacial, a atual
consultora senior da IFRI responsável pelo departamento da política espacial e dos
EUA, a Professora Laurence Nardon promoveu na sua tese de doutoramento Space
Observation as an Instrument of Power in International Relations: the U.S. and their
Observation Satellites, 1955-1985 que recebeu incontáveis elogios e colocou o tema da
política espacial no quotidiano dos analistas políticos dos mais diversos meios de
comunicação social. A Laurence Nardon tem publicado vários artigos sobre o estado da
política americana utilizando conceitos espaciais e imagens de análises por satélite, tais
como a observação por satélites meteorológicos, revelando nova metodologia de análise
e perspetiva.
16
Capítulo I
Após a 2ª Guerra Mundial os avanços científicos na área espacial
estavam relacionados com as políticas externas das duas superpotências da
altura: EUA e a URSS. A necessidade de estar um passo à frente fez com que a
tecnologia se aliasse à política e aquela fosse utilizada como um meio para um
fim político.
O lançamento do Sputnik, a crise dos mísseis de Cuba e a Guerra do
Golfo de 1991 são exemplos claros que a exploração espacial tem mais do que
um objetivo meramente científico. Acima de tudo, a exploração espacial é um
objetivo estratégico, militar e político.
Deborah Cadbury escreveu: “On 8 September 1944, the V-2 bombardment of
London began. The age of the ballistic missile arrived in Chiswick in West London as
the first struck at 6.43p.m.”12
Sob o poder de Hitler, Werhner von Braun criou as instalações de investigação
para o maior foguetão jamais criado. O foguetão criado por Von Braun – o A-4 –
simbolizava para Hitler a arma que poderia salvar o III Reich e provar a superioridade
alemã no mundo. Após a apresentação do foguetão a Hitler, que se havia mostrado
incrédulo a que fosse possível construir um foguetão que pudesse alcançar a Inglaterra,
exclamou: “Why could I not believe in the sucess of your work? Europe and the rest of
the world will be too small to contain a war with such weapons”.13
Hitler deu então
instruções que fosse acoplado uma ogiva de 10 toneladas e que fosse feita a sua
produção em massa. O A-4 seria então renomeado para Vergeltungswaffen14
(V-2).15
Nos dias finais da II Guerra Mundial, Werhner Von Braun e alguns membros da
sua equipa eram os homens mais procurados tanto pela Intelligence americana como
soviética. O Major Robert Staver dos Estados Unidos da América (EUA) foi enviado
12 Cadbury, Deborah, (2005) “Space Race – The untold story of two rivals & their struggle for the Moon”,
Four Estate, London, p. 13 13
Idem, ibid., p. 5 14
Arma de vingança 15
Idem, ibid, p. 5
17
em Fevereiro de 1945 para Londres com a missão de descobrir tudo quanto fosse
possível sobre a arma alemã. Por seu turno, a URSS já havia colocado no encalço de
Von Braun, desde 1935, o antecessor do Comité de Segurança do Estado (KGB), o
Comissariado do Povo para Assuntos Internacionais (NKVD). Em Janeiro de 1945, os
Soviéticos estavam a avançar rapidamente sobre a Prússia.16
Após a II Guerra Mundial, o mundo ficou perante um cenário bipolar, em que
existiam duas potências mundiais com ideologias diferentes – Capitalismo versus
Comunismo, EUA versus URSS, respetivamente. Este fator esteve na origem da Guerra
Fria, uma disputa entre sociedades capitalistas e comunistas, entre Este e Oeste. Durante
este conflito o Mundo assistiu à busca de poder por ambas as potências na tentativa de
se tornarem a verdadeira superpotência e de provarem qual a ideologia que iria
sobreviver ao longo do tempo. O período inicial da Guerra Fria pode ser dividido em
três fases: 1945 a 1947 (princípio gradual), 1947 a 1949 (declaração de Guerra Fria) e
1950 a 1962 (auge).
As razões que se podem apontar para o exórdio da Guerra Fria prendem-se com
a política externa dos Estados Unidos e da União Soviética. Durante a Guerra Fria,
EUA e URSS confrontaram-se indiretamente através da política externa que praticavam
e tomando partido por partes em conflito. Nesta época existiam “duas superpotências
que se mantinham mutuamente paralisadas, com a ameaça de utilização dos arsenais
nucleares (…) digladiando-se em todo o planeta através de procuradores seus em
conflitos que controlavam, mantendo-os sempre abaixo de um patamar de intensidade
que não desembocasse no confronto direto entre as «sedes» imperiais, com o risco de
provocar a escalada ao nível nuclear estratégico”17
.
A Polónia e a Europa de Leste foram a primeira questão suscitada para que a
Guerra Fria despoletasse. Os americanos consideravam que Estaline quebrara o
compromisso de realizar eleições livres na Polónia após a II Guerra Mundial. Contudo,
nunca ficou claro que Estaline o acordara. O acordo de Ialta de 1945 continuou bastante
16 Idem, ibid. pp-16-19
17 SANTOS, Loureiro dos, (2000) “Reflexões sobre Estratégia – Temas de Segurança e Defesa”,
Publicações Europa América, Mem Martins, pp. 68
18
ambíguo neste ponto e Estaline aproveitou essa lacuna para instituir um governo-
fachada na Polónia após a expulsão dos alemães pelo exército soviético.
Em Maio de 1945, a relação económica entre americanos e soviéticos
deteriorou-se devido ao súbito corte do programa de ajuda lend-lease. Embora tenha
acontecido por causa de um erro burocrático, a situação na globalidade não melhorou e
no ano seguinte os americanos recusaram pedidos de empréstimos soviéticos. Por seu
turno, os soviéticos interpretaram estes factos como sendo pressões económicas com
intenções hostis.
Na reunião de Ialta, EUA e URSS acordaram que a Alemanha deveria pagar 10
mil milhões de dólares em reparações a cada uma das Nações. Contudo, os pormenores
deste pagamento não foram acertados. Em Potsdam, os soviéticos exigiram a sua parte e
que esta fosse paga pelas zonas ocidentais da Alemanha. Harry Truman afirmou que “se
os soviéticos queriam tirar 10 biliões [mil milhões] de dólares à Alemanha deveriam
tirá-los da zona oriental que ocupavam”18
. Assim começou uma série de divergências
entre URSS e EUA, fazendo com que americanos, britânicos e franceses iniciassem o
processo de integração da Alemanha Ocidental e os soviéticos apertassem o controlo
sobre a zona de Leste da Alemanha.
Também a Ásia Oriental constituía um problema. Os soviéticos mantiveram-se
neutrais na guerra do Pacífico até à última semana, quando ocuparam territórios
japoneses. Na reunião de Potsdam, os soviéticos solicitaram uma zona de ocupação no
Japão semelhante à que os americanos ocupavam na Alemanha. Os EUA recusaram esta
pretensão alegando o tardio envolvimento soviético naquela zona do conflito. A URSS
considerou a situação do Extremo Oriente análoga à da Europa de Leste onde o seu
exército tinha chegado primeiro e os americanos reivindicavam eleições, ficando
portanto descontente com a posição americana.
A bomba atómica também foi uma “pedra no sapato” nas relações entre os dois
blocos. Roosevelt decidiu não partilhar o segredo da bomba atómica. Em 1946, os
americanos apresentaram nas Nações Unidas o Plano Baruch de controlo de armas
18 NYE, Joseph S. Jr (2002), Compreender os Conflitos Internacionais – Uma Introdução à Teoria e à
História”, Gradiva, Lisboa, pp. 144.
19
nucleares que os soviéticos recusaram porque pretendiam construir a sua própria bomba.
Para Estaline seria melhor para a segurança da União Soviética se esta tivesse a sua
própria bomba19
e tentou por isso provar que a URSS seria também capaz de a
construir.
As questões no Mediterrâneo e Médio Oriente (invasão do Irão e mais tarde
pressões sobre a Turquia pela URSS) aumentaram o sentimento no Ocidente de que os
soviéticos estavam a expandir a sua zona de influência.20
Este foi o contexto em que a Guerra Fria surgiu e encetou uma competição sem
precedentes entre duas nações envolvendo o mundo numa terceira guerra mundial sem
confronto direto. No auge da Guerra Fria, os dois principais atores começaram a
explorar novos teatros de guerra, nomeadamente o espaço extra-atmosférico como
forma de alcançar um maior prestígio internacional mas também com propósitos
militares. O paradigma espacial da Guerra Fria é definido pelo emprego de atividades e
equipamento espaciais inseridos nos objetivos de uma política nacional e externa. “In
this view, space becomes merely another tool by which international power and prestige
are pursued by decision makers otherwise largely disinterested in space as a field of
human endeavour”21
.
O Sputnik
William Burrows afirma “the Cold War would become the engine, the supreme
catalyst that sent rockets and their cargoes far above Earth”22
. Após o final da II
Guerra Mundial desenvolveram-se aviões espiões (os U-2 e os SR-71). Contudo, as
potências vencedoras da guerra aperceberam-se que os satélites seriam muito mais
eficazes que os aviões porque, tendo em consideração a altitude em que seriam
colocados, ofereceriam uma vista mais ampla e vasta que os aviões espiões. Esta visão
19 A URSS detonou a sua bomba atómica em 1949.
20 NYE, Joseph S. Jr, ibid., pp. 142-149.
21 JONHSON-FREESE, Joan e HANDBERG, Roger, (1997) “Space the dormant frontier – changing the
paradigm for the 21st century”, Praeger, London, pp. 7 22
BURROWS, William E. (1998) “This new ocean – the story of the first space age”, New York,
Random House, pp. 147
20
poderia incluir toda a Terra se esta ficasse rodeada por uma cintura de satélites. Um
outro fator seria o aumento da margem de segurança que os satélites teriam em relação
aos aviões para além de que sobrevoar um Estado no espaço não seria ilegal, pois não
violaria o espaço aéreo nem tão pouco violaria as leis internacionais.23
Desde finais da década de 40 que os apoiantes da exploração espacial estavam a
preparar o público americano para a conquista do espaço ”with elaborate visions of
promise and fear”24
. O lançamento dos primeiros satélites combinados com a promoção
do voo espacial numa cultura popular subverteu a alternativa de Eisenhower25
e levou a
que os líderes políticos perseguissem objetivos mais ambiciosos.26
Durante a Guerra Fria nem todos partilhavam o entusiasmo duma aventura de
grandes estações espaciais, bases lunares, naves sofisticadas e viagens até outras órbitas.
Por isso, nem todos aceitavam as profecias de Werhner Von Braun e outros pioneiros
espaciais. Durante a década de 1950, um grupo de cientistas americanos, que
trabalhavam para o governo federal, avançaram com uma visão alternativa embora a
imprensa a tenha tratado como dissidente, uma vez que não tinham um porta-voz
carismático como Von Braun. Contudo, a alternativa tinha um poderoso apoiante:
Dwight Eisenhower, o primeiro presidente americano a formular uma política de
exploração espacial. 27
“President Eisenhower, as a military leader of many years standing, was
permanently worried in the early 1950s about the possibility of a surprise russian attack
on the USA”.28
A administração de Eisenhower considerava por isso a legitimação do
reconhecimento espacial como possível complemento e/ou substituto do
reconhecimento aéreo. A carta que acompanhou o relatório do Technological
Capabilities Panel, “Meeting of Surprise Attack”, para o Departamento de Estado, que
23 Idem., ibid., pp. 159
24 MCCURDY, Howard E. (1997), “Space and the American Imagination”, Washington, Smithsonian
Institution Press, pp. 54 25
A administração de Eisenhower defendia uma visão mais prática do espaço que diferia em grande
escala dos sonhos mais utópicos para a exploração humana do espaço. 26
Idem., Ibid., pp. 53-54 27
Idem, ibid., p. 54 28
LEVERINGTON, David, (2001), “New Cosmic Horizons – Space Astronomy from the V-2 to the
Hubble Space Telescope”, Cambridge University Press, p. 18
21
colocava a liberdade do espaço no topo da agenda, sugeria uma “re-examination of the
principles of freedom of space, particularly in connection with the possibility of
launching an artificial satellite into an orbit about the earth, in anticipation of use of
larger satellites for intelligence purposes”29
. Este relatório sugeria ainda que o
desenvolvimento de mísseis de longo e médio alcance se tornasse mais rápido e a
construção imediata de aviões U-2.30
Estes aviões de reconhecimento e os futuros
satélites de observação militar tinham como objetivo dar aos Estados Unidos um aviso
no caso de uma preparação de ataque e assegurar que não existiria uma repetição dos
eventos de Pearl Harbor. O desenvolvimento de mísseis de longo alcance iria assegurar
que os Estados Unidos não necessitariam de bases noutros países para lançar um ataque
balístico contra a União Soviética.31
Em 1952, durante o segundo Simpósio sobre Viagens Espaciais do Planetário
Hayden, Milton Rosen, um investigador no Naval Research Laboratory na área de
propulsão espacial, afirmou “before we can attempt to transport human beings in a ship
that orbits around the earth, we must produce a practical, reliable, unmanned
satellite”.32
A visão para o espaço de Eisenhower estava baseada em grande parte na
tecnologia de satélites. Para o Presidente e grande parte dos membros da sua
Administração, satélites e sondas automatizadas demonstravam grande parte daquilo
que pretendiam que fosse o programa espacial americano.33
Do lado soviético, Estaline tornou-se cada vez mais determinado em conseguir a
sua própria bomba atómica e em obter capacidade de lançar a grandes distâncias. O
desenvolvimento de veículos propulsores soviéticos no pós-guerra teve a mesma origem
técnica que o programa americano: os V-2 alemães.34
Alguns especialistas alemães
foram colocados nas primeiras instalações soviéticas de pesquisa e desenvolvimento de
mísseis. Estes submeteram a Estaline várias propostas para “naves” balísticas e
antibalísticas, tendo sempre como ponto de partida o V-2. O míssil que surgiu destes
29 BURROWS, William E. (1998), Ibid., p. 159
30 LEVERINGTON, David, p. 19
31 Idem, ibid., p. 19
32 MCCURDY, Howard E., ibid., p. 56
33 Idem ibid., p. 60
34 Em 1942 foi lançado com sucesso o V-2, o primeiro míssil balístico, criado pela Alemanha de Hitler e
que serviu para bombardear a Inglaterra. O V-2 foi o primeiro foguetão com combustível de hidrogénio
líquido. Após a derrota alemã na II Guerra Mundial, o V-2 passou a ser apelidado por Viking.
22
testes e experiências – o R-14 – foi um míssil de cruzeiro capaz de percorrer 3 mil km
com uma ogiva de cerca de 3 toneladas.35
Após melhoramentos, testes e experiências, surgiu o R-7 que apenas no quarto
lançamento a 9 de Agosto de 1957 conseguiu deixar o solo. O R-7 revelou-se um
falhanço como intercontinental ballistic missile (ICBM), mas um excelente veículo de
lançamento de satélites e o progenitor de longa série de propulsores.36
Em Outubro de 1957, em plena Guerra Fria, a URSS lançou para órbita terrestre
o Sputnik, o primeiro satélite artificial, provando que os Soviéticos não estavam tão
atrasados tecnologicamente como os americanos pensavam.37
Khrushchev afirmou a um
jornalista dinamarquês em Janeiro de 1958 que “o lançamento dos Sputniks soviéticos
mostra em primeiro lugar (…) que se deu uma mudança séria no equilíbrio de forças
entre os países socialistas e capitalistas a favor das nações socialistas”38
. Num só golpe,
a URSS derrotou os EUA não só a nível científico como também a nível militar,
principalmente na nova arena potencialmente decisiva: o espaço39
. Khrushchev via o
programa espacial soviético como oponente ao programa de mísseis e um desperdício
de recursos40
, apenas mudou de opinião quando se apercebeu da reação internacional ao
lançamento do satélite soviético – o Spunitk. No dia seguinte ao lançamento o jornal
soviético Pravda apenas publicava uma pequena notícia factual, seguindo o mote de
discrição do líder soviético. Contudo, no dia seguinte, o Pravda, apercebendo-se de que
o lançamento fora um tremendo êxito de propaganda no Ocidente, publicava cabeçalhos
descrevendo o feito.41
A imprensa soviética descrevia a importância dos satélites
artificiais como sendo um meio para “interplanetary travel, and apparently, our
contemporaries will witness how the freed and conscientious labor of the people of the
new socialist society makes the most daring dreams of mankind a reality”42.
35 BURROWS, William E., (1998) ibid., p. 162
36 Idem, ibid., pp. 165 - 166
37 LEVERINGTON, David, ibid., p. 21
38 KISSINGER, Henry, (1996) “Diplomacia”, Gradiva, Lisboa, p. 495
39 TAUBMAN, Philip (2003) “Secret Empire – Eisenhower, the CIA, and the hidden story of America’s
Space Espionage”, Simon & Schuster, New York, p. 212 40
BURROWS, William E (1998), ibid., p. 180 41
LEVERINGTON, David, ibid., p. 17 42
BURROWS, William E., (1998) ibid., p. 183
23
Nos EUA as notícias acerca do lançamento foram recebidas pela população com
uma mistura de surpresa e pânico, conforme se ia apercebendo de que as cidades
americanas estavam agora ao alcance de um ataque nuclear dos mísseis soviéticos.43
Tornou-se claro que a balança do poder havia-se alterado, permitindo ao potencial
inimigo largar armas nucleares de órbita sem aviso.
Antes do lançamento do Sputnik I, os Estados Unidos atravessavam um período
de crescimento económico e orgulho nacional desde os finais da II Guerra Mundial. A
nação estava “buoyed by its resolve, courage, and confidence in its scientists, engineers
and technicians ability to create stunning technological advances on short notice”44,45
.
O lançamento do Sputnik veio alterar tudo isto.
Em Janeiro de 1958, horas depois do Sputnik ter reentrado na atmosfera, Gabriel
Heatter, um comentador influente do Mutual Broadcasting System, num editorial de
rádio entitulado “Thank you Mr. Sputnik”, proferia:
“You will never know how big a noise you made. You gave us a
shock which hit many people as hard as Pearl Harbor. You hit our pride
a frightful blow. You suddenly made us realize that we are not the best in
everything. You reminded us of an old-fashioned American word,
humility. You woke us up out a long sleep. You made us realize a nation
can talk too much, too long, too hard about money. A nation, like a man,
can grow soft and complacent. It can fall behind when it thinks it is
Number One in everything. Comrade Sputnik, you taught us more about
the Russians in one hour than we had learned in forty years.”46
43 LEVERINGTON, David, ibid., p. 17
44 DICKSON, Paul, (2001)“Sputnik – The Shock of the Century”, Walker, New York, p. 223
45 Os Estados Unidos haviam num curto período de tempo desenvolvido tecnologias como o radar, o
sonar, um pesticida – DDT, a produção em larga escala de borracha sintética, a bomba atómica e a
energia nuclear. 46
DICKSON, Paul (2001), ibid., pp. 223
24
O lançamento do Sputnik foi uma derrota humilhante para os Estados Unidos,
mas também um facto que mudou a vida americana. Este evento deu um novo impulso
ao programa espacial americano. Três dias após o lançamento o Presidente Eisenhower
pressionou o Pentágono para desenvolver um satélite espião.47
O sucesso soviético
desenvolveu uma reação mundial que James Killian48
descreveu como sendo
“Confidence in American science, technology, and education suddently evaporated”49
.
A United States Information Agency, num relatório elaborado pouco depois da
colocação do Sputnik em órbita afirmava que “Soviet claims of scientific and
technological superiority over the West and especially the US have won greatly
widened acceptance. Public opinion in friendly countries shows concern over the
possibility that the balance of military power has shifted or may shift in favour of the
USSR”50
.
Allen Dulles51
reportou ao National Security Council a 10 de Outubro que a
rapidez nos avanços soviéticos que colocaram o Sputnik em órbita estava parcialmente
relacionada com o facto de os soviéticos conciliarem o programa ICBM e o programa
de satélites.52
No Inverno de 1958, o Congresso criou Comités ad hoc, presididos pelos líderes
da maioria, para considerarem as necessidades legislativas de forma a irem de encontro
aos novos problemas causados pelo começo da era espacial. No Verão do ano seguinte,
foi assinado o National Aeronautics and Space Act.
Com o lançamento do Sputnik e a reação mundial ao mesmo, Khrushchev
começou a ter a sua estratégia delineada: “Of course we tried to derive maximum
political advantage from the fact that we were the first to launch our rockets into space.
47 TAUBMAN, Philip (2003) ibid., pp. 212
48 Na década de 1950, James Killian, presidente do MIT, foi Conselheiro Presidencial para a Ciência,
Tecnologia e Intelligence. 49
TAUBMAN, Philip (2003), ibid., pp. 213 50
TAUBMAN, Philip (2003), ibid., pp. 213 51
Allen Welsh Dulles foi o primeiro civil a dirigir a CIA entre 1953 e 1961. 52
ANDREW, Christopher (1996), “For the President Eyes Only – Secret Intelligence and the American
Presidency from Washington to Bush”, Harper Collins Publishers, London, pp. 240
25
We wanted to exert pressure on American militarists – and also influence the minds of
more reasonable politicians so that the United States would start treating us better”53
.
Apesar da balança militar favorecer o Ocidente, Khrushchev fez questão de
minimizar esse facto afirmando “our missiles were still imperfect in performance and
insignificant in number”54
mas “we can launch satellites because we have a carrier for
them, namely the ballistic rocket”55
.
Os EUA consideraram o lançamento do Sputnik como um precedente em matéria
de liberdade do Espaço. Donald Quarles56
destacou “that none of the many nations that
have been overflown by the Soviet satellite appears to have raised objection on the
ground that its territorial rights have been infringed. This seems to establish the validity
of the concept that outer space is international in character”57
. Dias após a colocação
em órbita do Sputnik, o Presidente Eisenhower especificamente questionou a
possibilidade de desenvolverem satélites de reconhecimento. Donald Quarles do
Pentágono descreveu então o projeto da Air Force WS-117L. 58
Perante a imprensa, Eisenhower tentou disfarçar a preocupação americana com o
sucesso soviético descrevendo a ocorrência como “one small ball in the air”59
. No
entanto, reconhecia que a URSS tinha desenvolvido um sistema de propulsão poderoso,
mas ao mesmo tempo não demonstrava publicamente qualquer intenção de acelerar o
programa de mísseis intercontinentais ou de satélites americanos embora nesse campo
os EUA não estivessem na vanguarda da produção.60
Apesar de estarem a desenvolver
programas tecnológicos espaciais desde 1954, os esforços americanos para colocar um
satélite em órbita cresceram em larga escala com o lançamento do Sputnik. Os esforços
53 GADDIS, John Lewis, (1997), “We now know – rethinking Cold War History”, Oxford, New York, pp.
239 54
Idem, ibid., pp. 239 55
BURROWS, Wiliam E (1998), ibid., pp. 195 56
Donald Quarles foi Secretário Adjunto da Defesa de Eisenhower. 57
TAUBMAN, Phillip,(2003) ibid., pp. 216 58
Idem, ibid., pp. 217 59
Idem, ibid., pp 218 60
Idem, ibid., pp 218
26
desenvolvidos durante a década de 1950 estavam voltados para dois objetivos:
reconhecimento militar e a participação no Ano Geofísico Internacional (1957).61
Tal como fomentou a corrida espacial, o Sputnik também conduziu ao
desenvolvimento e produção de armas tecnológicas. Como George Kennan62
escreveu
nas suas memórias:
“It caused Western alarmists ... to demand the immediate
subordination of all other national interests to the launching of
immensely expensive crash programs to outdo the Russians in this
competition. It gave arguments to the various enthusiasts for nuclear
armament in the American military – industrial complex. That the
dangerousness and expensiveness of this competition should be raised to
a new and higher order just at the time when the prospects for
negotiation in this field were being worsened by the introduction of
nuclear weapons into the armed forces of the Continental NATO powers
was a development that brought alarm and dismay to many people
besides myself”.63
O lançamento do primeiro satélite americano estava previsto para Dezembro
1957, mas quem conhecia o programa Vanguard sabia que esta era uma previsão
extremamente otimista. Entretanto, os soviéticos já haviam lançado o Sputnik II e a
cadela Laika já havia iniciado o seu voo espacial. No dia 7 de Novembro, Eisenhower
fez uma comunicação ao povo americano, salientando a força militar da nação: “It’s my
conviction, supported by trusted scientific and military advisers, that, although the
Soviets are quite likely ahead in some missile and special areas and are obviously
ahead of us in satellite development, as of today the over-all military strength of the free
61 JOHNSON-FREESE, Joan, and HANDBERG, Roger, ibid., pp. 74-75
62 George Kennan, cientista político, diplomata e historiador, teve um papel central na Guerra Fria. Ficou
conhecido como pai da política de contenção. 63
DICKSON, Paul, (2001) ibid., pp. 224-225
27
world is distinctly greater than that of the Communist countries. We must see to it that
whatever advantages they have are temporary only”64
.
A Crise dos Mísseis de Cuba
A estratégia da Guerra Fria de Eisenhower passava por covert actions. Durante a
II Guerra Mundial, Eisenhower ganhou uma paixão por imagery intelligence que se
refletiu na sua presidência.65
Desde o início do seu mandato que Eisenhower tentou
desenvolver a intelligence americana e a recolha de imagens. Apesar de reconhecer que
o foto-reconhecimento por satélite seria muito mais benéfico, assumiu-se que os
problemas tecnológicos, incluindo o desenvolvimento de veículos de lançamento
viáveis, iriam adiar o funcionamento do sistema até meados de 1960, na melhor das
hipóteses. Por esse motivo, a administração Eisenhower apostou em projetos de aviação
avançados, começando pelos U-2 e depois avançando para um avião espião
supersónico, quando se aperceberam que os U-2 poderiam ser detetados pelos radares
soviéticos.66
Apesar de Eisenhower considerar as missões dos U-2 de extrema importância,
estava ansioso por uma solução alternativa de recolha de dados de modo a limitar a
provocação ao Kremlin. Por esse motivo, mostrava-se bastante relutante em autorizar
tantas missões quanto Richard Bissel67
queria. 68
A principal missão dos U-2 era
procurar e monitorizar a produção de ICBM e o desenvolvimento de instalações de
energia atómica em território soviético.69
Devido à sua aposta em satélites de reconhecimento, a CIA tornou-se interessada
no Vanguard. Em finais de 1956, Bissel apercebeu-se que o esforço americano para
64 TAUBMAN, Phillip (2003), ibid., pp 223
65 ANDREW, Christopher (1996), ibid., pp. 200-201
66 TAUBMAN, Phillip (2003), ibid., pp. 227
67 Richard Bissel foi o Chefe das Covert Operations da CIA na segunda metade da década de 1950.
68 ANDREW, Christopher (1996), ibid., pp 243
69 Idem, ibid., pp. 242
28
chegar ao espaço estava aquém das capacidades soviéticas. Eisenhower considerou que
um satélite lançado no decorrer do Ano Geofísico Internacional iria fortalecer a
liberdade dos céus numa altura em que os Estados Unidos secretamente estavam a
desenvolver aviões e satélites espiões para fazerem reconhecimento da URSS.70
Em 1960, as missões do U-2 sobre solo soviético terminaram abruptamente
quando um dos aviões foi abatido a 1 de Maio.71
O plano de voo deste U-2 pilotado por
Gary Powers dar-lhe-ia a possibilidade de fotografar a nova base de mísseis soviética
em Plesetsk, no nordeste do território soviético. Iria também sobrevoar a base nuclear
de Tyuratam e o complexo de construção de bombas em Chelyabinsk. O tempo de voo
daria imenso tempo para que os soviéticos detetassem o U-272
, o que aconteceu quando
ainda sobrevoava território afegão. Os soviéticos dispararam três mísseis SA-2 quando
o U-2 de Powers sobrevoava a zona perto de Sverdlovsk.73
Eisenhower aprovou, a 3 de Maio, uma história de fachada para encobrir a real
missão do U-2 abatido: “A NASA U-2 research plane, being flown in Turkey on a joint
NASA – USAF Air Weather Service mission, apparently went down in the Lake Van,
Turkey, area at about 9:00 AM, Sunday, May 1”74
.
Numa conferência de imprensa a 11 de Maio, Eisenhower abriu um precedente
ao explicar publicamente a necessidade de atividades de intelligence em tempo de paz:
“No one wants another Pearl Harbor. This means that we
must have knowledge of military forces and preparations around the
world, especially those capable of massive surprise attacks.
Secrecy in the Soviet Union makes this essential. In most of the
world no large-scale attack could be prepared in secret, but in the
70 DICKSON, Paul (2001), ibid., pp. 100-101
71ANDREW, Christopher (1996), ibid., pp. 243
72 Este seria o 24º voo em território soviético e o segundo para Powers. Tratava-se da missão 4154, nome
de código Operação Grand Slam. Powers já havia sobrevoado território chinês e pilotado o U-2 ao longo
da fronteira soviética 6 vezes. A máquina que Powers pilotou fora reconstruída pela Lockheed após uma
queda em 1959. Estava equipada com os mais recentes motores da Pratt & Whitney. 73
TAUBMAN, Phillip (2003), ibid., pp. 305-307 74
ANDREW, Christopher (1996), ibid., pp. 244
29
Soviet Union there is a fetish of secrecy and concealment. This is a
major cause of international tension and uneasiness today…
…Ever since the beginning of my administration I have issued
directives to gather, in every feasible way, the information required to
protect the United States and the free world against surprise attack
and to enable them to make effective preparations for defense.”75
Khrushchev emitiu um comunicado e sublinhou que “this latest flight, towards
Sverdlovsk, was an especially deep penetration into our territory and therefore an
especially arrogant violation of our sovereignty. We are sick and tired of these
unpleasant surprises, sick and tired of being subject to these indignities. They were
making these flights to show up our impotence. Well, we weren’t impotent any
longer”.76
Georgi Zhukov, decano dos teoristas espaciais russos, avisou em Outubro de
1960 que desde que a URSS provasse que podia abater aviões espiões americanos, os
Estados Unidos iriam apressar o desenvolvimento de novos métodos de colocar satélites
em órbita. O tipo de informação fornecida por satélites espiões “can be of importance …
solely for a state which contemplates aggression and intends to strike the first blow.”77
Em 1959, Eisenhower sublinhou que “the satellite, since it does not violate the
air space,… represents the greatest future in the reconnaissance area”78
. A crise do U-2
expôs o comportamento impulsivo e errático que começava a ser característico em
Khrushchev. A cimeira marcada em Paris para o mês seguinte manteve-se e apesar do
líder soviético dar indicações que pretendia que a mesma se realizasse, reviu a sua
posição: “I became more and more convinced that our pride and dignity would be
damaged if we went ahead with the meeting as though nothing had happened”79
.
75 Idem, ibid., pp. 248
76 Idem, ibid., pp. 306.
77 MCDOUGALL, Walter A., (1997), “The Heavens and the Earth – A Political History of the Space
Age”, John Hopkins University Press, London, pp. 259 78
GADDIS, John Lewis (1997), ibid., pp. 246 79
Idem, ibid., pp. 246-247
30
Quando a conferência se iniciou, Khrushchev exigiu um pedido de desculpas
formal pelo Presidente americano e a garantia de que os voos do U-2 tinham terminado.
Contudo, Eisenhower não pediu desculpas, afirmou que os U-2 eram necessários e que
iria pedir às Nações Unidas que fossem efetuados voos sobre território americano e
soviético.80
A União Soviética ameaçou com ataques de mísseis a países como a Grã-
Bretanha e Japão enquanto acolhessem os U-2, caso se verificassem quaisquer novos
voos de reconhecimento a território soviético ou a países socialistas81, 82
.
A 18 de Agosto desse ano, os Estados Unidos lançaram com sucesso o satélite
Discoverer XIV da base da Força Aérea de Vandenberg, começando uma nova era em
imagery intelligence. Este satélite mostrou o primeiro de quatro ICBMs soviéticos
operacionais.83
Entretanto, em Cuba, Fidel Castro havia chegado ao poder e as informações de
intelligence que chegavam a Eisenhower levavam-no a crer que “Communists began
permeating Cuba’s life and government”84
, pelo que deveriam ser tomadas acções
contra Castro. “We could simply not afford to appear the bully”85
. Em Dezembro de
1959, J. C. King86
, recomendou a Allen Dulles que “thorough consideration be given to
the elimination of Fidel Castro”87
. Contudo, Dulles mostrou pouco entusiasmo em
colocar em prática medidas tão drásticas. Porém foram ordenados vários assassinatos
com ou sem o conhecimento de Eisenhower com poucos resultados práticos. Em 18 de
Agosto de 1960, Bissel e Allen Dulles apresentaram um plano de operações paramilitar
a Eisenhower com o propósito de criar uma oposição cubana unificada. Em Novembro,
foi constatado que não existia qualquer tipo de resistência organizada em Cuba.88
Em 17
80 ALDRICH, Richard J, (2002), “The hidden hand – Britain, America and Cold War Secret Intelligence”,
John Murray, London, pp. 536 81
Estas ameaças foram efectuadas por Malinovsky a 30 de Maio e reiteradas por Khrushchev a 3 de
Junho numa conferência de imprensa em Moscovo. 82
Idem, ibid., pp. 537 83
ANDREW, Christopher, ibid., pp. 249-250 84
Idem, ibid., pp. 251 85
Idem, ibid., pp 251 86
J. C. King foi Chefe da Divisão do Hemisfério Ocidental do Departamento de Operações da CIA. 87
Idem, ibid., pp. 251 88
Idem, ibid., pp. 252-256
31
de Abril de 1961, já na administração Kennedy, ocorreu uma operação militar secreta
americana em Cuba, que ficou conhecida como Baía dos Porcos, tendo sido um
falhanço total89
.
Em Março de 1962, Castro solicitou ao KGB que montasse uma base de
operações em Havana para exportar a Revolução para toda a América Latina. No
seguimento desse pedido, em Maio desse ano Khrushchev decidiu construir uma base
de mísseis nucleares em Cuba. O Presidente da URSS estava parcialmente motivado
pelo seu desejo de impressionar os EUA com o poder nuclear soviético e assim
dissuadi-los de planos de first strike. Ao mesmo tempo, Khrushchev pretendia ter um
gesto de apoio à revolução cubana.90
A URSS estava convencida de que os EUA não iriam detetar a presença de
mísseis em Cuba até que fosse demasiado tarde para tomar medidas. Contudo esta
assunção estava errada uma vez que os U-2 podiam fotografar a construção das bases
dos mísseis e porque a intelligence americana possuía documentos fornecidos pelo
Coronel Oleg Vladimirovich Penkovsky, um espião ao serviço do SIS britânico e da
CIA.91
Todavia, Penkovsky apenas forneceu informação pouco relevante.92
Em 1962, foram obtidas informações fiáveis acerca das capacidades soviéticas
pelos satélites americanos e a existência de uma base de mísseis balísticos de médio
alcance (MRBM) em San Crístobal foi confirmada num voo de U-2 a 14 de Outubro.
As fotografias tiradas pelo U-2 foram decisivas para que os líderes ocidentais
percebessem que a ameaça era real. Os voos do U-2 sobre Cuba durante a crise foram
descritos como “one of the greatest contribution to American security ever made by the
intelligence community”93
. Os voos forneceram uma maior certeza de que realmente os
MRBMs haviam chegado a Cuba, apesar de não conseguirem detetar as ogivas
89 Idem, ibid., p. 258
90 ANDREW, Christopher e MITROKHIN, Vasili, (2000), “The Mitrokhin Archive – The KGB in
Europe and the West”, Penguin Books, London, p. 238 91
Idem, ibid., p. 238 92
ALDRICH, Richard J., ibid., pp. 619-620 93
Idem, ibid., p. 622
32
nucleares. O programa de satélites americano provou também então que não existia
qualquer atraso no desenvolvimento de mísseis em relação à URSS.94
Durante a crise, a comunidade de Intelligence americana tinha três funções
básicas: monitorizar os desenvolvimentos nos silos de mísseis identificados, descobrir
novos silos e monitorizar outros acontecimentos de importância relevante em Cuba;
monitorizar os movimentos dos navios soviéticos em mar alto; e ainda determinar se
havia qualquer sinal de alerta nas altas patentes militares na União Soviética que
pudessem indicar um ataque. Numa reunião a 16 de Outubro, o presidente americano
ordenou que a frequência das missões do U-2 fosse aumentada. Nos seis dias seguintes
as missões do U-2 forneceram aos intérpretes de fotografias no National Photografic
Information Center provas de que os soviéticos estavam a construir pelo menos seis
silos MRBM e silos SS-5 IRBM em Cuba.95
Entretanto a National Security Agency (NSA) e os seus componentes militares
lançaram um esforço massivo de Signals Intelligence (SIGINT), gravando todos os
sinais de radares cubanos que conseguissem. Para além de patrulharem os céus, a NSA
também tentava obter sinais no mar observando e ouvindo todos os eventos que
tivessem o ponto de origem no mar. Para reunir mais informação acerca dos
desenvolvimentos na União Soviética, a CIA e o National Reconnaissance Office
(NRO) tentaram colocar em órbita um novo CORONA96
cujo veículo de lançamento
estava na base da Força Aérea em Vandenberg, sempre a postos para colocá-lo em
órbita, mas cujo lançamento falhou.97
Os esforços feitos na recolha de informação permitiram que fosse feito um
memorando a 19 de Outubro acerca dos mísseis soviéticos em Cuba. O memorando
fornecia informação acerca da capacidade de alcance dos mísseis, precisão, peso da
94 Idem, ibid., pp. 621-622
95 RICHELSON, Jeffrey T., (1995), “A Century of Spies – Intelligence in the Twentieth Century”, New
York, Oxford Press, pp. 315 96
O CORONA foi o primeiro satélite de reconhecimento americano, operando desde Agosto de 1960 até
Maio de 1972, recolhendo intelligence e imagery. O programa CORONA obteve a aprovação do
Presidente Eisenhower em 1958, mas só foi colocado em órbita com sucesso em 1960, uns meses após a
queda do U-2 do Gary Powers. Disponível em: http://www.nro.gov/history/csnr/corona/factsheet.html
acedido em 11/05/2012. 97
RICHELSON, Jeffrey T,.(1995), ibid., pp. 315-316
33
ogiva e capacidade de destruição. Também fornecia informação acerca da quantidade de
mísseis que cada lançador poderia suportar, o refire time, e esclarecia ainda acerca dos
locais que estariam já operacionais a efetuar lançamento em Dezembro.98
Entre o dia 19 de Outubro e o anúncio de bloqueio feito por John F. Kennedy no
dia 22, a recolha de intelligence continuou. O discurso de Kennedy não afetou as
atividades de intelligence, pelo menos no que diz respeito aos seus alvos mais básicos –
Cuba, alto mar e URSS. 99
As informações de intelligence recolhidas desde então deixavam entrever
algumas preocupações. A 23 de Outubro a CIA confirmou a existência de dois canais de
comunicação alternativos, apesar de não conseguir fornecer a sua localização exata. As
fotografias recolhidas mostravam que o trabalho na construção dos silos estava a evoluir
mais depressa do que os americanos pensavam. A 27 de Outubro as imagens recolhidas
por satélite indicavam que os seis silos de MRBM estavam operacionais, num total de
24 posições, e com um potencial de fogo de 48 mísseis em duas salvas. A 28 de
Outubro, o Foreign Broadcast Information Service da CIA, informou a Casa Branca
que Moscovo emitiu uma mensagem de Khrushchev para Kennedy afirmando que “the
USSR had decided to dismantle Soviet missiles in Cuba and return them to the Soviet
Union”.100
A vigilância a Cuba não acabou com o fim da crise, particularmente porque os
Estados Unidos não tinham a certeza absoluta de que todos os mísseis e bombas que
chegaram a Cuba haviam retornado à União Soviética. A 30 de Novembro de 1962, o
“Guidelines for the Planning of Cuban Overflights” afirmava:
“The United States Government has a high priority need for the
following:
a. Continuing evidence on the removal of offensive weapons systems
from Cuba;
98 Idem, ibid., pp. 316
99 Idem, ibid., pp 317
100 Idem, ibid., pp. 318
34
b. Evidence of any reduction on the removal of offensive weapons
systems into Cuba;
c. Evidence of the concealment of offensive weapons system in
Cuba”.101
A revolução tecnológica que Khrushchev havia proclamado na segunda metade
da década de 1950, estava finalmente a ocorrer com a crise dos mísseis de Cuba, apesar
de ter ocorrido cinco anos depois do lançamento do Sputnik.102
Após a crise dos mísseis de Cuba, os Soviéticos iniciaram um plano de aumento
da capacidade militar e superioridade nuclear. Este plano teve início em 1962-1963 sob
comando de Krushchev e nasceu assim a força de ICBM soviética.
Os EUA iniciaram em 1960 o Corona: um programa de satélites de espionagem
e recolha de informações103
. O Corona esteve em funcionamento até 1972 e teve um
papel crucial na avaliação das capacidades reais de misseis inter-balísticos continentais
da URSS. Este projeto surgiu numa altura em que era particularmente difícil para os
EUA recolher informações sobre a URSS por outro método além do U-2. Entre 1959 e
1960 foram realizados 30 lançamentos de satélites Corona que falharam.104
Apenas
passado três meses e meio após a queda do U-2, os EUA conseguiram colocar em órbita
um satélite-espião.
A recolha de imagens feita pelo Corona veio demonstrar que a URSS possuía
menos ICBM’s do que os analistas americanos previam105
. A constatação dos factos
trouxe tranquilidade aos EUA e a vigilância feita a partir de satélites deu confiança para
101 Idem, ibid., pp. 319
102 MCDOUGALL, Walter A.(1997), ibid., pp. 262
103 Os soviéticos também desenvolveram um programa semelhante entre 1961 e 1994 – O Zenit.
Tecnicamente os satélites Zenit eram bastante parecidos com os satélites Corona 104
DICKSON, Paul, (2001),“Sputnik – The Shock of the Century”, New York, Walker & Company, pp.
211-212 105
Os analistas Americanos previam que a URSS possuísse cerca de 3000 ICBM’s. Nikita Kruschev
chegou a afirmar que os soviéticos movimentavam-nos como se tratasse de salsichas. O Corona veio
mostrar que afinal a URSS possuía apenas uma dúzia de ICBM’s.
35
que na década de 70 fossem negociados com os soviéticos os tratados SALT. De facto,
durante as negociações, os americanos mostraram saber mais do que os seus congéneres
soviéticos sobre o arsenal soviético, embora nunca tenham admitido que a sua fonte de
informação era a vigilância por satélite.106
Nas palavras do General George J. Keegan Jr., um dos responsáveis pela área de
Intelligence da Força Área Americana, a recolha de intelligence era “uma enorme fonte
de poder e de controlo.107
” E o que se seguiu à crise dos mísseis de Cuba veio
comprovar que ele tinha razão. A recolha de informações era e continua a manter um
estatuto de grande importância como elemento chave para ver e ouvir o inimigo e para
moldar a perceção da ameaça.
A crise dos mísseis de Cuba introduziu um novo elemento no reconhecimento
estratégico que se tornou em uso comum nos anos seguintes. Como ambas as partes
rapidamente perceberam, a dissuasão só funciona se o oponente souber o que existe e a
melhor forma de garantir que o oponente sabe, é deixá-lo fotografar e recolher dados
das armas estratégicas. Até certo ponto, tanto os EUA como a URSS dependeram do
reconhecimento estratégico do outro, especialmente dos satélites, para validar a sua
capacidade retaliatória.108
A crise dos mísseis de Cuba marcou um ritual de passagem para o
reconhecimento espacial americano que com este evento passou a ser considerado um
sistema estratégico e teve um profundo impacto nas relações internacionais e ficou claro
que no futuro viria a desempenhar um papel preponderante. Khrushchev temia e
ameaçou o U-2 porque era sua preocupação que mais cedo ou mais tarde expusesse o
programa de mísseis balísticos de longo alcance soviético por aquilo que realmente era:
essencialmente impotente.109
106 DICKSON, Paul, (2001), Ibid, pp. 213-214
107 BURROWS, William E, (1998), ibid, pp. 229
108 BURROWS, W. E. (1986). Deep black : space espionage and national security. New York, Random
House, pp. 126-127-.
109 Idem, ibid, p. 132
36
A conquista da Lua
Kennedy ganhou a presidência dos EUA em parte por atacar a política doméstica
e externa de Eisenhower, com ênfase na defesa e no espaço. Kennedy via o espaço
como área de conflito e no seu discurso de tomada de posse fez questão de salientar os
feitos norte-americanos no espaço apesar do avanço soviético na área. Nesta mesma
ocasião, apelou à cooperação soviética para explorar as estrelas enquanto avisava que
caso os Comunistas continuassem a liderar o caminho para o espaço, iriam ocupá-lo de
forma perigosa e como tal deveriam estar preparados para as consequências que
adviriam daí.110
Durante a crise dos mísseis de Cuba, foi realçado que “if there
happened to be no satellite in orbit or ready for launch when a foreign threat suddenly
materialized, no satellite images were available to assist the president and its senior
aides111
. A fraqueza realçada durante a crise dos mísseis112
foi novamente salientada
durante a crise do Médio Oriente em 1967 quando as imagens de satélite chegaram a
Washington demasiado tarde para que fosse possível monitorizar breve mas
intensivamente a Guerra dos Seis Dias entre Israel e os seus vizinhos Árabes. Em
Agosto de 1968 os dados do Corona não foram suficientemente rápidos para avisar a
Casa Branca que as forças soviéticas estavam prestes a invadir a Checoslováquia para
pôr termo às políticas liberais que Alexander Dubcek estava a implementar113
.
Bud Wheelon, Director do Office of Scientific Intelligence da CIA, relembrou
mais tarde que “Corona was totally useless during the Cuban missile crisis because of
the long delay in getting the film back. We needed the data back that day, not a month
from now”114
.
De 1961 a 1963, foram os anos em que os protestos soviéticos contra os satélites
espiões americanos alcançaram maior relevo. Muitos artigos denunciavam a
110 Idem, ibid., pp. 319-320
111 TAUBMAN, Phillip, (2001) ibid., pp. 327
112 Durante a crise dos mísseis de Cuba, Kennedy teve de confiar nos voos do U-2 e em voos de
reconhecimentos a baixa altitude por outros aviões sobre Cuba para monitorizar a instalação dos mísseis
soviéticos. O Major Rudolph Anderson, piloto de um U-2, foi morto quando o seu avião foi abatido sobre
Cuba em finais de Outubro. 113
Idem, ibid., pp. 328 114
Idem, ibid., pp. 328
37
militarização americana do espaço mas serviam ao mesmo tempo para publicitar a
importância dos sistemas de satélites soviéticos.115
No início de 1962, a era espacial
contava com 4 anos. Os Estados Unidos haviam feito 63 lançamentos para órbita (cerca
de 34 eram militares). A URSS apenas conseguira lançar 50 satélites de reconhecimento
e provavelmente outras aplicações militares entre 1959-60. Os EUA necessitavam mais
de satélites espiões do que a URSS, mas esta também tinha interesse em monitorizar as
atividades americanas e do exército chinês.116
Em Agosto de 1963, Soviéticos, Americanos e Britânicos assinaram o Limited
Test Ban Treaty banindo as explosões nucleares no ar, mar e espaço. Quando o
COPUOS117
reuniu em Setembro, a delegação soviética prometeu “new measures in
order to bring together the different points of view”118
nos princípios básicos do direito
espacial. Estas duas arenas sobrepunham-se. Para a aceitação tática de reconhecimento
baseado no espaço (objetivo americano) era necessário discutir a lei espacial no que
concerne à ilegalidade da militarização do espaço e que não fossem tomadas medidas
que permitissem que esses satélites fossem abatidos. Os primeiros planos anti-satélite
envolviam a detonação de uma ogiva nuclear na proximidade de um satélite hostil. Por
esse motivo a proibição de testes nucleares no espaço contribuiu para a legitimação
implícita de satélites espiões.119
No Verão de 1964 estavam a decorrer duas corridas espaciais: uma para colocar
humanos no espaço120
e alcançar o desenvolvimento tecnológico que o espaço
115 MCDOUGALL, Walter A. (1997), ibid., pp. 271
116 Idem, ibid., pp. 272
117 Commitee on the Peaceful Uses of Outer Space (COPUOS) criado em 1959 pela Resolução n.º 1472
(XIV) da Assembleia Geral das Nações Unidas para promover a esfera de acção da cooperação
internacional no uso pacífico do espaço, para aconselhar o desenvolvimento de programas sob alçada das
Nações Unidas, para encorajar a pesquisa e disseminação de informação em assuntos relacionados com
espaço e para estudar assuntos legais que possam ser levantados com a exploração espacial.
http://www.oosa.unvienna.org/oosa/en/COPUOS/cop_overview.html , acedido em 11/05/2012 118
BURROWS, Williams, (1986), ibid., pp. 274 119
BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 274 120
A Soviética Tereshkova havia-se tornado a primeira mulher no espaço, Yuri Gagarin havia já
completado uma volta à Terra em órbita e dentro de meses Aleksei Leonov iria realizar o primeiro passeio
espacial. O objetivo americano implementado por Kennedy seria colocar americanos na Lua como forma
de os Estados Unidos da América recuperarem o seu prestígio na arena internacional.
38
implicava, outra para satisfazer o desejo de colocar meios no espaço que permitissem
obter superioridade militar.121
A propaganda dos triunfos soviéticos resumia-se aos veículos de lançamento na
senda do Sputnik. Portanto, era inconcebível para Khrushchev ver Kennedy em 1962 a
encaminhar os americanos para a Lua e ver o seu país a atrasar-se na corrida espacial.
Khrushchev incentivou por isso Korolev122
e outros que desenvolviam planos para ir à
Lua e a Marte, já que o que era necessário era um grande nível de coordenação que não
existia.123
Korolev desenvolveu três programas separados para colocar os soviéticos na Lua
paralelamente ao programa americano. O Vostok levou cosmonautas ao espaço da
mesma forma que a Mercury e Gemini levaram astronautas. O segundo, Luna, era
idêntico aos três programas americanos de reconhecimento lunar. E o último, o
Programa N, pretendia desenvolver um lançador similar ao Saturn, embora oficialmente
não fosse reconhecido, tal como no caso americano, que o seu principal objetivo seria
levar Homens à Lua.124
Em Setembro de 1963, George Muller, o recém-nomeado administrador da
NASA para os projetos de voos tripulados, pediu a alguns subordinados para calcularem
a probabilidade de chegar à Lua no tempo estipulado por Kennedy. As hipóteses
estimadas foram uma em dez.125
Contudo, a 9 de Novembro de 1967 e após uma série
de acidentes, a Apollo 4 e os módulos lunares foram lançados por um Saturn V numa
trajetória que os poderia levar à Lua. A Apollo 4 desempenhou perfeitamente a sua
121 BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 387
122 Durante a II Guerra Mundial, Sergey Korolev foi feito prisioneiro mas passou os anos a desenhar e
testar combustível líquido para rocket boosters de aviões militares. Após a Guerra, modificou o míssil
alemão V-2, aumento o seu alcance para 685 km. Em 1953 ele começou a desenvolver a série de mísseis
balísticos que levou ao primeiro ICBM soviético. Após a morte de Estaline, Korolev foi responsável pelos
sistemas de engenharia dos lançadores e naves soviéticas (Vostok, Voskhod e Soyuz). Korolev foi o génio
por detrás dos voos espaciais tripulados. http://www.odessit.com/namegal/english/korolev.htm , acedido
em 11/05/2011 123
BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 396 124
BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 396 125
BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 405
39
missão. Este ensaio foi importante porque juntou todas as peças do programa pela
primeira vez e demonstrou que conseguiam funcionar.126
Em Julho de 1969, a Apollo11 levou uma tripulação de três homens à Lua.
Levavam consigo uma bandeira e uma placa comemorativa para colocar no Mar da
Tranquilidade dizendo:
“HERE MEN FROM THE PLANET EARTH
FIRST SET FOOT UPON THE MOON
JULY 1969 D.C
WE CAME IN PEACE FOR ALL MANKIND”
Contudo, a bandeira que levavam era o estandarte nacional dos Estados Unidos e
não representava o mundo inteiro127.
Durante anos os soviéticos fizeram passar a mensagem de que o seu objetivo
nunca tinha passado por enviar homens à superfície lunar. Para o demonstrar, um ano
depois da chegada à Lua dos americanos, a URSS prosseguiu com a investigação lunar
com sondas automáticas. A 12 de Setembro de 1970, após cuidadosas preparações,
enviaram a sonda Luna 16 ao Mar da Fertilidade para recolher amostras do solo lunar e
enviá-las de volta à Terra. Esta missão foi a primeira que trouxe para a Terra amostras
de rochas de outro corpo celeste sem presença humana no espaço exterior. Apesar de ter
sido um feito importante, uma vez que não colocava em risco vidas humanas, a
imprensa não deu o devido valor ao acontecimento.128
A década de 70 e 80: os Tratados SALT
126 BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 416-418
127 BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 426
128 BURROWS, Williams, (1986) ibid., pp. 432
40
Em meados da década de 60, a corrida às armas nucleares tornou-se ainda mais
intensa entre EUA e URSS. Tanto um lado como outro reforçaram ao máximo a sua
capacidade de ICBM’s além de começarem a planear igualmente sistemas antimísseis
balísticos (ABM). Em 1967, o presidente norte-americano Lyndon Johnson e o seu
homólogo Alexei Kosygin levaram a cabo uma cimeira em Glassboro onde abordaram a
possibilidade de limitar os sistemas ABM. Contudo, com a invasão soviética da
Checoslováquia em Agosto de 1968 as negociações ficaram suspensas.129
Este foi o
início na alteração da estratégia de Destruição Mútua Assegurada (MAD) para uma
estratégia de coexistência pacífica e de cooperação. O Presidente Nixon viria mais tarde
a afirmar no seu discurso ao Congresso americano no dia 1 de Junho de 1972 “We took
the first step towards a new era. We have begun to check the wasteful and dangerous
growth of nuclear weapons. We have begun to reduce the level of fear by reducing the
causes of fear”.130
Só após a tomada de posse do Presidente Nixon é que se iniciaram formalmente
as negociações para o tratado SALT-I (Tratado para limitação de armas estratégicas) em
1969. As negociações do Tratado SALT-I versaram sobretudo numa limitação no
número de mísseis nucleares, ou seja, inicialmente o objetivo seria limitar armas
ofensivas, mas acabou por cair este princípio e trocou-se as limitações ofensivas por
limitações defensivas.131
Os EUA mostraram-se mais preocupados durante as
negociações em limitar a capacidade ofensiva da URSS enquanto as preocupações
soviéticas versavam a limitação do sistema antimíssil americano. Este acordo foi
bastante difícil de concretizar sobretudo pela dificuldade em chegar a uma definição
comum de “armas ofensivas”.
O Tratado SALT I (Maio de 1972) foi um marco nas relações entre as duas
superpotências, não só porque altera o modo de fazer política durante a Guerra Fria ao
proibir a prossecução de sistemas ABM mas também porque proíbe que ambas
superpotências de interferir com os meios nacionais de verificação, ou seja, satélites
espiões. Acresce ainda que com este Tratado os EUA garantiram a não militarização do
129 GRAHAM, T. and HANSEN K. A. (2007). “Spy satellites and other intelligence technologies that
changed history”, Seattle, Wash. ; London, University of Washington, pp. 48-50. 130
MURPHY, D. (2003), “Cold War 1945-1991” London, Collins Educational, pp59 131
DUNBABIN, J. P. D. (2008). “The Cold War : the great powers and their allies”, Harlow, England ;
New York, Pearson Education, p. 64.
41
espaço ao ficar expresso no tratado a proibição de sistemas ASAT (antissatélite) mas
não de satélites de pesquisa e desenvolvimento.132
Em grosso modo, este tratado divide-
se em duas áreas principais: nenhuma das potências terá uma rede de armas defensivas
que permita fazer frente de forma eficaz às represálias da outra parte; nem “nenhuma
deverá ter capacidade ofensiva que no primeiro ataque seja capaz de aniquilar a
capacidade de resposta da outra parte”133.
Contudo, no final de 1972 iniciam-se as negociações para rever o Tratado SALT
(Novembro 1972). Em parte esta renegociação ficou a dever-se ao facto de o SALT-I
assinado permitir uma superioridade numérica em armamentos balístico da União
Soviética em relação aos Estados Unidos. Na América, o Senador Jackson foi a voz do
descontentamento com esta situação e gerou uma luta interna para que esta
renegociação acontecesse. Não foram tempos fáceis para os EUA com o choque do
petróleo e a demissão de Nixon em 1974 por causa do caso Watergate. Em cima da
mesa estava mais uma vez a redução de armamento, mas também a introdução de
pontos importantes sobre a verificação, o número máximo de ogivas por míssil e o teste
e colocação de novos tipos de mísseis (algo que o SALT-I não previa).134
Contudo, o
Congresso norte-americano não ratificou o SALT-II em parte pela invasão do
Afeganistão pela URSS.
Nas negociações dos Tratados SALT o uso de satélites para recolha de
informações teve um papel vital. Richard Helms, Director da CIA de 1966 até 1972,
afirmou que o Corona foi indispensável nas negociações do SALT-I. Afirmou inclusive
anos mais tarde:
“President Nixon, for example, has told me, “If you can’t verify an
arms control treaty, we’re not going to hold any arms control negotiation.
(…) One of the pivotal points of the negotiations rested on mutual
verification; we were trying to match the Soviet’s figures with ours,
Fortunately, the Soviets said they’d agree to use our projections about
their forces, which we had, unbeknownst to them, compiled using
132 MCDOUGALL, Walter A., ibid, p. 431
133 DROZ, Bernard et ROWLEY, Anthony, (2000), “História do Século XX – Expansão e Independências
(1950-1973)”, Lisboa, Publicações D. Quixote, p. 560 134
DUNBADIN, JPD, ibid, pp. 57-68
42
CORONA. So, in other words, CORONA produced the arms control
statistics that we used to resolve the SALT I negotiations.”135
De facto, sobretudo nas negociações do Tratado Salt I, as delegações de ambos os
países tinham presentes técnicos e analistas de intelligence e reconhecimento de
imagens espaciais. Isto porque técnicos e analistas com conhecimentos na área de
estratégia e peritos responsáveis pelos sistemas de recolha de informações eram
considerados adequados para acompanhar o processo. Como conselheiros nas
delegações, reportavam as últimas novidades em matéria de informação e análises e
davam parecer em termos específicos a serem utilizados no tratado, entre outras
competências. Contudo, os conselheiros na área de intelligence não faziam nem
recomendavam políticas a seguir, apenas providenciavam análises objetivas de factos.
Nesta época era reconhecido que “the Intelligence Community helps policy
makers determine what sort of verification provisions would be desirable, should be a
treaty, to complement our own NTM capabilities and to optimize our ability to monitor
activities and ensure credible and effective verification”136
. Laurence Nardon afirma
inclusive que “satellite observation can be used for various and self-serving policy
ends”.137
Contudo, deixa também bem claro que a tecnologia de satélite não pode ser
usada para qualquer fim: “space observation technologies are therefor not flexible to all
political ends”138
, porque por exemplo, tem as suas limitações tecnológicas (outros
atores terem posse do mesmo tipo de meios tecnológicos).
Richard Helms, num discurso que proferiu no National War College em Outubro
de 1971139
vem reforçar a importância do apoio da “intelligence” no controlo de
armamento:
135 DAY, D. A., J. M. LOGSDON, et al. (1998), “Eye in the sky : the story of the CORONA spy
satellites” Washington, D.C. ; London, Smithsonian Institution Press, p. 180 136
GRAHAM, T. and HANSEN K. A. (2007). ibid, pp. 61-62 137
NARDON, Laurence, (2007), “Cold War Space Policy and Observation Satellites, Astropolitics, vol 5,
2007, p. 44 138
NARDON, Laurence, (2007), ibid, p. 58 139
Discurso entretanto desclassificado.
43
“Since 1969, it [intelligence to support to the SALT negotiations] has
grown so rapidly in importance and urgency that it now is one of our
foremost continuing concerns. Intelligence has major roles to play. We
are responsible for defining the Soviet Strategic capabilities which are
to be limited in any treaty. After any agreement is signed, we will be
even more involved in continually monitoring whether the Soviets are
observing those limits. An agreement as wide-ranging as the one
contemplated at SALT has had to await the advent of a reliable,
repeatable means of verification from outside the URSS. This brings me
into an area which I must tread with the greatest care. I am talking, of
course, of satellite reconnaissance. Everyone knows that this activity is
going on. And yet we go to considerable lengths – and endure
considerable inconvenience – to maintain a security barrier around it.
One is that certain details of the program still must be kept from the
Soviets if it is to remain fully effective. The second is that Soviets
themselves are very anxious that it not be discussed. They are aware of
what we are doing, although not of the extent of our success, and they
have a vigorous program of their own. In fact, last year they launched
about three times as many reconnaissance satellites as we did.”140
Richard Helms vai mais longe neste discurso ao referir-se aos meios de verificação do
tratado como sendo algo imprescindível e de vital importância para os EUA:
“If a treaty is finally achieved, you will find this point covered in language like
“national technical means of verification, operating within the generally
accepted principles of international law”. The will be no misunderstanding
between Whashington and Moscow about what is meant. But we’ll avoid a lot
of problems by saying it that way. The first full-system success came in 1960,
almost overlapping with the last U-2 flight over Soviet territory. Since then,
140 GRAHAM, T. and HANSEN K. A. (2007). ibid pp. 62-63
44
reliability has become excellent. The performance of the system, as well as the
quality of the product, has dramatically improved. It has come to embrace
electronic, infrared, and other kinds of intelligence in addition to imagery. We
have reached the point where we can give to the President some definite
assurances about just what sort of treaty provisions we can and cannot
monitor with confidence.”141
Mais tarde, quando o Tratado foi assinado, ficou expresso que as verificações
seriam efetuadas pelos “meios técnicos nacionais de verificação”. Não foi de forma
inocente que esta passou a ser a referência em direito internacional na área de controlo
de armamento, isto porque desta forma, e apesar de ambas as partes terem
conhecimento do uso deste tipo de tecnologia, não fica em causa a soberania dos
Estados nem a violação do espaço de cada Estado. Com os meios tradicionais de recolha
de informações, os Estados violavam o espaço soberano do outro Estado e daí a queda
do U-2 em território soviético ter gerado ainda mais celeuma.
Em meados da década de 90, no âmbito das negociações do Tratado para Banir
Testes Nucleares (em inglês: CTBT – Comprehensive Nuclear Test Ban Treaty –
negociado em 1996 mas que nunca entrou em vigor142
), o termo “meios técnicos
nacionais de verificação” continuou a ser usado por outros países, como França, Reino
Unido. Contudo nas negociações da década de 90, China, Índia e Paquistão opuseram-se
e tentaram inclusive que EUA e Rússia definissem o que queriam dizer por “meios
técnicos nacionais de verificação”. Obviamente, ambos recusaram, argumentando que
qualquer definição “would facilitate cheating and unnecessarily restrict future
developments of collection systems, which would be unwise in the contexto of an
indefinitve treaty”, facilitando inclusive exemplos: “space, aerial, sea and ground
detectors, as well as nationally owned and operated systems that paralleled those
planned for CTBT’s International Monitoring System”.143
141 GRAHAM, T. and HANSEN K. A. (2007). ibid., p.63
142 GRAHAM, T. and HANSEN K. A (2007). ibid., p. 128
143 GRAHAM, T. and HANSEN K. A (2007). Ibid,.p. 52
45
Em conclusão, a tecnologia de satélite teve um papel preponderante no controlo
de armamento desde finais da década de 1960, tendo inclusive influenciado as posições
nas negociações dos tratados ABM e SALT. Prova da sua eficácia foi o episódio em
1983 quando os satélites americanos descobriram que os soviéticos haviam construído
um novo radar para deteção de mísseis balísticos na Sibéria. No final da década de
1970, tanto EUA como URSS usavam a tecnologia espacial não para persuadir ou
dissuadir pacificamente, mas para fornecer informações para troca mútua de
acusações.144
A Guerra das Estrelas
Em 1980, ambas as superpotências dependiam de sistemas militares passivos no
espaço para C3I145
. Uma vez instalados no espaço os sistemas vitais, estes tornavam-se
alvos convidativos e métodos de defesa eram necessários.146
Esta década viu os seus padrões políticos da tecnologia espacial sofrerem um
fluxo na mesma proporção aos implementados em 1961.
Assim, em 1981, o programa espacial americano Space Shuttle entrou em
funcionamento, revitalizando o interesse nacional e parecendo restaurar o predomínio
americano no espaço. O presidente Ronald Reagan invocou então o presidente Kennedy
ao anunciar uma estação espacial num espaço de uma década, apesar dos conselhos
adversos dos seus conselheiros. Segundo Reagan, no discurso proferido em Março de
1983 anunciando a criação da Strategic Defense Iniciative (SDI): “This strategy of
deterrence has not changed. It still works. But what it takes to maintain deterrence has
144 NARDON, Laurence, (2007), “Cold War Space Policy and Observation Satellites, Astropolitics, vol 5,
2007, p. 49 145
Communications, Command, Control and Intelligence 146
Idem, ibid., pp. 433
46
changed”147
. As palavras que Reagan utilizou para anunciar a SDI foram bastante
apelativas e demonstram que os EUA queriam fazer crer que a SDI teria apenas efeitos
defensivos:
“What if free people could live secure in the knowledge that their
security did not rest upon the threat of instant U.S. retaliation to
deter a Soviet attack, that we could intercept and destroy strategic
ballistic missiles before they reached our own soil or that of our
allies?148
Os orçamentos militares eram superiores ao da NASA em 1981 pela primeira
vez desde a década de 1950, e a Strategic Defense Iniciative (SDI) de Reagan aumentou
consideravelmente os fundos para investigação de sistemas ABM baseados no espaço,
capazes de destruir mísseis na boost phase. A SDI (ou Star Wars, como foi apelidada
pelos seus críticos) desenhou novas possibilidades tecnológicas e opôs-se aos 20 anos
de adesão à estratégia americana de destruição mútua assegurada e à sua doutrina de que
o espaço era um santuário para sistemas militares passivos e fora dos limites para
armamento ativo.149
A URSS, no entanto, considerava a SDI como ofensiva, apesar de se tratar de
um sistema defensivo. Oleg Kalugin, um antigo General do KGB, afirmou: “When
President Reagan started this program, Soviet intelligence had already obtained
information on the 'Star Wars' program, and they were scared. They were convinced
they would never be able to match the U.S. program for purely financial reasons."150
147 http://pierretristam.com/Bobst/library/wf-241.htm , acedido em 11/05/2012
148 Idem, ibid., acedido em 16/10/2005
149 MCDOUGALL, Walter A,, ibid., pp. 434
150 KENNEDY, Bruce, “War Games – Soviet, fearing Western Attack, prepared for worst in ‘83”,
disponível em http://www.militaryphotos.net/forums/showthread.php?36104-Soviets-prepared-for-worst-
in-1983 acedido em 11/05/2012
47
Entretanto, os Soviéticos tinham uma nova estação espacial – a MIR – que
possibilitava a presença humana no espaço de forma continuada.151
As missões de longa
duração na MIR estavam tecnicamente planeadas para perceber se o ser humano
aguentaria uma missão tão longa como ir a Marte. Estas missões tinham também outro
propósito: pretendia-se que mostrassem que pôr um homem na Lua e depois abandonar
o local não era tão sério, nem tão importante e nem tão prestigiante quanto um programa
espacial maduro e sério que iria manter pessoas por longos períodos no espaço com
propósitos científicos.152
Durante os primeiros lançamentos do space shuttle americano, os soviéticos
estavam também a testar o seu próprio veículo reutilizável – o programa Buran. O
primeiro e único lançamento foi efetuado por uma nave não tripulada e sem nome no
Energia, em Novembro de 1988.153
A Guerra do Golfo de 1991
Apesar da Guerra de Golfo de 1991 ser famosa por ter utilizado sistemas
espaciais em tempo real com fins táticos, a primeira vez que foram utilizados foi no
Panamá em 1989.154
Contudo, e por ter sido em maior escala utilizados, iremos aqui
focar a Guerra do Golfo de 1991.
Na manhã de 2 de Agosto de 1990, o Iraque invadia o Kuwait e começava assim
o conflito que ficou conhecido como a primeira guerra espacial. A 17 de Janeiro de
1991 a Operação Tempestade no Deserto começou com os disparos dos mísseis Hellfire
dos helicópteros Apache do exército dos Estados Unidos.155
Neste conflito, o poder
espacial demonstrou o potencial de estar na vanguarda na guerra. “In 1991, spacepower
151 MCDOUGALL, Walter A., ibid., pp. 435
152 BURROWS, William E, ibid., pp. 514
153 CNN, “Cold War Technology”, disponível em
http://www.cnn.com/SPECIALS/cold.war/experience/technology/, acedido em 16/10/2005 154
NARDON, Laurence, (2007), “Cold War Space POlicy and Observation Satellites, Astropolitics, vol
5, 2007, p. 38 155
LAMBERT, Benjamim S, (1999), “Air Power, Space Power and Geography”, Geopolitcs –
Geography and Strategy, ed. Colin Gray e Geoffrey Sloan, Frank Cass, New York, pp. 65
48
demonstrated that it could enable combat arms of all kinds to be much more lethal than
otherwise would be the case. Spacepower showed that it enhanced the fighting power of
all military elements prepared technically, doctrinally, and organizationally to exploit
its services.”156
Apesar do envolvimento militar na exploração do espaço remontar aos anos 50,
foi apenas na Guerra do Golfo que a potencial sinergia entre poder aéreo e espacial
começou a ser totalmente considerada. Apesar dos equipamentos espaciais apenas terem
desempenhado um papel de apoio na atividade das forças aliadas e nas operações de
combate que se seguiram, foram indispensáveis para determinar o curso da guerra. O
aumento da capacidade de combate das forças aliadas através do espaço assumiu a
forma de apoio à navegação e comunicação, informações meteorológicas, indicações e
avisos, avisos de ataques, vigilância e reconhecimento. Cada informação assumiu um
papel preponderante em assegurar a superioridade informativa da coligação durante a
guerra.157
O NAVSTAR Global Positioning System (GPS), sistema que esteve em
desenvolvimento pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos durante 18 anos,
desempenhou um papel chave na Guerra do Golfo.158
Este sistema providenciou
informação em tempo real e informação atualizada acerca dos alvos a um vasto tipo de
armas usadas pelas forças da coligação. O GPS demonstrou ser bastante útil no
indiferenciado terreno do deserto iraquiano que colocava desafios pouco usuais à
navegação159
, sendo descrito como um avanço tecnológico que “(…) provides the
technical capacity for armed forces to revolutionize modern warfare with readily
available, highly precise sensor, weapon, and logistical systems at all echelons of
military organization”160
.
Os iraquianos duvidavam que as forças da coligação conseguissem encontrar o
caminho pelo deserto. Até porque a navegação neste tipo de terreno havia colocado
156 GRAY, Colin S., (1999), “Modern Strategy”, Oxford, Oxford University Press, New York, pp. 263.
157 LAMBERT, Benjamin S., ibid., pp 73-74
158 PBS, “Frontline: the Gulf War”, http://www.pbs.org/wgbh/pages/frontline/gulf/weapons/gps.html,
acedido em 11/05/2012 159
LAMBERT, Benjamin S., ibid., pp. 74 160
RUSSEK, Michael and HASIK, James M. (2002), “The precision Revolution – GPS and the future of
Aerial Warfare”, Naval Institute Press, Maryland, p. 5
49
inúmeros problemas a anteriores campanhas no deserto. O GPS resolveu este problema:
usando um simples recetor, um veículo ou mesmo um soldado individual pode
encontrar a sua posição com uma margem de erro pequena, em qualquer parte do
mundo. A Guerra do Kuwait foi a primeira a usar este tipo de tecnologia e foi um
sucesso tremendo, porque tornou possível manobras noturnas que sem esta tecnologia
requeriam imensos guias e scouts. O GPS tornou possível à coligação alterar os seus
planos de ataque até ao último momento, uma vez que as forças que o utilizavam não
necessitavam de referências no terreno.161
Como a constelação de GPS ainda não estava completa nesta altura, apenas era
possível dispor do sistema por curtos períodos de tempo, sete vezes por dia. Isto
limitava a ação da coligação que teria de recorrer a sistemas menos precisos que o GPS.
Para as comunicações dos aliados, três satélites do Defense Satellite Communication
System asseguravam comunicações seguras. O Defense Meteorological Support
Program providenciava aos comandantes e planeadores as informações de vigilância e
de monitorização necessárias no que concerne a condições meteorológicas. Um sistema
de vigilância espacial que provou ser de extrema importância na caça aos SCUDs
iraquianos foi a constelação de satélites de infravermelhos do Defense Support Program
(DSP) que detetava a chama do exaustor do míssil 30 segundos após o lançamento.162
A Guerra do Golfo foi a primeira guerra onde os equipamentos espaciais tiveram
um papel preponderante. Pois, uma vez que não eram conhecidos todos os
equipamentos no terreno, muito do trabalho tático normalmente feito por aviões, foi
efetuado por satélites que foram redirecionados para esse objetivo. Sem os sistemas
espaciais a guerra dificilmente seria travada. Contudo, a Guerra do Golfo também
demonstrou as limitações inerentes ao uso desta tecnologia.163
“GPS provide accurate
position during Operations Desert Shield and Desert Storm, but was never designed to
provide the required communication capability for military command-and-control”164
.
161 FRIEDMAN, Norman (1991), “Desert Victory – The War for Kuwait”, Naval Institute Press,
Maryland, pp. 222-225 162
LAMBERT, Benjamin S , ibid., pp. 74-75 163
FRIEDMAN, Norman, ibid., pp. 240-241 164
RUSSEK, Michael and HASIK, James M., ibid, p. 122
50
Um sensor do satélite DSP foi utilizado para detetar e localizar locais de
lançamento de mísseis SCUD e para calcular potenciais alvos numa questão de minutos.
Todo este sistema DSP, comunicações, mísseis terrestres) era uma versão rudimentar da
projetada pela SDI de Reagan na década anterior.165
Numa guerra com cerca de cinco meses de preparação é possível fazer uma
recolha de imagens e mapeamento do local de combate com a preparação e rigor
necessários. A Defense Mapping Agency teve de trabalhar com prazos extremamente
apertados para recolher a informação necessária à elaboração dos mapas indispensáveis
ao uso dos Tomahwaks no Iraque. Isto fazia com que GPS – Tomahwaks fosse uma
ligação importante uma vez que toda a recolha de informação teria de ser feita com base
em equipamentos espaciais.166
Nunca antes num conflito os equipamentos espaciais desempenharam um papel
tão integrado e extensivo nas operações de combate como na Guerra do Golfo de 1991.
Uma mistura de satélites civis e militares proporcionaram ligações de comunicações
inter e intra teatro de operações, asseguraram transmissão de dados, informação
meteorológica, sistema de aviso prévio de lançamento de mísseis balísticos, vigilância e
imagem de reconhecimento e ainda SIGINT. “In fact, the Desert Storm experience so
altered the Pentagon’s perception of space-based systems that since then US forces
have never entered combat without such support”167
.
165 FRIEDMAN, Norman, ibid, p. 241
166 Idem, ibid, p. 242
167 RUSSEK, Michael and HASIK, James M., ibid, p. 123
51
Capítulo II
A República Popular da China completou com sucesso a sua segunda missão
tripulada a 17 Outubro de 2005. Tornou-se assim na terceira nação, após a Rússia e os
EUA, a ser capaz de colocar humanos no espaço. O primeiro voo tripulado em 2003
demorou pouco mais de 1 dia. O de 2005 durou 5 dias e envolveu dois “taikonautas”.
Alguns especialistas consideram que com esta capacidade a China é uma ameaça
competitiva na exploração do espaço. Outros que é um potencial parceiro. Neste
capítulo, ir-se-á focar sobre o papel da China na atual exploração espacial e como
utiliza as suas capacidades espaciais para influenciar e obter recursos de outros
Estados em proveito próprio.
China no Espaço – as origens
A China tem, como é bem conhecido, um longo percurso na história da
astronomia, astronáutica e sistemas de propulsão. Para só citar este exemplo, a pólvora
foi descoberta pelos Chineses no século III, que os levou a desenvolveram ao longo dos
tempos sistemas de propulsão mais rudimentares de foguetões, semelhantes ao que é
usado em fogo-de-artifício.
A História contemporânea também nos revela o interesse dos chineses em
temas do espaço. Hoje, já não são só astrónomos a revelarem o futuro, mas cientistas
políticos com olhos posto no espaço que traçaram o futuro do gigante asiático. Tsien
Hsue Shen é o nome associado ao programa espacial chinês moderno, como a pessoa
que mais contribuiu para o seu desenvolvimento através dos seus trabalhos na área de
aeronáutica e astronáutica. No final da década de 1940, Shen desenvolveu o conceito de
um avião espacial, transcontinental, capaz de voar 400km acima da Terra, onde os
passageiros poderiam sentir por breves instantes a ausência de gravidade. O design do
seu avião espacial era bastante semelhante ao V-4 alemão. No ano seguinte, Tsien Hsue
52
Shen anteviu que o homem iria à Lua dentro de 30 anos, os seus planos visionários
inspiraram os americanos nos antecessores do space sthulle.168
A 8 de Outubro de 1956, o Partido Comunista Chinês cria a 5ª Academia de
Investigação do Ministério de Defesa Nacional para desenvolver o esforço espacial
chinês. Esta data é conhecida por ser a data oficial do início do programa espacial
chinês. Tsien foi o primeiro diretor do Instituto de Investigação de Propulsão criado
dentro da Academia. Numa primeira fase, esta instituição dedicou-se a qualificar
recursos humanos, sobretudo na área de concepção de mísseis e na sua preparação para
o voo. Como a China não possuía, naquela altura, a capacidade de construção dos
mesmos, aliou-se à União Soviética.169
O acordo de cooperação Sino-Soviética iniciou-se em 1957 e estabelecia uma
cooperação técnica entre os dois Estados entre 1957 a 1987, onde a URSS concordava
em ceder à China modelos de mísseis, documentos técnicos, design e especialistas.
Contudo, esta cooperação foi marcada por demasiada burocracia que levaram os
chineses a considerar não existir real boa-fé por parte dos soviéticos no fornecimento
total de informação, duvidando da mesma.
Apesar da incerteza, os chineses decidiram iniciar com um projeto com o nome
de código 1059, que consistia na cópia do R-2 soviético, obrigando, por isso, a
consistente intercâmbio entre especialistas soviéticos e chineses. Com a concretização
do projeto, os técnicos do programa espacial chinês perceberam então as dificuldades
técnicas em produzir um foguetão, considerando o nível de exigência e sofisticação da
tarefa.170
168 HARVEY, Brian (2004). China's space program : from conception to manned spaceflight. London;
Springer, pp. 16-21 169
HARVEY, B. (2004). Ibid, pp. 22-23 170
HARVEY, B. (2004). Ibid, pp. 23-25
53
Tabela 1: Código dos projetos do programa espacial Chinês
Código Ano Projecto
1059 1958 Cópia do R-2 soviético (1958)
581 1958 Projecto de satélite terrestre (1958)
651 1965 Projecto de satélite terrestre, renovado (1965)
911 1967 Programa de satélites recuperáveis (1967)
701 1970 Ji Shu Shiyan Weixing (1970)
714 1971 Programa Espacial Tripulado de Shuguang (1971)
761 1977 Souding rockect programme (1977)
331 1977 Satélite de comunicações (1977)
863 1986 Advanced tecnhologies for the sciences (1986)
921 1992 Programa espacial tripulado (1992)
211 2003 Sonda lunar (2003)
Fonte: Harvey, B. (2004). China's space program: from conception to manned spaceflight. London ;Springer, pp. 22-
25
Para além da ambição de lançar um satélite, a concretização do projeto
deparou-se com consideráveis divergências entre os intervenientes políticos, militares e
cientistas. Contudo, é de realçar a aspiração à grandeza patente na missão para o
primeiro satélite: um instrumento experimental de recolha dados e que ajude no
desenvolvimento de satélites de observação terrestre, meteorologia e comunicações. A
estratégia de comunicação desta missão poderia ser resumida numa única frase: “get it
up, follow it around, make it seen, make it heard”.171
Apesar de a China não ter participado ativamente na corrida espacial ainda
durante a Guerra Fria, sobretudo por questões políticas internas que estagnaram o
programa espacial chinês, na década de 70 a China lançou o seu primeiro satélite.
171KULACKI , Gregory e LEWIS, Jeffrey G. (2009) “A place for One’s Mat: China Space Program 1956
to 2003”, Cambridge, American Academy of Arts and Sciences, p. 12 (disponível em: www.amacad.org
última vez acedido em: 31/10/2005)
54
Décadas mais tarde, já na década de 90, o programa espacial chinês iniciou a sua
fulgurosa evolução. Este considerável progresso e aposta prenderam-se sobretudo com a
Guerra do Golfo de 1991, conflito internacional em que os EUA demonstraram possuir
uma vantagem assimétrica assente em tecnologia aérea e, sobretudo, espacial. Isto fez
com que a China tivesse a perceção da importância que a tecnologia espacial teria para a
melhoria da sua vertente militar, para além das vantagens civis. O programa espacial
chinês tornou-se assim, muito rapidamente, no segundo maior orçamento espacial na
Ásia, ultrapassado apenas pelo Japão. Este aumento considerável no seu orçamento
obrigou o programa espacial chinês a assumir uma posição de liderança regional, com
especial enfâse nas capacidades militares e nas capacidades de voos espaciais
tripulados.172
Em 2003, a China tentou com sucesso o seu primeiro voo tripulado colocando
em órbita apenas um taikonauta, tendo em 2005 conseguido pela primeira vez colocar
uma equipa de dois taikonautas no espaço. Tornou-se assim, em 2003, na terceira nação
a conseguir colocar homens no espaço dependendo apenas da sua própria tecnologia.
Também em 2003, a China começou a sua cooperação com o projeto de
sistema de navegação europeu: o Galileu. Apesar das negociações entre EUA e EU
terem sido intensas, sobretudo na questão da participação chinesa, o acordo sino-
europeu avançou e, ainda hoje, a China é um dos principais parceiros tecnológicos da
Europa.
Marco importante no programa espacial chinês, foi a realização de um teste
anti-satélite em Janeiro de 2007, que consistiu na destruição de um satélite
meteorológico chinês, criando inúmeros detritos que ficaram em órbita colocando em
risco os outros satélites que lá se encontram. A reação da comunidade internacional a
este teste não foi das melhores, tendo vários Estados condenado publicamente pelo
perigo da criação de lixo nas órbitas terrestres.
Apesar da polémica em torno do programa espacial, chinês, certo é que forte e
ciente dos seus sucessos em apenas uma década de investimento intensivo em
172 MOLTZ, James Clay (2011), Asias’s Space Race: National Motivations, Regional Rivaliries and
International Risks, p. 70
55
tecnologias espaciais, a China declara de forma ambiciosa mas não desmedidas, nos
poucos documentos públicos sobre o seu programa espacial, conseguir até 2020:173
:
construir um sistema de observação terrestre de longa duração
instalar uma rede independente de satélites de comunicação
implementar serviços de lançamentos comerciais
estudar no espaço a microgravidade, ciências vitais da vida, desempenho
de materiais e astronomia.
desenvolver o plano de exploração da Lua.
Pensando para a longo prazo, a partir de 2020, são objetivos divulgados da
China174
:
aumentar seu conhecimento nas ciências espaciais
construir uma estação espacial orbital
levar naves tripuladas à Lua
construir uma base lunar habitada
exploração profunda não-tripulada do Sistema Solar
China no Espaço: o que a motiva?
Teoricamente, importa referir, antes de mais, Joseph Nye Jr. Este cientista-
político desenvolveu um conceito nas relações entre os Estados: soft power. Para Nye,
soft power é a capacidade de conseguir o que queremos através da atração em vez da
coerção ou de pagamentos. O soft power surge através da atração que provoca pela
cultura, política e pelas ideias. Assim, nesta perspetiva, quando as políticas parecem ser
legítimas aos olhos dos outros, o soft power aumenta.175
O soft power de um país
assenta, por isso, sobretudo em três recursos: a sua cultura (os lugares que são atrativos
para outros), nos seus valores políticos (quando vive de acordo com ele quer dentro quer
173“China Space activities 2011”, disponível em
http://images.spaceref.com/china/ChinaSpaceActivitiesin2011.pdf , acedido última vez em 20/10/2012 174
“China Space activities 2011”, disponível em
http://images.spaceref.com/china/ChinaSpaceActivitiesin2011.pdf, acedido última vez em 20/10/2012 175
NYE JR, Joseph S., Soft Power: The Means To Success In World Politics, pp. 70-72
56
além fronteiras) e na sua política externa (quando é visto como legítimo e tendo
autoridade moral).176
O soft power traduz-se na prática na capacidade de um Estado
seduzir outros a fazer com que admirem os seus ideais, de fazê-los querer o que nós
queremos. Além disso, segundo Nye, a sedução é muito mais eficaz e menos
dispendiosa do que a coerção, para além disso a promoção de muitos valores como
democracia, direitos humanos ou oportunidades individuais são extremamente
sedutoras.177
Considerando isso, podemos afirmar com um certo grau de certeza que os
países asiáticos têm uma fonte considerável de soft power na sua cultura. As artes, moda
e cozinha asiáticas têm tido um forte impacto no mundo há séculos. A China tem tido
esse soft power em consideração na sua expansão, dando os primeiros passos para
exercer esse soft power também pelo desenvolvimento tecnológico, para fins
económicos e políticos. Existem além do sudeste asiático, outros centros para onde o
soft power chinês tem-se expandido, o que faz crer que a estratégia chinesa para a
expansão da sua esfera de influência concentra-se em avançar por regiões ao invés de
assumir uma postura que prime pela abordagem global. Contudo, a China tem como
principais desafios ligados a sua imagem propagadora do soft power, algumas questões
internas ligadas aos direitos humanos e problemas ambientais.
Assim, o programa espacial não só traz vantagens económicas e tecnológicas
diretas para a China, como ainda enaltece a reputação chinesa. Se no passado, as
motivações para investir em projetos de tanta ambição e especulativos eram a
celebração de um poder divino ou real, a procura de lucro e a guerra, na atualidade estes
três motivos misturam com outros: o respeito e prestígio perante os outros Estados, a
liderança tecnológica e científica. Atualmente é inegável que o objetivo principal do
programa espacial chinês é realçar simultaneamente o poder militar, económico e
político do estado Chinês, através do desenvolvimento de parcerias internacionais que
passam pelo reconhecimento e credibilidade do Estado chinês. Na verdade, uma das
razões para a China ter investido tão agressivamente no seu programa espacial prende-
176 NYE JR, Joseph S., ibid, pp. 299-301
177 NYE JR, Joseph S., ibid, pp. 76-80
57
se com a obtenção do reconhecimento e prestígio do Estado na comunidade
internacional, assim como, no, não menos importante, orgulho patriótico a nível interno.
O reconhecimento e o prestígio internacional, como parte de um conjunto vasto
de ações, podem ter implicações e resultados geoestratégicos consideráveis. Consciente
disso, nos últimos anos, a China pôs em prática uma campanha de charme, tanto tendo
como destinatários os seus vizinhos asiáticos como o resto do mundo. A campanha de
marketing foi cuidadosa e deliberadamente desenhada para transformar, modelar, a
imagem chinesa: de um rufia para um parceiro potencial e de confiança. Este propósito
foi realizado usando meios políticos realistas de aparente ajuda humanitária, mas nem
sempre de forma altruísta, promovendo ajuda pelos recursos: pacotes de ajuda a África,
acordos de comércio e pacotes de ajuda na Ásia, incursões nos países da América do
Sul. Como resultado, sondagens de 2005 levada a cabo pelo Pew Research Center foram
indicativas do sucesso da China nesta sua campanha de marketing junto da comunidade
internacional. De acordo com esta sondagem, levada a cabo entre Abril e Maio 2005:
“China now has a better image than the U.S. in most European nations surveyed”178
.
178 Pew Global Attitudes Project, U.S. Image Up Slightly, But Still Negative: American Character Gets
Mixed Reviews, Washington, D.C.: Pew Global Attitudes Project, 2005, p. 2, disponível em:
http://www.pewglobal.org/files/pdf/247.pdf, última vez acedido a 21/10/2012
58
Tabela 2: Rating Nações
Fonte: Pew Research Center
Tabela 3: A China vista por outros países
Fonte: Pew Research Center
59
Como demonstração do crescimento dessa popularidade, tornaram-se do
domínio público as parcerias comerciais da China com diversos Estados, tais como a
Nigéria, a Venezuela, a França, assim como as suas parcerias científicas relacionadas
com o espaço que mantém, nomeadamente, com Inglaterra e a Agência Espacial
Europeia (ESA). Apesar destas parcerias constituírem uma percentagem global ainda
reduzida, tanto nos lançamentos espaciais e como na indústria de serviços de satélite,
demonstra invariavelmente a vontade da China em cooperar com nações
geograficamente afastadas, potencialmente por objetivos políticos e estratégicos.179
A
estratégia chinesa para se promover enquanto fornecedor de serviços a outros Estados,
apesar dos custos económicos a curto prazo, teve sempre em consideração os lucros e
vantagens que possam advir da sua boa reputação.
O Astrofísico e cientista político Neil deGrasse Tyson afirma que os planos
chineses tornados públicos poderão dar origem a um “momento Sputnik” para os EUA,
forçando estes a tomar ações que reforcem o plano espacial americano, entretanto a
meio gás.180
Por exemplo, retomar os planos para voos tripulados à Lua e Marte. Neste
sentido, Joan Johnson Freese é da opinião que a “space activity, particular manned
spaceflight, also yields considerable prestige, prestige that translates to political
prowess”181
.
Sendo a China uma potência em ascensão, quer a nível regional quer a nível
mundial, é-lhe inerente a sede por prestígio como forma de afirmação geoestratégica,
em detrimento de outras potências locais. De facto, após o primeiro voo tripulado em
2003, um dirigente no Japão afirmou que “Japan is likely to be the one to take the
severest blow from the Chinese success. A country capable of launching any time will
have a large influence in terms of diplomacy at the United Nations and military affairs.
179 CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international
relations, pp. 49-50, disponível em
http://edocs.nps.edu/npspubs/scholarly/theses/2009/Mar/09Mar_Chambers.pdf 180
DEGRASSE TYSON, Neil, (2012) “The Case for Space – Why we should keep reaching for the
stars”, Foreign Affairs, Abril 2012, Kindle Edition 181
JOHNSON FREESE, Joan (2007 -2), “China’s Space Ambitions”, disponível em:
http://www.ifri.org/downloads/China_Space_Johnson_Freese.pdf, acedido última vez em 21/10/2012, p.
7
60
Moves to buy products from a country succeeding in manned space flight may
occur.”182
A China tem vindo a apresentar a sua indústria espacial como um ponto
essencial da sua política de desenvolvimento estratégico para o país. O que indicia não
só importante papel desta indústria no desenvolvimento económico e social da China,
mas também demonstra que a sua indústria espacial se fortaleceu consideravelmente,
colocando-a entre os países na liderança em algumas áreas relacionadas com tecnologia
espacial.
A China, tal como outros membros do exclusivo clube espacial, incluindo os
países europeus, defende que os investimentos em tecnologia de duplo uso, ou seja,
simultaneamente de uso civil e militar, são desejáveis por causa da maior taxa de
retorno de um investimento que é considerável. Diferentemente, os EUA vêem este tipo
de tecnologia como algo a desencorajar fora dos EUA, preferindo incentivar o
investimento em tecnologias sem qualquer tipo de uso militar. De facto, a posição dos
EUA é que se a tecnologia de duplo uso está a ser desenvolvida pela China, é para os
seus objetivos militares, quando na verdade, tem parecido que a China desenvolve a
tecnologia espacial para duplo uso, fins militares e fins civis.183
Segundo o relatório chinês sobre atividades espaciais de 2011, prevê-se que a
China trabalhe nos próximos anos nos seus objetivos estratégicos e fortaleça as suas
capacidades de inovação e expanda a cooperação internacional. Para isso, a China
pretende que a sua indústria espacial seja melhor e mais rápida, o que implica que em
simultâneo a China trabalhe em conjunto com a comunidade internacional para manter o
espaço exterior numa zona limpa e pacífica e encete esforços para contribuir na
promoção da paz mundial e no desenvolvimento.184
182 JOHNSON FREESE, Joan (2007 - 2), ibibid, p.7
183JOHNSON-FREESE, Joan (2007 - 2), ibid, p. 8
184“China Space activities 2011”, disponível em
http://images.spaceref.com/china/ChinaSpaceActivitiesin2011.pdf , acedido última vez em 20/10/2012
61
No plano apresentado em 2011, a China apresentou as suas prioridades para o
programa espacial até 2016. A China pretende fortalecer as suas capacidades básicas na
indústria espacial, acelerar a investigação em tecnologia de ponta e continuar a
implementar projetos tecnológicos e científicos na área espacial, incluindo, voos
tripulados, exploração lunar e um sistema de observação terrestre de alta resolução, um
sistema de navegação e posicionamento, uma nova geração de lançadores e outros
projetos em áreas chave. A China pretende ainda desenvolver uma plano abrangente de
construção de infraestruturas espaciais, promover os seus satélites e a indústria de
aplicações de satélites, conduzir investigação científica espacial e coordenar e
desenvolver de forma sustentável um plano para a indústria espacial chinesa.185
Apesar de no passado a China ter construído o seu programa espacial com base
na ajuda material e na cooperação efetiva de outros Estados para desenvolver as suas
capacidades espaciais, é notória a vontade de agora avançar sozinha, progredindo lenta
mas firmemente. Porém, não se tem negado a cooperações pontuais, de facto a China
poderá cooperar em atividades espaciais para acelerar um aspeto particular do seu
programa, ou para ganhar quer prestígio quer reconhecimento ao longo do caminho que
percorre, mas o seu objetivo final é claro: tornar-se um jogador de peso na corrida ao
espaço.186
Os planeadores e estrategas chineses aprenderam com a corrida espacial da
Guerra Fria que um programa espacial forte é uma forma excelente de desenvolvimento
das capacidades de engenharia.187
Caso a China seja o segundo país a colocar um homem na Lua com sucesso,
será um sinal claro e inequívoco que a China é um país em ascensão, com uma base
tecnológica forte e estável, e que os produtos made in China não poderão ser
considerados apenas imitações baratas dos produtos ocidentais. Os estrategas militares
chineses compreendem claramente o uso do espaço nas operações militares como sendo
185 “China Space activities 2011”, disponível em
http://images.spaceref.com/china/ChinaSpaceActivitiesin2011.pdf , acedido última vez em 20/10/2012, p.
8 186
SABATIER, Vincent e FAITH, G. Ryan, “Space power: a crowded field”, World Politics review
features, May 17, 2011. 187
SABATIER, Vincent e FAITH, G. Ryan, “Space power: a crowded field”.ibid.
62
uma mais-valia, principalmente depois do impacto que o uso destas capacidades tiveram
na Guerra do Golfo de 91, em que os EUA obtiveram uma vantagem assimétrica. Por
esse motivo, têm desenvolvido essas capacidades de uma forma bastante discreta.188
Relações Internacionais espaciais da China
1. China versus Europa
China e Europa têm uma visão comum sobre espaço: ambos vêm os programas
espaciais como sendo algo que gera tecnologia, e tecnologia como sendo algo que
impulsiona desenvolvimento económico. Ambos partilham ainda a mesma visão
filosófica, segundo a qual investir em tecnologia de duplo uso permite a maximização
dos retornos dos escassos recursos disponíveis. Além disso, ao ser claro que esta visão
permite usar estes ativos não numa missão mas potencialmente em duas, a sua
justificação política torna-se muito fácil.189
A crescente parceria sino-europeia, especialmente na área espacial, pode ser
explicada por interesses estratégicos comuns ou convergentes:
1) maximizar as suas posições económicas perante os seus grandes
concorrentes, EUA e Japão, e
2) de certa forma, fazer frente ao poderia americano.
Desde 2004 que a UE tornou-se no maior parceiro comercial da China,
destronando desta forma o seu vizinho o Japão. A China importou mais de 64 biliões de
euros190
em tecnologia europeia, mais do que qualquer outra origem produtiva externa.
188 SABATIER, Vincent e FAITH, G. Ryan, “Space power: a crowded field”. Ibid
189 JOHNSON-FREESE, Joan (2006), “The emerging China-EU space partnership: a geotechnological
balancer”, Space Policy n.º 22, Elsivier, pp. 12-13 190
Valores apresentados à taxa de câmbio do início de 2004.
63
Ao atingir o valor de 135 biliões de euros em 2004, o comércio entre China-EU tornou-
se 3 vezes superior ao comércio entre China-Rússia.191
E apesar das múltiplas parcerias que tem vindo a estabelecer em diferentes
projetos europeus, a China irá provavelmente até 2020 superar o comércio de ativos
espaciais europeus.
O Beidou, o sistema de navegação chinês estará previsivelmente operacional
antes do seu homólogo europeu, o Galileu. Também os veículos lançadores chineses, o
Long March 5 (com previsão de inicio de uso em 2014) irão superar a performance do
Ariane 5 (o lançador europeu) e os seus sucessores.192
Relativamente ao sistema de navegação, a UE acolheu no seu projeto Galileu
vários parceiros não europeus, como Israel, África do Sul, Índia e Coreia do Sul, cujo
interesse na proposta europeia se traduziria com uma participação mínima de 5 milhões
de euros no projeto. A China contudo, tem uma participação/cooperação mais alargada
no projeto Galileu. Primeiro porque a sua participação inicial se traduziu numa
contribuição financeira de 200 milhões de euros e porque as contrapartidas para as
empresas chinesas passariam pela participação na construção de infraestruturas tanto no
solo como no sistema espacial assim como no desenvolvimento das aplicações e do
mercado. Em contrapartida, a UE não estava disponível para que a China participasse
nos elementos duais do sistema nem no sinal de restrição PRS193
nem na colocação da
arquitetura de controlo do sistema. 194
Contudo, a participação chinesa nem sempre foi unânime entre os parceiros
europeus. Na verdade, com a rejeição da França e Alemanha em 2005 de uma
Constituição Europeia, as pressões da indústria europeia para serem estes a desenvolver
as aplicações de mercado sem a China e o receio que, devido às sanções tecnológicas
dos EUA à China, os europeus não pudessem utilizar no projeto Galileu tecnologia
191 Johnson-Freese, Joan (2006), ibid, p. 13
192 SABATIER, Vincent e FAITH, G. Ryan, “Space power: a crowded field”. Ibid
193 Sinal exclusivo para uso governamental emitido pelo sistema de navegação ou por outro tipo de
satélites 194
NARDON, Laurence et MESSERLIN, Pierre, (2004) “Les États-Unis face au défi spatial chinois”
disponível em: http://www.ifri.org/files/CFE/US_defi_spatial_chinois.pdf, última vez acedido a
29/10/2012, pp. 7-8
64
americana vital para o sucesso do projeto, fez com que a China apostasse cada vez mais
num sistema de posicionamento e navegação seu. Face a algum impasse político-
jurídico foram estabelecidas uma série de parcerias diretas com a Agência Espacial
Europeia (ESA) e a Comissão Europeia (CE) de investigação na China e até se tornou
possível a realização de joint-ventures com empresas europeias neste segmento de
mercado para que a China desenvolva o seu próprio sistema.195
Tabela 4 - Projectos Cooperação entre China e Europa
Fonte: European Space Policy Institute
2. China versus EUA
195 POLLPETER, Kevin, (2008) “Building the future china progress in space technology during the tenth
5 year plan and the US response”, disponível em
http://www.strategicstudiesinstitute.army.mil/pdffiles/pub852.pdf, última acedido a 29/10/2012, p. 14
65
A relação entre a China e EUA em matéria de exploração e tecnologia espacial
nem sempre foi pacífica, ladeada de negociações tensas e demoradas num mercado
altamente competitivo. Assim, na década de 1990, a China empenhou-se em construir
um foguetão de confiança que permitisse entrar no mercado internacional e responder às
necessidades do mercado doméstico. Neste caso, a China só conseguiu obter a
aprovação dos EUA porque concordou com um sistema de quotas que limitasse o
número de voos a concorrer para o lançamento de satélites ocidentais e a manter o preço
dentro de certos limites que não colocasse em causa os lançadores americanos. Os EUA
concordaram com estes termos porque grande parte dos satélites mundiais tinham
tecnologia americana e por terem em vigor uma série de regras à exportação de
tecnologia. Contudo, os EUA não eram de longe o único cliente possível da China.
Paquistão, Suécia, Austrália e outros países ocidentais eram também potenciais clientes
para este novo serviço proposto pela China.196
Contudo, uma série de incidentes técnicos e lançamentos falhados colocaram
em causa a relação sino-americana.
As difíceis investigações ao acidente com o Intelsat em Agosto de 1996, a
partilha de informação entre investigadores e oficiais chineses e uma China pouco
aberta em relação às investigações, provocou um incidente de maior relevo nas relações
bilaterais dos dois países. O Comité COX, criado para investigar estes incidentes, fez
uma série de alegações e acusações à China em meados de 1999 sobre a área de mísseis
e espaço. O relatório do Comité alegou que as investigações conduzidas em 1996
resultaram na transferência de know-how que beneficiou diretamente o sistema de
mísseis chinês. Seguiu-se uma troca de comentários e críticas ao Comité sobre se de
facto a tecnologia envolvida nas investigações se revestia da sensibilidade e
confidencialidade alegada pelos membros do Comité. Contudo, e apesar da polémica, as
conclusões do relatório Cox foram essenciais na aprovação de legislação sob a
Administração Clinton de recategorizar toda a tecnologia espacial e itens de munições
no US Traffic in Arms Regulations (ITAR). A cooperação americana com a China teve
por isso uma dura e demorada paragem. Durante o resto da Administração Clinton, tal
como na administração Bush, a China não lançou mais nenhum satélite americano e
196MOLTZ, James Clay (2011), ibid, p. 88-89
66
nenhum tipo de cooperação na área do programa espacial civil foi considerado com a
China. O caminho posto em prática durante a Administração Reagan tinha chegado ao
fim e um período de inimizade no que diz respeito ao espaço foi alimentado por grupos
conservadores e militares de ambos os países.197
As relações entre estes dois gigantes económicos ficaram de tal forma
degradadas que de 2003 a 2006 as sanções impostas pelos EUA consistiam no embargo
total à exportação de satélites e seus componentes americanos para a China. Da mesma
forma, os EUA não poderiam importar satélites ou fazer um lançamento que envolvesse
direta ou indiretamente entidades chinesas.198
Em termos de cooperação civil, as duas agências responsáveis pelo programa
espacial civil pouco ou nenhum contacto tiveram depois do incidente com o relatório
Cox, até porque este veio tornar difícil, quase proibitivo, todo e qualquer contacto.
Inclusive, a China ficou inibida pelos EUA de participar na Estação Espacial
Internacional. A primeira tentativa de reaproximação ocorreu em 2006, quando o vice-
presidente da agência chinesa foi convidado pelo seu homólogo americano a visitar a
NASA. Michael Griffin, presidente da NASA na altura, foi à China em Setembro de
2006. Contudo foi-lhe negado acesso ao centro de operações e outro tipo de instalações
que havia solicitado para visitar. A visita falhou no objetivo pretendido: estimular os
laços entre as duas agências e os dois países.
Durante a visita do Presidente Obama em 2009 a Pequim com o Presidente Hu
Jintao, ambos surpreenderam o mundo ao dar uma conferência de imprensa em que
referiram expressamente o seu entendimento para “expanding discussions on space
science cooperation and starting dialogue on human space flight and space
exploration”199
.
Em Janeiro de 2007 a China lançou e testou o primeiro ASAT (arma
antissatélites). Este lançamento não mudou a balança geoestratégica asiática ou
mundial, ou desafiou a superioridade espacial dos EUA. Contudo, demonstrou o alcance
ofensivo/defensivo da tecnologia balística e os limites desta tecnologia. A China que
197MOLTZ, James Clay (2011), ibid p. 90-91
198NARDON, Laurence et MESSERLIN, Pierre,(2004) ibid, p 6
199 MOLTZ, James Clay (2011), ibid p. 90
67
sempre foi um apoiante do limite de armamento no espaço, mostra uma atitude bastante
pragmática: se os EUA não podem desenvolver armas espaciais, então a China não terá
que gastar os seus limitados recursos para os contrapor.200
Este teste antissatélite originou uma vaga de indignação internacional pelo
perigo que criou: além de revelar a existência de uma arma espacial em potência contra
satélites de outros países, gerou uma quantidade enorme de lixo espacial em órbita que
acabou por colocar em perigo outros satélites já em órbita.
Na verdade e segundo Joan Johnson-Freese numa entrevista cedida à CNN, os
EUA sabem qual a tecnologia espacial que a China possui, mas não conhece as
intenções da China para o seu uso e por isso, os EUA deveriam tentar conhecer melhor
os objetivos espaciais chineses. Contudo, com a NASA proibida por lei de trabalhar
com a China não ajudará a conseguir o conhecer e a acompanhar os objetivos chineses.
Ainda segundo a autora e especialista de política espacial: “The United States can
influence the direction, but only if we engage and persuade the Chinese to engage with
us. It’s one way of preventing a scenario of a galactic Wild West in which China has
become the world’s leader in space”.201
3. China versus América do Sul
Após as sanções com os incidentes em 1989 na Praça Tiananmen, a China
procurou novos parceiros para ajudar a sua recém-nascida indústria aeroespacial.
Procurou assim parceiros na América do Sul e iniciou uma parceria com o Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) no Brasil.
O Brasil iniciou o seu programa espacial na década de 60 e lançou o seu
primeiro satélite em 1993. Quando os EUA mudaram a gestão dos dados de deteção
remota e começaram a surgir problemas financeiros nos países emergentes, o Brasil
200 JOHNSON FREESE, Joan (2007-2), ibid , p. 25
201JOHNSON-FREESE, Joan (2012), “Will China overtake America in Space”, disponível em:
http://edition.cnn.com/2012/06/20/opinion/freese-china-space/index.html, acedido última vez em
29/10/2012
68
iniciou uma procura para acesso a dados de confiança noutras fontes. De facto, a
dependência em satélites estrangeiros, faz com que o Brasil esteja dependente da boa
vontade dos outros Estados para ter acesso à informação. 202
Com ênfase na cooperação e no desenvolvimento conjunto, o Brasil e China
aliaram-se e começaram a trabalhar no Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres
(CBERS), em Julho 1988, após a visita do Presidente brasileiro José Sarney à China.
Esta parceria ficou marcada como sendo a primeira venture de tecnologia espacial com
países emergentes que a China realizou e que conduziu ao lançamento de dois satélites:
um em 1999 e outro em 2000.
Segundo o site oficial do programa CBERS, “a união entre os dois países é um
esforço bilateral para derrubar as barreiras que impedem o desenvolvimento e a
transferência de tecnologias sensíveis impostas pelos países desenvolvidos. A parceria
conjunta rompeu os padrões que restringiam os acordos internacionais à transferência
de tecnologia e o intercâmbio entre pesquisadores de nacionalidades diferentes.”203
O projeto CBERS pretende assim ser um projeto de deteção remota, de recolha
de imagens e dados por satélite, de monitorização de terrenos agrícolas e recursos
naturais.
O Brasil viu vantagens neste tipo de parceria: primeiro conseguiria ter uma
alternativa mais barata para construir e lançar os seus próprios satélites. A China
também beneficiou deste projeto pelas mesmas razões: ou seja, a possibilidade de fazer
mais com o mesmo dinheiro. Note-se que a repartição para retorno do investimento, e
segundo o website do CBERS é de 30% para o Brasil, 70% para a China.
Atualmente, o projeto CBERS tem no total três satélites operacionais, com
acordo para lançamento de mais dois satélites durante 2013. O CBERS é considerado
como sendo uma parte importante da constelação de satélites para observação terrestre,
202 Câmara dos Deputados, “A política espacial brasileira”, disponível em: http://www2.camara.leg.br/a-
camara/altosestudos/arquivos/politica-espacial/a-politica-espacial-brasileira, última vez acedido em
29/10/2012, p24 203
CBERS, disponível em: http://www.cbers.inpe.br/, acedido última vez a: 29/10/2012
69
comparável com o LANDSAT dos EUA, o SPOT da França ou o ResourceSat da
Índia.204
Mais recentemente, a China deu início a relações bilaterais nesta área também
com a Venezuela, com quem quis estabelecer relações privilegiadas quer a nível de
assuntos de segurança nacional mas também sobre as importações de petróleo. Na
verdade a Venezuela é um país de esquerda e antiamericano na região. O Presidente
Hugo Chávez afirmou que a Venezuela tem cerca de 100 técnicos espaciais a receberem
formação completa na China205
, demonstrando assim a troca de know-how consistente
com o que será algo muito para além de uma mera parceria comercial. Em Outubro
2008, a China lançou o primeiro satélite venezuelano e, em Setembro 2012, o segundo
satélite.206
Hugo Chávez não quer ficar só por aqui. Pretende investir mais ainda num
conjunto de tecnologias espaciais, incluindo: acesso à telemedicina e teleducação a
áreas remotas do país; acesso a telecomunicações móveis a zonas na Venezuela onde
apenas há comunicações por linhas terrestres e cujo custo é elevado. Após as
negociações falhadas com o programa de recolha de imagens israelita, a Venezuela
procurou novamente a China para que possa também ter acesso à capacidade de recolha
de imagens. Apesar de não ser ainda bem conhecido esta negociação, rumores indicam
que a China irá lançar em 2013 um satélite de observação terrestre para a Venezuela.207
A China também deslocou técnicos para ministrar formação a países como a
Bolívia e Equador por causa da aquisição de equipamento militar e espacial por esses
204 CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international
relations, pp. 57-58, ibid 205
CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international
relations, pp. 58-59, ibid 206
“Segundo satélite venezuelano é lançado com sucesso da China”, disponível em:
http://noticias.terra.com.br/ciencia/noticias/0,,OI6189306-EI301,00-
Segundo+satelite+venezuelano+e+lancado+com+sucesso+da+China.html acedido última vez em
29/10/2012 207
CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international
relations, pp. 59-60, ibid
70
países. No caso da Bolívia, a deslocação dos técnicos chineses deve-se ao satélite Tupac
Katari que a China ajudará a lançar em 2014.208
A presença chinesa na América do Sul tem-se revestido de diversas formas:
onda de aquisições de empresas nos sectores de extração de recursos naturais para
garantir o controlo em áreas chave, a banca chinesa dá a alavancagem a pequenas
empresas provincianas a projetarem-se no mercado internacional e até o turismo chinês
está a beneficiar desta nova onda de prosperidade. O que está a acontecer é que a China
com base nas trocas politicas, culturais e industriais com estes países está a aumentar
significativamente a sua presença na região. Estas interações mudam radicalmente a
forma como a China é vista e como se relaciona com esta região.209
4. China versus África
A China desenhou, construiu e lançou um satélite para a Nigéria em 2007. Este
mesmo satélite, por um problema nos painéis solares do satélite acabou por deixar de
funcionar. O projeto, que custou cerca de 256 milhões de dólares, deveria melhorar as
comunicações na Nigéria. Contudo, o resultado final foi uma subida das vozes críticas a
este projeto pelas ligações de comunicações pouco fiáveis e das mais caras na região.210
Na realidade, a postura da China neste negócio revela tanto a utilização de soft
power como um dom natural de diplomacia e a forma como a China explora as suas
capacidades espaciais como ferramenta diplomática. A China doou generosamente
como contrapartida um pacote financeiro generoso à Nigéria para este projeto, tendo
como garantia as reservas de petróleo nigerianas. O lançamento do satélite foi recebido
e comentado pelas autoridades chinesas como sendo “um passo da Nigéria para o
208ELLIS, Even, (2012) “The expanding chinese footprint in Latin America – New Challenges for China
and Dilemmas for the US”, IFRI, disponível em: http://www.ifri.org/?page=contribution-detail&id=7014,
última vez acedido em: 29/10/2012, pp. 7-8 209
ELLIS, Even, (2012), op.cit. pp. 4-5 210
DAVENAC, Raoul et, NARDON, Laurence, (2009) “China and the Telecomunication Satellites of
Emerging Countries”, IFRI, disponível em: http://www.ifri.org/?page=contribution-
detail&id=3457&id_provenance=97, última vez acedido em: 22/10/2012
71
mundo digital dominado pelo Ocidente” enquanto a Nigéria considerou importante
continuar a trabalhar com os parceiros chineses para o lançamento de mais dois
satélites.211
5. China versus Ásia
Há questões que se levantam relacionadas com o crescimento e afirmação
chinesa na Ásia. A principal parece ser: como irão reagir os outros países asiáticos à
afirmação da China como potencial regional e mundial na área espacial? Irão responder
de uma forma agressiva ou ficarão calmos na sombra? Para nações mais pobres e com
pouca ou nenhuma tecnologia desenvolvida, parece mais vantajoso cooperar com a
China naquilo que serão os seus objetivos espaciais. Ou seja, as limitações financeiras
terão um papel preponderante naquilo que será a cooperação espacial asiática.212
Contudo, apesar da promissora cooperação espacial asiática, a Índia surge cada
vez mais no panorama e, tendo em conta os avanços mais recentes no seu programa
espacial, como um rival de peso à liderança chinesa. Surpreendentemente, e apesar de a
Índia ter armamento nuclear desde 1974, o seu programa espacial sempre teve
orientações pacíficas. Ao contrário da China, dos EUA e até da Rússia, os veículos de
lançamento indianos só tiveram origem em sistemas de propulsão civis e não em
mísseis balísticos convertidos em lançadores. Até muito recentemente, a Índia não tinha
qualquer tipo de programa espacial militar tendo durante décadas dedicado o seu
programa espacial a satélites de observação remota, comunicações e meteorologia para
servir a economia indiana, e a vasta e dispersa população.
Porém, o crescimento da China e a aproximação e cooperação com os EUA, e
o esforço indiano de colocar alguma ênfase das suas capacidades militares, colocaram
os holofotes sob o programa espacial indiano. Assim, já em pleno século XXI, a Índia
211 CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international
relations, pp. 62-63, ibid 212
CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international
relations, pp. 63-65, ibid
72
lançou um avançado sistema de navegação, abriu um comando militar espacial, e falou
abertamente sobre capacidades cinéticas antissatélite e possíveis armas a laser.
Os esforços espaciais da China, nomeadamente a tentativa de chegar ao
objetivo primeiro que todos os outros, colocou pressão na Índia para que evolua
rapidamente nas suas capacidades espaciais. De facto, a Índia tem colocado bastantes
esforços na exploração lunar, onde tem recolhido prestígio e admiração pela sua
pesquisa. Contudo, começa a existir alguma discussão interna sobre se a Índia deverá
focar-se e de quais serão os parâmetros para a exploração humana do espaço. Isto revela
que o tradicional foco da Índia no espaço poderá mudar nos próximos anos,
principalmente se quer competir com os seus rivais regionais, promover a sua segurança
nacional, e estabelecer uma reputação internacional assente nos seus progressos
espaciais.213
Algumas organizações internacionais relacionadas com a área científica,
tecnológica e espacial, como a UNESCAP e a CSSTEAP, estão localizadas na Índia, o
que faz com que beneficie dos privilégios de acolher estas instituições internacionais. A
Índia tem também sido procurada cada vez mais na área de lançamentos comerciais.
Além disso, o sucesso do programa espacial indiano demonstra os avanços tecnológicos
de todo o programa espacial indiano.214
Apesar de a Índia ter ratificado a maioria dos tratados internacionais na área do
Espaço, há questões que começam a surgir que colocam em causa a continuidade de
exploração espacial apenas com fins pacíficos. Na verdade, os analistas indianos
identificam a China como sendo a maior ameaça nesta área. Quando a Índia considera
que os avanços da China no campo militar assentes em tecnologia espacial e o seu
impacto na Ásia e que tendo em conta numa situação volátil o desequilíbrio regional
servirá apenas para aumentar as tensões regionais, poderá despoletar uma corrida à
militarização do espaço.215
213 MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 109-111
214 CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power in international
relations, pp. 63-64, ibid 215
MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 128
73
Também o Japão é uma outra nação claramente com preocupações em relação
ao poderio espacial chinês. O Japão tem o necessário para competir tecnologicamente
no espaço mas tem que definir a sua estrutura organizacional para gestão das atividades
espaciais e tem um orçamento que é cerca de 25% do orçamento da China ou dos EUA.
O Japão tem potencial para um programa espacial que abarque desde a exploração
humana do espaço, à implementação de uma vasta gama de serviços comerciais e ainda
ativos espaciais militares. Mas terá também que enfrentar uma luta política interna para
que o programa espacial seja uma prioridade dentro das prioridades nacionais nipónicas.
Isto inclui constrangimentos orçamentais, constituição pacifista que poderá levantar
questões legais, e questões relacionadas com os benefícios que a estreita cooperação
com os EUA poderá trazer. Contudo, os avanços chineses em matéria militar e
crescentes capacidades espaciais levantam sérias preocupações e desafia os dirigentes
japoneses a tomarem decisões que inicialmente pareceriam improváveis. Também o
sector espacial privado do Japão tem feito pressão na promoção dos interesses
espaciais.216
As motivações espaciais japonesas incluem aplicações tanto civis como
aplicações relacionadas com segurança. Na verdade, a autonomia e a cooperação
internacional sempre foram os pilares centrais da política espacial japonesa, apesar
destes objetivos historicamente por vezes se contradizerem. A cooperação próxima com
os EUA tem trazido a ambos benefícios incalculáveis. O Japão sempre pretendeu ser
pelo menos uma potência regional na exploração espacial, evidenciada pelo sue apoio à
Agência Regional Espacial Ásia-Pacifico. Mas o crescimento da China e os anos
seguintes a 1945 trouxeram alguns dissabores ao Japão, nomeadamente nos esforços
chineses em convencer os seus vizinhos das suas intenções pacíficas, trouxe o desafio
acrescido ao Japão em ter uma presença mais assertiva no espaço.217
As atividades já desenvolvidas pelo Japão na área espacial dão nota claramente
da utilização do espaço como soft power, numa região dominada por conflitos regionais
216 MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 43-44
217 MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 45
74
(caso por exemplo da disputa pelas Ilhas Senkaku pela China e Japão218
), que espera
utilizar os seus feitos únicos e competências técnicas adquiridas como forma de
aumentar a sua influência política na região e no mundo. Este esforço nota-se na
preocupação em ter alcançado feitos que promovam o prestígio tecnológico japonês, por
exemplo, as sondas lunares Kaguya.219
É claro também a estratégia de aumentar o seu
soft power e influência na região asiática através de protocolos de cooperação cada vez
mais significativos, não só com os EUA, mas também com a Índia e com a Coreia do
Sul, e até usar estes como forma de contrabalançar o poder chinês na região.220
218“Dois navios-patrulha chineses entram em águas japonesas“, Diário de Notícias, disponível em:
http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=2787151&seccao=%C1sia última vez
acedido em 30/10/2012
219 MOLTZ, James Clay (2011), ibid pp. 65-67
220 MOLTZ, James Clay (2011), ibid p. 68
75
Conclusão
Este ensaio debruçou-se sobre o tema ”Influência da exploração espacial na
política internacional”. No desenvolvimento do seu estudo utilizou-se o método de
investigação em Ciências Sociais proposto por Luc Van Champenhoudt e Raymond
Quivy. Para a sua aplicação foi necessário conceber, inicialmente, uma pergunta de
partida que se ambiciona ter sido respondida ao longo do corpo deste ensaio: de que
forma a exploração espacial influencia e é usada na política internacional?
Das leituras e análise efetuadas, depreende-se que as Relações Internacionais
enfrentaram, enfrentam e enfrentarão um desafio colocado pelos avanços tecnológicos
adjacentes da exploração espacial, a vários níveis: politico, comercial, económico,
militar e científico.
Iniciou-se este estudo com uma abordagem aos avanços iniciais da era espacial
na era moderna. Os avanços tecnológicos introduzidos pelo lançamento do Sputnik
mudaram a forma de ver o mundo. A Guerra Fria e os eventos relatados na primeira
parte deste estudo, demonstram claramente como o uso da exploração espacial como
ferramenta de fazer política. É o caso da Crise dos Mísseis de Cuba e dos Tratados
SALT em que a tecnologia espacial teve um papel vital nas negociações.
A chegada do Homem à Lua e a construção de estações espaciais que
garantissem a presença humana no espaço em permanência mostrou de uma forma clara
e bastante representativa do uso da exploração espacial enquanto fonte de prestígio
perante os outros Estados. De facto, sendo o Espaço acessível apenas a uma elite,
cumpre-se um requisito essencial em qualquer campanha de marketing para projecção
de uma imagem e obtenção da admiração por terceiros: a exclusividade!
Com o fim da Guerra Fria, o investimento na exploração espacial sofre um
revés. A Rússia não consegue acompanhar financeiramente o investimento americano e
os EUA começam a ter mais dificuldade em justificar as somas avultadas de
investimento nesta área, sobretudo quando com os acidentes com os vai-e-vem
começam a implicar perdas de vidas humanas.
Com a mudança no paradigma vigente nas Relações Internacionais e com a
entrada de novos atores no cenário da exploração espacial, verifica-se que até a
exploração espacial deixa de ser bipolar para ser multipolar. Deixa de ser apenas uma
76
corrida para serem várias: a nível mundial e a nível regional. A entrada de privados na
exploração espacial traz também novos contornos. Contudo, há algo que continua a ser
comum: a visão de que o Espaço é uma fronteira a conquistar e quem conseguir fazer
mais e chegar mais longe dominará a tecnologia e reunirá a admiração dos restantes
intervenientes.
Como demonstrado ao longo do estudo, a ocupação do Espaço, ou o seu
domínio, é de vital importância para as super-potências ou para quem aspira a ser
considerado uma super-potência, sendo certo e demonstrado, que todo o projeto espacial
tem uma dimensão geopolítica subjacente. Nos dias que correm, possuir tecnologia
espacial, saber tratar a informação recolhida e aplicá-la, quer seja em cooperação ou
não, representa uma nova fonte de poder, vital quando se aposta em meios pacíficos de
influência dos outros atores internacionais.
77
Bibliografia
Monografias
ALDRICH, Richard J, (2002), “The hidden hand – Britain, America and Cold
War Secret Intelligence”, John Murray, London
ANDREW, Christopher (1996), “For the President Eyes Only – Secret
Intelligence and the American Presidency from Washington to Bush”, Harper
Collins Publishers, London
ANDREW, Christopher e MITROKHIN, Vasili, (2000), “The Mitrokhin
Archive – The KGB in Europe and the West”, Penguin Books, London
BURROWS, W. E. (1986). “Deep black: space espionage and national security”,
New York, Random House.
BURROWS, William E. (1998) “This new ocean – the story of the first space
age”, New York, Random House
CADBURY, Deborah, (2005) “Space Race – The untold story of two rivals &
their struggle for the Moon”, Four Estate, London
CHAMBERS, Rob, “China’s Space Program: a new tool for PRC - Soft power
in international relations”, tese de Mestrado, disponível em
http://edocs.nps.edu/npspubs/scholarly/theses/2009/Mar/09Mar_Chambers.pdf
DAY, D. A., J. M. LOGSDON, et al. (1998), “Eye in the sky : the story of the
CORONA spy satellites” Washington, D.C. ; London, Smithsonian Institution
Press
DICKSON, Paul, (2001),“Sputnik – The Shock of the Century”, Walker, New
York
DOUGHERTY, James E e PFAKTZFRAGG, Robert L, (2003) “Relações
Internacionais – As teorias em confronto”, Gradiva
DROZ, Bernard e ROWLEY, Anthony, (2000), “História do Século XX –
Expansão e Independências (1950-1973)”, Lisboa, Publicações D. Quixote
DUNBABIN, J. P. D. (2008). “The Cold War : the great powers and their
allies”, Harlow, England ; New York, Pearson Education
FRIEDMAN, Norman (1991), “Desert Victory – The War for Kuwait”, Naval
Institute Press, Maryland
78
GADDIS, John Lewis, (1997), “We now know – rethinking Cold War History”,
Oxford, New York
GRAHAM, T. and HANSEN, K. A. (2007). “Spy satellites and other
intelligence technologies that changed history”, Seattle, Wash; London,
University of Washington Press.
GRAY, Colin S., (1999), “Modern Strategy”, Oxford, Oxford University Press,
New York
HARVEY, Brian (2004). China's space program: from conception to manned
spaceflight. London; Springer.
JONHSON-FREESE, Joan, (2007) “Space as a strategic asset”, Columbia
University Press, E-Book, versão Kindle.
JONHSON-FREESE, Joan e HANDBERG, Roger, (1997), “Space the dormant
frontier – Changing the paradigma for the 21st century”, London, Praeger.
KISSINGER, Henry, (1996) “Diplomacia”, Gradiva, Lisboa
KULACKI , Gregory e LEWIS, Jeffrey G. (2009) “A place for One’s Mat:
China Space Program 1956 to 2003”, Cambridge, American Academy of Arts
and Sciences, (disponível em: www.amacad.org)
LAMBERT, Benjamim S, (1999), “Air Power, Space Power and Geography”,
Geopolitcs – Geography and Strategy, ed. Colin Gray e Geoffrey Sloan, Frank
Cass, New York
LAMBRIGHT, W. Henry (ed), (2003), “Space policy in the 21st century”, John
Hopkins University Press
LEVERINGTON, David, (2001), “New Cosmic Horizons – Space Astronomy
from the V-2 to the Hubble Space Telescope”, Cambridge University Press
LI, Mingjiang (ed), (2009), “Soft Power: China’s Emerging Strategy in
International Politics”, Lexington Books, New York, E-Book, versão Kindle
MCCURDY, Howard E. (1997), “Space and the American Imagination”,
Smithsonian Institution Press, Washington,
MCDOUGALL, Walter A., (1997), “The Heavens and the Earth – A Political History
of the Space Age”, John Hopkins University Press, London
79
MOLTZ, James Clay (2011), “Asias’s Space Race: National Motivations,
Regional Rivaliries and International Risks”, Columbia Press University, New
York, E-book, versão Kindle.
MURPHY, D. (2003), “Cold War 1945-1991” London, Collins Educational
NYE, Joseph S. Jr (2002), “Compreender os Conflitos Internacionais – Uma
Introdução à Teoria e à História”, Gradiva, Lisboa
NYE, Joseph S. Jr (2004), Soft Power: The Means To Success In World
Politics”, Public Affairs, Cambridge, E-book, versão Kindle
RICHELSON, Jeffrey T., (1995), “A Century of Spies – Intelligence in the
Twentieth Century”, Oxford Press, New York
SHEEHAN, Michael, (2007), “The international politics of space”, Routledge,
New York
SANTOS, Loureiro dos, (2000) “Reflexões sobre Estratégia – Temas de
Segurança e Defesa”, Publicações Europa América, Mem Martins
TAUBMAN, Philip, (2003) “Secret Empire – Eisenhower, the CIA, and the
hidden story of America’s Space Espionage”, Simon & Schuster, New York
Artigos
CNN. “Cold War Technology”, disponível em
http://www.cnn.com/SPECIALS/cold.war/experience/technology/, acedido em
16/10/2005
DAVENAC, Raoul et, NARDON, Laurence, (2009) “China and the
Telecomunication Satellites of Emerging Countries”, IFRI, disponível em:
http://www.ifri.org/?page=contribution-detail&id=3457&id_provenance=97,
última vez acedido em: 22/10/2012
DEGRASSE TYSON, Neil, (2012) “The Case for Space – Why we should keep
reaching for the stars”, Foreign Affairs, Abril 2012, Kindle Edition
ELLIS, Even, (2012) “The expanding chinese footprint in Latin America – New
Challenges for China and Dilemmas for the US”, IFRI, disponível em:
http://www.ifri.org/?page=contribution-detail&id=7014, última vez acedido em:
29/10/2012
JOHNSON-FREESE, Joan (2006), “The emerging China-EU space partnership:
a geotechnological balancer”, Space Policy n.º 22, Elsivier
80
JOHNSON-FREESE, Joan (2007 - 2), “China’s Space Ambitions”, disponível
em: http://www.ifri.org/downloads/China_Space_Johnson_Freese.pdf, acedido
última vez em 21/10/2012
JOHNSON-FREESE, Joan (2012), “Wil China overtake America in Space”,
disponível em: http://edition.cnn.com/2012/06/20/opinion/freese-china-
space/index.html, acedido última vez em 29/10/2012
KENNEDY, Bruce, “War Games – Soviet, fearing Western Attack, prepared for
worst in ‘83”, disponível em
http://www.militaryphotos.net/forums/showthread.php?36104-Soviets-prepared-
for-worst-in-1983 acedido em 11/05/2012
NARDON, Laurence et MESSERLIN, Pierre, (2004) “Les États-Unis face au
défi spatial chinois”, disponível em:
http://www.ifri.org/files/CFE/US_defi_spatial_chinois.pdf, última vez acedido a
29/10/2012
NARDON, Laurence, (2007), “Cold War Space Policy and Observation”
Satellites, Astropolitics, vol 5, 2007
PBS, “Frontline: the Gulf War”,
http://www.pbs.org/wgbh/pages/frontline/gulf/weapons/gps.html, acedido em
11/05/2012
POLLPETER, Kevin, “Building the future china progress in space technology
during the tenth 5 year plan and the US response” , disponível em
http://www.strategicstudiesinstitute.army.mil/pdffiles/pub852.pdf, última vez
acedido a 29/10/2012, Março 2008
RATHGEBER, Wolfgang (2007). China’s posture in space: implications for
Europe. ESPI. Relatório nº 3. Junho de 2007. Disponível em:
http://www.espi.or.at/images/stories/dokumente/studies/espi_china_report_rev4-
1_wf.pdf , acedido em 02/11/2012
SABATIER, Vincent e FAITH, G. Ryan, “Space power: a crowded field”,
World Politics review features, Maio 17, 2011.
Câmara dos Deputados, “A política espacial brasileira”, (2010) disponível em:
http://www2.camara.leg.br/a-camara/altosestudos/arquivos/politica-espacial/a-
politica-espacial-brasileira, última vez acedido em 29/10/2012
CBERS, disponível em: http://www.cbers.inpe.br/, acedido última vez a:
29/10/2012
China Space activities 2011”, disponível em
http://images.spaceref.com/china/ChinaSpaceActivitiesin2011.pdf
81
Pew Global Attitudes Project, U.S. Image Up Slightly, But Still Negative:
American Character Gets Mixed Reviews, Washington, D.C.: Pew Global
Attitudes Project, 2005, disponível em:
http://www.pewglobal.org/files/pdf/247.pdf