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Informativo 581-STJ (14/04 a 28/04/2016) Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante Julgado não comentado por ter menor relevância para concursos públicos: REsp 1.304.529-SC. ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO RESPONSABILIDADE CIVIL Indenização por danos morais a anistiado político. SERVIDORES PÚBLICOS Jornada de trabalho diferenciada para servidores da União que trabalhem com substâncias radioativas. PROCESSO ADMINISTRATIVO Prazo para o TCU exigir comprovação de regular aplicação de verbas federais por meio de tomada de contas especial. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Inaplicabilidade das sanções por ato de improbidade administrativa abaixo do mínimo legal. DIREITO CIVIL FIANÇA Termo inicial do prazo para herdeiro pleitear anulação de fiança. REGIME DE BENS Comunhão parcial e inexistência de meação de valores do FGTS depositados antes do casamento. PATERNIDADE Reconhecimento de paternidade socioafetiva post mortem. DIREITO DO CONSUMIDOR PROTEÇÃO CONTRATUAL Necessidade de filiação à entidade aberta de previdência para contratar empréstimo. PLANO DE SAÚDE Equiparação de companheiro a cônjuge para fins de cobertura de cláusula de remissão de plano de saúde. DIREITO EMPRESARIAL DUPLICATA Emissão de duplicata com base em mais de uma nota fiscal.

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Informativo 581-STJ (14/04 a 28/04/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante Julgado não comentado por ter menor relevância para concursos públicos: REsp 1.304.529-SC.

ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO

RESPONSABILIDADE CIVIL Indenização por danos morais a anistiado político. SERVIDORES PÚBLICOS Jornada de trabalho diferenciada para servidores da União que trabalhem com substâncias radioativas. PROCESSO ADMINISTRATIVO Prazo para o TCU exigir comprovação de regular aplicação de verbas federais por meio de tomada de contas

especial. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Inaplicabilidade das sanções por ato de improbidade administrativa abaixo do mínimo legal.

DIREITO CIVIL

FIANÇA Termo inicial do prazo para herdeiro pleitear anulação de fiança. REGIME DE BENS Comunhão parcial e inexistência de meação de valores do FGTS depositados antes do casamento. PATERNIDADE Reconhecimento de paternidade socioafetiva post mortem.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PROTEÇÃO CONTRATUAL Necessidade de filiação à entidade aberta de previdência para contratar empréstimo. PLANO DE SAÚDE Equiparação de companheiro a cônjuge para fins de cobertura de cláusula de remissão de plano de saúde.

DIREITO EMPRESARIAL

DUPLICATA Emissão de duplicata com base em mais de uma nota fiscal.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

COMPETÊNCIA Súmula 570-STJ. AÇÃO ANULATÓRIA Ação anulatória proposta por particular com o objetivo de anular acordo firmado com a Fazenda Pública e homologado judicialmente

DIREITO PENAL

CÓDIGO DE TRÂNSITO O fato de o condutor estar com a CNH vencida não se enquadra na causa de aumento do inciso I do § 1º do art.

302 do CTB. ESTATUTO DO DESARMAMENTO Porte de arma de fogo por vigia após o horário de expediente.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

SIGILO BANCÁRIO Entrega espontânea de documentos por ex-companheira de investigado e sigilo bancário. EXECUÇÃO PENAL Execução provisória de pena em ação penal originária. Competência para expedição de guia de recolhimento de réu em execução provisória de pena.

DIREITO TRIBUTÁRIO

PIS/COFINS Inclusão do ISSQN no conceito de receita ou faturamento para fins de incidência de PIS/COFINS. DIREITO ADUANEIRO Súmula 569-STJ.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

APOSENTADORIA RURAL Extinção de processo por ausência de início de prova material de atividade rural e possibilidade de ajuizamento de

nova demanda. DIREITO DO TRABALHO

FGTS Súmula 571-STJ.

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DIREITO ADMINISTRATIVO

RESPONSABILIDADE CIVIL Indenização por danos morais a anistiado político

O anistiado político que obteve, na via administrativa, a reparação econômica prevista na Lei nº 10.559/2002 (Lei de Anistia) não está impedido de pleitear, na esfera judicial, indenização por danos morais pelo mesmo episódio político. Inexiste vedação para a acumulação da reparação econômica com indenização por danos morais, porquanto se tratam de verbas indenizatórias com fundamentos e finalidades diversas: aquela visa à recomposição patrimonial (danos emergentes e lucros cessantes), ao passo que esta tem por escopo a tutela da integridade moral, expressão dos direitos da personalidade.

Nas hipóteses de condenação imposta à Fazenda Pública, como regra geral, a atualização monetária e a compensação da mora devem observar os critérios previstos no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.485.260-PR, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 5/4/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: João foi vítima de intensa perseguição política praticada pelo governo federal durante a época da ditadura militar instalada no Brasil em 1964. O art. 8º do ADCT concede anistia política a pessoas que foram prejudicadas por perseguições decorrentes de motivação política no período de 18/09/1946 até a data de promulgação da CF/88. Há previsão também de que o anistiado receba uma reparação de natureza econômica, a ser paga pela União, em alguns casos nos quais fique demonstrado que ele sofreu prejuízos em sua atividade laboral. A Lei nº 10.559/2002 regulamentou o art. 8º do ADCT e a concessão dessa reparação econômica para os anistiados. Veja:

Art. 1º O Regime do Anistiado Político compreende os seguintes direitos: I - declaração da condição de anistiado político; II - reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação única ou em prestação mensal, permanente e continuada, asseguradas a readmissão ou a promoção na inatividade, nas condições estabelecidas no caput e nos §§ 1º e 5º do art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; (...) Art. 3º A reparação econômica de que trata o inciso II do art. 1º desta Lei, nas condições estabelecidas no caput do art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, correrá à conta do Tesouro Nacional. (...) Art. 4º A reparação econômica em prestação única consistirá no pagamento de trinta salários mínimos por ano de punição e será devida aos anistiados políticos que não puderem comprovar vínculos com a atividade laboral. (...) Art. 5º A reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada, nos termos do art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, será assegurada aos anistiados políticos que comprovarem vínculos com a atividade laboral, à exceção dos que optarem por receber em prestação única. (...) Art. 6º O valor da prestação mensal, permanente e continuada, será igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se na ativa estivesse, (...)

João requereu e recebeu, administrativamente, a reparação econômica prevista na Lei nº 10.559/2002 (Lei de Anistia). Ocorre que depois disso, já em 2014, ele ajuizou ação de compensação por danos morais contra a União pedindo indenização extrapatrimonial pelos sofrimentos que passou neste período.

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A pretensão em tela está prescrita? NÃO. As ações de indenização por danos morais decorrentes de perseguição, tortura e prisão, por motivos políticos, durante o regime militar, são imprescritíveis. Para esses casos, não se aplica o prazo prescricional de 5 anos previsto no art. 1º do Decreto 20.910/1932. STJ. 2ª Turma. REsp 1.374.376-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 25/6/2013 (Info 523). O STJ concluiu que tais demandas são imprescritíveis porque se referem a um período (regime militar) em que a ordem jurídica foi desconsiderada, com legislação de exceção, tendo havido, sem dúvida, incontáveis abusos e violações dos direitos fundamentais, mormente do direito à dignidade da pessoa humana (AgRg no Ag 1391062/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 09/08/2011). É possível que o anistiado político pleiteie judicialmente indenização por danos morais mesmo já tendo recebido administrativamente a reparação econômica da Lei nº 10.559/2002? SIM. O anistiado político que obteve, na via administrativa, a reparação econômica prevista na Lei nº 10.559/2002 (Lei de Anistia) não está impedido de pleitear, na esfera judicial, indenização por danos morais pelo mesmo episódio político. STJ. 1ª Turma. REsp 1.485.260-PR, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 5/4/2016 (Info 581). A Lei nº 10.559/2002, em seu art. 16, prevê o seguinte:

Art. 16. Os direitos expressos nesta Lei não excluem os conferidos por outras normas legais ou constitucionais, vedada a acumulação de quaisquer pagamentos ou benefícios ou indenização com o mesmo fundamento, facultando-se a opção mais favorável.

Esse dispositivo pode dar a impressão de que seria proibida a acumulação da reparação econômica com a indenização por danos morais. Contudo, não foi esta a interpretação dada pelo STJ. Segundo entendeu o Tribunal, o art. 16 é um comando dirigido, antes e unicamente, à Administração Pública, e não à jurisdição. Em outras palavras, esse dispositivo proíbe que o Poder Público pague, administrativamente, a reparação econômica cumulada com outros pagamentos, benefícios ou indenização. Além disso, a reparação econômica prevista na Lei nº 10.559/2002 não tem por objetivo indenizar danos morais. O art. 8º do ADCT determina que seja paga reparação econômica para aquelas pessoas que sofreram prejuízos na sua esfera profissional e, por consequência, patrimonial. A Lei nº 10.559/2002, ao regulamentar o art. 8º do ADCT, restringiu-se a estipular os direitos profissionais do anistiado político e suas repercussões econômicas. Analisando os arts. 4º e 5º da Lei fica ainda mais claro que essa reparação econômica tem natureza patrimonial e se destina a compensar o anistiado pelo fato de ele não mais ter podido exercer suas atividades laborais. Desse modo, o recebimento da reparação econômica de que trata a Lei nº 10.559/2002 não exclui, por si só, o direito de o anistiado buscar na via judicial, em ação autônoma e distinta, a reparação dos danos morais que tenha sofrido em decorrência da mesma perseguição política geradora da anterior reparação administrativa (art. 5º, V e X, da CF/88), pois distintos se revelam os fundamentos que amparam cada uma dessas situações.

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Suponha que o TRF, em sede de apelação, condenou a União ao pagamento da indenização por danos morais fixando o termo inicial dos juros de mora e da correção monetária como sendo a data do evento danoso e determinando a aplicação do índice conhecido como INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor, do IBGE). Agiu corretamente o Tribunal neste ponto? NÃO. Na condenação imposta à Fazenda Pública a título de danos morais decorrentes de perseguição política durante a ditadura militar instalada no Brasil após 1964, para fins de atualização monetária e compensação da mora, haverá a incidência dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança a partir da data do arbitramento da indenização. Isso porque, na espécie, a atualização monetária e a compensação da mora deverão observar os parâmetros estipulados no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97. STJ. 1ª Turma. REsp 1.485.260-PR, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 5/4/2016 (Info 581). Portanto, os juros moratórios e a correção monetária não terão como termo inicial a data do evento danoso e o índice de correção não poderá ser o INPC (como muitos decidem). Como regra geral nas condenações pecuniárias impostas à Fazenda Pública, a atualização monetária e a compensação da mora deverão observar os parâmetros estipulados no art. 1ºF da Lei nº 9.494/97:

Art. 1º-F. Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança. (Redação dada pela Lei nº 11.960/2009)

A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento (Súmula 362 do STJ).

SERVIDORES PÚBLICOS Jornada de trabalho diferenciada para servidores da União que trabalhem com substâncias radioativas

Apenas concursos federais!

Independentemente da categoria profissional, todos os servidores da União, civis e militares, e os empregados de entidades paraestatais de natureza autárquica que operam, de forma habitual, diretamente com raios X e substâncias radioativas, próximo às fontes de irradiação, têm o direito à redução da duração máxima da jornada de trabalho de 40 para 24 horas semanais prevista no art. 1º da Lei nº 1.234/50.

Vale ressaltar que a Lei nº 1.234/50 não foi revogada pela Lei nº 8.112/90, pois esta mesma excepciona as hipóteses estabelecidas em leis especiais.

STJ. 2ª Turma. AgInt no REsp 1.569.119-SP, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 7/4/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: João é servidor público federal concursado e trabalha no IPEN (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares), uma autarquia responsável por realizar pesquisas científicas e tecnológicas na área da atividade nuclear. O referido servidor exerce suas atividades na "gerência de radioproteção", sendo responsável pelo setor de "rejeitos radioativos", tem como atividades diárias monitorar, por meio de aparelhos móveis, os níveis de radiação nas áreas restritas, isto é, onde trabalham os funcionários do IPEN, o fechamento de sacos

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contendo rejeitos radioativos, a monitoração desses rejeitos e, ainda, a descontaminação de pessoas ou coisas, quando verificada tal ocorrência. João trabalha 8h por dia, em uma jornada de 40h semanais. Determinado dia, um advogado amigo de João comentou que ele, por ser servidor público federal que trabalha com atividade radioativa deveria ter uma jornada semanal de, no máximo, 24 horas. A informação dada pelo amigo de João é correta? SIM. Existe uma Lei federal que garante este direito. Trata-se da Lei nº 1.234/50, que, apesar de antiga, continua em vigor. Confira o que ela prevê:

Art. 1º Todos os servidores da União, civis e militares, e os empregados de entidades paraestatais de natureza autárquica, que operam diretamente com Raios X e substâncias radioativas, próximo às fontes de irradiação, terão direito a: a) regime máximo de vinte e quatro horas semanais de trabalho; b) férias de vinte dias consecutivos, por semestre de atividade profissional, não acumuláveis; c) gratificação adicional de 40% (quarenta por cento) do vencimento.

A União defende que esse art. 1º somente se aplica para servidores que trabalham na área da saúde, o que não é o caso de João. Este argumento é aceito pela jurisprudência? NÃO. A alegação de que a jornada reduzida deve ser restrita a uma determinada categoria profissional não é aceita pela jurisprudência. O objetivo da lei é o de proteger a saúde dos servidores que operam diretamente com Raios X e substâncias radioativas, de forma habitual e permanente, independentemente da qualificação profissional. Essa Lei nº 1.234/50 foi revogada pela Lei nº 8.112/90? NÃO. O art. 19 da Lei nº 8.112/90 prevê que "os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente." Contudo, o § 2º do mesmo art. 19 afirma que essa regra acima explicada não se aplica para servidores públicos federais que são regidos por legislação específica. Confira: "O disposto neste artigo não se aplica a duração de trabalho estabelecida em leis especiais". Os servidores federais que trabalham com Raios X e substâncias radioativas estão regidos pela Lei nº 1.234/50, razão pela qual estão abrangidos pela ressalva feita pelo § 2º do art. 19 da Lei nº 8.112/90. Conclui-se, portanto, que a Lei nº 1.234/50 não foi revogada pela Lei nº 8.112/90, pois esta mesma excepciona as hipóteses estabelecidas em leis especiais (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1117692/RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 17/09/2015). Resumindo: Independentemente da categoria profissional, todos os servidores da União, civis e militares, e os empregados de entidades paraestatais de natureza autárquica que operam, de forma habitual, diretamente com raios X e substâncias radioativas, próximo às fontes de irradiação, têm o direito à redução da duração máxima da jornada de trabalho de 40 para 24 horas semanais prevista no art. 1º da Lei nº 1.234/50. Vale ressaltar que a Lei nº 1.234/50 não foi revogada pela Lei nº 8.112/90, pois esta mesma excepciona as hipóteses estabelecidas em leis especiais. STJ. 2ª Turma. AgInt no REsp 1.569.119-SP, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 7/4/2016 (Info 581).

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PROCESSO ADMINISTRATIVO Prazo para o TCU exigir comprovação de regular aplicação de verbas federais

por meio de tomada de contas especial

É de cinco anos o prazo para o TCU, por meio de tomada de contas especial (Lei nº 8.443/92), exigir do ex-gestor público municipal a comprovação da regular aplicação de verbas federais repassadas ao respectivo Município.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.480.350-RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 5/4/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: Em 2000, o Município "XX" celebrou convênio com o Ministério da Saúde por meio do qual recebeu determinada verba federal com o objetivo de aplicar a quantia na saúde local. Em 2012, o Tribunal de Contas da União instaurou procedimento de tomada de contas especial para fiscalizar o convênio e, ao final, concluiu que João, prefeito do Município à época, responsável pelo pacto, não comprovou que destinou corretamente as verbas federais, razão pela qual aplicou multa ao administrador, além de determinar que ele faça o ressarcimento da verba pública. O administrador ingressou com ação judicial a fim de anular o acórdão do TCU alegando que já havia passado o prazo para que o Tribunal realizasse a tomada de contas. A tese do administrador público foi aceita pelo STJ? O TCU possui um prazo máximo para instaurar tomada de contas especial contra o administrador público exigindo dele comprovação da regular aplicação das verbas federais repassadas? SIM. É de cinco anos o prazo para o TCU, por meio de tomada de contas especial (Lei nº 8.443/92), exigir do ex-gestor público municipal a comprovação da regular aplicação de verbas federais repassadas ao respectivo Município. STJ. 1ª Turma. REsp 1.480.350-RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 5/4/2016 (Info 581). Quando o TCU instaura procedimento para fiscalizar a correta aplicação de recursos de um convênio, o ônus de provar o adequado e regular emprego das verbas públicas é do imputado, ou seja, do administrador público responsável pela utilização dos valores repassados pela União. Assim, caso o administrador não consiga provar a adequada aplicação dos recursos públicos, isso gera uma presunção de que houve prejuízo ao erário e, consequentemente, o TCU aplica multa ao gestor falho ou faltoso, além de determinar a imputação do débito (ressarcimento dos valores). Justamente por isso, deve-se entender que o TCU possui um prazo para instaurar a referida fiscalização (tomada de contas). Isso porque como o ônus da regularidade é do ex-gestor público, não é razoável que ele permaneça obrigado a provar que aplicou adequadamente verbas públicas mesmo após longos anos. Caso isso fosse exigido dele, haveria flagrante vulneração dos princípios da segurança jurídica e da ampla defesa, bases do ordenamento jurídico, afinal, é notória a instabilidade jurídica e a dificuldade, ou mesmo impossibilidade, de produção de provas após o decurso de muito tempo. Quando o § 5º do art. 37 da CF/88 fala que as ações de ressarcimento por prejuízo ao erário são imprescritíveis, ele está se referindo apenas a ações judiciais, ou seja, propostas perante o Poder Judiciário. Isso porque nas ações judiciais, o autor é quem tem o ônus de provar o alegado prejuízo e a responsabilidade do causador. Logo, a situação torna-se menos gravosa ao ex-administrador público.

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Assim, a exceção constitucional à regra da prescritibilidade pressupõe o exercício da jurisdição e a efetiva prova do prejuízo ao erário e da responsabilidade do seu causador, ônus de quem pleiteia. Caso contrário, admitir-se-ia Estado de Exceção, em que qualquer ex-gestor público demandado pelo TCU, em tomada de contas especial, estaria obrigado a provar, a qualquer tempo, mesmo que decorridas décadas, a adequada aplicação de verbas federais repassadas, independentemente da comprovação de efetivo prejuízo ao erário. A Lei nº 8.443/92 (Lei Orgânica do TCU) não estabelece prazo para que o Tribunal de Contas realize a tomada de contas especial. Diante disso, é necessário se valer da analogia como recurso de integração legislativa, conforme permissivo do art. 4º da LINDB, para o fim de aferir o prazo para o agir da Administração. Utilizando, portanto, este raciocínio, deve-se adotar o prazo de 5 anos, aplicando-se, por analogia, o mesmo prazo previsto em diversos dispositivos, como o art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, arts. 173 e 174 do CTN, art. 142 da Lei nº 8.112/90, art. 54 da Lei nº 9.784/1999, art. 23 da Lei nº 8.429/92, art. 13, § 1º, da Lei nº 9.847/99, art. 1º da Lei nº 6.838/80, e, em especial, do art. 1º da Lei nº 9.873/99. Percebe-se, da análise desses dispositivos, que o prazo máximo de cinco anos é uma constante para as hipóteses de decadência ou prescrição nas relações com o Poder Público, seja por meio de regra geral, quando está no polo passivo da relação, seja por meio de inúmeras regras específicas, quando está no polo ativo da relação jurídica. Dessa forma, a tomada de contas especial está sujeita ao prazo decadencial de 5 anos, limite temporal para que qualquer irregularidade nas contas gere presunção de prejuízo ao erário e importe na imputação do débito e multa ao responsável. Expirado esse prazo, ressalva-se a via judicial para eventual ação de ressarcimento, esta imprescritível, oportunidade em que deverá ser provado o efetivo prejuízo ao erário e a responsabilidade do acionado.

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Inaplicabilidade das sanções por ato de improbidade administrativa abaixo do mínimo legal

No caso de condenação pela prática de ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública, as penalidades de suspensão dos direitos políticos e de proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios não podem ser fixadas abaixo de 3 anos, considerando que este é o mínimo previsto no art. 12, III, da Lei nº 8.429/92.

Não existe autorização na lei para estipular sanções abaixo desse patamar.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.582.014-CE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 7/4/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: O Ministério Público ajuizou ação de improbidade administrativa contra João com fundamento no art. 11, VI, da Lei nº 8.429/92. O juiz julgou a ação procedente e condenou João, aplicando-lhe as seguintes sanções: a) Ressarcimento integral do dano; b) Suspensão de direitos políticos por 3 anos; c) Pagamento de multa civil correspondente a 2 vezes o valor da remuneração percebida pelo agente; e d) Proibição de contratar com o Poder Publico ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 3 anos.

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As punições foram impostas com base no art. 12 da Lei de Improbidade. Confira:

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (...) III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

O condenado interpôs apelação contra a sentença e o Tribunal de Justiça deu parcial provimento ao recurso apenas para o fim de reduzir as sanções impostas nas letras "b" e "d". O TJ fixou o seguinte: a) (...) b) Suspensão de direitos políticos por 2 anos; c) (...) d) Proibição de contratar com o Poder Publico ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 2 anos. Agiu corretamente o Tribunal? NÃO. No caso de condenação pela prática de ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública, as penalidades de suspensão dos direitos políticos e de proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios não podem ser fixadas abaixo de 3 anos, considerando que este é o mínimo previsto no art. 12, III, da Lei nº 8.429/92. STJ. 2ª Turma. REsp 1.582.014-CE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 7/4/2016 (Info 581). O art. 12 prevê as sanções que são aplicáveis para os casos de improbidade administrativa. Para cada ato de improbidade praticado, o legislador fixou um conjunto de penalidades. Se praticou o art. 9º, incide nas punições do inciso I do art. 12. Se cometeu o art. 10, responde pelo inciso II. Se incorreu no art. 11, deverá receber as sanções do inciso III. No caso do inciso III, a lei prevê a "suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos" e a proibição de contratar "pelo prazo de três anos". Logo, não é possível que o julgador estipule prazos menores que os fixados na lei.

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DIREITO CIVIL

FIANÇA Termo inicial do prazo para herdeiro pleitear anulação de fiança

O prazo decadencial para herdeiro do cônjuge prejudicado pleitear a anulação da fiança firmada sem a devida outorga conjugal é de dois anos, contado a partir do falecimento do consorte que não concordou com a referida garantia.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.273.639-SP, Rel. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/3/2016 (Info 581).

O que é fiança? Fiança é um tipo de contrato por meio do qual uma pessoa (chamada de “fiadora”) assume o compromisso junto ao credor de que irá satisfazer a obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra (art. 818 do Código Civil). Logo, João, ao assinar o contrato na condição de fiador, forneceu ao banco uma garantia pessoal (uma caução fidejussória): “se a empresa JJ não pagar o que deve, pode cobrar a dívida de mim”. Outorga uxória Se a pessoa for casada, em regra, ela somente poderá ser fiadora se o cônjuge concordar. Essa concordância, que é chamada de “outorga uxória/marital”, não é necessária se a pessoa for casada sob o regime da separação absoluta. Tal regra encontra-se prevista no art. 1.647, III, do CC:

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: (...) III — prestar fiança ou aval;

Se o cônjuge negar essa autorização sem motivo justo, a pessoa poderá pedir ao juiz que supra a outorga, ou seja, o magistrado poderá autorizar que a fiança seja prestada mesmo sem o consentimento (art. 1.648). Sobre o tema, existe um enunciado do STJ:

Súmula 332-STJ: A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia.

Imagine agora a seguinte situação hipotética: João e Maria são casados sob o regime da comunhão parcial de bens. Determinado dia, João assinou contrato aceitando ser fiador de Pedro (seu irmão) em uma locação por prazo indeterminado. Vale ressaltar que João chegou a comentar com Maria sobre o contrato, mas ela se recusou a assinar a autorização prevista no art. 1.647, III, do CC, já que não gostava nada do cunhado. Diante disso, João não contou para o locador que era casado e assinou sozinho o contrato como fiador. 3 anos depois deste fato, Maria morreu. As desgraças não pararam na vida de João e ele recebeu em casa a citação de uma execução movida pelo locador do imóvel contra ele. Isso porque Pedro, seu irmão, deixou de pagar os alugueis e o proprietário está cobrando a dívida do fiador. Na execução, o juiz determinou a penhora da casa em que mora João. Desesperado, ele procura um advogado para fazer a sua defesa.

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O advogado prepara embargos à execução, onde alega que a casa de João é bem de família e que, por isso, não pode ser penhorada. Esse argumento será aceito pelo magistrado? NÃO. A impenhorabilidade do bem de família não se aplica no caso de dívidas do fiador decorrentes do contrato de locação. Veja o que diz a Lei nº 8.009/90:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: (...) VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

O STF decidiu que o art. 3º, VII, da Lei n. 8.009/90 é constitucional, não violando o direito à moradia (art. 6º da CF/88) nem qualquer outro dispositivo da CF/88 (STF. 1ª Turma. RE 495105 AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 05/11/2013). O STJ possui um enunciado sobre o tema:

Súmula 549-STJ: É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação.

O executado alega também que a fiança concedida não é válida. Isso porque não houve autorização do cônjuge do fiador (no caso, Maria). Essa alegação feita pelo fiador pode ser acolhida pelo juiz? NÃO. O fiador não tem legitimidade para arguir essa nulidade. Veja o que diz o Código Civil:

Art. 1.650. A decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros.

Confira o entendimento jurisprudencial sobre o tema:

(...) A jurisprudência do STJ é no sentido de que a nulidade da fiança só pode ser demandada pelo cônjuge que não a subscreveu ou por seus respectivos herdeiros. (...) STJ. 4ª Turma. AgRg no REsp 1232895/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 04/08/2015.

Assim, João não poderá alegar a invalidade da fiança outorgada, considerando que se isso fosse aceito haveria a ocorrência do chamado venire contra factum proprium (proibição de comportamento contraditório), sendo uma forma de abuso de direito. Foi, então, que Lucas, filho de João, que está estudando para concurso público, teve uma ideia: ele, enquanto filho de Maria, poderia ingressar com ação objetivando anular o contrato de fiança por falta de consentimento. A ideia de Lucas é boa? Esta ação tem chance de êxito? SIM. O herdeiro do cônjuge prejudicado pode pleitear a anulação da fiança concedida sem a devida outorga conjugal. Essa possibilidade está prevista expressamente no art. 1.650 do CC acima transcrito. Dessa forma, Lucas, sendo herdeiro de Maria (esposa que não concedeu a outorga), possui legitimidade para buscar a anulação da fiança. Qual é o prazo para a propositura dessa ação? 2 anos. Neste caso, já se passaram 3 anos da assinatura da fiança... Não interessa. O prazo de 2 anos não é contado da assinatura do contrato, mas sim do fim da sociedade conjugal, conforme preconiza o art. 1.649 do CC:

Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjugal.

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Em nosso exemplo, a sociedade conjugal terminou com a morte de Maria. Logo, a partir desta data é que se conta o prazo de 2 anos para ajuizamento da ação anulatória. Em suma: O prazo decadencial para herdeiro do cônjuge prejudicado pleitear a anulação da fiança firmada sem a devida outorga conjugal é de dois anos, contado a partir do falecimento do consorte que não concordou com a referida garantia. STJ. 4ª Turma. REsp 1.273.639-SP, Rel. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/3/2016 (Info 581).

REGIME DE BENS Comunhão parcial e inexistência de meação de valores do FGTS depositados antes do casamento

Importante!!!

Diante do divórcio de cônjuges que viviam sob o regime da comunhão parcial de bens, não deve ser reconhecido o direito à meação dos valores que foram depositados em conta vinculada ao FGTS em datas anteriores à constância do casamento e que tenham sido utilizados para aquisição de imóvel pelo casal durante a vigência da relação conjugal.

Ao contrário, deve ser reconhecido o direito à meação dos valores do FGTS auferidos DURANTE a constância do casamento, ainda que o saque daqueles valores não seja realizado imediatamente à separação do casal.

Os proventos do trabalho recebidos, por um ou outro cônjuge, na vigência do casamento, compõem o patrimônio comum do casal, a ser partilhado na separação, tendo em vista a formação de sociedade de fato, configurada pelo esforço comum dos cônjuges, independentemente de ser financeira a contribuição de um dos consortes e do outro não.

A incomunicabilidade prevista no inciso VI do art. 1.659 do CC somente ocorre quando os valores são percebidos em momento anterior ou posterior ao casamento.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.399.199-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Rel. para acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 9/3/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: Eduardo e Mônica casaram-se, em 2013, sob o regime da comunhão parcial de bens. Um mês depois do casamento decidiram comprar um apartamento que custava R$ 200 mil. Para tanto, Eduardo utilizou o dinheiro do seu FGTS e pagou R$ 30 mil à construtora. Mônica também se valeu de seu FGTS e pagou R$ 70 mil. Os R$ 100 mil restantes foram doados pelo pai de Mônica, que transferiu para a conta da construtora. Ocorre que o casamento não deu certo e, em 2014, o casal decidiu se divorciar. Surgiu, então, uma disputa entre os dois para saber como iriam dividir o apartamento. O advogado de Eduardo sustentava que eles deveriam vendê-lo por R$ 200 mil e dividir o dinheiro igualmente, metade para cada um, considerando que se trata de regime da comunhão parcial de bens. A advogada de Mônica, por sua, vez, concordava em vender, mas afirmava que Eduardo teria direito de receber de volta apenas 15% do valor da casa (R$ 30 mil), quantia com o qual ele contribuiu para a aquisição. Os demais 85% (R$ 170 mil pertenceriam à esposa já que R$ 100 mil foi doado pelo pai dela e R$ 70 mil veio do seu FGTS). Vamos entender com calma este interessante e complicado caso.

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Como funciona o regime da comunhão parcial? O regime da comunhão parcial é tratado pelos arts. 1.658 a 1.666 do CC. Nessa espécie de regime, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com exceção dos casos previstos no Código Civil. Dito de outro modo, os bens adquiridos durante a união passam a ser de ambos os cônjuges, salvo em algumas situações que o Código Civil determina a incomunicabilidade. Veja o que diz a Lei:

Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.

O art. 1.660 lista bens que, se adquiridos durante o casamento, pertencem ao casal:

Art. 1.660. Entram na comunhão: I — os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; II — os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior; III — os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges; IV — as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge; V — os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.

O art. 1.659, por sua vez, elenca aquilo que é excluído da comunhão:

Art. 1.659. Excluem-se da comunhão: I — os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; II — os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares; III — as obrigações anteriores ao casamento; IV — as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal; V — os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; VI — os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; VII — as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

Se alguém faz doação em favor de um casal casado sob o regime da comunhão parcial de bens, a coisa ou o valor doado deve entrar na meação? Em outras palavras, esse bem doado deverá ser dividido igualmente entre os cônjuges caso eles decidam se divorciar? SIM. Isso está previsto expressamente no inciso III do art. 1.660, acima visto:

Art. 1.660. Entram na comunhão: III — os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;

No caso concreto, Eduardo alegou que, como o pai de Mônica não especificou para quem estava doando o dinheiro, presume-se que foi um presente para o casal. Essa tese foi aceita pelo STJ? Os R$ 100 mil doados pelo pai de Mônica devem se comunicar? No momento do divórcio, tanto Eduardo como Mônica terão direito à metade desse valor cada um? NÃO. No caso concreto, o valor doado pelo pai de Mônica não se comunica e não deve ser partilhado no momento do divórcio. Isso porque não existe qualquer prova de que essa doação tenha sido feita em favor em ambos os cônjuges. Ressalte-se que a doação foi feita sem nenhuma formalidade nem indicação de quem seria o beneficiário. Diante disso, presume-se que o pai tenha querido beneficiar apenas a filha, sua herdeira. Para que se considerasse que a doação foi para o casal, isso deveria ter sido dito de forma expressa. Veja precedente do STJ parecido com o caso concreto:

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Se o bem for doado para um dos cônjuges, em um casamento regido pela comunhão parcial dos bens, a regra é que esse bem pertence apenas ao cônjuge que recebeu a doação. Em outras palavras, esse bem doado não se comunica, não passa a integrar os bens do casal. Em um regime de comunhão parcial, o bem doado somente se comunica se, no ato de doação, ficar expressa a afirmação de que a doação é para o casal. Logo, em caso de silêncio no ato de doação, deve-se interpretar que esse ato de liberalidade ocorreu em favor apenas do donatário (um dos cônjuges). STJ. 3ª Turma. REsp 1318599/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/04/2013 (Info 523). Dessa forma, os R$ 100 mil doados pelo pai de Mônica deverão ficar com ela no momento do divórcio, já que não se comunicaram por não ter sido uma doação em favor de ambos os cônjuges (art. 1.660, III, do CC). Parte do imóvel adquirida com recursos do FGTS Eduardo argumentou também que o valor do FGTS, a partir do momento que foi utilizado para a aquisição do imóvel, passou a integrar o patrimônio comum do casal. Dessa forma, sustentou que, por isso, deveriam ser somadas as quantias de FGTS disponibilizadas por cada um dos cônjuges (30 dele e 70 dela) e divididas em partes iguais (50% para cada um). Mônica refutou a alegação, afirmando que esse saldo de FGTS utilizado para a compra foi constituído antes do casamento, ou seja, refere-se a períodos trabalhados pelos dois antes de se casarem. Em outras palavras, antes de se casarem, cada um deles trabalhou e os respectivos empregadores depositaram as quantias no FGTS. Por mais que eles tenham utilizado só depois do matrimônio, são relacionados a período pretérito.

Qual das duas teses foi acolhida pelo STJ? A de Mônica.

Diante do divórcio de cônjuges que viviam sob o regime da comunhão parcial de bens, não deve ser reconhecido o direito à meação dos valores que foram depositados em conta vinculada ao FGTS em datas anteriores à constância do casamento e que tenham sido utilizados para aquisição de imóvel pelo casal durante a vigência da relação conjugal. STJ. 2ª Seção. REsp 1.399.199-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Rel. para acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 9/3/2016 (Info 581).

O que é FGTS? Qual é a sua natureza jurídica? FGTS é a sigla para Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. O FGTS foi criado pela Lei n.º 5.107/66 com o objetivo de proteger o trabalhador demitido sem justa causa. Atualmente, o FGTS é regido pela Lei n.º 8.036/90. O FGTS nada mais é do que uma conta bancária aberta em nome do trabalhador e vinculada a ele no momento em que celebra seu primeiro contrato de trabalho. Nessa conta bancária, o empregador deposita todos os meses o valor equivalente a 8% do salário pago ao empregado, acrescido de juros e atualização monetária (conhecidos pela sigla “JAM”). Assim, vai sendo formado um fundo de reserva financeira para o trabalhador, ou seja, uma espécie de “poupança”, que é utilizada pelo obreiro quando fica desempregado sem justa causa ou quando precisa para alguma finalidade relevante, assim considerada pela lei. Se o empregado for demitido sem justa causa, o empregador é obrigado a depositar, na conta vinculada do trabalhador, uma indenização compensatória de 40% do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros (art. 18, § 1º da Lei nº 8.036/90). O trabalhador que possui conta do FGTS vinculada a seu nome é chamado de trabalhador participante do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. O FGTS possui natureza jurídica de direito social do trabalhador, sendo considerado, portanto, fruto civil do trabalho (STJ. 3ª Turma. REsp 848.660/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 13/05/2011).

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Por que interessa saber que o FGTS tem natureza jurídica de "direito trabalhista" (fruto civil do trabalho)? Porque o inciso VI do art. 1.659 do CC prevê que ficam excluídos da comunhão os valores auferidos com o trabalho pessoal de cada cônjuge. Veja:

Art. 1.659. Excluem-se da comunhão: VI — os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;

Obs: a palavra "proventos" está empregada neste inciso com o significado de vantagem financeira, ganho, proveito, lucro etc. Dessa forma, sendo o FGTS uma vantagem financeira decorrente do trabalho pessoal de cada cônjuge, ele se enquadra neste inciso VI do art. 1.659 do CC. Os proventos (ganhos) decorrentes do trabalho pessoal do cônjuge estão sempre fora da comunhão? Este inciso é interpretado de forma literal e absoluta? NÃO. O STJ mitiga a redação literal desse inciso. Apesar da determinação expressa do Código Civil no sentido da incomunicabilidade, o STJ entende que não se deve excluir da comunhão os proventos do trabalho recebidos na constância do casamento, sob pena de se desvirtuar a própria natureza do regime. A comunhão parcial de bens funda-se na noção de que devem formar o patrimônio comum os bens adquiridos onerosamente na vigência do casamento. Os salários e demais ganhos decorrentes do trabalho constituem-se em bens adquiridos onerosamente durante o casamento. Pela lógica, devem se comunicar. Essa é também a opinião da doutrina: "(...) Não há como excluir da universalidade dos bens comuns os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge (CC, art. 1.659, VI). Ora, se os ganhos do trabalho não se comunicam, nem se dividem pensões e rendimentos outros de igual natureza, praticamente tudo é incomunicável, pois a maioria das pessoas vive de seu trabalho. O fruto da atividade laborativa dos cônjuges não pode ser considerado incomunicável, e isso em qualquer dos regimes de bens, sob pena de aniquilar-se o regime patrimonial, tanto no casamento como na união estável, porquanto nesta também vigora o regime da comunhão parcial (CC, art. 1.725). (...) De regra, é do esforço pessoal de cada um que advêm os créditos, as sobras e economias para a aquisição dos bens conjugais. (...) (DIAS, Maria Berenice. Regime de bens e algumas absurdas incomunicabilidades. Disponível em: www.mariaberenice.com.br) Assim, o entendimento atual do STJ é o de que: Os proventos do trabalho recebidos, por um ou outro cônjuge, na vigência do casamento, compõem o patrimônio comum do casal, a ser partilhado na separação, tendo em vista a formação de sociedade de fato, configurada pelo esforço comum dos cônjuges, independentemente de ser financeira a contribuição de um dos consortes e do outro não. A incomunicabilidade prevista no inciso VI do art. 1.659 do CC somente ocorre quando os valores são percebidos em momento anterior ou posterior ao casamento. STJ. 2ª Seção. REsp 1.399.199-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Rel. para acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 9/3/2016 (Info 581). Resumindo o entendimento do STJ quanto ao inciso VI do art. 1.659: Se os proventos do trabalho foram adquiridos ANTES ou DEPOIS do casamento: não se comunicam. Os

valores pertencerão ao patrimônio particular de quem tem o direito a seu recebimento. Se os proventos do trabalho foram adquiridos DURANTE o casamento: comunicam-se. No caso concreto, contudo, o FGTS de Eduardo e Mônica não se comunicaram porque eles eram referentes a períodos de trabalho laborados antes do casamento.

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PATERNIDADE Reconhecimento de paternidade socioafetiva post mortem

Importante!!!

É possível o reconhecimento da paternidade socioafetiva post mortem, ou seja, mesmo após a morte do suposto pai socioafetivo.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.500.999-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: João conheceu Maria e, depois de algum tempo de namoro, decidiram se casar. Vale ressaltar que Maria, quando se casou com João, já era mãe de Pedro, fruto de um relacionamento anterior que teve. Mesmo sendo filho biológico e registral de outro homem, João tratava Pedro como se ele fosse seu filho. Aliás, perante a sociedade, o trabalho, os amigos, a escola etc., João sempre apresentava Pedro como seu filho, sem qualquer distinção. Depois de algum tempo, João e Maria tiveram um filho em comum: Ricardo. Mesmo após o nascimento de Ricardo, João continuava tratando Pedro com o mesmo amor de pai. Passaram-se 30 anos nesta situação e, infelizmente, Maria veio a falecer. Muito triste com a morte de sua esposa, João também morreu cerca de 3 meses depois. Aí é que os problemas começaram. João era muito rico e possuía vários bens em seu nome. Ricardo, seu filho biológico e registral, afirmou que Pedro não tinha direito a nada e pretendeu ficar com a herança inteira para si. O que Pedro poderá fazer neste caso para resguardar seus direitos? Pedro poderá ajuizar uma ação declaratória pedindo que se reconheça que havia entre ele e João uma relação de paternidade socioafetiva, ou seja, que o falecido era seu pai socioafetivo. Segundo decidiu o STJ: É possível o reconhecimento da paternidade socioafetiva post mortem, ou seja, mesmo após a morte do suposto pai socioafetivo. STJ. 3ª Turma. REsp 1.500.999-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016 (Info 581). Essa ação deverá ser proposta contra Ricardo, o único herdeiro de João e que será afetado juridicamente caso o pedido seja julgado procedente. Na ação, deverão ser juntadas fotos, bilhetes, vídeos de celular, posts do Facebook e quaisquer outros documentos que provem a relação de afeto como pai e filho. Poderão também ser arroladas testemunhas. A paternidade socioafetiva é protegida pelo ordenamento jurídico? SIM. A socioafetividade é contemplada pelo art. 1.593 do Código Civil, que prevê:

Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem.

Ao falar em "outra origem", o legislador permite que a paternidade seja reconhecida com base em outras fontes que não apenas a relação de sangue. Logo, permite a paternidade com fundamento no afeto. Assim, a paternidade socioafetiva é uma forma de parentesco civil. Nesse sentido, confira o Enunciado nº 256 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal:

Enunciado 256-CJF: A posse do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de parentesco civil.

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Quais são os requisitos para que se reconheça a filiação socioafetiva? Para que seja reconhecida a filiação socioafetiva, é necessário que fiquem demonstradas duas circunstâncias bem definidas: a) vontade clara e inequívoca do apontado pai ou mãe socioafetivo de ser reconhecido(a), voluntária e juridicamente, como tal (demonstração de carinho, afeto, amor); e b) configuração da denominada “posse de estado de filho”, compreendida pela doutrina como a presença (não concomitante) de tractatus (tratamento, de parte à parte, como pai/mãe e filho); nomen (a pessoa traz consigo o nome do apontado pai/mãe); e fama (reconhecimento pela família e pela comunidade de relação de filiação), que naturalmente deve apresentar-se de forma sólida e duradoura. STJ. 3ª Turma. REsp 1.328.380-MS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 21/10/2014 (Info 552). Existe algum dispositivo legal que pode ser invocado ao caso? Pode ser aplicado, por analogia, o raciocínio previsto no art. 42, § 6º do ECA:

Art. 42 (...) § 6º A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.

Vale ressaltar que o STJ adota uma interpretação ampliativa desse dispositivo e afirma que em situações nas quais ficar amplamente demonstrada a inequívoca vontade de adotar, é possível o deferimento da adoção póstuma mesmo que o adotante não tenha dado início ao processo formal para tanto (STJ. 3ª Turma. REsp 1.326.728/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/8/2013). Dessa forma, ainda que o pai, em vida, não tenha formalizado o processo de adoção do filho, isso pode ser reconhecido se ficar provado que havia entre eles uma ligação de paternidade socioafetiva. Existe uma relação direta entre a possibilidade de adoção post mortem com a filiação socioafetiva, conforme já reconheceu o STJ:

(...) Para as adoções post mortem, vigem, como comprovação da inequívoca vontade do de cujus em adotar, as mesmas regras que comprovam a filiação socioafetiva: o tratamento do menor como se filho fosse e o conhecimento público dessa condição. (...) (STJ. 3ª Turma. REsp 1.217.415/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/06/2012).

Tal entendimento consagra a ideia de que o parentesco civil não advém exclusivamente da origem consanguínea, podendo florescer da socioafetividade, o que não é vedado pela legislação pátria, e, portanto, plenamente possível no ordenamento.

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DIREITO DO CONSUMIDOR

PROTEÇÃO CONTRATUAL Necessidade de filiação à entidade aberta de previdência para contratar empréstimo

É possível impor ao consumidor sua prévia filiação à entidade aberta de previdência complementar como condição para contratar com ela empréstimo financeiro.

STJ. 4ª Turma. REsp 861.830-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 5/4/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "XX" é uma entidade de previdência complementar aberta. João soube que a empresa "XX" realizava empréstimos com juros atrativos. Diante disso, procurou a entidade e pediu informações sobre o mútuo. O funcionário da entidade explicou que a entidade somente concederia empréstimo a João caso ele se filiasse a um dos planos da entidade de previdência. João achou aquilo um absurdo e avisou que iria "denunciar" a empresa ao PROCON, considerando que isso seria uma forma de venda casada, o que é proibido pelo art. 39, I, do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

O CDC é aplicável para as entidades de previdência complementar? Depende: Para as abertas: SIM. Para as fechadas: NÃO.

Súmula 563-STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às entidades abertas de previdência complementar, não incidindo nos contratos previdenciários celebrados com entidades fechadas.

No exemplo acima dado, a prévia necessidade de filiação para concessão de empréstimo caracteriza "venda casada"? Esta prática é abusiva? NÃO.

É possível impor ao consumidor sua prévia filiação à entidade aberta de previdência complementar como condição para contratar com ela empréstimo financeiro. STJ. 4ª Turma. REsp 861.830-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 5/4/2016 (Info 581).

As entidades abertas são empresas privadas constituídas sob a forma de sociedade anônima, que oferecem planos de previdência privada que podem ser contratados por qualquer pessoa física ou jurídica.

As entidades abertas de previdência complementar não têm como finalidade institucional a operação como instituição bancária. Assim, a concessão de empréstimos não é a sua atividade primordial.

Segundo o parágrafo único do art. 71 da LC 109/2001, as entidades de previdência privada abertas podem realizar operações financeiras apenas com seus patrocinadores, participantes e assistidos.

Dessa forma, a entidade de previdência, ao exigir que o consumidor, antes de realizar o empréstimo, fizesse um plano de previdência complementar, não praticou qualquer ato ilícito, considerando que tais entidades somente podem realizar este tipo de operação com seus patrocinadores, filiados e assistidos. Logo, sem essa prévia filiação, a entidade estaria impedida de conceder o empréstimo.

Assim, não existiu a chamada "venda casada" de que trata o art. 39, I, do CDC. O que houve foi a exigência de uma providência que é imposta por lei.

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PLANO DE SAÚDE Cláusula de remissão de plano de saúde

O companheiro faz jus à cobertura de cláusula de remissão por morte de titular de plano de saúde na hipótese em que a referida disposição contratual faça referência a cônjuge, sendo omissa quanto a companheiro.

Após o transcurso do período previsto na cláusula de remissão, o dependente já inscrito pode assumir, nos mesmos moldes e custos avençados, a titularidade do plano, voltando a pagar as mensalidades.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.457.254-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016 (Info 581).

Remissão por morte do titular nos contratos de plano de saúde Remissão é uma cláusula prevista em alguns planos de saúde segundo a qual se o titular do plano falecer, os seus dependentes continuarão tendo direito aos serviços de saúde oferecidos pelo plano por um determinado período (que varia entre 1 a 5 anos), sem pagar mensalidades durante este tempo. O objetivo desta cláusula é o de proteger o núcleo familiar do titular falecido, que dele dependia economicamente, assegurando, para isso, por certo período, a assistência médica e hospitalar a fim de evitar o desamparo abrupto. Imagine agora a seguinte situação hipotética: João era titular do plano Bradesco Saúde S/A. No contrato assinado havia uma cláusula de remissão prevendo: "Cláusula 14. Em caso de falecimento do Segurado titular, o cônjuge e os filhos participantes como dependentes da apólice ficam isentos do pagamento de mensalidades pelo período de até 1 ano. 14.1 Para os efeitos desta Cláusula, consideram-se dependentes, exclusivamente, o cônjuge, os filhos solteiros de até 24 anos e os filhos inválidos de qualquer idade."

João vivia em união estável com Maria há muitos anos. Ele faleceu e Maria tentou obter os serviços de saúde, mas o plano negou atendimento afirmando que a cláusula de remissão somente protege o cônjuge (vínculo de casamento), não abrangendo companheiros (união estável). Irresignada, Maria buscou auxílio junto ao Poder Judiciário e propôs ação contra o plano. O pleito de Maria encontrou amparo no STJ? Ela terá direito à cláusula de remissão mesmo sendo companheira e o contrato prevendo o benefício apenas para cônjuges? SIM. O companheiro faz jus à cobertura de cláusula de remissão por morte de titular de plano de saúde na hipótese em que a referida disposição contratual faça referência a cônjuge, sendo omissa quanto a companheiro. STJ. 3ª Turma. REsp 1.457.254-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016 (Info 581). Embora a cláusula de remissão de plano de saúde se refira expressamente ao cônjuge como dependente, sendo omissa quanto à figura do companheiro, não deve haver distinção sobre esse direito, diante da semelhança de papéis e do reconhecimento da união estável como entidade familiar promovido pela própria CF/88 (art. 226, § 3º, da CF/88). Desse modo, havendo a equiparação de companheiro e de cônjuge para fins de qualificação como dependente em plano de saúde, deve ser estendido ao companheiro o direito à cobertura adicional de remissão por morte.

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Após o término do período de remissão, o dependente poderá continuar com o plano? SIM. Após o transcurso do período previsto na cláusula de remissão, o dependente já inscrito pode assumir, nos mesmos moldes e custos avençados, a titularidade do plano, voltando a pagar as mensalidades. STJ. 3ª Turma. REsp 1.457.254-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016 (Info 581). Sobre o tema, a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS editou a Súmula Normativa nº 13/2010 prevendo: "O término da remissão não extingue o contrato de plano familiar, sendo assegurado aos dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes, para os contratos firmados a qualquer tempo." Essa orientação foi construída especialmente nos princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da proteção da segurança jurídica e da proteção à entidade familiar, conjugados com o previsto no art. 3º, § 1º, da Resolução Normativa nº 195/2009 da ANS, com o fim de evitar o desamparo dos dependentes inscritos do titular falecido quanto à assistência médica e hospitalar. Assim, deve ser assegurado a dependente o direito de assumir a posição de titular de plano de saúde - saindo da condição de dependente inscrito - desde que arque com as obrigações decorrentes e sejam mantidas as mesmas condições contratuais, em virtude da ausência de extinção da avença, não sendo empecilho, para tanto, o gozo do período de remissão.

DIREITO EMPRESARIAL

DUPLICATA Emissão de duplicata com base em mais de uma nota fiscal

Uma só duplicata pode corresponder à soma de diversas notas fiscais parciais.

Em outras palavras, uma única duplicata poderá abranger mais de uma nota fiscal.

Não há proibição legal para que se somem vendas parceladas procedidas no curso de um determinado período (ex: um mês), e do montante se formule uma fatura única ao seu final.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.356.541-MG, Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 5/4/2016 (Info 581).

Conceito de duplicata Duplicata é... ­ um título de crédito ­ que consiste em uma ordem de pagamento emitida pelo próprio credor ­ por conta de mercadorias que ele vendeu ou de serviços que prestou ­ e que estão representados em uma fatura ­ devendo ser paga pelo comprador das mercadorias ou pelo tomador dos serviços. Título de crédito genuinamente brasileiro A duplicata foi criada pelo direito brasileiro. Atualmente, a duplicata é regulada pela Lei nº 5.474/68. Vale ressaltar, no entanto, que, além da Lei nº 5.474/68, aplicam-se, à duplicata e à triplicata, no que couber, os dispositivos da legislação sobre emissão, circulação e pagamento das Letras de Câmbio (Lei Uniforme de Genebra).

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Feitos estes esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "AA" comprou da loja "BB" três produtos. A loja extraiu uma fatura dos produtos e emitiu uma duplicata mercantil dando uma ordem à empresa compradora para que ela pague o preço das mercadorias. A loja poderia ter emitido uma única nota fiscal dos três produtos. Isso, inclusive, é o mais comum de acontecer. No entanto, por inexperiência do gerente, que era novato, foram emitidas três notas fiscais, uma para cada produto. Vale ressaltar novamente que, apesar de terem sido emitidas três notas fiscais, foi extraída uma única fatura e uma só duplicata. A empresa "AA" acabou não pagando a duplicata e, em seguida, ajuizou ação ordinária contra a loja buscando a declaração de inexigibilidade e de nulidade da duplicata alegando que a soma das notas fiscais em uma única fatura e a emissão da duplicata correspondente foi um procedimento irregular. Em suma, o argumento da empresa é o de que a emissão de duplicata deve se referir a apenas uma nota fiscal.

A tese da empresa foi acolhida pelo STJ? Houve irregularidade no fato de a duplicata se referir a mais de uma nota fiscal? NÃO.

Uma só duplicata pode corresponder à soma de diversas notas fiscais parciais. Em outras palavras, uma única duplicata poderá abranger mais de uma nota fiscal. STJ. 3ª Turma. REsp 1.356.541-MG, Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 5/4/2016 (Info 581).

O que é uma nota fiscal? Nota fiscal é um "Documento fiscal a ser obrigatoriamente emitido por comerciantes e industriais, sempre que promoverem a saída de mercadorias ou a transmissão de sua propriedade." (LOPES DE SÁ, Antônio; LOPES DE SÁ, Ana Maria. Dicionário de Contabilidade. São Paulo: Atlas, 1994). A nota fiscal prova que houve a realização de um negócio jurídico sujeito à fiscalização tributária. Faz prova da entrada e saída de mercadorias de estabelecimentos empresariais, acompanhando a sua entrega aos destinatários.

O que é a fatura? A fatura é um documento emitido pelo vendedor ou prestador de serviços no qual são discriminadas as mercadorias que foram vendidas ou os serviços prestados. Na fatura constam a descrição e os preços dos produtos vendidos ou do serviço prestado. Todas as vezes que for celebrado um contrato de compra e venda mercantil entre partes domiciliadas no Brasil, com prazo não inferior a 30 dias, contado da data da entrega ou despacho das mercadorias, o vendedor é obrigado a extrair uma fatura para apresentar ao comprador (art. 1º, da Lei nº 5.474/68). No caso de prestação de serviços (qualquer prazo) ou de compra e venda inferior a 30 dias, a emissão de fatura é facultativa.

Duplicata e fatura são documentos diferentes A fatura não é título de crédito. O título é a duplicata, que é emitida a partir de uma fatura. A fatura apenas prova a existência do contrato.

Fatura pode abranger mais de uma nota A duplicata só poder espelhar uma fatura, ou seja, para cada fatura, uma duplicata. No entanto, a fatura pode corresponder à soma de diversas notas parciais. A nota parcial é o documento representativo de uma venda parcial ou de venda realizada dentro do lapso de um mês, que poderá ser agrupada a outras vendas efetivadas nesse período pelo mesmo comprador. Não há proibição legal para que se somem vendas parceladas procedidas no curso de um determinado período (ex: um mês), e do montante se formule uma fatura única ao seu final.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

COMPETÊNCIA Demanda em que se pede a obtenção de diploma de curso de ensino à distância negado por

problemas de credenciamento da instituição de ensino superior junto ao MEC

Súmula 570-STJ: Compete à Justiça Federal o processo e julgamento de demanda em que se discute a ausência de ou o obstáculo ao credenciamento de instituição particular de ensino superior no Ministério da Educação como condição de expedição de diploma de ensino a distância aos estudantes.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 27/04/2016, DJe 02/05/2016.

Imagine a seguinte situação adaptada: João cursava uma faculdade, na modalidade à distância, tendo concluído integralmente o curso e colado grau. Apesar disso, ele não consegue obter o diploma devidamente registrado, em virtude do fato de a instituição de ensino não estar credenciada pelo Ministério da Educação, órgão da União. João quer ajuizar uma ação para conseguir a entrega do diploma de conclusão do curso devidamente registrado e para receber indenização por danos morais em virtude dos transtornos que sofreu. Contra quem e em qual juízo deverá ser proposta esta demanda? Contra a instituição de ensino superior e contra a União, em litisconsórcio passivo, sendo demanda de competência da Justiça Federal. Credenciamento de cursos de ensino à distância é incumbência da União Conforme o art. 9º, IX e o art. 80, §§ 1º e 2º, da Lei nº 9.394/96, cabe à União credenciar e fiscalizar as instituições de ensino que oferecem programas de educação à distância:

Art. 9º A União incumbir-se-á de: (...) IX - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino.

Art. 80. O Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada. § 1º A educação a distância, organizada com abertura e regime especiais, será oferecida por instituições especificamente credenciadas pela União. § 2º A União regulamentará os requisitos para a realização de exames e registro de diploma relativos a cursos de educação a distância. (...)

Assim, se for proposta ação na qual se discuta a dificuldade do aluno de obter o diploma do curso à distância que realizou por causa da ausência/obstáculo de credenciamento da instituição particular junto ao MEC, haverá nítido interesse da União, que deverá compor a lide no polo passivo da demanda, já que é ela quem credencia as instituições. No STJ, este tema já havia sido pacificado por meio de recurso especial repetitivo: STJ. 1ª Seção. REsp 1344771/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 24/04/2013. Existe também precedente do STF no mesmo sentido: STF. 2ª Turma. ARE 750186 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 24/06/2014.

Informativo 581-STJ (14/04 a 28/04/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 23

E se João propusesse a ação pedindo unicamente a indenização por danos morais? Neste caso, a ação teria que ser proposta somente contra a instituição de ensino, e a competência seria da Justiça Estadual. Nesse sentido:

(...) No caso em análise, não há interesse jurídico da União a ensejar o deslocamento do feito para a Justiça Federal, uma vez que a autora não pleiteou a emissão do diploma, somente a reparação dos supostos danos morais e materiais sofridos em decorrência da conduta da parte ré. (...) (STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1553120/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 17/11/2015)

Quadro-resumo (REsp 1344771/PR): De quem é a competência para julgar ações propostas contra instituição PRIVADA de ensino superior?

AÇÃO COMPETÊNCIA

Se a ação proposta for mandado de segurança Justiça Federal

Ação (diferente do MS) discutindo questões privadas relacionadas ao contrato de prestação de serviços firmado entre a instituição de ensino e o aluno (exs: inadimplemento de mensalidade, cobrança de taxas etc.).

Justiça Estadual

Ação (diferente do MS) discutindo registro de diploma perante o órgão público competente ou o credenciamento da entidade perante o Ministério da Educação (obs: neste caso, a União deverá figurar na lide).

Justiça Federal

AÇÃO ANULATÓRIA Ação anulatória proposta por particular com o objetivo de anular acordo

firmado com a Fazenda Pública e homologado judicialmente

No caso em que particular e Fazenda Pública firmaram, sem a participação judicial, acordo que tenha sido meramente homologado por decisão judicial - a qual, por sua vez, apenas extinguiu a relação jurídica processual existente entre as partes, sem produzir efeitos sobre a relação de direito material existente entre elas -, o prazo decadencial para anular o ajuste por meio de ação ajuizada pelo particular é de 5 anos, contados da data da celebração da transação, e não da decisão homologatória.

STJ. 2ª Turma. REsp 866.197-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 18/2/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "XX" ajuizou ação contra o Estado do Rio Grande do Sul pedindo que fosse declarado que ela não era devedora de ICMS em relação a determinada operação. Durante a tramitação da ação, a empresa e o Estado fizeram um acordo extrajudicial. As partes apresentaram uma petição ao juízo pedindo a homologação da transação e a extinção do processo, o que foi feito mediante decisão judicial. Vale ressaltar que a referida decisão judicial não examinou se a empresa era ou não devedora do ICMS (relação de direito material), limitando-se a homologar a transação e por fim à relação processual existente. A decisão judicial homologatória transitou em julgado. Após quatro anos e um mês da homologação do acordo, a empresa ajuizou ação com o objetivo de anular o ajuste celebrado. A empresa deverá propor uma ação rescisória neste caso? NÃO. Se a sentença é meramente homologatória – tal como ocorreu, no caso –, não cabe ação rescisória. Deve-se propor ação anulatória, prevista no art. 966, § 4º do CPC 2015:

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Art. 966 (...) § 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.

Nesse sentido:

(...) A sentença judicial que, sem adentrar o mérito do acordo entabulado entre as partes, limita-se a aferir a regularidade formal da avença e a homologá-la, caracteriza-se como ato meramente homologatório e, nessas condições, deve ser desconstituída por meio da ação anulatória prevista no art. 486 do CPC (1973), sendo descabida a Ação Rescisória para tal fim. (...) STJ. 4ª Turma. AgRg no REsp 1440037/RN, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 09/09/2014

Neste caso concreto, o prazo para a ação anulatória será de 4 anos, nos termos do art. 178 do CC ("Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado:")? NÃO. No exemplo acima mencionado, o prazo é de 5 anos, com base no art. 1º do Decreto 20.910/32. Em se tratando de ação anulatória proposta contra a Fazenda Pública, o prazo decadencial é regido pelo Decreto 20.910/32. Isso porque este prazo do Decreto mencionado é aplicável em relação a todo e qualquer direito ou ação exercitável contra a Fazenda Pública (federal, estadual ou municipal), seja qual for a sua natureza. Logo, não é aplicável o prazo previsto no art. 178 do CC (quatro anos), utilizado apenas quando a Fazenda Pública não ocupa o polo passivo da ação anulatória. Qual é o termo inicial desse prazo de 5 anos? Conta-se da data em que foi firmado o acordo ou do dia em que este foi homologado judicialmente? O prazo da ação anulatória deve ser contado da data em que foi celebrado o acordo. Por que este prazo não é contado da data em que o acordo foi homologado? Porque o que está sendo questionado não é a homologação judicial, mas sim o acordo. A ação anulatória não é proposta contra a sentença em si, que, no caso, apenas homologou o ato de vontade das partes, sem qualquer conteúdo decisório do Juiz. Em verdade, a ação é contra o que foi objeto da manifestação de vontade das partes, ou seja, contra a própria transação. O que se objetiva rescindir, ou melhor, anular, não é a sentença homologatória, que não faz coisa julgada material, mas a transação celebrada pelos litigantes, ou seja, o acordo feito pelas partes quanto à relação jurídico-material. Em suma: No caso em que particular e Fazenda Pública firmaram, sem a participação judicial, acordo que tenha sido meramente homologado por decisão judicial - a qual, por sua vez, apenas extinguiu a relação jurídica processual existente entre as partes, sem produzir efeitos sobre a relação de direito material existente entre elas -, o prazo decadencial para anular o ajuste por meio de ação ajuizada pelo particular é de 5 anos, contados da data da celebração da transação, e não da decisão homologatória. STJ. 2ª Turma. REsp 866.197-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 18/2/2016 (Info 581).

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DIREITO PENAL

CÓDIGO DE TRÂNSITO O fato de o condutor estar com a CNH vencida não se enquadra

na causa de aumento do inciso I do § 1º do art. 302 do CTB

Importante!!!

O fato de o autor de homicídio culposo na direção de veículo automotor estar com a CNH vencida não justifica a aplicação da causa especial de aumento de pena descrita no inciso I do § 1º do art. 302 do CTB.

O inciso I do § 1º do art. 302 pune o condutor que "não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação". O fato de o condutor estar com a CNH vencida não se amolda a essa previsão não se podendo aplicá-lo por analogia in malam partem.

STJ. 6ª Turma. HC 226.128-TO, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 7/4/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: João, conduzindo imprudentemente veículo automotor, atropelou e matou um pedestre. Ao chegar no local, a polícia constatou que a Carteira Nacional de Habilitação de João estava vencida. Diante disso, o Ministério Público denunciou o motorista pela prática de homicídio culposo na direção de veículo automotor com a incidência da causa de aumento prevista no inciso I do § 1º do art. 302:

Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor: Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. § 1º No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) à metade, se o agente: I - não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação;

O réu se defendeu afirmando que a causa de aumento não se aplica ao caso porque ele possuía (e possui) Carteira de Habilitação. Ela simplesmente estava vencida no momento do acidente. O fato de estar vencida não pode ser equiparada à inexistência de CNH. A defesa do réu foi acolhida pelo STJ? SIM. O fato de o autor de homicídio culposo na direção de veículo automotor estar com a CNH vencida não justifica a aplicação da causa especial de aumento de pena descrita no inciso I do § 1º do art. 302 do CTB. STJ. 6ª Turma. HC 226.128-TO, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 7/4/2016 (Info 581). Dirigir sem possuir CNH é uma conduta diferente de dirigir com CNH vencida. Isso fica muito claro ao se analisar o art. 162 do CTB, onde são previstas as infrações administrativas de trânsito. Confira:

Art. 162. Dirigir veículo: I - sem possuir Carteira Nacional de Habilitação ou Permissão para Dirigir: Infração - gravíssima; Penalidade - multa (três vezes) e apreensão do veículo; (...) V - com validade da Carteira Nacional de Habilitação vencida há mais de trinta dias: (...)

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Essas situações, embora igualmente configurem infração de trânsito, foram tratadas separadamente, de forma diversa. Em relação ao crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, o inciso I do § 1º do art. 302 do CTB determina que a pena será aumentada de 1/3 (um terço) à metade se o agente "não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação". Ora, se o legislador quisesse punir de forma mais gravosa o autor de homicídio culposo na direção de veículo automotor cuja CNH estivesse vencida, teria feito expressa alusão a esta hipótese. No Direito Penal não se admite a analogia in malam partem, de modo que não se pode inserir no rol das circunstâncias que agravam a pena (art. 302, § 1º) uma conduta que não foi prevista expressamente.

ESTATUTO DO DESARMAMENTO Porte de arma de fogo por vigia após o horário de expediente

O fato de o empregador obrigar seu empregado a portar arma de fogo durante o exercício das atribuições de vigia não caracteriza coação moral irresistível (art. 22 do CP) capaz de excluir a culpabilidade do crime de "porte ilegal de arma de fogo de uso permitido" (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) atribuído ao empregado que tenha sido flagrado portando, em via pública, arma de fogo, após o término do expediente laboral, no percurso entre o trabalho e a sua residência.

STJ. 5ª Turma. REsp 1.456.633-RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 5/4/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: João estava voltando para casa quando foi parado em uma blitz da PM. Os policiais encontraram com ele um revólver .38 (arma de uso permitido). Ocorre que João não possui porte de arma. Diante disso, ele foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 14 do Estatuto do Desarmamento. A Defensoria Pública, que fez a assistência jurídica do réu, alegou que ele deveria ser absolvido por inexigibilidade de conduta diversa (causa de exclusão da culpabilidade). Isso porque, segundo explicou o réu, ele só portava arma de fogo porque trabalhava como vigia de uma chácara e seu patrão o obrigava a usar o revólver a fim de defender a propriedade. Se fosse por João, ele nem usaria arma. A tese da defesa foi aceita pelo STJ? NÃO. O fato de o empregador obrigar seu empregado a portar arma de fogo durante o exercício das atribuições de vigia não caracteriza coação moral irresistível (art. 22 do CP) capaz de excluir a culpabilidade do crime de "porte ilegal de arma de fogo de uso permitido" (art. 14 da Lei nº 10.826/2003) atribuído ao empregado que tenha sido flagrado portando, em via pública, arma de fogo, após o término do expediente laboral, no percurso entre o trabalho e a sua residência. STJ. 5ª Turma. REsp 1.456.633-RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 5/4/2016 (Info 581). Segundo o Ministro Relator, esse argumento até poderia, em tese, justificar a aplicação da excludente de culpabilidade se o réu tivesse sido flagrado portando a arma no exercício de sua atividade laboral. No entanto, ele foi preso com o revólver quando já não estava mais trabalhando e fora dos limites da chácara. Assim, o STJ entendeu que não se deve aceitar o argumento de que o réu estivesse sob influência de coação moral irresistível, até porque, quando praticou a conduta proibida, estava fora do horário e de seu ambiente de trabalho, livre, portanto, da relação de subordinação que o obrigava a portar arma de fogo de modo ilegal.

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A inexigibilidade de conduta diversa somente funciona como causa de exclusão da culpabilidade quando proceder de forma contrária à lei se mostra como única alternativa possível diante de determinada situação. Se há outros meios de solução do impasse, a exculpante não se caracteriza.

Vale ressaltar, por fim, que o acusado em questão era "vigia" e não "vigilante armado". O "vigia" não pode usar arma no exercício de suas funções. Já o vigilante é um profissional contratado por estabelecimentos financeiros ou por empresa especializada em prestação de serviços de vigilância e transporte de valores, sendo categoria regulamentada pela Lei nº 7.102/83, possuindo o direito de portar armas de fogo, quando em efetivo exercício da profissão. Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. REsp 1221960/SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 22/02/2011.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

SIGILO BANCÁRIO Entrega espontânea de documentos por ex-companheira de investigado e sigilo bancário

Não configura quebra de sigilo bancário e fiscal o acesso do MP a recibos e comprovantes de depósitos bancários entregues espontaneamente pela ex-companheira do investigado os quais foram voluntariamente deixados sob a responsabilidade dela pelo próprio investigado.

STJ. 5ª Turma. RHC 34.799-PA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 17/3/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: João é um rico empresário que, em conluio com políticos, vencia todas as licitações da cidade fornecendo as mercadorias com preços superfaturados. Tudo estava tranquilo, até que ele se envolveu com a sua secretária e decidiu abandonar Maria, sua companheira, com quem estava há mais de 20 anos. Maria não se envolvia nos negócios do ex-companheiro, mas desconfiava que eles eram ilícitos por conta de umas conversas suspeitas que ouvia quando políticos visitavam a sua casa. Ela lembrou, então, que certa vez, quando ainda estavam juntos, João lhe pediu para guardar, em um local escondido, uma caixa com diversos documentos. Maria pegou a caixa que estava guardada com ela e levou até o Ministério Público. O membro do Parquet, na mesma hora, instaurou um procedimento de investigação criminal, tomou as declarações de Maria relatando os negócios suspeitos e fez um termo de recebimento da caixa com os documentos que foram entregues espontaneamente pela ex-companheira de João. Alguns dias depois, o MP passou a analisar os documentos entregues e verificou que havia ali elementos indiciários de pagamentos de propinas e de superfaturamento. Além disso, na caixa havia extratos bancários impressos que comprovariam aumento desproporcional do patrimônio do investigado. Com base em tais documentos, foi oferecida denúncia contra João. A defesa suscitou a nulidade das provas obtidas argumentando que o MP, ao perceber que se tratava de documentos protegidos pelo sigilo, deveria ter recusado o recebimento da caixa ou a entregue para João (titular dos documentos). Dessa forma, teria havido quebra ilegal de sigilo bancário.

A tese da defesa foi aceita pelo STJ? NÃO.

Não configura quebra de sigilo bancário e fiscal o acesso do MP a recibos e comprovantes de depósitos bancários entregues espontaneamente pela ex-companheira do investigado, os quais foram voluntariamente deixados sob a responsabilidade dela pelo próprio investigado. STJ. 5ª Turma. RHC 34.799-PA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 17/3/2016 (Info 581).

Informativo 581-STJ (14/04 a 28/04/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 28

O STJ entendeu que, no caso concreto, os documentos em questão não estavam protegidos pelo sigilo bancário e/ou fiscal (art. 5º, XII, da CF/88). Isso porque o sigilo bancário é um dever jurídico imposto às instituições financeiras para que estas não divulguem informações acerca das movimentações financeiras de seus clientes, tais como aplicações, depósitos, saques etc. Tal imposição legal deriva do próprio art. 1º da LC 105/2001, que assim dispõe:

Art. 1º As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.

Semelhante ao dever jurídico imposto às instituições financeiras, o art. 198 do CTN, igualmente, proibiu à Fazenda Pública e seus servidores públicos de divulgarem qualquer informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira dos contribuintes ou de terceiros. Veja:

Art. 198. Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades.

Assim, tanto as instituições financeiras quanto a Administração Pública não estão autorizadas a fornecer dados financeiros e/ou fiscais que detenham em razão do exercício de suas atividades e funções, salvo, conforme previsão do art. 5º, XII, da CF/88, mediante autorização judicial devidamente motivada. No caso dos autos, contudo, os documentos utilizados pelo Ministério Público para oferecimento da denúncia não se encontravam sob a autoridade e posse de instituições financeiras e/ou da Administração Pública. Eles estavam sob a posse da ex-companheira do réu que, espontaneamente, os entregou ao Parquet. Dessa forma, verifica-se que não houve, em nenhum momento, quebra ilegal de sigilo bancário e/ou fiscal por parte do MP, visto que os dados fornecidos não se encontravam mais sob a tutela de instituições financeiras e/ou da Administração Pública, às quais é imposta a obrigatoriedade de proteção do sigilo bancário e fiscal, mas, sim, tratava-se de recibos que foram, espontaneamente, impressos e guardados pelo próprio investigado, o qual, voluntariamente, os deixou sob a responsabilidade de sua companheira, tendo esta os entregado por livre vontade ao Ministério Público. Logo, constata-se que tais documentos entregues não estavam acobertados pelo direito fundamental do sigilo bancário e/ou fiscal, não incidindo, pois, a cláusula de reserva de jurisdição descrita no artigo 5º, XII, da Carta Magna.

EXECUÇÃO PENAL Execução provisória de pena em ação penal originária

Importante!!!

É possível a execução provisória de pena imposta em acórdão condenatório proferido em ação penal de competência originária de tribunal.

Desse modo, a 6ª Turma do STJ acompanha o novo entendimento do STF decidido no HC 126292/SP (Info 814) mesmo ainda não tendo havido a publicação do acórdão do Supremo.

STJ. 6ª Turma. EDcl no REsp 1.484.415-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 3/3/2016 (Info 581).

Imagine a seguinte situação hipotética: João é Deputado Estadual e foi denunciado no Tribunal de Justiça pela prática de diversos crimes. O TJ julgou a ação penal e condenou o Deputado a 10 anos de reclusão em regime inicial fechado.

Informativo 581-STJ (14/04 a 28/04/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 29

Contra este acórdão, o réu interpôs recurso especial, que ainda não foi julgado. O Ministério Público requereu, então, a execução provisória da pena, ou seja, que o réu inicie o cumprimento da pena privativa de liberdade enquanto aguarda o trânsito em julgado. O pedido do MP poderá ser acolhido? SIM. É possível a execução provisória de pena imposta em acórdão condenatório proferido em ação penal de competência originária de tribunal. STJ. 6ª Turma. EDcl no REsp 1.484.415-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 3/3/2016 (Info 581). O STF decidiu recentemente que a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência (STF. Plenário. HC 126292/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 17/02/2016. Info 814). Os recursos especial e extraordinário interpostos pela defesa contra o acórdão condenatório não possuem efeito suspensivo (art. 637 do CPP). Isso significa que, mesmo a parte tendo interposto algum desses recursos, a decisão recorrida continua produzindo efeitos. Logo, é possível a execução provisória do acórdão condenatório enquanto se aguarda o julgamento do recurso. Vale ressaltar que o STJ acompanhou o novo entendimento do STF decidido no HC 126292/SP mesmo ainda não tendo havido a publicação do acórdão do Supremo.

EXECUÇÃO PENAL Competência para expedição de guia de recolhimento de réu em execução provisória de pena

Em execução provisória de pena fixada em ação penal originária, a expedição de guia de recolhimento de réu cabe ao tribunal competente para processá-la e julgá-la.

STJ. 6ª Turma. EDcl no REsp 1.484.415-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 3/3/2016 (Info 581).

O que é a "guia de recolhimento"? Guia de recolhimento é um documento preparado pelo escrivão (ou Diretor de Secretaria) e assinado pelo juiz, depois que o réu é condenado, e no qual deverão estar presentes as seguintes informações: I - nome do condenado; II - qualificação civil e o seu número de identidade; III - inteiro teor da denúncia e da sentença condenatória; IV - certidão do trânsito em julgado (caso já exista); V - informação sobre os antecedentes criminais VI - informação sobre o seu grau de instrução; VII - data em que será encerrada a pena; VIII - outras peças do processo reputadas indispensáveis ao adequado tratamento penitenciário. A guia de recolhimento, também chamada de "carta de guia" em alguns Estados, deve ser expedida em duas vias, sendo uma encaminhada para a autoridade administrativa que custodia o executado (ex: Diretor do presídio) e outra para o juízo da execução penal competente (ex: juiz da vara de execuções penais).

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Ao receber a guia de recolhimento, o juiz da vara de execuções penais ordenará a formação do Processo de Execução Penal (PEP), que deverá ser instruído com diversos documentos listados no art. 1º da Resolução 113/2010 do CNJ. Ninguém pode ser recolhido para cumprimento de pena privativa de liberdade sem a guia expedida pela autoridade judiciária (art. 107 da LEP). A guia de recolhimento só é expedida após o trânsito em julgado? Se você ler o texto da LEP, pode pensar que sim. Confira:

Art. 105. Transitando em julgado a sentença que aplicar pena privativa de liberdade, se o réu estiver ou vier a ser preso, o Juiz ordenará a expedição de guia de recolhimento para a execução.

Ocorre que o STF e o STJ, assim como o CNJ, entendem que deverá ser expedida guia de recolhimento mesmo que ainda não tenha havido trânsito em julgado, desde que se trate de réu preso. Neste caso, o documento será chamado de "guia de recolhimento provisória". Estabelece o art. 8º da Resolução 113/2010 do CNJ:

Art. 8º Tratando-se de réu preso por sentença condenatória recorrível, será expedida guia de recolhimento provisória da pena privativa de liberdade, ainda que pendente recurso sem efeito suspensivo, devendo, nesse caso, o juízo da execução definir o agendamento dos benefícios cabíveis. (...) Art. 10. Sobrevindo decisão absolutória, o respectivo órgão prolator comunicará imediatamente o fato ao juízo competente para a execução, para anotação do cancelamento da guia.

A emissão desse documento é uma garantia para o réu. Isso porque como ele irá, em tese, aguardar o recurso preso, é importante que o juiz das execuções penais acompanhe sua situação a fim de lhe conceder eventuais benefícios da execução que possam surgir enquanto não há o trânsito em julgado. É o caso, por exemplo, da progressão de regime. Se o réu condenado por crime não hediondo ficar preso mais que 1/6 da pena enquanto aguarda o julgamento de seu recurso, ele poderá ter direito à progressão de regime mesmo ainda não tendo havido trânsito em julgado. Imagine agora a seguinte situação hipotética: João é Deputado Estadual e foi denunciado no Tribunal de Justiça pela prática de diversos crimes. O TJ julgou a ação penal e condenou o Deputado a 10 anos de reclusão em regime inicial fechado. Contra este acórdão, o réu interpôs recurso especial, que ainda não foi julgado. O TJ, com base na decisão do STF no HC 126292/SP (Info 814), decidiu que o réu deverá iniciar o cumprimento da pena enquanto aguarda o julgamento do Resp, já que este recurso não possui efeito suspensivo. Em outras palavras, o TJ determinou o início da execução provisória da pena. Isso significa que o réu deverá ser preso e será expedida uma guia de recolhimento provisória. De quem é a competência para expedir essa guia de recolhimento provisória: do TJ ou do juiz das execuções penais? Do TJ. Em execução provisória de pena fixada em ação penal originária, a expedição de guia de recolhimento de réu cabe ao tribunal competente para processá-la e julgá-la. STJ. 6ª Turma. EDcl no REsp 1.484.415-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 3/3/2016 (Info 581). Vale ressaltar, no entanto, que, depois de o TJ expedir a guia de recolhimento provisória, ele deverá remetê-la ao juízo da Vara de Execuções Penais para efetivo início da execução provisória das penas impostas ao réu.

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DIREITO TRIBUTÁRIO

PIS/COFINS Inclusão do ISSQN no conceito de receita ou faturamento para fins de incidência de PIS/COFINS

O valor suportado (pago) pelo beneficiário do serviço, nele incluindo a quantia referente ao ISSQN, compõe o conceito de receita ou faturamento para fins de adequação à hipótese de incidência da Contribuição para o PIS e COFINS.

Assim, o valor do ISSQN integra o conceito de receita bruta, assim entendida como a totalidade das receitas auferidas com o exercício da atividade econômica, de modo que não pode ser dedutível da base de cálculo do PIS e da COFINS.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.330.737-SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 10/6/2015 (recurso repetitivo) (Info 581).

Os chamados PIS e COFINS são duas diferentes “contribuições de seguridade social”, instituídas pela União, e destinadas a custear os serviços de saúde, previdência e assistência social (art. 194 da CF/88). Atualmente, o PIS é chamado de PIS/PASEP. PIS/PASEP O sentido histórico dessas duas siglas é o seguinte:

PIS: Programa de Integração Social.

PASEP: Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público. O PIS e o PASEP foram criados separadamente, mas desde 1976 foram unificados e passaram a ser denominados de PIS/PASEP. Segundo a Lei nº 10.637/2002, a contribuição para o PIS/Pasep incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil. COFINS Significa Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social. A COFINS (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) é uma espécie de tributo instituída pela Lei Complementar 70/91, nos termos do art. 195, I, “b”, da CF/88. A COFINS incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil (art. 1º da Lei nº 10.833/2003). Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "XX" (prestadora de serviços) é contribuinte de PIS/COFINS. Durante o mês de maio, ela foi contratada por 4 tomadores de serviço (beneficiário de serviço). Ela recebeu R$ 25 mil de cada um dos quatro. Assim, no mês, o total das receitas auferidas pela empresa foi R$ 100 mil. O fisco cobrou o PIS/COFINS com base nesse valor (alíquota x 100 mil = tributo devido). A empresa não concordou e afirmou que dos R$ 25 mil que cada tomador de serviço pagou, R$ 20 mil ficava com ela e R$ 5 mil eram repassados ao Município a título de pagamento de imposto sobre serviços. Assim, descontando o ISSQN, ela recebeu apenas R$ 80 mil (R$ 20 mil de cada um dos quatro). Em suma, para a empresa, a quantia paga a título de ISSQN não pode ser incluída na base de cálculo do PIS/COFINS. Como reforço de seu argumento, a empresa mostrou as notas fiscais dos serviços que prestou e nela consta, em separado, a seguinte descrição "ISSQN R$ 5 mil", o que demonstra que houve separação do pagamento do tributo com a receita auferida pela prestadora do serviço.

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A tese da empresa foi acolhida pelo STJ? NÃO.

O valor suportado (pago) pelo beneficiário do serviço, nele incluindo a quantia referente ao ISSQN, compõe o conceito de receita ou faturamento para fins de adequação à hipótese de incidência da Contribuição para o PIS e COFINS. Assim, o valor do ISSQN integra o conceito de receita bruta, assim entendida como a totalidade das receitas auferidas com o exercício da atividade econômica, de modo que não pode ser dedutível da base de cálculo do PIS e da COFINS. STJ. 1ª Seção. REsp 1.330.737-SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 10/6/2015 (recurso repetitivo) (Info 581).

As Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003 estabeleceram como fato gerador da Contribuição para o PIS e COFINS "o faturamento mensal, assim entendido o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil".

O valor correspondente ao ISS suportado faticamente pelo consumidor (contribuinte de fato), mas recolhido aos cofres públicos pelo prestador de serviço (contribuinte de direito), inclui-se no conceito de receita ou faturamento para fins de incidência da Contribuição para o PIS e COFINS, exações cujo sujeito passivo de direito corresponde ao mesmo contribuinte de direito do ISS, qual seja, o prestador do serviço.

O fato de constar em nota fiscal informação no sentido de que o valor com o qual arcará o destinatário do serviço compreende quantia correspondente ao valor do ISSQN não torna o consumidor contribuinte desse tributo a ponto de se acolher a tese da empresa. Admitir essa tese seria o mesmo que considerar o consumidor como sujeito passivo de direito do tributo (contribuinte de direito) do ISS e o prestador do serviço seria apenas um "substituto tributário", cuja função seria apenas a de recolher aos cofres públicos a exação devida por terceiro, no caso o consumidor. Ocorre que isso não encontra amparo na legislação, pois o consumidor não é contribuinte do ISS.

O consumidor pode até, na prática, suportar o valor do tributo, já que a empresa "embute" no preço do serviço o valor que ela irá pagar de ISS. No entanto, isso não transforma o tomador do serviço no contribuinte de direito do ISS. A lei prevê que o sujeito passivo do ISS é a prestadora do serviço.

A hipótese não se confunde, portanto, com aquela em que se tem a chamada responsabilidade tributária por substituição, em que determinada entidade, por força de lei, figura no polo passivo de uma relação jurídico-tributária obrigacional, cuja prestação (o dever) consiste em reter o tributo devido pelo substituído para, posteriormente, repassar a quantia correspondente aos cofres públicos. Se fosse essa a hipótese (substituição tributária), é certo que a quantia recebida pelo contribuinte do PIS e da COFINS a título de ISSQN não integraria o conceito de faturamento. No mesmo sentido se o ônus referente ao ISSQN não fosse transferido ao consumidor do serviço. Nesse caso, não haveria dúvida de que o valor referente ao ISSQN não corresponderia à receita ou ao faturamento, já que faticamente suportado pelo contribuinte de direito, qual seja, o prestador do serviço.

Em suma, quem possui o dever de pagar o ISSQN é a empresa prestadora do serviço. Ela repassa essa quantia para o consumidor embutida no preço do serviço. Logo, ela recebe esse valor e o utiliza para pagar uma obrigação que é sua (o imposto). Dessa forma, não se pode dizer que não se trate de uma receita sua, já que utilizada para pagar suas obrigações tributárias.

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DIREITO ADUANEIRO Momento da exigência de certidão negativa de débito no caso de drawback

Súmula 569-STJ: Na importação, é indevida a exigência de nova certidão negativa de débito no desembaraço aduaneiro, se já apresentada a comprovação da quitação de tributos federais quando da concessão do benefício relativo ao regime de drawback.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 27/04/2016, DJe 02/05/2016.

Comprovação de quitação de tributos federais Para que o contribuinte possa receber incentivos ou benefícios fiscais relacionados com tributos federais, ele não pode estar em débito com o Fisco federal. Assim, ao requerer o incentivo ou benefício, o contribuinte deverá apresentar uma certidão negativa comprovando que todos os tributos federais estão quitados. Tal exigência encontra-se prevista no art. 60 da Lei nº 9.069/95 e no art. 47, I, “a”, da Lei nº 8.212/91:

Art. 60. A concessão ou reconhecimento de qualquer incentivo ou benefício fiscal, relativos a tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal fica condicionada à comprovação pelo contribuinte, pessoa física ou jurídica, da quitação de tributos e contribuições federais.

Art. 47. É exigida Certidão Negativa de Débito-CND, fornecida pelo órgão competente, nos seguintes casos: I - da empresa: a) na contratação com o Poder Público e no recebimento de benefícios ou incentivo fiscal ou creditício concedido por ele;

Drawback Drawback é uma palavra de origem inglesa, cuja tradução literal seria algo como "arrastar de volta". Trata-se de uma operação pela qual o contribuinte se compromete a importar a mercadoria, beneficiá-la e, depois, mandá-la de volta ao exterior (exportá-la). Nas palavras do Min. João Otávio de Noronha, "drawback" é a operação mediante a qual o contribuinte, para fazer jus a incentivos fiscais, importa mercadoria com o compromisso de exportá-la após o beneficiamento." (STJ REsp 385634/BA). Com a maestria de quem conhece muito sobre Direito Tributário, a Min. Regina Helena Costa explica, de forma mais técnica, em que consiste o drawback: "O drawback constitui um regime aduaneiro especial, que pode apresentar-se em três modalidades - isenção, suspensão e restituição de tributos - e é classificado como incentivo à exportação, nos termos dos arts. 1º, I, da Lei nº 8.402/92 e 383, caput, do Decreto nº 6.759/09. O incentivo consubstancia-se na desoneração do processo de produção o que acaba tornando a subsequente mercadoria nacional mais competitiva no mercado global." (STJ REsp 1313705/PR). Exemplo: uma indústria de automóveis importa matérias-primas, fabrica carros no Brasil e os revende para o exterior. Para o Brasil, isso é algo produtivo, considerando que favorece a balança comercial, já que houve o ingresso de uma mercadoria que será em seguida reenviada para o exterior com um valor maior em razão do melhoramento do produto (agregou-se valor à mercadoria que será exportada). Com isso, em tese, mais divisas ficam no país, gerando aqui emprego e renda. Diante desse cenário, o país incentiva a referida operação, concedendo benefícios fiscais para o contribuinte que se compromete a realizar o drawback.

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Concessão do benefício e desembaraço aduaneiro Para que o contribuinte possa participar do drawback, é necessário que ele assuma junto ao Governo um compromisso de exportação. A Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) analisa o pedido e autoriza (ou não) a importação com a suspensão dos tributos. No momento em que formula o pedido, já se exige que o contribuinte apresente a certidão negativa de tributos federais. Ocorre que, posteriormente, no momento em que a mercadoria chega ao Brasil e o importador vai realizar o desembaraço aduaneiro, o Governo exige novamente a apresentação da certidão negativa. O STJ, contudo, entende que é indevida a exigência da certidão negativa nestes dois momentos distintos. Assim, “apresentada a certidão negativa, antes da concessão do benefício por operação Drawback, não é lícito condicionar-se à apresentação de novo certificado negativo no desembaraço aduaneiro da respectiva importação." (STJ. 1ª Turma. REsp 196.161/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgado em 16/11/1999). Drawback: ato complexo O argumento do STJ para que a certidão negativa seja exigida somente uma vez está no fato de que o drawback é uma operação única que, no entanto, se divide em três momentos distintos: a) quando a mercadoria ingressa no território nacional; b) quando a mercadoria, no País, sofre o beneficiamento; e c) quando a mercadoria beneficiada vai ser reexportada (REsp 240.322/RS). Assim, o drawback é um ato complexo, que se forma a partir da conjugação dessas três fases, não sendo lícito exigir-se a certidão negativa em cada uma de suas etapas. Outra razão invocada pelo STJ está na redação do art. 60 da Lei nº 9.069/95. Isso porque o referido dispositivo afirma que a comprovação, pelo contribuinte, da quitação de tributos federais deve ocorrer no momento da “concessão ou reconhecimento” de qualquer incentivo ou benefício fiscal. Dessa forma, a certidão é exigida em um momento ou no outro. E não nos dois. Assim, quando o Fisco aceitou o compromisso do contribuinte de fazer o drawback, ele já concedeu o benefício, exigindo, para tanto, a certidão negativa. Logo, não é devida nova exigência no momento do desembaraço.

Este entendimento consolidado do STJ foi agora convertido em uma súmula: Súmula 569-STJ: Na importação, é indevida a exigência de nova certidão negativa de débito no desembaraço aduaneiro, se já apresentada a comprovação da quitação de tributos federais quando da concessão do benefício relativo ao regime de drawback.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

APOSENTADORIA RURAL Extinção de processo por ausência de início de prova material de atividade rural

e possibilidade de ajuizamento de nova demanda

Importante!!!

Se a petição inicial de ação em que se postula a aposentadoria rural por idade não for instruída com documentos que demonstrem início de prova material quanto ao exercício de atividade rural, o processo deve ser extinto sem resolução de mérito por falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo (art. 485, IV, do CPC). Isso significa que o segurado poderá ajuizar nova ação caso reúna os elementos necessários a essa iniciativa (art. 486, § 1º).

STJ. Corte Especial. REsp 1.352.721-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 16/12/2015 (recurso repetitivo) (Info 581).

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NOÇÕES GERAIS SOBRE O INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA ATIVIDADE RURAL

Para ter direito à aposentadoria rural, a pessoa pode comprovar o exercício de atividade rurícola com base apenas em testemunhas? NÃO. Existe até mesmo uma súmula afirmando isso.

Súmula 149-STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.

Assim, a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, sendo indispensável que ela venha corroborada por razoável início de prova material, conforme exige o art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991:

Art. 55 (...) § 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.

A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material. Início de prova material “Considera-se início de prova material, para fins de comprovação da atividade rural, documentos que contêm a profissão ou qualquer outro dado que evidencie o exercício da atividade rurícola e seja contemporâneo ao fato nele declarado. Na prática previdenciária, o mais comum é a certidão de casamento em que conste a profissão de lavrador; atestado de frequência escolar em que conste a profissão e o endereço rural; declaração do Tribunal Regional Eleitoral; declaração de ITR; contrato de comodato etc.” (AMADO, Frederico. Direito e processo previdenciário sistematizado. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 566). O segurado pode apresentar prova material de apenas uma parte do tempo de serviço e se valer de testemunhas para comprovar o restante? SIM. Pode haver a apresentação de prova material de apenas parte do lapso temporal, de forma que a prova material seja complementada por prova testemunhal idônea. Segundo o STJ, não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo o período de carência estabelecido pelo art. 143 da Lei nº 8.213/91, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória, vinculando-o, pelo menos, a uma fração daquele período (AgRg no REsp 1326080/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 06/09/2012). No mesmo sentido entende a TNU:

Súmula 14-TNU: Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício.

Vale ressaltar, no entanto, a necessidade de que a prova seja contemporânea aos fatos que se pretende provar:

Súmula 34-TNU: Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à epoca dos fatos a provar.

Qual é o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural? Essa relação encontra-se prevista no art. 106 da Lei nº 8.213/91:

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Art. 106. A comprovação do exercício de atividade rural será feita, alternativamente, por meio de: I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social; II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural; III – declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural ou, quando for o caso, de sindicato ou colônia de pescadores, desde que homologada pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS; IV – comprovante de cadastro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar; V – bloco de notas do produtor rural; VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7º do art. 30 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor; VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante; VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização da produção; IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da comercialização de produção rural; ou X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra.

Esse rol de documentos é taxativo ou o requerente pode se valer de outros tipos de documento? Trata-se de rol meramente EXEMPLIFICATIVO, sendo admissíveis, portanto, outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo. Nesse sentido:

Súmula 6-TNU: A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola.

NOÇÕES GERAIS SOBRE O INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA ATIVIDADE RURAL

Imagine a seguinte situação hipotética: João, trabalhador rural, deseja se aposentar. Após ter o pedido negado administrativamente, ele ingressou com ação judicial contra o INSS pedindo a concessão da aposentadoria por idade rural. Como início de prova material, João juntou três documentos (docs. 1, 2 e 3). O Juiz Federal julgou improcedente o pedido afirmando que os documentos apresentados não são suficientes para comprovar o exercício de atividade rural pelo período correspondente à carência. O juiz, ao decidir que não existem nos autos documentos que se constituam em início de prova material da atividade rural, deverá extinguir o processo com ou sem resolução do mérito? Essa sentença proferida é definitiva ou terminativa? Trata-se de sentença terminativa. Se a petição inicial de ação em que se postula a aposentadoria rural por idade não for instruída com documentos que demonstrem início de prova material quanto ao exercício de atividade rural, o processo deve ser extinto sem resolução de mérito (art. 485, IV, do CPC 2015). Mas o ônus da prova não é do autor? Se ele deixa de juntar os documentos necessários, a sentença não deveria ser de mérito? Realmente, o ônus da prova incumbe ao autor quanto ao fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC 2015). Entretanto, não se desconhece as dificuldades enfrentadas pelo segurado para comprovar documentalmente que preenche os requisitos necessários para a concessão do benefício, uma vez que normalmente se referem a fatos que remontam considerável transcurso de tempo.

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Por conta disso, segundo o STJ, as normas de Direito Processual Civil devem ser aplicadas ao Processo Judicial Previdenciário levando-se em conta os valores constitucionais de proteção da Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários. Assim, a aplicação do processo civil no Direito Previdenciário deve levar em consideração as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da CF/88, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado. Qual é a relevância desse debate? Qual é a consequência de o STJ dizer que o juiz deverá extinguir o processo sem resolução de mérito? Ao afirmar que o juiz deve extinguir o processo sem resolução de mérito, o STJ autoriza que a parte autora proponha novamente a mesma ação, desde que junte novos documentos que constituam início de prova material. Assim, voltando ao nosso exemplo, João poderá repropor a ação desde que traga novo documento que, na sua visão, poderá servir como início de prova material. Na primeira ação ele juntou os docs. 1, 2 e 3. No entanto, procurando na gaveta de sua casa, ele achou uma certidão de casamento religioso na qual constava que ele era agricultor. Diante disso, ele propõe novamente a ação trazendo aos autos este documento diferente daqueles já apresentados. Essa nova ação é proposta com base em qual dispositivo do CPC?

Art. 486. O pronunciamento judicial que não resolve o mérito não obsta a que a parte proponha de novo a ação. § 1º No caso de extinção em razão de litispendência e nos casos dos incisos I, IV, VI e VII do art. 485, a propositura da nova ação depende da correção do vício que levou à sentença sem resolução do mérito.

Resumindo: Se a petição inicial de ação em que se postula a aposentadoria rural por idade não for instruída com documentos que demonstrem início de prova material quanto ao exercício de atividade rural, o processo deve ser extinto sem resolução de mérito por falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo (art. 485, IV, do CPC). Isso significa que o segurado poderá ajuizar nova ação caso reúna os elementos necessários a essa iniciativa (art. 486, § 1º). STJ. Corte Especial. REsp 1.352.721-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 16/12/2015 (recurso repetitivo) (Info 581).

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DIREITO DO TRABALHO

FGTS Taxa progressiva de juros do FGTS e trabalhador avulso

Súmula 571-STJ: A taxa progressiva de juros não se aplica às contas vinculadas ao FGTS de trabalhadores qualificados como avulsos.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 27/04/2016, DJe 02/05/2016.

FGTS FGTS é a sigla para Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. O FGTS foi criado pela Lei n.º 5.107/66 com o objetivo de proteger o trabalhador demitido sem justa causa. Atualmente, o FGTS é regido pela Lei n.º 8.036/90. Em que consiste o FGTS? O FGTS nada mais é do que uma conta bancária aberta em nome do trabalhador e vinculada a ele no momento em que celebra seu primeiro contrato de trabalho. Nessa conta bancária, o empregador deposita todos os meses o valor equivalente a 8% do salário pago ao empregado, acrescido de juros e atualização monetária (conhecidos pela sigla “JAM”). Assim, vai sendo formado um fundo de reserva financeira para o trabalhador, ou seja, uma espécie de “poupança”, que é utilizada pelo obreiro quando fica desempregado sem justa causa ou quando precisa para alguma finalidade relevante, assim considerada pela lei. Se o empregado for demitido sem justa, o empregador é obrigado a depositar, na conta vinculada do trabalhador, uma indenização compensatória de 40% do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros (art. 18, § 1º da Lei nº 8.036/90). O trabalhador que possui conta do FGTS vinculada a seu nome é chamado de trabalhador participante do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. O trabalhador poderá levantar (“sacar”) o valor depositado em sua conta do FGTS? SIM, mas somente em algumas situações previstas na Lei. O art. 20 da Lei n.º 8.036/90 prevê as hipóteses em que o trabalhador poderá movimentar a sua conta vinculada no FGTS. São exemplos:

Se o trabalhador for despedido sem justa causa;

Se se aposentar;

Se ele (ou algum dependente) for acometido de neoplasia maligna (câncer), HIV ou outra doença grave;

Se houver necessidade pessoal, cuja urgência e gravidade decorra de desastre natural. Taxa progressiva de juros - histórico Os valores depositados na conta do FGTS são atualizados monetariamente (para recompor as perdas da inflação) e sobre eles também incidem juros remuneratórios. Isso tudo com o objetivo de que, quando o trabalhador for sacar tais quantias, elas tenham sido beneficiadas com uma rentabilidade. Sobre os juros que incidem no FGTS, é importante traçar o seguinte histórico:

A Lei nº 5.107/66 criou o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), mas este sistema não era obrigatório. Assim, os trabalhadores poderiam continuar vinculados ao sistema antigo (estabilidade) ou optar pelo FGTS. A Lei conferiu um prazo de 365 dias para os trabalhadores decidirem se queriam ou não optar pelo regime do FGTS;

O art. 4º da Lei nº 5.107/66 previu que os valores depositados pelos empregadores nas contas individuais dos empregados teriam direito às seguintes taxas de juros:

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I - 3% durante os 2 primeiros anos de permanência na mesma empresa; II - 4% do 3º ao 5º ano de permanência na mesma empresa; III - 5% do 6º ao 10º ano e permanência na mesma empresa; IV - 6% do 11º ano de permanência na mesma empresa, em diante.

Essa tabela acima ficou conhecida como “taxa progressiva de juros” do FGTS, considerando que ela ia aumentando com o passar dos anos na mesma empresa;

Dessa forma, a taxa progressiva de juros foi prevista inicialmente pelo art. 4º da Lei nº 5.107/66 (Lei que criou o FGTS);

Ocorre que a Lei nº 5.705/71 (que entrou em vigor em 22/09/1971) extinguiu a taxa progressiva de juros e determinou que só incidiriam juros fixos de 3% ao ano, independentemente dos anos de empresa que o trabalhador tivesse. No entanto, a Lei nº 5.705/71 trouxe uma regra de transição e permitiu que os trabalhadores que já estavam no FGTS antes da sua vigência (22/09/1971) pudessem optar pela continuidade das taxas progressivas;

Sobre o tema, vale ainda mencionar a Lei nº 5.958/73, que disse o seguinte: os trabalhadores que começaram a trabalhar antes da Lei nº 5.107/66 e que ainda não estavam vinculados ao FGTS poderão optar por este regime, de forma retroativa. Veja a redação da Lei: “Art. 1º Aos atuais empregados, que não tenham optado pelo regime instituído pela Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, é assegurado o direito de fazê-lo com efeitos retroativos a 1º de janeiro de 1967 ou à data da admissão ao emprego se posterior àquela, desde que haja concordância por parte do empregador.”

Essas pessoas que fizeram a opção, nos termos do art. 1º da Lei nº 5.958/73, possuem também direito de opção pelos juros progressivos. Nesse sentido: Súmula 154-STJ: Os optantes pelo FGTS, nos termos da Lei nº 5.958, de 1973, tem direito a taxa progressiva dos juros, na forma do art. 4º, da Lei nº 5107, de 1966;

A Lei que atualmente rege o FGTS (Lei nº 8.036/90) repetiu a mesma regra da Lei nº 5.705/71 e confirmou que a taxa de juros somente é devida para os trabalhadores que, em 22/09/1971, já possuíam contas do FGTS e que optaram pela taxa progressiva. Veja o que diz a Lei nº 8.036/90:

Art. 13. Os depósitos efetuados nas contas vinculadas serão corrigidos monetariamente com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização juros de (três) por cento ao ano. (...) §3º Para as contas vinculadas dos trabalhadores optantes existentes à data de 22 de setembro de 1971, a capitalização dos juros dos depósitos continuará a ser feita na seguinte progressão, salvo no caso de mudança de empresa, quando a capitalização dos juros passará a ser feita à taxa de 3 (três) por cento ao ano: I - 3 (três) por cento, durante os dois primeiros anos de permanência na mesma empresa; II - 4 (quatro) por cento, do terceiro ao quinto ano de permanência na mesma empresa; III - 5 (cinco) por cento, do sexto ao décimo ano de permanência na mesma empresa; IV - 6 (seis) por cento, a partir do décimo primeiro ano de permanência na mesma empresa.

Vale ressaltar que esta opção pela taxa progressiva pode ser feita a qualquer momento, com efeito retroativo (art. 14, § 4º, da Lei nº 8.036/90). Basta, para isso, que, em 22/09/1971, o trabalhador já possuísse contas do FGTS.

Trabalhadores avulsos De acordo com o art. 9º, VI, do Decreto 3.048/99, trabalhador avulso é "aquele que, sindicalizado ou não, presta serviço de natureza urbana ou rural, a diversas empresas, sem vínculo empregatício, com a intermediação obrigatória do órgão gestor de mão-de-obra, nos termos da Lei nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, ou do sindicato da categoria, assim considerados".

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Os trabalhadores avulsos possuem direito ao FGTS? SIM. Os trabalhadores avulsos possuem direito ao FGTS (art. 7º, XXXIV, da CF/88).

Taxa de juros das contas do FGTS no caso de trabalhadores avulsos No caso das contas de FGTS vinculadas a trabalhadores avulsos, a Caixa Econômica não faz a atualização dos valores aplicando a taxa de juros progressivos, acima explicada. Segundo entende a CEF, o art. 4º da Lei nº 5.107/66 (atual 3º do art. 13 da Lei nº 8.036/90), ao falar em “anos de permanência na mesma empresa”, restringe a incidência da taxa de juros progressivos apenas aos trabalhadores empregados. Os trabalhadores avulsos, por sua vez, contra-argumentam alegando que a expressão “anos de permanência na mesma empresa” pode ser interpretada também como anos de permanência na mesma atividade. Logo, sustentam que eles também teriam direito às taxas de juros progressivos.

Qual foi o entendimento do STJ sobre o tema? Os trabalhadores avulsos possuem direito à taxa progressiva de juros do FGTS? NÃO.

A taxa progressiva de juros não se aplica às contas vinculadas ao FGTS de trabalhadores qualificados como avulsos. Como visto acima, é condição básica para a obtenção desse direito a “permanência na mesma empresa” por certo tempo. Para o STJ, não se pode confundir permanência na mesma empresa com permanência na mesma atividade profissional. O trabalhador avulso não permanece trabalhando anos “na mesma empresa”. Ao contrário, ele presta serviços a diversas empresas, sem vínculo empregatício. Logo, o trabalhador avulso não tem direito ao crédito de juros, na sua conta de FGTS, calculado na forma progressiva porque não se enquadra na previsão legal. Este já era o entendimento consolidado do STJ, inclusive em recurso repetitivo: STJ. 1ª Seção. REsp 1.349.059-SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 26/3/2014 (recurso repetitivo) (Info 546).

JULGADO NÃO COMENTADO

DIREITO CIVIL. POSSIBILIDADE DE ENTIDADE FECHADA DE PREVIDÊNCIA AUMENTAR EM ATÉ 12% OS JUROS NO MÚTUO FENERATÍCIO. A entidade fechada de previdência complementar contratada em mútuo feneratício pode, obedecido o limite de 12% ao ano, cobrar o aumento de taxa de juros pactuado do tomador do crédito (empregado do patrocinador e vinculado ao plano de benefícios oferecido pela mutuante) desde o desligamento deste da relação empregatícia, antes da extinção da obrigação decorrente desse contrato de crédito. Isso porque, como é cediço, os mútuos são oferecidos mediante modelos científicos que, efetivamente, tomam em consideração, na formação das taxas de juros, o risco de inadimplemento. Por isso mesmo, é notório que os empréstimos que envolvam desconto em folha costumam ter taxas mais favoráveis ao tomador, se comparados aos demais mútuos oferecidos pelos bancos. E tanto isso é verdade que um dos objetivos da Lei n. 10.820/2003, ao prescrever a consignação em folha dos pagamentos referentes a empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil contraídos por empregados celetistas, aposentados e pensionistas, foi facilitar o acesso a crédito, inclusive com taxas de juros menores, em razão dos menores riscos de inadimplência envolvendo os contratos de crédito consignado. Com efeito, é razoável que, enquanto houver a permanência do vínculo do participante com o patrocinador, é possível a concessão equânime de juros mais favorecidos, em vista da possibilidade de se efetuar o desconto das prestações do mútuo em folha de pagamento da patrocinadora, tal como é efetuado o desconto das contribuições para os planos de benefícios de previdência privada daqueles participantes que mantêm vínculo de emprego com o patrocinador. REsp 1.304.529-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/3/2016, DJe 22/4/2016.