impacto da legislaÇÃo ambiental na decisÃo...
TRANSCRIPT
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
IMPACTO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL NA DECISÃO PRODUTIVA DE
CARVÃO VEGETAL NO SUL DO BRASIL
IMPACT OF ENVIRONMENTAL LEGISLATION ON CHARCOAL PRODUCTION
DECISION IN SOUTHERN BRAZIL
LILIAN MALUF DE LIMA¹; LILIAN DE PELEGRINI ELIAS¹; RENEY DOROW²; CINTIA
ULLER GÓMEZ³;
.
1.UNICAMP, CAMPINAS - SP – BRASIL; 2.EPAGRI, FLORIANÓPOLIS - SC -
BRASIL; 3.FATMA, FLORIANÓPOLIS - SC - BRASIL;
Grupo de Pesquisa: 6. Agropecuária, Meio-Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
Resumo
Estudos exploratórios feitos no sul do Brasil evidenciaram a presença de produção de carvão
vegetal na agricultura familiar, que por ter sido associada a uma atividade considerada
“ilegal”, apresenta-se invisível aos olhos de órgãos de fomento e apoio à agricultura familiar.
Essa invisibilidade evidencia a ausência de esforço institucional no sentido de compreender os
processos socioambientais dessa população rural e compatibilizá-la à legislação vigente, como
forma de retirá-los da situação marginal em que se encontram. Nesse sentido, faz-se relevante
compreender o impacto da legislação na produção desses agricultores como forma de prover
readequações nos procedimentos dos organismos de extensão rural e fiscalização ambiental.
Como resultado desse estudo, observou-se que mesmo que a produção de carvão vegetal,
realizada por agricultores familiares na região Sul do Brasil seja desenvolvido num ambiente
legal restritivo, não houve diferença estatística no volume de carvão vegetal produzido entre
os agricultores familiares, independentemente do conhecimento ou não das regras ambientais
e seus riscos de punição associados, nos três estudos de caso. Impõem-se a necessidade de
promover avanços técnico-científicos quanto ao uso da matéria-prima para o
“carvoejamento”, bem como o modo de produção de carvão vegetal voltado para o consumo
doméstico.
Palavras-chave: Carvão Vegetal, Legislação Ambiental, Agricultura Familiar.
Abstract
Exploratory studies made in southern Brazil showed the presence of charcoal production on
family farms, which have been linked to an activity deemed "illegal", presents itself invisible
in the eyes of funding bodies and support for family agriculture. This invisibility highlights
the absence of institutional effort in order to understand the environmental processes of those
rural people and to make it compatible to the current legislation, in order to remove them
from marginal situation in which they find themselves. In this sense, it is important to
understand the impact of legislation on production of these farmers as a way to provide
adjustments in procedures of rural extension and supervisory bodies. As a result of this study,
it was observed that even though the production of charcoal held by farmers in southern
Brazil is developed in a restrictive legal environment, there was no statistical difference in
volume of charcoal produced from family farmers, regardless of knowledge of environmental
rules or not, and their punishment risks associated, in the three case studies. So, it is
necessary to promote technical and scientific advances regarding the use of raw material for
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
the "charcoal business", as well as the mode of production of charcoal for domestic
consumption.
Key words: Charcoal; Environmental legislation; Family agriculture.
1 INTRODUÇÃO E IMPORTÂNCIA DO PROBLEMA
Nos estados do Sul, especialmente no litoral e encostas do Paraná e Santa Catarina o uso e
ocupação do solo respeitam preceitos de um desenvolvimento econômico voltado para a
ocupação imobiliária, expansão dos centros urbanos e para a matriz energética. Mesmo que
estes fatores tenham peso determinante na derrubada das matas, a maior pressão institucional
no sentido de preservação das florestas predomina sobre a exploração florestal. E neste
contexto a produção carvoeira é evidenciada, que no caso dos estados do sul do país é feita
predominantemente por pequenas propriedades rurais.
O carvão vegetal possui um estigma de agente poluidor, devido a sua produção se dar sem
bases sustentáveis e com exploração de mão-de-obra escrava e infantil. Porém, estudos
exploratórios no sul do Brasil (ARAÚJO et al., 2013) surgem com uma perspectiva diferente.
Ao analisar a produção do carvão vegetal como produto acabado, voltado ao consumo
doméstico associado a modelos alimentares típicos da região, observou-se um sistema
produtivo cuja exploração esta associado à preservação da floresta nativa e biodiversidade
locais e à manutenção de agricultores familiares na área rural. Entender a produção de carvão
no sul do Brasil como ambientalmente viável e economicamente fundamental para muitas
famílias é o ponto de partida desta análise.
Para compreender o impacto da exploração florestal para a produção carvoeira é preciso
ampliar a abrangência de análise quanto aos usos da floresta. É necessário compreender a
capacidade de regeneração da mata, as interações ecológicas e humanas, as redes sociais, as
alternativas tecnológicas envolvidas e suas influências no longo prazo.
O carvão vegetal possui muitas vantagens quando comparado a outras fontes energéticas,
por ser derivado da biomassa, não possui enxofre, tem baixos teores de cinzas, é renovável, e
pode ter uso doméstico, industrial e químico (produtos farmacêuticos e de purificação). Por
outro lado, o carvão de origem mineral, seu substituto direto, é rico em enxofre, e o resultado
de sua queima, provoca chuva ácida nos pontos de uso, além de possuir altos teores de cinzas.
Considerando esses elementos positivos que resultam em menor impacto ambiental, o
carvão vegetal vem sendo crescentemente utilizado. Na siderurgia o apelo ambiental de sua
utilização, cunhou o conceito de “aço verde”, sinalizando que há amplo espaço para a
expansão de seu uso (ROCHA, 2011). Portanto, os problemas da cadeia produtiva do carvão
vegetal, tanto para uso doméstico, quanto industrial, demandam esforços para que sua
expansão ocorra de forma racional e sustentável. Além disso, problemas legais relativos ao
uso de espécies nativas no seu beneficiamento, denominado em geral como uma produção
“não sustentável” devem ser melhor estudados e compreendidos. Considerando que sistemas
de produção de pequeno porte de modo geral não extinguem a floresta, pois não resultam
necessariamente na conversão do uso da terra, por outro lado, não tem controle sobre os
poluentes atmosféricos emitidos durante o processo produtivo.
A procura por resolução para estes desafios não está em proibir ou coibir a produção e uso
do carvão vegetal, principalmente no caso dos sistemas de pequeno porte. É necessário
aprofundar a compreensão desses sistemas de produção de carvão vegetal, bem como, avaliar
a vocação histórica das populações envolvidas na sua produção, além de determinar o peso
econômico do produto na manutenção dos agricultores.
A relevância dada à manutenção dos agricultores de pequeno porte, no campo na região
estudada, está intimamente ligada ao impacto da presença deste tipo de propriedade no sul do
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
Brasil. Nos estados do Sul do Brasil a agricultura familiar é majoritariamente predominante e,
segundo o Censo Agropecuário do IBGE (2006), representa 84% dos estabelecimentos
agropecuários da região (86% no RS, 87% em SC e 82% no PR). Isso evidencia a importância
socioeconômica dessa forma de organização social do campo, na ocupação e desenvolvimento
dos espaços rurais.
Estudos têm apontado que no âmbito da agricultura familiar a floresta nativa vem sendo
utilizada a despeito da legislação ambiental restritiva (BRASIL, 2013), motivada pela
importância da presença da floresta na dinâmica do uso da terra (SIMINSKI & FANTINI,
2004; FANTINI & SIMINSKI, 2007; SIMINSKI, 2004; SIMINSKI, & FANTINI, 2010.;
ULLER-GÓMEZ et al., 2009; ULLER-GÓMEZ & GARTNER, 2008). Diante da proibição
de uso imposta pela legislação agricultores quando os remanescentes alcançam o estágio
médio de regeneração agricultores tem optado por viabilizar o uso futuro da terra via
suprimindo a mata nativa. Esta supressão se dá pela substituição gradativa por monoculturas
de espécies florestais exóticas e pelo impedimento da regeneração da floresta.
A relevância do estudo da exploração florestal tem sido verificada in loco a partir de
pesquisas para outros fins em diversos contextos da agricultura familiar do Sul do Brasil, diz
respeito à produção de carvão vegetal com lenha extraída da mata nativa. Essa atividade tem
se configurado como uma importante, ou mesmo, a principal fonte de renda para muitas
famílias rurais. Cujo seu impedimento, dada sua relevância no contexto produtivo destas
propriedades, motiva os membros da família, sobretudo filhos/filhas, a buscar ocupações não-
agrícolas e, na maioria dos casos, abandonarem a propriedade e o espaço rural (SCHNEIDER,
2003; ULLER-GÓMEZ, 2006).
Dados do IBGE para 2008 confirmam que existe a produção de carvão vegetal a partir de
extrativismo em todas as mesorregiões desses estados (IBGE, 2010). Segundo os mesmos
dados, a produção em Santa Catarina caiu de 99.409 toneladas em 1991 para 4.885 toneladas,
em 2008. Já para o estado do Paraná, verificamos o inverso: a produção passou de 70.460
toneladas em 1990 para 169.933 toneladas, em 2008. Não existem trabalhos que explorem as
razões dessa diferença, nem o potencial da produção nesses diferentes contextos.
Por outro lado, uma análise mais acurada com base em observações de campo e dados de
algumas pesquisas recentes (ARAÚJO et al., 2013) sugere que a importância social e
econômica da produção de carvão não está adequadamente dimensionada para o estado de
Santa Catarina. Enquanto o IBGE (2010) apresenta como nula essa produção para a
Microrregião de Florianópolis, dados recentes mostram que ela é a principal fonte de renda
para mais de 30% das famílias com renda agrícola (FANTINI, 2009; ULLER-GÓMEZ &
GARTNER, 2008). Da mesma forma, os dados poucos expressivos do IBGE para outras
regiões do estado contrariam a importância econômica, social e ambiental da atividade
apontada, por exemplo, por Steenbock (2009), Lindemann (2010) e ARAÚJO et al (2013).
Entende-se assim que os dados do IBGE subestimam a produção de carvão vegetal a partir de
extrativismo e camuflam os problemas socioambientais associados.
Nos estados estudados, tanto Paraná quanto Santa Catarina, o manejo da Bracatinga (Mimosa
scabrella) têm sido fomentado principalmente por agricultores em sistemas de pousio ou
roça-de-toco, e sabe-se que existem consórcios entre bracatinga, mandioca e ingá há pelo
menos 50 anos (CARVALHO, 1994; ULLER-GÓMEZ & GARTNER, 2008; BAUER, 2012;
SOUZA, 2014).
Com relação aos aspectos socioambientais, em Santa Catarina práticas de manejo de
bracatingais e sua influência para na inclusão social e conservação ambiental foram estudadas
por Steenbock (2009), apontando que nos assentamentos de reforma agrária estudados, o
manejo dos bracatingais, e a produção de carvão oriunda deste sistema, compõem cerca de
50% da renda das famílias. Esse autor salienta ainda que, apesar da política florestal vigente
inviabilizar essa prática, o manejo de bracatingais proporciona a conservação da cobertura
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
florestal nativa por volta de 60% das áreas nos lotes do assentamento (STEENBOCK, 2009).
As comunidades agricultoras apresentam histórico de conhecimento local através da relação e
convivência de uso dos recursos naturais inseridos nos meios de vida e no modo de
reprodução social (BERKES et al., 1995). Estudar a interação dessas comunidades com as
espécies vegetais usadas e o manejo realizado é uma das formas de compreender as dinâmicas
das populações vegetais ao longo do tempo, o que pode fundamentar estratégias de ação
visando à conservação de recursos genéticos vegetais bem como à continuidade da
reprodução social das famílias (HANAZAKI et al., 2007; CAPORAL, 2007, ZUCHIWSCHI,
2008).
Assim, a produção de carvão vegetal pode ser considerada atualmente uma das mais
emergentes questões da agricultura familiar no sul do Brasil, já que envolve problemas
ambientais, legais, sociais, econômicos, de geração de renda e de saúde do trabalhador que
são abordados de forma apenas incipiente, ou pontual, pelas instituições oficiais de ensino,
pesquisa e extensão estaduais ou federais.
Diante disso, o presente estudo teve como objetivo principal, comparar as quantidades médias
produzidas de carvão vegetal em duas amostras independentes, oriundas de 2 populações
normais independentes com variâncias desconhecidas (podendo ser iguais ou não). Essas 2
amostras representaram pessoas que responderam a 4 questoes sobre legislação, em 3
localidades. Tais amostras consistiram em respostas agrupadas em “SIM” e “NÃO”, de modo
a avaliar o conhecimento dos produtores de carvão vegetal sobre a legislação ambiental, a
ocorrência de vistas de fiscais ambientais na propriedade, a notificação por parte dos agentes
diante de alguma irregularidade e a avaliação de risco de suspensão da produção diante de
alguma irregularidade na produção.
Assim, toda a análise se baseou em avaliar se o grupo de respostas negativas às 4 referidas
questões, como esperado, seria aquele que apresentaria maior produção média de carvão
vegetal.
2 METODOLOGIA E ESPECIFICAÇÃO DOS DADOS
Os dados utilizados no presente trabalho são resultado de um estudo mais abrangente que
visava caracterizar a produção carveira nos estados do sul do Brasil. Foram aplicados 72
questionários em estabelecimentos rurais, onde 24 estabelecimentos se localizam no
município de Biguaçu, 23 no município de Bituruna e 25 estabelecimentos do município de
Santa Rosa de Lima. Dentro do questionário aplicado constava quatro questões que
abrangiam a temática legislação ambietal.
Para garantir uma melhor representatividade ao estudo fez-se a escolha por três municípios
representativos. A escolha dos municípios representativos se deu de forma coletiva entre os
pesquisadores da Rede e respeitou características de ‘Estudo de Caso Etnográfico’ de André
(2008), bem como respeitou exigências de associação de técnicas de pesquisa quantitativa
com técnicas de pesquisa qualitativa, envolvendo entrevistas profundas e, alguns casos,
técnicas próximas da observação participante.
Cada município escolhido se enquadrou em uma das três áreas determinadas
previamente como contextos relevantes para a compreensão da dinâmica da produção de
carvão vegetal do sul do Brasil, resultando em três estudos de caso, respectivamente.
O estudo de caso 1 se localiza na Grande Florianópolis no estado de Santa Catarina. A
escolha foi determinada pela exposição em pesquisas recentes da existência de produção de
carvão vegetal a partir de ecossistemas nativos em comunidades do município de Biguaçu/SC
(ULLER-GÓMEZ & GARTNER, 2008, FANTINI et al., 2010). A produção carvoeira
representa a principal renda para mais de 30% das famílias com atividades agrícolas dentre os
estabelecimentos rurais estudados na zona rural do município.
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
O estudo de caso 2 foi feito no Sul Catarinense. Informações provenientes de agentes
de extensão rural e alguns estudos recentes apontam que na região existe produção de carvão
vegetal a partir da bracatinga (Mimosa scabrella Benth), espécie nativa e cujo manejo
atualmente é considerado ilegal pela legislação brasileira (STEENBOCK, 2009;
LINDEMANN, 2010). O município escolhido para o estudo foi Santa Rosa de Lima (SC). O
município, que dispunha de grande quantidade de bracantingais converteu a exploração para a
produção florestal exótica por pressão da legislação ambiental (STEENBOCK, 2009). A
legalização se dá, quando ocorre a substituição do bracatingal pelo eucalipto.
O estudo de caso 3 foi feito no Centro Sul Paraná, região onde, segundo informações
preliminares obtidas com agentes de extensão rural, a produção de carvão vegetal tem
predominância da agricultura familiar e representa uma importante estratégia de reprodução
das famílias rurais. O município escolhido foi Bituruna (PR) e foi feito em assentamentos
rurais. A matéria-prima é proveniente de sistemas de agricultura itinerante, como roça-de-toco
ou roça de pousio. A produção é clandestina e os agricultores estão sujeitos às condições
impostas pelos atravessadores e à fiscalização ambiental. Para as famílias nessa situação, o
carvão representa a maior parte da renda, sendo a produção é destinada para Minas Gerais.
Para tanto, produtores de carvão vegetal dos três municípios representativos da Região Sul do
Brasil (Bituruna, Biguaçu e Santa Rosa) foram entrevistados, a partir de quatro perguntas:
a) O Sr.(a) conhece as regras da legislação ambiental para o uso de matas nativas para a
produção de carvão?
b) Já houve(ram) visita(s) na propriedade de órgão(s) de fiscalização ambiental (Fatma,
Ibama, Polícia Ambiental, etc.) para fiscalizar o corte de madeira nativa ou a produção de
carvão?
c) Sua propriedade já recebeu alguma notificação ou multa pelo corte de madeira nativa
ou pela produção não licenciada de carvão?
d) O Sr.(a) vê risco de ter que parar de produzir carvão devido à pressão ou impedimento
dos órgãos de fiscalização ambiental?
Para as quatro questões, havia apenas 2 alternativas de resposta: “SIM” e “NÃO”. Nesse
contexto, para cada localidade, obteve-se a quantidade media de carvão produzida por aqueles
que responderam “SIM” e por aqueles que responderam “NÃO”. Então, essas duas
quantidades (toneladas) de carvão, para cada questão e para cada localidade (Bituruna,
Biguaçu e Santa Rosa) foram comparadas a partir de um teste de hipóteses sobre o valor da
diferença entre duas médias nos casos em que as variâncias são desconhecidas.
Assim, há dois procedimentos para testar a hipótese de que a diferença entre as médias de
duas populações normais independentes tem um valor especificado, θ no contexto de as
variâncias dessas populações serem desconhecidas:
- CASO 1 - as variâncias dessas populações são desconhecidas e supostamente iguais;
- CASO 2 - as variâncias dessas populações são desconhecidas e supostamente diferentes.
Segundo Hoffmann (2006), quando se trata do CASO 1, supõe- se que X1 e X2 denotam a
variável em cada população. Sejam 1 e 2 as médias de X1 e X2, respectivamente, e seja a
variância comum de X1 e X2. Então, testa-se = 0, com base em duas amostras
aleatórias independentes, uma com n1 observações de X1 e outra com n2 observações de X2.
Sejam 1 e 2 as médias das duas amostras.
Sabemos que:
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
( ) (
) (
)
(6)
Uma estimativa não tendenciosa da variância , comum às duas populações, é dada por:
∑ ( )
∑ ( )
(7)
ou
( )
( )
(8)
De (7) e (8), segue-se que uma estimativa não-tendenciosa da variância de ( 1 - 2) é
( ) (
)
(9)
Pode-se demonstrar que, se X1 e X2 tem distribuições normais com a mesma variância, a
variável
( ) (
)
√( )
(10)
tem distribuição de t de Student com graus de liberdade. Sob a hipótese
= θ, a variável
( ) θ
√( )
(11)
tem distribuição de t com graus de liberdade. Assim, para testar a hipótese
θ, com base em duas amostras aleatórias independentes, a primeira com n1
observações de X1 e a segunda com n2 observações de X2, α deve-se pressupor que X1 e X2
são variáveis aleatórias com distribuições normais, com a mesma variância , cujo valor é
desconhecido. Seja t o nível de significância.
Para o CASO 1, tem-se os procedimentos (Hoffmann, 2006):
1º) Calcula-se S2 de acordo com (7) e, em seguida, o valor de t, conforme (11);
2º) Da Tabela de Distribuição de t de Student, obtém-se o valor crítico to para
graus de liberdade, tal que :
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
a) P(t > to) =
se o teste for bilateral;
b) P(t > to) = α se o teste for unilateral.
3º) Compara-se o valor de t calculado com to. O resultado é dito significativo, rejeitando-se
Ho, quando
a) |t| ≥ se o teste for bilateral;
b) t ≥ se a hipótese alternativa for ;
c) |t| ≤ se a hipótese alternativa for .
Já para o CASO 2, também segundo Hoffmann (2006), sejam X1 e X2 as variáveis com
médias e
e variâncias
e , respectivamente. Se as variâncias são desconhecidas e
são supostamente diferentes, para testar , com base em amostras aleatórias
independentes com n1 observações de X1 e n2 observações de X2, utiliza-se a variável:
( ) θ
√(
)
(12)
Em que
∑ ( )
∑ ( )
e
A variável t’ não possui, rigorosamente, distribuição de t. No entanto, sua distribuição é
semelhante a uma distribuição de t e um valor crítico aproximado pode ser obtido da Tabela
de Distribuição de t de Student, utilizando o número de graus de liberdade dado por
(Hoffmann, 2006):
( )
(13)
Em que
e
Nos casos em que as variâncias não são pressupostas iguais, o procedimento para
testar = θ se distingue do procedimento do CASO 1, pelo fato de se calcular
t´em vez do valor de t dado por (11) e pela maneira de determinar o número de graus de
liberdade.
Analogamente para os dados do presente estudo, onde se fez menção aos dados de
média amostral, media populacional e tamanho de amostra para o índice 1, subentende-se que
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
seriam para os dados da pesquisa correspondentes aos grupos de “SIM”, das 4 questões. Para
o índice 2, seria então aos que se referem aos dados dos grupos de “NÃO”, das 4 questões.
Por exemplo, X1 = Xsim; n1 = nsim; , X2 = Xnão; n2 = nnao.
As quantidades médias de carvão das amostras de SIM e de NÃO dentro de cada
questão, para cada localidade, foram comparadas. A expectativa inicial seria de que a
quantidade média de carvão produzido pelos respondentes do grupo “NÃO” fosse maior que
o grupo de “SIM”.
O fato de desconhecer a regra da legislação ambiental, não ter recebido visita de órgão
de fiscalização ambiental na propriedade, não ter recebido multa pelo corte de madeira nativa
e de não observar risco em parar de produzir carvão devido pressão de órgãos fiscalizadores,
poderiam ser os fatores que contribuíssem para que a quantidade media de carvão vegetal nos
respondentes “NÃO” fosse maior que nos respondentes “SIM”.
Assim, para cada questão, foram testadas as hipóteses:
ã
= 0
ã > 0
Para a decisão de qual CASO (1 ou 2), seguir, previamente foi realizado um teste
sobre igualdade das variâncias, permitindo saber se as variâncias desconhecidas dessas
populações (SIM e NÃO) são supostamente iguais (CASO 1) ou não (CASO 2).
A situação de comparação das variâncias de duas populações Normais envolve a
utilização da distribuição F. Uma das distribuições amostrais mais usadas, e que corresponde
a uma distribuição F, resulta do seguinte problema, segundo Morettin e Bussab (2002): a
partir de duas amostras independentes, de tamanhos n1 e n2, retiradas de duas populações
normais com a mesma variância . Indica-se os estimadores de variância obtidos das
amostras por e
, respectivamente. Sabe-se que:
( )
( )
(1)
( )
( )
(2)
e portanto a variável aleatória
( )
(3)
Essa variável será utilizada no teste, em questão.
Consideram-se, uma amostra X1, ...., Xn de uma população com distribuição
N( ) e uma amostra Y1, ...., Yn de uma população com distribuição N(
). Supõe-se
que as duas amostras sejam independentes.
Deseja-se testar:
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
Sendo e
as variâncias amostrais respectivas, obtêm-se o valor de W e, sob a suposição
de Ho , ou seja,
, tem-se que:
( )
(4)
Fixado α, encontramos dois números f1 e f2, por meio da tabela de distribuição de t Student,
tais que:
( ) ( ) ( )
(5)
Os valores f1 e f2 são determinados de modo que ( )
( ).
Colhidas as amostras de n1 e n2 indivíduos, respectivamente, das duas populações,
calcula-se os valores observados das variâncias das amostras independentes e, em seguida,
calcula-se o valor de W. Se este valor pertencer à região crítica, rejeita-se Ho. Caso contrário,
não se rejeita.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para a realização dos procedimentos dos testes de hipóteses, utilizou-se de estatística
descritiva, em função da produção média de carvão vegetal. Essas informações foram
agrupadas conforme a amostra (SIM e NÃO), para cada questão e para cada localidade,
apresentadas no Quadro 1.
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
Quadro 1 – Valores de estatísticas descritivas das amostras comparadas, por questão, por localidade –
ano 2011. Fonte: dados de pesquisa
** número de informações insuficiente para composição de média e desvio padrão.
Esse dados foram então utilizados para testar a hipótese de igualdade de variâncias.
Conforme o resultado, optou-se pelo procedimento do CASO 1 ou CASO 2, já descritos
anteriormente.
Quadro 2 – Resultados do teste de igualdade das variâncias. Hipóteses consideradas
Fonte: dados de pesquisa
** número de informações insuficiente para realização do teste e cálculo das estatísticas.
Quando o resultado foi de “Rejeitar a Ho”, utilizou-se o CASO 2 para a obtenção dos
resultados finais. Quando o resultado foi de “Não rejeitar Ho”, então utilizou-se o CASO 1
para a obtenção dos resultados finais.
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
O Quadro 3, a seguir, apresenta os resultados finais dos testes realizados para as
amostras cujas respostas a cada uma das quatro questões, classificaram-se em “SIM” e
“NÃO”, para cada uma das três localidades.
Quadro 3 – Resultados finais. Hipóteses consideradas ã
e
ã .
Fonte: dados de pesquisa.
** número de informações insuficiente para realização do teste e cálculo das estatísticas.
Os resultados dos testes estatísticos demonstraram a insignificância da relação entre as
respostas a respeito de legislação ambiental e à quantidade de carvão produzida de
agricultores da região estudada. Este resultado junto a argumentação qualitativa feita em
trabalhos correlados, nos permite levantar hipóteses a respeito das decisões de produção.
Os agricultores que disseram ter conhecimento a respeito de regras da legislação
ambiental para o uso de matas nativas para a produção de carvão produziram quantidade
semelhante de carvão vegetal em relação aos que atestaram desconhecer a legislação.
Assim como os agricultores que já foram visitados por orgãos de fiscalização ambiental
(Fatma, Ibama, Polícia Ambiental, etc.) para fiscalizar o corte de madeira nativa ou a
produção de carvão também produziram uma quantidade semelhante aos agricultores que não
foram visitados.
Mesmo os agricultores que receberam notificação ou multa pelo corte de madeira
nativa ou pela produção não licenciada de carvão não apresentaram produção diferente frente
aqueles que não foram notificados ou multados.
A percepção de risco em parar de produzir carvão devido à pressão ou impedimento
dos órgãos de fiscalização ambiental, da mesma forma, não impactou sobre a produção
carvoeira. Agricultores que atestam que a legislação ambiental restritiva pode impedira
produção, estatisticamente produzem a mesma quantidade de carvão em relação aqueles que
trabalham sem temer a interrupção da produção.
Esta similaridade entre a quantidade da produção carvoeira entre todos os agricultores
entrevistados, sinaliza que há uma motivação comum na continuidade da prática produtiva.
Os agricultores entrevistados demonstram que não há no cenário vigente uma alternativa
produtiva viável. Com ou sem risco de punição a produção permanece, e, com apoio de outros
estudos paralelos é possível inferir que o impacto da renda oriunda do carvão vegetal para os
agricultores familiares pode ser a razão.
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados obtidos no presente estudo geraram conclusões que fogem da lógica
simplista considerada pela linha teórica neoclássica de que dado a ausência de lucro
econômico1 a atividade produtiva é suprimida.
No sul do Brasil observou-se a aplicação de uma legislação ambiental que se mostra
inadequada a realidade regional, à medida que estudos põem em dúvida o impacto negativo
da atividade. Deste ponto de partida podemos entender que houve a imposição institucional de
uma legislação inadequada para a realidade local.
A inadequação se torna evidente ao percebermos que foi implementada em um tempo
posterior ao início da atividade produtiva estudada, e, como conseqüência levou os
agricultores à ilegalidade sem dotá-los de ferramentas para sua regularização. Este movimento
serviu de impeditivo à inserção destes agricultores aos novos mercados constituídos,
transformando-os em marginais em um contexto em que a produção de carvão vegetal tem
caráter tradicional e forte impacto na renda destes agricultores.
O resultado deste cenário é o que se observou neste estudo, agricultores familiares
habituados a uma atividade transformada em ilegal resistem em parar sua atividade.
Independentemente do conhecimento ou não das regras impostas, dos riscos de punição, ou
mesmo do risco de reincidência da punição não deixam de produzir.
Estas conclusões direcionam para discussões a respeito de inadequações da legislação
ambiental vigente e abrem espaço para reflexão no sentido de melhor compreender
especificidades regionais e propor mudanças legais. A compatibilização entre preservação
ambiental e benefícios sócio-econômicos aos produtores rurais podem vir a permitindo
avanços no desenvolvimento rural destas regiões.
5 REFERÊNCIAS
ARAUJO, L. A., BAUER, E., TORESAN, L., MONDARDO, M., ELIAS, L.; Atividades
“Invisíveis” na Agricultura Familiar: O Caso da Produção de Carvão Vegetal no Município de
Biguaçu-SC. In: 51º Congresso da Sociedade Brasileira de Economia, Administração e
Sociologia Rural, 2013, Belém-PA. Anais 51º Congresso da SOBER. Belém-PA: SOBER,
2013.
BRASIL. Lei n. 7.804, de 18 de julho de 1989. Altera a Lei nº 6.938, de 31 de agosto de
1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de
formulação e aplicação, a Lei nº 7.735, de 22 de fevereiro de 1989, a Lei nº 6.803, de 2 de
julho de 1980, e dá outras providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7804.htm. Acesso em 16 jul. 2013.
______. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis-IBAMA.
Instrução Normativa nº 112 de 2006. Institui e regulamenta o documento de origem florestal
(DOF). Disponível em:
http://www.iap.pr.gov.br/arquivos/File/Legislacao_ambiental/Legislacao_federal/instrucao
normativa/instrucao normativa ibama 112 2006. Acesso em: 29 mai. 2013.
1 O lucro econômico incorpora a receita gerada menos todos os custos, explícitos e implícitos, ou seja, inclui o
custo das possíveis punições.
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
______. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis-IBAMA.
Instrução Normativa nº 187 de 2008. Define procedimentos e padrões de nomenclatura e
coeficientes para indústrias consumidoras ou transformadoras de produtos e subprodutos
florestais madeireiros de origem nativa, inclusive carvão vegetal. Disponível em
http://www.iap.pr.gov.br/arquivos/File/Legislacao_ambiental/Legislacao_federal/ instrucao
normativa 187 2008. Acesso em: 30 mai. 2013.
______. Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA. Instrução Especial/
INCRA/Nº 20 de 28 de maio de 1980. Estabelece o Módulo Fiscal de cada Município
previsto no Decreto nº84.685 de 06 de maio de 1980. Disponível em: www.incra.gov.br.
Acesso em: 15 mai. 2013
______. LEI nº 601, de 18 de setembro de 1850. Dispõe sobre as terras devolutas do Império.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L0601-1850.htm. Acesso em 15
mai. 2013.
______. LEI Nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa;
altera as Leis nos 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e
11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e
7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e
dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-
2014/2012/Lei/L12651.htm. Acesso em: 16 mai. 2013.
______. LEI nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e
dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm.
Acesso em 17 mai. 2013.
BAUER, E. Mudanças no uso da terra na microbacia de São Mateus em Biguaçu-SC:
agricultores em permanente processo de adaptação. 92f. Dissertação (Mestrado) - Programa
de Pós-Graduação em Agroecossistemas, Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianópolis, 2012.
BRASIL. DECRETO nº 7.212, de 15 de junho de 2010. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7212.htm. Acesso em: 17
mai. 2013.
______. LEI nº 10.406, de 10 de janeiro de 2012. Institui o Código Cívil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm#art966. Acesso em: 09 de jun.
2013.
BUSSAB, W.O.; Morettin, P.A. Estatistica Básica, editora Saraiva, 2002. 5a ed. São Paulo,
2002.
HOFFMANN, R. Estatistica para Economistas, 4a ed. 2006. ed São Paulo, ed Pioneira.
PREFEITURA MUNICIPAL DE BITURUNA. Bituruna: Aspectos Históricos. Disponível
em: http://www.bituruna.pr.gov.br/base.php?id=historia. Acesso em: 20 set. 2013.
NORTH, D. C. Custos de transação, instituições e desempenho econômico. Rio de Janeiro:
Instituto Liberal, 1998.
Goiânia - GO, 27 a 30 de julho de 2014
SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural
NORTH, D.C. Institutions. Journal of Economic Perspectives, Nashville, TN, v. 5, n. 1, p. 97-
112, 1991.
FATMA - Fundação do Meio Ambiente. Instrução Normativa nº 34 de 14 de maio de 2013.
Dispõe sobre as atividades sujeitas ao cadastro ambiental. Disponível em: http:
www.fatma.sc.gov.br/images/stories/Instrucao%20Normativa/IN%2034/in_34.pdf. Acesso
em: 20 jul. 2013.
ROCHA, J. O carvão vegetal no Brasil e a produção de aço verde. Disponível em: http:
http://www.embrapa.br/imprensa/artigos/2011/o-carvao-vegetal-no-brasil-e-a-producao-de-
aco-verde. Acesso em: 1 abril. 2014.
SOUZA, M. C. Cadeias Produtivas do Carvão Vegetal na Agricultura Familiar no Sul do
Brasil. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Agroecossistemas,
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2014.
WILLIAMSON, Olliver. Transaction Cost Economics meets Posnerian Law and Economics.
Journal of Institucional and Theoretical Economics, 1993.
ZYLBERSZTAJN, Décio; SZTAJN, Rachel. Direito & Economia – análise econômica do
Direito e das organizações . 1. Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.