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0 ISAURA MARIA LONGO IDENTIDADE DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA ENSINO SUPERIOR ITAJAÍ (SC) 2019

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ISAURA MARIA LONGO

IDENTIDADE DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO CONTEXTO

DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA ENSINO SUPERIOR

ITAJAÍ (SC) 2019

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Vice-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação

Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGE Curso de Doutorado em Educação

ISAURA MARIA LONGO

IDENTIDADE DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO CONTEXTO

DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA ENSINO SUPERIOR

Tese apresentada ao colegiado do PPGE como requisito parcial à obtenção do grau de Doutor em Educação – área de concentração: Educação – Políticas para Educação Básica e Superior. Orientadora Professora Dra. Regina Célia Linhares Hostins.

ITAJAÍ (SC) 2019

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ISAURA MARIA LONGO

Tese avaliada e aprovada pela Comissão Examinadora e referendada pelo Colegiado do PPGE como requisito parcial à obtenção do grau de Doutor(a) em Educação.

______________________________ DRA. VALÉRIA SILVA FERREIRA

COORDENADORA

Apresentada perante a Banca Examinadora composta pelos Professores:

_________________________________________________ DRA. REGINA CÉLIA LINHARES HOSTINS (UNIVALI)

PRESIDENTE E ORIENTADORA

___________________________________________________ DRA. VALÉRIA SILVA FERREIRA (UNIVALI)

MEMBRO

______________________________________________________ DR. JÚLIO CESAR GODOY BERTOLIN (UPF)

MEMBRO EXTERNO

___________________________________________________ DR. TRISTAN MCCOWAN (LONDON)

MEMBRO EXTERNO

Itajaí-SC, 24 de abril de 2019.

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AGRADECIMENTOS

À professora Regina Célia Linhares Hostins, minha querida orientadora, pelas

importantes contribuições a este trabalho e pelo incentivo na realização de uma tese a respeito

do modelo comunitário de universidade. Mas, antes de tudo, minha gratidão pela amizade linda

que cultivamos.

Ao professor Tristan McCowan, do Institute of Education (UCL/Londres), pelas

valiosas orientações a respeito dos rumos teórico-metodológicos da tese.

Aos professores Júlio César Godoy Bertolin da universidade de Passo Fundo e Valéria

Silva Ferreira da Universidade do Vale do Itajaí pelas significativas contribuições durante a

banca de qualificação do projeto da tese.

Aos professores entrevistados durante a pesquisa, pelo tempo, reflexões e pontos de

vista comigo compartilhados.

À Universidade do Vale do Itajaí, especialmente à Vice-Reitoria de Pesquisa, Pós-

Graduação e Inovação, pelo apoio por meio do programa de Bolsa de Estudo e incentivo à

pesquisa.

Ao meu querido amigo André Luiz Vailati, pelo incondicional apoio aos dias que

exigiram a minha ausência da extensão e por compartilhar momentos de incertezas e desafios.

Às minhas queridas amigas Ana Cristina B. Cardoso e Cláudia Beatriz B. da Cruz por

me apoiarem nos momentos de pedido de socorro.

Aos colegas, professores e funcionários do Programa de Pós-Graduação em Educação,

pela sempre prestativa acolhida.

Aos colegas e alunos da Escola de Artes, Comunicação e Hospitalidade, especialmente

ao coordenador Hans Peter Behling, pelo apoio nos momentos de angústia.

Aos meus bolsistas dos projetos de extensão dos quais fui coordenadora pelo suporte às

ações de extensão e ao empenho em ajudar.

Ao Gilberto, meu companheiro, pela acolhida afetiva e pela disponibilidade em ser um

facilitador nesse processo tão intenso. Crescemos juntos.

Aos meus filhos, Rodolfo e Nathalia e à minha neta Amanda, por compreender a minha

ausência e alimentarem meu coração de amor e carinho.

À minha família, por entender minhas ausências ao longo dos desafiadores anos do

doutorado.

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PARA INICIAR….

Por ocasião da minha qualificação, o professor Tristan perguntou: Mas onde fica o

pesquisador visto que ele faz parte desse universo?

E agora respondo:

Nasci numa cidadezinha chamada Vacaria, no Rio Grande do Sul. Filha mais velha de

Isauro e Umbellina, tinha que dar o exemplo de comportamento às minhas cinco irmãs. De

família humilde, presenciei e senti as dificuldades de ter à mesa pouco o que comer. Assisti

meu pai sair muito cedo para o trabalho e voltar depois que o sol se punha com suas mãos sujas

de graxa e seu rosto tomado pelo cansado. Vi minha mãe cuidar da casa e esfregar as roupas na

água gelada do inverno. Nesses anos, ouvi meu pai falar “Minha filha, nunca deixe seu nome

sujo na praça. Nunca prometa o que não pode cumprir. Honre o nome do teu pai e da tua mãe.

Honestidade não se compra, minha filha, se pratica. Dia após dia valores como, perseverança,

dignidade, honestidade, luta, resignação, esperança eram alimentados com exemplos de meu

pai e de minha mãe. E esses valores internalizei e cultivei como lastros que sedimentam minha

forma de viver no mundo.

E novamente as palavras de meu pai ecoaram em meus pensamentos “Minha filha, se

quiser ter alguma coisa, faça. Não espere pelos outros. ” Cheguei à universidade, numa

universidade comunitária. Ali estudei, me formei e três anos depois passei a ser docente. Há

quarenta anos, vivo dentro de uma universidade comunitária. Nela cresci como pessoa e como

profissional, me transformei, mudei. A cada semestre mutações, turbulências, inseguranças.

Convivi com milhares de estudantes. Jovens que alimentam meu propósito de estar

aqui. Alimentam a certeza de que eu posso, de alguma maneira, fazer diferença em suas vidas

e de que suas vidas em muito transformam a minha, num ato de cumplicidade e amor. Sentir e

pensar são ingredientes fundamentais para que a aprendizagem se realize e o conhecimento

liberte.

Pois então, lhes digo, que perseverança, dignidade, honestidade, e esperança são os

pilares de minha identidade. Essência de minha existência.

Quanto à minha função, estou aqui para fazer diferença, cultivando e perseguindo a

utopia de um mundo melhor por meio do meu trabalho como docente. E com meu trabalho me

distinguo, me diferencio e singularizo.

Fruto de encontros que vivi, aqui tenho meus amigos, minha família compartilhando

momento tão significativo em minha vida, com os quais dividi em algum momento o caminho

do conhecimento e dos sonhos.

Então, lhes digo, que engravidarei meu coração tantas vezes quantas o mundo me

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permitir para poder sentir e viver momentos tão emocionantes como esse. Que as nossas

palavras e nossas ações façam diferença na vida das pessoas. Porque essa vida só tem sentido

se for para fazer o bem.

Isaura M. Longo

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O flete do pensamento cavalga noites escuras Gasta estrada, gasta tempo,

Mas não perde as ferraduras. (Wilson Paim)

Dedico esta tese aos que encontram no conhecimento uma forma de felicidade.

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RESUMO Este trabalho, vinculado ao grupo de pesquisa Observatório de Políticas Educacionais do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Itajaí, é resultado de estudo multicaso envolvendo quatro instituições de ensino superior e tem por objetivo compreender o processo e as características que envolvem a constituição identitária das Universidades Comunitárias do sul do Brasil, considerando o contexto mutante das políticas para o ensino superior nas últimas décadas. O modelo de universidade comunitária passou a ser implantado no Brasil, a partir da década de 1960, pela sociedade civil e pelo poder público local, por ser reconhecido como fator de desenvolvimento das regiões desatendidas pelo poder público na oferta de educação superior. Com a Lei Nº 12.881, de 13 de novembro de 2013, o Estado brasileiro reconheceu as instituições de ensino superior como comunitárias, diferenciando-as de instituições privadas e com fins lucrativos. Esta medida cria um fato novo na história dessas universidades e no contexto das políticas de educação superior brasileira, indicando a relevância do desenvolvimento de investigações que busquem compreender, não só o momento histórico, neste contexto de reformas educacionais, mas também a forma como tais instituições atuam na construção de sua identidade institucional. Buscou-se em McCowan (2016), um modelo teórico-metodológico para compreender a “anatomia" dessas instituições, considerando as dimensões valor, função e interação e as influências que sofrem em virtude da comoditização e desagregação decorrentes das políticas neoliberais. A abordagem da Teoria Organizacional a partir dos estudos de Albert e Wetthen (1985), também contribuiu para a análise no que tange ao conceito de identidade organizacional. As Universidades foram selecionadas com base nos seguintes critérios: universidades laicas, reconhecidas como comunitárias (de acordo com a Lei Nº 12.881/2013), com, no mínimo, quatro mestrados e dois doutorados implantados, credenciadas no sistema federal e com maior número de alunos. A pesquisa foi conduzida simultaneamente em duas frentes de investigação: 1. Pesquisa documental para exame dos documentos do MEC e das universidades investigadas (documentos que avaliam e disciplinam o ensino superior no país, PDI, PPI, Planejamento Estratégico, Materiais institucionais e de divulgação); 2. Pesquisa de campo para entrevistas com os gestores das instituições que compõem a amostra. Os resultados do estudo indicaram que as universidades comunitárias investigadas trazem em seus discursos, tanto dos gestores, dos seus PDIs como campanhas institucionais a convicção de sua existência como instituições que nasceram para produzir conhecimento voltado para o bem público, com alto valor instrumental, tendo consciência da indissolubilidade do ensino, pesquisa e extensão, com ampla inserção social. Por outro lado, se debatem com as ameaças do mundo globalizado, no qual os processos de mercantilização e desagregação pressionam-nas a transformarem a educação superior em mero bem de consumo, regido pelo lucro desenfreado da política neoliberal, no entanto, não são suficientes, ainda, a ponto de comprometer a missão comunitária dessas instituições, essência de sua identidade. Palavras-chave: Política educacional. Universidades Comunitárias. Identidade Institucional. Identidade Organizacional.

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ABSTRACT This work, which is linked to the research group Observatory of Educational Policies, of the Postgraduate Program in Education of the University of Vale do Itajaí, is the result of a multicase study involving four higher education institutions. It aims to understand the process and characteristics of identity construction by Citizenship Universities – Universidades Comunitárias in the South of Brazil, considering the changing context of policies for higher education that have occurred in recent decades. The citizenship university model began to be implemented in Brazil in the 1960s, by civil society and the local public authorities, as they began to recognize higher education as a factor required for development for regions neglected by the public authorities. They were democratically created with the involvement of the local community, aiming at promoting expanded access to higher education in non-metropolitan regions, and responding to local industry needs. With Law 12881 of November 13, 2013, the Brazilian State recognized these higher education institutions as citizenship universities, differentiating them from private and for-profit institutions. This measure led to a new era in the history of these universities and in the context of Brazilian higher education policies, hence the importance of research that seeks to understand not only the historical context of these educational reforms, but also how these institutions construct their institutional identity. We looked to McCowan (2016) for a theoretical-methodological framework from which to understand the "anatomy" of these institutions, considering the dimensions of value, function, and interaction, and the influences they undergo as a result of the commoditization and disaggregation prompted by the neoliberal policies. Organizational theory, based on the studies of Albert and Wetthen (1985), also contributed to the analysis in relation to the concept of organizational identity. The universities examined in this research were selected based on the following criteria: secular universities, recognized as citizenship universities (according to Law 12881 of 2013), with an offer of at least four Master's degrees and two Doctoral degrees accredited by the federal system, and with a high number of students. The research involved two simultaneous lines of investigation: 1. Document-based research to examine the MEC documents and universities investigated (documents that evaluate and discipline higher education in the country, IDP, IPP, Strategic Planning, Institutional and Disclosure Materials); 2. Field research involving interviews with the managers of the institutions that made up the sample. The results of the study indicated that the citizenship universities investigated convey, through the discourses of their managers, their IDPs, and their institutional campaigns, a conviction that they exist to produce knowledge aimed at the public good, with high instrumental value, close ties between teaching, research and extension, and broad social insertion. On the other hand, these institutions struggle to deal with the threats posed by a globalized world, in which the processes of commodification and disintegration propel them to turn higher education into a mere consumer good, governed by the unbridled greed for profit of the neoliberal policies. However, these challenges are not so great as to undermine the community-focused mission of these institutions, which is the essence of their identity. Keywords: Educational policy. Citizenship Universities. Universidades Comunitárias. Institutional Identity. Organizational Identity.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Anatomia da universidade.............................................................................. 40

Figura 2 - Dimensões da identidade organizacional....................................................... 41

Figura 3 - Relação entre dimensões de análise, características das UCs e dilemas.......... 43

Figura 4 - Critérios de seleção das universidades comunitárias...................................... 47

Figura 5 - Principais marcos da trajetória das universidades comunitárias – 1960-

2013................................................................................................................................

58

Figura 6 - Vertentes influenciadoras nas dimensões Valor – Função – Interação............ 82

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Características das IES Públicas, Comunitárias e Privadas.......................... 45

Quadro 2 - Características das Esferas Pública, Comunal e Privada............................... 46

Quadro 3 - Perfil das Universidades Comunitárias da Amostra...................................... 48

Quadro 4 - Ciclo Plano de Desenvolvimento Institucional............................................ 52

Quadro 5 - Sítios Institucionais Veiculados na Plataforma Digital YouTube.................. 53

Quadro 6 - Missão das Universidades Comunitárias...................................................... 88

Quadro 7 - Princípios e Valores das Universidades Comunitárias................................. 92

Quadro 8 - Visão das Universidades Comunitárias Estudadas....................................... 94

Quadro 9 - Principais Atividades de Ensino, Pesquisa e Extensão das Universidades

Comunitárias..................................................................................................................

111

Quadro 10 - Principais Atividades de Pesquisa das Universidades Comunitárias.......... 131

Quadro 11 - Rankings e Avaliações das Universidades Comunitárias entre 2017-2018 136

Quadro 12 - Principais Atividades de Extensão das Universidades Comunitárias......... 149

Quadro 13 - Certificações e Premiações Recebidas pelas Universidades Comunitárias

- 2017-2018....................................................................................................................

155

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABRUC Associação Brasileira das Universidades Comunitárias ACAFE Associação Catarinense das Fundações Educacionais ACG Avaliação dos Cursos de Graduação ADIN Ação Direta de Inconstitucionalidade BM Banco Mundial CAD Comitê de Ajuda ao Desenvolvimento CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEFET Centro Federal de Educação Tecnológica CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico COMUNG Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas CPC Conceito Preliminar de Curso CRUB Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras EBSCO Publishing Service Selection Page ENADE Exame Nacional do Desempenho dos Estudantes

FEEVALE Federação de Estabelecimentos de Ensino Superior em Novo Hamburgo

FORPROEX Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Instituições Públicas de Educação Superior Brasileiras

FUMDES Fundo de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da Educação Superior

GATS General Agreement on Trade and Service

ICES Instituições Comunitárias de Educação Superior IES Instituição de Ensino Superior IGC Índice Geral de Cursos

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC Ministério da Educação MOOCs Massive Open Online Courses ODAEE Organização das Américas para a Excelência Educativa OEA Organização dos Estados Americanos OECD Organização Para a Cooperação e Desenvolvimento da Economia OI Identidade Organizacional OMC Organização Mundial do Comércio OMT Organização Mundial do Trabalho ONU Organização das Nações Unidas PDI Projeto de Desenvolvimento Institucional PPC Projeto Pedagógico dos Cursos PPI Projeto Pedagógico Institucional PUCPR Pontifícia Universidade Católica do Paraná PUCRS Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul RUF Ranking Universitário da Folha

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SINAES Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior SciELO Scientific Electronic Library Online STF Supremo Tribunal Federal UCPEL Universidade Católica de Pelotas UCS Universidade de Caxias do Sul UNC Universidade do Contestado UNESC Universidade do Extremo Sul Catarinense

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

UNIARP Universidade Alto Vale do Rio do Peixe UNICRUZ Universidade de Cruz Alta UNIJUI Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul UNIPLAC Universidade do Planalto Catarinense UNISC Universidade Integrada de Santa Catarina UNISINOS Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNISUL Universidade do Sul de Santa Catarina UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí UNIVILLE Universidade da Região de Joinville UNOCHAPECO Universidade Comunitária da Região de Chapecó UNOESC Universidade do Oeste de Santa Catarina UPF Universidade de Passo Fundo URCAMP Universidade da Região da Campanha URI Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..........................................................................................................

1.1 Contextualização do tema.........................................................................................

1.2 Estudos realizados....................................................................................................

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.............................................................

2.1 Abordagem teórico-metodológica.............................................................................

2.2 Contextualização da pesquisa....................................................................................

2.3 Procedimentos de coleta e análise dos dados..............................................................

3 A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DAS UNIVERSIDADES

COMUNITÁRIAS: AVANÇOS E DILEMAS NO CONTEXTO DAS

POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA O ENSINO SUPERIOR..............................

3.1 A identidade das universidades comunitárias: da gênese à legitimação......................

4 ANATOMIA DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS: VALOR, FUNÇÃO,

INTERAÇÃO.................................................................................................................

4.1 VALOR: o bem público como razão da existência da universidade

comunitária.....................................................................................................................

4.2 FUNÇÃO: o papel da universidade comunitária na produção, armazenamento e

disseminação do conhecimento........................................................................................

4.3 INTERAÇÃO: o elo entre a universidade comunitária e a sociedade.......................

5 A COMUNICAÇÃO DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS: UM

DESAFIO A ENFRENTAR..........................................................................................

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................

7 REFERÊNCIAS..........................................................................................................

APÊNDICES..................................................................................................................

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38

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57

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1 INTRODUÇÃO

1.1 Contextualização do tema

A universidade representa uma das instituições mais características e indispensáveis da

sociedade moderna. Seu papel é plural e diverso. Sendo fruto de artefato social, deve ser

compreendida como produto da história humana. Demarcada pela própria temporalidade, essa

história se constitui em meio a confluências e conflitos entre os mais variados estratos sociais.

Isso dito, entende-se que a universidade “é uma produção social e histórica, cuja função social

não está dada por uma definição natural” (CAMPOS, 2012). Sua trajetória traduz uma história

milenar, que se origina no fim o século XII, na Europa. Ela nasce das corporações de estudantes

e professores e chega ao controle dos Estados nacionais e dos grandes conglomerados

empresariais do século XXI. No Brasil, as experiências universitárias tardaram a ganhar

materialidade, somente no século XIX foram estabelecidas escolas de ensino superior. A rigor,

tais experiências manifestaram a cultura de escolas ou faculdades, que, por meio de decretos ou

leis, foram reunidas instituições isoladas em torno do nome "universidade” (CAMPOS, 2012,

p. 1).

Ao longo do tempo, como resultado da própria ação de diferentes grupos envolvidos

com essa instituição, múltiplos sentidos e significados têm sido atribuídos à universidade.

Embora haja semelhanças, elas possuem configurações e concepções diferentes significativas.

“Por tais metamorfoses já é possível postular a dificuldade para se chegar a uma definição

uníssona do papel social da universidade” (CAMPOS, 2012, p. 1). Esse cenário conduz ao

enfrentamento de uma crise localizada no âmago de sua existência: uma crise de sua identidade

institucional, o que leva a dilemas e contradições em sua atuação (SANTOS, 2004). Se a

identidade diz respeito à forma como alguém se define e como é definida por outros, e se a

universidade não possui uma representação inequívoca de sua existência, então se instaura aí

uma fértil reflexão acerca de suas funções e características identitárias.

Santos (2004) afirma que uma pluralidade de ameaças de ordem externa e interna como

o elitismo, o corporativismo e a inércia contribuíram para acelerar a crise institucional das

universidades, sobretudo a partir do início da década de 1990. Porém, dois fatores podem ser

destacados: o desinvestimento do Estado e a globalização mercantil da universidade. Nos

últimos trinta anos, as universidades, em grande parte dos países, foram atingidas por uma crise

institucional, em decorrência da perda de prioridade do bem público universitário nas políticas

públicas e da consequente redução dos recursos financeiros. Quando o Estado decidiu reduzir

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seu compromisso com as universidades e a educação em geral, tornando-os bens públicos não

exclusivos garantidos pelo Estado, a universidade teve sua crise institucional agravada. Junte-

se a isso a imposição de outros modelos de governança tidos como mais eficientes, baseados

em critérios de eficácia de natureza empresarial assentados em um modelo de desenvolvimento

econômico neoliberal.

Observa-se que o processo de construção da universidade e sua consequente evolução,

vem passando por diferentes fases, as quais retratam o pensamento da época. Vários legados

foram deixados, e a universidade brasileira, ainda de pouca tradição, comparativamente às do

exterior e da própria América Latina, se defronta com uma série de desafios que precisam ser

superados.

Este estudo, vinculado ao grupo de pesquisa Observatório de Políticas Educacionais do

Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Itajaí (SC), nasceu como

recorte da pesquisa “Identidade e Imagem das universidades comunitárias do Sul do Brasil”

(CHAMADA UNIVERSAL– MCTI/CNPq Nº 14/2014). Desenvolvida no período 2014-2018,

essa pesquisa foi uma proposta de estudo em rede que articulou conhecimentos e processos de

investigação nos campos da Educação, das Políticas Públicas e da Comunicação e teve como

objetivo analisar a interface identidade e imagem institucional de Universidades Comunitárias

do sul do Brasil. O estudo foi conduzido simultaneamente em quatro frentes de investigação:

Pesquisa documental, Pesquisa de campo, Seminários Redes Grupos de Pesquisa em âmbito

nacional e internacional e Grupos focais denominados Seminários Redes Comunitárias

envolvendo a comunidade interna e externa das instituições da amostra1.

Neste caso, a pesquisa tem como objeto de estudo as políticas educacionais e o modelo

de universidade comunitária, especificamente a construção da identidade institucional das

Universidades Comunitárias do sul do Brasil. Há várias décadas essas instituições vêm

construindo sua trajetória no campo do ensino superior brasileiro, em meio a batalhas pelo seu

reconhecimento e identificação como instituição pública não estatal. Em face da ampla

mudança nas políticas educacionais, notadamente a partir da reforma do Estado e da Educação,

na década de 1990, esse modelo de universidade se transformou em fértil ambiente para

pesquisas na tentativa de compreender os processos que se entrelaçam na construção de sua

identidade.

1 Pesquisadores de quatro universidades do sul do Brasil junto com professor Dr. Tristan McCowan University of London – MA in Education and International Development participaram do estudo. O processo foi coordenado pela professora Dra. Regina Celia Linhares Hostins e pelo professor Dr. Hans Peder Behling e foi concluído em dezembro de 2018.

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A educação superior brasileira, até a metade da década de 1960, era formada,

basicamente, por instituições públicas e confessionais (Católicas, Metodista, Luterana) estas de

caráter religioso e sem fins lucrativos. É a partir dessa época que o modelo de universidade

comunitária passa a ser implantado pela sociedade civil e pelo poder público local nas regiões

desatendidas pelo poder público federal e estadual. No Rio Grande do Sul e em Santa Catarina,

as instituições comunitárias, em sua maioria, nasceram em espaços onde houve ausência do

Estado na educação superior, estando enraizadas na história da colonização e da organização

social dos imigrantes e seus descendentes (PINTO, 2009a).

Essas instituições existem em vários Estados do Brasil, com forte atuação, no entanto,

no sul do país. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

Anísio Teixeira, em 2017, existiam 2.448 instituições de educação superior no Brasil, das quais

2.152 são da iniciativa privada. Existem 199 universidades, 106 delas são públicas e 93 são

privadas (INEP, 2017). As 23 Universidades Comunitárias do Rio Grande do Sul e de Santa

Catarina representam quase 10% do total de universidades do país.

Dois grupos de universidades denominam-se “comunitárias: as confessionais e as não-

confessionais ou laicas. Aquelas entendidas como comunitárias lato sensu, cuja origem vincula-

se a entidades religiosas. Estas chamadas de comunitárias stricto sensu, são instituições sem

vínculo religioso, criadas pela própria comunidade ou pela sociedade civil, sem alinhamento

político ou ideológico de qualquer natureza (PINTO, 2009a). O termo “laico” tem sua origem

etimológica no grego laikós que significa “do povo”.

As instituições comunitárias no Sul se organizam em duas associações: COMUNG e

ACAFE. Conforme sítio, o COMUNG - Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas,

congrega 15 instituições de educação superior do Rio Grande do Sul, sendo 12 universidades e

3 Centros universitários. Suas afiliadas congregam mais de 40 campi universitários, abrangem

mais de 380 municípios em suas áreas de influência e possuem em torno de 120 mil alunos de

graduação e pós-graduação, constituindo o maior sistema de educação superior em atuação no

estado2. A ACAFE - Associação Catarinense das Fundações Educacionais congrega 16

instituições de educação superior de Santa Catarina, sendo 11 Universidades e 5 Centros

Universitários3. Estas associações há muitos anos postulam um reconhecimento oficial como

entidades comunitárias de interesse público, para permitir sua participação na destinação de

recursos orçamentários e em editais reservados para instituições públicas, diferenciando-as

oficialmente das instituições privadas com fins lucrativos (VILELLA, 2014). Em Protocolo de

2 COMUNG. Disponível em: https://comung.org.br/. Acesso em: 14 set. 2016. 3 ACAFE. Disponível em: http://new.acafe.org.br/. Acesso em: 14 set. 2016.

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Ação Conjunta as instituições definem como

universidades públicas não estatais, públicas pela lógica de seu funcionamento vinculado aos interesses do conjunto da sociedade e não regido pelo lucro, configurando-se como organizações não-governamentais de origem e interesse comunitário, desvinculadas de grupos familiares, políticos, religiosos, empresariais ou sindicais (COMUNG, 1994, p. 4).

Conforme a Associação Brasileira das Universidades Comunitárias - ABRUC, estas

instituições não têm fins lucrativos, portanto os recursos gerados ou recebidos são integralmente

aplicados em suas atividades e são constituídas como instituições públicas não-estatais.

Também não pertencem a investidores, sendo mantidas por comunidades, igrejas,

congregações, podendo ser confessionais ou não. As Instituições Comunitárias de Ensino

Superior (ICES) têm, pois, um compromisso com a sociedade na qual estão inseridas, buscando

atender às necessidades da comunidade (BITTENCOURT, 2014).

Múltiplos estudos sobre a identidade comunitária foram produzidos, especialmente

diante da dicotomia público/privado (TRAMONTIN; BRAGA, 1988; BITTAR, 1999;

VANNUCCHI, 2011; LONGHI; FRANCO; ROCHA, 2009; PINTO, 2009a; 2009b;

SCHMIDT, 2010; SAMPAIO, 2013; FIOREZE, 2017). As universidades comunitárias não se

enquadram nem no modelo público, tampouco no modelo privado (BITTAR, 1999). Elas

representam um modelo alternativo, ou seja, não sendo pública, no sentido estatal, nem privada

no sentido estrito, empresarial, elas são públicas não estatais (VANNUCCHI, 2011). O caráter

comunitário destas instituições foi utilizado como elemento de distinção conceitual, bem como

de argumento político na luta por um tratamento diferenciado pelos órgãos encarregados da

política de ensino superior, tanto estadual como nacional (NEVES, 1995). Para Frantz (2006,

p. 138-139)

a noção do comum, quando se materializa em ações sociais, desperta identidade, mobiliza interações e pode levar à construção de compromissos e responsabilidades, pode fundar processos sociais e alianças políticas. Assim, é um conceito que contém a ideia de ação, de agregação de sujeitos, de integração de interesses, de associação de forças, de viabilização de potencialidades.

Vannucchi (2011) reitera que as universidades comunitárias, desde o início, estiveram

comprometidas com a sociedade e não com o lucro; entendidas por seus fundadores enquanto

um serviço público e não como negócio particular. Em documento, o COMUNG reafirma seu

caráter comunitário como decorrente de sua

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origem na vontade e no esforço da comunidade, da articulação e comprometimento com a comunidade regional, da sua inserção na história do povo da região, da sua gestão democrática e transparente, da sua autogestão pela comunidade acadêmica com a participação institucionalizada do poder público e de entidades representativas da sociedade civil nos órgãos colegiados e pela sua política de extensão universitária à comunidade (COMUNG, 1994, p. 5).

Durante décadas, essas instituições foram buscando mecanismos que possibilitassem o

seu reconhecimento junto aos órgãos públicos e de fomento da educação, sendo atribuída a elas,

no decorrer do processo, diferentes denominações. A busca pela definição de um conceito de

universidade comunitária contém uma posição política e a necessidade de ter firmada uma

identidade própria, para assim estabelecer relações políticas e de cooperação com o Estado e a

sociedade (FRANTZ, 2006).

Entre as décadas de 1980 e 1990, o setor privado de ensino superior vivia o auge de sua

expansão e almejava garantir o acesso às verbas governamentais (BITTAR, 2001). No entanto,

a geração de reformas educacionais implantadas a partir de 1990, provocou um forte

redirecionamento da universidade brasileira. Neste período a economia brasileira alinhou-se a

agências internacionais como o Banco Mundial, a Organização para a Cooperação e

Desenvolvimento da Economia (OECD), a Organização Mundial do Trabalho (OMT), cujas

políticas e avaliações são focadas nos termos neoliberais. Isso envolve a promoção de alianças

em prol da transformação das “formas do estado” (SHAW, 1997, p. 497) do fluxo livre de

capital à epidemia das privatizações, flexibilizações e avaliações.

Neste contexto o Brasil, que se consagrava como uma economia emergente, mas com

altos níveis de desigualdade social, direcionou as políticas governamentais a serviço da

economia global. Isso resultou na inclusão da educação no mercado internacional com o uso

generalizado de procedimentos e valores capitalistas competitivos na gestão das instituições de

ensino. A educação superior, em particular, passa a ser considerada como um serviço

comercialmente lucrativo (SOUZA; OLIVEIRA, 2003).

Sob essa concepção dominante, na década de 1990, a reforma universitária foi

implantada, produzindo radicais mudanças na educação superior. A Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional – LDB, Lei nº. 9.394/96 e as regulamentações que a sucederam,

facilitaram as possibilidades de mercantilização do ensino, da pesquisa e da extensão no ensino

superior. Ela rompeu com o modelo de universidade pública e abriu o campo para o setor

privado possibilitando a diversificação institucional – faculdades, centros universitários,

institutos – e a diversificação das fontes de financiamento. Trata-se de uma maneira particular

de governança, de tornar a educação superior “mais favorável para à estratégia de acumulação

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global” (ROBERTSON et al., 2006, p. 233).

No entanto, para Frantz (2006) a universidade é uma organização complexa em sentido

e significados históricos, não pode ser conduzida por visões simplistas e utilitárias, submissa

aos interesses do mercado, como se fosse um negócio, ou servindo como um simples

instrumento de políticas de governos. “A instrumentalização do fazer universitário em favor da

lógica do mercado ou de interesses de grupos reduz o seu sentido maior” (FRANTZ, 2006, p.

121). Por outro lado, a universidade não pode desconhecer a realidade de que ela sofre também

as consequências do mercado. O grande desafio da comunidade universitária é exatamente

reconhecer essa realidade e, por meio da gestão universitária, administrar complexas dimensões

culturais, políticas, sociais, econômicas garantindo que esse processo não se reduza a uma

simples operação de funções técnicas.

Neste contexto de reformas e de afrouxamento e permeabilidade das fronteiras entre

público e privado, as Universidades Comunitárias já estabelecidas e consolidadas no Brasil

passaram a ocupar um lugar no limbo: não se caracterizavam como instituições de direito

público, nem como corporações da iniciativa privada e seus recursos não advinham nem de

fontes governamentais, nem de aplicações financeiras em mercados de capitais.

Em 2013, após décadas na luta em busca de sua existência efetiva, o governo brasileiro

passou a reconhecer essas instituições como uma modalidade distinta das universidades

privadas. Com a Lei Nº 12.881, de 13 de novembro de 2013, o Estado brasileiro estabeleceu

um marco legal que define, qualifica, e especifica prerrogativas e finalidades das Instituições

Comunitárias de Educação Superior – ICES, reconhecendo-as como comunitárias, o que lhes

permite a participação na destinação de recursos orçamentários e em editais reservados para

instituições públicas, diferenciando-as de instituições privadas e com fins lucrativos (BRASIL,

2013).

Esta medida cria um novo fato na história dessas universidades e no contexto da

educação superior brasileira indicando a relevância e a necessidade do desenvolvimento de

investigações que evidenciem, esclareçam e ajudem a compreender não só o momento histórico

neste contexto de reformas educacionais, mas também a forma como tais instituições atuam na

construção de sua identidade institucional e nas respectivas leituras feitas pelos seus públicos

na significação da sua imagem institucional. Na fronteira entre o “não-lugar ou limbo” e o

marco histórico instituído com a criação da Lei nº 12.881 existe um profícuo espaço para

investigações e indagações a respeito dos traços que definem a identidade das universidades

comunitárias, pois longe está a solução para a crise existencial que afeta estas instituições em

suas bases financeiras e identitárias.

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Conforme Bittar (2001) ainda há muito para se explorar no que tange à compreensão e

análise das especificidades e características das universidades comunitárias. A preocupação

com o tema da identidade continua latente, como uma necessidade quase vital para essas

universidades que expressam, por meio de seus dirigentes, uma urgência em se verem

respeitadas pela sociedade e reconhecidas pelos seus serviços educacionais.

Mas como se define uma Universidade Comunitária? Na busca por uma resposta, várias

referências na área da educação podem ser citadas as quais tentam descrever e caracterizar a

essência dessas instituições como também os seus traços distintivos por meio de descrições de

sua história, dos fatos que marcaram a gênese “comunitária” requerida pelas associações que

as representavam, o seu papel junto as comunidades regionais, da singularidade de sua gestão

(TRAMONTIN; BRAGA, 1988; BITTAR, 1999; LONGHI, 2000; FRANTZ, 2006;

PEGORARO, 2008; PINTO, 2009; SCHMIDT; CAMPIS, 2009; BITTENCOURT, 2014). Em

geral esses estudos abordam o conflito existente na sua origem, que circula entre: o público e

privado, a natureza privada (porém sem fins lucrativos), o conflito entre a assistência e a

necessidade da provisão de recursos para manter a sua existência, entre ser uma organização ou

uma instituição.

Para além dos estudos na área da educação, foram identificadas em outras searas um

arcabouço que pode contemplar alguns parâmetros definidores da identidade dessas

instituições. Alguns estudos encontrados se debruçam sobre identidade organizacional,

principalmente na área das Ciências Sociais Aplicadas. O objeto de estudo são as universidades

e isso leva aos trabalhos de MacDonald (2013), Glynn, Lockwood e Raffaelli (2006), Gioia et

al. (2010), Stensaker (2015); Dumay, Draelants e Dahan (2015) os quais encontram no conceito

de identidade organizacional uma oportunidade para investigar as razões que levam à

continuidade ou às mudanças das características das instituições universitárias no contexto

atual.

Para Vannucchi (2011, p. 37) a identidade da universidade comunitária “não se

concretiza nem se confirma por uma ou várias definições a ela atribuídas”. Não importa qual

seja a definição escolhida, é necessário que esta reflita a consciência identitária da instituição.

Para o autor as universidades comunitárias nasceram de vozes que queriam se fazer ouvir e

participar da construção de um espaço de educação amplo e democrático. São iniciativas da

sociedade civil, sem fins lucrativos, não apoiam sua existência e interesses no capital, por isso

não podem ser confundidas com a sociedade empresária. Também não devem ser entendidas

como uma iniciativa de privatização do espaço da educação, mas “como um esforço pela

construção de novos e ampliados espaços públicos de educação. É uma iniciativa que não

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nasceu do poder público-estatal, mas no espaço da ampliação da esfera pública” (FRANTZ,

2006, p. 151). Nesse universo, instauram-se as dificuldades e os desafios da sustentabilidade

das suas atividades de ensino, pesquisa e extensão.

Com a admissão legal e a ampliação desordenada de entidades mantenedoras e de

instituições com fins lucrativos, a partir dos anos 1990, esse modelo de instituição, interessado

em promover um trabalho de inclusão de pessoas no ensino superior e sem o propósito do lucro,

começa a enfrentar limites. Sua sobrevivência depende do pagamento de mensalidades

efetuadas por seus estudantes. Na medida em que isso não acontece e que o Estado não cumpre

com suas obrigações de repassar recursos de programas de financiamento, se veem obrigadas a

recorrer a bancos para manter o seu funcionamento e manutenção, ficando à mercê das

imposições do mercado (CAMPIS, 2003). Para complicar, as instituições empresariais,

universitárias ou não, adotam uma postura ofensiva no mercado de competitividade e

funcionam com critérios de organização menos acadêmica e mais empresarial, sobrepondo a

organização administrativa à acadêmica e introjetando uma nova forma de governo que se opõe

à concepção clássica de universidade (CAREGNATO, 2004).

Chauí (2003a) tem discutido, com base no caso brasileiro, a identidade da universidade,

entendendo que ela se desloca da condição de instituição social para a de organização. Como

instituição visaria sua função na sociedade numa perspectiva universalista. Como organização,

volta-se para o eficientismo interno, ficando marcada por um caráter instrumental e efêmero.

Na linguagem corrente, usam-se as terminologias organizações e instituições como sinônimos

para identificar agrupamentos sociais nas suas mais diferentes tipologias (empresas públicas ou

quando se refere a uma organização, escolas, universidades, ONGs, órgão públicos). No

entanto, Bernardes (1988), usando a Sociologia como referência, destaca algumas

características para diferenciar tais termos: uma organização deve ter a função de produzir

bens, prestar serviços à sociedade, atender necessidades de seus próprios participantes, possuir

uma estrutura formada por pessoas colaborativas com o intuito de transformar insumos em bens

e serviços, bem como ser perene no tempo. Já uma instituição deve atender a certa necessidade

básica da sociedade, ter uma estrutura formada por pessoas que apresentem um conjunto de

crenças, valores, ideias e comportamentos comuns e que respeitem certas normas e

procedimentos. Alguns elementos entre os conceitos se entrelaçam, porém, a universidade tem

a tarefa de pensar a sociedade da qual é fruto, o que dá a ela um grande traço distintivo (CHAUÍ,

2003a).

Para McCowan (2016) a combinação entre incentivo ao lucro e a desassociação das

múltiplas funções da universidade são fatores que prejudicam sua capacidade de proporcionar

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ensino, pesquisa e participação comunitária voltado ao interesse público. Deste modo, “o valor

subjacente da universidade se move para o benefício instrumental, em vez de intrínseco e (lucro

líquido), e suas funções tornam-se fragmentadas e incapazes de reforçar-se mutuamente

(MCCOWAN, 2016, p. 520).

Essas novas configurações de cenários econômicos, políticos e sociais trazem, então,

novas indagações que abalam antigas certezas do papel dessas instituições na sociedade,

pressionando para diferentes performances. Em um mundo de mudanças, no qual a identidade

passa a ser compreendida como “algo evasivo, pouco estruturado, alvo a ser continuamente

inventado, expresso e suprimido ao mesmo tempo – um elemento contraditório” (PIMENTA;

LOPES; CORRÊA, 2010, p. 63), o conflito é inevitável.

Para Bauman (2005), a velocidade e intensidade das mudanças presentes no ambiente

institucional afetam significativamente os processos de identificação. Referindo-se ao contexto

atual, o autor, caracteriza-o como uma época líquido-moderna, em que o mundo se reparte em

fragmentos mal coordenados. Nele “a construção da identidade deixaria de ser uma condição

“natural”, um processo inequívoco, estável e definido, transformando-se em uma tarefa árdua

a ser cumprida, uma busca constante por novas identificações” (FERNANDES; MARQUES;

CARRIERI, 2010, p. 46).

Hall (1997) afirma que as identidades são “mutantes” e podem ser vistas como “figuras

discursivas”, ou seja, seriam efeitos tanto dos discursos do pensamento, quanto dos processos

que estruturam a modernidade. Essas colocações conduzem à ideia da existência de múltiplas

identidades.

Pratt e Foreman (2000) afirmam que as organizações podem ter múltiplas identidades

quando há concepções diferentes sobre o que é central, distintivo e permanente em suas

características. Do mesmo modo que psicólogos e sociólogos afirmam que o indivíduo tem

múltiplas identidades, as organizações têm sido concebidas como tendo vários “eus”. Gioia,

Schultz e Corley (2000) reiteram a afirmação de que não há uma identidade, mas várias

identidades em uma mesma organização, assim como não há uma única cultura, mas várias.

Hall (1997) enfatiza que a identidade não é estável ou fixa, mas social e historicamente

construída, ficando sujeita a contradições, revisões e mudanças. Considerando esta visão, a

questão da identidade para as universidades comunitárias se torna delicada, pois coloca em foco

o equilíbrio entre o que é estável e o que é fluído. Como lidar com a mudança, mantendo as

características que determinam o núcleo de sua identidade? (GIOIA, 1998; SILVA;

VERGARA, 2002).

Assim, em face do contexto de mudanças das políticas educacionais para o ensino

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superior no Brasil nas últimas décadas, da trajetória das universidades comunitárias e dos

estudos que evidenciam os dilemas vividos por este modelo de universidade nesse contexto,

desenvolveu-se a presente pesquisa. Esta foi orientada pela seguinte questão-problema: Como

a universidades comunitárias constroem e consolidam sua identidade considerando o

contexto mutante das políticas para o ensino superior nas últimas décadas? Essa pergunta

conduz ao objetivo geral de compreender o processo e as características que envolvem a

constituição identitária das Universidades Comunitárias do sul do Brasil, considerando o

contexto mutante das políticas para o ensino superior nas últimas décadas. Como

desdobramento, buscar-se-á: (1) identificar os principais marcos históricos de constituição da

identidade que norteiam as Universidades Comunitárias no contexto das políticas educacionais

para o ensino superior no Brasil; (2) analisar os traços identitários característicos das

universidades comunitárias, a partir das dimensões valor, função, interação, observando os

dilemas enfrentados por estas instituições no que tange às políticas neoliberais; (3) identificar

o modo como as universidades comunitárias manifestam/comunicam sua identidade aos seus

públicos.

Em face dos objetivos e da pergunta que direcionam este estudo, a tese defendida é que

os contrastes entre o caráter institucional e o organizacional, entre servir à comunidade e

sobreviver à concorrência, entre respeitar a sua gênese e ceder às imposições do mercado são

influenciadores na construção da identidade das universidades comunitárias, no entanto, não

são suficientes a ponto de comprometer a missão comunitária dessas instituições, essência de

sua identidade.

A defesa dessa tese e o ato de refletir sobre o que nela está envolvido traz algumas

contribuições para a discussão na área da educação superior e os modelos de universidade. As

universidades comunitárias são instituições de ensino superior e como tal e por sua gênese vão

muito além de transformar insumos em bens e serviços. Porém, ao se deparar com uma política

neoliberal, na qual a educação é vista como um bem de consumo, ou uma marca, sendo tratada

como qualquer mercadoria e bem de capital, sujeita às mesmas técnicas de gestão e estratégias

de negócios, se veem forçadas a refletir sobre novos tipos de tomada de decisão, novos

resultados e novos interesses, pois “nesse mundo dos negócios, os acionistas, os investidores e

os valores do mercado de ações – rentabilidade é o que conta na análise final” (BALL, 2014, p.

222). Cumpre papel importante, nesse cenário, o gerencialismo, responsável por destruir os

sistemas éticos-profissionais que prevaleciam nas instituições de ensino, os quais passam a ser

substituídos por sistemas empresariais competitivos (BALL, 2005). Ao se propor estudar como

as universidades comunitárias se configuram, se organizam e se definem em sua identidade

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seria observar como essas instituições vêm se legitimando no campo da educação superior e

como vêm enfrentando as intempéries provocadas pelo mundo globalizado.

As universidades comunitárias do sul do Brasil vêm influenciando o contexto da

educação como um modelo de organização que se consolidou no ensino superior. As

Instituições de Ensino Superior (IES) que formam especificamente o COMUNG (RS) e a

ACAFE (SC) representam juntas uma rede de educação, ciência e tecnologia que abrange quase

todos os municípios dos dois Estados. Integrado por 31 instituições de ensino e com 18.000

professores e mais de 16 mil funcionários, esse sistema contabiliza junto mais de 330.000

universitários matriculados em cursos de graduação e pós-graduação e oferece 4.400 cursos de

graduação e pós-graduação, constituindo-se um dos maiores sistemas de educação superior em

atuação no Sul do Brasil (COMUNG, 2016; ACAFE, 2016). Dada a abrangência e os impactos

socioeconômicos gerados por essas instituições nas regiões onde atuam, o tema universidade

comunitária constitui uma provocação ao debate atual sobre o ensino superior e o papel da

universidade na sociedade. Constitui também um desafio a sua conceituação, a sua definição, a

sua caracterização no sentido de poder orientar este debate e as próprias políticas públicas que

as afetam (FRANTZ, 2006).

Compreender a Universidade Comunitária é igualmente compreender sua interlocução

com o conjunto dos sistemas educativos, com os sistemas econômico, social, cultural em nível

local e global. No contexto brasileiro, desde a década de 1990, a ideologia neoliberal vem

apoiando a menor intervenção do Estado nas produções de políticas4 de cunho universal, na

qual distingue-se a educação superior. A acentuada expansão de Instituições de Educação

Superior, com ênfase no ensino privado, a descentralização, a diversificação e a flexibilização

dos modelos institucionais, a avaliação do ensino superior ancorada em conceitos de qualidade

isomórficos e orientados para a tomada de decisão e o controle de qualidade foram algumas as

mudanças que passaram a influenciar o cenário da educação superior orquestradas pelas

orientações do Banco Mundial (MOROSINI; FRANCO, 2006). Não imunes às mudanças, as

universidades comunitárias também são afetadas pelas novas políticas, o que implica a presença

de conflitos identitários ao longo do processo. Assim, refletir sobre os traços que caracterizam

essas instituições e o seu papel como universidades à luz das incertezas por que passa a

educação superior, torna-se um argumento plausível para considerar a relevância do estudo.

4 Neste contexto, pode-se considerar as políticas como mediações que, após grandes embates, conflitos, acordos, interpretações, são codificadas e materializadas em documentos complexos produzidos por autoridades públicas; e, posteriormente, decodificadas e interpretadas, com igual complexidade, pelos atores envolvidos, os quais atribuem significados de acordo com suas histórias e experiências (BALL, 1994; REZENDE; BAPTISTA, 2015).

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Há muito tempo, estudos tendo a universidade como tema vêm sendo realizados. No

contexto brasileiro, há inúmeros entre os quais pode-se destacar: Chauí (1999) e Dias Sobrinho

(2005). No âmago do debate, as diversas concepções, a razão da sua existência, o seu papel na

sociedade e seus múltiplos modelos levantam questionamentos que continuam a provocar

reflexões pertinentes e necessárias, principalmente no contexto da economia global. Neste

estudo, essa preocupação também se manifesta, assim como os estudos de Bittar (1999),

Schmidt (2010; 2017) na medida em que se busca entender os contornos que definem as

instituições chamadas universidades comunitárias e os elementos que as constituem.

Do ponto de vista teórico-metodológico, este estudo buscou em McCowan (2016; 2017;

2018) o referencial para analisar o modelo de universidade estruturado pelas comunitárias. O

autor propõe uma estrutura considerando três dimensões que diferenciam as instituições em

seus comportamentos: valor, função, interação, os quais contribuíram para identificar as

mudanças que vêm ocorrendo nas universidades comunitárias ao longo do tempo, tanto no que

se refere à sua função, quanto às suas relações com a sociedade.

Como já foi mencionado anteriormente, ao estudar as características constituintes da

“anatomia” da universidade, o autor propõe considerar três dimensões, as quais podem servir

de referência para diferenciar as instituições em seus comportamentos, são elas: valor, função,

interação. O que faz esse trabalho então: promove a aplicabilidade dessa teoria, a qual serve de

baliza para encontrar os ingredientes que constroem a identidade das universidades

comunitárias e tensionamentos com o mercado. Talvez resida aí uma boa razão para argumentar

favoravelmente à continuidade desse estudo.

Indo um pouco adiante, percebeu-se a necessidade de refinar um dos conceito-chave

desse estudo: identidade (ALBERT; WHETTEN, 1985; FERNANDES; MARQUES;

CARRIERI, 2009). Entendido como um conceito promissor e novo para pesquisar tanto a

continuidade quanto as mudanças que vêm ocorrendo nas instituições de ensino superior em

virtude da dinâmica externa atual, o conceito de identidade organizacional contribuiu para

analisar as universidades como instituições, em um momento em que forças buscam

transformá-las em organizações, bem como uma maneira de estabelecer uma conexão mais

próxima entre o mundo universitário e o mundo empresarial. A universidade não é apenas

sistemas técnicos ou produtivos, mas é um sistema social - como tal, é dotada de uma identidade

específica, e em processos de transformação deve fortalecer a sua identidade (identidade

organizacional) e utilizá-la como alavanca estratégica (DUMAY; DRAELANTS; DAHAN,

2015).

Esta tese está estruturada em capítulos. Na primeira parte apresenta-se introdução,

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definindo-se o tema e a problemática que orientaram o desenvolvimento da pesquisa, os

objetivos pretendidos, a justificativa do estudo e os estudos relativos à identidade

organizacional, alguns especificamente voltados à universidade. O segundo capítulo trata da

metodologia utilizada para o desenvolvimento da pesquisa: a abordagem teórico-metodológica,

a contextualização da pesquisa e os procedimentos utilizados na coleta e na análise dos dados.

No terceiro capítulo, são desenvolvidas as análises relativas às a construção da identidade das

universidades comunitárias, seus avanços e dilemas, no contexto das políticas educacionais para

o ensino superior. Dois aspectos serão abordados: a história dessas instituições e as políticas

educacionais para o ensino superior que promoveram o surgimento e o reconhecimento das

universidades comunitárias no Brasil, a partir da década de 1960 ao início do século XXI.; no

quarto capítulo, são tecidas análises a partir das dimensões valor, função e interação como

pilares da anatomia das universidades, considerando o conflito entre o servir e o performar em

resposta às políticas nacionais de ensino superior. No quinto capítulo, são apontadas as

considerações finais, bem como reflexões e sugestões para estudos futuros. Por último,

apresentam-se as referências, anexos e apêndices.

1.2 Estudos realizados

Com o propósito de levantar os estudos já realizados sobre identidade das universidades

comunitárias, foi realizada uma busca nas principais bases de dados disponíveis como SciELO

- Scientific Electronic, Library Online; EBSCO Publishing Service Selection Page e o Portal

de Periódicos, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), o

banco de teses e dissertações da CAPES, a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações

(BDTD). Estas bases de dados foram escolhidas por sua relevância e por reunirem bancos de

dados de periódicos, teses e dissertações. Assim, para esta investigação, foram utilizados os

seguintes termos: - ensino superior e universidades comunitárias; identidade e universidades; -

identidade e universidades comunitárias; identidade institucional e universidades comunitárias;

-identidade organizacional e universidades e a forma em inglês organizational identity and

higher education. Para abranger maior número de trabalhos, não foi delimitado período de

tempo.

Ao acessar o Banco de teses e dissertações da CAPES, 2.417 trabalhos foram listados a

partir da utilização dos elementos de busca “ensino superior AND universidades comunitárias”.

A pesquisa foi refinada, delimitando-se a área de conhecimento para Ciências Humanas, área

de concentração Educação, só teses. Obteve-se um resultado de 204 ocorrências. Ao fazer o

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rastreamento, observou-se que os focos eram diversos como estudo do currículo, modalidades

de avaliação, perfil de professores e alunos, apesar disso, 13 trabalhos foram pré-selecionados,

pois faziam menção à construção do modelo das universidades comunitárias, ao seu histórico e

também às características dessas instituições.

Em relação aos termos “identidade AND universidades comunitárias”, foram

identificados 402 trabalhos e aplicando refinamento, selecionando somente teses,

permaneceram 67 trabalhos, no entanto, poucos, apenas seis se relacionavam, parcialmente, ao

tema pesquisado. Ampliando a pesquisa aos buscadores “identidade organizacional AND

universidades comunitárias, foram encontrados 501 trabalhos. No refinamento para as áreas de

Ciências Sociais Aplicadas e Educação, Administração, 111 estudos foram listados, dos quais

somente cinco tinham relação direta com o foco da pesquisa. Na plataforma EBSCO foram

encontrados 36 estudos, dos quais 12 poderiam dar suporte a esta pesquisa no que se refere à

identidade organizacional das universidades.

Há um bom volume de trabalhos realizados sobre ensino superior e universidades

comunitárias, mas a maioria deles apenas tangenciava o foco desta pesquisa: identidade.

Observou-se a existência de 13 estudos que trazem como elementos centrais os termos

identidade e universidades comunitárias, principalmente na área de Ciências Humanas. Grande

parte dos estudos sobre identidade organizacional são realizados nas Ciências Sociais

Aplicadas, notadamente na administração.

Entre os trabalhos encontrados na área da Educação situa-se a tese de Bittar (1999) com

o título Universidade Comunitária: uma identidade em construção em que buscou analisar a

concepção de universidade comunitária. Seu estudo a partir da análise de documentos e

publicações das instituições, buscou conhecer na percepção de reitores e professores, até que

ponto a identidade desse modelo de universidade estava realmente construída. A autora

examinou a formação histórica do segmento, bem como itens requeridos pelas universidades

comunitárias como a presença da confessionalidade, a denominação ‘público não-estatal’, o

significado da extensão universitária com inserção na comunidade e as características da gestão

universitária. Seus achados evidenciaram a ambiguidade do conceito “universidade

comunitária” a “qual pretende ser um ‘espaço ímpar’ denominado como “público não-estatal”.

Pegoraro (2008), em sua tese, analisa a questão do terceiro setor e a educação superior

no Brasil. Por meio de entrevistas e análise de documentos, discute o compromisso social das

fundações universitárias em Santa Catarina, tomando como objeto de estudo a Universidade do

Contestado. Considerando a trajetória histórica de cada instituição, adota a gestão democrática,

a inovação e excelência, a identidade institucional e relevância social como princípios

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importantes para a construção de alguns modelos de universidades, especialmente as

constituídas por organizações da sociedade civil, socialmente relevantes.

Pinto (2009a), defendendo a tese de que as universidades comunitárias gaúchas

contribuem com uma educação socialmente responsável, por meio da articulação e da

indissociabilidade de suas funções, bem como da relação e da interação que estabelecem com

as comunidades de seu entorno, a autora buscou compreender como os gestores de universidade

comunitária gaúcha percebem se traduzir, nas atividades nelas desenvolvidas, preocupação com

uma educação socialmente responsável em sua instituição. Utilizou-se de várias fontes de

evidência, coletadas a partir de entrevistas – gestores; de documentos institucionais – relatórios

e balanços sociais de 2000 a 2007 e Projeto Político-Pedagógico Institucional –, e de

observações in loco. O estudo considerou que a UNISC é uma universidade socialmente

responsável, preocupada em contribuir com o desenvolvimento sustentável de sua região e que

vem encontrando um equilíbrio entre as ações direcionadas a seu público interno e aquelas

direcionadas ao público externo.

Silva (2012) traz um estudo sobre a ABRUC – Associação Brasileira das Universidades

Comunitárias apresentando as ações desenvolvidas por esta entidade na educação superior do

Brasil no período de 1995 a 2007. O autor fez uma análise documental com base nas legislações,

documentos e publicações da entidade, bem como realização de entrevista. O resultado

demonstrou avanços na fixação e aceitação do conceito de comunitária e do espaço público não

estatal. A ABRUC, ainda que dentro do corporativismo próprio do associativismo, possibilitou

avanços na criação de um espaço democrático para as IESs comunitárias, confessionais e laicas,

seja para o relacionamento e defesa de interesses comuns, seja para a questão de destinação de

verba pública.

Castro (2013) busca, em sua tese, compreender as características das universidades

comunitárias que justifiquem sua existência e crescimento, bem como contribuir para a

consolidação de uma identidade própria que as diferencia dos demais segmentos do subsistema

de educação superior brasileiro. Conclui a autora que além do ensino, produzem pesquisas e

dedicam importante esforço para partilhar o conhecimento e as artes com as comunidades, por

meio da extensão. A importância das Universidades Comunitárias se dá, destacadamente, pelo

seu reconhecimento como uma nova categoria jurídica: um espaço configurado como “público

não estatal” inserido entre os setores público e privado empresarial.

Fioreze (2017) analisa o modelo das universidades comunitárias regionais do Rio

Grande do Sul buscando compreender quais são os principais tensionamentos entre o público e

o privado vivenciados pelas universidades comunitárias no atual contexto, bem como

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identificar os desdobramentos de tais tensões na configuração dessas instituições. Os dados

consistiram em entrevistas com representantes das IES e análise de documentos nacionais e

institucionais. A tese demonstrou que as universidades comunitárias compõem um modelo

institucional peculiar, que, em meio a um contexto permeado por contradições e

tensionamentos, mostra-se tendente ao equilíbrio dentro de uma feição eminentemente híbrida,

a qual configura composições entre público e privado que, ao mesmo tempo em que podem lhe

fornecer plasticidade para se mover com agilidade frente aos desafios que emergem do

capitalismo acadêmico, também podem consubstanciar resiliência para preservar a ideia de

educação superior como bem público.

Além desses estudos de tese, outros trabalhos tangenciam a temática sobre identidade

das universidades comunitárias. Longhi (2000) realiza uma síntese das principais características

desse modelo, suas formas de resistência e o seu esforço em busca do atendimento às demandas

educacionais e sociais, pautado pela busca da melhor competência acadêmica.

Frantz (2006) busca caracterizar a universidade comunitária como uma instituição de

natureza pública não estatal, permitindo a sua identificação como um novo modelo de

organização e funcionamento de ensino superior, no Brasil. Morosini e Franco (2006), por sua

vez, analisam características de sustentabilidade na universidade comunitária - UC (não estatal

orientada para a região), segundo seus gestores, objetivando identificar políticas institucionais,

mudanças no caráter comunitário e traçar perspectivas. Os resultados apontaram características

de expansão, diversificação de áreas e de financiamento e estímulo acadêmico. Observou-se

também que as UCs diferem quanto ao fortalecimento do grupo central e à cultura empresarial.

Fernandes (2008) faz uma revisão sobre a caracterização das Instituições de Ensino

Superior – IES no Brasil, com foco na conceituação de universidade comunitária e evidencia a

ambiguidade dos conceitos de universidade comunitária em oposição ao de universidade

particular, notadamente na ótica dos estudantes. Gumbowsky (2013) apresenta aspectos da

evolução dessas instituições e discute o conflito entre o seu compromisso original de fomentar

o desenvolvimento regional, transitando por um período de mercantilização do ensino superior

e, mais recentemente, convivendo com políticas públicas que ampliam o acesso ao ensino

superior gratuito.

Bittencourt et al. (2014), analisam o novo cenário da educação superior brasileira, com

especial enfoque nas IES integrantes da Associação Brasileira de Universidades Comunitárias

(ABRUC). Os resultados obtidos, justificam a valorização dessas instituições que operam e

contribuem para a consolidação dos cursos superiores no Brasil.

Rosa-Castro, Marques Júnior e Marques (2014) buscam caracterizar as Universidades

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Comunitárias no setor da Educação Superior Brasileira, sob o olhar dos gestores, considerando

o tripé ensino/pesquisa/extensão, assim como, Venanzi e Sandano (2014), que analisam missão

e prestação de serviços à comunidade na busca de uma consolidação de uma identidade própria

que auxilie essas universidades a desempenhar com eficiência a missão educacional a que se

propõem.

Luckmann, Cimadon e Bernart (2015) aprofundam o debate sobre o modelo

comunitário em duas dimensões: a social e a jurídica: (1) A primeira vincula-se a dimensão de

natureza pública construída por esse modelo ao longo da história, a qual extrapola as dimensões

do público-estatal e do privado presentes nos modelos de educação superior vigentes. Isso pôde

ser constatado na forma como as ICES foram criadas, como constituíram seu patrimônio, como

organizam sua gestão, como aplicam e destinam seus recursos financeiros e patrimoniais, como

ocorre a participação da sociedade civil nos conselhos da instituição e, sobretudo, na prestação

de contas à sociedade; (2) a segunda se refere à participação das ICES nas políticas de regulação

e supervisão do ensino superior, e sua restrita participação nas políticas de fomento. Parte dos

programas de fomento é destinada exclusivamente às IFES (Programa de Apoio a Planos de

Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), Programa de Apoio à

Extensão Universitária (ProExt), Programa de Acessibilidade na Educação Superior (Inluir),

entre outros. Para os autores, o Estado precisa construir as condições políticas de uma presença

mais orgânica junto às instituições comunitárias, caso contrário, corre-se o risco de vermos uma

experiência bem-sucedida de educação superior se perder com o tempo.

Paim e Yamaguchi (2016) buscaram evidenciar e avaliar as percepções da comunidade

organizada acerca da interação regional das Instituições Comunitárias de Ensino Superior -

ICES catarinenses. O estudo apontou que para as ICES serem protagonistas do

desenvolvimento regional, precisam proporcionar um relacionamento cooperativo com os

órgãos representativos dos municípios e da região, bem como com as entidades de classe da

comunidade organizada.

Tendo em vista a proposta desta pesquisa, esses trabalhos apontam elementos que

fortalecem o posicionamento adotado no estudo, em relação ao problema e a tese defendidos.

Estudos que visam o entendimento do conceito de universidade comunitária, de natureza

pública não estatal, que discutem o modelo comunitário de educação superior no contexto do

ensino superior brasileiro, que buscam compreender os tensionamentos entre o público e o

privado vivenciados por essas instituições, trazem argumentos que destacam os dilemas vividos

entre os propósitos fundacionais das universidades comunitárias e a sua luta para sobreviver às

pressões no mercado competitivo.

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Além do conhecimento produzido sobre o tema na área da educação, o estudo

bibliométrico permitiu identificar importantes pesquisas, notadamente no campo da

administração sobre os conceitos: identidade organizacional/institucional.

O tema sobre identidade organizacional se intensificou a partir da década de 1980. Nos

Estados Unidos, o estudo passou a conquistar espaço com a publicação de um artigo intitulado

Organizacional Identity, Universidade de Illinois, desenvolvido por Albert e Whetten em 1985.

No Brasil, esse tema começou a ser estudado, com mais intensidade, a partir de 1995, com os

trabalhos de Wood Jr. e Caldas (1995) (CRÉDICO, 2003).

Albert e Whetten (1985) tomaram da Psicologia e da Sociologia alguns estudos a

respeito do conceito de identidade individual para o nível organizacional de análise,

estabelecendo alguns critérios para observação. Os autores caracterizam a identidade

organizacional como uma questão de “autorreflexão”, em que os membros da organização, ao

compartilhar suas crenças acerca dos atributos da identidade, respondem à questão: “Quem

somos nós como organização?” Para os autores, a identidade nas organizações tem por base

três características: a centralidade - o que é considerado pelos membros como a essência da

organização; a distintividade - o que faz a organização se diferenciar/distinguir de outras; e a

permanência /continuidade temporal - que se refere à manutenção e à estabilidade de

determinadas características ao longo do tempo.

As organizações, assim como os indivíduos, decidem quem elas são ao empregar algum

esquema de classificação e ao se localizar dentro deste esquema. Quanto ao critério de caráter

central da identidade de uma organização tem que ser uma declaração que a distingua em

relação a algo importante e essencial, considerando o que é central para ela, a partir de um certo

propósito (ALBERT; WHETTEN, 1985).

Gioia (1998), acrescenta elementos a essa discussão destacando que, assim como os

indivíduos, as organizações mantêm sua identidade ao interagir com outras organizações,

utilizando o processo de comparação ao longo do tempo. E ressalta ainda que, as organizações,

tanto quanto os grupos de indivíduos, procuram parecer similares a um determinado grupo de

outras organizações, enquanto, ao mesmo tempo, procuram se distinguir desse grupo de

referência. A ideia de que a identidade seria então relacional e comparativa também seria

aplicada às organizações. Para Albert e Wetthen (1985) as organizações, igualmente, se

empenham em manter a continuidade dos conceitos sobre si mesmos ao longo do tempo,

investindo na consistência de seus valores e ações, mas também buscando manter certa

adaptabilidade em tempos de mudanças rápidas.

Para Scott e Lane (2000), a identidade organizacional compreende o processo, atividade

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e acontecimento por meio do qual a organização torna-se específica na mente de seus

integrantes. Segundo Albert e Wetthen (1985) esse processo, se manifestaria por meio das

crenças partilhadas pelos membros da organização sobre o entendimento do que seria central,

distintivo e duradouro na organização. Para Machado (2003), a identidade organizacional é

construída dia após dia, conforme os membros vão internalizando a crença de que a organização

da qual fazem parte é a mesma que era ontem, simbolizando sua existência temporal.

A identidade organizacional também forma uma estreita relação com a cultura

(MACHADO, 2005), na medida em que os significados atribuídos aos símbolos, rituais,

cerimônias, histórias os quais são compartilhados pelos membros da organização, ajudam a

orientar a percepção sobre a essência dessa organização. O foco da identidade, portanto, se fixa

em como as pessoas desenvolvem uma compreensão coletiva de “quem somos nós como

organização”, construindo os sentidos sobre “o que é a organização” (FERNANDES;

MARQUES; CARRIERI, 2009).

Ao longo do tempo, diferentes definições e abordagens foram adicionadas ao conceito

de Albert e Wetthen (1985), surgindo algumas dimensões antagônicas sobre o conceito de

identidade organizacional (FERNANDES, MARQUES; CARRIERI, 2009). Para os autores,

ora o conceito é tomado numa perspectiva objetiva, como variável passível de ser manipulada,

ora é entendida de forma subjetiva, a partir das percepções dos indivíduos sobre “o que é

organização”. Nessa perspectiva, a identidade organizacional pode ser conceituada como a

“metáfora que exprime as percepções das pessoas acerca da essência de quem somos nós como

organização” (FERNANDES; MARQUES; CARRIERI, 2009, p. 689).

Uma revisão bibliográfica realizada por Ravasi e Canato (2013) revelou que levou mais

de dez anos para que estudos empíricos sobre identidade organizacional começassem a aparecer

nas principais revistas da área, depois do trabalho de Albert e Whetten (1985). Os autores

analisaram os artigos empíricos que compreendiam o período entre 1985 e 2011 publicados nas

mais conceituadas revistas internacionais como: Academy of Management Journal,

Administrative Science Quarterly, British Journal of Management, Human Relations, Journal

of Management, Journal of Management Studies, Journal of Organizational Behavior,

Organization Science, Organization Studies, Strategic Management Journal e Strategic

Organization.

Ravasi e Canato (2013) classificam os estudos empíricos sobre identidade

organizacional em três grandes ondas que refletem o modo de pesquisar o conceito. A primeira

onda, de 1991 a 2000, é da Identidade Organizacional - IO como uma “explicação inesperada”.

Nessa onda, os estudos tinham como foco a investigação do gerenciamento de problemas,

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mudanças estratégicas ou respostas para a degradação de imagens organizacionais. A segunda

onda, entre 2000 a 2002, contempla análises realizadas ao nível do indivíduo, com pesquisas

que investigavam vários antecedentes da identificação dos indivíduos com a organização. Esses

estudos demonstram como uma identidade coletivamente percebida e coerente com os valores

pessoais dos membros tende a favorecer o forte apego dos indivíduos à organização. A terceira

onda, de 2002 a 2011, estuda a IO como objeto de pesquisa explícito, reunindo estudos sobre

construções e processos. As investigações tendem a construir as teorias baseadas em um único

estudo de caso, relativo a um prolongado período de tempo ou concentrando-se em eventos

organizacionais especiais, tais como fundações, fusões ou reestruturação (RAVASI; CANATO,

2013).

Bauer e Mesquita (2007) observaram que os trabalhos sobre identidade, na literatura

internacional, seguem diversos caminhos epistemológicos e que abordam tanto o nível coletivo

(ou imagem organizacional), quanto o nível mais subjetivo, da identidade social e identificação.

Na literatura nacional, a produção sobre o tema tem se voltado para estudos na organização, e

não da organização, assim as análises predominam sobre a identidade dos indivíduos inseridos

nas estruturas organizacionais. Embora haja distinção entre as concepções, em se tratando de

identidade organizacional, alguns aspectos da identidade pessoal, da identidade no trabalho e

da identidade social acabam sendo mencionados, demonstrando certa complementaridade entre

os fenômenos (MACHADO; KOPITTKE, 2002). Isso porque qualquer estudo sobre identidade

se fundamenta a partir do comportamento dos indivíduos ou dos grupos, isto é, do

comportamento humano nas organizações (BAUER; MESQUITA, 2007).

Segundo levantamento realizado por Crédico (2003) nos Anais do ENANPAD e na

RAE – Revista de Administração de Empresas, no período de 1987 a 2002, os primeiros

trabalhos realizados no Brasil sobre identidade organizacional iniciaram na década de 1990 com

três estudos teóricos de Wood Jr e Caldas (1995), Caldas e Wood Jr (1997) e Campos (2002).

A partir de 2001, várias pesquisas empíricas realizadas em organizações brasileiras que

passavam por grandes mudanças, principalmente estatais que foram privatizadas, do ramo de

telecomunicações se apresentaram tais como Machado-da-Silva e Nogueira (2001), Carrieri

(2002), Cesar e Machado-da-Silva (2002), Rodrigues e Child (2002) e Silva e Vergara (2002).

Crédico também constatou que os autores brasileiros empregam basicamente o conceito

clássico de identidade organizacional definido por Albert e Whetten (1985), os conceitos da

Teoria da Identidade Social, de Cultura Organizacional e do Interacionismo Simbólico.

Miranda, Pessanha e Moreira (2009), tomando a cultura como elemento constituinte da

IO buscam compreender a construção identitária da organização, a partir de sua cultura e

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imagem. Por meio da percepção dos informantes internos, os autores verificam alguns traços

culturais que auxiliaram na compreensão dos parâmetros de definição da identidade

organizacional, conforme propostos por Albert e Whetten (1985). Nessa perspectiva, o sistema

de gestão da qualidade foi elemento que se destacou como característica simultaneamente

central, distintiva e duradoura da organização.

Os pesquisadores Beyda e Macedo-Soares (2010) em levantamento bibliográfico de

artigos sobre identidade organizacional produzidos no Brasil a partir de 2004 e publicados nos

Anais dos encontros da EnANPAD, EnEO, EnGPR e nos periódicos da RAE-e, RAC-e,

RAUSP, BAR, Organização & Sociedade e Cadernos Ebape, afirmam que é possível perceber

a terceira onda nas pesquisas empíricas sobre Identidade Organizacional, relatada por Ravasi e

Canata (2013). Entre 2004 e 2009, com objetivo de compreender o fenômeno, as pesquisas

empíricas enfocam a identidade organizacional como um objeto de pesquisa explícito. Essas

pesquisas são elaboradas com diferentes propósitos tais como: verificar como a identidade

organizacional se comporta em situações de mudança (NOGUEIRA, 2007; CARASSAI,

FONSECA, 2009), estudar a construção da identidade organizacional (MACHADO, 2005;

MIRANDA; PESSANHA; MOREIRA, 2009), ou relacionar a Identidade Organizacional com

outras abordagens como cultura (MACHADO, 2005) ou imagem (MIRANDA; PESSANHA;

MOREIRA, 2009).

Machado (2014), ao estudar a formação da identidade organizacional de um campus

universitário federal, buscou examinar, em sua dissertação, o processo, a partir do que os

membros dessa instituição entendiam e incorporavam aquilo que representava a essência da

organização, do que a distinguia e do que a tornava única no contexto de sua atuação e do que

permanecia nela ao longo do tempo. Os achados de Albert e Wetthen (1985) serviram de base

para analisar os significados compartilhados pelos membros ao que era central, distintivo e

duradouro no contexto do Campus. A autora conclui que a organização vem formando sua

identidade ao longo de um processo que compreende seis momentos distintos do

desenvolvimento do Campus: (1) sua criação; (2) a instalação; (3); o início do seu

desenvolvimento; (4) a criação dos cursos; (5) a mudança de local; (6) a expansão das atividades

de ensino. Verificou que, em cada um desses momentos, vários acontecimentos influenciaram

na construção da identidade, bem como foram constatados alguns fatores críticos na definição

e consolidação de sua identidade.

Borba (2018) em seu estudo intitulado Imagem e identidade da Universidade do Vale

do Itajaí buscou identificar a imagem e a identidade dessa instituição comunitária. Para o

construto identidade, a pesquisa empírica envolveu entrevistas com dois gestores da

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Universidade e triangulação com o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI). O resultado

apontou que a identidade é constituída de cinco categorias quais sejam Definição de instituição

comunitária, Posicionamento, Inserção regional, Estratégias e Reconhecimento. Já para o

construto da imagem, foi utilizado o Método de Configuração da Imagem (MCI), desenvolvido

por Schuler e De Toni (2007) e envolveu entrevistas com 30 alunos, 30 funcionários e 30

membros da comunidade de Itajaí na fase qualitativa exploratória e uma pesquisa do tipo survey

para toda a população na fase quantitativa e descritiva. Os resultados apontaram como

formadoras da imagem da Universidade do Vale do Itajaí, nove dimensões e 13 atributos, a

saber: Dimensão Top of Mind: atributos “Universidade”, “Qualidade” e “Referência”;

Dimensão Afetiva: “Carinho”; Dimensão Emocional: “Estrutura” e “Estacionamento”;

Dimensão Racional: “Contribuir com a Sociedade” e “Aprendizado”; Dimensão Sensorial:

“Arquitetura”; Dimensão Simbólica: “Fundamento”; Dimensão Visionária: “Crescimento”;

Dimensão Axiológica: “Respeito”; e Dimensão de Pontos de Comparação: “Melhor”.

Apesar de trilharem caminhos teóricos distintos, os estudos da área de Ciências

Humanas e os estudos das Ciências Sociais Aplicadas sobre identidade acabam se encontrando

em determinados momentos na medida em que buscam analisar e caracterizar a formação das

identidades de instituições e organizações por suas semelhanças, diferenças, aspectos

duradouros e por influência do contexto histórico. Muitas pesquisas analisam a identidade

tomando como referência a teoria da identidade institucional (Albert; Wetthen, 1985) ao utilizar

as categorias de centralidade, distintividade e durabilidade, mas também usam o contexto

histórico para fazer a análise (Gioia et al., 2010; Machado, 2005). Esses afirmam que a

identidade organizacional tem uma relação estreita com a cultura, na medida em que a

percepção das pessoas sobre a essência da organização é permeada por significados atribuídos

às formas de expressões culturais, como histórias, mitos, rituais, símbolos que são

compartilhados por seus membros.

Ainda em busca de estudos sobre identidade organizacional das universidades, foi

realizada uma pesquisa na Plataforma de base de dados EBSCO. Foram encontrados trinta e

seis trabalhos a partir da utilização das palavras-chave organizational identity AND higher

education, destes, oito estudos poderiam contribuir para esta pesquisa.

Stensaker (2015) ao buscar compreender a dinâmica da universidade, argumenta que a

identidade organizacional é um conceito promissor e relativamente novo para pesquisar tanto a

continuidade quanto as mudanças que vêm ocorrendo nas instituições de ensino superior.

Demonstra a relevância do conceito, identificando e descrevendo vários usos da identidade

organizacional dentro das universidades. A identidade organizacional é um conceito que pode

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ser usado para analisar as universidades como instituições, em um momento em que forças

fortes buscam transformá-las em organizações. A afirmação é de que existem possíveis elos

entre imagem, integração, inovação e interpretação que precisam ser explorados, sugerindo que

a mudança e a continuidade talvez estejam conectadas de maneiras altamente complexas. A

identidade organizacional é um conceito que representa uma promessa considerável nesta

situação, devido à sua maneira de conectar o passado e o futuro, a tradição e a modernidade.

Assim, a identidade organizacional é um conceito que pode destacar valores e normas

importantes da universidade em uma época em que as conotações mais positivas dos rótulos

tradicionais que as caracterizam foram perdidas.

Em trabalho intitulado Identidade organizacional: uma revisão da literatura de 1972 a

2014, Dumay, Draelants e Dahan (2015) analisaram 120 estudos empíricos, reconhecendo a

existência de uma literatura rica, mas dispersa, em termos teóricos, epistemológicos e

metodológicos sobre o uso do conceito de identidade organizacional para entender as

transformações atuais por que passa a universidade. Foram identificadas seis principais

categorias de pesquisa de acordo com as distinções clássicas encontradas na literatura de

identidade organizacional propostas por Hatch e Schultz (2002) e Glynn (2008). Para Hatch e

Schultz (2002) a identidade organizacional é um processo de diálogo e comparação entre

imagens externas da organização (hetero-definições) e sua cultura interna (auto-definições), ela

é construída na interseção de dois processos, um espelhando e refletindo e outro, autoexpressão

e autoapresentação. Espelhamento: indivíduos valorizados fora da organização têm

representações dela e, assim, mantêm um espelho para os que estão por dentro. Refletindo: a

imagem refletida no espelho oferecido por outros não pode deixar de afetar a forma como os

atores da organização percebem e se definem. Sua interpretação interna depende da cultura

organizacional e da compreensão da identidade coletiva disponível dentro da organização.

Autoexpressão: ao longo do tempo, as organizações, como os indivíduos, constituem suas

identidades através de suas próprias narrativas, discussões internas e debates sedimentados na

cultura organizacional. Autoapresentação: as imagens da organização são projetadas para seu

público, deliberada e estrategicamente ou não.

Para construir a tipologia de estudos sobre a identidade organizacional das

universidades, os autores cruzaram os quatro elementos do processo de construção identitária

estabelecidos por Hatch e Schultz (2002) (Espelhamento, Refletindo, Autoexpressão,

autoapresentação) com a classificação proposta por Glynn (2008) dos três principais tipos de

definição de identidade organizacional (essencialista, estratégica, neo-institucional). O primeiro

deles, que segue na linha da definição inicial de Albert e Whetten (1985), baseia-se em uma

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visão essencialista. Se concentram em identificar e enumerar os aspectos essenciais, distintivos

e duradouros que definiriam a "essência" da organização. O segundo enfoca a forma como a

identidade é utilizada como um recurso estratégico, oferecendo vantagens competitivas e

funcionando como uma bússola para os membros da organização quando tomam decisões e

escolhas estratégicas. A terceira definição, de natureza institucional e relacional, mostra um

maior contraste com a primeira e está menos preocupada em buscar a natureza ou atributos

únicos das organizações do que com o estudo dos processos de construção de posições dentro

de um campo organizacional. Quando a pesquisa se baseia na dinâmica externa (processos de

espelhamento e auto-apresentação), as abordagens estratégicas dominam (40 estudos fora dos

64 identificados), no caso da dinâmica de identidade interna (refletida e autoexpressão) que

representam um número menor de estudos, as abordagens essencialistas estão melhor

representadas (22 artigos dos 35 identificados).

Ao se fazer recortes em uma pesquisa, busca-se garimpar fontes que de alguma forma

ajudem a elucidar os fenômenos que se apresentam na realidade, os quais merecem ser

investigados. Este é um deles: investigar a construção da identidade das universidades

comunitárias e seus conflitos à luz das políticas educacionais para o ensino superior, o que

requer critérios minuciosos no garimpo por estudos já realizados sobre esse universo.

O levantamento de estudos realizados na área de Ciências Sociais e Humanas e na área

da Teoria das Organizações demonstrou importantes referenciais em pesquisas sobre o tema

identidade das universidades, especificamente, das universidades comunitárias e deu

indicativos das potencialidades do aprofundamento desse tema desde outras perspectivas

analíticas, principalmente as que possibilitem discutir os embates e dilemas em torno dos temas:

identidade institucional e identidade organizacional. Então, encontrou-se nesse universo um

terreno fértil para a discussão nessa tese, daí é que se propõe, por meio do referencial teórico

proposto por McCowan (2016) discutir os componentes da anatomia das universidades e por

Albert e Whetten (1985) os componentes que constituem a identidade organizacional.

Buscou-se encontrar, nesses estudos, subsídios que contribuissem para a compreensão

daquilo que marca a identidade do modelo de instituição chamado universidades comunitárias.

Outros estudos, no meio do trajeto, serviram de suporte para a análise da empiria e

fortalecimento na construção deste conhecimento e elucidação dessa tese.

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2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Este capítulo tem como finalidade evidenciar a abordagem teórico-metodológica (2.1)

escolhida para este estudo; a contextualização da pesquisa (2.2), e os procedimentos de coleta

e análise dos dados (2.3).

2.1 Abordagem teórico-metodológica

Ao tomar identidade como “uma produção psíquica complexa e que assume numerosas

dimensões e estratos, em virtude de nossas experiências pessoais e dos grupos de que fazemos

parte” (FREITAS, 2010, p. 13); ao considerar o processo de construção identitária dinâmico e

que se alicerça em bases históricas e sociais, derivando daí múltiplas identidades “conforme o

nível de identificação de um indivíduo em relação ao seu grupo e de ambos em relação à

organização” (SARAIVA et al., 2010, p. 19); este estudo concentra seus esforços de pesquisa

na construção da identidade das universidades comunitárias, sendo desenvolvido na linha de

pesquisa Políticas para Educação Básica e Superior, no grupo de Pesquisa Observatório de

Políticas Educacionais do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale

do Itajaí. Levando em consideração o contexto brasileiro, no escopo das reformas e políticas

educacionais, e a existência de um modelo alternativo e diferenciado de universidade presente

no sul do Brasil denominado universidade comunitária, este trabalho, como já foi mencionado,

busca compreender o processo e as características de constituição da identidade dessas

instituições, focalizando os desafios que estas encontram no contexto das políticas públicas

voltadas ao ensino superior no Brasil.

Para estudar o processo de construção da identidade das universidades comunitárias e

os elementos que as caracterizam, parte-se do pressuposto de que existem várias realidades

subjetivas que variam em sua forma e conteúdo entre indivíduos, grupos e culturas. O ser

humano não é passivo, ao contrário, interpreta o mundo em que vive continuamente e a

realidade muda por causa das observações e dos pontos de vista dos atores estudados.

(OLIVEIRA, 2011; SAMPIERO; COLLADO; LUCIO, 2013). Portanto, optou-se pela

abordagem qualitativa por se entender que o estudo da experiência humana deve ser feito

considerando que as pessoas interagem, interpretam e constroem sentidos. Nessa perspectiva

Stake (2011, p. 30) afirma que na pesquisa qualitativa, o [...] pesquisador é um instrumento ao

observar ações e contextos e, com frequência, ao desempenhar intencionalmente uma função

subjetiva no estudo, utilizando sua experiência pessoal em fazer interpretações”.

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No universo de metodologias inseridas na abordagem qualitativa optou-se pela

metodologia de estudo multicaso para desenvolver a investigação. O estudo de casos diz

respeito à replicação e não amostragem, isto é, não permite generalização dos resultados para

toda população, mas a possibilidade de previsão de resultados similares ou contrários aos

esperados (YIN, 2005). Conforme Boyd e Westfall (1987, p. 73), o estudo de multicasos tem

se mostrado conveniente na identificação de três fatores: “fatores comuns a todos os casos no

grupo escolhido; fatores não-comuns a todos, mas apenas a alguns subgrupos; fatores únicos

em caso específico”.

Nesse sentido, o emprego do método multicaso, nesta pesquisa, permitiu a compreensão

do processo de construção da identidade institucional das universidades comunitárias

selecionadas a partir da análise dos discursos de seus gestores, bem como dos documentos

oficiais que nortearam as políticas educacionais voltadas a essas instituições e documentos

produzidos por elas, como os Planos de Desenvolvimento Institucional (PDI). Considera-se que

mesmo sendo classificadas como comunitárias, as quatro universidades estudadas apresentam

experiências que se assemelham e também não comuns que foram sendo construídas de modo

específico, de acordo, com sua história, condições sociais e pessoas que dela foram partícipes.

Como referenciais orientadores das análises estão os estudos de McCowan (2016; 2017)

ao se referir às características que definem uma universidade e de Albert e Wheten (1985), ao

propor um modelo de análise da identidade organizacional.

McCowan (2016; 2017) sugere alguns ingredientes substanciais para a análise de

características constituintes da “anatomia” da universidade, os quais podem contribuir para

identificar as mudanças que vêm ocorrendo nas universidades comunitárias ao longo do tempo

tanto no que se refere ao conhecimento, quanto às suas relações com a sociedade. O autor

propõe uma estrutura considerando três dimensões que diferenciam as instituições em seus

comportamentos: valor, função, interação. A figura 1 ilustra essa proposta.

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Figura 1 - Anatomia da universidade

Fonte: Elaborado pela autora a partir de McCowan (2016; 2017; 2018)

A dimensão valor refere-se à razão da existência da universidade, do porquê do ensino

superior. Dois eixos são considerados ao valor atribuído à universidade: o valor intrínseco (o

conhecimento gerado vale por si mesmo sem qualquer justificativa) e o valor instrumental (o

conhecimento servindo a objetivos individuais e sociais e interesses econômicos, políticos ou

culturais (MCCOWAN, 2016, p. 550). A dimensão função relaciona-se à variedade de

atividades e papéis que a universidade cumpre. Diz respeito ao papel da universidade em termos

de armazenamento, transmissão, produção ou aplicação de conhecimento. A dimensão

interação refere-se às formas como a universidade se relaciona com a sociedade externa, isto

é, a facilidade ou dificuldade com que o fluxo de atores e ideias acontece, ao quanto suas portas

estão abertas ou fechadas para traduzir e comunicar o conhecimento produzido a parceiros

externos e à comunidade. “Todas essas dimensões de porosidade podem ser vistas em diferentes

escalas: em relação às comunidades locais, ao nacional e ao global, vinculando-as a debates

sobre internacionalização” (MCCOWAN, 2016, p. 511). Este quadro analítico serviu de

referência para avaliar os possíveis dilemas que as universidades comunitárias vêm enfrentando

quanto à construção de sua identidade e a relação desta com as políticas educacionais para o

ensino superior.

Agregando-se a este arcabouço, os elementos propostos por Albert e Whetten (1985),

Ashforth e Mael (1996) e Carrieri (2002) e que sustentam a identidade organizacional também

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serviram de apoio para as análises sobre a identidade de tais instituições, quais sejam: o que

lhes é central (características vistas como a essência da instituição), o que lhes é distintivo

(elementos que distinguiriam uma instituição das outras com quais poderia ser comparada) e o

que lhes é duradouro (características estáveis no tempo). A figura 2 ilustra esses elementos.

Figura 2 - Dimensões da identidade organizacional

Fonte: Elaborado pela autora a partir de Albert e Whetten (1985)

Todos esses aspectos integrantes da identidade organizacional são interdependentes e

sua análise se daria em conjunto sendo descritos pela linguagem por meio de discursos e

narrativas. Também estariam materializados na missão, nos objetivos organizacionais

estratégicos, nas proposições ideológicas presentes nas culturas, nos valores organizacionais

(NOGUEIRA; MACHADO-DA-SILVA, 2003). Vista assim, a identidade toma uma dimensão

subjetiva, concebida como um processo de construção social que resulta na percepção dos

indivíduos sobre os atributos centrais, distintivos e duradouros da organização (ALBERT;

WHETTEN, 1985; CARRIERI, 2001; HATCH; SCHULTZ, 2002). Sendo as universidades

comunitárias consideradas um modelo de instituição de ensino superior que vêm se forjando ao

longo de décadas, considera-se que como tais, traços centrais, distintivos e duradouros possam

ser ressaltados em sua construção identitária.

Para a análise das dimensões valor, função, interação e sua relação com os conflitos por

que passam as universidades comunitárias, partir-se-á de alguns traços identitários ou

característicos dessas instituições preconizados e reiterados em estudos realizados sobre as

instituições comunitárias. A Lei 12.881/2013, cujo texto contempla a definição, a qualificação,

as prerrogativas e as finalidades das instituições comunitárias também é referência para a

seleção das características que marcam a identidade das instituições comunitárias.

Entre os traços distintivos dessas instituições aludidas por diversos autores identificados

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na revisão de literatura estão as seguintes: (I) Quanto à iniciativa de criação. A origem dessas

instituições se deu por organizações da sociedade civil e do poder público local/regional. (II)

Quanto à responsabilidade pela manutenção e forma de constituição. Associações ou fundações

da sociedade civil são responsáveis por sua manutenção. A entidade mantenedora é que tem a

personalidade jurídica (pessoa jurídica de direito privado) e cabe-lhe prover os recursos

necessários para o funcionamento da instituição de ensino. (III) Quanto à natureza e finalidade.

Pública não estatal. As universidades comunitárias gozam de significativa autonomia

administrativa e científica, isso porque não pertencem a proprietários individuais nem ao

Estado. (IV) Quanto à destinação dos recursos econômicos. Os recursos angariados destinam-

se à manutenção e qualificação dos serviços prestados, portanto, sem fins lucrativos. (V) Quanto

à forma de escolha dos dirigentes (autogestão). A direção das universidades comunitárias é

exercida por professores do seu quadro docente. Em certas instituições há eleição direta, em

outras são nomeados pela mantenedora. (VI) Gestão com caráter público. Os cidadãos são

tratados de forma isonômica, sem privilégios ou distinção. (VII) Inserção comunitária.

Compromisso com a extensão que se materializa pela atenção dada às necessidades do contexto

social das comunidades regionais. (VIII) Participação e transparência. Participação ativa dos

diversos segmentos da sociedade nas decisões e acesso às informações sobre temas acadêmicos

e financeiros (FIOREZE; MCCOWAN, 2018; SCHMIDT, 2017; VANNUCCHI, 2011;

LONGHI; FRANCO; ROCHA, 2009; CRUZ, 2008; FRANTZ, 2006; SAMPAIO, 2000;

BITTAR, 1999).

A partir dos estudos realizados até aqui, foi possível criar uma figura demonstrativa das

dimensões de análise (valor, função, interação) relacionadas às características/atributos das

universidades comunitárias e às possíveis ameaças. A figura 3 traz os detalhes.

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Figura 3 - Relação entre dimensões de análise, características das UCs e dilemas

Fonte: Elaborado pela autora a partir de McCowan (2016; 2017; 2018) e Albert e Whetten (1985)

Cada uma das dimensões será tratada, considerando as razões de existência dessas

instituições, bem como os dilemas decorrentes das políticas educacionais para o ensino

superior.

2.2 Contextualização da pesquisa

Em 2014, foi aprovado junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico (CNPq) o projeto de pesquisa intitulado Identidade institucional versus imagem

institucional das universidades comunitárias no sul do Brasil, período 2014-2018, tendo como

coordenadores a Dra. Regina Celia Linhares Hostins, professora do Programa de Pós-

Graduação em Educação da Universidade do Vale do Itajaí e o Dr. Hans Peder Behling,

professor do Programa de Pós-Graduação em Administração da mesma universidade. Trata-se

de uma proposta de investigação em rede que articula conhecimentos e processos de

investigação nos campos da Educação, das Políticas Públicas e da Comunicação e que tem o

propósito de analisar a interface: Identidade e Imagem institucional de Universidades

Comunitárias, do sul do Brasil” (CHAMADA UNIVERSAL– MCTI/CNPq Nº 14/2014).

Considerando a importância atual de articulação da produção científica em contextos de redes

colaborativas intra e inter áreas do conhecimento, a pesquisa envolve pesquisadores de quatro

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universidades do sul brasileiro e também do Prof. Dr. Tristan McCowan da University College

of London.

A pesquisa sobre a construção da identidade e da imagem dessas instituições vem sendo

conduzida simultaneamente em quatro frentes de investigação: 1. Pesquisa documental para

exame dos documentos do MEC e das universidades investigada (documentos que avaliam e

disciplinam o ensino superior no país, PDI, PPI, Planejamento Estratégico, Materiais

institucionais e de divulgação). 2. Pesquisa de campo para entrevistas com os gestores das

instituições que compõem a amostra; 3. Seminários Redes Grupos de Pesquisa em âmbito

nacional e internacional, neste caso, já com a realização de seis encontros e 4. Grupos focais

denominados Seminários Redes Comunitárias envolvendo a comunidade interna (professores,

técnico-administrativos, alunos) e externa (representantes da sociedade) das instituições que

compõem a amostra.

O projeto de pesquisa citado considera que identidade e imagem constituem duas formas

relevantes de perceber a construção do perfil das universidades. Vistas como complementares

e orientadoras do comportamento dos diferentes públicos que se relacionam com essas

instituições, essas duas facetas se constituem dois assuntos críticos na vida das universidades.

(RUÃO, 2005). Dada a amplitude e complexidade teórica desses dois universos (identidade e

imagem), esta pesquisa representa um recorte desse projeto maior e se alia ao interesse de

aprofundar os estudos sobre as universidades comunitárias, um modelo que se distingue dos

demais modelos consolidados no país, considerando os aspectos relativos à identidade. Estudos

sobre imagem dessas instituições já estão em andamento e serão contemplados posteriormente.

O ensino superior brasileiro é heterogêneo e diversificado. O INEP – Instituto Nacional

de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – refere às instituições de educação

superior brasileiras como sendo organizadas em a) Universidades (públicas ou privadas); b)

Universidades Especializadas; c) Centros Universitários; d) Centros Universitários

Especializados; e) Faculdades Integradas e Faculdades; f) Institutos Superiores ou Escolas

Superiores; g) Centros de Educação Tecnológica (INEP, 2017). Tanto o setor público quanto o

setor privado são compostos por segmentos de universidades e faculdades com características

distintas e peculiares. Schmidt (2017, p. 47) apresenta, de forma detalhada, as características

dos modelos de Instituições de Ensino Superior brasileiro, quais sejam, públicas, comunitárias

e privadas. O quadro 1 ilustra descritivamente as distinções.

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Quadro 1 - Características das IES Públicas, Comunitárias e Privadas Características IES públicas IES comunitárias IES privadas

(particulares)

Iniciativa de criação Governo federal,

estadual ou municipal

Entidades e lideranças da

sociedade civil

Grupo privado (empresarial ou

familiar)

Responsabilidade pela manutenção

União, estados ou municípios

Entidades da sociedade civil e entes do poder público local

Grupo privado (empresarial ou

familiar

Natureza e finalidade Pública estatal Pública não estatal Privada

Destinação dos

resultados econômicos

Reinvestimento na universidade

Reinvestimento na universidade

Apropriação privada

Forma de escolha dos dirigentes

Nas IES, nomeação pelo Presidente da

República a partir de lista tríplice

Eleição (em certas instituições) ou nomeação pela

mantenedora (em outras)

Nomeação pela mantenedora

Tipo de pessoa jurídica

Pessoa jurídica de direito público

Pessoa jurídica de direito privado

Pessoa jurídica de direito privado

Forma de constituição

Autarquia ou fundação pública

Mantida por associação ou

fundação

Mantida por sociedade empresária

(anônima ou limitada)

Amparo na Constituição Federal

Art. 206, 207 e 211 Art. 205 e 213 At. 205 e 209

Fonte: Schmidt (2017, p. 47)

Três esferas são contempladas nesses modelos: Estado, comunidade (sociedade civil) e

mercado. Importa reconhecer uma esfera nem estatal nem privada, na qual se encontram as

universidades comunitárias, as quais se constituem um universo próprio, distinto do governo e

dos entes privados. A tríade público/comunitário/privado faz sentido à luz da tripartição

Estado/comunidade/mercado, cada qual cumprindo um papel específico que toma contornos

diferentes em função das condições sociais. Schmidt (2017), baseando-se nos apontamentos de

Etzioni (2007; 2001; 2001a), Sandel (2008) e Parsons (2003), elaborou um quadro ilustrativo

das características das esferas pública, comunal e privada, que passa a ser reproduzido a seguir,

dada a pertinência de elucidar tais conceitos no momento de contextualizar o perfil das

universidades estudadas.

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Quadro 2 - Características das Esferas Pública, Comunal e Privada Características Esfera pública Esfera Comunal Esfera privada

Âmbito social Estado Comunidade/sociedade

civil Mercado

Setor econômico Setor público Terceiro setor Setor privado

Finalidade Bem público Bem comum Bem individual

Princípios Lei e força Moral e costume Auto interesse e razão

individual

Valores centrais Legalidade e ordem Cooperação e

confiança Competição e busca do

lucro

Poder predominante Coercitivo Normativo Econômico

Forma de gestão Hierárquica Autogestionária Hierárquica

Organizações típicas Órgãos públicos e empresas estatais

Organizações da sociedade civil

Empresas privadas

Fonte: Schmidt (2017), com base em Etzioni (2007; 2001; 2001a); Sandel (2008) e Parsons (2003)

Schmidt (2017) faz algumas observações quanto à convivência dessa tripartição. Para o

autor, todas as esferas são importantes, legítimas e necessárias à sociedade, elencar as

diferenças são significa estabelecer hierarquia entre elas. Nenhuma esfera consegue cumprir

suficientemente os papéis das outras, as quais estão amplamente interligadas nas sociedades

contemporâneas. E nesse universo, “as políticas públicas se realizam na presença de complexas

redes de agentes comunitários, estatais e privados” (SCHMIDT, 2017, p. 71).

Sob a denominação “universidades comunitárias”, agrupam-se várias instituições: as

comunitárias confessionais (entendidas como comunitárias lato sensu, ligadas a valores morais

e religiosos os quais encontram-se presentes na educação que oferecem à sociedade) e as

comunitárias não-confessionais ou laicas (ou comunitárias stricto sensu) (FRANTZ, 2006). No

caso desse estudo optou-se pelas universidades comunitárias laicas, ou seja, instituições criadas

pela própria comunidade em que estão inseridas ou pela sociedade civil.

Atualmente a ABRUC reúne 68 Instituições Comunitárias de Educação Superior

associadas entre universidades, centros universitários e faculdades. Para este estudo delimitou-

se como população, o universo composto pelas Universidades Comunitárias do sul do Brasil,

constituído por onze Universidades Comunitárias no Rio Grande do Sul, uma no Paraná e nove

em Santa Catarina.

Entre as universidades no Rio Grande do Sul estão: (1) UCS (Caxias do Sul); (2) UNISC

(Santa Cruz do Sul); (3) URCAMP (Bagé); (4) FEEVALE (Novo Hamburgo); (5) PUCRS

(Porto Alegre); (6) UCPEL (Pelotas); (7) UNICRUZ (Cruz Alta); (8) UNIJUI (Ijuí); (9)

UNISINOS (São Leopoldo); (10) UPF (Passo Fundo); (11) URI (Erechim). No Paraná há

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apenas uma (1) PUCPR (Curitiba). E em Santa Catarina existem as seguintes: (1) UNC

(Concórdia); (2) UNESC (Criciúma); (3) UNIPLAC (Lages); (4) UNIVILLE (Joinville); (5)

UNOESC (Joaçaba); (6) UNIARP (Caçador); (7) UNISUL (Tubarão); (8) UNIVALI (Itajaí);

(9) UNOCHAPECO (Chapecó).

Deste universo, participaram do estudo quatro instituições: duas do Estado do Rio

Grande do Sul (RS) e duas do Estado de Santa Catarina (SC). No Paraná não existem

Universidades Comunitárias laicas. As Universidades foram selecionadas com base nos

seguintes critérios: ser Universidades do sul do Brasil, ser universidade laica, reconhecida como

comunitária (de acordo com a Lei No 12.881, de 13 de novembro de 2013), com no mínimo

quatro mestrados e dois doutorados implantados, credenciada no Sistema Federal de Ensino,

com maior número de alunos e que exerçam atividades de ensino, pesquisa e extensão. A figura

4 traz o recorte da amostra.

Figura 4 - Critérios de seleção das universidades comunitárias

Fonte: Elaborado pela autora

De acordo com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de

Inconstitucionalidade (ADIN) n. 2501/DF, é inconstitucional a vinculação de Instituições de

Ensino Superior mantidas pela iniciativa privada aos sistemas estaduais de ensino, devendo

essas IES se submeter ao regramento federal. A decisão do STF se aplica indistintamente a

todas as Instituições de Ensino Superior não-públicas e seus cursos superiores ofertados.

Somente as IES que fazem parte do Sistema Federal de Ensino estão aptas a requerer a

qualificação de ICES. Além disso, para obter a qualificação de Instituição Comunitária de

Educação Superior, as IES devem cumprir os requisitos previstos na Lei 12.881/2013, bem

como na Portaria MEC nº 863, de 3 de outubro de 2014 (BRASIL, 2014a), publicada em 6 de

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outubro de 2014, que regulamenta o procedimento para qualificação das IES. As IES que

protocolaram pedido de migração passam a se sujeitar a competência do Ministério da

Educação (MEC) de regulação, supervisão e avaliação (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO,

2018). Portanto, as universidades que fazem parte dessa mostra fazem parte do Sistema Federal

de Educação.

As universidades que fazem parte da amostra estão identificadas com as seguintes

denominações: UNI1, UNI2, UNI3 e UNI4. No quadro 3, são apresentadas algumas

informações abrangentes sobre cada uma delas.

Quadro 3 - Perfil das Universidades Comunitárias da Amostra

Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e Sítios eletrônicos – Período 2016-2018.

UNI1

Criada em 1967, a UNI1 é uma Instituição Comunitária de Educação Superior (ICES),

com atuação direta na região nordeste do estado do Rio Grande do Sul. Tem como mantenedora

uma Fundação e é uma entidade jurídica de Direito Privado. É afiliada ao Consórcio das

Universidades Comunitárias Gaúchas - COMUNG; à Associação Brasileira das Universidades

Comunitárias - ABRUC; ao Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras - CRUB; e ao

Fórum das Instituições de Ensino Superior Gaúchas. Oferece setenta e sete cursos de graduação,

dezesseis Mestrados e oito Doutorados. Tem em seu quadro novecentos e setenta e sete

professores titulados (86% com título de mestre e doutor). Em meio século de atividades, a

UNI1 marcou a vida de mais de 100 mil pessoas, que contribuem com o seu conhecimento para

o progresso da região e do país.

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A UNI1 mantém unidades em oito cidades, atingindo diretamente uma população de

mais de 1 milhão de habitantes. Seu Campus-Sede fica em um polo de desenvolvimento

industrial com reconhecimento nacional. As demais unidades universitárias estão localizadas

nas cidades do Noroeste do Rio Grande do Sul.

UNI2

A UNI2 é uma Instituição Comunitária de Educação Superior (ICES), foi criada em

1968 e atua na região Norte do Rio Grande do Sul. Tem como mantenedora uma Fundação e é

administrada pelos próprios professores, independente das pressões e interferências político-

partidárias. Oferece 60 cursos de graduação, que recebem aproximadamente 22 mil alunos.

Nessas cinco décadas, formou mais 75 mil profissionais. Na pós-graduação, conta com quinze

cursos de mestrados, seis doutorados. São oferecidos mais de cinquenta cursos de

especialização em diferentes áreas do conhecimento, além dos cursos de extensão, seminários,

palestras e outros eventos, que contam com a participação das comunidades acadêmica e geral.

A UNI2 é uma instituição multicampi constituída pela sede administrativa e mais seis campi.

Em função da descentralização e do desenvolvimento das atividades acadêmicas em outros

municípios, expandiu-se significativamente a área de abrangência, que compreende mais de

100 municípios das regiões Norte e Noroeste do estado do Rio Grande do Sul, nos quais a

população é estimada em, aproximadamente, um milhão de habitantes.

UNI3

O ano de 1964 é considerado o marco inicial da evolução da UNI3, localizada no litoral

centro-norte de Santa Catarina. Esta tem como mantenedora uma Fundação e oferece cem

cursos superiores atendendo a mais de vinte e quatro mil alunos. Na pós-graduação são

oferecidos cerca de trinta e cinco cursos de especialização, onze mestrados e seis doutorados.

A UNI3 é uma instituição multicampi constituída pela sede administrativa e por mais oito

campi, localizados em diversos municípios. Sua estrutura multicampi e sua política de atuação

permitem atender a comunidade em toda a sua área de abrangência.

UNI4

A UNI4, localizada no sul de Santa Catarina, tem como sua mantenedora uma Fundação

Educacional, cuja origem remonta o ano de 1968. Esta região é considerada o centro político-

econômico social e cultural das microrregiões da Amrec - Associação dos Municípios da

Região Carbonífera - e da Amesc - Associação dos Municípios do Extremo Sul Catarinense.

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Ambas são constituídas de 27 municípios e 608.754 habitantes. A UNI4 atende em torno de

treze mil alunos, oferecendo cinquenta cursos de graduação. Na pós-graduação são ofertados

trinta e dois cursos de especialização, sete mestrados e dois doutorados.

Todas essas universidades são mantidas por uma fundação. No Brasil, há uma exigência

legal quanto à existência de entidade mantenedora e de entidade mantida em instituições de

educação superior privadas. Os recursos necessários para o funcionamento da instituição de

ensino cabem à entidade mantenedora, pois é ela que tem personalidade jurídica, sendo os atos

jurídicos realizados em seu nome. Caso as atividades da associação ou fundação se encerrem,

o seu patrimônio será destinado a uma instituição congênere (comunitária ou pública)

(SCHMIDT, 2017).

Outra característica que marca a identidade dessas universidades é a composição dos

colegiados superiores, com a presença de representantes dos professores, técnicos

administrativos, estudantes e da comunidade regional. Para Schmidt (2017, p. 50) “a

transparência é viabilizada pelo acesso regular a informações sobre temas acadêmicos e sobre

a situação financeira tanto aos membros da mantenedora quanto aos integrantes da comunidade

acadêmica.”

Todas as universidades investigadas apesar de denominarem comunitárias e

compartilharem atributos essenciais, também se distinguem de outros modelos de instituições

superiores, assim como se distinguem entre si, dada a sua imersão na comunidade regional.

Como universidades, agregam uma diversidade de campos do saber, tendo como características

a autonomia acadêmica, didática, administrativa e de gestão (PAULA, 2003). Mas, em que

medida suas histórias se assemelham? Seus dilemas se parecem? Como vêm se dando a

construção de sua identidade e como vêm enfrentando as turbulências no cenário das políticas

públicas para o ensino superior dada a sua vocação para o bem público e as pressões exercidas

pelo mercado? Eis algumas perguntas que orientam esse estudo.

2.3 Procedimentos de coleta e análise dos dados

Em setembro de 2016, esta pesquisa foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em

Pesquisa (CONEP) do Conselho Nacional de Saúde/MS (CNS), pelo Comitê de Ética da

UNIVALI (CEP/UNIVALI), sob número CAAE 57090116.2.0000.0120, e também pelos

comitês de ética de todas as instituições coparticipantes, os quais têm a responsabilidade de

acompanhar e avaliar as propostas de pesquisa que envolvam seres humanos, animais ou

aspectos de biossegurança, estando de acordo com as prerrogativas éticas exigidas na Resolução

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CNS 466/12.

Para a coleta de dados de um estudo multicaso, é importante utilizar várias fontes de

evidência, criar um banco de dados e manter o encadeamento das evidências (YIN, 2005). Para

tanto, para esta investigação várias fontes de evidência foram utilizadas, coletadas a partir de

entrevistas e de documentos oficiais e institucionais, bem como das observações da

investigadora. Esse processo é chamado por Stake (1998) de triangulação de dados e seus

métodos incluem, especialmente, observação, entrevista e análise de documentos pertinentes

ao caso.

Quanto aos procedimentos técnicos, esta pesquisa caracteriza-se como documental e de

campo. A análise documental envolve a leitura e estudo de publicações pertinentes ao caso,

tornam-se um instrumento útil e seguro no trabalho de análise para o pesquisador. Dados podem

constituir-se em expressivos expedientes de argumentação, porque conferem à pesquisa

facticidade, proximidade concreta, visibilidade (DEMO, 2000, p. 86). Assim, para se atingir os

objetivos propostos nessa pesquisa procedeu-se à consulta (1) ao portal do MEC/INEP,

identificando e selecionando os documentos que regulam, avaliam e disciplinam o ensino

superior no país, notadamente o credenciamento e o recredenciamento de universidades; (2) ao

portal do MEC, especificamente à Lei nº 12.881, de 13 de novembro de 2013, que dispõe sobre

a definição, qualificação, prerrogativas e finalidades das Instituições Comunitárias de Educação

Superior – ICES; (3) aos portais das Universidades Comunitárias que compõem a amostra, nos

quais foram selecionados textos sobre o PDI (Plano de desenvolvimento institucional), ao PPI

(Projeto Pedagógico Institucional); (4) às campanhas institucionais veiculadas em diversas

mídias; (5) a documentos físicos a serem coletados com as próprias Universidades

Comunitárias que compõem a amostra.

Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96 determinou

uma série de ações sistêmicas a serem executadas por parte das instituições de educação

superior. No decorrer dos anos de consolidação da Lei, surge o Plano Nacional da Educação

que traz metas em caráter decenal para o ensino superior, culminando na promulgação do

Decreto 3860/2001 que determina a instituição legal do Plano de Desenvolvimento Institucional

(PDI). Esse documento se desenvolveu com maior preponderância a partir da Lei Federal n°

10.861 com a instituição do Sistema Nacional de Avalição da Educação Superior – SINAES

(BRASIL, 2004). O SINAES tem como principal objetivo melhorar a qualidade da educação

superior brasileira e utiliza vários instrumentos para mensurar a qualidade do ensino. A partir

de então, o PDI é uma ferramenta obrigatória para que a instituição seja avaliada pelo Ministério

da Educação (MEC), passando a ser um referencial orientador da qualidade institucional,

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52

tornando-se instrumento norteador dos processos de avaliação, planejamento e gestão das

instituições.

Para Francisco et al. (2012, p. 87), o PDI orienta as ações da instituição as quais

consolidam a sua identidade, determinando as habilidades necessárias para promover uma

resposta rápida aos ensejos do segmento da educação superior no Brasil, com ênfase em

aspectos quantitativos e qualitativos. Com o Decreto 5773/06, o Documento incorporou pontos

relevantes do Projeto Pedagógico Institucional (PPI), além de consolidar os objetivos

institucionais, a área de atuação acadêmica e um retrato sistemático de sua epistemologia.

(FRANCISCO et al., 2012; ARAÚJO et al., 2018). Ainda para Francisco et al. (2012), a

utilização desse arcabouço documental pode ajudar a suprir possíveis deficiências e evitar a

crise de identidade, pois tais registros representariam o retrato e o posicionamento institucional

na perspectiva de suas atividades. Assim, para este estudo, fazem parte dessa amostra os PDIs

das quatro universidades comunitárias selecionadas, sendo apresentados no quadro 4.

Quadro 4 - Ciclo Plano de Desenvolvimento Institucional

Fonte: Planos de Desenvolvimento Institucional disponibilizados pelas universidades

Dada a relevância em termos de planejamento estratégico que o Plano de

Desenvolvimento Institucional vem adquirindo desde a sua implantação nas instituições de

ensino superior, este documento é rica fonte materializada em discurso que orienta as ações

dessas universidades e que, por sua vez, apontam indícios que consolidam seu posicionamento

dentro das bases estruturantes de sua identidade. Entre os capítulos do PDI examinados no

estudo estão “Perfil Institucional”, “Projeto Pedagógico Institucional”, “Políticas de Ensino”,

“políticas de Pesquisa”, “Políticas de Extensão” e “Políticas de Gestão”.

Além dos documentos citados, também compõem o universo de documentos analisados

os Relatórios de Responsabilidade Social/Balanço Social das quatro universidades comunitárias

estudadas, produzidos entre os anos de 2015 e 2018, disponibilizados nas páginas da internet

dessas instituições. O termo Responsabilidade Social ganhou força no Brasil ao ser incluído

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como uma das dez dimensões de avaliação das IES no Sistema Nacional de Avaliação da

Educação Superior (Sinaes), instituído pela Lei n° 10.861, de 14 de abril de 2004, e

regulamentado pela Portaria n° 2.051, de 9 de julho de 2004.

Esses documentos foram acrescidos aos demais pois a Responsabilidade Social

Universitária compreende a “capacidade que tem a universidade de difundir e colocar em

prática um conjunto de princípios e valores, por meio de quatro processos essenciais: gestão,

docência, pesquisa e extensão, comprometendo-se assim, do ponto de vista social, com a

comunidade universitária e com o próprio país” (BERTO, 2011, p. 23).

A investigação também integrou como fonte documental as campanhas institucionais

dessas universidades veiculadas nas mídias digitais, especificamente, na plataforma Youtube.

Essas universidades têm uma série de entrevistas, reportagens, documentários que contemplam

múltiplos aspectos de suas atividades junto ao ensino, pesquisa e extensão, mas para o propósito

dessa pesquisa, utilizou-se como critério de busca e seleção dos discursos institucionais, o termo

“Vídeo institucional”. Para cada universidade foram selecionados dois vídeos veiculados entre

os anos de 2015 e 2018. Após assistir a cada um deles, os discursos foram transcritos e

analisados à luz do referencial teórico que dá suporte a esta pesquisa. Não foi feita interpretação

semiótica das imagens, pois não é foco desse estudo. O quadro 5 traz detalhes da coleta.

Quadro 5 - Sítios Institucionais Veiculados na Plataforma Digital YouTube Universidade Comunitária Endereço sítio no YouTube

Ano de publicação

Tempo de duração

Número de visualizações

UNI1

VÍDEO1. https://www.youtube.com/watch?v=TDbH0J4d9Jo&t=55s VÍDEO 2 https://www.youtube.com/watch?v=pieGspJQaF8&t=51s

2015

2018

06:10

04:04

72

1.340

UNI2 VÍDEO 1 https://www.youtube.com/watch?v=Etft2MP4q3U&t=7s VÍDEO 2 https://www.youtube.com/watch?v=JYjcHyEA_Wk&t=22s

2015

2018

07:38

04:42

2.334

898

UNI3

VÍDEO 1 https://www.youtube.com/watch?v=Ii0UT7G9_Y4&t=145s VÍDEO 2 https://www.youtube.com/watch?v=_6l27TjGSEU&t=11s

2016

2018

06:59

02:33

106

146.884

UNI4

VÍDEO 1 https://www.youtube.com/watch?v=Aqt_VZmAE28 VÍDEO 2 https://www.youtube.com/watch?v=kbY3gJ_ZguQ&t=86s VÍDEO 3 https://www.youtube.com/watch?v=QiPWeffHjMQ

2017

2018

2018

01:00

07:36

01:00

372

894

59.336

Fonte: Organizado pela autora, a partir dos dados coligidos.

Ao se entender que a identidade de uma organização reflete a forma pela qual os seus

membros a constroem e a percebem coletivamente e por se constituir pelo conjunto de

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representações que os seus integrantes formulam sobre o significado desta organização,

reconhece-se a importância do fortalecimento de sua identidade. Tendo em vista esta questão,

observa-se um movimento das instituições no sentido de intensificar as ações de comunicação

institucional, os quais passam a empregar elementos básicos da cultura organizacional, como

rituais, símbolos, mitos, cerimônias e histórias, para traduzir e disseminar os aspectos

fundamentais desejáveis para a construção de uma identidade coletiva (DUTTON;

DUKERICH; HARQUAIL, 1994; CARASSAI; FONSECA, 2009).

Para Argenti (2014, p. 89) a identidade de uma organização “é a manifestação visual de

sua realidade”, transmitida por meio do nome, logomarca, lema, produtos, serviços, instalações,

material impresso e visual, uniformes e todas as peças exibidas e divulgadas, criadas pela

organização e comunicadas aos seus diferentes públicos. Estes diferentes públicos formam

percepções baseadas nas mensagens que as organizações enviam de forma tangível. Se um dos

propósitos desta pesquisa é identificar o modo como as universidades comunitárias comunicam

a sua identidade, considerou-se pertinente investigar em seu discurso oficial (PDIs, Campanhas

institucionais, Entrevistas dos gestores) traços que demonstrem seu valor, sua função e sua

forma de se relacionar com a sociedade.

Outra frente de investigação se deu por pesquisa de campo. Gonsalves (2001, p. 67)

afirma que a pesquisa de campo pretende buscar a informação diretamente com a população

pesquisada e que ela exige do pesquisador um encontro mais direto. Com a finalidade de

examinar os discursos predominantemente utilizados pelas Universidades Comunitárias do sul

do Brasil ao atuarem na construção de suas respectivas identidades institucionais em resposta

às políticas nacionais de ensino superior, como instrumento de coleta de dados primários foi

realizada entrevista semiestruturada individual (gravadas) junto aos gestores destas instituições

(apêndice A).

Foram entrevistados os Reitores das quatro universidades comunitárias selecionadas,

escolhidos por se entender que são pessoas que detêm os conhecimentos gerais e específicos

sobre essas instituições, bem como por serem vistos como mediadores fundamentais dos

processos que envolvem as decisões estratégicas da universidade, sejam elas em suas dimensões

político financeira e pedagógica. Os gestores foram identificados com os códigos R1, R2, R3 e

R4 a fim de resguardar as suas identidades.

As entrevistas foram agendadas e ocorreram entre os meses de julho e dezembro de

2016. Foi solicitado aos entrevistados que assinassem o Termo de Anuência de instituição para

coleta de dados de pesquisa envolvendo seres humanos (apêndice D), o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (apêndice B), permitindo o uso do conteúdo das

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entrevistas nesse trabalho sem identificação dos respondentes. Também foi assinada Declaração

autorizando a pesquisadora a frequentar a instituição para realização da coleta de dados, bem

como a instituição a fornecer os dados pertinentes à investigação (apêndice C). As entrevistas

tiveram uma duração média de 60 minutos.

A análise dos dados documentais e de campo foi realizada por meio da Análise de

Conteúdo que viabilizou o estudo sistemático de dados oriundos de perguntas realizadas nas

entrevistas e outros tipos de dados coligidos da pesquisa documental. A análise de conteúdo é

um processo de busca de compreensão do real, que ocorre através da interpretação de textos

que tenham vínculo com esse real. Portanto, este tipo de análise revelou-se uma possibilidade

de construir o conteúdo, tanto o explícito como o latente, de textos escritos (RAMOS, 1999, p.

51).

Os objetivos da análise de conteúdo referem-se à inferência e à interpretação, para além

de uma descrição crítica, aprofundada e detalhada dos dados, pois se pretendeu, com esse tipo

de análise, avançar para além de um estudo meramente exploratório (MORAES, 1999). Este

tipo de metodologia de análise de dados não se limita ao conteúdo manifesto encontrado, pois

toda a leitura é também uma interpretação, transcendendo uma análise meramente objetiva e

quantitativa, centrando sua preocupação nos elementos qualitativos do conteúdo analisado.

A análise de conteúdo realizada foi composta de quatro etapas distintas, sugeridas por

Engers (2000). A primeira etapa manifesta-se por uma leitura compreensiva, com o intuito de

haver a impregnação dos conteúdos, “[...] caracterizando-se esta atividade por um ‘ir e vir’ entre

a leitura das entrevistas e a dos aspectos teóricos analisados, para poder compreender os

conteúdos latentes [...]” (ENGERS, 2000, p. 140). Na segunda etapa, realizou-se uma análise

vertical das entrevistas, “[...] buscando demarcar aspectos relevantes das falas de cada um dos

participantes” (ENGERS, 2000, p. 140). Nessa etapa, foi executada a análise de cada uma das

questões das entrevistas, marcando as palavras-chave ou expressões de significado de cada uma

delas. A terceira constituiu-se por uma análise horizontal das entrevistas, tendo como eixo

norteador cada uma das palavras-chave ou expressões de significado de cada uma das questões

do instrumento de pesquisa para todos os entrevistados. A quarta e última etapa se constituiu

no momento da síntese, em que foi criada uma matriz interpretativa. A partir daí, emergiram as

categorias extraídas das entrevistas tendo em vista as palavras-chave. Tais categorias foram

elencadas porque emergiram nos diferentes segmentos ou entrevistas, por se “encontrarem

numa mesma direção” (ENGERS, 2000, p. 140).

Ao se pensar os critérios metodológicos para execução desta pesquisa, múltiplos

aspectos foram considerados com o intuito de compreender a empiria que se relaciona com o

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objeto foco deste estudo, as universidades comunitárias. Buscou-se um constante diálogo entre

a empiria e a teoria, articulando as vozes dos atores, os discursos estratégicos e as reflexões

teóricas no sentido de elucidar a trajetória dessas instituições participantes do conjunto de

universidades que caracterizam o ensino superior brasileiro.

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3. A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS:

AVANÇOS E DILEMAS NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA

O ENSINO SUPERIOR

Que a universidade não dê razão ao mercado se e quando ele se

impõe como razão da sociedade. Que a universidade não seja um motor da globalização da economia de mercado, mas sim da

globalização da dignidade humana. (DIAS SOBRINHO, 2005, p. 172)

3.1 A identidade das universidades comunitárias: da gênese à legitimação

O objetivo desse capítulo é identificar os principais marcos históricos de constituição

da identidade das Universidades Comunitárias no contexto das políticas educacionais para o

ensino superior no Brasil. Considera-se que a construção de uma sólida instituição educacional

é um processo longo e complexo que envolve diferentes segmentos, desde o poder público a

setores organizados da sociedade civil. Assim vem acontecendo com as universidades

comunitárias, as quais vêm forjando sua identidade há mais de 60 anos5, numa luta por

reconhecimento.

As universidades em geral vêm enfrentando, desde sua gênese, múltiplos obstáculos que

se colocam contrários à sua vocação de promover o bem público. Neste caminho, a adoção de

políticas neoliberais para o ensino superior, recomendadas pelo Banco Mundial, desencadearam

processos de mercantilização, privatização, precarização, desconstrução da educação superior,

tornando-se termos cada vez mais usuais para qualificar este setor (MINTO, 2006). Neste

contexto, encontram-se as universidades comunitárias, as quais vêm sofrendo os efeitos das

políticas públicas voltadas à mercantilização da educação e das oscilações econômicas

provocadas pela globalização.

Inseridas em um contexto sócio econômico e histórico-cultural, as universidades

comunitárias enfrentam muitas tensões na busca de uma identidade que as torne singular. Em

cada uma das etapas do processo, a presença de interesses divergentes pelos definidores das

políticas, vem tornando o caminho sinuoso e os obstáculos crescentes. Nesta seção, são

analisados alguns dos conflitos enfrentados pelas universidades comunitárias no caminho de

construção de seu DNA. Para ilustrar a trajetória, apresenta-se na figura 5 os marcos de

surgimento, consolidação, diversificação e legitimação deste modelo de universidade, os quais

5 BITTAR (1999); PEGORARO (2008); PINTO (2009); SILVA (2012); CASTRO (2013); FIOREZE (2017); LONGHI (2000); FRANTZ (2006); FERNANDES (2008); MOROSINI; FRANCO (2006); BAUER; MESQUITA (2007); RAVAS; CANATO (2013); ALBERT; WETHEEN (1985); CARASSAI; FONSECA (2009); MACHADO (2014); STENSAKER (2015); DUMAY; DRAELANTS; DAHAN (2015), entre outros.

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serão detalhados no decorrer do capítulo.6

Figura 5 - Principais marcos da trajetória das universidades comunitárias – 1960-2013

Fonte: Elaborado pela autora, com base nos documentos analisados

A maioria das universidades comunitárias no sul do Brasil foram criadas entre as

décadas de 1940 e 1970, período em que o país passava por processo de modernização nos

campos social, político e econômico. Foram estruturadas em pleno Estado desenvolvimentista,

viabilizadas pela capacidade de organização das comunidades regionais apoiadas pelo poder

público local (SCHMIDT, 2017). Foi para além de atender às necessidades regionais que,

principalmente nas zonas de imigração italiana e alemã do Rio Grande do Sul e Santa Catarina,

surgiram muitas universidades comunitárias, entre elas, as selecionadas como objeto de estudo

deste trabalho.

Ao longo das décadas de 1950, 1960 e 1970, várias universidades estabeleceram-se em

polos regionais. Porém, antes do aparecimento das grandes instituições, outras experiências

comunitárias já faziam parte da vida dos imigrantes como escolas, igrejas, corais, clubes

6 A partir deste capítulo serão introduzidas, nas discussões, as vozes dos gestores entrevistados (identificados pelos códigos R1, R2, R3 e R4) e recortes dos documentos institucionais selecionados para este estudo, identificados pelos códigos (UNI1, UNI2, UNI3, UNI4). Sua presença será reconhecida por fonte em itálico.

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esportivos, cooperativas, os quais evidenciavam a formação de um expressivo capital social

comunitário (SCHMIDT; CAMPIS, 2009).

Ao fazer referência ao seu perfil institucional a UNI1, afirma no seu PDI que desde a

década de 50, do século XX, em função das necessidades de desenvolvimento social e

econômico, a comunidade pleiteava a instalação de cursos de nível superior. Para suprir esta

carência, diferentes entidades da comunidade obtiveram autorização para a criação de

faculdades (PDI UNI1 2017-2021, p. 9). Com discurso semelhante, a UNI2 declara que desde

sua origem, a universidade demonstrou intenção de assumir um compromisso com o

desenvolvimento da região (PDI UNI2, p. 14). Reafirmando o compromisso com a coletividade

regional a UNI4 completa que foi instituída pelo Poder Público Municipal, concretizando um

desejo que nasceu da participação comunitária na busca coletiva pelo atendimento às

necessidades regionais (PDI UNI4, p. 11). Nessa mesma perspectiva, a UNI3, ao apresentar

sua história afirma que essa teve origem.

[..] em uma ampla campanha de mobilização popular em defesa da interiorização do ensino superior no Estado de Santa Catarina na década de 1960 — período em que ainda não havia a oferta de cursos universitários fora da capital catarinense. Este fato define o código genético da Instituição como Universidade Comunitária (PDI UNI3, p. 29).

Constituindo-se em um modelo próprio de educação superior brasileira, as

universidades comunitárias são fruto da mobilização de comunidades regionais que buscavam

suprir a carência de educação de nível superior pela ausência do Estado em prover esse serviço.

Preocupada em alavancar o desenvolvimento socioeconômico e cultural de suas comunidades,

e com o objetivo de promover atividades de formação de recursos humanos, de produção

intelectual e de atividades de qualificação científica, necessárias ao desenvolvimento das

regiões, a sociedade civil se organizou e se mobilizou pela instalação de escolas superiores, por

meio de associações e fundações, inicialmente sob forma de faculdades ou centros de ensino

superior. Não eram iniciativas de caráter privado, com perspectiva capitalista, e sim, públicas,

porém não estatais (VANNUCCHI, 2011).

A universidade comunitária não surge por acaso, mas como tentativa de concretização

das aspirações educacionais de grupos (confessionais ou não) que manifestam segmentos vivos

da sociedade. “Não é um projeto criado em gabinete, nem fruto de especulação teórica, mas

resulta da experiência concreta de algumas instituições” (TRAMONTIN; BRAGA, 1988, p.

18). Para Schimdt (2009, p. 22) “instituições comunitárias não derivam de relações e interesses

de algumas poucas pessoas. Elas pressupõem relações e interesses largamente compartilhados”.

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Uma das lideranças universitárias entrevistadas assim comentou: (...) a universidade

comunitária é uma instituição que procura atender às demandas da comunidade, da sociedade.

Ela também ao mesmo tempo precisa ser promotora do desenvolvimento e tem que impulsionar

a economia da região (R1, 2016).

Com o intuito de resolver carências regionais específicas, surgiram as universidades

comunitárias, as quais se propunham gerar o desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias

com foco local. Vannucchi (2011) salienta que, desde o início, esse tipo de universidade foi

entendida por seus fundadores como um serviço público e não como negócio particular, sempre

comprometida com a sociedade e não com o lucro. Afirma um dos gestores

Ela (a universidade comunitária) não tem dono. Os nossos regimentos do estatuto dizem que se um dia ela deixar de operar, isso volta para a prefeitura, porque foi quem criou a instituição. Se não for a prefeitura, outra unidade congênita, com as mesmas características filantrópicas de educação sem fins lucrativos e que deseja continuar com os projetos da universidade, vai dar continuidade. Isso está muito claro no nosso estatuto (R4, 2016).

Evidencia-se no discurso, a consciência dos gestores quanto à identidade legal e

normativa da instituição. Cientes dos fatos que marcaram a história dessas instituições no que

tange aos marcos legais e seus estatutos, seus gestores e os documentos oficiais enfatizam os

atributos essenciais dessas instituições, entre eles o forte caráter regional, não visar lucro,

destinar seu patrimônio, em caso de extinção, a uma instituição pública ou congênere e o

compromisso com uma gestão baseada na transparência administrativa, o que se revela em seus

estatutos e regulamentos. Essas são características essências da identidade do modelo

comunitário de educação superior que abrangem o que é legítimo em termos organizacionais

(ALBERT; WHETTEN, 1985).

Para Carrieri et al. (2010, p. 24), assim como os indivíduos têm uma identidade, as

organizações7, neste caso, as universidades comunitárias, também constroem uma identidade.

Diferentemente de um conceito tido como estável, autônomo e permanente em seus primórdios,

7 Etzioni (1976, p. 9) define as organizações como unidades sociais “intencionalmente construídas e reconstruídas, a fim de atingir objetivos específicos”. Segundo o autor, a sociedade moderna é preponderantemente uma sociedade de organizações. Para Andrade (2002), as universidades devem ser estudadas como um tipo específico de organização complexa cujas características exigem que a adoção de modelos ou critérios de gestão deva ocorrer de forma diferente do que sucede em outras organizações. O Relatório da UNESCO para a educação do século XXI (DELORS et al., 1999), consolida algumas perspectivas da universidade como organização e de sua complexidade, ao especificar os vários papéis que ela desenvolve, dentre os quais destacam-se: (a) ser o lugar onde se aprende e fonte de saber; acompanhar a evolução do mercado de trabalho; (b) ser o lugar de cultura e de estudo aberto a todos; (c) ser o lugar de fazer a cooperação internacional; (d) ser o lugar onde se produz e se socializa o conhecimento. Para Schmidt (2017, p. 205) “organizações e instituições são meios de ação comum dos sujeitos, estruturadas em torno de regras que lhes conferem coerência e permanência.”

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para esses autores, a identidade traz em sua concepção “uma dimensão social, coletiva e

processual de construção”. Observa-se que na construção da identidade das universidades

comunitárias há como alicerce um forte enraizamento coletivo. Sua trajetória é marcada por

vários fatos históricos impulsionados por desejos e necessidades advindos da comunidade. E,

em prol do bem público e na busca do desenvolvimento regional, as entidades foram pouco a

pouco tomando corpo, espalhando seus tentáculos em regiões desassistidas pelo poder público.

Tem-se aí, uma marca da essência de sua identidade: a regionalização, fruto de um processo

lento, mas contínuo.

Mantidas por fundações educacionais criadas por associações comunitárias, as

universidades comunitárias iniciam suas atividades sob a forma de pequenas faculdades, como

é o caso do RS, ou pelo poder público municipal, como é o caso de SC. Mais tarde, já nos anos

de 1980 e 1990, muitas delas transformam-se em universidades (LÜCKMANN; CIMADON;

BERNART, 2015). Afirma um dos gestores

A UNI4 foi criada em 1968 em um movimento da comunidade. Eles se revoltaram após a criação da UFSC e da UDESC em Florianópolis, e aí a região se mobilizou, e foi brigar e foi atrás do prefeito, foi atrás de uma possibilidade que tinha para criar sua instituição de ensino superior aqui na região, justamente para os filhos deles também poderem fazer universidade aqui e não precisar todo mundo se deslocar. Nem tinha vaga para todo mundo na capital, então foi uma resposta da comunidade. Ela nasceu já de um anseio, de uma luta comunitária (R4, 2016).

Observa-se como elemento integrador da gênese dessas instituições, a sua inserção

social. A característica constitutiva de uma instituição sem fins lucrativos é beneficiar a

sociedade, sendo seu mérito atribuído ao potencial de resultado das ações levadas a cabo no

ambiente social. Nesse sentido, a UNI1 se posiciona como instituição, em permanente diálogo

com a sociedade. Seus interesses são os da coletividade (UNI1 PDI, p. 10).

Independentemente da ação dos governos federal ou estadual, muitas fundações

educacionais foram criadas a partir da década de 1960, algumas com o aval dos municípios,

como é o caso do Estado de Santa Catarina, com estrutura administrativa e financeira próprias.

Essa iniciativa, além de atender aos anseios locais quanto à ampliação do número de vagas no

ensino superior, encontrava respaldo da legislação da época. Assim comenta um gestor

A UNI4 48 anos de existência, foi criada por lei municipal na década de 60, em 68. Nós ficamos 29 anos como quatro escolas isoladas. Na década de 90, teve aquele movimento todo do Estado para transformar em universidade e a gente também fez o movimento, porque tinha 9 cursos só de graduação. Era

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só aquele espaço, só aqueles bloquinhos pequenos lá, e eu já estava aqui. Eu estou aqui como professor há 30 anos, como aluno há 35 (R4, 2016).

A maioria das universidades comunitárias surgiu antes do advento da Lei de Diretrizes

e Bases de 1961 e da Lei 5.540, da Reforma Universitária, de 1968. A Lei de Diretrizes e Bases

n. 4.024/61 de 1961 - em seu artigo 107, concedeu estímulo às fundações educacionais ao

mencionar que:

O poder público estimulará a colaboração popular em favor das fundações e instituições culturais e educativas de qualquer espécie, grau ou nível sem finalidades lucrativas, e facultará aos contribuintes do imposto de renda a redução dos auxílios ou doações comprovadamente feitas a tais entidades (BRASIL, 1961).

Promulgada após um período de 14 anos de tramitação no Congresso Nacional, a Lei

de Diretrizes e Bases n. 4.024 de 1961 possibilitou certa flexibilidade na sua implementação,

no entanto, na prática, reforçou o modelo tradicional de instituições de ensino superior vigente

no país. Sua preocupação maior ainda se voltava para o ensino, deixando de lado a pesquisa.

Em termos organizacionais, as faculdades isoladas permaneceram, e a universidade continuou

composta por simples justaposição de escolas profissionais. A nova Lei fortaleceu ainda mais

a centralização do sistema de educação superior, ampliando os poderes do Conselho Federal de

Educação, agora com autonomia para autorizar e fiscalizar novos cursos de graduação e

deliberar sobre o currículo mínimo de cada curso superior. O novo na Lei ficou por conta da

participação estudantil nos colegiados (OLIVEN, 2002).

Para Durham (2003, p. 203) a LDB de 1961 “foi uma vitória dos setores privatistas e

conservadores, e constituiu, em grande escala, uma preservação do sistema existente. A lei e

suas complementações praticamente preservaram o status quo e se preocuparam basicamente

em estabelecer mecanismos de controle de expansão do ensino superior e do conteúdo do

ensino. O Conselho Nacional de Educação foi reestruturado e passou a contar com

representantes do setor público e privado. Entre suas atribuições a autorização para criação de

novos cursos e instituições no setor federal e privado e a fixação dos currículos dos cursos

superiores. Com tal poder de decisão, o Conselho passou a ser alvo das pressões exercidas pelo

setor privado, em defesa de seus interesses (DURHAM, 2003).

Paradoxalmente a essa inércia formal do sistema universitário, nos anos 1960, a

universidade brasileira vivia um momento de grande vitalidade com a participação da

comunidade acadêmica se deu além dos muros da universidade. Fóruns acadêmicos, como as

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reuniões da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), revistas especializadas,

professores e pesquisadores universitários defendiam a modernização institucional na busca por

um novo ensino superior, mais nacional e democrático, voltado para a pesquisa, aos moldes do

modelo de Humboldt, da Alemanha, ou o norte-americano (OLIVEN, 2002).

Em 1964, com a tomada do poder pelos militares, as universidades passaram a ter

interferência direta do governo federal. Atividades de professores e alunos consideradas de

caráter “subversivo” foram coibidas. E a reforma universitária passou a ser debatida

exclusivamente nos gabinetes da burocracia estatal. Passados alguns anos, em 1968, porém, o

Congresso Nacional aprovou a Lei da Reforma Universitária (Lei nº 5540/68) que, além de

propor várias mudanças funcionais e organizacionais, estabeleceu a indissociabilidade das

atividades de ensino, pesquisa e extensão, o regime de tempo integral e a dedicação exclusiva

dos professores, criando condições para o desenvolvimento da pós-graduação e possibilitando

a profissionalização dos docentes (SANTOS; CERQUEIRA, 2009).

Cabe salientar que a opção do setor público por universidades que aliassem o ensino à

pesquisa aumentou os custos do ensino público, o que freou a sua capacidade de expansão,

abrindo espaço para o setor privado atender a demanda não absorvida pelo Estado. Apesar de a

Reforma de 1968 exigir o estabelecimento de um modelo único de ensino superior com a

indissociabilidade do ensino e da pesquisa, na prática, a expansão do sistema se deu mediante

a proliferação de instituições isoladas e poucas universidades conseguiram efetivamente

instituir a produção científica (MARTINS, 2002).

Passados alguns anos, em 1968, a Lei Federal n° 5.540/68, da Reforma Universitária,

no seu artigo 2°, dispõe que “o ensino superior indissociável da pesquisa será ministrado em

universidades e, excepcionalmente, em estabelecimentos isolados, organizados como

instituições de direito público ou privado”. Frente a esse contexto, começaram a se delinear as

primeiras iniciativas com vistas à criação de instituições de ensino superior isoladas em Santa

Catarina e no Rio Grande do Sul. Esse processo teve como consequências a interiorização da

oferta de ensino superior; a democratização das oportunidades de acesso a cursos superiores de

formação profissional; a formação de quadros vocacionados para o atendimento das

necessidades locais; a constituição de um corpo de professores capacitado, selecionado segundo

os critérios exigidos pelo Conselho Federal de Educação e a instalação de uma infraestrutura

de ensino qualificada (GUMBOWSKY, 2013).

Para Schmidt (2010), o fato de as universidades comunitárias gaúchas e catarinenses

terem sido criadas entre as décadas de 1940 e 1970, impede que seja estabelecido vínculos com

o projeto político neoliberal, que se ampliou a partir da década de 1980. As universidades

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comunitárias regionais “foram estruturadas em plena vigência do Estado desenvolvimentista,

suprindo a lacuna de educação superior nas regiões interioranas por iniciativa da sociedade civil

e do poder local, e nada tem a ver com as reformas de caráter neoliberal implementadas décadas

mais tarde” (SCHMIDT, 2010, p. 29). Assim, essas instituições preservaram seu caráter de

fornecer à população ensino de qualidade, mantendo sua vocação ao promover o bem público,

sem qualquer intenção de almejar lucro, como as instituições empresariais.

Na década de 1970, o Brasil vivia o chamado “milagre econômico”. Como resultado

desse amplo desenvolvimento, a classe média cresceu e novas oportunidades no setor produtivo

surgiram, novos hábitos de consumo foram adquiridos, aumentando, assim, a demanda pelo

ensino superior, o que provocou providenciais recursos e orçamentos federais destinados à

educação. Ao contrário de alguns países da América Latina, no Brasil, a repressão política

promoveu o ensino superior, tanto público quanto privado. O número de matrículas, em cerca

de vinte anos, passou de 101.691 (em 1960), para 1.377.286 (em 1980) (DURHAM, 1998).

A expansão da educação superior nas décadas 1970 e 1980 teve como pano de fundo o

financiamento das universidades não públicas, especialmente no que se refere às confessionais.

Até a década de 1970, essas instituições recebiam verbas governamentais para o

desenvolvimento de suas atividades. Por terem ideologia diferente e não quererem ser

equiparadas às outras Instituições de Ensino Superior do setor privado particular, as

universidades comunitárias uniram forças em torno de seus interesses, objetivos e princípios

comuns, numa luta por reconhecimento e legitimação. Nesse período, foram criadas a maioria

das universidades federais, sendo estas instaladas em cidades de médio porte, além do

estabelecimento de vários campi em cidades do interior.

A partir do reconhecimento da Universidade (1989), há um período de expansão. Novos campi e cursos de graduação são implantados em resposta às aspirações das comunidades instaladas nas áreas de abrangência da Instituição, que, aos poucos, também passam a ser beneficiadas por projetos de pesquisa e extensão. A década de 1990 representa um momento de significativa expansão da universidade, verificada na implantação de novos campi e cursos de graduação, pós-graduação stricto sensu e educação básica em alguns municípios e no desenvolvimento de projetos de extensão, parcerias com o poder público e iniciativas voltadas à internacionalização (PDI UNI3, p. 30).

É nesta década também, que se verifica um processo de regionalização do ensino

superior. Para Marques e Cepêda (2012), a interiorização provocou a expansão das IES, ou pela

implantação de campi de IES já existentes em regiões menos desenvolvidas ou pela criação de

novas IES para facilitar o acesso ao ensino superior. “Sem acesso ao ensino superior em seus

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locais de origem, os estudantes interioranos ou suas famílias teriam que arcar com as despesas

para poderem estudar na Capital ou em outros grandes centros urbanos” (MARQUES;

CEPÊDA, 2012, p. 173). Esse processo veio suprir a crescente demanda por educação terciária,

em nível local, de estudantes advindos de pequenas e médias cidades localizadas no interior.

Esse movimento contribuiu para minimizar as desigualdades socioeconômicas e fortalecer as

economias regionais.

Ao ser perguntado quanto à importância da presença da universidade comunitária em

sua região, um dos gestores respondeu

Então, há sessenta anos um grupo de pessoas de liderança da comunidade pensou em interiorizar cursos de nível superior. [...] Então, desde 1956, época em que tínhamos apenas cursos isolados mantidos pela sociedade pró Universidade, ou pelo Consórcio Universitário Católico, dois grupos que existiam na época, já se tinha o propósito de oferecer uma formação que poderia ser traduzida como desenvolvimento. Isto fomentou a cidade. Se hoje nós temos aqui um polo educacional, um polo médico excepcional, com um crescimento enorme, se temos aqui um comércio e uma área da construção civil e imobiliária de crescimento excepcional, se deve exatamente a essas iniciativas lá do passado que foram se consolidando ao longo do tempo. Então o fato de existir uma universidade comunitária significa a vontade dos líderes da época de buscar o desenvolvimento da região. Então, isso acabou tornando a cidade referência no ensino superior e, consequentemente, no crescimento regional porque, na medida em que vinham os alunos de fora, a rede hoteleira ganhava, a indústria da construção civil ganhava, ou seja, o comércio ganhava, porque tudo estava em torno da universidade (R2, 2016).

Observa-se, nesta fala, a ênfase dada pelo gestor à importância da instituição para o

desenvolvimento regional. Durante anos, a instituição vem sendo socialmente construída e

institucionalmente sustentada, edificada pela ação de diferentes atores (REED, 1998), com o

objetivo de mudar a realidade, oferecendo uma formação profissional que atendesse aos anseios

de desenvolvimento regional. O resgate de fatos históricos e as suas consequências na atual

condição de crescimento do entorno da região, reiteram a crença do gestor sobre a influência

promissora da universidade em diferentes campos do conhecimento e a contribuição disso para

a comunidade. Assim, de modo ativo e crítico, a universidade vai influenciando no processo de

desenvolvimento nos espaços da cultura, da política, da economia, da tecnologia (FRANTZ,

2006). Aos poucos vai se modelando como comunitária, num processo social e relacional, cuja

construção resulta na percepção dos indivíduos sobre os atributos centrais e duradouros da

organização (CUCHE, 1999), neste caso, na percepção do gestor evidencia-se na ênfase dada

ao fato de que “tudo estava em torno da universidade”.

A partir da produção do saber, cumpre ela seu papel; nascem suas funções. Não é uma

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inserção desvinculada de um projeto de sociedade, uma presença neutra. Pode e deve a

universidade ajudar a construir as condições do desenvolvimento da região na qual está

localizada.

Apesar da Lei n° 5.540/68 dirigir-se às Instituições Federais de Ensino Superior (IFES),

ela também atingiu o setor privado. Este cenário pressionou o aumento de vagas, provocando a

criação de inúmeras faculdades isoladas na periferia das grandes metrópoles e nas cidades de

porte médio do interior dos estados mais desenvolvidos. Com anuência do Estado, chega-se em

1980, com mais da metade dos alunos de terceiro grau matriculada em estabelecimentos

isolados de ensino superior, sendo 86% em faculdades privadas (OLIVEN, 2002).

Aparentemente, o setor público não se preparou para esse momento do ensino superior.

Por outro lado, o setor privado foi capaz de absorvê-lo. Com a oferta de cursos de baixo custo

e exigências acadêmicas menores, tanto para o ingresso como para o prosseguimento dos

estudos até a pós-graduação. As instituições privadas de ensino superior tornaram-se um grande

negócio. A despreocupação com a qualidade do ensino e a necessidade imediata de um diploma

por grande percentual da sociedade oportunizaram aos empresários, donos de instituições

privadas, ganhar muito dinheiro (SANTOS; CERQUEIRA, 2009). Em 1960, 56,7% das

matrículas no ensino superior vinculavam-se ao sistema público e 44% ao sistema privado. Já

em 1980, as matrículas no ensino público caíram (35,7%), havendo um aumento no setor

privado (64,3%) (DURHAM, 2003; SANTOS; CERQUEIRA, 2009). Esse cenário indicia um

surto expansionista no ensino superior liderado pelas “empresas educacionais” as quais

encontram espaço para sua ampliação.

Se, por um lado, o processo de interiorização do ensino superior trouxe múltiplos

benefícios como a ampliação e o fortalecimento do mercado de trabalho dos munícipios

interioranos, com a possibilidade de fixação de mão de obra altamente qualificada, a

dinamização da economia local e expansão do mercado consumidor do interior e a instalação

de equipamentos educacionais de nível mais sofisticado, por outro, também fomentou o

aparecimento de instituições privadas que viam aí uma oportunidade de lucrar com a oferta de

cursos com baixa qualidade.

Para Calderón (2000), até o período do início da grande reforma universitária, em 1968,

a universidade ou era gratuita ou paga, mas, caso cobrasse pelos serviços educacionais, não

poderia ter fins lucrativos. Na mesma época, havia grande pressão por vagas nas universidades,

o que, segundo Martins (1981, p. 94) “foi contornado através de uma avalanche de autorizações

para a abertura de novas escolas e ao mesmo tempo a permissão para as instituições já existentes

aumentarem suas vagas sem atender a grandes exigências burocráticas.” Esse fenômeno

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provoca o surgimento de novos estabelecimentos isolados com caráter de instituições mercantis

– com status de escolas integradas, de faculdades, centros universitários, caracterizados como

ensino de massa. Afirma Martins (1981, p. 80)

[...] a esmagadora maioria dessas instituições privadas que surgiram após o ano de 1968 se constituíram como empresas privadas capitalistas, ou seja, estavam voltadas para a procura de rentabilidade, utilizando a área educacional como um campo fértil para investimentos [...] com a finalidade de obtenção de lucro e de acumulação de capital.

Entre os anos de 1970 e 1979, as matrículas do setor privado quase quadruplicaram, de

425.478 estudantes em 1970, o país passa a 1.311.799 em 1979, respondendo por 50,5% das

matrículas no início da década de 1970, chegando ao seu final com mais de 64%. É nesse

período também que as instituições sofrem mudanças consideráveis em seus perfis e a

hegemonia dos cursos de educação superior privada passa dos grupos confessionais para os

empresariais, os quais optam pela oferta de cursos bacharelescos, em instituições isoladas de

ensino superior (VIEIRA; NOGUEIRA, 2017).

Esse movimento de expansão, fez com que, a partir da década de 1980, alguns

segmentos da sociedade civil implementassem ações de apoio às instituições comunitárias.

Inicia-se assim a etapa de consolidação desse modelo de universidade. A denominação

universidade comunitária passou a ser amplamente divulgada, o que tornou necessária a

demarcação de traços que caracterizassem seu perfil e sua identidade. Vários representantes de

universidades comunitárias (confessionais e laicas) reuniram-se no sul do Brasil com o objetivo

de “refletir sobre os traços comuns entre elas, que justificariam a denominação de

“comunitárias” (VANNUCCHI, 2011, p. 17). Moura, ao prefaciar a obra “As universidades

comunitárias: um modelo alternativo”, de Tramontin e Braga (1988, p. 10) reitera a necessidade

de “clarificar a identidade destas universidades historicamente compromissadas com a

qualidade do serviço que prestam e o meio social. Por assumir em suas atividades uma ampla

inserção social e especial dimensão pública, as instituições congregadas reivindicavam de

forma regular a concessão de recursos governamentais para suas entidades. Em 1985, mais

precisamente, foi aprovado um manifesto em prol dessas IES em reunião realizada pelo

Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras – CRUB, para que elas recebessem verbas

do governo para desenvolvimento de suas atividades educacionais.

Em 1988, reitores de vinte universidades (das quais dezesseis eram confessionais

católicas, uma metodista e três laicas) se reuniram para refletir sobre seus ideais comuns e,

igualmente, influenciar o Congresso Nacional a incluir o termo “escolas comunitárias” no texto

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que daria origem, posteriormente, à nova Constituição do Brasil. Essas articulações foram

muito importantes para as instituições denominadas comunitárias, uma vez que, nesse período,

meados da década de 1990, o setor privado, em franca expansão no Brasil, objetivava ter acesso

às verbas governamentais destinadas à educação. Grande número de instituições foram

reconhecidas como universidades, principalmente aquelas pertencentes ao segmento

estritamente particular (ou empresarial) (PINTO, 2009a). Convém mencionar (CALDERÓN,

2000, p. 63) “que essas transformações estão vinculadas estritamente ao aumento de vantagens

competitivas do mercado”. As universidades que, em suas origens, foram estabelecimentos

isolados ou faculdades integradas, já continham enraizado seu caráter mercantil.

A luta pelo reconhecimento expresso do modelo comunitário, defendido por vários

organismos nacionais e pela pressão exercida por representantes do setor privado,

principalmente pelas universidades confessionais, culminou na inclusão, ao artigo 213 da nova

Constituição Federal de 1988, nos seguintes termos:

Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que: I - Comprovem finalidade não-lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação; II - Assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades. § 1º - Os recursos de que trata este artigo poderão ser destinados a bolsas de estudo para o ensino fundamental e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública na localidade da residência do educando, ficando o Poder Público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua rede na localidade (BRASIL, 1988).

A elaboração da Nova Constituição reiterou o espaço da iniciativa privada na educação

bem como, reconheceu a existência de instituições nomeadamente comunitárias. A aprovação

deste artigo garantiu o repasse de recursos públicos para a educação e o acesso a verbas públicas

para as universidades comunitárias, confessionais ou filantrópicas. A Constituição também

estabeleceu o princípio da autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira

e patrimonial das universidades, isto estimulou a transformação na organização acadêmica das

IES privadas, que deixaram de ser faculdades isoladas e se transformaram em universidades.

Com autonomia, processos como abertura e fechamento de cursos ou alteração no número de

vagas foram desburocratizados (SAMPAIO, 2000). Ao descrever seu perfil institucional, a

UNI3 declara A partir do reconhecimento da Universidade, há um período de expansão. Novos

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campi e cursos de graduação são implantados em resposta às aspirações das comunidades

instaladas nas áreas de abrangência da Instituição, que, aos poucos, também passam a ser

beneficiadas por projetos de extensão e pesquisa (PDI UNI3, 2017, p. 30).

A participação institucionalizada das universidades comunitárias no orçamento

governamental estimulou a realização, em 1991, do 1 º Fórum de Reitores das Universidades

Comunitárias do Brasil. E, em 1995, nasce a Associação Brasileira das Universidades

Comunitárias – ABRUC (BITTAR, 1999) associação civil, sem fins lucrativos, com o objetivo

de promover, consolidar e defender o conceito de Universidade Comunitária (e, mais tarde,

também de Centros Universitários Comunitários). A ABRUC deu continuidade aos debates

para consolidar o uso do termo “comunitário” entre as Instituições de Ensino Superior por meio

da promoção de seminários nacionais das Universidades comunitárias que aconteceram entre

1995 e 1996. A década de 1990 representa um momento de significativa expansão da UNI3,

verificada na implantação de novos campi e cursos de graduação, pós-graduação stricto sensu

e educação básica em alguns municípios e no desenvolvimento de projetos de extensão,

parcerias com o poder público e iniciativas voltadas à internacionalização (PDI/UNI3, 2017,

p. 30).

Assim, em 1996, o termo “comunitário” também é incluído no texto da nova Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN (Lei nº 9.394/96). Vista como marco

regulatório para as universidades e tendo como base os princípios da Constituição de 1988, a

nova lei é o instrumento legal que melhor expressa os parâmetros e a lógica de reestruturação

da educação superior nos anos 90.

Com relação às universidades comunitárias, a LDBEN/96 distingue as instituições

privadas como atividade educacional, como se pode observar no texto da lei:

Art. 20. As instituições privadas de ensino se enquadrarão nas seguintes categorias: I – Particulares em sentido estrito, assim entendidas as que são instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado que não apresentem as características dos incisos abaixo; II – Comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas de professores e alunos que incluam na sua entidade mantenedora representantes da comunidade; III – Confessionais, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e ideologia específicas e ao disposto no inciso anterior; IV – Filantrópicas, na forma da lei (BRASIL, 1996).

Para Schmidt (2017), no entanto, sua redação não foi favorável às comunitárias, na

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medida em que as considerou uma modalidade de instituições privadas. No art. 19, a lei

estabelece apenas duas categorias de instituições de ensino: públicas e privadas. O art. 20

explicita as modalidades de instituições privadas: I – particulares, II – comunitárias, III –

confessionais e IV filantrópicas. As comunitárias, portanto, não conseguiram fazer valer sua

especificidade nesse importante documento legal da educação. Essa classificação é fonte de

confusão no entendimento ´dos conceitos entre o que é comunitário e o que privado no Brasil.

Estudos como os de Gadotti (1995); Bittar (1999); Longhi (2000); Frantz (2006);

Fernandes (2008); Schmidt (2010); Sampaio (2013) discutem a dicotomia público versus

privado como um dos entraves do aclaramento da identidade das instituições comunitárias. Ao

entender a educação como um bem social, como direito público, o papel do Estado com relação

a ela parece óbvio. Porém, por terem nascido da iniciativa da sociedade civil, mesmo tendo

compromisso público, as IES comunitárias estão enquadradas na categoria privada. Schmidt e

Campis (2009, p. 18) explicitam a necessidade de entender que a ideia de público é mais

abrangente do que o estatal, afirmando que existem duas formas do público se organizar: como

público estatal e o público não-estatal. Os autores complementam

A legislação existente não conhece uma figura jurídica apropriada às comunitárias. A dicotomia público versus privado manifesta-se na existência de apenas duas pessoas jurídicas: a de direito público e a de direito privado. Como decorrência dessa simplificação legal, os agentes públicos costumam tratar as comunitárias, que são de direito privado, como organizações privadas (SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 33).

Essa problemática fica evidente nas vozes de seus gestores quando anunciam a

dificuldade que as universidades comunitárias têm em comunicar seu caráter comunitário. Tem

que reverter a percepção de que comunitária não significa pública. Ela tem função pública,

mas não é estatal. Para definição: “o que que é universidade comunitária?” É uma

universidade pública, mas não estatal, ela é de direito privado e tem o papel de prestar serviços

à comunidade, público (R1). Há certa dificuldade de tornar claro o conceito, apesar de

inúmeras campanhas realizadas pelos departamentos de comunicação. Boa parte da

comunidade que é atendida e desfruta dos serviços talvez não sabe que ela é comunitária. Se

soubesse melhor, poderia fidelizar mais a sua vinda para a instituição. Não temos uma perfeita

socialização da visão de comunitária (R2). Segundo um dos gestores, torna-se um grande

desafio para essas instituições ultrapassar o equívoco do imaginário coletivo de considerar que

os serviços prestados devem ser gratuitos, é um pouco da confusão do público que nós temos,

né. É de todos então eu posso me beneficiar, não preciso pagar (R1). De certa maneira, essa

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confusão também é evidenciada nas publicações dos serviços ofertados por tais instituições.

Nas estatísticas noticiadas, ora os dados das nossas atividades estão computados junto às

privadas, ora estão relacionados junto a documentos públicos municipais pela nossa

natureza originária. Então se pegarmos o senso, nós estamos em todas as áreas (R2).

Todas essas vozes presentes no texto até aqui delineado trazem a preocupação de seus

anunciantes com relação aos elementos definidores da identidade das universidades

comunitárias. Albert e Whetten (1985), ao fazer referência à identidade nas organizações,

afirmam que a identidade organizacional é resultante de um conjunto de afirmativas sobre os

atributos centrais, distintivos e duradouros da organização. A centralidade diz respeito aos

atributos fundamentais da organização, seu sistema interno de crenças, normas, valores, que

constroem o sentido do que é a organização e do que ela representa para a comunidade; a

distintividade se relacionaria com o que distingue a organização das demais, diferencia do

grupo; e os atributos de durabilidade estariam atrelados à estabilidade da identidade ao longo

do tempo, o que permitiria manter o vínculo entre o presente, passado e futuro. Para Nogueira

e Machado-da-Silva (2003), esses aspectos seriam interdependentes e estariam expressos na

missão, nos objetivos, na ideologia, nos valores e nas estratégias organizacionais. Talvez se

possa levantar neste momento uma reflexão quanto a um dos aspectos que marcam os atributos

centrais dessas instituições, qual seja, a sua natureza, origem e finalidade e o conflito que aqui

se instaura, bem como aqueles que fazem referência ao que a distingue de outros modelos.

Por sua gênese, as comunitárias destacam-se pela alta inserção nas comunidades

regionais, atendendo demandas do poder público local e regional, em grande parte, de forma

gratuita. É uma iniciativa que não nasceu no núcleo do poder público-estatal, mas na sua

periferia, isto é, no espaço da ampliação da esfera pública, experiência fundadora de uma

natureza pública não estatal. Se a centralidade diz respeito aos atributos fundamentais de uma

organização, ao que lhe é legítimo, observa-se um certo impasse quanto ao conceito pública

não estatal. Nas palavras de Frantz (2006, p. 134)

O marco jurídico da sociedade brasileira reconhece e define diferentes níveis e categorias de instituições de ensino superior: universidades estatais e universidades privadas, sendo estas, particulares, em sentido estrito, confessionais, comunitárias e filantrópicas, conforme os Art. 19 e 20 da Lei nº 9.394. Portanto, a noção do privado, aqui, não se confunde, necessariamente, com a de propriedade privada. Em dimensão mais ampla, contrapõe-se à natureza jurídica estatal.

Parece então que o fato de originariamente ser de natureza pública, porém, constituir-se

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como pessoa jurídica de direito privado, gera grande confusão sobre este traço que deveria

caracterizá-la como comunitária. Afirma R1 Tem que reverter essa percepção de que

comunitária não significa pública. Ela tem função pública, mas não é estatal. Ela é pública,

mas não estatal. Ela é de direito privado e tem o papel de prestar serviços à comunidade,

público. No entanto, apesar das controvérsias, “a identidade público não estatal é um aspecto

marcante do discurso das comunitárias gaúchas e catarinenses, reafirmando insistentemente nos

documentos das instituições e entidades representativas ao longo das últimas décadas”

(SCHMIDT, 2017, p. 42). Não se caracteriza apenas como elemento acessório. No discurso, o

caráter comunitário se manifesta pela inserção da instituição na comunidade regional, nas

relações permanentes com a sociedade civil e o poder público local, na participação ativa de

integrantes da comunidade nas decisões e na gestão democrática.

Para Schmidt (2010, p. 30), apesar do Plano Nacional de Educação (Lei 10.172, de

9/01/2001), elaborado com base na LDB/96 as diretrizes de, “oferecer apoio e incentivo

governamental para as instituições comunitárias sem fins lucrativos, preferencialmente aquelas

situadas em localidades não atendidas pelo Poder Público, levando em consideração a avaliação

do custo e a qualidade do ensino oferecido.”, pouca relevância foi dada ao modelo comunitário

e, na prática, pouco aconteceu.

Em 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso, foi aprovado o Plano Diretor da

Reforma do Aparelho de Estado. Nele a categoria público não estatal foi utilizada na lógica da

minimização do Estado. Essa reforma possibilitou a criação de dois mecanismos legais que

constituem o atual marco do público não estatal do país: a Lei das Organizações Sociais (Lei nº

9.637, de 15/05/1998), destinada à privatização de atividades exercidas pelo Estado, o que vem

de encontro às características das comunitárias; e a Lei das Organizações da Sociedade Civil de

Interesse Público – OSCIPs (Lei nº 9.790, de 23/03/1999). Esta última exclui explicitamente,

no art. 2º, “as escolas privadas dedicadas ao ensino formal não gratuito e suas mantenedoras”,

assim como “as instituições hospitalares privadas não gratuitas e suas mantenedoras”

(SCHMIDT, 2010, p. 31).

Segundo Cunha (2007, p. 816), a LDB de 1996 “reconheceu, pela primeira vez na

legislação brasileira, a possibilidade de lucro para as instituições privadas de ensino: as

particulares, no sentido estrito, definidas, implicitamente, por oposição às instituições privadas

sem fins lucrativos (comunitárias, confessionais e filantrópicas)”. A LDBEN/96 facilitou a

entrada no setor, o que contribuiu ainda mais para o aceleramento e crescimento do ensino

superior privado durante a década de 90 (CRUZ, 2008). Vários decretos publicados

posteriormente tiveram efeitos significativos no setor privado. Uma maior diversificação nos

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formatos institucionais ocorreu, e as IES passaram a ser classificadas como institutos

superiores, faculdades, faculdades integradas, centros universitários ou universidades, cada

qual com distintas prerrogativas e níveis de autonomia. As novas normativas permitiram

também a criação de instituições privadas com fins lucrativos ao lado das já tradicionais

privadas sem fins lucrativos (comunitárias, confessionais e filantrópicas) e das públicas estatais

(FIOREZE, 2017). As instituições privadas organizadas como empresas lucrativas (particulares

em sentido estrito) passam de 39% do total das matrículas do setor privado, em 1997, para 52%,

em 2002, ganhando muito espaço frente às instituições privadas sem fins lucrativos (PINTO,

2004, p. 740). Ao assumirem a forma legal “com finalidade lucrativa”, as entidades

mantenedoras adquirem o direito de transformar as instituições de ensino superior (as mantidas)

em mercadorias, tornando-as passíveis de serem vendidas e compradas no mercado

(SAMPAIO, 2012).

Para Morosini e Franco (2006), a década de 90 foi marcada por importantes mudanças

nas IES brasileiras. Sob orientações de organizações internacionais como Banco Mundial,

Organização Mundial do Comércio (OMC), Organização das Nações Unidas para a Educação,

a Ciência e a Cultura (UNESCO), as políticas públicas para o ensino superior investiram em

ações que incentivaram a redução do papel do Estado, priorizando o ensino privado; bem como

a “expansão do Sistema de Educação Superior (SES); descentralização, diversificação e

flexibilização do SES; avaliação da ES ancorada em conceitos de qualidade isomórficos e

orientados para a tomada de decisão e o controle de qualidade” (MOROSINI; FRANCO, 2006,

p. 56).

No final da década de 1990, a mercantilização do ensino superior se acentua e inicia-se

assim o marco de diversificação da oferta do ensino superior. O processo de globalização e de

disseminação das tecnologias de informação, por meio da oferta direta de cursos (presenciais e

a distância), da produção de materiais instrucionais (livros, apostilas e softwares), do

nascimento de consultorias empresariais faz com que as instituições lucrativas na área da

educação se transformassem em um grande negócio, sendo um dos segmentos que apresentou

maior taxa de crescimento e lucro (CARVALHO, 2013, p. 766).

Passados alguns anos, já na década de 2000, algumas alterações aconteceram na Lei

9.394/96. O inciso II do Artigo 20 desta lei sofreu duas alterações, a primeira em 2005 e a

segunda em 2009, cujas redações passaram a ter os seguintes termos:

II – Comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas

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de pais, professores e alunos, que incluam em sua entidade mantenedora representantes da comunidade; (Alteração efetuada por meio da Lei 11.183, de 5 de outubro de 2005) (BRASIL, 2005c). II – Comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas educacionais, sem fins lucrativos, que incluam na sua entidade mantenedora representantes da comunidade; (Alteração efetuada pela Lei Nº 12.020, de 27 de agosto de 2009) (BRASIL, 2009).

Amparadas em termos legais, incluindo a utilização de recursos públicos, as instituições

comunitárias, confessionais e filantrópicas colocam-se num patamar diferenciado dentro do

setor privado do ensino, ganhando com isto condições especiais para suas atividades. A

introdução do critério diferenciador entre as instituições particulares em sentido estrito e, as

demais, incluindo as comunitárias, confessionais e filantrópicas, explicitado pela expressão

“sem fins lucrativos” para este segundo grupo é a alteração mais significativa no processo

(SILVA, 2012). Essa década (2000) assinala a consolidação da Universidade, com

participação e o êxito da maioria expressiva de seus cursos nos processos de avaliação externa,

notadamente a partir de 2004, com a vigência do Sinaes (PDI/UNI3, 2017, p. 31). Pouco a

pouco, por conquistas sociais e políticas, as universidades comunitárias vão se legitimando e

distinguindo-se de outras instituições de ensino superior, tornando a organização única

(ALBERT; WETTHEN, 1985).

Na primeira década de 2000, muitas articulações vinham sendo realizadas com intensos

debates nos Ministérios da Educação e da Justiça por representantes das Universidades

Comunitárias com o intuito de definir o perfil dessas instituições de educação superior e de

garantir seu processo de legitimação. Todos os gestores participantes desta pesquisa tiveram

participação intensa nas negociações.

RS e SC já conheciam as universidades comunitárias, mas o modelo tinha que ser levado para o Brasil. [...]. Buscamos apoio da CMBB e da OAB. Então foi criada a Frente Parlamentar em defesa das comunitários com 247 inscritos na bancada. [...] então começou a dar corpo e a relatoria ficou por conta de dois senadores de Santa Catarina. Visitamos os parlamentares de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Visitamos todas as bancadas. Fomos a todas as lideranças. O projeto passou na câmara e foi para o Senado. O projeto foi aprovado com vetos (R2, 2016).

Em 2008, as associações, gaúcha COMUNG e catarinense ACAFE, propunham ao

Governo Federal e ao Congresso Nacional um projeto de lei específico para as instituições

comunitárias. UNI4 e UNI3 lutando juntas. Primeiras a migrar para o sistema federal (MEC).

Luta pelo reconhecimento dos direitos. Realização de campanhas e abaixo-assinados para

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enviar aos deputados pedindo a aprovação da lei. Envio de e mails para alunos (R4, 2016).

Outro gestor enfatiza o grande envolvimento no processo de formulação da lei. A nossa

universidade teve grande envolvimento, auxiliando a ABRUC no sentido de fomentar e

provocar manifestações junto aos deputados e senadores. O marco regulatório das

universidades comunitárias era necessário (R3, 2016). Em sua primeira versão intitulou-se

Projeto de Lei das Instituições Comunitárias, incluindo nesse conjunto universidades, escolas,

hospitais, emissoras e demais organizações comunitárias.

Para Saraiva e Duarte (2010, p. 113) “a construção identitária é constituída pelo

conjunto de representações que seus integrantes formulam sobre o significado da organização,

que se baseia no objetivo, valores e crenças consideradas importantes”. Os objetivos das

universidades comunitárias estão relacionados à promoção de ações junto à sociedade, e a

“identificação do indivíduo com a organização acontece quando o indivíduo reconhece valores

na organização semelhantes ao dele” (SARAIVA; DUARTE, 2010, p. 114). A adesão de

políticos, associações de classe e comunidade à proposta de criação de uma identidade própria

para as instituições comunitárias demonstra a presença de um processo de identificação com os

objetivos dessas instituições, o que os impulsiona a reconhece-las como legítimas.

Em 2009, a Associação Brasileira das Universidades Comunitárias – ABRUC

mobilizou todas as entidades representativas das universidades comunitárias brasileira,

incluindo a Associação Nacional de Educação Católica do Brasil – ANEC e a Associação

Brasileira de Instituições Educacionais Evangélicas – ABIEE objetivando unificar o discurso

em favor de um marco legal para que o Estado e a sociedade brasileira reconheçam essas

instituições com características distintas das privadas e sejam reconhecidas como públicas não

estatais. Finalmente, em 2010, foi entregue pela Frente Parlamentar de Apoio às Universidades

Comunitárias à Câmara dos Deputados o projeto de Lei n. 7.639/2010, intitulado Projeto de Lei

das Instituições comunitárias de Educação Superior, o qual se configura como marco

regulatório para o setor.

Após tramitar por várias instâncias e ser aprovado por unanimidade em todas as

comissões permanentes, o projeto torna-se lei. Em 12 de novembro de 2013, a Lei 12.881 é

publicada no Diário Oficial da União dispõe sobre a definição, qualificação, prerrogativas e

finalidades das instituições comunitárias e vem assinada por pela Presidente Dilma Roussef e

os ministros Guido Mantega, Aloisio Mercadante, Miriam Belchior e Luis Inacio Adams. Essa

Lei representa uma nova era para as universidades comunitárias, ampliando os espaços de

cooperação entre o poder público e as organizações criadas pelas comunidades no setor da

educação superior. Sua aprovação é “o reconhecimento legal das especificidades que tornam as

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instituições comunitárias um modelo específico” (SCHMIDT, 2017, p. 59). Afirma um

entrevistado A lei é importante pois reconhece que existe um modelo de universidade

comunitária que não é federal, que não é estatal e nem municipal. Existe um modelo por

iniciativa da comunidade (R1, 2016). Até o advento desta norma jurídica, as universidades

comunitárias encontravam-se no espaço genérico das IES privadas, mesmo com o amplo

processo de inserção local e regional. A Lei assume um papel fundamental no reforço da

identidade do modelo comunitário de educação superior no Brasil. Tudo isso implica em

perceber que não há como refletir sobre identidade, sem considerar a existência de um outro,

ou de diferentes tipos de outros (nesse caso, os outros tipos de instituição) que possuam algum

elemento de relevância para a construção dos traços que as distingam (SILVA; VERGARA,

2002).

Entre as características básicas para a qualificação das Universidades Comunitárias

estão: constituir-se na forma de associação ou fundação de direito privado, adotar práticas de

gestão que coíbam privilégios, ter patrimônio pertencente à sociedade civil ou ao poder público,

não distribuir sua renda, ofertar serviços gratuitos, aplicar recursos nas suas atividades e

desenvolvimento permanente de ações comunitárias, prestar contas publicamente, prever a

participação de representantes dos docentes, estudantes e funcionários em órgãos colegiados,

além da apresentação de relatório de responsabilidade social (Lei 12.881/13 - Artigos 3º e 4º).

Desde sua origem, esses atributos já eram requisitados pelas instituições de caráter

comunitário. Observa-se, portanto, a permanência/persistência tanto dos traços centrais quanto

dos traços distintivos da identidade dessas universidades. “A estabilidade, implícita nesse

elemento, cria nos indivíduos um nível de certeza sobre as práticas da organização que confere

horizontes historicamente definidos para as suas ações” (SARAIVA; DUARTE, 2010, p. 113).

Ou seja, há um alto grau de credibilidade institucional, reforçada por um processo de construção

sedimentado/enraizado em convicções sólidas e que levam à legitimação das práticas

organizacionais.

As ICES classificadas também possuem as seguintes prerrogativas

Artigo 2º: I - ter acesso aos editais de órgãos governamentais de fomento direcionados às instituições públicas; II - receber recursos orçamentários do poder público para o desenvolvimento de atividades de interesse público; IV - ser alternativa na oferta de serviços públicos nos casos em que não são proporcionados diretamente por entidades públicas estatais; V - oferecer de forma conjunta com órgãos públicos estatais, mediante parceria, serviços de interesse público, de modo a bem aproveitar recursos físicos e humanos existentes nas instituições comunitárias, evitar a multiplicação de estruturas e assegurar o bom uso dos recursos públicos (BRASIL, 2013).

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Em 06 de outubro de 2014, foi publicada no Diário Oficial da União a Portaria MEC n.

863, de 03 de outubro de 2014 (BRASIL, 2014a), que “Regulamenta o procedimento para

qualificação das Instituições de Educação Superior como Instituições Comunitárias de

Educação Superior, nos termos da Lei n. 12.881, de 12 de novembro de 2013” (BRASIL, 2013).

O sonho da consolidação da instituição comunitária ocorreu com efetividade no ordenamento

jurídico brasileiro a partir da Lei e sua posterior regulamentação, podendo cumprir com maior

segurança seus fins institucionais (CIMADON; CIMADON, 2015).

Entre os avanços alcançados pela nova Lei, está o caráter inovador no que concerne a

distinção entre as instituições comunitárias das instituições privadas (particulares) da educação

superior, estabelecendo a tripartição entre públicas (estatais), comunitárias e privadas. Essa

norma também remove alguns obstáculos quanto à transferência de recursos públicos a essas

instituições, geralmente contestados no âmbito legal, promovendo maior cooperação entre o

poder público e as comunitárias. Outra novidade está na possibilidade, agora oficial, dessas

instituições prestarem serviços gratuitos, por meio do repasse de recursos pelo poder público.

Assim, o dinheiro público pode ser repassado para as instituições públicas estatais e

comunitárias. Para Schmidt (2017, p. 61) o reconhecimento do modelo comunitário “serve de

inspiração para a formulação de um marco legal abrangente do terceiro setor”. Desta forma, as

entidades da sociedade civil passam a ser percebidas como parceiras públicas, distanciando-se

das instituições caracteristicamente privadas.

As leis são instrumentos de luta política para transformação social. Para os gestores, a

Lei 12.881/2013 é fruto de muito trabalho pelo reconhecimento de uma instituição que há muito

já existia e cujo intento era promover o bem social no seu entorno. Foi importante porque nós

já somos comunitária de fato, mas agora somos de direito. Ter uma lei que diga isso é

importante (R4, 2016). Porém, nenhuma lei modifica de forma mágica uma situação. A

dicotomia público/privado está profundamente enraizada na cultura administrativa, o que

demandará tempo até que as novas normas sejam incorporadas ao modus operandis dos órgãos

de educação e da máquina pública. A voz do entrevistado (R4, 2016) anuncia a dificuldade A

lei dá acesso aos recursos públicos por meio de editais (compra de equipamentos, incentivo à

pesquisa, instalação). Mas, já se passaram três anos e nada disso aconteceu até agora.

A descrição das vozes dos gestores quanto à legitimação das comunitárias denuncia que

não basta existir a lei. Ela deve ser cumprida, no entanto, o processo de seu cumprimento, às

vezes, encontra algumas resistências. Se se considerar que a identidade organizacional é algo

construído socialmente, de modo relacional, então ela deve ser considerada como fluída,

contínua, adaptativa. Afirma R2,

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Quando ela (a universidade) foi criada, a realidade era outra. Ela foi criada por uma necessidade, serviu, principalmente, na formação profissional, mas talvez, em razão da concorrência, ela acabou meio que desvirtuando dos seus propósitos, mas vejo como como uma instituição vinculada à comunidade (R2, 2016).

Ou seja, longe está de ter acabado a modelagem dessas instituições, a cada conquista,

um novo desafio se lhes apresenta, o processo é ininterrupto, com diferentes arranjos no

caminho (SILVA; VERGARA, 2002). A nova economia global trouxe mudanças de largo

alcance para as instituições de ensino superior, seja qual for o modelo de universidade. A

palavra de ordem do discurso preconiza um ensino que se adapte à competitividade do mercado

internacional e que as universidades se abram aos financiamentos empresariais, às pesquisas

práticas, utilitárias e à produtividade (GHIRALDELLI, 1996). Observa-se, assim, que, ao

mesmo tempo em que reafirmam sua essência, as universidades comunitárias se deparam com

um mundo globalizado onde as mudanças se aceleram, a diversidade cultural se amplia e novas

estratégias de adaptação se fazem urgentemente necessárias.

O receio de fragmentar-se, de dissolver-se no global e ficar à deriva de políticas

neoliberais, reafirma a necessidade dessas instituições de marcar os seus contornos, de se firmar

como um modelo comunitário fortalecido por suas referências de origem, quais sejam: de serem

criadas e mantidas pelas comunidades, orientadas para as necessidades da coletividade, não

pela lógica do mercado e serem prestadoras de serviços de interesse público. Também entre os

traços que as singularizam está o seu caráter público não estatal. Na cultura política e na ordem

legal brasileiras prevalece ainda a tendência reducionista de identificar o público com o estatal.

O público é mais abrangente que o estatal e o comunitário é uma das formas do público. Caso

as estruturas sócio-político-econômicas evoluam nesse sentido, essas instituições podem vir a

ter uma potência política expressiva, pois “reúnem condições para proporcionar ao país

relevantes contribuições ao compartilhar com o Estado e com as organizações da sociedade

civil a tarefa de oferecer serviços públicos de qualidade” (SCHMIDT, 2010, p. 10).

Outro traço que distingue essas universidades das instituições públicas e das privadas é

sua autonomia no plano decisório e financeiro em relação ao Estado. É o que faz delas

instituições não estatais. Embora mantenham relação permanente com entes públicos e muitas

acolham representantes governamentais em suas instâncias deliberativas, essas instituições não

são sustentadas pelo Estado, não há dependência econômica nesta relação. Também não há

intenção de que isso aconteça, porém, o fato de serem reconhecidas oficialmente como um

modelo de universidade amplia as possibilidades de participação em editais que deem acesso

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aos recursos públicos (SCHMIDT, 2010).

Nas vozes de seus gestores, evidencia-se a grande preocupação com a sobrevivência

financeira e com os encaminhamentos dados às políticas educacionais atreladas a um viés

neoliberal.

O modelo das universidades comunitárias regionais é anterior aos modelos propagados

pelas reformas de caráter neoliberal implementadas a partir da década de 1980, pois foram

estruturadas em plena vigência do Estado desenvolvimentista, suprindo a lacuna de educação

superior nas regiões interioranas por iniciativa da sociedade civil e do poder local. Apesar da

existência de um cenário gerador de incertezas, muitas das universidades comunitárias mantêm-

se fiéis à sua natureza e ter reconhecida oficialmente a sua existência dá a elas um fôlego maior

para continuar a sua trajetória.

O reconhecimento da existência das universidades comunitárias pode ser visto como

um avanço na definição do novo modelo de Estado, que possibilite a cooperação entre os entes

estatais, a sociedade civil e as organizações privadas. E cabe a esta pesquisa e a tantas outras

desenvolvidas no meio acadêmico elucidar e aprofundar as múltiplas abordagens que modelam

a anatomia das instituições de ensino superior e os seus conflitos identitários. Partindo dessa

premissa, o capítulo seguinte abordará os caminhos conflituosos por que passam essas

instituições. À luz das considerações de McCowan (2016) e de Albert e Wetthen (1985), passar-

se-á a analisar a anatomia das universidades comunitárias e sua relação entre o bem público e

o bem de consumo.

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4 ANATOMIA DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS: VALOR, FUNÇÃO,

INTERAÇÃO

Dada a conjuntura econômica e social atual, segundo a qual a educação é redefinida pela

lógica do mercado por meio das reformas neoliberais, percebe-se que as universidades

comunitárias vêm atravessando múltiplos conflitos, sejam eles relacionados à questão de

autonomia, de currículo, de relação social, de sustentabilidade financeira, e, inclua-se nesse rol,

certa crise de identidade. Assim, buscar caracterizar, conceituar esse modelo de instituição de

ensino superior e as políticas públicas com relação a elas no sentido de poder orientar o debate,

constitui-se grande desafio. Com base nas entrevistas realizadas com os gestores das

universidades e nas análises dos documentos institucionais, especificamente, Planos de

Desenvolvimento Institucional e Relatórios de Responsabilidade Social, buscar-se-á, a partir de

três dimensões – valor – função – interação - modelo teórico proposto por McCowan (2016;

2017) e a partir do entendimento do conceito de identidade organizacional proposto por Albert

e Whetten (185) promover uma reflexão sobre os elementos que constituem a identidade das

universidades comunitárias e, em que medida, as políticas neoliberais afetam essa construção.

Para McCowan (2016), nas últimas décadas, as agências internacionais de

desenvolvimento têm mostrado grande interesse pelo ensino superior, haja vista a alocação de

recursos pelas agências de desenvolvimento: 20% dos fundos do Banco Mundial, 34% de ajuda

à educação dos países do Comitê de Ajuda ao Desenvolvimento (CAD) com a oferta de bolsas

de estudo para estudar em países de alta renda.Vários motivos estariam contribuindo para essa

mudança de ótica, entre eles a percepção do aumento do valor do conhecimento como fator de

competitividade econômica, a alta taxa de retorno, em diferentes níveis, a capacidade de

impulsionar o desenvolvimento tecnológico pela pesquisa e as mudanças da economia política

global.

O reconhecimento de que o ensino superior tem papel fundamental na consecução dos

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) levou a Organização das Nações Unidas

(ONU) a incluir como meta “até 2030 garantir acesso igual para todas as mulheres e homens a

educação técnica, vocacional e terciária acessível e de qualidade, incluindo a universidade"

(Nações Unidas Brasil, 2015).

Segundo o autor, esse interesse crescente pelo ensino superior é bem-vindo, no entanto,

as formas de intervenção propostas e as razões que as sustentam nem sempre são claras. É

preciso verificar os impactos que os diferentes tipos de ensino superior podem acarretar na

sociedade, pois ainda faltam evidências empíricas que sustentem as alegações sobre a

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contribuição do ensino superior para o desenvolvimento.

McCowan (2016) afirma que há certa fragilidade conceitual e teórica sobre o que é a

universidade e para que ela serve. Na tentativa de avaliar a natureza mutável das universidades,

o autor propõe então um modelo teórico. Para o autor (2016) a dicotomia público/privado não

dá conta de explicar os atributos que caracterizam uma universidade. Assim, para compreender

as características dessa instituição, sua relação com a sociedade e seu potencial de contribuição

para o desenvolvimento, o autor propõe um modelo sustentado em três dimensões – valor,

função, interação – para a análise de características constituintes da “anatomia” da

universidade (MCCOWAN, 2016). Esse quadro tridimensional ofereceu subsídios para

compreender os elementos constituintes da identidade das instituições comunitárias, seus

propósitos, suas práticas, seus vínculos com a sociedade externa e a inter-relação entre esses

elementos. Ao tornar transparente essa compreensão, foi possível analisar, com mais

propriedade, os dilemas que essas instituições vêm enfrentando quanto à sua existência.

Há uma inter-relação entre as três dimensões. Se o conhecimento for tomado com valor

instrumental, a hipótese de uma relação interativa mais porosa com o mundo exterior é

aceitável, ao mesmo tempo em que suas funções se entrelaçam com atividades que refletem

maior preocupação com a comunidade local, o que poderia ser ilustrado com a existência de

um hospital universitário ou cursos de educação para adultos, por exemplo. Do mesmo modo,

caso seja dado ao conhecimento um valor intrínseco, com estímulo a ações de arquivamento ou

mera interpretação do conhecimento, a relação com a comunidade teria uma baixa porosidade

(MCCOWAN, 2016).

O autor defende que esses três ingredientes valor, função e interação sofrem efeitos

devastadores pelo surgimento de atividades empresariais nas instituições de ensino superior,

pela redução de custos e a maximização dos lucros por meio da separação das atividades

executadas por essas instituições. Dois processos contribuiriam para gerar uma instabilidade

identitária nas universidades: a comoditização (Commodification) e a desagregação

(Unbundling) (MCCOWAN, 2016; 2017).

O processo de comoditização/mercantilização se caracteriza pela conversão das

funções da universidade em produtos e serviços para venda voltados à lucratividade. “Refere-

se ao processo através do qual o conhecimento que poderia ser livremente transmitido e

adquirido - seja por meio de atividades relacionadas ao ensino, pesquisa ou envolvimento da

comunidade - é organizado e disponibilizado com o objetivo de gerar renda e potencialmente

lucrativo” (MCCOWAN, 2016, p. 515, tradução nossa). Já o processo de desagregação se

manifestaria por meio da separação das funções da universidade em unidades individuais,

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formalizada pelo conjunto de produtos vendidos como pacotes, tendo como influência o

desenvolvimento de novos modos de entrega, em particular os Massive Open Online Courses

(MOOCs) – Cursos on line abertos massivos. “O desagregamento, portanto, refere-se ao

processo de vender aos consumidores apenas as partes da experiência universitária que eles

querem ou podem pagar”8 (MCCOWAN, 2016, p. 516, tradução nossa). A figura 6 traz as duas

vertentes influenciadoras neste processo.

Figura 6 - Vertentes influenciadoras nas dimensões Valor – Função – Interação

Fonte: Elaborado pela autora, com base em Mccowan (2016)

Esses dois processos têm relevância nesse estudo na medida em que podem ser vistos

como influenciadores/estimuladores na mudança de conduta ou no comportamento que vêm

tomando as universidades comunitárias. Assim eles serão retomados por ocasião da análise das

dimensões Valor, Função, Interação.

Schmidt (2017) descreve em detalhes as características das universidades comunitárias,

além de vários outros autores já mencionados. Baseando-se nesses estudos, elencou-se aquelas

características que reiteradamente foram citadas, as quais serviram de referência para a análise.

Para contemplar o conjunto de traços centrais, distintivos e duradouros da identidade

organizacional, os estudos de Albert e Whetten (1985) se mostraram pertinentes. Retoma-se os

dados apresentados anteriormente na figura 3, na qual se apresenta a relação entre esses

8 Unbundling, therefore, refers to the process of selling to consumers only those parts of the university experience that they want or can afford (MCCOWAN, 2016, p. 516).

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elementos.

Figura 3 - Relação dimensões de análise, características das UCs e dilemas

Fonte: Elaborado pela autora com base em Schmidt (2017; Albert e Whetten (1985)

4.1 VALOR: O bem público como razão de existência da universidade comunitária

O conhecimento é uma parte inerente do patrimônio comum da humanidade. Assim, ao

considerar a necessidade de garantir o desenvolvimento sustentável em um mundo cada vez

mais interdependente, conhecimento e educação podem ser vistos como bens comuns mundiais.

Entendida como um bem público e direito social, “a educação tem como finalidade

essencial a formação de sujeitos e, por consequência, o aprofundamento da cidadania e da

democratização da sociedade” (DIAS SOBRINHO, 2013, p. 109). Neste caso, o conceito de

bem público é interpretado como princípio, como um valor moral que “sobrepõe a dignidade

humana aos interesses, inclinações e circunstâncias individuais” (DIAS SOBRINHO, 2013, p.

109). Respeitar a dignidade humana condiz ao princípio de compreender o outro como fim e

não como simplesmente um meio, o que se contrapõe ao individualismo cujo entendimento é

de que o outro é mero meio para servir aos interesses próprios. Respeitar a dignidade humana

é fazer prevalecer o bem comum sobre as conveniências individuais. Essencial para a formação

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de cidadãos conscientes, a educação como bem público concebe profissionais qualificados e

éticos que passam a atuar como principais atores do fortalecimento econômico e

desenvolvimento de uma nação (DIAS SOBRINHO, 2013).

Bens comuns seriam aqueles que, “independentemente de qualquer origem, pública ou

privada, caracterizam-se por um destino comum vinculante, sendo necessários para a

concretização dos direitos fundamentais de todas as pessoas” (MARELLA, 2012). Pode-se

definir bem comum como “uma associação solidária de pessoas que é mais do que o bem dos

indivíduos em seu conjunto. É o bem que consiste em ser uma comunidade, ou seja, “é o bem

concretizado nas relações mútuas nas quais e pelas quais os seres humanos alcançam seu bem-

estar” (DENEULIN; TOWNSEND, 2007, p. 23). Assim, o bem comum seria inerente às

relações existentes entre os integrantes de uma sociedade unidos entre si em uma vontade

coletiva, a qual enfatiza o processo participativo, que é em si um bem comum. Nessa

perspectiva, parece que a noção de bem comum ultrapassa os limites do conceito de bem

público. A noção de bem comum vai além do conceito mais instrumental do bem público, em

que o bem-estar humano se assenta nos parâmetros de uma teoria socioeconômica

individualista.

Para Silva (2002, p. 661), público significa “o que é comum, pertence a todos, é o povo,

pelo que, opondo-se a privado, se mostra que não pertence nem se refere ao indivíduo ou ao

particular.” A esfera pública envolve questões da coletividade, que vão além do indivíduo, da

família e de grupos específicos. Schmidt e Campis (2009) afirmam que o público se manifesta

em duas modalidades: público estatal e público não estatal. “O estatal, por definição, tem (deve

ter) finalidades exclusivamente públicas. Todavia, o público é mais abrangente que o estatal.”

(SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 18). Estatal refere-se às organizações que pertencem à esfera

do Estado em seus diferentes níveis, compreendendo os diferentes poderes políticos –

Executivo, Legislativo e Judiciário – no plano federal, estadual e municipal, e empresas e

órgãos a eles vinculados. Em sociedades complexas, além das entidades estatais, “o público

inclui uma gama de organizações e instituições que prestam serviços de interesse coletivo, ou

seja, são públicas não estatais” (SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 18).

Está-se elucidando o entendimento de bem comum e bem público, porque eles são

componentes inerentes à gênese das instituições objeto desse estudo. Comunitário é aquilo que

é comum à comunidade, o que é coletivo, o que é de todos os membros da comunidade.”.

(SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 19). O termo comunidade normalmente associa-se a

características como comunhão, laços sociais fortes, integração, interesse público. “O

comunitário distingue-se do estatal e do privado: não pertence ao Estado, nem a grupos

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particulares. Pelas suas finalidades e modus operandi é uma das formas do público, abrangendo

as instituições e organizações voltadas à coletividade” (SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 19).

Segundo o princípio do bem público, o sistema educativo não pode amparar as práticas

tão somente mercantilistas e de acumulação de lucros, a educação não pode ser vista como

mercadoria. Por serem parte essencial do direito que todos têm à vida digna e saudável, os bens

públicos precisam ser universalmente acessíveis e não podem ser tomados como mercadoria.

(LOCATELLI, 2017; MCCOWAN, 2015; DIAS SOBRINHO, 2013). A afirmação desse

princípio, que parece caminhar na contramão da crescente mercantilização, atinge todas as

instituições educativas, as quais têm funções e finalidades públicas que não deveriam ser

negligenciadas. Para Dias Sobrinho (2013, p. 110) “os fins da educação com sentido público

referem-se à formação de indivíduos sociais, cuja construção pessoal integral se insere no plano

mais amplo da construção da sociedade e, em termos universais, da dignificação da

humanidade.” Assim, discutir a educação como bem público e comum implica reconhecer a

grande responsabilidade que as Instituições de Educação Superior têm na formação ética,

científica e moral de cidadãos comprometidos com a construção de uma sociedade mais

inclusiva e justa (LOCATELLI, 2017; MCCOWAN, 2017).

Estando as universidades comunitárias envolvidas nesta seara, como instituições de

ensino superior, suas concepções e práticas precisam ser expostas à reflexão, ao debate e à

crítica como caminho em busca do entendimento de sua constituição identitária. Daí, a proposta

de McCowan (2016) parecer bastante pertinente na busca por possíveis respostas. Para

McCowan (2016), a dimensão valor refere-se à razão da existência da universidade, do porquê

do ensino superior. Dois eixos são considerados ao valor atribuído à universidade: o valor

intrínseco e o valor instrumental. No caso do valor intrínseco, o conhecimento vale por si

mesmo sem qualquer justificativa. O conhecimento gerado, armazenado e transmitido pela

universidade pode ser percebido intrinsecamente valioso, valendo a pena em si mesmo sem

qualquer justificativa adicional. Por sua vez, o conhecimento com valor instrumental serviria

a objetivos individuais e sociais e interesses econômicos, políticos ou culturais. Nessa

dimensão, seria considerado o benefício privado ou público dos bens produzidos pelo ensino

superior, assim como a sua abrangência, se em nível local, nacional ou mundial. Esses dois

eixos não são mutuamente excludentes, pois “podemos considerar que existe um valor

intrínseco na promoção da compreensão humana das estruturas profundas da linguagem, ao

mesmo tempo que valoriza sua contribuição para o desenvolvimento de computadores

programação” (MCCOWAN, 2016, p. 510, tradução nossa). Assim, o conhecimento produzido

pela universidade pode ser fundamental tanto para os resultados individuais, em termos de

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realização de objetivos de vida, quanto para o fortalecimento da atividade instrumental.

A produção e a disseminação de conhecimentos, bem como a vivência de valores

fundamentais da vida constituem a matéria prima da formação humana. A universidade, sendo

uma instituição de educação cuja finalidade principal é a formação do ser humano em suas

distintas dimensões, justifica a sua existência ao cumprir sua responsabilidade social na

produção e socialização de conhecimentos. Para Dias Sobrinho (2015, p. 584) “À universidade

compete a missão de formar pessoas com alto sentido cultural, moral e político de cidadania e

de contribuir, em sua esfera de possibilidades e em seus limites, para a solução de problemas

da coletividade”. Ainda para este autor, a universidade tem a função de formar indivíduos-

cidadãos dotados de valores cívicos, conhecimentos cientificamente relevantes e socialmente

pertinentes. “Sem sentido vital e valência social, não mereceria existir uma instituição criada e

mantida pela sociedade para o bem de todos” (DIAS SOBRINHO, 2015, p. 582).

A universidade é um dos espaços da convivência plural da sociedade. Tem múltiplas e

contraditórias demandas disputadas por seus diferentes atores, que, por meio da crítica

fundamentada em conhecimentos, defendem seus valores em permanente diálogo (DIAS

SOBRINHO, 2015). Por isso mesmo, para McCowan (2017, p. 8) “nenhuma universidade

jamais terá um conjunto unitário de valores: sempre haverá alguma diversidade de perspectiva”,

em virtude dos diferentes grupos que ali convivem compostos por gestores, professores,

funcionários, acadêmicos que, por sua vez, se conectam com a comunidade externa. Apesar

dessa diversidade, o autor aponta para a existência de três elementos que podem ser observados

na dimensão valor: a individualização, que corresponderia às escolhas individuais em relação

ao que é aprendido, aquilo que ele considera como valor para agregar à sua vida; o bem público,

entendida como um bem público, a universidade deve estimular o engajamento e o debate

coletivo; e a ação afirmativa, que se relaciona às questões de igualdade e justiça social. Ao

fazer referência a cada um desses elementos, o autor descreve as possíveis implicações

negativas que os processos de comoditização e desagregação podem provocar na formação

integral do indivíduo.

Uma vez que todos têm necessidade vital de formação e esta se dá pela educação, cabe

à universidade a responsabilidade de “formar cidadãos portadores de sólidos conhecimentos e

conscientes de suas responsabilidades nos processos de construção econômica, ética e política

da sociedade” (DIAS SOBRINHO, 2015, p. 586). Ao entender a educação e o conhecimento

como bens públicos e direitos humanos essenciais, as universidades comunitárias assumem o

caráter de instituição que não negligenciam nem sonegam ao cidadão o direito à sua formação

integral pela mediação dos conhecimentos. Nessa linha de raciocínio, o conhecimento tem valor

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público e social. Percebido assim, não é mera engrenagem da otimização de lucros e nem a

universidade simples espaço de reprodução de produtos comercializáveis (DIAS SOBRINHO,

2015).

Tais colocações reforçam os ingredientes presentes na concepção de valor instrumental

denominado por MCCowan (2016) e elucidados nas vozes dos gestores das universidades,

objeto desse estudo. Ao comentar sobre o papel da universidade, um dos gestores afirma que a

universidade é uma empresa que gera um produto e que precisa de resultados (R1), no entanto,

é uma empresa diferente cuja compreensão extrapola o simples fato de eliminar cursos de

licenciatura, por exemplo, só porque estes estão dando prejuízo. A lógica é outra, a percepção

da função da universidade é outra, Se fôssemos buscar só resultados, nós fecharíamos metade

dos cursos, [...] Os resultados estão a serviço de uma causa maior, que é a formação de

professores, formar recursos para todas as áreas e não só aquelas que dão resultado ou lucro

(R1). Apesar de admitir, que a universidade tem características de uma empresa, ela não deve

e nem pode seguir os caminhos de uma organização empresarial, seu papel vai além da

prestação de serviço como mero produto de troca.

O valor instrumental do conhecimento também marca presença no discurso do Plano de

Desenvolvimento Institucional – PDI - das universidades pesquisadas. Elaborado para um

período de cinco anos e com caráter normativo, esse documento posiciona os aspectos que

confirmam o compromisso institucional com a educação superior, bem como identifica a

relação da instituição com a sociedade, por meio de sua missão e dos pressupostos que elucidam

as contribuições da instituição com a formação intelectual da sociedade (FRANCISCO et al.,

2012).

O espírito da instituição, a sua ideologia, o seu propósito, o verdadeiro motivo de sua

existência é traduzido na missão, visão e objetivos, os quais oferecem o direcionamento e o que

ela quer do futuro. A missão, para Tachizawa e Rezende (2000, p. 39), “é a razão de ser da

organização, a que ela serve, qual a justificativa de sua existência para a sociedade, ou seja,

qual a sua função social”. Com função orientadora e delimitadora da ação institucional, a missão

compromete crenças, expectativas, conceitos e recursos, deixando claro o alcance das operações

da organização e o que ela pode oferecer para aqueles que se envolvem em suas atividades

(TACHIZAWA; REZENDE, 2000). Ambas estão estritamente relacionadas às questões

estratégicas da instituição, principalmente no sentido de consolidar a sua identidade

institucional (FRANCISCO, 2012).

Para Vannucchi (2011, p. 35) “o melhor retrato de uma universidade comunitária deverá

ser contemplado no seu Projeto Político-Pedagógico e no Plano de Desenvolvimento

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Institucional”. Nos PDIs das universidades estudadas, a missão de cada uma delas fica explícita

nas primeiras páginas do documento. Assim se apresentam no quadro 6.

Quadro 6 - Missão das Universidades Comunitárias UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA

MISSÃO

UNI1

“Produzir, sistematizar e socializar conhecimento com qualidade e relevância para o desenvolvimento sustentável.” (PDI 2017-2021, p. 13).

UNI2

“Produzir e difundir conhecimentos que promovam a melhoria da qualidade de vida e formar cidadãos competentes, com postura crítica, ética e humanística, preparados para atuarem como agentes de transformação social.” (PDI 2017-2021, p. 15).

UNI3

“Produzir e socializar o conhecimento pelo ensino, pesquisa e extensão, estabelecendo parcerias solidárias com a comunidade, em busca de soluções coletivas para problemas locais e globais, visando à formação do cidadão crítico e ético.” (PDI 2017-2021, p. 38).

UNI4

“Promover, por meio do ensino, da pesquisa e extensão, o desenvolvimento regional para melhorar a qualidade do ambiente de vida.” (PDI 2018-2022, p. 13).

Fonte: Elaborado pela autora a partir dos PDIs das instituições

Observa-se a preocupação latente das instituições com a produção do conhecimento

voltada à formação de um cidadão com postura crítica frente à realidade, evidenciando em seus

propósitos e razão de ser, um valor instrumental, como conceitua McCowan (2016) ao definir

o porquê do ensino superior: o conhecimento deve servir para o indivíduo, para a sociedade e

para tornar o mundo mais igualitário. Ao afirmar que sua missão é Produzir e socializar o

conhecimento [...] visando à formação do cidadão crítico e ético, a UNI3 reitera as palavras da

UNI2 quando esta define como missão Produzir e difundir conhecimentos que promovam a

melhoria da qualidade de vida e formar cidadãos competentes, com postura crítica, ética e

humanística (UNI2). Essas instituições deixam evidente em seus discursos a sua preocupação

com a formação e qualificação de seus cidadãos, seja para o trabalho, para a política, para a

cultura. Essa postura também se apresenta no texto da UNI1 quando coloca que é sua missão

Produzir, sistematizar e socializar conhecimento com qualidade e relevância para o

desenvolvimento sustentável. Quando a UNI4 apresenta que sua missão é Promover, por meio

do ensino, da pesquisa e extensão, o desenvolvimento regional para melhorar a qualidade do

ambiente de vida, fica explícito que esta instituição produz conhecimento voltado à

preocupação com a qualidade de vida do cidadão, em seu sentido mais amplo. Dessa forma,

essas instituições preconizam a ideia de que a universidade “deve ser um lugar onde o ser

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humano possa cultivar a capacidade de olhar criticamente a sua atuação, para qualificá-lo a

realizar-se em todas as dimensões de sua existência” (FRANTZ, 2006, p. 124). Cabe, assim, à

universidade, interpretar o mundo e produzir conhecimento, formando cidadãos conscientes das

transformações por que passa a sociedade e ética e moralmente responsáveis.

Dias Sobrinho (2015, p. 585) afirma que “a universidade é uma instituição da sociedade

cuja missão essencial consiste em dar forma e conteúdo à construção da vida das pessoas e, ao

mesmo tempo, contribuir para solucionar os problemas do conjunto da população”. Vannucchi

(2011, p. 40), ao se referir à missão das universidades comunitárias, considera que os membros

participantes de uma instituição dessa natureza ali estão motivados por suas convicções e por

um ‘sentimento de comunidade’, “não são meros agentes acadêmicos trabalhando para a

comunidade, porque aprenderam a trabalhar com a comunidade e, mais ainda, como

comunidade” (VANNUCCHI, 2011, p. 40). Observa-se nas palavras de Vannucchi, a presença

de um processo de identificação com as crenças, a missão e os valores da instituição daqueles

que participam da organização, o que leva à formação da identidade. Este é um processo

construído ao longo de uma trajetória, o qual vai sendo incorporado pelo indivíduo por meio de

informações, gestos, linguagens, ritos e normas estabelecidas (SILVA; VERGARA, 2002).

Uma vez que a representação da organização se expressa por meio de comportamentos,

simbolismos e comunicação, a idealização e a fantasia também fazem parte desse processo e

podem explicar a tendência das pessoas se identificarem com as organizações quando estas

possibilitam a conexão com seus atributos e desejos pessoais (MACHADO; KOPITTKE,

2002). Afirma R4 a universidade é reconhecida pelas pessoas, pela comunidade regional, é

um motivo de orgulho. A gente escuta isso, vê escrito isso. A questão do orgulho que a região

tem de ter a UNI como a sua universidade, a sua instituição. Para Dutton, Dukerich e Harquail

(1994), o processo de construção da identidade organizacional é entendido como o

entrelaçamento psicológico das pessoas com a organização, reconhecendo, assim, na sua

identidade, a identidade organizacional. Ou seja, há uma mediação entre a identidade pessoal e

a identidade organizacional, mediante a identificação.

Voltado para o bem público e com orientações acentuadamente igualitárias, o

conhecimento gerado na instituição está direcionado para o interesse da comunidade, “[...] é

uma universidade da comunidade [...] e para comunidade” (VANNUCCHI, 2011, p. 36). A [...]

universidade comunitária é uma instituição que procura atender às demandas da comunidade,

da sociedade, ela também, ao mesmo tempo, precisa ser promotora do desenvolvimento, ela

tem que impulsionar [...] (R1, 2016). Isso exige o desenvolvimento efetivo das funções ensino,

pesquisa e engajamento público, e, este último, com alto grau de porosidade entre os atores e

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com grande fluxo de ideias (MCCOWAN, 2016). Afirma um entrevistado Universidade

comunitária é aquela que tem esse envolvimento, engajamento com as coisas das comunidades

em torno (R2, 2016). Outro reitera [...] é a universidade que tem a identidade vinculada com

essa região, que tem um compromisso com essa região, que é reconhecida pelas pessoas, pela

comunidade regional, [...] (R4, 2016). Outro gestor confirma A universidade deu base para

formação de recursos humanos [...]. Deu suporte para que as pessoas se desenvolvessem. [...]

Eles vêm porque temos um programa que é bom pra eles. Buscam a formação. Enfim, aqui

têm espaços de interação, convívio, aprendizado, um novo aprendizado (R3, 2016). Assim, o

valor instrumental dado ao conhecimento evidencia que a produção deste deve ser importante

tanto para o indivíduo, quanto para a coletividade, interferindo significativamente na realidade

social (MCCOWAN, 2016). Para Vannucchi (2011) é missão das comunitárias produzir

conhecimentos significativos para a sociedade, transformar os acadêmicos em cidadãos

conscientes e profissionais íntegros e intervir positivamente na sociedade.

A convicção de que o conhecimento gerado na instituição deve estar direcionado para

o bem público também se manifesta na missão dessas instituições. Isso pode ser observado em

suas missões como, produzir e socializar o conhecimento [...] em busca de soluções coletivas

para problemas locais e globais [...] (PDI-UNI3), ou nas palavras da UNI4 promover [...] o

desenvolvimento regional para melhorar a qualidade do ambiente de vida (PDI-UNI4). A

UNI2, por sua vez, proclama a missão de Produzir e difundir conhecimentos que promovam a

melhoria da qualidade de vida [...] para atuarem como agentes de transformação social. A

UNI1 propõe como missão Produzir, sistematizar e socializar conhecimento com [...]

relevância para o desenvolvimento sustentável. Expressões como “socializar conhecimento”,

“soluções coletivas”, “problemas locais e globais”, “desenvolvimento regional”, “agentes de

transformação social” deixam transparecer o intensão dessas universidades em se conectar com

a comunidade, resolvendo os problemas oriundos das transformações sociais. A par de sua

natureza comunitária e regional, a UNI1 busca, em sua atuação, assumir o conhecimento como

patrimônio social e a educação como bem público (PDI UNI1, p. 39). Para Vannucchi (2011,

p. 42) a vitalidade de uma universidade autenticamente comunitária “deve ser medida pelo nível

de fidelidade à sua missão. Sem isso, seu perfil identitário se esvai e rui por completo sua

autoconsciência institucional”.

Para que a Universidade possa cumprir com sua função social, “precisa sair de seus

muros e buscar a sua inserção na sociedade mais ampla, analisando, discutindo e equacionando

os diferentes problemas existentes, promovendo, assim, a contextualização da realidade”

(ARAUJO et al., 1998, p. 178). Reafirma um entrevistado por sermos uma instituição

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comunitária; essa é a nossa diferença; essa é a nossa missão; esse é o nosso compromisso;

esse é o nosso papel social; nossa grande relevância social (R4, 2016). Assim, para Bordigon

(2017), o conhecimento não se dá exclusivamente por fórmulas acadêmicas, mas é fruto das

relações sociais e passa a ser visto como “produção coletiva dos homens que surge de sua

atuação na vida real, por intermédio de suas relações com a natureza, com os outros e com ele

próprio” (ARAUJO et al., 1998, p. 179). Para além de serem essenciais ao indivíduo, os

conhecimentos são essenciais aos processos de condução da vida, à construção das sociedades.

Os saberes e as técnicas precisam ser pertinentes ao bem-estar coletivo e cumprem seu sentido

público na medida em que a sociedade e o Estado buscam efetivar os seus propósitos (DIAS

SOBRINHO, 2015).

Em trabalho intitulado Universidade comunitária: uma identidade em construção Bittar

(1999) já trazia nas vozes de seus entrevistados e em documentos analisados a visão

instrumental do conhecimento. À época já era manifestada a preocupação com a formação

integral do homem, na busca de seu bem-estar físico, social e espiritual, a valorização do

homem crítico e comprometido consigo mesmo e com os outros, o respeito à diversidade, a

percepção de que o homem é um agente de transformação, o interesse na solução de problemas

da comunidade, a organização participativa. Na visão dos entrevistados, “a universidade

comunitária deve ter como missão: a produção e a socialização do conhecimento; o atendimento

às demandas específicas da população que se encontra “distante da universidade” e a agilidade

com que ela atende essas demandas (BITTAR, 1999, p. 137). Assim, as universidades

comunitárias, apesar de quase duas décadas terem se passado, após estudo de Bittar, parecem

sustentar-se em fortes pilares no que tange ao valor instrumental dado ao conhecimento, este

voltado à construção do indivíduo, à coletividade e à justiça social.

Ao se falar em fortes pilares, e fazer referência aos PDIs das universidades comunitárias,

há de se mencionar a presença dos valores que estas instituições apontam do que seja importante

para o cumprimento de sua missão. São eles que norteiam as práticas e determinam a direção

na qual a instituição acredita ser certa e efetiva para seu desenvolvimento. A seguir, apresenta-

se o quadro 7 que ilustra princípios e valores das universidades locus desse estudo.

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Quadro 7 - Princípios e Valores das Universidades Comunitárias UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA

PRINCÍPIOS E VALORES

UNI1

Respeito à pessoa; Responsabilidade social; Qualificação institucional; Prevalência do interesse institucional; Inovação; Inserção local e global; Gestão democrática; Compromisso com o meio ambiente; Autonomia; Sustentabilidade. (PDI 2017-2021, p. 14).

UNI2

Respeito ao pluralismo de ideias; Compromisso social com o desenvolvimento regional e global; Produção e uso da tecnologia a serviço da humanização; Ética no relacionamento; Formação e profissionalização de vanguarda. (PDI 2017-2021, p. 15).

UNI3

Promoção da formação integral do homem; Qualidade educativa Universalidade de campos de conhecimento; Indissociabilidade entre ensino, pesquisa, extensão; Gestão democrática; Responsabilidade Social universitária; Inovação; Sustentabilidade acadêmico-financeira (PDI, 2017-2021, p. 33-47).

UNI4

Excelência na formação integral do cidadão; Universalidade de campos de conhecimento; Flexibilidade de métodos e concepções pedagógicas; Equilíbrio nas dimensões acadêmicas; Inserção na comunidade; Gestão democrática, participativa, transparente e descentralizada; Valorização e capacitação dos profissionais; Compromisso socioambiental; Respeito à biodiversidade, à diversidade étnico-ideológico-cultural e aos valores humanos (PDI 2018-2022, p. 15).

Fonte: Elaborado pela autora a partir dos PDIs da Universidades estudadas

Princípios e Valores também são marcadores da identidade, então, pode-se evidenciar,

nos documentos, traços que definem o(s) papel(eis) dessas instituições no ensino superior ao

perseguirem o “Respeito à pessoa”, a “Promoção da formação integral do homem”, a

“Excelência na formação integral do cidadão”, o “Respeito à biodiversidade, à diversidade

étnico-ideológico-cultural e aos valores humanos”, o “Respeito ao pluralismo de ideias”, a

“Ética no relacionamento”, a “Formação e profissionalização de vanguarda”, a

“Universalidade de campos de conhecimento” e a “Valorização e capacitação dos

profissionais”. Todas essas referências voltam-se à razão da existência dessa instituição

secular: o valor dado à produção do conhecimento. Numa visão holística e plurissignificativa

da formação do homem, os Princípios e Valores elencados, de certa forma, reiteram as palavras

de Chauí (2001, p. 187-188) quando esta afirma que

A universidade é uma instituição social que aspira à universalidade e que tem a sociedade como seu princípio e sua referência normativa e valorativa, a qual se percebe inserida na divisão social e política e busca definir uma universalidade (imaginada ou desejada) que lhe permita responder às contradições impostas por esta divisão.

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Esta citação conduz ao papel que a universidade deve exercer em termos de produção,

transmissão e armazenamento do conhecimento, ou seja, à sua função. Estes itens são

contemplados pela presença de expressão como “Indissociabilidade entre ensino, pesquisa,

extensão”, “Equilíbrio nas dimensões acadêmicas”, “Produção e uso da tecnologia a serviço

da humanização”, “Inovação”. Esses aspectos serão retomados no item 4.1.2 com maior

profundidade ao abordar a segunda dimensão: a função da universidade.

Ao se extrair das primeiras páginas de seus PDIs a missão, os Princípios e os Valores

defendidos por estas instituições, constata-se que a universidade é uma instituição ímpar, dada

a alta densidade de capacidade de administração, criação e disseminação de conhecimento

(ESCRIGAS; LOBERA, 2009, p. 7). Sua missão vincula-se a objetivos nobres, e o papel

desempenhado por essas instituições de ensino e pesquisa com compromisso social tende a

seguir o caminho oposto a uma organização de caráter essencialmente empresarial. Portanto,

como mencionam Bertolin e Dalmolin (2014, p. 141), “a missão de uma universidade é muito

mais ampla do que o objeto econômico, abrange notadamente as dimensões sociais, culturais e

ambientais que, em muitos momentos, conflitam com a lógica do mercado”.

A tríade Missão-Visão-Valores nasce nas organizações a partir de observações do

ambiente organizacional, bem como de reuniões de caráter estratégico que delimitam o ponto

de chegada e os recursos que serão utilizados para tal finalidade. Essa tríade compõe a

identidade de uma organização social. Se a missão se refere ao que a organização faz e a sua

razão de existência, a visão, assemelhando-se a uma meta, em sentido de maior alcance, evoca

o lugar aonde ela pretende chegar. Entretanto, metas são para ser cumpridas em prazos

determinados, as visões são para serem perseguidas com persistência por todas as pessoas que

corporificam a organização (SCORSOLINI-COMIN, 2012). No contexto organizacional, a

visão apresenta-se na parte do Planejamento Estratégico em que define o que espera ser/realizar,

orientando os colaboradores para o futuro, porém não se distanciando da realidade. Visão

sempre é um elemento de futuro, algo ainda a ser realizado. Em seus PDIs, as universidades

comunitárias da amostra também explicitam sua Visão, quais sejam:

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Quadro 8 - Visão das Universidades Comunitárias Estudadas UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA

VISÃO

UNI1

Ser indispensável para o desenvolvimento sustentado no conhecimento. (PDI 2017-2021, p. 13).

UNI2

Consolidar-se como universidade comunitária regional, pública não estatal, de excelência, por meio do reconhecimento de sua qualidade, valores acadêmicos, seu compromisso social e suas ações inovadoras e sustentáveis. (PDI 2017-2021, p.68).

UNI3

Ser reconhecida como Universidade de excelência na atividade de ensino, no desenvolvimento e divulgação de pesquisas e na gestão criativa e empreendedora de projetos sociais. (PDI 2017-2021, p. 38).

UNI4

Ser reconhecida como uma Universidade Comunitária, de excelência na formação profissional e ética do cidadão, na produção de conhecimentos científicos e tecnológicos, com compromisso socioambiental. (PDI 2018-2022, p. 14).

Fonte: Elaborado pela autora a partir dos PDIs da Universidades estudadas

A leitura atenta do texto que expressa a Visão do que essas universidades desejam ser

ou fazer, observa-se uma grande recorrência ao uso de expressões como “Consolidar-se/ ser

reconhecida como “Universidade Comunitária”, “Universidade Comunitária regional”,

“pública não estatal”. “Esses termos reiteram pontos centrais da gênese identitária dessas

instituições: ser comunitária, regional, pública não estatal. Ou seja, trata-se de iniciativas da

sociedade civil, sem fins lucrativos, cuja lógica se apoia na vida da comunidade e que

“nasceram como expressões de vozes e vontades que querem se fazer ouvir e participar da

construção de um espaço de educação, socialmente mais amplo e democrático” (FRANTZ,

2018, p. 2).

Repetidas vezes também aparece a expressão “excelência”: Esse termo está explícito

na Visão da UNI2, UNI3 e UNI4. Mas excelência em quê? “na atividade de ensino”, “no

desenvolvimento e divulgação de pesquisas e na gestão criativa e empreendedora de projetos

sociais”, “na produção de conhecimentos científicos e tecnológicos”, “na formação

profissional e ética do cidadão”. Termos como “ensino”, “pesquisa”, “projetos sociais”

conduzem ao tripé ensino, pesquisa e extensão, que, neste caso, não se restringe apenas a uma

questão conceitual ou legislativa, mas, substancialmente, epistemológica, paradigmática e

político-pedagógica (CESAR, 2013). Ou seja, as visões definidas reiteram o papel fundamental

da universidade na produção, armazenamento e transmissão do conhecimento e seu

envolvimento com a sociedade. Mas o que é ser reconhecida como “Universidade Comunitária

de excelência”? A indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão é um dos parâmetros

tomado como referência do padrão de qualidade acadêmica nessas instituições. Ao ser

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questionado qual ou quais motivos levariam um estudante procurar a UNI1, R1 respondeu

É evidentemente pela qualidade da instituição. [...] Qualidade dos cursos, estudar em um universo universitário que tem possibilidades de interação por muitas áreas. Há possibilidade de fazer pesquisa, se tornar um pesquisador e isso é um diferencial, [...] do universo acadêmico mais amplo. Acho que são ainda diferenciais que nós possuímos, todo o ambiente e estrutura que nós temos, estrutura e laboratórios. Todo o convívio, todos os espaços que o aluno encontra aqui (R1, 2016).

O respondente R4 comenta: Eles escolhem a nossa universidade por ser uma

universidade [...] pela qualidade das nossas atividades, dos nossos cursos de graduação, pela

história de qualidade que nós temos na instituição. Nós temos um nome, uma marca bastante

forte aqui nessa região. Em suas vozes, os gestores reconhecem o potencial de suas instituições

e argumentam em prol da qualidade oferecida.

Ainda em seus PDIs, a presença da expressão “excelência” é marcante. Ao se referir às

suas Linhas estratégicas, Objetivos e Metas, a UNI2 declara

A linha estratégica Excelência acadêmica e pedagogia universitária se consubstancia, especialmente, na observância da missão institucional e na atenção aos valores acadêmicos históricos. Uma instituição comunitária, para além da coerência com a ideia de universidade, que possui compromisso e responsabilidade social, mas que também é engajada no desafio de desenvolvimento socioeconômico e cultural de sua região de abrangência, deve priorizar, permanentemente, a busca pela qualidade nos processos de produção e transmissão do conhecimento (PDI 2017-2021, p. 64).

Interessante observar que a busca pela excelência na qualidade nos processos de

produção e transmissão do conhecimento nunca perde de vista o propósito central da instituição,

ou seja, sua missão e suas origens. O alinhamento e uniformização na forma de registrar os

objetivos da instituição, suas metas e atitudes são imprescindíveis quando se fala em qualidade.

Com o intuito de atingir a “excelência” naquilo que oferta, muitos objetivos e metas são

propostos nos PDIs, expressos por verbos como qualificar, consolidar, fortalecer, ampliar,

melhorar, elevar, investir, aprimorar, promover, desenvolver, modernizar, fortalecer, cujo

campo semântico fortalece o caminho da qualidade. Leite (2005, p. 9) pergunta: Quem decide

qual é o marco da excelência ou da qualidade de uma universidade? A qualidade da

universidade poderia ser compreendida no seu marco institucional, quando esta é o que diz ser

e faz (oferece) o que promete; poderia ser compreendida na visão dos estudantes e seus pais,

quando obtêm o que dela esperam para sua formação; e poderia ser compreendida na visão da

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sociedade, quando esta encontra ressonância na instituição. Para a autora, a qualidade não é

algo abstrato: o padrão de qualidade pode atingir o nível de excelência definido e desejado por

ela própria e sua comunidade. A qualidade “Não é atribuída por um Ranking, por uma nota ou

conceito, seja ela proveniente da avaliação que for” (LEITE, 2005, p. 9). Eis que em seu

depoimento R4 declara

Se vêm agora avaliações externas e nos identificam e nos mostram que nós estamos tendo esses indicadores, inclusive em âmbito nacional, nós não fizemos para dar respostas pra eles. Nós fizemos para dar resposta à comunidade. É à comunidade que devemos o nosso respeito, nossa admiração e nosso trabalho, nosso envolvimento. Então, isso hoje está muito claro para nós (R4, 2016).

O gestor é enfático ao demonstrar a quem se dirige o trabalho da universidade. Acredita

na qualidade dos serviços que presta à comunidade e entende que os indicadores avaliativos

institucionalizados apenas fazem parte do processo das políticas públicas. O que importa

mesmo é o “respeito”, a “admiração”, o “envolvimento” com a comunidade, concretizados pelo

trabalho que realiza com dedicação e pela qualidade do que oferece à comunidade. Para Leite

(2005, p. 9) a qualidade de uma instituição “pode, e deve, ser definida por aqueles sujeitos que

a fazem ser do jeito que ela é, que lhe dão uma cara, que podem definir seu perfil e o seu papel.”

Essa declaração conduz a refletir sobre identidade. Dutton e Dukerich (1991, apud

NOGUEIRA, 2010, p. 131) afirmam que o conceito de identidade organizacional (o que se crê

ser central, distintivo e duradouro) e o conceito de imagem externa construída (o que se crê que

seja a percepção dos não integrantes a respeito da organização) “influenciam a conexão

cognitiva que os indivíduos mantêm com ela e os tipos de comportamento que adotam.” Ou

seja, segundo esses autores “quando os autoconceitos contêm os mesmos atributos da

identidade organizacional ocorre a conexão cognitiva denominada identificação”. Nesse

sentido, R4 identifica-se com os atributos que a universidade possui e àquilo que ela se propõe

a oferecer, isto é, “seu autoconceito possui muitas das mesmas características que crê definam

a organização como um grupo social” (DUTTON; DUKERICH, 1991, apud NOGUEIRA,

2010, p. 131). Assim, uma vez tendo identificação positiva com os atributos da universidade,

R4 tende a ressaltá-los em atitudes e sentimentos pessoais.

Há de se fazer menção aos verbos utilizados para apresentar a Visão “Ser reconhecida”,

“Consolidar-se”, “Ser indispensável”, eles indiciam “o quanto ainda se pode e se deve crescer

ou, em outras palavras, o quanto ainda se deve trabalhar para atingir aquilo que se pretende,

objetivamente ou não” (SCORSOLINI-COMIN, 2012, p. 330). Como afirmado anteriormente,

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a visão se diferencia de uma meta na medida em que não se delimita em termos temporais.

Trata-se de uma intenção que deve ser fortemente incorporada ao trabalho e perseguida por

todos os membros da organização.

Observa-se que alguns Princípios e Valores vinculam-se à interação, traço que é

requisitado pelas instituições comunitárias como lhes sendo o grande diferencial identitário em

sua gênese e atuação. Termos como “Compromisso social com o desenvolvimento regional e

global”, “Inserção local e global”, “Responsabilidade Social universitária”, “Inserção na

comunidade” e “Compromisso socioambiental” “Autonomia”, “Sustentabilidade acadêmico-

financeira”, “Gestão democrática participativa, transparente e descentralizada” reafirmam a

missão dessas instituições, a qual só parece ter legitimidade “na medida em que envolve um

verdadeiro compromisso com as reais necessidades e aspirações da população docente, discente

e comunitária a quem deve servir em múltiplas instâncias” (SANTOS, 2016, p. 212). Afirma

um dos gestores: Ela (a universidade comunitária) tem que estar voltada para o mundo. Ela

tem que ter um processo de interação global no sentido internacional. Conhecimento ele se

produz em todos os cantos do mundo, mas ela tem que trazer para onde ela está inserida de

fato, para que ela possa contribuir com a região (R1, 2016). Ao mesmo tempo em que se atrela

aos interesses da Nação também atende às necessidades regionais, as quais são bastante

complexas e importantes para a geração de novos saberes, “úteis para o progresso social,

político, econômico, ético, moral e cultural de todos os sujeitos sociais” (SANTOS, 2016, p.

212).

A análise da Missão, da Visão e dos Valores das universidades comunitárias em questão,

permitiu identificar semelhanças no modo de construir esses aspectos, até uma certa

uniformização do dizer, com exceção da UNI1 que apresenta uma forma de demonstrar a Visão

mais concisa, qual seja “Ser indispensável para o desenvolvimento sustentado no

conhecimento.” De modo bastante abrangente é colocado o suporte a ser perseguido pela

instituição “desenvolvimento sustentado no conhecimento”, há que se inferir daí o papel

intrínseco à universidade, ou seja, sua atuação imprescindível nas mudanças decorrentes do

conhecimento na sociedade. Essa interpretação vai ao encontro da Visão da UNI2, UNI3 e

UNI4.

Ao buscar definir sua Missão, sua Visão e seus Valores, essas instituições deixam

transparecer alguns elementos constituintes de sua identidade organizacional. Sua descrição e

entrelaçamento servem de parâmetros os quais indicam as áreas, as atividades, os programas, a

região, os públicos-alvo, os parceiros nos quais a instituição deve concentrar-se, o que se

configura um grande desafio para essas universidades, considerando os processos de

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mercantilização e desagregação por que passa a educação mundial (MCCOWAN, 2016; 2018).

Mas, antes de mais nada, cabe alertar que esses conceitos não são impessoais ou simplesmente

técnicos (FERREIRA, 2016; SCORSOLINI-COMIN, 2012; FLORES, 2005), eles estão

conectados às pessoas que tratam com eles, refletindo suas aspirações, expectativas,

motivações, vontades e caminho de vida de cada uma delas.

Mas......

Apesar de estarem conscientes de sua razão de existir, não estariam as universidades

comunitárias sofrendo uma erosão em sua missão em virtude das mudanças por que passa o

mundo em suas bases econômico-sociais? Não estaria o conhecimento sendo produzido mais

pelo critério de valor utilitário que pelo significado humano formativo?

Dias Sobrinho (2005, p. 169) ao fazer algumas reflexões sobre o conhecimento, afirma

que “grande parte do controle social é feita mediante o controle do conhecimento, em suas

dimensões de produção, distribuição e consumo.” Quem controla o conhecimento? Quem

produz e distribui? Quem o consome? Num mundo cada vez mais concorrencial, o

conhecimento e a capacidade de aprender e de aplicar passaram a ser moeda de troca e

potencializaram a competitividade global. Assim, a educação superior adquiriu enorme

importância como produtora de fontes de riqueza, geradora e disseminadora de conhecimentos,

principalmente, como insumo econômico de relevância estratégica para alimentar a

competitividade dos indivíduos e das empresas. Como reflexo, a educação superior teria

diminuído a sua autonomia de pensamento, capacidade crítica e de compreensão global da

história humana, abdicando, desse modo, de sua função de intermediação entre o indivíduo, a

sociedade civil e o Estado (DIAS SOBRINHO, 2005). Para Dias Sobrinho (2005, p. 167) “as

universidades de hoje perderam muito da utopia social dos anos de 1960 e de 1970, que lhes

atribuía um papel central na democratização das sociedades e na diminuição das

desigualdades.” Será que estaria aí um dos grandes dilemas das universidades comunitárias?

Para Frantz (2006) a universidade deve incorporar todas as dimensões da vida, deve ser

um lugar onde o homem possa cultivar a memória da humanidade, bem como a capacidade de

olhar criticamente a sua atuação. Para o autor, “cabe à universidade interpretar o mundo, o seu

movimento; cabe a ela produzir conhecimento a respeito das consequências desse movimento”

(FRANTZ, 2006, p. 124). Entendidas como construções históricas e políticas, as universidades

incorporam em seu conceito a complexidade das práticas e das ideias da sociedade, extraídas

da dinâmica da realidade social que, por si só, são contraditórias.

Sendo, portanto, complexa em seus sentidos e significados históricos, a universidade

não pode se submeter aos interesses do mercado, como se fosse um negócio, deixando-se

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conduzir por visões simplistas e utilitaristas ou servindo como mero instrumento de políticas

de governos. Em favor da superação dessas contradições, a universidade, pelas funções que

exerce por meio do ensino, da pesquisa e da extensão é um campo de luta contra o desequilíbrio

social que ameaça a humanidade (FRANTZ, 2006). Reiterando esse conceito, um dos gestores

comenta

É, temos aqui na região instituições com ações em bolsa de valores, a base está nos Estados Unidos. Então, o resultado disso vai para um fundo de investimento. Quem investe nas ações quer resultados. Depois são vendidas e assim por diante. O resultado é o lucro. O papel nosso é totalmente diferente em relação a isso, por isso comunitária. O termo comunitário é que o resultado fica aqui, daquilo que se propõe, daquilo que se gera, daquilo que se vislumbra, daquilo que se busca lá fora, mas se traz para a comunidade (R1, 2016).

Observa-se a preocupação por parte do gestor em permanecer fiel a um dos propósitos

da instituição. Para R1 o papel da universidade comunitária vai além de colocar ações na bolsa

de valores e ter como resultado o lucro. Seu compromisso é com a comunidade. Reafirma o

significado do termo que a instituição carrega em seu nome “comunitária”. Ao tecer

considerações sobre as noções de público, comunitário e privado, Schmidt declara

Comunitário deriva do latim communis (comum) e communitas (comunidade. Comunidade designa a forma de vida social caracterizada por relações personalizadas, de coesão social, de compromisso moral e de continuidade no tempo, distinta das formas marcadas pela impessoalidade, anonimato e contratualidade. [...] Comunitário diz respeito ao que é comum a um coletivo ou a um público; é o terreno do bem comum (SCHMIDT, 2017, p. 77).

Ao descrever os traços identitários dessas instituições, Vannucchi (2011, p. 50)

complementa que a comunitária “não possui finalidade econômica, não busca a remuneração

do capital investido, não distribui dividendos, não tem outro proprietário senão a própria

comunidade [...]”. Este extrato, retirado da fala de R4, é comprovação disso:

Por nossa característica comunitária, e só uma comunitária poderia fazer isso: nós, ao invés de fechar os cursos de licenciatura, negociamos com todos os cursos da universidade. [...] Nossos cursos de licenciatura estavam com um pingo de alunos pagantes. Nós argumentamos que era fundamental manter as licenciaturas. Elas foram responsáveis pela criação, aqui, da instituição mesmo, pela formação dos professores. É preciso garantir boa formação para que os alunos depois também tenham um bom nível na universidade. Porque tudo isso tem uma relação, não tem como separar essa conexão (R4, 2016).

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Parecendo compartilhar de dilema semelhante, comenta R1

Nós temos a compreensão do qual é o papel da universidade, do que ela de fato faz, quando, por exemplo, mantém as licenciaturas, em nome de uma causa que muitas vezes não é percebida, porque na lógica empresarial é assim “Ah, tá dando prejuízo, então fecha. Pronto!”. Se fôssemos buscar só resultados, nós fecharíamos metade dos cursos. Mas, aí, vai fazer o quê com o resultado? Investir neles próprios? Os resultados estão a serviço de uma causa maior, que é a formação de professores, formar recursos para todas as áreas e não só aquelas que dão resultado. Então, essa percepção do papel da universidade é uma das maiores dificuldades que nós enfrentamos (R1, 2016).

Mais do que ilustrativos, os depoimentos de R4 e R1 trazem a essência do que é ser

comunitário, denominação que as universidades em estudo carregam como marca de sua

identidade. Seus gestores entendem que os conhecimentos produzidos nas humanidades, apesar

de não ter valor imediato de mercado, merecem atenção e são de interesse público, daí a decisão

de assumir a permanência dos cursos de licenciatura, mesmo sendo estes deficitários, dividindo

o ônus com toda a instituição. Essa forma de proceder se distancia do entendimento de que

somente os conhecimentos “úteis” e aplicáveis, conectados à indústria e ao comércio, são

motores de desenvolvimento e, portanto, merecem prestígio e financiamento (ALTBACH,

2008). A compreensão de que a pesquisa em humanidades é importante propulsora na formação

de profissionais qualificados e cidadãos responsáveis impacta na construção do conhecimento

como bem comum e coletivo. Assim é, que se materializa o conceito de comunitário.

Para Chauí (2003a), a universidade é uma instituição social e como tal convive com a

presença de opiniões, atitudes e projetos conflitantes que exprimem as contradições da

sociedade. Como instituição social aspira à universalidade, ou seja, tem a sociedade como seu

princípio e sua referência normativa e valorativa. A relação entre a universidade e a sociedade

é que explica o seu surgimento. A instituição se percebe inserida na vida social e política e

busca definir uma universalidade que lhe permita responder às contradições, impostas pela

realidade. Há o reconhecimento público de sua legitimidade e de suas atribuições o que lhe

confere autonomia preconizada por normas e valores próprios.

Nas últimas décadas, contudo, a universidade vem remodelando sua identidade,

adaptando-se às transformações do mundo, deixando de ser, nesse processo, uma instituição

social para ser uma organização social. A reforma do Estado realizada nos últimos governos,

designando a educação como um setor de serviços não exclusivos do Estado, fez com que ela

deixasse de ser concebida como um direito e passasse a ser considerada um serviço, deixasse

de ser um serviço público e passasse a ser um serviço que pode ser privado ou privatizado. Uma

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organização social define-se por uma prática social determinada por conjunto de meios

administrativos para obtenção de um objetivo particular, sendo regida pelas ideias de gestão,

planejamento, previsão, controle e êxito. Uma organização social não discute ou questiona sua

existência, seu lugar no interior das lutas de classe. O que para a instituição social universitária

é fundamental, para a organização não passa de um dado de fato. “Seu alvo não é responder às

contradições, mas vencer a competição com seus supostos iguais” (CHAUÍ, 2003a, p. 6). Diante

das palavras de Chauí, há de se perguntar: estariam as universidades comunitárias sofrendo os

impactos das transformações mundiais a ponto de “perderem” sua identidade como instituições

sociais voltadas ao bem comum? Estariam as universidades comunitárias sendo pressionadas a

estabelecer uma mera conexão linear entre conhecimento e progresso, descartando seus

objetivos humanísticos e culturais? Longe de permanecerem imunes às mudanças da realidade,

as universidades comunitárias vêm enfrentando, sim, algumas tensões, o que provoca certa

instabilidade e incertezas quanto à sua razão de existir.

Apesar de tudo, há de se destacar o crescimento que a universidade brasileira teve ao

longo de sua existência, principalmente, nos últimos cinquenta anos. Os dados são

significativos em relação ao número de cursos de graduação, da qualificação docente em nível

de mestrado e doutorado, aos cursos de pós-graduação, aos grupos de pesquisa, a expansão para

o interior do estado. Contudo, a avalanche neoliberal na economia, na reforma do Estado e na

concepção do conhecimento e do ensino superior como bem privado, quase-mercadoria

passaram a condicionar uma nova configuração de universidade em nosso país. O descontrolado

processo de expansão da universidade privada, em especial a com fins lucrativos; o aumento da

diferenciação institucional e a adoção de modelos gerenciais ou empresariais de administração

universitária e a retirada do Estado da manutenção do setor educacional, são apenas algumas

decorrências das profundas mudanças na economia pós-fordista e na organização do Estado

pós-moderno. (CHAUÍ, 2001; DOURADO, 2002; CUNHA, 2004; SGUISSARDI, 2006).

Tal política vem negligenciando o papel social da educação superior como espaço de

investigação, discussão e difusão de projetos que têm como norte a garantia dos direitos sociais,

resultando num intenso processo de massificação e privatização da educação superior no Brasil.

Orquestrados pela redução significativa de insumos financeiros destinados à educação,

instrumentos legais como a LDB e o PNE estimulam um sistema nacional de avaliação que

conduz as IES

à condição de instituições operacionais por meio de testes estandardizados que metamorfoseiam as instituições, alteram a lógica do trabalho acadêmico,

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redirecionam a estrutura e os projetos acadêmicos, balizados por políticas de gerenciamento cartorial, ao sabor das exigências do mercado, naturalizando, desse modo, a privatização do ensino superior (DOURADO, 2002, p. 246).

A educação, assim, passa a ser vista pelos setores hegemônicos da economia e da

política como um poderoso provedor das competências e habilidades exigidas pela demanda de

produção e de trabalho requeridas pelo mercado e, do valor social, migra-se para o valor

comercial. O conhecimento vai perdendo paulatinamente “sua histórica densidade de

significação humana associada à liberdade, à emancipação pessoal e ao bem coletivo, e mais e

mais é subsumido pela ideologia do interesse individual e do lucro ilimitado” (DIAS

SOBRINHO, 2015, p. 589). A universidade fragiliza a sua função social ao deixar de ser um

“lugar institucional privilegiado de elaboração de uma cultura comum que integra nela mesma

o debate e a reflexão, e sem a qual a ideia mesma de um espaço público político ficaria vã”

(FREITAG, 1995, p. 33).

Nesse cenário, organismos internacionais passaram a atuar como importantes

interlocutores multilaterais nas políticas educacionais no Brasil. A partir da década de 1980, o

Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), as agências da Organização das Nações

Unidas (ONU) e, especialmente, o Banco Mundial revigoraram a sua atuação no país e

difundiram, em seus documentos, novas orientações para a articulação entre educação e

produção do conhecimento, por meio do binômio privatização e mercantilização da educação.

Entre as ações podem ser citadas a redução do papel do Estado, com ênfase no ensino privado;

expansão, descentralização, diversificação e flexibilização do Sistema de Educação Superior

(SES), avaliação da ES ancorada em conceitos de qualidade isomórficos e orientados para a

tomada de decisão e o controle de qualidade (MOROSINI; FRANCO, 2006; CUNHA, 2007).

Nos anos 1990, por meio de vários processos, mas, principalmente da reforma do

Estado, a gestão de Fernando Henrique Cardoso reorienta as políticas públicas educacionais,

promovendo alterações substanciais nos padrões de intervenção estatal, as quais alinham-se em

total consonância aos organismos multilaterais. Tais ações expressam-se no processo que

resultou na aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96)

(MINTO, 2005; DOURADO, 2002). A nova Lei reconhecia a possibilidade de lucro para as

instituições privadas de ensino, principalmente, particulares, no sentido estrito, por oposição às

instituições sem fins lucrativos (comunitárias, confessionais e filantrópicas (CUNHA, 2007).

Na composição desse cenário em que se considera a universidade uma instituição cuja

responsabilidade social não pode ser negligenciada e onde a geração de conhecimento deve ser

compartilhada a fim de promover o bem público, encontra-se, na contramão, a promoção de

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políticas públicas nacional e internacional para o ensino superior que descaracterizam as

funções primárias da universidade, ou seja, o ensino, a pesquisa e a extensão. Descrever, mesmo

que de modo sintético, alguns ingredientes que compõem o cenário de incertezas no qual se

encontram as universidades, especialmente, as universidades comunitárias, pode, de algum

modo, ajudar a compreender um pouco os dilemas por que passam as universidades em geral

e, em particular as universidades comunitárias.

Para Frantz (2006, p. 120) “a universidade deve ser um campo de luta, pela função do

ensino, da pesquisa e da extensão, em favor da superação dessas contradições”. Ao reconhecer

que as novas estruturas de produção e trabalho se transformam e carregam consigo inseguranças

e necessidades de atualização permanente, as universidades comunitárias sentem-se

pressionadas a reinventar sua forma de administrar complexas dimensões culturais, políticas,

sociais, de forma a não perder de vista suas funções primordiais, não reduzindo sua existência

a simples operação de funções técnicas. Porém, ao considerar os ingredientes que compõem a

sua anatomia, quais sejam valor, função e interação, observa-se que essas instituições vêm

sendo influenciadas por dois grandes processos: a comoditização (Commodification) e a

desagregação (Unbundling) (MCCOWAN, 2016).

A comoditização diz respeito ao processo de conversão de serviços ou produtos em

insumos lucrativos. Neste caso, o conhecimento, que antes era livremente transmitido e

adquirido por meio de atividades de ensino, pesquisa e extensão, passa a ser organizado,

embalado e disponibilizado com o objetivo de gerar renda e lucratividade (McCowan, 2016).

A desagregação corresponderia ao processo pelo qual “os produtos anteriormente vendidos em

conjunto são separados em suas partes constituintes” (McCowan, 2018, p. 464), ou seja, é o

processo de separação das funções da universidade em unidades individuais ou conjunto de

produtos vendidos como pacotes. Para o autor, esses dois processos são resultado do surgimento

de atividades empresariais em instituições de ensino superior, bem como a busca por redução

de custos e maximização dos lucros (MCCOWAN, 2016).

Assim, parece que os termos comoditização e mercantilização podem ser tomados como

sinônimos, uma vez que

Por mercantilização do ensino superior designa-se ao processo em que o desenvolvimento dos fins e dos meios do ensino superior, tanto no âmbito estatal como no privado, sofre uma reorientação de acordo com os princípios e a lógica do mercado e sob a qual o ensino superior progressivamente perde o estatuto de bem público e assume a condição de serviço privado e comercial (LANGA, 2012, p. 28).

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Ao perder o estatuto de bem público e assumir a condição de serviço comercial, a

mercantilização estabelece uma relação com o mercado em que prevalece o princípio da

competição. Neste sentido, o sistema de ensino superior é reestruturado em função da lógica da

competição nesse mercado (LANGA, 2012; MAMDANI, 2007; HARBOUR, 2006) e o valor

(um dos ingredientes que definem a anatomia das universidades) assume características

instrumentais, mas, diferentemente daquele em que o conhecimento produzido e transmitido se

volta à construção do indivíduo, à coletividade e à justiça social, este passa a atender à demanda

de um cliente externo, o qual esperará receber os benefícios decorrentes de seus investimentos,

direcionando suas compras aos itens que lhe trouxer maior dividendos. Numa ilusão de ótica,

parecerá que as atividades desenvolvidas na universidade e o mercado estão sintonizados na

busca de soluções para as necessidades da sociedade, porém, a oferta não está orquestrada pela

necessidade, mas pela demanda, esta, por sua vez, depende do poder de compra. Assim,

Passamos, portanto, de uma noção de valor instrumental para uma de valor de troca. O conhecimento nessa concepção é valorizado não pelos benefícios que pode trazer diretamente, mas pelo valor que pode obter no mercado e que pode ser usado para comprar outros bens desejados. A universidade, por sua vez, é incentivada a criar e disseminar não os tipos de conhecimento que trarão maior benefício para a sociedade, mas aqueles que trarão a maior receita em relação ao custo9 (MCCOWAN, 2016, p. 515, tradução nossa).

Considerando-se que a informação e o conhecimento são, na atualidade, os mais

importantes insumos do paradigma produtivo, alguns dados merecem relevância. No cenário

mundial, os países agrupados na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento

Econômico (OCDE) respondem por 60% da produção mundial, 80% dos recursos econômicos

e 95% das tecnologias e produção científica. Esses números demonstram que, apenas 150

milhões, dos seis bilhões de habitantes participam de atividades científicas, concentrando-se

90% nos sete países mais industrializados (DIAS SOBRINHO, 2005). O que isso significa? “A

divisão internacional entre os que produzem e controlam o uso dos conhecimentos e, na outra

ponta, aqueles que não têm meios para produzir conhecimentos e muito menos podem receber

seus benefícios” (DIAS SOBRINHO, 2005, p. 165). Isso implica dizer que aqueles que têm o

poder do conhecimento como capital de base, também têm o poder de criar leis que garantam a

proteção de sua posse e seus benefícios. Indo além, “têm também a competência de definir

9 We move, therefore, from a notion of instrumental value to one of exchange value. Knowledge in this conception is valued not for the benefits that it can bring directly, but for the value that it can obtain on the market, and which can be used to purchase other desired goods. The university in turn is incentivised to create and disseminate not the kinds of knowledge that will bring the greatest benefit to society, but those which will bring the greatest revenue in relation to cost (MCCOWAN, 2016, p. 515).

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quais são os conhecimentos que têm valor – especialmente no sentido de valor de mercado”

(DIAS SOBRINHO, 2005, p. 165).

No Brasil, como já foi mencionado, foi a partir da década de 1990 que o sistema de

ensino superior começou a vivenciar uma grande transformação no que tange às opções para os

cidadãos clientes-consumidores no campo acadêmico-universitário O cenário das universidades

viu-se consideravelmente alterado com a entrada das universidades particulares e/ou mercantis

geridas como empresas educacionais, com explícitos fins lucrativos, as quais ofereciam

produtos e serviços de acordo com a demanda do mercado (CALDERÓN, 2000).

Durham (2003), em estudo realizado sobre O ensino Superior no Brasil: público e

privado apresenta dados relativos ao crescimento de instituições de ensino superior públicas e

privadas no Brasil entre os anos de 1970 e 2000. As instituições privadas de ensino superior

haviam se tornado, de fato, um grande negócio. A lucratividade dos empreendimentos atraiu

um novo conjunto de empresários, sem compromissos anteriores com a educação. Há um

crescimento vertiginoso de instituições que passam a oferecer ensino superior, em 1970 as

instituições privadas somavam 478; já em 2000, passaram a somar 1004. O setor privado passou

a ser governado pelo mercado. A expansão deste segmento do setor privado chamado de

empresarial se orientou para a satisfação imediata da demanda social, ou seja, na obtenção do

diploma. Esta tendência é reforçada na sociedade brasileira, que associa diploma de ensino

superior ao acesso a uma profissão regulamentada e assegura a seus portadores certos

privilégios no mercado de trabalho (DURHAM, 2003). Neste contexto, a preocupação reside

na qualidade da formação oferecida por esses estabelecimentos que têm como motivação o

lucro, tornando a educação e, consequentemente, o conhecimento como mera mercadoria de

troca.

Dias Sobrinho (2013), alerta para uma diferença fundamental entre educação-bem

público e educação-mercadoria. Por educação-bem público entende-se a busca pelo

aprofundamento do bem comum, considerando valores como equidade, igualdade democrática

e social; já, por educação-mercadoria entende-se aquela que prioriza o desenvolvimento de uma

sociedade competitiva e individualista, com seu foco no lucro do empresário. A busca por

resultado econômico também é próprio das empresas estatais e das entidades não

governamentais, assim, o que distingue o setor privado não é a busca pelo lucro, mas a

“apropriação individual ou particular do lucro, ou seja, o usufruto do resultado produzido pela

empresa por parte do proprietário”. Isso significa dizer que o crescimento da educação no setor

privado no país permitiu a apropriação do lucro para fins pessoais, e que o dono da empresa

desfrutasse de seus ganhos da forma que preferisse, até arriscando seu capital em novos

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empreendimentos e bolsas de valores (SCHMIDT, 2017). Essa atitude se afasta

consideravelmente de ações cujo fortalecimento é essencial para a democracia. Rumo contrário

tomam as universidades comunitárias, as quais visam a prestação de educação de qualidade a

todos e, cujos recursos obtidos destinam-se à manutenção e qualificação dos serviços prestados.

Quanto à gestão dos recursos econômicos, seguem-se as seguintes premissas:

(i) em existindo superávit, todo ele é reinvestido na própria instituição; (ii) não há nenhuma distribuição de qualquer parcela do seu patrimônio ou de suas rendas, ou seja, não há qualquer apropriação privada de excedentes gerados; (iii) os dirigentes não recebem qualquer recompensa ou bonificação econômica por resultados positivos alcançados (SCHMIDT, 2017, p. 49).

Nesses aspectos, essas instituições se assemelham às públicas e não às instituições

privadas. Há um tratamento isomórfico a todos os cidadãos na prestação de serviços. Não há

privilégios. Todos os membros da comunidade acadêmica têm iguais direitos.

Há décadas, a defesa da educação superior como bem público vem sofrendo severos

golpes. Várias estratégias de reforma da educação superior com o objetivo principal de diminuir

a responsabilidade e a participação do financiamento público e alimentar a expansão das

empresas privadas mercantilistas foram formuladas e colocadas em prática com apoio

ideológico e financeiro de organismos multilaterais. Argumentos como: universidades são

inoperantes, corporativistas, onerosas, não atendem às necessidades da indústria e da sociedade

ecoam nas vozes dos defensores da privatização e da mercantilização, com a anuência dos

governos.

Ao se referir às universidades comunitárias Bertolin e Dalmolin (2014, p. 152)

comentam que “o contexto de transformações e mercantilização demanda às universidades

comunitárias mudanças no sentido do desenvolvimento de uma boa governança, mais efetiva e

ágil, que viabilize a qualidade acadêmica sem comprometer a sustentabilidade econômica.” No

entanto, como alertam os autores, essas mudanças exigem profunda reflexão sobre as

características que regem a lógica do mercado na educação superior, principalmente, no que

tange às universidades comunitárias, cuja concepção de educação como bem público faz parte

de sua história e de seus valores acadêmicos, o que a coloca na contramão da lógica do mercado

(BERTOLIN; DALMOLIN, 2014). Os desafios que os sistemas educacionais enfrentam devem

buscar soluções inovadoras e sustentáveis baseadas no princípio do desenvolvimento pleno do

ser humano (LOCATELLI, 2017).

Apesar de não estar isenta de contradições, uma sociedade que cultiva os valores sociais

e se mobiliza em torno do bem comum tende a ser mais coesa e fortalecida. Há de se reconhecer,

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então, o importante papel das instituições de nível superior na formação humana ao pensar o

conhecimento e a sua influência na construção do viver bem em sociedade. Como princípio,

em sua concepção de universidade comunitária, está intrínseca a noção de bem comum. Como

função, volta-se para o bem público. Cabe salientar que já em sua denominação, a opção pelo

termo comunitário tem significado histórico e “contém a noção de identidade, de

responsabilidade coletiva e de cooperação” (FRANTZ, 2006, p. 151). Engloba também

experiência histórica de organização dos espaços econômicos, sociais, culturais, principalmente

dos espaços da educação na formação de uma sociedade que prioriza o bem comum (FRANTZ,

2006). Isso conduz ao entendimento de uma instituição que concebe a educação como bem

público e oferece os seus serviços para o bem público (LOCATELLI, 2017).

Uma universidade não está fora, separada, mas está dentro da tessitura complexa e

contraditória da sociedade. Nada, neste tempo, pode ser pensado sem que sejam levadas em

conta as características atuais da globalização e a mercantilização do conhecimento,

características estas retratadas e materializadas nas visíveis transformações no sistema de

educação superior brasileiro. Este cenário reforça a tese da negação do conhecimento como

bem público e de sua afirmação como bem de consumo. Mas, ao se refletir sobre o valor dado

ao conhecimento pelas instituições de ensino superior, especificamente, as universidades

comunitárias, e os possíveis dilemas “existenciais” e identitários que estas enfrentam nesse

universo, há de se considerar uma atitude/identidade de resistência às mudanças provocadas

pela globalização. Ao resgatar os elementos integrantes da construção da identidade dessas

universidades, talvez se possa inferir que na forte presença da memória coletiva, na origem

desta “comunidade”, “criada por atores em situações desvalorizadas que procurariam resistir

para sobreviverem, com base em princípios diferentes ou mesmo opostos aos princípios das

instituições da sociedade” (CASTELLS, 1999 apud FERNANDES; MARQUES; CARRIERI,

2010, p. 45), estaria o cerne de sua existência, a incansável luta na busca por uma educação

promotora do bem comum, assim como o cerne de sua resistência àquilo que vem de encontro

à sua missão: construir uma sociedade mais humana, igualitária e inclusiva. Comunitário é

aquilo que é comum à comunidade, o que é coletivo, o que é de todos os membros da

comunidade” (SCHMIDT; CAMPIS, 2009, p. 19). Eis um traço central de sua identidade.

Muito se pode discursar sobre a anatomia das universidades, considerando o valor dado

ao conhecimento, no entanto, outros aspectos da anatomia das universidades comunitárias

também podem elucidar como sua identidade está se constituindo, considerando as mutações

no âmbito da educação. Para que isso aconteça, dar-se-á continuidade ao estudo sobre as

características dessas universidades à luz de outro componente sugerido por McCowan (2016):

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108

a sua função na produção, armazenamento e disseminação do conhecimento.

4.2 Função: o papel da universidade comunitária na produção, armazenamento e

disseminação do conhecimento

A presença ativa e crítica da universidade nos espaços da cultura, da política, da

economia, da tecnologia, certamente, influencia no processo de desenvolvimento de uma

sociedade. Sua inserção não está desvinculada de um projeto de sociedade, sua presença não é

neutra. Sendo assim, uma universidade deve ajudar a construir as condições necessárias para a

promoção do bem comum, talvez um de seus papéis mais relevantes na construção do

conhecimento e no cumprimento de suas funções. McCowan (2016) afirma que a função da

universidade tem a ver com a variedade de atividades concretas realizadas pela instituição e aos

papéis que a instituição cumpre. A função diz respeito ao papel da universidade em termos de

produção ou aplicação, armazenamento, transmissão de conhecimento. Assim, o propósito

é analisar a anatomia das universidades comunitárias considerando alguns aspectos das

atividades realizadas por essas instituições em ensino, pesquisa ensino, pesquisa e engajamento

social.

Para Moraes (2013) ensino, pesquisa e extensão compreendem os três níveis

constitutivos da realidade universitária. Aparentemente, cada um conteria linguagem, método,

lógica, fronteiras separadas. Se vistos de forma fragmentada, representariam cada qual uma

realidade unidimensional, com objetos de estudo independentes na forma de observar a

realidade e de construir o conhecimento. Se compreendidos assim, as ações de extensão seriam

desvinculadas do ensino e da pesquisa, e o educador estaria divorciado do educando e do

contexto das políticas educacionais que regem cada um dos níveis da realidade acadêmica. Por

outro lado, se compreendidos a partir de uma dimensão epistemológica transdisciplinar e da

complexidade constitutiva da realidade, ensino, pesquisa e extensão se entrelaçariam e

estimulariam o nascimento de “processos dialógicos e interdependentes, nutridos por uma

causalidade circular retroativa ou recursiva e por processos em sinergia” (MORAES, 2013, p.

14). Essa sinergia pressupõe a existência de processos dinâmicos, flexíveis, abertos ao

inesperado, capazes de transformar a realidade pessoal, profissional e social de todos aqueles

que participam do processo educacional.

Ensino, pesquisa e extensão constituem as três funções básicas da universidade

brasileira dos dias atuais. Este princípio foi estabelecido como dever para as Universidades, no

artigo 207 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988). Isto é, de acordo com a

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Constituição, ele deve estar, necessariamente, presente na formação promovida e ofertada por

essas instituições, sua implantação não é opcional. Conforme prescreve o Artigo 43 da Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei Federal nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, a

educação superior tem por finalidade incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica

(Inciso III), comunicar o saber através do ensino (Inciso IV) e promover a extensão aberta à

participação da população (Inciso VII), entre outras questões (BRASIL, 1996). Essa

prerrogativa foi reforçada e ampliada no Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2014b), o qual

prevê, inclusive para as instituições de ensino superior, intercâmbios e processos de

internacionalização tanto na pesquisa quanto no ensino e na extensão.

Ensino, pesquisa e extensão “devem ser equivalentes entre si e merecer igualdade em

tratamento por parte das Instituições de Educação Superior (IES), pois, ao contrário, estarão

violando os supracitados preceitos” (SANTOS, 2016, p. 216). Para UNI2, o desafio está em

associar essas dimensões a um processo integral “voltado para uma formação de alta

qualidade profissional, humanista, ética, cidadã e crítica de seus estudantes, mantendo o foco

na vocação comunitária que constitui a instituição” (PDI/UNI2, 2017, p. 35). Sendo

compreendido como princípio, a UNI1 considera que sua efetivação se dá pela “realização de

projetos coletivos, na interlocução com o mundo do trabalho, na aproximação da

Universidade com a sociedade, constituindo o significado social do trabalho acadêmico”

(PDI/UNI1, 2017, p. 21).

Diante da demonstração da relevância do entrelaçamento desses três pilares fundantes

da universidade presentes nas vozes de seus gestores e nos documentos oficiais, parece que a

proposição de McCowan (2016) de analisar a anatomia das universidades considerando as

dimensões valor, função e interação se torna ainda mais pertinente a este estudo, principalmente

quando enfatiza a função desta instituição quanto à produção, transmissão e armazenamento do

conhecimento.

Na busca pela qualidade da educação superior, a associação das atividades de ensino,

pesquisa e extensão é bem-vinda. Santos (2016, p. 2017) afirma que

A extensão propicia a complementação da formação acadêmica de docentes e discentes universitários, dada nas atividades de ensino e pesquisa científica, alicerçadas com a aplicação prática dos conhecimentos. Assim, forma-se um ciclo permanente [...] de maneira que as três atividades tornam-se complementares e dependentes, atuando então de forma sistêmica.

Visando entender o sentido e a diferença entre ensino, pesquisa e extensão, Frantz e

Silva (2002, p. 217) abordam, de modo mais objetivo, essas unidades de análise. Assim definem

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110

a) ensino: procura articular as ciências existentes, conhecer seus produtos e formar profissionais. Legitima-se no espaço social pela quantidade e qualidade dos diplomas concedidos; b) pesquisa: almeja construir novos, confirmar ou contestar conhecimentos existentes. Legitima-se junto à sociedade pela produção de tecnologias úteis a ela e pela orientação científica na resolução dos seus problemas; c) extensão: tem a função de estabelecer conexões entre os interesses do ensino e da pesquisa científica com os interesses sociais. Legitima-se pela presença de agentes universitários nos setores sociais, executando ações de serviços, assistências, projetos culturais etc.

Entende-se que, no cumprimento de suas funções sócio educativas, as universidades

integram e articulam de forma sistêmica esse trinômio. Parece, assim, que, no âmbito das

universidades brasileiras, esse tripé se apresenta como “uma de suas maiores virtudes e

expressão de compromisso social” (SANTOS, 2016, p. 218) já que seu exercício é considerado

fator de excelência na educação superior, a qual, volta-se à formação acadêmica e profissional

daqueles que dela participam.

Para Vannucchi (2011, p. 41), as universidades comunitárias têm convicção de que sua

missão só atingirá todo processo político-pedagógico caso esta se manifeste “como luz

predominante nas atividades acadêmicas; na prática da pesquisa, [...] no exercício da extensão

e em todos os procedimentos comunitários da instituição”. Comenta um dos gestores a nossa

missão é uma missão muito clara, educar por meio do ensino de pesquisa-extensão, para

promover a sustentabilidade e a melhoria do ambiente de vida (R4, 2016). A indissolubilidade

deste trinômio na construção da identidade dessas instituições está longe de ser mera obrigação

imposta por legislação. Esse traço faz parte do que lhe é essencial, e também do que lhe torna

diferente de outras instituições, (ALBERT; WETTHEN, 1985), como afirma R4 por sermos

uma instituição comunitária; essa é a nossa diferença; essa é a nossa missão; esse é o nosso

compromisso; esse é o nosso papel social; nossa grande relevância social está por aí (R4,

2016).

A indissolubilidade entre ensino, pesquisa e extensão também é evidenciada na missão

das instituições locus desse estudo. Em suas missões, as expressões produzir, sistematizar e

socializar conhecimento (PDI/UNI1, 2017) e produzir e difundir conhecimentos fazem

referência à tríade ensino, pesquisa, extensão. Duas das instituições analisadas evidenciam

explicitamente os termos em seus textos: Produzir e socializar o conhecimento pelo ensino,

pesquisa e extensão (PDI/UNI3, 2017) e Promover, por meio do ensino, da pesquisa e

extensão, o desenvolvimento regional (PDI/UNI4, 2017). É na missão que se percebe o motivo

da existência dessas instituições, ou seja, quem são, para quem elas fazem e como fazem. E,

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conforme a acepção de Santos (2005, p. 64-65), “no século XXI só há universidade quando há

formação graduada e pós-graduada, pesquisa e extensão. Sem qualquer destes, há ensino

superior, não há universidade”. Assim, o princípio da indissociabilidade tem na Universidade

seu sentido mais intrínseco.

Ao analisar os PPIs das universidades em estudo, essas concepções ficam mais

evidentes. Para UNI4 A indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão oportuniza uma

visão sistêmica para o planejamento, desenvolvimento e avaliação curricular, tendo em vista

ser um princípio fundamental para a articulação teoria e prática (PPI UNI4, p. 80). Para

assegurar o preceito constitucional, os documentos reafirmam que esses três pilares devem ser

equivalentes e merecer igualdade em tratamento por parte da instituição.

Observa-se que os discursos se assemelham em um esforço de descrever as qualidades

da instituição. Esta é uma forma de dar consistência e sentido ao trabalho realizado nas

dimensões de ensino, pesquisa e extensão. Com o intuito de evidenciar a presença efetiva dessas

funções nas universidades comunitárias, foi-se aos seus documentos oficiais e extraiu-se

algumas informações, as quais são descritas no quadro 9. Salienta-se que tanto os PDIs, inclui-

se PPIs como Relatórios/Balanços de Responsabilidade Social trazem muito mais informações

com riqueza de detalhes, as quais comprovam as diferenciadas ações dessas instituições no que

concerne às atividades de ensino, pesquisa e extensão.

Quadro 9 - Principais Atividades de Ensino, Pesquisa e Extensão das Universidades Comunitárias ATIVIDADES DE ENSINO

UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 38 mil alunos 77 Cursos de Graduação (Bacharelado, Licenciatura, Tecnólogo) 160 opções de ingresso 977 Professores titulados (88% com título de mestre e doutor) 1000 funcionários EaD:18 Cursos virtuais em diferentes áreas do conhecimento CETEC – Centro Tecnológico - Escola de ensino médio e cursos técnicos UNTI – Universidade Terceira Idade 880 alunos - 50 turmas em atividades Programa de atendimento ao estudante PROGRAMA DE IDIOMAS PROGRAMA DE INTERNACIONALIZAÇÃO Formação Continuada para professores e funcionários Comissão Própria de

17.500 mil alunos 60 cursos de graduação (Bacharelado, Licenciatura, Tecnólogo) 150 opções de ingresso 904 professores de Ensino Superior (50,55% Me.; 32,74% Dr.) 1258 funcionários EaD: disciplinas em diversos cursos CEMI – Centro de Ensino Médio Integrado Centro de Referência e Atenção ao Idoso Programa de atendimento ao estudante PROGRAMA DE IDIOMAS UNINCLUI - Programa de inclusão da pessoa com deficiência – PROGRAMA DE INTERNACIONALIZAÇÃO Formação Continuada para professores e funcionários Comissão Própria de Avaliação – CPA

24 mil alunos 100 cursos de graduação (Bacharelado, Licenciatura, Tecnólogo) 150 opções de ingresso 1277 professores (nível superior e ed. Básica) 1359 funcionários EaD: 9 Cursos de Graduação a Distância Programa de Educação de Jovens e Adultos Colégio de Aplicação – Ensino Fundamental e Médio Programa de atendimento ao estudante PROGRAMA DE IDIOMAS PROGRAMA DE INTERNACIONALIZAÇÃO UNIFORMA - Formação Continuada para professores e funcionários Formação continuada para funcionários – AGORA - Programa de investimento em Qualidade de Vida no Trabalho –

14 mil alunos 50 Cursos de graduação (Bacharelado, Licenciatura, Tecnólogo) 130 opções de ingresso 730 docentes (20,97% doutores e 41,94 % mestres) 696 funcionários EaD: 7 Cursos de Graduação 231 alunos Colégio de Aplicação - Ensino Fundamental e Médio Programa de Educação de Jovens e Adultos ÂNIMA e VIVER BEM Formação Continuada para professores e funcionários Programa de atendimento ao estudante PROGRAMA DE IDIOMAS PROGRAMA DE INTERNACIONALIZAÇÃO Comissão Própria de Avaliação – CPA INFRAESTRUTURA 1 Campus

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ATIVIDADES DE ENSINO UNI1 UNI2 UNI3 UNI4

Avaliação – CPA INFRAESTRUTURA: Multicampi: 8 Unidades em 8 cidades 805 laboratórios 759 salas 11 bibliotecas 759 salas 11 biblioteca

INFRAESTRUTURA Multicampi: 7 Campi em 7 cidades 22 anfiteatros e auditórios 176 salas para ensino prático-experimental 300 laboratórios 150 clínicas 10 bibliotecas

Comissão Própria de Avaliação – CPA INFRAESTRUTURA: Multicampi: 9 Campi 532 salas de aula 315 laboratórios 17 auditórios 8 bibliotecas

170 salas de aula 2 bibliotecas 78 laboratórios 5 auditórios

ATIVIDADES DE PESQUISA UNI1 UNI2 UNI3 UNI4

11 Cursos de Doutorados 17 Cursos de Mestrados 70 Cursos de Especialização 93 Grupos de Pesquisa cadastrados no CNPq; 331 Linhas de pesquisa 269 Bolsas de Pós-Graduação 219 Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica 21 Núcleos de Inovação e Desenvolvimento Parque de Ciência, Tecnologia e Inovação Incubadora Tecnológica e Startups 110 Registros de patentes no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual – INPI Instituto de Biotecnologia, Instituto de Pesquisas Clínicas para estudos Multicêntricos; Instituto de Materiais Cerâmicos; Instituto de saneamento ambiental; Instituto Memória Histórica e Cultural; Instituto de Pesquisas econômicas e sociais EDITORA: Publicação de mais de 1.200 títulos PUBLICAÇÕES: 10 revistas acadêmicas Participação programas de financiamento: FIES, PROUNI Comitê de Ética em Pesquisa

6 Cursos de Doutorado 15 Cursos de Mestrado 57 Cursos de Especialização 322 projetos de pesquisa 90 Grupos de Pesquisa cadastrados no CNPq; Mais de 200 Linhas de Pesquisa Mais de 200 Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica Incubadora Tecnológica e Startups Parque Científico e Tecnológico do Planalto Médio Parque de Geração Solar Fotovoltaica Museu Histórico, de Artes Visuais e Zoobotânico EDITORA: Publicação de mais de 800 títulos PUBLICAÇÕES: 12 revistas acadêmicas Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI Comitê de Ética em Pesquisa

6 Cursos de Doutorado 11 Cursos de Mestrado 35 Cursos de Especialização 24 Cursos de especialização EAD 311 projetos de pesquisa 101 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq; Mais de 400 bolsas de Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares – ITCP UNIINOVA – Núcleo de Inovação e Tecnologia ITE – Incubadora Tecnológica Empresarial CERUMA(R) - Parceiro Propriedade Intelectual Instituto de Pesquisas Sociais Museu Oceanográfico EDITORA: Publicação de mais de 160 títulos PUBLICAÇÕES: 5 revistas acadêmicas Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI, FUMDES Comitê de Ética em Pesquisa

2 Cursos de Doutorado 7 Cursos de Mestrado 28 cursos de Especialização 379 projetos de pesquisa 121 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq Mais de 200 bolsas de Iniciação Científica IPARQUE – Parque Científico e Tecnológico IPAT- Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnológicas IDT – Instituto de Engenharia e Tecnologia IALI – Instituto de Alimentos IPESE – Instituto de Pesquisa Socioeconômica Aplicada ITEC IN – Incubadora Tecnológica de Ideias e Negócios Incubadora Tecnológica e Startups Planetário Museu de Zoologia - Centro de referência na pesquisa científica, na educação ambiental e no turismo cultural Museu Tecnológico Museu Mineralógico EDITORA: Publicação de mais de 100 títulos entre 2013-2018 Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI, FUNDES Comitê de Ética em Pesquisa

ATIVIDADES DE EXTENSÃO UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 Mais de 90 projetos de extensão em diferentes áreas: saúde, meio ambiente, social, educação Mais de 700.000 pessoas beneficiadas (2016 – 2018) Hospital Geral 280 bolsas de extensão Sistema Educativo de RÁDIO E TV CETEL – Centro de Teledifusão educativa. O canal 15 da NET e 27 na TV Aberta foram fechados em 2017, após 20 anos de existência. Tinha parceria com a TV Futura. - 3 emissoras de rádio em

Mais de 80 projetos de extensão em diferentes áreas: saúde, meio ambiente, social, educação Mais de 650.000 pessoas beneficiadas (2016 e 2018) Hospital Veterinário 210 bolsas de extensão Sistema Educativo de Rádio e TV Afiliada do Canal Futura Cursos acreditados pelo Sistema de Acreditação Regional de Cursos de Graduação do Mercosul (Arcusul) CONVÊNIOS INTERNACIONAIS, com

Mais de 70 projetos de extensão em diversas áreas: saúde, meio ambiente, social, educação 600.000 pessoas beneficiadas (2017-2018) Hospital Universitário, conveniado com o SUS 265 bolsas de extensão Ecomuseu – espaço cultural que atua no resgate e valorização dos costumes e da história das comunidades litorâneas de Santa Catarina Sistema Educativo de Rádio e TV Afiliada do Canal Futura. Coral e Grupo de dança

Mais 110 projetos de Extensão em diversas áreas: saúde, meio ambiente, social, educação 300 mil pessoas beneficiadas (2017-2018) Hospital Universitário 298 Bolsas de Extensão Sistema Educativo de TV Coral e Grupo de dança Fomento a grupos artísticos PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações INTERCÂMBIOS - 48

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ATIVIDADES DE ENSINO UNI1 UNI2 UNI3 UNI4

funcionamento em diferentes campi da região. Fomento a grupos artísticos Coral e Grupo de dança PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações INTERCÂMBIOS: 203 acordos bilaterais com instituições de 28 países

62 universidades de 18 países Coral e Grupo de dança Fomento a grupos artísticos PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações INTERCÂMBIOS com universidades do país e do exterior, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais

PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações INTERCÂMBIOS. – 140 convênios firmados com Universidades estrangeiras, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais

acordos com 20 países, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais

Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e Sítios eletrônicos – Período de referência 2017-2018

Ao se fazer uma leitura atenta dos dados apresentados, observa-se a dimensão e

abrangência de cada uma das universidades comunitárias estudadas. Os números levam a

refletir sobre a influência da presença dessas instituições no contexto sócio-econômico-cultural

de cada região em que estão inseridas, ao mesmo tempo, que projetam o impacto na formação

profissional e humana daqueles que por elas são atingidos.

No capítulo 3, momento em que se buscou compreender a construção da identidade

dessas instituições, desde sua gênese até a sua legitimação, evidenciou-se que, historicamente,

na década de 1960, as comunidades do interior do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

pleiteavam a instalação de cursos de nível superior. O que se observa, a partir do quadro 08, é

que, nestas cinco décadas de existência, essas instituições vêm construindo uma trajetória de

consolidação, de melhoria e reconhecimento do seu trabalho pelas comunidades interna e

externa. Comenta R1 Daquilo que era, a universidade cresceu com sucesso o case da UNI1, é

um case de sucesso. E cresceu junto com a cidade, com a região, a cidade cresceu junto com a

universidade (R1, 2016).

Como Universidades Comunitárias expandiram suas ações, com novos cursos de

graduação e pós-graduação em diferentes áreas, articuladas com a pesquisa e a extensão,

empreendendo programas e projetos para concretizar a sua missão institucional. Ao

completarem cinquenta anos de existência, em meio a avanços e conflitos motivados pelo

contexto econômico e pelas políticas públicas, chegam ao século XXI com sua identidade

reconhecida e legitimada.

Analisando o conjunto de informações no quadro 9, observa-se semelhanças nos

projetos de aplicação sistêmica do trinômio ensino-pesquisa-extensão de modo que tais funções

parecem complementar-se mutuamente nas quatro instituições. Se forem contabilizados em

dados gerais, observa-se que no ensino, são quase 100 mil alunos atingidos diretamente, são

mais de 290 cursos de graduação oferecidos àqueles que buscam a formação profissional, isto

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demonstra a capacidade dessas instituições de armazenamento e transmissão de conhecimentos

de valor científico. A oferta de quase 300 cursos de pós-graduação, os quais têm como objetivo

a pesquisa e a construção de novos conhecimentos, traduz um trabalho voltado à inovação e

criação de novas tecnologias úteis à sociedade. Por intermédio das múltiplas atividades de

extensão, essas universidades promovem a socialização e a democratização do conhecimento

científico junto à comunidade, beneficiando mais de 750.000 pessoas em um ano e abrangendo

as mais diferentes áreas de atuação. Assim, “forma-se um ciclo permanente onde a pesquisa

aprimora e produz novos conhecimentos, os quais são difundidos pelo ensino e pela extensão,

de maneira que as três atividades se tornam complementares e dependentes, atuando então de

forma sistêmica” (SANTOS, 2016, p. 217).

Prever a indissociabilidade com a pesquisa e a extensão, do ponto de vista do ensino,

não significa meramente concebê-lo como um espaço orgânico no qual se desenvolvem a

recriação e o acesso aos conhecimentos produzidos. Essa indivisibilidade implica, também,

esmerar-se por uma formação que se volte para a autonomia, na qual os estudantes sejam

envolvidos em atividades de pesquisa e incentivados a modelar solução para os novos

problemas. Implica, igualmente, manter uma conexão contínua e recíproca entre a instituição

e a sociedade, “transversalizando o olhar dos Projetos Pedagógicos (PPI/UNI2, 2017, p. 35).

Mas como essa indissociabilidade pode acontecer? Rays (2003) aponta alguns

pressupostos necessários, entre eles: que o Projeto Pedagógico dos Cursos (PPC) aponte para

uma atitude investigativa, reflexiva e problematizadora de docentes e discentes; que a matriz

curricular e a organização pedagógica dos cursos considere as Diretrizes Curriculares

Nacionais, a missão e o PPI da instituição, olhando para os avanços técnico-científicos, para as

questões da cidadania, da ética e da diversidade sociocultural; que o ensino da graduação e pós-

graduação, a pesquisa e a extensão busque a intersecção curricular e o relacionamento com a

sociedade, por meio de um caminho de mão dupla; que a gestão do PPC se paute

prioritariamente nas ações acadêmicas, entre elas as atividades Curriculares Complementares,

os estágios, os Trabalhos de Conclusão de Curso, os projetos integrados. Ao analisar os

documentos dessas universidades, constatou-se que seus PPIs vão muito além do que propõe

Rays. Itens como currículo, avaliação de aprendizagem, metodologia de ensino, acessibilidade

e inclusão, valorização docente, gestão do processo pedagógico, estágios curriculares, educação

a distância e internacionalização são apenas alguns ingredientes que norteiam o trabalho de

construção da política10 de ensino dessas instituições.

10 Como políticas entende-se “a compilação dos fundamentos, objetivos e das diretrizes; dos princípios e pressupostos que estabelecem a lógica de funcionamento dos diversos processos institucionais. A partir delas são

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115

No contexto da Educação Superior, a ação de ensinar vai muito além da tarefa de “passar

conteúdos”. Ensinar requer o esforço de instaurar condições de aprendizagem que leve em conta

a gênese do conteúdo, bem como a criação de estratégias metodológicas de aprendizagem,

formando conceitos com o propósito de resolver situações concretas da vida prática

(LIBÂNEO, 2009). Ensinar, portanto, implica promover e ampliar o desenvolvimento das

aprendizagens, oferecendo ferramentas para pensar cientificamente, operar com conceitos e

mobilizar procedimentos lógicos de pensamento. (PPI/UNI2, 2017, p. 42). Ciente de seus

princípios filosóficos, técnico-metodológicos norteadores de suas práticas acadêmicas, a UNI3

orienta suas ações, da concepção de ensino ao uso dos resultados das avaliações, considerando

a excelência na produção técnica e científica; a excelência no processo de ensino/aprendizagem

nos diferentes níveis de ensino; a interação com a comunidade local e regional e; a integração

dos processos de gestão administrativa, acadêmica e pedagógica.

A UNI3 desenvolve um processo educacional sustentado em uma ação pedagógica

dinâmica, baseada no diálogo, compartilhada e construída com base na vivência e na

interação dos sujeitos da aprendizagem com a cultura (PPI/UNI3, 2017, p. 88-90). Visto dessa

forma, o processo de ensinar teria a capacidade de estimular a curiosidade e alimentar uma

inquietação que levaria a um aprendizado constante e infinito. E com mais relevância, “pode

levar a uma compreensão mais profunda do tema através do processo de lidar com um problema

específico e avaliar a complexidade e a natureza contestada dos temas políticos em geral”

(MCCOWAN, 2006, p. 145).

Ao fazer referência à política institucional para o ensino e aprendizagem em seus

Projetos Pedagógicos Institucionais, as universidades comunitárias concebem a ação de ensinar

como um processo pedagógico interativo, intencional, no qual o acadêmico tem um papel ativo

no processo de aprendizagem. A UNI1 se propõe a desenvolver um conhecimento amplo, que

situe o sujeito no mundo e o habilite a interagir profissional, científica e eticamente com a

sociedade (PPI/UNI1, 2017, p. 25); a UNI2 assume que um processo acadêmico de ensino-

aprendizagem precisa transformar o saber científico em conteúdos formativos, tendo em

consideração os saberes discentes, os instrumentos de mediação e os contextos educativos do

ensino, da pesquisa e da extensão; a UNI3 a UNI4 por sua vez defende o saber universalmente

elaborado [...], a fim de favorecer a construção de novos conhecimentos, com a articulação

entre teoria e prática, respeitando os diferentes métodos e concepções pedagógicas.

(PPI/UNI4, 2017, p. 34). Observa-se que a política institucional para o processo pedagógico,

indicadas regras, conceitos e especialmente instrumentos expressando os parâmetros para o planejamento e o acompanhamento das ações da Instituição, em seus diferentes níveis” (PPI/UNI1, 2017, p. 25).

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116

portanto, persegue um compromisso com a formação integral do aluno, voltada para a

realização plena do ser humano, tendo este um envolvimento ativo com o conhecimento e com

as práticas sociais.

Ao rastrear as informações sobre essas universidades, na dimensão Ensino, no quadro

9, pode-se inferir que a existência de mais de 280 Cursos (Bacharelado, Licenciatura,

Tecnólogo) em diferentes áreas do conhecimento (Ciências da vida, Ciências Extas e

engenharias, Humanidades, Ciências Sociais, Ciências Jurídicas, Artes e Arquitetura), a

presença de programas voltados à Educação Básica, bem como de projetos voltados à educação

de Jovens e Adultos e à Terceira Idade, a oferta de cursos na modalidade EAD, o

desenvolvimento de Programas de idiomas, o aprimoramento do corpo docente e técnico-

administrativo, por meio de programas de formação continuada reiteram o compromisso dessas

instituições com a formação integral do homem e ao atendimento aos princípios estabelecidos

para o processo de ensinar para a formação de um homem livre e uma sociedade democrática.

Em sua trajetória, entre os anos de 1960 e 2013, vários marcos pontuaram a caminhada

de legitimação das universidades comunitárias. Durante esse caminho que se inicia com o

processo de interiorização do ensino até o seu reconhecimento legítimo, consagrado por lei,

observa-se expressivos avanços na construção da identidade dessas instituições.

Mas...

Livres de estarem imunes às intempéries dos jogos políticos, econômicos e sociais, em

nível local e/ou global, essas instituições vêm sofrendo com as turbulências geradas pelas

mudanças que se aceleram no mundo da educação superior provocadas por políticas de caráter

neoliberal, exigindo delas novas estratégias de adaptação no quesito ensino.

Leite (2006) ao analisar os impactos e as mudanças da avaliação nas universidades

públicas, comunitárias, confessionais e privadas do Brasil, da Argentina e do Uruguai, entre os

anos de 1996 e 2000, constatou várias evidências de mudanças ameaçadoras nas IES, as quais

mantinham alguma relação com o momento de ordenação capitalista global. A primeira

evidência percebida foi o redesenho capitalista das universidades, entendido como “uma

espécie de performance institucional marcada pela comoditização do conhecimento, da ciência

e da tecnologia, produzida pela nova gestão que favorece a comercialização privada e as

operações com lucro nos campi” (LEITE, 2002). Essa perspectiva de análise corrobora com a

tese de McCowan (2016) quando este apresenta os processos de Comoditização e Desagregação

como grandes geradores da instabilidade identitária por que passam as universidades, neste caso

específico, as universidades comunitárias.

Entre as características desse novo desenho de universidade apresentam-se as seguintes:

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(a) avaliações classificatórias - estabelecem um sistema competitivo entre as IES com

avaliações produzidas por agências externas às universidades; (b) capitalismo acadêmico e

professores empreendedores – docentes e pesquisadores buscam no mercado recursos para a

pesquisa, são empreendedores de si próprios e de sua produção intelectual; os modelos de

avaliação privilegiam a produtividade docente, o quantitativo de livros e artigos publicados

consolidam o capitalismo acadêmico; (c) gestão de caráter “gerencialista” – decisões centrais

levam a medidas de contenção de despesas: cortes nos cargos, nos salários ou nas vagas

docentes, a avaliação por méritos afeta as decisões; (d) universidades empreendedoras –

atitudes incisivas de instituições privadas sobre o mercado do conhecimento; observam-se

parcerias para formação de incubadoras empresariais; venda de produtos patenteados; parques

tecnológicos, escritórios de negócios no campus; (e) mercado no campus – liberação de espaços

da instituição para a instalação de lojas de serviços de toda espécie, dentre elas, as agências de

diferentes bancos privados; (f) decisões de fora para dentro das instituições – decisões

autoritárias tomadas em face de políticas públicas do governo central, especialmente sobre a

avaliação classificatória e acreditação; (g) instalação de campi fora de sede – expansão de

campi em diferentes locais, com clientela potencial; oferta de cursos presenciais e virtuais;

educação a distância e convênios com outras instituições (LEITE, 2006).

O ciclo de reformas está em andamento. A educação superior expande-se em direção ao

mercado e o estado tenta diminuir os seus custos. Ainda conforme Leite (2002) fazem parte do

elenco das características dessas reformas, intensificadas pela Lei de Diretrizes e Bases da

Educação de 1996 (Lei nº 9.394/96) os seguintes itens: (a) diversificação da missão das

instituições: Universidades (ensino, pesquisa, extensão, pós-graduação), Centros Universitários

(ensino preferencial e pesquisa), Institutos Superiores, Faculdades Integradas e Escolas

Superiores; (b) aumento do número de instituições privadas em progressão acelerada; (c)

ampliação do número de matrículas e de cursos; (d) flexibilização da oferta curricular –

introdução de cursos sequenciais – curta duração; (e) diversificação do financiamento, abertura

para serviços e convênios; (f) avaliação intensiva, em diferentes modalidades, sob o controle

do estado desde 1996, Sistema de avaliação pública (Provão, Exame Nacional de Cursos,

seguido de ranking nacional, ENEM), avaliação das Condições de oferta, avaliação externa por

especialistas, entre outras.

Para a autora este redesenho possibilitou a emergência de novos modelos institucionais,

entre eles: (a) um denominado universidade liberal híbrida, que atuaria em nível local e

nacional e se caracterizaria como “uma instituição tradicional que sempre foi autônoma do

mercado, mas que passou a sobrepor critérios de mercado às suas tradicionais funções e

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atividades, após processos de avaliação homogeneizadores que produziram o redesenho de suas

prioridades, atividades e funções” (LEITE, 2006, p. 179); (b) um segundo modelo denominado

universidades globais, as quais lançam seus produtos na Internet e outras mídias de circulação

internacional, arregimentando grande número de alunos ao redor do mundo, com

regulamentação dos serviços educativos de educação superior pela Organização Mundial do

Comércio (OMC) e pelo General Agreement on Trade and Service (GATS) e que não

reconhecem a legislação de outros países que não aquele de sua origem (c) a universidade

empreendedora caracterizadas por ação empreendedora coletiva as quais convivem com o risco

de empreender as inovações em busca de uma transformação planejada; (d) modelo de

universidade empresarial, a qual admite acionistas, lucros, gestão igual à de empresas privadas;

orientação do conhecimento voltada para aprendizagem aplicada, demanda em procura de

ganhos, orientação para o mercado, qualidade dos insumos, clientes e consumidores; (e) modelo

de universidade corporativa, instituições vinculadas a grandes corporações multinacionais, nas

quais o aprendizado está associado ao desempenho, à capacidade de trabalhar de forma mais

produtiva e criativa dentro do contexto da empresa. Essas instituições têm um perfil de

treinamento, baseiam-se em procedimentos, no ciclo curto (LEITE, 2002).

Se se considerar as características do desenho da nova universidade apontadas por Leite

como predominantes do novo modelo, e uni-las aos efeitos da aprovação da LDB de 1996 em

todas as suas consequências, então pode-se dizer que algumas dessas características estão

presentes no comportamento institucional das universidades comunitárias. Em seus

documentos institucionais (PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e peças audiovisuais

divulgadas na internet) a exaltação dos seus conceitos nos rankings, números expressivos de

produção científica, investimentos em inovação com criação de Parques Tecnológicos e

desenvolvimento de incubadoras são apresentados em detalhes à comunidade. A estrutura

multicampi e a oferta de cursos presenciais, educação a distância, a redução de pessoal e

convênios com outras instituições também estão o rol das ofertas das comunitárias. Aliadas a

essas decisões, entra no cenário a implementação de políticas para ingresso em cursos EaD e a

intensificação da comunicação de seus cursos com uma linguagem mais mercadológica. Parece

que há um movimento das comunitárias no sentido de “sobrepor critérios de mercado às suas

tradicionais funções e atividades, após processos de avaliação homogeneizadores que

produziram o redesenho de suas prioridades, atividades e funções” (LEITE, 2006, p. 179). Essas

mudanças dariam um contorno de universidade ao que Leite denominou de universidade liberal

híbrida. Seriam essas novas investidas contraditórias à missão dessas instituições a ponto de

descaracterizá-las como comunitárias? Talvez. Considerando que as universidades

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comunitárias entendem a educação como um bem público e comum, são instituições não

lucrativas, pertencentes à sociedade civil, as quais defendem a indissociabilidade do ensino, da

pesquisa e da extensão, esse movimento de mudança estaria imerso nas comunidades com o

intuito de promover o desenvolvimento social e econômico regional, ao mesmo tempo que

atenderia as demandas dessas comunidade que, apesar de local, encontra-se inserida em todas

as instâncias nacional e global. Esse é o discurso que percorre os PDIs.

Interessante observar que o surgimento desses novos modelos de instituições provoca

nova forma de comunicação com os diferentes públicos. Enquanto as universidades históricas

e tradicionais restringem suas estratégias de marketing ao que Levitt (1985) chamou de produto

genérico (ao produto em si), ou seja, os cursos que estão sendo oferecidos no mercado; as novas

universidades de caráter mercantil, tendem a mostrar, em suas estratégias mercadológicas,

“outros elementos ou qualidades distantes do produto em si, os mesmos que muitas vezes

ganham maior destaque que o principal produto oferecido pela universidade: o próprio curso”

(CALDERÓN, 2000, p. 66). Assim, a oferta de novos ingredientes como uma sala de

musculação, um salão de beleza, convênios com “grandes” empresas, um instituto de idiomas,

uma praça de alimentação passa a ganhar mais notoriedade do que o próprio curso ofertado pela

universidade. Essa estratégia amplia o produto para além do que é solicitado ou esperado pelo

cliente, acrescentando-se algo novo ao produto, o que acaba funcionando como mecanismo de

captura de novos “clientes”.

Todas essas mudanças criam um novo cenário na educação superior do Brasil. O

aumento substancial de novas instituições, principalmente de instituições privadas, com

consequente aumento no número de matrículas, indica que a educação superior no Brasil é um

bom negócio.11 A rede privada ofertou 92,4% do total de vagas em cursos de graduação em

2017. A rede pública correspondeu a 7,6% das vagas ofertadas pelas instituições de educação

superior. Em 2017, 3, 2 milhões de alunos ingressaram em cursos de educação superior de

graduação. Desse total, 81,7% em instituições privadas (MEC, 2016).

Calderón (2000), ao observar o comportamento das universidades particulares no

munícipio de São Paulo, constatou que o crescimento do número de instituições promoveu o

surgimento de um “mercado de oferta”, no qual passou-se a produzir a partir das exigências do

mercado, principalmente, a partir “do que os consumidores querem, dentro de um contexto de

11 Conforme Censo da Educação Superior (2017), há no Brasil 2.448 instituições de Educação Superior (universidade, Centro universitário, faculdade, Institutos federais, Cefet, das quais 1152 são privadas, correspondendo a 87,9% do total. Apenas 296 instituições são públicas (municipais, estaduais, federais), correspondendo a 12,1%. (Ministério da Educação, 2016). Disponível em: http://portal.inep.gov.br/web/guest/censo-da-educacao-superior. Acesso em: 13 jan. 2019.

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acirrada concorrência por clientes em potencial, de excesso de produtos para um número de

consumidores que, embora crescente, não consomem todas as vagas e serviços oferecidos pelas

universidades particulares” (CALDERÓN, 2000, p. 66). Passados dezesseis anos, essa

realidade ainda se faz sentir também nas universidades comunitárias. Em depoimento, R1

manifesta sua preocupação

Nós tivemos um histórico até então de que a universidade automaticamente era comprada, entre aspas, automaticamente. Vinha o aluno, automaticamente... (Ela, a universidade) não precisava vender-se, mostrar-se. E isso nós perdemos. Nos últimos anos, o cenário, esse paradigma, o modelo foi superado, ou seja, ruiu. Hoje nós temos que fazer um movimento contrário. Hoje nós temos que sair e mostrar que nós somos uma universidade, ou seja, não é automático esse processo (R1, 2016).

Reaparece, aqui, as discussões de McCowan (2016; 2017) sobre a influência dos

processos de comoditização/mercantilização e desagregação nas funções da universidade, quais

sejam ensino, pesquisa e extensão. A institucionalização do mercado faz proliferar uma ampla

diversificação de produtos e serviços educacionais, como também uma acentuada diferenciação

entre as universidades com os mais variados perfis e missões institucionais que interagem no

mercado de ensino. Isso tudo gera um novo movimento que caracteriza o chamado “mercado

de oferta” em contraposição ao “mercado de demanda” (CALDERÓN, 2000).

Ao voltar ao quadro 9, o qual traz um panorama das universidades comunitárias

pesquisadas, constata-se a oferta de inúmeros produtos àqueles que pretendem ter acesso ao

conhecimento. No quesito Ensino, a soma dos cursos de graduação ofertados chega à casa de

300 formatos entre Bacharelados, licenciaturas, tecnólogos em diferentes áreas do

conhecimento, com mais de 140 opções de ingresso, em diferentes modalidades – presencial e

a distância. Tem-se opções de ensino para todo tipo de público: jovens, idosos, crianças,

adolescentes. Talvez isso se justifique pela busca de adaptação aos novos tempos, cujos

mercado e protagonistas estão em constante modificação, e a possibilidade de estabelecer

vantagem competitiva duradoura não exista mais. Para Tachizawa e Andrade (1999, p. 22),

“nenhuma instituição de ensino superior, enfim, pode se dar ao luxo de descansar sobre seus

louros; cada qual tem de inovar incessantemente para poder competir e sobreviver”. O

“mercado de oferta” exige que essas instituições estejam atentas às demandas do mercado,

oferecendo novos produtos e aprimorando aqueles que já oferecem.

Para McCowan (2018) a expansão contínua do ensino superior traz seus desafios e

conduz ao processo de desagregação, o qual tem sido alavancado essencialmente por

motivações financeiras e liderado pelo setor com fins lucrativos, mas tem também motivações

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pedagógicas por meio da ênfase na personalização e na empregabilidade. “Este processo

envolve a separação da instituição em seus papéis constituintes e atividades diferentes, e o corte

de funções percebidas como supérfluas, permitindo ao cliente comprar apenas os elementos

desejados” (MCCOWAN, 2018, p. 465).

McCowan aponta alguns riscos que o processo de desagregação pode provocar nas

funções das universidades, como já foi mencionado, entre eles estão a dissociabilidade entre

ensino, pesquisa e extensão; a redução da capacidade das instituições de promover o bem

público e a igualdade de oportunidades; e a ameaça ao que o autor denomina de

hiperporosidade, ou seja, a perda de espaço para reflexão profunda sobre a produção do

conhecimento e, consequente, perda de autonomia para realização de atividades de ensino e

pesquisa.

Para explicar a desagregação, McCowan parte do princípio de que os produtos são

comumente vendidos em pacotes, distinguindo dois tipos de processo e “entrega”: (1º) “os

produtos distintos que, anteriormente, foram vendidos juntos, passam a ser distribuídos

separadamente.” Exemplo: da compra de um CD (Compact Disk) com várias músicas, para a

compra de faixas individuais, ou transmissão sem custo direto; (2º) modelo “no-frills”, “no

qual o produto básico é vendido na sua forma mais barata, sem extras e ornamentos.” Exemplo:

oferta de passagens aéreas de baixo custo, com a retirada de refeições, subsídio de bagagem,

reduzindo os custos das empresas aéreas significativamente, deslocando as companhias aéreas

tradicionais para rotas de curta distância. “Em muitos casos, os consumidores correram para

essas novas opções, pois estão dispostos a sacrificar o conforto e a conveniência adicionais pelo

preço muito reduzido, ou são capazes de comprar os produtos desejados com maior precisão

sem itens indesejados” (MCCOWAN, 2018, p. 468). E como esses fenômenos se apresentam

no ensino superior?

Para McCowan (2018) várias são as formas de desagregação, as quais se manifestam

em diferentes níveis, desde sistemas de Educação Superior, passando por Instituições, Cursos

e chegando aos Quadros Acadêmicos. Entre essas manifestações se apresentam o crescimento

de instituições com foco só no ensino, a terceirização de serviços nas universidades como

refeições, limpeza, suporte acadêmico, a redução da proporção de funcionários permanentes, o

surgimento de vários polos para substituir os campi, o que fragiliza a ideia de universidade

como “lugar”, com alunos estudando a distância em qualquer parte do mundo. O autor apresenta

como exemplos o sucesso da Universidade Aberta na Grã-Bretanha, a Universidade Aberta

Nacional Indira Gandhi na Índia e a Universidade Aberta Allama Iqbal, no Paquistão, com

números expressivos em milhões de estudantes.

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Como consequência, esse cenário leva a mudanças dos papéis daqueles que frequentam

a academia. Macfarlane (2011, p. 59) evidencia a substituição do acadêmico de tempo integral

por “para-acadêmicos”, intitulados “conselheiros de habilidades, desenvolvedores

educacionais, tecnólogos de aprendizado e gerentes de pesquisa.” O crescimento de professores

não permanentes e a evolução das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), as quais

facilitaram a transmissão de palestras para inúmeros estudantes em diferentes e distantes locais,

estimularam o surgimento de um grupo suplementar de “tutores” os quais passam a mediar o

processo pedagógico, atendendo às necessidades dos estudantes. “Esta tendência

inevitavelmente sinalizaria o fim do professor universitário, no papel mais famoso promovido

por Wilhelm von Humboldt, como aquele que se envolve na busca do conhecimento e

simultaneamente orienta os alunos em sua própria busca” (MCCOWAN, 2018, p. 470).

No modelo de ensino superior “no-frills”, instituições, em sua maioria com fins

lucrativos, oferecem cursos mais baratos com diplomas a baixo custo, no período noturno, a

uma população de adultos que trabalha durante o dia e que lutava pelo acesso ao ensino superior.

Essas circunstâncias fragilizam a interação pedagógica e restringem a possibilidade de

vivenciar experiências mais amplas no meio acadêmico. No Brasil, com a expansão do setor

privado, muitos cursos noturnos de baixo curso foram abertos desde o final da década de 1990,

dispersos por cidades nos centros comerciais, com limitados recursos de biblioteca e estudo

autônomo. “A desagregação, portanto, sinaliza o fim do programa de estudo, no qual os

acadêmicos direcionam a aprendizagem através de um processo de seleção e sequenciamento

do conteúdo do conhecimento” (MCCOWAN, 2018, p. 470). Para o autor, os MOOCs seriam

a manifestação mais evidente do processo de desagregação. Talvez resida nesse item, entre

tantos outros, uma das maiores preocupações desse pesquisador no que tange às funções da

universidade.

O panorama da educação superior vem se transformando significativamente,

principalmente, pelo crescente interesse por parte de governos, instituições educacionais e

empresas por cursos on line abertos e massivos. Embora os MOOCs tenham se tornado uma

relevante plataforma para aumentar a acessibilidade à educação superior e à inovação da

educação on line, eles também geram preocupações. Sobretudo, por questões pedagógicas,

como acentua McCowan, no que diz respeito à garantia de qualidade e baixas taxas de

finalização, bem como de certificação e reconhecimento da aprendizagem.

As preocupações de McCowan encontram ressonância nas afirmações de Bates (2012)

quando este afirma que os MOOCs envolvem essencialmente estudo individual e que a falta de

interações pessoais e de discussões ao vivo dificulta uma resposta plena às necessidades

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individuais dos estudantes; métodos didáticos tidos como antiquados, os quais, em sua maioria,

baseiam-se na transmissão da informação, trabalhos corrigidos por computador e avaliação por

pares. Segundo Bates (2012), alguns mitos estão associados à propagação dessa modalidade de

ensino: (i) a de que os MOOCs aumentam o acesso ao ensino superior nos países em

desenvolvimento; (ii) a de que usam novas pedagogias de ensino; (iii) a de que o acesso a um

grande número de informações vai melhorar o ensino; e (iv) a de que os computadores

personalizam o ensino. Para o pesquisador “qualquer tentativa de tornar o conhecimento de

alguns dos principais especialistas do mundo disponível para qualquer pessoa gratuitamente é

um excelente empreendimento. Se apenas parasse ali” (BATES, 2012).

Ao analisar os apontamentos de McCowan (2017; 2018) sobre ensino superior e

desagregação e a evolução do ensino a distância no Brasil, algumas intersecções e inferências

podem ser estabelecidas ao observar o comportamento das universidades comunitárias.

No Brasil, como já se mencionou, a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB no.

9.394/1996), no artigo 80, cujo caput dispõe que “o Poder Público incentivará o

desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e

modalidades de ensino, e de educação continuada.” Com isso, abre-se espaço para a oferta de

cursos na modalidade a distância, em especial em nível superior (GOMES, 2013). Porém, essa

modalidade educacional somente foi regulamentada em 2005 pelo Decreto n° 5.622, que traz

em seu Art 1º a seguinte conceituação:

Art 1o. Para os fins deste Decreto, caracteriza-se a Educação a Distância como modalidade educacional na qual a mediação didático-pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos (BRASIL, 2005a).

Várias iniciativas privadas e decretos governamentais foram responsáveis pela criação

e desenvolvimento da Educação a Distância (EaD) no Brasil. Em sua trajetória a EaD passou

pela era do correio, do rádio e da televisão e hoje chega à era da internet, acompanhando as

mudanças tecnológicas no país. Em cada época, sucessivos governos a têm aplicado “como

uma forma economicamente viável de ampliação do acesso para superar a defasagem

educacional latente em diversas regiões do país” (GOMES, 2013, p. 14). Utilizada para ampliar

consideravelmente o número de alunos, baratear os custos e maximizar os lucros, a EaD tem

representado papel importante na expansão do ensino superior privado brasileiro (GOMES,

20013).

Frente à sua impotência em ofertar para população um número satisfatório de

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universidades federais capaz de absorver uma quantidade razoável da demanda de alunos

existentes, o governo vem criando alternativas para contemplar o maior número possível de

indivíduos. Assim, políticas de estímulo ao alargamento da capacidade de oferecimento dos

cursos superiores passam a ser centrais, e incentivos como o Programa Universidade para todos

(Prouni), o Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) e a criação

da Universidade Aberta do Brasil (UAB), em 2005, surgem como possibilidade de aumentar a

oferta de ensino superior. Essas iniciativas, deram à Educação a Distância novas perspectivas

no sentido de se consolidar como política pública à medida que seu oferecimento e regulação

vão se institucionalizando (BORGES; JESUS; SILVA, 2013).

Some-se a elas o surgimento de três organizações que também impulsionaram a

expansão dessa modalidade no Brasil, quais sejam: a Associação Brasileira de Teleducação -

ABT, o Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação - IPAE e a Associação Brasileira de

Educação a Distância - ABED (ALVES, 2009). A ABED foi criada em 1995 por um grupo de

educadores que tinham interesse em tecnologias de aprendizagem e em Educação a Distância e

é considerada uma sociedade científica sem fins lucrativos e tem como missão: "Contribuir para

o desenvolvimento do conceito, métodos e técnicas que promovam a educação aberta flexível

e a distância" (ABED, 2019). No sítio da ABED (2019), vários catálogos são oferecidos com

um rol de mais de 300 fornecedores de produtos e serviços para educação a distância, bem como

um catálogo com mais de 2.300 profissionais de diversas áreas do conhecimento, muitos com

nível de mestrado e doutorado, oferecendo seus serviços em educação a distância.

Em 2017, o último Censo do Ensino Superior no Brasil, divulgado pelo Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), do Ministério da

Educação (MEC), revelou um crescimento das matrículas no nível superior de ensino,

principalmente no setor privado. As matrículas, neste setor, cresceram de 3,9 milhões em 2007

para 6,2 milhões em 2017, em contrapartida, o crescimento por via do setor público foi de 1,3

milhão para 2,1 milhões nesse mesmo período. O setor privado, atualmente, responde por

75,3% das matrículas. O Ensino a Distância se destaca nesse palco. Em 2007, 85% das

matrículas eram presenciais, e apenas 15% no EaD; em 2017, a presença de ingressantes no

EaD já corresponde a um terço das matrículas. Para Neves (2019) “tudo leva a crer que, nos

próximos dez anos, a contribuição do EaD para a expansão do ensino superior no país será ainda

maior.” E acredita que “num futuro próximo, os sistemas de ensino superior partirão cada vez

mais para uma oferta de cursos híbridos, combinando disciplinas presenciais com outras através

da modalidade a distância.” Para os gestores das universidades comunitárias essa expansão vem

criando alguns dilemas quanto ao oferecimento desta modalidade. Afirma R4,

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Nós estamos exatamente agora discutindo educação a distância. Nós vamos fazer educação a distância porque realmente não tem muita saída. Não tem. Nós vamos ter que fazer educação a distância. Agora temos uma (faculdade) reconhecida e estamos criando mais nove cursos. Vamos criar sete polos. Mas a questão é: qual é o nosso diferencial? Como é que nós vamos garantir a nossa marca e a nossa história de 48 anos nesses cursos? Nós não podemos banalizar como têm muitos fazendo. Nós temos que mostrar que nós podemos fazer uma educação a distância sim, com muito mais responsabilidade, muito mais qualidade. Então, isso sempre vem nas nossas discussões. (R4, 2016).

O tom da fala conduz a uma certa contrariedade à oferta dessa modalidade de ensino.

Afirmações como Nós vamos fazer educação a distância porque realmente não tem muita

saída. Não tem. Estamos criando mais nove cursos. Vamos criar sete polos. Revela a submissão

às regras de um mercado que se apresenta como uma realidade indiscutível, impositiva e gera

preocupações, principalmente com a manutenção da qualidade de ensino ofertado. É certo que

a EaD, mediada por tecnologias comunicacionais, diminui de fato as fronteiras físicas e

revoluciona a noção de espaço, tempo e aprendizagem, mas também apresenta suas limitações.

Não basta ter acesso a uma rede, um domínio mínimo sobre o uso das tecnologias é necessário,

além de conhecimento prévio que o permita ao estudante relacionar conteúdos com os recursos

disponibilizados nas plataformas de ensino. Por isso a pertinência das preocupações colocas

pelo gestor com relação à necessidade constante de se pensar os caminhos que a EaD precisa

percorrer para alcançar uma formação pautada em qualidade de ensino.

Igualmente preocupado se mostra R2, em seu depoimento.

Nós devemos estar hoje, na graduação com dezesseis mil alunos. Já estivemos com dezoito, dezenove mil na graduação, mais pós-graduação e o ensino médio. Nós chegamos a quase vinte e dois mil alunos. Então houve uma redução muito grande neste período. Algo que nós estamos ainda absorvendo para ver como vamos estabilizar. Temos percebido a redução muito grande de alunos nos campi. Campi que nós tínhamos aí setecentos, oitocentos alunos, hoje estamos com duzentos e cinquenta, trezentos. Então houve uma redução muito grande porque lá também teve concorrência. O EaD em algumas situações, ele tem tirado o aluno da sala de aula e não consegue dar a qualidade que promete. Então o aluno sai iludido, porque paga menos e estuda quando quer, mas, na verdade, é um engodo enorme, enorme (R2, 2016).

Há duas preocupações visíveis na fala do gestor: redução do número de alunos

frequentadores da universidade e a oferta de cursos EaD a baixo custo. A primeira motivada

pelo aumento do número de instituições privadas Na região nós temos várias instituições. [...]

têm várias faculdades isoladas, [...] Nós temos, aqui, na cidade, hoje, acho que dezessete ou

dezoito cursos superiores. A concorrência, ela é muito grande (R2, 2016). E a segunda, pela

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oferta de cursos EaD, o EaD tem tirado o alunado da sala e não consegue dar a qualidade

que promete, o aluno sai iludido, porque paga menos e estuda quando quer, (R2, 2016) o que

também vem motivando a evasão do alunado.

Lisoni e Loyolla (2004) ao comparar os custos entre educação Presencial e a Distância

constataram que os custos de implantação e operação de cursos presenciais são superiores aos

de cursos a Distância, sendo estes economicamente mais viáveis quando a intenção é buscar o

equilíbrio entre oferta e demanda. Assim, fatores como a necessidade de incluir mais pessoas

em cursos superiores imposta pelo mundo do conhecimento, a demanda crescente por educação

em nível superior, e a escassez de recursos para tais atendimentos, atrelados aos incentivos de

ações do setor privado e decisões tomadas no âmbito das políticas públicas, se apresentam em

terreno fértil para o aumento da prática da educação a distância no Brasil, tornando o cenário

cada vez mais difícil para as universidades comunitárias, as quais oferecem mais de 90% de

seus cursos na modalidade presencial. R4 comenta

Tem muitas (instituições) cedendo (ao mercado). E, aí, cedendo, entra numa lógica, como que eu vou dizer, numa lógica, numa série de diminuição das suas funções como universidade. Porque a lógica, lá, é pelo menor custo, pelo menor preço, pela pressa, por um monte de coisas. E isso é muito perigoso. Se quisessem destruir o próprio planeta, elas iam entrar nessa lógica doida. (R4, 2016).

Em sua fala faz uma analogia interessante com o canto da sereia. [...] A gente não pode

cair também nesse outro extremo [...] que nem Ulisses lá, o canto da sereia, e achar que aquilo

é são mil maravilhas, porque é sedutor aquilo que está sendo dito ali fora. Ou seja, o gestor

está ciente de que não é tão simples assim fazer mudanças em modelos de ensino. Todos

requerem muito planejamento e boa execução para que efetivamente possam surtir bons

resultados.

E continua R2 [...] os outros cursos da cidade, enfim, as demais instituições, elas fazem

o que nós fazemos também. Como é que nós vamos nos diferenciar? O dilema se estabelece

quando a realidade bate à porta e coloca em risco a própria existência da instituição. No final

do primeiro semestre de 2018, os polos de ensino EaD somavam 15.394 unidades. O número

representa um crescimento de 133% em relação a 2017 (ABED, 2018). Entre os fatores

responsáveis pelo crescimento está a edição do Decreto nº 9.057, em maio de 2017 (BRASIL,

2017), que regulamentou a modalidade de ensino, mas flexibilizou as exigências para a

implantação dos polos. Com o Decreto, as IES passaram a poder implantar cursos a distância

sem a obrigação de oferecer cursos presenciais.

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Esse cenário expansionista foi impulsionado também, em parte, pela publicação, no

final de 2018, da Portaria nº 1.428, que dispõe sobre a oferta, por IES, de disciplinas na

modalidade a distância em cursos de graduação presencial e da Portaria nº 275, que dispõe sobre

os programas de pós-graduação stricto sensu na modalidade a distância. E então ecoa

novamente a pergunta: Como é que nós vamos nos diferenciar? Como as universidades

comunitárias podem se posicionar frente a mudanças tão agressivas e velozes que adentram o

universo da educação presencial e fomentam a educação a distância? Ao fazer-se esse

questionamento, é visível a preocupação do gestor com a possível perda dos traços que

caracterizam a instituição e que a tornam singular. Essa situação traz à tona, novamente,

algumas reflexões sobre identidade organizacional.

Bretas Pereira (1988, p. 20), afirma que “O caráter ou identidade é a marca que a

diferencia de todas as outras. Somente ao tornar-se infundida de valor, a organização adquire

uma identidade”. Assim, o que torna uma organização única e ímpar são suas maneiras

peculiares de agir e de acreditar, por meio da sua cultura organizacional a qual indica a relação

dos valores e crenças. Consciente da natureza comunitária de sua instituição, consciente da

natureza do valor instrumental dado ao conhecimento e da característica indissociabilidade das

funções ensino, pesquisa e extensão, o gestor vê ameaçadas tais singularidades, na medida em

que se sente pressionado a oferecer um produto que pode se assemelhar a tantos outros no

mercado, dada a concorrência de instituições privadas que competem com base no menor preço

das mensalidades.

A preocupação dos gestores é pertinente. É notória a complexidade dos indicadores de

qualidade dessa modalidade de ensino cuja proposta precisa estar integrada ao Plano de

Desenvolvimento Institucional e à comunidade. O compromisso institucional na formação dos

profissionais coloca-se como prioridade quando a questão é a qualidade de ensino que se deseja

oferecer, compromisso este expresso em itens como concepção de educação e currículo no

processo de ensino e aprendizagem; sistemas de comunicação; material didático; forma de

avaliação; equipe multidisciplinar; infraestrutura de apoio; gestão acadêmico administrativa e

sustentabilidade financeira.

Observando o quadro 9 e retornando aos PDIs das universidades comunitárias, vê-se

um movimento no sentido de adaptar-se às novas políticas públicas para a EaD, por meio do

oferecimento de EaD, ao mesmo tempo em que todas elas buscam garantir a qualidade que

sempre lhes foi cara. Para UNI1 a utilização de ambientes de aprendizagem na modalidade a

distância surge como oportunidade de criação de outros espaços formativos, rompendo com

modelos tradicionais de ensino e de aprendizagem, centralizados no professor (UNI1, PPI,

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128

2017-2021, p. 32). Para isso, a Universidade disponibiliza o serviço de Assessoria à Educação

a Distância, que tem por objetivo construir, apoiar e ampliar a cultura de EaD na Instituição.

E continua

A concepção é de uma educação atualizada e inovadora; um sistema de comunicação amplo e adequado; um currículo e material didático qualificado para a modalidade; avaliação adequada que leve em consideração o processo de aprendizagem; apoio de uma equipe multidisciplinar; infraestrutura de apoio; gestão acadêmico-administrativa, além de mecanismos que garantam a sustentabilidade financeira (UNI1, PPI, 2017-2021, p. 32).

Para UNI2 a EaD é uma modalidade de ensino que não substitui a presencial. Constitui-

se numa alternativa pedagógica, comprometida com o processo de formação humana, para

ampliar as possibilidades de acesso ao saber científico. Para sua efetivação, a UNI2 planeja

ampliar a oferta de cursos de graduação, extensão e pós-graduação, tanto nos formatos a

distância quanto nos híbridos (UNI2/PPI, 2017, p. 106). Entre as políticas que norteiam as ações

da UNI4 relativas à implementação da EaD estão as seguintes: fortalecimento da cultura

institucional de EaD em todos os níveis de atuação da IES, comprometimento com a qualidade

nos projetos em EaD, ampliação do acesso aos cursos de educação superior, formação

continuada dos profissionais na EaD, gestão colaborativa da EaD e disponibilização de recursos

e infraestrutura tecnológica e profissional (UNI4/PPI, 2017, p. 80). Tais políticas se veem

descritas com muita semelhança no PPI da UNI3. Incluam-se na lista: ampliação de parcerias

internas e externas para a oferta de cursos e serviços em educação a distância, adequação e

aprimoramento dos processos administrativos e acadêmicos da instituição para atendimento às

especificidades da EaD.

Ao descrever o modelo de EaD projetado, a UNI3 informa que este segue um desenho

híbrido, ou seja, vídeo aulas são disponibilizadas em conjunto com o uso de materiais

impressos, com alguns encontros presenciais.

Talvez o que chame a atenção da modalidade EaD seja a quantidade de alunos que são

atendidos por um único professor ou tutor. E como se dá o monitoramento do processo de

aprendizagem deste estudante? É possível acompanhar o desenvolvimento das habilidades e

competências desse alunado?

Oferecer um ensino com custos mais acessíveis, com menos tempo na universidade,

mais flexibilidade curricular “são apenas sinais dos tempos”, afirma Neves (2019). O acesso ao

conhecimento não está mais necessariamente restrito a uma sala de aula com um professor

presencial, mas se dá também por meio de diferentes canais.” Neves ainda argumenta que o

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fato de ser um curso presencial não lhe garante qualidade. Caso o país queira, efetivamente,

cumprir o que está posto na meta 12 do Plano Nacional de Educação (PNE): chegar a 33% de

jovens entre 18 e 24 anos, no ensino superior, até 2024, deverá expandir com qualidade a oferta

deste nível, e “o ensino a distância pode ser um instrumento importante para esse fim, desde

que a sua qualidade seja assegurada” (NEVES, 2019).

Para Rocha (2019) para se tornar um concorrente não basta mudar de modelo presencial

para híbrido, ou 100% EaD para híbrido. Deve-se ter o cuidado com a seleção e qualificação

do corpo técnico e dos professores, o investimento em marketing digital integrado com políticas

de captação e manutenção do estudante, investimento em flexibilização da oferta baseada em

fatores de riscos regionais e culturais, investimento na infra tecnológico-digital dos polos, oferta

de mestrado e doutorado a distância regionais, pelos polos. Enfim, parece que, tão importante

quanto a decisão de mudar de modelo, é pensar no tipo de “pacote” será oferecido ao potencial

“cliente” (MCCOWAN, 2018).

Essas questões levam a reflexões sobre a EaD no ensino superior dentro do que seriam

suas possibilidades e seus limites de seu uso. Teriam as universidades comunitárias capacidade

para promover a expansão do ensino superior em quantidade e qualidade que a modernidade

exige? Seus PPIs descrevem suas políticas de expansão em EaD, apresentam suas metas e

objetivos, mas estariam elas preparadas para sofrer alterações no que tange à defesa da tese da

indissociabilidade do ensino, pesquisa e extensão? Novos tempos, novas adaptações, novas

identidades? Há uma lógica na expansão do ensino superior brasileiro, claramente privatista,

quantitativista e concentrada em determinadas áreas do conhecimento. A EaD não está,

obviamente, alheia a esse fenômeno. Apesar das potencialidades encontradas nessa nova

modalidade educacional, é pertinente refletir se a sua ampliação representa de fato um caminho

para democratização do ensino superior e consequente formação crítica do cidadão (DIAS

SOBRINHO, 2005; NASCIMENTO; CARNIELLI, 2007; COSTA; COCHI, 2013; VIEIRA;

SILVA; VIEIRA, 2017).

Buscou-se ilustrar, por meio da contextualização da EaD, um dos dilemas por que

passam as universidades comunitárias no que tange a uma de suas funções, o ensino. A EaD e

seus desdobramentos, atrelada às políticas públicas para o ensino superior, talvez seja,

atualmente, um dos fenômenos que mais represente os processos de mercantilização e

desagregação, nos quais o desenvolvimento dos fins e dos meios da educação superior se

reorienta conforme os princípios e a lógica do mercado, e sob os quais “a educação, gradativa

e progressivamente, perde o status de bem público e assume a condição de serviço comercial”

(BERTOLIN, 2011, p. 237).

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130

Longe de esgotar as aflições dessas instituições, ainda aparecem no cenário

preocupações ligadas à internacionalização, movimento este em resposta aos inúmeros desafios

advindos do processo de globalização e que passou a ser reconhecida como um diferencial de

qualidade e de competitividade na oferta do ensino superior. Programas de internacionalização

no campus (IaH) e/ou de internacionalização de currículos (IoC) objetivam expor todos os

alunos de uma instituição a um currículo que contemple a orientação internacional e

multicultural, não mais se prendendo à função pesquisa, exclusivamente, mas estendendo-se à

função ensino. Todos os PDIs analisados trazem as políticas voltadas a esse universo e

descrevem seus objetivos e esforços investidos nessa dimensão. Este é outro item que merece

estudo e detalhamento em momento oportuno.

Outro componente importante da tríade é a pesquisa. Talvez a função universalmente

reconhecida da universidade, porque estabelece estreita relação com a formação humana e com

o desenvolvimento da sociedade, seja a construção de conhecimentos. Para Vannucchi (2011,

p. 53), “pesquisa é questionamento sistemático e criativo da realidade. É espírito investigativo

crítico em qualquer ação pedagógica; É a curiosidade consequente e coerente de quem assume

postura de reflexão construtiva e propositiva em face a realidade.” Vista assim, a pesquisa

pressupõe a busca sistemática do saber, alcançada pela desconstrução dos conhecimentos, como

caminho necessário para a construção de algo novo.

Para que uma instituição possa ser reconhecida oficialmente como “universidade”, a

produção de conhecimentos sistemática e em alto nível é uma entre tantas das exigências legais.

A legislação nacional, ao estabelecer os parâmetros fundamentais da uma universidade, indica

como divisor de águas entre ela e as demais instituições de ensino superior, a indissociabilidade

entre ensino, pesquisa e a extensão, “pilar da universidade como construtora do saber, de um

saber que transforma e que se comunica, que se irradia” (LIMA, 2009, p. 93). Entre as

condições, critérios e indicadores que devem atender uma Universidade, também figuram:

produção científica e intelectual consolidada, linhas e grupos de pesquisa definidos, patamares

de tempo integral e de formação dos docentes em nível de pós-graduação stricto sensu, com

destaque para o doutorado (Decreto nº 2.207, de 15 de abril de 1997) (DIAS SOBRINHO,

1998). Portanto, as exigências para trazer no nome a denominação “universidade” são muitas

e, se aplicam, portanto, às universidades comunitárias.

Ao analisar os elementos que sustentam a missão das instituições comunitárias em

estudo, ficou evidente o grau de relevância atribuído à pesquisa por essas instituições:

“Produzir, sistematizar e socializar conhecimento [...]” (PDI/UNI1), “Produzir e difundir

conhecimentos que promovam a melhoria da qualidade de vida [...] (PDI/UNI2); “Produzir e

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131

socializar o conhecimento pelo ensino, pesquisa e extensão[...]” (PDI/UNI3); “Promover, por

meio do ensino, da pesquisa e extensão, o desenvolvimento regional para melhorar a qualidade

[...]” (PDI/UIN4). A expressão “produzir conhecimento” se apresenta enfaticamente, o que

traduz a convicção de que “sem o cultivo da atividade científica e do pensamento crítico em

qualquer ação pedagógica, não conseguirá gerar conhecimento, nem provocar avanços

tecnológicos, nem formar profissionais competentes e socialmente comprometidos”

(VANNUCCHI, 2011, p. 54). A busca pelo conhecimento, assim, parece indissociável à

concepção que essas instituições têm sobre seu papel como universidades comunitárias.

A pesquisa é “um processo de construção do saber que objetiva a produção e/ou a

ampliação do conhecimento científico e tecnológico” (PPI/UNI4, 2017, p. 43), processo este

fundamentado nas ações da pós-graduação e que se difunde nas ações de ensino e nas ações da

extensão, sedimentando a indissociabilidade entre os três elementos. Em seu PPI, a UNI2

defende que a qualidade do ensino universitário depende da prática investigativa da instituição.

Considerando a velocidade com que o conhecimento se transforma, sem a pesquisa, o ensino

acadêmico perderia o seu caráter formativo, tornando-se meramente informativo. Este já é um

argumento suficiente que compromete a universidade a estimular a formação de grupos de

pesquisa, compostos por docentes e discentes, nas mais diferentes áreas do conhecimento, a fim

de promover a reflexão sistemática e racional da realidade, bem como desenvolver

competências em busca de respostas que superem os desafios em torno das diferentes

problemáticas presentes na sociedade (PPI/UNI2, 2017).

Ao fazer uma fotografia do quesito Pesquisa, presente no quadro 10 constata-se um

volume substancial de ações das universidades comunitárias com o intuito de promover a

construção do conhecimento, principalmente voltadas ao desenvolvimento onde estão inseridas.

Quadro 10 – Principais Atividades de Pesquisa das Universidades Comunitárias

ATIVIDADES DE PESQUISA – UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 11 Cursos de Doutorados

17 Cursos de Mestrados

70 Cursos de Especialização

93 Grupos de Pesquisa cadastrados no CNPq;

331 Linhas de pesquisa

269 Bolsas de Pós-Graduação

219 Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica

21 Núcleos de Inovação e Desenvolvimento

Parque de Ciência, Tecnologia e Inovação

Incubadora Tecnológica e Startups

6 Cursos de Doutorado

15 Cursos de Mestrado

57 Cursos de Especialização

322 projetos de pesquisa

90 Grupos de Pesquisa cadastrados no CNPq;

Mais de 200 Linhas de Pesquisa

Mais de 200 Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica

Incubadora Tecnológica e Startups

Parque Científico e Tecnológico do Planalto

6 Cursos de Doutorado

11 Cursos de Mestrado

35 Cursos de Especialização

24 Cursos de especialização EAD

311 projetos de pesquisa

101 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq;

Mais de 400 bolsas de Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica

Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares – ITCP

UNIINOVA – Núcleo de

2 Cursos de Doutorado

7 Cursos de Mestrado

28 cursos de Especialização

379 projetos de pesquisa

121 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq

Mais de 200 bolsas de Iniciação Científica

IPARQUE – Parque Científico e Tecnológico

IPAT- Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnológicas

IDT – Instituto de Engenharia e Tecnologia

IALI – Instituto de Alimentos

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132

ATIVIDADES DE PESQUISA – UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 110 Registros de patentes no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual – INPI

Instituto de Biotecnologia, Instituto de Pesquisas Clínicas para estudos Multicêntricos; Instituto de Materiais Cerâmicos; Instituto de saneamento ambiental; Instituto Memória Histórica e Cultural; Instituto de Pesquisas econômicas e sociais

EDITORA: Publicação de mais de 1.200 títulos

PUBLICAÇÕES: 10 revistas acadêmicas

Participação programas de financiamento: FIES, PROUNI

Comitê de Ética em Pesquisa

Médio

Parque de Geração Solar Fotovoltaica

Museu Histórico, de Artes Visuais e Zoobotânico

EDITORA: Publicação de mais de 800 títulos

PUBLICAÇÕES: 12 revistas acadêmicas

Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI

Comitê de Ética em Pesquisa

Inovação e Tecnologia

ITE – Incubadora Tecnológica Empresarial

CERUMA(R) - Parceiro Propriedade Intelectual

Instituto de Pesquisas Sociais

Museu Oceanográfico

EDITORA: Publicação de mais de 160 títulos

PUBLICAÇÕES: 5 revistas acadêmicas

Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI, FUMDES

Comitê de Ética em Pesquisa

IPESE – Instituto de Pesquisa Socioeconômica Aplicada

ITEC IN – Incubadora Tecnológica de Ideias e Negócios

Incubadora Tecnológica e Startups

Planetário

Museu de Zoologia - Centro de referência na pesquisa científica, na educação ambiental e no turismo cultural

Museu Tecnológico

Museu Mineralógico

EDITORA: Publicação de mais de 100 títulos entre 2013-2018

Participação Programas de financiamento: FIES, PROUNI, FUNDES

Comitê de Ética em Pesquisa

Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e Sítios eletrônicos – Período de referência 2017-2018

Junto às ações de ensino, esse universo de pesquisa, alavancado pelo envolvimento de

centenas de pesquisadores e jovens estudantes transforma-se numa potencial força motriz na

busca de soluções para problemas de toda natureza que, por ventura, aquela comunidade possa

ter. Ao se referir à pesquisa, R2 afirma

A universidade sempre se caracterizou por fazer pesquisa. [...] Nós tínhamos em 2010, um doutorado. Hoje nós estamos com seis. E isto significa que esta ciência que é praticada aqui, ela não está escondida. Ela está à disposição da comunidade. [...] Na época, nós tínhamos sete programas de mestrado. Hoje nós temos dezesseis. Olha o que nós crescemos. Crescemos para quê? Para dizer que nós crescemos? Não. Crescemos exatamente para mostrar o nosso potencial” (R2, 2016).

As palavras do gestor são avalizadas no PPI da instituição, quando afirma:

Especialmente numa universidade que se classifica como comunitária, as ações de pesquisa

devem surgir das questões dessa comunidade e seus resultados devem traduzir-se em práticas

de inovação e iniciativas de extensão universitária (PPI/UNI2, 2017, p. 60). Ao se entrelaçar

os discursos, evidencia-se, mais uma vez, a tese de que a universidade leva o conhecimento à

comunidade por meio de ações de ensino e extensão, as quais se constituem fontes de pesquisa,

retroalimentando desta forma o ensino. O ensino e a extensão são geradores de novas pesquisas

na medida em que identificam necessidades e novos anseios na comunidade.

Dias Sobrinho (1998) comenta que a pesquisa normalmente é identificada como um

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133

trabalho de uma elite de cientistas que produz o avanço científico e tecnológico de alto nível, o

qual deve responder às mais importantes demandas de setores da sociedade, principalmente, ao

desenvolvimento do sistema industrial avançado, apesar de não ser a única definição sobre

pesquisa, afirma que ainda é a mais propagada. Porém, o autor acrescenta que há muitas

instituições com forte vínculo regional que desenvolvem investigações com qualidade e

relevância social, cuja natureza é outra. “Refiro-me àquele tipo de pesquisa que se realiza como

construção do conhecimento com forte sentido de pertinência” (DIAS SOBRINHO, 1998, p.

23). Igualmente o autor se refere à reconstrução de saberes com forte inserção local e a chama

de “pesquisa necessária” do ponto de vista social, para distingui-la da “alta pesquisa”. Para o

autor, ensinar e produzir conhecimentos, numa instituição educativa vai além do simples

treinamento e aplicação. Diz respeito “ao compromisso social dessa instituição, à sua função

pública” (DIAS SOBRINHO, 1998, p. 24). Isso remete à concepção de que o ensino e a

pesquisa devem estar intimamente ligados aos valores da própria sociedade que lhes serve de

referência. Ensino e pesquisa devem ter significação social, devem ter pertinência, isto é,

precisam estar enraizados no terreno das aspirações e contradições públicas” (DIAS

SOBRINHO, 1998, p. 24).

Ao fazer referência à política voltada à pesquisa, a UNI3 tem como um de seus objetivos

promover a produção e a disseminação do conhecimento, por meio do fomento à produção

científica e tecnológica docente e discente e do investimento em parcerias que consolidem a

pesquisa, a formação de recursos humanos e a cultura (PPI/UNI3, 2017). Esse objetivo

também é compartilhado pelas outras universidades e permeia o discurso de seus PPIs. Para

que esse objetivo se concretize programas institucionais de apoio à pesquisa e ações de inter-

relação entre pesquisa e ensino, do ensino médio à pós-graduação são fomentados pelas

instituições os quais estimulam o desenvolvimento da pesquisa e promovem a construção e a

disseminação de conhecimento (PPI/UNI3, 2017, p. 111). A concretização da associação entre

ensino, pesquisa e extensão não é trabalho fácil e não se realiza apenas no professor ou no

estudante: é tarefa institucional, a qual requer uma estrutura organizativa, “voltada para a

superação da fragmentação que marca o modelo usualmente adotado pelas instituições

educacionais, materializado na divisão social do trabalho entre os que decidem e os que

executam, originário do modelo empresarial burocrático e tecnicista” (MAZZILLI, 2011, p.

218).

Vários pré-requisitos se apresentam como condição sine qua non para a consecução da

associação entre ensino, pesquisa e extensão, entre eles estão: elaboração de projetos

institucionais que apresentem as diretrizes e orientem as ações previstas para sua realização;

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projetos coletivos de trabalho, interligando ações acadêmicas e administrativas; práticas de

avaliação institucional considerando todo o trabalho realizado pela universidade; modelos de

gestão que possibilitem a participação de todos os segmentos no processo de decisão e de

avaliação do trabalho acadêmico; corpo docente com sólida formação científica e pedagógica,

organicamente vinculada ao projeto da universidade; e condições materiais para a realização do

projeto pretendido (MAZZILLI, 2011). Essa breve descrição das condições mínimas

necessárias para promover o entrelaçamento da tríade que sustenta a instituição como

universidade, dá a dimensão das superações que as universidades comunitárias vêm

enfrentando nessa caminhada de mais de 50 anos na construção de sua identidade.

Outras ações sedimentam o objetivo de promover a produção e a disseminação do

conhecimento, descritas pela UNI4, como o fortalecimento do ambiente institucional para o

desenvolvimento da pesquisa, para isso investe na ampliação e atualização da infraestrutura,

estimula o surgimento de grupos e redes interinstitucionais de pesquisa, apoia o processo de

formação e qualificação de novos pesquisadores (UNI4, PPI, 2017). Ao fazer referência aos

seus programas de incentivo à pesquisa, R4 comenta

Cada programa de mestrado e doutorado nosso tem 12 horas/aula de pro estrito. Eles [os professores] têm o recurso todo ano para poder investir na sua pesquisa para apresentar trabalho, para gastar com material. O que eles precisam, todos eles têm. [...] Nós temos cerca de 160 grupos de pesquisa cadastrados no CNPq aqui dentro da universidade, hoje, e temos quase 70 financiados pela universidade. Tem política que inclui até alguns horistas também [...] se tem mínimo de 16 horas, eles também podem participar de alguns programas de pesquisa (R4, 2016).

Assim, com o apoio de seus gestores, a universidade comunitária, de modo proativo,

preserva e aprofunda as suas atividades de pesquisa, orientando e gerenciando os programas de

Bolsas de Estudo, buscando fontes financiadoras como CNPq, Finep, Capes e fundações

estaduais de apoio à pesquisa (Fapesp). No elenco de programas de incentivo oferecidos pela

UNI3, por exemplo, encontram-se os seguintes: Programa de Bolsas de Iniciação Científica

(Probic); Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic); Programa de Bolsas

de Pesquisa do Artigo 170 da Constituição Estadual; Programa Institucional de Bolsas de

Iniciação Científica do ensino Médio (PIBIC-EM); Artigo 171 – Fundo de apoio à Manutenção

e ao Desenvolvimento da Educação Superior do Governo do Estado de Santa Catarina;

Programa de Pesquisa Voluntária; Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em

Desenvolvimento Tecnológico e Iniciação (PIBITI/CNPq); Programa Institucional de

Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (Proinova). Observa-se que alguns programas de

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incentivo estão vinculados ao governo do Estado onde se situa a universidade, o que demonstra,

em parte, a preocupação por parte do poder público em alavancar e fortalecer as atividades

voltadas à formação de bons profissionais, bem como fomentar a produção de novos

conhecimentos que se traduzam em novas frentes de inovação para o Estado. Iniciativas de

parcerias com o Estado de origem também ocorrem nas outras universidades em estudo.

Para Demo (2006) não há como falar em universidade sem pesquisa, esta deve se dar

em um processo que perpassa toda a vida acadêmica. Conforme o autor, a pesquisa

É um princípio científico e educativo que faz parte do processo emancipatório. [...] Sem ela não há como falar de universidade, se a compreendermos como descoberta e criação. Somente para ensinar, não se faz necessária essa instituição e jamais se deveria atribuir esse nome a entidades que apenas oferecem aulas (DEMO, 2006, p. 36).

Oportunizada por trabalhos de iniciação científica, por monografias de conclusão de

curso, pela participação crescente de professores e acadêmicos em projetos e programas

desenvolvidos pelos departamentos e áreas do conhecimento da universidade, a pesquisa

garante “o suporte às atividades de ensino e de extensão, consolida grupos e redes, sustenta a

pós-graduação e a produção intelectual, realimenta e qualifica a extensão universitária”

(WAHLBRINCK; PACHECO, 2016, p. 20).

Os programas em nível nacional também são oferecidos por todas as universidades. Em

2017, foram ofertadas mais de mil e seiscentas (1600) Bolsas de Estudo, nos Programas de

pesquisa dessas universidades. São docentes e discentes que recebem auxílio para desenvolver

suas atividades em cerca de quatrocentos (400) grupos de pesquisa, ancorados em torno de mil

(1000) linhas de pesquisa. Esse cenário, certamente, vai impactar positivamente na

transformação da realidade no entorno dessas instituições. Por sua forte conexão com a região

onde estão instaladas, essas universidades desencadeiam um processo de desenvolvimento

técnico-científico de alto valor agregado. Junte-se a isso, os Institutos de pesquisa, os quais têm

contribuído eficazmente para a solução de problemas no campo educacional, empresarial e na

conservação e preservação ambiental (LIMA, 2009). Esse panorama conduz as universidades

comunitárias a fazer parte de um seleto rol de instituições avaliadas por diferentes entidades

(públicas e privadas) credenciadas, as quais julgam o trabalho realizado por elas, considerando

vários indicadores como pesquisa, internacionalização, inovação, ensino e mercado. Ao visitar

os PDIs e os Relatórios de Responsabilidade Social, foi possível colher uma série de

informações sobre os lugares que ocupam nos rankings nacionais e internacionais. O quadro 11

apresenta o resultado da participação entre 2017 e 2018.

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Quadro 11 - Rankings e Avaliações das Universidades Comunitárias entre 2017-2018 UC RANKINGS/AVALIAÇÕES UNI1

- 42ª entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2017 e 2018) - 2ª em Inovação entre as Universidades Comunitárias e Privadas do país (posição que se mantém) - Ranking Universitário da Folha (RUF)12. (2016-2018) - 5ª em Pesquisa, entre as 84 instituições de ensino superior comunitárias e privadas do país. (2018) - 20ª no ranking das universidades mais empreendedoras no Brasil, entre as 55 instituições de Ensino Superior avaliadas pela Emerge. (2018) - 1º lugar no ranking entre as universidades comunitárias e privadas mais empreendedoras, e 3º lugar na totalidade das instituições gaúchas avaliadas pela Emerge. (2018) - 75 cursos de graduação estrelados pelo Guia do Estudante da Editora Abril (2018) Índice Geral de Cursos - IGC13 - 2017, 2016 e 2015: conceito 3

UNI2

- 71ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2017 e 2018) - 4ª melhor entre as instituições privadas do Rio Grande do Sul - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 11ª melhor entre as IES públicas e privadas do Rio Grande do Sul - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 1º lugar Cursos de Agronomia e Medicina Veterinária oferecidos pelas IES privadas do Rio Grande do Sul - 8º lugar Curso Agronomia no ranking nacional entre todas as IES privadas do Brasil. - 56 cursos de graduação estrelados pelo Guia de Estudante da Editora Abril14 (2017) - 57 cursos de graduação estrelados pelo Gui de Estudante da Editora Abril (2018) Índice Geral de Cursos – IGC -2017, 2016 e 2015: conceito 3

UNI3

- 74ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2017) - 75ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 18ª melhor universidade brasileira entre as não públicas Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 1º lugar melhor Curso de Turismo e Hotelaria de Santa Catarina Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 51 cursos de graduação estrelados pelo Guia de Estudante da Editora Abril (2018) - 29ª posição entre públicas e privadas brasileiras (IGC/ MEC) (2018) - 6ª posição entre as instituições sem fins lucrativos (IGC/MEC) (2018) - 1ª posição Melhor universidade não pública de Santa Catarina – (IGC) (2018) - Está entre as 81 melhores universidades da América Latina - Times Higher Education (THE)15. - 32ª no ranking geral entre as instituições brasileiras e a 7ª entre as não-estatais (Times Higher Education) (2017) - 3ª melhor organização para trabalhar, no ranking das Grandes Empresas, em Santa Catarina (consultoria Great Place to Work (GPTW)(2017) - 10ª colocada entre todas as IES do Sul do Brasil e a 4ª não-pública (Times Higher Education) (2017) Índice Geral de Cursos – IGC 2018: conceito 4 2017: conceito 3

UNI4

- 76ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2017) - 87ª melhor entre as públicas e privadas do país. - Ranking Universitário da Folha (RUF) (2018) - 2ª melhor instituição entre as Universidades Comunitárias de Santa Catarina (IGC/MEC) (2017) - 18 cursos de graduação estrelados pelo Guia de Estudante da Editora Abril (2017 e 2018) - 18ª melhor Universidade do país entre as instituições não públicas do país (RUF) 2017 - 1ª posição entre as IES não públicas em Santa Catarina, no quesito pesquisa (RUF) 7ª melhor IES do Brasil (2017) - 62ª melhor em pesquisa do país entre as instituições públicas e não públicas (RUF) (2017) - No quesito internacionalização, a Universidade saltou do 35º lugar no ranking nacional das instituições não públicas em 2016 para a 11º posição (2017) - 2ª melhor IES Empreendedora do Brasil, entre as não públicas (Índice das Universidades Empreendedoras). Estudo realizado pela Brasil Júnior, com apoio da consultoria McKinsey, divulgado na Revista Pequenas Empresas & Grandes Negócios (2016) Índice Geral de Cursos – IGC 2018 e 2017: conceito 3

Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs e dos Relatórios de Responsabilidade Social das universidades comunitárias. Período 2017-2018

12 O RUF - Ranking Universitário Folha - é uma avaliação anual do ensino superior do Brasil feita pela Folha desde 2012. Há dois produtos principais: o ranking de universidades e os rankings de cursos. No ranking de universidades estão classificadas as 196 universidades brasileiras, públicas e privadas, a partir de cinco indicadores: pesquisa, internacionalização, inovação, ensino e mercado. No ranking de cursos é possível encontrar a avaliação de cada um dos 40 cursos de graduação com mais ingressantes no Brasil de acordo com o último Censo da Educação Superior disponível, a partir de dois indicadores: ensino e mercado. Nos rankings de cursos são avaliadas universidades, centros universitários e faculdades (Fonte: https://ruf.folha.uol.com.br/2018/o-ruf/). 13 O índice Geral de Cursos Avaliados da Instituição – (IGC) é um indicador de qualidade que avalia as Instituições de Educação Superior (Fonte: http://portal.inep.gov.br/indice-geral-de-cursos-igc-). 14 O Guia de Estudante da Editora Abril é uma pesquisa feita, basicamente, com professores e coordenadores de curso. Eles emitem conceitos que permitem classificar os cursos em bons (três estrelas), muito bons (quatro estrelas) e excelentes (cinco estrelas) (Fonte: https://guiadoestudante.abril.com.br/universidades/entenda-a-avaliacao-de-cursos-2017-do-guia-do-estudante/). 15 O Times Higher Education um dos rankings mais respeitados do mundo. Junto com o QS Ranking e o Academic Ranking of World Universities, é uma das mais importantes classificações educacionais do mundo. O ranking avalia universidades fortes em pesquisa do redor do mundo e baseia-se nos principais critérios que guiam uma instituição: ensino, pesquisa, transferência de conhecimento e visão internacional. São usados 13 indicadores no intuito de deixar a relação entre as universidades a mais justa possível (Fonte: https://www.lae-edu.com.br/lae-responde-times-higher-education).

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137

Observa-se que as universidades comunitárias estão sendo avaliadas por diversas

entidades credenciadas a lhes aferir notas e conceitos, partindo de determinados indicadores de

qualidade, entre eles pesquisa, internacionalização, inovação, ensino e mercado. Os indicadores

apontam posição em nível internacional, nacional e estadual, contemplando instituições

públicas e privadas, bem como universidades, centros universitários e faculdades. A UNI1 se

destaca nos quesitos pesquisa e empreendedorismo, mantendo a 42ª posição no Ranking

universitário da Folha – RUF, por dois anos seguidos; a UNI1 se destaca no cenário estadual,

apresentando suas boas performances em relação às instituições privadas. Sobre novas

estratégias de se fazer perceber nesse mercado, R2 comenta

Então, nós vamos fazer uma comunicação institucional. Ela acaba não sendo percebida. Então nos últimos tempos nós já estamos fazendo assim: o curso de Direito, que a OAB recomenda. A Agronomia ganhou o prêmio “Os

melhores da terra”. Esse prêmio nós ganhamos da Revista Granja no mês passado. Esse prêmio é um prêmio que nos insere no cenário do agronegócio nacional. [...] E esse ano nós fomos agraciados e isso tem um peso enorme. Tem um peso grande (R2, 2016).

A UNI3 está entre as 81 melhores universidades da América Latina e - 32ª no ranking

geral entre as instituições brasileiras e a 7ª entre as não estatais; a UNI4 se destaca em pesquisa

e internacionalização, sendo que neste último quesito, saltou do 35º lugar no ranking nacional

das instituições não públicas em 2016 para a 11º posição (2017). Todas as universidades têm

cursos com estrelas, conquistadas por avaliações realizadas por professores e coordenadores de

curso, bem como se submetem à avaliação do INEP, o qual lança o Índice Geral de Cursos, a

partir de indicadores de qualidade. O panorama da pesquisa nas universidades comunitárias

parece estar bem representado no que tange às suas colocações frente às suas competidoras.

Seguindo as tendências da atualidade, essas universidades vêm empreendendo grandes

esforços na área da inovação. A inovação, juntamente com a pesquisa, é indispensável para a

disseminação do conhecimento, agregação de valor ao processo de formação dos estudantes e

ampliação da competitividade das organizações (PPI/UNI1, 2017, p. 36). A inovação hoje está

presente na sociedade, em todas as áreas e segmentos. Para Audi (2017, p. 75), “inovador não

é quem tem boas ideias, inovador é quem tem a capacidade de, com uma boa ideia nas mãos,

transformar o mundo a seu redor, agregando valor, seja econômico, social ou pessoal.” Dessa

forma, não basta ter uma boa ideia, é preciso aplicá-la, e tal forma que se possa, por meio de

processos, conceitos e produtos criar o novo e transformar o mundo, a fim de melhorá-lo. Parece

que essa concepção de inovação vem ao encontro da concepção de valor que as universidades

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comunitárias dão ao conhecimento, isto é, o conhecimento só tem sentido se percebido como

bem comum.

Assim, algumas políticas institucionais para a inovação podem ser citadas como: a

articulação da inovação no âmbito dos processos de ensino, pesquisa e extensão; interação com

ecossistemas nacionais e internacionais de inovação e empreendedorismo; incentivo ao

desenvolvimento de ambientes que estimulem a criatividade e a inovação; promoção de cultura

interna em vista da geração de ideias criativas, do aprendizado, da experimentação, da

proatividade, da aceitação do risco, do aprendizado de falhas, bem como da competitividade,

entre outras (PPI/UNI1, 2017, p. 37).

Para que uma universidade tenha características inovadoras, ela precisa romper com

certezas, dogmas e regularidades que marcaram seu passado. “A inovação nesse sentido se

constituiria como um rompimento com visões hegemônicas da modernidade reguladora. Nessa

circunstância, as inovações podem ser assim chamadas, quando favorecem novas articulações

entre o ser, o saber e o agir emancipatório” (LEITE, 2005, p. 8).

Continuando a elencar, a UNI4 descreve entre seus objetivos para a política de Inovação

os seguintes: contribuir para a formação de melhores profissionais e seres humanos, por meio

da excelência em ensino, pesquisa e extensão, promovendo o desenvolvimento regional

sustentável; desenvolver novos produtos, serviços, processos e tecnologias, com vistas ao

patenteamento, a comercialização de seus resultados e a transferência de tecnologias; difundir

e valorizar os conhecimentos adquiridos e experiências vivenciadas no processo de inovação;

estimular a criação de novos negócios, por meio da pré-incubação ou incubação; subsidiar as

atividades da instituição visando a sustentabilidade econômica (PPI/UNI4, 2017, p. 56). Com

o intuito de atingir tais objetivos, essas universidades vêm se movimentando no sentido de

instalar Núcleos de Inovação Tecnológica e criação de Parques Tecnólogos, bem como de

ampliar as ações voltadas às empresas Incubadoras (LIMA, 2009).

Orgulhoso de seu feito, R2 afirma: Nós inauguramos o parque tecnológico, e isso foi

um acontecimento. [...] Eu me empolgo demais ao falar da universidade, principalmente do

parque. Eu vejo o parque como a grande redenção da universidade pela área tecnológica.

Porque laboratório nós sempre tivemos. Em todos os cursos têm laboratórios. Mas nunca

tivemos um espaço próprio focado na inovação. E estamos apostando nisso (R2, 2016). Ao

falar sobre a sustentabilidade financeira, R4 mencionou que 10% do sustento da instituição

advinha da prestação de serviços do Parque Científico Tecnológico, daí a importância e a

necessidade de investir mais na área de inovação (R4, 2016). Todas as universidades estudadas

têm seus Núcleos de Inovação Tecnológica, “o que representa verdadeiros berçários dos novos

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e futuros empreendimentos das economias regionais e, consequentemente, da estadual” (LIMA,

2009, p. 98). Afirma R3: Nós não podemos ser um museu. Nós temos que ser vanguarda, e

para ser vanguarda em uma sala de aula e pegar essa meninada precisa estar afinado (R3,

2016). Observa-se, nas universidades, o surgimento de um novo modelo de ambientes de

geração de riqueza e crescimento econômico e social: os Parques Científicos, Tecnológicos ou

de Pesquisa. Caracterizados por serem instituições híbridas, que abrigam novos

empreendimentos de base tecnológica, como incubadoras, aceleradoras, espaços de coworking

e living labs e por gerarem intervenções de impacto onde se situam, os parques parecem ter

grande significado de conquista aos gestores e parecem representar uma alavanca aos

empreendimentos da instituição e, consequentemente, reflete na melhoria da qualidade de vida das

pessoas (AUDY, 2017).

Ainda em pesquisa, observou-se que essas universidades estão em conformidade com

os princípios da ética e das orientações dos órgãos legisladores no que tange à realização de

pesquisas com seres humanos e com animais, tendo todas em sua gestão um Comitê de Ética

(CEP) que avalia cada projeto encaminhado aos Programas de Pós-Graduação. Para manter seu

compromisso com a produção e a socialização do conhecimento, várias publicações

institucionais (periódicos, livros, anais, revistas) são disponibilizadas de forma gratuita em seus

portais. Os periódicos de divulgação científica institucionais encontram-se classificados nos

níveis de melhor qualidade (A e B), conforme classificação CAPES.

Difícil negar os impactos sociais e econômicos, na sociedade, do trabalho realizado

pelas universidades comunitárias em pesquisa. Em busca de respostas para superar as múltiplas

problemáticas advindas da realidade, pesquisadores desenvolvem competências e reflexões

sistemáticas a fim de produzir conhecimentos que possibilitem construir uma sociedade mais

justa e democrática, na qual o bem comum se sobrepõe aos anseios individualistas.

Mas....

A pesquisa também sofre os reveses da realidade que ora se apresenta na educação

superior. Entendida como uma dimensão da universidade, indissociável do ensino e da extensão

e que objetiva a produção do conhecimento científico, a pesquisa também tem enfrentado

grandes desafios no mundo da globalização. No Brasil, supostas soluções trazidas pelas

reformas, introduzidas pelo poder executivo, prometiam amenizar as crises dentro das

universidades. Muitas mudanças aconteceram, a mais reconhecida diz respeito à avaliação

(SGUISSARDI, 2006).

O crescimento de instituições privadas em todo país, favorecido pela flexibilidade da

LDB/1996, e pela nova roupagem dada ao ensino, que passou a atender o mundo globalizado e

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em constante transformação, requeria a constituição de um perfil eficiente e capaz de dar conta

das demandas do mercado. Apresenta-se aí, a nova configuração da universidade “que passa

constituir espaços de produtividade, mantendo características como eficiência e eficácia,

atingindo patamares de competitividade através de padrões de mensuração de resultados, com

vista à qualidade” (TENÓRIO; ANDRADE, 2009, p. 49). Essa competição é garantida pela

combinação entre desempenho e financiamento, os quais tornam-se critérios para alocação de

recursos e remunerações diferenciadas dentro de sistemas de ensino que até a pouco

trabalhavam com a noção de remunerações isonômicas (SOUZA; OLIVEIRA, 2003).

Nesse contexto, a avaliação aparece como elemento formal de regulação estatal, ao

mesmo tempo que permite garantir as finalidades utilitaristas de educação, na qual a

universidade passa a ser vista como uma prestadora de serviços à sociedade e não apenas como

um espaço de disseminação de conhecimento e pesquisa. A construção do “cidadão produtivo”

requerida pela nova ordem, instiga mudanças da base curricular, novas posturas metodológicas,

além de uma nova estrutura de organização e gestão institucional.

Em virtude da explosão do ensino privado e da diversificação, e com o pretexto de

manter a qualidade do ensino superior ofertado, instauram-se padrões e mecanismos de

controle, como a ampliação da avaliação de credenciamentos e reconhecimentos de instituições

e cursos e exames nacionais (FRANCO; LONGHI, 2011). “Neste desafio está embutido o da

gestão trilhar o caminho da interlocução para identificar os padrões essenciais no exercício da

autonomia sem incidir na lógica regulatória que privilegia a técnica e o mercado em detrimento

do homem” (FRANCO; LOGHI, 2011, p. 8). A avaliação, como um organizador qualificado,

“por si só não leva consigo a força da mudança, mas como um instrumento de controle pode

carregar o redesenho capitalista da universidade” (LEITE, 2005, p. 9).

As avaliações em larga escala se articulam a um conceito “que consiste numa sequência

periódica e ininterrupta de processos ou atividades de levantamento, tratamento e difusão de

resultados” (WAISELFISZ, 1993, p. 6). Porém, discutir seus dados, confrontá-los com outras

referências e práticas é fundamental, “pois elementos quantitativos não produzem avaliação, ou

seja, só há avaliação quando o qualitativo emergir do quantitativo” (ESQUINSANI, 2010, p.

133). Para a autora, os dados não podem ser apenas sínteses estatísticas nacionais e estaduais,

distanciados e abstratos. A discussão sobre o que emerge deve ser mais profunda, para que os

“processos e resultados possam ser reconhecidos e desdobrados localmente em seus

significados”, (ESQUINSANI, 2010, p. 133), envolvendo educadores, gestores educacionais e

a comunidade em geral.

Observa-se que as universidades comunitárias estão sendo avaliadas por diversas

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entidades credenciadas a lhes aferir notas e conceitos, partindo de determinados indicadores de

qualidade, entre eles pesquisa, internacionalização, inovação, ensino e mercado. Os indicadores

apontam posição em nível internacional, nacional e estadual, contemplando instituições

públicas e privadas, bem como universidades, centros universitários e faculdades. Essas

avaliações servem de parâmetro de produtividade ou resultado, ou como demonstração de

qualidade, ou ainda para promoção ou inspeção (BALL, 2004). A performatividade, objetifica

e mercantiliza o trabalho com conhecimento e se concretiza por meio de reuniões de avaliação,

elaboração de relatórios, publicações periódicas dos resultados. As informações são coletadas,

registradas e publicadas com frequência na forma de rankings, os quais, de alguma forma,

traduzem a submissão da comunidade acadêmica a julgamentos, mensurações, comparações e

metas. “Em essência, performatividade é uma luta pela visibilidade” (BALL, 2005, p. 548).

Nesse cenário, a avaliação é partícipe do quadro do redesenho, contribuindo com os

rankings nacionais que ganham destaque na imprensa e mostram ao país aquelas instituições

que estão com ótimos conceitos, quanto aquelas que poderão ser fechadas em virtude das baixas

notas. Embora, para alguns, as listas de classificação pareçam contribuir para a transparência

das informações e a responsabilização das instituições e venham responder à crescente demanda

por informações relativamente simples, acessíveis e bem apresentadas sobre a “qualidade” de

instituições de educação superior; para outros, a aplicação de um conjunto limitado de critérios,

considerando o forte desejo das instituições de estar entre as melhores, estimula a

homogeneização de instituições de educação superior (LEITE, 2002). “As avaliações geradoras

de ranking, que se baseiam em exames, não levam em consideração aspectos importantíssimos

de uma instituição de educação superior, tais como compromisso social, valores acadêmicos e

interação com a comunidade” (BERTOLIN, 2014, p.144). Para Nóvoa (2014) as universidades

estão se tornando instituições cada vez mais iguais na sociedade, dirigidas da mesma maneira

que outras empresas, submetidas aos mesmos critérios de indicadores e produtividade, às

mesmas lógicas de eficiência do mercado, o que as fragiliza e as descaracteriza.

Sendo as universidades comunitárias integrantes do sistema, não poderiam ficar imunes

às dezenas de processos de regulação e avaliação impostas a elas. Observa-se, a partir do quadro

11, a participação efetiva dessas instituições nos processos de avaliação em nível internacional,

nacional e estadual. Submetidas a sistemas de indicadores desenvolvidos pela Unesco,

Comissão Europeia e pela OCDE, os quais têm servido de parâmetro para as avaliações,

medições e monitoramento do desempenho de sistemas educacionais baseado em aspectos de

entradas, processo e saídas (BERTOLIN, 2009), as universidades se veem pressionadas por

exames de verificação da qualidade do ensino de graduação, avaliação das condições de ensino,

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visitas dos especialistas, credenciamento institucional, reconhecimento de cursos, projeto

pedagógico da instituição, os quais passaram a afetar os limites do trabalho da academia e a

levar a exaustão os processos burocráticos.

O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), contemplando a

Avaliação Institucional, a Avaliação dos Cursos de Graduação (ACG), o Exame Nacional do

Desempenho dos Estudantes (ENADE), o Conceito Preliminar de Curso (CPC) para cursos e o

Índice Geral de Cursos (IGC), são alguns dos indicadores que permitiram a geração de um

espírito de competitividade entre as instituições.

Os rankings gerados a partir desses exames não incluem o capital cultural dos alunos,

sendo este considerado um fator determinante no desempenho em provas e exames

(BOURDIEU, 1979 apud BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 144). Assim, “os rankings são

instrumentos de baixa confiabilidade, que podem gerar uma percepção injusta acerca da real

qualidade das universidades comunitárias, em comparação com uma faculdade com fins

lucrativos (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 144). Dessa forma, o desafio está em encontrar

mecanismos que promovam a adoção de estratégias institucionais que garantam a credibilidade

no sistema avaliativo. A avaliação é um processo que deveria ser capaz de atender não apenas

o aspecto formal da regulação, mas a possibilidade de autoconhecimento, emancipação e

fortalecimento da autonomia das instituições universitárias.

Acrescente-se a esse cenário, o credenciamento de novas instituições não universitárias

e com fins lucrativos, as quais não precisam investir em pesquisa, o que possibilita a cobrança

de mensalidades mais baixas, uma vez que o custo de manutenção é inferior ao de uma

universidade comunitária. Por não investir em pesquisa, essas novas instituições não se veem

obrigadas em ter em seus quadros de profissionais, docentes titulados e tão pouco oferecer-lhes

um plano de carreira, isso, por si só, já reduz em 40% a folha de pagamento de uma faculdade

em relação a uma universidade (HADDAD; GRACIANO, 2004).

Tudo isso gerou “uma espécie de “competição predatória” por alunos, o que obrigou as

universidades comunitárias a realizarem cortes ou, até mesmo, extinguirem cursos, importantes

ações e atividades de interesse social” (BERTOLIN; DALMOLIN 2014, p. 144). Comenta R1

Há um equívoco da política do próprio governo federal, liberando e achando que

pulverizando, abrindo faculdades para tudo que é canto do país, estatisticamente elevaria a

qualidade. Isso não se concretiza. Por que? Porque é o mesmo público que está sendo

disputado (R1, 2016).

As novas faculdades e centros universitários têm autonomia para criar cursos, o que

facilita a autorização de novos cursos, os quais, dificilmente, são negados pelo MEC em seus

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processos de regulação. E acrescenta

Então estamos lançando cursos tecnólogos, licenciaturas em uns preços bem mais acessíveis para que o professor possa estudar, então não a razão para não o fazer. Pelo ponto de vista financeiro, estamos criando condições, dando financiamentos. [...] Só que a nossa margem que nos dá resultado vai diminuindo. Então você perde o poder de investimento. O que acontece, você enfraquece a instituição. Você não tem mais recursos, dinheiro para investir na instituição, você acaba se fragilizando (R1, 2016).

Ressurgem aqui as preocupações de McCowan (2016; 2018) no que tange aos processos

de comoditização/mercantilização e de desagregação das funções da universidade.

Essa concorrência gera certa instabilidade nas instituições comunitárias, uma vez que

sentem dificuldades em manter sua sustentabilidade econômico-financeira; seus padrões de

qualidade acadêmica e suas ações sociais junto à comunidade, gerando cortes de horas de

atividades de pesquisa e extensão, extinção de ações comunitárias e demissões do corpo docente

(BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 144). Ao comentar sobre suas dificuldades, R1 comenta

[...] Esse ano nós perdemos alunos, mas em número de alunos nós somos a maior. Temos menos pós-graduação do que nossas co-irmãs. Não estou falando da federal, né, estou falando entre as privadas e as comunitárias. Então nós estamos sempre em terceiro lugar, normalmente, assim, entre as quinze. Mas em tamanho, em número de alunos até então nós sempre fomos a maior universidade e temos estrutura também grande. Atuamos nos nove campi, né, então são setenta municípios que a universidade atende [...] (R1, 2016).

Retornando aos depoimentos dos gestores, R4 pergunta, Como é que nós vamos garantir

a nossa marca16? Como é que nós vamos nos diferenciar? Talvez se possa buscar uma resposta

na argumentação apresentada por Bertolin e Dalmolin (2014), quando os autores defendem a

tese de que a educação superior é um bem posicional. Explica-se:

Na teoria econômica, bem posicional é um bem ou serviço cujo valor, ao menos em parte, é determinado pela atração que gera em outros agentes. O valor do bem posicional depende do nível de exclusividade, isto é, do fato de que nem todos têm acesso a este bem. Quanto mais exclusivo, mais status e, por conseguinte, mais capacidade de se diferenciar e obter reconhecimento dos outros (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 151).

Valores simbólicos como tradição e prestígio de uma instituição poderiam proporcionar

16 No âmbito da administração mercadológica, o termo “marca” significa não apenas um ativo estratégico, mas, também, a fonte principal de vantagem competitiva para uma empresa (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 152).

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ao aluno uma vantagem competitiva em situações como procura por bons empregos, destaque

acadêmico ou social, assim, “uma universidade com tradição tende a ser a preferida e escolhida

pelos alunos” (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 151).

Quando questionados sobre quais razões levavam o aluno a procurar aquela

universidade, R2 comentou

Vou usar o que é jargão: tradição. A história da universidade. Quem quer qualidade procura a nossa universidade. [...] Aquilo que a universidade tem de qualidade, atrai por si só. O nome dela. A maioria dos nossos estudantes são filhos de quem fez a formação conosco. Então, aí mais um significado de ter uma instituição funcionando há tantos anos com qualidade, comprometida. Então vem de pai para filho, como a gente diz, né. Muitos dos nossos professores, os pais foram professores ou estudaram aqui. Então, tem todo um sentimento que envolve isso que é muito caro para todos nós (R2, 2016).

Usando argumento semelhante, ao falar sobre a consolidação da marca, R3 afirma: Esse

aspecto da consolidação, acho que tem a ver com a história, a gente tem um mérito muito

grande em face da tradição e do que foi feito aqui anteriormente. E continua

Então aquela necessidade que se teve na época de fazer com que os filhos não precisassem sair ou não poderiam sair, até porque muitos trabalhavam e ajudavam em casa, aquilo marcou e acho que ajudou a consolidar o nome institucional, porque muitas gerações passaram por isso. E agora nós estamos já com os netos daquelas gerações. Então é interessante porque isso dá toda uma trajetória de informação. Então para que ir estudar fora se seu pai, seu irmão estudaram aqui e se deram bem? Para que ir estudar na universidade federal, ou em São Paulo se todos os seus irmãos, seus primos, toda a sua família estudou aqui e se deu bem, isso é um suporte, podemos dizer, da escolha (R3, 2016).

Identifica-se, nas vozes dos gestores, um reconhecimento da comunidade da excelência

acadêmica das funções exercidas pelas universidades. O sentimento de pertencimento é

alimentado pela credibilidade dos serviços educacionais que ela transmite de pai para filho, seus

valores, suas crenças. Isso arregimenta a conquista de novos integrantes na academia, bem

como estimula o interesse por governos, associações e empresas em firmar parcerias e

desenvolver projetos, “proporcionando oportunidades de obtenção de benefícios e

financiamentos, bem como recursos para investimento em qualidade, pesquisa e extensão.”

(BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 151). R4 reafirma essa percepção ao afirmar

Eles escolhem a nossa universidade por ser uma universidade, porque têm outras instituições que não são universidade na região. Pela qualidade das

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nossas atividades, dos nossos cursos de graduação, pela história de qualidade que nós temos na instituição. Nós temos um nome, uma marca bastante forte aqui nessa região. Escolhem pela estrutura da universidade, não tenho dúvida, que eles se encantam quando vêm aqui (R4, 2016).

Percebe-se que a identidade das universidades em foco é construída gradativamente nas

relações cotidianas e que se consolida ao longo do tempo. A instituição passa a ser um ponto

de referência identitária, uma vez que os indivíduos percebem-se diferente dos demais e de

grupos sociais com os quais se relacionam, isto é, “o processo de constituição da identidade

organizacional passa pela coesão em torno dos objetivos das organizações, que se mantêm os

mesmos, ainda que as organizações tenham se modificado significativamente desde a sua

fundação” (SARAIVA; DUARTE, 2010, p. 122-123). Resgata-se nesse momento, o que Albert

e Whetten (1985) consideram duradouro nos traços que caracterizam a identidade

organizacional de uma instituição: os quais (os traços) circunscrevem-se

aos aspectos temporais relacionados à perpetuidade tanto dos traços centrais quanto dos distintivos da identidade organizacional. A estabilidade, implícita nesse elemento, cria nos indivíduos um nível de certeza sobre as práticas da organização que confere horizontes historicamente definidos para as suas ações (SARAIVA; DUARTE, 2010, p. 113).

Para Bertolin e Dalmolin (2014, p. 151) “o que gera “prestígio” e mantém a tradição de

uma universidade são seus diferenciais relacionados a cursos stricto-sensu e ações de interesse

da comunidade.” Dois motivos levam as faculdades com fins lucrativos a não se interessar por

atividades de pesquisa e extensão: a não obrigatoriedade legal para executar tais atividades e a

não atratividade pelo alto custo e pouco retorno financeiro. Aqui está, portanto, um diferencial

identitário e competitivo das universidades comunitárias: o investimento em pesquisa e

extensão, o que se caracteriza como bem posicional.

Neste sentido, com vistas a preservar o reconhecimento e a tradição ou, nas palavras do mercado, para manter a marca, o diferencial competitivo e, por conseguinte, a sustentabilidade econômica no longo prazo, é essencial que as universidades comunitárias continuem valorizando e investindo o máximo possível em pesquisa e extensão (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 152).

Essa afirmação entra eco nas palavras de R1 ao falar dos motivos sobre as ações que a

universidade executa para se diferenciar nesse ambiente tão competitivo.

Mostramos que somos diferentes pela qualidade, qualidade dos cursos. Mostrar que há uma diferença que agrega valor no sentido. Estudar em um

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universo universitário que tem possibilidades de interação por muitas áreas. Então, há possibilidade de fazer pesquisa, se tornar um pesquisador e isso é um diferencial, da pesquisa, da iniciação cientifica, da pós-graduação, do universo acadêmico mais amplo (R1, 2016).

Para que as universidades comunitárias mantenham sua tradição e a sua sustentabilidade

econômica em longo prazo, investimentos em pós-graduação stricto sensu, em pesquisa e

extensão é ponto fundamental, essa é a defesa de Bertolin (2014), aliada ao argumento de que

“cortar gastos em programas e cursos simplesmente porque não produzem retorno financeiro

imediato pode ser um grande equívoco” (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 152).

Volta-se, assim, ao ponto inicial que desencadeou a reflexão dessas dimensões: as

funções da universidade. Está-se falando sobre um dos traços identitários que consolidam o

modelo da universidade comunitária: a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

Notadamente, em muitos aspectos, essas universidades se assemelham em seus propósitos e

suas características no que se refere ao ensino e à pesquisa. Isso, possivelmente, não será

diferente no que tange à extensão. É nesse terceiro elemento que a identidade e a missão das

universidades comunitárias ganham contornos mais claros e reafirmam a sua gênese (BITTAR,

1999; LONGHI, 2000; FRANTZ, 2006).

Sendo o terceiro elemento da tríade, a extensão universitária é a promotora da integração

entre a universidade e a comunidade na qual está inserida. “É uma espécie de ponte permanente

entre a universidade e os diversos setores da sociedade” (SANTOS, 2012, p. 12). Opera como

uma “via de duas mãos, em que a Universidade leva conhecimentos e/ou assistência à

comunidade, e recebe dela influxos positivos como retroalimentação tais como suas reais

necessidades, seus anseios, aspirações e também aprendendo com o saber dessas comunidades”

(WAHLBRINCK; PACHECO, 2015, p. 66).

Se a extensão é uma via de mão dupla, há de se entender a existência de uma troca de

conhecimentos, ou seja, a existência de um processo que possibilita o aprendizado por parte da

comunidade, assim como a universidade também aprende com a própria comunidade sobre a

cultura e valores dessa comunidade. “É uma forma de a universidade socializar e democratizar

o saber científico, de modo a este não se traduzir em privilégio apenas da minoria da população

(universitária), mas difundido também à comunidade não acadêmica, consoante os próprios

interesses dessa mesma comunidade (SANTOS, 2012, p. 14).

A extensão universitária configura-se como uma atividade prática educativa, cultural e

científica, por meio da qual articula-se o Ensino e a Pesquisa de forma indissolúvel, viabilizando

uma relação transformadora entre universidade e sociedade. É por meio de uma práxis dialética

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de produção/reprodução crítica do conhecimento que a extensão chega até a sociedade, ela (a

práxis) quem faz o papel de mediadora entre universidade-sociedade-universidade.

(WAHLBRINCK; PACHECO, 2015). Ainda para essas autoras não se faz extensão

universitária sem planejamento próprio e sistemático. Dessa forma, dois instrumentos seriam

componentes essenciais para que se passe do discurso à ação concreta: O Plano de

Desenvolvimento Institucional e os Projetos Político-Pedagógicos dos cursos de graduação e

de pós-graduação (WAHLBRINCK; PACHECO, 2015).

Estas colocações levam a refletir sobre a terceira dimensão proposta por McCowan

(2016) ao apresentar a anatomia das universidades: a interação.

4.3 Interação: o elo entre a universidade comunitária e a sociedade

“O conhecimento não se estende do que se julga sabedor até aqueles que se julga não saberem;

conhecimento se constitui nas relações homem-mundo, relações de transformação, e se

aperfeiçoa na problematização crítica destas relações” (FREIRE, 2006, p. 36).

Para McCowan (2016), a dimensão interação refere-se às formas como a universidade

se relaciona com a sociedade externa, com relação à facilidade ou à dificuldade com que o fluxo

de atores e ideias acontece, ao quanto suas portas estão abertas ou fechadas para traduzir e

comunicar o conhecimento produzido a parceiros externos e à comunidade. Essa interação, ou

grau de porosidade, nas palavras do autor, que se estabelece com a comunidade pode se dar em

escala local, nacional e global. Por interação, portanto, entender-se-ia a noção de extensão

universitária praticada no Brasil, ou seja, o modo de relação que existe entre a universidade

(pública, comunitária, privada) e a comunidade em que se insere, o mecanismo que serve de

ponte entre a instituição e os diversos setores da sociedade civil capitalista (SANTOS, 2016).

Portanto, faz-se, neste momento, uma interpretação da teoria de McCowan (2016),

estabelecendo-se uma equivalência entre a denominação Interação expressa pelo autor e a

denominação Extensão, uma das funções da universidade brasileira, por entender que as

referências conceituais caminham na mesma direção, ou seja, fazem menção aos elos que a

universidade estabelece com a comunidade e às suas múltiplas formas de concretização.

De acordo com a proposição do O Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Instituições

Públicas de Educação Superior Brasileiras - FORPROEX, elaborada em 1987, e reiterada em

documentos seguintes, inclusive no Plano Nacional de Extensão Universitária, de 1999, e no

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documento Política Nacional de Extensão Universitária, de 2012:

A extensão é uma via de mão-dupla, com trânsito assegurado à comunidade acadêmica, que encontrará, na sociedade, a oportunidade de elaboração da práxis de um conhecimento acadêmico. No retorno à universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à reflexão teórica, será acrescido àquele conhecimento. Este fluxo, que estabelece a troca de saberes sistematizados/acadêmico e popular, terá como consequência: a produção de conhecimento resultante do confronto com a realidade brasileira e regional; e a democratização do conhecimento acadêmico e a participação efetiva da comunidade na atuação da universidade (FORPROEX, 2012).

Ressalte-se que como prática acadêmica, a extensão distingue-se das atividades de

ensino e pesquisa por constituir um processo metodológico que indaga pela relevância social

do ensino e que procura, por meio da pesquisa científica, referências objetivas aos problemas

reais que envolvem a sociedade como um todo. Em 2004, o Sistema Nacional de Avaliação do

Ensino Superior (SINAES) orienta que a extensão deve primar pela integração com o ensino e

a pesquisa, ressaltando a necessidade da transferência do conhecimento produzido pelas IES e

a sua interferência no desenvolvimento regional e nacional. Também defende que “as políticas

de extensão devem cumprir os preceitos estabelecidos pela missão da instituição, considerando

a importância social de suas ações para o desenvolvimento e promoção da cidadania”

(CARBONARI; PEREIRA, 2007, p. 24). Ainda conforme esses autores, a extensão está

relacionada ao processo de integração da universidade com a região, da vinculação entre o

ensino e a pesquisa atrelada às necessidades sociais, enfim, a extensão está associada às

transformações, bem como da própria universidade (CARBONARI; PEREIRA, 2007).

Parece que essa concepção de extensão/interação vem ao encontro dos anseios das

universidades comunitárias, forjados já em seu nascimento. Já na descrição do Perfil

Institucional a denominação “universidade comunitária” traz seu forte caráter regional e a noção

de comunidade em sua origem, em seus objetivos e em sua forma de gestão (PDI/UNI1;

PDI/UNI2, 2017). Ao revisitar a missão dessas instituições, vai-se perceber a ênfase dada à

socialização do conhecimento, ao usar explicitamente termos que se referem a esse universo

“socializar o conhecimento pelo ensino, pesquisa e extensão”, “difundir conhecimentos que

promovam a melhoria da qualidade de vida”, “promover, por meio do ensino, pesquisa e

extensão, o desenvolvimento regional”. Ao fazer referência à sua política de extensão, a UNI1

afirma

A extensão é uma das três funções da universidade, compreendida no conjunto das atividades que socializam com a comunidade o conhecimento

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produzido e sistematizado na Instituição. Por outro lado, a Universidade deve se beneficiar da interação com a sociedade, com a retroalimentação dos seus processos. A Extensão é o elo entre Universidade e a sociedade (PPI/UNI1, 2017, p. 35).

Essa concepção é reiterada na voz do gestor R4 quando comenta sobre os projetos de

extensão e pesquisa.

Esses projetos de extensão e de pesquisa, nos próprios cursos de graduação... Então, tudo o que a gente faz, nós pensamos em fazer o melhor para a nossa comunidade, que é aquela que dá sentindo a nossa existência. É para essa comunidade que nós temos que dar respostas. [...] A comunidade que deve o nosso respeito, nossa admiração e nosso trabalho, nosso envolvimento. Então, isso hoje está muito claro para nós (R4, 2016).

Para UNI3, a extensão é compreendida como um processo acadêmico-pedagógico, que

promove o intercâmbio de saberes entre a Universidade e a comunidade, com o

desenvolvimento de atividades que contribuam na formação profissional e cidadã dos

acadêmicos e no desenvolvimento regional (PPI/UNI3, 2017, p. 117). Nesse sentido, a extensão

busca desenvolver ações nas quais participem a comunidade externa, com interação entre

acadêmicos e professores, com o objetivo de proporcionar a vivência dos valores essenciais ao

exercício da cidadania e a reflexão sobre o conhecimento produzido na universidade. Assim, é

que se entende a extensão como uma dimensão do fazer acadêmico, um processo didático-

pedagógico articulado ao ensino e à pesquisa (PPI/UNI3, 2017, p. 118).

Percebe-se que os discursos se alinham em uma mesma direção, e, para além dos

discursos, essa concepção vê-se refletida em ações concretas realizadas por essas instituições

conforme quadro 12.

Quadro 12 - Principais Atividades de Extensão das Universidades Comunitárias ATIVIDADES DE EXTENSÃO – UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS

UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 Mais de 90 projetos de extensão em diferentes áreas: saúde, meio ambiente, social, educação

Mais de 700.000 pessoas beneficiadas (2016 – 2018)

Hospital Geral

280 bolsas de extensão

Sistema Educativo de RÁDIO E TV

CETEL – Centro de Teledifusão educativa. O canal 15 da NET e 27 na TV Aberta foram fechados em 2017, após 20 anos de existência. Tinha parceria

Mais de 80 projetos de extensão em diferentes áreas: saúde, meio ambiente, social, educação

Mais de 650.000 pessoas beneficiadas (2016 e 2018)

Hospital Veterinário

210 bolsas de extensão

Sistema Educativo de Rádio e TV Afiliada do Canal Futura

Cursos acreditados pelo Sistema de Acreditação Regional de Cursos de Graduação do Mercosul

Mais de 70 projetos de extensão em diversas áreas: saúde, meio ambiente, social, educação

600.000 pessoas beneficiadas (2017-2018)

Hospital Universitário, conveniado com o SUS

265 bolsas de extensão

Ecomuseu – espaço cultural que atua no resgate e valorização dos costumes e da história das comunidades litorâneas de Santa Catarina

Sistema Educativo de Rádio e TV Afiliada do Canal

Mais 110 projetos de Extensão em diversas áreas: saúde, meio ambiente, social, educação

300 mil pessoas beneficiadas (2017-2018)

Hospital Universitário

298 Bolsas de Extensão

Sistema Educativo de TV

Coral e Grupo de dança

Fomento a grupos artísticos

PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e

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ATIVIDADES DE EXTENSÃO – UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS UNI1 UNI2 UNI3 UNI4 com a TV Futura.

- 3 emissoras de rádio em funcionamento em diferentes campi da região.

Fomento a grupos artísticos

Coral e Grupo de dança

PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações

INTERCÂMBIOS: 203 acordos bilaterais com instituições de 28 países

(Arcusul)

CONVÊNIOS INTERNACIONAIS, com 62 universidades de 18 países

Coral e Grupo de dança

Fomento a grupos artísticos

PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações

INTERCÂMBIOS com universidades do país e do exterior, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais

Futura.

Coral e Grupo de dança

PARCERIAS com diversos setores empresariais, órgãos governamentais e associações

INTERCÂMBIOS. – 140 convênios firmados com Universidades estrangeiras, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais

associações

INTERCÂMBIOS - 48 acordos com 20 países, instituições científicas, entidades e órgãos governamentais

Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e Sítios eletrônicos – Período de referência 2017-2018

Assim, é que se tem o volume de atividades descritas no quadro 12: o rol de mais de

300 projetos de extensão com cerca de dois milhões e trezentas mil pessoas atingidas entre

2016-2018; a presença de hospitais com atendimento em várias especialidades na área da saúde;

os museus em suas diferentes áreas de especificidades, a implantação de um sistema educativo

de rádio e TV divulgando informação de interesse local e regional, lazer e entretenimento,

privilegiando aspectos culturais e educativos; e as dezenas de parcerias com os diversos

segmentos da sociedade e convênios internacionais demonstram o grau de inserção e conexão

dessas instituições na comunidade e no mundo.

Para Vannucchi (2011, p. 51) “toda universidade comunitária é um projeto, um destino

comum e ao mesmo tempo singular”. Há uma identificação nos princípios dessas universidades,

o que as leva a compor uma identidade com traços que se assemelham nas suas convicções. Em

nível macro, entre si, há uma alta correspondência de traços que se assemelham, ou seja, se o

ponto de partida é identificar o perfil desse modelo de universidade e sua existência plena a

partir dos dados de que esta pesquisa dispõe, então, sim, é possível afirmar que todas essas

instituições trazem em seu DNA, em sua essência, elementos que as caracterizam como se

denominam: universidades comunitárias. E a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e

extensão é um dos traços centrais.

Mas, se as mesmas instituições fossem analisadas no seu micro universo, ou seja, a partir

de suas especificidades, então passa-se a entender as palavras de Albert e Wetthen (1985)

quando afirmam que não há, qualquer tipo de lista universal de aspectos centrais da

organização, uma vez que isso depende do que é importante para aquele contexto

organizacional, isto é, cada universidade comunitária vai atuar, levando em consideração as

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necessidades de seu entorno, as peculiaridades que a circundam e fará as intervenções possíveis

para atender às necessidades daquele universo social. As preocupações fundantes com os

problemas sociais e econômicos são semelhantes, porém a forma de interagir e buscar soluções

aos problemas são diferentes na medida em que cada realidade se apresenta de modo diferente.

Assim é que as universidades comunitárias desse estudo se diferenciam e requisitam para si

como traço essencial e distintivo: a sua alta inserção comunitária.

Em cinco décadas de existência e de efetiva participação no projeto de desenvolvimento

regional, essas instituições provocaram grandes mudanças socioeconômicas nas regiões onde

estão inseridas, pela articulação com os vários municípios ao seu entorno e com parcerias

firmadas com os diversos segmentos da sociedade. Dessa forma, essas universidades

caracterizam-se como instituições regionais “por estar em constante diálogo com a comunidade,

atendendo às suas necessidades e constituindo-se em fator de integração a partir de cada

realidade, buscando um projeto coletivo de desenvolvimento e um crescimento harmônico da

região em que atuam” (LAUXEN, 2006, p. 238). Saliente-se que não só as demandas locais são

atendidas, as macros dimensões – nacional e global – também são monitoradas e

acompanhadas, afinal o fenômeno da globalização aí está para compor esse cenário e nele

interferir.

Em seus PDIs, todas as universidades enfatizam a sua inserção comunitária. Ao fazer

referência ao seu envolvimento com a comunidade regional, UNI3 afirma

A UNI3 acompanha o desenvolvimento socioeconômico do estado e contribui para seu fortalecimento, pois sua constituição histórica, como instituição de natureza comunitária e sua organização física e geográfica favorecem o trabalho de inserção regional. Desde a origem da Instituição em 1964, o perfil institucional é regido por valores como o “compromisso social com o desenvolvimento regional e global” (PDI/UNI3, 2017, p. 72).

Salienta-se que esses valores estão explícitos nos ordenamentos jurídicos como o

Estatuto e o Regimento Geral e orientam o projeto institucional, político e pedagógico das

instituições. Composta por nove campi, a UNI3 atua na região de abrangência dos municípios

localizados ao longo do litoral centro-oeste catarinense, atingindo mais de dois milhões de

pessoas. Suas atividades são desenvolvidas em estreita relação com os principais segmentos da

economia regional, notadamente nas áreas da pesca, das atividades portuárias e da indústria

naval, do turismo e da gastronomia, da indústria têxtil e do vestuário e da construção civil

(PDI/UNI3, 2017, p. 73). Pesquisas, projetos de extensão, estágios supervisionados, visitas

técnicas e diferentes atividades sociais desenvolvidas nesses segmentos e outros como gestão,

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saúde e educação resultam em relatórios, artigos científicos, produções técnico-científicas as

quais apontam soluções e alternativas de desenvolvimento econômico e social,

sustentabilidade, gestão, inovação e prospecção para mercados potenciais (PDI/UNI3, 2017).

Afirmam Gumbowsky e Siqueira (2013, p. 6) que “tanto maior será a contribuição da

universidade para a sociedade quanto for a sua inserção regional.” Neste sentido, além da sua

condição de Universidade, a instituição deve assumir características de universidade regional,

articulando-se com os vários municípios ao seu entorno (LAUXEN, 2006).

A UNI4 orienta suas linhas de pesquisa para a educação, saúde, meio ambiente, ciência,

tecnologia e inovação voltadas para a solução de problemas próximos à sua área de atuação.

Situada na região sul de Santa Catarina, compreende mais de 45 municípios e é polo industrial

em diversos setores, como confecção, cerâmico, metalomecânico, extração de carvão mineral

e construção civil, esta instituição fortalece seus vínculos com a comunidade por meio dos 113

projetos de extensão e quase trezentas bolsas de extensão distribuídas aos acadêmicos

(PDI/UNI4, 2017, p. 22).

Com oito campi espalhados pelo estado do Rio Grande do sul, a UNI1 compreende 70

municípios da região nordeste deste estado. Esse conjunto de municípios apresenta alto grau de

industrialização, intensa atividade turística e gastronômica, bem como representa um polo

agroindustrial com núcleos agrícolas e de extração e transformação mineral (PPI/UNI1, 2017).

Nesse contexto, a UNI1 mostra sua força e inserção para contribuir com a comunidade,

garantindo a formação de profissionais dotados de valores, de competências; investigativos e

inovadores; capazes de fazer diferença em seu local e em seu tempo (PDI/UNI1, 2017, p. 18).

Para que se efetive tal concepção, na UNI1 os principais programas de pesquisa acontecem no

campo social, econômico, antropológico, da biotecnologia, da engenharia, entre outros.

Com uma sede administrativa e mais seis campi, a UNI2 é centro propulsor das

transformações sociais, econômicas e culturais das regiões Norte e Noroeste do estado,

atingindo mais de 100 municípios. Sua forte atuação nos setores de saúde, educação, turismo,

tecnologia da informação e agroindustrialização faz com que se destaque pela

representatividade na área médica, cultural e tecnológica (PPI/UNI2, 2017). Interessante frisar

que em um de seus slogans, essa universidade se coloca como “A universidade da nossa

comunidade” reiterando a sua conexão com a região.

Esta alta inserção regional acontece porque há uma predisposição tanto por parte das

universidades quanto por parte da sociedade em firmar parcerias.

Complementarmente à formação qualificada de recursos humanos para

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acompanhar os avanços sociais e globais — ao mesmo tempo em que deles se beneficia para promover o aperfeiçoamento do sistema educacional e propagar o conhecimento científico —, a inserção regional da UNI3 revela-se também no enfoque e na abrangência de suas pesquisas e produções técnico científicas e nas suas atividade de extensão e prestação de serviços, nas diferentes áreas do conhecimento, por meio de parcerias institucionais e interinstitucionais (PPI, UNI3, 2017, p. 73).

Há uma ligação orgânica com a região, que se dá não apenas pela troca de conhecimento

com diversos setores produtivos da sociedade ou pela formação de profissionais para atuar

localmente, mas também pela participação de membros da comunidade na governança

institucional e pelo amplo uso dos serviços e instalações universitárias pela comunidade

(FIOREZE; MCCOWAN, 2018).

Em parcerias firmadas com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico (CNPq), Governos Nacional, Estadual e Municipal e inúmeras organizações da

iniciativa privada, essas universidades comunitárias incentivam a iniciação científica e as

atividades de extensão de seus acadêmicos por meio de Programas de Bolsas de Ensino,

Pesquisa e Extensão que propiciam grande troca de conhecimento na busca da melhoria da

qualidade de vida dos cidadãos.

Talvez a forma mais explícita de revelar a intersecção entre essas universidades e seus

stakeholders espalhados pela comunidade externa esteja colocada de forma transparente nos

seus Relatórios de Responsabilidade Social/Balanço Social. Este documento apresenta à

sociedade, a síntese das ações de responsabilidade social desenvolvidas pela instituição,

evidenciando indicadores de qualidade e números associados a cinco dimensões de atuação:

institucional: acadêmica, social, socioambiental e cultural, o compromisso institucional e o

esforço de centenas de profissionais docentes e administrativos envolvidos na superação das

metas da instituição.

Ao analisar o Relatório de Responsabilidade Social dessas instituições, encontra-se a

descrição detalhada das atividades desenvolvidas com a participação da comunidade acadêmica

(alunos, professores, funcionários, egressos) em parceria com a comunidade regional no

desenvolvimento de ações voltadas à resolução de problemas sociais, educacionais, de saúde,

econômicos, envolvendo todas as áreas do conhecimento. Assim é que

a responsabilidade social apresenta-se como eixo transversal à atuação da UNI1 e o esforço continuado em prol da melhoria da qualidade das atividades acadêmicas toma sentido e é ampliado com a participação direta da Instituição no cotidiano da sociedade, atuando como agente constitutivo da identidade regional e do projeto de nação que busca construir (PDI/UNI1, 2017, p. 39).

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Os números registrados em atendimento à comunidade (mais de 700.000) entre 2017 e

2018, os programas e ações desenvolvidos com e para a comunidade acadêmica e a

comunidade externa, os mais de 200 acordos bilaterais com 28 países, são exemplos que

conferem à UNI1 o título de universidade comunitária. Para Ribeiro (2012, p. 87) “as

experiências de responsabilidade social universitária devem estar relacionadas à extensão

universitária, como um compromisso social e uma forma de estabelecer um diálogo dinâmico

entre a instituição e a sociedade, desenvolvendo nela um sentimento de pertença social.”

Situação semelhante se revela com o trabalho realizado pela UNI3 em Responsabilidade

Social,

a qual desenvolve seus programas e projetos voltados à elevação da qualidade de vida e do desenvolvimento econômico e social do país – sobretudo das regiões nas quais se encontra inserida, conforme explicitado na sua missão, visão e valores e nos múltiplos projetos, ações e iniciativas que desenvolve com o ensino, a pesquisa, a extensão e a cultura (PPI/UNI3, 2017, p. 134).

Para Pereira (2003) a verdadeira responsabilidade social vai além do cumprimento das

exigências legais, ela deve, antes de mais nada, contribuir para uma sociedade mais justa e

humanitária. Parece que este preceito é defendido na seguinte afirmação presente no PPI da

UNI3 A atuação social da Universidade é um processo de mão dupla. Embora seu caráter

comunitário a vincule naturalmente às necessidades da sociedade de seu entorno, ela acaba

por acumular importante expertise ao abraçar, como desafios seus, as muitas demandas e

necessidades sociais (PPI/UNI3, 2017, p. 134). O entendimento é de que, para além de atender

às necessidades locais, esta universidade comunitária enfatiza seus propósitos: desenvolver

ações capazes de promover a inclusão de todos em prol de um bem comum. Para tanto, algumas

ações e benefícios são oferecidos de forma permanente em diversas áreas como: Defesa e

promoção dos Direitos Humanos e Igualdade ético-racial, Desenvolvimento Econômico e

Social, Diversidade, Inclusão Social, Meio ambiente, Memória e Patrimônio Cultural, Produção

artística, Promoção da saúde. Em termos tangíveis, pode-se dizer que foram mais de 600.000

atendimentos entre 2017-2018; porém, medir o quão tudo isso afeta a qualidade de vida da

comunidade se revela quase em uma missão impossível (UNI3/Relatório de Responsabilidade

Socioambiental 2017).

Este trabalho de Extensão e Responsabilidade Social desenvolvido por essas

instituições, com alta inserção junto à comunidade, conferiu-lhes reconhecimento pelas

organizações responsáveis por certificar suas ações, as quais foram autenticadas por

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certificados, títulos e prêmios. O quadro 13 apresenta as certificações e premiações recebidas

pelas universidades comunitárias foco deste estudo.

Quadro 13 - Certificações e Premiações Recebidas pelas Universidades Comunitárias - 2017-2018

UC PREMIAÇÕES/CERTIFICAÇÕES

UNI1

- Prêmio Sapientiae de Excelência Educativa, outorgada pela Organização das américas para a Excelência Educativa (ODAEE) (2017) - Certificação de Nível II de Excelência em Gestão da Acreditação Hospitalar (2017) - Certificação de Serviço de Referência para Atenção Integral às Pessoas em Situação de Violência Sexual – Hospital Geral (2018) - Prêmio Caxias do Sul, distinção da Câmara Municipal de Vereadores de Caxias do Sul (2018) - Incubadora Tecnológica de Caxias do Sul recebe certificado do Centro de Referência para Apoio a Novos Empreendimentos – CERNE1 (2018) - Prêmio Capes de Tese entregue a pesquisadores da instituição. (2018)

UNI2

- Premiação Selo de Qualidade OAB Recomenda ao Curso de Direito pelo quinto ano consecutivo por cooperar para a melhoria da qualidade de ensino jurídico no Brasil. (2017) - Prêmio/Medalha de Responsabilidade Social, concedido pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul na categoria Instituições de Ensino Superior pela atuação em prol do bem social e da preservação do meio ambiente (2018) - 6º Prêmio de Responsabilidade Social, promovido pelo Sindicato do Ensino Privado Sinepe/RS

UNI3

- Prêmio Fritz Müller por projeto desenvolvido com mulheres agricultoras promovido pela Fundação do Meio Ambiente (Fatma), de Santa Catarina (2017) - 1º lugar projeto GraduaSUS "Concurso de Experiências Significativas en Promoción de la Salud en la Región de las Américas”, promovido pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPS) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) (2017) - Prêmio Empresa Cidadã da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil, em Santa Catarina (ADVB/SC) - 3º ano consecutivo, na categoria preservação ambiental (2018) - Certificação Selo Social por ter cumprido com os Objetivos do Desenvolvimento sustentável (ODSs, ONU) - 10º ano consecutivo (2017) - Certificação de Responsabilidade Social promovida pelo legislativo catarinense em reconhecimento às ações desenvolvidas em prol do bem-estar da sociedade e da preservação ambiental (2017 -2018) - Prêmio Top of Mind de Santa Catarina, evento alicerçado em pesquisa do Instituto Mapa e promovido pela NSC Comunicação - 6º ano consecutivo. (2018) - Prêmio IMPAR de Universidade Mais Lembrada na Foz do Itajaí. O prêmio é resultado da pesquisa Ímpar – Índice das Marcas de Preferência e Afinidade Regional 2018, realizada pelo grupo RIC/Record em parceria com o Ibope. (2018) - Certificação de Responsabilidade Social 2018, e o Troféu Responsabilidade Social – Destaque Santa Catarina, na categoria "organização sem fins lucrativos". Esta foi a oitava edição da certificação de responsabilidade social. Ao todo, foram 162 inscrições, 69 empresas e instituições certificadas e seis ganhadores do troféu Destaque Santa Catarina. (2018) - Prêmio Capes de Tese entregue a pesquisadores da instituição. (2018) - Certificação do Great Place to Work (GPTW), com nota 80 (2017).17

UNI4

- Prêmio Melhores Práticas em APLs de Base Mineral 2017. Iniciativa da Rede APLmineral com o apoio do Ministérios de Minas Energia e de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Centro de Tecnologia Mineral - reconhecimento às práticas inéditas realizadas no âmbito da cadeia produtiva do setor mineral. (2017) - Troféu Mérito Regional de Saúde, reconhecimento promovido pela - Agência de Desenvolvimento Regional e Gerência Regional de Saúde, com intuito de melhorar as boas práticas na saúde pública. (2017) Prêmio Destaque Içarense e Rinconense por suas atividades de ensino, pesquisa e extensão (2017) - Moção de Aplausos da Alesc (Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina) pelos 20 anos de atividades da Instituição como Universidade Comunitária (2017) - Diploma do Mérito - CREA/SC (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Santa Catarina) reconhecimento por contribuir para o aprimoramento técnico das profissões que compõem o Sistema Confea (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia) / CREA, - Reconhecimento da Câmara de Vereadores ao trabalho realizado pela Equipe Multi-Institucional, que tem a participação de 53 entidades, busca o desenvolvimento da região, por meio de trabalhos voluntários - Certificado de Responsabilidade Social – Destaque SC 2017 (Assembleia Legislativa de Santa Catarina) pelo destaque em práticas de responsabilidade socioambiental - Prêmio IMPAR na categoria Faculdade ou Universidade. O prêmio é resultado da pesquisa Ímpar – Índice das Marcas de Preferência e Afinidade Regional 2018, realizada pelo grupo RIC/Record em parceria com o Ibope. (2018) - Prêmio Sócrates como Melhor Instituição Regional, concedido pela European Business Asssembly, em Oxford, no Reino Unido (2018), pelo reconhecimento aos indicadores de excelência no ensino, na pesquisa, na extensão, na pós-graduação e na internacionalização e gestão (2018)

Fonte: Dados coligidos pela autora a partir dos documentos institucionais analisados.

17 A certificação Great Place to Work (GPTW) é uma avaliação identifica as melhores empresas para trabalhar e baseia-se no preenchimento da pesquisa Trust Index, que mede, nacionalmente, o que os funcionários dizem sobre as organizações em que trabalham. Disponível em: https://www.univali.br/noticias/Paginas/fundacao-univali-recebe-certificacao-do-great-place-to-work.aspx. Acesso em: 12 dez. 2018.

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A gama de certificações concedidas às universidades comunitárias em foco evidencia

que as comunidades locais e regionais assumem a responsabilidade social não como um

apêndice que, muitas vezes, se materializa em ações pontuais, mas como elemento fundante de

um projeto de universidade e de sociedade que almejam construir. Ao rastrear seus PDIs/PPIs,

observou-se que este reconhecimento é fruto de um conjunto de diretrizes introduzido nas áreas

do ensino, da pesquisa e da extensão, que dispõe sobre políticas e metodologias voltadas às

questões que envolvem a responsabilidade para com a promoção dos direitos humanos e sociais

de todos os participantes envolvidos no processo.

Observa-se, no quadro 13, as certificações consecutivas na área da responsabilidade

social representadas pelo Selo Social concedido pela comunidade local às instituições. Entre as

certificações, pode-se exemplificar aquela recebida, pela 10ª vez, pela UNI3 (Certificação Selo

Social por ter cumprido com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs, ONU) - 10º

ano consecutivo (2017), em reconhecimento por suas ações nas áreas de: Boa saúde e bem-

estar; Educação de qualidade; Igualdade de gênero; Emprego digno e crescimento econômico;

Indústria, inovação e infraestrutura; Redução das desigualdades; Consumo e produção

responsáveis; Combate às alterações climáticas; Vida debaixo d'água; Vida sobre a terra; Paz,

justiça e instituições fortes; e Parcerias em prol das metas dos Objetivos de Desenvolvimento

Sustentável (ODSs).

Em 2018, a UNI3 recebeu o Selo Social por 75 projetos e ações que beneficiaram cerca

de 354.240 pessoas. As atividades, à época, contemplaram os 17 Objetivos Desenvolvimento

do Milênio (ODS), que são: Erradicação da pobreza; Fome zero e agricultura sustentável; Saúde

e bem-estar; Educação de qualidade; Igualdade de gênero; Água potável e saneamento; Energia

acessível e limpa; Trabalho decente e crescimento econômico; Indústria, inovação e

infraestrutura; Redução das desigualdades; Cidades e comunidades sustentáveis; Consumo e

produção sustentáveis; Ação contra a mudança global do clima; Vida na água; Vida terrestre;

Paz, justiça e instituições eficazes; Parcerias e meios de implementação. Parece que esse cenário

consegue ilustrar a interação entre as universidades comunitárias e a sociedade na perspectiva

de sua contribuição para o bem público, e potencialmente para a construção do bem público.

Também ilustra que o desenvolvimento local se dá pelo elo orgânico entre instituições e

comunidade, promovendo avanços por meio da responsabilidade social (FIOREZE;

MCCOWAN, 2018).

As práticas de responsabilidade socioambiental desenvolvidas, pela UNI4, na região em

que atua, foram reconhecidas pela Alesc (Assembleia Legislativa de Santa Catarina) com o

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Certificado de Responsabilidade Social – Destaque SC 2017. O objetivo da Assembleia e de

outras 12 entidades envolvidas na organização da premiação é valorizar e estimular as empresas

e instituições a incorporarem a sustentabilidade na sua gestão. Assim comenta R4

O prêmio (que ganhamos) agora, Conexões, que valoriza e gera resultado. O certificado da Associação Brasileira de Recursos Humanos – ABRH, que concede o prêmio Ser Humano SC à nossa universidade, na categoria quesito sócio ambientais. Agora ganhamos o prêmio, mandamos o projeto, através do Anima, projeto coordenado por um professor, e aí fomos reconhecidos lá (R4, 2016).

Observa-se que há uma recompensa em receber premiações. O gestor cita vários deles

como reconhecimento do trabalho realizado pela instituição. Ser reconhecido fora da área de

atuação é um aspecto positivo para a instituição, pois parece reforçar a excelência da

universidade em questões de extensão. Premiação semelhante recebe a UNI2, pela atuação em

prol do bem social e da preservação do meio ambiente (Prêmio/Medalha de Responsabilidade

Social, concedido pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul na categoria Instituições

de Ensino Superior) (2018).

Citar algumas das ações de reconhecimento a essas instituições por suas atividades junto

à comunidade ou descrever um rol de certificações em determinado período do tempo em um

quadro é, talvez, minimizar toda teia de relações entre aqueles que alimentam o complexo

universo de contatos e inúmeros caminhos trilhados em parceria na busca por uma sociedade

mais justa e igualitária. A relação entre as universidades comunitárias, no que tange à extensão,

se estende para além da compreensão tradicional de disseminação de conhecimento, prestação

de serviço e difusão cultural, é “concebida como uma práxis transformadora, um mecanismo

que a universidade dispõe para cumprir sua responsabilidade social” (RIBEIRO, 2012, p. 86).

Portanto, as ações de extensão executadas pelas instituições comunitárias em foco parecem

estar condizentes com a sua missão e a sua visão, ou seja, estão alinhadas a uma política

propositiva em relação às ações humanitárias do ponto de vista da responsabilidade social

universitária (RIBEIRO, 2012).

Mas...

Assim como o valor do conhecimento, o ensino e a pesquisa, ingredientes essenciais da

anatomia das universidades, parecem se fragilizar, em virtude de políticas públicas que

fomentam a expansão e diversificação de um sistema educativo alimentado por preceitos

privatistas, o processo de interação entre universidade e sociedade também é minado pela

mercantilização, globalização e desagregação.

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Para McCowan (2016) a forma como a universidade interage com a sociedade também

define o quanto suas portas estão abertas ou fechadas para comunicar o conhecimento

produzido a parceiros externos e à comunidade. Algumas universidades são mais flexíveis do

que outras com relação ao fluxo de ideias e participação de atores em suas atividades, nas

palavras do autor algumas são mais “porosas” do que outras. A porosidade inbound (entrada)

corresponderia à disposição da instituição em conversar e trazer para dentro de seus muros

ideias e atores da sociedade, sendo receptiva aos conhecimentos produzidos pelos setores

externos a ela; a porosidade outbound (saída) diria respeito aos conhecimentos produzidos pelas

universidades e à atitude ativa destas em comunicá-los à sociedade. Esse caminho de mão dupla

entre universidade e sociedade é desejável, uma vez que atribui maior importância ao trabalho

realizado pela universidade e aumenta a participação de segmentos mais amplos na definição

das ações prioritárias a serem executadas pela universidade.

Porém, o autor chama a atenção para a ocorrência da hiperporosidade, ou seja, quando

as fronteiras entre a universidade e a sociedade se tornam muito permeáveis, isto é, mais do que

porosas e começam a desaparecer, e os perigos que podem surgir provocados pela

desagregação. Entre eles a perda de espaço para a reflexão profunda sobre os fenômenos da

sociedade e a produção do conhecimento intrinsecamente valioso, valendo a pena em si mesmo,

sem qualquer justificativa adicional e a perda de autonomia para a realização de suas atividades

de ensino e pesquisa. E aqui valem as palavras de Nóvoa (2018) “as universidades são

instituições indispensáveis para proteger o trabalho que ainda não tem valor comercial, para

proteger o trabalho que nós muitas vezes ainda não sabemos para que serve. É essa inutilidade

que vai dar origem às grandes utilidades do futuro.”

Na dimensão interação, vê-se um movimento progressivo de abertura dos modelos de

universidade de baixa porosidade como os medievais e Humboldtianos para um modelo de

universidade com média porosidade, cujo conhecimento passa a ter valor instrumental, voltado

ao bem público e ao interesse da comunidade; até chegar ao modelo de universidade que

igualmente atribui valor instrumental (troca) ao conhecimento, mas com fins comerciais,

ocasionando a alta porosidade, Dada essa categorização, se poderia dizer que as universidades

comunitárias estariam no universo da média porosidade, ao qual o autor denomina de modelo

de desenvolvimento da instituição (the developmental model of institution).

As características deste modelo são que os cursos ministrados são direcionados para áreas em que as sociedades precisam de recursos humanos, a pesquisa é direcionada para áreas de necessidade aplicadas, e os acadêmicos são encorajados a prestar serviços de assessoria ao governo e às comunidades.

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O acesso também se torna uma questão chave no modelo de desenvolvimento, com as universidades abrindo suas portas para uma proporção mais ampla da população.[...] a principal característica agora é relevância, aplicabilidade e impacto no desenvolvimento 18 (MCCOWAN, 2016, p. 513, tradução nossa).

Um modelo de universidade com tais características, exigiria, segundo o autor, a

aplicabilidade plena das funções de ensino, pesquisa e engajamento público, cuja interação se

daria em níveis mais elevados de porosidade nos dois sentidos da relação universidade-

sociedade (MCCOWAN, 2016). Este estudo tem constatado que as universidades comunitárias

trazem na essência de seus traços identitários o nascimento na comunidade e a sua vida voltada

para a comunidade. Seu discurso não é retórico. Suas atividades de extensão refletem o seu

engajamento junto à comunidade e seu entendimento sobre o valor do conhecimento como bem

comum.

Porém, essas instituições vêm sofrendo uma série de influências motivadas pela

mercantilização e pela desagregação da educação superior: seja pelos mecanismos de expansão

do ensino superior, seja pela diversidade de instituições a oferecer cursos de graduação, seja

pelas políticas públicas de acesso tanto de alunos quanto de professores à universidade; seja

pelos processos de regulamentação governamentais. Esse cenário pode levar a hiperporosidade.

Ao comentar sobre o modelo de universidade, R1 afirma

O modelo está em crise. O modelo de universidade, e não só o modelo das comunitárias, a universidade como um todo. Passando por um processo de revisão total e quem não se atualizar dança, quebra. Ela tem que virar mais empresas. Se não virarem mais empresas, elas quebram, infelizmente. A lógica de mercado faz elas ruírem, não interessa o tamanho. Elas precisam virar um pouco esse jogo né? (R1, 2016).

Parece que afirmações como “quem não se atualizar dança, quebra” ou “A lógica do

mercado faz elas ruírem” denunciam as pressões que levam ao processo de conversão das

funções da universidade em produtos e serviços para venda, voltados à lucratividade. Isso

significa adotar estratégias, estratégias de gestão dentro de um modelo como se fosse uma

empresa, abrir mão do seu ideal (R1, 2016).

O entendimento é de que o mercado está ditando as leis, pressionando as universidades

comunitárias a tomarem decisões que vão de encontro à sua missão. Estaria aqui ilustrada a

18 The characteristics of this model are that taught courses are directed towards areas in which societies are in need of human resource, research is directed towards applied areas of need, and academics are encouraged to provide advisory services to government and communities. Access also becomes a key issue in the developmental model, with universities opening their doors to a broader proportion of the population; the key feature now is relevance, applicability, and developmental impact (MCCOWAN, 2016, p. 513).

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hiperporosidade, na via de duas mãos, diminuem os caminhos de intersecção e aumentam os

distanciamentos, com a pressão maior de um dos lados. Assim, “com a mercantilização da

educação superior, a adoção de modelos empresariais de gestão passou a fazer parte das

alternativas estratégicas de algumas universidades” (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 149).

As universidades de caráter empresarial são muito competitivas e, em nome da lucratividade,

enfatizam a avaliação de resultados e são extremamente adaptáveis ao meio, o que leva a

educação a se transformar em um mero bem de consumo.

Pergunta então o entrevistador “Isso não contribuiria para a desconstrução da ideia de

comunitária?” Ao que R1 respondeu

É, isso também faz perder um pouco, por que aí, qual é a diferença? O aluno ou o cliente pensa assim “Bom, na outra eu pago menos, pagando menos pra mim está ótimo, melhor, né? O diploma vale igual. Eu quero exercer minha profissão, e aí? Quero diploma para viabilizar, né? O professor que quer ganhar “tanto por cento” no plano dele só. O que que interessa se qualificar como um professor? “Quero diploma”. Lá na instituição X, as pós-graduações que os professores fazem, a grande maioria, é para subir no plano, ganhar lá 5% ou 10%. A lógica não é para aprender uma nova dinâmica e agregar valor, ter uma formação mais sólida para dar conta dos processos pedagógicos. A lógica não é essa, tanto é que, a maioria faz EAD por nem R$ 200 reais, porque a lógica ela é para isso (R1, 2016).

Várias atitudes se contrapõem aos princípios das universidades comunitárias quanto aos

procedimentos adotados tanto por alunos, professores e pelas instituições que oferecem o

serviço. Nas instituições mercantis, o aluno é cliente que paga (pouco) por uma educação

(produto) imediata, em cursos de curta duração, cuja escolha programática se limita a conteúdos

que sejam imediatamente aplicáveis e relevantes ao trabalho, e a maioria dos cursos se orienta

para os negócios. Nelas, atividades de pesquisa são pouco incentivadas e há pouca expectativa

de serviço à comunidade (RYAN, 2001).

A pergunta Qual é a diferença? Leva a inferir as preocupações do gestor: se a

universidade ceder às pressões do mercado, o que vai diferenciá-la de outras instituições? Por

outro lado, se a universidade não fizer algumas mudanças, ela pode sucumbir? Mas se ceder,

também corre o risco de perder a identidade. Comenta R2 Nós temos instituições comunitárias

aqui do estado, não é o caso da nossa, que têm uma visão quase que empresarial da sua

atividade. Eu não critico esse aspecto porque tem que estar presente, mas nós não podemos

perder os nossos vínculos comunitários. A fonte de tensões parece ser a sustentabilidade

institucional pelo embate entre a dupla natureza das universidades comunitárias, ou seja, o seu

caráter público não estatal, com a oferta de serviço à comunidade e o caráter de sua inserção no

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mundo competitivo em luta pela sobrevivência. Sob tal tensão,

algumas IES se aproximam do modelo heterônomo, adotando um empreendedorismo reativo às investidas da globalização; outras captam tenuamente a influência da globalização, devido à forte ligação com o local que toma todo o olhar. Outras ainda estão atentas às repercussões da globalização, sem deixar de priorizar os valores locais e a comunidade (MOROSINI; FRANCO, 2006, p. 67).

Políticas públicas como a desobrigação de vincular as instituições da obediência ao

princípio da indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão, assim como da obrigação das

entidades mantenedoras de publicar demonstrativos financeiros certificados por auditores

independentes, levaram ao crescimento do modelo de instituição empresarial/mercantil ou

“neoprofissional” como denomina Sguissardi (2004). Estaria ocorrendo a transição da

universidade com autonomia, como as privadas, e sem autonomia, como as federais, para uma

universidade heterônoma e competitiva. O modelo de heteronomia “significa o poder de setores

externos — estado e indústria — na definição da missão, da agenda e dos produtos da

universidade. É o mercado aumentando sua capacidade para impor sua própria lógica e

interesses” (SGUISSARDI, 2004, p. 34).

Como já se comentou, a sustentabilidade econômica dessas instituições é um fator que

as torna vulnerável nesse cenário competitivo, principalmente quando a implementação de

algumas políticas públicas prioriza entidades com fins lucrativos. Explica-se: a baixa ou alta

porosidade/permeabilidade também diz respeito ao acesso de alunos e professores ao universo

acadêmico, ou seja, até que ponto estão as universidades abertas a uma ampla gama de alunos

ou, contrariamente, restringem a sua entrada (MCCOWAN, 2016).

Com o propósito de garantir o acesso ao ensino superior dos estudantes de baixa renda

por meio do preenchimento de vagas nas instituições privadas, foi instituído, em 2005, o

Programa Universidade para Todos (PROUNI), através da Lei nº 11.096/2005 (BRASIL,

2005b). O programa atendeu à demanda de acesso ao Ensino Superior gratuito e da

determinação do Plano Nacional de Educação de aumentar a taxa de escolarização dos jovens

de 18 a 24 anos para 30% até o final da primeira década dos anos 2000. Para Pereira e Tavares

Júnior (2012), dois atores sociais foram beneficiados com a oferta de bolsas de gratuidade nos

cursos superiores de graduação e sequenciais de formação: os alunos aptos a ocuparem essas

vagas, e as IES privadas que, além de preencherem um grande número de vagas ociosas,

também conquistaram isenção fiscal. “O que o Prouni faz é aumentar as isenções fiscais para

IES privadas que, com poucas exceções, não prestam contas de como as usam, remuneram de

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forma ilegal seus sócios, não têm transparência na concessão de bolsas e maquiam balanços”

(VALENTE; HELENE, 2004). O programa, assim, “é uma medida de impacto popular,

privatista e de baixo custo orçamentário” (CATANI; HEY; GILIOLI, 2006, p. 137).

O programa começou a disponibilizar as bolsas no ano de 2005 e até o ano de 2011

assim se apresentavam os dados: entre os bolsistas, 49% estão matriculados em IES privadas

com fins lucrativos, 28% em IES que se configuram como entidades beneficentes de assistência

social e 23% em instituições privadas de Ensino Superior sem fins lucrativos (PEREIRA;

TAVARES JÚNIOR, 2013, p. 107). Essa política expansionista, aliada à outra anterior, que

incluiu as instituições de cunho privatista na educação superior (LDB de 1996), proporcionando

um crescimento de 120% no número de instituições, motivado pelas altas taxas de retorno

econômico (BITTAR; OLIVEIRA; MOROSINI, 2008), criaram um cenário complicado para

as universidades comunitárias. Assim é que se coloca R1

A Lei da Filantropia19 [...] e a Lei do PROUNI foram altamente prejudiciais sobre o ponto de vista financeiro para instituição. [...] Sob o ponto de vista de sustentabilidade, nossa, é prejudicial, porque nós usávamos os recursos na saúde. Não podemos mais usar, no hospital, por exemplo. Nós devemos cobrir com a mensalidade do aluno e antes era usado na filantropia. [...] Então, de 2005 para cá, a partir da lei, isso para nós foi altamente corrosivo no ponto de vista da sustentabilidade. Nós tivemos que adaptar toda a instituição para buscar aqui o sustento. [...] Tinha recursos para investir. Esse dinheiro agora faz falta, esse dinheiro é dado em bolsa. [...] A lei do PROUNI afetou de uma forma significativa o modelo comunitário. Não tem mais dinheiro...[...] ela (a universidade) era muito mais ativa na comunidade antes, porque ela tinha muito mais recursos para fazer.[...] Quando entra essa lei, ela tende a retirar todos os serviços e jogar para bolsas, esses recursos e com isso ela se retrai e se afasta da comunidade. [...] Valeria teses do que significou essa transição...isso afetou muito. E, aí, as comunitárias perderam parte da sua identidade da relação com a comunidade, e esse é um ponto central. Não tenha dúvida quanto a isso (R1, 2016).

Percebe-se a ênfase que o gestor dá nas implicações negativas que a Lei do PROUNI

gerou no âmbito da oferta de serviços da universidade à população. Segundo ele, a

obrigatoriedade de canalizar os recursos somente para bolsas de estudo restringiu o poder de

integração com a comunidade, abalando um dos grandes pilares da missão das comunitárias: a

extensão. Em tempos anteriores à Lei, era possível atender às demandas da comunidade, e a

19 BRASIL. LEI Nº 12.101, DE 27 DE NOVEMBRO DE 2009. Dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes de assistência social; regula os procedimentos de isenção de contribuições para a seguridade social; altera a Lei no 8.742, de 7 de dezembro de 1993; revoga dispositivos das Leis nos 8.212, de 24 de julho de 1991, 9.429, de 26 de dezembro de 1996, 9.732, de 11 de dezembro de 1998, 10.684, de 30 de maio de 2003, e da Medida Provisória no 2.187-13, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências.

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interação entre universidade e comunidade se dava de forma mais harmônica. Já não é mais

assim. Quando perguntado sobre a definição de instituição comunitária e a sua relação com a

comunidade e região, comenta R3 sobre a Lei do PROUNI

A lei do PROUNI estabeleceu a preponderância dos recursos. A lei do PROUNI estava ligada à filantropia, aquela lei estabeleceu o que é preponderante. Nosso hospital, por exemplo, durante muito tempo nós utilizamos as despesas do hospital na filantropia e não podemos mais usar. O que a saúde precisa ter para ser considerada beneficente e filantrópica? O hospital precisa atender mais de 60% por dia pelo SUS. Nós atendemos 72%. Mas como a nossa atividade maior é a educação, nós só podemos comprovar através da educação, através de bolsas. O desapego da situação de fato com a situação de direito, a situação de direito não fotografou bem a situação de fato. [...] Então esse conceito de comunitária, com a abrangência que ela tem de prestação de serviço à comunidade, ela, de certa forma, sofre um pouco, e a tendência a sofrer mais os impactos por força da lei (R3, 2016).

Novamente, percebe-se que o gestor, ao analisar a aplicação da lei, critica vários de seus

aspectos a situação de direito não fotografou bem a situação de fato e exemplifica com

atividades que a universidade pratica, por exemplo, na área da saúde, no hospital20, as quais não

são reconhecidas porque não são da atividade fim (educação). As crises advêm das mais

variadas vertentes, e o gestor, ou a equipe gestora é desafiada a encontrar alternativas para

desvencilhar a instituição das fragilidades decorrentes das circunstâncias em que são

submetidas. “A instituição está sujeita à influência direta e/ou indireta de vários fatores que

imputam novas condições de sobrevivência em um mercado competitivo” (DILLY, 2011, p. 6).

Não saber administrar essa crise de identidade pode desequilibrar a instituição em diversas

dimensões: a credibilidade, a confiabilidade, a reputação, afetando seus públicos e serviços,

depondo contra a instituição (DILLY, 2011). Declara R1 Todas (comunitárias) que passaram

por crises já estão dando a volta, mas 90% delas já trazem algumas ações de caráter

empresarial (R1, 2016).

Com a nova Lei, os recursos tornaram-se escassos, o que leva a um movimento das

comunitárias de firmar mais e mais parcerias para se fortalecerem e fortalecer a conexão entre

as atividades que são realizadas na academia e o entendimento sobre o que a comunidade

precisa e deseja. Comenta R1 Nós estamos fazendo hoje muitas ações, muitas ações. Nós

fizemos um movimento em relação aos empresários, em relação as entidades, muitos

20 Em 2018, o hospital passou a ser administrado por uma instituição da área da saúde porque legalmente tem mais condições de receber verbas públicas. Disponível em: http://g1.globo.com/sc/santa-catarina/videos/v/univali-nao-vai-mais-administrar-hospital-infantil-pequeno-anjo/7077503/. Acesso em: 26 fev. 2019.

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convênios, parcerias e ações conjuntas, então nisso nós estamos fazendo um movimento

muito forte (R1, 2016). O entendimento de tudo isso recai sobre a noção de porosidade,

entendida, neste caso, como as consequências negativas das pressões/das infiltrações das

políticas públicas sobre a instituição, desestabilizando a dinâmica interna de suas ações. A

interação, a “conversa”, dessa forma, se dá de forma assimétrica. Por outro lado, eventos dessa

natureza estimulam as comunitárias a buscar novas estratégias de sustentabilidade.

Além disso, ao propor uma política dessa natureza, o estado transferiu a tarefa de

expansão do ensino superior a todas instituições sem medir as consequências para muitas delas.

E pior, ao incluir todas as instituições, sejam elas sem fins lucrativos ou com fins lucrativos e

incluir todas as categorias, sejam elas universidades, centros universitários ou faculdades, no

programa de distribuição de bolsas, estimulou a mercantilização do ensino, a precariedade da

qualidade e ampliou o processo de desagregação da educação ofertada.

A adesão ao PROUNI restabelece parte da desoneração fiscal, o que permite às IES

lucrativas permanecerem tendo acesso a recursos públicos indiretos e a usufruírem dos

mercados financeiros (CARVALHO, 2013). O crescimento do segmento tem sido bastante

significativo, tanto na modalidade presencial como a distância. Mais ainda, investimento em

pesquisa e formação de pesquisadores não são de interesse das instituições de pequeno porte, o

que pode implicar negativamente na formação dos estudantes beneficiados pelo PROUNI, os

quais não teriam acesso a esses benefícios, diminuindo as condições de igualdade de formação

entre eles e outros estudantes no mundo do trabalho (DIAS SOBRINHO, 2010).

E complementa o autor

As políticas de expansão da escolaridade e, particularmente, de ampliação das matrículas na educação superior constituem aspectos que deveriam ser considerados importantes não simplesmente do ponto de vista dos interesses econômicos, mas, sobretudo, da democratização da sociedade e do aprofundamento da justiça social (DIAS SOBRINHO, 2010, p. 1232).

Apesar de existirem alguns defensores da desagregação sob a alegação de que ela

permite a expansão do ensino superior com financiamento sustentável e com maior eficiência,

incentivando a entrada de novos provedores no mercado, bem como permite capacitar os

alunos, desenvolvendo competências necessárias ao mercado do trabalho, a análise que vem

sendo realizada a partir das dimensões valor, função e interação indicia algumas implicações

preocupantes, entre elas: uma inclinação no pêndulo em que o valor do conhecimento passa a

assumir o papel de bem de consumo, afastando-se da concepção de bem público; o

enfraquecimento das concepções de aprendizagem com investimentos em modelos que

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reduzem as possibilidades de uma formação holística e plena do estudante por meio da

intersecção entre as funções da universidade tais ensino, pesquisa e extensão; e a necessidade

de manter um espaço distinto e alguma autonomia para as atividades de ensino e pesquisa nas

instituições, evitando, assim, a hiperporosidade (MCCOWAN, 2018).

Esse processo conduz a outras dinâmicas mais amplas. Segundo o autor leva à

individuação, ou seja, “ela estimula uma maior adaptabilidade do aprendizado em relação a

metas, necessidades e estilos de vida individuais”; como também à economização, isto é,

“coloca o econômico no centro da imagem, tanto em termos de custo-eficiência do processo

educacional, quanto em termos de resultados entendidos como maximização do salário e da

produção” (MCCOWAN, 2018, p. 478). Como consequência, aumenta a inserção de

trabalhadores em empregos corporativos, com o desenvolvimento de novos produtos para o

mercado, “em vez de promover a compreensão humana, conscientização e igualdade social.”

(MCCOWAN, 2018, p. 478).

Apresentou-se durante essa reflexão, uma analogia feita por McCowan (2018) na qual

o pesquisador compara a oferta do ensino superior a pacotes de serviços, categorizando-os em

pacote atrelado, pacote de conveniência e pacote tipo inter-relacionado, sendo este último

aquele em que os componentes são “interdependentes e mutuamente reforçadores”, ou seja,

todos os elementos são necessários para a formação integral do estudante, sendo considerado,

portanto, o mais adequado. No pacote inter-relacionado, todas as funções da universidade, até

aqui explicitadas, seriam contempladas, promovendo a plena formação do estudante, seria

aquele que evitaria a desagregação. O depoimento de R4 talvez possa ilustrar o entendimento

de que não se está oferecendo o pacote atrelado ou o pacote de conveniência. Afirma o gestor

[...] Com o avanço do próprio capitalismo, então, não tenho dúvida de que ela (a universidade) tem que estabelecer um diálogo com a sociedade. E quando eu falo em mercado, eu prefiro falar “o mundo do trabalho”, porque quando se fala em mercado, as pessoas reduzem o mercado a empresas, a trabalhar em empresas e fábricas. Mas o mercado que nós formamos não é apenas para empresas e fábricas. Nós formamos para o mundo do trabalho, nós formamos para as organizações sociais, nós formamos para os envolvimentos sociais, enfim, para a vida (R4, 2016).

Assim, apesar dos conflitos que as universidades comunitárias vêm enfrentando

oriundos das mais diferentes vertentes sejam elas do âmbito governamental ou de mercado, em

nível local, nacional ou global, as quais impulsionam os processos de comoditização e

desagregação, parece que a defesa em seu discurso e em suas ações em prol da

indissociabilidade das funções ensino, pesquisa e extensão encontra eco em outras vozes e

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permanece como grande pilar de sua missão como comunitária. Afirma McCowan (2018, p.

477) “em termos da instituição como um todo, a evidência empírica é inconclusiva, mas há, no

entanto, razões para manter a confiança na coexistência mutuamente benéfica do ensino, da

pesquisa e do envolvimento da comunidade.”

Se interação diz respeito ao fluxo de ideias e atores entre a universidade e a sociedade

(McCowan, 2016), então, há de se considerar também o tipo de gestão, a sua dinâmica

colegiada, com alto grau de democratização no fluxo de seus processos, presente nas

universidades comunitárias. Várias dessas instituições elegem sua direção por meio do voto

direto de seus professores, estudantes, técnicos administrativos e representantes da comunidade

regional, constituindo exemplos avançados de democracia participativa, descentralização e

transparência. Ao falar sobre o processo eleitoral do conselho universitário, R4 comenta [...]

A gente abre o edital. Daí os conselhos divulgam para a comunidade dos professores convidando aqueles que querem representá-los. Eles querem ser representantes dos seus pares no Conselho. Cada um desses faz a sua campanha. E aí se vota e se manda para o Conselho Universitário. Assim são os funcionários também. [...] Então, essas são características para mim de uma universidade comunitária. Todas as eleições são colegiadas, somos executivos, então as decisões são colegiadas, as regras, as leis, o legislativo, são essas comissões (R4, 2016).

Nem todas as instituições têm o seu sistema de votação direto, muitas delas têm seus

representantes indicados por seus pares. A participação ativa de diversos segmentos nas

decisões, assegurada pela composição dos colegiados superiores da universidade compostos

por representantes da comunidade interna e externa, e a transparência, viabilizada pelo acesso

às informações sobre temas acadêmicos e situação financeira, são marcas salientes dessas

instituições.

Por ocasião dos debates sobre o marco legal das instituições comunitárias, que culminou

na Lei 12.881/2013, predominou o entendimento de que a autonomia de cada instituição deveria

ser respeitada, sendo inapropriada alguma forma de imposição legal (SCHIMDT, 2017). Ao

falar sobre processo de representação R2 afirma Digo e afirmo o seguinte, na seguinte medida:

todos os cargos são eletivos, coordenador de curso, eleito. Diretor de curso, eleito. Reitor e

vice-reitores, eleitos (R2, 2016). Em seus PDIs, as instituições detalham com preciosidade toda

a estrutura organizacional, a qual contempla os órgãos deliberativos e administrativos, cada um

com suas competências, atribuições e composições específicas, bem como salientam a

autonomia da universidade em relação à sua Mantenedora (Fundação).

Assim como a colegialidade pode ser considerada uma forma democrática e desejável

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de participação das comunidades interna e externa nas decisões da universidade, ela também

pode representar certo entrave nos processos que necessitam de maior agilidade. Ao falar sobre

os órgãos deliberativos, R2 comenta

E nós respeitamos isso. De certo modo, isso nos dá um pouquinho de demora na decisão, por ter que respeitar as diversas instâncias. Mas de resto, a decisão, ela é colegiada. Não tem uma coisa assim “ah quem decide é o reitor”, “quem contrata ou distrata”. Não, não é assim. Observa, observa a regra. Quer dizer então que nós temos esse cuidado aqui, né, de respeitar as esferas decisórias (R2, 2016).

Una-se a esse comentário, a voz de R4

Temos essa característica de muito debate e muita discussão, muita transparência. Às vezes, as coisas emperram um pouquinho e demoram mais pra sair. É mais difícil avançarmos em algumas coisas, demora mais. Precisa de mais argumentos, mais convencimentos, mais tempo para que as pessoas comecem a assimilar (R4, 2016).

Esses comentários vão desencadear outra reflexão que se encaminha para a governança

dessas universidades. Ao revisitar o quadro 9, difícil não surgir questionamentos quanto às

formas de administração ou gerenciamento desses universos, os quais se revelam em números

tão grandiosos e, que, ao mesmo tempo, são tão singulares, dada a sua inserção regional. Os

inúmeros processos implicados, as centenas de milhares de pessoas envolvidas, aliados a

cenários cada vez mais complexos, reflexo da globalização, são ingredientes que desafiam essas

instituições, principalmente com relação à sua gestão. Para Longhi, Franco e Rocha (2009, p.

7) a gestão da educação superior “é expressão de formas relacionais presentes na IES e entre

instituição/Sistema de Educação Superior/interlocutores, no plano de políticas e/ou de práticas

ligadas aos processos de tomada de decisão no desenvolvimento de ações.” Dessa forma, a

configuração da gestão estaria ligada às concepções sobre universidade e suas finalidades

referentes à pesquisa/ensino/extensão, assim como aos princípios organizacionais que norteiam

os processos decisórios e as relações em nível local, nacional e global (FRANCO; MOROSINI,

2005). Um dos gestores, ao fazer referência à gestão, comenta

Nós temos que profissionalizar a gestão das instituições. Se nós conseguirmos alinhar uma gestão profissional nas comunitárias, sem que elas percam a sua essência de oferecer um serviço educacional de qualidade, uma formação de qualidade, uma pesquisa de qualidade, um resultado efetivo para as demandas que vêm do mercado, onde elas estão inseridas. Eu vejo que nós podemos avançar de forma muito mais célere no cenário educacional,

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proporcionado, além da formação, ganhos excepcionais em termos (R2, 2016).

O gestor manifesta duas preocupações: “alinhar uma gestão profissional” e “não perder

a essência de ser uma instituição comunitária”. Dada a configuração do cenário da educação

superior, incrementada com as questões do público e do privado e das fontes de financiamento,

a convergência de três fatores desafiam a gestão dessas instituições: qualidade-autonomia,

limites da expansão e sobrevivência institucional (FRANCO, 2007). Alinhar uma gestão

profissional se refere ao desafio de encontrar um “caminho da interlocução para identificar os

padrões essenciais no exercício da autonomia sem incidir na lógica regulatória que privilegia a

técnica e o mercado em detrimento do homem” (FRANCO; MOROSINI, 2012, p. 44). Alinhar

uma gestão profissional significa manter a autonomia frente aos desafios advindos das políticas

e práticas de gestão da educação brasileira, as quais precisam considerar critérios como

relevância, pertinência, exequibilidade, inclusão e participação, e cuja implicação recai

diretamente na regulação e transparência de gestão (FRANCO; MOROSINI, 2012). Significa

também perseguir a expansão de ensino/pesquisa/extensão, desencadeando ganhos

excepcionais em termos de novas patentes, novas invenções, novos descobrimentos, enfim em

todas as áreas de conhecimento (R2, 2016).

Alinhar uma gestão profissional, neste discurso, representa as preocupações do gestor

com a qualidade e a autonomia da instituição, encontrar estratégias para a saúde financeira,

aprimorar as estratégias de relacionamento com os stakeholders. Alinhar também significa,

apesar dos problemas no que se refere às questões que surgem da dicotomia público/privado,

apesar das escassas fontes de financiamento, não perder de vista a essência comunitária da

instituição, e tentar resolver os impasses sem que eles se tornam obstáculos intransponíveis.

Alinhar significa oferecer um serviço educacional de qualidade, uma formação de qualidade,

uma pesquisa de qualidade, um resultado efetivo para as demandas que vêm do mercado, onde

elas estão inseridas. Alinhar é estar em sintonia para com aquela que realmente seria o motivo

de sua existência: a comunidade local.

Consideradas organizações complexas, principalmente por executar tarefas múltiplas

que envolvem diferentes dimensões como ensino, pesquisa e extensão, as quais requerem

metodologias de trabalho que lhes são próprias, as universidades têm uma dinâmica diferente

daquela desenvolvida por outras organizações (TAVARES FILHO; BERNARDES, 2005).

“Estas diferenças específicas da universidade demandam um modelo de gestão distinto

daqueles desenvolvidos e implementados em empresas de bens de consumo” (BERTOLIN;

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DALMOLIN; 2014, p. 149), dadas às incertezas na definição de objetivos e serviços contidas

nos processos de realização dos serviços oferecidos. Assim, ao buscar uma gestão com base

nos modelos de estruturas organizacionais empresariais, talvez essas instituições não encontrem

amparo para tomadas de decisão que deem conta de seu universo, sendo, portanto, ineficazes

(PRATES, 2002; BERTOLIN; BERTOLIN, 2014).

Contudo, mudanças como o crescimento da modalidade de ensino a distância, a crise

nas licenciaturas, o ingresso de grandes players internacionais no segmento da educação

superior, ditou a necessidade de reposicionamento estratégico para a manutenção no setor.

Assim, o planejamento estratégico tem sido uma ferramenta importante de gestão,

principalmente para essas instituições que possuem uma estrutura autogestionada e sem fins

lucrativos (DALPIAZ; KELM, 2017).

Ao mesmo tempo em que buscam preservar os fortes elementos culturais e a sua

dinâmica colegiada, se sentem pressionadas a se reposicionem “de modo a gerar um equilíbrio

entre qualidade da educação, fortalecimento de valores, competitividade e sustentabilidade”

(DALPIAZ; KELM, 2017, p. 2), o que, muitas vezes, implica mudanças estruturais e de

comportamento. Assim, “profissionalizar a gestão” implica enfrentar os desafios que marcam

o segmento comunitário e, que, por disputar o mesmo público alvo com o segmento

empresarial, precisa igualmente ser competitivo sob pena de comprometer sua sustentabilidade

(DALPIAZ; KELM, 2017). O planejamento estratégico deve possibilitar o reposicionamento

necessário, funcionando como ferramenta flexível, sem que permita a perda das características

identitárias peculiares dessas instituições de ensino superior. (DALPIAZ; KELM, 2017).

Ao se remeter à gestão universitária, Prates (2002, p. 9-10) afirma

a gestão de universidades deve, portanto, se pautar pela busca de consensos, pela flexibilidade administrativa e por decisões estratégicas. Qualquer modelo de autonomia administrativo-financeira de universidades que não se paute pelo modelo acima descrito estará fadado ao insucesso institucional.

Para o autor, na universidade, as decisões devem ser negociadas, diferentes interesses e

ideologias devem ser percebidos como recursos motivadores para o intercâmbio científico, o

debate e a pluralidade de ideias (PRATES, 2002). Nesse debate, cabem algumas reflexões de

CHAUÍ (1999) sobre o comportamento de universidades as quais denomina “Operacionais”,

fazendo a distinção entre instituições e organizações. A universidade é uma instituição social e

como tal, aspira à universalidade, o que significa dizer que a sociedade é referência normativa

e valorativa. Discutir ou questionar sua função, sua própria existência, seu lugar no interior da

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luta de classes está no seu papel (CHAUÍ, 1999). “A instituição percebe inserida na divisão

social e política e busca definir uma universalidade (ou imaginária ou desejável) que lhe permita

responder às contradições impostas pela divisão” (CHAUÍ, 1999, p. 3). Diferentemente, a

organização, funde-se à particularidade, e tem apenas a si como referência, num processo

competitivo com outras organizações que com ela se assemelham em objetivos. “A organização

pretende gerir seu espaço e tempo particulares aceitando como dado bruto sua inserção num

dos polos da divisão social, e seu alvo não é responder às contradições, e sim vencer a

competição com seus supostos iguais” (CHAUÍ, 1999, p. 3). É regida pelas ideias de gestão,

planejamento, previsão, controle e êxito. Nesse universo, expressões como “qualidade

universitária”, “avaliação universitária” e “flexibilização da universidade” conferem a ideia de

determinada autonomia institucional, o que para a autora não se confirma.

Ao ponderar as considerações de Prates (2002) e Chauí (1999), o debate sobre a gestão

da educação superior parece requerer mais espaço em que nele se amplie os conceitos

relacionados a novas formas de gestão. Há de se ter certos cuidados, pois “estudos

internacionais indicam que a emergência do modelo empresarial de gestão dos serviços

públicos, incluindo a educação superior, resultou em perda de confiança nas instituições e

exigências de mais responsabilidade” (BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p. 150). Por outro

lado, estudo de Clark (2006) apresentaram evidências de que “as universidades podem se

adaptar a um estilo inovador de boa governança e, paralelamente, manterem suas funções

acadêmicas e valores de colegialidade” (CLARK apud BERTOLIN; DALMOLIN, 2014, p.

150).

Na tentativa de entender o contexto das mudanças e buscar novos horizontes, a UNI3,

em seu PDI, apresenta um estudo sobre as estratégias e sistemas utilizados para o

redimensionamento do planejamento e desenvolvimento institucional para 2017-2021, até

chegar ao mapa estratégico do Plano de Desenvolvimento Institucional e do Planejamento

Estratégico, o qual apresenta os caminhos escolhidos pela Instituição para cumprir sua missão

e alcançar sua visão.

A configuração do mapa leva em conta as características da Instituição como Universidade Comunitária, cuja natureza tem na sustentabilidade financeira o aporte à realização das suas atividades fins. O que significa dizer que os recursos econômico-financeiros são revertidos para o capital social e os processos acadêmicos e administrativos e possibilitam seu crescimento e desenvolvimento (PPI/UNI3, 2017, p. 47).

Várias dimensões são contempladas: Capital Social. Processos, Crescimento e

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Desenvolvimento, Sustentabilidade Financeira. A elaboração do planejamento tomou como

referência “as características que constituem a identidade como uma Instituição comunitária e

seu reconhecimento pela comunidade, sobretudo em relação à oferta de ensino de qualidade, ao

desenvolvimento de pesquisas e à gestão criativa de projetos sociais” (PPI/UNI3, 2017, p. 48).

Argumentos semelhantes são utilizados por todas as outras comunitárias em seus PDIs.

Em seus planejamentos estratégicos, os objetivos traçados por estas universidades

privilegiam o aprimoramento, a ampliação, a consolidação, o fortalecimento, a otimização, a

modernização e o desenvolvimento institucional sustentável. Para chegar a eles, destacam seus

diferenciais em relação à gestão acadêmica, ao corpo docente qualificado, à infraestrutura

consolidada e ao posicionamento do egresso no mercado de trabalho. Os conceitos 4 e 5 obtidos

na avaliação realizada pelo MEC em seus cursos e os conceitos 4 e 5 obtidos na avaliação dos

programas de pós-graduação feita pela Capes, também são citados como evidência dos

diferenciais de qualidade e a coerência das ações institucionais em relação à missão, valores e

objetivos institucionais.

Nesse capítulo, percorreu-se um caminho de análise da configuração das universidades

comunitárias, partindo-se das dimensões Valor, Função e Interação, estabelecendo uma relação

com as características singulares dessas instituições e os conflitos provenientes de processos

como a comoditização e a desagregação do ensino superior, motivados por políticas neoliberais.

Observou-se que políticas de expansão e diversificação da educação superior vão incidir em

ações que propiciam a proliferação de instituições com fins lucrativos, as quais colocam em

risco a qualidade dos serviços oferecidos e se constituem em ameaças às universidades

comunitárias. Observou-se a luta das comunitárias em manter o princípio da indissociabilidade

entre ensino/pesquisa/extensão e os desafios impostos à gestão dessas instituições dado o

cenário da concorrência imposta pela mercantilização do conhecimento. As vozes dos gestores

e os documentos reiteram a natureza comunitária dessas universidades e demonstram uma

atitude persistente/resistente de manter em sua identidade o valor do conhecimento

intrinsicamente ligado à tríade ensino/pesquisa/extensão, com forte inserção social.

O capítulo 5 intitulado A comunicação das universidades comunitárias: um desafio

a enfrentar traz algumas reflexões sobre a percepção dos gestores quanto à forma de

comunicação que essas instituições assumem ao se comunicar com seus públicos, alguns

apontamentos sobre os discursos institucional divulgados na mídia e os desafios que surgem

nesse universo.

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5 A COMUNICAÇÃO DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS: UM DESAFIO A

ENFRENTAR

Este capítulo tem por objetivo identificar o modo como as universidades comunitárias

comunicam sua identidade aos seus públicos. Ao se considerar as abordagens de Albert e

Whetten (1985), Caldas e Wood Júnior (1997) e de Nogueira (2000a) depreende-se uma visão

de identidade organizacional como auto conceito, tomando-se como referência duas dimensões:

uma delas é a forma como seus membros internos, principalmente seus gestores, de modo

compartilhado, a percebem, correspondendo a uma percepção de si mesma ou autopercepção

ou auto imagem; a outra é a forma pela qual a organização é percebida, a sua imagem externa,

por aqueles com quem ela interage. Assim, faz parte da identidade, a percepção dos dirigentes

sobre a organização, ou seja, a forma como a organização se vê; e como imagem, a percepção

da sociedade sobre a organização, ou seja, a forma como o público externo a vê. O foco desta

investigação recai sobre uma das partes componentes da identidade, qual seja, como as

universidades comunitárias se percebem, procurando responder à pergunta "Quem nós

somos?"; ou seja, a consciência de si, a partir da análise de seus atributos centrais, distintivos e

duradouros (ALBERT, WHETTEN, 1985), bem como das dimensões Valor, Função e

Interação (MCCOWAN, 2016; 2017; 2018). Não se está desconsiderando a importância de

como a sociedade percebe a instituição, apenas está sendo feito um recorte de pesquisa, já que

este estudo faz parte de um grande projeto intitulado Identidade e Imagens das Universidades

Comunitárias do sul do Brasil, o qual tem várias frentes de trabalho.

Retomando então alguns aspectos sobre a construção da identidade e a relevância da

linguagem nesse universo, toma-se como referência o estudo de Borzeix e Linhart (1996), sobre

o modo como as identidades coletivas são (re)construídas, reafirmadas ou abandonadas nas

organizações por influência da palavra, a qual assume expressiva importância como

instrumento de gestão. Para as autoras, a comunicação na organização atua como estratégia dos

gestores para que os saberes e conhecimentos informais sejam padronizados e oficializados. A

palavra em si não é criadora de identidade, no entanto, serve como veículo que conduz ao

processo de formação da identidade, uma vez que é por meio dela que os indivíduos se

expressam e se posicionam, de modo convergente ou não (BORZEIX: LINHART, 1996).

Quem são os atores construtores dos discursos ora analisados nesse estudo? Os gestores

da alta administração, as comissões organizadoras e escritoras dos PDIs das instituições foco

do trabalho, cujo expediente é formado por reitores, vice-reitores, diretores, gerentes,

coordenadores, ou seja, colaboradores integrantes da administração dessas instituições. Ao

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entender que o discurso produzido traz certa visão de mundo impregnada por valores, crenças,

mitos e representações sociais cujos significados são comumente compartilhados pelos atores

organizacionais (SARAIVA et al., 2010), interpreta-se que “a linguagem não é um meio neutro

que se torne fácil e livremente a propriedade intencional do falante, mas que ela está povoada

de intenções de outrem” (BAKHTIN, 1998 [1934/35], p. 100). Ou seja, a linguagem se mostra

como uma zona de tensões entre vozes de outrem, socio ideologicamente situadas; “todas as

palavras e formas que povoam a linguagem são vozes sociais e históricas” (1998 [1934/35], p.

106). E onde se manifesta concretamente a linguagem? Na comunicação. Neste caso, na

comunicação organizacional/corporativa: o meio que a organização/instituição usa para se

comunicar com seus públicos e que consiste em diversos elementos, como marcas, produtos e

serviços, divulgações pela mídia, anúncios de propaganda, patrocínios, eventos, relatórios,

balanços financeiros, página na Internet, entre outros (FROEMMING, 2008, p. 33).

Para dar continuidade ao estudo com o intuito de compreender a constituição da

identidade das universidades comunitárias vai-se caminhar para além dos discursos dos gestores

e dos PDIs, vai-se visitar algumas campanhas institucionais veiculadas na Internet, por estas

universidades, via site YouTube21, entre os anos de 2015 e 2018. Os vídeos têm duração entre

um a sete minutos. Todas as universidades comunitárias deste estudo utilizam-se de várias redes

sociais, ou seja, espaços virtuais de comunicação para se relacionar com seus stakeholders por

meio de envio de mensagens, divulgação de produtos/serviços e partilha de conteúdos, entre

elas estão Facebook, Instagram, Whatsapp, Twitter, LinkdIn e YouTube. Explora-se, nesse

contexto, o que se chama de Marketing Digital, uso da internet como meio para estabelecer uma

relação mais próxima com o aluno/cliente (REEDY; SCHULLO; ZIMMERMAN, 2001).

Para Kunsch (2006), a comunicação tem que ser percebida como parte inerente à

natureza das organizações. As organizações “são formadas por pessoas que se comunicam entre

si e que, por meio de processos interativos, viabilizam o sistema funcional para sobrevivência

e consecução dos objetivos organizacionais num contexto de diversidades e de transações

complexas” (KUNSCH, 2006, p. 167). Assim, sem comunicação, as organizações não

existiriam. A comunicação organizacional está diretamente ligada ao planejamento e aos

processos de gestão que determinam as estratégias da organização. Se, anteriormente, o foco

estava na transmissão da mensagem, hoje se observa muito mais a formação do significado, da

informação e do conhecimento (MARCHIORI; VILAÇA, 2011). Corroborando com esse

21 YouTube é o nome dado a um site de compartilhamento de vídeos enviados pelos usuários por meio da internet. Os canais são criados pelos próprios usuários, por meio dos quais podem compartilhar vídeos sobre os mais variados temas (BURGESS; GREEN, 2009).

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posicionamento, Foreman e Argenti (2005) afirmam que a comunicação organizacional só se

realizará se for reconhecida e sustentada pela alta administração como uma área estratégica para

a gestão, devendo estar alinhada aos objetivos e metas propostas para execução. Assumir esse

lugar requer que a área de comunicação esteja envolvida no processo de tomada de decisão, o

que tem sido um dos grandes desafios das organizações nos dias de hoje.

Os vídeos trazem em sua composição uma série de imagens que retratam os espaços, as

pessoas, as ações, enfim, elementos que constituem a vida da e na universidade e na região

onde estão inseridas. Normalmente, há um texto de caráter descritivo, cuja locução é feita em

OFF, com voz masculina e, sobrepostas às imagens, aparecem informações as quais são

apresentadas por meio de legendas. Apesar de se entender a importância que a composição das

imagens assume em termos de produção textual visual, não é intuito, neste trabalho, fazer um

exame semiótico das imagens que compõem os vídeos. Ao analisar as campanhas institucionais

das universidades comunitárias, identifica-se explicitamente na construção do discurso a

referência à sua missão, ao seu propósito, à sua abrangência, à busca pela excelência. É a

instituição dizendo como ela é. Textos como

A UNI1 é uma instituição comunitária de ensino superior. [...] Reconhecida como a universidade comunitária da Serra, a UNI1 se mantém em permanente processo de qualificação, compromisso que envolve toda a comunidade universitária. [...] Uma Universidade que se renova a cada dia, porque a busca pelo conhecimento não cessa nunca.” (Vídeo 1, UNI1, 2015). A UNI1 é uma universidade comunitária de ensino superior, que tem como missão produzir, sistematizar e socializar o conhecimento com qualidade e relevância para o desenvolvimento sustentável (Vídeo 2, UNI1, 2018).

são ilustrativos e reforçam o posicionamento da instituição no contexto da educação superior.

Já em campanhas apresentadas na plataforma YouTube sobre a Uni2 os seguintes textos foram

divulgados

A Missão da UNI2 é produzir e difundir conhecimentos para melhoria da qualidade de vida da comunidade. Para isso, busca formar cidadãos preparados e competentes com postura crítica, ética e humanista que atue como agentes transformadores na sociedade. [...] De natureza comunitária e filantrópica desde o início seu objetivo foi produzir conhecimento, promover a inovação tecnológica e o desenvolvimento regional. [...] Um conjunto de possibilidades que busca preparar os alunos para enfrentar os desafios do mundo contemporâneo e para atender as demandas da comunidade. [...] Uma instituição voltada aos interesses da vida em comunidade. Um lugar onde o conhecimento construído de forma coletiva e com ações buscando excelência tecnológica e qualificação profissional. Mas acima de tudo essa é uma instituição que privilegia a formação ética e humanista, capaz de transformar a realidade social (VÍDEO 1, UNI2, 2015).

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Em 2018, por ocasião de completar 50 anos de existência, a UNI2 lançou outro vídeo

institucional, no qual reitera o seu posicionamento: Com meio século de história, a UNI2

mantém em suas raízes no ensino de excelência, incentivo à pesquisa e extensão e a constante

busca pela inovação tecnológica. [...] Uma instituição que prioriza a formação ética e

humanista, que produz e difunde o conhecimento. Busca a excelência e tem dentro do seu

campus a grande inspiração. Como se evidencia, os textos veiculados nessa rede social

reproduzem as informações contidas nos PDIs, com o propósito de associar a marca (nome da

instituição) à razão de sua existência. Essas expressões também traduzem os discursos de seus

gestores, como se vem observando desde o Capítulo 3, por ocasião da descrição da trajetória

dessas instituições desde sua gênese até a sua legitimação e no Capítulo 4, por ocasião da análise

de suas funções.

Ao assistir aos vídeos da UNI3, novamente encontra-se a denominação universidade

comunitária com a presença do slogan “UNI3 universidade de verdade” (Vídeo 1, UNI3,

2016). Talvez aqui, a intenção da instituição se manifestasse no sentido da mostrar à

comunidade o quanto ela tem a oferecer em comparação a outras instituições que se fazem

presentes no seu entorno (faculdades, Centros universitários, escolas técnicas), as quais

chamam para si qualidades que somente uma universidade comunitária poderia oferecer. O

mesmo texto informa que

A UNI3 mais do que uma universidade comunitária é um ponto de encontro onde pessoas de todo o mundo compartilham seus sonhos e ideais, pessoas que sabem que o ensino de qualidade só ampliará a chance de um futuro promissor, um ambiente ético, rico em cultura, atento à informação do jovem como um cidadão crítico para um desenvolvimento cada vez mais sustentável (Vídeo 1, UNI3, 2016).

Dois anos mais tarde, uma nova peça de divulgação é lançada pela UNI3, nela contém

o seguinte:

Movidos pelo conhecimento, é nossa missão, nossa vocação, nossa razão de existir. Movidos pelo conhecimento é nossa eterna busca pelo aprender, entender e acima de tudo inovar. Somos a UNI3. Uma das melhores instituições de ensino da América Latina, uma universidade em transformação (Vídeo 2, UNI3, 2018).

Na análise dos vídeos produzidos pela UNI4, encontrou-se o seguinte teor

Você tem ideia do que faz uma universidade? Universidade é conhecimento. É formação acadêmica, pesquisa, inovação, integração, debate.

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Solidariedade. Inclusão social, digital, real. É desenvolvimento de ideias e de tecnologia. [...] Um lugar construído de forma coletiva. Uma espécie de protótipo do amanhã. Universidade é experiência, uma experiência de vida. E uma experiência viva. Viva a UNI4. Há cinquenta anos a nossa universidade (Vídeo 3, UNI4, 2018).

Importante mencionar que, para comprovar tais posicionamentos, o narrador elenca as

cidades de abrangência da instituição, o número de cursos de graduação e pós-graduação

ofertados, a infraestrutura enumerando a quantidade de salas e laboratórios, o número de

projetos de extensão e atendimentos realizados junto à comunidade, a presença de professores

qualificados, informações estas que também aparecem legendadas sobre as imagens. A ênfase

na apresentação de dados numéricos parece cumprir o papel de comprovação das afirmações

contundentes sobre o valor do conhecimento e das experiências vivas para a universidade.

Ao analisar algumas campanhas de marketing institucional destas universidades,

observou-se que muitos aspectos de produção textual se assemelham, ou seja, enfatizam a

excelência na busca do conhecimento, a tradição e contemporaneidade, a inovação, o

envolvimento com a comunidade, os destaques e rankings nacionais e internacionais, a

abrangência da infraestrutura. Também pôde-se observar a presença reiterada de um discurso

que prioriza a missão e os valores preconizados por essas instituições. Há um esforço em

reafirmar o conhecimento visto e exercitado como instrumento de geração de saberes, promotor

de mudanças, que se origina na universidade, que a retroalimenta e que atende às necessidades

da comunidade, transformando realidades na busca de uma vida melhor.

Talvez os slogans utilizados nessas campanhas sejam os principais mensageiros dessa

visão, tais como “O conhecimento ilumina” (UNI1, 2015); “Conhecimento é a nossa natureza”

(UNI2, 2017); “Movidos pelo conhecimento” (UNI3, 2018). Constata-se, portanto, que os

discursos veiculados são bastante semelhantes e defendem os atributos centrais, digamos,

únicos, singulares dessas instituições, entre eles o de se voltar ao bem público, como

componente de sua identidade. Vannucchi (2011, p. 32) reafirma que “maneira coletiva e

pública com a qual toda reflexão crítica e todo o conhecimento científico e cultural que nela se

produzem constituem um valor realmente democrático [...]”. Portanto, a percepção é a de que

as universidades comunitárias se esforçam para demonstrar, por meio de diferentes canais de

comunicação, o alto valor que atribuem ao conhecimento como bem público, valor de sua

existência.

Está-se analisando os atributos componentes da identidade das universidades

comunitárias a partir dos depoimentos de seus gestores e seus documentos

oficiais/institucionais – PDIs, Relatórios de Responsabilidade Social e vídeos institucionais.

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Mas como esses atributos são comunicados aos seus públicos? Laux, Silveira e Perfeito (2003)

ao estudar as estratégias e ações de marketing adotadas pelas IES participantes do Sistema

ACAFE, observaram que seus materiais de comunicação com o mercado (existentes em maior

profusão), seguem uma mesma linha que privilegia, principalmente, o histórico da instituição e

o rol de cursos ofertados, com pouca ou nenhuma diferenciação entre esses materiais. Segundo

os autores, “não há, assim, um embasamento mais científico centrado na diferenciação e no

valor agregado substanciais, mas, com maior preponderância, em desenvolvimento gráfico das

peças de maneira a torná-las atrativas para o aluno-cliente” (LAUX; SILVEIRA; PERFEITO,

2003, p. 9).

Voltando aos depoimentos dos gestores, ao ser questionado sobre como a universidade

comunicava aos seus públicos a sua identidade como comunitária, R1 afirmou

é uma dificuldade se comunicar. Nós e todas as universidades comunitárias do Estado temos dificuldade em mostrar esse diferencial. [...] Historicamente, há uma dificuldade a tal ponto que o aluno, às vezes, não percebe a diferença entre estudar numa faculdade ou num centro universitário ou em uma universidade comunitária. [...] então há uma falha na comunicação, essa é uma fraqueza (R1, 2016).

R2 em suas palavras confirma a fragilidade de fazer com que seus públicos

compreendam a dimensão de ser comunitária

a informação de que somos uma universidade comunitária se dá de uma forma muito frágil. Ela não é consistente. Não existe uma programação para fazer a comunicação, isto está mais na palavra do gestor, do reitor, do vice-reitor, eventualmente do diretor, eventualmente do professor. Eu falo eventualmente porque nós não temos uma prática de estar a todo instante dizendo para nosso aluno “Olha, nós somos uma comunitária, nós somos uma universidade comunitária”. Eu procuro, nas minhas manifestações oficiais registrar, “a UNI2 é uma instituição comunitária e filantrópica...” Ou seja, procuro fazer um discurso um pouquinho mais amplo para reafirmar a nossa condição, mas essa não é uma regra geral (R2, 2016).

Ainda com base na avaliação das fragilidades na comunicação da identidade

comunitária, o entrevistado R3 destaca que, inúmeras campanhas, inclusive de cunho

interinstitucional no sul do Brasil, entre os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul foram

criadas com o slogan “Quem faz comunitária, faz bem.”. O intuito da campanha foi massificar

a ideia de que o trabalho comunitário traz retorno para a comunidade, faz bem para a sociedade,

nós queremos cada vez mais nos envolver com a comunidade e também queremos que ela

reconheça as nossas atividades e ações. No entanto, apesar do esforço coletivo, há pouco

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retorno ainda no que concerne a estratégias de mídia voltadas ao fortalecimento da identidade

como universidade comunitária. Este entendimento é reiterado nos achados de Borba (2018) ao

entrevistar gestores da Universidade do Vale do Itajaí (SC) com o intuito de identificar a

imagem e a identidade desta instituição. Um dos entrevistados comenta Atualmente, a gente

tem trabalhado com várias frentes em termos de campanha. Mas eu acho que a gente ainda

peca numa campanha institucional com maior tempo de mídia, que é para exatamente

consolidar esta identidade de universidade comunitária (BORBA, 2018, p. 67).

Para Girard e Almeida (2009), o processo comunicativo sofre influência de práticas

culturais e de construções simbólicas, as quais são inerentes à organização. Entendida assim, a

comunicação, então, tem a qualidade de sustentar o que é distintivo daquela instituição, por

meio da divulgação de ações eficazes que realmente consigam demonstrar o que é singular

naquela universidade. Talvez, os departamentos de comunicação dessas instituições devam usar

novas estratégias para reafirmar sua identidade institucional. R2, ao se posicionar quanto à

comunicação de sua instituição, comenta Talvez a instituição nunca tenha se dado conta da

necessidade de comunicar esse aspecto. Ela sempre foi como é hoje. Ela não mudou. Ela foi

criada e ela se mantém no formato que ela foi criada. [...] Mas agora é que a gente sente a

necessidade de afirmar essa condição de comunitária. Percebe-se um entrelaçamento de

elementos culturais, práticas que vêm sendo executadas ao longo do tempo e que não eram

ameaçadas por pressões externas. No entanto, as mudanças globais trouxeram a necessidade de

reforçar a identidade para que esta possa servir de alavanca competitiva neste espaço de

combate. E continua Em 2010, nós já tínhamos umas concorrências muito fortes na cidade.

Então quando nós assumimos, a nossa preocupação era de nos afirmar como instituição da

cidade, porque havia outras de fora. Então, temos um predicado que ninguém nos tira, somos

comunitários, então “UNI2 a universidade da nossa comunidade”.

Percebe-se na fala dos gestores certa angústia quanto ao fato de a comunidade (tanto

interna, quanto externa) não compreender a dimensão do que caracterizaria uma instituição

comunitária, apesar de seus atributos serem tão mencionados nos canais formais de

comunicação. Estaria este problema de comunicação atrelado à forma como a mensagem é

comunicada ou à pouca clareza do entendimento do conceito do que seria uma “universidade

comunitária? Talvez aos dois.

Pertinente, neste momento, fazer referência aos usos e funções da linguagem. Ao

rastrear os vídeos selecionados, constatou-se que a linguagem utilizada é referencial, ou seja,

traz um caráter prioritariamente informativo, cujo foco recai na terceira pessoa do discurso, ou

seja, fala-se sobre “ela” (a universidade), o que ela é, o que faz, o que tem, mas de uma maneira

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bastante impessoal, distante daquele com quem fala (o interlocutor). Há grande volume de

material informativo, números, dados sobre a atuação da instituição, os quais parecem ter a

função de comprovar o envolvimento com a comunidade, o volume de produção científica, o

impacto regional, apresentados como se fossem relatórios de fiscalização. Apesar de alguns

elementos de caráter persuasivo se fazerem presentes (uso da segunda pessoa do discurso (sua

universidade, nossa universidade), adjetivações (a melhor universidade), eles não se mostram

em número suficiente para que a função conativa da linguagem predomine (CHALHUB, 1999).

Com exceção de um vídeo (UNI4, 2018), cujo texto é narrado em primeira pessoa (como se a

própria universidade estivesse falando), todos os outros se assemelham no modo de apresentar

a instituição. Entende-se que essas universidades têm consciência de si, sabem o que são e o

que querem dizer, mas, talvez, ainda não saibam como dizer. Argenti (2014, p. 90) comenta

que, com a crescente globalização e comoditização dos produtos, “a identidade e a imagem de

uma organização podem se tornar o único traço distintivo entre uma empresa e outra.” Em

virtude das semelhanças entre os produtos em todo mundo, os consumidores fazem cada vez

mais distinções com base em outras noções que não aquelas do produto em si, o que transforma

fatores como identidade e imagem em diferenciais significativos.

Entende-se que as universidades em estudo desejam realçar os atributos do modelo de

universidade que representam, as comunitárias, afinal foram reconhecidas como tais pela Lei

Nº 12.881 de novembro de 2013, mas o fazem apresentando um discurso linear, que se iguala,

como se todas dissessem a mesma coisa, do mesmo modo. Comenta R2 Nós precisamos

mostrar para a sociedade quem nós somos. E o que nós fazemos. E nós somos muito tímidos

nisso (R2, 2016). A institucionalização de universidades de caráter mercantil, a partir da década

de 1990, no Brasil, acirrou a competição no mercado de ensino superior e motivou um

comportamento mais agressivo quanto ao uso de propagandas nesse setor. Na tentativa de

ganhar mais espaço, as universidades mercantis valeram-se de todos os recursos disponíveis na

área de publicidade e marketing. Um levantamento feito em 1998, na cidade de São Paulo,

mostrou que entre os 15 maiores anunciantes de outdoor encontravam-se cinco instituições de

ensino privadas, o que demonstra a importância dada por essas instituições à publicidade

(CALDERÓN, 2000). Ao pensar sobre as campanhas institucionais das universidades

comunitárias foco deste estudo, parece que a constatação de Levitt (1985) faz sentido, ou seja,

que as universidades tradicionais tendem a restringir suas estratégias de marketing ao produto

em si, aos cursos que estão sendo oferecidos no mercado. Como já se constatou nas páginas

anteriores desta pesquisa, observa-se nos depoimentos dos gestores grande insatisfação quanto

às campanhas de comunicação realizadas pelas instituições, os quais percebem certa

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ineficiência no sentido de deixar clara à comunidade as singularidades da identidade da

instituição como comunitária, bem como produzir efeito atrativo sobre aqueles a quem se

direciona a mensagem. “Mas voltando especificamente ao ponto, nós comunicamos ainda

muito mal.”, afirma R2 (2016), demonstrando certa frustração.

Para Argenti (2014), a identidade corporativa deve trazer uma visão inspiradora, uma

marca cuidadosamente elaborada, que abranja os principais valores, filosofias e objetivos da

instituição. Para isso, o autor sugere a utilização de narrativas ou de uma história em episódios.

“A comunicação será mais eficaz se as organizações se basearem em uma [...] história

corporativa sustentável como fonte de inspiração para todos os programas de comunicação

internos e externos. Histórias dificilmente podem ser imitadas, e elas favorecem a consciência

em todas as mensagens corporativas” (RIEL, 2000, p. 163). A história corporativa deve

representar todo o discurso institucional, sendo coerente e consistente com a cultura e

comportamento organizacional.

Para obter informações sobre a organização e a história que está sendo contada, as

pessoas baseiam-se em artigos de publicações, anúncios de televisão, mídias digitais, mas

principalmente em conversas com outras pessoas como família, amigos, colegas de trabalho,

assim como com colaboradores da organização (ARGENTI, 2014). Ao ser perguntado sobre os

motivos que levariam um jovem a escolher aquela universidade, R3 comentou

Eu acho que é um misto de várias coisas. Primeiro, a indução familiar ou do próprio aluno em querer fazer um curso para realização pessoal. [...] Segundo, eu não sei como está isso, nos últimos anos, mas quando se fazia pesquisa de vestibular junto aos alunos e se perguntava qual tinha sido a fonte que o fez vir para a universidade, um percentual muito significativo dizia que era o boca a boca. Então, acho que esse elemento, essa índole é uma coisa que ajuda bastante. Lógico que as campanhas ampliam, comunicam. Mas não adianta fazer uma campanha de uma instituição que não tenha os predicados de condições, de professores, de estrutura, de qualidade e tal, pois eu acho que a campanha se esvazia (R3, 2016).

Os predicados da instituição são confirmados no compartilhamento informal de ideias

(boca a boca), comentários, opiniões e informações entre pessoas. Esse tipo de comunicação

interpessoal acaba assumindo grande impacto no comportamento dos consumidores, e por

consequência, na reputação corporativa, por influenciar nas suas opiniões e atitudes com relação

à organização e àquilo que ela oferece (IKEDA, 1997; BLACKWELL; MINIARD; ENGEL,

2005).

Falar em reputação, é falar sobre as expectativas que os stakeholders têm da organização

e da percepção que eles formam sobre o cumprimento dessas expectativas (ARTONI; DARÉ,

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2008). Assim, ao fazer o comentário sobre o que motivava o aluno a escolher aquela instituição,

respondendo que era o “boca-a-boca” ou mesmo a “índole”, o gestor se referia aos atributos

que faziam parte da reputação daquela universidade, quais sejam, a credibilidade, a qualidade,

a confiança e a responsabilidade (FOMBRUN, 1996), avalizados pelo intercâmbio de relatos

de experiências positivas com aquela instituição.

A reputação é construída ao longo dos anos e tem como base as ações e comportamentos

da organização, o que lhe dá um caráter de estabilidade. Para Rindova (1997), essa estabilidade

faz da reputação um ativo valioso porque ela protege as empresas de reações negativas, quando

um evento desfavorável acontece. Dessa maneira, mesmo que a organização vivencie uma crise,

abalando a sua imagem no curto prazo, se ela possui uma reputação forte, conseguirá

administrar melhor a crise em virtude dos relacionamentos sustentados em ações e

comportamentos que geram confiança, respeito e credibilidade (RINDOVA, 1997). Cabe

lembrar que a construção da reputação é demorada e requer coerência de atitudes no tempo e

nas diversas situações vivenciadas por aqueles que se relacionam com a organização. No relato

de R2, isso pode ser constatado

Aquilo que a universidade tem de qualidade, atrai por si só, o nome da universidade, por exemplo. A maioria dos nossos estudantes são filhos de quem fez a formação conosco. Então, aí mais um significado de ter uma instituição funcionando há tantos anos com qualidade, comprometida. [...] Então vem de pai para filho, como a gente diz, né. Muitos dos nossos professores, os pais foram professores ou estudaram aqui. Então, tem todo um sentimento que envolve isso que é muito caro para todos nós (R2, 2016).

Expressões como A maioria dos nossos estudantes são filhos de quem fez a formação

conosco ou aí mais um significado de ter uma instituição funcionando há tantos anos com

qualidade, comprometida. [...] Então vem de pai para filho trazem elementos singulares da

vivência daquela comunidade com a instituição e demonstram que a preferência se dá pelo

compromisso da instituição em manter a qualidade nos serviços que oferece. Essa reputação

que a universidade tem não pode ser copiada e muito menos vendida, daí a sua relevância como

contingente estratégico. Ela é a prova de que a empresa cumpre as promessas estabelecidas em

sua marca, gerando confiança, estima e respeito em seus públicos de relacionamento (NUNES;

ALMEIDA, 2008). Essa reputação corporativa está conectada com os resultados coletivos

positivos que os seus públicos-alvo percebem das ações da instituição, o que demonstra a

habilidade da organização em gerar valor aos seus stakeholders ao longo do tempo.

(FOMBRUN; RINDOVA, 1998).

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A palavra “tradição” utilizada pelos gestores quando questionados sobre as motivações

que levavam os estudantes a escolher aquela instituição traz consigo o sentido de reputação.

Vou usar o que é jargão. Tradição. A história da UNI2. Quem quer qualidade procura a UNI.

(R2, 2016). Esse aspecto da consolidação, acho que tem a ver com a história. A gente tem um

mérito muito grande em face da tradição e do que foi feito aqui anteriormente (R3, 2016).

Eles procuram a UNI4 pela qualidade das nossas atividades, dos nossos cursos de graduação,

pela história de qualidade que nós temos na instituição, nós temos um nome, uma marca

bastante forte aqui nessa região. Entra em cena um dos traços do conjunto que determina a

identidade organizacional, segundo Albert e Whetten (1985): a durabilidade. Esta diz respeito

aos aspectos temporais relacionados à perenidade tanto ao que é central quanto ao que é

distintivo da identidade da universidade, ou seja, a história construída durante os mais de

cinquenta anos dessas instituições junto à comunidade oferecendo uma formação profissional

que atende aos anseios da população, está viva nos discursos que se sucedem de geração a

geração. Esses discursos são alimentados por argumentos que ressaltam os princípios

comunitários, bem como as virtudes que distinguem essas instituições de outras, como a

qualidade de educação que oferece. Assim, a “identidade é afetada pela cultura organizacional

e por outros sistemas de significado com os quais ela interage” (SARAIVA; DUARTE, 2010,

p. 113), é a cultura munindo o simbolismo com o qual as imagens são construídas e

comunicadas (MACHADO, 2003).

Isso tudo gera um grau expressivo de pertencimento, pois “a construção de fortes

associações emocionais entre uma organização e seus clientes aumenta a identificação com a

organização e, portanto, a probabilidade da compra de produtos” (NUNES; ALMEIDA, 2008,

p. 2). Todos os gestores, quando perguntados sobre a história da instituição, em algum momento

incluíram-se nela. Conta o gestor R4

Eu cheguei aqui tinha só uns bloquinhos. Desde aluno de graduação, no curso de Educação Física que eu fiz, era atleta. [...] Depois comecei a me envolver muito com educação, me chamaram para ser coordenador pedagógico da Secretaria de Educação do município, e uns anos depois comecei a fazer pós-graduação e me convidaram para dar aula na universidade. Daí comecei em 1986 aqui na instituição como professor, então, 31 anos eu estou como professor. [...] A minha vida é a UNI4. Em 1997, fomos transformados em universidade. Há 19 anos que estamos aí como universidade (R4, 2016).

Para Saraiva e Duarte (2010) as identificações por parte do indivíduo também estão

ligadas ao trabalho que realiza e ao contexto em que atua. Hall (1997) comenta que a

identificação é construída juntamente com reconhecimento de objetivos, origens e

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características comuns entre indivíduos e organização. Eu comecei como aluno em 1977. Em

1981 comecei a dar aula antes de me formar, em Administração Rural. Depois me formei em

1982. Em 1986, eu fiz concurso para Direito. Aí, entrei no Direito como professor. Eu

conheço muito da nossa história (R2, 2016). Evidencia-se, nas declarações, uma identificação

dos gestores com os valores e o trabalho que desempenham junto às instituições.

Descreve R1

Estou aqui há vinte e três anos. Eu sou da Filosofia. Dois anos depois que eu entrei na universidade, já assumi uma chefia de departamento. Depois fui por quase três vezes diretor de centro e eu só larguei a direção porque assumir a pró-reitoria. [...] Então eu sempre fui demandado para mediar conflitos na gestão. Eu sou o mediador. As dificuldades existem, né, inclusive os cabelos branquearam, né? E enfim, então de fato, é um peso enorme, uma responsabilidade enorme. [...] Daquilo que era, a universidade cresceu com sucesso, o case da UNI1, é um case de sucesso. E cresceu junto com a cidade, com a região, a cidade cresceu junto com a universidade (R1, 2016).

A permanência desses gestores, por longo tempo, se dedicando em diferentes instâncias

e participando dos processos de transformação nessas universidades, alimenta o sentimento de

pertença, os quais comungam com os ideais e as ações promovidas pelas instituições junto à

sociedade. Isso é, de certa maneira, uma forma de manifestação da identidade organizacional.

Assim é, que em seus discursos, os gestores reforçam a todo instante as características de ser a

sua universidade comunitária. Destacam as qualidades, as virtudes, o envolvimento com a

comunidade, a história, as lutas, a reputação do local onde trabalham. E buscam comunicar tudo

isso, utilizando-se das mais variadas formas, sem, contudo, perceberam grande retorno de seus

esforços. Talvez, mais investimento em traços distintivos como a reputação pudesse comunicar

melhor suas principais forças como comunitárias.

Vários motivos têm levado as empresas a repensarem suas estratégias de relacionamento

com seus públicos: a globalização dos mercados; a saturação e a fragmentação da mídia; o

crescimento da opinião pública e uma inevitável comoditização de produtos e serviços que

dificulta a diferenciação. Nesse universo, a reputação é um recurso que se torna cada vez mais

importante na criação e manutenção de vantagem competitiva nas organizações (GARDBERG;

FOMBRUN, 2002). Para isso, “estabelecer uma política de comunicação consistente e que

transmita a identidade e os valores da empresa contribui, sobremaneira, para construir e

sustentar uma reputação forte” (NUNES; ALMEIDA, 2008, p. 3). Mais do que contribuir para

a visibilidade da organização, a comunicação organizacional “constrói sentido e significados

que levam a um maior ou menor grau de admiração, respeito, simpatia e confiança por parte de

seus públicos” (NUNES; ALMEIDA, 2008, p. 3).

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Wiedmann e Prauschke (2006) afirmam que a comunicação organizacional pode ser

utilizada para se estreitar o relacionamento com os stakeholders, na medida em que tem a

capacidade de alinhar as expectativas e demandas dos diversos grupos. Partindo dessa premissa,

talvez, é que os gestores, manifestam seus desejos de alinhar os discursos. Para tanto descrevem

algumas ações de comunicação interna e externa.

Tem o Tour UNI4 que acontece todos os meses. Os funcionários estão, às vezes dez anos aqui dentro e não conhecem a universidade. Eles vem de manhã, se inscrevem, são recebidos com café da manhã, e naquele dia, eles passam conhecendo a universidade, todos os lugares, passam o dia inteiro eles vão conhecer tudo. Almoçam, tomam café da tarde para encerramento. Então, eles não podem mais dizer que eles não sabem. Então, os feedbacks são muito interessantes no sentido de eles sentirem a universidade, de conhecer a instituição e de se comprometerem com ela, de se comprometerem com o outro também. Criamos o Anima. Nós dispensamos meia hora de trabalho, todos os funcionários, aqueles que podem sair naquele momento, dos setores para fazer ginastica laboral, yoga, natação, academia de graça O Anima também veio com objetivo de se desenvolver o sentimento de pertença. A gente precisa desenvolver o sentimento de pertença. Todos eles têm que se sentir integrantes dela (R4, 2016).

Ciente da necessidade de criar mecanismos eficientes de comunicação, o gestor

desenvolveu alguns programas que possibilitaram a integração entre universidade e

comunidade interna, mas não só. Seu propósito também era criar nesta comunidade o

sentimento de pertencimento e satisfação em trabalhar naquele espaço, Então, os feedbacks são

muito interessantes no sentido de eles sentirem a universidade, de conhecer a instituição e

de se comprometerem com ela, levando-os a respeitar e a admirar o trabalho realizado pela

instituição. Ao falar da relação entre gestão e comunicação, R4 defende

São decisões, são concepções que a gente tem de gestão. São escolhas. [...]Então, é essa coisa de as pessoas se comprometerem com o projeto institucional é ele que tem que estar acima de tudo. Não é com uma pessoa, com um gestor, com outro gestor, é com a instituição. E pra isso, a gente precisa do diálogo. Ter atenção com eles e fazer o que a gente pode para eles se sentirem bem, para eles se sentirem parte das decisões da instituição (R4, 2016).

O esforço do gestor vem no sentido de polinizar uma noção clara do que é uma

universidade comunitária e o que ela faz, alinhando os discursos, os quais serão polinizados

positivamente junto à comunidade tanto interna quanto externa. Além disso, alguns estudos

indicam que empresas que têm reputação forte e positiva sustentam seus processos de

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comunicação num conjunto de dimensões proposto por Fombrun e Riel (2004), quais sejam

transparência, autenticidade, consistência, visibilidade e distintividade. Em depoimento, R4 diz

Nós temos o Papo Aberto da reitoria com os funcionários. Todo semestre, então, os funcionários enchem o auditório, e aí a gente tá lá, toda a reitoria tá lá. [...] Eles são sinceros. Se a gente tá ali, a gente tá ali pra construir junto alguma coisa, pra melhorar. [...] É a transparência, é muito tranquilo isso com eles, porque não tem nada o que esconder (R2, 2016).

Parece que há certa predisposição do gestor em manter um canal aberto com o público

interno, na tentativa de criar uma relação transparente, sem grandes atritos. Ao se comunicar

mais e melhor com seus colaboradores, garantindo um processo de transparência, a instituição

aumenta o grau de confiança dos seus grupos de relacionamento, os quais depositam

credibilidade nas ações e propósitos da organização (FOMBRUN; RIEL, 2004). A

transparência, consiste, portanto, em uma ferramenta eficiente no gerenciamento de crises

quando múltiplos pontos de vista entram em jogo no conflito. A autenticidade gera certo apelo

emocional, confere um caráter de verdade ao discurso, pois sustenta-se nas crenças e valores da

instituição (OLIVEIRA, 2008). São decisões, são concepções que a gente tem de gestão. São

escolhas. [...] Então, é essa coisa de as pessoas se comprometerem com o projeto institucional

é ele que tem que estar acima de tudo. O gestor legitima tais princípios e, por meio do diálogo,

busca endossá-los junto aos colaboradores.

A consistência do discurso organizacional é garantida pela legitimidade conferida pela

coerência entre as ações e as informações divulgadas (FOMBRUN; RIEL, 2004). Para tanto, a

instituição deve valer-se de estratégias de comunicação e assim o fazem as universidades

comunitárias.

Nós optamos em mostrar o que estamos fazendo sem dizer “Olha, aqui tá a

universidade porque a universidade é o supra sumo.” Não. Não estamos fazendo isso. Porém, isso não chega a todas as pessoas. Nós não temos uma comunicação de massa. Isso que eu tô te falando, se refere aos dois jornais da cidade. Aparece na nossa TV Aparece na nossa rádio. Ok. Mas é muito pouco. Porque a nossa rádio, a nossa TV, não têm uma grande audiência (R2, 2016).

Parece que a preocupação do gestor reside em apresentar a universidade sem o cunho

mercadológico, mas por meio das ações e projetos que ela desenvolve junto à comunidade com

o intuito de reforçar a sua identidade como comunitária. Porém, ao mesmo tempo que considera

pertinente essa estratégia, também constata que ela não chega de forma abrangente nos

diferentes públicos, pois os meios de que dispõe atingem pequeno público. Então, nós

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precisaríamos ter algo mais massivo pra chegar nesse ponto de querer mostrar quem nós

somos. E ao mesmo tempo, distinguir-se das outras instituições que não são comunitárias. Ao

comentar sobre sua participação junto ao Comung, o gestor afirma

O Comung tem este compromisso de fazer essa comunicação. Nós fechamos agora uma parceria com a Rádio Gaúcha[...] através do nosso departamento de marketing. Mas nós queremos o quê. Patrocinar um programa na Rádio Gaúcha, que fale de educação e faça referência a uma universidade comunitária. A rádio não vai estar fazendo propaganda da universidade, mas a universidade vai levar informações para o programa. Essa rádio tem uma audiência em todo o Estado (R2, 2016).

A estratégia de comunicação da UNI4 também se apoia na apresentação dos feitos da

universidade em pesquisa, em ensino, vinculando a divulgação a informações de caráter

referencial, sem que haja elementos que sugiram um tom persuasivo. Ao falar sobre como a

universidade se comunica com seus públicos, R4 comentou

Nós temos, por exemplo, um espaço toda semana chamado Café Consciência na Associação Comercial. Toda semana, nós estamos lá comunicando uma produção cientifica dos nossos grupos de pesquisa. Isso é divulgado para toda a cidade, por causa da nossa vocação comunitária. Nós temos um espaço em todos os jornais da cidade. Tem um mundo de artigos publicados. Então, tem todos os releases. São inúmeros os artigos que eu já escrevi dizendo que é uma comunitária, porque se diferencia (R4, 2016).

São muitas as informações nas mídias sobre as atividades executadas pela instituição.

Nós geramos muitas notícias na comunidade. Isso é uma coisa constante. Na página de

esportes, vários atletas foram bancados pela universidade. Essa é uma forma de mostrar o que

nós fazemos (R2, 2016). Os esforços de divulgação buscam familiarizar entre os públicos de

interesse os resultados satisfatórios do trabalho realizado pela instituição. A visibilidade, neste

caso, pode gerar o reconhecimento para a instituição (FOMBRUN; RIEL, 2004). E este está

atrelado à frequência com que são disponibilizadas informações em diferentes mídias. Observa-

se que para atingir este reconhecimento, as universidades lançam mão de coletivas de imprensa,

participação em eventos, divulgação de trabalhos em congressos, artigos publicados em revistas

e campanhas publicitárias. Estas últimas, parecem apresentadas de maneira muito tímida.

Ao analisar as defesas das estratégias utilizadas junto à mídia, observa-se certo cuidado

dos gestores em não transformar a universidade em mero produto que passa a ser escolhido

porque apenas oferece determinadas vantagens. Está-se falando de uma instituição que prima

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pelo conhecimento como bem público, cujo ensino e pesquisa são percebidos como

experiências ímpares para aquele que deseja uma formação profissional fortalecida pelos laços

com a comunidade, A rádio não vai estar fazendo propaganda da universidade, mas a

universidade vai levar informações para o programa. Precisa-se, sim, divulgar as ações da

instituição, mas sem o cunho mercadológico, sem transformar a educação em bem de consumo.

Porém, a competitividade e a comoditização na educação superior ampliaram a

necessidade de um posicionamento que possibilite distinguir a organização na mente de seus

stakeholders (OLIVEIRA, 2008). Num contexto de competição, a informação torna-se

realmente crítica, porque, segundo Amaral (2009) a educação superior possui três

características simultâneas: é um bem de experiência – a avaliação de suas qualidades só poderá

acontecer depois de o estudante ter frequentado grande parte do curso; é uma compra rara – em

muitos casos o estudante só frequenta um curso durante a vida; e o custo de evasão é muito alto

– abandonar o curso é difícil em virtude do custo e tempo já investidos. Essas características da

educação superior atreladas à expansão de novas instituições não universitárias e com fins

lucrativos, estimulou a competição e a busca pelo mesmo público-alvo: os alunos. Talvez, por

não precisarem investir em pesquisa e extensão, o que aumenta os custos de manutenção, como

folha de pagamento, essas instituições de ensino tenham condições de destinar mais recursos

para o setor de publicidade junto à mídia, incrementando, assim, a sua forma de se comunicar

com os diversos públicos, tornando o mercado mais agressivo (BERTOLIN; DALMOLIN,

2014). Essa inferência, encaminha o raciocínio para as constatações de McCowan (2018). Na

medida em que a instituição procura reduzir os custos e maximizar os lucros por meio da

separação de suas atividades, aí se instala a desagregação, como resultado do surgimento de

atividades empresariais.

No quadro 12, observa-se que a UNI3 recebeu premiação - Prêmio Top of Mind22 de

Santa Catarina (2018), pelo sexto ano consecutivo. Essa é uma forma de constatar a importância

dada pela gestão à comunicação Um dos nossos propósitos de gestão é a comunicação, porque

sabemos que a comunicação é complicada (R3, 2016). Em virtude dessa complexidade, a

universidade precisa construir sua história, “criando links emocionais entre seus grupos de

relacionamento” (OLIVEIRA, 2009, p. 14) e escolher estratégias eficientes de comunicação, a

22 Top of Mind é um termo em inglês utilizado na área do marketing empresarial como uma maneira de qualificar as marcas que são mais populares na mente dos consumidores. Na prática, a pesquisa acontece com entrevistados que, sem indução, nomeiam uma marca ou produto específico, ao serem perguntados sobre empresas que se recordam dentro de certa categoria de produtos. Disponível em: http://flipzh.clicrbs.com.br/jornal-digital/pub/gruporbs/index2//?numero=12325&code=1530873234072#page/2. Acesso em: 15 fev. 2019.

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fim de desenvolver uma marca forte e memorável. Comunicar seus traços distintivos, talvez

seja uma maneira de personalizar a sua existência, potencializando suas vantagens competitivas

(ALBERT; WHETTEN, 1985).

O processo comunicacional precisa ser compreendido em sua complexidade durante as

trocas simbólicas, informacionais e de bens culturais. A viabilização da comunicação exige

informação, credibilidade dos interlocutores, meios e instrumentos adequados, assim, “a análise

dos processos de relacionamentos torna-se imprescindível quando se pretende inovar, criando

melhorias que impactem a vida da população” (DUARTE, 2007, p. 64). Não basta ter ciência

de que as relações mudaram e que a competição no universo da educação superior tornou-se

mais acirrada, isso requer novas formas de comunicação. Nós temos que profissionalizar a

gestão das instituições (R2, 2016). Os gestores desejam que a comunicação seja eficiente e

eficaz. Isso requer o constante monitoramento para apreender as necessidades e potenciais

mudanças nas estratégias de comunicação. No entanto, ao percorrer os PDIs das universidades,

pouco espaço, nesse documento, foi destinado à comunicação institucional. Ao descrever

aspectos sobre Planejamento e Governança estratégica, a UNI2 apontou que o objetivo neste

item é aprimorar o marketing e a comunicação institucional (UNI2/PPI, 2017, p. 66). Já, a

UNI3 descreve em detalhes as suas metas no campo da comunicação com a sociedade,

apontando objetivos e descrevendo ações, de modo mais objetivo (UNI3/PPI, 2017, p. 157-

159). Talvez a equipe gestora devesse reavaliar a presença desse ingrediente em seus

documentos e dar a ele lugar de destaque.

Assim, percebeu-se que, nas campanhas de marketing das universidades comunitárias,

há a presença reiterada de um discurso que prioriza a missão e os valores preconizados por essas

instituições, muitos dos predicados da instituição são compartilhados de modo informal (boca

a boca), o que acaba impactando na reputação da universidade e há um forte sentimento de

pertença por parte de seus gestores presente em seus discursos. Em contrapartida, o fraco

investimento em campanhas eficazes de comunicação que demonstrem esse potente esforço de

atuação junto à sociedade, compromete o entendimento de sua denominação como comunitária.

A comunicação institucional é uma das responsáveis pela construção da identidade da

organização, por isso mesmo deveria ser compreendida como fundamental nos processos de

relacionamento entre os diversos públicos com os quais a universidade interage, assumindo um

papel relevante nas estratégias de gestão dessas instituições. As preocupações dos gestores são

pertinentes com relação à comunicação e representam um grande desafio para as universidades

comunitárias.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As universidades vêm enfrentando múltiplos obstáculos que se colocam contrários à a

proposta de promover o bem público. A adoção de políticas neoliberais para o ensino superior,

recomendadas pelo Banco Mundial, desencadeou processos de mercantilização, privatização,

precarização, tornando-se estas palavras comuns para qualificar este setor. Neste contexto,

encontram-se as universidades comunitárias, as quais vêm sofrendo os efeitos das políticas

públicas voltadas à mercantilização da educação e das oscilações econômicas provocadas pela

globalização. Inseridas em um contexto sócio econômico e histórico-cultural, as universidades

comunitárias enfrentam muitas tensões na busca de uma identidade que as torne singular.

Esta pesquisa teve como objetivo compreender o processo e as características que

envolvem a constituição identitária das Universidades Comunitárias do sul do Brasil,

considerando o contexto mutante das políticas para o ensino superior nas últimas décadas.

Como desdobramento, buscou-se identificar os principais marcos históricos de constituição da

identidade que norteiam as Universidades Comunitárias no contexto das políticas educacionais

para o ensino superior no Brasil; analisar os traços identitários característicos das universidades

comunitárias, a partir das dimensões valor, função, interação, observando os dilemas

enfrentados por estas instituições no que tange às políticas neoliberais; e identificar o modo

como as universidades comunitárias manifestam/comunicam sua identidade aos seus públicos.

A análise que se estabeleceu entre a empiria e a teoria sugere alguns encaminhamentos

pertinentes aos objetivos perseguidos.

Há mais de cinco décadas, em meio a lutas pelo seu reconhecimento e identificação

como instituição pública não estatal, as universidades comunitárias vêm construindo sua

trajetória no campo do ensino superior brasileiro. Em face da ampla mudança nas políticas

educacionais, notadamente a partir da reforma do Estado e da Educação, na década de 1990,

esse modelo de universidade vem se deparando com uma política neoliberal, na qual a educação

é vista como um bem de consumo, sendo tratada como mercadoria e bem de capital, sujeita às

mesmas estratégias de gestão do mundo dos negócios. Esse cenário gerou alguns conflitos no

que diz respeito aos contrastes entre o caráter institucional e o organizacional, entre servir à

comunidade e sobreviver à concorrência, entre respeitar a sua gênese ou ceder às imposições

do mercado, os quais estariam influenciando a constituição de sua identidade. A análise do

contexto à luz de uma abordagem teórico-metodológica a partir dos estudos de McCowan

(2016; 2017; 2018) e de Albert e Whetten (1985) traz algumas contribuições.

Em sua trajetória, entre os anos de 1960 e 2013, vários marcos pontuaram a árdua

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caminhada até a legitimação das universidades comunitárias, com a aprovação da Lei nº

12.881/2013 que dispõe sobre a definição e finalidades dessas instituições. Durante esse

caminho que se inicia com o processo de interiorização do ensino como projeto de

desenvolvimento regional, passando para a fase da consolidação, com o reconhecimento da

existência das universidades comunitárias na Constituição de 1988 (Art. 213), seguindo em

direção à multiplicação da abertura de novos campi, marcando a diversificação e, finalmente,

o seu reconhecimento legítimo, consagrado pela Lei Nº 12.881/2013 que estabeleceu a

tripartição das Instituições de Ensino Superior em públicas, comunitárias e privadas, observa-

se a conquista de muitos avanços na construção da identidade dessas instituições, fruto das

incessantes reivindicações de seus gestores como reitores, vice-reitores, professores,

funcionários, das associações que as representam como COMUNG (RS) e ACAFE (SC), de

integrantes da sociedade civil, de representantes junto aos órgãos municipais, estaduais e

federais. Em cada uma das etapas do processo, a presença de interesses divergentes pelos

definidores das políticas, vem tornando o caminho sinuoso e os obstáculos crescentes.

Apesar de terem percorrido um caminho que as levou ao reconhecimento de sua legítima

existência, as decisões no âmbito das políticas públicas constituíram-se em muitos entraves,

principalmente com a promulgação de leis que abriram espaço para o setor privado (4.024/61;

5.540/68), estimulando a proliferação de instituições isoladas. Se, por um lado, o processo de

interiorização do ensino superior trouxe múltiplos benefícios como a ampliação e o

fortalecimento do mercado de trabalho e a dinamização da economia local, por outro, também

fomentou o aparecimento de instituições privadas que viam aí uma oportunidade de lucrar com

a oferta de cursos com baixa qualidade. A Constituição de 1988 e a LDB de 1996 reiteraram o

espaço da iniciativa privada na educação. O estabelecimento de apenas duas categorias de

instituição de ensino – públicas e privadas (particulares, comunitárias, confessionais,

filantrópicas) pela Lei 9.394/96, fez nascer alguns conflitos quanto à identidade dessas

instituições. Até o advento da Lei 12.881/2013, as universidades comunitárias encontravam-se

no espaço genérico das IES privadas, e a Lei assumiu um papel fundamental no reforço da

identidade do modelo comunitário de educação superior.

No processo de construção de uma identidade reconhecida e sólida, um conjunto de

benefícios às universidades comunitárias, propiciado pela nova lei, principalmente pelo acesso

aos editais de órgãos governamentais e o recebimento de recursos orçamentários do poder

público para desenvolver atividades de interesse público, foi conquistado. Ao mesmo tempo, a

presença de elementos de regulação do Estado sobre o modelo comunitário oferece ainda

dificuldades de acesso de várias instituições às benesses da nova lei, bem como a presença de

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certa resistência e morosidade no processo de seu cumprimento no que tange à liberação de

recursos públicos para essas instituições.

Na análise da anatomia das universidades comunitárias, alguns traços identitários

característicos desse modelo de universidade foram definidos, a partir das dimensões valor,

função e interação, bem como algumas tensões enfrentadas por essas instituições no que tange

às políticas neoliberais, com a presença de processos como comoditização e desagregação.

A dimensão valor refere-se à razão da existência da universidade. Ao entender a

educação e o conhecimento como bens públicos e direitos humanos essenciais, as universidades

comunitárias assumem o caráter de instituição que não negligencia nem sonega ao cidadão o

direito à sua formação integral pela mediação dos conhecimentos. Nessa linha de raciocínio, o

conhecimento tem valor público e social, não é mero mecanismo de otimização de lucros, e

nem a universidade simples espaço de reprodução de produtos comercializáveis. Nesse caso, o

conhecimento é tomado em seu valor instrumental e serve tanto para resultados individuais, em

termos de realização de objetivos de vida, quanto para benefício público, cujo alvo volta-se para

a coletividade, na busca de um mundo mais igualitário.

A análise da Missão, da Visão e dos Valores dessas instituições permitiu identificar

semelhanças no modo de construir esses aspectos, até uma certa uniformização do dizer e

deixam transparecer alguns elementos constituintes de sua identidade organizacional. Sua

descrição e entrelaçamento servem de parâmetros os quais indicam as áreas, as atividades, os

programas, a região, os públicos-alvo, os parceiros nos quais a instituição deve concentrar-se,

o que se configura um grande desafio para essas universidades, considerando os processos de

mercantilização e desagregação por que passa a educação mundial. Alerta-se que esses

conceitos não são impessoais ou simplesmente técnicos, eles estão conectados às pessoas que

tratam com eles, refletindo suas aspirações, expectativas, motivações, envolvidos em um

discurso que intermedia as relações entre a comunidade interna e externa e que reflete aspectos

culturais organizacionais.

A universidade é uma instituição social e como tal convive com a presença de opiniões,

atitudes e projetos conflitantes que exprimem as contradições da sociedade. No entanto, nas

últimas décadas, a universidade vem remodelando sua identidade, adaptando-se às

transformações do mundo, deixando de ser, nesse processo, uma instituição social para ser uma

organização social a qual define-se por uma prática regida pelas ideias de gestão, planejamento,

previsão, controle e êxito. Uma organização social não discute ou questiona sua existência, seu

lugar no interior das lutas de classe. Complexas em seus sentidos e significados históricos, as

universidades comunitárias buscam permanecer fiéis aos seus propósitos, lutando para não se

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submeter aos interesses do mercado. Seus gestores entendem que os conhecimentos produzidos

nas humanidades, apesar de não ter valor imediato de mercado merecem atenção e são de

interesse público, daí a decisão de assumir a permanência dos cursos de licenciatura, mesmo

sendo estes deficitários, dividindo o ônus com toda a instituição. Essa forma de proceder se

distancia do entendimento de que somente os conhecimentos úteis e aplicáveis, conectados ao

mercado, são propulsores de desenvolvimento e, portanto, merecem destaque. A compreensão

de que a pesquisa em humanidades é importante na formação de profissionais qualificados e

cidadãos responsáveis impacta na construção do conhecimento como bem comum e coletivo.

Esse é um processo vai de encontro aos princípios da comoditização. Assim é, que se

materializa o conceito de comunitário, carregando a marca da sua identidade.

A função diz respeito ao papel da universidade em termos de produção, armazenamento

e transmissão de conhecimento e se materializa por meio do ensino, da pesquisa e da extensão,

princípio estabelecido como dever para as Universidades, no artigo 207 da Constituição Federal

de 1988 (BRASIL, 1988). A indissolubilidade deste trinômio na construção da identidade das

universidades comunitárias está longe de ser mera obrigação imposta por legislação. Parece que

o preceito de aplicação sistêmica do trinômio ensino-pesquisa-extensão na busca pela qualidade

da educação superior nessas instituições se manifesta de forma quase igualitária de modo que

tais funções pareçam complementar-se mutuamente. Mas, livres de estarem imunes às

intempéries dos jogos políticos, econômicos e sociais, em nível local e/ou global, novas

estratégias de adaptação em suas funções estão sendo exigidas.

A educação superior expande-se em direção ao mercado e o estado tenta diminuir os

seus custos. Entre as características desse novo desenho de universidade apresentam-se

avaliações classificatórias, capitalismo acadêmico, professores empreendedores, gestão de

caráter gerencialista, além da diversificação da missão das instituições, do aumento do número

de instituições privadas em progressão acelerada; da ampliação do número de matrículas e de

cursos; da flexibilização da oferta curricular, da diversificação do financiamento, da avaliação

intensiva, em diferentes modalidades, seguido de rankings nacionais e internacionais. Esse

redesenho possibilitou a emergência de novos modelos institucionais, de caráter empresarial,

cuja orientação do conhecimento volta-se para o mercado e, de certa forma, pressionou as

universidades comunitárias a buscar novas formas de governança.

Se se considerar as características do desenho da nova universidade em todas as suas

consequências, então pode-se dizer que algumas dessas características estão presentes no

comportamento institucional das universidades comunitárias. Em seus documentos

institucionais, a exaltação dos seus conceitos nos rankings, números expressivos de produção

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científica, investimentos em inovação com criação de Parques Tecnológicos e desenvolvimento

de incubadoras são apresentados em detalhes à comunidade. A estrutura multicampi e a ampla

oferta de cursos presenciais, educação a distância, a redução de pessoal e convênios com outras

instituições também estão o rol das mudanças que vêm ocorrendo nas comunitárias.

Aliada a essas decisões, entra no cenário, a implementação de políticas para ingresso

em cursos EaD. Utilizada para ampliar o número de alunos, baratear os custos e maximizar os

lucros, a EaD tem representado papel importante na expansão do ensino superior privado

brasileiro. Essa é uma estratégia que começa a tomar corpo nas universidades comunitárias,

apesar de depoimentos contrários à sua implementação, mas o risco de comprometer a

sustentabilidade das instituições está fazendo com que estas ofereçam cursos de graduação e

pós-graduação em currículos flexíveis ou totalmente à distância, a custos mais baixos,

facilitando o acesso de alunos. A EaD e seus desdobramentos, atrelada às políticas públicas

para o ensino superior, talvez seja, atualmente, um dos fenômenos que mais represente os

processos de mercantilização e desagregação, nos quais o desenvolvimento dos fins e dos meios

da educação superior se reorienta conforme os princípios e a lógica do mercado.

Una-se a essas implicações, os padrões e mecanismos de controle, como a ampliação da

avaliação de credenciamentos e reconhecimentos de instituições e cursos e exames nacionais.

Nesse cenário, a avaliação é partícipe do quadro do redesenho das universidades, contribuindo

com os rankings nacionais que ganham destaque na imprensa e estimulando a homogeneização

de instituições de educação superior. Submetidas a sistemas de indicadores, as universidades se

veem pressionadas a atender múltiplos aspectos formais de regulação, e, para garantir a sua

credibilidade, adotam estratégias de produtividade que extrapolam os limites do trabalho da

academia, levando os processos burocráticos à exaustão. Acrescente-se a esse cenário, o

credenciamento de novas instituições não universitárias e com fins lucrativos, as quais não

precisam investir em pesquisa, o que possibilita a cobrança de mensalidades mais baixas, uma

vez que o custo de manutenção é inferior ao de uma universidade comunitária. Tudo isso

estimulou uma competição acirrada entre as instituições de ensino superior, obrigando as

universidades comunitárias a realizarem cortes, extinguirem cursos e atividades de interesse da

comunidade.

Parece que há um movimento das comunitárias no sentido de aplicar critérios de

mercado às suas tradicionais funções e atividades, o que, talvez, sejam investidas contraditórias

à missão dessas instituições a ponto de descaracterizá-las como comunitárias. Porém,

considerando que as universidades comunitárias entendem a educação como um bem público e

comum, são instituições não lucrativas, pertencentes à sociedade civil, e defendem a

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indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão, esse movimento de mudança estaria

imerso nas comunidades com o intuito de promover o desenvolvimento social e econômico

regional, o que a distanciaria de um caráter totalmente mercantil. Ao mesmo tempo em que são

pressionadas a acompanhar as transformações em nível global, não se descolam das demandas

da comunidade onde estão inseridas, promovendo extensão e pesquisa em prol desta.

A função interação/extensão refere-se às formas como a universidade se relaciona com

a comunidade externa, com relação a facilidade ou dificuldade de comunicação do

conhecimento produzido a parceiros externos à universidade. A extensão universitária é a

promotora da integração entre a universidade e a comunidade na qual está inserida, operando

como uma via de mão dupla. A concepção interação/extensão vem ao encontro dos anseios das

universidades comunitárias, forjados já em seu nascimento. A denominação “universidade

comunitária” traz seu forte caráter regional, e a noção de comunidade em sua origem, em seus

objetivos e em sua forma de gestão.

Em cinco décadas de existência e de efetiva participação no projeto de desenvolvimento

regional, essas instituições provocaram grandes mudanças socioeconômicas nas regiões onde

estão inseridas. A gama de certificações concedidas às universidades comunitárias em foco

evidencia que as comunidades locais e regionais assumem a responsabilidade social não como

um apêndice que, muitas vezes, se materializa em ações pontuais, mas como elemento fundante

de um projeto de universidade e de sociedade que almejam construir.

Porém, quando as fronteiras entre a universidade e a sociedade se tornam muito

permeáveis, há riscos de desagregação, provocados pela hiperporosidade, na via de duas mãos,

diminuem os caminhos de intersecção e aumentam os distanciamentos, com a pressão maior de

um dos lados. Políticas públicas como a desobrigação de vincular as instituições da obediência

ao princípio da indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão, assim como da obrigação das

entidades mantenedoras de publicar demonstrativos financeiros certificados por auditores

independentes, levaram ao crescimento do modelo de instituição empresarial/mercantil,

constituindo-se em ameaça à sustentabilidade das universidades comunitárias, tornando-as

vulneráveis nesse cenário competitivo.

A baixa ou alta porosidade/permeabilidade também diz respeito ao acesso de alunos e

professores ao universo acadêmico. Com o propósito de garantir o acesso ao ensino superior

dos estudantes de baixa renda por meio do preenchimento de vagas nas instituições privadas,

foi instituído, em 2005, o Programa Universidade para Todos (PROUNI), através da Lei nº

11.096/2005 (BRASIL, 2005b). Dois atores sociais foram beneficiados com a oferta de bolsas

de gratuidade nos cursos superiores de graduação e sequenciais de formação: os alunos aptos a

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ocuparem essas vagas, e as IES privadas que, além de preencherem um grande número de vagas

ociosas, também conquistaram isenção fiscal. Essa política expansionista e a obrigatoriedade

de canalizar os recursos somente para bolsas de estudo restringiu o poder de integração com a

comunidade, criando um cenário complicado para as universidades comunitárias.

O Estado transferiu a tarefa de expansão do ensino superior a todas instituições sem

medir as consequências para muitas delas. Ao incluir todas as instituições, sejam elas com ou

sem fins lucrativos e de todas as categorias, no programa de distribuição de bolsas, estimulou a

mercantilização do ensino, a precariedade da qualidade e ampliou o processo de desagregação

da educação ofertada. Se no passado, as instituições comunitárias se valiam de isenções fiscais

para desenvolver projetos e ações sociais junto à comunidade, com a nova Lei, os recursos

tornaram-se escassos, o que levou a um movimento das comunitárias de firmar mais parcerias

para se fortalecerem e fortalecer a conexão entre as atividades que são realizadas na academia

e sobre o que a comunidade precisa e deseja. O entendimento de tudo isso recai sobre a noção

de porosidade, neste caso, as consequências negativas das pressões/das infiltrações das políticas

públicas sobre as instituições comunitárias, desestabilizando a dinâmica interna de suas ações.

A interação, dessa forma, se dá de forma assimétrica.

A interação também diz respeito à gestão, que, nesse caso, refere-se à dinâmica

colegiada das universidades comunitárias, com alto grau de democratização no fluxo de seus

processos. Assim como a colegialidade pode ser considerada uma forma desejável de

participação das comunidades interna e externa nas decisões da universidade, ela também pode

representar certo entrave nos processos que necessitam maior agilidade. Ao mesmo tempo em

que buscam preservar os fortes elementos culturais e a sua dinâmica colegiada, se sentem

pressionadas a se reposicionem na tentativa de gerar equilíbrio entre qualidade da educação,

fortalecimento de valores, competitividade e sustentabilidade.

Expressões como “alinhar uma gestão profissional” e “não perder a essência de ser

uma instituição comunitária” revelam a preocupação de seus gestores em manter a autonomia

frente aos desafios advindos das políticas e práticas de gestão da educação brasileira e cuja

implicação recai diretamente na regulação e transparência da gestão das universidades

comunitárias. Também significam, apesar dos problemas no que se refere às questões que

surgem da dicotomia público/privado, apesar das escassas fontes de financiamento, não perder

de vista a essência comunitária da instituição, e tentar resolver os impasses sem que eles se

tornam obstáculos intransponíveis. Alinhar é estar em sintonia para com aquela que realmente

seria o motivo de sua existência: a comunidade local.

No entanto, uma universidade não vive isolada, ela é parte da tessitura complexa da

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sociedade. Nenhuma reflexão que tenha a educação superior como foco pode desconsiderar as

características atuais da globalização e da mercantilização do conhecimento, características

estas materializadas nas visíveis mudanças no sistema de educação superior brasileiro. Apesar

de se perceber, nas vozes dos gestores e nos registros dos documentos analisados, uma atitude

de resistência às mudanças que vêm ocorrendo na área da educação, provocadas pela

globalização, parece haver uma avalanche de políticas internacionais, de reformas políticas

brasileiras, de decisões no mundo financeiro, de omissão do Estado no resguardo dos direitos

do cidadão que, pouco a pouco, vai mimando o ideário comunitário e seus princípios voltados

aos bem comum.

A análise da anatomia das universidades comunitárias permitiu observar a luta dessas

universidades em manter o princípio da indissociabilidade entre ensino/pesquisa/extensão e os

desafios impostos à sua gestão dado o cenário da concorrência imposta pela mercantilização do

conhecimento. Historicamente, sabe-se que o trabalho realizado nas universidades se volta à

pesquisa, muito mais do que ao ensino e à extensão. Manter a tríade (uma das exigências legais)

faz com que as universidades comunitárias tenham que dispor de recursos vultosos em capital

humano, em infraestrutura, em intervenções junto à comunidade local. Isso tudo as coloca em

desvantagem quando comparadas a instituições cujo compromisso se limita a oferecer

atividades de ensino apenas. Por outro lado, é a nutrição da indissociabilidade entre

ensino/pesquisa/extensão um dos fatores que torna a educação nas universidades comunitárias

singular. Seu fortalecimento se dá no incentivo à pesquisa voltada à busca de solução aos

problemas locais, advindos dos contatos estabelecidos com a sociedade e retroalimentado com

os referenciais teóricos capturados em dimensão global.

Esse estudo também permitiu constatar que políticas de expansão e diversificação da

educação superior, principalmente, do ensino superior privado, constituem ameaças às

universidades comunitárias. Apesar de haver a necessidade de expandir o ensino superior no

Brasil para expansão do acesso, promoção da inclusão social e disseminação do conhecimento,

a forma como esse processo vem acontecendo deixa dúvidas quanto à qualidade do serviço

oferecido e os seus reais objetivos de aplicação. Com um discurso pautado na privatização, as

políticas educacionais têm sido decisivas para a criação de um mercado educacional,

introduzindo, de modo efetivo, a educação no setor de serviços a serem negociados como mero

produto de troca. Princípios neoliberais como flexibilidade, racionalidade, produtividade e

competitividade passam a alimentar a proposta de um novo modelo de governança,

transformando a educação superior em negócio altamente lucrativo.

Nesse estudo também buscou-se identificar o modo como essas instituições a

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comunicam aos seus diferentes públicos. Ao analisar algumas campanhas de marketing

institucional destas universidades, observou-se que elas enfatizam a excelência na busca do

conhecimento, a tradição e contemporaneidade, a inovação, o envolvimento com a comunidade,

os destaques e rankings nacionais e internacionais, a abrangência da infraestrutura. Também

pôde-se observar a presença reiterada de um discurso que prioriza a missão e os valores

preconizados por essas instituições. Para os gestores, muitos dos predicados da instituição são

compartilhados de modo informal (boca a boca) por comentários, opiniões e intercâmbio de

relatos de experiências positivas com aquela instituição, o que acaba impactando na reputação

da universidade, avalizada por atributos como credibilidade, qualidade, confiança e

responsabilidade.

A permanência desses gestores, por longo tempo, nessas universidades, alimenta o

sentimento de pertença, os quais comungam com os ideais e as ações promovidas pelas

instituições junto à sociedade. Em suas estratégias de comunicação tanto interna quanto externa,

buscam elucidar o conceito de “universidade comunitária”, utilizando-se dos mais variados

canais de comunicação, sem, contudo, perceberem grande retorno de seus esforços. Muito do

que se veicula se assemelha a campanhas institucionais de outras universidades privadas, o que

contribui para a incompreensão do sentido do que seja comunitário. Talvez, mais investimento

em traços distintivos como a reputação e o uso de narrativas singulares e inspiradoras pudessem

comunicar melhor suas principais forças como comunitárias.

Quanto à defesa das estratégias utilizadas junto à mídia, observou-se certo cuidado em

não transformar a universidade em mero produto vantajoso. Está-se falando de uma instituição

que prima pelo conhecimento como bem público, cujo ensino e pesquisa são percebidos como

experiências ímpares para aquele que deseja uma formação profissional fortalecida pelos laços

com a comunidade. Mas, há a necessidade de repensar as estratégias de relacionamento com

seus públicos, pois em um contexto de competição, a informação torna-se realmente crítica. A

saturação e a fragmentação da mídia; o crescimento da opinião pública e a comoditização de

produtos e serviços, aliadas à globalização dos mercados, estão dificultando as diferenças entre

as instituições. Dar visibilidade às ações junto à comunidade, investindo mais em campanhas

de comunicação pode se constituir em uma estratégia eficaz.

Com o intuito de compreender como as universidades comunitárias constroem e

consolidam sua identidade, concebeu-se uma visão de identidade organizacional como

resultante de um conjunto de afirmativas sobre seus atributos centrais, distintivos e duradouros

(ALBERT; WHETTEN, 1985). Entre os atributos centrais encontram-se a convicção de que o

conhecimento gerado na instituição deve estar direcionado para o bem público e para o bem

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comum, sendo tomado em seu valor instrumental, a indissociabilidade entre

ensino/pesquisa/extensão e o forte enraizamento coletivo, o que marca outro traço central de

sua identidade: a sua inserção social. As vozes dos gestores e as redações dos documentos

oficiais enfatizam as características distintivas, entre elas o forte caráter regional, não visar

lucro, ser pública não estatal, destinar seu patrimônio, em caso de extinção, a uma instituição

pública ou congênere e o compromisso com uma gestão baseada na colegialidade e na

transparência administrativa. A durabilidade diz respeito aos aspectos temporais relacionados

à perenidade tanto ao que é central quanto ao que é distintivo da identidade da universidade. A

palavra “tradição”, que traz consigo o sentido de reputação, e as histórias construídas durante

os mais de cinquenta anos dessas instituições, junto à comunidade, estão vivas nos discursos

que se sucedem de geração a geração. Esses discursos são alimentados por argumentos que

ressaltam os princípios comunitários, bem como as virtudes que distinguem essas instituições

de outras, como a qualidade de educação que oferecem.

Observou-se, reiteradamente, nas palavras dos entrevistados, um discurso de resistência

àquilo que possa vir de encontro à missão dessas instituições. Mas indaga-se: e na prática como

isso se dá? Como ou até quando se poderá resistir a um discurso globalizado cada vez mais

agressivo que busca inculcar novos valores, atitudes e prioridades, projetando e forjando uma

nova ou diferente identidade institucional? Como resistir diante de um projeto identitário de

universidade que vai na contramão do que as instituições comunitárias preconizam?

Pressionadas por um mercado altamente competitivo e por políticas públicas que incentivam a

expansão e diversificação da concorrência, o que compromete a sua sobrevivência, como

resistir à avalanche de ofertas de produtos e serviços terceirizados na área da educação que

minimizam os custos da instituição e prometem bons rendimentos a curto prazo?

Se a formação e o conhecimento forem tomados como mercadoria, os fins alimentarão

competências e habilidades que poderão estimular a competitividade e a maximização de

lucros, se tomados como bens públicos, orientar-se-ão por valores como justiça social,

equidade, democracia e respeito. Nesse contexto de ambiguidades, encontram-se de um lado os

ideais históricos da universidade (busca do conhecimento, liberdade de pensamento e de

expressão, pluralismo de ideias, a conjunção ensino, pesquisa, extensão) e, por outro, os ideais

econômicos de produtividade, eficiência e resultados, sustentados pelos princípios do

neoliberalismo. Conforme afirmou-se, nas primeiras páginas deste estudo, a universidade é

fruto de uma construção social e histórica, atravessada de contradições, não está isenta das lutas

por espaços e ideias que adentram o jogo do poder, que tem a força de materializar o tipo de

humanidade a que se quer fazer parte. Assim, parece que os ideais históricos das universidades

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comunitárias e o vínculo que elas têm com a comunidade, marcas identidade institucional,

então, se mostram como fortes elementos de resistência às mudanças impostas pelo mercado.

Mas até quando?

Quanto às limitações enfrentadas no estudo, a abrangência da dimensão Funções

apresentou-se como uma delas, uma vez que, para este item três elementos se faziam presentes

– ensino, pesquisa e extensão, cada qual com inúmeras possibilidades de investigação como

currículo, acessibilidade, produção docente, gestão do processo pedagógico,

internacionalização, os quais são também ingredientes importantes da construção da identidade

das universidades comunitárias e que, igualmente, sofrem com as turbulências geradas pelas

mudanças que se aceleram no mundo da educação superior provocadas por políticas de caráter

neoliberal.

Ao estudar as universidades comunitárias, esta pesquisa considerou alguns aspectos em

cada uma das dimensões Valor, Funções, Interação, dentro do contexto das políticas públicas

voltadas à educação superior. Se considerarmos a abrangência, por exemplo, das funções da

universidade no que se refere ao ensino, poder-se-ia aprofundar uma análise voltada aos

programas de formação continuada, às formas de acesso, às modalidades de ensino; quanto à

pesquisa, seria possível analisar os grupos e linhas de pesquisa, a expansão de parques e

incubadoras tecnológicas; e à extensão, e poderia abordar as relações com os diversos

stakeholders com os quais a instituição se relaciona. Cada uma das dimensões apontadas,

poderia gerar múltiplas investigações. Outra sugestão de estudo poderia contemplar uma análise

comparativa entre instituições públicas e privadas, considerando aspectos centrais, distintivos

e duradouros na construção da identidade dessas instituições. Estas são algumas investidas que

poderiam desencadear investigações científicas na busca pelo conhecimento da identidade dos

diferentes modelos de universidade, não só das comunitárias.

Finalmente, os resultados do estudo indicam que as universidades comunitárias

investigadas trazem em seus discursos a convicção de sua existência como instituições que

nasceram para produzir conhecimento voltado para o bem público, com alto valor instrumental,

tendo consciência da indissolubilidade do ensino, pesquisa e extensão, com ampla inserção

social. Por outro lado, se debatem com as ameaças do mundo globalizado, no qual os processos

de mercantilização e desagregação pressionam-nas a transformarem a educação superior mero

bem de consumo, regido pelo lucro desenfreado da política neoliberal, no entanto, não são

suficientes, ainda, a ponto de comprometer a missão comunitária dessas instituições, essência

de sua identidade.

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APÊNDICES

APÊNDICE A – INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS

ROTEIRO ENTREVISTA COM REITORES 1. Para o senhor, o que é uma universidade comunitária?

2. Qual a importância de se ter uma universidade comunitária na região?

3. Como a sua universidade se encaixa nessa definição?

4. Como a sua universidade comunica isso aos seus públicos?

5. Existem campanhas direcionadas ao posicionamento de universidade comunitária?

a. Caso existam, quais?

b. Caso não existam, por quê?

6. Em 2013, foi aprovada a lei número 12.881, que dispõe sobre a definição, qualificação,

prerrogativas e finalidades das Instituições Comunitárias de Educação Superior – ICES.

Qual o envolvimento de sua instituição neste processo?

7. Como o senhor avalia as implicações da lei na consolidação da identidade de sua

universidade?

8. Quais são os principais atores (professores, funcionários, mídia, etc...) na construção da

identidade de sua universidade?

9. Quais as estratégias/ações usadas pela universidade na construção de sua identidade?

10. O que poderia ser feito para melhorar a imagem da sua universidade como comunitária?

11. Em sua opinião, que razões levam o aluno a escolher a sua universidade?

12. O Senhor considera que a comunidade reconhece sua universidade como comunitária?

13. Quais os fatores que contribuem para isso?

14. Fale um pouco sobre a história da sua universidade comunitária.

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APÊNDICE B - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura Programa de Pós-Graduação em Educação

www.univali.br/ppge • e-mail: [email protected] Fone: (47) 3341 7516 - fone/Fax: (47) 3341 7822

Rua Uruguai, 458 - Bloco F - 4° piso CEP: 88302-901 Itajaí - SC.

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

Universidade xxxxx Prof. Dr. MD Reitor A sua universidade está sendo convidada para participar em uma pesquisa. Após ser esclarecido sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, rubrique todas as folhas e assine ao final deste documento. Este documento está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de recusa a sua universidade não será penalizada de forma alguma. Informações sobre a pesquisa: TÍTULO: IDENTIDADE INSTITUCIONAL E IMAGEM INSTITUCIONAL DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO SUL DO BRASIL (financiada pelo CNPq)

Pesquisadores responsáveis: Profa. Dra. Regina Célia Linhares Hostins – Universidade do Vale do Itajaí - Univali http://lattes.cnpq.br/3614416302948755 Telefone para contato: (47) 3341-7516 E-mail: [email protected] Prof. Dr. Hans Peder Behling – Univali http://lattes.cnpq.br/7579158270075083 Telefone para contato: (47) 3341- 7928 E-mail: [email protected] Pesquisadores participantes: Isaura Maria Longo – Univali http://lattes.cnpq.br/1672286659904274 Telefone para contato: (47) 9947-9171 Nilda Stecanela – Universidade de Caxias do Sul - UCS http://lattes.cnpq.br/7861875052634037 Telefone para contato: Cristina Fioreze – Universidade de Passo Fundo - UPF http://lattes.cnpq.br/0042420942779752 Telefone par contato: Michelle Sprandel da Silva Perusin – Univali http://lattes.cnpq.br/2588723820178588 Telefone para contato: (47) 3341-7543 Giovana Cristina Pavei – Univali http://lattes.cnpq.br/8195624286682014 Telefone para contato: (47) 3341-7543

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João Francisco de Borba – Univali http://lattes.cnpq.br/8923219961217015 Telefone para contato: (47) 3341- 7553 Tristan McCowan – Universidade de Londres Senior Lecturer em Educação e Desenvolvimento Internacional no Departamento de Humanidades e Ciências Sociais – Institute of Education- University of London Este estudo tem como objetivo geral analisar a interface: Identidade e Imagem institucional de Universidades Comunitárias, no sul do Brasil; e como objetivos específicos: - Identificar os indicadores, regras e diretrizes que norteiam a constituição das Universidades Comunitárias; -Examinar os discursos predominantemente utilizados pelas Universidades Comunitárias do sul do Brasil ao atuarem na construção de suas respectivas identidades institucionais em resposta às políticas nacionais de ensino superior; - Analisar os fatores socioculturais, históricos e contextuais que influenciam nas leituras e significações da comunidade interna (professores, técnico-administrativos, alunos) e externa (representantes da sociedade) a respeito da imagem institucional das Universidades Comunitárias no sul do Brasil; -Constituir uma rede internacional de estudos e pesquisas sobre modelos diferenciados de universidade. As Universidades foram selecionadas com base nos seguintes critérios: universidades laicas, reconhecidas como comunitárias (de acordo com a Lei No 12.881, de 13 de novembro de 2013), com no mínimo quatro mestrados e dois doutorados implantados, credenciadas no sistema federal e com maior número de alunos. A pesquisa será conduzida simultaneamente em quatro frentes de investigação: 1. Pesquisa documental para exame dos documentos do MEC e das universidades investigada (documentos que avaliam e disciplinam o ensino superior no país, PDI, PPI, Planejamento Estratégico, Materiais institucionais e de divulgação). 2. Pesquisa de campo para entrevistas com os gestores das instituições que compõem a amostra; 3. Seminários Redes Grupos de Pesquisa em âmbito nacional e internacional: dois seminários presenciais previstos para outubro de 2016 e julho de 2017; dois seminários por Skype, com a participação de aproximadamente 20 pesquisadores. 4. Seminários Redes Comunitárias envolvendo a comunidade interna (professores, técnico-administrativos, alunos) e externa (representantes da sociedade) das instituições que compõem a amostra. As discussões serão desencadeadas por eixos, prevendo uma plenária com explanação do objetivo, discussão em grupo das temáticas/respostas e volta à plenária para as considerações. Serão quatro seminários (um em cada IES), com previsão de 40 pessoas (10 de cada segmento: professores, funcionários, alunos, externo). A sua universidade está sendo convidada a participar da investigação porque atende aos critérios definidos. Convém ressaltar que a participação não é obrigatória, sendo que a qualquer momento a universidade poderá desistir e retirar seu consentimento.

A participação da sua universidade consistirá em: permitir acesso aos documentos institucionais, tais como PDI, PPI, Planejamento Estratégico, Materiais institucionais e de divulgação; conceder entrevistas e organizar com os pesquisadores os seminários envolvendo a comunidade interna e externa. Os pesquisadores se comprometem a assegurar a confidencialidade das informações, mantendo anonimato absoluto sobre a identidade e sigilo das informações que possam ferir a imagem da instituição. A recusa não trará nenhum prejuízo à instituição. Os principais riscos decorrentes da pesquisa estão relacionados a possíveis erros de interpretação de informações relacionadas à instituição. Para amenizar tais riscos, os pesquisadores se comprometem a manter a fidedignidade aos documentos e aos depoimentos coligidos. Caso ocorra qualquer tipo de desconforto, a instituição poderá interromper a sua participação. Além

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disso, os pesquisadores estarão sempre presentes para sanar eventuais dúvidas, bem como para dar o suporte necessário para minimizar possíveis desconfortos durante a realização da pesquisa. O processo não causará nenhum dano à sua instituição, pois asseguramos o sigilo de sua participação. Serão tomados todos os cuidados para garantir um tratamento ético aos participantes. As dúvidas que possam surgir, antes e durante a pesquisa, serão respondidas pelos pesquisadores. Esclarecemos, ainda, que esta pesquisa não prevê qualquer gasto aos participantes e não será disponibilizada nenhuma compensação financeira adicional. O desenvolvimento da pesquisa e seus resultados trarão benefícios institucionais, entre eles destacam-se o melhor entendimento do processo de construção da identidade das ICES (Universidades Comunitárias de Ensino Superior) e o respectivo reconhecimento de sua imagem perante os seus públicos. Os dados coletados durante o estudo serão analisados e apresentados sob a forma de artigos e/ou capítulos de livros, divulgados por meio de reuniões científicas, com a garantia de anonimato dos participantes. Ao assinar este Termo, o(a) Senhor(a) autoriza a participação desta universidade nas atividades da referida Pesquisa, declarando estar ciente e concordar com as informações expostas anteriormente, no que se referem aos objetivos, riscos e benefícios decorrentes do trabalho a ser desenvolvido. O(a) Senhor(a) receberá uma cópia deste termo onde consta o endereço e o telefone dos pesquisadores, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sobre sua participação agora, ou a qualquer momento. Nome da instituição: xxxxxxxxxxx Nome completo do responsável legal: Prof. Dr. Assinatura: _________________________________________ Data: ___ / ___ / 2016 Nome e endereço completo dos pesquisadores: Profa. Dra. Regina Célia Linhares Hostins - http://lattes.cnpq.br/3614416302948755 Universidade do Vale do Itajaí Programa de Pós-Graduação em Educação Rua Uruguai, 458 Centro - Itajaí - SC CEP: 88302-901 Telefone para contato: (47) 3341-7516 E-mail: [email protected] Prof. Dr. Hans Peder Behling – http://lattes.cnpq.br/7579158270075083 Universidade do Vale do Itajaí Programa de Pós-Graduação em Administração Rua Uruguai, 458 Centro - Itajaí - SC CEP: 88302-901 Telefone para contato: (47) 3341- 7928 E-mail: [email protected] Essa pesquisa está sendo encaminhada ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, caso persistam dúvidas, sugestões e/ou denúncias após os esclarecimentos do pesquisador o comitê está disponível para atender lhe.

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CEP/UNIVALI Rua Uruguai, n. 458 Centro Itajaí. Bloco F6, andar térreo. Horário de atendimento: Das 8h às 12h e das 13h30 às 17h30 Telefone: 47- 33417738 E-mail: [email protected]

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APÊNDICE C – AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DA COLETA DE DADOS

AUTORIZAÇÃO A Universidade xxxxxxxxxxxx autoriza a realização da pesquisa com o Título: IDENTIDADE INSTITUCIONAL E IMAGEM INSTITUCIONAL DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO SUL DO BRASIL, subsidiada pelo CNPq e vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UNIVALI, cujos pesquisadores responsáveis são Profa. Dra. Regina Célia Linhares Hostins e Prof. Dr. Hans Peder Behling. Autoriza também os pesquisadores citados e seu grupo de pesquisa a frequentar a instituição para a realização das coletas de dados, bem como autoriza a instituição a fornecer os dados que forem solicitados. Os pesquisadores estarão disponíveis para esclarecimentos e dúvidas a respeito da pesquisa. ___________________, _____ de _____________ de 2016. _________________________________

Assinatura e Carimbo

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APÊNDICE D – TERMO DE ANUÊNCIA DE INSTITUIÇÃO PARA COLETA DE

DADOS DE PESQUISA ENVOLVENDO SERES HUMANOS

TERMO DE ANUÊNCIA DE INSTITUIÇÃO PARA COLETA DE DADOS DE PESQUISA ENVOLVENDO SERES HUMANOS

Declaro que conheço e cumprirei os requisitos da Res. CNS 466/12 e suas complementares e como esta instituição tem condições para o desenvolvimento do projeto de pesquisa IDENTIDADE INSTITUCIONAL E IMAGEM INSTITUCIONAL DAS UNIVERSIDADES COMUNITÁRIAS NO SUL DO BRASIL, autorizo sua execução pelos pesquisadores Profa. Dra. Regina Célia Linhares Hostins, Prof. Dr. Hans Peder Behling e sua equipe de trabalho. Nome da instituição: xxxxxxxxxxxxxxxxxx Nome completo do Responsável legal: xxxxxxxxxxxx Cargo: Reitor Data: _____/______/2016

__________________________________________ Assinatura e carimbo