histÓria dos conceitos e teoria polÍtica e social

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IO debate acerca do que seriam as formas vá-

lidas da história do pensamento para o âmbito dateoria política e social ganhou enorme impulsocom a publicação, em 1969, na revista History and 

Theory , do ensaio metodológico de Quentin Skin-ner, intitulado “Meaning and understanding in thehistory of ideas”. Neste ensaio, que ampliava argu-mentos inicialmente expostos por Dunn (1972) epor Pocock (1969) na esteira das pesquisas de Pe-ter Laslett (1965), Skinner endereçou uma crítica

violenta contra várias tradições da história dasidéias políticas, acusando-as principalmente de in-correrem no erro comum do anacronismo, ouseja, de imputarem a autores e obras intenções esignificados que jamais tiveram, nem poderiam tertido, em seus contextos originais de produção. Oresultado básico dessas histórias criticadas seria aprodução de um conjunto de mitologias históricas

HISTÓRIA DOS CONCEITOS E TEORIA POLÍTICA E SOCIAL:referências preliminares*

Marcelo Gantus Jasmin

O presente artigo discute, de forma sucinta,algumas das principais questões em torno dasquais vem se dando o debate acerca do fazer his-tória do pensamento político e social nas últimastrês décadas. Importa esclarecer, comparando, li-mites e possibilidades teóricas e metodológicas dasduas vertentes mais produtivas no campo hoje: ocontextualismo lingüístico de Quentin Skinner e ahistória dos conceitos (Begriffsgeschichte ) desen-volvida por Reinhart Koselleck. Pretende-se, comisso, organizar minimamente a pauta de questõesem discussão.

RBCS Vol. 20 nº. 57 fevereiro/2005 

* Este trabalho é parte do projeto “Contextualismolingüístico e história conceitual: o debate teórico-metodológico contemporâneo sobre a história dateoria política” e teve apoio do CNPq.

Artigo recebido em novembro/2004Aprovado em janeiro/2005

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que terminavam por narrar pensamentos que nin-guém pensou, portanto, não-histórias.

Em geral, afirmava Skinner, as interpretaçõescontemporâneas acerca das idéias do passado to-

mavam conceitos e argumentos sem a devidaconsideração de seus significados originais, trans-formando os antigos em parceiros de um debatedo qual jamais poderiam ter participado. Se para oâmbito genérico da história da filosofia o anacro-nismo já seria anátema,1 em relação à teoria polí-tica o erro estaria amplificado na medida em que,diferentemente de formas mais abstratas da elabo-ração filosófica – os tratados de lógica são o casomais extremo –, os trabalhos da filosofia políticaseriam elaborados como atos de fala (cf. Austin,

1962) de atores particulares, em resposta a confli-tos também particulares, em contextos políticosespecíficos e no interior de linguagens próprias aotempo de sua formulação. Cada autor, ao publicaruma obra de teoria política, estaria portanto ingres-sando num contexto polêmico para definir a supe-rioridade de determinadas concepções, produzin-do alianças e adversários, e buscando a realização

prática de suas idéias. Nesta chave interpretativa,sendo a elaboração de um tratado de filosofia po-lítica e social uma ação, a questão do seu signifi-cado deveria se confundir com aquela da sua in-

tenção, sendo esta apreendida no ato de fazer (indoing ) a própria obra ou asserção. Daí a reivindi-cação metodológica mínima conformada na noçãode que, de um autor não se pode afirmar que fezou quis fazer, que disse ou quis dizer, algo que elepróprio não aceitaria como uma descrição razoá-vel do que disse ou fez (Skinner, 1969, p. 28).2 Dis-so resulta que a correta compreensão de umaidéia ou teoria só poderia se dar pela sua apreen-são no interior do contexto em que foram produ-zidas. Resulta também que o objeto da análise his-toriográfica é deslocado da idéia para o autor, do

conteúdo abstrato da doutrina para a ação ou per-

formance concreta do ator num jogo de lingua-gem historicamente dado.

Se tal perspectiva correspondia genericamen-te à concepção historiográfica da compreensão talcomo formulada no programa cognitivo de RobinGeorge Collingwood, a quem Skinner presta a suahomenagem (ver, por exemplo, Skinner, 1969,

p. 50; 2001), e poderia ser aproximada de outrasabordagens contextualistas da primeira metade doséculo XX – como as propostas, por exemplo, pelanoção de utensilagem mental de Lucien Febvre ou

da “sociologia do conhecimento” de Karl Man-nheim –, ela trazia consigo um conjunto de novasaquisições extraídas da filosofias da linguagemde Wittgenstein e da linguagem ordinária de JohnAustin. O principal veio produtivo foi estabeleci-do a partir das noções de que o significado deuma proposição é o seu uso na linguagem e que,portanto, a sua elucidação deve orientar-se para oseu portador (Wittgenstein, 1984, par. 43), e deque neste uso são reconhecíveis forças ilocucioná-rias e perlocucionárias não disponíveis à análise

orientada para o caráter descritivo ou constatativoda linguagem (Austin, 1962, especialmente a VIIIConferência). Para Skinner, como para Austin, aanálise da sentença cede lugar “à análise do ato defala, do uso da linguagem em um determinadocontexto, com uma determinada finalidade e deacordo com certas normas e convenções” (Mar-condes de Souza, 1990, p. 11). Nessa direção,Skinner especificava a noção de contexto, qualifi-cando como lingüístico ou de linguagem aqueleque importaria reconstruir historicamente para darsentido às proposições da teoria política e social

no tempo. Uma tal especificação resultava, simul-taneamente, na crítica da tendência reificadora denoções de contexto usuais em diversas perspecti-vas sociais da historiografia.

A partir desse programa básico, uma sofisti-cada elaboração metodológica e conceitual acercado fazer história das idéias (ou dos discursos, dosatos de fala, da linguagem política e social etc.),das noções de significado e de intenção e dos li-mites da historiografia do pensamento político esocial, assim como uma pujante produção histo-riográfica com freqüência identificada com o rótu-

lo “escola de Cambridge” e com a coleção “Ideasin Context”, se desenvolveram, provocando rea-ções diversas que constituíram um profícuo deba-te metodológico internacional entre historiadores,filósofos, cientistas políticos e críticos literários.3

Para o propósito introdutório deste artigo, im-porta ressaltar algumas das linhas de crítica à pers-pectiva skinneriana que conformariam o que me

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parece ser o quadro mais significativo do debatecontemporâneo acerca da história do pensamentopolítico e social. Em primeiro lugar,4 a linha deacusações acerca do antiquarismo ou da inutili-

dade  desse tipo de historiografia contextualista

para a elaboração teórica, com freqüência operan-do a partir da noção de que o programa rankeanode saber com precisão o que se passou seria, se-não totalmente inútil, irrelevante para a tarefa dateoria cuja vocação estaria no enfrentamento dosproblemas contemporâneos. Nessa direção, se ossignificados dos conceitos anteriores não são trans-poníveis para o presente senão por mecanismosilegítimos de atualização, porque produtores dedeformação dos sentidos originais, melhor seria,

ou deixá-los a si e partir para uma elaboração dateoria sem referência histórica às idéias, ou assumircomo inevitável a traição da tradução para o con-temporâneo e operar como se (a título de ficçãoheurística) os autores do passado fossem parceirosnos temas do debate contemporâneo.5

A resposta skinneriana a esse tipo de argüi-ção segue, em geral, a noção de que o investi-mento historicista no não-familiar dos conceitosdo passado e, conseqüentemente, no estranha-mento dele derivado, serve à desnaturalização oudesestabilização dos conceitos da teoria contem-

porânea, fomentando a imaginação conceitualcom alternativas enriquecidas por significados ealteridades que a pesquisa erudita da históriapode encontrar. Um caso notório seria o da aná-lise que o próprio Skinner faz da idéia republica-na de liberdade em Maquiavel: o reconhecimentoda complementaridade necessária e da convivên-cia pacífica das dimensões positiva e negativa daliberdade na teoria política de Maquiavel poriaem xeque a naturalização operada pelo pensa-mento liberal, desde o século XIX – leia-se aquiBenjamin Constant, Jeremy Bentham e Isaiah Ber-

lin –, da oposição entre essas duas dimensões(Skinner, 1984).

Nesse sentido, a variante apresentada pelaperspectiva metodológica de John Pocock, nocontexto da mesma escola, ganha relevância. Emprimeiro lugar porque, embora também operecom a análise de obras e de autores, o centro desua reflexão metodológica desloca-se para a rela-

ção entre as várias linguagens políticas que, noseu confronto sincrônico, conformam a tessituralingüística (langue ) na qual as diversas perfor-

mances (parole ) se tornam possíveis e inteligíveis.

Também em Pocock, o esforço de desnaturaliza-ção da conceituação e dos horizontes teóricoscontemporâneos se faz presente. Para dar umexemplo, ao chamar a atenção do leitor para a he-terogeneidade dos discursos produzidos no sécu-lo XVIII inglês, baseados ora nos direitos, ora nasvirtudes ou nos costumes (manners ), sublinhaque ali tais possibilidades devem ser apreendidas,pelo intérprete, como alternativas numa disputaque desconhece o que nós, hoje, conhecemos – os seus resultados, isto é, aquilo que, a posterio-

ri , tornou-se hegemônico: o liberalismo, a lingua-gem dos direitos individuais e a noção de liberda-de como não-obstrução.

Ao mesmo tempo, a mobilização e o estudodetalhado das categorias inscritas no registro dohumanismo cívico (ou do republicanismo clássi-co, como preferem outros intérpretes) permitiriareconstruir lógicas teóricas derrotadas na luta po-lítica dos últimos séculos, mas não por isso racio-nalmente inferiores ou desprezíveis. Além disso, averificação do caráter necessariamente poliglota dalinguagem política, com os vários idiomas que em

disputa a integram num determinado período histó-rico, aponta para os riscos da incompreensão (mi-

sunderstanding ) que o analista corre quando tentaapreender os modos de desenvolvimento do pen-samento alheio a partir de concepções estáveis ehistoricamente desinformadas daquilo que lhe pa-rece ser um domínio próprio da política ou da mo-ral. O risco do anacronismo estaria não apenas naincapacidade de compreender o que está em jogona emissão desta ou daquela proposição (de seusignificado), mas também na imputação de cará-ter contraditório a elaborações teóricas que, em

seu contexto de enunciação, eram plenamente le-gítimas e racionais. Neste registro, as relações en-tre, por um lado, a gramática que permite as vá-rias construções lingüísticas (idiomas ousublinguagens) num determinado período e, poroutro, as performances  específicas – por vezessubversivas da própria gramática – desempenha-das em seu interior, constituiria o locus privilegia-

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do da análise pocockiana do discurso político (cf.,por exemplo, Pocock, 1985).6

Vale notar que a reivindicação de um pro-grama rigorosamente historicista que recusa a

existência de “problemas filosóficos perenes” eque paga o preço da redução drástica do alcancedas “lições” do passado, dado que a história só li-daria com respostas particulares a problemas epo-cais particulares, tem como contraparte a “libera-ção” da elaboração teórica contemporânea paracriar respostas novas (e particulares) para os pro-blemas novos (e também particulares) do presen-te (Skinner, 1969, p. 53). Nesse sentido, é no mí-nimo curioso perceber que uma reivindicação tãoerudita e historicista em relação ao fazer história,

e que resulta na afirmação da impossibilidade detransposição dos conceitos antigos para o presen-te sem anacronismo, funciona, na outra ponta, ada teoria contemporânea, como uma espécie decarta de alforria para a imaginação que deve dei-xar ao passado os seus termos e partir para umainovação conceitual adequada aos problemas “lo-cais” do tempo presente. Na frase de Skinner, “De-mandar da história do pensamento uma soluçãopara os nossos próprios problemas imediatos éperpetrar não só uma falácia metodológica, mastambém algo como um erro moral” (Idem, p. 67).

O debate também é promissor e produtivonuma segunda via de inquirição que traz, em ge-ral, embora não necessariamente, a marca da her-menêutica das ciências humanas de referência ga-dameriana e que duvida da própria empreitadacientífica de apreensão das intenções e dos signi-ficados originais dos atos de fala do passado, namedida em que a cognição é ela mesma prisionei-ra de sua historicidade. O que implica dizer, ra-dicalizando ao caso limite, que o significado ori-ginal em si é inapreensível e que é apenas no

interior de uma fusão de horizontes interpretati-vos  que se dá a compreensão dos significadosdesde logo marcados pela teia da comunidadede intérpretes contemporâneos. Na concepçãode Gadamer:

[...] cada época entende um texto transmitido deuma maneira peculiar, pois o texto constitui par-te do conjunto de uma tradição pela qual cada

época tem um interesse objetivo e na qual tentacompreender a si mesma. O verdadeiro sentidode um texto, tal como este se apresenta a seu in-térprete, não depende do aspecto puramente

ocasional que representam o autor e o seu públi-co originário. Ou, pelo menos, não se esgota nis-so. Pois este sentido está sempre determinadotambém pela situação histórica do intérprete e,por conseqüência, pela totalidade do processohistórico (Gadamer, 1997, p. 366).

A cognição, sendo ela mesma produtiva eprodutora de significados a partir da tradiçãoem que se inscreve, transforma-se em recepção,tornando essencial que idéias e conceitos sejamapreendidos em seus efeitos.

Daí a proposição de uma história dos efeitos caracterizada por aquilo que a recepção contem-porânea consegue determinar, a partir de seu ho-rizonte de expectativas, das diversas mutações so-fridas pelos conceitos ou idéias no tempo. Se ahistoricidade dos significados das idéias é inesca-pável, a dos sujeitos que os conhecem também oé, transformando as condições de possibilidade doconhecimento dos conceitos do passado numaaventura interpretativa, por definição contemporâ-nea, e não passível de determinação científica. Teo-ricamente, o caráter hermenêutico e lingüístico da

operação do conhecimento das idéias não seriaapenas epistemológico, mas ontológico, o que, nolimite, tornaria sem efeito a própria noção de umahistória científica. Segue-se daqui que o trabalhoda teoria política e social se confundiria comaquele da história da teoria, sendo ambas, históriada teoria e teoria, formas da hermenêutica inter-pretativa dos conceitos. Se a primeira linha de crí-tica acima referida denunciava a inutilidade ou ainocuidade políticas  do programa rankeano docontextualismo lingüístico, a crítica hermenêuticamais radical afirma a sua inviabilidade cognitiva.

Há duas respostas básicas de Skinner paraeste tipo de linha de argumentação, embora nãohaja um enfrentamento direto com as proposiçõesgadamerianas em si. A primeira delas distingueentre os vários tipos de significado que uma pro-posição pode ter: o significado das palavras enun-ciadas na frase; o significado da proposição paramim ou para a comunidade contemporânea de in-

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térpretes à qual pertenço; e o significado da pro-posição como o ato de fala daquele que a profe-riu. É para a apreensão deste último sentido quea metodologia skinneriana se elaborou, e só para

ele (cf. Skinner, 2002a). Skinner reconhece que háintenções e significados que, por ausência de in-formação contextual, não podem ser recupera-dos. No entanto, se as intenções a serem recupera-das pelo historiador são aquelas que, por estaremexpressas num ato de comunicação bem-sucedido,foram legíveis publicamente, as chances de esta-belecê-las é grande. Não se trata, portanto, deexercício de empatia ou de busca do que haviaoculto na mente de alguém, mas de reconhecer,no conjunto das convenções lingüísticas publi-camente reconhecíveis de uma determinada

época, a intenção que se infere do “lance” pro-movido por um determinado jogador (Skinner,1988, pp. 279-280).

A segunda linha de resposta ameniza o cará-ter científico da certeza do método proposto. Mes-mo quando há muita informação contextual, o quese obtém com a pesquisa histórica são hipótesesplausíveis que devem se sustentar na erudição dis-ponível, sem a pretensão de resultados últimos quealcancem “verdades finais, auto-evidentes e indubi-táveis” (Idem, p. 280). Embora reconhecendo que“sempre nos aproximamos do passado à luz de pa-

radigmas e pressupostos contemporâneos”, paraSkinner um grau (bastante) elevado de erudição econsciência históricas é capaz de controlar a impu-tação de intenções que são, em última análise, taishipóteses, “inferências a partir da melhor evidênciadisponível para nós” (Idem, p. 281).

II

A segunda corrente relevante para a cons-trução do nosso quadro do debate acerca dasperspectivas teórico-metodológicas do fazer his-tória do pensamento político e social constitui-sena história conceitual alemã tal como desenvolvi-da por Reinhart Koselleck. Divulgada tardiamenteno mundo anglo-saxão, embora seus desenvolvi-mentos iniciais fossem anteriores aos da perspec-tiva skinneriana, essa outra forma da história as-sociada à teoria política e aos conceitos sociais

conquistou espaços cada vez maiores na discus-são internacional das ultimas duas décadas.7

Como diz o nome, a Begriffsgeschichte  éuma história de conceitos, e proliferou como um

modo particular de história reflexiva da filosofiae do pensamento político e social, tendo se de-senvolvido a partir das tradições da filologia, dahistória da filosofia e da hermenêutica. A históriados conceitos tal como a conhecemos hoje foiinicialmente desenvolvida pelo historiador aus-tríaco Otto Brunner na sua crítica à historiografiajurídica e liberal alemã, em particular ao modocomo esta transpunha para a realidade medievallógicas conceituais derivadas do liberalismo pos-terior como, por exemplo, a separação entre aeconomia e a política e a oposição entre o públi-co e o privado.8

Em sua versão contemporânea, concomitan-temente a uma pujante discussão teórica e meto-dológica, produziu volumosos dicionários de con-ceitos.9 O projeto que aqui importa, o da históriados conceitos políticos e sociais fundamentais queresultou no Geschichtliche Grundbegriffe , justifi-cou-se pela percepção, experimentada por histo-riadores nas décadas de 1950 e 1960, da insufi-ciência da história do espírito (Geistesgeschichte )de corte hegeliano e da história das idéias (Ideen-

geschichte ) tal como explorada por Dilthey e seusseguidores. Os principais pontos atacados pela crí-tica desta então nova historiografia estavam nabaixa contextualização de idéias e conceitos utili-zados no passado, no anacronismo daí derivado ena insistência metafísica da essencialidade dasidéias. Na fala de Koselleck, a atual Begriffsges-

chichte surgiu do duplo impulso crítico referido “àtransferência descuidada para o passado de ex-pressões modernas, contextualmente determina-das, do argumento constitucional” e à “prática dahistória das idéias de tratá-las como constantes,

articuladas em figuras históricas diferentes, maselas mesmas fundamentalmente imutáveis” (Ko-selleck, 1985a, p. 80). Daí que a reivindicação me-todológica mínima possa ser resumida nos se-guintes termos: os conflitos políticos e sociais dopassado devem ser descobertos e interpretadosatravés do horizonte conceitual que lhes é coetâ-neo e em termos dos usos lingüísticos, mutua-

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mente compartilhados e desempenhados pelos ato-res que participaram desses conflitos. Desse modo,o trabalho de explicação conceitual quer precisaras proposições passadas em seus termos próprios,

tornando mais claras as “circunstâncias intencio-nais contemporâneas” em que foram formuladas(Idem, p. 79).

É esta direção contextualista da história dosconceitos que permite uma aproximação teórico-metodológica com as perspectivas desposadas porSkinner e Pocock.10 Poderíamos então dizer, emtermos simplificadores, embora não empiricamen-te falsos, que, se o projeto original de Skinnerteve como principais adversárias as concepçõesdas idéias atemporais e dos problemas filosóficos

perenes, tal como julgava encontrar em trabalhoscomo os de Leo Strauss e de Arthur Lovejoy, oprojeto de Koselleck dirigiu-se contra a históriadas idéias imutáveis tal como desenvolvida, porexemplo, por Friedrich Meinecke em seu livro so-bre a razão de Estado.11 Nessa dimensão, por as-sim dizer sincrônica, da história do pensamento,a aproximação entre o contextualismo lingüísticoe esta forma da história dos conceitos não é su-pérflua. Como reconhece Koselleck, “a históriados conceitos lida com o uso de linguagem espe-cífica em situações específicas, nas quais os con-

ceitos são elaborados e usados por falantes espe-cíficos” (Koselleck, 1996, p. 62). Por isso anecessidade de se estabelecer os conceitos queconstituem os vocabulários – campos semânticosou domínios lingüísticos – dessa ou daquela lin-guagem política e social, relacionando o seu usona discussão política, social e econômica com osgrupos que os sustentam ou os contestam.12

No entanto, há uma outra dimensão intrínse-ca à história dos conceitos que me parece ultra-passar o caráter basicamente sincrônico do histo-ricismo metodológico skinneriano e trazer outras

possibilidades para a elaboração da teoria políticae social contemporânea na sua relação com a his-tória. Pois, se os atos de fala são únicos e os con-ceitos – não mais concebidos como substânciascapazes de vida própria – também são dependen-tes da experiência que os formulou, a recepçãodesses atos (ou de seus efeitos) se dá ao longo dotempo, constituindo diacronicamente uma tradi-

ção interpretativa. Sem dúvida, a história concei-tual mantém a noção da “não convertibilidade doque foi articulado pela linguagem” numa determi-nada época, afirmando a necessidade metodoló-

gica de um historicismo rigoroso para a com-preensão dos usos conceituais particulares (Idem,p. 62). Nesse sentido, por exemplo, o conceito aris-totélico de politeia não pode ser apreendido semreferência aos usos e às práticas da cidadania naspoleis gregas, assim como a compreensão da res pu-

blica de Cícero depende da ordem política daRoma do primeiro século.

Mas a história conceitual não pára aí, poisestá interessada nos modos pelos quais as gera-ções e os intérpretes posteriores leram, alterando

os seus significados, essas proposições políticasdo passado. Neste registro é possível afirmar, ri-gorosamente, que os conceitos em si não têm his-tória; mas também é possível afirmar, com rigor,que a sua recepção tem. Aliás, é da própria con-dição de unicidade dos atos de fala ou dos concei-tos articulados numa linguagem local que a histó-ria conceitual deriva a necessidade de uma históriada recepção, já que parte justamente da aposta deque os significados não se mantiveram no tempoe que foram alterados. “O registro de como osseus usos foram subseqüentemente mantidos, al-

terados, ou transformados pode, propriamente,ser chamado de história dos conceitos” (Idem, pp.62-63). Afinal, é disso que se trata quando mobi-lizamos, hoje, termos como sociedade civil, repú-blica ou democracia. Nessa perspectiva, a com-preensão das alterações, dos desvios, dasocultações etc., conscientes ou não, mas articula-dos na linguagem, é um caminho historiográficoprivilegiado para apreender com maior precisãoos significados próprios e as funções normativasde um conceito contemporâneo formulado numateoria também contemporânea.

Aqui, a perspectiva da mudança conceitualadquire traços diacrônicos de dinamismo históri-co e acentos claramente hermenêuticos que estãoausentes, ou são muito tênues, nas proposiçõesfundadoras do contextualismo lingüístico de Cam-bridge.13 Para a história conceitual koselleckiana,continuidades e mudanças conceituais tornam-setemas centrais. No entanto, esta mesma história re-

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cusa limitar a investigação às linguagens articula-das pelos atores do passado na medida em que es-tas revelam apenas parte do que é relevante co-nhecer. Em primeiro lugar porque há elementos

pré-lingüísticos que condicionam a história, tantoacontecimento como discurso, e que uma antropo-logia histórica convencida da finitude humanadeve reconhecer. São “condições, às quais a huma-nidade compartilha com os animais e que são, nes-ta medida, pré- ou extralingüísticas, ‘metahistóri-cas’” (Koselleck, 1989, p. 650). Exemplosinescapáveis, segundo Koselleck, são os “três con-juntos de contrários sem os quais nenhuma histó-ria é possível”: antes/depois, dentro/fora e emcima/embaixo. É certo que tais precondições são,

freqüentemente, articuladas pelas linguagens decomunidades locais e mobilizadas em usos concei-tuais determinados: religiosos, políticos, econômi-cos etc. Mas mesmo quando não o são, integramassim mesmo a história dessas comunidades.14

Em segundo lugar, há boa parte do históricoacontecido que não recebe articulação na lingua-gem local, seja porque se trata de fenômenos des-conhecidos para a consciência dos atores históri-cos daquele momento, seja porque a linguagemnão consegue exprimir satisfatoriamente os even-tos, como no caso dos alemães, em 1945, incapa-

zes de encontrar expressões verbais adequadasao extermínio em massa, fazendo com que umamemória estável por intermédio da linguagemfosse bem posterior (Idem, p. 652).

Nesse sentido, a exigência de separação en-tre linguagem e história social é ativada e, comela, a necessidade metodológica de associar mu-dança lingüística à história dos eventos. Numa de-finição sucinta, e para aproveitar a recepção nor-te-americana desta perspectiva, trata-se de pensar“as relações recíprocas entre as continuidades, asmudanças e as inovações nos significados e nas

aplicações dos conceitos políticos e sociais de umlado, e as transformações estruturais de larga es-cala no governo, na sociedade e na economia deoutro” (Richter, 1986, p. 610). Trata-se de pôr osconceitos políticos e sociais em relação com acontinuidade ou a descontinuidade das estruturaspolíticas, econômicas e sociais, o que resulta emter como tema favorito a elaboração conceitual

produzida em tempos de mudança rápida (cf. Ko-selleck, 1994, 1997a).

Em termos esquemáticos, podemos recorrer àfórmula proposta por Koselleck numa conferência

de 1991, que elabora um modelo de Heiner Schultzapresentado em 1979, e que observa o problemada mudança do ponto de vista das relações mais“brutas” entre conceitos e realidades. Supondo quede um lado haja um estado de coisas, e de outroum conceito deste estado de coisas, quatro situa-ções são possíveis: 1) o estado de coisas e o con-ceito permanecem ambos estáveis ao longo deum período de tempo; 2) o conceito e a realida-de transformam-se simultaneamente; 3) os con-ceitos mudam sem que haja uma mudança conco-mitante da realidade, ou seja, a mesma realidadeé conceituada de modo diverso; 4) o estado decoisas muda, mas o conceito permanece o mesmo(Koselleck, 1994).15

Se olhamos para a obra de Koselleck, é no-tório o caráter heurístico e didático deste esque-ma, dada a relação bem mais complexa entre lin-guagem e história. Antes de mais nada porque arelação entre conceito e realidade social e política,entre “dogmata” e “pragmata”, não é de simplesseparação e oposição. Prevalece a opinião de que,

[...] enquanto os conceitos têm capacidades polí-ticas e sociais, sua função e performance semân-ticas não são unicamente derivadas das circuns-tâncias sociais e políticas às quais eles se referem.Um conceito não é simplesmente indicativo dasrelações que ele cobre; é também um fator den-tro delas. Cada conceito estabelece um horizonteparticular para a experiência potencial e a teoriaconcebível e, nesse sentido, estabelece um limite(Koselleck, 1985a, p. 84).

Aqui podemos perceber a relação de filiaçãotensa e de simultâneo afastamento entre as pro-

posições de Koselleck e a versão ontológica daBegriffsgeschichte , pois o historiador quer negar afusão entre linguagem e história:

Toda linguagem é historicamente condicionada, etoda história é lingüisticamente condicionada.Quem desejaria negar que todas as experiênciasconcretas que temos só se tornam experiênciaspela mediação da linguagem? É justamente isto o

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que faz a história possível. Mas, ao mesmo tempo,quero insistir que linguagem e história permane-çam separadas analiticamente, pois nenhuma dasduas pode ser, na sua inteireza, relacionada à ou-

tra (Koselleck, 1989, pp. 649-650).

Em outras palavras, a ciência histórica deKoselleck mantém a exigência de referencialidadeao postular os aspectos extralingüísticos da vidahistórica e afirmar que mudanças estruturais delongo prazo não podem ser identificadas, descri-tas ou explicadas por teorias do discurso que ex-cluam a referência a algo externo ao sistema designos constitutivos da linguagem.

Por isso torna-se imprescindível separar “ascircunstâncias que foram, num certo momento, ar-

ticuladas na linguagem” e aquelas outras “circuns-tâncias que não foram previamente articuladas nalinguagem mas que, com a ajuda de hipóteses emétodos, ele [o historiador] é capaz de extrair dosvestígios” (Koselleck, 1985b, pp. 267-268). Assim,produz-se um segundo afastamento em relação aGadamer, pois se repõe o espaço negado pelahermenêutica filosófica à discussão sobre o méto-do e a teoria da história (Historik ). Quando Gada-mer busca uma teoria da verdade baseada na es-trutura ontológica da compreensão humana como

tal, nega, simultaneamente, validade à discussãometodológica no campo das ciências humanas, in-cluindo-se aí a historiografia e o estudo daquilo queo conhecimento histórico é. Por isso mesmo, a re-posição da distinção entre história e linguagemvem acompanhada das discussões de método e deteoria da história em Koselleck.16

Cabe, no entanto, notar que permanece ativaa “influência” de Gadamer na história conceitualproposta por Koselleck, uma vez que esta diz que-rer cobrir justamente “a zona de convergência ocu-pada por conceitos passados e presentes”, embora

reivindique uma “teoria” para tornar possível acompreensão dos “modos de contato e de separa-ção no tempo”, teoria que estabelece as condiçõesde possibilidade da produção de histórias a partirdas “aporias da finitude do homem em sua tempo-ralidade” (Koselleck, 1997b, p. 68 ss.) e que se en-contra condensada na distinção entre “espaço deexperiências” e “horizonte de expectativas” (Ko-

selleck, 1985b). Na relação complexa entre con-ceitos e realidade, entre dogmata e pragmata, a se-paração entre linguagem e história não implica arecusa tout court do caráter lingüístico constitutivo

da realidade social e política, mas a busca de ummodelo teórico no qual os significados lingüísticossimultaneamente criam e limitam as possibilidadesda experiência política e social.

NOTAS

1 O debate, embora iniciado no âmbito da história

do pensamento político, ganhou a discussão geral

sobre a interpretação de textos do passado. Sem

esquecer essa dimensão abrangente, restrinjo-me

aqui àquelas perspectivas que têm impacto signifi-cativo no tratamento do pensamento político e so-

cial. Para o quadro mais amplo ver, por exemplo,

as coletâneas organizadas por LaCapra e Kaplan

(1982) e Rorty, Schneewind e Skinner (1984), além

do artigos de Kelley (1990) e Falcon (1997).

2 Uso o texto da edição original que foi republicado

em Tully (1988, pp. 29-67) e, posteriormente, abre-

viado e revisto em Skinner (2002, pp. 57-89). Para

o quadro básico aqui exposto as modificações en-

tre as edições deste texto não são relevantes.

3 Uma excelente coletânea dos principais passos no

desenvolvimento metodológico de Skinner e de

críticas importantes oriundas da ciência política e

da filosofia política encontra-se em Tully (1988).

Os principais textos foram revistos e coletados

pelo próprio Skinner no primeiro volume de Vi-

sions of politics (Skinner, 2002).

4 Há um tipo de crítica que não analiso aqui e que

aponta para o fato de que nas obras historiográficas

de Skinner nem sempre se reconhece o seu progra-

ma metodológico. Creio que se trata da incompreen-

são de que a obra historiográfica não está limitada aoprograma derivado das questões de método às quais

o autor se dedicou sistematicamente.

5 Ver, por exemplo, a permanência desta linha de

crítica no debate entre Skinner e Yves Charles Zar-

ka na revista Le Débat , 96, 1997. Ver também a no-

ção de “reconstrução racional” como oposta a “re-

construção contextual”em Rorty (1984).

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HISTÓRIA DOS CONCEITOS E TEORIA POLÍTICA E SOCIAL 35

6 Os termos da lingüística de Benveniste citados são

os mobilizados pela reflexão do próprio Pocock.

Ver, por exemplo, Pocock (1987).

7 Para uma comunidade como a nossa que, da peri-

feria, se sente comprometida com a atualização

permanente em relação à bibliografia especializa-

da, européia e norte-americana, é no mínimo estra-

nho ler em Skinner (2002b, p. 177) a confissão de

que só tomou conhecimento da existência do pro-

grama koselleckiano a partir da divulgação da Be-

griffsgeschichte pelos artigos de Melvin Richter reu-

nidos em Richter (1995).

8 Ver Brunner (1992). Para o contexto ideológico das

primeiras formulações da Begriffsgeschichte  e os

seus vínculos com o nazismo, ver Kaminsky e Mel-

ton (1992) e Melton (1996).

9 Os dicionários de maior relevância são o Historis-

ches Worterbuch der Philosophie (Dicionário Histó-

rico de Filosofia), editado por Joachim Ritter e

Karlfried Gründer a partir de 1971; o Geschichtli-

che Grundbegriffe. Historiches Lexikon zur poli-

tisch-sozialen Sprache in Deutschland  (Conceitos

Históricos Fundamentais. Léxico Histórico da Lín-

gua Política e Social na Alemanha), editado por

Otto Brunner, Werner Conze, Reinhart Koselleck a

partir de 1972; e o Handbuch politisch-sozialer 

Grundbegriffe in Frankreich 1680-1820  (Manualde Conceitos Político e Sociais Fundamentais na

França), editado por Rolf Reichardt e Eberhard

Schmitt desde 1985. Isso não significa que essa his-

tória implique apenas a forma dos dicionários. Bas-

taria uma referência a Koselleck (1997, 1999 e

2002) para se desfazer essa impressão.

10 Para uma apresentação geral dessa perspectiva na

tentativa de aproximação com o contextualismo

lingüístico, ver Richter (1986, 1994, 1995).

11 Ver, por exemplo, Koselleck (1996, pp. 61-62).

12 Tecnicamente, os passos iniciais da pesquisa histó-rica nesta perspectiva exigem os desenvolvimentos

analíticos da onomasiologia e da semasiologia, de

modo a que se construa desde logo a teia de sig-

nificados disponíveis para cada um dos conceitos

fundamentais em tela e também os muitos concei-

tos que eventualmente possam abarcar ou corres-

ponder a um mesmo significado básico.

13 O tema das mudanças conceituais de longo curso

jamais integrou o núcleo duro das preocupações

metodológicas de Skinner. Ele adotou como sua

uma perspectiva “retórica” da mudança conceitual

para indicar o caráter de curta duração do que lheinteressa estudar. Ver Skinner (2002b, pp. 175-187).

Ver também o artigo de Skinner sobre o conceito

de Estado, publicado em Ball et. al . (1989), e repu-

blicado com revisão no segundo volume de Vi-

sions of Politics .

14 Para a discordância de Gadamer em relação a este

ponto, ver Gadamer (1997a, pp. 103-105).

15 O tema já recebera outras elaborações anteriores,

notoriamente em Koselleck (1985a). Ver também

Koselleck (1992).

16 Para a polêmica entre a hermenêutica gadameriana

e a teoria da história em relação à história concei-

tual, ver Koselleck e Gadamer (1997). “Se existem

tais pressupostos [condições pré- ou extralingüísti-

cas] da história que não se esgotam na linguagem

nem são remetidos aos textos, então a história de-

veria ter, do ponto de vista epistemológico, um sta-

tus que a impede de ser tratada como um subcaso

da hermenêutica. Esta é a tese que quero funda-

mentar” (Koselleck, 1997b, p. 69).

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202 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 20 Nº. 57

HISTÓRIA DOS CONCEITOS ETEORIA POLÍTICA E SOCIAL:REFERÊNCIAS PRELIMINARES

Marcelo Gantus Jasmin

Palavras-chaveQuentin Skinner; Reinhart Ko-selleck; História dos conceitos;Teoria política e social.

O presente artigo discute, de forma

sucinta, algumas das principais

questões em torno das quais vem se

dando o debate acerca do fazer his-

tória do pensamento político e so-cial nas últimas três décadas. Impor-

ta esclarecer, comparando, limites e

possibilidades teóricas e metodoló-

gicas das duas vertentes mais produ-

tivas no campo hoje: o contextualis-

mo lingüístico de Quentin Skinner e

a história dos conceitos (Begriffsges-

chichte ) desenvolvida por Reinhart

Koselleck. Pretende-se, com isso,

organizar minimamente a pauta de

questões em discussão e estabelecer

pontos interessantes para a pesquisa

das relações da teoria política e so-

cial com a sua história.

HISTORY OF CONCEPTS ANDSOCIAL AND POLITICAL THE-ORY: PRELIMINARY REFE-RENCES

Marcelo Gantus Jasmin

KeywordsQuentin Skinner; Reinhart Ko-selleck; History of concepts; So-cial and political theory.

The present article briefly discusses

some of the main issues around

which there has been debate on the

making of the history of social and

political thinking for the last threedecades. It is important to clarify, by 

comparison, both the limits and

theoretical and methodological pos-

sibilities of the two most productive

branches in the field today: the lin-

guistic contextualism of Quentin

Skinner and the concepts (Begriffs-

geschichte ) developed by Reinhart

Koselleck. We intend, in doing so,

to minimally organize the guidelines

of matters in discussion and esta-

blish interesting points on the rela-

tions of social and political theory 

with its history.

HISTOIRE DES CONCEPTS ETTHÉORIE POLITIQUE ET SO-CIALE: REPÈRES PRÉLIMINAI-RES

Marcelo Gantus Jasmin

Mots-clésQuentin Skinner; Reinhart Ko-selleck; Histoire des concepts;Théorie politique et sociale.

Cet article aborde, de forme succinc-

te, certaines des principales ques-

tions à propos du débat sur la for-

mation de l’histoire de la pensée

politique et sociale au cours destrois dernières décennies. Il est im-

portant d’expliquer, tout en les com-

parant, les limites et les possibilités

théoriques et méthodologiques des

deux courants les plus productifs ac-

tuellement: le contexte linguistique

de Quentin Skinner et l’histoire des

concepts (Begriffsgeschichte ) déve-

loppé par Reinhart Koselleck. Nous

proposons, ainsi, d’organiser les

questions qui sont à l’ordre du jour,

ainsi que d’établir les points intéres-

sants pour la recherche des relations

de la théorie politique et sociale

avec leur histoire.