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Revista Hélade ISSN: 1518-2541 www.helade.uff.br Título: Entre a virgem e o hóplita: o feminino e seus valores guerreiros em Eurípides Autora: Bruna Moraes da Silva Referência: SILVA, B. M. Entre a virgem e o hóplita: o feminino e seus valores guerreiros em Eurípides. Hélade, v. 2, n. 1, 2016, p. 71-83.

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Revista Hlade ISSN: 1518-2541 www.helade.uff.br Ttulo: Entre a virgem e o hplita: o feminino e seus valores guerreiros em Eurpides Autora: Bruna Moraes da Silva Referncia: SILVA, B. M. Entre a virgem e o hplita: o feminino e seus valores guerreiros em Eurpides. Hlade, v. 2, n. 1, 2016, p. 71-83.

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ENTRE A VIRGEM E O HPLITA: O FEMININO E SEUS VALORES GUERREIROS EM EURPIDES

BRUNA MORAES DA SILVA1

Resumo: Propomos, no presente artigo, analisar a relao entre o gnero feminino e o cdigo de con-duta guerreiro do Perodo Clssico (sculos V e IV a.C.) grego. Faremos essa anlise a partir da compa-rao entre os ideais hoplticos, masculinos por exce-lncia, e aqueles representados na personagem Ma-cria, presente na obra Os Herclidas, de Eurpides.Palabras clave: Feminino, cdigo de conduta guer-reiro, Eurpides.

Introduo

Demonstrar o thos guerreiro, assim como os desdobramentos das guerras, fez-se temtica tanto dos discursos poticos quanto das criaes designa-das como os primrdios da historiografia, sendo os valores socioculturais presentes na sociedade hel-nica, inclusive aqueles que deveriam ser seguidos em batalha, expostos em muitos deles.

1 Mestre em Histria Comparada pelo Programa de Ps-Grad-uao em Histria Comparada da UFRJ. Atualmente cursando o doutorado pelo mesmo programa e realizando pesquisa jun-to ao Laboratrio de Histria Antiga da UFRJ. E-mail: [email protected].

Desde a epopeia homrica, diferentes obras, mesmo que no picas, destacaram em seus con-tedos caractersticas pertencentes queles ho-mens tidos e cultuados no Perodo Arcaico (Sculos VIII-VI a.C.) como heris, guerreiros que enfrenta-vam os perigos de um conflito blico seja por uma motivao individual como a busca pela glria im-perecvel ou pela coletividade.

Caractersticas como honra, coragem, uma boa oratria e at mesmo medo da desaprovao de outrem destacavam-se dentre os que encaravam seus inimigos e lutavam por sua (patrs)2, in-dependentemente se o fim a ser encontrado fosse a morte.

2 Devemos deixar claro que a noo de ptria inexistente no perodo por ns estudado. Como elucidado por Violaine Sebillote Cuchet (2006), apesar do discurso da plis frequen-temente se focar em consideraes institucionais, a palavra ptris no significaria o sentindo pelo qual hoje conhecemos e sim o apego aos ancestrais, a terra e os laos entre membros da comunidade. Segundo Joselita de Queiroz Nascimento, Na Antiguidade, vemos uma ligao fundamental entre a noo de /patria, a lealdade familiar e o discurso poltico: a lealdade ptria, no apenas enquanto local de nascimento, mas tambm como unidade poltica na qual o indivduo est inserido e com a qual se identifica atravs de sua linhagem e participao poltica, se torna muito similar ao sentido de leal-dade e obedincia famlia (NASCIMENTO, 2015, p. 15-6).

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Igualmente, a virilidade, conceito este mais ideolgico que antropolgico, isto , que mais representa sobre aquilo que se espera do homem do que o que ele realmente (SARTRE, 2013, p. 19), era um atributo essencial entre os gregos. Tanto que nas obras homricas encontramos por diversas ve-zes exortaes exigindo aos guerreiros a serem ho-mens (HOMERO, Ilada, V, v. 529-532/ XV, v. 561-4/ XV, v. 661-5); assim como dentre os lderes da Guer-ra do Peloponeso, mencionados por Tucdides em sua Histria da Guerra do Peloponeso, verificamos uma incitao coragem e uma crtica covardia.

Este modelo de homem viril, estabelecido no discurso, construdo, em muitos aspectos, a partir da oposio com o gnero feminino. Como nos ressaltado por Carmen Isabel Soares, estava vedada mulher a presena em campo de batalha (SOARES, 1999, p. 27) e, segundo Mastronarde, um aspecto importante da auto definio dos cidados atenien-ses do sexo masculino do quinto sculo residia na noo da incapacidade de mulheres gregas normais para as virtudes de bravura e resistncia fsica do sexo masculino e para as virtudes dos cidados de bom senso e liderana (MASTRONARDE, 2010, p. 261).

No universo simblico dos gregos, as nicas mulheres que se aproximavam dos ideais guerrei-ros eram as deusas, no caso Athen, ou aquelas que no pertenciam a sua esfera civilizatria: as ama-zonas (MASTRONARDE, 2010, p. 216). Desse modo, conforme elucidado por Nicole Loraux, os homens morreriam na guerra, realizando rigorosamente o ideal cvico; j a mulher, submissa a seu destino, te-ria unicamente como o ato glorioso a morte em seu leito, dando luz a um novo heleno (LORAUX, 1988, p. 21).

desde Hesodo que o gnero feminino marcado por caractersticas diminutivas de seu carter ou de sua possibilidade de ao em meio sociedade. O poeta da Becia descreve as mulheres em seu Os Trabalhos e Dias como uma grande des-graa (v. 56), um mal com que todos se deleita-ro no nimo (v. 57-8). Pricles, em sua Orao

Fnebre3, descrita por Tucdides (II, 45), dirige-se ao pblico feminino igualmente apontando o carter de sua natureza:

Se me permitido recordar tambm a virtude feminina, como a das mulheres que acabaram de ficar vivas, vou dar-lhes com brevidade o seguinte conselho: grande ser a vossa glria se no ficar abaixo das qualidades que a na-tureza vos deu e se o vosso bom nome no se prestar a ser falado entre os homens em lou-vor ou m-lngua

Devido a esse tratamento dado s mulheres em muitas das documentaes escritas, a maneira de se pensar esse gnero na Antiguidade grega em meio historiografia contempornea se manteve por um longo tempo atrelada a um ponto de vista focado exclusivamente na recluso feminina e na sua impossibilidade de participao poltica. Traba-lhos como os de Sarah Pomeroy (Diosas, rameras, esposas y esclavas) e Claude Moss (La mujer em la Grcia Clssica) focaram-se exclusivamente na lite-ratura, deixando de lado os artefatos arqueolgicos e evidenciando apenas o modelo de mulher ideal: a mlissa, de quem se esperava algumas caractersti-cas determinadas, como a passividade e a conexo ao ambiente interno, ao okos.

Almejava-se da (gyn), a esposa legti-ma do cidado ateniense considerada de car-ter frgil e dbil que ela realizasse as atividades domsticas, fosse silenciosa, no participasse da vida pblica, abstivesse-se dos prazeres do corpo e gerasse filhos, de preferncia do sexo masculino (LESSA, 2010, p. 15). Ao espao externo, ligado ao masculino, a presena do feminino estaria negada.

Este quadro investigativo hermtico sobre o ser mulher na Grcia Antiga comeou a ser modifi-cado a partir da dcada de 80 do sculo XX, quando se deu incio a uma abertura documentao ar-queolgica e anlise no mais de uma histria das

3 A Orao Fnebre considerada por Loraux (1994) como um gnero discursivo como caractersticas especficas, delineado por regras retiradas de oraes do passado. O usualmente discursado referia-se aos mortos em combate, aos jovens e suas virtudes cvicas, destacando seu herosmo e destemor e servindo de exemplo para os vivos.

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mulheres focada apenas em uma diviso sexual , mas de uma histria de gnero baseada em uma investigao pautada a partir de um aspecto rela-cional entre o masculino e o feminino, uma viso distanciada do determinismo biolgico (PANTEL, 1998, p. 101)

Indo de encontro s perspectivas dualistas, defende-se, a partir de ento, que lanar um olhar para o feminino v-lo como absolutamente plural, j que existem vrias mulheres e que estas esto inseridas na sociedade de formas tambm absolu-tamente variadas. O gnero passa a ser entendido como um elemento constitutivo das relaes fun-dadas sobre as diferenas percebidas entre os se-xos, destacando-se como uma maneira de significar relaes de poder e modelado por fatores sociais como identidades, status/classe, riqueza e raa/et-nia (FOXHALL, 2013, p. 11).

Assim, devemos ressaltar, os ideais culturais esperados em uma sociedade no dizem totalmen-te respeito s prticas sociais existentes. Segundo Fbio de Souza Lessa, h indcios de que o modelo da mulher ideal no fora rigidamente posto em pr-tica, havendo desvios do que era esperado, e que o gnero feminino poderia ter feito parte do ambien-te primordialmente masculino (LESSA, 2010, p. 16).

Ademais, como nos ressaltado por Iglsias, quando, dentro de uma situao extraordinria, de guerra ou no, a plis passava por dificuldades, o setor feminino era com muita frequncia sustent-culo e s vezes inclusive chega a certo protagonis-mo (IGLSIAS, 1986, p. 112). De acordo com Car-men Isabel Soares, mesmo que a mulher no fosse para o campo de batalha, isso no impedia que ela estivesse conectada ao fenmeno blico, seja como causa, vtima ou salvadora da ptria (SOARES, 1999, p. 27).

Tendo isto em considerao, podemos verifi-car documentaes em que h uma quebra do pa-radigma feminino esperado pela sociedade grega, sobretudo a ateniense. A tragdia, destacando-se as obras escritas por Eurpides, confunde as fron-teiras que usualmente os gneros construam entre si. Este tragedigrafo, que aqui ser analisado, foi um dos que mais cedeu espao mulher em seu

teatro: basta lembrar que das dezenove tragdias que chegaram at ns, doze possuem nomes femi-ninos e treze tm mulheres como protagonistas.

A escolha por personagens femininas, assim como de crianas, relacionadas fragilidade de suas condies sociais, teria como objetivo, como por ns defendido, provocar um dos maiores ob-jetivos da tragdia: a (kathrsis), a purga-o das emoes (ARISTTELES, Potica, VI, 1449b, 24), posto que da natureza feminina julgava Eurpi-des poder tirar melhores efeitos patticos (SILVA, 2005, p.130).

Do mesmo modo, como nos destacado por Marquardt, a escolha pelo gnero feminino tam-bm destacaria a possibilidade de as mulheres re-presentarem a grandeza que os homens parecem ser j incapazes de demonstrar (MARQUARDT, 2007, p. 111). Isso porque, o perodo no qual as obras de Eurpides esto inseridas diz respeito ao contexto da Guerra do Peloponeso (431-404 a.C.), conflito travado entre atenienses e espartanos, uni-dos a seus respectivos aliados, em que se verifica-va no apenas o confronto entre a democracia dos primeiros e a oligarquia dos ltimos, mas tambm a hbris (desmedida) e a harmata (falha) de seus lderes.

Os desmandos da plis ateniense durante a guerra foram responsveis por romper, como des-taca Donald Kagan (2006, p. 22), a tnue fronteira que separa a civilizao da selvageria. vista dis-so, o gnero trgico, assim como o cmico, serviu como uma oportunidade segura de se representar os erros humanos na guerra ou as vantagens da paz (PRITCHARD, 2014, p. 43). As peas possuam como funo por em questo todas as representaes cvicas. Como nos remete Nicole Loraux, no colo-cando o real nos palcos, a distribuio dos valores seria submetida a todas as distores possveis (LORAUX, 2003, p. 46). Assim sendo,

admite-se como verossmil que as mulheres, que nesse contexto histrico estavam reclu-sas no gineceu e que pouco ou nada influ-am na realidade da plis, poderiam sim ser capazes das aes mais nobres e demonstrar uma fora que poderia faltar a muitos homens (MARQUARDT, 2007, p. 111).

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Outrossim, segundo Sartre, o gnero feminino poderia manifestar sua andrea, uma das palavras gregas que designava coragem e estava conectava sobretudo ao universo masculino como o prprio radical da palavra (anr homem) designa , espe-cialmente em obras literrias (SARTRE, 2013, p. 20), sendo isto verificado nas peas de Eurpides.

Levando ao palco jovens virgens dispostas a ce-der sua vida em prol de um bem comum, como o caso de Macria, que aqui ser analisada, o mais trgico dos trgicos, como Aristteles o denomi-na (Potica, XIII.1453a, 29-30), destacava nessas mulheres ideais prprios do guerreiro, do varo, como a coragem e a virtude. Segundo Mendelshon, o auto sacrifcio de uma jovem, a fim de executar o seu ato heroico, deve atravessar a invisvel, mas culturalmente bem guardada, fronteira entre os es-paos masculino e feminino (MENDELSOHN, 2002, p. 50). Assim, discordamos de Redfield quando este afirma que uma mulher no pode ser considera-da um heri, mas apenas a me de um heri (RE-DFIELD, 1994, p. 120).

Destarte, temos como proposta no presente artigo analisar as representaes sociais do cdigo de conduta guerreiro verificados no gnero femini-no na pea Os Herclidas (~430-427 a.C.), de Eur-pides, apresentada no incio da Guerra do Pelopo-neso.

Defendemos que atravs de cdigos simblicos e recursos discursivos, o poeta punha em cena ques-tionamentos e problemas da plis, fazendo aluses indiretas ao conflito que ocorria no contexto do au-tor, como aqui j mencionado. Sendo destacado na historiografia tanto pelo ttulo de pacifista, apresen-tando os males que a guerra pode causar, quanto o de patriota, ele evidenciaria a necessidade de se sacrificar pela comunidade (ROMILLY, 1999, p. 103) e demonstraria a utilizao da ambiguidade como meio de expresso do universo trgico.

De acordo com David Pritchard, as peas tea-trais podiam exercer tanto uma resposta crtica democracia quanto compartilhar algumas de suas premissas ideolgicas, devendo isso liberdade pessoal e o debate aberto que Atenas defendia (PRITCHARD, 2014, p. 5). Ademais, as obras trgicas

haveriam confirmado a aret (virtude) e os servios militares como normas, reforando o modo de guer-rear ateniense como justo, ajudando a manchar a moralidade dos inimigos e lembrando sociedade da importncia do debate aberto para poltica ex-terna.

Isto posto, dividiremos o presente artigo em duas sees: a primeira destinada a explicitar quais eram os valores presentes no cdigo de conduta do guerreiro grego do Perodo Clssico (Sculo V-IV a.C.), e a segunda voltada para anlise da pea e da personagem Macria, comparando os ideais nela presente com os encontrados nos hplitai.

Os ideais guerreiros

Podemos dizer que Homero poeta que locali-zamos no Perodo Arcaico foi o primeiro na tradi-o grega que a ns foi legada a descrever os ideais esperados de um guerreiro. Nomes como Aquiles, Heitor e Diomedes encarnavam verdadeiros mode-los a serem seguidos por aqueles que ouviam suas epopeias: a aristocracia da poca, que tinha como uma de suas principais atividades a guerra.

Outrossim, de acordo com Pritchard, quando as obras do aedo j haviam sido fixadas na escrita, os meninos aprendiam em suas aulas de gramtica, parte da paidea4, exemplos dos heris homricos, que seus pais acreditavam que iria transform-los em homens corajosos (PRITCHARD, 2014, p. 38).

Valores como coragem, virtude, honra e vergo-nha eram destacados nesses heris e deveriam ser seguidas ou rechaados at mesmo na hora da mor-te, sendo o campo de batalha o local por excelncia onde eram demonstrados. E, muitos desses ideais vistos nas epopeias homricas, ainda vo continuar a existir nos guerreiros do sculo V a.C.

4 Significando, literalmente, educao de meninos, perfazen-do-se em um conceito muito amplo e complexo, a paidea pode ser simplificada como um conjunto de atividades edu-cacionais e culturais da sociedade grega, que possua como objetivo a construo de um cidado com aret (excelncia, virtude), honra e coragem, atravs de atividades que levavam a harmonia entre o corpo e a mente.

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A honra, por exemplo, conhecida entre os gre-gos como (time), era entendida como o reco-nhecimento pessoal do indivduo, assim como o da sociedade. Caso o guerreiro realizasse um ato desonroso, ele seria apontado como algum sem valor, mas que poderia redimir-se atravs de atos dignos.

Ela seria atingida atravs dos atos em batalha, da habilidade como um lder e lutador, mas tambm de outras qualidades, como a habilidade de orador, a piedade, o bom senso, a lealdade, a hospitalidade e a gentileza, mas essas so secundrias e a ltima poderia de fato estar sem lugar no combate (RU-THERFORD, 1996, p. 40). Conforme destacado na Orao Fnebre de Pricles, descrita por Tucdides, s o culto da honra () no envelhece e no so as riquezas, como dizem alguns, mas sim honra () que d prazer quando se chega idade (TUCDIDES, Histria da Guerra do Pelopo-neso, II, 44).

A excelncia, virtude ( - aret), era outro qualitativo guerreiro prezado entre os gregos anti-gos. Ela se definia como o mrito ou qualidade pela qual o heri se destacava. A guerra seria um meio atravs do qual o guerreiro poderia demonstrar sua aret e utilizar como modelo seus ancestrais mti-cos e histricos (PRITCHARD, 2014, p. 38). Se um heri hesita, se ele transgride valores ticos, ele ser apontado pela sociedade como indigno de ser rememorado, como algum sem aret, sem valor.

A vergonha ( - aids) igualmente acom-panhava o guerreiro em campo de batalha. Segun-do Schein, ela o medo da desaprovao ou da condenao pelos outros que faz um homem ficar e lutar bravamente (SCHEIN, 2010, p. 177), o que de-monstra que no era vedado ao homem, at mes-mo ao maior dos heris, o sentimento do medo. Segundo nos relata Tucdides acerca do discurso de Arquidamo, chefe do exrcito espartano, aos seus guerreiros:

Quando em campanha em territrio inimigo, necessrio no s combater com coragem mas tambm para cada ao fazer cuidadosos pre-parativos, como se ditados pelo medo. Deste modo, pode-se ser o guerreiro mais destemido

no ataque ao inimigo e tambm o mais seguro a enfrentar o seu ataque (TUCDIDES, Histria da Guerra do Peloponeso, II, 11).

A coragem (-alk/-andrea, entre outros sinnimos) a superao deste medo a fim de atingir uma meta pr-estabelecida (BALOT, 2004, p. 407), destacando-se igualmente como a fora e o vigor que um homem possui. Podemos dizer que um ponto de equilbrio entre insegurana e con-vico exacerbada e que se manifesta no indivduo consoante trs aspectos: 1) Predisposio no car-ter; 2) Incitao por parte de outra pessoa; 3) Inci-tao por parte de um sentimento. Segundo Sartre,

No existe andrea sem um profundo senti-mento de agn: sempre e em toda parte fazer melhor do que o outro. Este esprito de com-petio se encontra no corao mesmo da ci-dade e, por consequncia, no comportamento daqueles que so seus membros: os homens (SARTRE, 2013, p. 25).

Ainda assim, a coragem vista no Perodo Cls-sico entre os atenienses, como nos destacado por Balot, diferencia-se daquela reverberada nas epo-peias ou entre os espartanos. Segundo o autor, a soluo dos atenienses foi desenvolver um entendi-mento de coragem tanto como uma consequncia quanto como uma base para os valores democrti-cos, como a liberdade, a igualdade e a segurana do indivduo (BALOT, 2004, p. 406), isto , h uma de-mocratizao deste ideal (BALOT, 2014): pensa-se anonimamente e luta-se por seus deveres cvicos.

Ser corajoso passa a ser, do mesmo modo, no simplesmente uma questo de desafiar o perigo, mas igualmente de como e por que o guerreiro o faz (BALOT, 2014, p.100), destacando-se a raciona-lidade no combate dos atenienses em oposio irracionalidade dos espartanos, que seriam extre-mamente ligados tradio, excessivamente reve-rentes autoridade e treinados especificamente para superar o medo (TUCDIDES, II, 39).

Igualmente, como nos ressaltado por Pri-tchard, a coragem da Atenas do sculo V a.C. se referia capacidade de se manter firme na batalha e aceitar a possibilidade de injria pessoal ou morte quando lutando pela sua plis (PRITCHARD, 2014, p. 35),

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destacando-se, assim, como uma caracterstica pas-siva do guerreiro (PRITCHARD, 2014, p. 18), sem deixar de lado a bravura como componente de uma vitria, pois, como destacado por Frmion, estra-tego ateniense, ser valente () algo que se enquadra muito bem (TUCDIDES, Histria da Guerra do Peloponeso, II, 89).

E, devemos ressaltar, conforme elucida Balot, que o teatro era um veculo cultural que encora-java os atenienses a refletir sobre seus ideais de vergonha e coragem (BALOT, 2014, p. 104), de-monstrando-se como os tragedigrafos evidencia-vam nas encenaes os ideais de cidadania a serem seguidos pelos helenos.

A mais que tudo, a coragem no momento de se enfrentar a morte era igualmente um dos requisi-tos que destacavam os guerreiros como homens de valor. Para atingir a to almejada bela morte seria necessrio perecer jovem em batalha, demonstran-do-se toda virilidade, honra e coragem. Experimen-tar a morte seria para ele um momento que o daria poder (NAGY, 1999, p.9), sendo sua beleza juvenil sempre remorada, servindo de exemplo para gera-es vindouras e como uma resposta fatalidade que o fim da vida demarcava 5. Acatando seu des-tino, mesmo este sendo trgico, os guerreiros sela-riam com sua bela morte sua vida de aret, de vir-tude, positivando-a atravs da memria e de uma nova condio de existncia social.

Conforme verificamos na obra de Tucdides sobre esta temtica, os lderes Corntios dizem que os atenienses usam seus corpos na defesa de sua ptria como se fossem de estranhos (TUCDIDES,

5 Em contraste ao feito de morrer belamente, havia a feia mor-te, que seria motivo de esquecimento por parte da sociedade daquele que fora morto. O padecimento de um ancio em ba-talha e no na velhice, por exemplo, encaixar-se-ia nessa cate-goria; assim como morrer ferido pelas costas, demonstrando que o homem estaria fugindo de seu inimigo. As personagens tambm poderiam aferir a feia morte ultrajando o corpo do inimigo e buscando priv-lo de uma figura bela que poderia permanecer na memria social: O aika, o ultraje, consiste em desfigurar, em desumanizar o corpo do adversrio, em destruir nele todos os valores que nele se encarnam, valores indissoluvelmente sociais, religiosos, estticos e pessoais (VERNANT, 2009, p. 429).

Histria da Guerra do Peloponeso, I, 70); E Pricles pronuncia que a felicidade ter alcanado, como esses (os guerreiros mortos], a morte mais honrosa, ou a mais honrosa dor como vocs e como aqueles a quem a vida lhes calculou em igualdade ser feliz e morrer (TUCDIDES, Histria da Guerra do Pelo-poneso, II, 44).

Ainda assim, diferentemente dos ideais aris-tocrticos vistos nas atitudes dos heris homricos que visavam, sobretudo, o alcance de uma glria in-dividual6, a partir do sculo VII a.C., com a emergn-cia da falange hopltica, o comprometimento com a coletividade era posto em destaque (GARLAN, 1994, p.61).

Essa formao, alm de promover mudanas nos armamentos, tticas de guerra e a incluso de uma fora blica que no a aristocrtica, dando abertura a outras camadas da sociedade (RICH, SHI-PLEY, 1995, p. 47), foi uma resposta necessidade de uma comunidade, que cada vez mais abria espa-o para o to koinn, o comum, o coletivo.

E, em Atenas, ainda mais: nos anos iniciais da guerra, que tiveram a frente Pricles como estrate-go, a ode dada glria coletiva v-se transformada em uma ode glria da plis democrtica. Em sua Orao Fnebre, verificamos um desvio do que usualmente era proferido aos mortos de guerra: o enaltecimento da glria desses homens posto em segundo plano em prol do louvor aos ideais demo-crticos e expansionistas atenienses. Dessa forma, verifica-se que a coragem pregada por Pricles no seria motivada apenas pelo aids, como era em Ho-mero, mas pelo pensamento racional da constru-o de uma , uma comunidade poltica (BALOT, 2004, p. 416). Do mesmo modo, a andrea passa a assumir mais um carter poltico que guerreiro, sendo louvado, como destaca Sartre, uma coragem que no tem objetivo seno aquele de formar um cidado perfeito, mestre da palavra, dispensador de bons conselhos (SARTRE, 2013, p. 21).

6 Segundo Detienne, o heri era marcado por dois tipos de gl-ria: Klos e Kudos. O ltimo se refere glria do combatente cedida pelos deuses e o primeiro a que vingar na memria social (DETIENNE, 1988, p.19).

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Conforme discursado por Pricles, aps um longo elogio e enaltecimento das caractersticas da plis ateniense, os guerreiros considerando justo no serem privados de uma tal cidade, lutaram e morreram nobremente, e natural que qualquer um dos sobreviventes queira esforar-se em sua de-fesa (TUCDIDES, Histria da Guerra do Pelopone-so, II, 41), destacando-se que se deve valorizar, em primeiro lugar, a valentia em defesa da ptria (TU-CDIDES, Histria da Guerra do Peloponeso, II, 42)

A ideologia guerreira cumpria, assim, uma fun-o social nesse contexto, destacando-se como a ideologia da falange hplita e a ideologia da p-lis so as mesmas (RICH & SHIPLEY, 1995, p. 48). Fazendo-se um discurso de autocelebrao, veri-fica-se, como ressalta Balot, como os atenienses fizeram conexes prximas entre a sua forma de organizao poltica e sua coragem no campo de ba-talha (BALOT, 2004, p. 406). De acordo com Neiva,

Uma nova concepo de herosmo se conso-lida para o soldado-cidado durante a guerra do Peloponeso. Aos poucos, a cidade-estado e o grupo, no mais os indivduos, passam a ser o lugar privilegiado para a manifestao da aret. Tucdides observa, claramente, que o modelo heroico no mais o mesmo que o das narrativas homricas, e por isso atribui a Pricles, no discurso fnebre, uma frase onde o lder ateniense diz que a glria da cidade dis-pensa Homero (Tucdides 2. 41) (NEIVA, 2003, p. 87)

Desse modo, conforme Pritchard, suas mortes em batalha em prol do bem comum ou seus ide-ais dignos resultaram em louvor e renome eternos. Isso deu a eles uma lembrana imortal no apenas de sua aret, mas tambm de sua juventude, por-que sua morte prematura teria lhes poupado os es-tragos e a invalidez da velhice (PRITCHARD, 2014, p. 35).

Curiosamente, muitas das caractersticas des-critas por Tucdides verificadas, ou ao menos espe-radas, de um guerreiro, esto presentes em perso-nagens femininas das obras de Eurpides. Conforme nossa proposta, analisaremos a seguir como Ma-cria, personagem presente em Os Herclidas, re-presenta ideais presentes no cdigo de conduta

desses homens que enfrentavam seus inimigos em campo de batalha. Buscaremos, igualmente, ir alm de uma anlise per se dos discursos proferidos nes-tas peas, colocando-se em destaque os processos e condies de produo das mesmas, pois como nos ressalta Orlandi, os sentidos no esto s nas palavras, nos textos, mas na relao com a exterio-ridade, nas condies em que eles so produzidos e que no dependem s das intenes dos sujeitos (ORLANDI, 2012, p.30).

A virgem como hplitai: um estudo de caso da jovem Macria

Como citado em nossa introduo, recorren-te nas obras de Eurpides o protagonismo ou pre-sena de mulheres que assumem uma posio ativa em meio a uma sociedade na qual a recluso era a palavra de ordem para esse grupo, pelo menos em grande parte dos discursos que a ns chegaram.

Igualmente, faz-se recorrente em suas obras a temtica do sacrifcio humano, especialmente de jovens virgens7, ato que fugia s normas da socie-dade grega e estava presente, como ressaltado por Albert Henrichs, apenas no imaginrio dos helenos, tendo sido parte de seu passado histrico, mas abo-lido de sua sociedade, sendo encontrado, sobretu-do, nas documentaes poticas (HENRICHS, 2013, p. 182).

Segundo Pietro Pucci, o sacrifcio o ritual de violncia atravs do qual consegue-se atingir um remdio, apaziguar a conscincia, estabelecer a or-dem no caos e compensar perdas e runas (PUCCI, 2003, p. 140). No caso da pea analisada, verifica-mos que uma jovem levada ao altar sacrificial de-monstrando um ato heroico em um momento de incerteza. Os Herclidas traz para ns essa temtica de impacto atravs de um parntese institucional (LORAUX, 1988, p. 114), gerando-se, como citado,

7 Alm de esta temtica ser vista na pea aqui analisada, Os Herclidas, ela tambm se faz presente em Ifignia em ulis, com o sacrifcio da personagem que d nome a pea; em H-cuba, com o sacrifcio de sua filha Polxena, e no fragmento Erecteu, no qual a filha da personagem que d nome a pea escolhida como vtima.

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um impacto emocional e uma purgao das emo-es, a chamada catarse, mas tambm debatendo questes do prprio cotidiano de Eurpides, sendo uma em especial: a Guerra do Peloponeso.

Ainda assim, no nosso objetivo neste artigo analisar o ato do sacrifcio em si, investigao j rea-lizada por ns em dois trabalhos publicados (SILVA, B., 2014; LESSA & SILVA, 2014), mas sim nos focar no estudo da personagem, destacando as caracte-rsticas nela presente que a aproxima do guerreiro.

Analisando a personagem, deparamo-nos com uma virgem, jovem e de uma linhagem nobre, pos-ta sob o cutelo do degolador em prol de um bem maior, deixando de lado a possibilidade de gerar fi-lhos, ao to esperada das mulheres gregas, para alcanar uma glria eterna. A coragem que essa virgem demostra, que, conforme explicitamos, a virtude que permite indivduos ou grupo alcana-rem suas metas apesar dos perigos ou de circuns-tncias difceis (BALOT, 2014, p. 92), destaca como o renome reivindicado pelo gnero feminino pode ser muito similar a glria dos guerreiros8. Conforme nos explicitado por Marta Mega de Andrade, as virtudes que se ressaltam nessas personagens su-gerem uma aproximao virilidade dos espritos livres, devido ao seu consentimento em morrer (ANDRADE, 2001, p. 110). Segundo Mastronarde,

em vez de desafiar os pressupostos do sexo masculino, essas personagens o alimentam para estabelecer o seu prprio status, e podem ser saudadas como um exemplo a fortiori para os homens na plateia: se uma jovem pode ra-ciocinar assim e agir assim, ento eles mesmos devem ser capazes de bravura semelhante (MASTRONARDE, 2010, p. 266).

Ademais, como aqui j debatido, as mulheres na tragdia apontam para a incompletude de he-rosmo masculino (ROSELLI, 2007, p. 124), eviden-

8 De acordo com Marquardt, As mulheres, dispostas a essa morte gloriosa que as aproxima ao estatuto do guerreiro so, no por acaso, virgens. Na realidade no so ainda mulheres no sentido pleno. No penetraram no universo feminino por excelncia que consiste no himeneu e na maternidade, que as levaria vida adulta plenamente inserida na cidade, na civili-zao (MARQUARDT,2007, p. 119).

ciando as falhas e a falta de coragem de alguns lde-res ao longo da Guerra do Peloponeso, destacando a funo social no sacrifcio de uma virgem, que ar-gumentamos ser tanto uma busca pela restaurao da ordem quanto uma forma de defender o patrio-tismo ateniense.

Ainda assim, o teatro, com sua ambiguidade intrnseca, que permitia escutar ao mesmo tem-po os dois discursos opostos e seguir o confronto do princpio ao fim, atravs do drama (VERNANT & VIDAL-NAQUET, 2008, p.73 e 78), no deixa de evidenciar as desvantagens desse patriotismo exa-cerbado, pondo em destaque o sacrifcio humano como um ato profano.

Analisando a personagem de Macria, nome que, devemos ressaltar, no aparece na obra de Eurpides que a descreve apenas como virgem () 9, o primeiro destaque dado ino-vao em sua presena no mito dos Herclidas. Em nenhuma outra documentao anterior a do tra-gedigrafo relatada a existncia de uma moa, filha de Hracles, que tenha sido sacrificada. Desse modo, considera-se em meio aos helenistas esse fato como uma criao euripidiana.

O perodo em que a pea narrada, ainda que no possa ser fixado com segurana, diz respeito, provavelmente, aps o primeiro ano de guerra, no qual Atenas estava sofrendo com as invases espar-tanas e Pricles realizava a sua Orao Fnebre.

No que compete a sua temtica, a pea traz para ns a perseguio que os filhos de Hracles vinham sofrendo aps a morte de seu pai pelo rei de Argos, Euristeu. Acompanhados de Iolau, antigo companheiro de Hracles e de Alcmena, me do heri, os jovens pedem o auxlio e a hospitalidade de Demofonte, filho de Teseu e basileus de Atenas, que cede suplica, demonstrando um altrusmo ateniense.

Ainda assim, ele se se depara com uma exign-cia da filha de Demter, Persfone, para que fos-sem bem-sucedidos no confronto contra o inimigo

9 Segundo a historiografia, o nome dado a jovem fora extrado de documentaes gregas posteriores pea.

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e para a cidade viver (EURPIDES, Os Herclidas, v.492): o sacrifcio de uma jovem virgem, ponto no-dal da pea para nosso estudo.

Demofonte se recusa a realizar o ato caso seja uma ateniense a ser submetida ao cutelo do de-golador e neste momento surge a personagem da jovem Macria, que prontamente se oferece em sa-crifcio e demonstra seus valores guerreiros.

Interessante ressaltar, todavia, que mesmo manifestando uma conduta viril, ao adentrar ao recinto predominado por homens, a virgem j se desculpa por falar e ressalta as caractersticas femi-ninas da mulher ideal aqui j destacadas:

Estrangeiros, no me acusem de de-savergonha por ter sado ( )10. Esta ser a pri-meira coisa que eu peo. Para uma mulher, o mais belo , sem dvida, o silncio e a sensa-tez, assim como uma tranquila permanncia dentro de caso (EURPIDES, Os Herclidas, v. 474-8).

Conforme salientado por Meldelson,

Cada vez que uma personagem feminina nas peas polticas entra, alguma meno feita das convenes sociais que atribuem as mu-lheres para o espao interior da casa e os ho-mens para o exterior, o espao pblico, que normalmente o local do discurso poltico; se tal meno feita, , sem dvida, porque cada entrada tal viola necessariamente essas con-venes (MENDELSOHN, 2002, p. 38).

Ainda assim, indo de encontro posio que a sociedade a ela designava, a jovem toma o poder de fala e com uma extensa rhsis destaca sua compe-tncia de argumentao:

Ento, no mais temas a lana inimiga dos Argi-vos. Eu mesma, de livre e espontnea vontade, apesar de receber essa ordem, ancio, estou disposta a morrer e a entregar-me em sacri-

10 A palavra que o tradutor define como desavergonhada diz respeito, no grego, ao termo , que significa coragem, podendo esta sentena ser traduzia como no considerem minha sada como um ato de extrema coragem.

fcio ( ). O que haveremos pois de alegar, se, por nossa causa, a cidade aceita correr um grande perigo? Ns mesmos, que impomos provaes a terceiros, quando possvel salv-los, fugiremos diante da morte? Seguramente no. Tanto mais que so compor-tamentos dignos de escrnio: que suplicantes dos deuses estejam sentados a gemer e que descendentes daquele que tivemos como pai se mostrem uns covardes ( ). Onde que estas aes ficam bem a homens honrados ()? Rica sorte, bem o creio, se esta cidade for tomada quem dera tal no acontea! , cair nas mos dos inimigos, e, embora filha de um pai ilustre aps ter su-portado atos desonrosos (), nem por isso deixar de ver o Hades! Mas hei-de eu vaguear, expulsa deste solo? E no hei-de corar, se al-gum disser: Porque que viestes para aqui com ramos suplicantes, se vs mesmos tendes amor vida ()? Fora desta ter-ra! Covardes () no ajudaremos ns. [...]

(A Demofonte) Conduzi-me at onde o meu cor-po deve morrer, ornaio-com coroas, e, quando quiserdes, comeai o sacrifcio. Vencei, pois os inimigos. Esta alma que aqui est age esponta-neamente, e no contra sua vontade. Eu decla-ro que pelos meus irmos e por mim mesma que vou morrer. que, certamente porque no sou covarde ( ), eu fiz a mais bela descoberta: como deixar com glria a existncia ( ). (EURPIDES, Os Herclidas, v. 500-518/528-534).

Diante de sua fala podemos verificar tanto os motivos de sua morte: retribuir a generosidade de Atenas, garantir a vida dos irmos e a sua glria pes-soal, visto que a generosidade de Macria fruto apenas da sua vontade (SILVA, 2005, p. 141); quan-to os valores prezados em um guerreiro e nela en-carnados.

A jovem destaca o ato indigno que a fuga da morte e o demonstrar-se covarde ( ), sendo estas aes conectadas a homens no honra-dos (/). Acusa aqueles que tem amor vida (), o que ela destaca no ter ( ), visto que deseja alcan-ar, tal quais os heris, a glria imperecvel.

Ademais, conforme nos evidenciado por Mastornarde, as palavras utilizadas por Macria no verso 502, , evocam, consoante

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o j explicitado, a funo do bom guerreiro que se mantm firme na falange hopltica, lado a lado () com seus iguais (MASTRONARDE, 2010, p. 265).

Assim, tal como destacado por Cludia Raquel Cravo da Silva a respeito de Macria,

se os atenienses se mostraram dispostos a cor-rer grandes perigos para os ajudarem, o mais natural que ela agora abdique da sua vida pela mesma causa. At porque est bem ciente das responsabilidades morais advindas da sua nobreza de nascimento e no quer ser poste-riormente acusada de covardia (SILVA, 2000, p. 52).

Isso porque, de acordo com MacIntyre, a co-ragem destaca-se no apenas como uma qualidade do indivduo, mas como valor necessrio para sus-tentar a famlia e a comunidade (MACINTYRE, 2001, p. 212).

Voltando-nos anlise dos versos, Macria designada como a mais digna de louvor dentre os filhos de Hracles (EURPIDES, Os Herclidas, v. 486), isto , est acima dos homens. Sua fala cha-mada pelo coro de grandiosa ( ) (EUR-PIDES, Os Herclidas v.535), suas palavras as mais nobres () (EURPIDES, Os Herclidas v.537) e seu ato de maior nobreza ( ) (EU-RPIDES, Os Herclidas, vv.537-8).

Ainda assim, Iolau diz a jovem para se reali-zar um sorteio entre as irms a fim de que a sorte escolha quem realmente deveria morrer. Macria, diante do ofertado, discursa que no perecer pela deciso dos fados, pois no haveria mrito nisso, sendo por sua vontade e no por obrigao que es-taria oferecendo sua vida (EURPIDES, Os Hercli-das, v. 548-557), palavras que, segundo Iolau, so mais sublimes que as anteriores, dizendo a ela que sua morte seria til aos irmos (EURPIDES, Os He-rclidas, v. 543-7).

Digna de um funeral, ato exigido da sociedade grega para os guerreiros mortos em combate, De-mofonte diz que a jovem que a ela sero dadas as honras devidas, pois seria ignomioso no prest-las (EURPIDES, Os Herclidas, vv.568-9), destacando

os motivos para isso: Primeiro pela tua coragem (), depois pela justia (). Eu vi, com estes olhos, que tu s a mais destemida de todas as mulheres ( ) (EURPIDES, Os Herclidas, v. 569-573).

Macria, assim, abdica de seu casamento em prol de um bem comum (EURPIDES, Os Herclidas, v. 579-580), mantendo sua intrepidez de esprito. Conforme destaca Cludia Raquel Cravo e Silva, a virgem jovem e frgil, mas senhora de uma ma-turidade precoce, capaz de resolver a situao de crise em que os adultos se mostram inoperantes (SILVA, 2000, p.70-1).

Para mais, alm de elevar o tom dramtico da tragdia, sua figura seria um contraste ao basileus de Atenas, visto que este se encontra absorto em indeciso e perplexidade (SILVA, 2000, p. 71), des-tacando, como aqui j citado, as crticas realizadas aos lderes atenienses em meio Guerra do Pelo-poneso.

A jovem igualmente exige dos irmos que, caso eles consigam retornar a sua ptria, tributem hon-ras fnebres vossa libertadora (), ato primordial para que o guerreiro permanecesse na memria, destacando que essas fossem as melho-res, pois a ajuda que vos prestei no foi incomple-ta, mas dei a vida pela minha raa () (EUR-PIDES, Os Herclidas, v.587-591).

Aps sua morte, os elogios continuam. Iolau a destaca como a mulher mais distinta que todas pela coragem que teve ( ), sendo, de longe, o maior alvo de venerao, (EURPIDES, Os Herclidas, v. 598-9). O coro ressalta que

a desafortunada ganha a sua quota-parte hon-rosa ao morrer pelos irmos e por este pas (), e no sem glria () a fama que receber dos humanos. que a virtude caminha por entre as dores. Este procedimen-to digno do seu pai, digno da sua nobreza de origem. E, se tu veneras a morte dos bons, eu junto-me a ti (EURPIDES, Os Herclidas, v. 619-627).

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Resenha

Assim sendo, diante desses inmeros elogios coragem da jovem, podemos dizer, tal qual afirma Loraux, que

Por ignorar o casamento e os trabalhos de Afrodite, a moa adquire por meio do imagin-rio social noes relativas ao mundo da guerra [...] As virgens no poderiam combater ao lado dos vares mas, quando o perigo extremo, seu sangue corre para que a comunidade dos andres viva (LORAUX, 1988, p. 67).

Demonstrar essas atitudes em meio a um con-flito blico, conforme ressaltado, faz-se assim como um meio de evidenciar ao pblico de Eurpides que, para que Atenas fosse bem-sucedida, havia ne-cessidade de um forte empenho de todos na defe-sa dos mais altos valores morais que, por tradio, eram apangio daquela cidade (ZUNTZ apud SILVA, C., 2010, p. 90), ainda que esse empenho fosse um ato que causasse perplexidade e medo a Demo-fonte (EURPIDES, Os Herclidas, v. 472-3), visto que o prprio lder ateniense indaga quem seria insensato ao ponto de entregar, deliberadamente por suas mos, os filhos queridos? (EURPIDES, Os Herclidas, v. 413-5).

Atravs do carter ambguo da tragdia, como aqui j destacado, a morte da jovem evidencia no apenas a necessidade de se sobrepujar os desejos coletivos acima dos individuais, mas tambm os males da guerra atravs de um ato de transgresso. O sacrifcio humano exigido, apesar de causar gran-de tristeza aos familiares, torna-se, assim, uma resposta a um perigo que ameaa a coletividade na sua prpria existncia (BONNECHERE, 1998, p. 194), evidenciando-se como o ambguo o prazer da ktharsis (LORAUX, 1988, p. 59).

Conforme elucidado por Hughes, que analisa os casos de sacrifcio feminino nas tragdias euri-pidiana,

A devoo altrusta dessas vtimas lendrias, particularmente pungente no caso de moas jovens, serviu para inspirar o exrcito a cora-gem e patriotismo em face do inimigo [...] As-sim, os contos de mulheres que morreram de forma abnegada para salvar seu pas, efetiva-mente inspiraram homens a estarem prepara-dos para fazer o mesmo, embora s mulheres nos mitos seja concedida uma morte sacrifi-cial, em vez de uma morte viril no campo de batalha (HUGHES, 2003, p. 76).

Assim, conforme apontado por Nicole Loraux, com efeito, a morte gloriosa no procurada, aceita: da mesma forma que os cidados de Atenas e de Esparta se inclinam diante de um imperativo ditado pela cidade, as virgens aceitam um destino de que se apropriam (LORAUX, 1988, p. 86).

Concluso

Exaltando virtudes que a priori se conectavam apenas natureza masculina, o herosmo na Grcia Antiga era, usualmente, apartado do universo femi-nino. Este, conectado a uma demarcao espacial, seja de fala, local ou ao, atrelava-se, sobretudo, ao ambiente interno e passividade, estando veda-do a ele participar de questes da plis.

Ainda assim, em um cenrio no qual a reclu-so e o silncio seriam as palavras-chave para as mulheres, Eurpides as destaca no palco do teatro, passando-as de passiva a ativa, visvel, como pde ser visto atravs de nosso objeto de estudo.

A maneira pela qual as personagens femininas representadas pelo tragedigrafo abdicam de suas vidas, superando o medo e demonstrando uma grande coragem, aproxima-as dos guerreiros que arriscavam sua existncia em benefcio da plis, do coletivo, tal como solicitado por Pricles em sua Orao Fnebre.

Atravs de Macria, Eurpides constri simbo-licamente, como ressalta Polignac, uma mensagem que deve ser entendida a partir do seu contexto de produo (POLIGNAC, 2010, p. 484), demonstrando tanto os males da guerra, a falha e a desmedida dos homens, quanto a necessidade de trav-la, eviden-ciando a honra e a coragem necessrias em campo de batalha, ainda que a vida fosse um obstculo.

Em meio a um conflito blico e ao Imperialismo ateniense, que vinha suprimindo qualquer barreira tica e deixando de lado a (sophros-ne), o comedimento to almejado pelos gregos, o poeta exps atravs de metforas seus pensamen-tos que acima de um artista so de um cidado.

Pr em seus versos temtica de tamanho im-pacto no era uma escolha desintencionada. Seus discursos significavam em meio sociedade atravs

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de uma relao dialtica entre o enunciador e seu pblico, seu contexto de insero, permitindo-nos vislumbrar outros sentidos presentes alm do tex-to ipsis litteris, visto que o discurso s se faz (se significa) na/pela histria (ORLANDI, 2012, p. 95).

Destarte, Macarria, assim como outras virgens sacrificadas nas peas de Eurpides, converte-se em herona, tornando sua morte um ator glorioso, sen-do a forma de morte que elegeram a melhor por ser til (ANDRES, 1980, p. 57). Mais que piedade, essa jovem gera, assim, admirao.

BETWEEN THE VIRGIN AND THE HOPLITE: THE FEMALE GENDER AND ITS WARRIORS VALUES

IN EURIPIDESAbstract: We propose, in this paper, to analyse the relationship between de female gender and the warrior code of conduct on the Classical Period (V-IV centuries b.C.) of Greek antiquity. We will do this analysis through the comparasion between the hop-litic ideals, male par excellence, and those represent-ed by the characters Macaria, presente in the work Heraclidae, of Euripides. Keywords: Feminine, warrior code of conduct, Eu-ripides.

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