habermas j. - esfera pública em direito e democracia v. 2
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7/21/2019 HABERMAS J. - Esfera Pública Em Direito e Democracia v. 2
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m Atores
d
sociedade civil opinião pública
e poder comunicativo
Até o momento tratamos a esfera pública políticacomo se fosse
uma
estrutura comunicacional enraizada no mundo da vida através
da
sociedade civil. Este espaço público político foi descrito como uma
caixa de ressonância
onde
os problemas a serem elaborados pelo
sistema político encontram eco. Nesta medida, a esfera pública é
um
sistema de alarme dotado de sensores não especializados, porém,
sensíveis no âmbito de
toda
a sociedade. Na perspectivade uma teoria
da democracia, a esfera pública
tem
que reforçar a pressão exercida
pelos problemas, ou seja, ela não pode limitar-se a percebê-los e a
identificá-los, devendo, além disso, tematizá-los, problematizá-los e
dramatizá-los de modo convincente e
eficaz
a ponto de serem assu
midos e elaborados pelo complexo parlamentar. E a capacidade de
elaboração dos
próprios
problemas, que é limitada, tem que ser
utilizada para
um
controle ulterior do tratamento dos problema'> no
âmbito do sistema político. Não posso mostrar em detalhes como isso
é possível. Por isso, adotarei o seguinte procedimento: ventilarei
inicialmente os conceitos controvertidos esfera pública (
1
e socie
dade civil (2), a fim de esboçar a seguir, algumas barreiras e
s t r u ~ r s
depoder que surgem no interior da esfera pública (3), as quais, porem,
podem ser superadas, em situações críticas, por movimentos que
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adquirem maior importância (4
).
Concluirei com um resumo desses
e l e m e n t o ~ que o sistema jurídico tem que levar em conta quando
elabora a imagem
de urna
sociedade complexa
(5).
1
O conceito esfera pública .
Esfera
ou
espaço público é
um
fenômeno social elementar, do
~ e s : n o modo
que
a
ação,
o
ator,
o grupo ou a coletividade; porém,
ele
nao
e arrolad? entre os conceitos tradicionais elaborados para descrever
o ~ d ~ m
social.
A esfera pública
não pode ser
entendida como uma
mstltuição, nem como uma organização, pois, ela não constitui uma
estrutura normativa capaz de diferenciar entre competências e papéis,
nem
~ ~ l o
11odo de ~ r t e n ç a
a uma
organização, etc.
Tampouco ela
~ o n s t i t u i um
i ~ t e m a
pois, mesmo que seja possível delinear
seus
limites
mtemos, extenormente ela
se
carateriza através
de
horizontes abertos
permeáveis e deslocáveis. A esfera públicapode
ser
descrita corno
u m ~
r e d e . ª ~ : < i u a d a para a comunicação de conteúdos, tomadas de posição
e opmwes; nela
os fluxos
comunicacionais
são filtrados
e sintetizados,
a ponto de se condensarem em opiniões públicas enfeixadas em tema<;
e s p e c í f i c o s . ~ mesmo modo que o mundo da vida tomado globalmen
te,
a esfera u b l i ~ a
se e p r o d ~ z através do
agir comunicativo, implicando
apenas
o
dorrnruo de
uma lmguagem natural; ela está em sintonia com
a ~ o m p r e e n s i b i l i d a d e geral da prática comunicativa cotidiana. Desco
bnm?s que o
u n ~ o da
vida é um r ~ s e : v a t ó r i o para interações simples;
eos
sistemas
de.
açao
e saber especializados,
que se formam no
interior
do
~ u n d o
da vida, :ontmuam i n c u l ~ d o s a ele. Eles se ligam a funções
gerais de r e p r o d u ~ a o do mun?o da
vida
(como é o caso da religião, da
escola da
farrn1ia),
ou
a diferentes aspectos
de
validade
do
saber
comurucado através da linguagem comum (como é o caso da ciência
da
moral,
da
a r t e ~ T ~ a v i a ~ e s f e r a
pública não
se
especializa
nenhuma destas d t r e ç o e ~ ; por isso quando abrange questões politica
m e n t ~ r ~ l e v a n t e s ela de1:a
ªº
a r g ~ s i ~ t e i : n a político a elaboração
e s p e c i ~ h z a ~ a .
A
s f e r ~
p u ~ h c a constitui pnncipalmente uma estrutura
comumcacwnal agtr onentado pelo entendimento, a
qual
tem a ver
com oespaço socw gerado no agir comunicativo,
não
com
as
funções
nem com os conteúdos da comunicação cotidiana.
Os
que agem .comunicativamente encontram-se numa situação
que el.es
mesmos a J ~ d a m a constituir
através de suas
interpretações
negociadas cooperativamente, distinguindo-se dos atores que visam
92
o sucesso que
se
observam
mutuamente como algo que
aparece
no
mundo ?b:1et1vo. O espaço de u1,lla sitnação
de fala,
compartilhado
intersubjetivamente, abre-se a t r a v ~ s ~ a s relações interpessoais que nas
cem
no
momento em
que os. a r t i c i p ~ t e s
tomam
posição
perante os
atos
de
fala dos_ u t r o ~ ~ s u m m d o obngações ilocucionárias. Qualquer
encontro
que ~ a o se
hmita a contatos de observação mútua, mas que se
alimenta
da
hberdade comunicativa que
uns
concedem aos outros,
m o v i n : i e n ? 1 ~ s e num e,spaço público, c o ~ s t i t u í d o através da linguagem.
Em pnnc1pio, ele
está
aberto
para parceiros
potenciais do
diálogo,
que
se
encontram
r e ~ n t e s ou que
poderiam vir a
se
juntar. E para impedir
o acesso
de
terceiros a esse espaço constituído
através da
linguagem,
impõem-se medidas
especiais.
Podemos
dar urna forma
abstrata e
perene a essa estrutura espacial
de
encontros
simples
e episódicos,
fundacm no agir comunicativo, e estendê-la a
um
grande público de
presentes. Existem metáforas arquitetônicas para caraterizar a infra-es
trutura de tais reuniões, organizações, espetáculos,
etc.:
empregam-se
geralmente os termos foros , palcos , arenas , etc.
Além
disso,
as
esferas pública<; ainda estão muito ligadas aos espaços concretos de um
público presente. Quanto mais elas se desligam de sua presença física,
integrando
também, por
exemplo, a presença
virtual de leitores situados
em
lugares
distantes, de
ouvintes
ou espectadores,
o
que
é
possível
através
da
mídia, tanto mais
clara se toma a abstração
que
acompanha
a passagem
da
estrutura espacial
das
interações
simples
para a genera
lização da
esfera
pública.
As
estruturas comunicacionais assim
generalizada<;
compri
mem-se em conteúdos e tomadas
de
posição desacopladas dos con
textos densos
da<;
interações simples
de
determinadas pessoas e
de
obrigações relevantes para a decisão. De outro
lado,
a generalização
do
contexto, a inclusão, o anonimato crescente, etc., exigem um grau
maior
de
explicação e a renúncia a linguagens
de
especialistas
ou
a
códigos especiais. A orientação leiga implica sempre uma certa
indiferenciação,
ao
passo
que
a separação entre as opiniões compar
tilhada-; e
às
obrigações concretas da ação caminha rumo a uma
intelectualização. E certo que os processos de formação da opinião,
uma vez que se trata
de
questões práticas, sempre acompanham a
mudança de preferências e de enfoques dos participantes -mas podem
ser dissociados
da
tradução dessas disposições em ações. Nesta me
dida, as
estrutura<; comunicacionais da esfera pública aliviam o
público da tarefa
de
tomar decisões;
as
decisões proteladas conti-
93
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nuam
reservadas a instituições que tomam resoluções. Na esfera
pública,
as
manifestações são escolhidas
de
acordo com temas e
tomadas
de
posição pró ou contra; as informações e argumentos são
elaborados na forma
de
opiniões focalizadas. Tais opiniões enfeixada<;
são transformadas
em
opinião pública através
do
modo como surgem
e através do
amplo assentimento
de
que gozam . Uma opinião
pública
não
é representativa no sentido estatístico. Ela não constitui
um agregado de opiniões individuais pesquisadas uma a uma ou
manifestadas privadamente; por isso, ela não pode ser confundida com
resultados
da
pesquisa
de
opinião. A pesquisa da opinião política pode
fornecer um certo reflexo da opinião pública , se o levantamento for
precedido por
uma
formação da opinião através
de
temas específicos
num
espaço público mobilizado.
Nos processos
públicos
de comunicação não se trata, em primeiro
lugar, da
difusão
de conteúdos e tomadas de posição
através
de meios
de
transmissão
efetivos.
A ampla circulação
de
mensagens compreen
síveis, estimuladoras da atenção, assegura certamente uma inclusão
suficiente
dos
participantes. Porém,
as regras de
uma prática comunica
cional,
seguida em comum têm um significado
muito
maior para a
estruturação
de uma
opinião pública. O assentimento a temas e contri
buições só se onna como resultado de uma controvérsia mais
ou
menos
ampla, na qual
propostas, informações e argumentos podem ser elabo
rados de forma mais
ou
menos racional. Com esse mais ou menos em
termos de
elaboração racional
de
propostas,
de
informações e
de
argumentos, há geralmente uma
variação no nível discursivo da forma
ção
da
opinião e
na
qualidade do resultado. Por
isso,
o sucesso
da
comunicação pública não se mede per se pela produção
de
generali
dade ,47
e
sim,
por critérios
formais do
surgimento
de
uma opinião
públicaqualificada. As estruturas
de
uma
esfera pública encampadapelo
poder excluem discussões fecundas e esclarecedoras. A qualidade de
uma
opinião pública constitui uma
gra..Tldeza
empírica,
na
medida em
que ela
se mede
por qualidades procedimentais
de seu
processo
de
criação. Vista
pelo
lado normativo, ela fundamenta uma medida para
a legitimidade da. influência exercida por opiniões públicas sobre o
sistema
político.
Certamente, a
influência fática
e a influência
legítima não
47 Cf. J Gerhards e F. Neidhardt. Strukturen
und
Funktionen
moderner Ôffentlichkeit. Wissenschaftszentrum Berlim, 1990, 19.
94
coincidem,
assim como não há
coincidência
entre
a
legitimidade
e ª.fé
na
legitimidade.
Porém, esses conceitos permitem abrir uma perspectiva, a
~ d qual toma-se possível
pesquisar
empiricamente
a relação
entre
a
]nfluência real
e a
qualidade
procedimental
de opiniões
públicas.
Parsons introduziu a influência como uma forma simbolica
mente generalizada
da
comunicação que regula interações através da
convicção
ou
da persuasão.
48
Pessoas ou instituições, por exemplo,
pedem gozar
de
uma reputação que lhes permite exercer influência
sobre as convicções
de
outras pessoas, sem ter
que
comprovar com
petências e sem ter que dar ,explicaç?es. A i n ~ u ê n c i alimenta-se da
fonte
do
entendimento, porem
se
ap01a num adiantamento
de
confian
ça
em possibilidades
de
convencimento ainda não testadas. Neste
sentido, opiniões públicas representam potenciais
de
influência polí
tica, que podem ser utilizados para interferir no comportamento
eleitoral das pessoas ou na formação da vontade nas corporações
parlamentares, governos e tribunais. A
influência
publicitária, apoiada
em
convicções públicas, só
se
transforma em poder político,
ou
seja,
num potencial capaz de levar a decisões impositivas, quando
se
deposita
nas
convicções
de
membros autorizados do sistema político,
passando a determinar o comportamento
de
eleitores'. a r l 3 : 1 l l e n ~ a r e ~
funcionários, etc. Do mesmo modo que o poder social, a mfluencia
político-publicitária só pode ser transformada em poder político atra
vés
de
processos institucionalizados.
Na esfera pública luta-se por influência, pois
ela
se forma nessa
esfera. Nessa luta não
se
aplica somente a influência políticajá adquirida
(de
funcionários comprovados, de partidos estabelecidos
ou
de grupos
conhecidos, tais como o Greenpace, a Anistia Internacional, etc.), mas
também
o prestígio
de
grupos
de
pessoa<;
e
de
especialistas que con
quistaram sua influência através
de
esferas públicas especiais (por
exemplo, a autoridade de
membros
de
igrejas, a notoriedade
de
literatos e artista'>, a reputação
de
cientistas, o
renome de astros do
48
T Parsons. On the Concept o lnfluence , in
id Sociological
Theory
and odem
Society. Nova Iorque, 1967, 355-382. Sobre a
relaçã'a entre influência'; e afinidade com valores . e s ~ b r e a
delimitação destas formas generalizadas de .
o ~ u m c a ç a o
em
relação a meios de regulação, tais como o dmherro e
0
poder
administrativo, cf. J. Habermas (1931 ), vol.
II,
408-419.
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esporte, do
showbusiness,
etc.). A partir do momento em que o espaço
público se estende para
além do
contexto
das
interações
simples,
entra em
cena uma diferenciação que distingue entre organizadores, oradores e
ouvintes, entre
arena
e galeria, entre
palco
e espaço reservado ao público
espectador. Os papéis de
ator,
que
se
multiplicam
e se profissionaliZJ1111
cada
vez
mais através
da complexidade
organiz.acional, e o alcance da
mídia, têm
diferentes
chances de
influência.
Porém, a influência
política
que
os atores
obtêm sobre a comunicação
pública, tem
que
apoiar-se, em
mtima instância, na ressonância ou, mais precisamente, no assentimento
de
um
público
de leigos que possui
os mesmos direitos. O público
dos
sujeitos
privados tem que ser convencido através de contribuições
compreensíveis e interessantes sobre temas que eles sentem como
relevantes. O público possui esta autoridade, uma
vez
que é constitutivo
para a estrutura internada esfera pública, na
qual
atores podem aparecer.
No entanto, temos que fazer uma distinção entre atores que surgem
do
público e participam na reprodução da esfera pública e atores que
ocupam uma esfera pública
á
constituída, a fim de aproveitar-se dela.
Tal é o caso, por exemplo, de grandes grupos de interesses, bem
organizados e ancorados em sistemas de funções, que exercem influên
cia
no
sistema político através da esfera pública Todavia, eles não
podem usar manifestamente, na esfera pública, os potenciais de sanção
sobre
os
quais
se
apóiam quando participam
de
negociações reguladas
publicamente
ou de
tentativas
de
pressão não-públicas. Para contabilizar
seu poder social em termos de poder político, eles têm que fazer
campanha a favor de seus interesses, utilizando uma linguagem capaz
de mobilizar convicções, como é o caso, por exemplo, dos grupos
envolvidos com tarifas, que procuram esclarecer a esfera pública sobre
exigências, estratégias e resultados
de
negociações. De qualquer modo,
as contribuições
de
grupos de interesses são expostas a um tipo de crítica
que
não
atinge as contribuições oriundas de outras partes. E
as
opiniões
públicas que são lançadas graças ao uso não declarado
de
dinheiro
ou
de
poder organizacional perdem sua credibilidade, tão logo essas
fontes
* Aqui
os termos
ator e
papel
de
ator
são
tomados
no sentido
sociológico e teatral, isto é, no sentido
de
um personagem que
repre-
senta
um
papel social.
Ao
passo
que na
maior
parte da presente obra
de
Haberrnas, o termo ator é empregado no sentido exclusivamente
sociológico,
como
agente racional
da
ação. N.
T.)
96
de poder social
se
tomam pública5. Pois as opiniões públicas
podem ser manipuladas: porén;_i n ~ o compradas public.amente, nem
obtidas à força Essa circunstancia pode ser esclarecida pelo fato
de que nenhuma esfera pública pode ser produzida a bel-prazer.
Antes de ser assumida por atores que agem estrategicamente, a esfera
pública tem que reproduzir-se a partir de si mesma e configurar-se como
uma estrutura autônoma E essa regularidade, que acompanha a forma
ção de uma esfera pública capaz de funcionar, permanece latente na
esfera pública constituída - e só reaparece nos momentos em que uma
esfera pública é mobilizada. .
Para preencher sua função, que consiste em captar e tematizar os
problemas da sociedade como
um
todo, a esfera pública política tem
que
se formar a partir
dos
contextos comunicacionais
das
pessoas
virtualmente
atingidas.
O público que lhe serve de suporte é recrutado
entre a totalidade das pessoas privadas. E, em suas vozes díspares e
variadas, ecoam experiências biográficas causadas pelos custos exter
nalizados
(e
pelas disfunções internas) dos sistemas de ação funcional
mente especializados - causadas também pelo aparelho do Estado, de
cuja regulação dependem os sistemas de funções sociais, que ~ ã o
complexos e insuficientemente coordenados. Sobrecargas deste tipo
acumulam-se
no
mundo da vida. No entanto,
este
dispõe
de
antenas
adequadas, pois,
em
seu horizonte, se entrelaçam
as
biografias privadas
dos ''usuários dos sistemasde prestações que eventualmente fracassam.
Os envolvidos são os únicos a beneficiar-se dessas prestações na forma
de valores de
uso .
Afora a religião, a arte e a literatura, somente as
esferas da vida privada dispõem de uma linguagem existencial, na
qual
é possível equilibrar, em nível
de
wna
história
vida, os proble
mas gerados pela sociedade.
Os
problemas
t e m a t z a d o ~
na esf
pública política transparecem inicialmente na
p r e s ~ ~ o ~ o c a l e x e ~ c d a
pelo sofrimento
que se
reflete
no
e s ~ ~ h o .de
expenenc1as
pessoais
vida. E, na medida em que essas expenencias encontram sua
x p s e s ~ o
nas linguagens da religião, da
arte
e da literatura, a esfera pubhca
literária , especializada na articulação e na descoberta
do
mundo,
entrelaça-se com a política.
49
9
Sobre essa função de
igrejas
e comunidades
religiosas,
cf _ F. Schüssler-
Fiorenza Die Kirche ais Interpretationsgemeinschaft , m E. Ahrens
(ed.). Habermas un die Theologie Düsseldort, 1989, 115-144.
97
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Há uma união pessoal entre os cidadãos do Estado, enquanto
titulares da esfera pública política, e os
membros da sociedade,
pois
- em seus papéis complementares de trabalhadores e consumido
res, de segurados e pacientes,
de contribuintes do fisco e de clientes
de burocracias estatais, de estudantes, turistas, participantes do
trânsito, etc. - eles estão expostos, de modo especial, às exigências
específicas e às falhas dos correspondentes sistemas de prestação.
No início, tais experiências são elaboradas de modo privado , isto
é, interpretadas no horizonte
de uma
biografia particular, a qual se
entrelaça
com
outras biografias, em contextos de mundos
da
vida
comuns. Os canais de comunicação
da
esfera pública engatam-se
nas esferas
da
vida privada as densas redes de interação da família
e do círculo de amigos e os contatos mais superficiais com vizi
nhos, colegas de trabalho, conhecidos, etc. - de tal modo que as
estruturas espaciais de interações simples podem ser ampliadas e
abstraídas,
porém
não destruídas. De modo que a orientação pelo
entendimento, que prevalece na prática cotidiana, continua valen
do também
para uma
comunicação entre estranhos, que se desen
volve
em
esferas públicas complexas e ramificadas, envolvendo
amplas distâncias. O limiar entre esfera privada e esfera pública
não é definido através de temas ou relações fixas, porém através
de condições de comunicação modificadas. Estas modificam cer
tamente o acesso, assegurando, de um lado, a intimidade e, de
outro, a publicidade, porém, elas não isolam simplesmente a esfera
privada da esfera pública, pois canalizam o fluxo de temas de uma
esfera para a outra. A esfera pública retira seus impulsos da
a ~ s i m i l ~ ç ã o p r ~ v a d a de problemas sociais que repercutem nas
biografias particulares. Neste contexto particular é sintomático
constatar que, nas sociedades européias do século XVII e XVIII,
se tenha formado
uma
esfera pública burguesa moderna,
como
esfera das pessoas privadas reunidas e formando um público . Do
ponto de vista histórico, o nexo entre esfera pública e privada
começou a aparecer nas formas de reunião e de organização de
um
p ú b l i ~ o leitor, composto
de
pessoas privadas burguesas, que se
aglutmavam em tomo de jornais e periódicos.50
50
J.
Habermas. Strukturwandel der Ôffentlichkeit. (1962), Frankfurt/M,
1990,
86;
cf. a introdução de C. Calhoun sobre a coletânea por ele
98