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Primeira viagem errante

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Titulo: Há um lugar para cada despertar © Santiago Guimarães, 2012 Revisão e ortografia: Evy Bernades, Paulo Menezes Grafismo: Elisabete Agostinho: [email protected], http://www.wix.com/designarte/designonarte Paginação: Antagonista Sociedade Editora, Lda. ISBN: 978-989-8336-31-6 Depósito legal: Antagonista Editora http://antagonistaeditora.blogspot.com [email protected] Impresso na União Europeia por Publidisa. ________________________________ Contatos do autor: Facebook/amealoucamente Twitter/amealoucamente [email protected]

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Santiago Guimarães

Há um lugar para cada despertar

(Primeira viagem errante)

Contagiar o mundo, ter sede, e nunca faltar o alimento.

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Nota do autor

Escrever uma escrita sem ontem, hoje ou amanhã. Uma escrita para assentar a esperança humana! Que vença constantemente a sua luta e se transforme num hino à vida; e o motivo que move ela não é pelas substâncias da virtude mas pela glória explicada em si. Uma escrita que começa na minha marcha e termina nos passos do povo. Que essa não seja somente uma escrita carregada com ênfases e desassossegos, mas uma escrita para limpar e nortear. Quero que meu leitor vire gente, categórico, que no primeiro verso seu corpo leve um susto, seu coração vibre e que seu passo se torne diferenciado. Uma escrita de uma poesia íntima na dor humana, fidedigna, buscando uma vista paralaxe, que tenha sobretudo a linguagem do amor, descansada e aconchegada no colo de uma mulher apaixonada.

Agradecer essa publicação é agradecer a todos que passaram

por minha vida até o presente e especialmente aquelas que me entusiasmaram a seguir viagem. Um projeto que ficou parado pelas circunstâncias e retomado por um dever sagrado. Retribuir esse livro a essas pessoas não é somente apenas pelas reputações das vivências que tivemos, pelas alegrias ou consentimento que elas me proporcionaram, mas especialmente por me fazer sentir mais próximo do mundo e, claro, terem-me fornecido tudo o que preciso: a paixão pela vida.

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Prefácio Parafuso Pensante

Visão, realidade. Pesadelo, sonho. Sonhar, acordar. Correr,

descansar. Liberdade, repressão. Manifestação, submissão. Anarquia, ordem. Sustentável, dependente. Esperança, desilusão. Riqueza, pobreza. Água, deserto. Amazonas, Sahara. Vida, morte. Amor, ódio. Amigos, inimigos. Alegria, tristeza. Vida boémia, vida regrada. Noite, dia. Lua, sol...

Palavras desconexas? Talvez não! Desconcertantes, opostas… talvez sim! Será o anúncio de uma vida errante, como o homem comum, poderá

pensar? Absolutamente, não! Em Santiago, o que diz, escreve solto, mas profundo! À sua maneira,

é um alerta às consciências adormecidas. Não se arvora de vanguarda, mas quer estar á frente e gritar: contem comigo!

Para Santiago, amor é algo que, ou se tem, ou não se tem. É o amor sem pele, que não precisa de uma coberta para parecer aquilo que não é!

Como em qualquer um de nós, a vida tem um início e um fim; um

passado que, por mais duro que seja, não se esquece; um presente que se luta para viver; e um futuro que se procura! Todos nós, temos um propósito, um chamado. Santiago pensa que já o encontrou. Está na hora de o ajudarmos a confirmar seu propósito, o seu chamado! Leia este livro, nos seus momentos de repouso e paz! Se estiver em stress,

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não o faça! Só descontraído, poderá entender o que está escrito, e nas linhas e entrelinhas, captar a sua mensagem… Quem sabe se o seu chamado é compatível com o de Santiago?

Insisto numa ideia: este livro pode transparecer uma viagem

errante, e se calhar até o é, mas à maneira de Santiago, com um sentido diferente do comum…

Boa sorte! Um amigo que Santiago encontrou

Na sua viagem errante… Paulo Menezes

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Índice

Dos apelidos marginais

Elegia de um permanente.13 Rompendo pele.14

Consumo silvestre.15 Embriagado de noites.16

É por causa do jeito dela.17 Ausência da tua segunda casa.18

Impregnada de mundo.19 Meus anos novos.20

Filmam algo na rua.22 Olhos da memória.23

Do encarar seus olhos

Mensagem instantânea.27

Trajetória em torno de ti.28 Olhar de criança.29

Gosto de ti.30 Diálogo com o mundo.31

Esperarei.33 Tu virás.35

Fotografia.36 Branca e nua. 37

My sweet candy.38

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De uma paixão avassaladora

À volta do poeta.41 Dicionário aberto.42

In-sigth dum rebelde.43 O melhor do homem.44

Há um lugar para cada despertar.45 Amo-te.46

Te cortejar é a minha ocupação.47 Olor da ausência.48

Vanguarda.50 Ausência do velho cinema.52

Consumar o próprio caminho

Ressurgir do pó.57

O vento de Lisboa.59 Partida.61

Para quem continua.63 O galo cantou, menina.65

Integral despedida.67 Jogando-se na vida.68

Iniciação.70 Estandarte.72

Somos parte da história.73

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Dos apelidos marginais

Nunca permita que ninguém diga a você quem você é. Ou te engane, tentando explicar o que você é.

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Há um lugar para cada despertar

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Elegia de um permanente

O que pode vir-a-ser a saudade? Que dor constante é essa que tu sentes

De lembranças nostálgicas cantadas por amantes?

A mulher, doce mulher dos olhos puros; Redimo-me ao teu tom efémero,

Da noite tépida de putas tão tristes Percebi que tu entre tantas outras deveria ser notada.

Essa é a vida árdua que andei e amadureci, Reconheci em mim as palavras dos homens Mas hoje não quero trilhar ou me encontrar

Prefiro permanecer, instalar em algo qualquer.

Eu procuro em vestidos encontrar a eternidade! No seio sensível arrumarei minha tenda.

Pegarei jovens agnósticos da eterna busca E direi a eles que suas entranhas são a única satisfação, a única verdade!

O que eu falo é de amor, do gosto dos grandes gemidos,

Do teu coração que não pode ser arrancado de si; E assim como vinho posai-vos nossos lábios

Como taças exageradas cheias de sede! Permanecerei então assim estranhamente no ser embriagado

Nós não nascemos somente para morrer, amanhã necessito ser anjo!

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Dos apelidos marginais 14

Rompendo pele Quando eu ando nas madrugadas encontro: Corpos fatídicos, deitados em bancos de praça Os postes simpáticos se intimidam com a impassível lua cheia. O vinho que nos aquece, faz todos queimarem em suas dermes. O berço balança quando a manhã se aproxima O boémio vem engatinhando no meio da rua Cantando e dançando na chuva Ele sabe que precisa de um propósito de vida, Pois todo homem da noite acredita em monogamia Porém não descobriu sua prometida. Digo a mim mesmo: é preciso manter a paixão! A beleza não é apenas uma forma de rosto, ela é devagar e urgente E você menina, quando me toca desabo como velhas habitações arcaicas. E eu não sei onde termina minha pele e onde começa a dela! O bom presente faz a nostalgia do passado, Tudo que sabemos é produto do que fizemos com nossas vidas Mas não tenho tempo para lembrar nada, eu sou para agora! E nossas pernas continuam perdidas entre lençóis Esvaem-se sentimentos! Tua vida caminha, pois ela é insuficiente. E eu realmente não sei onde termina minha pele, e onde começa a dela.

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Consumo silvestre

Quem entre legiões impediria de escutar minha voz? Todas as coisas as quais eu sirvo se tornam algo e me consomem Pois tudo pode ser envolvido e degustado, se não, ao menos perdoado. Quem caminhará com o poeta cantando a última canção alegre? Quem se permitirá ser assaltado constantemente pela poesia? Aqueles que se tornam belos transitam sem descanso! Nessa noite minha mãos entenderam meus gestos, Como os vinhos, entendem sua riqueza através dos anos Vossos corações saturados ultrapassaram qualquer causa, E os contidos da sua liberdade continuaram debaixo das escadas. Maduros, nossos toques se contaminaram pelo contato simples. Num thriller erótico, nossos braços se embrulharam numa torrente forte. Acordaremos assim juntos, tomando café e pensando na vida! Aparte, todos estão proibidos em não se apaixonar pela sua existência!

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Embriagado de noites A mais bela com seus gestos tão simples Assimilados e compreendidos por minha alma. Pequena minha, quando eu te tomo pelo rosto Suas partes desatam de uma compreensão saudável Na noite que caíra me levantei e bati na tua porta Você extasiada em mim apreendia minha prosa, depois parti Carreguei o teu traço no bolso e passei pelo auge da noite. No meio do caminho pulei de calçadas, dediquei tua flor. Você porém, se recompondo, catando suas peças Que por minha vez espalhei no chão claro de sua sala. Desinibido estendia os braços, dançava a música dos anjos Pavoneando-me com ela eu sorria ao lado dos meus poetas. Para onde eu iria? Não sei, tudo valeria! Talvez o vinho explicasse melhor. Dissipando a madrugada fui seguindo. Nessas horas da madrugada, moças fatigadas se entregam, Advogados se matam, fundamentalistas cumprem seus ritos. Se fosse para repetir minha adoração, gritaria a fome! Pedimos pelo rapaz, porque pedir é nosso destino Não devemos dar esse fardo para ele. Tenho sentimentos muito mais violentos Não tenho outra paixão a não ser a dos loucos.

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É por causa do jeito dela

Onde está? Mostra-me rapaz esta sua busca! Essa pessoa que te incendeia logo pelo amanhecer Cadê esta deusa fugidia que não se deixa afagar? E que te deixa inquieto a escrever versos. Sinestesia de cheiros, cores, perfumes, bocas, pálpebra. O desejo de misturar essa cara lerda em pele macia Mostra-me essa mulher que nega suas curvas, Aponte que eu vou lá, acorrento e a prendo em você. Persegue esta mulher que não te deixa dormir, rapaz Diga que teu silêncio é em homenagem a ela, Que teu último cigarro do dia, é fumado pensando nela; Diga, mas diga mesmo, que a vida fica mais interessante [por causa dela.] Cante essa mulher ingrata que nega o peito, Que lhe causa tosse mesmo em dias de carne e vinho. Profetize essa mulher que faz a lua nos trair em noites quentes Diga que é por causa do charme, da decência de ser morena... Não, não cuspa nessa mulher rapaz, não bata nessa mulher! O meu Deus proteja-a, proteja pois o homem, esse não presta.

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Ausência da tua segunda casa

Aquele apartamento parou, severizou, estabeleceu... A cadeira deixou de ser cadeira, o chuveiro parou de existir Quartos, salas e banheiros perderam suas cogitações próprias. Tudo isso porque você não mais participa. As portas ficaram fadigadas, as roupas dobradas Os corredores não têm mais seus passos diários As chaves foram colocadas sobre a mesa. Os nomes dos encontros guardados nos livros. O que restou foi o teu cheiro corporal no ar, Fumos importados, garrafas de vinho acumuladas, fluxos Corpos despidos apertados contra a parede para seu deleite Num processo lento e profundo do qual a vida só servia a isso. Marcas no peito, a boca lubrificada, formas de corpo Na noite que se arrastava rápida repercutia gemidos. Iríamos morrer devido à entrega, teu silêncio era óbvio. E que mal teria isso, morrer sobre o peito demasiado forte? São nesses dias que homens imploram para morrer Morrer no corpo, na carne consumida, no peito sugado. São nesses dias que mulheres imploram para viver Viver no corpo, na alma consumida, no peito amado.

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Impregnada de mundo

Isso, esparramai suas coxas pelo salão Na noite do samba que tu precisas sambar. Hoje cultivarei o palpável, obedecerei à obsessão Lançar-me-ei ao teu gingado e me envolverei no teu cheiro. Tu que danças na noite quente de calor humano Que pisa fielmente no chão e sorri para o bando, Sim, você é a moça impregnada de forte mundo O teu segredo eu não direi pois é a fala de Deus. Jovem macia e sensível de olhos tão tenros Que habita na intimidade do meu coração Derramarei o melhor leite sobre teu peito Contornarei cada vã ocasião do teu corpo. Cálidas minhas mãos te abençoaram sem açodamento Quero viver como se o tempo fosse algo ilimitado Que por mais que o mundo não brilhe continuarei a ver-te. Levarei a tua cor precisa e criarei algo eterno, Algo em que os corpos se grudem e gritem por mais. E o estar morto pode ser tão penoso, eu não aturaria. E quantas tentativas eu precisaria até te encontrar? De novo, algo que se pareça com sua pele iria demorar Moça, sua beleza se declara e agride minha paciência.

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Meus anos novos Está pronto lá fora o Sol, já se levanta; E quanto tempo faz? Doce é poder lembrar as vozes dos amigos de infância. No tempo que se perdia as horas, se constituía a origem dos fatos. Éramos sábios e contínhamos a essência da procura, Porque não nos interessávamos as pegadas dos antigos, Queríamos apenas o que eles tanto procuravam. Cada qual amava à sua maneira sem importar o modo E este é o discurso: Tinha na folha o sentimento do mundo Que amigo não se escolhe por cor ou credo E sim pela pupila, pelo brilho inquietante. Para ser amigo só sendo de cara lavada e alma passada. Ter coragem para dizer o óbvio que ninguém mais dirá Ser amigo é procurar no outro sua maior alegria, Reconhecendo suas reais agonias! Vivia-se cantando pelas noites dos meus anos novos Eu juro por tudo que enaltecia aquela vida Porque para mim tudo fazia muito sentido Era muito raso, sem chantagens. Adquirimos toda postura da excelência Podendo ficar assim, dias e dias acordados.

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Eu fui porta-voz daquela geração. Exigindo deles apenas uma ligação de lealdade E a única coisa que importava era estar ali. Sonhando, participando, admirando a evolução deles. Hoje, eu procuro evitar meus amigos de infância Se nada aconteceu, se os gostos foram deformados, As particularidades recalcadas, eu também serei derrotado. Sabe-se que entre amigos não se faz nenhum tipo de comparações!

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Filmam algo na rua Eu esperava a escuridão Eu almejava a escuridão, não a morte! Mas sim a noite, a madrugada serena. Que vem envolvida com hedonismo E quando ela chega eu tenho que falar, eu tenho que me abrir. E por aí se foi a nossa vida... De repente, não muito de repente, ela sorriu como uma borboleta tonta que acaba de tomar um banho de vinho. Acho que sempre tive aquela necessidade de me propor algo, de alcançar o impalpável, de me arriscar e principalmente de dar conta que estava vivo. E por esquinas que saio, casas que entro, e quartos que ainda repousarei, eu vou anotando tudo, criando personagens, construindo meu mundo. O beijo sonoro, a alma que não tem pele A alma que só tem interiores que querem cantar Vivi tempo demais sozinho bebendo vinho, Se eu soubesse ser feliz do teu jeito De ser totalmente diferente do meu Se eu soubesse ser feliz, mas acontece que sou poeta. Tudo é singular. Errante ou não, descubro a vida que nos teus muros nasceu. Ser jovem é a única religião, e minha metralhadora é uma máquina de escrever!

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Olhos da memória Acontece que me canso de estar cansado, de não ser mafioso Acontece que essa cena se repete em minha memória Quartos de hotéis baratos pagos, manhãs em barbearias. Acontece que esse negócio de ser escritor desespera minha existência! Só mais tarde fui perceber que sofria de um fatalismo otimista. Não vou mudar, esses sonhos rasgados já não têm mais solução. Os meus rastros, palavras deixadas em estradas que não resistiram Com os próprios olhos pude ver a fúria que é continuar vivo. Sendo que acredito em poucas coisas na vida, não deixarei de viajar Porque de estrada eu sou. E volto porque de mim são todas as coisas simples Eu não sei com que força me separo, e o que me faz falta é do sono da tarde. Não posso ser sorriso para tantas desgraças, nem voluntário para angústias. Acontece que me canso de calçar os mesmos sapatos, De bocejos pela manhã e dos gritos das calçadas no inverno. Necessito de música africana e de dar mão ao índio Quero só ser capitão de cavalos e destino. Há solidão de viúvos, banho em recém-nascidos Há batismos e salvações. Visto-me encharcado de humildade. Entre todos aqueles que teriam passados, ainda puderam ver Ferida entre o povo e o tempo, ela era ainda louca do coração.

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Do encarar seus olhos

Seus olhos são o voraz castigo para minhas aventuras

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Mensagem instantânea

Te escrevo infelizmente com apenas uma parte Uma sede minha está aqui, a outra partiu. E não é desde hoje que volto para casa Com a alma nos olhos, sempre me faltam pedaços. Peço que um dia entendas este destino exigente Que não sejas indiferente ao ouvir o canto deste povo E que venha matar sua solidão apenas com abraços, Menina do riso mais fácil desta América Latina. Quero a densidade retomada em sua fala, Quero que a esperança não seja apenas uma atividade. Te peço que ao menos me carregue no esquecimento Não lhe pedirei mais nada, nem que devolva meus olhos. Não lhe pedirei cadastro, não preciso de formalidades Mas recorda de alimentar a estirpe quando o verão passar Se agora estivesse perto dos teus pés, beijava-os! A vida bate e o meu sonhar se encontra descalço.

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Trajetória em torno de ti Ainda haverá aquele resquício, aquela brecha Quieta e muda. Porções de pensamentos agradáveis, Daquele pedaço de pano antigo com logo-marca. Dos corredores onde os peitos se encostavam Ou daquela doçura que foi perdida em alguma esquina. Tive de correr mundo por um tempo, Sofri perigo, pulei de colo em colo. Souberam meus nomes, proclamei o teu. Fui lírico, bebi na boémia, cuspi poesia. Desculpe-me talvez pelos exageros, por te olhar profundo. Por habitar no âmago das coisas distraídas, De fazer itinerários solitários sem destino comum. Hoje a lua está pura e minha noite é fria Talvez menos fria se você estivesse nela. Quero um descanso de lavandarias ou de quadris. Fugirei da inércia, sonharei com teu peito Hei-de suspirar novamente ao ver tua saia Escreverei versos e mais versos, criarei livros Quero viver louco, pretendo morrer de paixões. Sairei para comprar rosas, escreverei cartas. Voltarei ao teu céu, e te direi coisas ao pé do ouvido Dar-te-ei a mão, você o braço, depois os nossos corpos. Repousaremos no calor da tarde, livrarei de mim, te salvarei.

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Olhar de criança

Há uma porta que te leva ao infinito, e a dica para abri-la é repor seus olhos!

Pelo que eu saiba, em nenhuma época ou parte da história, um povo

desmoronou-se por excessos de altruísmo. Tem que amar; isso dá capacidade, isso nos faz enxergar! Talvez por uma forma involuntária escolhi a profissão de poeta. Pela fome contínua da agregação dos verbos, ou pela incompetência de não ser uma coisa só. E vos digo que só se adquire vida, apenas quando se ama. Reconciliar com a jornada. Os que se acalmam tranquilizam suas peles, tudo parece mais fácil quando se sabe o que quer.

Para viver um grande amor é preciso se ceder por inteiro, até se

transformar em um. É preciso de flores, café da manhã com sumo de laranja. Ter a confiança de falar olhando no olho do outro, contar como foi o dia, acordar ao lado, ser boa companhia, lutando e descobrindo uma vida juntos. É preciso ter afeto e dedicação ao corpo da amada, e é claro escrever nele, ser pagão a ele.

Meus amigos envelhecem em tua maturidade, mas peço o favor que

sintam a ingenuidade saltar em suas veias, lembrando que a capacidade de beleza consiste na formosura de gente simples e desusada, crianças poetas. Devemos reaprender a dar novos passos, a ter o primeiro amor, e não deixar que o mundo apequene nossa alma ao ponto de desalma-la. Devemos entender como as crianças enxergam a vida, e entendem que amar é simplesmente amar, do puro amor que só se sabe dar, sem perguntas sem remendas.

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Gosto de ti

Gosto de ti quando se cala, porque assim o tempo congela E deste tempo faço teu templo de elogios. Sussurrando nuances, nos teus olhos encontro brilho. Tuas mãos esvanecem mundo a fora que procuram minha voz para o teu banho noturno. De onde tira tantas folhas o Outono por onde passas? E o porquê dessas folhas sem decência se suicidam Para fazer um tapete confortável, para os teus pés acariciar? Mistério do mundo, necessidade do mundo querer te amar! Gosto de ti até quando o presente nos ausenta Porque assim sinto mais a tua falta! E desta linha que nos separa eu peço a ti para ter calma, Pois a distância só existe para quem não confia. E assim com naturalidade, aqui no futuro, enfeitarei a nossa casa. Basta ser breve quando te sinto nos meus versos Versos que criam pernas que escorrem planetas a fora E compreendo as construções divinas E entendo o meu descontentamento celestial. Eu gosto de ti porque eu gosto de ti. E a amo porque a amo. Essas coisas a gente não explica Simplesmente canta, profere, põe para fora.

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Diálogo com o mundo

O vento que vem nesta noite canta alegremente Posso escolher os versos mais contentes deste dia. Gosto, simpatizo, e mantenho diálogo com a chuva

Que entra em tua casa pela janela, que foi deixada aberta. O que eu sinto, por hoje, foi teu grito contido da primavera

São as luzes que ficaram acesas, numa madrugada que se repercutiram em gemidos.

O que eu pretendo fazer da minha vida

Não é mais um ensinamento para árvores maduras. O que eu quero de você, não apenas a parte que chega nossas vidas

Quero mais do que a vida toda, é a tua essência e o laço que realmente nos une.

O que eu procuro entender neste diálogo com o mundo é o porquê, Do tempo que nos servem as horas custam a passar.

Os carteiros que encontrei ontem pela rua, estavam aflitos, pois não tenho

casa fixa. Pelas manhãs frequento tabacarias, perfumarias, mercados Pelas tardes caminho em parques, padarias, peixarias

E quando chega a noite, o orvalho que cai nos meus ombros, Exala o cheiro do teu pêlo doce. O cheiro irrepreensível de mulher.

Escrevo o teu nome no meu braço para me alertar.

(Eu sempre escrevo coisas no meu corpo para me alertar!) Tenho que te ligar. Acordo!...

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Teu nome continua grudado na minha pele,

Pela tinta duma caneta de um amigo, satisfação que se partiu Seguiu rodovia cantando, pois já dizia que sabia o teu caminho.

Meninas de pernas jovens sorriem para mim,

Recito poesias para elas, que escrevi pensando em ti Elas olham teu nome estancado no meu braço, mas não se importam,

Elas querem minhas palavras, elas querem tirar fotos dos meus lábios! Erguem as blusas e me oferecem para escrever um romance em volta dos seus seios rosados.

Saio de quartos húmidos, passo no posto, me abasteço Continuo sempre atento, buscando olhares.

Há algo mais triste do que uma casa não habitada?!

Sim, eu quero que todos vivam no meu quintal, E que sorriam ao meu cantar e que cantem o seu canto!

Encontro uma cabine telefónica e você diz alô! Tua voz me acalma Eu digo que estou voltando para nossa história

Que arrumei o alimento e que ainda sinto a tua falta.

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Esperarei

Simplesmente corri, corri sem motivo, sem pressa de chegar, com lenço e com documento, e foi assim por longos oito quarteirões; (a vida exposta ali a todos e um destino a seguir). Naquela época eu tinha uma super abundância de energia que não havia escoadouros para depositar tudo que me exercia, acho que tudo era um grande acesso de compreensão. Eu não me importo de andar para lá e para cá. Isso é até uma vantagem, o que pode ser terrível por um lado, pois as vezes ninguém consegue te alcançar. Então, fico assim algumas estações na frente a olhar suas fotos, que não deveria, porque ficar com aquilo nas mãos me causa uma beleza insuportável de acreditar em você, finjo que não estou sendo visto por satélites, isso dói.

Esperarei. Mas não congelarei o tempo, não ficarei com o mesmo

sentimento, não fumarei cigarros em demasia. Porque a vida nos exige muito nesse aspecto, é injusto guardar a mesma coisa por longos anos, e continuar parado na estação perguntando: e agora? o que vem depois? E concordo contigo: essa vida é cretina mesmo! Ela quer te contradizer a todo instante, é preciso uma luta interna muito forte para se continuar inteiro, intacto. O homem não é o que o seu nascimento determina. A vida (essa) nos usa para o seu bem próprio, no que ela mais necessita em sua narrativa, e se você entrega você faz parte, você conecta. Isso mesmo é o sexo! É preciso fundir com a vida, fazer amor constantemente, no chão do banheiro, no porão, atrás da porta, na escada, atrás da lixeira. Entender que é preciso às vezes sair da bossa nova e avançar pro rock and roll.

Imagino você rompendo os laços, indo embora para que sintam a sua

falta. Alimentar eles por um longo tempo apenas com cartões postais, ai eles te ligarão no natal, te pedirão para voltar, farão questão de pagar sua

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passagem, e falarão que tudo vai ser diferente. Irás negar. Tua vida agora te exige mais. Aceitará suas perdas, o que nunca foi fácil; mas isso a gente só consegue quando atinge um grau de nobreza. Chorarás pelo que se perdeu, por tudo que ameaçou a ser e não chegou, pelo que se idealizou, e pelo que se está cumprindo. Se tornarás tão humana, que seus amigos de infância correrão atrás de ti, lhe propondo fidelidade e negócios.

Esperarei, pois o que vale a pena possuir, vale a pena esperar. Já quis te

gritar tanto, falar que te entendo, que tudo que fiz foi sem excerto, neutro. Hoje me contenho, adiante que a paixão é um estado, e essas coisas têm que ser meio discretas, centradas somente no alvo. Se você sai espalhando pela vizinhança seu novo amor, algo conspira errado, isso é fato. Então fico mais quieto, calado, só escrevendo. Vencendo sem lutar, chamando-a sem falar. Aí eu torço para você não ler porque, se você lê, você sabe do jeito que eu me dirijo a você. Você é metida, isso é complicado. Por isso literatura troca todos os nomes, lugares, objetos. Te imagino assim num dia onde choveu desde manhã, ao me encontrar às 16:00num dia cinzento, marcado há cinco anos atrás. Você chegará de metrô na estação da praça, contigo somente um livro na mão, teus braços se entrelaçaram sobre os meus, e não direi nada por um longo tempo. Nem como vai, quanto tempo, senti saudades... você sorrirá como na primeira vez que te vi, me mostrará o livro, perguntará se eu conheço o autor, mas nunca o li…

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Tu virás

Quando te trago a memória Um estridente sorriso me escapa; fronte reparada.

Como criança que recebe um beijo esmagador do pai, longe de casa. Depois de te conhecer comecei a sonhar, a olhar ao meu redor, caminhar...

Agi com tanta loucura, Me perdi em comércios ilegais,

É porque tu és a escolhida.

Pequena, porque teus braços ao meu redor me faz sentir primavera humana E eu sinto falta, e sofro com tua ausência nos bares,

Pois a saudade não presta. E tu sempre serás jasmim.

E sou poeta com enxofre e vinagre.

Se eu te canto a todo instante, porque tu és o que tem de mais sagrado. Contudo se pudéssemos controlar, tornaríamos um, a todo instante.

Porque tu és o poema da vida E ao acordar e te ligar, faz meteoros estalarem violinos.

Porque o que deves fazer é esperar pelo tempo, assim como já o fazes.

E cantar é preciso sempre, aquela força que vem como alimento. Tua amizade é importante, o companheirismo, essa descoberta de palavras.

Majestosa, tu encaixas no meu sangue,

Com meu fogo, quero-te a qualquer preço! E tu sempre virás de dentro, e por fora golpearei a tua porta até abrir Pois é tão vazio sem tua presença, após ter envolvido no teu mundo

Tomara que a vida a traga depressa, porque é importuno ser feliz sozinho.

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Fotografia Aquela foto a qual eu tirei no dia que seguiu viagem Que suas amigas viram, e falaram que eu levo jeito para fotografia, Revelou um sorriso ingénuo que inaugurou minha inspiração Aquela foto do dia do seu embarque, é para mim um amuleto. E por onde eu sirvo, pego boleia, levo banho de chuva Minha mochila vai-se cansando, se arrastando, me mordendo. Cantei a primícia da manhã, abracei as florestas e subi montanhas Acompanha-me ao nascer do dia, amo-te de essência e fúria genitária. Não é porque a gente só foi mais um romance no exterior, Ou porque você sentava sobre mim e contava suas histórias E pedia que agasalhássemos com abraços, na noite fria que seguia. Mas é que sinto falta realmente do teu olhar de mulher, teu olhar de cuidado Mas quem sabe o nosso amor esteja sendo vivido Da mesma intensidade e exatidão por outros jovens? E são várias coisas que sinto falta nessa viagem de agora. Acredito que sou alguém e que meu fim será com o povo Desejo cresce de lhe topar por aí no mundo, numa esquina, ou num bar. Pois no teu seio trabalharei, pretendo estender obra, criar novos suspiros.

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Branca e nua

Acordarei com essa encenação de domingo eterno, esse talento hábil; Vou me aproximar do dia, beijar os rostos probos dos trabalhadores Vou me simpatizar com os povos, e me vestir impecavelmente. Então caminharei lentamente sobre os confins da terra. E te olharei como quem espera a vida diretamente de ti. É assim que te quero, é assim que te procuro Branca, nua de verdade, infestada de gestos Com frases mundanas e as inspirações dos Janeiros. Quero-te berrando do vermelho mais azul que existe. É assim que te espero querida, a minha espera com sorrisos de fúria. E todos entenderão que só teu orgulho me interessa (e o tenho); Então te beijarei 3 vezes, e olharei para vida a partir de ti E é claro que a vida pode ser boa, a natureza não peca. Mas ela só foi perene quando descansada em ti. E não me importam teus erros, pelo contrário isso te completa. Te emoldura e lhe deixa humana. Então lhe beijarei 268 vezes. E certamente teu riso deve erguer mais uma primavera que chega. Te quero se não para defrontar o que essa ausência me causou.

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My sweet candy (Ode a candy)

Caminhe até a mim, caminhe no frio da terra estrangeira, ( no teu passo meigo Candy. Se você voltasse aos meus olhos como naquele verão ( eu descobriria o segredo da vida. E de supor saber, já saber este é o segredo. Esta é a causas das causas. Então... Quem diria Candy, Eu não poderia esperar, guarde isso. É com você que eu dividiria. Foi nesta idade que veio me buscar, escolhera as flores para acasalar Foi entrando por aquela porta, escalando a minha cama calçada de aurora; Saudando com esses sorrisos famintos que te conheci Candy. Quem diria... Você me conduziu para tua ilha sob o teu canto. Teu cheiro ímpar. E eis o segredo mais profundo que ninguém conhece, Eis a raiz da raiz, o choro do querer acordar amanhã E o broto do broto, e o céu do céu De uma árvore que se chama vida: Que cresce mais que a alma pode esperar ou a mente esconder E esta é a maravilha! Que explica o metal macio dos teus olhos E que ainda mantém as estrelas distantes Que justifica a história em nossa pele! Carrego seu coração comigo. Carrego-o comigo.

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De uma paixão avassaladora

Não ter paciência para medos, depositar todas as energias

em alguma coisa que realmente acredita

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À volta do poeta É este teu olhar recíproco que me manterá Uma gratidão através dos anos, pequena minha. Quero fazer dessa afinidade a relação mais ínfima possível. Amar só é bom: quando surge da necessidade para tal evento, Fato pelo qual quem desacredita, nada tem sentido. E desta tua ternura pelos meus abraços Quero debruçar-me no gozo que é viver ao lado teu. E desculpe talvez por te amar assim de repente Mas é que o velho poeta precisava renascer; Como não! Depois dessas noites entrelaçados Das quais convivíamos com uma volúpia tão agitada. Quero inventar anjos por agora, invocar a noite! Para o nosso eterno delírio sempre apaixonados. Deixarei então no teu lábio essa expressão fecunda, E assim mais tarde escreverei no teu corpo: Por aqui soube amar uma mulher.

Buenos Aires, Dezembro 2008

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Dicionário aberto

O mundo lhe pedirá conselhos E tu não economizarás gestos Eu prefiro não acreditar que o verdadeiro amor é em vão. Não posso esquecer tua paixão, o teu corpo, teu cheiro. Resta um coração queimando, As vigílias para alcançar um novo horizonte O silêncio que às vezes fala mais do que as palavras. Existe uma luz que se chama esperança, e ser otimista é questão de opção. Buscar, buscar, plantar, colher - não mais obstante No mundo há sempre um lugar para consciência Eu quis a verdade, e o papel de ser homem. Então procuraram meu sangue, me exilaram num país distante. Ressuscitar do chão! O barro leve e roído da tua luta Não entenderam que ainda sou um aprendiz... Para mim isso tudo é uma canção sem fim Não cantarei amores que não sejam meus! Resta ainda este teu olhar de cruz para dentro de mim, A tua contemporaneidade para com os meus braços, Essa mansidão com a fraternidade que um dia nos casará. Qual é a comemoração de vossos sonhos? - Eu estou aqui de passagem.

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In-sigth dum rebelde

Porque depressa é a vida e assim ela é. E o sentimento de que a vida passa, dura... E senti-la passar toma em mim tal intensidade De viver sempre sem propósito ou mistério Nas multiplicidades de nossas raízes, imaculadas. Pelo que vale e em tudo em que levamos dela E de saber que ela é real e é agora, convoco! De viver uma vida real em febre. Se tens dificuldade de entender o que ama É ingénuo o sentimento de reduzir ´ O que se dá na esquina em casa se guarda. Então entrega teus sorrisos a este mundo Não convém lembrar de gestos acumulados, Terminarei enfim... ...a vida: Por sonho amo o que provém de mim E por ser sonho o [quero] e tenho. Cada dia continuo, vivendo para ti.

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O melhor do homem

Diariamente penso, não penso somente na existência No fruto que pretendo morder, no material cheiro da maresia

Creio sempre no que me cerca, nos demais objetos que manifestam Quero dar a plenitude, quero compor cantos, quero cafés pelas manhãs

Boina cinza, enxergar a natureza nos seus olhos, inimigo valente Eu quero caminhar novamente nas ruas de Ouro Preto

Ser o bêbado daquela noite, fazer pacto com a lua Namorar com a menina boémia que trabalha às sete

Quero fotos, sorrisos de aeroportos, quero a simplicidade do samba. Quero mulher de unhas vermelhas, sexo com exaustão, suor ilimitado.

Sussurros em alemão, francês e hebraico Não penso somente nas minhas necessidades

Mas penso com toda força e paulatinamente na vida! Ela própria em si Todos os seus âmbitos em todas as suas nuances.

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Há um lugar para cada despertar

Sorte é acordar para dentro Dar conta da tua risada fácil; Como escravos bem sucedidos, Obesos rebolando em passos mecânicos. Azar é entender que amamos mais o desejo Do que o próprio ser desejado. Nas ruas em que eu me perdia, Hoje não encontro mais nada. Ele diz um verso bonito e de novo vai embora Espero o dia em que ele morra por suas frases. Traficante da liberdade! Ele é tão livre que nos agride Simples como quem anda descalço, recebendo energia da terra. Um desejo? Ter os olhos cansados de te ver! Uma prece? A maravilhosa agonia de que realmente estou vivo! Sorte é acordar para dentro... Reconhecer a dor; Tão terrível como uma cunhada bonita. Se dar conta que sempre haverá portas. Que tudo morre e renasce num mesmo dia. Prestar conta realmente que nada por aqui Faz sentido, é igual a você, sem você. Que você pode sim melhorar tudo e agora Com um novo despertar.

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Amo-te

Amo-te tanto e sempre... Amo com tanta elegância, que ninguém entende o que eu sinto

Amo já o necessário porque se amasse mais estragaria. Quero-te tanto meu amor;

Quero perto, Quero teu calor

Quero os pensamentos mais loucos E os devaneios mais absurdos de ti.

Amo-te tanto (sempre...) Não chore nunca, cante! Canta que a vida entende

Canta o nosso amor atrasado Porque quando você canta Lembro de ti no instante.

E há momentos em que nós sentimos falta de estarmos juntos.

Cante suas saudades, meus poemas, as músicas que faço para ti. Cantando a gente uni uma paixão, cantando a gente se alivia.

Amo-te tanto meu amor, amo-te sempre!

Por via quando não estou em movimento E penso e lembro dela, não entendo

Porque quem se quer está longe. Eu digo à vida tão docemente para contê-la

Pois cuidar é questão de necessidade!

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Te cortejar é a minha ocupação

Saio de casa com a cabeça cheia de livros e sonetos Com minha jaqueta velha, uma lâmpada e horizontes. Quero a vida sorrindo em paz por te encontrar! Conquistar-te com um amor adolescente. Sem ilusões nem devaneios, te ganhar. Conciliar minha pele na tua, sem ironia Te pegar e morder com uma força desconhecida. Conceder no teu seio como uma onda noturna. Então venha: mas venha branda como os ventos calmos de tua infância, Não faça como as outras, que tiveram medo dessa paixão vadia Desse amor clareia ele minha, clareia minha para que seja digna. Mas não diga por favor que eu a tenho, porque assim seria triste. Comemos em pratos brancos, lemos livros verdes Proliferaremos como as raízes, choraremos por nossa América. É claro que tu és bela, e de ti bendigo a essência de todas as coisas. Mas não diga por favor que eu a tenho, porque assim seria triste. Quero morrer na vida da tua boca, quero dormir para o tempo Contemplar teus pés pequenos, ouvir os teus simples desejos Ser vítima dos teus abraços jeitosos, lhe afagar os seios. Mas não diga por favor que eu a tenho, porque assim seria triste.

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Olor da ausência Em tardes de pôr-do-sol eu a tinha na praça! E são dos perfumes, dos crepúsculos, do azul... Em tardes como aquelas eu a tinha no meu colo! É verdade que não a tenho, que ela talvez jamais me pertença Mas como não querer a presença daqueles olhos fixos? Dos cabelos curtos e aqueles pés compactos? O que eu amo em ti não és simplesmente tu, Mas a pessoa que me torno quando aproximo de você Às vezes me dá uma necessidade de te dizer que és dolorosa Sem afeto preciso, que sem mim o mundo não pode ser igual Que o carro está ali para pegarmos a estrada, dar corpo às possibilidades. É, eu a amei de fato, talvez eu a ame ainda! E a guardo como um livro privilegiado na minha estante. Como não amar o fato de perder-me em sua presença? E tua voz é como rajadas de primavera, mariposa descalça, Mas o fato é que não a tenho. E de tardes como aquela, eu a tinha na praça! Queria que estivesse por perto, quero que diga repetidamente: Sim sou tua, tua mulher, rainha, amante, tua mãe, tua cria. E quero que lhe sagre o eterno cavalheiro! Andarei ao teu lado, meu homem de chapéus.

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Mas o fato é que não a tenho E tardes como aquelas eu a tive na praça. E que esse seja amiúde o último poema para ela! O último vinho celebrado, o último tango homenageado. Entre todas as coisas, que se impregnou, o cheiro da ausência.

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Vanguarda

Tu és tudo aquilo que diz, mas sobretudo aquilo que faz, tu és também aquilo que pensa e o que sente, não deixa de ser você mesmo, até quando não fazes nada. A cada segundo exerce o seu eu humano, cada momento é biografia. O homem só descobre seu significado através da luta, de sua demonstração ativa; ele não é uma entidade estéril, desprovida de alma, contida em si. Somos sim mais importantes do que pensamos e de tudo aquilo que nos disseram.

A primeira lição (1): que se deve ensinar a um homem é lutar. Lutar na

vida para ser livre, e a verdadeira liberdade só chega quando os outros também são livres. A segunda lição (2): é ensinar a seguir uma carreira; e de que nada adianta uma carreira bem sucedida se não houver honra. A terceira lição (3): (ou melhor, a primeira) é que somos parte da Natureza, que não estamos sós, e cabe a nós respeitar sua lei e compreender seu ciclo.

Qualquer caminho que seguimos é único e irreversível, cada decisão é

responsável por tudo aquilo que nos tornamos. O que significa viver tendo a certeza da sua morte? A maior obra-de-arte já inventada é senão a performance da vida. Sem tempo para ensaios, a vida é inventada e realizada. Ser integral com a obra nos traz o dever de trabalhar a toda hora, a cada minuto, com interesse fermentado e alegre, o dever nos traz responsabilidade e nos torna exemplos.

Não adote o estilo de vida dos outros, os sonhos dos outros, seus amores,

suas citações... Não cometa o erro de se repetir, faça de toda acção o impecável!

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Impecabilidade é ausência de qualquer ato desnecessário. A salvação é

fugir da mediocridade. Encare cada dia como um novo desafio, não se deite o mesmo como acordou, e é isto que diferencia os homens, uma vida inventada deles próprios, com necessidades reais. O verdadeiro significado da vida é lutar por ideias e mais ideias. Nunca jamais medir o que se obteve, mas sim manter a integridade, a racionalidade e a paixão. Porque no final não é o que se obteve para si, mas o que se valorizou da vida dos outros, o que fizemos e demonstramos para o mundo sobre nós mesmos.

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Ausência do velho cinema

E se eu confessar que teu peito pode ser a única coisa que me resta? Se te falasse que me tornei passivo e comum, como você reagiria?

Mulher, eu trabalho e levanto da cama como todos pela manhã. Se dissesse que a loucura não mais me fascina?

Se eu sussurrar que as noites não são mais longas, nem tão contentes assim? Que chegou o dia em que eu não bebo para celebrar

Ou viaje para me defrontar. -Mulher, você me resgataria?

Segui um caminho que cai num lago indiferente

Me tornei o que nunca fora ou poderia me tornar. Logo eu que dediquei minha vida aos amigos

Que por agora estão ensinando uma pedagogia atrasada aos seus filhos, Amando suas mulheres parcialmente, e se comportando como estrangeiros.

Num ritual patético e sem propósito, porque a vida só é uma rotina.

Sinto falta do velho cinema! Onde todos se percebiam: Pois um grito tinha sua essência, e os belos gestos eram aprimorados.

As pessoas se tornaram muito convencionais, contidas Seguindo os ritos devem tratar dos seus umbigos.

Sim! Talvez eu perdesse a oportunidade de seduzir o mundo,

de cantar para eles. Esqueci de lembrar que a vida é uma coisa simples,

por isso não dar cabo dela; Que era para todos dormirmos na mesma casa,

sem paredes e no mesmo colchão.

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Não consigo acompanhar os novos filmes, nada me emociona

Narre amiúde aos novos estudantes de cinema Que o cinema perdeu o brilho da lua, o olhar de criança

Que negar o pão a um homem é matar a terra.

Agora que nada tem mais o seu devido valor; Dê-me o teu sorriso novamente!

Presenteia-me com tua presença definitiva, Onde eu possa perder-me em vossos cabelos desfeitos.

Que me neguem o sol, a comida, a revolução, mas teu amor não.

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Consumar o próprio caminho

O fato de sermos nos condiciona o pleno direito de mudança imediata, não necessitamos somente sonhar e sim viver.

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Ressurgir do pó

Quando fiz meu apelo, eu apenas tinha viajado com o vento Caminhada selvagem que para sobreviver foi preciso esquecer.

A vitória não pode ser improvisada desta ânsia ilimitada! Coragem humana, fé absoluta, voz ausente!

Peço que entenda o que fiz conforme a aventura

Porque chorei até para que tua boca selvagem não secasse. A vida que se expande nos cafés, nos comboios das sete

Nos chapéus dos pintores, na ala dos famintos. Errante fui cantando, errante fui terreno, e tornei real

Alcancei a glória entre o sustentar dos trigos E do mergulho que se vive nisso, era preciso afogar

para encontrar outro amanhã.

Talvez a síntese da minha juventude fosse me incluir, me sentir parte de algo Construindo uma história que ficasse para meu povo

Como um quebra cabeça que encontra sua última peça, Como o soldado que volta da guerra e encontra sua mulher na porta de casa.

Queria a integração. Quero ser inigualável e necessário!

Tendes de ouvir-me, mulher otimista e perturbada Não gosto de pontos finais, minha vida se acha entre pontos e virgulas

E da minha língua sai o bálsamo para aqueles que estão fadigados, Alço nos meus ombros o melhor deste sítio, e arrecado os melhores sorrisos

Tudo por aqui tem que ir até o fim, porque só a glória interessa. E sei que morremos constantemente na vida.

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Que somos gatos e nos esbarramos porque não estacionamos.

Mas o que importa é renascermos mais fortes, mais dignos de nós próprios E estaremos assim dispersos entre os homens, no dia final do sofrimento

Onde a justiça conquistará a luta, onde nascerá uma flor na América adormecida.

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O vento de Lisboa

Quando pisei no chão de Lisboa, havia uma festa das águas As árvores, que já não tinham suas folhas no alto, tocavam os galhos.

Grave e calado o dia teria adquirido uma consciência serena. Conciliado de encanto e admiração pela história das minhas raízes

Estremeci ao ouvir sussurrar do vento que vinha pelo norte, Dizia: a vida é assim, esta é a verdade, pense nisto para teu bem.

Tendes de ouvir-me Lisboa, não quero ser inimigo de Deus Nem tê-lo que matar todas as manhãs.

Jamais irei procurar entender porque os homens escondem suas realidades Continuarei a resistir toda a ordem, que a cultura nos tem deixado.

Sustentando em apoiar sempre o ideal das pessoas livres, e das causas sagradas.

Acredito em homens de pescoços dourados, e respirações variadas

Soldados de peso azul, com uma imensidade que esmaga o capricho do céu Que nasceram nutridos, do luto do domingo, do clamor da vanguarda Da dentada, o fio, o extermínio, a sede, o cantil, da justiça pregada.

Perguntaram por mim todos os dias; Diga que eu fico aonde mais necessita

Como meu peito surgem cravos, tens os lábios que o meu beijo procura Portugal O pão, o sangue cantam para terras de injustiças

Personalidade e canto atormentado, tens tu pátria contida.

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Por essas ruas, muros, por detrás das janelas

Nas plantações de uvas, nas relvas, no cais do Tejo Permanece um grito que a cada dia o procuro, e se encontro, o toco.

Teu início, vem dos oprimidos, dos famintos, de um choro consternado. De sabor de oliva, e suor. Da chama vermelha e verde que alenta a esperança.

Este grito cativante consiste em trazer graça e agrado. Das cinzas que ainda restam nos becos, a liberdade ganha licença

Pois ela tem a sua unidade plantada por esta terra. De procurar sua verdade, repartida entre tantas conquistas

de um povo glorioso!

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Partida

Abruptamente, fui retirado dos braços quentes de minha mãe Não soube de onde vinha a convocação, ou o porquê da manhã cinza.

A vida me olhava com olhos de ressaca E me chamava para entre os povos a flanar; Adentro, mais adentro suspiravam calçadas!

As janelas queimavam em febre, contando suas histórias E o meu peito ardia pelo conhecimento.

Não! Não escutei vozes, nem beijei os romances que li

Mas abracei os desejos da terra, e busquei pessoas com feição simples. Minha alma era chão! A poesia desabava por dentro E me agradava te reencontrar com tanta expressão;

Porque para mim só valem aqueles que são calorosos. Os que não brincam em serviço, que fazem algum gesto para a eternidade.

E o canto se aponta, é autêntico e chega a multidões hostis e aos reaccionários.

Alí vivem pessoas com seus olhos fundos.

Guardam tanta coisa menina, guardam todo o mistério do mundo. E a verdadeira poesia desaba por dentro e ataca como uma peste.

Abruptamente fui colocado em outros braços: Um deles o teu, e fui homenageado por olhos tristes.

Eu só lhe peço que me encantes!

Que venha pela noite e me chame na cama, Pois por ti geme minha existência;

Por ti sinto náusea do que não provém de afeto.

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Por ti as brumas do mar se tornam respostas.

E é daquele amor avassalador das montanhas que sinto nesses versos.

É do teu beijo de mulher na chuva de inverno. É da minha cara pálida quando sou tocado de surpresa.

Por ti perco sono, morro, renasço, dou fim. Por ti dura. Por ti diz-se do rio. Da fonte que não seca durante a estiagem e jorram torrentes servidoras de

alma. Para mim tu pareces com a palavra perene.

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Para quem continua

É preciso estar levantado, de queixo erguido sem tiritar sono companheiro, sempre em frente! Não se esqueça que o ar se transforma, e revitaliza constantemente. Nada que não seja bom para teus olhos, durará em sua infinitude. Por isso é preciso educar o espírito a cada aurora que se anuncia, inspirar-se no que queres e dedicar-se a cada segundo a cada hora. Escrevo para as necessidades do homem comum, os demais não interessam, já são por eles.

Conheci trabalhadores que dormiam em pé, conheci homens que não

terminavam as palavras que começavam de suas bocas, camponeses com mãos cortadas. Conversei com prefeitos, autoridades, pulhas, tiranos, heróis, bandidos, mães militantes. Convivi com índios, budas, poetas, prostitutas, antropólogos, privilegiados, intelectuais, marginais à beira da sociedade, líderes, artistas, cineastas, turistas. Fui presenteado por todas as vozes e de todas elas a única que ficou guardada em mim foi a dos oprimidos. É deles que vem a intimidade do sofrimento humano.

Através duma cortina ténue e ostensiva, facas amoladas penetram sobre

peitos, meus pés doem e o que me resta é um povo sujo de terra nos olhos, este silêncio guardado por tanto tempo, basta! É nessas horas, que devemos agarrar o humano mais acessível dentro de nós. Vejo meus amigos baterem à minha porta e não me encontrarem, eles sorrirão e entenderão a causa. E é para causa que devemos olhar, é fortalecer e transportar nossa ortodoxia para que não deixemos de caminhar.

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Reconhecer, andar pelo mundo, buscar alguém desconhecido, escrever o

que viu. Repito repetidamente, coisas repetidas, de que tudo isso irá mudar. Para quem continua tentando a cada ano que se inicia, vai aqui meu brinde: é a vocês que me dirijo companheiros, o homem que serve a sua índole nada irá extraviá-lo. Você meu irmão, a quem eu falo por meio desta, aqueles como nós que seguimos esses ritos a fim dum destino comum, que buscamos a raiz do homem verdadeiro, que queremos que o mundo seja reflexo de nós mesmos. Essas pessoas acreditam que a cada jornada conduz à sua iluminação.

Estava errado quem acreditava que nós viemos para empatar ou coisa

parecida. Mantendo a auto-estima elevada, saber o que pensar de si, e o que lhe determina isso indicará teu destino. Resta termos paciência, pois não há motivo maior para que a história não mude. E quanto ao processo de transformação resta continuarmos servindo com o coração perfeito, com uma alma voluntária e o senso de justiça coerente, para que assim possamos construir um mundo mais tragável.

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O galo cantou, menina

O médio abrir dos olhos pela estrada insondada A rota da alma funda perante o sol campesino,

A sombra andante encara o habitar da dor humana. Do punho, a letra depositou-se na carta sobre a mesa

Antes de partir foi até à cama e a lhe beijou nos olhos. P.S: sou peregrino.

Não ao que perdoar, só o de plantar antes de aceitar a morte.

As manifestações do coração do homem correm com ansiedade ao seu domínio

Ele sabia que ficaria algum tempo sem vê-la por isso beijou de uma forma diferente.

Considerando o frio da compaixão humana, a indiferença dos homens Fantasmas que tossem, perseveram em serem tristes, corruptos, soberbos...

Quem decifra o cinema encara a vida com oposição. Resistir é elogiar a intolerância!

Bebe-se à mesa estendida pela manhã faz à entender que o amor é simples.

Este amor é genuíno, embora estéril, é o único que prevalece O sacrifício pacifica a ira,

o fogo ecuménico aquece o espírito e empurra as criaturas. Nalguns indivíduos brotam um desejo

De cantar e acordar a consciência dos povos.

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Penso eu, que homem nenhum colocaria algo no papel, se não tivesse peito

para viver aquilo. Então chega a hora: de não cantar só por cantar, de passar a teoria exercendo à prática. E ele parte com um ar fundamentado, sem muita

bagagem para encontrar com outros que estudaram a realidade.

Aonde irão parar com seus propósitos, ainda é muito cedo para afirmar.

Mas eles se diferenciam dos demais desde o cumprimento. Entendem a causa, sabem o que fazem, e isso faz toda a diferença (de viver sem medo, vislumbram o sonho da sociedade mais justa)

De uma sociedade em sua total liberdade, duma sociedade sem classes ! A cada passo desses homens seus impulsos de justiça se tornam suas condutas. Seus olhares, a maneira de se vestir, portar, provocam uma

constante de um lado e do outro.

A cada passo desses homens e mulheres um acordo vibra por toda a eternidade. A cada passo tocam chaves cujo os sons

alcançam todas as montanhas e vales Em todo o movimento exercem uma influência que irão contaminar os

interesses das almas. Considero os homens não só pelo fato de existirem, mas pela vida de seus atos. Connosco, e por toda parte, devem ter pessoas assim

que esperam que o povo colha seus esforços.

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Integral despedida

O que eu desejava quando parti de casa, não era nada do que se busca hoje, eram verdades clandestinas que não se compram. Queria minha libertação, meu encontro comigo jovem. Foi por isso que eu ganhei esta respiração, por isso me deram esses braços, e portanto me deram um motivo. A respiração foi doada a você, os braços ajudaram a construir a casa do vizinho, o motivo está na estrada. Preciso ir para a rua, a pressa escorre em minhas botas, em placas nas rodovias encontram-se meus nomes. Tal é a passagem do tempo que dará apenas uma pausa para dois cafés. Ando depressa porque já fui devagar.

Pessoas são presentes, é preciso abrir o embrulho para ver o que se

encontra. Eu me tornei uma espécie de prémio, me doando aos outros, em troca reconheci a mim, as pessoas sempre necessitam ouvir algo para conceder a fé. Em qual sistema você anda caminhando? Para onde a tua alienação está te levando, amigo? A loucura da solidão é um fascínio, porém o amor é a solução. Repense.

Talvez o mundo não seja o bastante para mim, por isso é preciso dividir

com você para fazer algum sentido. Entraremos agora em uma história, façamos assim: habituaremos em uma vida de fatos, pois é preciso ter memória mais tarde. Construiremos uma política de celebração à vida, somos as crianças brincando debaixo dos postes, isso é nossa lição de casa. Seja de dia ou de noite o importante é a dedicação, o compromisso da ação, com o peso seremos eternos apaixonados.

“Há sistemas para todas as coisas que nos ajudam a saber amar. Só não há sistemas para saber amar”

Estação Saldanha, metro. Lisboa 2011

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Jogando-se na vida

Muito bem, começamos assim: Talvez meu ofício fosse me ter emprestado. Foi ter amado e ser amado, foi ter provocado as lágrimas do público.

Talvez tudo isso fosse a busca da plenitude.

Escutei os marinheiros desesperados, as mulheres que jogavam baralho Eu caminhei na estrada estreita, pois ela indicava o longo caminho

Provoquei os suspiros do Outono, ganhei as flores dos campos desconhecidos. E afirmo aqui que ninguém passou abatido E cuidei de todos como quem cuida a mãe.

Tentando dar a alguém o que vivi, a vida foi me cedendo aos poucos

E isso me tomava de tal forma, que eu seguia meus impulsos e me perdia; Perdendo-me eu me contagiava,

contagiando-me eu tornava algo sempre novo. Fiz isso a todo momento e a vida se tornou o belo errante!

Pedia uma nova palavra aos novos homens que caminhavam. -Astúcia!!! - gritaram eles.

E as coisas foram acontecendo de repente... Sem mais nem menos. Milhões de moços e moças, com suas mochilas nas costas, andavam pelos campos

Buscavam as montanhas, sempre a pé ou de carona. À procura da palavra certa.

E com o tempo também fui cansando da vida vazia dos homens,

Retirei meu preço baixo dos mercados, fugi dos sistemas carcerários, Parei de lidar com os idiotas da objectividade, para meu alívio

E é claro, de tocar minha guitarra para quem não me fornecia as cordas.

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Como não querer a morte vendo que o dia amanhece sobre o teu peito?

Por isso se fez a vida: Do seio do outro, o desejo de se tornar um. Para conter o passo e chegar na hora certa.

E com a vida se inventaram os nossos braços Nossas pequenas dúvidas, lembranças, loucuras.

Eu me identificava na tua efemeridade,

Tacava em tua língua o oceano no qual me criei! - Mergulhamos no itinerário da existência

Como uma criança que se dá conta de que nasceu. Tornamo-nos livres com calma... Soltos em nossas personalidades

Levantamos assim o nosso ninho às alturas. Chegando ao extremo, desembarcamos:

Sem horas, motivos, ânsias.

Muito bem, talvez meu ofício fosse me tornar parte. E o que ganhei? A eterna afirmação das crianças da infância!

Aquelas crianças que brincavam descalços no quintal da casa.

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Iniciação

De minha poesia, o ato de viver tive que procurar Da rua me deram o barro, das estradas as cores

Eu tive que colher as lembranças das pessoas em baixo das árvores. Era sede de vida, era um mundo ainda desconhecido.

Mudei e me propus incessantemente coisas novas,

Ao mesmo tempo a vida me mudou, e as pessoas renovaram E tudo foi se encaixando na memória marginal Dormi cada dia propondo-me uma vista nova

Conheci personagens, risquei versos, procurei horizonte.

Dormi em centenas de hotéis e as figuras se deslocavam Quantidade de gavetas, formas de janelas, o frio na varanda

A poeira era largada no canto, enquanto você ocupava o banheiro E me pedia num tom passageiro, que recitasse alguma coisa

de Neruda ou Lorca. Me pegava ali pensando, quantos miseráveis usaram aqueles lençóis

E dos mesmos lençóis, quantos amores súbitos de suas paixões se amaram ali, sepultando seus últimos encontros.

Ao longe, em cima duma montanha olhando para as cidades

Eu continuo cantando diferente, arquitetando meu hino E como um menino, ainda não durmo planejando arte.

Sem carregar máquina, fotografei Pegava pessoas desiludidas dessa vida.

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Há um lugar para cada despertar

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Dizia a elas por exemplo: os dias estão difíceis, tristes, sombrios,

Dizia por exemplo: não devemos perder esse ar, a fé, a apresentação. E dizia especialmente: que o amor é o milagre que elas esperam,

e disso se faz a iniciação!

Talvez não vivi para mim! Vivi a vida dos outros! E às vezes alcança-me o desejo de falar mais um pouco,

Deixando a poesia de lado, proferindo a necessidade do povo Estocando no teu peito que esta realidade existe

E que nossa história não se constrói sem cooperação.

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Estandarte

Que devaneio constante é este que transportas e enuncia Confundindo a cabeça dos homens mais esclarecidos. Homem de locuções, ontem te viram derramando lágrimas Pela tarefa humana ainda não cumprida nesta terra Por aqui vem um homem subindo e descendo essas ladeiras De longe, não muito longe, teu riso é escutado, tua mímica acariciada. Teus passos curtos, alastram movimentos concretos pelo chão de pedra Vestido em sua indumentária, esse homem comum se comporta como um príncipe. Talvez tua busca seja um enredo de paixão para sua nova novela Seio novo de moça alegre, que amanhece com o coração batendo E às vezes é difícil narrar o tempo, que caminha ou se ausenta num quarto. Mas perdoa-vos! Caminhai poeta porque você não tem casa. Sabe-se que por esses últimos dias se viveu muito por aqui. Diz ao homem, esse de caminhar atrevido, que fixa os olhos no horizonte Que com seu estandarte de palavras, as pessoas vão se unindo Aglomerando-se, abrindo trilhos, desenvolvendo o futuro, Para nessa demasia de destino elas venham conceder. Ele levanta para proferir a poesia E a poesia que é cuspida no teu rosto, carrega todo afeto do mundo! Transmitindo a responsabilidade do porquê desse sol atrever-se a iluminar-te.

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Há um lugar para cada despertar

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Somos parte da história

A poesia é orientadora, ela é o juiz aplicando sua sentença, Ela é a sede do trabalhador, todas as cores gastas. A onda arrebenta no meu ouvido ao assistir o sol morrer Lembro até hoje os caminhos dessa viagem. Vivi tudo, certezas e dúvidas. Catei pessoas abandonadas por dedos, e colei nelas o antigo brilho dos olhos O coração selvagem desesperadamente busca e suspira pela humanidade. Eu quero a divisa! Gastar meus olhos com todas as vistas Eu planejo usar meus pés até o limite da terra, nada me paralisa. Sugar a medula da vida, morrer nesse ritual eterno de essência e chamas. Não me compete escrever poesia, minha obrigação é de viver como poeta. Quem procura e busca a beleza, o bem, a verdade Fazem parte da mesma família, não do sangue Mas de algo que é o mais importante do homem, o espírito. O homem selvagem não respeita status quo, ele faz a sua própria pesquisa. O homem que se torna silvestre, usa a poesia como moral e revolução Ele se torna louco o bastante para acreditar no progresso humano. Pratica no seu quotidiano saúde mental e direitos humanos Esse homem não se distrai com invenções, ele sabe onde quer chegar. - A salvação da nossa história é a qualquer hora, quando somos coadjuvantes do nosso papel.

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